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V I S TA
e m RE
Esta é uma publicação da Embrapa Agroenergia Ano II, nº 3, agosto de 2011
Sorgo sacarino:
Tecnologia Agronômica
e Industrial para
Alimentos e Energia
Sorgo sacarino:
Editorial tecnologia agronômica e
industrial para alimentos
e energia
Aliado às espécies oleaginosas com domínio tec- No foco de desenvolvimento de tecnologia agronô-
nológico, como amendoim, girassol, soja e adubos mica são tratados, basicamente, três aspectos: a) o
verdes (Crotalaria juncea L.), o sorgo sacarino tem melhoramento, genética e desenvolvimento de cul-
grande potencial para expansão de cultivo em zo- tivares (variedades e híbridos); b) boas práticas agrí-
nas tradicionais e novas do setor sucroalcooleiro. E, colas e temas especiais dos sistemas de produção;
a produção de etanol de sorgo sacarino deverá ser e, c) descritores de planta (com viés biológico) para
expandida em complementação ao etanol de cana- fins energéticos.
-de-açúcar. Estudos e estimativas demonstram que
se buscam opções para a reforma de 10-15% de Em desenvolvimento de tecnologia industrial focam-
área anual de cana-de-açúcar, que possam amorti- -se outros três temas: a) a caracterização da matéria-
zar cerca de 30-40% do custo de implantação de um -prima (viés industrial) para fins energéticos, nas ro-
novo canavial. A rotação de culturas na reforma me- tas de produção de etanol (1ª-geração tecnológica),
lhora em até 20% a produtividade do canavial. E, a e biomassa para fins diferenciados (etanol de ma-
seleção de espécies de expressão econômica deve terial lignocelulósico ou 2ª-geração, cogeração de
contribuir para atender aos interesses de produção energia, alimentação de animais ruminantes, biofer-
de alimentos e energia. tilizantes e coprodutos – novas moléculas, materiais,
etc.); b) os processos de conversão “per se”, tais
Além de atender a uma forte e crescente demanda como protocolos analíticos de referência e utilidades
do mercado por informações e negócios competiti- para rotas tecnológicas diferenciadas; e, c) arranjos
vos para o sorgo sacarino, equipes de pesquisado- (institucionais, técnico-científicos e produtivos) vi-
res e técnicos da Embrapa, em parceria organizada, sando a inserção do sorgo sacarino no complexo
tem sistematizado dados e discussões sobre o tema, do setor sucroenergético, abordando reforma de
em três vertentes, a saber: desenvolvimento de tec- canavial, plantio de entressafra da cana, cogeração,
nologia agronômica, tecnologia industrial e em estu- e scale up de maquinaria agronômica e industrial,
dos transversais (ciclo de vida, balanços de massa e dentre outros temas.
de energia, economia de água e de carbono, socio-
economia, etc.). Decididamente, neste cenário de competitividade
agroindustrial do setor sucroenergético, a lei de La-
A coleta e organização de dados e informações, a voisier é, por certo, mais adequada e robusta que
divulgação técnica, a transferência de tecnologia e os ditames de Caminha, em sua histórica carta ao
os negócios competitivos, demonstram o acervo de Rei de Portugal, anunciando o descobrimento da
conhecimento à disposição do mercado, bem como Terra de Vera Cruz (Brasil) e registrando “em nela
objetivam analisar e divulgar o esforço acumulado se plantando tudo dá”. E, a inserção do sorgo saca-
e corrente que a Embrapa realiza em seus laborató- rino neste setor sucroenergético, por certo, deverá
rios e campos experimentais. Apontam ainda, para acontecer pela observância disciplinada e integrada
novas parcerias internas e externas, e para os pro- da gestão da inovação.
cedimentos em busca de melhorias no domínio tec-
nológico nas áreas de interesse para a inserção do Empreendedorismo, PD&I (pesquisa, desenvolvi-
sorgo sacarino no rol de matérias-primas do setor mento e inovação), governança, negócio público-
sucroenergético do Brasil. Atualmente, novos mode- -privado e atividade agroindustrial estão entre as
los de transferência de tecnologia e de negócios tec- palavras-chave deste negócio temático. Ou, em sín-
nológicos estão em andamento, na parceria público- tese, reportando-se às falas de duas eminências da
-privada, para o cumprimento desta agenda. gestão pública e da ciência agropecuária – respec-
tivamente, ex-Ministro do MAPA Alysson Paulinelli,
Em AGROENERGIA em revista, edição 3, de Agosto e ex-Presidente da Embrapa Doutor Eliseu Roberto
de 2011, técnicos e gestores tratam a temática SOR- de Andrade Alves – que cunharam preciosidades em
GO SACARINO: Tecnologia agronômica e industrial momentos críticos - em termos de Agroenergia, ou
para a produção de alimentos e energia. Esta edição qualquer um de seus programas, o Brasil (ou o em-
objetiva condensar um considerável acervo de infor- presariado) precisa de “investimentos e juízo” .
mações técnicas e gerenciais sobre o sorgo sacarino
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2 Editorial
6 Sorgo sacarino na Embrapa: histórico, importância e usos
7 Sorgo sacarino: desenvolvimento de tecnologia agronômica
8 Melhoramento genético do sorgo sacarino
10 Genômica do sorgo sacarino e análise de marcadores genéticos moleculares para características de
interesse agronômico e industrial
12 Seleção genômica como estratégia do melhoramento de sorgo sacarino para altas performances
20 Zoneamento de áreas aptas para o plantio de sorgo sacarino na época de entressafra de cana-de-açúcar
no Brasil
S
orgo (Sorghum bicolor L. Moench) é nati- cesso da produção nacional de etanol a partir de
vo da África e algumas variedades atuais cana-de-açúcar. Com o Pró-Álcool, a Embrapa
são originárias do continente africano. Milho e Sorgo iniciou um programa de melho-
Iniciativas de introdução desta gramínea no ramento de cultivares de sorgo sacarino com o
Brasil foram realizadas em eras diferentes, mas objetivo de desenvolver cultivares destinadas à
contam os esforços de institutos de pesquisa e produção de álcool, principalmente por peque-
universidades, sobretudo a partir da década de nas destilarias. Devido à eliminação dos incen-
1950. A Embrapa iniciou um programa de me- tivos governamentais às pequenas destilarias
lhoramento de sorgo em meados da década de na década de 80, o programa de melhoramento
1970, acreditando no potencial desta cultura no do sorgo sacarino foi desacelerado na Embra-
país, e hoje a área plantada de sorgo no Brasil pa. Entretanto, mais recentemente, e de acor-
é de aproximadamente 1,5 milhões de hectares. do com o Plano Nacional de Agroenergia (PNA
2006-2011), a Embrapa tem priorizado o de-
O sorgo, nos diferentes tipos (granífero, forragei- senvolvimento de cultivares de sorgo sacarino
ro e sacarino), apresenta-se como uma espécie (produção de etanol de 1ª-geração e resíduos)
bem adaptada a ambientes extremos de estres- e de sorgo-energia (biomassa diferenciada para
ses abióticos, especialmente, de temperatura características lignocelulósicas para fins energé-
do ar e umidade do solo. Este comportamento ticos , com foco em etanol de 2ª-geração ou co-
de rusticidade às condições ambientais confere geração de energia).
ao sorgo condições favoráveis à sua adaptação
em relação a outras espécies comerciais. Apesar Este novo foco requer que o programa de me-
deste fato, o sorgo é responsivo às boas práti- lhoramento da Embrapa seja redimensionado,
cas agrícolas e de manejo da cultura, e, portan- de forma a permitir o desenvolvimento das ati-
to, passível de inovação tecnológica competitiva vidades de PD&I nesta área. Vários projetos na-
para a sua utilização e usos. cionais e internacionais já foram aprovados na
área de sorgo para bioenergia, e parcerias com
Com a implementação do Programa Pró-Álcool, várias instituições tem contribuído no avanço do
em meados da década de 1970, o Brasil tem se programa de melhoramento, manejo, e utiliza-
tornado um dos países pioneiros no uso de bio- ção de sorgo sacarino para fins agroindustriais
energia, e é uma referência mundial com o su- e energéticos.
Fotos: André May
desenvolvimento de
sa verde, utilizando-se a mesma tecnologia utilizada
nas usinas (homologada pelo Consecana). Ainda ve-
rificam-se que é possível ajustar a mesma estrutura
tecnologia agronômica para colheita e processamento da biomassa (moa-
gem, fermentação e destilação) utilizada para cana-
-de-açúcar.
