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sentimentos de enfermeiros
Gisele Elise Menin 1, Marinez Koller Pettenon 2
Resumo
Objetivo: compreender as percepções e sentimentos do profissional enfermeiro diante do processo de morte
e morrer infantil. Metodologia: qualitativa e exploratória, pautada por categorias temáticas. Participaram da
pesquisa sete enfermeiros da unidade de terapia intensiva mista neonatal e pediátrica de um hospital geral da
região noroeste do Rio Grande do Sul. Dados coletados por meio de pergunta aberta, no período de fevereiro
a março de 2013, e submetidos a análise por classificação, ordenação e análise final. Resultados: além da difícil
aceitação, enfrentamento e assimilação da finitude da vida infantil por parte dos enfermeiros, observou-se que
o cuidado de enfermagem é fundamental nesse momento. Conclusão: os resultados evidenciam o despreparo
emocional dos enfermeiros e a insuficiência de subsídio, seja em sua formação acadêmica, seja em sua educa-
ção continuada, bem como a falta de suporte terapêutico nas instituições de saúde para lidar com a situação.
Palavras-chave: Morte. Criança. Família. Enfermagem. Unidade de terapia intensiva.
Resumen
Terminalidad de la vida infantil: percepciones y sentimientos de los enfermeros
Objetivo: Comprender las percepciones y sentimientos del profesional enfermero ante el proceso de muerte
y morir infantil. Metodología: cualitativa y exploratoria, basada en categorías temáticas. Participaron de la
investigación siete enfermeros de la unidad de terapia intensiva mixta neonatal y pediátrica de un hospital
general de la región noroeste de Rio Grande do Sul. Los datos fueron recogidos a través de preguntas abiertas
en el período de febrero a marzo de 2013 y fueron sometidos a análisis por clasificación, ordenamiento y
análisis final. Resultados: además de la difícil aceptación, afrontamiento y asimilación de la finitud de la vida
infantil por parte de los enfermeros, se observó que el cuidado que proporciona la enfermería es fundamental
en este momento. Conclusión: los resultados evidencian la falta de preparación emocional de los enfermeros
y la insuficiencia de herramientas, tanto en su formación académica y en su formación continua, así como
también la falta de apoyo terapéutico en las instituciones de salud para hacer frente a esta situación.
Palabras-clave: Muerte. Niño. Familia. Enfermería. La unidad de cuidados intensivos.
Abstract
Terminally child life: perceptions and feelings of nurses
Objective: To understand the perceptions and feelings of professional nurses towards death and the dying
process of children. Methodology: qualitative and exploratory, based on thematic categories. The participants
were seven nurses of the Neonatal and Pediatric Intensive Care Unit of a general hospital in the Northwest
region of the Rio Grande do Sul (One of the Brazilian States). Data were collected through open questions
Artigos de pesquisa
in the period from February to March 2013 and were submitted to analysis by rating, sorting and final data
analysis. Results: There has been difficulty for nurses to accept, confront and assimilate the finiteness of child
life. It was also observed that nurse care is fundamental in those moments of end-of-life. Conclusion: The
results show the lack of emotional preparedness of nurses and the lack of assistance, be it in the academic
training or in continued education, as well as the lack of therapeutical support to deal with the situation in
health care institutions.
Keywords: Death. Child. Family. Nursing. The intensive care unit.
Correspondência
Gisele Elise Menin – Rua Frei Estanislau Schaette, 86, apt. 3, Água Verde, CEP 87034-001. Blumenau/SC, Brasil.
Artigos de pesquisa
repensar seu papel como profissional na unidade de roeste do Estado do Rio Grande do Sul (CEP Unijuí),
terapia intensiva 6. sob o parecer consubstanciado nº 182.102/2013.
A partir de relatos de campo, o presente es- Garantiu-se o anonimato dos participantes por meio
tudo procura trazer subsídios aos enfermeiros, a da denominação geral “Enfermeiro”, acrescida da
fim de que possam trabalhar seus sentimentos e numeração de 1 a 7.
compreender a importância da assistência integral
e humanizada durante o processo de finitude da
Resultados e discussão
vida de uma criança. Ao revelar as percepções e
os mecanismos de enfrentamento utilizados pelos
enfermeiros que trabalham em Utin e/ou Utip pe- A experiência dos enfermeiros perante a morte
rante a morte e o morrer de um neonato ou uma e o morrer de seus pacientes neonatos e infantis, re-
criança, este trabalho contribui com os profissio- velou as percepções dos profissionais sobre o tema.
nais de enfermagem, levando-os a compreender Emergiram do discurso três categorias analíticas: 1)
que não estão sozinhos em seus sentimentos e que ser enfermeiro diante da morte e do morrer infantil;
todos precisam de apoio para vivenciar e superar 2) o enfermeiro no cuidado à família durante o pro-
essa situação. cesso de finitude da vida infantil; e 3) necessidade
muitos deles sentem-se compelidos a tentar lhe tudo, para assegurar sua própria integridade física e
“salvar” a vida; dessa forma, se assumem essa psicossocial 13, sem o que, indiscutivelmente, acaba-
frieza, é antes de tudo para mascarar e negar os rá por falhar como profissional.
