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CFO 9 17 B-4 : N> 3189 REVISTA RSTO AROULAIO ,Gneaao PERNAMBUGANO- DEZEMBRO DE 1837 . é e WWoRMERO _Sa_ | Coz. rep ale ett t fag ethene . | RBECWB. - TYPOGRAPHIA. UNIVERSAL 1987 0°. RESTOS. MORTALS DE JOAO FERNANDES VIEIRA INDICAGAO DO Socio Francisco A. PEREIRA DA CosTa Venho trazer ao conhecimento e consideragao do Instituto a resolugio de um problema de gran- de interesse historico, qual o da indicaga&o precisa do lugar em que foi sepultado Jodo Fernandes Vi- eira, um dos vultos mais proeminentes da historia dos tempos coloniaes, e particularmente do glo- ioe periodo da luta homerica da guerra hollan- eza. C Instituto, que em 1864 tanto seempenhou em pesquizas tendentes ao descobrimento do jazigo da- quelle grandioso herée, que em 1865 ainda prose- guiram, procedendo a escavagdes em um mausoléo que a tradigao popular apresentava como a sepul- tura de Fernandes Vieira, existente na igreja da Misericordia de Olinda e que em 1875 ainda con- tinuou em investigacdes a respeito, por interme- did do nosso digno consocio major José Domin- gues Codeceira, ue rocanoe obter informagdes precisas da ilha da Madeira, patria do herée, on- de, segundo o seu proprio testamento julgava-se repousar, em um jazige, na_capella-mér da_igreja da Misericordia da cidade de Funchal, capital da ilha, vio perdidos todos os seus trabalhos e frus~ tradas todas as suas esperangas. Agora, porem, sem 0 emprego de esforcgos nem de trabalho algum e quando ja nado havia esperan~ gas de conseguir-se o almejado fifth, o acaso, um 4 REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. feliz acaso, veio desvendar o mysterioso véo e mos- trar 4 luz da evidencia o lugar certo e determinado da sepultura, que, qual outro El Dourado, tanto se procurava. . . Lo Incumbido pela presidencia da provincia, para em commissdo com dous de nossos illustres col- legas, os Srs. Monsenhor Joaquim Arcoverde de Albuquerque Cavalcante e Dr. Jodo Baptista Re- gueira Costa, examinar e dar parecer sobre os li- vros e documentos historicos existentes nos con- ventos e mosteiros do Recife e Olinda, que conve- nham, mediante cessdo, remover para a Bibliothe- ca Provincial, encontrei no curso dos ‘meus traba- lhos, na livraria do convento de S. Francisco de Olinda, a obra—Memorias historicas dos illustris- simos arcebispos, bispos e escriptores portugueses da Ordem de Nossa Senhora do Carmo,, escripta por Fr. Manoel de Sie impressa em Lisbéda em 4724. Esta obra de que ja tinha conhecimento, por citagdes de Antonio José Victoriano Borges da Fonseca, em sua Nobiliarchia Pernumbucana, e por honroasa mengao de Barbosa Machado na sua Bibliotheca Lusitana, e de Innocencio Silva no Dic- cwnario Bibliographico, foi de um grande valor para mim o seu achado, porquanto desejava con- sultal-a, para obter noticias mais circumstancia- das daquelles de nossos conterraneos que perten- ceram a Ordem do Carmo, e especialmente de D, Fr, Manoel de Santa Catharina, natural de Pernam- buco e bispo diocesano de Angela. Effectivamente encontrei valiosos apontamen- tos e no capitulo XI, que trata da origem e funda- cao das nossas vigararias da Bahia ¢ Rio de Janei- roe da Reforma da de Goyanna, sob o titulo Cata- logo dos Conventos, 4 pagina 58, vem mencionado. logo em primeiro lugar 0 convento de Nossa Se- nhora do Carmo de Olinda, em cujo artigo se 1é este periodo: . « Na capella-mér da sua igreja, da parte do "REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. 5 en Evangelho, descangam em humilde sepultura as cinzas daquelle grande Herée Restaurador do mes- mo Estado, Jodo Fernandes Vieira, e ainda que lhe faltaram os marmores para o mausoléo € nao tenha epitaphio que declare.o heroico de suas accées, ti- veram estas a fortuna de serem escriptas pela ele- vada penna do Exm. Sr. D. Luiz de Menezes, con- de da Ericeyra. Della fez tambem escripto_parti- cular, intitulado Castrioto Lusitano, o B. Fr. Ra-- phaei de Jesus. » Nada mais positivo,nem mais convincente. “Ve- jamos agora o que diz o proprio Fernandes Vieira na verba sexta do seu testamento, feito na sua pro- priedade de Maranguape, em 15 de Fevereiro de 1674, e aberto em Olinda, no dia do seu falleci- mento, em 10 de Janeiro de 1681 : « Levando-me Deus para si, me terfo vinte e quatro horas por amortalhar, com a cera necessa- ria acesa, e com reponsos de musica; e pego a to- das as pessoas que me rezem um Padre Nosso pelo amor de Deus, e serei amortalhado no habito da Sempre Virgem Nossa Senhora do Livramento do Monte do Carmo, de quem sou Terceiro, e sobre elle o da Ordem minha de Christo, como mais pro- pria do Christéo. E seré meu corpo mettido em um caixaéo bem forrado de chumbo e calefetado, o qual sera posto em deposito na igreja do convento de’ Nossa Senhora do Carmo da villa de Olinda, fora da terra, para d’ahi ser trasladado 4 capella mor da Santa Casa de Misericordia da Ilha da Ma- deira, de que sou Padroeiro, onde tenho mandado fazer um carneiro por minha conta e de minha mu- Iher, para ser 0 nosso encerro e de nossos filhos ; e€ emquanto se nao fizér a obra, cada dia se por& uma lampada acesa no lugar em que estiver o cai- x40, e pordo céra sempre ardendo, ese diré uma missa quotidiana por minha alma e de minha mu- Iher e filhos pela esmola de doze vintens cada uma.» . Pela “verba, transcripta, cumpre averiguar cs ~ 6 REY, DO INST. ARCH. E GEOGR, PERN. seguintes pontos : Se effectivamente Joao Fernan- des Vieira foi padrociro da capella-mor da igreja da Misericordia da Ilha da Madeira e se mandou construir alli algum jazigo para si e sua familia, em que fosse sepultado. Vejamos. Para responder vantajosa e negati- vamente dquelles dous pontos, bastam as seguin- tes provas: 4.2 A obra do Dr. Gaspar Fructuvso, sob 0 ti- tulo—Hiustoria das ilhkas do Porto Santo, Madeira, Deserta e Seloagens, impressa na cidade do Fun- chal em 1873, obra volumosa (4° de 920 pgs.) que trata especialmente sobre tudo que diz respeito 4 historia da Madeira, descendo mesmo a particula- ridades e minudencias ; pois bem, nesta obra nada se encontra a réspeito daquella determinagéo, e tratando de Fernandes Vieira, do seu heroismo, ¢ dos seus servicos no Brazil, termina: « A Madei- ra ndo deve esquecer tao illustre filho, cujo nome é um dos mais celebrados nos annaes brazileiros.» Enada mais. , 2.4 Os seguintes topicos de duas cartas escri- ptas da cidade do Funchal em 24 de Novembro de 1875 e 23 de Julho de 1876, pelo Sr. Carlos Joaquim de Oliveira Castro, pessoa respeitavel e de eleva- dos creditos, a respcito de investigagdes sobre 0 assumpto promovidas pelo nosso consocio major Codeceira : « Estou de posse do sua estimada carta de 27 de Maio e apontamentos relativos ao testamento de Jodo Fernandes Vicira. « Foram infructuosas as pesquizas que se fl- zeram nos archivos da Santa Casa de Misericordia do Funchal, sobre os ditos apontamentos. Onde se podia colher alguma cousa procurou-se, e em quatro grossos volumes que vie li os indices, on- de estado copiados todos os testamentos, legados, doacées, foros, etc., etc., que foram feitos 4 Santa Casa, desde o seu comego até 1700 e tantos, naéo REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. 7 existe o nome de Vieira nem nada que lhe diga respeito. « Sobre o seu pedido de indagagées dos restos de Joio Fernandes Vieira, nada pude colher. O edificio do actual hospital (invocagao de Santa Isa- bel) foi construido depois de 1686 e acabado em... 1745. Na sua capella nao existe jazigo algum de Joao Fernandes Vieira, e mesmo na pauta dos pa- drociros desta Santa Casa, que data de 1511 (tendo principio no hospital de Santa Maria Maior), nao existe o nome de J. F. Vieira. « Foi tudo o que pude colher, quer de infor- macgées do-meu amigo conego Felippe, presidente da commiss4o administrativa da Santa Casa, quer das Saudades da Terra, do Dr. Azevedo, livro va- lioso para a historia da Madeira. » 3.