Por: Frederico O. M. Durães, Chefe-Geral
Embrapa Agroenergia Adicionalmente, o sorgo sacarino produz grãos
(2,5 t.ha-1), que apresentam características nutricio-
nais similares às do milho, podendo ser utilizados
E
m um processo agrícola, o ordenamento ter- na alimentação humana ou animal.
ritorial, a genética e cultivares modificadas, as
boas práticas agrícolas e as associações bióticas Dados técnicos mostram possibilidades de produção
e abióticas visando ganhos de produtividade, bem de etanol de sorgo sacarino na entressafra da cana-
como os arranjos produtivos são passíveis de com- -de-açúcar. Plantios realizados no início do período
plexos empreendimentos técnicos e legais. chuvoso (out/Nov) tornam possível a antecipação de
2 a 3 meses do período de moagem das usinas, com
Em termos de matérias-primas produtoras de açúcar colheitas a partir de fevereiro e março, reduzindo
e processos de produção de etanol, a inovação está
assim, o período de ociosidade das destilarias, que
centrada em dois grandes desafios técnico-científicos
varia de 3 a 5 meses, com impactos positivos na ge-
e gerenciais. Um primeiro é o aumento da densidade
ração de receitas.
energética, que pode ser explorado na biodiversida-
de, na construção de associações biológicas dentro É fato corrente que setores da agroindústria cana-
de espécies, ou mesmo na utilização de processos vieira, incluindo fazendas de cana e indústria de
físicos, químicos ou biológicos. Neste enfoque são
maquinarias agronômica e industrial para proces-
exemplos diferenciados o desenvolvimento de novas
sos de conversão, tem procurado avaliar o sorgo
cultivares modificadas de cana-de-açúcar, por me-
sacarino com foco em novos negócios, visando
lhoramento genético convencional e biologia avança-
da, e a utilização de matérias-primas alternativas ou maior competitividade e sustentabilidade do setor
complementares, com domínio tecnológico, como é sucroenergético.
o caso do sorgo sacarino – Sorghum bicolor (L.) Mo-
O sorgo sacarino é uma espécie agrícola rústica, com
ench. Um segundo desafio trata da eficiência das tec-
boa adaptação a estresses ambientais, p.ex., tempe-
nologias de aproveitamento do conteúdo energético.
ratura e umidade); entretanto, ela é responsiva para a
Adicionalmente, os setores de pesquisa e produtivos aplicação de insumos modernos (p.ex., água, corre-
buscam alternativas para questões de maior uso e tivos e fertilizantes) em fases críticas do crescimento
eficiência dos recursos da natureza, incluindo os fa- e desenvolvimento da cultura. A disponibilidade de
tores clássicos de produção (terra, capital e trabalho) sementes de qualidade de cultivares (domínio da ge-
e os itens modernos de competitividade (inovação, nética de variedades e híbridos adaptados) é impres-
insumos modernos como agroquímicos fertilizantes cindível para ganhos de produtividade e rendimen-
e protetivos, biofertilizantes, economia de água, eco- to, e adequadas técnicas de plantio e de manejo da
nomia de carbono, oportunidade social de uso dos cultura (p.ex., profundidade de plantio) são limitantes
recursos, viabilidade econômico-financeira e empre-
para a melhor performance agronômica e produtiva.
sarial, etc.).
A formação de caldo e a produção de açúcares totais
O setor sucroenergético busca empreender novas e sacarose, bem como a tipificação dos resíduos, ca-
agendas e modelos produtivos, orientados por mar- recem de cuidados quanto à aplicação de processos
co regulatório firme, visando aumentar a competiti- técnicos e industriais que permitam a maximização
vidade e os ganhos de produtividade agroindustrial. de resultados econômicos. Estes procedimentos são
relevantes ao êxito do empreendimento e requer do
O sorgo sacarino apresenta colmos com caldo seme-
agricultor, canavieiro ou industrial uma adequada go-
lhante ao da cana, rico em açúcares fermentescíveis,
vernança (gestão, administração e parceria) para a
e pode servir para a produção de etanol na mesma
instalação utilizada pela cana-de-açúcar. Trata-se de sua atividade empresarial.
uma espécie de ciclo rápido (quatro meses), cultura
totalmente mecanizável (plantio por sementes, tratos No foco de desenvolvimento de tecnologia agronô-
culturais e colheita), alta produtividade de biomassa mica são tratados, basicamente, três aspectos: a) o
verde (60 a 80 t.ha-1), com altos rendimentos de eta- melhoramento, genética e desenvolvimento de cul-
nol (3.000 a 6.000 l.ha-1), com bagaço utilizável como tivares (variedades e híbridos); b) boas práticas agrí-
fonte de energia (vapor para industrialização e coge- colas e temas especiais dos sistemas de produção; e,
ração de eletricidade). Observam-se resultados de c) descritores de planta (com viés biológico) para fins
50 a 77 litros de etanol por tonelada de massa verde energéticos.
O sorgo sacarino [Sorghum bicolor (L.) Moen- No início dos anos 80, o Centro Nacional de Pes-
ch] é um tipo de sorgo com alto potencial for- quisa de Milho e Sorgo (CNPMS) selecionou seis
rageiro. Ele se assemelha à cana-de-açúcar, por variedades de sorgo sacarino – BR 500, BR 501,
apresentar colmos suculentos com altos teores BR 502, BR 503, BR504 e BR505 – derivadas das
de açúcares fermentescíveis. O sorgo sacarino variedades Rio, Brandes, Roma, Theis, Dale e
pode oferecer, dentre outras, as seguintes van- Wray, respectivamente, todas com produtivida-
tagens: rapidez no ciclo (quatro meses); cultura de de colmos superior a 40 t ha-1 e teor de sóli-
totalmente mecanizável, desde o plantio até a dos solúveis médios entre 18 e 20º Brix.
colheita; produção de grãos em torno de 2,5 t
ha –1, que podem ser utilizados para alimentação Posteriormente, em 1987, as primeiras varieda-
humana, animal ou para a produção de biocom- des brasileiras foram desenvolvidas com poten-
bustível; utilização do bagaço como fonte de cial para produção de etanol, sendo o BRS 506 e
energia para industrialização, cogeração de ele- BRS 507, e o híbrido BRS 601. Nessa época, pro-
tricidade ou forragem para animais, contribuin- jetos pilotos foram desenvolvidos em Sete La-
do para um balanço energético favorável. Além goas-MG, Brasília-DF, Jundiaí-SP e Pelotas-RS,
disso, esta cultura pode ser utilizada para forne- para processar sorgo sacarino em microdestila-
cimento de matéria-prima durante a entressafra rias, e a tecnologia proposta para a produção de
de cana-de-açúcar nas destilarias, que vai de etanol a partir de sorgo foi validada nestes pro-
dezembro a abril, e, assim, reforçar a produção jetos-piloto. Contudo, com o insatisfatório êxito
nacional de etanol e reduzir o período de ocio- do Pro-Álcool e da política nacional direcionada
sidade das destilarias. Ainda, a cultura do sorgo para grandes destilarias, o foco das pesquisas
se sobressai em regiões marginais com baixa com sorgo sacarino foi redirecionado para a
precipitação e solos ácidos, onde não se produz produção de cultivares forrageiras, provocando
cana, devido ao sorgo apresentar mecanismos um intervalo no desenvolvimento tecnológico
de tolerância à seca e ao alumínio tóxico, bem do sorgo sacarino. Como as cultivares lançadas
como eficiência na utilização de nutrientes. apresentavam boa produtividade e qualidade de
matéria verde, estes produtos se mantiveram
A Embrapa Milho e Sorgo (CNPMS) iniciou um no mercado, comercializados como forrageiras.
programa de desenvolvimento de cultivares de Atualmente apresentam-se como cultivares de
sorgo sacarino depois da implantação do Pró- dupla aptidão, sacarina e forrageira.
-Álcool, na década de 70, antecipando uma crise
energética. Neste período, houve forte incentivo A Embrapa Milho e Sorgo reiniciou seu programa
do Governo Federal para o desenvolvimento de de desenvolvimento de cultivares de sorgo saca-
micro e minidestilarias com capacidade de 100 rino a partir de 2008, devido ao potencial desta
a 1000 L hr –1, respectivamente, as quais utiliza- cultura na geração de energia renovável e devido
riam o sorgo sacarino como matéria-prima. Ini- à grande demanda por matéria-prima alternativa
cialmente foram introduzidos 50 genótipos de para a produção de etanol nas grandes destilarias.
sorgo sacarino do Departamento de Agricultura O programa de melhoramento da Embrapa Milho
dos Estados Unidos (USDA), África e Índia, os e Sorgo visa o desenvolvimento de variedades e/
quais foram caracterizados agronomicamente, ou híbridos de sorgo sacarino e estabeleceu as
além de ser estabelecido o seu período de utili- seguintes metas de produtividade e qualidade:
zação industrial (PUI). produtividade mínima de biomassa – de 60 t.ha-1
▲Na foto o autor do artigo, ao lado de uma lavoura experimental de sorgo sacarino
A
seleção de culturas dedicadas à bioener- rios países, permitirá o uso de técnicas de mape-
gia contendo características composicio- amento por associação, que apresentam resolu-
nais de parede celular que sejam favorá- ção superior a outros métodos de mapeamento.