sentimentos de tristeza e as emoções perturbado-
A morte ainda hoje é vista como tabu em nos-
ras ao acompanhar a morte 10:
sa sociedade. Considera-se “mórbido” falar sobre
ela, mesmo nos espaços terapêuticos em que ocorre
“O enfermeiro precisa tirar de dentro de si uma força com relativa frequência, como as UTI dos hospitais.
enorme, precisa, nesses momentos, adotar um sen Tal interdição explica-se pela abordagem psicológi-
timento de frieza que muitas vezes não lhe pertence. ca, segundo a qual o homem procura defender-se
Segurar o choro, engolir uma lágrima, nem sempre é de diversas maneiras do medo crescente da morte
possível, mas muitas vezes se torna essencial!” (En- e de sua incapacidade de prevê-la e preveni-la 14,
fermeiro 5). como se observa na fala de um dos entrevistados:
“É importante que todo o enfermeiro saiba controlar “[A morte] gera, também, tensão em toda a equipe,
seu emocional, a fim de não se prejudicar nem dimi comportamentos diferenciados, maneiras de agir,
nuir seu desempenho profissional” (Enfermeiro 4). pensar, expressar, insegurança, raiva, medos diante
desta situação indesejável, (…) que muitas vezes não to grande pelo tempo que permanecem internadas
estamos preparados para enfrentar (…) e devemos e pelo bom relacionamento que se cria com familia
estar preparados para conduzir a equipe, para que o res” (Enfermeiro 6).
trabalho continue. Cobrar eficiência da equipe, ética
profissional, respeitar as crianças, religiões e atitu Ao sensibilizar-se e compreender toda a situa-
des de cada família” (Enfermeiro 3). ção e experiência dos pais com a internação de seu
filho em uma UTI, o enfermeiro busca estabelecer
Se lidar com um tabu social, em si mesmo, com eles uma forma de comunicação mais clara e
não é tarefa fácil, torna-se ainda mais difícil em- efetiva, que se estende também aos demais fami-
preendê-la quando esse interdito está diretamente liares. O profissional entende que, mesmo com a
relacionado com a morte de crianças e bebês, os impossibilidade de cura, os pais continuam a acredi-
quais, segundo nossa percepção, teriam toda uma tar que a criança irá sobreviver. Nesses momentos,
vida pela frente. Além de toda pressão inerente a faz-se necessário que o profissional perceba a li-
tais circunstâncias, é importante que o enfermeiro mitação dos pais e familiares para lidar com essa
proporcione motivação a sua equipe, tornando-a circunstância, e, desse modo, auxilie-os a aceitar a
harmoniosa e comprometida com a melhoria do finitude da vida de seus bebês 19. Para realizar, de
atendimento prestado, mesmo que essa assistên- maneira efetiva, essa penosa tarefa, o enfermei-
cia esteja voltada apenas para propiciar alívio ao ro precisa considerar que cada família interpreta e
pequeno paciente que falece 15. Sendo assim, o pro- vivencia a morte e o morrer de formas diferentes,
fissional de enfermagem deve enfatizar o cuidado conforme seu contexto histórico e sociocultural 20:
humanizado e a percepção do paciente como um
todo, com o intuito de diminuir a hostilidade do tra- “No momento de falar com a mãe e o pai, o emocio
tamento, além de manter a dignidade e o respeito nal é tão evidente (…) Esse enfrentamento é difícil
pelos direitos do paciente e de seus familiares 16. sempre (…) cada momento é diferente, é uma expe
riência especial; as famílias sempre reagem diferente
A aceitação da morte infantil é difícil para o
(…) A mãe, quando entra na unidade e encontra seu
enfermeiro. A fim de conseguir manter seu papel
filho entre milhares de tubos, aparelhos, portinho
nos momentos em que a ameaça fraquejar, o pro-
las, até colocar a mão no seu bebê, [mantém] o olhar
fissional de enfermagem precisa ter em mente que
de espanto, a procura por um gesto, uma palavra de
o cuidado dispensado ao neonato ou à criança, bem
conforto que diga: ‘Logo tudo vai ficar melhor, mes
como a sua família, é essencial ao bem-estar dessas mo em casos tão complicados’” (Enfermeiro 1).
pessoas, e que esse cuidado deve basear-se na in-
tegralidade da assistência prestada, assegurando o
respeito, a ética e a dignidade humana. “Deixar que eles passem por este momento reagin
do do jeito deles, porque tudo isso faz parte do luto,
eles precisam passar por isso. Tem pais que gritam,
O enfermeiro no cuidado à família durante o choram, rezam para que o filho ‘volte’, e devemos
processo de finitude da vida infantil deixar que reajam assim, pois é um sofrimento de
No processo de morte, a família necessita de sesperador, e cada um tem seu jeito de passar esta
Artigos de pesquisa
auxílio para entender e vivenciar melhor o luto 17. Ao etapa” (Enfermeiro 6).
conhecer aspectos como a história de vida da crian-
ça, seus familiares, o motivo da internação, entre
“(…) mas nenhum profissional consegue aceitar,
outros, o enfermeiro acaba por envolver-se emocio-
principalmente ao ser indagado pelos pais ou fami
nalmente no caso. Muitas vezes, tal envolvimento se
liares, que desejam somente a melhora do quadro
dá pelo simples fato de os pacientes serem crianças.
clínico [do paciente]” (Enfermeiro 2).