° Fallecendo D. Maria Cesar, esposa de Fer- nandes Vieira, em 141 de Agosto de 1681, foi sepul- tada na igreja de Nossa Senhora do Desterro, hoje com o nome de Santa Thereza, em virtude do con- vento que junto a ella construiram os frades The- rezios, como consta da respectiva certidao de obi- to, que obteve o Instituto, e acha-se publicada 4 pag. 125 do 1° volume das Revistas. 4.° Finalmente, as questées_e demandas que se deram depois da morte-de Vieira, pelos seus multiplos e embaracados negocios, o facto de ficar sua mulher residindo em Pernambuco, onde nas- ceu e contava numerosos parentes, ea circum- stancia ji mencionada de nao existir jazigo algum na capella-mér da igreja da Misericordia da ilha da Madeira ; sao provas robustas e corroborstivas de todo 0 allegado, e que vem confirmar a noticia do padre Fr. Manoel de S4 em sua obra de que a —capella mor da igreja do convento do Carmo de Olinda guarda os restos mortaes de Fernandes Vieira. . Cumpre ainda entrar em uma ordem de consi- deragdes de muita importancia para 0 caso. . O padre Fr. Manoel de Sd era um carmelita, 8 REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN.” distincto, prelado superior de sua ordem, e escri- plor de creditos, por muitos trabalhos importan- tes que deixou firmados como seu nome, como consta do Diccionaaio Bibliographico de Innoceh- cio Francisco da Silva. E é claro que, escrevendo uma obra sobre a sua Ordem, maximé de uma obra tendente a pro- clamar os seus creditos e reputagéo dos seus lu- minares, como séo as Memorias Historicas que vimos de fallar, tivesse a sua disposigéo os mais veridicos e valiosos subsidios e as mais fidedignas informagées. . Além disso, Fr. Manoel de Sd foi, por.assim dizer, contemporaneo de Vieira, porquanto nasceu em 1673 e morreu em 1735; e a respeito de suas Memorias, encontramos o honrosissimo e autori- sado juizo de Barbosa Machado, que diz: em sua Bibliotheca Lusitana, serem ellas escriptaus com sunmo desvello e boa critica; alem de mencionar ojuizo de outros escriptores, taes como Maragoni no Thesaur, Paroch. que o chama eruditissimo, e © padre Manoel Caetano de Souza, que no seu Cathal. dos Bisp., de Port., 0 chamou « diligentis- simo academico..., nas suas nunca bastantemente louvadas Memorias », e em outro escripto « dili- gentissimo e prudentissimo autor. » Ainda mais um argumento. Fr. Manoel de Sa, em seguida_ao capitulo referente a sepultura de Fernandes Vieira, diz que no mesmo convento, e no cemiterio dos religiosos, fora sepultado o bispo desta diocese D. Fr. Francisco ‘de Lima, o que menciona ainda a pag. 153, quando trata da vida deste illustre carmelita; ¢ effectivamente foramen- contrados os seus restos mortaes pelo Instituto, em 28 de Outubro de 1867, como consta do auto é relatorio respectivos insertos no segundo volume de nossa Revista, pags. 147 a 153. Deixando assim demonstradas todas as pro- babilidades em favor da valiosa noticia que acabo de encontrar, e trazendo ao conhecimento e con- REY. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN 9. a sideragao do Instituto, proponho que se procedam ds investigagées e.exames necessarios uc intuito de se encontrar os restos mortaes do heroico ba- talhador, um dos vultos mais altanciros da guer- ra hollandeza, Jodo Fernandes Vieira. Sala das sessdes do Instituto, 29 de Abril de 1886, . AUTO D& EXHUMAGAO DOS PRESUMIDOS OSsos DO GO- VERNADOR JOAO FERNANDES VIEIRA, PROCEDIDO NA CAPELLA MOR DA IGREJA DE NOSSA SENHORA DO CARMO DA CIDADE DE OLINDA. Aos dezeseis dias do mez de Junho de mil oito centos e oitenta e seis, na igreja de Nossa Se- nhora do Carmo da cidade de Olinda desta provin- cia, 4s 11 horas da manha, achando-se presente a commisséo nomeada pelo Instituto Archeologico e Geographico Pernambucano, composta dos Drs. Maximiano Lopes Machado, Adelino Antonio de Luna Freire, Joaquim Antonio de Castro Loureiro, Monsenhor Joaquim Arco-Verde de Albuquerque Cavalcante e Francisco Augusto Pereira da Cos- ta, para o” fim de se abrir a sepultura do jazi- go que se presume ser do governador Jodo Fer- nandes Vieira, em vista da indicagdo de Fr. Ma- noel de $a, em sua obra: Memorias Historicas dos iilustrissumos_Arcebispos, Bispos e Escriptores Por= tugueses da Ordem de Nossa Senhora do Carmo, pagina 38, impressa em Lisboa no anno de 1724, dirigio-se a commissdo para o logar indicado em ditas Memorias, na capeila-mor da referida igreja, do lado do Evangelho, acompanhada das testemu- nhas presentes Dr, Ignacio de Barros Barreto e Ma- jor José Domingues Codeceira, e antes de dar co~ mego aos trabalhos Jeu-se # indicagdo do referido chronista queéa a seguinte: 2 40 REY. DOT '. ARCH. E GEOGR. PERN. «Na capella-mor da sua igreja, da parte do Evangelho, descangam em humilde sepultura as cinzas d’aquelle grande herée Restaurador do mesmo Estado (Pernambuco ), Joao Fernandes Vieira, ¢ ainda que lhe faltaram os marmores para o mausoléo e nao tenha epilaphio que declare o heroico de suas accées, tiveram estas a fortunna de serem escriptas pela elevada penna do Exm. D. Luiz de Menezes, conde de Ericeyra» E dando principio ao acto da escavagao, ao lado do Evan- gelho, na forma indicada, do primeiro degréo do altar-mér, encostado ao estrado das cadeiras do coro que alli existem em seguimento para 0 arco- cruzeiro, fez para esse fim a commissao uma aber- tura no ladrilho, na extensdo de um metro e trinta e dous centimetros, e deum metro, pouco mais mais ou menos, de largura, e na profundidade de oitenta e oito centimetros, pouco mais ou menos, encontrou uma coberta de argila rija e solida, que, bem examinada conheceu-se ser formada na ex- tensao de uma sepultura, a qual, depois de des- truida essa coberta, verificou-se ter: um metro e e setenta e seis centimetros de extensao ¢ sessenta e seis de largara, apresentando descripta no terre- no aconfiguragao de um atatide que devia ter sido aquelle em que fora encerrado 0 cadaver qne alli se encontrou, sendo Je presumir que aquella coberta ou camada de argila se tivesse formado quando abateu o atatide na occasido em que apo- dreceu a madeira, visto ser o terreno de argila e se achar muito compacto e rijo. No funda da sepultura, que deve ter sido 0 do “atatide, se via estendida em toda a sua extensdo e largura uma porgiio de cal branca, mais on menos solidificada, distinguindo-se perfeitamente o lado dos pés e oda cabega que achava-se envolvida n’aquella camada de cal, tendo os pés voltades para o altar da Sa ea cabeca para 0 arco- cruzeiro ou entrada da mesma capella. Verificando a commissado que a maior parte REV, DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. il dos ossos se achava em fragmentos e misturados com a cal, fel-a retirar cuidadosamente, bem como os residuos que alli se achavam, fazendo passar tudo em uma peneira grossa, que produzio o re- sultado que se vé e a commissao apresenta: ossos em sua maior parte fracturados, alguns dentes separados das mandibulas, demonstrando haver estado o cadaver enterrado ha muitos annos; resi- duos da madeira do atatide, jé carbonisada, pregos de ferro bastante oxydados e gastos, brochas.de cobre com cabegas a semelhanga das que hoje se usam douradas, indicando terem servido para guarnecer o atatide, cal petrificada, etc.; 0 que tudo fez a commissao encerrrar em uma urna de metal que foi conduzida para este Instituto. Parecendo conveniente 4 commissao explorar toda a parte do lado do Evangelho, afim de ver se ahi havia mais alguma sepultura, proseguio nesse trabalho escavando todo esse lado desde a extre- midade da sepultura de que faz mencao este auto, até 0 arco-cruzeiro sem encontrar outra nesse lado do Evangelho, nem -vestigio algum que demons- trasse ter servido o indicado lugar de sepultura além da que fica mencionada, nem téo pouco en- controu ossos ou outro gualquer fragmeuto delles ; pelo que deua commissao por findo o seu trabalho, mandandg lavrar o presente auto que todos as- signaram. E eu Antonio Cavalcante de Albuquerque Pi- mentel, amanuense do Instituto Archeologico e Geographico Pernambucano, 0 escrevi a mandado da commissao.