veis ao processo de conversão de biomassa é O ressequenciamento genômico dessas popula-
importante para tornar a produção de biocom- ções e painel constituirá um grupo de dados de
bustíveis de segunda geração economicamente grande aplicabilidade para o descobrimento de
viável. A implementação de seleção assistida alelos superiores e desenvolvimento de marca-
por marcadores nos programas de melhoramen- dores moleculares relacionados a um sorgo de
to em culturas dedicadas à bioenergia deverá melhor qualidade para produção e conversão
acelerar o desenvolvimento de novas cultivares em etanol. Entretanto, para o aproveitamento
com alta biomassa e composição adequada aos dos dados de variabilidade genética oriundos
processos de produção de biocombustíveis. do ressequenciamento genômico, o desenvolvi-
mento e aplicação de técnicas que permitam a
Na área de genômica se encontra o maior po- fenotipagem em larga escala, como análise de
tencial de descoberta de marcadores molecula- composição de parede celular e teor de açúca-
res para características relacionadas ao uso do res no caldo, se faz necessária. Colaborações
sorgo para produção de bioenergia, alimentação
em andamento com universidades brasileiras e
animal de melhor qualidade e na indústria quími-
americanas permitirão a caracterização da pare-
ca. Novos métodos de sequenciamento em lar-
de celular de sorgo nos mesmos painéis a serem
ga escala, mais econômicos e rápidos, poderão
ressequenciados, abrindo novas perspectivas
identificar marcadores mais próximos aos genes
para o melhoramento genético de sorgo.
de interesse sem que haja necessidade de uti-
lização de técnicas de mapeamento laboriosas.
Como exemplo, o re-sequenciamento dos geno- O objetivo do programa de melhoramento de
mas de todos os indivíduos de duas populações sorgo da Embrapa é usar estratégias para se-
de linhagens recombinante de sorgo (RILs, F10) e lecionar e produzir genótipos de sorgo que
de um painel diverso, está em andamento, por demonstrem características favoráveis para a
meio de uma colaboração da Embrapa Milho e produção de biocombustíveis. Na Embrapa,
Sorgo com o Instituto de Diversidade Gênomica abordagens clássica e molecular estão sen-
(IGD), pertencente à Cornell University, EUA. do utilizadas no programa de melhoramento
de sorgo para bioenergia, incluindo menor e
Uma das populações segrega para colmo seco maior teor de lignina (Figura). Uso de técnicas
ou com caldo e teor de açúcares no caldo, en- genômicas, como as desenvolvidas em par-
quanto que a segunda população segrega para ceria com a Cornell University para re-sequen-
tolerância à toxicidade por alumínio, além de ca- ciamento de populações de mapeamento, e
racterísticas relacionadas à biomassa, tais como análise de expressão gênica para característi-
presença de caldo, altura e composição de pare- cas envolvidas com a qualidade da biomassa
de celular. ou concentração de açúcares tem o potencial
de orientar em qual direção o programa de me-
O ressequenciamento do painel diverso, cujos lhoramento deve focar para obter predição de
materiais originam-se de coleções núcleo de vá- ganhos de seleção dessa característica.
I
nicialmente, o sorgo sacarino tem sido reco- seja feito em breve período de tempo, já que o
mendado para cultivo em áreas de reforma de escalonamento de semeio deve estar intrinsica-
canaviais, visando fornecer matéria-prima para mente relacionado à demanda de matéria-prima
a produção de etanol na entressafra de cana-de- entre os meses de março e abril, associado ao
-açúcar no Brasil. O semeio é recomendado, período de utilização industrial (PUI) das cultiva-
para a maioria das áreas produtoras de cana (re- res de sorgo sacarino, que, geralmente, gira em
giões Centro-Oeste e Sudeste), entre os meses torno de 30 dias.
de novembro e dezembro e a colheita é progra-
mada para março e abril, justamente quando a A profundidade de semeadura deve ser motivo
cana ainda não apresenta elevados valores de de atenção redobrada, principalmente em so-
Brix, inviabilizando seu corte. los argilosos, não devendo ultrapassar cerca de
2 cm. Normalmente, utiliza-se para semear um
Sendo assim, para que se consiga adequado hectare cerca de 8 kg de sementes.
desenvolvimento da lavoura, almejando altas
produtividades de biomassa e, consequente- Como as áreas de implantação de sorgo sacari-
mente, elevada produção de caldo por hectare no advêm de anos de cultivo de cana, o produ-
cultivado, a lavoura de sorgo sacarino demanda tor rural deverá estar atento a vários problemas
os mesmos preceitos recomendados para qual- inerentes a essas áreas, como compactação de
quer cultura, como adequado preparo de solo, solo, reconstrução de terraços, baixa fertilidade
boa fertilização de base e cobertura, controle de do solo, etc., que devem ser equacionados antes
plantas daninhas e pragas. do semeio do sorgo, pois após a sua colheita,
nova área de cana deverá ser implantada.
Em decorrência das áreas potencialmente dis-
poníveis para o cultivo da espécie (áreas de so- Novas pesquisas estão em andamento visando
queira de cana), o primeiro passo a ser seguido esclarecer adequadamente as exigências nutri-
é, sem dúvida alguma, uma boa amostragem cionais do sorgo sacarino, contudo, sabe-se que
de solo (nas profundidades de 0-20 e 20-40 cm, é uma espécie exigente, quando se pretendem
conforme o caso), visando avaliar adequada- elevadas produtividades de biomassa, depen-
mente qual a dose a ser aplicada de calcário e dendo, inclusive, da cultivar utilizada.
dos nutrientes, e se há a necessidade de corre-
ção do solo em subsuperfície.
O
estabelecimento de condições ótimas sagem. Essa estratégia torna o ambiente edáfico
para a produção de sorgo (sacarino, for- favorável ao maior aprofundamento do sistema
rageiro ou granífero) envolve o reconhe- radicular, amenizando os efeitos detrimentais
cimento e manejo de diversos fatores. As intera- dos períodos de déficit hídrico sobre a produti-
ções entre as características de solo, do clima, do vidade.
sistema de rotação/sucessão de culturas, época
de plantio, cultivar, adubação e tratos fitossani- Desse modo, a fertilidade dos solos, a nutrição
tários são determinantes do potencial produtivo. e adubação são componentes essenciais para a
construção de um sistema de produção eficien-
Os esforços para aprimoramento dos sistemas te. A disponibilidade de nutrientes deve estar
de produção de sorgo sacarino devem conside- sincronizada com o requerimento da cultura, em
rar que a contribuição de cada um dos fatores quantidade, forma e tempo.
mencionados varia amplamente de uma região
para outra e no tempo. As recomendações ide- Um programa racional de adubação envolve as
ais de manejo são sítio-específicas e, preferen- seguintes considerações:
cialmente, deveriam ser baseadas em informa-
ções oriundas de estudos locais. • Diagnose da fertilidade do solo;
(1)
Nutrientes extraídos
Matéria Seca Total Grãos
N P K Ca Mg
Kg/ha % Kg/ha
7.820 37 93 13 99 22 8
(1)
Foto: Cynthia Maria Borges Damasceno
Para converter P em P2O5, K em K2O, Ca em CaO e Mg em MgO, multiplicar por 2,29, 1,20, 1,39 e 1,66,
respectivamente.
Fonte: Embrapa Milho e Sorgo.
S
orgo sacarino representa uma alternativa elaborado a partir da integração espacial entre o
promissora para a produção de etanol no mapa resultante do zoneamento agroecológico
Brasil, na época de entressafra da cana-de- da cana-de-açúcar (Manzatto et al., 2009) e os
-açúcar. Plantado entre os meses de setembro e mapas resultantes da representação geográfica
dezembro (dependendo da região produtora), o dos municípios aptos para o plantio de milho de
sorgo sacarino pode fornecer matéria-prima de ciclo normal em solo argiloso, entre os meses de
qualidade entre os meses de janeiro a abril, épo- outubro e dezembro (MAPA, 2011).
