Documentos de Académico
Documentos de Profesional
Documentos de Cultura
Olgálvaro Jr1
Neles temos a “biografia” do nosso Senhor, apesar da forma literária não corresponder
ao que classificamos de uma biografia em nossos dias. Mas claro que toda Bíblia, não
apenas os Evangelhos, conta-nos uma só história através de vários personagens e
circunstâncias, em diferentes épocas e culturas, que apontam para Cristo. Tudo se trata
de revelar a humanidade quem Deus é, portanto, tudo que está nas Santas Escrituras é
sobre Jesus.
Ao lê-los, podemos conhecer de uma maneira poderosa o plano de Deus, o amor que O
levou a se tornar como um de nós e sofrer as dores do ser humano, para nos levar a uma
vida abundante, preparada para todos que O amam.
Desde o início da minha jornada, me apaixonei pelas Escrituras Sagradas, pelo Livro de
Deus, e tudo começou pela leitura, meditação e, depois, pelo estudo dos Evangelhos que
são o extrato, o resumo de toda a mensagem que Deus quer comunicar a humanidade
em todas as gerações e em todas as culturas. Descreverei, aqui, um pouco da estrutura
de quem são os seus escritores, como eram suas relações com nosso Senhor, os
objetivos para os quais os textos foram escritos e como eles nos ajudam a conhecer
ainda mais de Jesus de Nazaré e os fundamentos da igreja cristã.
1
Olgálvaro Jr é pastor conselheiro do Ministério Sal da Terra, coordenador da “S.Família” com igrejas
em Uberlândia, São Paulo e Goiânia. Escritor na SalEditora com diversos títulos públicos. Presidente da
Aliança Evangélica Brasileira. Casado com a Fabiana, juntos são pais de 3 filhos e 2 netas.
1
1. OS EVANGELHOS SINÓTICOS
Alguns estudiosos consideram ser possível que eles tenham trocado informações na
elaboração de seus textos. A grande maioria dos estudos apontam o de Marcos como
sendo o primeiro a ser escrito, mas ainda há alguns que creem que foi o de Mateus,
sendo os demais posteriores ao dele.
Uma estimativa aproximada indica que Marcos possui cerca de 90% de seu material
similar a Mateus e Lucas. Quase 60% do conteúdo de Mateus é encontrado nos outros
sinóticos. Por último, Lucas possui aproximadamente 40% de conteúdo em comum com
Mateus e Marcos. Essa estimativa indica que os Evangelhos de Mateus, Marcos e
Lucas, possuem apenas 10%, 40% e 60%, respectivamente, de conteúdo exclusivo. No
entanto, apesar de grande similaridade, os evangelhos não são cópias uns dos outros.
Eles têm a capacidade de serem únicos e correlativos ao mesmo tempo, abordando fatos
ocorridos com perspectivas distintas que ampliam nossa compreensão da vida e
ministério do nosso Senhor Jesus.
Os Sinóticos foram escritos no primeiro século e, portanto, havia, entre os seus leitores,
pessoas que viveram e testemunharam diretamente da vida e feitos de Jesus. Por isto, o
conteúdo destes escritos tinha de ser apurado e comprovado como fiel, ou não seriam
aceitos pelas comunidades de cristãos em seus dias. Os Evangelhos são considerados
não só documentos históricos, com narrativa comprovada e factual – mas a base
teológica para os seguidores do Cristo
2
2. SOBRE OS AUTORES
Mateus: Apesar de não ter no Evangelho o nome do autor, desde o início, os pais da
igreja e historiadores têm como sendo do apóstolo a autoria do Evangelho. São
pouquíssimos aqueles que se opõem a esta afirmativa.
Também chamado Levi, o filho de Alfeu, Mateus foi um dos apóstolos que, antes de ser
convocado por Jesus, era publicano, ou coletor de impostos. Uma categoria de pessoas
bastante rejeitada e odiada pelos judeus, afinal, representava Roma, o império que
dominava sobre Israel. Os publicanos também tinham a fama de serem desonestos,
porque era comum que cobrassem impostos a mais e ainda retinham para si parte dos
valores. Além do mais, eram violentos e formavam, entre si, um grupo como a máfia.
