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ubledo com o elo Sonia dr Dic pla Press Universitas de Limoges (i) 39% rue Camille Gti FOTOS Limoges cedex ~F (Tel: 053501 9535 ~ Fae 0535 435629) pula emis pau fe Gar earaepublit desl cad dh Programme Wide 3 le ableton Cares Drummond de Andee de Amba de Fone om Bre, bnti da ton du Minne neds Ae Bangi “Et lino, publado no bio do programa de pari &publajso Cals Drummond de Anda da “Enmbaitads da Fang no Brail cotton com o poi do Mini francs ds RelgesExteires™ JAcQuEs FONTANILLE SEMIOTICA DO DISCURSO Tradugio Jean Cristtus Portela editoracontexto Copyright © 1999 «2003 de Jacques Fonsanille “Tadon oe dito asain terrae ABdicora Contest (Edivora Pinsky Lida) Copa Imagem de snc cada por JM Dischlere D. Ghaanfrpour no MSL, Laborato de Informatica da Universidade de Limoges Diagramae app Design Revista de dopo Daniela Marini Foamore Revise Fernanda Baia dos Santos Dados Inernacionis de Caalogasio na Pablcagio (CIP) (Cémara Braet do Liv, SP Bras Fonenille Jaques ‘Semin do dium! Jacques Fonanille: ado de Jean Crises Portela, ~ ed I reimpresso Sse Pale Comexo, 2008. ‘Tilo orginal: Sémiotique du dicour, ISBN 978-85-7244375-3 1 Anslze do dar 2. Semitic Titulo 07.6967 cop Takes para cllogo sendin 1. Anise do discus: Comunicago Linguistics 401.41 Enron, Conrexro Direor earn Jame Piney Ram De Jou His 520 Alo da Lapa (5083-030 So Paulo 50 ra: (1) 3832 5838 entexip@ediorconteca.cam br ‘wonwedioracontertacom br mE Poibidea prodigal ou pascal Osinfatores sto procesador na forma dale & “Lad de todas as comparagées que se poderiam imaginar, a mais demonstratva é a que se estabeleceria entre o jogp da lingua e uma partida de xadrez. De um lado e de outro, estamos na presenga de um sisteme de valores e assistimos as suas modificagbes. Uma partida de xadter é como uma realzagio artificial daquilo que 2 lingua nos presenta sob forma natural.” Ferdinand de Saussure Sumario NOTAS DO TRADUTOR ssenmensnnennnnne PREFACIO A EDICAO BRASILEIRA PROLOG. , DO SIGNO AO DISCURSO sn 1, Signo € Signifieago nn si LL. A diversidade das abordagens sobre 0 sentido .. 1.2, As teorias do signo .. nae 2, Peroepeio © Significagio 2.1, Blementos para recordar 22. Os dois planos de uma linguagem 2.3. O sensivel e 0 intligivel ‘AS ESTRUTURAS ELEMENTARES ou 1. As Bstruturas Bindsias. LL A oposicio privativa 1.2. A oposigao entre os conttios 2. 0 Quadrado Semistico 2.1. As relagdes consccutivas 2.2. A sincaxe elementat un 2.3. A polatizacéo axiolégica 2.4. Os termos de segunda gerasio. 3. A Escrucura Ternétia.. 3.1. Os es niveis de apreensio dos fendmenos 43.2. As propriedades dos trés niveis 3.3, Os modos de existéneia ene 40 A Bstrutura Tensiva cccnnnnn 4.1, Problemas em suspenso 4.2. Novas exgéncias 4.3, As dimens6es do sensivel 44, A cortelagio entre as duas 45. Os dois tipos de cortelagio 4.6, Das valéncias 208 valores. 47. Balango. vi 1. Texto, Discurso, Narrativa 11.0 texto 1.2. O discarso 1.3, A narrativa. 14, Texto e discurso 1.5, Narrativa e discurso 2. A Tnstincia de Discus 2.1, A comada de posisio 2.2. A breagem 233, 0 campo porcional 3. Esquemas Discursivos 3.1. Os esquemas de eensio. 3.2, Esquemas canénicos 3.3..A sintaxe do discurso 05 ACTANTES scnsntnernnn 1. Actantes e Atores a 1. Actantes ¢ predicados 1.2, Percursos da identidade, paps e attuces 1.3, Actamts € aores da frase 2. Actantes Transformacionais e Actantes Posicionais 2.1, Transformagio e orientagio discursiva 22. Os actantes posicionais 2.3. Os actantes ransformacionais 24. Campo posicional e cena predicativa 3. As Modalidades... 3.1. A modalidade como predicado - 3.2. A modalizagio como imaginirio pasional ACAO, PALKAO, COGNICAO... L.A Agio A 1.1, A reconstrugao por pressuposia 1.2. A programagio da agi .. 2, Paix 2.1. A intensdade e 2 quantdade passions 2.2. ged dimenso pasion do dno 3. Cognigio Seaiees 3.1, Saber e exer 3.2. Apreensdes e racionalidades 4, Interseoges € Imbricamentos.. 4.1, Imbricamentos 42.0 sensivel eo intlgivel A ENUNCIAGAO cone 1. Recepitulagio. : 1.1. A instineia proprioceptiva . 1.2. 0 campo de presenga.. 13. Os regimes discursivos 2, Confrontag6es mn 2.1 Enunciagao © comunicagio. 2.2. Enunciagéo € subjetividade men 2.3, Enunciaglo e atos de linguagem un 3. A Pedais Enunciativa 4, As Operagies da Prixis 4.1, AS tenses existencias, a 4.2. O devi existencial dos objetos semisticos.. 4.3, O devir existencial da instincia de discurso 5. A Semiosfera ame 0 AUTOR sneer © Traoutor... Os actantes ‘Osactantes sto forgas e papeis necessatios&realizagzo de um proceso. ‘As personagens de umainriga, os sintagmas nominals de una fese, 0s alores ‘eos panei de uma pega de eato Ao suas reaizagnes concrotas. A ambigso de ‘uma teria actancial omecer una representaco geral des aantes necessértos ‘ainstauragao de um processo, independentomenta de sua realzaglo particular. Para tanto, ela deve dstinauir (1) 0s atores@ 0s actantesproplamente dos, om ‘squid, (2) 0s actantes posicionals 8 actantes tanstormacionaise, por fim, (S)os actantes fundamentals eos varios papéis que eles podom desempenhar, ‘especialmente sob a agio des modaldades que es so atiuidas, 1-Acmutes€ Arones (Os ators #08 actanies S30 lstinguitos de duns maneias Em pimelrluger, el principio que crlenta seureconhecments reconhece-se umatorpela presen ‘de um certo nimero de propriedadesfiuratvas, cya associago permanece mais ‘cumenos estive enquanto sous papal se modfoam Em conraprida, econhece- ‘se umactante pela estbldade do papel que lhe éatrbuido em relapso um pode presicado, independentemente das modicagées de ua descr figuatva. Em ‘segundo luge, ¢conseqdertemente a um atorpodam comesporder ros ectates «do mesmo medo, a um actants podem conesponder vrs alee. 2. Actes Tanssromuciouas Actes POSIONAS (0s actantes pasicials so deirids excusivamente pelo oulugarnocampo pposicional do discurso: a intencionalidade que os oaracteriza & somente una ‘rientagéo de natureza topolégica. Os aciantes ranslormacials 880 definidos ase: pela sua partlpago junio forgas que transformam uma conjure. Potato, a Itencioraidade que of caracteriza reside naquilo quo oath om jogo na transformacio, isto 6, em um sistema de valores. Os actantes posicionas esto 0b o controle da orentagio do discurso, enquanto os actantesiransfrmacionais Clependem da estrtura semartica dos predicados de que els partlpam. 2. As Mooaunsoes As modalidades sao contedos que defnem a identidade dos actantes. OS ‘actantes posicionls so doterminades por modalidades da presenpa e mods de ‘exisénci), Os actantestranstormacionais so determinados por modaldaes dos predicados de arto e de estado (as modaldades do fazere as modalidades do ‘90. atibigso suoessiva de medaldades diferentes a um mesmo actato faz dle, do panto de visa da sntaxe do dscurso, uma sucesso de papéis modal ‘A questo dos actantes€, som divida, uma des questbes que slo objeto ~ no som debates ~do um amplo consenso atualmenternas céncias da inguagem, também sem duvida 0 dominio de pesquisa em que os resultados, desde 0s ‘anos 1950, 580.08 mais oonstantes¢ cs mais corvincontos. A quostio dos actantos ‘est reacionada ao problema dos components da instincia, tema que, ao ado {da questo do ato propriamente do (ver cepitulo"O ciscurso), constitu uma, das duas quosides oscancials para a porspectiva do ascurso om at, 1. Actantese Atores LI. Actantes e predicados A nogio de actante é uma nogao abstrata que deve ser, antes de tudo, distinguida das nogdes tradicionais ou intuitivas de personagem, protagonista, heréi, ator ow papel. Todas essas nogbes partem da idéia de que algumas centidades textuais representam seres humanos ou seres animados e que elas ém uma fungio na intriga narrativa ou ocupam um lugar em uma cena. A partir desse pano de fundo comum, as diferentes nogoes variam de acordo com a importincia do lugar ou da fungao que designam (aror/herdi) ¢ de acordo com a importincia que se atribui seja para a sua fungio de representagio de um ser humano, seja para a sua participacio na intriga (personagem|protagonista). No entanto, quaisquer que sejam as nuangas entre essas nogGes, todas clas pressupdem a existéncia textual indiscutivel de entidades representativas, e assim a inica questio que se coloca é saber para que elas servem afinal. 148 Em contrapartida, 0 actante deve ser concebido segundo uma perspectiva de que nada, no texto, est4 antecipadamente estabelecido: tudo esté por ser construido, especialmente a identidade das figuras antropomorfas que nele parecem se manifestar. Conseqiientemente, antes de se perguntar qual é a fungdo desta ou daquela personagem, é necessério estzbelecer 0 esquema do desenrolar da intriga ¢ definir as fungées que ele tequer. Portanto, 0 actante é uma entidade abstrata cuja identidade funcional € necessiria & predicagéo narrativa, Na verdade, todo enunciado € composto por dois sipos de grandezas: (1)o préprio predicado, que exprime 0 estado ou 0 ato, ¢ (2) seus “argumentos”, isto é, seus actantes, que séo os termas entre os quais predicado estabelece uma relagéo ¢ que ocupam em torno dele um certo mimero de “fungbes”. Logo, a formula de base seria: ENUNCIADO = ACTANTES —* (Fung6es) —» PreDIcADo ‘Mas esse € um ponto de vista quase que fréstico, focalizado cm um predicado particular e isolado, Se adorarmos um ponto de vista discursivo, 2 situacio apresenta-se de forma bem diferente, jd que um mesmo actante corresponde, nesse caso, a toda uma classe de predicados cue cle encontra um. apés 0 outro a0 longo do discurso. Mas, por outro lado, cada um desses predicados pode, por sua vez, requerer virios actantes. Do mesmo modo, 0 discurso ¢ globalmente consticuido por uma rede de acrantes e predicados que s6 ¢inteligivel se rrés condigdes forem atendidas: (1) os predicados devem constituir-se em um pequeno niimero de classes; (2) o* lugares actanciais requeridos para cada uma dessas classes devem também ser em pequeno riimero, previsivels ecalculiveis; (3) as series de predicados devem constituir procesos articulados em aspectos, c esses processos devem ser congruentes com 0s percursos des actantes. Desse modo, a frmula de base seria: Discurso-ENUNCIADO = PERCURSO DOS ACTANTES —» sngruéncia) ~» PROCESSO 149 "Senieeeadodiecurso —— en i 12. Percursos da identidade, papéis e atitudes ‘As nogGes de actante e de ator permitem distinguir dois grandes tipos de permanéncia ¢ de identidade no discurso. Primeiramente, esclaregamos que aquilo que chamamos aqui de permanéncia ou identidade nao & senéo uma forma particular de isoropia, isto é, uma redundancia semantica que, nesse aso, éaplicada a uma categoria particular de contedidos. Uma personage que tem o mesmo nome e recebe as mesmas qualificagbes 20 longo de um texto obedece ao principio da isotopia. Basta imaginar, ao contrdrio, um romance em que cada personagem seria, a cada aparigio, designada por um ‘nome diferente e descrita com novos tragos para compreender em que medida a identidade sobre a qual falamos depende da isotopia: ela torna possivel ‘uma leitura coerente do percurso da personagem. Os dois grandes tipos de identidades so, respectivamente, (1) no caso dos actantes, aqueles assegurados pelas isotopias predicativas e, (2) no caso dos atores, aqueles assegurados por todas as outras isotopias (Figurativas, teméticas, afetivas etc). A identidade dos actantes define-se em relacio & recorréncia de uma mesma classe de predicados;jé a identidade dos atores define-se em relagio & recorréncia de uma mesma classe seméntica, seja ela abstrata(identidade tematica) ou mais concreta (identidade figurativa). Como 