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AGROENERGIA

www.cnpae.embrapa.br

V I S TA
e m RE
Esta é uma publicação da Embrapa Agroenergia Ano II, nº 3, agosto de 2011

Sorgo sacarino:
Tecnologia Agronômica
e Industrial para
Alimentos e Energia
Sorgo sacarino:
Editorial tecnologia agronômica e
industrial para alimentos
e energia

Na natureza nada se cria e nada se perde, tudo se


transforma. Hodiernamente, o mundo redescobre e
discute as oportunidades e ameaças para a produção
e distribuição de alimentos dependente de energia,
incluindo as oportunidades da energia renovável da
biomassa. Isto implica em novas visões e aplicações
do conceito da lei de conservação da massa, a co-
nhecida Lei de Lavoisier.

O fator inovação é o mecanismo de competitivida-


de com sustentabilidade do setor agroenergético e
a inovação disruptiva é o elemento central para con-
siderar este setor como um negócio, tipicamente da
iniciativa público-privada. Isto implica em entender
e criar domínios tecnológico e negocial, com devida
apropriação intelectual de matérias-primas, proces-
sos e tecnologias, sob os aspectos técnico-científi-
cos e legais.

A produção brasileira de açúcar é feita, fundamen-


talmente, a partir da extração do caldo de cana-de-
-açúcar (Saccharum sp.). A produção agrícola de
matéria-prima e o processo industrial para produção
de açúcar, etanol, coprodutos e cogeração de ener-
gia tornam o empreendimento sucroenergético um
negócio competitivo, profissional.

O histórico do ciclo econômico da cana-de-açúcar no


Brasil colonial, e especialmente do programa cana-
-etanol nestes últimos 35 anos, os ganhos técnicos,
econômicos, sociais e ambientais do setor sucroal-
cooleiro, implicam em uma aprendizagem robusta
capaz de considerar que, para a energia de biomassa
no Brasil, a “vantagem competitiva é transitória”.

A planta de cana-de-açúcar, o canavial, o engenho e


a indústria, as biorrefinarias tem histórico secular e
evolutivo no Brasil. A implantação e a ampliação do
setor sucroenergético no país, sobretudo nas regi-
ões canavieiras tradicionais do Sudeste e Nordeste,
experimentaram significativos ganhos de produtivi-
dade agrícola e industrial.

Neste particular, a agenda de produção de alimentos


e energia, maximização do uso de recursos (terra,
água, agricultura de baixo carbono), eficiência de
processos agrícolas e industriais, renovação ou re-
forma de canaviais, espécies energéticas para rota-
ção, colocam o sorgo sacarino como uma espécie
com domínio tecnológico capaz de atender às ne- e suas aplicações para novos negócios. Entretanto,
cessidades agronômicas e biológicas da interação deverá desmistificar falácias antigas e errôneas so-
genótipo-ambiente em benefício do setor sucroe- bre o sorgo sacarino e mesmo reforçar os conceitos
nergético, e de produzir mais etanol e resíduos na de oportunidade e perspectivas futuras para a sua
entressafra da cana-de-açúcar. expansão em áreas selecionadas do Brasil.

Aliado às espécies oleaginosas com domínio tec- No foco de desenvolvimento de tecnologia agronô-
nológico, como amendoim, girassol, soja e adubos mica são tratados, basicamente, três aspectos: a) o
verdes (Crotalaria juncea L.), o sorgo sacarino tem melhoramento, genética e desenvolvimento de cul-
grande potencial para expansão de cultivo em zo- tivares (variedades e híbridos); b) boas práticas agrí-
nas tradicionais e novas do setor sucroalcooleiro. E, colas e temas especiais dos sistemas de produção;
a produção de etanol de sorgo sacarino deverá ser e, c) descritores de planta (com viés biológico) para
expandida em complementação ao etanol de cana- fins energéticos.
-de-açúcar. Estudos e estimativas demonstram que
se buscam opções para a reforma de 10-15% de Em desenvolvimento de tecnologia industrial focam-
área anual de cana-de-açúcar, que possam amorti- -se outros três temas: a) a caracterização da matéria-
zar cerca de 30-40% do custo de implantação de um -prima (viés industrial) para fins energéticos, nas ro-
novo canavial. A rotação de culturas na reforma me- tas de produção de etanol (1ª-geração tecnológica),
lhora em até 20% a produtividade do canavial. E, a e biomassa para fins diferenciados (etanol de ma-
seleção de espécies de expressão econômica deve terial lignocelulósico ou 2ª-geração, cogeração de
contribuir para atender aos interesses de produção energia, alimentação de animais ruminantes, biofer-
de alimentos e energia. tilizantes e coprodutos – novas moléculas, materiais,
etc.); b) os processos de conversão “per se”, tais
Além de atender a uma forte e crescente demanda como protocolos analíticos de referência e utilidades
do mercado por informações e negócios competiti- para rotas tecnológicas diferenciadas; e, c) arranjos
vos para o sorgo sacarino, equipes de pesquisado- (institucionais, técnico-científicos e produtivos) vi-
res e técnicos da Embrapa, em parceria organizada, sando a inserção do sorgo sacarino no complexo
tem sistematizado dados e discussões sobre o tema, do setor sucroenergético, abordando reforma de
em três vertentes, a saber: desenvolvimento de tec- canavial, plantio de entressafra da cana, cogeração,
nologia agronômica, tecnologia industrial e em estu- e scale up de maquinaria agronômica e industrial,
dos transversais (ciclo de vida, balanços de massa e dentre outros temas.
de energia, economia de água e de carbono, socio-
economia, etc.). Decididamente, neste cenário de competitividade
agroindustrial do setor sucroenergético, a lei de La-
A coleta e organização de dados e informações, a voisier é, por certo, mais adequada e robusta que
divulgação técnica, a transferência de tecnologia e os ditames de Caminha, em sua histórica carta ao
os negócios competitivos, demonstram o acervo de Rei de Portugal, anunciando o descobrimento da
conhecimento à disposição do mercado, bem como Terra de Vera Cruz (Brasil) e registrando “em nela
objetivam analisar e divulgar o esforço acumulado se plantando tudo dá”. E, a inserção do sorgo saca-
e corrente que a Embrapa realiza em seus laborató- rino neste setor sucroenergético, por certo, deverá
rios e campos experimentais. Apontam ainda, para acontecer pela observância disciplinada e integrada
novas parcerias internas e externas, e para os pro- da gestão da inovação.
cedimentos em busca de melhorias no domínio tec-
nológico nas áreas de interesse para a inserção do Empreendedorismo, PD&I (pesquisa, desenvolvi-
sorgo sacarino no rol de matérias-primas do setor mento e inovação), governança, negócio público-
sucroenergético do Brasil. Atualmente, novos mode- -privado e atividade agroindustrial estão entre as
los de transferência de tecnologia e de negócios tec- palavras-chave deste negócio temático. Ou, em sín-
nológicos estão em andamento, na parceria público- tese, reportando-se às falas de duas eminências da
-privada, para o cumprimento desta agenda. gestão pública e da ciência agropecuária – respec-
tivamente, ex-Ministro do MAPA Alysson Paulinelli,
Em AGROENERGIA em revista, edição 3, de Agosto e ex-Presidente da Embrapa Doutor Eliseu Roberto
de 2011, técnicos e gestores tratam a temática SOR- de Andrade Alves – que cunharam preciosidades em
GO SACARINO: Tecnologia agronômica e industrial momentos críticos - em termos de Agroenergia, ou
para a produção de alimentos e energia. Esta edição qualquer um de seus programas, o Brasil (ou o em-
objetiva condensar um considerável acervo de infor- presariado) precisa de “investimentos e juízo” .
mações técnicas e gerenciais sobre o sorgo sacarino

Frederico Ozanan Machado Durães


Chefe-Geral
Embrapa Agroenergia
EXPEDIENTE

Esta é a edição nº 3, de agosto


de 2011, da Agroenergia em
Revista, publicação trimestral
de responsabilidade da Área
de Comunicação da Embrapa
Agroenergia
Chefe-Geral
Frederico Ozanan Machado Durães
Chefe Adjunto de Pesquisa e
Desenvolvimento
Esdras Sundfeld
Chefe Adjunto de Comunicação e
Negócios:
Bruno Galveas Laviola
Chefe Adjunta de Administração
Maria do Carmo de Morais Matias
Jornalista Responsável
Daniela Garcia Collares
(MTb/114/01 RR)
Revisão
José Manuel Cabral de Sousa Dias
Diagramação
Maria Goreti Braga dos Santos
Alexandre Esteves Neves Sumário
Capa e arte-final
Maria Goreti Braga dos Santos
Fotos da capa
RGB Comunicação
Embrapa Milho e Sorgo

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2 Editorial
6 Sorgo sacarino na Embrapa: histórico, importância e usos
7 Sorgo sacarino: desenvolvimento de tecnologia agronômica
8 Melhoramento genético do sorgo sacarino
10 Genômica do sorgo sacarino e análise de marcadores genéticos moleculares para características de
interesse agronômico e industrial

12 Seleção genômica como estratégia do melhoramento de sorgo sacarino para altas performances

14 Produção de sementes de sorgo sacarino

16 Boas práticas agrícolas para o cultivo de sorgo sacarino

18 Fertilidade do solo, exigências nutricionais e adubação do sorgo sacarino

20 Zoneamento de áreas aptas para o plantio de sorgo sacarino na época de entressafra de cana-de-açúcar
no Brasil

22 Zoneamento agroecológico do sorgo sacarino para a produção de etanol em áreas de produção e


renovação de cana-de-açúcar

24 Informação geoespacial aplicada ao mapeamento e monitoramento da cultura da cana-de-açúcar:


Potencial para expansão do sorgo sacarino em áreas selecionadas

25 Sorgo sacarino: desenvolvimento de tecnologia industrial


26 Caracterização do sorgo para a produção de etanol
27 Produção de etanol de sorgo sacarino
29 Leveduras para produçao de etanol de sorgo sacarino
31 Sorgo sacarino para produção de etanol: uma visão do produtor e da usina de cana-de-açúcar
33 Informações tecnológicas sobre sorgo sacarino em documentos de patente
37 Potencial de cogeração de energia elétrica a partir de resíduos do processamento de sorgo sacarino
39 Concorrência ampliada dos produtos do sorgo sacarino na entressafra da cana-de-açucar no Brasil
43 Viabilidade econômica e arranjos produtivos para produção de etanol do sorgo sacarino
46 Elementos do plano de negócios do sorgo sacarino da Embrapa
47 Metas de rendimento e qualidade de sorgo sacarino
48 O Sorgo sacarino na mídia
50 Eventos
51 Sorgo sacarino na TV Globo
Sorgo sacarino na Embrapa:
histórico, importância e usos
Por: Antonio Álvaro Corsetti Purcino, Chefe-Geral da Embrapa Milho e Sorgo

S
orgo (Sorghum bicolor L. Moench) é nati- cesso da produção nacional de etanol a partir de
vo da África e algumas variedades atuais cana-de-açúcar. Com o Pró-Álcool, a Embrapa
são originárias do continente africano. Milho e Sorgo iniciou um programa de melho-
Iniciativas de introdução desta gramínea no ramento de cultivares de sorgo sacarino com o
Brasil foram realizadas em eras diferentes, mas objetivo de desenvolver cultivares destinadas à
contam os esforços de institutos de pesquisa e produção de álcool, principalmente por peque-
universidades, sobretudo a partir da década de nas destilarias. Devido à eliminação dos incen-
1950. A Embrapa iniciou um programa de me- tivos governamentais às pequenas destilarias
lhoramento de sorgo em meados da década de na década de 80, o programa de melhoramento
1970, acreditando no potencial desta cultura no do sorgo sacarino foi desacelerado na Embra-
país, e hoje a área plantada de sorgo no Brasil pa. Entretanto, mais recentemente, e de acor-
é de aproximadamente 1,5 milhões de hectares. do com o Plano Nacional de Agroenergia (PNA
2006-2011), a Embrapa tem priorizado o de-
O sorgo, nos diferentes tipos (granífero, forragei- senvolvimento de cultivares de sorgo sacarino
ro e sacarino), apresenta-se como uma espécie (produção de etanol de 1ª-geração e resíduos)
bem adaptada a ambientes extremos de estres- e de sorgo-energia (biomassa diferenciada para
ses abióticos, especialmente, de temperatura características lignocelulósicas para fins energé-
do ar e umidade do solo. Este comportamento ticos , com foco em etanol de 2ª-geração ou co-
de rusticidade às condições ambientais confere geração de energia).
ao sorgo condições favoráveis à sua adaptação
em relação a outras espécies comerciais. Apesar Este novo foco requer que o programa de me-
deste fato, o sorgo é responsivo às boas práti- lhoramento da Embrapa seja redimensionado,
cas agrícolas e de manejo da cultura, e, portan- de forma a permitir o desenvolvimento das ati-
to, passível de inovação tecnológica competitiva vidades de PD&I nesta área. Vários projetos na-
para a sua utilização e usos. cionais e internacionais já foram aprovados na
área de sorgo para bioenergia, e parcerias com
Com a implementação do Programa Pró-Álcool, várias instituições tem contribuído no avanço do
em meados da década de 1970, o Brasil tem se programa de melhoramento, manejo, e utiliza-
tornado um dos países pioneiros no uso de bio- ção de sorgo sacarino para fins agroindustriais
energia, e é uma referência mundial com o su- e energéticos.
Fotos: André May

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Sorgo sacarino: com ATR (açúcares totais recuperáveis) variando de
80 a 127 kg de açúcar extraídos por tonelada de mas-

desenvolvimento de
sa verde, utilizando-se a mesma tecnologia utilizada
nas usinas (homologada pelo Consecana). Ainda ve-
rificam-se que é possível ajustar a mesma estrutura
tecnologia agronômica para colheita e processamento da biomassa (moa-
gem, fermentação e destilação) utilizada para cana-
-de-açúcar.
Por: Frederico O. M. Durães, Chefe-Geral
Embrapa Agroenergia Adicionalmente, o sorgo sacarino produz grãos
(2,5 t.ha-1), que apresentam características nutricio-
nais similares às do milho, podendo ser utilizados

E
m um processo agrícola, o ordenamento ter- na alimentação humana ou animal.
ritorial, a genética e cultivares modificadas, as
boas práticas agrícolas e as associações bióticas Dados técnicos mostram possibilidades de produção
e abióticas visando ganhos de produtividade, bem de etanol de sorgo sacarino na entressafra da cana-
como os arranjos produtivos são passíveis de com- -de-açúcar. Plantios realizados no início do período
plexos empreendimentos técnicos e legais. chuvoso (out/Nov) tornam possível a antecipação de
2 a 3 meses do período de moagem das usinas, com
Em termos de matérias-primas produtoras de açúcar colheitas a partir de fevereiro e março, reduzindo
e processos de produção de etanol, a inovação está
assim, o período de ociosidade das destilarias, que
centrada em dois grandes desafios técnico-científicos
varia de 3 a 5 meses, com impactos positivos na ge-
e gerenciais. Um primeiro é o aumento da densidade
ração de receitas.
energética, que pode ser explorado na biodiversida-
de, na construção de associações biológicas dentro É fato corrente que setores da agroindústria cana-
de espécies, ou mesmo na utilização de processos vieira, incluindo fazendas de cana e indústria de
físicos, químicos ou biológicos. Neste enfoque são
maquinarias agronômica e industrial para proces-
exemplos diferenciados o desenvolvimento de novas
sos de conversão, tem procurado avaliar o sorgo
cultivares modificadas de cana-de-açúcar, por me-
sacarino com foco em novos negócios, visando
lhoramento genético convencional e biologia avança-
da, e a utilização de matérias-primas alternativas ou maior competitividade e sustentabilidade do setor
complementares, com domínio tecnológico, como é sucroenergético.
o caso do sorgo sacarino – Sorghum bicolor (L.) Mo-
O sorgo sacarino é uma espécie agrícola rústica, com
ench. Um segundo desafio trata da eficiência das tec-
boa adaptação a estresses ambientais, p.ex., tempe-
nologias de aproveitamento do conteúdo energético.
ratura e umidade); entretanto, ela é responsiva para a
Adicionalmente, os setores de pesquisa e produtivos aplicação de insumos modernos (p.ex., água, corre-
buscam alternativas para questões de maior uso e tivos e fertilizantes) em fases críticas do crescimento
eficiência dos recursos da natureza, incluindo os fa- e desenvolvimento da cultura. A disponibilidade de
tores clássicos de produção (terra, capital e trabalho) sementes de qualidade de cultivares (domínio da ge-
e os itens modernos de competitividade (inovação, nética de variedades e híbridos adaptados) é impres-
insumos modernos como agroquímicos fertilizantes cindível para ganhos de produtividade e rendimen-
e protetivos, biofertilizantes, economia de água, eco- to, e adequadas técnicas de plantio e de manejo da
nomia de carbono, oportunidade social de uso dos cultura (p.ex., profundidade de plantio) são limitantes
recursos, viabilidade econômico-financeira e empre-
para a melhor performance agronômica e produtiva.
sarial, etc.).
A formação de caldo e a produção de açúcares totais
O setor sucroenergético busca empreender novas e sacarose, bem como a tipificação dos resíduos, ca-
agendas e modelos produtivos, orientados por mar- recem de cuidados quanto à aplicação de processos
co regulatório firme, visando aumentar a competiti- técnicos e industriais que permitam a maximização
vidade e os ganhos de produtividade agroindustrial. de resultados econômicos. Estes procedimentos são
relevantes ao êxito do empreendimento e requer do
O sorgo sacarino apresenta colmos com caldo seme-
agricultor, canavieiro ou industrial uma adequada go-
lhante ao da cana, rico em açúcares fermentescíveis,
vernança (gestão, administração e parceria) para a
e pode servir para a produção de etanol na mesma
instalação utilizada pela cana-de-açúcar. Trata-se de sua atividade empresarial.
uma espécie de ciclo rápido (quatro meses), cultura
totalmente mecanizável (plantio por sementes, tratos No foco de desenvolvimento de tecnologia agronô-
culturais e colheita), alta produtividade de biomassa mica são tratados, basicamente, três aspectos: a) o
verde (60 a 80 t.ha-1), com altos rendimentos de eta- melhoramento, genética e desenvolvimento de cul-
nol (3.000 a 6.000 l.ha-1), com bagaço utilizável como tivares (variedades e híbridos); b) boas práticas agrí-
fonte de energia (vapor para industrialização e coge- colas e temas especiais dos sistemas de produção; e,
ração de eletricidade). Observam-se resultados de c) descritores de planta (com viés biológico) para fins
50 a 77 litros de etanol por tonelada de massa verde energéticos. 