- Maximiano Lopes Machado.—Dr. Joaquim Antonio de Castro Loureiro.—Monsenhor Joaquim Arco-Verde de Albuquerque Cavalcante,— Francisco Augusto Pereira da Costa.—José Domin- gues Codeceira.—Ignacio de Barros Barreto. 42 REV. bo ‘INST. ARCH, E GEOGR. PERN. PARECER MEDICO Nos abaixo assignados, doutores em medicina pelas faculdades medicas do Brazil, medicos clini- cos residenles 10 Recife, encarregados pelo Insti- tuto Archeologico e Geographico Pernambucano de examinar os ossos exhumados em 17 de Junho de 1886, na capella mér do convento do Carmo de Olinda, e analysar as substancias calcareas conti- das na sepuitura, depois de acurado estudo e va- rias pesquizas, somos levados & diversas consi- deracées em resposta aos cinco seguintes quesitos propostos, embora a resolucéo de questées desta natureza seja sempre difficil, e tanto mais quanto os dados fornecidos no caso presente sao em nu- mero pequeno d’entre os que podem ser estudados, e estes mesmos bastante deteriorados pelo tempo. 4.° Quesito.—Pertencem todos os ossos exhu- mados a um s6 individuo ou contém fréagmentos bem caracteristicos de mais de um? 2.° Quesito.—Qual é0 sexo do individuo a que elles pertencem ? 3." Quesito.—Que idade podia ter approxima- damente este individuo ? 4.° Quesito.—Pode-se conhecer o tempo da inhumagéio do cadaver respectivo e saber se esta foi ha um seculo ou ha dois seculos? 5.° Quesito.—De envolla com a cal achada na sepullura, de onde foram extrahidos os ossos, existealgum metal e qual asua nalureza? DESCRIPGAO Os dados que nos foram fornecidos, além da substancia calcarea, pregos grandes e pequenos, taxas de cobre e pequenos pedacos de madeira quasi que carbonisados, resumem-se nos ossos encontrados na catacumba pela maior parte em fragmentos de tamanhos tio diminulos que néo ° REV. DO INST. ARCH, £ GEOGR PERN 413 anc Ee eee ee péde-se determinar a que parte do esqueleto per- tencem, sendo pequeno o numero daquelles- que péde-se dizer de que osso fazem parte, e muito me- nor ainda o dos que permittem um: estudo mais ou menos completo, “Nos fragmentos de tamanho diminuto apenas existe do tecido osseo a substan- cia esponjosa, tendo desapparecido a substancia compacta, ficando todos reduzidos pela pressao digital a uma substancia pulvernlents, devido a ter © esqueleto permanecido por tempo muito longo debaixo da terrae 4 accéo lenta, continua e pro- longada do calorico que desenvolvia-se no lugar. . Os fragmentos que podem ser determinados a que osso pertencem, como a parte esquerda do osso frontal, partes da diaphyse do humero, pedagos de diversas costellas e das phalanges, geralmente em todas os ossos submettidos a exame, isolada e comparativamente, néo mostram dois pontos ou duas partes iguaes, notando-se entretanto partes symetricas; nem a espessura deixa de ser a mes- ma, o que exclue a idéa de haver ossos de mais de um individuo, Os ossos que permittem um estudo mais ou menos completo sao a clayicula, 0 omoplata, os dois femures, o osse illiaco, o maxillar inferior, os parietaes e algumas phalanges, sendo que todos elles nao estéoem estado de completa integridade. _, Clavicula.—A_unica que encontramos é a di- reita, medindo 15 centimetros de comprimento ; nota-se nella que a superficie de insercéo.do mus- cule sterno-cleido-mastoidiane nou tergo interno da face superior, e a em que se insere 0 musculo grande peitoral nos dois tercos internos, e 0 mus- culo deltoide no terco externo do bordo anterior, bem como a superficie de insergio do musculo trapesio no terco externo do bordo posterior, sio Sensivelmente rugosas. ‘ __As rugosidades que existem neste osso para cima @ para diante, destinadas 4s insercées mus- culares, para baixo para ainsergao do ligamento 14 REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. eee costo-clavicular e para traz para 0 ligamento sterno-cleido-hyoidiano, sio bastante salientes. Omoplata.—Das duas scapulas a direita esta menos deteriorada e mede do angulo superior a0 inferior 16 centimetros de comprimento e 9 de lor. gura tomada na parte media, isto 6, do bordo os terno abaixo da cavidade glenoide até ao ponto correspondente do bordo interno ou espinhal. ae do este osso de forma triangular, cuja base est no bordo superior ou cervical, é largo e de tama- nho nao pequeno. . Nao Tpresenta mais a apophyse coracoide, o acromio, a espinha de omoplata e do pero eyes rior, somente Cee uma pequena parte, on- de vé-se 0 angulo superior. As suas Ques superficies rugosas de forma triangular, uma na parte inferior da face anterior, onde se insere o musculo grande dentado, aoutra no bordo axillar ou externo, desde o ponto em que termina a cavidade glenoide até o angulo inferior, no qual se insere a longa porgéo do musculo tri- ceps, sao bastante asperas. A crista obliqua para baixo e para fora, que divide a depressaio da face posterior em duas partes, edd insercio superior- mente ao musculo pequeno redondo e¢ inferiormen- te ao musculo grande redondo, é visivelmente sa- liente. . | Femures.— Ainhos bem espessos ¢ de igual es- pessura, 0 esquerdo bastante estragado, 0 direito dé lugar a uma investigacio mais satisfactoria; tem 40 centimetros de circunferencia e 0 canal medul- Jar bastante largo, mede 30 centimetros de compri- mento, sem fallar nas extremidades superior e in- ferior, que ndo existem. . : Nao apresenta mais superiormente a cabega do femur, 0 collo anatomico, 0 grande e pequeno tro- chanter, nem 0 collo cirurgico, que, se nao faltasse, esclarecia muito_nossas investigagdes depois das grandes discussées havidas ¢ estudos feitos por Chassaigne, Rodet, Malgaigne, Richet e outros, s0- REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. 45 re bre a differenga de longitude e direcgio do collo cirurgico do femur, segundo a idade e 0 SeX0; in- feriormente tambem nao apresenta os dois condy- los nemo espago popliteo, mas deixa ver cla- ramente a bifurcacao da linha aspera, conhecida tambem por bordo posterior, com rugosidades muito proeminenfes em toda a sua extensde, par- ticularmente na parte média, A trifurcagao desta linha para.a extremidade superior é visivel, onde o ramo externo vai ao gran- de trochanter e d& insercéo ao musculo grande gluteo; o médio se dirige ao pequeno trochanter e insere em sua extengio o musculo pectineo ; o in- terno, apezar de pouco promunciado, é ainda visi- vel, é vai ter ao bordo inferior do collo, dando in- sergéo ao musculo vasto interno. Sua curva é disfargada e ndo muito convexa. Cozal. A porc&o deste osso que péde ser es- tudada, é uma parte do illeo esquerdo, onde encon- tra-se a fossa illiaca interna situada acima da su- perficie de articulagdo com o osso sacro 7 ©& parte posterior da crista illiaca que é bastante rugosa e inserindo no seu labio interno.o musculo transver- so do abdomen, no labio externo 0 musculo gran- de obliquo. Se este osso estivesse completo, po- der-se-hia estabelecer com seguranca e clareza o Sexo, attendendo ao grande numero de caracteres distinctivos ;. néo obstante vé-se sOmente que a fossa illiaca interna é concava e nado achatada. Mazillar inferior.—A parte esquerda deste osso 6 de pequeno tamanho e deixa s6 ver 0 come- go do ramo ascendente; a direita, comprehendida desde a symphyse do mento, ponto de soldadura das duas metades do maxillar, até o ramo ascen- dente que vai constituir a apophyse coronoide, que falta, assim como o condylo que se articula na ca- vidade glenoide do osso temporal, deixa ver bem saliente o tuberculo mentoniano, 0 orificio do mes- mo nome mais proximo do bordo alveolar que do inferior, 0 estado gasto deste bordo e a estreiteza 16 REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. do canal dentario, sendo que os cinco dentes en- contrados estado igualmente bastante gastos. Os quatro pequenos tuberculos da face poste. rior denominados apophyses geni, algumas vezes pouco distinctos, sac muito salientes, sendo visi- veis a linha obliqua externa e a myloidiana. Pariectaes.