05 predicados sio agenciados durante © proceso, essas identidades se ‘ransformam ao longo de um percurso, quer em percursos temsticos (préprios 208 aspectos do processo), quer em percursos figurativos (préprios aos atores) Se identificarmos, por exemplo, em um texto, uma classe de predicados como alpar véo, levantarse, voar ela poders ser reduzida a um arquipredicado como “subir”, e, entio, seri preciso perguntar-se quais so os actantes que esse predicado implica: no minimo, cle implicaré um actante “fonte” (embaixo), um actante “avo” (em cima) e um tereeiro, que se desloca entre os outros dois. Em Elevagio,’ de Chatles Baudelaire, esses trés actantes correspondem as seguintes figuras: (1) a ferna, como fonte do deslocamento (pantenais, vale, montanhas exc): @) 0 ctu, como alvo (onde oar se fz mais fino, space tansparene,vdreas dlaras) © (3) mew espirito, que se move de um para outro. [Essas mesmas figuras seguem um percurso figurativo (segundo tipo de identidade discursiva) por meio de uma série de imagens metéforas. Mew epirit por exemplo, é retomado tanto como ator pessoal (Tt) quanto como ator figurativo (0 pensar), No encanto, esse percurso interessa mais do que a simples denominasio do ator e afeta também outras propriedades, especialmente ons Alsactentes ppassionais: gezo, dio, devgostos e penas etc. O exame desse percurso revela, além disso, que 0 ator, conservando sua identidade, transforma-se de duas maneciras ‘complementares ¢ congruentes: a cada nova fase do processo (mudanga temtica), cle recebe novas propriedades (mudanca figurativa ou passional). Assim, na fonte do deslocamento, meu epiritoé afetado pelo wédio e por dagstes pena, em contrapartida, no alvo, ele conhece 0 gozo c, entre esses dois extremos, mei epirite & identificado a um péssaro (pdssaro veloz) ¢ sofre, aléin de tudo, a lei dos aspect intermeditios do procesto voat(ditenderse ao cts, pain). Verenos mais adiante que a congruéncia entre esses dois percursos & assegurada pelas posigées modais do actante, que mudam ao longo do process. ‘A nogio de predicado & estética, ¢ 0 actante, associado a um predicado, néo. sofre nenhuma transformagéo enquanto o predicado néo é modificado. Em ‘conteapartida, 2 gio de proceso édinmica na medida em cue ela implica fier _sucessivas (0s aspectos do processo) e tnansigéer de fasex. E desse modo que um aor, astociado a um procesto, pode softer tantastransformagbc tematicasquantot forem os aspectos do processo. Esse exemplo permite também compreender melhor a nogio de pape, que é indissocivel da nogio de percurso. Como cada ator é programado para um certo ntimero de percursos figurativos (0 péssato, por exemplo, & programado para algar vo, subir, pairar), cada etapa corresponde a um ‘papel figurative. Por outro lado, o actante que se desloca € sempre idéntico a.ele mesmo enquanto actante, ainda que o percurso figurativo do ator que © manifesta acompanhe bem de perto as fases do processo subjacente que Ihe fornecem seu percurso temético. A relagao entre esses percursos e esses papéis figurativos, de um lado, € as fases do proceso subjacente, de outro, pode ser considerada como uma relagdo semiética do tipo semi-simbélica. Desse modo, as fases figurativas, do véo do passaro podem manifestar o percurso temético da elevacéo spiritual. Fssa equivaléncia global, estabelecida gragas a um tropo (no caso, situado a meio caminho entre a metéfora e a alegoria), autoriza, ento, uma releitura de todas as fases do processo de um modo analégico. pocma de Baudelaire permite-nes tornar mais lara adistingo entre oteradtico 0 figurative: visios atores diferentes (epirito, nadador, pésare), dorades cada urn de ‘um percuso figurative, assumem aqui o acante que se desloca c o processo no qual cle est implicado. Contudo, um dentre eles, 0 epirite, permanece subjacente 20s dois outros mesmo quando, metaforiamente, eles chegam a substitutlo. Nesse «aso diriamos que se trata de um tema, que suporta 0 percurso dos paps temtios wm ‘Semidcicadodiscurso 20s quis si confeontados os papéisigurativos nadador epsaro. O papel emt surge, entio, como tina prsicé intermedira entre o actane € © a0 "A mudanga de papel actancal implica uma mudanga de clase de predicados portanto, de processo. O mesmo ator. meu espirita, por exemplo, pode, desse modo, corresponder a actantes diferentes se mudamos de processo: tendo chegado as ndrzeas clara, ele nko corresponde mais 20 actante do deslocamento (0 deslocamento terminou), mas a um actante receptivo, jf que um novo processo ‘comegs, um processo de emissioltecepsio. Entio, o novo actante bebe 0 puro {fig © sem eorco encende a linguagem da lore das cosas sem voz. Do mesmo ‘modo, logo de inicio, quando ele ¢ interpelado como Ti (flatu), essa nova identidade corresponde a um outro processo que é 0 da comunicagio verbal Portanto, a identidade dos arores, bem como a dos actantes, transforma- se continuamente, isto é, ela prépria € composta de identidades transitérias, Diante disso, devem-se distinguir dois tipos de percursos: (1) Os percursosfechados, eristalizados, em que cada etapa pode ser prevista antecipadamente, A identidade “fechada” dos actantes ou dos atores seria, entdo, composta de um ou virios papéis — papdis actanci actantes © papéis figurativos no caso dos atores; ‘no caso dos (2) Os percursos abertos, em que os actantes ¢ atores dispem de uma liberdade de agao suficiente para inventar e construir sua prépria identidade, de modo que cada uma das etapas que a constituem corresponda a uma atitude, ¢ no a um papel no sentido restrito. Portanto, papéis ¢ atitudes sio duas formas diferentes das identidades ‘ransitérias que compéem o percurso de um actante ou de um ator. O papel 6 pode ser reconhecido nestes dois casos: (1) ou porque ele ésuficientemente estereotipado em uma determinada cultura para que seja identificado imediatamente, sob a condigéo de que 0 uso que se faz desse papel seja compativel com o esteredtipo, (2) ou porque ele é suficientemente repetido e reiterado no discurso para ser estabilizado ¢ reconhecido. Mas, nesses dois casos, 0 reconhecimento do papel faz-se a posteriori, depois do uso que 0 cristalizou, depois da repetigo que o estabilizou. O papel é uma identidade acabada, apreendida ao fim de um percurso, e que pressupée sempre uma praxis enunciativa gracas & qual ele se estabilizou e objetivou. Em contrapartida, a atitude pode ser reconhecida 10 momento exato ‘em que surge. Ela bic novas possibilidades de identidade, coloca actante em devir: pela graga de um gesto inesperado, de uma ousadia no comportamento ou de uma propriedade revelada e néo previsivel, novas bifurcagdes ver a tona. Para estabelecer um papel, a instancia de discurso deve situar-se a0 final do percurso, no ponto em que o processo acaba, de modo a ter uma boa ideia da situacio, daquilo que foi transformado e daquilo que permanece idéntico. Para identificar uma atitude, ela deve, ao contrério, tomar posigdo no préprio curso do devir, seguir e partilhar, o mais préximo possivel do actante, 0 desenrolar do processo, Em suma, aatirude é uma identidede subjetiva, porque cla s6 pode ser apreendida na presenca da instincia de ciscurso, enquanto 0 ‘papel é uma idencidade objetiva, separada dessa instancia. Em Elevaydo,o péssaro apenas desempenha seu papel (alga vbo, subi, paiat)s ‘© nadador, por outro lado, é menos previsivel e bem mais inventivo, ja que ele acaba por afundar-se, beber o puro fogo e sem esforco entender a linguagem da flor ¢ das coisas sem vez. © pAssaro desempenha um papel uma identidade estereotipada, programada sob a forma de um percurso figuatvo fechado, J 0 nadador assume uma atitude: uma identidade em devir sob a forma de um percurso figurativo abert. Ademais, do ponto de vista do proprio actante, eses dois tipos de identidades correspondem, como veremos em breve, a dois grupos diferentes de modalidades: “poder-fazer e dever-fazet”, no caso do pissaro, © Ssaber-fazer e querer-fazet” no caso do nadador 1.3, Actantes e atores da frase {A frase comporta, por definico, ao menos um predicado. Portanto, ela também pode ser analisada do ponto de vista actandal. No dominio da gramética contemporinea, Lucien Tesnitre foi o primeiro 2 destacar essa dimensio da frase. Concebendo a frase como um “pequeno drama”, uma “cena’, ele péde, enti, dispor em torno do predicado verbal as valéncias do verbo, que designam 20 mesmo tempo o mimero ¢ 9 lugar dos actantes, necessérios a0 drama. No entanto as valéncias actanciais sio independentes dos sintagmas concretos que ocupam seu lugar: todos sabem que 0 actante “sujeito” pode 193 SARERRIESIEC STEN ser representado por um nome, um infinitive, um pronome, uma outta fase ete, A natureza dos sintagmas deve ser préxima da natureza dos atores: so constituintes figurativos que recebem seu valorsintitico das valéncias actanciais definidas pelo préprio predicado. Portanto, o que chamamos “fungio” na anilise gramatical tradicional designa uma relaco superficial entre o predicado verbal ¢ os constituintes figurativos, nomes, infinitivos, pronomes (o cequivalente dos “atores’), Essa relagdo nao pode ser estabelecida sem a mediagio dc um actante que, por sua ver, mantém uma estreita relagdo com o predicado, Conseqtientemente, poderiamos complementar a f6rmula proposta anteriormente, distinguindo dois tipos de “fungbes", a saber, as fungdes frésticas (“fungbes 1”) e as fungées actanciais, ou valéncias (“fungées 2”): [FRASE = SINTAGMAS —> (Funges 1) —> ACTANTES —> (Fungies 2)—+ PREDICADO. Tesnitre, na andlise da lingua francesa, constata que os verbos exigem, no maximo, estruturas de base de waléncia 3 (sujeito, objeto, destinatdrio, por exemplo). Ele propée, entio, generalizar essa constatagao, conservando apenas trés tipos de actantes: 0 primeiro actante, 0 segundo actantec 0 terceiro actante. Essa classficagZo, retomada em semiética por Jean-Claude Coquet, deve ser utilizada com prudéncia: um verbo como vender, por exemplo, é uum “pequeno drama’ de quatro actantes (dois sujeitos, dois objetos) e, para reduzir esse ntimero a trés actantes, é preciso decompor o processo vender em dois predicados associados: dar um objeto e dar a contrapartida, Obtém- se entio, para cada um dos dois predicados, apenas trés papéis: (1) o doador, (2) oobjetoe (3) o beneficiétio. Essa anslise sugere-nos que certos enunciados devam ser tratados como compostos, ainda que no se note neles nenhum imbricamento, No entanto, tal caso parece néo ter sido previsto por Tesnitre. Os limites da andlise actancial, em relacio & andlise actoral,aparecem aqui claramente: as valéncias verbs s6 conservam os papéise os lugares necesdris ao “pequeno drama’, Elas correspondem, sobretudo na frase concreta, 205, sintagmas que nio se podem deslocar sem modificar a estrutura sinética no :minimo, sem substitu-los por um pronome clitico (A sua vizinha, ew avi onter ‘mesma. Conseqiientemente, as valencas de Tesniére s6 sio compativeis com os actantes da estrucura de base, devendo todos os outros constituintes ou ligarem- tamente a estes ou figurarem na lista de “circunstantes”. nea. » -Osactantes Por outro lado, a gramitica dos casos, cujo precunor mais conhecido € ‘Charles Fillmore, ofereve wna outra descrigo desses actantes (chamados, nessa sgramatica, casos profandos) mais abstratos que os sintagmas. Fillmore também parte da idéia de que a frase, antes de ser uma seqiiéncia de sintagmas dispostos lum a apés 0 outro, &a representaglo seméntica (e mental) de uma cena. Cada cena-predicado impée uma determinada distribuigéo dos actantes (0s