O ofício exercido por Mateus o apresenta como uma pessoa capacitada, com percepção
intelectual afiada, acostumado com relatórios e escritas. Então, é possível supor que
suas habilidades cooperaram, em muito, na validação de seus registros a respeito de
Jesus e dos fatos relatados por ele.
João Marcos foi companheiro de vários outros importantes líderes da igreja primitiva.
Era primo de Barnabé que serviu com Paulo, Lucas e Pedro. Várias vezes é citado,
como em Atos 12, 13,15, Filemom 1, 2 Timoteo 4, Colossenses 4.
3
Cresceu vendo as ações em torno de Jesus, pois a casa de sua mãe era ponto de encontro
dos apóstolos. Sua história nunca foi a de um grande protagonista, mas sempre foi
citado como um ajudador, um apoio aos grandes homens.
Atos 12, 13 e 15 mostram como João Marcos causou um desentendimento entre Paulo e
Barnabé, o que resultou na separação deles e na continuidade de novas viagens
missionárias. João Marcos, provavelmente sentiu a dureza da primeira viagem, que não
colheu grandes frutos, e retornou para casa. Em seguida, Barnabé quis incluí-lo em
numa nova viagem, mas Paulo não concordou. Foi, então, que Marcos seguiu com
Barnabé, para Chipre, enquanto Paulo se associou a Silas que foram para Síria e Cilicia
encontrar e fortalecer as igrejas.
Apesar de ter começado sua vida missionária com aparente fracasso, quando deixa o
campo e retorna para sua casa, a contragosto dos demais companheiros, ele segue firme
e torna grande o seu ministério.
Marcos é exemplo de uma caminhada de superação. Sua vida nos ensina que, mesmo
que tenhamos falhado em algum momento, não precisamos desistir, nem recuar.
Só Lucas está comigo. Traga Marcos com você, porque ele me é útil para
o ministério. 2 Timóteo 4:11 (NVI-PT)
Pensa-se que Marcos nunca imaginou que seus escritos tomariam o mundo como
aconteceu. A princípio, sua intenção era a de uma simples circular para ser levada aos
cristãos gentios que sofriam em Roma.
Como o Evangelho mais antigo, ele serviu de base para Mateus e Lucas ampliarem seus
textos. Observe que em Mateus contém cerca de 90% dos escritos de Marcos, e no de
Lucas algo em torno de 60%.
Lucas: o “médico amado”, grego, nascido em Antioquia, antiga Ásia Menor, hoje na
região da Turquia. Ele é o único autor entre os 40 autores bíblicos, não judeu.
4
O médico teve uma educação sofisticada e trouxe uma contribuição poderosa quanto ao
testemunho de quem é Jesus de Nazaré. Vemos que seu evangelho é fruto de uma
minuciosa pesquisa que fez, estando com alguns dos apóstolos e com muitas
testemunhas oculares dos dias de Jesus.
Entre os quatro, é o que tem a melhor escrita o que evidencia a capacitação de Lucas
com o idioma grego, língua que dominava bem. Muitos estudiosos afirmam que este é o
livro mais amado. Talvez pela característica do evangelista que transborda ternura nos
seus relatos.
Tendo como base o Evangelho de Marcos, aquele que, também, esteve com Paulo em
suas missões, Lucas reorganiza, para os gentios, ou seja, aos que não eram judeus, a
jornada de Jesus sobre a Terra.
Escreveu não apenas o seu Evangelho, mas, também, o livro de Atos dos Apóstolos.
Fato, que faz dele, o autor com maior contribuição ao Novo Testamento, em quantidade
de texto, totalizando mais de um quarto de toda obra. Estas duas obras são
complementares, como se fossem volume um e dois.