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Melhoramento genético
do sorgo sacarino
Por: Rafael Augusto da Costa Parrella, pesquisador da Embrapa Milho e Sorgo

O sorgo sacarino [Sorghum bicolor (L.) Moen- No início dos anos 80, o Centro Nacional de Pes-
ch] é um tipo de sorgo com alto potencial for- quisa de Milho e Sorgo (CNPMS) selecionou seis
rageiro. Ele se assemelha à cana-de-açúcar, por variedades de sorgo sacarino – BR 500, BR 501,
apresentar colmos suculentos com altos teores BR 502, BR 503, BR504 e BR505 – derivadas das
de açúcares fermentescíveis. O sorgo sacarino variedades Rio, Brandes, Roma, Theis, Dale e
pode oferecer, dentre outras, as seguintes van- Wray, respectivamente, todas com produtivida-
tagens: rapidez no ciclo (quatro meses); cultura de de colmos superior a 40 t ha-1 e teor de sóli-
totalmente mecanizável, desde o plantio até a dos solúveis médios entre 18 e 20º Brix.
colheita; produção de grãos em torno de 2,5 t
ha –1, que podem ser utilizados para alimentação Posteriormente, em 1987, as primeiras varieda-
humana, animal ou para a produção de biocom- des brasileiras foram desenvolvidas com poten-
bustível; utilização do bagaço como fonte de cial para produção de etanol, sendo o BRS 506 e
energia para industrialização, cogeração de ele- BRS 507, e o híbrido BRS 601. Nessa época, pro-
tricidade ou forragem para animais, contribuin- jetos pilotos foram desenvolvidos em Sete La-
do para um balanço energético favorável. Além goas-MG, Brasília-DF, Jundiaí-SP e Pelotas-RS,
disso, esta cultura pode ser utilizada para forne- para processar sorgo sacarino em microdestila-
cimento de matéria-prima durante a entressafra rias, e a tecnologia proposta para a produção de
de cana-de-açúcar nas destilarias, que vai de etanol a partir de sorgo foi validada nestes pro-
dezembro a abril, e, assim, reforçar a produção jetos-piloto. Contudo, com o insatisfatório êxito
nacional de etanol e reduzir o período de ocio- do Pro-Álcool e da política nacional direcionada
sidade das destilarias. Ainda, a cultura do sorgo para grandes destilarias, o foco das pesquisas
se sobressai em regiões marginais com baixa com sorgo sacarino foi redirecionado para a
precipitação e solos ácidos, onde não se produz produção de cultivares forrageiras, provocando
cana, devido ao sorgo apresentar mecanismos um intervalo no desenvolvimento tecnológico
de tolerância à seca e ao alumínio tóxico, bem do sorgo sacarino. Como as cultivares lançadas
como eficiência na utilização de nutrientes. apresentavam boa produtividade e qualidade de
matéria verde, estes produtos se mantiveram
A Embrapa Milho e Sorgo (CNPMS) iniciou um no mercado, comercializados como forrageiras.
programa de desenvolvimento de cultivares de Atualmente apresentam-se como cultivares de
sorgo sacarino depois da implantação do Pró- dupla aptidão, sacarina e forrageira.
-Álcool, na década de 70, antecipando uma crise
energética. Neste período, houve forte incentivo A Embrapa Milho e Sorgo reiniciou seu programa
do Governo Federal para o desenvolvimento de de desenvolvimento de cultivares de sorgo saca-
micro e minidestilarias com capacidade de 100 rino a partir de 2008, devido ao potencial desta
a 1000 L hr –1, respectivamente, as quais utiliza- cultura na geração de energia renovável e devido
riam o sorgo sacarino como matéria-prima. Ini- à grande demanda por matéria-prima alternativa
cialmente foram introduzidos 50 genótipos de para a produção de etanol nas grandes destilarias.
sorgo sacarino do Departamento de Agricultura O programa de melhoramento da Embrapa Milho
dos Estados Unidos (USDA), África e Índia, os e Sorgo visa o desenvolvimento de variedades e/
quais foram caracterizados agronomicamente, ou híbridos de sorgo sacarino e estabeleceu as
além de ser estabelecido o seu período de utili- seguintes metas de produtividade e qualidade:
zação industrial (PUI). produtividade mínima de biomassa – de 60 t.ha-1

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extração mínima de açúcar total de 120 kg t-1 bio- ção de cultivares com maiores níveis de resis-
massa, considerando a eficiência de extração de tência. O acamamento é outra característica
90-95%; conteúdo mínimo de açúcar total no cal- importante a ser considerada, uma vez que
do de 14%; produção mínima de etanol de 60 l t-1
as cultivares de sorgo sacarino são de porte
biomassa; Período de Utilização Industrial (PUI)
alto (3 a 5 m de altura) e possuem panícula
mínimo de 30 dias com extração mínima de açú-
car total de 100 kg t-1 biomassa. com grãos no ápice da planta, fazendo com
que as cultivares sejam mais propensas ao
Além dessas características, é utilizado como acamamento. Contudo, o manejo adequado
critério de seleção a resistência às principais da cultura, com a utilização de população de
doenças (antracnose, helmintosporiose, fer- plantas ideal e adubação equilibrada, reduz os
rugem, cercosporiose e míldio) e pragas (la- problemas com acamamento. O programa de
garta-do-cartucho e broca-da-cana). Neste melhoramento de sorgo sacarino da Embrapa
contexto, atenção especial tem sido dada à está estruturado para lançar novas cultivares
broca-da-cana (Diatrea spp.), visando a sele- a partir da safra 2012/2013.
Foto: Robert Eugene Schaffert

▲Na foto o autor do artigo, ao lado de uma lavoura experimental de sorgo sacarino

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Genômica do sorgo Na literatura científica, ao se compararem vá-
rios dos genomas de plantas (álamo, Populus;
sacarino e análise de arroz, Oryza; Arabidopsis; e, sorgo, Sorghum),
juntamente com estudos de expressão gênica
marcadores genéticos em larga escala, uma série de genes candidatos
para o melhoramento de culturas dedicadas à
moleculares para bioenergia foram identificados. Dentre estes ge-
nes estão os envolvidos na síntese de celulose,
características de hemicelulose e lignina, além daqueles que in-
interesse agronômico e fluenciam características morfológicas de cresci-
mento como altura, número de ramos/perfilhos,
industrial espessura do caule, sensibilidade a fotoperíodo,
dentre outros. Em sorgo, além da busca por ho-
mologia de sequências para a identificação des-
tes genes no genoma, outras estratégias estão
Por: Cynthia Maria Borges Damasceno,
sendo utilizadas por grupos de melhoramento
pesquisadora da Embrapa Milho e Sorgo
em todo mundo, como mapeamento de QTLs,
mapeamento por associação e mutagênese em
escala genômica acoplada a triagens fenotípicas
Além das características agronômicas favorá- para características como composição geral da
veis do sorgo, tais como tolerância a estresses parede celular, digestibilidade e recalcitrância à
abióticos e o fato de ser uma espécie C4 com sacarificação.
capacidade para produção de alta biomassa, o
sorgo possui uma gama de recursos genéticos Acredita-se que a maximização da produção de
disponíveis que podem auxiliar as estratégias biomassa por unidade de área plantada será um
de melhoramento clássico e biotecnológicas dos principais focos dos programas de melhora-
para torná-lo uma cultura dedicada à produção mento voltados à produção de bioenergia, a fim
de bioenergia. De fato, o sorgo está se tornando de se minimizar o uso de área cultivável. Apesar
uma gramínea modelo para análises genômicas do aumento da biomassa per se constituir um
funcionais e estruturais, por ser uma espécie di- alvo prioritário dos programas de melhoramen-
plóide de genoma relativamente pequeno e de to, o aumento do conteúdo de açúcares e maior
alta endogamia, e ser geneticamente mais pró- produção de caldo também são importantes para
ximo da cana-de-açúcar e do milho, tendo diver- culturas como cana-de-açúcar e sorgo sacarino.
gido recentemente dessas espécies. Avanços Em sorgo, vários QTLs associados com o conte-
na área de genética em sorgo podem contribuir údo de açúcar no caldo foram identificados, indi-
muito para o melhoramento da cana-de-açúcar, cando que essa é uma característica controlada
uma espécie poliplóide de grande importância por vários genes e com interações complexas.
econômica cujo genoma ainda não possui sequ- Estratégias visando alterações nas proporções e
ência completa publicamente disponível, como estruturas dos vários polímeros que constituem
o sorgo. a parede celular do sorgo terá um papel crucial
para a obtenção de acessos para produção de
Pesquisadores contam hoje com uma grande etanol de segunda geração a partir do bagaço
coleção de germoplasma de sorgo, cujos aces- do sorgo sacarino ou diretamente do sorgo de
sos genéticos estão bem caracterizados, incluin- alta biomassa, uma vez que um dos principais
do mapas genéticos e físicos saturados, amplo problemas para a conversão de biomassa para
banco de dados de EST (“Expressed Sequence açúcares fermentáveis é a dissociação dos vá-
Tags”), e mais recentemente, a sequência genô- rios polímeros presentes na matéria lignoceluló-
mica do sorgo foi finalizada permitindo estudos sica. O conteúdo e composição da lignina será
genômicos comparativos entre outras espécies importante para as linhas de melhoramento vi-
vegetais. A coleção de germoplasma de sorgo sando conversão da biomassa ou co-geração de
da Embrapa inclui acessos oriundos de vários energia (bioeletricidade). Na primeira espera-se
países e coleções núcleo, painéis diversos e po- aumento de eficiência do processo com menor
pulações avançadas de linhagens recombinan- conteúdo de lignina ou composição diferenciada
tes (segregantes para características relaciona- da mesma, enquanto que no último, espera-se
das à produção de etanol de primeira e segunda maior produção de energia a partir de aumento
geração), além de variedades e linhagens elite calorífico da biomassa, o que pode ser atingido
de sorgo sacarino já desenvolvidas. por aumento do conteúdo de lignina.

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No caso específico do sorgo, que é uma cultura de conversão da biomassa em glicose, verifican-
amplamente utilizada como forragem para ali- do que as linhagens contendo os genes bmr-6
mentação animal, por vários anos os melhoris- e bmr-12 foram igualmente eficientes na redu-
tas têm buscado o aumento na digestibilidade ção do conteúdo de lignina. Quando comparada
de materiais de sorgo. As soluções para aumen- à linhagem não mutante, a liberação de glicose
tar digestibilidade sem afetar outras caracterís- pelos mutantes bmr-6, bmr-12 e pelo duplo mu-
ticas importantes dos cultivares são as de obter tante foi mais eficiente, mostrando um aumento
materiais-elite com níveis de celulose e lignina de glicose liberada de 27%, 23% e 34%, res-
modificados. Materiais contendo mais celulose pectivamente. Os resultados demonstram que
e/ou menos lignina, ou com a composição de houve um efeito aditivo na redução de lignina
lignina modificada, têm maior digestibilidade com o duplo mutante bmr-6/bmr-12. Assim, os
animal. Assim, estes mesmos materias teriam autores concluíram que a redução do conteúdo
grande potencial para apresentar maior eficiên- de lignina pode apresentar um impacto positivo
cia de conversão em bioreatores, podendo ser na eficiência de conversão da biomassa de sor-
utilizados nos programas de melhoramento de go bmr em açúcares simples. Por outro lado, é
sorgo para produção de bioenergia. De fato, um importante ressaltar que a redução no teor de
mutante em sorgo que apresenta até menos lignina pode reduzir o rendimento de biomassa
50% no conteúdo de lignina, chamado de “ner- e causar acamamento. Entretanto, estes efeitos
vura marrom” (bmr ou brown midrib), é ampla- parecem ser dependentes do background gené-
mente comercializado para uso como forragem, tico em que os mutantes bmr se encontram.
conferindo maior palatabilidade ao material e di-
gestibilidade animal. Da mesma forma, avanços Novos avanços em métodos de genotipagem
no melhoramento de variedades de sorgo saca- em larga escala contribuirão para a identificação
rino para bioenergia tem o potencial de produzir mais rápida de genes e marcadores de interesse
novos materiais interessantes para o uso como para os programas de melhoramento de espé-
alimentação animal. cies que apresentam uso potencial para bioener-
gia. A Embrapa desenvolve e aplica marcadores
Estudos publicados em 2009 compararam linha- moleculares como ferramentas auxiliares ao
gens isogênicas de sorgo forrageiro com e sem programa de melhoramento genético de sorgo,
os genes bmr quanto à eficiência do processo para alimentos, forragem e energia.

Foto: Cláudia Teixeira Guimarães

Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011 11


Seleção genômica como estratégia do
melhoramento de sorgo sacarino para
altas performances
Por: Cynthia Maria Borges Damasceno e Rafael Augusto da Costa Parrella, pesquisadores da
Embrapa Milho e Sorgo

A
seleção de culturas dedicadas à bioener- rios países, permitirá o uso de técnicas de mape-
gia contendo características composicio- amento por associação, que apresentam resolu-
nais de parede celular que sejam favorá- ção superior a outros métodos de mapeamento.
veis ao processo de conversão de biomassa é O ressequenciamento genômico dessas popula-
importante para tornar a produção de biocom- ções e painel constituirá um grupo de dados de
bustíveis de segunda geração economicamente grande aplicabilidade para o descobrimento de
viável. A implementação de seleção assistida alelos superiores e desenvolvimento de marca-
por marcadores nos programas de melhoramen- dores moleculares relacionados a um sorgo de
to em culturas dedicadas à bioenergia deverá melhor qualidade para produção e conversão
acelerar o desenvolvimento de novas cultivares em etanol. Entretanto, para o aproveitamento
com alta biomassa e composição adequada aos dos dados de variabilidade genética oriundos
processos de produção de biocombustíveis. do ressequenciamento genômico, o desenvolvi-
mento e aplicação de técnicas que permitam a
Na área de genômica se encontra o maior po- fenotipagem em larga escala, como análise de
tencial de descoberta de marcadores molecula- composição de parede celular e teor de açúca-
res para características relacionadas ao uso do res no caldo,  se faz necessária. Colaborações
sorgo para produção de bioenergia, alimentação
em andamento com universidades brasileiras e
animal de melhor qualidade e na indústria quími-
americanas permitirão a caracterização da pare-
ca. Novos métodos de sequenciamento em lar-
de celular de sorgo nos mesmos painéis a serem
ga escala, mais econômicos e rápidos, poderão
ressequenciados, abrindo novas perspectivas
identificar marcadores mais próximos aos genes
para o melhoramento genético de sorgo.
de interesse sem que haja necessidade de uti-
lização de técnicas de mapeamento laboriosas.
Como exemplo, o re-sequenciamento dos geno- O objetivo do programa de melhoramento de
mas de todos os indivíduos de duas populações sorgo da Embrapa é usar estratégias para se-
de linhagens recombinante de sorgo (RILs, F10) e lecionar e produzir genótipos de sorgo que
de um painel diverso, está em andamento, por demonstrem características favoráveis para a
meio de uma colaboração da Embrapa Milho e produção de biocombustíveis.  Na Embrapa,
Sorgo com o Instituto de Diversidade Gênomica abordagens clássica e molecular estão sen-
(IGD), pertencente à Cornell University, EUA. do utilizadas no programa de melhoramento
de sorgo para bioenergia, incluindo menor e
Uma das populações segrega para colmo seco maior teor de lignina (Figura). Uso de técnicas
ou com caldo e teor de açúcares no caldo, en- genômicas, como as desenvolvidas em par-
quanto que a segunda população segrega para ceria com a Cornell University para re-sequen-
tolerância à toxicidade por alumínio, além de ca- ciamento de populações de mapeamento, e
racterísticas relacionadas à biomassa, tais como análise de expressão gênica para característi-
presença de caldo, altura e composição de pare- cas envolvidas com a qualidade da biomassa
de celular. ou concentração de açúcares  tem o potencial
de orientar em qual direção o programa de me-
O ressequenciamento do painel diverso, cujos lhoramento deve focar para obter predição de
materiais originam-se de coleções núcleo de vá- ganhos de seleção dessa característica.

12 Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011


Estudos em andamento estão caracteri- sintética da lignina, e usamos PCR em tempo
zando um painel geneticamente diverso real para estudar seus níveis de expressão.
de sorgo com mais de 100 acessos quan- Dois destes genes, C3H e HCT, parecem es-
to aos níveis de lignina no colmo e tar corregulados, uma vez que apresentaram
de expressão dos genes envolvido na sínte- expressão altamente correlacionada entre
se desse composto. Análises do conteúdo genótipos. Futuramente, genes envolvidos
de lignina e outros componentes da parede na síntese de lignina que demonstrarem ex-
celular, bem como características morfoa- pressão diferencial entre acessos contras-
gronômicas relacionadas à biomassa, mos- tantes para o conteúdo de lignina, serão
traram que o painel é bastante diverso feno- validados por análise de associação e sele-
tipicamente e o conteúdo de lignina variou cionados para uso do programa de melhora-
entre 2 e 12% da matéria seca total, sendo a mento de sorgo para bioenergia, coordenado
média 5,8%. A fim de melhor entender a sín- pela Embrapa. Abordagem semelhante será
tese de lignina em sorgo, nós identificamos utilizada para o estudo da concentração de
homólogos de genes-chave da via de bios- açúcares no caldo. 