casos profiandos). Essencialmente, esses actantes sio: 0 agentivo (actante animado instigador), 0 instrumental (actante inanimado intervenieate), 0 dativo (actante animado afetado), 0 fatitivo (actante resultante), 0 lacativw (actante de situagio) € 0 objetivo (acrante inanimado afetado). Essa lista softeu muitas variagdes € complementos, mas aqui é somente seu principio de base que nos inteessa, Na verdade, no que toca a esse princfpio, nfo se trata mais de “lugares” ou de “valéncias”, mas de casos semanticos que séo definidos por um pequeno niimero de categorias, cujo nticleo comum poderia set a forca ea intencionalidade que the & associada. Assim, 0 actante afetante (agentivo ou instrumental) co actante afetado (objetivo ou dative) sio dois pos de forca: a forga emana de algo e aplica-se a um outro elemento. Por outro lado, 0 actante animado (agentivo ou dativo) ¢ o actante inanimado (instrumental ou objetivo) distinguem-se pelo fato de que o primeio pessui intrinsecamente «ssa forga ou € por ela afetado em sua identidade, enquanto o mesmo nio se dé com o segundo. Por fim, levando-se em conta o alcance dessa forga, pode-se definir 0 locativo e o facttivo: o locativo indica © quadro espaco- temporal no qual a forca é exercida; 0 factitivo, o aleance da forca quanto a suas conseqiiéncias e resultados. Portanto, ao que parece, os actantes em si podem ser abordados de duas maneiras diferentes: segundo uma ldgica dos lugares (como nas valéncias verbais de Tesniére) e segundo uma légica das forgas (como na gramatica dos casos de Fillmore). Desse modo, percusso de sua identidade ser4 diferente para cada caso. No primeiro caso, serd composto por uma série de “posigbes” sucessivas: 0 actante muda de identidade deslocandc-se, ele passa 2 um primeiro plano ou ele recua a um segundo plano em fungio da posicdo (primeiro, segundo, terceiro) que Ihe atribui cada am dos predicados sucessivos. No segundo caso, em contrapartida, esse percurso ser composto por variagées da “forca” que define o actante, essa forca sendo considerada ‘como o conjunto das condigées necessérias para a realizagao do ato: a forca ‘Semidtica dediscurso. aumenta, diminui, esgota-se; a forga pertence ou no ao actante; cla o transforma ou ndo; ela the diz ou nio lhe diz. respeito etc. CCabe-nos refletir em que essas duas ldgicas sio compativeis ¢ quais si0 seus respectivos dominios de pertinéncia, 2. Actantes Transformacionais e Actantes Posicionais 2.1. Transformacao e orientacdo discursiva £ esta ultima questéo que gostarfamos de retomar, agora sistematicamente, segundo a perspectiva de uma semiética do discurso, A lagica dos lugares & wma logica posivional: ela define os actances unicamente a partir de uma posigao de referencia por meio da qual eles podem ser situados (primeiro, segundo, terceiro, por exemplo) e podem deslocar-se. A légica das forcas € uma l6gica transformacional: ela define os actantes tunicamente a partir de sua participagdo em uma transformagio entre dois estados e de seu engajamento em face dessa transformacio. [As proposgSes de Tesnitree de Filmore no pertencem exclusivamente a uma cu outra das dus ligicas. De fato, em Temniére, 0 primeiro ¢ 0 segundo actantes correspondem geralmente a0 sueto ¢a0 objeto. Contrariamente,vit- que a lgica dds forgas cm Fillmore implica fontes ¢ alos. No entanto, pode-se mesmo assim ‘onstaar que Tesniére raciocina mais em termos posicionas, ¢ Filmore, mais em termos cransformacionais. Agora iso pouco importa: a dstingio necesita jf foi feicae, ndependentemente das teoras desses doslingists, ela nos permitrd definir por contraste os actantesporcinals, que dependem da ligica dos lugares, € os actantes smansormacionais, que dependem da gic das Forgas. ‘Um exemplo pode ilustrar essa diferenca: Jost vendeu sua casa de Minas a um argentino. ‘Uma outra possibilidade seria: Pablo comprou uma casa de um agricultor mineiro.* + NT: No eign, a vend &frmada ene "Jean", camponts da regio de Arche (Sadete da rang © "Wolgang, sm alersa. ‘As duas frases baseiam-se no mesmo “pequeno drama” composto igualmente por quatro actantes: dois sujeitos (o vendedor e o comprador) € dois objetos (um objeto, uma contrapartida). Todavia, o lexema verbal é diferente, a ordem dos sintagmas esté invertida. O préprio contetido dos sintagmas, e especialmente 0 grau de identificagio dos atores, é também diferente, Trata-se de uma diferenga na encenacio da frese, é claro, mas, de ‘uma frase para a outra, a cena é praticamente irreconhecivel. Poderiamos contentar-nos em dizer que se trata de uma mudanca de ponto de vista: © mesmo “drama” € contado a partir do ponto de vista de José ou do ponto de vista de Pablo, como se fosse apenas a passagem de uma construgao ativa a uma construgio passiva, Todavia, aqui, a perspectiva nao opde um agente ¢ um objeto, que so, alternadamente, os sujeitos sintéticos da frase. Ela ope dois ageates, que comam alternadamente a iniciativa do processo. Falar aqui em ponto de vista nio esclarece muito as coisas, exceto se atribuimos 1 essa nogio mais importancia do que de costume: ela diria respeito, entio, aos sistemas de designacio dos atores, 4 escolha do lexema verbal, a ordem dos constituintes da frase ete. le diria respeito até mesmo ao sentido do enunnciado, sua intencionalidade. De fato, o segundo enunciado nao faria literalmente sentido algum em uma histéria em que José (ou os mineiros ou os agricultores) fosse a personagem principal. O mesmo vale para 0 primeiro exemplo, de forma inversa. Pois “tomar a iniciativa do proceso” significa pura ¢ simplesmente obedecer ou desobedecer & orientagao discursiva, que decide a posigio de referéncia, que decide o que deve ser levado em conta em relacio a ela. Em suma, a orientacio discursiva escolhe a maneira pela qual as transformagGes narrativas devem se ‘ordenar em torno da instincia de discurso para ter um sentido global. © enunciado de transformagio € sempre interpretivel isoladamente, mas ele serd tido como insignificante ou inadequado no discurso se nao ‘obedecer & orientagio dominante. Eis por que é preciso acrescentar a esse enunciado de transformagio uma “tomada de posigio", que depende da cnunciagdo. Inversamente, a orientacio discursiva e 0 sistema de posigoes Pressupdem o sistema das transformagées, jé que, se o discurso “orienta”, é necessério que haja algo para ele orientar. 1s7 © conceito de “colocagio em intriga” desenvolvido por Paul Ricoeur seria aqui de grande utilidade: de um lado, 0 discurso acolhe as estruturas da histéria, as estruturas da transformacio narrativa; de outro, cle assegura sua “colocago em intriga”, evidenciando as modulagées do desenrolar dos fatos. O papel de “sujeito operador” (aquele que realiza a transformacgo) pertence as estruturas da histéria, enquanto o papel de “actante de i iativa” (aquele que modifica o desenrolar dos fatos) pertence as estruturas da intriga, Portanto, a intriga é 0 resultado da assungio enunciativa das estruturas narrativas, reconfiguradas em relagio & posicio da instancia de discurso e 4 orientagio discursiva que ela impée. Formalmente, por exemplo, dir-se-é que o papel actancial que tem a “iniciativa” na insriga é aquele cujo lugar coincide com a instincia de discurso. Se seguitmos Tesnire & risea, como a indicagio da contrapartida no & necessria& estrurura de base do nosso exemplo, a distibuigéo dos trés actantes (primeira, segundo c serceiro actantes) seria rigorosamente inversa: Joé, que é 0 primeire actante no exemplo inical, tomar-se-ia terecro actante no excmplo seguinte; Pablo, que € somente 0 tercere atante no exemplo inicial, tomar se- ia, em seguida, 0 primeira actante. Por outro lado, se seguirmos Fillmore, nada mudaré: José sempre seria, 20 ‘mesmo tempo, agentivo em relagio 4 casa e dativo em relacio & contrapartida. Pablo sempre seria, 20 mesmo tempo, dativo em relacio & cata e agentive em selacio ao dinheito. Como jd observamos, a teoria de Tesnitre seria mais senstvel A distribuigio dos actantes posicionais, ea de Fillmore, mais sensvel i distribuigio ddos actantes transformacionais. Vése claramente que a descrigfo completa dos fendmenos exige uma teoria actancial que contemple ambas as perspectivas. 2.2. Os actantes posicionais Portanto, a nogio de actante posicional supde que se possam defini os actantes, que sio entidades sintéticas abstratas, a partir de uma topologia, da estrutura de um “lugar”. E 0 que se chama teoria localista, Esse tipo de abordagem nao data de hoje, uma vez que se pode encontré-la jé nos ‘gramdticos estdicos — ao menos pelo que conhecemos deles por meio dos 158 LAR sgraméticos medievais — ¢ em vérios autores russos ¢ americanos. O préprio Hielmsley, que inspirou profiundamente a lingiiistica ea semiética européias, concebeu uma teoria lacalisa dos casos. Esse esclarecimento deve vir acompanhado de um segundo: invocar uma abordagem localista significa recorrer obrigatoriamente & percepcio, De fat, se as estruturas sintéticas podem ter a forma de um “lugar”, de um espago, € porque, antes de se tornarem estruturas sintéticas concebiveis intelectualmente, elas sio, a principio, cenas percebidas vagamente, cenas das quais se extraiu toda a substincia figurativa para conservar somente as propriedades do lugar e do movimento. Logo, essas copologias tém 0 estatuto de imagens esquemiticas subjacentes & sintaxe do discurso. Como séo organizadas em torno de actantes, elas sio estruturas de sampo. Isso nos conduz.novamente ao campo posicional do discurso, a0 campo no interior do qual operam os dois atos perceptivos elementares, a visada ea apreensio, Esses dois atos implicam, cada um, ao menos dois actantes posicionais, tum primeiro eum segundo, 0 actante-fonte eo actante-alvo,com uma mudanga acentuada de registro: na visada, a fonte entra em relagdo intensiva e afetiva ‘com o alvo, em um campo posicional aberto, enquanto na apreensdo a fonte entra em relaco cognitiva e extensiva, ou, ainda, quantitativa, com o alvo, isso tudo em um campo posicional fechado, Em suma, a visada atualiza € abre as estruturas de campo, enquanto a apreensio as realiza c as fecha, Um terceiro actante deve ser previsto igualmente, pois é preciso reservar uum lugar a um serceiro elemento no face a face da fonte e do alvo. Nos jé identificamos esse terceiro como 0 actante de controle ou, simplesmente, controle, Dentre as suas varias fungées, pode-se citar: a regulagem, o filtro, © obsticulo, O tipo “regulagem” é particularmente bem representado pelo funcionamento dos pontos de vista (ver capitulo *O discurso”). © tipo “filtro” esta implicado em todos os processos de selesio, de triagem, de repartisio. O tipo “obstéculo” é a principal fonte da peripécia. Escas diferentes versées do conzrole explicitam particularmente os modos de participagao nas estruturas da intriga (ajustamentos, bifurcagdes, peripécias), que, como se vé, diferem muito clarameate das estruturas propriamente narrativas (conjungio e disjungo entre objetos ¢ sujcitos). 