—De grande espessura, apresentam a structura bi-parietal ou sagital ja ossificada. Phatanges.—As encontradas se udo sio de grande tamanho, tambem nao sao pequenas; a nao ser isto, nada apresentam digno de mensao. CONSIDER. ES i." Oexame minucioso de todos os ossos,a comparagaio entre os fragmentos de todos os tama- nhos e dimensées, os pontos symetricos, a igual- dade de espessura e desenvolvimento, nenhuma duvida deixam,de modo que podemos affirmar per- tencerem todos a um so individuo. 2. Sdo innumeros os caracteres distinctivos quanto 4 idade no esqueleto iniciro, todavia nos ossos que permiltiram um estudo mais ou menos complete encontramos provas que nos autorisam a dizer com approximacao que a idade do indivi- duo a que elles pertenceram é muito superior a 50 annos emesmo a 61), § Estas provas ou razées sao: a ossificacéo das suturas craneanas, como se verifica na sutura sa- gital, o que tem lugar dos 50 annos em diante; 0 estado gasto do bordo alveolar do maxillar infe- rior, a approximagao do orificio mentoniano do bordo superior da maxilla inferior, o que sé temn lu- gar nas pessoas idosas, e nio do bordo inferior, como nas criangas, e da parte media da face ante- rior, como nos adultos; o estado gasto dos dentes, © phenomeno da rarefaccao da stbstancia ossea, determinado somente pelo progresso da idade, © que foi notado em todos os ossos partidularmen- te nos femures ¢ clavicula; a largura do canal REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. 47 nnn ne medullar dos femures, nos quaes a substancia cones que forma sua superficie é bastante del- ada. : 3.* Do mesmo modo que a idade, existem mui- tos dados para distinguir6 sexo no esqueleto com- pleto, maxime na configuragao e conformacdéo da bacia, mas apezar do estado incompleto e deterio- rado dos ossos, encontram-se caracteres pelos quaes péde-se dizer qual o sexo do individuo, Em osteologia é princpio corrente serem os ossos do homem mais desenvolvidos em tamanho © espessura que os da mulher, bem como todas as rugosidades, tuberculos, cristas e saliencias geral- mente fallando, mais pronunciadas no sexo forte que no fraco, Estas circumstancias em sua tota- lidade verificam-se nos ossos que examinamos, revelando que as insercées musculares deixaram fortes impress6es, o que nos leva a affirmar serem todos elles de um individuo do sexo masculino. Se ajuntarmos a isto o ‘unico dos caracteres distinctivos que encontramos dos muitos que exis tem em todo osso coxal, isto é, 0 néo achatamento da fossa illiaca interna que no caso presente é con- cava e nao achatada como na mulher, e ainda mais ndo sendo a curva da clavicula disfarcada, como sée ser na mulher, e sim proeminente, nem sendo a curva do femur muito convexa como na mulher e sim disfarcada, maior é a razdo de nossa affiri- mativa. Além disto, attendendo-se a longitude do femur que mede 30 centimetros, faltando as'extre- midades superior e inferior, e dando proporcional e aproximadamente 15 centimetros para as duas extremidades, temos 45 centimetros para todo fe- mur, comprimeuto mais que regular e que nado é o maximo. Orfila medio em um grande numero de cadaveres © comprimento proporcional do tronco e dos mem- bros superiores ¢ inferiores comparativamente ao tamanho do individuo ; ¢ medindo tambem um nao pequeno numero de esqueletos procurou Geese 18 REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. nar o comprimento de cada um dos ossos dos membros superiores e inferiores proporcionalmen- te ao comprimento do tronco e de todo corpo. Estas pesquizas levaram-n’o a organisar dous quadros ou taboas. A 4%*, resultado das medidas tomadas com exactid&io em 51 cadayeres e orga- nisada segundo aidade e sexo, serve para por ella determinar-se nao sé isoladamente o compri- mento de cada um dos ossos longos, como tambem o de todo corpo, do tronco, dos membros supe- riores e inferiores ; a 2.*, resultado das medidas exactas tomadas em grande numero. de esquele- tos, e organisada, segundo o comprimento de todo esqueleto, do tronco, dos membros superiores e inferiores, serve para por ella determinar-se 0 com- primento de cada osso longo dos dous membros superior ¢ inferior e vice versa. . E’ assim que tendo, calculado approximada- mente em 45 centimetros o comprimento do femur e procurando nas taboas n. 1 este comprimento, a que sexo e idade corresponde, encontramos sem- pre correspondendo ao sexo masculino, 3 vezes 4 idade 60 annos, uma de 5d, outra de 50, e outras a idades menores entre 40 e 20 annos. Desprezando estas idades abaixo de 50 annos, porque no caso presente temos dados que sé po- diam ser achados em individuos idosos e de idade superior a 50 annos, chegdmos a mais uma prova em favor do sexo masculino e da idade acima de 50 annos. 4.° Nesta mesma taboa um femur de 42 centi- metros de longitude corresponde a cadaveres de -tamanhos variaveis entre 1",64, ¢1",77; tomando a medida temos aproximadamente 1,71 para al- tura do individuo a que pertence este femur. Pela .taboa n. 2 este osso com tal extensio corresponde a esqueletos cujos comprimentos sao |",65 e 4",67 5 tomando a media destes dous numeros temos 1",66 para comprimento do esqueleto desde a parte mais clevada do craneo até a face plantar dos pés. REV. DO INST, ARCH. E GEOGR. PERN. 419 Ajuntando-se a 1",66, media do esqueleto, 50 cen- timetros, media justamente da espessura das par- tes molles do corpohumano, temos para aaltura do individuo 4,71, numero que esta de’ accordo com -o lamanho acima determinado, segunde a taboa de medidas tomadas em cincoenta e um cadaveres. 5.* Medindo a clavicula15 centimetros de com- primento, péde-se calcular com approximagéo a distancia que vai da cabeca do humero direito 4 do esquerdo em 45 centimetros, e tendo a scapula 16 centimetros de largura na parte inferior e 6 centi- metros de largura na parte media, conforme des- crevemos tratando deste osso, concluimos por es- tas medidas que 0 individuo, a que pertenciam esta scapula é clavicula, era de hombros largos. 6.° Determinar com exactid&o o tempe da in- humagao de um cadaver somente pelo exame dos ossos 6 difficil, porque a molestia de que soffreu_o individuo a que elles pertenceram, a natureza do terreno, onde foi inhumado o cadaver e muitas ou- tras circumstancias, podem infiuir para a deterio- racao mais ou menos rapida dos mesmos ; toda- via ‘attendendo-se ao estado, de pulverigacéo em que estéa maioria dos ossos, a falta da cabeca dos humeros e das extremidades dos dous femu- res eainda a destruigéo da maior parte do esque- leto, 6 de presumir que a inhunyagao 6 de longa “data, podendo.ser de muito mais de seculo. Analyse chimica qualitativa. - Apezar de ndo haver um laboratorio a ropria- do para exames desta natureza, da falta de appa- relhos proprios e ainda de alguns reagentes, como - acido sulphydrico, sulfureto de ammonioe outros, procedemos a exame chimico na substancia cal- carea, sobre a qual linha de verificar-se a existen- cia de metal ou metaes. Elle compunha-se de duas partes, uma branca pulverulenta e friavel, desfazando-se a mais leve presséo e assemelhan- do-se ao carbonato de cal, porém com mais den- sidade ; a outra acinzentada e em fragmentos 20 RRV. DO INST, ARCH. E GEOGR, PERN. DUIS UEUUDUINDEEINE EEN UEDUDNINIINEL Benen IE eTSEDEEne SECO bastante duros com aspecto metallico e sem deixar- seriscarcomaunha __ | : Esta ullima substancia tratada pelo acido ni- trico e submettida depois 4 acco dos differentes reagentes dev, além de outras, as seguintes reac- . cées: com o mono-sulfureto de sodio, precipitado branco geélatinoso com pontos escuros ou cinzen- tos, ndo soluvel em excesso de reactivo; com a po- tassa caustica, precipitado branco gelatinoso, so- luvel pela maior parte em excesso de reactivo; com o ferro-cyanureto de potassio precipitado azul da Prussia. A parte que dissolveu-se em excesso de potas- sa caustica, sendo tratada novamente por agua destillada e acido nitrico e submettida depois 4 accdo do acido sulfurico, deu um precipitado bran- co perfeitamente soluvel no acido azotico; levada 4 chamma do alcool nao tingio de purpura a luz, tratada isoladamente pelo acido oxalico e bicarbo- nato de soda o precipitado obtido foi branco e abun- dante. 