ca em que as usinas de beneficiamento da cana
ficam ociosas e a produção de etanol diminui O zoneamento agroecológico da cana-de-açúcar
consideravelmente no país. Sendo o processa- resultou da identificação de áreas com aptidões:
mento dos colmos o mesmo já utilizado para a climática (análise do risco climático) e pedológi-
cana-de-açúcar, sorgo sacarino representa uma ca para a cultura de cana-de-açúcar, em que a
alternativa importante para plantio em áreas de destinação da terra para uso agrícola não apre-
reforma de canaviais, sem a necessidade de ocu- sentava restrições ambientais. O zoneamento
pação de novas áreas (Sorgo sacarino, 2011). de risco climático de plantio de milho de ciclo
normal baseia-se na análise de risco climático
A identificação de áreas aptas para a produção (aptidão climática) para o plantio de milho. Es-
de etanol em época de entressafra da cana-de- tas análises foram baseadas em estudos pro-
-açúcar torna-se extremamente importante, for- babilísticos de ocorrência de fatores adversos
necendo subsídios para a futura definição de para o desenvolvimento de cada cultura consi-
estratégias de gestão territorial e formulação de derada, baseados em séries históricas de dados
políticas públicas que possibilitem a produção climáticos registrados em estações meteoroló-
de etanol em épocas de renovação dos plantios gicas do país. Na análise, fatores adversos re-
de cana-de-açúcar, tornando ativas usinas de presentam riscos de ocorrência de geadas, de
beneficiamento que estariam paradas no perío- veranicos ou de ocorrência de quantidade insu-
do. Objetivando identificar áreas potencialmente ficiente de água no solo para suprir a demanda
aptas para a produção de etanol nos meses em hídrica da cultura considerada em cada fase do
que a produção de etanol normalmente diminui, seu desenvolvimento. A identificação de áreas
foi elaborado um mapa indicando locais poten- com aptidão pedológica ou edáfica baseou-se
cialmente aptos para o plantio de sorgo sacarino na estimativa do potencial de produção agrícola
em época de entressafra da cana-de-açúcar. de cada classe de solo para a cultura de cana-
-de-açúcar sob um determinado tipo de manejo
Estima-se que a exigência hídrica do sorgo saca- da cultura, considerando características físicas e
rino para a obtenção de produção de etanol com fisiográficas da classe de solo. Para tanto, foram
brix do caldo entre 15 e 20% seja semelhante à avaliados seis fatores de limitação: deficiência
do milho de ciclo normal. Considerando o plan- de fertilidade, deficiência de água, excesso de
tio de sorgo sacarino em locais indicados para água ou deficiência de oxigênio, suscetibilida-
a produção de cana-de-açúcar, o zoneamento de a erosão, impedimentos à mecanização e
de áreas aptas para o plantio de sorgo sacarino impedimentos ao desenvolvimento do sistema
em época de entressafra de cana-de-açúcar foi radicular. Áreas com declividade superior a 12%
O
consumo crescente de combustíveis fós- e, com o apoio de programas do Governo Fede-
seis frente às reservas existentes e as pre- ral, o setor experimentou uma forte expansão a
visões alarmantes de mudanças climáti- partir de 2006. Entretanto, mesmo com os ga-
cas devido ao aquecimento global, causado em nhos de produção e produtividade expressivos,
sua maioria, pela emissão de dióxido de carbono a produção brasileira de cana ainda não acompa-
a partir da queima desse combustível, sinalizam nha o ritmo de crescimento da demanda por eta-
para os governos a necessidade de alteração da nol e açúcar, interna e externamente. Para aten-
matriz energética mundial. der o consumo, o setor necessita crescer cerca
de 7% ao ano e pode piorar nos próximos anos
Neste quadro, o Brasil tem se destacado pelo de acordo com especialista no assunto. Com o
grande potencial para agricultura de energia ou agravante de uma sequência de safras frustra-
agroenergia para a produção de biocombustí- das pelo clima, baixos investimentos e produti-
veis. O país acumulou importante experiência vidades pressionadas pelo envelhecimento dos
na produção de álcool como combustível e a canaviais, os estoques brasileiros praticamente
agricultura tem se mostrado como uma das al- baixaram muito, enquanto as vendas de veícu-
ternativas viáveis para oferta energética susten-
los flex cresceram. Por exemplo, entre janeiro a
tável. Atualmente o país é um dos mais tradicio-
março de 2011, as vendas de veículos subiram
nais produtores de cana-de-açúcar do mundo,
cerca de 8%, com a venda de cerca de 900 mil
estando em posição privilegiada em relação aos
veículos no primeiro trimestre, segundo a Anfa-
demais países produtores, por deter avançado
vea, contra cerca de 836 mil no mesmo período
conhecimento do processo produtivo da cultura
e ao mesmo tempo, do ponto de vista tecnoló- de 2010.
gico, no uso do etanol como alternativa energé-
Preocupado com expansão desordenada do
tica.
setor, em 2009, o Governo Federal estabeleceu
A cana-de-açúcar foi introduzida no Brasil por novas regras de expansão da agroindústria ca-
Martin Afonso de Souza em 1532 com a finalida- navieira através do Zoneamento Agroecológi-
de de produzir açúcar para o mercado Europeu. co Nacional da Cana-de-açúcar (ZAE Cana), um
Cerca de 400 anos depois, em 1925, realizou- trabalho pioneiro que orientou a formulação de
-se uma experiência com um veículo movido políticas públicas para o setor sucroenergético.
a álcool no Brasil, revelando a potencialidade O ZAE Cana inovou ao adotar critérios econô-
deste combustível. Essa experiência subsidiou, micos, ambientais e sociais que contribuam
em 1975, o lançamento do Programa Proalco- para um modelo sustentável de expansão dessa
ol, como alternativa energética para a a crise agroindústria no Brasil.
de abastecimento de petróleo da época. Neste
momento, o país começou a trilhar o caminho O estudo não se limitou a definir as regiões onde
da liderança tecnológica no setor de biocombus- a produção é economicamente viável, como faz
tíveis, sendo que o Brasil detém atualmente as o zoneamento agrícola de outras culturas que
melhores técnicas para o plantio e colheita da considera apenas as condições de clima e solo.
Por: Édson Luis Bolfe, Chefe Adjunto de P&D da Embrapa Monitoramento por Satélite
A
tualmente as geotecnologias desempe- ▼Fotografia aérea oblíqua de 16/12/2010 da
nham um relevante papel no planejamen- região de Cosmópolis, SP.
to físico-rural de propriedades agropecu-
árias. A utilização de sistemas de informações
geográficas (SIG), sistemas de posicionamento
global por satélite (GPS), imagens de satélite e
fotografia aéreas possibilitam caracterizar dife-
rentes componentes vegetais de culturas agríco-
las isoladas ou consorciadas. Isto é possível por
meio da obtenção de dados de sensores remotos
com diversas resoluções espectrais, temporais
E
m um processo industrial que usa matéria- lidade tecnológica do sorgo sacarino (enfoque
-prima sacarídea para a produção de açúcar tecnológico para processos e aproveitamento
e etanol, a moagem dessa matéria-prima, a industriais).
filtração, a fervura/centrifugação do caldo/mela-
do, a adição de químicos, a fermentação e a des- Em desenvolvimento de tecnologia industrial
tilação resultam na transformação nos produtos focam-se outros três temas:
principais.
• A caracterização da matéria-prima (viés in-
Em termos de matérias-primas produtoras de dustrial) para fins energéticos, nas rotas de
açúcar e de etanol, a inovação está centrada em produção de etanol (1ª-geração tecnológica),
dois grandes desafios técnico-científicos e ge- e biomassa para fins diferenciados (etanol de
renciais. Um primeiro é o aumento da densida- material lignocelulósico ou 2ª-geração, co-
de energética e a utilização de matérias-primas geração de energia, alimentação de animais
alternativas ou complementares, com domínio ruminantes, biofertilizantes e coprodutos –
tecnológico, como é o caso do sorgo sacarino novas moléculas, materiais, etc.);
– Sorghum bicolor (L.) Moench. Um segundo • Os processos de conversão “per se”, tais
desafio trata da eficiência das tecnologias de como protocolos analíticos de referência e
aproveitamento do conteúdo energético. Neste utilidades para rotas tecnológicas diferencia-
campo, transitam as questões sobre o aumen- das; e,
to da eficiência no processo industrial conven-
• Arranjos (institucionais, técnico-científicos e
cional (pré-tratamento, fermentação, destila-
produtivos) visando a inserção do sorgo sa-
ção, biodigestão da vinhaça, entre outros); bem carino no complexo do setor sucroenergéti-
como, questões sobre o domínio de novos pro- co, abordando reforma de canavial, plantio
cessos em rotas tecnológicas de conversão de de entressafra da cana, cogeração, e aprovei-
biomassa em energia (hidrólise ácida e enzimá- tamento ou adaptação de maquinaria agro-
tica, termoquímica, gaseificação, dentre outros). nômica e industrial, dentre outros temas.
Inovação é o argumento que norteia estas no- Em termos competitivos e sustentáveis, o ge-
vas buscas e novos negócios. E, atualmente, renciamento dos arranjos institucionais, técnico-
a Embrapa está focada nestas parcerias para -científicos e produtivos é definidor da estratégia
negócios competitivos, embasada na demons- e oportunidade para a produção e utilização do
tração de resultados da experiência agronômi- etanol e cogeração de energia. E, a administra-
ca e progressos na genética, boas práticas de ção do conhecimento e da disponibilidade das
manejo da cultura e inserção profissional para matérias-primas, processos e arranjos constitui-
as oportunidades de processos de conversão -se no elemento operacional fundamental para
industrial. Adicional e complementarmente, justificar as vantagens comparativas de unida-
são relevantes as informações sistematizadas des industriais, empresas, regiões, ou países no
sobre a caracterização de matéria-prima e qua- negócio sucroalcooleiro.