150 a: camo ants dese jis bjs agent” obj osacants sionals so fine calar do to no campo posicional. Antes de seem “ativos", nstrumentis” ou “dives”, eles fo actances teers, actants de console Esse dispositive minimo baseia-se,afinal, no fato de que os atos perceptivos clementares apresentam duas propriedades de base: uma diregda (fontelalvo) um controle dessa diresio, que pode modificar sua orientagio, desdobri-la, interrompé a, prolongé-la etc. Em semiética visual, esse dispositive actancial aplica-se mais particularmente 3 iluminagio, que requer fontes, alvas e que encontra, por vezes, obstdculos. Em contrapartida, na comunicagio, é 0 destinatério adicional, ou observador, que assumirs as FungSes de controle em, relagio & fonte e a0 alvo de cada fase da troca comunicacional, Essa terminologia nao substitui a terminologia empregada em outros ‘casos, como, por exemplo, as nogées de “destinador” “destinatétio”, ou de “emissor” e de “receptor”. Ao contrétio, ela nos convida a distinguir dois niveis de funcionamento. Por exemplo: nos Alcools, de Appolinaite, o pocma “Vendémiaire’ (Vindemiério] coloca em cena um Eu e um Tu que so, respectivamente, definidos como destinador e destinatério, ainda que fonte seja 0 Tu, ¢ 0 alvo, o Eu, Nesse caso, os papéis posicionais nio coincidem com os papéis enunciativos. ‘A semi6tica da luz, por exemplo, ndo pode ser concebida sem esses actantes, lementares. Pode-se até mesmo conccber uma tipologia dos obsticuls de acordo ‘com 0 fato de eles reterem mais ou menos @ luz, de acordo com a forga com que cles se opsem 8 circulagio da iluminagio: desse modo, os obsticulos podem ser ‘pace, ranshicides ow iranparentes. Pode-se também levar em conta a forga que cles empregam para refleti a luz em diregl0 ao alvo: 0 obsticulo absorvente $6 reflete lampejos, enquanto o obstéculo brilhante poder mostrar rcflexos deslumbrantes. No e280 do reflexo deslumbrante, que particularmente tanto aolhe ‘como rejeita a luz, compreende-se laramente que 0 actante captura 0s rios de luz ce desvia sua ditesio, inverte sua orientagio e concentra sua intensidade. Esse feito produzido sobre 0 observador, a violencia do choque visual, é resultado, cvidentemente, da intensidade da fonte original, mas também «, sobretudo, de todas as operagées de controle: desvi, reorientagSo, concentragéo. [Nos textos verbais,sejam eles podtics ou cientfficos, esses actanes posicionais também intervém. Quando, por exemplo, este ou aquele texto coloca em cena transformagées elementares da matri, observ-se que o elementos mateiais so triados, cransferidos, misturados, fundidos, gragas a um pequeno niimero de 160 2 Os actantes ‘operages que c bascam, por sua vez, nos actantesposicionis fame, avo e controle, Um fir, por exemplo, & um actente de controle que separa clemenas misturados, ‘opondo uma resistencia seletivaa seu movimento: considerando a drei escolhida, cle #6 barra uma parte do fluxo ¢ deixa pasar a outra. Por fim na perspectiva da comunicasio, o destinattiosuplementarcindiscreto aparecerd como um terceiro e, portanto, como um actante de controle, pois ele ‘modifica e desvia parcialmente a orientagio do processo de comunicacio, Pode-se axé mesmo pensar que, provavelmente, como ele é sensvel a outras informagSes, diferentes daquelas a que é sensfvel o destinattio direto ele filtraré também o fluxo ¢ desviruari o sentido. Além disso, se sua presenga é conhecida dos dois parccizos dizer da toca, les mesmas serio conduzidos a modifcar suas exrutégias dde comunicagio, em fungio dessa presenca, e da escuta, das preacupagées, das cexpectativa e das estratégias que eles atibuem ao destinatirioindieto. Dois dos trés exemplos empregados aqui (a iluminagdo e a comunicagao verbal) poderiam sugerir que os actantes fonte e alvo so equivalentes aos lissicos emisor e receptor. Essa ambigiiidade deve set dirimida. Em primeiro lugar, seria apenas metaforicamente — ou por um grande nivel de abstragio — que © par emissorl receptor poderia ser aplicado a0 segundo exemplo (as transformagdes materiais). Em segundo lugar, o pat emtisorlreceptor implica uuma atividade transformadora (a emisséo e a recepgo) que nao € pertinente do ponto de vista estritamente posicional. Na verdade, os actantes posicionais no fazem nada por si préprios: eles ocupam lugares, eles sio movidos por ‘uma energia que os desloca. 2.3. Os actantes transformacionais ‘Um actante transformacional deve ser dotado ou afetado por uma forca intencional para tomar parte na cena predicativa do enunciado, ¢ isso independentemente da orientagio discursiva. A tradigéo semistica distingue, ‘a esse respeito, duas classes de transformagées: (1) aquelas que dependem do desejo eda busca, que associam o sujeito eo abjero, e (2) aquelas que dependem da comunicagéo, que associam o destinador © 0 destinasdro, Iso leva a supor que todos os predicados narrativos pertencem a uma dessas duas classes, 0 que, no que conceme aos predicados da fase, precisariasinda ser demonstrado. ‘Mas 0 modelo subjacente no é 0 da frase ¢ dos predicados verbais, & © modelo do discurso em sua dimensio mais abrangente, inclusive ROC UTE antropoldgica. Ora, do ponto de vista antropoldgico, o valor esté no centro da predicagio discursiva: 0 desafio de uma Idgica transformacional, © que Ihe confere seu sentido, é exatamente a construgao dos valores, seu devir, suas realizagées concretas, sua inscrisao nas figuras do mundo. E, do ponto de vista da sintaxe narrativa, isto é, da transformagio das conjunturas, 9 actante necessétio para tal é, no minimo, o objero, justamente aquilo que € transformado, pois o objeto é 0 que esté em jogo na transformacio, 0 actante no qual o valor esté ancorado. Portanto, a perspectiva discursiva coloca no centro da sintaxe narrativa © objeto de valor: aquilo que dé suporte & transformagio ¢ aquilo que, em suma, vale a pena, Reduzido ao essencial, o devir do objeto de valor no discurso conhece apenas duas dimens6es: (1) por um lado, a dimensio da atualizagéo dos valores, gragas a sua insrigdo em objetos ¢ em figuras concretas e gracas & construcio e/ou & conquista desses objetos por sujeitos; (2) de outro, a dimensio da troca dos objetos de valor entre os destinadores € os destinatdrios, que é, por definigio, seu modo de existéncia nas comunidades humanas. Essas duas dimensdes da manipulacio dos valores so também os dois pontos de vista segundo os quais elas so percebidas: por meio das figuras ‘que as exprimem, a percepcio do valor desemboca na dimensio estética dos discursos; ¢, por meio da troca e da circulagao dos objeros em uma comunidade, a percepgo do valor ¢ ética ¢ econdmica. Além disso, essas duas dimensées sio, 20 mesmo tempo, distintas € complementares: uma no pode funcionar sem a outra, e, mesmo que uma dimensio seja inibida enquanto a outra estd ativa, ela continua sendo cficiente. O avarento, por exemplo, inibea dimensio da troca entre sujeitos para conservar somente a dimensGo da atualizagéo do valor em um tipo de objeto particular. No entanto, ele s6 parece avaro, de fato, porque continua a pertencer a um actante coletivo, aquele da troca, que exerce sobre ele uma pressio para que ele devolva & circulagio os objetos retidos, 146? ae Algumas paixGes, como o citkme e a inveja, baseiam-se inteiramente na solidariedade problemética entre as duas dimensécs: de um lado, 0 apego 20 objeto ¢ transformado em inquietacao pela presenga do rival, de outro, as trocas com os outros sujeitos sfo convertidas em rivalidades e competic6es pelo objeto desejado, Essas duas dimensées, tratadas como duas valéacias oriundas da percepsao dos valores, formam, entio, uma estrutura tensiva na qual dominam ora a percepcio do valor por meio das figuras e objetos, ora a percepgao das trocas, e na qual elas podem também se fortalecer ou inibir- se reciprocamente. Em Lévi-Strauss, o sistema de parenteseo é apresentado como um sistema de comunicacio social, que coneerne apenas i dimensio da soca dor objeto: de zalpr. No entanto, e cle se limitasse apenas 2 iss0, no poderia ser tema de narrativaalguma, pois ndo haveria nada a contar, ¢ Rome c Julieta nunca teriam se encontrado. Ora, 0 préprio Lévi-Strauss estudlou casos em que as relages de parentesco cntte familia estio implicadas em narrativas concretas e complexas, fem que justamente a procura do parceiro isto &, a primeira dimensio, a imcrigao do valor em deserminadas figuras (a busca do objeto), também intervém Sobrerudo nas narrativas de incest, as duas dimensées entram em conttadigio: 2 procura do parceiro perturba, enti, a comunicasio social, a busca dos valores ‘entra em contradigio com os principios da sua toca. As duas dimens6es sio necessirias & dindmica da narrativa e influem uma sobre a outra: 0 modo de atualizagio dos valores evidentemente determina os objetos que poderso ser trocados. As regras de parentesco determinam of tipos de aliancss que sio possvcis fou no. De uma outa forma, a influgncia é também determinante. Uma alianga transgressora, por exemplo, colocard em causa a esabilidade do sistema de valores, chegando até mesmo a depreciar os objetos de valores. 'No caso do incest, a estruturatensiva funciona em comeacio inves, f que atualizagéo do valor em um objet particular domina & eusta das regras de ‘toca. Inversamente, no motivo exereotipado dos “casamentos aranjados", 80 as regas da troca social que se impem em detrimento da escolha do cbjewo, Felizmente, cevistem também escolhas aceradas que satisfazem as regras sociais¢ is stuagbes como a época contemporinea demons, nas quais nem a escola do abjeto nem a aplicagio das regras da troca bastam para assegurar o valor da alianga. A histéria dos costumes matrimoniaisassenta-s assim sobre as varagbes dessa extruturaaxioldgica, Os proprios géneros estio sujeitos a essas tensbes: 0 texto poético é, a0 ‘mesmo tempo, um lugar de troca (dos valores de comunicagao, retéricos e ‘Semigeicadodiscurse pragmticos) © um objeto que permite ancorar o valor em uma realidade material ¢ intelectual (dos valores de composigao, morfolégicos estéticos), ‘As duas dimens6es, a construcio do objeto estético e sua comunicagéo 20 Ieitor, corroboram uma & outra e s6 fazem sentido uma em relacio & outra, Entretanto, no interior de um mesmo género, o equilibrio entre as duas dimensbes pode vatiar se, por exemplo, a preocupagao morfolégica e estética prevalecer sobre a preocupaso com a comunicagéo (beirando, por vezes, 0 hermetismo), ou, 20 contrério, como é o caso da doutrina chamada de “realismo socialista”. CConseqtientemente, restam-nos ainda duas dimens6es: (1) uma dimensio em que os valores esto encarnados nos objetos procurados ¢ conquistados pelos sujeitos e (2) uma dimensio em que os valores so propostos, garantidos, trocados e postos em circulaco. Em cada uma dessas dimensoes, a categoria do actante cinde-se em dois papéis, produzindo assim o par sujetol objet, no caso da primeira dimenslo, eo par destinador{ destinatério, no caso da segunda, sujcito visa e apropria-se do objeto, 0 destinador propée-no ao destinatério, Percebe-se a essa altura da exposi¢ao que jé ¢ possivel derivar simples diretamente os actantes transformacionais a partir dos actantes posicionais. De fato, 0 pat sujeitolobjero & homélogo 20 par fontelalvo (o sujcito visa ¢ apreende o objeto); 0 mesmo ocorre com 0 par destinadorldestinatdrio (0 destinador visa e apodera-se do destinatério, comunicando-Ihe 0 objeto), & por fim, 0 par destinadorldestinatdrio atua globalmente como actante de controle (pois é ele que define 0 valot) em relagio 20 par sujizol objeto. Todavia, nés trocamos de dominio de pertinéncia, passamos agora 2 ‘uma légica das forcas,e essa forga € produzida pelo valor. Portanto, pode-se dizer que a “légica transformacional” resulta da projesao do valor sobre © sistema posicional, 20 qual ela impoe, além de uma mudanga de estatuto dos actantes (definidos em relagio & forga axiolégica, ¢ nao em relagéo 20 lugar que eles ocupam), uma duplicagio da estrutura devido as duas dimens6es da manipulagao de valores. ‘Uma outra ambigiidade deve ser agora dirimida: se 0 sujeito apropria-se do ‘objeto, como se pode dizer que o destinador propde-no 