Ernesto Renan2 diz que; “o Evangelho de Mateus é o mais importante livro que jamais
foi escrito”. Ele é o primeiro dos evangelhos aceito, universalmente, pela igreja dos
primeiros tempos e a ser igualado com a autoridade de Escritura Sagrada, assim como o
Antigo Testamento. No século 2, ele era o evangelho mais usado.
Foi escrito entre os anos 50 e 70, possivelmente na Antioquia, pois tem grande material
judaico em sua composição.
O objetivo primário do autor é mostrar que Jesus é o Messias, aquele que, por tempos,
Israel aguardava para ocupar, uma vez mais, o trono de Davi, conforme vemos por todo
Antigo Testamento
2
The New Testament as Literature
5
A grande conexão com as profecias e personagens do Antigo Testamento demonstra que
o cristianismo é uma continuidade da Antiga Aliança, mas superior em revelação.
Mateus enfatiza que Jesus é o novo e superior Moisés, descendente de Davi, que traz a
nova lei, mas que não despreza a lei anterior e, sim, a cumpre, e ao cumpri-la a torna
obsoleta em aplicação e demanda sobre o povo, hoje.
2. A obra dos Discípulos de Cristo - Jesus estabelece o seu modo de vida, a Missão e a
conduta para seus seguidores. (Mateus capítulos 9:35 a 11-1)
3. Reino dos Céus - Mateus não usa o termo Reino de Deus, pois sua audiência era de
judeus e, portanto, evitou mencionar o nome de Deus para não criar uma barreira. Para
mostrar o que significa o Seu Reino, ele se utiliza de várias parábolas, assim como para
definir sua natureza, o seu grande valor e a necessidade de buscá-lo.
6
4. O Texto Infantil - Ele escreve, aos novos na fé, como enfrentar nas suas jornadas este
mundo hostil. Trata dos problemas da comunidade cristã, ou eclesiásticos, mostrando
como deve ser as atitudes básicas no convívio da igreja. (Mateus 18:1 a 19:2)
Joio - 13:36-46
Tesouro escondido - 13:34
Perola de grande valor - 13:45-46
Rede de pesca - 13:47-50
Servo sem misericórdia - 18:23-35
Trabalhadores da vinha - 20:1-16
Dois filhos - 21:28-32
Bodas - 22:1-14
Dez virgens - 25:1-13
Ovelhas e bodes - 25:31-46
Além destas parábolas, há muito textos que não constam em outros evangelhos, como:
A cura de dois cegos, (9:27); Jesus expulsa os demônios do surdo-mudo (9:32); O peixe
com a moeda na boca (17:24); A visita dos magos do oriente (2:1); A fuga de José e
Maria para o Egito (2:13-14); A matança das crianças (2:16); e outros.
Como o foco de Mateus era o de apresentar Jesus como o Messias, o Salvador e Rei,
fica esclarecida a ênfase na genealogia e a citação contínua das leis e dos costumes
judaicos que falam diretamente aos filhos de Israel. Assim, ele faz ligação da Antiga
Aliança e das promessas com a chegada de Jesus, com o cumprimento pleno destas
coisas.
7
Porque um menino nos nasceu, um filho nos foi dado, e o governo está
sobre os seus ombros. E ele será chamado Maravilhoso Conselheiro,
Deus Poderoso, Pai Eterno, Príncipe da Paz. 7- Ele estenderá o seu
domínio, e haverá paz sem fim sobre o trono de Davi e sobre o seu
reino, estabelecido e mantido com justiça e retidão, desde agora e para
sempre. O zelo do SENHOR dos Exércitos fará isso. Isaías 9:2-7 (NVI-
PT), grifo meu
Eles perguntaram: — Onde está o menino que nasceu para ser o rei
dos judeus? Nós vimos a estrela dele no Oriente e viemos adorá-lo.