Workflow das estratégias moleculares utilizadas no programa de


melhoramento de sorgo para bioenergia da Embrapa para identificação de
alelos superiores relacionados a uma biomassa de melhor qualidade

Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011 13


Produção de sementes
de sorgo sacarino
Por: Nádia Nardely Lacerda Durães Parrella, pesquisadora EPAMIG/CRCO e
Rafael Augusto da Costa Parrella, pesquisador Embrapa Milho e Sorgo

►Introdução de duas linhagens. Na produção comercial de semen-


tes de sorgo sacarino, a macho-esterilidade genético
Com a perspectiva de crescimento da cultura do sorgo citoplasmática é uma característica que viabilizou a
sacarino como matéria prima alternativa na produção produção de sementes híbridas em escala comercial,
de etanol, aumentará significantemente a demanda por pois o sorgo é uma espécie autógama com flores per-
sementes de alta qualidade. O sorgo sacarino se as- feitas. E ainda, a macho-esterilidade evita que ocorram
semelha à cana-de-açúcar, uma vez que o armazena- autofecundações nas linhas onde estão sendo produzi-
mento do açúcar ocorre no colmo, além de fornecer ba- das as sementes (linhas fêmeas). Além disso, a garan-
gaço para a indústria. Entretanto, ele difere de maneira tia da pureza genética das linhagens parentais e dos
acentuada da cana-de-açúcar pelo fato de ser cultivado próprios híbridos é um pré-requisito fundamental para
a partir de sementes e apresentar um ciclo vegetativo a expressão de todo o potencial deste tipo de cultivar
bem mais curto, de 120 a 130 dias. Nesse cenário, há a e da comercialização das sementes estabelecidas pelo
necessidade de uso técnicas adequadas de produção, Ministério da Agricultura, Pecuária e abastecimento.
colheita e secagem das sementes para garantir a sus-
tentabilidade do sistema. Sementes híbridas - O sorgo é uma planta monóica
que apresenta flores perfeitas, sendo basicamente uma
► A cultura espécie autógama. Neste caso, a exploração comercial
de híbridos foi possível a partir de 1954, com a des-
O sorgo sacarino é uma planta de dia curto, de clima coberta do sistema de macho-esterilidade genético-
temperado e tropical. A formação da panícula se -citoplasmática. A esterilidade genético-citoplasmática
dá aproximadamente 30 dias após a semeadura e o em sorgo resulta da combinação de citoplasma Milo e
florescimento da panícula se dá de cima para baixo e, genes Kafir. Os híbridos de sorgo sacarino são produzi-
em 4 a 9 dias após o início do florescimento, já se tem dos pelo cruzamento entre uma linhagem macho estéril
meia floração; nessa fase 50% do peso seco da planta e uma linhagem fértil polinizadora. A linhagem macho
já foi atingida. Após 70 dias, o grão é considerado estéril, denominada “A”, é produzida pelo cruzamento
leitoso e já atingiu metade do peso seco. O ponto de plantas macho estéril com pólen de uma linhagem
de maturidade fisiológica ocorre quando há máximo denominada mantenedora “B”. As sementes produzi-
acúmulo de massa seca, sendo que em sementes de das pelo cruzamento entre as linhagens A e B resulta-
sorgo sacarino, maiores índices de germinação e vigor rão em planta A (macho estéreis) devido ao citoplasma
são obtidos quando as sementes estão com a umidade estéril herdado da linhagem A, ou seja, a linhagem B
em torno de 30%, correspondendo ao intervalo de não restaura a fertilidade na linhagem A. As linhagens
35 a 44 dias após a floração. Porém, são muitas as A e B são isogênicas, mas diferentes na fertilidade do
variações encontradas na literatura, provavelmente
pólen devido a presença de citoplasma normal.
devido aos diferentes locais, épocas de semeadura e,
principalmente, ao tipo de material utilizado. A partir da
maturidade fisiológica, o acúmulo de massa seca cessa As sementes de híbridas são produzidas pelo cruza-
e o de massa fresca diminui. As plantas são mantidas mento entre uma linhagem A e uma linhagem restau-
no campo até as sementes atingirem um teor de água radora de fertilidade denominada “R”. Semente pro-
em torno de 18%, valor ideal para uma colheita que duzidas desse cruzamento produzirão plantas macho
provoque menos danos. No momento da colheita, além férteis, ou seja, a linhagem R restaura sobre a linhagem
do estádio de maturação, o conteúdo de água nas A devido a presença de genes restauradores de fertili-
sementes é importante para a sensibilidade delas à dade no núcleo. A linhagem R não é fenotipicamente
temperatura de secagem, garantindo a sua qualidade similar a linhagem A, e a combinação delas deverá re-
sultar em um híbrido de alto potencial de rendimento. A
ao longo do armazenamento.
multiplicação da linhagem A e a produção de sementes
do híbrido, em larga escala, devem ser realizados em
►Produção de sementes campos isolados, proporção básica de três fileiras da
linhagem A para uma fileira da linhagem R, procurando
Na metodologia básica para a produção de sementes
proporcionar a coincidência no florescimento das duas
de sorgo sacarino existem dois processos, sendo o pri-
linhagens. A multiplicação da linhagem R deve ser fei-
meiro a obtenção da linhagem pura (variedades) e o
ta em campo isolado, utilizando os mesmos procedi-
segundo a obtenção de híbridos a partir do cruzamento
mentos com linhas puras. Portanto, para produção de

14 Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011


sementes híbridas de sorgo sacarino, necessita-se de o menor possível, para não prejudicar a polinização e
duas gerações, sendo uma para multiplicação das se- a formação de sementes. Também são realizados “ro-
mentes das linhagens A e R, separadamente, e outra guing”, também chamada de purificação, que é a técni-
para produzir a semente híbrida de A com R. ca usada para a eliminação manual de plantas conta-
minantes (atípicas e outras que não estão no padrão)
Semente varietal - Variedade em sorgo é constituída em campos de produção de sementes. Sua finalidade
por uma linhagem R ou B, as quais são macho fértil. é a de assegurar que o campo produza sementes de
Neste caso, para a produção de sementes varietal ne- desejável pureza genética, varietal e física. Na realiza-
cessita-se apenas de uma geração em campo isolado. ção dessa operação, são arrancadas e destruídas to-
Variedades de sorgo sacarino são de porte alto, 2 a das as plantas fora do tipo da cultivar em multiplicação,
4m de altura, e as sementes são produzidas no ápice ou plantas pertencentes a outras cultivares e espécies,
das plantas, nas panículas, o que dificulta o processo além de plantas atacadas por doenças transmissíveis
de colheita mecanizada. Este problema pode ser ame- pela semente.
nizado com plantios para produção de sementes nas
épocas do ano com comprimento dia menor que 12h ►Considerações Finais
e 20min, condição que tende a influenciar variedades
de sorgo sacarino a florescer mais cedo e assim, reduz Os maiores cuidados que devem ser seguidos em
seu porte possibilitando uma colheita mecanizada. campos de produção de sementes de sorgo são re-
ferentes às questões de isolamento, um eficiente ro-
guing e semeadura correta das linhagens A, B e R.
Outros fatores fundamentais devem ser observados na
Além disso, cuidados especiais durante toda a pro-
produção de sementes de sorgo sacarino. Esses cui-
dução devem ser seguidos para conseguir o máximo
dados devem começar desde a escolha da área para
de qualidade das sementes.
o plantio, no beneficiamento, armazena-
mento e disponibilização das sementes
no comércio, passando pela semeadura,
manejo de “split”, tratos culturais, manejo
de plantas invasoras, colheita, etc.

A escolha da área de semeadura, evi-


tando-se sempre áreas contaminadas
por pragas e patógenos que ataquem o
sorgo sacarino. No caso da produção de
sementes, a principal doença que causa
grandes prejuízos é o “Ergot” ou mela do
sorgo, causada pelo patógeno Claviceps
africana. O sinal externo mais evidente
da doença é a exsudação pelas flores
infectadas, de um "melaço" ralo, viscoso
e açucarado. Ocorre nas épocas mais
frias do ano, e prejudica principalmente a
produção de sementes híbridas, pois as
linhagens fêmeas não possuem pólen,
tornando-se mais susceptíveis ao fundo.
Pulverizações preventivas com fungici-
das e evitar semeadura em épocas em
que o florescimento ocorra durante o
inverno são medidas para minimizar os
efeitos dessa injúria.

Na escolha da área, cuidados com iso-


lamentos entre campos também devem
ser observados para se evitar contami-
Fotos: Cynthia Maria Borges Damasceno

nação varietal. As distâncias em metros


entre os campos de produção se dão em
função da área em hectares e do número
mínimo de linhas de bordadura do poli-
nizador.

Outro ponto importante é quanto a ne-


cessidade de sincronismo entre o flores-
cimento das linhagens fêmeas e macho,
ou seja, SPLIT. Esse intervalo deve ser

Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011 15


Boas práticas agrícolas para o
cultivo de sorgo sacarino
Por: André May, pesquisador da Embrapa Milho e Sorgo

I
nicialmente, o sorgo sacarino tem sido reco- seja feito em breve período de tempo, já que o
mendado para cultivo em áreas de reforma de escalonamento de semeio deve estar intrinsica-
canaviais, visando fornecer matéria-prima para mente relacionado à demanda de matéria-prima
a produção de etanol na entressafra de cana-de- entre os meses de março e abril, associado ao
-açúcar no Brasil. O semeio é recomendado, período de utilização industrial (PUI) das cultiva-
para a maioria das áreas produtoras de cana (re- res de sorgo sacarino, que, geralmente, gira em
giões Centro-Oeste e Sudeste), entre os meses torno de 30 dias.
de novembro e dezembro e a colheita é progra-
mada para março e abril, justamente quando a A profundidade de semeadura deve ser motivo
cana ainda não apresenta elevados valores de de atenção redobrada, principalmente em so-
Brix, inviabilizando seu corte. los argilosos, não devendo ultrapassar cerca de
2 cm. Normalmente, utiliza-se para semear um
Sendo assim, para que se consiga adequado hectare cerca de 8 kg de sementes.
desenvolvimento da lavoura, almejando altas
produtividades de biomassa e, consequente- Como as áreas de implantação de sorgo sacari-
mente, elevada produção de caldo por hectare no advêm de anos de cultivo de cana, o produ-
cultivado, a lavoura de sorgo sacarino demanda tor rural deverá estar atento a vários problemas
os mesmos preceitos recomendados para qual- inerentes a essas áreas, como compactação de
quer cultura, como adequado preparo de solo, solo, reconstrução de terraços, baixa fertilidade
boa fertilização de base e cobertura, controle de do solo, etc., que devem ser equacionados antes
plantas daninhas e pragas. do semeio do sorgo, pois após a sua colheita,
nova área de cana deverá ser implantada.
Em decorrência das áreas potencialmente dis-
poníveis para o cultivo da espécie (áreas de so- Novas pesquisas estão em andamento visando
queira de cana), o primeiro passo a ser seguido esclarecer adequadamente as exigências nutri-
é, sem dúvida alguma, uma boa amostragem cionais do sorgo sacarino, contudo, sabe-se que
de solo (nas profundidades de 0-20 e 20-40 cm, é uma espécie exigente, quando se pretendem
conforme o caso), visando avaliar adequada- elevadas produtividades de biomassa, depen-
mente qual a dose a ser aplicada de calcário e dendo, inclusive, da cultivar utilizada.
dos nutrientes, e se há a necessidade de corre-
ção do solo em subsuperfície.

Contudo, o momento do preparo de solo e se-


meio da lavoura de sorgo sacarino é crucial para
o sucesso do empreendimento. Nas regiões ci-
tadas, o grande volume de chuvas ocorre justa-
mente no período ideal de semeio da espécie,
sendo assim, a instalação da lavoura pode sofrer
atrasos consideráveis, em virtude da impossibi-
lidade da entrada de máquinas semeadoras na
área, principalmente em solos mais argilosos,
como os encontrados na região Centro-Leste de
São Paulo. Dessa forma, deve-se programar o
Foto: Rafael Parrella

preparo de solo antes do período chuvoso.

Além disso, o investimento em um bom parque


de máquinas é importante para que o semeio

16 Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011


Em áreas comerciais de cultivo de sorgo saca- necessária uma capina mecanizada com o auxí-
rino, é comum a aplicação de apenas uma adu- lio de um cultivador, nas entrelinhas de sorgo.
bação de cobertura, visando reduzir o custo da Já com relação à broca-da-cana, o manejo pro-
operação agrícola. vavelmente se dará de forma muito próxima ao
comumente utilizado em cana, através de técni-
A população de plantas deve girar entre 100.000 cas de controle biológico.
e 120.000 plantas por hectare, contudo, o es-
paçamento entre linhas pode variar, conforme Normalmente, as doenças comuns em sorgo sa-
o equipamento de colheita que será utilizado. carino (Antracnose, Helmintosporiose e Cercos-
As pesquisas têm demonstrado maiores pro- poriose) aparecem apenas em final do ciclo das
dutividades de caldo por área em menores es- plantas, não prejudicando a produção de bio-
paçamentos. Contudo, dependendo da região massa. Contudo, em lavouras mal conduzidas,
produtora, existe o risco de acamamento, princi- o aparecimento das doenças supracitadas ocor-
palmente nos meses de janeiro e março, devido re precocemente, afetando proporcionalmente
às tempestades com grandes ventanias, comuns a produtividade, conforne o grau de infestação
nessa época. Lavouras muito adensadas e com das plantas.
crescimento vegetativo muito vigoroso são mais
suscetíveis ao problema. Atualmente, em grandes áreas de cultivo, o sor-
go sacarino tem sido colhido com colhedoras de
Dois graves entraves à produção de sorgo sa- cana, que possibilitam alto rendimento e efici-
carino necessitam atenção especial: plantas da- ência de corte, em toletes (apenas colmos), si-
ninhas e a broca-da-cana (Diatraea saccharalis). milares à cana. No Rio Grande do Sul, onde se
Atualmente, não existem herbicidas recomen- cultiva o sorgo sacarino para a produção de eta-
dados para controle de plantas daninhas em nol em minidestilarias, é comum a colheita da
sorgo, principalmente monocotiledôneas, em biomassa produzida (planta toda) com ensiladei-
pós-emergência. Recomendam-se apenas her- ra de milho, contudo, existe a possibilidade de
bicidas à base de atrazine, ideal para controle fermentação da massa colhida de forma muito
de dicotiledôneas e algumas monocotiledôneas, mais rápida do que no primeiro modelo de co-
em pré-emergência. Em áreas de produção, pra- lheita citado.
tica-se a aplicação, logo após semeio, com solo
úmido. Contudo, decorridos cerca de 30 dias, Sendo assim, apesar de ser uma cultura bastante
normalmente, tem-se o aparecimento de mono- antiga no Brasil, o sorgo sacarino ainda deman-
cotiledôneas, principalmente capim-carrapicho, da muitas pesquisas e investimentos, principal-
capim-marmelada e capim-colchão, comumente mente no que tange ao sistema de produção da
encontradas em canaviais. Sendo assim, depen- cultura, visando responder todas as demandas
dendo do grau de infestação da área, pode ser do setor produtivo.
Foto: Rafael Parrella

Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011 17


Fertilidade do solo,
exigências nutricionais e
adubação do sorgo sacarino
Por: Antônio Marcos Coelho, pesquisador da Embrapa Milho e Sorgo

O
estabelecimento de condições ótimas sagem. Essa estratégia torna o ambiente edáfico
para a produção de sorgo (sacarino, for- favorável ao maior aprofundamento do sistema
rageiro ou granífero) envolve o reconhe- radicular, amenizando os efeitos detrimentais
cimento e manejo de diversos fatores. As intera- dos períodos de déficit hídrico sobre a produti-
ções entre as características de solo, do clima, do vidade.
sistema de rotação/sucessão de culturas, época
de plantio, cultivar, adubação e tratos fitossani- Desse modo, a fertilidade dos solos, a nutrição
tários são determinantes do potencial produtivo. e adubação são componentes essenciais para a
construção de um sistema de produção eficien-
Os esforços para aprimoramento dos sistemas te. A disponibilidade de nutrientes deve estar
de produção de sorgo sacarino devem conside- sincronizada com o requerimento da cultura, em
rar que a contribuição de cada um dos fatores quantidade, forma e tempo.
mencionados varia amplamente de uma região
para outra e no tempo. As recomendações ide- Um programa racional de adubação envolve as
ais de manejo são sítio-específicas e, preferen- seguintes considerações:
cialmente, deveriam ser baseadas em informa-
ções oriundas de estudos locais. • Diagnose da fertilidade do solo;

• Requerimento nutricional do sorgo de acor-


Apesar das vantagens de suas características de
do com a finalidade de exploração (grãos,
tolerância a estresses hídricos, um mito que deve
forragem);
se quebrado é que o sorgo se adapta aos solos
degradados e de baixa fertilidade. Entretanto, o • Os padrões de absorção e acumulação dos
sorgo responde intensamente a incrementos no nutrientes, principalmente N e K; F
suprimento de água e à adubação, alcançando
• Fontes dos nutrientes;
ou superando, em alguns casos, as produções
de massa seca e de grãos normalmente obtidas • Manejo da adubação.
com a cultura do milho.
O requerimento nutricional varia diretamente
O que se tem verificado é o desenvolvimento do com o potencial de produção. Por exemplo, os
sorgo ser bastante prejudicado quando a umida- dados obtidos para sorgo forrageiro, apresenta-
de no solo fica abaixo de 70-75% da água dispo- dos na Tabela, dão uma idéia da extração de nu-
nível na profundidade efetiva do sistema radicu- trientes pelo sorgo. Observa-se que a extração
lar. Assim, quando não é possível usar irrigação, de nitrogênio, fósforo, potássio, cálcio e mag-
deve-se buscar o condicionamento do perfil do nésio aumenta linearmente com o aumento na
solo em subsuperfície, principalmente com re- produtividade, e que a maior exigência do sorgo
lação ao fornecimento de cálcio e redução da refere-se ao nitrogênio e potássio, seguindo-se
toxidez por alumínio por meio da calagem e ges- cálcio, magnésio e fósforo.