20 destinatdrio? Esa aparente contradigio condusiu alguns semioticistas a renunciar a0 destinatério, | que ele seria uma repetisio do sujeto, Contudo a aparente confuséo entre © Usectantes: sujeito ¢ 0 destinattio é somente uma ilusio provocada pea forma de nossas bara covidians, Encanto ni alam naravasem gu sto cons ‘ou conquirta um objeto de valor para colocd-o entre as mio: de um terceiro, 0 eal en Ps a Portanto, a distinggo entre as duas dimensGes e os quatro actantes que as sustentam é imperativa, se no se quer confundir os actantes e seus paptis)c 0s acores (e sua identidade figuratva). Por outro lado, fato de taver quatro papéis actanciais em torno da transformagio narrativa em geral no consticui uma ‘obrigacdo para as transformagSes partculares. Ao contririo, quando o niimero de actantes manifestados ¢ incompleto, 0 disposiivo actancial nao é por isso ‘menos significativo. Por exemplo: a presenga do destinador fiz do sujeito um actante heterénomo, mas, em sua auséncia, ele se torna um actante ausnomo, ‘Do mesmo modo, a auséncia de destinatério, que fz do ato algo apatentemente _Guatuit, coloca em primeiro plano a construsio ou a alimegio da identidade do sujcto, que se torna, entio, 0 principal desafio da narraiva, 2.4. Campo posicional e cena predica a (Os actantes transformacionais derivam, portanto, dosactantes posicionais (1) pela adogdo de uma outra légica semidtica (forca e valores) e (2) pela duplicagao da estrutura. Masa distingdo entre os actantes posicionais eos actantes transformacionais baseia-se na oposicéo mais abrangente que nos conduz a opor o universo da _presenga ao universo da jungao. O universo da presenga € aquele do campo de presenca, da tomada de posigao enunciativa, da orientacéo discursiva etc. O tuniverso da jungdo €, por outro lado, aquele dos enunciados de estado e de asio, das transformagGes ¢ da programacio narrativa. O universo da presenga tem por dominio de eleiglo 0 discurso em ato, 0 discurso concebido como tum conjunto significance sujeito aos atos de enunciagzo. O universo da jungao, em contrapartida, tem por dominio de eleigao 0 discurso ertunciado, o discurso acabado ¢ objetivével. Portanto, a presenga ¢ seu dominio de pertinéncia ~ 0 discurso cm ato ~ dependem das fases incoativa e durativa do processo Semidtico. J4 a jungao e seu dominio de pertinéncia 0 discurso enunciado — dependem da fase terminativa, do aspecto acabado do mesmo processo. Desse modo, 0 momento da presenga (que funda a pertinéncia do campo posicional) é aquele da emergéncia dos valores nas modulagies da ‘o-presenga —co-presenca entre fontes ealvos, sincronizacdo e ajustamentos 165 ‘Semioticadodiscurso. ddeseus ritmos de existencia flutuages de seus reciproces efeitos de intensidade, ‘© momento da jungéfo (que funda a pertinéncia da cena predicativa) é aquele da ancoragem dos valores nos objetos, da circulagio dos objetos. Essa distingao € particularmente perceptivel no discurso da filosofia cinica: 0 cfnico, de fato, ésensivel a presenga dos meios necessérios &satisfagéo de suas necessidades, mas ele faz de tudo para que esses meios nao se tornem objetos de valor, O cinico nao se conjunge ou se disjunge dos objetos, pois le Ihes recusa seu estatuto sintético. E 0 meio mais seguro para tanto é a satisfagdo imediata, sem elaboragao ¢ sem ritual: os alimentos consumidos sem demora (e sem cozimento), os parceiros sexuais “consumidos” no mesmo instante, sem nenhuma preparacéo nem ritual de sedugdo. A sincope temporal, nesse caso, é 0 meio pelo qual 0 cfnico permanece em presenca sinctonizada com suas necessidades ¢ inibe toda claboracéo axiolégica. Jean-Claude Coquet propbe a ese respito distingur dois tipos de semidticas dicen, A emia da junio, de ansormagio nara «do actane rogramado é dita objral. A semidtica da presenga, do campo posicional e das Fost incase lnk prramates 6 dina Sebel Eric Landowski, por sua vez, também propés, de wma ourra mancirs, ising ua sited juno (endian cognac econdmica) uma semiética da presenca (de tendéncia sensvel e estética) ‘No entanto, nio basta distinguir essas duas semidticas: € preciso, ademas, articulé-las como dois regimes diferentes da significagio. Jean-Claude Coquet propée, baseado em uma terminologia emprestada de Tesnitre (primeiro, segundo e terceiro actantes), distinguir essencialmente, no interior da instdncia de discurso, dois tipos de primeiros actantes ~ 0 nio- sujeito ¢ 0 sujeito —, confrontados a0 objeto (0 segundo actante), aos quais se acrescenta eventualmente o destinador (0 terceiro actante). O ndo-sujeito pode somente predicar, ele néo tem iniciativa na medida ‘em que sé pode seguir percursos preestabelecidos, um miimero bem pequeno de programas impostos. Todavia ele é em primeiro lugar, um corpo, um corpo que toma posigao no campo do discurso e, por essa razo, & também o lugar das emogbes e das paixdes. O sujeito pode, a0 mesmo tempo, predicar e afirmar. Porcanto, cle € capar de julgar ¢, gracas asso, tem acesso as fungSes superiores da percep¢40> -Osacrantes, dda cognicio e da avaliagao, Todas as iniciativas lhe sio possives, jé que ele pode sempre deliberas; decidir inventar scus préptios percursos. O destinador & 0 terceito a0 qual se referem ou nao 0s dois primeiros, de acordo com o fato de eles serem heterénomes ou autinomos. Esses diferentes actantes pertencem & classe dos actantes posicionais, ¢ no & classe dos actantes transformacionais. Na verdade, eles sfo insténcias enunciantes do discurso, € nfo actantes narrativos da histéria. Uma das diferencas entre 0 “nao-sujeito” (que s6 pode agir se for programado) ¢ 0 “sujeito” (que inventa seus préprios percursos) diz respeito & questéo da iniciativa, que nds associamos 2 colocagdo em intriga. Uma outra diferenca, que faz do nao-sujeito um escravo dos aspectos do process0, ¢ do sujeito, um actante senhor do tempo, esta baseada na mesma distingio entre, de um lado, as estruturas narrativas atemporais da “hisiéria” e, de outro, a temporalidade inerente & colocagao em intriga. Segundo a perspectiva que propomos, o ndo-sujeto seria a fonte de urna visada, enquanto 0 sujeito seria a fonte de uma apreensio, De fato, a visada & sensivel, intensiva e afetiva, enquanto a apreensio € perceptiva, extensiva € cognitiva. Por outro lado, de um outro ponto de vista, a capacidade de julgamento do sujeito faria dele um bom candidato 0s papéis de controle na auséncia de um terceiro destinador. Entretanto, como a tipologia proposta por Jean-Claude Coquet foi exclusivamente elaborada para dar conta dos discurses verbais, na tradigéo lingifstica oriunda de Benveniste, nés conservaremos as denominagées fonte, «luo e controle, que, além de oferecerem uma definigio mais especifica da dimensao perceptiva, dizem respeito a uma Semistica geral. E preciso ainda dizer que a teoria actancial de Jean-Claude Coquet explora principalmente uma outra dimensio da identidade actancial, a ‘™modalizario, dimensdo sobre a qual trataremos mais adiante e que se revela particularmente heuristica. Em contrapartida, a divisdo entre semidtica objetal e semidtica subjetal, que permitiu depreender um novo dominio de pertinéncia ~ aquele do ‘campo posicional e da presenga-, no pode mais ser mantida, pois os dois dominios de pertinéncia devem ser, a partir de agora, associados no interior de uma mesma semiética do discurso. Na verdade, no se pode reduzit a ‘Seéticadodiscurso instancia de discurso 20 campo posicional nem reduzir 0 discurso enunciado a cena predicativa, Se reduzimos a instincia de discurso ao campo posicional e & presenca, 36 conservamos 0 substrato fenomenoldgico do discurso, sua forma intencional elementar, e perdemos, ao mesmo tempo, a outra dimensio do discurso, a dimensGo que faz dele uma estrutura de recepcio e de troca de valores, enfim, um sistema de valores. Se reduzimos o discurso enunciado unicamente & cena predicativa, sé conservamos a dimensio narrativa ¢ formal do discurso, e seu substrato axiolégico, ¢ perdemos de vista, a0 mesmo tempo, tanto a dimensio do discurso em ato comoas condigées de emergéncia dos valores. Essa concepgio sobre 0 discurso possibilirou as avangos tedricos ¢ metodoligicos dos anos 1970 e 1980, justamente porque ela reduzia o dominio de pertinéncia purificava-o de todo efeito “subjetivo”. Ao “objetivar” o discurso sob a forma de um simples enunciado, essa concepgio tornava possivel a articulagéo formal. Bla deve, atualmente, ser complementada pela outra concepsio que adota o ponto de vista do discurso em ato. Portanto, entre uma opgio, que consiste em tudo explicar & luz do ‘campo posicional do discurso, ¢ uma outra, que consiste em tudo reduzir: 2 estrutura actancial narrativa, escolhemos conservar para cada um desses pontos de vista seu dominio de pertinéncia e associd-los entre si gracas & nogio de présis enunciativa. Voltaremos a tratar dessa nogao, mas, daqui em diante, ela jé pode ser compreendida como o lugar da articulagéo centre as estruturas semionarrativas ~ dominadas pela cena predicativa ~ 2 instancia de discurso — dominada pelo campo posicional. A préxis enunciativa € também um outro nome para aquilo que chamamos anteriormente de processo semidtico ou. semiose em ato, e fica claro agora como os dois dominios de pertinéncia invocados dependem cada um de uma fase particular (de um aspecto) dessa praxis e de seu processo. -Osactantes 3. As Modalidades 3.1. A modalidade como predicado 3.11. O prepicapo Mopat ‘As modalidades séo predicados que atuam sobre outros predicados e, portanto, eles sio predicados que modificam o estatutode outros predicados, Ademnais, eles asseguram uma mediacio entre os actantes e seu predicado de base no interior de uma cena predicativa, Assim, a modalidade do querer relaciona um actante sujeito a um outro predicado (dangar, por exemplo). Quando ocorre a reaiza¢ao concreta dessa relagéo, o actante do predicado modal pode ser confundido com o actante do predicado modalizado (Ele quer dangar) ou estar dissociado dele (Ele quer que voce dance). Pode-se encontrar também um caso em que apenas o objeto do predicado modalizado ¢ mencionado (Ex quero esta casa). Todavia, independentemente de qual for a variedade de realizagées particulares, 2 estrutura subjacente é sempre a mesma, c Na perspectiva lingtifstica, a expressio da modalidade &, de fato, muito varidvel: ela pode dar-se em um verbo (saber), em uma perifase verbal (ser capac de) ou em uma expressio nominal (a capacidade de.., a necesidade de.) ste. As nuangas semanticas sao infinitas, ainda mais em relagao &s combinagbes {que as express6es modais podem contrair entre si, Por exemplo, 0 enunciado: Ele gostaria mesmo de aprender a dangan predicado dangar € modalizado por aprender, que é uma modalidade factual do tipo saber. Essa modalidade cognitiva é modalizada pelo querer (o ‘estar’), outra modalidade factual. Essa modalidade volitiva é modalizada dluas vezes, uma primeira vex pela forma verbal em -ria, que é uma modalidade de atenuagéo argumentativa e que produz uma distancia ‘nunciativa e um valor probabilistico, e uma segunda ver. pelo advérbio ™esmo, modalidade de orientagio axioldgica concessiva. Sem aprofundarmo- Ros mais nos meandros da anélise, fica bem claro equi, acerca de um ‘Semi6ricadodiscurso | ‘enunciado por fim muito banal, que a modalizagao multiplica os niveis de controle do predicado de base ¢, ao mesmo, introduz gradientes, tensdes ¢ polaridades reversiveis. Essa propriedade é essencial para explicar certos efeitos passionais, que de uma forma mais geral chamaremos daqui a pouco de “imagindrio