Mateus 2:1-2 (NTLH), grifo meu
Veja que, séculos depois, Mateus faz a ligação de Jesus com a casa de Davi. A
genealogia extensa colocada no início do Evangelho mostra, então, a história de Jesus
para afirmar que ele era o descendente que as profecias diziam. Ela liga Jesus com a
história que o povo de Israel esperava por séculos. A intenção do autor era dizer que o
Rei chegou, que, agora, enfim, o reinado da casa de Davi seria reestabelecido com o
novo rei, e seu reino não teria mais fim, a promessa se cumpriu.
O livro “Simply Jesus”, de N.T. Wright, relata o ambiente que Jesus, o Messias, enfrenta
nos seus dias. O autor cita o Império Romano e seu momento como potência mundial
onde o imperador, chamado de “o filho de deus”, era o regente não só do mais poderoso
exército do seu tempo, como a figura que simbolizava paz e prosperidade para todos. É
neste contexto que Mateus apresenta Jesus como o Rei na terra que tinha rei, como
sumo sacerdote na terra dos sumos sacerdotes.
Roma não interferia nos ritos judaicos e, no que podia cooperar, era favorável as ações
que estes líderes tomavam em troca de suas subserviências. Mateus mostra como Jesus
foi apontado por estes líderes como herege, pois, para eles, Jesus ensinava contra os
costumes de Moisés. Eles denunciaram Jesus aos romanos como aquele que estava se
levantando contra o imperador, se fazendo passar por rei dos judeus. Mas a motivação
que tinham para condenar Jesus era que Ele estava atraindo, cada vez mais, seguidores,
e sua mensagem denunciava a hipocrisia dos escribas, fariseus e saduceus, pondo em
risco o poder que tinham e a posição que ocupavam.
8
dispostos a levantar um só dedo para movê-los. “Tudo o que fazem é
para serem vistos pelos homens. Eles fazem seus filactérios bem largos e
as franjas de suas vestes bem longas; gostam do lugar de honra nos
banquetes e dos assentos mais importantes nas sinagogas, de serem
saudados nas praças e de serem chamados ‘rabis’. Mateus 23:1-7 (NVI-
PT)
Mateus finaliza o Evangelho lembrando que, apesar de desprezada, a promessa de Jesus
se estende para todos os povos, mostrando que havia um novo Rei de um Reino eterno,
muito além da nação de Israel. Que chegava o tempo de uma nova era para todos os
povos, uma mensagem de grande alegria que deveria ser compartilhada com todas as
gerações em todas as nações, onde se cumprisse a ordem da Grande Comissão
O evangelho de Mateus nos faz lembrar que Jesus é Rei de um reino que não tem fim. A
paz que Ele veio nos dar, não é como a paz de Roma, aquela que o Imperador apregoava
como fruto de domínio pela força, coerção e medo. A paz que nosso Rei traz é aquela
que, mesmo que haja conflitos e guerras, está em nós. Mesmo que em algemas, cadeias,
martírio e perseguições, ela guarda o nosso coração.
O Rei Jesus não governa usando as pessoas para seu benefício, como quem é servido,
como fazem os reis deste mundo, mas é aquele que veio para servir. Ele não é aquele
que tira a vida das pessoas ou as condena como soberano juiz. Ele veio dar sua própria
vida para resgate de muitos.
Então, este evangelho nos conecta com toda a promessa do Antigo Testamento, aonde o
Messias viria para resgatar e reinar sobre seu povo em um governo que não teria fim.
9
O Evangelho de Marcos, Jesus é o servo sofredor:
O Evangelho de Marcos é o primeiro dos Evangelhos a ser escrito e data-se antes do ano
de 60 DC. Tem como foco o servo sofredor, pois o desejo dele foi o de ajudar os cristãos
a suportarem perseguição e martírio que sofriam severamente em seus dias. Sua
linguagem é para falar com os gentios que haviam se convertido e, agora, estavam em
uma situação de grande aflição, pois poderiam enfrentar as arenas de feras que o
império romano dedicava aos que se diziam ser seguidores de Cristo.