E, diante da impossibilidade de cura de um deles, o
profissional sofre, quer pela perda da criança, quer Importa ao enfermeiro perceber a necessi-
pela dor dos pais, quer pela reflexão acerca de sua dade da criança e de sua família de se manterem
própria finitude 18: próximos o maior tempo possível após se esgotarem
todas as possibilidades de cura. Essa proximida-
“A morte é difícil de ser aceita pela maioria das pes de propicia a flexibilização das normas rígidas de
soas que perdem um familiar ou ente querido, e segregação de uma UTI e valoriza a presença dos
também para o enfermeiro que trabalha com crian pais e familiares em todo o processo, ajudando-os
ças, porque na maioria das vezes acabamos tendo a enfrentar a morte ao mesmo tempo que permite
uma relação de empatia com os pais e crianças mui torná-la mais digna a esses pequenos 21:
“Eu geralmente, ao perceber que o RN ou a criança dos profissionais amenizaria aflições, medos e daria
pode ir a morrer, tento proporcionar a visita dos pais, melhor suporte emocional para enfrentarmos ou ten
tento ver qual é o que tem a possibilidade de ouvir tarmos compreender a morte (…) E, assim, podermos
eu falar um pouco sobre como pode vir a ser a vida conduzir a equipe através deste acompanhamento
dos dois sem o bebê ou criança (…) Proporciono um melhora na questão espiritual, física e emocional.
tempo para que os pais possam ficar sozinhos com a Para também estarmos melhor preparados para o
criança (…) Quando a criança morre, eu procuro ofe trabalho com os familiares” (Enfermeiro 3).
recer aos pais a possibilidade de pegar a criança no
colo (…) Caso tenham máquina fotográfica, sugiro Os sentimentos de medo e insegurança ge-
a possibilidade de tirarem uma foto de recordação” rados nos enfermeiros pelo processo de morte e
(Enfermeiro 7). morrer revelam possíveis lacunas no ensino de
graduação, entre as quais a ineficácia de suporte
pedagógico e psicológico aos futuros profissionais,
“(…) oferecendo alívio, perguntar se querem per a fim de que possam conviver com o sofrimento dos
manecer com o filho, após o óbito, por um tempo” pacientes e familiares 24:
(Enfermeiro 6).
“Cabe, por fim, salientar que essa temática deveria
Ser enfermeiro diante da impossibilidade de
ser mais abordada ao longo do curso de graduação,
cura de uma criança, na oferta de um processo de
pois muitas vezes o profissional de enfermagem
morrer digno, significa olhar além desses pequenos
deixa transparecer a sobreposição de sentimentos
pacientes, significa perceber a família como parte
profissionais aos pessoais. Por isso, uma sugestão a
integrante dos cuidados, como alvo merecedor de
este trabalho poderia ser o desenvolvimento de es
atenção, compreensão, respeito e suporte durante
tratégias de ensino a fim de desenvolver subsídios
a vivência desses momentos que a tornam tão frágil.
para os profissionais lidarem, tanto emocionalmen
te quanto profissionalmente, melhor com a morte”
Necessidade de qualificação profissional e de (Enfermeiro 2).
conhecimento sobre a temática
A formação dos profissionais da área de saúde “A morte com crianças ou neonatos muitas vezes
proporciona-lhes o conhecimento técnico e cientí- perturba a paz hospitalar; contudo, sabe-se que é
fico voltado sobretudo para salvar vidas e evitar a um assunto pouco explanado/esclarecido nos cur
morte. Consequentemente, evidencia-se seu des- rículos dos cursos de enfermagem” (Enfermeiro 4).
preparo para lidar com a terminalidade da vida 22:
Recomenda-se, como medida relevante, a
“É notória a falta de preparo do profissional para reformulação dos currículos acadêmicos de enfer-
lidar com a morte (…) Esse enfrentamento é difícil magem, pela inserção de disciplinas e espaços de
sempre porque realmente não estamos preparados reflexão que enfoquem a perda e o luto, de tal for-
(…) embora a morte seja um evento presente todos ma que os futuros profissionais consigam vivenciar
os dias ou com mais frequência” (Enfermeiro 1). a realidade da finitude da vida e propiciar uma rela-
Artigos de pesquisa
Este artigo foi elaborado com base em trabalho de conclusão do curso de graduação em enfermagem da Uni
versidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (Unijuí), Ijuí/RS, Brasil.
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Revisado: 29.5.2015
Participação dos autores
Aprovado: 7.6.2015
Gisele Elise Menin participou da concepção e delineamento do estudo, revisão bibliográfica, realização
do trabalho de campo, análise dos dados, redação do artigo. Marinez Koller Pettenon participou da
concepção e delineamento do estudo, análise dos dados, redação do artigo e revisão crítica.