Foto: RGB Comunicação
C
om as preocupações crescentes de poluição lizar economicamente a destilação deste produto.
ambiental, segurança energética e futuros su- Quanto às demais frações do sorgo, para que haja
primentos de petróleo, a comunidade global aproveitamento máximo destas em processos rá-
está buscando combustíveis alternativos para au- pidos, com pouca ou nenhuma geração de resídu-
mentar a eficiência do uso de energia. Ao contrário os e elevados rendimentos, é desejável que o teor
dos combustíveis fósseis, o etanol é uma fonte de de lignina seja mínimo.
energia renovável produzida através da fermenta-
ção de açúcares. Atualmente, o país enfrenta um Vários estudos mostram que os principais açúca-
momento em que é necessário aumentar a pro- res livres no caldo de sorgo sacarino são: glico-
dução de etanol para atender a demanda interna se, sacarose e frutose. O sorgo sacarino possui
e externa. Além disso, o elevado preço do etanol maior teor de açúcares redutores em comparação
durante a entressafra da cana-de-açúcar também é com caldo de cana, entretanto estudos apontam
um fator relevante apresentado no cenário brasilei- que não há diferença significativa entre a quanti-
ro. Diante deste quadro, diversas culturas energéti- dade total de açúcares solúveis. Desta forma, os
cas estão sendo buscadas para produção de álcool métodos analíticos e os parâmetros utilizados para
carburante. Dentre elas, vem se destacando o sor- o estabelecimento de indicadores de controle de
go sacarino, uma fonte potencial para baixo custo qualidade, podem ser os mesmos utilizados para
de produção de biocombustíveis. a cana-de-açúcar, entre eles: sólidos solúveis (Brix
em %), sacarose (Pol do caldo em %), fibra indus-
A utilização de sorgo sacarino para a produção de trial na cana (%), pureza do caldo (%), porcenta-
etanol tem sido profundamente investigada e o gem bruta de açúcar (PCC), pH.
desenvolvimento de novas variedades e híbridos
vem sendo realizado com o objetivo de aumentar a Seguindo a mesma linha, pode-se estender as
produção de etanol por hectare. O aproveitamento mesmas metodologias empregadas para avaliar
de toda a matéria-prima (caldo, bagaço e folhas) é a cana-de-açúcar para o etanol de sorgo sacarino
um dos fatores mais importantes para viabilizar a de segunda geração. Os métodos analíticos para
produção de etanol. A composição de cada uma avaliação de biomassa lignocelulósica devem pos-
destas frações definirá as etapas do processo a ser sibilitar a quantificação dos açúcares estruturais
utilizado para a conversão da biomassa em etanol. provenientes da celulose e hemicelulose. Desta
forma, as metodologias utilizadas para a análise do
Como a matéria-prima representa o início da ca- bagaço do sorgo sacarino podem ser as mesmas
deia fabril, esta deve ser submetida a um contro- que as desenvolvidas para bagaço de cana-de-açú-
le de qualidade para garantir uma produção com car e milho, como aquelas propostas pelo National
maior rendimento e, portanto, com maior eficiên- Renewable Energy Laboratory (NREL) nos Estados
cia. Para que haja uma uniformidade e controle na Unidos. O NREL desenvolveu uma série de proto-
produção de etanol a partir do sorgo sacarino, a colos com métodos validados para análise de dife-
caracterização do caldo extraído torna-se de gran- rentes tipos de biomassa lignocelulósica os quais
de importância. O bagaço produzido após a moa- estão sendo utilizados pela Embrapa Agroenergia.
gem e extração do caldo também deve ser caracte-
rizado de acordo com a sua finalidade: cogeração Para a produção de etanol a partir do caldo de sor-
de energia ou produção de etanol de segunda ge- go sacarino, as principais análises de controle de
ração. qualidade são aquelas já utilizadas rotineiramente
das usinas. Entretanto, com a viabilização da pro-
O teor de água nos diferentes tipos de sorgo é dução do etanol de celulose, haverá a necessidade
uma característica que deve ser destacada, pois in- de desenvolvimento de métodos analíticos rápidos
fluencia diretamente nos valores de concentração e de menor custo, tanto para a caracterização de
de açúcares fermentescíveis presente no caldo, o biomassa quanto para o monitoramento de parâ-
qual deve ser máximo para que a concentração fi- metros de qualidade dos processos de pré-trata-
nal de etanol seja suficientemente alta para viabi- mento e hidrólise.
A
via fermentativa é o método utilizado na são bastante onerosos. Ex.: palha, madeira, ba-
obtenção de etanol no Brasil e na maior gaço de cana-de-açúcar, bagaço de sorgo saca-
parte dos países do mundo. Por esse rino, resíduos agrícolas e de fábricas de papel.
processo, qualquer produto que contenha uma
quantidade considerável de carboidratos consti- O sorgo sacarino se assemelha à cana-de-açú-
tui-se em matéria-prima potencial para obtenção car, uma vez que armazena de açúcares simples
de etanol. De acordo com os tipos de carboidra- em colmos, gerando após a extração um baga-
tos presentes, as matérias-primas podem ser ço que pode ser usado na geração de energia
classificadas em: térmica ou elétrica ou na produção de etanol
de celulose, quando esse processo for viabiliza-
►Materiais açucarados do. Deste modo, o processamento industrial do
sorgo sacarino para produção de etanol seria o
Contêm açúcares simples, ou seja, carboidratos mesmo já amplamente utilizado nas usinas do
com seis (monossacarídeos) ou doze átomos de país, possivelmente com pequenos ajustes de
carbono (dissacarídeos), como glicose, fruto- processo.
se e sacarose. Estes açúcares são diretamente
fermentados, produzindo etanol, levando, dessa Como em qualquer processo agroindustrial, a
forma, a um processo mais barato. Ex.: cana-de- composição da matéria-prima afeta o rendimen-
-açúcar, beterraba açucareira, melaços e sorgo to da produção de etanol. Nesse caso, o fator
sacarino. mais importante é a quantidade e composição
de açúcares no caldo. No sorgo sacarino, em ex-
►Materiais amiláceos perimentos feitos pela Embrapa Milho e Sorgo,
Contêm carboidratos mais complexos, como o foram encontrados materiais com teor de açúca-
amido, que podem ser quebrados em glicose res solúveis entre 15 e 21%, concentrações mui-
pela hidrólise ácida ou ação de enzimas num pro- to próximas à cana-de-açúcar. Porém uma di-
cesso denominado malteação ou sacarificação. ferença importante está na composição desses
Uma vez que para a produção de etanol a partir açúcares no caldo. Enquanto na cana, estes são
dos materiais amiláceos é necessária esta etapa majoritariamente sacarose, no sorgo sacarino há
adicional no processo, seu uso sempre terá um uma concentração relativamente alta de açúca-
custo da fase industrial mais alto, se comparado res redutores – glicose e frutose. Essa diferença
aos materiais açucarados. Ex.: grãos amiláceos afeta o processo de duas formas: (i) na produção
(milho, trigo, arroz) raízes e tubérculos (batata, de açúcar, o sorgo sacarino teria um rendimen-
batata-doce, mandioca). to menor do que a cana, ou seja, essa matéria-
-prima deverá ser usada especialmente para a
produção de etanol; (ii) na produção de etanol,
►Materiais celulósicos
possivelmente haverá maior risco de contamina-
São constituídos de celulose, e estão disponí- ção, uma vez que as bactérias contaminantes do
veis em grande quantidade, muitos deles sendo, meio normalmente fermentam prioritariamente
inclusive, resíduos agro-industriais. No entanto, a glicose. Portanto, na produção de sorgo saca-
seu uso na produção de etanol não é, por en- rino possivelmente serão necessários cuidados
quanto, economicamente viável, uma vez que adicionais com a contaminação do meio.
para obterem-se açúcares fermentáveis e, por-
tanto, etanol, a biomassa deve passar por um Outra diferença entre o sorgo sacarino e a cana-
processo complexo de pré-tratamento físico quí- -de-açúcar está na composição do bagaço obti-
mico e posterior hidrólise enzimática, que ainda do a partir da extração do caldo. Nos materiais
O
Brasil produziu 28.202 milhões de m3 de zados nos processos fermentativos a partir de
etanol em 2010 (ANP - Anuário Estatístico cana-de-açúcar e sorgo sacarino.