7.* Procurando interpretar estas reacgdes, no- ta-se evidentemente a presenga de tres metdes, por quanto o precipitado branco com monosul fu- reto de sodio e a potassa caustica que em excesso o dissolve em parte, prova a existencia de zinco, , asim como as eXperiencias feitas sobre o resto do precipitado (nfo soluvel em _excesso de potassa * caustica) provam existir cal, do mesmo modo que © precipitado azul com o ferro cyanureto de potas- sio prova a presenga do ferro, o que nao é para admirar, nio sé porque de envolta com a substan- cia calcarea foram encontrados muitos pregos oxydados, como tambem porque no zince do com- mercio ha sempre ferro, sendo que o ferro é acha- do em pequena quantidade, em quanto que a cal eo zinco sio achados em proporgédes quasi equi- valentes. REV. DO iNST. ARCH. E GEOGR. PERN. 24 nn nnreecnmnnnnnnannninnnnnnaaannsee CONCLUSOES Tomando por base as consideracdes que vimos de fazer, quer sobre ossos, quer sobre a snbstan- cia calcarea, respondemos aos quesitos que nos foram apresentados pelo modo seguinte: __,,40 4.° quesito ; todos os ossos séo de um 86: individuo. ] _ Ao 2.° quesito: o individuo a que elles perten- ciam era do sexo-masculino. » _Ao 3.° quesito: o individuo era de idade muito maior de 50 annos. Ao 4° quesito: a inhumagao é antiga, sendo Dae que tenha tido lugar ha mais de um se- Ao 5.° quesito: cal, zinco e ferro, foram os me- taes encontrados na substancia calcarea submetti- da 4 analyse chimica. Recife, 12 de Outubro de 18386. . Dr. Joaquim Loureiro.—Dr. Adriio Luiz Pe- reira da Silea.—Dr. Raymundo Bandeira. —Dr. Barreto Sampaio.—Dr. Praxedes Gomes de Sousa Pitanga.—Cirurgido dentista, Numa Pompilio. ’ : . * PARECER DA COMMISSAO A commissao abaixo assignada, tendo presen- te o auto de exhumagio e o exame medico dos pre- sumidos ossos de Jodo Fernandes Vieira, a ana- lyse das substancias calcareas contidas na sepul- tura eo reconhecimento da madeira carbonisada do atatide, dos pregos oxydados e carcomidos pela diuturnidade dos tempos, vem apresentar & consi- deracéo do Instituto o seu parecer a semelhante respeito. ‘ 0 Instituto desde muito investiga, mas sempre 22 REV. DO INST, ARCH. E GEOGR. PERN, debalde, o local da jazida do chefe ostensivo da restauracao pernambucana. Algumas phrases sol- tas se lém em escriptos biographicos mais ou me- nos modernos, d’onde veio naturalmente a_tradi- ¢do de ter sido elle sepultado na igreja da Miseri- cordia de Olinda, onde falleceu a 10 de Janeiro de 1681 ; e em vista da disposicéo da clausula 7.° do seu testamento, na qual Vieira determina que seu corpo « serdé levado na tumba da Santa Casa de Misericordia, acompanhado por todos os irmaos, a quem pede por picdade Ihe rezem um Padre Nos- so por sua aima », fez para alli seguir uma com- missdo persuadida da exactidao do facto. Depois de muitas duvidas e opinides encentra- das entre os membros da commissao, convenceu~ se o Instituto de que nao se tinha realisado a in- humacao de Vieira naquella igreja. Mais tarde conjecturou que o cadaver fosse transportado para a ilha da Madeira, segundo a disposic¢do da clausula 6° daquelle testamento e en- cerrado em um tumulo que pretendia construir na Misericordia daquelle lugar para si, sua mulher e filhos. Pedira o Instituto a pessoas gradas alli residentes informacées a respeito, e estas com toda a gentileza responderam, depois de aturadas pes- quizas no antigo local da Misericordia, nos livros e assentos do seculo XVII, nada terem descoberto hem desse facto haver alli a mais leve tradicéo, Nao se verifleava, por tanto, a disposicdo da clau- sula 6.5, 0 Institudo nada mais tinha a fazer depois da- quellas diligencias, no intuito de honrar a memo- ria do illustre Lucideno e registrar na historia o lu- gor unde descancam os seus restos mortaes. A commissa sao encarregada pelo governo da provincia de arrecadar das bibliothecas abandona- das dos mosteiros de $. Bento ¢ convento francis cano de Olinda os livros aproveitaveis, encontrou as Memorias Historicas dos illustrissumos arcebis- Pos, bispos ¢ escriptores portugueses da ordem de REV. DOINST. ARCH E GEOGR. PERN. 93 eed oe do Carmo, escripta por Fr. Manoel de Sa, carmelitano, e impress: ii aoe ') E as em Lisboa no anno Na leitura que fez da dita obra i nosso distincto consocio Sr, Froncisge erie Pereira da Costa, que fazia parte daquella commis- sao, a pagina 38, a seguinte noticia, em relagao'ao oo do one de Olinda: « Na capella-mér da sua igreja, da te d Evangelho, descangam em humilde’ sepubne ae cinzas daquelle grande herée Restaurador do mes- mo estado (Pernambuco), Joao Fernandes Vieira e ainda que lhe faltaram os marmores parao mau- soléo e néo .tenha epitaphio:que declare o heroico de suas accées, tiveram estas a fortuna de serem escriptas pela clevada penna do Exm. D. Luiz de Menezes, conde de Ericeyra, » __,0 nosso illustre consocio communicou imme- diatamente ao Tnstituto, em officio de 29 de Abril do anno. passado, a indicacdo de Fr. Manoel de 84, © na primeira sesséo apresentou-se com as Me- morius Historicas, para que todos a lessem e re- solvessem 0 que cumpria fazer, sendo elle de opi- nlao que se procedessem ds necessarias investiga. ° goes no interesse da verdade. Resolveu o Instituto que sé nomeasse uma commissao e alli fosse, obtida a licenga do Exm, Diocesano, proceder a rigoroso exame sobre 0 que se lia na obra do escriptor carmelitano, visto «ndo haverem marmores, mausoléo nem epitaphio, mas simplesmente uma sepultura humilde onde des- cangaram em paz as cinzas do Restaurador. » . 0 interesse, qué a noticia despertou, chamou 4 igreja do Carmo de Olinda grande numero de bessoas distinctas tanto desta como daquella ci- lade. A commissao, encetando os seus trabalhos, limitou-se, na forma da indicagao, a remover o la- drilho da capella-mér da parte do Evangelho, do primeiro degréo do altar ao arco cruzeiro, em se- guimento 4 face do estrado das cadeiras do céro. 24 REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. E dando principio a excavagéo, de cima para bai- xo, encontrou junto ao degrao do altar uma cober- tura na profundidade de 88 centimetros, de oxydo de calcio, e sob ella a forma de um atatide que de- via ter encerrado o cadaver ahi sepultado. . Destruida a coberta, compacta e rija, reconhe- ceu a commissio; pela disposigéo da ossada ahi encontrada, que o morto ficara com a cabega na direcgéo do arco cruzeiro ¢ os pés para o altar. A maior parte dos ossos estavam reduzidos a frag-. mentos e misturados com cal, pedacinhos de ma- deira carbonisada, pregos carcomidos e brochas de cabecas largas, de metal enegrecido, denotando tudo isto annos remotos do enterramento. Deposi- tando aquelles restos e todos estes objectos encon- trados em uma urna de metal, continuou na exca- vagéo até o arco cruzeiro, mas nada descobrio até ahi, nem mesmo vestigios de outra sepultura. A commisséo medica no seu relatorio osteo- genico, apresentado ao Instituto, declarou que, de- pois de acurade estudo e varias pesquizas, reco- nheceu existirem apenas no tecido osseo dos frag- mentos a substancia esponjosa, tendo desappare- cido a compacta, ficando quasi todas reduzidas a uma substancia pulverulenta, devido a ter o esque- leto permanecido por tempo muito longo