18 Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011


Devido ao fato de culturas com maiores rendi- cados para os grãos, seguindo-se o magnésio,
mentos extraírem e exportarem maiores quan- o potássio e o cálcio. Isso implica que a incor-
tidades de nutrientes e, portanto, necessitarem poração dos restos culturais do sorgo devolve
de doses diferentes de fertilizantes, nas reco-
ao solo parte dos nutrientes, principalmente po-
mendações oficiais de adubação para a cultura
tássio, cálcio e magnésio, contidos na palhada.
do sorgo no Brasil, as doses dos nutrientes são
segmentadas conforme a produtividade espera- Entretanto, mesmo com a manutenção da palha-
da. Isso se aplica mais apropriadamente, a nu- da na área de produção e, em decorrência das
trientes como nitrogênio e o potássio, extraídos grandes quantidades que são exportadas pelos
em grandes quantidades, mas também é valido grãos, faz-se necessária a reposição desses nu-
para o fósforo e, de certo modo para o enxofre. trientes em cultivos seguintes. O sorgo destina-
O conceito é menos importante para o cálcio e o do a produção de forragem e o sorgo sacarino
magnésio, cujos teores nos solos, com a acidez
têm recomendações especiais porque todo ma-
adequadamente corrigida, devem ser suficien-
tes para a cultura de sorgo de alta produtividade. terial é cortado e removido do campo antes que
a cultura complete seu ciclo. Com isso, a remo-
No que se refere à exportação dos nutrientes, o ção de nutrientes é muito maior do que aquela
fósforo e o nitrogênio são quase todo translo- para a produção de grãos. 

Extração média de nutrientes pela cultura do sorgo forrageiro


em diferentes níveis de produtividades

(1)
Nutrientes extraídos
Matéria Seca Total Grãos
N P K Ca Mg

Kg/ha % Kg/ha

7.820 37 93 13 99 22 8

9.950 18 137 21 113 27 28

12.540 16 214 26 140 34 26

16.580 18 198 43 227 50 47

(1)
Foto: Cynthia Maria Borges Damasceno

Para converter P em P2O5, K em K2O, Ca em CaO e Mg em MgO, multiplicar por 2,29, 1,20, 1,39 e 1,66,
respectivamente.
Fonte: Embrapa Milho e Sorgo.

Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011 19


Zoneamento de áreas aptas
para o plantio de sorgo sacarino
na época de entressafra de
cana-de-açúcar no Brasil
Por: Elena Charlotte Landau e Robert Eugene Schaffert, pesquisadores da Embrapa Milho e Sorgo

S
orgo sacarino representa uma alternativa elaborado a partir da integração espacial entre o
promissora para a produção de etanol no mapa resultante do zoneamento agroecológico
Brasil, na época de entressafra da cana-de- da cana-de-açúcar (Manzatto et al., 2009) e os
-açúcar. Plantado entre os meses de setembro e mapas resultantes da representação geográfica
dezembro (dependendo da região produtora), o dos municípios aptos para o plantio de milho de
sorgo sacarino pode fornecer matéria-prima de ciclo normal em solo argiloso, entre os meses de
qualidade entre os meses de janeiro a abril, épo- outubro e dezembro (MAPA, 2011).
ca em que as usinas de beneficiamento da cana
ficam ociosas e a produção de etanol diminui O zoneamento agroecológico da cana-de-açúcar
consideravelmente no país. Sendo o processa- resultou da identificação de áreas com aptidões:
mento dos colmos o mesmo já utilizado para a climática (análise do risco climático) e pedológi-
cana-de-açúcar, sorgo sacarino representa uma ca para a cultura de cana-de-açúcar, em que a
alternativa importante para plantio em áreas de destinação da terra para uso agrícola não apre-
reforma de canaviais, sem a necessidade de ocu- sentava restrições ambientais. O zoneamento
pação de novas áreas (Sorgo sacarino, 2011). de risco climático de plantio de milho de ciclo
normal baseia-se na análise de risco climático
A identificação de áreas aptas para a produção (aptidão climática) para o plantio de milho. Es-
de etanol em época de entressafra da cana-de- tas análises foram baseadas em estudos pro-
-açúcar torna-se extremamente importante, for- babilísticos de ocorrência de fatores adversos
necendo subsídios para a futura definição de para o desenvolvimento de cada cultura consi-
estratégias de gestão territorial e formulação de derada, baseados em séries históricas de dados
políticas públicas que possibilitem a produção climáticos registrados em estações meteoroló-
de etanol em épocas de renovação dos plantios gicas do país. Na análise, fatores adversos re-
de cana-de-açúcar, tornando ativas usinas de presentam riscos de ocorrência de geadas, de
beneficiamento que estariam paradas no perío- veranicos ou de ocorrência de quantidade insu-
do. Objetivando identificar áreas potencialmente ficiente de água no solo para suprir a demanda
aptas para a produção de etanol nos meses em hídrica da cultura considerada em cada fase do
que a produção de etanol normalmente diminui, seu desenvolvimento. A identificação de áreas
foi elaborado um mapa indicando locais poten- com aptidão pedológica ou edáfica baseou-se
cialmente aptos para o plantio de sorgo sacarino na estimativa do potencial de produção agrícola
em época de entressafra da cana-de-açúcar. de cada classe de solo para a cultura de cana-
-de-açúcar sob um determinado tipo de manejo
Estima-se que a exigência hídrica do sorgo saca- da cultura, considerando características físicas e
rino para a obtenção de produção de etanol com fisiográficas da classe de solo. Para tanto, foram
brix do caldo entre 15 e 20% seja semelhante à avaliados seis fatores de limitação: deficiência
do milho de ciclo normal. Considerando o plan- de fertilidade, deficiência de água, excesso de
tio de sorgo sacarino em locais indicados para água ou deficiência de oxigênio, suscetibilida-
a produção de cana-de-açúcar, o zoneamento de a erosão, impedimentos à mecanização e
de áreas aptas para o plantio de sorgo sacarino impedimentos ao desenvolvimento do sistema
em época de entressafra de cana-de-açúcar foi radicular. Áreas com declividade superior a 12%

20 Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011


foram excluídas. Considerando o grau máximo rando informações atualmente existentes sobre
de limitação de uso das terras, as áreas aptas a cultura. A partir deste, observa-se que as áreas
foram representadas considerando três classes com maior aptidão concentram-se no Estado de
de aptidão: alta, média ou baixa. Áreas incluí- São Paulo, Noroeste do Estado do Paraná, Les-
das na classe de aptidão alta representam locais te do Estado do Mato Grosso do Sul e Sudoes-
com aptidão preferencial. Na classe com aptidão te do Estado de Goiás. A maior parte das áreas
média foram incluídas as áreas com aptidão re-
com aptidão intermediária concentram-se nos
gular e, na classe aptidão baixa, aquelas com ap-
Estados de Minas Gerais e Goiás. Informações
tidão marginal. Áreas inaptas ou com restrições
adicionais como a localização das usinas sucro-
ambientais não foram incluídas no zoneamento
agroecológico da cana-de-açúcar. alcooleiras em operação ou projetadas, bem
como considerando a infraestrutura para viabi-
O mapa apresentando o zoneamento de áreas lizar o escoamento da produção deverão ser re-
potencialmente aptas para o plantio de sorgo sa- alizadas, subsidiando a definição de áreas mais
carino na época de entressafra de cana-de-açú- indicadas para a adoção de sorgo-sacarino para
car no Brasil é apresentado na Figura. O mesmo produção de etanol na época de entressafra da
representa uma primeira aproximação, conside- cana-de-açúcar.

Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011 21


Zoneamento cana-de-açúcar. Com uso de novas variedades
de cana-de-açúcar, a produtividade por hectare
agroecológico do sorgo atingiu, em média aproximadamente 80 tonela-
das, dependendo do regime climático anual. No
sacarino para a produção lançamento do Proalcool a produtividade era
de cerca de 47 toneladas por hectare. Avanços
de etanol em áreas de tecnológicos nas usinas permitiram que hoje, a
produção e renovação de produção seja de cerca de 80 litros de etanol de
cada tonelada de cana, quando em 1975 eram
cana-de-açúcar produzidos aproximadamente 45 litros por tone-
lada. Esse expressivo ganho de produtividade
nas etapas agrícola e industrial resultou em uma
Por: Celso Vainer Manzatto, Chefe-Geral da produção de mais de 7,5 mil litros etanol por
Embrapa Meio Ambiente hectare de cana colhida, contra 3 mil em 1975.

Com o lançamento dos carros flex fuel em 2003

O
consumo crescente de combustíveis fós- e, com o apoio de programas do Governo Fede-
seis frente às reservas existentes e as pre- ral, o setor experimentou uma forte expansão a
visões alarmantes de mudanças climáti- partir de 2006. Entretanto, mesmo com os ga-
cas devido ao aquecimento global, causado em nhos de produção e produtividade expressivos,
sua maioria, pela emissão de dióxido de carbono a produção brasileira de cana ainda não acompa-
a partir da queima desse combustível, sinalizam nha o ritmo de crescimento da demanda por eta-
para os governos a necessidade de alteração da nol e açúcar, interna e externamente. Para aten-
matriz energética mundial. der o consumo, o setor necessita crescer cerca
de 7% ao ano e pode piorar nos próximos anos
Neste quadro, o Brasil tem se destacado pelo de acordo com especialista no assunto. Com o
grande potencial para agricultura de energia ou agravante de uma sequência de safras frustra-
agroenergia para a produção de biocombustí- das pelo clima, baixos investimentos e produti-
veis. O país acumulou importante experiência vidades pressionadas pelo envelhecimento dos
na produção de álcool como combustível e a canaviais, os estoques brasileiros praticamente
agricultura tem se mostrado como uma das al- baixaram muito, enquanto as vendas de veícu-
ternativas viáveis para oferta energética susten-
los flex cresceram. Por exemplo, entre janeiro a
tável. Atualmente o país é um dos mais tradicio-
março de 2011, as vendas de veículos subiram
nais produtores de cana-de-açúcar do mundo,
cerca de 8%, com a venda de cerca de 900 mil
estando em posição privilegiada em relação aos
veículos no primeiro trimestre, segundo a Anfa-
demais países produtores, por deter avançado
vea, contra cerca de 836 mil no mesmo período
conhecimento do processo produtivo da cultura
e ao mesmo tempo, do ponto de vista tecnoló- de 2010.
gico, no uso do etanol como alternativa energé-
Preocupado com expansão desordenada do
tica.
setor, em 2009, o Governo Federal estabeleceu
A cana-de-açúcar foi introduzida no Brasil por novas regras de expansão da agroindústria ca-
Martin Afonso de Souza em 1532 com a finalida- navieira através do Zoneamento Agroecológi-
de de produzir açúcar para o mercado Europeu. co Nacional da Cana-de-açúcar (ZAE Cana), um
Cerca de 400 anos depois, em 1925, realizou- trabalho pioneiro que orientou a formulação de
-se uma experiência com um veículo movido políticas públicas para o setor sucroenergético.
a álcool no Brasil, revelando a potencialidade O ZAE Cana inovou ao adotar critérios econô-
deste combustível. Essa experiência subsidiou, micos, ambientais e sociais que contribuam
em 1975, o lançamento do Programa Proalco- para um modelo sustentável de expansão dessa
ol, como alternativa energética para a a crise agroindústria no Brasil.
de abastecimento de petróleo da época. Neste
momento, o país começou a trilhar o caminho O estudo não se limitou a definir as regiões onde
da liderança tecnológica no setor de biocombus- a produção é economicamente viável, como faz
tíveis, sendo que o Brasil detém atualmente as o zoneamento agrícola de outras culturas que
melhores técnicas para o plantio e colheita da considera apenas as condições de clima e solo.

22 Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011


Nenhuma outra cultura agrícola brasileira conta ► Objetivos Específicos
hoje com um estudo desse porte. Assim esta-
Indicar e espacializar áreas aptas à expansão do
mos propondo o Zoneamento Agroecológico do
cultivo de variedades do sorgo sacarino em regi-
Sorgo Sacarino, para aumento da produção de
me de sequeiro (sem irrigação plena);
etanol no Brasil, nas áreas indicadas pelo ZAE
Cana, como alternativa na renovação de cana- Disponibilizar uma base de dados espaciais para
viais e também como produção auxiliar no for-
o planejamento do cultivo sustentável das terras
necimento de matéria-prima que aperfeiçoe a
com sorgo sacarino em harmonia com a biodi-
operação das usinas no período de entressafra.
versidade e a legislação vigente;
Desta forma, o Zoneamento do Sorgo Sacari-
Indicar cultivares de sorgo sacarino mais ade-
no, seguirá as mesmas orientações adotadas
no ZAE Cana, ou seja: quados as características regionais da região do
empreendimento.
►Objetivo Geral
►Diretrizes Gerais do Estudo
O objetivo geral do Zoneamento Agroecológico
do Sorgo Sacarino para a produção de etanol é o O estudo observará as seguintes diretrizes que
de fornecer subsídios técnicos para o plantio de permitirão o cultivo e a produção em rotação
sorgo sacarino como alternativa para o aumento com a cana-de-açúcar, visando o aumento da
da produção de etanol e o ganho de produtivida- produção de etanol pelas unidades industriais:
de nas agroindústrias dedicadas à produção de
• Indicação de áreas com potencial agrícola
etanol de cana-de-açúcar.
para o cultivo de sorgo sacarino sem restri-
►Objetivos Estratégicos ções ambientais;
• Indicação de áreas com potencial agrícola
Avaliar, indicar e espacializar o potencial das ter-
(solo e clima) para o cultivo do sorgo sacari-
ras para a produção da cultura do sorgo sacari-
no em regime de sequeiro (sem irrigação plena) no em terras com declividade inferior a 12%,
para a produção de etanol nas áreas indicadas propiciando produção ambientalmente ade-
para produção e expansão da cana-de-açúcar quada com colheita mecânica;
indicadas pelo ZAE Cana, como base para o • Avaliação dos impactos do cultivo de sor-
planejamento do uso sustentável das terras, em go sacarino em relação a outros cultivos
harmonia com a biodiversidade. alimentares.

Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011 23


Informação geoespacial aplicada ao mapeamento e
monitoramento da cultura da cana-de-açúcar: potencial
para expansão do sorgo sacarino em áreas selecionadas

Por: Édson Luis Bolfe, Chefe Adjunto de P&D da Embrapa Monitoramento por Satélite

A
tualmente as geotecnologias desempe- ▼Fotografia aérea oblíqua de 16/12/2010 da
nham um relevante papel no planejamen- região de Cosmópolis, SP.
to físico-rural de propriedades agropecu-
árias. A utilização de sistemas de informações
geográficas (SIG), sistemas de posicionamento
global por satélite (GPS), imagens de satélite e
fotografia aéreas possibilitam caracterizar dife-
rentes componentes vegetais de culturas agríco-
las isoladas ou consorciadas. Isto é possível por
meio da obtenção de dados de sensores remotos
com diversas resoluções espectrais, temporais

Foto: Flávia Fiorini


e espaciais. As análises realizadas em cobertu-
ras do solo (agrícolas, florestais e pastagens) e
a detecção de suas mudanças temporais objeti-
vam monitorar a cobertura vegetal e avaliar as
condições de produção. A detecção qualitativa é
estudada desde a década de 60 e, mais recen-
temente, a estimativa quantitativa da vegetação
verde têm sido uma das principais aplicações do
sensoriamento remoto na tomada de decisões
econômicas e de gerenciamento agrícola. ▼Fusão imagem TM, bandas 5/4/3 com imagem
Pancromática CBERS-2b HRC de 28/08/2008
O desenvolvimento de relações funcionais entre da região de Araras, SP.
as características biofísicas da cultura da cana-
-de-açúcar e dados variáveis espectrais coleta-
dos remotamente tem sido alvo de instituições
de pesquisa e empresas com atuação no meio
rural. Inúmeras informações podem ser extraí-
das das imagens e assim estimar parâmetros da
cultura da cana, como: dimensões e distribuição
espacial das áreas plantadas, estrutura e fenolo-
Montagem: Embrapa Monitoramento por Satélite.

gia da vegetação, índice de área foliar, atividade


fotossintética, biomassa, produtividade, regime
de irrigação, déficit hídrico, propriedades físicas
e químicas do solo na superfície.

Os dados obtidos pelas imagens associados a


informações edafoclimáticas do talhões, permite
subsidiar a tomada de decisão em termos de re-
novação de plantios e a implantação de outras
culturas, como o caso do sorgo sacarino, na en-
tressafra. Neste contexto, a informação geoespa-
cial possibilita o levantamento, monitoramento
e planejamento de áreas destinadas à cultura da
cana, tendo aplicabilidade atual e promissora no
campo agronômico e econômico.