2011) com base na conversão da sacaro-
se da cana de açúcar, o chamado etanol de pri- As leveduras são os microrganismos responsá-
meira geração. No processo a cana de açúcar é veis pela conversão de açúcares a etanol nos
esmagada e o caldo extraído, rico em sacarose, processos fermentativos de produção tanto de
é convertido a etanol pela fermentação alcoóli- cana-de-açúcar como de sorgo sacarino. Leve-
ca. Os talos de cana esmagada, chamado baga- duras do gênero Saccharomyces são utilizadas
ço, são queimados para fornecer eletricidade e na indústria brasileira de etanol e podem ser
vapor para a refinaria de etanol, simultaneamen- consideradas as principais responsáveis pela
te evitando a eliminação de resíduos. Apesar da produção desse combustível no Brasil. As li-
grande produção, a demanda brasileira e mun- nhagens utilizadas na indústria foram selecio-
dial por combustíveis renováveis tem aumenta- nadas ao longo de vários anos e são altamente
do consideravelmente nos últimos anos tanto eficientes na fermentação de sacarose, glicose
por razões econômicas, isto é, preço de com- e frutose presentes nos caldos e extremamente
bustíveis fósseis, como por razões sócio-am- adaptadas à fermentação do caldo de cana de
bientais. Para suprir essa demanda de etanol, açúcar. Fermentações do caldo de sorgo saca-
grandes esforços têm sido feitos para o desen- rino por algumas linhagens de Saccharomyces
volvimento de processos de produção de etanol têm sido realizadas e os resultados demonstram
a partir de biomassas alternativas, incluindo bio- mais uma vez a eficiência dessas linhagens na
massa lignocelulósica, a qual engloba resíduos conversão de açúcares a etanol. A utilização das
agroindustriais, lixo urbano, resíduos florestais, mesmas linhagens para fermentação de caldos
etc. Entretanto, tecnologias para produção de de cana e de sorgo sacarino facilitará a utilização
etanol lignocelulósico ou etanol de segunda ge- deste último em usinas de etanol no país, pois
ração ainda estão sendo desenvolvidas. não existirá a necessidade de desenvolvimento
►Linhagem 7 crescendo
Foto: Carolina Poletto
A
procura de alternativas para produção
de biomassa e energias renováveis é um ▲ Desenvolvimento do sorgo sacarino em
caminho sem volta nos tempos atuais. A espaçamento duplo na Usina Boa Vista
utilização do sorgo sacarino para a produção de (GO), janeiro de 2011.
etanol é conhecida já há algum tempo no país.
Há quatro décadas, no início do PROALCOOL,
essa alternativa foi pesquisada e estava volta- carino, principalmente ao conseguir-se também
da principalmente às microdestilarias. Recente- aumentar o período útil de industrialização (PUI).
mente, essa possibilidade foi reativada devido à
crescente demanda de etanol e bioeletricidade. Suas características de altos teores de açúca-
res redutores (AR%) e, consequentemente, de
São vários os atrativos que fizeram os produ- baixos níveis de pureza (proporção de sacarose
tores e usinas de cana-de-açúcar a testar nova- em relação aos sólidos solúveis totais), além das
mente o sorgo sacarino para aumentar a oferta
suas altas concentrações de amido, não nos per-
de etanol, assim como verificar se o seu pro-
mite a fabricação de açúcar com qualidade. Isso
cessamento propiciaria um balanço energético
fez com que direcionássemos o seu processa-
positivo, de maneira a oferecer também energia
mento somente para produção de etanol.
elétrica excedente pela queima de seu bagaço
nas caldeiras. Um forte atrativo é o de se poder
Alguns aspectos industriais e agronômicos pu-
usar para o sorgo a mesma estrutura de colheita
deram ser notados nas primeiras áreas de sorgo
mecanizada e o mesmo processo industrial da
sacarino plantadas em larga escala pelas usinas
cana, amortizando grandes custos fixos. Outras
de cana-de-açúcar nessa safra.
motivações são o ciclo e o custo de produção
menor do sorgo, assim como possibilidade do O plantio e tratos culturais exigem uma estru-
aumento da área explorada, utilizando pasta-
tura de máquinas e implementos diferentes da
gens e outras não cultivadas com cana, agregan-
cana. Como o ciclo do sorgo é bem mais curto,
do e atraindo produtores de outras cadeias.
o manejo e as práticas culturais e, consequente-
Com relação ao período de moagem, avaliou-se mente, as intervenções agronômicas gerenciais
que seu melhor aproveitamento seria na anteci- acontecem mais rápido do que na cana. Perce-
pação da safra da cana, focando-se, no caso da be-se então a necessidade de uma equipe técni-
região Centro-Sul, a colheita no mês de março. ca dedicada ao sorgo.
Para tanto, com as atuais variedades e híbridos
disponíveis e suas interações de ciclo vegetati- A sua sensibilidade à maioria das moléculas de
vo com o fotoperíodo, o sorgo deve ser plan- herbicidas, excetuando-se as atrazinas, causa al-
tado em dezembro. Não se descarta, contudo, gum problema no controle de plantas daninhas,
um maior período de aproveitamento industrial, pois o espaçamento utilizado, visando a colheita
antecipando-se o plantio para outubro/novem- mecanizada com colhedoras de cana, deixa uma
bro (correndo-se nesse caso o risco de colheita área maior de entrelinhas. São necessárias pes-
num período mais chuvoso) ou até mesmo pos- quisas para se determinar a melhor população
tergando-se o plantio para março/abril, o que se de plantas por local, de maneira a aumentar a
poderia chamar de “sorgo sacarino safrinha”, produtividade agrícola, melhorar o controle de
para ser colhido junto com a cana, de junho a ervas e permitir uma perda menor na colheita já
B
uscas de documentos de patentes foram Na Tabela 2 é apresentada a relação dos deposi-
realizadas na base Derwent Innovations tantes e os países nos quais os seus pedidos de
Index com o objetivo de encontrar docu- patente foram depositados. Entretanto, o prazo
mentos de patentes, publicados entre 1995 e legal para depósito em outros países de muitos
2011, sobre sorgo sacarino relacionados com a documentos de patente pode não ter expirado e,
tecnologia agrícola e com a tecnologia industrial portanto, o número de países no qual foram de-
de etanol de primeira e de segunda gerações. positados os pedidos de patente pode aumentar.
Os dados dos documentos obtidos foram trata-
dos no software VantagePoint, para avaliação de De acordo com a Tabela 2, os principais países
nos quais os pedidos de patente foram depo-
informações como principais depositantes, ano
sitados são China e Estados Unidos. No Brasil,
de publicação e países nos quais foram deposi-
três pedidos de patente foram depositados por
tados os pedidos de patente.
South African Sugar Association, University of
Queensland e Yan Mixed Seed & Herbicide Inc.
►Tecnologia agronômica
Na busca realizada sobre a tecnologia agrícola ►Tecnologia industrial para etanol de primeira
do sorgo sacarino foram encontrados 22 docu- geração
mentos. Os depositantes relacionados com tec- Uma busca relacionada com a tecnologia indus-
nologia agrícola são apresentados na Tabela 1 trial de etanol de primeira geração foi realizada,
em função do ano de publicação do documento. encontrando-se 29 documentos de patente.
Tabela 1. Depositantes e ano de publicação dos documentos de patente relacionados com tecnologia
agrícola do sorgo sacarino.
CN – China; US – Estados Unidos da América; AU – Austrália; IN – Índia; EP – Europa; MX- México; BR – Brasil; ZA – África
do Sul; FR – França; JP – Japão; PH – Filipinas; CA – Canadá.
Empregando o software VantagePoint diversas México e Austrália), enquanto o outro pedido foi
informações foram obtidas, como os principais depositado apenas na Europa. Nenhum pedido
depositantes e o ano de publicação dos pedidos de patente foi depositado no Brasil.
de patente, os quais são mostrados na Tabela 3.
►Tecnologia industrial para etanol de segunda
Na Tabela 4 apresentam-se os países nos quais geração
os principais depositantes, apresentados na Ta-
bela 3, fizeram o depósito dos seus respectivos A busca realizada na base Derwent, para os anos
pedidos de patente. Os depósitos realizados na de 1995 a 2011, resultou em 35 documentos de
Organização Mundial da Propriedade Intelectual patente relacionados com etanol de segunda
(OMPI), publicados com a sigla WO, não foram geração. Os dados dos documentos foram trata-
computados, pois eles não representam um país dos no software VantagePoint.
específico, mas o depósito no sistema PCT (Pa-
tent Cooperation Treaty), para posterior entrada A relação entre os principais depositantes e o
nas fases nacionais nos países que o depositan- ano de publicação dos respectivos documentos
te tiver interesse. de patente relacionados com etanol de segunda
geração é mostrada na Tabela 5.
Através dos dados da Tabela 4, verifica-se que a
maioria dos depositantes optou por depositar os Na Tabela 6 mostram-se os países nos quais
pedidos de patente apenas na China, sendo que foram depositados os pedidos de patentes dos
quatro depositantes são chineses. A empresa in- principais depositantes. A BP (British Petroleum)
diana Praj Ind. depositou um dos seus pedidos depositou apenas nos Estados Unidos. As em-
apenas na Índia, sendo que o outro foi deposita- presas DSM e Nagarjuna Energy depositaram
do no sistema PCT da OMPI, o qual não aparece em mais de um país. Nenhum pedido de patente
na Tabela 4. A empresa Syngenta depositou um de etanol de segunda geração foi depositado no
pedido em vários países (China, Canadá, Europa, Brasil.