modal”: a determinagio modal dos predicados é recursiva, essa recursividade pode adiar indefinidamente a realizagdo do processo principal. Eis por que, sob uma perspectiva discursiva, a Semidtica conservou um niimero fixo de predicados modais, que sao, por razdes de comodidade, designados pelos verbos modais, mas nao devem ser confundidos com as express6es lingiisticas correspondentes. Esses predicados modais sio, assim, © querer, o dever, o saber, 0 podere o crer. Voltaremos a tratar da tipologia das modalidades, mas agora devemos introduzir uma distingao entre modalidade ¢ modalizagao. ‘A modalizagdo & mais geral que a modalidade, Na verdade, entende-se por modalizagio em lingifstica tudo 0 que assinala a atividade subjeriva da instdncia de discurso, tudo 0 que, de fato, indica que se trata de um “discurso em ato”. E isso inclui as expressbes afetivas, as avaliagdes axiolégicas, as orientagées ¢ efeitos argumentativos, ¢, conseqiientemente, a constituiga0 dos sistemas de valores do discurso. E, ainda, se se adota a perspectiva de Jacques Geninasca, para quem o discurso inteiro manifesta a atividade da ‘enunciacgo, nfo hé muito mais limites para a modalizacio. Em contrapartida, a nogio de modalidade & mais especifica. Ela é, como dissemos, um predicado que atua sobre um outro predicado. Mais precisamente, é um predicado que enuncia, na perspectiva da instancia de discurso, uma condicéo de realizagio do predicado principal. Em outras palavras, a modalidade emana especificamente de um actante de controle, enquanto a modalizarao emana em geral da manifestagéo da atividade emunciativa, Esse actante de controle, enquanto actante posicional, pertence a instancia de discurso e participa da atividade enunciativa, mas representa apenas um de seus miiltiplos aspectos. Essa cldusula, que limita o campo de aplicago da nogio, autoriza-nos, portanto, a traté-la de maneira especifica a partir de agora, sem confundi-la com a enunciagio global ¢ implicita do discurso. -Osactantes, 3.1.2. A MODALIDADE COMO CONDIGAO PRESSUPOSTA PELO PROCESSO Para apreciar a natureza particular desses predicados modais, pode-se confronté-los aos predicados que eles modificam. Quanto ao valor de verdade, 0 predicado modal permanece verdadeiro mesmo se 0 predicado modalizado nao 0 é. O fato de que Ele danga seja falso nao impede que Ele quer dancar permanega verdadeiro. Em contrapartida, se Ele quer dancar € falso, enti seré preciso acrescentar muitas outras condig6es complementares (uma obrigacao, por exemplo) para que Ele danca seja, se nao vetdadeito, a0 menos realizdvel. No caso de a modalidade querer ser falsa, conseqiientemente Fle danga ¢ falso também ‘ou, entéo, poder-se-é dizer, sob a forma de uma verdade concessiva: Embora ele nto queira dangar, ele danga assim mesmo (porque ele € obrigado, como 0 ministro ladrao em Zadig,? de Voltaire). Essa assimetria dos valores de verdade ¢ tipica da relagao de pressuposi¢io. Nesse caso, o predicado modal é pressuposto pelo predicado modalizado. O estatuto de termo pressuposto, em lingifstica, implica uma propriedade que € crucial para a semiética do discurso: um contetido pressuposto permanece verdadciro mesmo que ele no esteja expresso explicitamente; para isso, basta que o termo pressuponente esteja expresso. Se Ele danca é verdadeiro, entéo as modalidades que ele pressupde também o sio, ao menos ‘em parte. Isso significa que, no decorrer da andlise, estaremos no direito de questionar-nos, por exemplo, sobre a presenca implicita de um querer ou de um saber, mesmo se tais modalidades nao estiverem explicitas. Esse ponto essencial para se comprecnder o estatuto enunciativo das modalidades. Elas dependem da perspectiva enunciativa, primeiramente, Porque o actante de controle € um dos papéis da instincia de discurso e também porque nos levam a pensar que um processo qualquer pode ser visado sob varios pontos de vista diferentes. Ora, € 0 papel da instincia de discurso fazer variar dessa maneira as visadas e as apreensbes, 0 que confirma ‘nossa sugestio, por outro lado, que consiste em atribuir o predicado modal 4 um actante posicional, 0 actante de controle, No entanto, de uma forma mais abrangente, a modalidade pertence muito freqiientemente 20 dom{nio do implicito enquanto pressuposto. O implicito néo tem nenhuma existéncia verificdvel no dominio de pertinéncia ‘Semidtcadodiscurse do discurso enunciado, senio uma existéncia metalingiistica. De fato, por dedugao, pode-se decretar que para fazer € preciso, primeio, suber, querer, dever etc, ¢, quando se encontra um fazer no discurso, pode-se, entio, reconstruir por deducio os saber, os querer e os dever subjacentes, Em contrapartida, na perspectiva do discurso em ato, 0 implicito de um discurso depende do “saber compartilhado”, dos conhecimentos (enciclopédicos ou circunstanciais) comuns aos parceiros da enunciasio, Portanto, 0 implicito, enquanto “saber compartilhado”, seré comprometido na praxis enunciativa, serd oculto ¢ extraido, convocado, interrogado. Além disso, a qualquer momento os parceiros da troca enunciativa podem langar mio dele para fortalecer, testar ou subverter o elo empatico que os une, Portanto, expressa ou no expressa, a modalidade é uma condicio para que 0 predicado se realize e seja verdadeiro no discurso, Esse estatuto de condigio pressuposta levou a conferir aos predicados modais, em semistica, ‘um estatuto distinto dos outros predicados: as modalidades sio as condighes necessérias ou facultativas da agio transformadora dos actantes. No entanto, enquanto condicio de realizagio do ato, a modalidade atua sobre 0 conjunto do processo ou, como dizfamos anteriormente, sobre 0 conjunto da cena predicativa, Conseqiientemente, ela atua ao mesmo tempo sobre 0 predicado propriamente dito ¢ sobre seus actantes. Ela atua sobre 0 predicado, éclaro, na medida em que designa um de seus modos de existéncia anterior 3 sua realizagio (eis 0 porqué dessa propriedade ser designada como condigao de sua realizagio), Contudo cla atua também sobre os actantes, na medida em que 0 conteiido semantico da modalidade pode ser considerado ‘como uma propriedade do proprio actante, propriedade necessétia para que ele realize 0 ato. No esquema narrativo can6nico, por exemplo, as modalidades s40 adquiridas na fase da etapa denominada aguisigio de competéncia (as provas qualificantes de Propp). As modalidades sio genuinos predicados narrativos, pois elas, de fato, transformam algo: a competéncia € adquitida, complementada, perdida etc. Entretanto, o que os predicados transformam € somente a forca intencional dos actantes, isto é uma parte de sua identidade de actantes transformacionais, e nao diretamente a situagao narrativa, LOsactantes Portanto, as modalidades consideradas como condigdes pressupostas pertencem & ligic ala forgas, a lbgica transformacional do discurso-enunciado, 3.13. A MODALIDADE COMO MODO DE EXISTENCIA DO PROCESO ‘Um processo em que se exprimem as condicdes sob forma modal é um processo que nao é considerado como realizado. Quetendo apreendé-lo pelo angulo de sua condicéo modal, escolhe-se uma perspectiva em que sua realizagio cst somente em segundo plano, e sua cordicdo modal, em primeiro. A atengao dirige-se, entio, para as condigdes ¢ afasta-se parcialmente da transformacao em si. Portanto, pode-se dizer que a modalidade modifica 0 modo de existéncia do processo no discurso, que ela muda seu grau de presenga em relagao & instancia de discurso. A modalidade ocupa o primeito plano, absorve a atengio ¢ beneficia-se da presenca discursiva mais forte. A realizacdo do processo fica em segundo plano, nao chama a atengdo e sua presenga no discurso ¢ enfraquecida. Quanto aos modos de existincia, 0 predicado modal suspende a realizacdo do ato jd que, com a modalidade, se concebe o processo em uma perspectiva diferente daquela de sua realizacio pura e simples. Portanto, é preciso supor que a modalidade confere 20 predicado que ela modifica um modo de existéncia diferente do realizado, Examinemos a seqiiéncia: (1) Ele danga (2) Ble sabe dancar (3) Ble quer saber dangar Na seqiiéncia (1), dangar estd realizado; em (2), 0 saber esté realizado, ‘mas a realizagéo de dangar estd suspensa; por fim, na seqiéncia (3), apenas © querer esta realizado, e a realizagio de saber e de danar esté suspensa. Pode-se até mesmo considerar que a distancia entre 0 novo modo de existencia do processo € 0 modo de existéncia realizado £ proporcional a0 niimero ¢ ao tipo de modalidades. Fica claro que, quanto mais se aumenta ‘ontimero de condigdes modais concatenadas, como na seqiiéncia (3), relega- se mais ainda a realizagao do processo para um segundo plano. ‘Consideremos a existéncia no discurso como uma gradagao, cujos dois pélos extremos seriam o pélo realizado ¢ 0 pélo virtualizado. Por um lado, Ele danga acontece, est “presente” no discurso, por outto, Ele danga nio ‘Serniléticadodiscurso acontece, est4 “ausente” do discurso. Entre esses dois pélos extremos, os diferentes predicados modais permitem-nos percorrer codos os graus intermediérios. Voltaremos 2 tratar mais adiante sobre a definicéo desses graus quando propusermos uma tipologia das modalidades. Todavia, para poder falar em diferengas de presenga discursiva dos processos, para poder invocar o gradiente de seus diversos modos de existéncia, é preciso supor que o processo esigja situado no campo posicional da instincia de discurso, que ele seja percebido por um observador ¢ que 0 sujeito da enunciacao possa dispor sobre a distancia (espacial ou temporal, no importa) entre 0 proceso e seu observador. Sem isso, a nogdo de modo de existéncia permanece uma nogao puramente abstrata e formal, No campo posicional, quanto mais se se distancia do centro, mais a presenga enfraquece-se em relacio ao centro. E quanto mais se se aproxima do centro, mais a presenga fortalece-se. (Com relagio &s modalidades, quanto maior o niimero de condigdes modais ‘as quais o processo esté sujeito, mais distante ele esta do centro de referéncia. Do mesmo modo, quanto mais essas condiges sio incertas ou desfavoriveis, mais 0 processo esté distante na profundidade do campo de presenca. Portanto, distinguir-se-4 duas dimensdes da presenga modal: 0 niimero ea intensidade. O ntimero de modalidades distancia-se proporcionalmente do centro de referéncia, pois ele aumenta a distincia em relagéo ao modo realizado. A intensidade é aquela da expectativa de realizagio: quanto mais a condicio ¢ incerta, quanto mais ela é desfavordvel, mais essa expectativa € fraca, e 0 processo afasta-se mais ainda na profundidade do campo, para longe da instancia de discurso. Portanto, o modo de existéncia do proceso modalizado é mensurado em relacio oposi¢éo enunciativa, O que esta em jogo ¢ a do campo posicional, do centro de referéncia e da distancia em relagio ao centro de referéncia. Logo, o modo de existéncia do processo modalizado faz parte da outra Idgica, isto é, da légica dos lugares, a Iégica posicional prépria 4 instancia de discurso, Quando a modalidade ¢ considerada como uma condigao do processo, ela deriva da légica das foreas; quando é considerada como um modo de existéncia do processo, ela deriva da 6gica dos lugares. —y -Osactantes, O resultado disso € que as modalidades séo a interface entre, de um Jado, 2 eserucura narrativa da histéria (as transfurayGese a Idgica das forcas) & de outro, a colocagéo em intriga ¢ a instincia de discurso (o campo perceptivo ¢ a légica das posig6es). Portanto, néo é surpreendente que a teoria da modalidade tenha conhecido dois desenvolvimentos