Uma perseguição que se tornara ainda mais intensa quando o louco imperador de Roma,
Nero, depois de ter colocado fogo na cidade, acusou os cristãos de terem feito tal coisa.
Como Marcos teria escrito o que apóstolo Pedro contara, ou até mesmo ditara a ele, a
“biografia” é chamada do Evangelho da ação, dos milagres e prodígios. Há uma
dinâmica e uma intenção clara de mostrar o que Jesus fez, muito mais do falar do que
Jesus ensinou - bem a cara de Pedro.
10
No evangelho de Marcos consta mais milagres relatados que nos outros evangelhos. Ao
todo são dezoito registros, número maior do que em Mateus, Lucas e João. O sermão da
montanha, registro que é a base dos ensinamentos de Jesus, não é apresentado nesse
evangelho, e mostra que Marcos estava mais interessado no que Jesus fez. A sua ênfase
estava na atividade, tanto que não há registro do nascimento de Jesus ou de sua
linhagem judaica. Marcos já começa os seus registros em João Batista, onde a ação se
inicia.
Todos estes milagres, indiscutivelmente, mostram que Marcos tem o foco na pessoa de
Jesus como aquele que é todo poderoso e que tudo está debaixo de seu domínio e
querer. De que não há impossíveis para Jesus.
Assim está na declaração de João Batista sobre aquele que viria em poder:
11
E esta era a sua mensagem: “Depois de mim vem alguém mais poderoso
do que eu, tanto que não sou digno nem de curvar-me e desamarrar as
correias das suas sandálias. Marcos 1:7 (NVI-PT)
Portanto, um dos principais pontos para Marcos é apresentar Jesus como aquele que tem
autoridade sobre tudo e todos, e seus feitos testemunham disto. Como Messias e
Salvador, Ele tem poder para perdoar pecados. E como afirmavam os religiosos, só
Deus pode fazê-lo. Logo, esta é a declaração de quem Jesus é.
No Evangelho de Marcos, a palavra grega “euthus” que pode ser traduzida por
“imediatamente”, aparece por 41 vezes, o que acelera a narrativa, dando velocidade e
urgência nos fatos apresentados. Então, é um relato comparável a filmes de ação quando
aparece cenas em sequências rápidas. Neste caso, uma abundância de fatos
maravilhosos registrados com o objetivo de mostrar a autoridade de Jesus, como o
Messias Salvador. Bem a linguagem da capital do mundo de seus dias, Roma.
Marcos queria demonstrar quão poderoso era Jesus e como seus feitos revelavam que
Ele era o Salvador de todos os homens, e não apenas dos judeus. Que era necessário Ele
sofrer nas mãos dos religiosos, e ser executado para que pudesse vencer a morte.
Pois o próprio Filho do Homem não veio para ser servido, mas
para servir e dar a sua vida em resgate por muitos. Marcos 10:45
(ARA)
As expectativas do povo, naqueles dias, estavam direcionadas para o Messias que viria
libertar o povo de Israel do império opressor. O povo esperava um líder vencedor, capaz
de derrotar as poderosas armas romanas. E a fama de Jesus, que percorria a Galileia,
renovou a esperança e aguçou o desejo desse povo para que Ele pudesse, de fato, ser o
libertador que esperavam.
Marcos se dirigia ao mundo gentio. É o Evangelho que menos cita o Antigo Testamento
e, quando o faz, não o aborda como lei do Senhor. O seu interesse era demostrar aos
gentios, aos romanos, que Jesus é o rei de feitos prodigiosos e, sobretudo, age como um
grande conquistador porque tem poder.
Marcos apresenta, sim, Jesus como o salvador e libertador do povo, mas não da forma
que as pessoas esperavam. Ele mostra que Jesus veio para dar a vida, e não para
preservá-la. Que Ele veio para sofrer a tortura, e não se ver livre dela.
12
O livro “History of Primitive Christianity, de 1937, Johannes Weiss” nos lembra que
Jesus é o Messias não a despeito da cruz, mas justamente por causa dela.