Tabela 6. Países nos quais os principais depositantes fizeram o depósito dos pedidos
de patente relacionados com etanol de segunda geração.
• Existe uma tendência de aumento de depó- • China é país que mais recebe depósito de pedi-
sitos de patente relacionados com a tecnolo- dos de patente, seguido pelos Estados Unidos.
gia agrícola do sorgo sacarino. • C12P (Processos de fermentação ou proces-
sos que utilizem enzimas para sintetizar uma
• China e Estados Unidos são os principais pa- composição ou composto químico desejado)
íses nos quais os pedidos de patente foram e C12M (aparelhos para enzimologia ou mi-
depositados. crobiologia) são os principais códigos da clas-
sificação internacional de patentes (CIP) dos
• Os principais códigos da Classificação In- documentos de relacionados com etanol de
ternacional de Patentes (CIP) são C12N (en- segunda
genharia genética ou de mutações) e A01H
(novas plantas ou processos para obtenção É importante ressaltar que ainda não houve pedi-
do de patente, depositado no Brasil, relacionado à
das mesmas).
produção de etanol de primeira ou segunda gera-
ção a partir do sorgo sacarino.
Em relação à tecnologia industrial de etanol de
primeira geração, conclui-se que:
A
deradas para a geração de eletricidade a partir
produção de bioeletricidade no Brasil vem
de biomassa.
acompanhando o crescimento da produ-
ção de etanol. Dados elaborados por UNI-
O ciclo tradicional consiste na cogeração topping
CA, Koblitz e Cogen em 2009 e apresentados a vapor em contrapressão e nas alterações
por Silvestrin (2009) indicaram que o potencial possíveis para aumento do potencial de
de mercado da cogeração de bioeletricidade geração. Nesses sistemas, o bagaço é queimado
excedente em 2008/2009 utilizando bagaço de diretamente em caldeiras e a energia térmica
cana-de-açúcar e palha de cana-de-açúcar (con- resultante é utilizada na produção de vapor que
siderando-se a utilização de 75% do bagaço dis- acionará turbinas de acionamento mecânico do
ponível e 5% da palha disponível) foi estimado processo e turbinas para geração de energia
elétrica. Opcionalmente, os gases originados da
em 1800 MW médios. Projeções para 2015/2016
combustão do bagaço podem ser utilizados para
indicam crescimento para 8158 MW médios e
o acionamento de uma turbina a gás para geração
em 2020/2021 estima-se chegar a 13158 MW de energia elétrica (Corrêa Neto et al., 2002). Parte
médios, nesses dois casos considerando-se a dessas tecnologias convencionais atualmente
utilização de 75% do bagaço e 70% da palha de utilizadas em sistemas de cogeração apresentam
cana-de-açúcar. baixas eficiências no aproveitamento do bagaço
O
sorgo sacarino é cultivado em diversas cedores, clientes, investidores, culturas e pro-
partes do mundo. O seu principal uso tem dutos substitutos, assim como novos entrantes
sido a produção de grãos e forragens para podem ter maior ou menor importância, de-
alimentação animal. Segundo Durães (2011), o pendendo do contexto avaliado. Neste estudo,
sorgo sacarino, um tipo de Sorghum bicolor (L.) considera-se o posicionamento dos produtos
Moench, com alto potencial forrageiro, apresen- gerados do sorgo sacarino na entressafra da
ta colmos com caldo semelhante ao da cana, cana-de-açúcar como também na reforma de
rico em açúcares fermentescíveis e pode servir canavial. Concorrência, neste sentido mais am-
para a produção de etanol na mesma instalação plo, pode ser definida como rivalidade e opor-
utilizada pela cana-de-açúcar. Trata-se também tunidade ampliada. Sendo assim, o objetivo é
de uma das alternativas para reforma ou subs- avaliar a cooperação do sorgo sacarino com a
tituição de canaviais. A seleção de espécies de cana, em termos de ser uma opção alternativa
expressão econômica deve contribuir para aten- e viável, plantada como rotação de culturas nas
der aos interesses de produção de alimentos e áreas de reforma de cana-de-açúcar em outubro
energia. Neste contexto, por meio de um estu- e novembro, para colheita em março e abril. É
do da concorrência ampliada de Porter (2004), possível um melhor aproveitamento do parque
aplicada aos produtos do sorgo sacarino (etanol industrial no ano, produção de etanol em um
e bioeletricidade), algumas propostas são apre- período de baixos estoques e ainda possibilitar
sentadas e discutidas como contribuições para ganhos de produtividade na própria produção
uma melhor competitividade desta cultura na de cana-de-açúcar ao proporcionar sua colheita
entressafra da cana. em um período mais favorável. Na Figura 1 são
►Considerações finais
O Brasil está vivendo aumentos dos preços de
etanol e riscos de desabastecimento nos perío-
dos de entressafra. Os problemas de estoque e
de alta nos preços do etanol continuarão a ocor-
rer nos períodos de entressafra. Neste contexto,
o sorgo sacarino, que produz etanol usando a
mesma levedura que a cana e é plantado justa-
mente na fase de entressafra pode ser uma so-
lução. A cultura do sorgo sacarino é uma alter-
nativa viável sob os pontos de vista agronômico
e industrial, para a produção de etanol e bioele-
tricidade.
Preço Unitário
Descrição
(R$/litro)
Por: Alice Medeiros de Lima1, Daniela Tatiane
Fator de Conversão de sorgo em etanol
dos Santos1 e João Carlos Garcia2, analistas
(0,03505 m³/t)
da Embrapa Agroenergia1 e pesquisador da
Embrapa Milho e Sorgo2. Custo da matéria-prima R$ 0,48
A produção de etanol a partir do sorgo sacarino Fonte: FAEG (2011) e Linton et al (2011).
tem sido considerada viável devido à semelhan-
ça com a cana-de-açúcar, ao alto teor de açúca- Os custos de produção agrícola do sorgo em ja-
res fermentescíveis, além do processamento po- neiro de 2011 estiveram em torno de R$ 927/ha.
der ser feito nas usinas de cana-de-açúcar. Um Entretanto, para estimar o custo total de produ-
ponto importante é a possibilidade de produção ção em termos de R$/L seria necessário transfor-
de etanol no período da entressafra da cana-de- mar este valor por meio do fator de conversão
-açúcar utilizando-se o sorgo sacarino. Entretan- do substrato em etanol. Linton et al (2011) utili-
to, há poucos estudos e informações sobre a zam um fator de conversão de 0,03505 m³/t, ou
viabilidade técnico-econômica da produção de seja, cada tonelada de biomassa verde de sor-
etanol a partir do sorgo sacarino. go geraria 35,05 litros de etanol. Multiplicando-
-se este fator pela produtividade por hectare do
sorgo (55 t/ha), tem-se um total de 1.920 L/ha.
Alguns fatores possuem importantes efeitos so-
Assim, poderia se afirmar que o custo unitário
bre os custos de produção de etanol a partir do
da matéria-prima estaria em torno de R$ 0,48/L,
sorgo, como o preço das matérias-primas, o pre-
sem incluir quaisquer custos de transporte.
ço do etanol e do gás natural e os fatores de con-
versão. O potencial mínimo de geração de eta-
Por outro lado, com base no trabalho de Linton
nol de sorgo sacarino está estimado em 3.223 L/
et al (2011), estimou-se que os custos fixos uni-
ha, com uma produtividade que gira em torno
tários seriam de R$ 0,17/L e os custos de proces-
de 55 t/ha, o que representa cerca de 58,6 L/t.
samento, R$ 0,34/litro1. Deste modo, tendo em
A Tabela 1 ilustra estimativas para o custo uni-
vista os parâmetros aqui adotados, o custo total
tário de produção do etanol do sorgo sacarino.
de produção de etanol do sorgo sacarino seria
A Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás
de aproximadamente R$ 0,99/L.
(FAEG) publica os custos da produção agríco-
la do sorgo granífero, que podem ser tomadas
como uma primeira aproximação para o sorgo ►Comparação da produção de etanol a partir
sacarino. Entretanto, as estimativas no país so- da cana-de-açúcar e do sorgo sacarino
bre o processamento em escala industrial do A comparação da produção de etanol a partir de
etanol a partir do sorgo sacarino é de mais difícil cana-de-açúcar e sorgo sacarino foi feita a partir
acesso, estando limitadas às empresas produto- da simulação utilizando-se um modelo simpli-
ras, que somente recentemente deram margem ficado com o balanço de massa de uma usina
a esta iniciativa. Neste sentido, tomou-se como convencional. Este modelo é capaz de calcular,
parâmetro para o custo de produção do sorgo além da quantidade de etanol (1ª e 2ª geração),
sacarino (matéria-prima), o preço da matéria-pri- a quantidade de açúcar e eletricidade gerados
ma convencional, ao passo que os dados para o a partir da cana-de-açúcar e/ou sorgo sacarino.
processamento do sorgo sacarino basearam-se
em estimativas para a produção do sul dos Esta-
dos Unidos (LINTON et al, 2011). Ainda que este
procedimento não esteja livre de incongruên- 1
Estes valores foram convertidos, considerando-se a taxa
de câmbio do dólar de R$ 1,6.