paralelos: um em semiética narrativa (a partir das proposigies de Greimas) e outro em semiética do discurso (com as proposigées de Coquet). Compreende-se melhor também por que a semiética das paixdes - que se bascia, entre outras coisas, nas modalidades — esteja a meio caminko entre a semiética narrativa ¢ a semiética discursiva que proponha, de certa maneira, uma sintese dessas duas abordagens, 3114. A TROLOGIA DAS MODALIDADES Como sintese das proposigées que formulamos, podemos propor agora ‘uma tipologia das modalidades que se assenta sobre o dupa estatuto de condigao Pressuposta (aspecto narrative) e de modo de existencia do proceso (aspecto discursive). Conforme esse duplo estatuto, as modalidades sero definidas por meio de duas varidveis: (1) os actantes que clas envolvem, como con do processo, no que diz respeito i ldgica das forcas, e (2) os modos de existéncia que elas impdem ao processo, no que diz respeito 2 da ligica dos lugares. Segundo a légica das forgas, duas situagées configuram-se: ou a modalidade modifica a relacio entre 0 sujeito ¢ 0 objeto ou, entio, ela modifica a relagéo entre o sujeito e um terceiro actante. O querer e 0 saber modificam a relagao entre o sujeito e seu objeto, Todavia, essa relacao pode também ser modificada por uma forma do crer, que se exprime em portugues pela construgio “crer em algo”, e que chamaremos pura simplesmente de rer. O dever © 0 poder modificam a relasio entre 0 sujeito e um terceiro, scja esse terceiro um destinador (no caso do dever) ou um adversério (no caso do poder). Essa relagao entre 0 sujeito € 0 terceiro actante pode ser também modificada por um outro tipo de crer, que se exprime em portugues pela construsao “crer em alguém”, e que chamaremos de aderir para distingui- la da primeira forma, Segundo a légica dos lugares, que define os diferentes modos de existéncia, ‘quatro sicuagées configuram-se, correspondendo aos quatro modos de ‘Semidnica dodiscurso cexisténcia reconhecidos até hoje. Sao eles, na ordem de graus de presenga: (1) 0 modo virtualizudo, que caracteriza 0 querer © o dever; (2) 0 modo potencializado, que caracteriza os dois tipos de crer; (3) 0 modo atualizado, {que caracteriza 0 saber e 0 poder, e, por fim, (4) 0 modo realizado, o tltimo da lista, que ndo 6, na verdade, o modo das modalidades em sentido restrito, j4 que, sob scu dominio, surgem os enunciados do fazer e do ser, que nao comportam nenhuma distancia modal. A tipologia das modalidades deduzida a partir de seus dois principais tipos de propriedades estabelece-se, entio, da seguinte maneira: [Modo [Modo | Modo | | virtwalizado jalizadlo atualizado | Motivages Crengas | Sujeio/Objeo | __ QUERER Case | SujeltorTerceiro | DEVER Ase | 3.2. A modaliza¢ao como imaginario passional O conjunto dos predicados modais do discurso surge agora como uma dimenséo em parte autdnoma em relagio aos predicados narrativos dos quais eles modificam o sentido ¢ o estatuto. ‘Essa relativa autonomia lhes ¢ assegurada por duas observages que, entre as j feitas aqui, merecem ser novamente evocadas: (1) em primeiro lugar enquanto condigées pressupostas, as modalidades sio independentes da realizagio do processo;além disso, oconjunto da dimensio modal do discurso pode ser reconstituido a partir dos processos, estejam as modalidades expressas ou nao; (2) em segundo lugar, enquanto modos de existéncia dos process0s, as modalidades estio sob o controle da enunciagio ¢, desse modo, elas escapam ao controle dos predicados que elas modificam; elas Ihes impoem a posigio da instincia de discurso e determinam-lhes a orientagio discursiva. Essa relativa autonomia levou, ademas, a um desenvolvimento considerivel das pesquisas modais, pois o enunciado modal nos dé acesso a estruturas actanciais e narrativas mesmo na auséncia de uma narrativa de fato. Eis por que, pot AR: cexemplo, para caracterizar o valor semidtico de uma porta ou de uma janela em semidtica da arquitctura, no é necessdrio coletar e analisar os percursos dos sujeitose seus usosefetivos dessestipos de aberturas basta reconhecer seu estatuto ‘model (poder/nio poder-ver, poderfndo poder-atnavesar et). Isso nos convida a fazer da dimenso modal do discurso uma dimensio completa capaz de assegurar sozinha todo um ramo da significagao tanto de discurso enunciado quanto do discurso em ato. Considerando essa significasio como independente da realizacio dos processos, daquilo que acontece de fato na dimensio narrativa, pode-se dizer, em suma, que ela inaugura no discurso um campo imagindrio expecifico, urn imagingrio cuja instdncia de discurso esté sempre no centro, mas que obedece a regras diferentes das regras da dimensio narrativa propriamente dita. Quando enuncio Eu quero dangar, eu me ponho a sonhar com cenas em que danco: apenas a modalidade basta para descortinar essas evocagbes imaginrias, independentemente do que eu faga na realidade. 3.2.1. A MODALIZACAO COMO CONSTRUGAO DA IDENTIDADE DOS ACTANTES A identidade semantica de um actante € definida pelo lugar que ele ‘ocupa em relacéo a. um predicado: mas essa identidade s6 é assegurada ~e 86 ser igualmente reconhecida — no Ambito de todo o discurso se cla apresenta uma recorréncia. Como ja observamos, as modalidades so as mais aptas a assogurar essa recorténcia e, portanto, a construir a identidade do actante na medida em que, mesmo quando elas nao esto expressas, clas so dedutiveis. Consequentemente, elas so mais freqiientes que suas manifestagdes explicitas; além do mais, elas podem ser expressas mesmo na auséncia de um proceso realizado ¢, por isso, sao globalmente mais freqiientes que os préprios processos. Logo, essa propriedade nos incita a baseat-nos nas modalidades para construir a identidade do actante. Formalmente diz-se que, se os predicados modalizados descrevem 0 fizzer dos actantes ~ sua performance -, os predicados modais descrevem, em. contrapartida, seu set —sua comperéncia, Portanto, a dimensio modal do discurso pode agora ser considerada como aquela em que— por actmulacio, combinagio € transformagio das modalidades — os actantes constroem sua identidade. Imaginemos, por exemplo, um actante que sc esforga para adquirir todas as WT Usactantes SenoREES ‘competéncias necessiias para realizar uma procza: cle acumula técnicas, estoca informagies, treina, ganha resisténcia etc. No final das contas, ele muda de identidade, esté melhor assim, e estima que fea 0 que importava: ele nao se dé ‘mais sequer ao trabalho de realizar a proeza. A construgio da identidade modal prevalece, entio, sobre a busca dos objetos de valor. Em termos mais tnicos: 0s valores modais sio substituidos pelos valores descrtivos. A identidade modal dos actantes pode ser caracterizada pelo miimero de ‘modalidades que a define ¢ pela natureea das combinagies que cla contrai. Portanto, ¢ preciso, a prinelpio, definir 0 niimero de modalidades ¢ as combinagées concebiveis para cada ntimero: (1) O actante nao modalizado (actante M°) é um actante imediatamente realizado no acontecimento, um corpo que toma posicio. Portanto, ele pode apenas reagir as tenses, sensiveis e afetivas, que perpassam seu campo de presenga. Quando Proust descreve a experiéncia do despertar nas piginas ais de No caminho de Swann, ele descteve, primeiro, a omada de posicio progressiva de um actante M? e sé depois a aquisigio das modalidades. Logo, 0 actante M?° teria o estatuto de uma instincia fenomenolégica em um campo discursivo em vias de formacio; (2) O actante unimodalizado (actante M?) deve ser provido da tinica modalidade de que ndo se pode prescindir para agir — 0 poder-fazer (a capacidade) — ou para existir— 0 poder-ser (a possibilidade). Quando Fabricio cesté perdido em plena batalha de Waterloo, em A cartwca de Parma, de Stendhal, ele acaba por esquecer 0 que ele foi fazer ali — futar, talvez ver Bonaparte —, ele nao tem mais nenhum ponto de referéncia, cle reage apenas ‘em fungi das peripécias de modo a safar-se sem graves prejutzos: nele nao hhd nem querer, nem dever, nem saber, hd unicamente poder. O actante M' é ‘um autémato ou uma méquina eficazmente programada para uma tinica tarefa e que depende, assim, obrigatoriamente, de outros actantes mais bem providos de modalidades; (3) Portanto, o actante bimodalizado (actante M") deve combinar o poder com uma outra modalidade. Agir “impulsivamente”, por exemplo, é, do ponto 1728 de vista da identidade modal, agir sob o controle do poder e do querer (nao se cencontra ncsse ato nem deliberagéo, nem programagio cognitiva da asso, nein injungéo exterior), Em contrapartida agir“metodicament’ e em engajamento passional é contentar-se apenas com 0 poder ¢ com o saber: Por fim, a identidade do “escravo”, ou do actante sob controle (ou sob influ€ncia), associaré um dever a0 poder do autémato, Eis © minimo modal necessétio para participar de um cesquema narrative canénico: ou poder + querer, ou poder + saber, ow, ainda, poder + dever. Osactantes M', M' eM? correspondem para Jean-Claude Coquet 20 ndo-sujeito: fica claro que a descricio modal é mais precisa e mais diretamente operatéria que a denominagéo genérica, adotada por comodidade, Ademais, é preciso esclarecer que as combinages modais que ele concebe sio menos numerosas que aquelas que propomos aquis (4) O actante trimodalizado (actante M’) €0 inico que se pode considerar como tendo uma identidade quase completa, é que nesse nivel de modalizagéo ele combina praticamente todos os tipos de modalidades: 0 poder, acrescentar- se-4, por exemplo, um saber € um querer para um actante auténomo, ou um saber © um dever para um actante heterénomo. Nos deis casos, no lugar do saber pode surgir um cer etc. Perretce, da fibula de La Fontaine A leiteira eo {jarro delete, corresponderia.a0 tipo M?, mas com uma mudanga de identidade 20 longo do caminho. Ela parte para a cidade com seu arto de leite sobre a cabega, com um equipamento modal de actante M heterinomo: ela pode, sabe e deve. No entanto, com a ajuda da imaginagio, ela muda de identidade e impée-se, ento, como um actante MP autinomo: ela ainda pode, ela se poe a carer em sua iminente fortuna, ela quer especular sobre a venda do leite. Sua queda, o incidente final, traz. bruscamente Perrette de volta & primeira identidade e, ainda por cima, sem 0 poder, (5) Quando 0 actante é definido por quatro modalidades (actante M‘), co ntimero de combinagdes aumenta, mas, obviamente, uma nova dimenséo da identidade surge entéo. Na verdade, entre as combinagoes possiveis, algumas vo obrigatoriamente opor um saber e um crer, tras, um querer € tum dever, que poderiam aparecer, ento, ao mesmo tempo como redundantes contraditérias: ou 0 sujeito sabe ou cré, ou ele quer ou deve. Tanto em 170 ‘Semiéticadodiscurso um caso como no outro, é preciso conceber uma hierarquia entre as modalidades redundantes. Percebe se, nos dois casos, que essa hierarquia permite compreender como o sujeito assume seu percurso ou seu ato. Logo, anova dimensao que surge € a dimensio da assungéo, Nao s6 se sabe, mas se eré: 20 passo que fica claro que se assume pessoalmente 0 que se sabe. Nao 6 se deve fazer algo, mas se quer: assume-se, entao, pessoalmente 0 que se deve fazet. Essa dimensio pode ser também manifestada na identidade do actante M3, mas, nesse caso, na falta de redundincia parcial entre as ‘modalidades, apenas o contexto permite decidir se 0 crere 0 querer tém esse valor de assungéo. Primera observacio: Jean-Claude Coquet traduz. essa propriedade sgrafando a modalidade de assungao — em sua teoria, apenas 0 meraguerer — ‘com maitiscula ¢ colocando-a na