Como servo, sofreu na sua carne, foi tentado em tudo e não pecou. Sofreu falsas
acusações, foi ferido, perseguido, espancado... Zombaram d’Ele, cuspiram em seu rosto,
pregaram em uma cruz e O expuseram como bandido. Até na cruz foi desafiado a provar
que era poderoso, no entanto, se submeteu a morte de cruz, pois era ali que se tornaria o
grande conquistador.
Marcos deixa claro que o poder que estava sobre Jesus revela quem Ele é. Que a Sua
entrega como servo sofredor mostra Sua natureza de amor e como Ele se identifica
conosco, por isso pode, agora, nos consolar em nossos sofrimentos.
O Rei a quem servimos, não é o que vai nos garantir o palácio, mas a cruz.
O evangelho de Marcos dá testemunho das obras de Jesus. Mostra que Ele é o poderoso
Messias, que realiza feitos maravilhosos que só o filho de Deus, que é Deus, pode
realizar.
As obras de Cristo testificam que Ele pode ainda perdoar os nossos pecados. Sua vida
demonstra que, apesar de todo o seu poder e glória, Ele veio para sofrer as nossas dores,
para se entregar para nos fazer filhos e filhas do altíssimo.
13
Jesus é o que veio para servir e não se servir dos homens, e assim deve ser os seus
discípulos - servir e revelar, ao mundo, a obra de Cristo, por onde forem. O que
significa que a vida deve ser entregue, completamente, a Ele. Que devemos tomar nossa
cruz e segui-Lo com integridade e santidade. Portanto, vemos nesse Evangelho o poder
e autoridade de Jesus que nos desafia a viver da mesma forma e a revelar ao mundo, a
sua mensagem, em ações e obras que mostram quem Ele é e como devem viver seus
discípulos.
Lucas escreve o Evangelho e Atos dos Apóstolos e envia os dois livros a Teófilo, um
alto oficial romano, com o objetivo de, como ele mesmo diz, relatar quem é Jesus e os
seus feitos.
Muitas coisas eram ditas a respeito de Jesus, então ele se propôs a tomar todos aqueles
depoimentos e organizar as informações. Assim, ele trabalha para mostrar a Teófilo, em
uma linguagem não judaica, o que aconteceu, de fato, com Jesus e seus discípulos.
Alguns estudiosos também consideram que o Evangelho de Lucas teve como motivação
ser um documento de defesa diante do Império Romano quanto à nova religião que
emergia de dentro das tradições judaicas, mostrando-a não como uma facção ou seita,
mas como uma continuidade do judaísmo que revela a salvação não mais restrita aos
judeus, mas a todos os povos da Terra. Dessa forma, ele demonstra que os seguidores de
Jesus não eram uma ameaça a Roma e que a nova “religião” deveria ser livremente
praticada com direitos garantidos pelo império, assim como era o judaísmo e várias
outras religiões que estavam nas colônias Romanas.
Naqueles dias, os cristãos sofriam forte e severa perseguição pelos judeus e pelo
império. Então, Lucas se esforça para demonstrar que a mensagem de Jesus, o Cristo,
era a perfeita revelação de Deus aos homens.
Também, alguns eruditos defendem que Lucas estava escrevendo para cooperar com a
defesa de seu querido amigo, o apóstolo Paulo, que seria julgado em Roma.
Infelizmente, a história demonstra que o império continuou a perseguir severamente os
cristãos até os anos 300 DC, quando o imperador Constantino encerrou essa perseguição
e decretou a prática livre dos seguidores de Jesus.
14
Veja que Lucas faz questão de associar Jesus ao humano, levando sua genealogia até
Adão e não apenas até Abraão, como fez Mateus, que escreveu seu evangelho tendo em
mente, primeiramente, os judeus. Desta forma, a ligação que Lucas faz, deixa claro que
Jesus é a salvação para todas as etnias, raças, línguas e nações.