Tabela 3. Estimativa de produtividade, produção de etanol, custos e receita líquida para sorgo sacarino
e cana-de-açúcar.
Produção de Produção de
Cenário -
Etanol de Custos Receita líquida Etanol de Produção Total
Produtividade
1ª geração (R$/ha) (R$/ha) 2ª geração (L/ha)
(t/ha)
(L/ha) (L/ha)
1SS - 55 3.223,00 3.190,77 676,83 1.079,00 4.302,00
Sorgo Sacarino
2SS - 80 5.504,00 5.448,96 1.155,84 2.983,00 8.487,00
1C - 80 5.921,00 4.677,59 2.427,61 1.413,00 7.334,00
Cana
2C - 90 7.098,00 5.607,42 2.910,18 2.296,00 9.394,01
Fonte: FAEG (2011); Linton et al (2011); Santos, F. G. apud Durães, F. O. M. (2011); Lee et al (2007).
N
o início dos anos 80, o Centro Nacional • Materiais modernos: desenvolvimento e lança-
de Pesquisa de Milho e Sorgo – CNPMS mento de novos híbridos, em horizonte tem-
selecionou variedades de sorgo sacarino, poral de 2-5 anos, de forma compartilhada ou
todas com produtividade de colmos superior a não com a iniciativa privada, e com estratégia
40 t / ha e teor de sólidos solúveis médios entre complementar de novo background genético
18 e 20º Brix. Em 1987, as primeiras variedades e boas práticas agrícolas e gerenciais para os
brasileiras foram desenvolvidas com potencial sistemas produtivos sustentáveis.
para produção de etanol (BRS 506 e BRS 507, e o Nichos territoriais (3):
híbrido BRS 601). Estes materiais apresentaram
rendimentos entre 2.500 e 3.500 l etanol por hec- • Áreas canavieiras tradicionais: produção com-
tare. Como as cultivares lançadas apresentavam plementar de etanol e resíduos na entressafra
boa produtividade e qualidade de matéria verde, da cana e/ou áreas de reforma de canaviais;
estes produtos se mantiveram no mercado, co- • Áreas de expansão canavieira: como alterna-
mercializados como forrageiras. tivas para produção de etanol e resíduos para
agroenergia;
A Embrapa reiniciou seu programa de desenvolvi- • Áreas antropizadas de expansão e/ou substitui-
mento de cultivares de sorgo sacarino a partir de ção agrícola: como alternativas para a produ-
2008, devido ao potencial desta cultura na geração ção de etanol e resíduos para agroenergia em
de energia renovável e devido a grande deman- áreas distintas ou remotas da região sucroal-
da por matéria-prima alternativa para a produção cooleira tradicional, p.ex., região centro-oeste
de etanol nas grandes destilarias. O programa de do Brasil.
melhoramento da Embrapa, coordenado pelo Cen-
tro Nacional de Pesquisa de Milho e Sorgo visa o Parcerias em cooperação científica e/ou
desenvolvimento de variedades e/ou híbridos de técnica (3):
sorgo sacarino e estabeleceu as seguintes metas • Acordos de cooperação científica para desen-
de produtividade e qualidade: uma produtividade volvimento de novos cultivares;
mínima de biomassa de 60 t / ha; extração mínima
• Acordos de cooperação técnica para licencia-
de açúcar total de 120 kg / t biomassa, consideran-
mento de genótipos de interesse técnico ou
do a eficiência de extração de 90-95%; conteúdo
comercial;
mínimo de açúcar total no caldo de 14%; produ-
ção mínima de álcool de 60 l / t biomassa; Perío- • Acordos de cooperação técnica para agrega-
do de Utilização Industrial (PUI) mínimo de 30 dias ção de valor a genótipos, processos e sistemas
com extração mínima de açúcar total de 100 kg / t produtivos, incluindo a obtenção de descrito-
biomassa. res botânicos e de caracterização agronômi-
ca de genótipos e materiais comerciais, bem
►Elementos para o Plano de Negócios de como de índices de indústria (caracterização
Sorgo Sacarino da Embrapa: planejada de matérias-primas, processos e
produtos).
Em síntese, o plano de negócios para o sorgo sa-
carino está estruturado em três background ge- A Embrapa disponibiliza os termos básicos (pa-
néticos e três nichos territoriais, e tem como es- drão) de cooperação científica e técnica para os
tratégia o compartilhamento de ações de PD&I e negócios competitivos. E recomenda que, para
negociais, a saber: cada assunto específico e cada instituição ou em-
presa interessada, sejam formalizados um termo
Background genético (3): de confidencialidade e a definição de contrapartes
• Materiais antigos: produção de sementes e institucionais de negociação para firmar acordos
performance agronômica e industrial de cul- específicos, em momentos oportunos dos traba-
tivares registradas no RNPC (variedades BRS lhos conjuntos.
N
o início dos anos 1980, a Embrapa/ reiniciou seu programa de desenvolvimento de
Centro Nacional de Pesquisa de Milho e cultivares de sorgo sacarino a partir de 2008,
Sorgo (CNPMS) selecionou variedades de devido ao potencial desta cultura na geração de
sorgo sacarino, com produtividade de colmos energia renovável e devido a grande demanda
superior a 40 t / há e teor de sólidos solúveis por matéria-prima alternativa para a produção
médios entre 18 e 20º Brix. Posteriormente, em de etanol nas grandes destilarias.
1987, as primeiras variedades brasileiras foram
desenvolvidas com potencial para produção de O programa de melhoramento da Embrapa visa
etanol, sendo o BRS 506 e BRS 507, e o híbrido
o desenvolvimento de variedades e/ou híbridos
BRS 601. Projetos-piloto de microdestilarias para
de sorgo sacarino e estabeleceu as seguintes
produção de etanol se valeram destas variedades.
metas de produtividade e qualidade: uma pro-
O Pro-Álcool incentivou a expansão da cana-de-
açúcar e as espécies alternativas, como o sorgo dutividade mínima de biomassa de 60 t / ha;
sacarino e a mandioca, tiveram seus programas extração mínima de açúcar total de 120 kg / t
paralisados. Como as cultivares lançadas biomassa, considerando a eficiência de extração
apresentavam boa produtividade e qualidade de 90-95%; conteúdo mínimo de açúcar total no
de matéria verde, estes produtos se mantiveram caldo de 14%; produção mínima de álcool de 60
no mercado, comercializados como forrageiras. l / t biomassa; Período de Utilização Industrial
Atualmente apresentam-se como cultivares de (PUI) mínimo de 30 dias com extração mínima
dupla aptidão, sacarina e forrageira. A Embrapa de açúcar total de 100 kg / t biomassa.
E
m dezembro de 2010, Beatriz Emygdio,
pesquisadora da Embrapa Clima Tempe-
rado (Pelotas, RS) publicou pequeno arti-
go denominado “Produção de etanol a partir de
sorgo sacarino” (http://www.infobibos.com/Arti-
gos/2010_4/Sorgo/Index.htm) que foi precursor
de várias matérias jornalísticas publicadas em
2011, em diversos sites, revistas e até mesmo
na TV. 5/5/2011
http://gadoegrao.blogspot.com/2011/05/sorgo-
-sacarino-e-alternativa-para.html
http://www.cnpms.embrapa.br/noticias/mostra- http://www.cnpms.embrapa.br/noticias/mostra-
noticia.php?codigo=667 noticia.php?codigo=672
21/6/2011
http://oestadodoparana.pron.com.br/agronegocio/
noticias/34890/?noticia=raizen-inicia-plantio-de-sor-
go-sacarino-em-goias
N
o programa Globo Rural de 19 de junho, http://video.globo.com/Videos/Player/
foi veiculada matéria sobre a cultura, com Noticias/0,,GIM1539830-7823-SORGO+SACARI
duração total de 15 minutos. O programa NO+PODE+REFORCAR+PRODUCAO+DE+ET
relembra o uso do sorgo na década de 1980 e ANOL+BRASILEIRA,00.html
traz as novidades que estão sendo introduzidas
pela Embrapa na Região Sudeste (Embrapa Mi-
lho e Sorgo) e na Região Sul (Embrapa Clima
Temperado). Assista ao vídeo em:
A
utilização do sorgo sacarino para produ-
ção de etanol será abordada em alguns
eventos no segundo semestre de 2011.
http://www.cnpms.embrapa.br/