24 Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011


Sorgo sacarino:
desenvolvimento de tecnologia industrial
Por: Frederico Ozanan Machado Durães, Chefe-Geral da Embrapa Agroenergia

E
m um processo industrial que usa matéria- lidade tecnológica do sorgo sacarino (enfoque
-prima sacarídea para a produção de açúcar tecnológico para processos e aproveitamento
e etanol, a moagem dessa matéria-prima, a industriais).
filtração, a fervura/centrifugação do caldo/mela-
do, a adição de químicos, a fermentação e a des- Em desenvolvimento de tecnologia industrial
tilação resultam na transformação nos produtos focam-se outros três temas:
principais.
• A caracterização da matéria-prima (viés in-
Em termos de matérias-primas produtoras de dustrial) para fins energéticos, nas rotas de
açúcar e de etanol, a inovação está centrada em produção de etanol (1ª-geração tecnológica),
dois grandes desafios técnico-científicos e ge- e biomassa para fins diferenciados (etanol de
renciais. Um primeiro é o aumento da densida- material lignocelulósico ou 2ª-geração, co-
de energética e a utilização de matérias-primas geração de energia, alimentação de animais
alternativas ou complementares, com domínio ruminantes, biofertilizantes e coprodutos –
tecnológico, como é o caso do sorgo sacarino novas moléculas, materiais, etc.);
– Sorghum bicolor (L.) Moench. Um segundo • Os processos de conversão “per se”, tais
desafio trata da eficiência das tecnologias de como protocolos analíticos de referência e
aproveitamento do conteúdo energético. Neste utilidades para rotas tecnológicas diferencia-
campo, transitam as questões sobre o aumen- das; e,
to da eficiência no processo industrial conven-
• Arranjos (institucionais, técnico-científicos e
cional (pré-tratamento, fermentação, destila-
produtivos) visando a inserção do sorgo sa-
ção, biodigestão da vinhaça, entre outros); bem carino no complexo do setor sucroenergéti-
como, questões sobre o domínio de novos pro- co, abordando reforma de canavial, plantio
cessos em rotas tecnológicas de conversão de de entressafra da cana, cogeração, e aprovei-
biomassa em energia (hidrólise ácida e enzimá- tamento ou adaptação de maquinaria agro-
tica, termoquímica, gaseificação, dentre outros). nômica e industrial, dentre outros temas.

Inovação é o argumento que norteia estas no- Em termos competitivos e sustentáveis, o ge-
vas buscas e novos negócios. E, atualmente, renciamento dos arranjos institucionais, técnico-
a Embrapa está focada nestas parcerias para -científicos e produtivos é definidor da estratégia
negócios competitivos, embasada na demons- e oportunidade para a produção e utilização do
tração de resultados da experiência agronômi- etanol e cogeração de energia. E, a administra-
ca e progressos na genética, boas práticas de ção do conhecimento e da disponibilidade das
manejo da cultura e inserção profissional para matérias-primas, processos e arranjos constitui-
as oportunidades de processos de conversão -se no elemento operacional fundamental para
industrial. Adicional e complementarmente, justificar as vantagens comparativas de unida-
são relevantes as informações sistematizadas des industriais, empresas, regiões, ou países no
sobre a caracterização de matéria-prima e qua- negócio sucroalcooleiro.
Foto: RGB Comunicação

Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011 25


Caracterização do sorgo para a
produção de etanol
Por: Angélica Gomes2, Dasciana Rodrigues1 e Patrícia Oliveira1, 1pesquisadoras da Embrapa
Agroenergia e 2analista da Embrapa Agroenergia

C
om as preocupações crescentes de poluição lizar economicamente a destilação deste produto.
ambiental, segurança energética e futuros su- Quanto às demais frações do sorgo, para que haja
primentos de petróleo, a comunidade global aproveitamento máximo destas em processos rá-
está buscando combustíveis alternativos para au- pidos, com pouca ou nenhuma geração de resídu-
mentar a eficiência do uso de energia. Ao contrário os e elevados rendimentos, é desejável que o teor
dos combustíveis fósseis, o etanol é uma fonte de de lignina seja mínimo.
energia renovável produzida através da fermenta-
ção de açúcares. Atualmente, o país enfrenta um Vários estudos mostram que os principais açúca-
momento em que é necessário aumentar a pro- res livres no caldo de sorgo sacarino são: glico-
dução de etanol para atender a demanda interna se, sacarose e frutose. O sorgo sacarino possui
e externa. Além disso, o elevado preço do etanol maior teor de açúcares redutores em comparação
durante a entressafra da cana-de-açúcar também é com caldo de cana, entretanto estudos apontam
um fator relevante apresentado no cenário brasilei- que não há diferença significativa entre a quanti-
ro. Diante deste quadro, diversas culturas energéti- dade total de açúcares solúveis. Desta forma, os
cas estão sendo buscadas para produção de álcool métodos analíticos e os parâmetros utilizados para
carburante. Dentre elas, vem se destacando o sor- o estabelecimento de indicadores de controle de
go sacarino, uma fonte potencial para baixo custo qualidade, podem ser os mesmos utilizados para
de produção de biocombustíveis. a cana-de-açúcar, entre eles: sólidos solúveis (Brix
em %), sacarose (Pol do caldo em %), fibra indus-
A utilização de sorgo sacarino para a produção de trial na cana (%), pureza do caldo (%), porcenta-
etanol tem sido profundamente investigada e o gem bruta de açúcar (PCC), pH.
desenvolvimento de novas variedades e híbridos
vem sendo realizado com o objetivo de aumentar a Seguindo a mesma linha, pode-se estender as
produção de etanol por hectare. O aproveitamento mesmas metodologias empregadas para avaliar
de toda a matéria-prima (caldo, bagaço e folhas) é a cana-de-açúcar para o etanol de sorgo sacarino
um dos fatores mais importantes para viabilizar a de segunda geração. Os métodos analíticos para
produção de etanol. A composição de cada uma avaliação de biomassa lignocelulósica devem pos-
destas frações definirá as etapas do processo a ser sibilitar a quantificação dos açúcares estruturais
utilizado para a conversão da biomassa em etanol. provenientes da celulose e hemicelulose. Desta
forma, as metodologias utilizadas para a análise do
Como a matéria-prima representa o início da ca- bagaço do sorgo sacarino podem ser as mesmas
deia fabril, esta deve ser submetida a um contro- que as desenvolvidas para bagaço de cana-de-açú-
le de qualidade para garantir uma produção com car e milho, como aquelas propostas pelo National
maior rendimento e, portanto, com maior eficiên- Renewable Energy Laboratory (NREL) nos Estados
cia. Para que haja uma uniformidade e controle na Unidos. O NREL desenvolveu uma série de proto-
produção de etanol a partir do sorgo sacarino, a colos com métodos validados para análise de dife-
caracterização do caldo extraído torna-se de gran- rentes tipos de biomassa lignocelulósica os quais
de importância. O bagaço produzido após a moa- estão sendo utilizados pela Embrapa Agroenergia.
gem e extração do caldo também deve ser caracte-
rizado de acordo com a sua finalidade: cogeração Para a produção de etanol a partir do caldo de sor-
de energia ou produção de etanol de segunda ge- go sacarino, as principais análises de controle de
ração. qualidade são aquelas já utilizadas rotineiramente
das usinas. Entretanto, com a viabilização da pro-
O teor de água nos diferentes tipos de sorgo é dução do etanol de celulose, haverá a necessidade
uma característica que deve ser destacada, pois in- de desenvolvimento de métodos analíticos rápidos
fluencia diretamente nos valores de concentração e de menor custo, tanto para a caracterização de
de açúcares fermentescíveis presente no caldo, o biomassa quanto para o monitoramento de parâ-
qual deve ser máximo para que a concentração fi- metros de qualidade dos processos de pré-trata-
nal de etanol seja suficientemente alta para viabi- mento e hidrólise.

26 Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011


Produção de etanol de
sorgo sacarino
Por: Cristina Maria Monteiro Machado, pesquisadora da Embrapa Agroenergia

A
via fermentativa é o método utilizado na são bastante onerosos. Ex.: palha, madeira, ba-
obtenção de etanol no Brasil e na maior gaço de cana-de-açúcar, bagaço de sorgo saca-
parte dos países do mundo. Por esse rino, resíduos agrícolas e de fábricas de papel.
processo, qualquer produto que contenha uma
quantidade considerável de carboidratos consti- O sorgo sacarino se assemelha à cana-de-açú-
tui-se em matéria-prima potencial para obtenção car, uma vez que armazena de açúcares simples
de etanol. De acordo com os tipos de carboidra- em colmos, gerando após a extração um baga-
tos presentes, as matérias-primas podem ser ço que pode ser usado na geração de energia
classificadas em: térmica ou elétrica ou na produção de etanol
de celulose, quando esse processo for viabiliza-
►Materiais açucarados do. Deste modo, o processamento industrial do
sorgo sacarino para produção de etanol seria o
Contêm açúcares simples, ou seja, carboidratos mesmo já amplamente utilizado nas usinas do
com seis (monossacarídeos) ou doze átomos de país, possivelmente com pequenos ajustes de
carbono (dissacarídeos), como glicose, fruto- processo.
se e sacarose. Estes açúcares são diretamente
fermentados, produzindo etanol, levando, dessa Como em qualquer processo agroindustrial, a
forma, a um processo mais barato. Ex.: cana-de- composição da matéria-prima afeta o rendimen-
-açúcar, beterraba açucareira, melaços e sorgo to da produção de etanol. Nesse caso, o fator
sacarino. mais importante é a quantidade e composição
de açúcares no caldo. No sorgo sacarino, em ex-
►Materiais amiláceos perimentos feitos pela Embrapa Milho e Sorgo,
Contêm carboidratos mais complexos, como o foram encontrados materiais com teor de açúca-
amido, que podem ser quebrados em glicose res solúveis entre 15 e 21%, concentrações mui-
pela hidrólise ácida ou ação de enzimas num pro- to próximas à cana-de-açúcar. Porém uma di-
cesso denominado malteação ou sacarificação. ferença importante está na composição desses
Uma vez que para a produção de etanol a partir açúcares no caldo. Enquanto na cana, estes são
dos materiais amiláceos é necessária esta etapa majoritariamente sacarose, no sorgo sacarino há
adicional no processo, seu uso sempre terá um uma concentração relativamente alta de açúca-
custo da fase industrial mais alto, se comparado res redutores – glicose e frutose. Essa diferença
aos materiais açucarados. Ex.: grãos amiláceos afeta o processo de duas formas: (i) na produção
(milho, trigo, arroz) raízes e tubérculos (batata, de açúcar, o sorgo sacarino teria um rendimen-
batata-doce, mandioca). to menor do que a cana, ou seja, essa matéria-
-prima deverá ser usada especialmente para a
produção de etanol; (ii) na produção de etanol,
►Materiais celulósicos
possivelmente haverá maior risco de contamina-
São constituídos de celulose, e estão disponí- ção, uma vez que as bactérias contaminantes do
veis em grande quantidade, muitos deles sendo, meio normalmente fermentam prioritariamente
inclusive, resíduos agro-industriais. No entanto, a glicose. Portanto, na produção de sorgo saca-
seu uso na produção de etanol não é, por en- rino possivelmente serão necessários cuidados
quanto, economicamente viável, uma vez que adicionais com a contaminação do meio.
para obterem-se açúcares fermentáveis e, por-
tanto, etanol, a biomassa deve passar por um Outra diferença entre o sorgo sacarino e a cana-
processo complexo de pré-tratamento físico quí- -de-açúcar está na composição do bagaço obti-
mico e posterior hidrólise enzimática, que ainda do a partir da extração do caldo. Nos materiais

Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011 27


analisados pela Embrapa Milho e Sorgo, tem-se encontrado
teores de lignina abaixo de 12%, enquanto no bagaço de cana-
-de-açúcar, os valores médios estão entre 20 e 22%. Essa dife-
rença é importante, quando se considera o uso do bagaço para
produção de etanol em processo de 2ª geração. A parede ce-
lular das plantas é uma mistura complexa e dinâmica de com-
ponentes, principalmente de polissacarídeos (celulose e hemi-
celulose), seguidos em quantidade pela lignina, que possui a
função estrutural e dá resistência à planta a umidade e ataques
biológicos. Embora muito importantes para as plantas, estas
propriedades da lignina dificultam a conversão enzimática em
cadeias menores de açúcares, que podem ser fermentados a
etanol. Assim, nesses processos, se o material possui um teor
menor de lignina como o sorgo sacarino, ele provavelmente
será mais susceptível à hidrólise, e, conseqüentemente gerará
mais açúcares para a produção de etanol.

Trabalhando nesse sentido, a Embrapa Agroenergia está com-


parando o potencial de diversas alternativas de biomassa para
produção de etanol de celulose em um processo-modelo, de-
senvolvido pela própria Unidade. Nesse trabalho, diferentes
variedades de capim elefante, braquiária, panicum, eucalipto,
sorgo, bagaço de cana-de-açúcar e bagaço de sorgo sacarino
estão sendo avaliados quanto ao potencial de produção de eta-
nol. Nesses testes, a hidrólise enzimática do bagaço de sorgo
sacarino demonstrou o melhor desempenho se comparado aos
materiais analisados até o momento (ver Figura), revelando-se
uma boa alternativa também quando se considera a produção
de etanol de celulose.

Hidrólise enzimática de bagaços pré-tratados


Foto: André May

28 Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011


Leveduras para O sorgo sacarino tem se mostrado como uma
excelente alternativa para a produção de etanol.
Dentre as várias qualidades dessa matéria-prima
produçao de etanol destaca-se seu curto ciclo de vida em períodos
da entre safra da cana-de-açúcar, e principal-

de sorgo sacarino mente a facilidade de extração de açúcares para


a fermentação, tal como ocorre com a cana de
açúcar. Isto é, os açúcares presentes no sorgo
sacarino podem ser facilmente liberados pela
Por: João Ricardo Moreira de Almeida e Léia prensagem e com isso serem fermentados.
Cecilia de Lima Fávaro, pesquisadores da Além disso, o bagaço de sorgo sacarino tam-
Embrapa Agroenergia bém poderá vir a ser utilizado para produção de
etanol lignocelulósico. Com isso, espera-se que
microrganismos semelhantes possam ser utili-

O
Brasil produziu 28.202 milhões de m3 de zados nos processos fermentativos a partir de
etanol em 2010 (ANP - Anuário Estatístico cana-de-açúcar e sorgo sacarino.
2011) com base na conversão da sacaro-
se da cana de açúcar, o chamado etanol de pri- As leveduras são os microrganismos responsá-
meira geração. No processo a cana de açúcar é veis pela conversão de açúcares a etanol nos
esmagada e o caldo extraído, rico em sacarose, processos fermentativos de produção tanto de
é convertido a etanol pela fermentação alcoóli- cana-de-açúcar como de sorgo sacarino. Leve-
ca. Os talos de cana esmagada, chamado baga- duras do gênero Saccharomyces são utilizadas
ço, são queimados para fornecer eletricidade e na indústria brasileira de etanol e podem ser
vapor para a refinaria de etanol, simultaneamen- consideradas as principais responsáveis pela
te evitando a eliminação de resíduos. Apesar da produção desse combustível no Brasil. As li-
grande produção, a demanda brasileira e mun- nhagens utilizadas na indústria foram selecio-
dial por combustíveis renováveis tem aumenta- nadas ao longo de vários anos e são altamente
do consideravelmente nos últimos anos tanto eficientes na fermentação de sacarose, glicose
por razões econômicas, isto é, preço de com- e frutose presentes nos caldos e extremamente
bustíveis fósseis, como por razões sócio-am- adaptadas à fermentação do caldo de cana de
bientais. Para suprir essa demanda de etanol, açúcar. Fermentações do caldo de sorgo saca-
grandes esforços têm sido feitos para o desen- rino por algumas linhagens de Saccharomyces
volvimento de processos de produção de etanol têm sido realizadas e os resultados demonstram
a partir de biomassas alternativas, incluindo bio- mais uma vez a eficiência dessas linhagens na
massa lignocelulósica, a qual engloba resíduos conversão de açúcares a etanol. A utilização das
agroindustriais, lixo urbano, resíduos florestais, mesmas linhagens para fermentação de caldos
etc. Entretanto, tecnologias para produção de de cana e de sorgo sacarino facilitará a utilização
etanol lignocelulósico ou etanol de segunda ge- deste último em usinas de etanol no país, pois
ração ainda estão sendo desenvolvidas. não existirá a necessidade de desenvolvimento

Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011 29


de novas linhagens para o processo e, ao mes- hidrolisados de bagaço de sorgo sacarino, aná-
mo tempo, reduzirá os riscos de contaminação. lises mais detalhadas deverão ser realizadas,
já que diferentes hidrolisados impõem diferen-
Para a produção de etanol de segunda geração, tes concentrações de açúcares e inibidores do
vários açúcares liberados a partir da hidrólise metabolismo microbiano, o que afeta profunda-
da celulose e hemicelulose precisam ser fer- mente o potencial fermentativo da levedura. De
mentados. Como linhagens de Saccharomyces qualquer forma, resultados recentes de Kurian
não são capazes de converter todos os açúca- e colaboradores (2010) demonstram que Pichia
res provenientes da hemicelulose, incluindo a stipitis e Debaryomyces hansenii são capazes
abundante xilose, outras espécies de leveduras de fermentar hidrolisados hemicelulósicos de
têm sido analisadas para a produção de etanol. bagaço de sorgo sacarino.
Leveduras de gêneros sabidamente conhecidos
como capazes de consumir xilose, tais como Pi-
Atualmente leveduras Saccharomyces são
chia, Candida, Pachysolen, já foram avaliadas
utilizadas na produção de etanol de primeira
quanto à capacidade de crescimento e produção
geração com cana de açúcar. Essas mesmas
de etanol a partir de xilose.
linhagens deverão ser utilizadas na produção
de etanol de sorgo sacarino, mantendo o alto
Na Embrapa Agroenergia, mais de 500 novas
linhagens de leveduras de diferentes espécies rendimento do processo. Para produção de eta-
têm sido avaliadas quanto à capacidade de cres- nol de segunda geração linhagens diferentes
cimento e fermentação de xilose, glicose e hi- para hidrolisados de bagaço de cana e de sor-
drolisados lignocelulósicos de bagaço de cana. go sacarino podem vir a ser necessárias. Pois
Novas linhagens com potencial fermentativo a composição desses hidrolisados pode variar
têm sido identificadas e poderão vir a ser utili- tanto quanto pela quantidade e tipo de açúca-
zadas em processos fermentativos. Apesar do res quanto pela presença de compostos inibi-
potencial das linhagens desenvolvidas para fer- dores. A identificação e o desenvolvimento de
mentação de hidrolisados de bagaço de cana novas linhagens de leveduras para o processo
também serem utilizadas na fermentação de estão em andamento. 