primeira posicio da série modal. Para ele, ela € caracter(stica ao actante sujeto. Propomos atribuir também ao crer 0 cestatuto de modalidade de assungio. Realmente, se limidssemos o exercicio da instincia de discurso ao campo posicional, o querer bastaria, jd que ele permite ao sujeito afirmar-se a si mesmo como ego. Todavia, se a instincia de discurso é também a instncia que constréi e controla.o sistema de valores do discurso, entao 0 crer torna-se necessitio para assumi-los. Segunda obscrvacio: as combinagdes concebiveis aqui sio menos numerosas que aquelas teoricamente possiveis. HA duas razGes para isso. Primeiramente, assim como as slabas de uma lingua so bem menos numerosas que as combinages possiveis entre os fonemas da prépria lingua, as combinag6es modais so também culturalmente determinadas elimitadas. E preciso realmente reconhecer que, quanto a isso, nds raciocinamos até aqui — como jé tantos fizeram! — segundo um ponto de vista “ocidental contemporineo”. Nés situamos, por exemplo, 0 pader na base do edificio, jd.que ele caracteriza o actante M'. De fato, poderfamos muito bem imaginar uma cultura em que, por exemplo, a modalidade do actante M' fosse obrigatoriamente o querer. Hi um vestigio dessa configuragao na expresso popular francesa Cet arbre veut tomber (Essa dtvore quer cait], expressio ‘que se pode encontrar também, entre outros lugares, na regio dos Grandes a Osactantes Lagos Afticanos. O dispositivo de conjunto seria profundamente modificado por tal configurasao. ‘Além disso, a combinatéria abre-se novamente a partir do momento em {que no se situa mais as coisas na perspectiva do aro, mas, sim, de uma forma ‘mais abrangente, na perspectiva do aféto. Como veremos em breve, um actante pode muito bem ser definido somente por um querer ¢ um dever, mas fica claro que cle nio est4 pronto para passar 4 ago somente com esse equipamento modal, ele pode tio-somente vivenciar um estado passional. 3.2.2. Os VALORES MODAIS 'Nés jé sugerimos que a identidade modal dos sujeitos poderia constituir © desafio de uma busca especifica, a busca de identidade, especialmente quando eles estio em condigdes de assumir essa identidade (actante M? M). Portanto, as modalidades podem ser, para eles, preciosas aquisigées dos objetos de valor. Um exemplo disso é a forma tipica do romance de aprendizado, ¢, em particular, a que se exprime por meio do género picaresco no século xvi. O termo “aprendizagem” poderia dar margem & confusio, pois aprender é adquirir saber, mas nessa busca o actante nao almeja somente 0 saber eo saber-fazer. Ele descobre também sua vocacio, suas motivagées, ele hierarquiza suas obrigagées, ele mede suas capacidades. Em suma, cle aprende a asswmir, a controlar ¢ a adaptar 0 que ele é. ‘Todavia, para tanto, as modalidades devem mudar de estatuto e de uso: elas no so mais condiges pressupostas, mas valores que definem papéis e atitudes diante do mundo e em um percurso de vida. E hé um sinal dessa ‘conversio que nao deixa diividas: ao invés de funcionar de maneira categérica (pode-se ou nio fazer, quer-se ou ndo etc.) como em seuestatuto puramente narrativo, as modalidades funcionam, entao, de maneira gradual. O rebelde, por exemplo, € alguém que atribui mais forga a seu querer do que a seus deveres, Isso significa que 0 resignado, ao contrdrio, longe de nao possuir nenhum querer, simplesmente adotou a hierarquia inversa, sendo 0 seu querer sujeito & orga de seu dever, Esses dois exemplos mostram claramente que (1) as diferengas modais séo aqui da ordem do mais ¢ do menos, 0 que introduz uma hierarquia entre as modalidades, ¢ que (2) essas hicrarquias e ‘esses gradientes modais formam papéis (0 rebelde, o resignado etc.). ‘Semicricadodiscurso ‘Mas a gradagio modal pode dizer respeito tanto & intensidade quanto a quantidade. E preciso, entao, lembrar-se de que, como todo sistema de valores, os valores modais s6 surgem sob o controle das valencias da percepcio (ver capitulo “As estruturas elementares”), isto é, das valéncias de intensidade e quantidade. Tomemos como exemplo o caso do homem de ciéncia: enquanto no se trata de sua prépria identidade na comunidade cientifica 4 qual cle pertence, seus conhecimentos serio avaliados somente do ponto de vista da verdade (adequagio & realidade, respeito aos procedimentos cientificos usuais etc.). No entanto, se se trata, por exemplo, de saber se ele é um “verdadeiro” intelectual, um “verdadeiro” pesquisador, a avaliagio de seus conhecimentos, conforme a cultura e conforme seus discipulos, recair4, entio, principalmente sobre sua extensao ou grau de especializagao. O intelectual do Renascimento — pensemos no caso do famoso Giovanni Pico della Mirandola ~ deve saber tudo (cixo da quantidade) © com a maior profundidade possivel (cixo da intensidade). Contudo, a partir da época clissica, 0 homem de sociedade, ¢, ainda hoje, © homem cultivado — aquele que lé o Le Monde\ -, deve saber de tudo um pouco, isto é ter conhecimentos extensos, mas sem bancar 0 sabe-tudo, sem se meter a especialista. Inversamente, 0 especialista ¢ 0 erudito devem renunciar & quantidade para aprofundarem ao méximo seu conhecimento em um dominio restrito. Em todos esses casos, 0 valor do saber deriva de uma determinada relagéo entre intensidade ¢ extensio. Cada um deles corresponde a uma identidade reconhecivel, em uma dada cultura, como um papel — ou uma aritude. O mesmo se dé no caso das outras modalidades: o indeciso nao sabe em que fixar seu querer, ele 0 espalha por um grande niimero de objetos sempre com uma fraca determinagio; 0 fandtico, em contrapartida, concentrou toda intensidade de seu crerem um tinico objeto. Inversamente, 0 crédulo € aquele que cxé em tudo, mas fracamente etc, ‘Acé agora estamos diante da légica das forgas: os valores modais basciam- se, segundo essa perspectiva, na avaliagao da forca modal com vistas ao sucesso das transformagées. Entretanto, segundo a légica posicional, o sujeito da enunciacéo, individual ou coletivo, decidiré quais sio os equilibrios aceitaveis -Osactantes, ‘ou quais sio aqueles que devem ser rejeitados, Nos exemplos anteriores, vé-se claramente que un julgamento moral insinua-se na avaliagao da identidade ‘modal, e que, por exemplo, aquele que condena o erédulo (grande dispersio, fraca intensidade) adota uma posigao diametralmente oposta a do que condena 0 fandtico (grande concentracio, forte intensidade). Porcanto, distinguir-se-4, procurando aprimorar 0 método, o queas denominagées emprestadas lingua confundem, isto é, de um lado, (1) a formagao dos valores modais que seguem a légica das forcas, que estabelece os diversos equilfbrios entre a intensidade ¢ a extensio c caracteriza a identidade de cada actante, seu “cédigo” pessoal, de certa forma; de outro, (2) 2 avaliagio ética, que toma posigéo em relagéo 20 sistema, que segue a légica dos lugares e que aplica acs valores modais um julgamento que emana da cultura de referéncia. 32.3, DAs MODALIDADES AS PAIXOES ‘A partir do momento em que as modalidades tornam-se valores modais, clas se baseiam, como se viu, em uma regulaco perceptiva ¢ sensivel: um corpo sensitivo “sente” a intensidade ¢ a extensio modal, o observador reconhece af um papel ou uma atitude, isto é, a identidade transitétia de um actante. Portanto, esses papéis ou aritudes modais so também, a0 menos vireualmente, papéise atitudes passionais, j& que estio relacionados 2o afeto € a sensibilidade. Todos os exemplos de que nos servimos hé pouco ‘comportam, em maior ou menor escala, uma dimensio passional: 0 crédulo, © fandtico, 0 indeciso € 0 erudito sao atores dos quais se pode praticamente Prever os comportamentos afetivos, pois esses comportamentos so previstveis a partir de sua definigao modal. Cada um desses atores tem suas emogGes priprias e caracteristicas: a adesio impensada, 0 arrebatamento inguietante, a hesitagao ansiosa ou curiosidade jamais saciada. Entio, percebe-se que 0 efeito passional nfo se encontra tanto em uma certa relagio entre intensidade e extensio modais, mas no movimento que modifica suas tensdes: 0 papel do erudito, por exemplo, sé seré tratado como um papel passional se ele for apreendido no movimento ¢ na tensio que © conduzem a um conhecimento sempre mais aprofundado e sempre ‘mais restritamente especializado, O mesmo acontece com 0 fandtico, cujo cardter apaixonado é to mais sensivel quanto ele parece dirigido para uma ‘Semigticadodiscurso renga mais forte e sempre mais estreita. O papel sé se torna passional se for apreendido em seu de Do ponto de vista da histéria da semiética do discurso, a teoria das ‘modalidades foi o primeiro passo na direcZo de uma semistica das paixGes: ‘os efeitos passionais, gracas ao componente modal oriundo da narratividade, tornam-se analiséveis, cada efeito passional podendo ser reduzido, de um ponto de vista narrativo, a uma combinagao de modalidades. Portanto, os afetos passionais eram considerados como simples epifendmenos do percurso natrativo dos actantes. Todavia essa abordagem do dom{nio afetivo permanecia nos limites de uma Iégica das transformagoes, a I6gica do discurso-enunciado. No entanto, fica bem claro que a dimensio afetiva do discurso nao pode ser privada da presenga, da sensibilidade e do corpo que toma posicio na instincia de discurso, pois a afetividade reivindica o corpo do qual ela emana e 0 qual ela modifica. Hoje em dia as proposigées que estamos em condigoes de fazer conciliam esses dois pontos de vista: mesmo apenas na perspectiva das modalidades ~ que proporemos cm breve ultrapassar -, 0s efeitos passionais participam dos dois dominios. As modalidades, como jé provamos, asseguram a sintese centre a légica das forcas (a das transformagGes, das cenas predicativas e do discurso-enunciado) c a légica das posig6es (a da presenga, do discurso em ato etc.), pois elas si, ao mesmo tempo, condicdes pressupostas ern relagio & légica das forcas e modos de existéncia em relagio & Iogica das posigoes. Portanto, sendo a identidade passional dos actantes baseada nos valores modais, ela é por definigao um dos lugares fundamentais da interagio entre esses dois dominios de pertinéncia. Assim, a identificagdo dos actantes da cenunciagio aos do enunciado, e vice-versa, dar-se-4 pelo intermédio desses paptis c atitudes passionais. Nao se pode exigir que um leitor, por exemplo, partlhe logo de inicio das aventuras de que os atores de uma historia qualquet participam nem que participe de tudo 0 que no discurso depende, em geral do dominio das transformagées narrativas. Em contrapartida, pode-se s€ apoiar sobreo fato de que ha, ao menos, algo em comum com esses actantes: ‘um corpo, uma posicao, percepgGes que conciliam intensidade e extens40€ que, conseqiientemente, podem ser manifestadas nos textos por graus de profundidade e de presenca. Osactantes, ‘Tal éa mola propulsora da identificagao dos actantes da enunciagio e do enunciado, se no 0 € tambéun da caprura do leitor pelo discurso: para let, 0 leitor deve claborar a significagio; para elaborar a significagdo, ele deve tomar posicdo em relagio ao campo de discurso, adotar um ponto de vista, desenvolver uma atividade perceptiva etc. Desse modo, cle jd partilha, 20 menos parcialmente, da identidade modal e passional dos actantes do discurso. ‘SUGESTOES DE LEITURA Braraano, Deni. Cominbs de somihoe lei. Tad. i Carls Lops el Baur nr ws, Dai pe al, Baru: Ease, 2003 (Pare (Coqur, Jean-Claude. Le Dies eson sue Pais Klick, 1984, pp. 27-15. Fuwont, Chales. Toward a modern theory of eae. 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