debaixo da terra e 4 accéo lenta, continua e prolongada do calorico desenvolvido no lugar. Mas, que nao obs- tante, podiam ser determinados, como a parte es- querda do osso frontal, parte da diaphyse do hu- mero, pedago das costellas e das phalanges ; e que geraimente em todos esses ossos, submettidos a exame, isolada e comparativamente, néo mostram dous pontos ou duas partes iguaes, notando-se entretanto, partes symetricas com a mesma espes- sura,o que exclue a idéa de haverem ossos de mais de um individuo. Os que permittem um es- tudo mais completo, diz ella, sio: a clavicula, a omoplata, os dous femures, 0 illiaco, o maxillar iti- ferior, os pariclaes e algumas phalanges. REV. DO INST. ARCH, E GEOGR. PE 23 : A clavicula encontrada é a direita e mede 15 centimetros de-cumprimento. Tratando do omo- plata, exprime-se deste modo: das duas escapu- las, a da direita esté menos deteriorada, e mede do angulo superior ao inferior 46 centimetros e 9 de largura, tomada na parte media, isto 6, do bordu externo abaixo da cavidade glenoide até o ponto correspondente ao bordo interno ou espinhal. E? largo e de tamanho nao pequeno. Os femures séo bem espessos e de igual espessura ; 0 esquerdo bastante estragado, mas o direito da lugar a uma investigagao mais satisfactoria. Tem 10 centime- tros de circumferencia, eo canal medular bastante largo ; 0 seu comprimento é-de 30 centimetros, sem fallar nas extremidades superior ¢ inferior que nao existem, A poreado do coxal, que péde ser estudada, é uma parte do illiaco esquerdo, onde encontra-se a fossa lliaca interna, situada acima da superficie da articulagao com o osso sacroe a parte posterior da crista illiaca, que 6 bastante rugosa, inserindo no seu labio interno o musculo transverso do ab- domen, no labio externod o musculo grande obli- quo. A fossa illiaca interna 6 concavae nao acha- tada, como sée ser no sexo feminino. A parte esquerda da maxillar inferior de pe- queno tamanho deixa ver somente o comegd do ramo ascendente; a direita, comprehendido desde a symphyse do mento, ponto da soldadura das duas metades do maxillar, atéo ramo ascendente ue vai constituir a apophyse corondide, que falta, eixa ver bem*saliente o tuberculo mentoniano, -o orificio do mesmo nome mais proximo do bordo alveolar que do inferior, o estado gasto deste bordo © a estreiteza do canal dentario, sendo que os cin- co'dentes encontrados estéo igualmente bastante gastos. Os parietaes so de grande espessura e apre- senlam a sutura bi-parietal ou sagital ja ossificada. 4 26 REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. nn As phalanges nao sao pequenas e nada offere- cem digno de mengao, a nao ser isso. Do exame dos ossos, comparagao entre os fra- gmentos, dimensdes, pontos symetricos, igualda- de de espessura e desenvolvimento, conclue nao haver duvida que todos séo de um sé individuo. Que das provas colhidas pelo estudo e obser- vagées conclue tsmbem ser a idade do individuo superior a 5) ou mesmo a 60 annos; ja pela ossi- ficagéo das suturas craneanas, pelo estado gasto do bordo alveolar do maxillar inferior, e approxi- macao do orificio mentoniano do bordo superior da maxilla inferior ; j4 pelo estado gasto dos den- tes, pelo phenomeno da rarefagio da substancia ossea determinada somente pelo progresso da ida- de, ja finalmente pela largura do canal medular dos femures, nos quaes a substancia compacta, que forma a sua superficie, é bastante delgada. Que sendo mais desenvolvidos e espessos os ossos do homem que os da mulher, o que se veri- fica nos que foram examinados, revelando ainda que as insergdes musculares deixaram fortes im- pressdes ; resulla serem todos elles de um sé in- dividuo do sexo masculino, accrescentando 0 ca- racter distinctivo da concavidade e nio achatamen- to da fossa illiaca; acurva proeminente da clavicula econcavidade do femur muito mais pronunciada do que se verifica na mulher, Que, finalmente, néo se podendo determinar com exactidao o tempo da inhumagao por div sas razdes, comtudo attendendo-se ao eslado de pulverisagio em que esti a maioria dos ossos, a falta da cabeca dos humeros, das extremidades dos dous femures ea destruigéo da maior parte do esqueleto, presume ser a inhumagao de longa data excedente a muito mais de seculo. ‘ Do auto de exhumagio e do parecer acima transcriptos em suas capitalidades fica reconheti- daa veracidade da noticia do chronista carmeli- tano, visto nao fer existido do lado do Evangelho, REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. 27. nme do altar mér ao arco cruzeiro, outra sepultura se- nao aguella, e pertencer a-ossada ahi encontrada e disposta, segundo 0 ceremonial daigreja, a um individuo qualificado de 50 ou 60 annos de idade e alli sepultado ha muito mais de um seculo. Da clausula 7* do testamento s6 se dedu’z que o corpo do testador fosse levado na tumba da Mi- sericordia da casa.em que fallecesse ao seu jazigo, acompanhado pelos irmaos, mas nado que fosse se- pultado naquella igreja. A clausula 6*, porém, depois das informacgées pedidas e respostas recebidas da ilha da Madeira, confirma ainda mais a noticia do thronista. Entre outras cousas diz esta clausula : « E seri meu corpo mettido em um caixfo for- rado de chumbo e calafetado, o qual seré posto em deposito na igreja do convento de Nossa Se- nhora do Carmo da villa de Olinda, fora da terra, para d’ahi ser trasladado 4 capella mér da Santa asa da Misericordia da ilha da Madeira, de que sou padrociro, onde tenho mandado fazer um car- neiro por minha conta e de minha mulher para ser 0 nosso encerro e de nossos filhos ; e emguanto se nao fiser a obra, cada dia se pord uma lampada accesa no lugar em que estiver 0 caixdéo e porao cera sempre ardendo, ese diré uma missa quoti- diana por minha alma, de minha mulher e filhos, pela esmola do doze vintens‘cada uma. » O carneiro, que Vieira pretendia mandar fazer na Misericordia da Ilha da Madeira, para si, sua mulher ¢ filhos, nao se fez. Seriam esses os seus desejos talvez; alli nascera e passara a infancia ; conservava naturalmente vivas todas essas recor- dacdes saudosas da patria, que fazem o homém voltar-se para o ponto em que nasceu, querendo vel-o atravez dos horisontes que o encobrem, rés- pirar com avidez as suas brisas, contemplar com dernura a belleza dos seus campos. Cobicava dar 4 patria o coragao que por ella palpitava. Mas a prova de que o nfo mandou construir ésté nas 28 REY. DO INST. ARCH, E GEOGR, PERN. pesquisas e exames feitos nos livros e assentos, correspondentes ao seculo XVII, no local da anti- ga Misericordia, onde nada se encontrou, nem mesmo a tradicéo o recorda. A prova esta ainda no facto de ter sido sua mulher sepullada na igreja de Santa Thereza de Olinda, fallecendo muito de- pois delle, ¢ permanecerem até hoje alli os seus restos mortaes, 0 que nao aconteceria, se na Ma- deira existisse o jazigo perpetuo de Vicira e sua familia. O testamento foi cumprido, como tudo leva a erer, na parte relativa ao deposito do corpo na egreja do Carmo, em caixéo de chumbo. Mas nao era possivel ahi permanecer fora do chao, por- mais de 3 ou 4 dias em virtude da decom posicao © gazes desprendidos, incommodos e prejudiciaes aos religiosos e ficis. Embora forrado.de chumbo, 0 caixdo, e cala- fetado, isto nao impediria a corrupcio do corpo nas suas partes simples, nem a vasio dos gazes por onde quer que fosse. ; Até a época do testamento Vieira nao havia mandado construir o carneiro na flha da Madeira, como se vé das palavras da clausula: e emquanto nao se fusia a obra; depois tambem nao a fez, como dizem as investigacées e pesquisas recebi- das; nestas circumstancias como deixar-se de operar o enterramento na igreja do Carmo, onde o cadaver fora depositado, fore do chao? : Por mais sinceros que fossem os desejos dos lestamenteiros de Vieira em cumprir nesta parte as disposigdes da sua ultima vontade teriam des- apparecido ante a impossibilidade daqnelle facto, Na analyse chimica qualilativa, procedida n’um torrio da substancia calearea, encontrada ao lado © sob 0s ossos craneanos, com o fim de verificar-se a existencia de metaes, chegou-se a este resultado : Cal, ferro e zinco. Ferro em pequena quantidade, attribuida 4 REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. 