Vale lembrar que, antes de Jesus, havia deuses regionais ou nacionais, era o Deus de
Israel, os deuses dos egípcios, dos romanos, dos gregos e persas, mas depois de Jesus,
não seria mais assim. Ele revela, na plenitude, que Deus o Criador do Universo é para
todos os povos e o caminho deste novo relacionamento é através de Jesus, o Filho do
Homem.
Jesus não apenas se parecia humano, ele era, totalmente, humano. Entre o seu povo,
estava sujeito a todas as condições humanas, se cansava, tinha fome e sede. Ele se
emocionava, foi tentado e humilhado à nossa forma, chorou e sentiu dores quando lhe
infligiram açoites e o pregaram em uma cruz. Era tão humano que morreu por asfixia,
na cruz.
Adão é o primeiro de toda raça humana, Jesus é filho de Adão. Ele é o Messias que foi
prometido, desde o princípio dos tempos, aquele que recebeu do Todo Poderoso, Deus
Criador, a autoridade para resgatar o que havia se perdido. Jesus, o Filho do homem, se
identifica com nossas fraquezas e em fraquezas se torna o homem substituto na cruz do
calvário, naquela fatídica sexta-feira, dia da morte de maldição para livrar os homens do
pecado que os aprisionava. Assim, Ele vem dar, a toda humanidade, a redenção,
trazendo-a de volta ao pleno relacionamento com o Criador.
15
Lucas enfatiza a humanidade de Jesus, mas, também, faz questão de lembrar da nossa
própria humanidade, da nossa necessidade de um Salvador, da pobreza de nossa
condição. Ele traz um olhar especial para os mais vulneráveis e marginalizados em
nossas sociedades, revelando como somos todos alvos do amor do homem Jesus.
Ele é, também, o que mais destaca a mulher em seus textos. Foi o único que registrou a
história de Isabel (Lucas 1:5-25), Maria (Lucas 1:26-56), Ana (Lucas 2:36-38), a viúva
de Naim (Lucas 7:11-17), Maria Madalena, Joana, Susana e as outras mulheres que
seguiam Jesus (Lucas 8:1-3). Escreveu, também, sobre Marta e Maria (Lucas 19: 38-
42), a mulher encurvada (Lucas 13:10-17), a mulher que procura a moeda perdida
(Lucas 15:8-10), a viúva insistente (Lucas 18:1-8) e as mulheres de Jerusalém que
choram atrás da cruz (Lucas 23:27-31).
É neste evangelho que encontramos mais ações dos anjos, do Espírito Santo e da prática
da oração, um testemunho recorrente do sobrenatural agindo em Jesus e através de Jesus
em sua humanidade. É destacado, no evangelho, nove momentos envolvendo oração,
dois deles, estão nos demais evangelhos. Lucas sempre associa a oração de Jesus aos
seus momentos mais importantes.
Há ainda duas parábolas que indicam a oração: a do Amigo Inoportuno (Lucas 11:5) e
do Juiz Iníquo (Lucas 18:1-8). Ambas encontradas em outro evangelho, e uma terceira
que só aparece no livro de Lucas, a do Fariseu e do publicano orando no templo.
16
Portanto, no Evangelho de Lucas, a oração na vida de Jesus aparece como prática
recorrente e consistente, mostrando-nos que o Filho do Homem só foi capaz de cumprir
seu designo porque tinha uma vida de intimidade com o Pai. A oração constante.
Claro que Lucas, em nenhum momento, refuta a divindade de Jesus, mas ele deixa claro
que, para se tornar salvador do mundo, Deus se fez totalmente homem. E, como
homem, operou a salvação da humanidade, porque se fazia necessário restaurar a cadeia
de autoridade que foi perdida em Adão.