Método para seleção em larga escala de linhagens capazes de crescer em


hidrolisados lignocelulósicos

Foto: João R. M. Almeida

►Linhagem 7 crescendo
Foto: Carolina Poletto

em placa de Petri com YPD

30 Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011


Sorgo sacarino para agosto. Essa moagem junto com a cana, apesar
de não trazer impedimentos da parte industrial,
produção de etanol: uma sugere a necessidade de ser feita com estrutura
de colheita diferente da cana, com colhedoras de
visão do produtor e da grãos, tipo plataforma. Dessa forma, seria outro
sistema de exploração a ser mais bem avaliado.
usina de cana-de-açúcar
Para esse último caso de “safrinha”, parece-nos,
contudo, ainda não haver material genético
Por: René de Assis Sordi, assessor de apropriado que dê alta produtividade no perío-
tecnologia do Grupo São Martinho do sugerido. O desenvolvimento de novas va-
riedades/híbridos pode colaborar em muito para
ampliar as possibilidades do uso do sorgo sa-

A
procura de alternativas para produção
de biomassa e energias renováveis é um ▲ Desenvolvimento do sorgo sacarino em
caminho sem volta nos tempos atuais. A espaçamento duplo na Usina Boa Vista
utilização do sorgo sacarino para a produção de (GO), janeiro de 2011.
etanol é conhecida já há algum tempo no país.
Há quatro décadas, no início do PROALCOOL,
essa alternativa foi pesquisada e estava volta- carino, principalmente ao conseguir-se também
da principalmente às microdestilarias. Recente- aumentar o período útil de industrialização (PUI).
mente, essa possibilidade foi reativada devido à
crescente demanda de etanol e bioeletricidade. Suas características de altos teores de açúca-
res redutores (AR%) e, consequentemente, de
São vários os atrativos que fizeram os produ- baixos níveis de pureza (proporção de sacarose
tores e usinas de cana-de-açúcar a testar nova- em relação aos sólidos solúveis totais), além das
mente o sorgo sacarino para aumentar a oferta
suas altas concentrações de amido, não nos per-
de etanol, assim como verificar se o seu pro-
mite a fabricação de açúcar com qualidade. Isso
cessamento propiciaria um balanço energético
fez com que direcionássemos o seu processa-
positivo, de maneira a oferecer também energia
mento somente para produção de etanol.
elétrica excedente pela queima de seu bagaço
nas caldeiras. Um forte atrativo é o de se poder
Alguns aspectos industriais e agronômicos pu-
usar para o sorgo a mesma estrutura de colheita
deram ser notados nas primeiras áreas de sorgo
mecanizada e o mesmo processo industrial da
sacarino plantadas em larga escala pelas usinas
cana, amortizando grandes custos fixos. Outras
de cana-de-açúcar nessa safra.
motivações são o ciclo e o custo de produção
menor do sorgo, assim como possibilidade do O plantio e tratos culturais exigem uma estru-
aumento da área explorada, utilizando pasta-
tura de máquinas e implementos diferentes da
gens e outras não cultivadas com cana, agregan-
cana. Como o ciclo do sorgo é bem mais curto,
do e atraindo produtores de outras cadeias.
o manejo e as práticas culturais e, consequente-
Com relação ao período de moagem, avaliou-se mente, as intervenções agronômicas gerenciais
que seu melhor aproveitamento seria na anteci- acontecem mais rápido do que na cana. Perce-
pação da safra da cana, focando-se, no caso da be-se então a necessidade de uma equipe técni-
região Centro-Sul, a colheita no mês de março. ca dedicada ao sorgo.
Para tanto, com as atuais variedades e híbridos
disponíveis e suas interações de ciclo vegetati- A sua sensibilidade à maioria das moléculas de
vo com o fotoperíodo, o sorgo deve ser plan- herbicidas, excetuando-se as atrazinas, causa al-
tado em dezembro. Não se descarta, contudo, gum problema no controle de plantas daninhas,
um maior período de aproveitamento industrial, pois o espaçamento utilizado, visando a colheita
antecipando-se o plantio para outubro/novem- mecanizada com colhedoras de cana, deixa uma
bro (correndo-se nesse caso o risco de colheita área maior de entrelinhas. São necessárias pes-
num período mais chuvoso) ou até mesmo pos- quisas para se determinar a melhor população
tergando-se o plantio para março/abril, o que se de plantas por local, de maneira a aumentar a
poderia chamar de “sorgo sacarino safrinha”, produtividade agrícola, melhorar o controle de
para ser colhido junto com a cana, de junho a ervas e permitir uma perda menor na colheita já

Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011 31


que esta foi comparativamente maior do que a
registrada na cana.

A alta incidência de pragas comuns à cana, como


a broca Diatraea, causou uma forte preocupa-
ção, tanto pelas perdas agrícolas, mas, princi-
palmente, pelas perdas industriais, sendo que o
complexo broca/podridão vermelha mostrou-se
agravado no sorgo, prejudicando o rendimento
fermentativo.

A qualidade e especificação do etanol produzi-


do, assim como o poder calorífico de seu baga- ▲ Desenvolvimento do sorgo sacarino na Usina
ço queimado nas caldeiras, foram perfeitamen- Boa Vista (GO), abril de 2011. Na foto o autor do
te compatíveis com o que se consegue com a artigo.
cana. O balanço energético também foi positivo.
Ou seja, sua fibra e os rendimentos de extração
geraram bagaço suficiente para seu processa-
mento. Deve-se, contudo, avaliar em maior es-
cala a quantidade real de energia elétrica adicio-
nal proporcionada.

De uma maneira geral obtiveram-se, em escala


comercial, rendimentos agrícolas e industriais
aquém do previsto ou daqueles conseguidos na
experimentação. A solução de alguns problemas
aqui apontados, com certeza, poderá melhorar o
resultado alcançado. Avalia-se, pelos custos de
produção e o preço dos produtos, que uma pro-
dutividade atrativa ao sorgo seria a partir de 3
mil litros de etanol por hectare, o que o colocaria
como uma forte opção de fonte complementar a
produção de etanol. 
▲ Colheita do sorgo sacarino na Usina Boa
Vista (GO), abril de 2011.
▼ O quadro aponta algumas oportunidades
de melhorias a curto e médio prazo:

Oportunidades de melhorias para o sorgo sacarino


• Aumentar produtividade agrícola pela otimiza-
ção de número de plantas por área;
• Desenvolver variedades/híbridos resistentes à
broca, a herbicidas e ao tombamento;
• Usar transgenia para controlar broca;
• Diminuir perdas na colheita;
• Desenvolver variedades/híbridos para limitar
florescimento e isoporização;
• Desenvolver variedades/híbridos para “safri-
nha” e novas regiões;
• Desenvolver variedades/híbridos com maior di- ▲ Processamento do sorgo sacarino na Usina
âmetro dos colmos. Boa Vista (GO), abril de 2011.

32 Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011


Informações tecnológicas sobre sorgo
sacarino em documentos de patente
Por: Emerson Léo Schultz1, Gilmar Souza Santos1, Maria Iara Pereira Machado2, Frederico O M
Durães1. 1Pesquisador da Embrapa Agroenergia; 2Analista da Embrapa Agroenergia.

B
uscas de documentos de patentes foram Na Tabela 2 é apresentada a relação dos deposi-
realizadas na base Derwent Innovations tantes e os países nos quais os seus pedidos de
Index com o objetivo de encontrar docu- patente foram depositados. Entretanto, o prazo
mentos de patentes, publicados entre 1995 e legal para depósito em outros países de muitos
2011, sobre sorgo sacarino relacionados com a documentos de patente pode não ter expirado e,
tecnologia agrícola e com a tecnologia industrial portanto, o número de países no qual foram de-
de etanol de primeira e de segunda gerações. positados os pedidos de patente pode aumentar.
Os dados dos documentos obtidos foram trata-
dos no software VantagePoint, para avaliação de De acordo com a Tabela 2, os principais países
nos quais os pedidos de patente foram depo-
informações como principais depositantes, ano
sitados são China e Estados Unidos. No Brasil,
de publicação e países nos quais foram deposi-
três pedidos de patente foram depositados por
tados os pedidos de patente.
South African Sugar Association, University of
Queensland e Yan Mixed Seed & Herbicide Inc.
►Tecnologia agronômica

Na busca realizada sobre a tecnologia agrícola ►Tecnologia industrial para etanol de primeira
do sorgo sacarino foram encontrados 22 docu- geração
mentos. Os depositantes relacionados com tec- Uma busca relacionada com a tecnologia indus-
nologia agrícola são apresentados na Tabela 1 trial de etanol de primeira geração foi realizada,
em função do ano de publicação do documento. encontrando-se 29 documentos de patente.

Tabela 1. Depositantes e ano de publicação dos documentos de patente relacionados com tecnologia
agrícola do sorgo sacarino.

Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011 33


Tabela 2. Depositantes e os países em que foram depositados os documentos de patente
relacionados com tecnologia agrícola do sorgo sacarino.

CN – China; US – Estados Unidos da América; AU – Austrália; IN – Índia; EP – Europa; MX- México; BR – Brasil; ZA – África
do Sul; FR – França; JP – Japão; PH – Filipinas; CA – Canadá.

Empregando o software VantagePoint diversas México e Austrália), enquanto o outro pedido foi
informações foram obtidas, como os principais depositado apenas na Europa. Nenhum pedido
depositantes e o ano de publicação dos pedidos de patente foi depositado no Brasil.
de patente, os quais são mostrados na Tabela 3.
►Tecnologia industrial para etanol de segunda
Na Tabela 4 apresentam-se os países nos quais geração
os principais depositantes, apresentados na Ta-
bela 3, fizeram o depósito dos seus respectivos A busca realizada na base Derwent, para os anos
pedidos de patente. Os depósitos realizados na de 1995 a 2011, resultou em 35 documentos de
Organização Mundial da Propriedade Intelectual patente relacionados com etanol de segunda
(OMPI), publicados com a sigla WO, não foram geração. Os dados dos documentos foram trata-
computados, pois eles não representam um país dos no software VantagePoint.
específico, mas o depósito no sistema PCT (Pa-
tent Cooperation Treaty), para posterior entrada A relação entre os principais depositantes e o
nas fases nacionais nos países que o depositan- ano de publicação dos respectivos documentos
te tiver interesse. de patente relacionados com etanol de segunda
geração é mostrada na Tabela 5.
Através dos dados da Tabela 4, verifica-se que a
maioria dos depositantes optou por depositar os Na Tabela 6 mostram-se os países nos quais
pedidos de patente apenas na China, sendo que foram depositados os pedidos de patentes dos
quatro depositantes são chineses. A empresa in- principais depositantes. A BP (British Petroleum)
diana Praj Ind. depositou um dos seus pedidos depositou apenas nos Estados Unidos. As em-
apenas na Índia, sendo que o outro foi deposita- presas DSM e Nagarjuna Energy depositaram
do no sistema PCT da OMPI, o qual não aparece em mais de um país. Nenhum pedido de patente
na Tabela 4. A empresa Syngenta depositou um de etanol de segunda geração foi depositado no
pedido em vários países (China, Canadá, Europa, Brasil.

34 Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011


Tabela 3. Relação entre principais depositantes e ano Tabela 4. Países nos quais os principais depositantes
de publicação dos respectivos documentos de paten- de patente de etanol de primeira geração fizeram de-
te relacionados com etanol de primeira geração. pósito.

CN – China; CA – Canadá; EP – Europa; MX- México; IN – Índia;


AU - Austrália

Tabela 5. Relação entre os principais depositantes e o ano


de publicação dos respectivos documentos de patente
relacionados com etanol de segunda geração usando sorgo
sacarino.

Tabela 6. Países nos quais os principais depositantes fizeram o depósito dos pedidos
de patente relacionados com etanol de segunda geração.

CN – China; US – Estados Unidos da América; EP – Europa; CA – Canadá; AU – Austrália; JP – Japão; IN –


Índia; KR – Coréia do Sul; MX- México; ZA – África do Sul.
Foto: Cynthia Maria Borges Damasceno

Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011 35


►Considerações finais Para tecnologia industrial de etanol de segunda
geração, conclui-se que:
Das informações relacionadas com tecnologia
agrícola do sorgo sacarino, obtidas dos docu-
• Cinco depositantes com dois ou mais do-
mentos de patente, pode-se concluir que:
cumentos de patente foram encontrados na
busca realizada, sendo que a empresa BP
• Os principais depositantes são South African
(British Petroleum) é a principal depositante.
Sugar Assoc, Agrigenetics Inc., Biotechnolo-
gy Res Inst CAAS, Nagarjuna e Universidade
• O número de documentos de patente publica-
de Queensland.
dos tem aumentado desde 2008.

• Existe uma tendência de aumento de depó- • China é país que mais recebe depósito de pedi-
sitos de patente relacionados com a tecnolo- dos de patente, seguido pelos Estados Unidos.
gia agrícola do sorgo sacarino. • C12P (Processos de fermentação ou proces-
sos que utilizem enzimas para sintetizar uma
• China e Estados Unidos são os principais pa- composição ou composto químico desejado)
íses nos quais os pedidos de patente foram e C12M (aparelhos para enzimologia ou mi-
depositados. crobiologia) são os principais códigos da clas-
sificação internacional de patentes (CIP) dos
• Os principais códigos da Classificação In- documentos de relacionados com etanol de
ternacional de Patentes (CIP) são C12N (en- segunda
genharia genética ou de mutações) e A01H
(novas plantas ou processos para obtenção É importante ressaltar que ainda não houve pedi-
do de patente, depositado no Brasil, relacionado à
das mesmas).
produção de etanol de primeira ou segunda gera-
ção a partir do sorgo sacarino.
Em relação à tecnologia industrial de etanol de
primeira geração, conclui-se que:

• Na busca realizada foram encontrados 6 de-


positantes com 2 documentos de patente
cada.

• Houve um aumento no número de documen-


tos de patente publicados a partir de 2008.

• China foi o país que mais recebeu depósito


de patentes.

• Os principais códigos da CIP são C12P (Pro-


cessos de fermentação ou processos que
utilizem enzimas para sintetizar uma com-
posição ou composto químico desejado) e
C12R (microrganismos).
Foto: Cynthia Maria Borges Damasceno

36 Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011


Potencial de cogeração Com o crescente interesse e o aumento dos in-
vestimentos para a utilização do sorgo sacarino
de energia elétrica a como matéria-prima alternativa na biorrefinaria
de cana-de-açúcar para a produção de etanol,
partir de resíduos do o aumento da quantidade de resíduos (bagaço
e palha de sorgo sacarino) será maior. Dada a
processamento de sorgo similaridade de composição e de potencial ener-
gético entre o bagaço de cana-de-açúcar (teor de
sacarino fibra de cerca de 11% a 15% em massa, em base
seca, e poder calorífico de aproximadamente 15
MJ/kg), o potencial de geração de bioeletricida-
Por: Elaine Virmond , analista da Embrapa de desse setor poderá ser ainda maior.
Agroenergia
A Figura apresenta um esquema simplificado
das alternativas tecnológicas atualmente consi-

A
deradas para a geração de eletricidade a partir
produção de bioeletricidade no Brasil vem
de biomassa.
acompanhando o crescimento da produ-
ção de etanol. Dados elaborados por UNI-
O ciclo tradicional consiste na cogeração topping
CA, Koblitz e Cogen em 2009 e apresentados a vapor em contrapressão e nas alterações
por Silvestrin (2009) indicaram que o potencial possíveis para aumento do potencial de
de mercado da cogeração de bioeletricidade geração. Nesses sistemas, o bagaço é queimado
excedente em 2008/2009 utilizando bagaço de diretamente em caldeiras e a energia térmica
cana-de-açúcar e palha de cana-de-açúcar (con- resultante é utilizada na produção de vapor que
siderando-se a utilização de 75% do bagaço dis- acionará turbinas de acionamento mecânico do
ponível e 5% da palha disponível) foi estimado processo e turbinas para geração de energia
elétrica. Opcionalmente, os gases originados da
em 1800 MW médios. Projeções para 2015/2016
combustão do bagaço podem ser utilizados para
indicam crescimento para 8158 MW médios e
o acionamento de uma turbina a gás para geração
em 2020/2021 estima-se chegar a 13158 MW de energia elétrica (Corrêa Neto et al., 2002). Parte
médios, nesses dois casos considerando-se a dessas tecnologias convencionais atualmente
utilização de 75% do bagaço e 70% da palha de utilizadas em sistemas de cogeração apresentam
cana-de-açúcar. baixas eficiências no aproveitamento do bagaço

Esquema simplificado das alternativas tecnológicas para geração de


eletricidade a partir de biomassa

Fonte: Corrêa Neto et al. (2002) modificada.

Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011 37


de cana-de-açúcar por meio de sua combustão, prazo e de definição de preço forem firmados
além de utilizarem unidades de geração de com concessionárias de energia elétrica, o que
energia elétrica igualmente ineficientes. vem sendo regulado pela Agência Nacional de
Energia Elétrica (ANEEL), pelo Operador Nacio-
A pirólise de biomassa pode ser aplicada para nal do Sistema Elétrico (ONS) e pela Empresa
a produção do bio-óleo (líquido combustível), o de Pesquisa Energética (EPE). Outro ponto im-
qual pode ser queimado em um motor alterna- portante é a alta dependência da qualidade da
tivo ou em uma caldeira, e os gases alimenta- matéria-prima e da garantia de seu fornecimento
dos a uma turbina a gás para geração de energia nos períodos de entressafra de cana-de-açúcar
elétrica, assim como o gás combustível produto (atualmente a principal fonte de matéria-prima)
da pirólise. Outra opção é a utilização da pirólise para garantia da geração de bioeletricidade du-
como pretratamento da biomassa para obten- rante o ano todo.
ção do bio-óleo seguida da gaseificação desse o
gás produzido pode então ser queimado em um Considerando-se que a cultura do sorgo saca-
motor alternativo ou alimentado a turbinas a gás rino é complementar ao período de entressafra
para geração de energia elétrica. da cana-de-açúcar, tanto etanol quanto energia
elétrica podem ser fornecidos durante grande
Essas tecnologias têm evoluído bastante, com parte do ano. Além da demanda crescente por
destaque para a tecnologia de gaseificação de etanol, essa necessidade é ainda maior dado
biomassa integrada a ciclos combinados, na qual que o consumo de energia das usinas nos perío-
se tem o aproveitamento da energia térmica dos dos de entressafra de cana tem aumentado pela
gases de exaustão originados de uma turbina a inclusão de novos processos, tais como fabrica-
gás para gerar vapor a média e a alta pressão e ção de embalagens, produtos químicos, papel,
posterior utilização do vapor em uma turbina a tratamento de efluentes e plantas de produção
vapor para aumento da potência e da eficiência
de biogás (ISO, 2009).
global do ciclo. Diversas plantas piloto já estão
em operação no mundo com essa tecnologia
Dessa forma, há grande potencial de desenvolvi-
e apresentam futuro promissor, no entanto, a
mento do setor de cogeração de energia elétrica
mesma ainda não está totalmente desenvolvida
a partir de biomassa, especialmente de sistemas
para aplicação industrial. Sistemas desse tipo
de gaseificação de biomassa integrados a ciclos
podem apresentar eficiência de até 50% compa-
rativamente a eficiências de aproximadamente combinados. Além de bioeletricidade, o gás de
30% alcançadas em sistemas de cogeração con- síntese produto da gaseificação (uma mistura de
vencionais por meio de combustão. monóxido de carbono e de hidrogênio), após
recuperação de calor e limpeza, pode ser en-
Embora essa tecnologia já tenha se mostrado viado para reatores químicos para a fabricação
viável, ainda necessita superar obstáculos antes de produtos de elevado valor agregado, como
de se tornar comercialmente competitiva, o que combustíveis líquidos tais como metanol, eta-
deve acontecer em pouco tempo dado o po- nol, diesel e gasolina, fertilizantes, monômeros
tencial que apresenta. A maior atratividade dos e diversos outros produtos químicos.
ciclos integrados de gaseificação de biomassa
com turbinas a gás e a vapor está relacionada Cerca de apenas um terço do potencial energé-
a mercados específicos, ou nichos de mercado, tico da cana-de-açúcar é utilizado na produção
tais como áreas com restrições a combustíveis de etanol de primeira geração. Os outros dois
fósseis ou com custos elevados, áreas com prio- terços estão no bagaço e na palha. Há grande
ridade de desenvolvimento rural, áreas com dis- potencial de expansão da geração de bioeletri-
ponibilidade de rejeitos ou resíduos diversos e cidade no Brasil dada a grande quantidade de
áreas nas quais os custos da biomassa são rela- biomassa (bagaço, palha e ponteiras) de cana-
tivamente baixos. -de-açúcar atualmente disponível (na última sa-
fra apenas cerca de 30% do bagaço foi utilizada
Entretanto, o alto investimento inicial requeri- para geração de bioeletricidade). Bagaço e palha
do para a construção e operação inicial de uma de sorgo sacarino devem ser somados à bio-
planta de cogeração pode ser justificado somen- massa de cana-de-açúcar a ser disponibilizada
te se acordos e contratos formais de forneci- com o aumento da participação dessa cultura no
mento e de compra de bioeletricidade de longo setor alcooleiro.

38 Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011


Concorrência ampliada ►A concorrência ampliada
Porter preconiza que o sucesso de uma empresa
dos produtos do sorgo está ligado a dois fatores: o desempenho do se-
sacarino na entresafra da tor em que a empresa atua e o posicionamento
da empresa nesse setor. Podemos estender esse
cana-de-açucar no Brasil conceito para os produtos gerados do sorgo sa-
carino, considerando os diversos agentes que
atuam na cadeia produtiva desta cultura, como
Por: Gilmar Souza Santos, pesquisador da também as diversas estratégias para o seu uso
Embrapa Agroenergia competitivo na entressafra da cana-de-açúcar.

Pelo conceito de concorrência ampliada, forne-

O
sorgo sacarino é cultivado em diversas cedores, clientes, investidores, culturas e pro-
partes do mundo. O seu principal uso tem dutos substitutos, assim como novos entrantes
sido a produção de grãos e forragens para podem ter maior ou menor importância, de-
alimentação animal. Segundo Durães (2011), o pendendo do contexto avaliado. Neste estudo,
sorgo sacarino, um tipo de Sorghum bicolor (L.) considera-se o posicionamento dos produtos
Moench, com alto potencial forrageiro, apresen- gerados do sorgo sacarino na entressafra da
ta colmos com caldo semelhante ao da cana, cana-de-açúcar como também na reforma de
rico em açúcares fermentescíveis e pode servir canavial. Concorrência, neste sentido mais am-
para a produção de etanol na mesma instalação plo, pode ser definida como rivalidade e opor-
utilizada pela cana-de-açúcar. Trata-se também tunidade ampliada. Sendo assim, o objetivo é
de uma das alternativas para reforma ou subs- avaliar a cooperação do sorgo sacarino com a
tituição de canaviais. A seleção de espécies de cana, em termos de ser uma opção alternativa
expressão econômica deve contribuir para aten- e viável, plantada como rotação de culturas nas
der aos interesses de produção de alimentos e áreas de reforma de cana-de-açúcar em outubro
energia. Neste contexto, por meio de um estu- e novembro, para colheita em março e abril. É
do da concorrência ampliada de Porter (2004), possível um melhor aproveitamento do parque
aplicada aos produtos do sorgo sacarino (etanol industrial no ano, produção de etanol em um
e bioeletricidade), algumas propostas são apre- período de baixos estoques e ainda possibilitar
sentadas e discutidas como contribuições para ganhos de produtividade na própria produção
uma melhor competitividade desta cultura na de cana-de-açúcar ao proporcionar sua colheita
entressafra da cana. em um período mais favorável. Na Figura 1 são

Figura 1. Indicadores Sorgo Sacarino x Cana

Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011 39


apresentados alguns indicadores das duas cul- distribuidoras e também pelas concessionárias
turas, a exemplo da água utilizada, produção do de energia elétrica. O mercado consumidor, por
etanol, biomassa e custo por hectare. sua vez, consome os produtos gerados do sor-
go, a exemplo de etanol e bioeletricidade.
A Monsanto/Canavialis indica que, além do uso
do sorgo como alimento, as variedades que Também existe um ambiente institucional que
apresentam colmo suculento e a presença de determina obrigações legais a serem seguidas
açúcares são uma alternativa para suplementar e um ambiente organizacional, representado
a safra de cana-de-açúcar, como matéria-prima por empresas de pesquisas, investidores e re-
para produção de etanol. Assim como a cana- guladores. Para uma melhor análise da cadeia
-de-açúcar, o sorgo pode produzir bagaço, que de agronegócio do sorgo sacarino, torna-se ne-
também é uma fonte interessante para geração cessário entender como esses diversos agentes
de energia elétrica. Além disto, o sorgo sacari- (fornecedores, produtores, empresas de pes-
no pode ser produzido utilizando-se os mesmos quisa, clientes etc.) se interagem no processo,
equipamentos e estrutura utilizados para a cana- considerando os diversos aspectos das estra-
-de-açúcar. A principal diferença está no plantio:
tégias genéricas de custos e de diferenciação.
ele é realizado com plantadoras de sementes se-
A escolha de um segmento de mercado para o
melhantes às utilizadas para plantios de milho,
sorgo sacarino (ex. etanol na entressafra) pode
usando-se o sistema de plantio convencional ou
ser avaliado sob o ponto de vista dos custos de
plantio direto com os mesmos espaçamentos
produção e diferenciação (ex. ciclo de vida cur-
adotados para a cultura da cana. Após o plantio,
to) em relação às outras culturas de entressafra
todas as operações de aplicação de herbicidas
e inseticidas e todas as atividades de colheita, da cana-de-açúcar (ex. soja, amendoim) para se
carregamento e transporte podem ser feitos tornar a opção ideal como safrinha, tendo atri-
com os mesmos equipamentos utilizados para a butos valorizados pelos fornecedores, produto-
cana, com pequenas regulagens. res, investidores e clientes. Assim, um estudo
de concorrência ampliada torna-se importante,
►A cadeia de agronegócio do sorgo sacarino conforme item seguinte.

Conforme adaptação da metodologia proposta ►A concorrência ampliada dos produtos do


pela Embrapa, a cadeia de agronegócio do sor- sorgo sacarino
go sacarino é apresentada na Figura 2. Contem-
pla fornecedores de insumos e equipamentos Considerando todo o mercado, a concorrência
para a fase agrícola e também para a fase indus- ampliada dos produtos do sorgo sacarino é for-
trial. Usinas e agricultores como agentes produ- mada por concorrentes do setor, fornecedores,
tores da fase agrícola (plantio, cultivo, colheita, novos entrantes, investidores, clientes, produtos
transporte) e da industrial (moagem, produção substitutos e governo, conforme Figura 3 (adap-
de etanol e de bioeletricidade). Os atacadistas tação do autor das 05 forças competitivas de Mi-
são representados pelos postos de gasolina, chael Porter).

Figura 2. Agronegócio sorgo sacarino

40 Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011


Um exemplo da influência da concorrência am- desenvolvendo desde 1976 um programa de
pliada é a decisão de plantar ou não o sorgo na pesquisa com esta cultura, abrangendo as áreas
entressafra da cana-de-açúcar. O mercado, nes- de Fitopatologia, Entomologia, Fertilidade, Ge-
te caso, pode ser diretamente afetado de forma nética e Melhoramento, entre outras. Na safra
positiva. Outro aspecto é que o mercado de sor- de 1981, foram instaladas microdestilarias nas
go sacarino está se tornando atrativo com novas Embrapa Arroz e Feijão, Embrapa Gado de Corte
empresas e investidores entrando na cadeia do e Embrapa Milho e Sorgo com as cultivares BR
seu agronegócio, trazendo novas capacidades, 500 (Rio), BR 501 (Brandes) e BR 602. Atualmen-
competências de ganhar margens melhores e te, a Embrapa mantém no mercado duas culti-
recursos financeiros. vares do sorgo sacarino (BRS 601 e BRS 602),
cujos testes em laboratório mostraram que é
Atualmente já existem bons investimentos em possível chegar a aproximadamente 4 mil litros
sorgo sacarino no Brasil, como por exemplo de etanol por hectare. Novas variedades de sor-
os realizados pela Embrapa e pela Monsanto/ go sacarino estão sendo avaliadas pela Embrapa
Canavialis. Com parceria da Canavialis, a Usina Milho e Sorgo em diversas regiões brasileiras.
Cerradinho, de Catanduva (SP), cultivou 1,2 mil Conclui-se que o mercado do sorgo está bastan-
hectares de sorgo sacarino e produziu 1,4 mi- te atrativo e não existem barreiras consideráveis
lhão de litros de etanol no final de março/2011, para que um novo negócio se estabeleça no se-
conforme informação divulgada pelos próprios tor. Esperam-se novos entrantes e grande volu-
investidores. O negócio faz parte de um projeto me de investimentos nesta cultura nos próximos
desenvolvido desde 2004 com híbrido do sorgo. anos.
No momento, os testes com as novas sementes
estão sendo realizadas em mais 11 usinas, tota- Outro aspecto a destacar são os diversos
lizando 3,1 mil hectares de plantio. A previsão é substitutos para os produtos do sorgo sacarino
atingir 35 mil hectares até 2012, segundo dados na entressafra, não considerando o etanol
da Monsanto/Canavialis. da cana-de-açúcar. Um exemplo é o plantio
do amendoim, concorrendo ainda na fase
Por outro lado, a Embrapa Milho e Sorgo traba- agrícola. Na fase industrial, a bioeletricidade a
lha com variedades de sementes de sorgo sa- partir do bagaço não utilizado da safra de cana
carino desde a década de 70. A Embrapa vem ou até mesmo o biogás, gerado a partir de

Figura 3. Concorrência ampliada do sorgo sacarino

Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011 41


biodigestores, concorrem com o sorgo sacarino A cultura do sorgo sacarino na entressafra é
e são exemplos de produtos substitutos. Por uma estratégia indicada para elevar a produ-
outro lado, as políticas do governo impactam ção de etanol sem concorrência com a cultura
diretamente o mercado dos produtos gerados de cana. A colheita do sorgo utiliza os mesmos
do sorgo, a exemplo das regulações, políticas equipamentos da cana, reduzindo o período de
agrícolas e também, de linhas de crédito do ociosidade da indústria. Mesmo com produtivi-
BNDES e do Banco do Brasil, com taxas de juros dade menor em relação à cana-de-açúcar, a al-
mais baixas que as praticadas no mercado, ternativa é viável considerando o ciclo comple-
como as que anunciadas em agosto/2011 para to de produção das duas culturas. Essa decisão
o etanol. Quanto aos fornecedores, os insumos estratégica poderá mitigar os riscos de falta de
e equipamentos são bem próximos da cultura etanol, ajudar na estabilização dos preços deste
da cana. Neste aspecto, deve ser considerada produto e reduzir a importação de etanol e gaso-
a cultura na entressafra da cana para que lina. Do ponto de vista da análise da concorrên-
não ocorra uma concorrência desta força cia ampliada é uma estratégia perfeitamente vi-
competitiva. Deve-se aproveitar a capacidade ável.Um exemplo da influência da concorrência
instalada das usinas e também o poder de ampliada é a decisão de plantar ou não o sorgo
negociação já implantado. na entressafra da cana-de-açúcar. O mercado,
neste caso, pode ser diretamente afetado de
Quanto aos compradores, na visão de Porter, se forma positiva. Outro aspecto é que o merca-
forem poucos e poderosos, certamente força- do de sorgo sacarino está se tornando atrativo
rão as condições de compra e os preços para com novas empresas e investidores entrando
baixo. Neste aspecto, a cultura do sorgo sacari- na cadeia do seu agronegócio, trazendo novas
no atua de forma positiva, possibilitando suprir capacidades, competências de ganhar margens
eventuais problemas de oferta de etanol, como melhores e recursos financeiros. 
também estabilizar o seu preço na entressafra,
como também manter competitivo o mercado
de bioeletricidade.

►Considerações finais
O Brasil está vivendo aumentos dos preços de
etanol e riscos de desabastecimento nos perío-
dos de entressafra. Os problemas de estoque e
de alta nos preços do etanol continuarão a ocor-
rer nos períodos de entressafra. Neste contexto,
o sorgo sacarino, que produz etanol usando a
mesma levedura que a cana e é plantado justa-
mente na fase de entressafra pode ser uma so-
lução. A cultura do sorgo sacarino é uma alter-
nativa viável sob os pontos de vista agronômico
e industrial, para a produção de etanol e bioele-
tricidade.

42 Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011


Viabilidade cias, trata-se de uma aproximação para avaliar o
potencial deste mercado.

econômica e Tabela 1. Estimativas dos custos de produção


arranjos produtivos de etanol a partir do sorgo sacarino.

Preço Unitário
Descrição
(R$/litro)
Por: Alice Medeiros de Lima1, Daniela Tatiane
Fator de Conversão de sorgo em etanol
dos Santos1 e João Carlos Garcia2, analistas  
(0,03505 m³/t)
da Embrapa Agroenergia1 e pesquisador da
Embrapa Milho e Sorgo2. Custo da matéria-prima R$ 0,48

Custo fixo/L R$ 0,17

►Custos unitários da produção de etanol a Custo de processamento/ L R$ 0,34


partir de sorgo sacarino Custo Total R$ 0,99

A produção de etanol a partir do sorgo sacarino Fonte: FAEG (2011) e Linton et al (2011).
tem sido considerada viável devido à semelhan-
ça com a cana-de-açúcar, ao alto teor de açúca- Os custos de produção agrícola do sorgo em ja-
res fermentescíveis, além do processamento po- neiro de 2011 estiveram em torno de R$ 927/ha.
der ser feito nas usinas de cana-de-açúcar. Um Entretanto, para estimar o custo total de produ-
ponto importante é a possibilidade de produção ção em termos de R$/L seria necessário transfor-
de etanol no período da entressafra da cana-de- mar este valor por meio do fator de conversão
-açúcar utilizando-se o sorgo sacarino. Entretan- do substrato em etanol. Linton et al (2011) utili-
to, há poucos estudos e informações sobre a zam um fator de conversão de 0,03505 m³/t, ou
viabilidade técnico-econômica da produção de seja, cada tonelada de biomassa verde de sor-
etanol a partir do sorgo sacarino. go geraria 35,05 litros de etanol. Multiplicando-
-se este fator pela produtividade por hectare do
sorgo (55 t/ha), tem-se um total de 1.920 L/ha.
Alguns fatores possuem importantes efeitos so-
Assim, poderia se afirmar que o custo unitário
bre os custos de produção de etanol a partir do
da matéria-prima estaria em torno de R$ 0,48/L,
sorgo, como o preço das matérias-primas, o pre-
sem incluir quaisquer custos de transporte.
ço do etanol e do gás natural e os fatores de con-
versão. O potencial mínimo de geração de eta-
Por outro lado, com base no trabalho de Linton
nol de sorgo sacarino está estimado em 3.223 L/
et al (2011), estimou-se que os custos fixos uni-
ha, com uma produtividade que gira em torno
tários seriam de R$ 0,17/L e os custos de proces-
de 55 t/ha, o que representa cerca de 58,6 L/t.
samento, R$ 0,34/litro1. Deste modo, tendo em
A Tabela 1 ilustra estimativas para o custo uni-
vista os parâmetros aqui adotados, o custo total
tário de produção do etanol do sorgo sacarino.
de produção de etanol do sorgo sacarino seria
A Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás
de aproximadamente R$ 0,99/L.
(FAEG) publica os custos da produção agríco-
la do sorgo granífero, que podem ser tomadas
como uma primeira aproximação para o sorgo ►Comparação da produção de etanol a partir
sacarino. Entretanto, as estimativas no país so- da cana-de-açúcar e do sorgo sacarino
bre o processamento em escala industrial do A comparação da produção de etanol a partir de
etanol a partir do sorgo sacarino é de mais difícil cana-de-açúcar e sorgo sacarino foi feita a partir
acesso, estando limitadas às empresas produto- da simulação utilizando-se um modelo simpli-
ras, que somente recentemente deram margem ficado com o balanço de massa de uma usina
a esta iniciativa. Neste sentido, tomou-se como convencional. Este modelo é capaz de calcular,
parâmetro para o custo de produção do sorgo além da quantidade de etanol (1ª e 2ª geração),
sacarino (matéria-prima), o preço da matéria-pri- a quantidade de açúcar e eletricidade gerados
ma convencional, ao passo que os dados para o a partir da cana-de-açúcar e/ou sorgo sacarino.
processamento do sorgo sacarino basearam-se
em estimativas para a produção do sul dos Esta-
dos Unidos (LINTON et al, 2011). Ainda que este
procedimento não esteja livre de incongruên- 1
Estes valores foram convertidos, considerando-se a taxa
de câmbio do dólar de R$ 1,6.

Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011 43


Tabela 2. Dados utilizados nas simulações. a receita líquida de etanol a partir do sorgo sa-
carino, bem como a produção que poderia ser
Parâmetros Sorgo sacarino (SS) obtida de etanol de segunda geração utilizando-
Cenário 1SS 2SS -se o bagaço.
Produtividade (t/ha) 55 80
Pode-se observar que à medida que se aumenta
Brix do caldo (%) 15 21 a quantidade de Brix, ART e fibra nas cultivares
ART do caldo (%) 13 20 analisadas (cana-de-açúcar e sorgo sacarino), a
produção de etanol aumenta consideravelmen-
Pureza do caldo (%) 55 80
te, tanto de primeira quanto de segunda gera-
ART do colmo (%) 11,5 16,5 ção. A produtividade de etanol a partir do sor-
Fibra do colmo (%) 10 19 go sacarino (cenário 2SS) poderia atingir níveis
similares aos da cana-de-açúcar (cenário 1C),
Composição do bagaço (assumindo-se que a composição do bagaço
da cana-de-açúcar e do sorgo sacarino são semelhantes) o que representaria maior oferta de etanol no
período da entressafra da cana-de-açúcar, bem
Lignina 9,98
como na safra. Esse aumento na oferta de eta-
Celulose 23,74 nol teria impactos significativos nos preços de
Hemicelulose 14,28 mercado deste produto.
Rendimento etanol de segunda geração (L/t bagaço)*
Os custos de produção do etanol de sorgo so-
*Hexoses: 80% recuperação, fermentação: 91%; Pento- freram grandes alterações em função das va-
ses: 78,5% recuperação, fermentação: 0%, destilação: riações na produtividade, com valores mínimo
99,75%.
e máximo oscilando entre R$ 3.190/ha (cenário
Fonte: Santos, F. G. (2007); Lee et al (2007); Durães, F. O.
M. (2011). 1SS) e R$ 5.448/ha (cenário 2SS). Admitindo-
-se que o preço de venda deste produto esteja
em torno de R$ 1,2/L, preço do etanol nas usi-
nas canavieiras, a margem de lucro seria de R$
O cenário padrão utilizado para as simulações 0,21/L. A produtividade total dos fatores (relação
neste estudo foi de 1,0 ha, considerando-se o entre receita e custos totais), uma medida da efi-
caldo e o bagaço produzindo apenas etanol ani- ciência deste sistema produtivo situaria em 1,2,
dro. Os dados utilizados nas simulações de qua- enquanto a taxa de retorno do investimento (re-
tro cenários estão mostrados na Tabela 2. ceita líquida sobre custo total) seria de 21,2%,
apontando para níveis de rentabilidade que se
Os resultados obtidos com a simulação dos qua- sustentam ao preço de venda considerado. Lo-
tro cenários propostos (dois para sorgo sacarino gicamente, que uma avaliação mais aprofunda-
e dois para cana-de-açúcar) estão indicados na da deveria ser realizada considerando a variação
Tabela 3. Também são calculados os custos e destes parâmetros ao longo do tempo.

Tabela 3. Estimativa de produtividade, produção de etanol, custos e receita líquida para sorgo sacarino
e cana-de-açúcar.

Produção de Produção de
Cenário -
Etanol de Custos Receita líquida Etanol de Produção Total
  Produtividade
1ª geração (R$/ha) (R$/ha) 2ª geração (L/ha)
(t/ha)
(L/ha) (L/ha)
1SS - 55 3.223,00 3.190,77 676,83 1.079,00 4.302,00
Sorgo Sacarino
2SS - 80 5.504,00 5.448,96 1.155,84 2.983,00 8.487,00
             
1C - 80 5.921,00 4.677,59 2.427,61 1.413,00 7.334,00
Cana
2C - 90 7.098,00 5.607,42 2.910,18 2.296,00 9.394,01
Fonte: FAEG (2011); Linton et al (2011); Santos, F. G. apud Durães, F. O. M. (2011); Lee et al (2007).

44 Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011


Segundo estimativas da Embrapa, a produtivida-
de da biomassa verde do sorgo sacarino pode
chegar a 80 t/ha, com rendimento aproximado
de 6.000 L/ha, o que representa uma receita lí-
quida de R$1.555/ha, com custo agrícola e in-
dustrial estimado em R$5.448/ha.

Entretanto, as baixas escalas de produção do


etanol de sorgo sacarino ainda restringiriam a
obtenção de custos de produção menos eleva-
dos. Mesmo com custos de produção por hecta-
re menores que o da cana-de-açúcar2, os níveis
reduzidos de produtividade teriam grandes efei-
tos sobre a quantidade de etanol de primeira ge-
ração que pode ser obtido. As disparidades no
potencial de produção entre as duas alternativas
(sorgo sacarino e cana) estão traduzidas nas di-
ferenças de receitas líquidas a serem auferidas.
Para ilustrar, com produtividade de 80 t/ha, a re-
ceita líquida do etanol de sorgo seria apenas 1/2
daquela obtida pela cana-de-açúcar.

Ainda assim, o estabelecimento de arranjos


produtivos entre cana-de-açúcar e sorgo saca-
rino seria uma forma relevante de aproveitar
as terras disponíveis em áreas de plantação de
cana, notadamente na renovação do canavial.
Este tipo de arranjo já ocorre com outras cul-
turas como amendoim, soja e milho, embora
os custos de produção destas culturas estejam
bem acima dos custos verificados para o sorgo,
cerca de R$ 1.610/ha para a soja e R$ 2.544/ha
para o milho. Certamente, as estimativas para o
Fotos: Cristina Maria Monteiro Machado
sorgo sacarino apontam para um potencial favo-
rável de geração de receitas. O cenário torna-se
ainda mais promissor quando se consideram as
limitações advindas da extrema dependência da
produção de etanol a partir de uma só cultura. ►Referências
As dificuldades na oferta de etanol no Brasil e
FAEG – Federação da Agricultura e Pecuária de Goi-
as variações no preço deste combustível, com
ás. Custo de Sorgo, 2011. Site disponível em
efeito, poderiam ser minimizadas na presença <http://www.site.sistemafaeg.com.br/index.
de fontes alternativas de biocombustíveis como php?option=com_phocadownload&view=category
o sorgo sacarino, o que aumentaria e regulariza- &id=12:custo-de-sorgo>. Acesso em: 01 setembro
ria a produção. 2011.

LEE, D. et al. Composition of herbaceous biomass


feedstocks. Preparado por North Central Sun Grant
Center. Universidade Dakota do Sul, 2007.

LINTON, J. A. et al. Economic feasibility of produ-


cing sweet sorghum as an ethanol feedstock in the
southeastern United States. Biomass and Bionergy,
n. 35, p. 3050-57, 2011.

SANTOS, F. G. Culturas com potencial para produ-


2
Os altos custos de produção da cana-de-açúcar atribuem- ção de álcool no Rio Grande do Sul: sorgo sacarino.
-se parcialmente aos elevados preços de arrendamentos In: Simpósio Estadual de Agroenergia, Pelotas, RS,
de terras em regiões canavieiras, notadamente na região 2007.
Centro-Sul, com efeitos consideráveis sobre o custo de
produção desta cultura.

Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011 45


Elementos do plano de 506 e BRS 507), em função de disponibilidade
de sementes, histórico de rendimento de eta-
negócios do sorgo sacarino nol de 2.500 a 3.500 litros por hectare, e busca
de novos índices agronômicos e industriais;
da Embrapa • Materiais atuais: lançamento de novos culti-
vares (1-3 variedades BRS, a partir da safra
Por: Antonio Álvaro Corsetti Purcino, Chefe-Geral 2012-2013), em complemento  à estratégia dos
da Embrapa Milho e Sorgo, Frederico O. M. Durães, materiais antigos. Para cada um desses back-
Chefe-Geral da Embrapa Agroenergia ground genéticos está previsto a determinação
de meta negocial, ciclo de vida da cultivar, e a
natureza e magnitude do empreendimento;

N
o início dos anos 80, o Centro Nacional • Materiais modernos: desenvolvimento e lança-
de Pesquisa de Milho e Sorgo – CNPMS mento de novos híbridos, em horizonte tem-
selecionou variedades de sorgo sacarino, poral de 2-5 anos, de forma compartilhada ou
todas com produtividade de colmos superior a não com a iniciativa privada, e com estratégia
40 t / ha e teor de sólidos solúveis médios entre complementar de novo background genético
18 e 20º Brix. Em 1987, as primeiras variedades e boas práticas agrícolas e gerenciais para os
brasileiras foram desenvolvidas com potencial sistemas produtivos sustentáveis.
para produção de etanol (BRS 506 e BRS 507, e o Nichos territoriais (3):
híbrido BRS 601). Estes materiais apresentaram
rendimentos entre 2.500 e 3.500 l etanol por hec- • Áreas canavieiras tradicionais: produção com-
tare. Como as cultivares lançadas apresentavam plementar de etanol e resíduos na entressafra
boa produtividade e qualidade de matéria verde, da cana e/ou áreas de reforma de canaviais;
estes produtos se mantiveram no mercado, co- • Áreas de expansão canavieira: como alterna-
mercializados como forrageiras. tivas para produção de etanol e resíduos para
agroenergia;
A Embrapa reiniciou seu programa de desenvolvi- • Áreas antropizadas de expansão e/ou substitui-
mento de cultivares de sorgo sacarino a partir de ção agrícola: como alternativas para a produ-
2008, devido ao potencial desta cultura na geração ção de etanol e resíduos para agroenergia em
de energia renovável e devido a grande deman- áreas distintas ou remotas da região sucroal-
da por matéria-prima alternativa para a produção cooleira tradicional, p.ex., região centro-oeste
de etanol nas grandes destilarias. O programa de do Brasil.
melhoramento da Embrapa, coordenado pelo Cen-
tro Nacional de Pesquisa de Milho e Sorgo visa o Parcerias em cooperação científica e/ou
desenvolvimento de variedades e/ou híbridos de técnica (3):
sorgo sacarino e estabeleceu as seguintes metas • Acordos de cooperação científica para desen-
de produtividade e qualidade: uma produtividade volvimento de novos cultivares;
mínima de biomassa de  60 t / ha; extração mínima
• Acordos de cooperação técnica para licencia-
de açúcar total de 120 kg / t biomassa, consideran-
mento de genótipos de interesse técnico ou
do a eficiência de extração de 90-95%; conteúdo
comercial;
mínimo de açúcar total no caldo de 14%; produ-
ção mínima de álcool de 60 l / t biomassa; Perío- • Acordos de cooperação técnica para agrega-
do de Utilização Industrial (PUI) mínimo de 30 dias ção de valor a genótipos, processos e sistemas
com extração mínima de açúcar total de 100 kg / t produtivos, incluindo a obtenção de descrito-
biomassa. res botânicos e de caracterização agronômi-
ca de genótipos e materiais comerciais, bem
►Elementos para o Plano de Negócios de como de índices de indústria (caracterização
Sorgo Sacarino da Embrapa: planejada de matérias-primas, processos e
produtos).
Em síntese, o plano de negócios para o sorgo sa-
carino está estruturado em três background ge- A Embrapa disponibiliza os termos básicos (pa-
néticos e três nichos territoriais, e tem como es- drão) de cooperação científica e técnica para os
tratégia o compartilhamento de ações de PD&I e negócios competitivos. E recomenda que, para
negociais, a saber: cada assunto específico e cada instituição ou em-
presa interessada, sejam formalizados um termo
Background genético (3): de confidencialidade e a definição de contrapartes
• Materiais antigos: produção de sementes e institucionais de negociação para firmar acordos
performance agronômica e industrial de cul- específicos, em momentos oportunos dos traba-
tivares registradas no RNPC (variedades BRS lhos conjuntos.

46 Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011


Metas de rendimento e
qualidade de sorgo sacarino
Por: Robert Eugene Schaffert1, Rafael Augusto da Costa Parrella1, André May1, Frederico O. M.
Durães2, pesquisadores da Embrapa Milho e Sorgo1 e Chefe-Geral da Embrapa Agroenergia2

N
o início dos anos 1980, a Embrapa/ reiniciou seu programa de desenvolvimento de
Centro Nacional de Pesquisa de Milho e cultivares de sorgo sacarino a partir de 2008,
Sorgo (CNPMS) selecionou variedades de devido ao potencial desta cultura na geração de
sorgo sacarino, com produtividade de colmos energia renovável e devido a grande demanda
superior a 40 t / há e teor de sólidos solúveis por matéria-prima alternativa para a produção
médios entre 18 e 20º Brix. Posteriormente, em de etanol nas grandes destilarias.
1987, as primeiras variedades brasileiras foram
desenvolvidas com potencial para produção de O programa de melhoramento da Embrapa visa
etanol, sendo o BRS 506 e BRS 507, e o híbrido
o desenvolvimento de variedades e/ou híbridos
BRS 601. Projetos-piloto de microdestilarias para
de sorgo sacarino e estabeleceu as seguintes
produção de etanol se valeram destas variedades.
metas de produtividade e qualidade: uma pro-
O Pro-Álcool incentivou a expansão da cana-de-
açúcar e as espécies alternativas, como o sorgo dutividade mínima de biomassa de 60 t / ha;
sacarino e a mandioca, tiveram seus programas extração mínima de açúcar total de 120 kg / t
paralisados. Como as cultivares lançadas biomassa, considerando a eficiência de extração
apresentavam boa produtividade e qualidade de 90-95%; conteúdo mínimo de açúcar total no
de matéria verde, estes produtos se mantiveram caldo de 14%; produção mínima de álcool de 60
no mercado, comercializados como forrageiras. l / t biomassa; Período de Utilização Industrial
Atualmente apresentam-se como cultivares de (PUI) mínimo de 30 dias com extração mínima
dupla aptidão, sacarina e forrageira. A Embrapa de açúcar total de 100 kg / t biomassa.

Fonte: Modificado de Schaffert, R.E. et al., Embrapa Milho e Sorgo (www.cnpms.embrapa.br)

Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011 47


O sorgo sacarino na mídia
Por: Daniela Collares1 e José Heitor Vasconcellos2, jornalista da Embrapa Agroenergia1 e Embrapa
Milho e Sorgo2

E
m dezembro de 2010, Beatriz Emygdio,
pesquisadora da Embrapa Clima Tempe-
rado (Pelotas, RS) publicou pequeno arti-
go denominado “Produção de etanol a partir de
sorgo sacarino” (http://www.infobibos.com/Arti-
gos/2010_4/Sorgo/Index.htm) que foi precursor
de várias matérias jornalísticas publicadas em
2011, em diversos sites, revistas e até mesmo
na TV. 5/5/2011

A presença do sorgo sacarino na mídia intensi- (http://www.inovacao.unicamp.br/noticia.


ficou-se quando a Canavialis anunciou, em abril php?id=925
de 2011, que estava produzindo etanol a partir
desse cereal, na Usina Cerradinho em Catandu-
va (http://www.canavialis.com.br/src/sorgo.php)

A partir desse anúncio, diversas notícias foram


veiculadas, enfatizando a possibilidade de utili-
zar sorgo sacarino na reforma dos canaviais, au-
mentando a produção de etanol sem aumentar a
área ocupada com matérias-primas.
http://www.agrosoft.org.br/agropag/210334.
htm)

http://gadoegrao.blogspot.com/2011/05/sorgo-
-sacarino-e-alternativa-para.html

48 Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011


http://g1.globo.com/economia/agronegocios/
noticia/2011/06/sorgo-sacarino-pode-reforcar- http://www.correiodoestado.com.br/noti-
-producao-de-etanol-no-brasil.html cias/cresce-cultivo-de-sorgo-para-etanol-no
-pais_120315/

http://www.cnpms.embrapa.br/noticias/mostra- http://www.cnpms.embrapa.br/noticias/mostra-
noticia.php?codigo=667 noticia.php?codigo=672

21/6/2011

http://oestadodoparana.pron.com.br/agronegocio/
noticias/34890/?noticia=raizen-inicia-plantio-de-sor-
go-sacarino-em-goias

Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011 49


Sorgo sacarino na TV Globo

N
o programa Globo Rural de 19 de junho, http://video.globo.com/Videos/Player/
foi veiculada matéria sobre a cultura, com Noticias/0,,GIM1539830-7823-SORGO+SACARI
duração total de 15 minutos. O programa NO+PODE+REFORCAR+PRODUCAO+DE+ET
relembra o uso do sorgo na década de 1980 e ANOL+BRASILEIRA,00.html
traz as novidades que estão sendo introduzidas
pela Embrapa na Região Sudeste (Embrapa Mi-
lho e Sorgo) e na Região Sul (Embrapa Clima
Temperado). Assista ao vídeo em:

50 Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011


Eventos

A
utilização do sorgo sacarino para produ-
ção de etanol será abordada em alguns
eventos no segundo semestre de 2011.

http://www.cnpms.embrapa.br/

3º Dia Quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Frederico Ozanan Machado Durães


Pesquisador
Embrapa Agroenergia

Agroenergia em Revista ■ Edição 3 ■ Agosto 2011 51

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