29 oxydagéo dos pregos; cal e zinco‘em proporgdes quasi equivalentes, 4 analyse n&o teve por si instrumentos e ap- parelhos superiores, nem reagentes de forga, como acido sulphydrico, sulfato de ammonio € outros ; com tudo obtiveram-se duas partes, uma branca pulverulenta e friavel, desfazendo-se 4 mais leve pressdo, a outra acinzentada e em fragmentos du- ros com aspecte metallico. Tratada esta ultima substancia pelo _acido ni- trico, e submettida depois 4 accfio de differentes reagentes, deu as seguintes reacdes : com 0 mono sulfureto de sodio precipitado branco gelatinoso com pontos escuros ou cinzentos, nado soluvel, em excesso de reactivo ; com a potassa caustica pre- cipitado branco gelatinoso, soluvel pela maior parte em excesso de reautivo, e com ferro cyanureto de polassio, precipitado azul da Prussia. A parte que nao dissolveu-se em excesso de potassa caustica, sendo tratada novamente por agua destillada e acido nitrico, e submettida de- pois 4 acgdo do acido sulfurico, deu um precipi- tado branco perfeitamente soluvel no acido azo- lico ; levada & chamma do alcool nao tingia de pur- pura aluz. Tratada isoladamente pelo acido oxa- ico e bicarbonato de soda, o precipitado obtido foi branco e abundanie. : . Interpretando-se estas reaccdes, notou-se a existencia de zinco no precipitado branco pelo mono sulfureto de sodio, é cal no restante do mes- mo precipitado azul pelo ferro cyanurete de po- tassio a presenga do ferro. Chumbo ou zinco, metaes confundidos pelo vulgo antigamente, prova a existencia do forro do caixdo, tal como recommendara Vieira em seu testamento. Entre as regras que cumpre observar sobre qualquer successo que parece duvidoso, uma d’el- las é: devemos seguir @ accommodar-nos com o que escreveram os que viveram mais chegados. ao tempo do successo. . Fr. Manoel de Sa publicou as Memorias de sua Ordem em 1724 e Vieira morreu no principio de Janeiro (10) de 1681, quarenta e tres annos antes, ou ainda menos, altendendo-se & época da morte e 4 publicagdo da obra, talvez annos depois de es- cripta. Com certeza nao consignou o facto sem ter delle pleno conhecimento, nao sé pela qualidade do morto, circumstancias do seu enterramento, como pela brevidade do tempo decorride, ainda na memoria da communidade, senéo mesmo em vista dos assentos do convento. E se a narragio das pessoas presentes aos fa- ctos, ou que puderam ter conhecimento delles,é considerada fonte historica, cabe a critica discernir © que ha de niais ou menos digno de credito, com- parar ¢ ligar entre si os acontecimentos para por esse meio chegar-se 4 verdade historica. Assim, pois, considerando que pelo auto de exhumagao a unica sepultura_encontrada na capella-mér da igreja de Nosso Senhora do Carmo de Olinda, da parte do Evangelho, foi a que continha os ussos presumidos de Joio Fernandes Vicira, apezar da escavacdo feita desse lado, da escada do altar ao arco-cruzciro ; Considerando que no testamento celebrado a 1d de Feverciro de 1674 acha-se inserida a clau- sula de ser o corpo do restaurador fechado em caixdo, forrado de chumbo e depositado naquella igreja fora do chao, até ser traslado para a ilha da Madeira, onde pretendia 0 testador mandar fazer um carneiro, na capella-mér da Misericordia da dita ilha, para si, sua mulher e filhos: Considerando que aquella obra niio se fez, nio sé porque nao foi encontrada, segundo as in- vestigagdes e exames jd referidos mandados pro- ceder alli pelo Instituto, nem corfstar dos livros termo ou assento que isso recordasse ; mas ainda porque, sua mulher fallecida, depois delle, foi en- REY. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. 31 ne enterrada na igreja de Santa Thereza de Olinda, bem como a filha e netos tiveram sepultura em outros lugares, o que assim nfo succederia, se o facto fosse real; Considerando que ent&éo entre nés nao eram conhecidos os processos de embalsamacio, nem fora delles se consegue prevenir e obstar a cor- rupcgdo dos cadaveres por mais tempo, e que o deposito foro do chao por mais de 70 horas trazia incommodo e perigo 4 satide publica, o que pa- rece resolvido Pea inhumagéo em « humilde sepul- aura em que lhe faltaram os marmores e epita- 10» > : Considerando que pelo exame e parecer de medicos, clinicos distinctos, residentes nesta ca- pital, ficou reconhecido, « depois de acurado estu- do e varias pesquizas», que os osses encontrados na unica sepultura existente da parte do ‘Evange- lho da igreja do core) pertenclaa a um individuo do sexo masculino, idade de 50 annos, e com pre- sumivel inhumagao de muito mais de seculo, o que coincide, na generalidade destes dous termos, com a idade de Vieira ao tempo da morte ; Considerando que pela analyse chimica quali- tativa em uma pequena porgao de substancia de ferro, attribuido aos muitos pregos oxydados, e zinco em proporcao equivalente acal,o que tam- bem coincide com a recommendagéo contida na clausula testamentarig de ser forrado o caixao mortuario com chumbo, metal que podia ser -sub- stituido pelo zinco por qualquer circumstancia ; Considerando que toda a presumpcao é fun- dada na relagao natural que existe entre a verda-~ de conhecida ea que se. procura, e como essa re- lac¢éo péde ser mais ou menos necessaria, ‘d’onde resulta tornarem-se tambem as presumpcdes mais ou menos falliveis, dependendo o grado’ de certe- za da connextio que existir entre o facto conhe- cido e o ignorado ; Considerando, finalmente, que a indicag&o das 32 REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. penne ranma enn nnn nenrennynnnnnne Memorias de Frei Manoel de Sa e investigagées feitas em virtude della resultaram os seguintes factos : nao existir outra sepultura da parte do Evangelho na capella mér da igreja do Carmo de Olinda, nem vestigio de mais alguma, sendo a en- contrada junto ao primeiro degrao do altar, estar © caixéo em que fora encerrado o cadaver comple- tamente desfeito e carbonisados alguns residuos pela accao do tempo ; ter sido sepultado o cadaver, pela disposigéo dos ossos, de pés voltados para o altar ; @ verificando-se do parecer medico, que aquelles ossos, submettidos a exame, pertencem a um s6 individuo do sexo masculino, de idade mui- to maior de 50 annos, sepultado ha muito mais de seculo; reconhecendo-se ao mesmo tempo pelo ex- ame chimico das substancias calcareas a existen- cia de zinco, com que devia ter sido forrado o cai- xo mortuario, segundo recommendacao testamen- taria, e com o fim de serocorpo trasladado para a igreja da Misericordia da Ilha da Madeira, o que se realisou ; resultando destes factos e de outros conlidos na exposigio acima mui fundadas pre- sumpgdes de que 08 ossos de que se trata nao po- dem ser de outro sendo de Joao Fernandes Vieira, é acommissio abaixo assignada de parecer que co- mo taes sejam reconhecidos, segundo a autorida- de das regras da critica, estabelecidas para dis- cernir das fontes da historia o que nellas ha mais digno decredito para obter a verdade, 0 que pa- rece ter conseguido a commisséo no presente caso. Recife, 7 de Agosto de 1887: Mazximiano Lopes Machado. Dr. José Hygino Duarte Pereira. José Domingues Codeceira. DOCUMENTOS PELA MAIOR PARTE EM PORTUGUEZ SOBRE VARIOS ASSUMPTOS Continuagao (1) * Ao Capitéo Joio Lopes Barbalho.