Há uma doutrina antiga chamada Docetismo, que vem da palavra grega “Dokeo”, e que
significa “parecer-se”. Um dos seus precursores era Cerinto, do primeiro século, um
discípulo do famoso filosofo judeu neoplatônico, Filo, que dizia que a humanidade de
Jesus era ilusória. Essa filosofia diz que Deus não se fez homem, ele apenas “se
pareceu” com os homens, algo bem próprio dos deuses gregos. Contudo, apesar de
tomar a forma humana, Ele nunca se tornou, de fato, humano. Era como se Ele tivesse
vestido uma roupa de aparência humana. Este era um ensinamento gnóstico sobre Jesus
contestado pelos líderes da igreja primitiva.
Lucas demonstra que Jesus é o “Filho do Homem” que se tornou o Salvador dos
homens, e sempre movido pelo mesmo Espírito Santo, hoje, está disponível a todos os
homens. Mostra que para resgatar o que havia se perdido, era necessária uma total
identificação com a criatura, sua imagem e semelhança e foi o que Deus fez ao se tornar
como um de nós.
Portanto, a ideia de que Deus apenas se pareceu “homem” nada tem a ver com a
verdade da Palavra de Deus, a Bíblia. Temos que ter cuidado, pois muitos se escondem
atrás de uma falsa ideia de que Jesus fez o que fez porque era Deus e, assim, nós
humanos nunca seremos como Ele. A vida de integridade e pureza de Jesus estaria, nesta
visão, muito acima de nós “seres humanos”. Aqueles que constroem essa narrativa se
sentem desculpados em sua maneira leviana de viver.
“Filho do Homem” é a forma, ou título, que Jesus mais se apresentou diante das
pessoas. É uma expressão encontrada cerca de 88 vezes no Novo Testamento e, no
Antigo Testamente, há mais 100 registros. A expressão significa em primeiro lugar “ser
humano”, mas é, também, um título Messiânico, que está no livro de Daniel. Os judeus
estavam acostumados a ouvi-la e, por isto, sabiam o que o termo significava. Jesus se
identifica com este “ser humano” e com o seu papel de “Messias”, o Salvador da raça
17
humana aprisionada por causa do pecado do pai de todos os homens, Adão. Jesus é
aquele que veio e voltará em glória.
Ao mesmo tempo, lembra-nos que Deus nos deu o Espírito Santo que nos auxilia em
tudo, e os anjos, seres ministradores designados pelo Pai para nos assistir na jornada. E
que tudo isto pode ser discernido através de uma vida de oração.
Refletir sobre o Novo Testamento, assim como em qualquer teor da Bíblia, de forma
que ela, a Palavra, cumpra seu propósito, conta com o coração aberto de cada leitor. É
preciso enxergar quem Jesus é, segundo as Escrituras, e como experimentar da vida que
18
Ele tem reservada aos que n’Ele creem, não deixando que as experiências e tradições
impeçam de vivenciar tudo o que Deus, o Criador, tem para nós.
Sem dúvidas, precisamos de um encontro pessoal e íntimo com o autor da vida, para
sermos inspirados por Ele em todo o tempo.
Encerro este capítulo lembrando-nos que os Evangelhos nos dão uma visão ampla de
quem é Jesus, assim como toda a Escritura Sagrada. Mas é só a leitura dela com
meditação, oração e estudo intencional é que nos aproximará do nosso Senhor e Sua
missão para nós.
Invista em um bom dicionário bíblico, compre comentários bíblicos que te ajudarão a
ampliar ainda mais a sua compreensão do texto bíblico. Mantenha um caderno de
anotações sempre em mãos quando se sentar para desenvolver esta disciplina espiritual.
Ainda quero recomendar meu livro “Jesus, quem Ele é” publicado pela SalEditora. O
livro traz um conteúdo mais elaborado e prático sobre como Jesus é apresentado nos 4
Evangelhos e como nossa vida é impactada por Ele.
No mais, busque o Senhor de todo o seu coração, peça que ao ler as sagradas escrituras,
o Espírito Santo te revele a beleza do texto bíblico. Assim você poderá desfrutar de
conhecimento e intimidade com Jesus Cristo.
19