—Com esta vae a ordem que Vm, ha de seguir, e outra ao ca- pitéo Antonio Phelipe Camarao ; muita conflanca tenho de que Vm. faré tudo, como convem, ea di- ligencia e cuidado vencera o pouco poder com que Vm. vae,e como assim sé me fica advertir a Vm. que se ndo fle nem de si mesmo, que esta 6uma das .maiores cousas que até agora se fez na guerra, © que cessaré tudo o que Vm. tem obrado em ser- vico de S. M.. Tudoo que V. puder obrar de ca- minho faga, entendendo primeiro que o pode fazer com seguranca, e nao dé quartel a indio nem fra- mengo, entregando-os aos tapuyas ¢ desculpando- Se com elles, ¢ aproveitando-se que é tempo. Eu ndo quero dobrées nem fato, negros e mais negros, todos em meu nome, que eu comporei os soldados, e cem isto veja Vme.o tempo que ha de pér no marchar, que a armada parte d’aqui quinta-feira que sao 17 deste mez. O engenho de Gaspar de Merida fique livre, e ode Antonio de Bulhées, ou de seu filho Zacarias, nestes nao faga nehtim damno nem consinta que se faca, nem Ih’o encarrego'; 0 (1) Vejaa Revista de Agosto deste anno. * desi aos do- cumentos do archivo do rei do Hollanda,e** os do archivo pt- blico de Haya, 5 34 REV. DO INST, ARCH. E GEOGR. PERN. alferes vae por mar. -Deus nos ajude, e a Vm. dé o successo que eu lhe desejo. Da Bahia hoje 16 de Novembro de 1639 annos : Tio de Vm. Luis Barbatho Beserra. *D. Fernando Mascarenhas, conde da Torre do Concelho de Estado de S. M, commendador das villas do Rosmaninhal e Santiago da Fonte Arcada, capitéo de mar e terra do Estado do Brazil e das armadas maritimas que nelle se acham. Por convir ao servigo de S. M. que na capita- nia de Sergipe assista com infantaria pessoa de valor, experiencia e cuidado, para que assim se fi- que atalhando as correrias que os Hollandezes fa- zem n’aquella paragem, saqueando os moradores, e tirando o gado que nos pode ser necessario, or- deno a0 capitao de arcabuzeiros Jodo Lopes Barba- Iho que com 100 infantes se va ajuntar com 0 ca- pitéo Joio Magalhaes, para que assim a sua infan- taria e soldados do capitaéo-mér D, Antonio Fhelipe Camaraéo, como os do governador Henrique Dias, estarée 4 ordem do dito capitéio Joéo Lopes Bar- balho, tomem posto com (vista?) a se poderem con- servar sem serem cortados dos Hollandezes, e em parte que (possam) acudir a encontrar as sahidas que elles fizerem para esta parte do rio de S. Fran- cisco, tendo para isso nas paragens necessarias tropas para que se (informe?) com tempo da can- tidade e caminhos que fazem os Hollandezes, aos quaes encontraré e romperd, usando de todos os ardis necéssarios pera assim o fazer,e sendo que o poder seja téo grande que totalmente entenda que o empenho que fizer sera grande, e que nao se poderé sahir delle com reputacdo, (e sem perda ?) de soldados, aguardara ter vista delles e esperara serepartam a fazer ditas correrias, para que assiin REV. DO INST, ARCH, E GEOGR. PERN. 35 divertidos os possa romper#e desbaratar que os Hollandezes 0 vao buscar com tode 0 podes e entendendo que lhe nao poderéa resistir, se reti- raré mais atrés pera melhor sitio, tomando algum passo'(immedia)to ao rio, onde com mais commo- didade o possa resistir, andando sempre 4 sua (vista), dando naquelles que se desmandarem ou apererom do maior poder ; nao dard quartel a ne- nhum, é pera mais seguranga e pera que miudamen- te me avise de tudo, traré da outra parte do rio de S. Francisco de ordinario 10 homens entre brancos ¢ negros, encarregando-os saibam dos moradores tudo o que houver de novo, e si pera esse effeito for necessario tomar um framengo 0 mandaré fazer. e€m’o enviaraé; mandando cada 45 dias render por outros os que lé andarem. Conservara o dito ca- pitéo os moradores que achar na dita capitania e os que a sua sombra forem, nao consentindo que os soldados, indios e negros lhe facam agravo ne- nhum; eos que o fizerem os castigaré como lhe parecer, pois por sua conta corre o que fizer mal feito e consentir se faga, e nao consentiré que tropa nenhoma passe a campanha, salvo aquella que the mostrar ordem minha por escripto, ¢ os indios que véo administrar as (rogas) de Antonio Rodrigues e Jo&o Rodrigues, tera cuidadg de saber como os di- tos procedem, e noo fazendo bem pora com elles @ pessoa que lhe parecer, havendo-se em este par- ticular e em todos os mais do servico de S. M. com ° Sa e Pocus que delle espero. ada na Bahia : i de Jule dah sob meu signal somente aos 34 E com o maior cuidado encarrego ao capitéo 0 bom tratamento dos moradores, e néo consentir que no caminho se Ihes fara exaccéo alguma. D. Fernando Mascarenhas, conde da Torre. . DO INST. ARCH, E GEOGR. PERN. D. Fernando Mascarenhas, etc. — Porquanto os recursos de guerra e accidentes que o tempo offerece se n&o podem prevenir, em tudo o que por esta ordem nao estiver prevenido, se governard pelo que Ihe parecer, fiando de sua (diligencia) ¢ zelo todos os bons effeitos que vae pretender em servico de S. M., e quictagdo e seguranga dos mo- radores daquelle districto. _ Dada na Bahia no dia acima. D. F. M., conde da Torre. * D. Fernando Mascarenhas, conde da Tor- re, etc.- Porquanto estou embarcado para ir to- mar porto na capitania de Pernambuco, convem ordenar ao capitio-mér D. Antonio Felippe Cama- rdo, que tem ido até o rio deS. Francisco, a viagem que ha de seguir e facgées que ha de intentar 5 se- guira em tudo a instrucgdo e ordem seguinte. Tanto que receber esta passara o rio de 8. Francisco junto vom 0 capitio Joio Lopes Barba- Iho, sé com a gente de guerra assim dos brancos como dos indios, e deixando o mutherio, velhos ¢ doentes em Sergipe ; ¢ todos unanimes marcharaéo (para a) aldeia que o dito D. Antonio Felippe Ca- marao sabe, a qual esta scte leguas do (tio ?) adon- de se previniré de bastimentos, procurando jun- tar-se com o Rodella, (para que) 9 acompanhe, fa- zendo muito por adguirir todos os principaes se- giurando-Ibes que) S. M. os gratificaré e thes fard mereé, como bons vassallos... como melhor thes parecer, conforme as nolicias que tiverem do ini- migo, marchario na volta de Serinhiem, passando pelas Alagoas e Porto do Calvo pera fomarem to- dos bastimenins e-cantidade delles que em cada uma destas paragens houver, assim de farinhas, carnes, legumes e¢ pescado, ¢ chegando a Seri- nhdem nio se empenhario, (mas) tratario de in- _ REV, DO INST. ARCH, E GEOGR, PERN 37 enn nnnennnnnennnennnsinaneneaaae quietar ao inimigo de modo. que o obrigue a sahira buscal-os, e si sahir com poder se retirardo na vol- ta de Pojuca, e d’alli & povoagdo de Santo Antonio do Cabo, fazendo paneling 80 sertéo, procurando sempre ter as espias.boas e de conflanca, pera que nao sejam cortados do inimigo, e pera que lhe dé aviso da chegada de nossa armada, aonde faz pon- ta, pera procurarem logo acudir 4 praia, pera que si houver inimigos a defender a desembarcagao, Ihe deem pela espalda, e pelegem com elles, pera que fique livre o desembarcadouro, e trabalharao muito por avisar 80 capitéo André Vidal, pera que todos juntos mui conformes acudam 4 praia, e em havendo vista da armada trabalharao por todos os meios que puderem dar-lhe todos os avisos do desenho do inimigo, e do estado em que estéo ede suas cousas, 6 a prevengdo que tem feita pera nos impedir a desembarcacéo e em que logares. Advirta-se que, em chegando a Santo Antonio do Caho de Santo Agostinho, queimarao e abra- sarao com todo o esirondo possivel os engenhos do sertéo de Grogati, sem Ihe deixar pedra sobre pedra, e todos os mais cannaviaes daquelle dis- tricto, de modo que venham a queimar cinco ou seis engenhos destes, e néo queimarao mais. Os framengos que encontrarem e aos que se forémre- colhendo, e aos que se acharem em casas que nao forem fortes, os salteardo e fardo suas emboscadas e Ihe néo daraéo nenhum quartel, sem se perder occasido nenhuma, advertindo mais que esta guer- ra que se Ihes ha de fazer ha de ser por assaltos, € sem que o inimigo saiba a parte certa aondeo tem, nem o numero e cantidade da gente que leva. Quanto aos moradores lhe encommendo e man- do lhes nao fagam nenhum agravo, nem molestia, nem vexagdo alguma, mas antes os amparem ¢ defendam pelo melhor medo que poderem a todo seu poder, advertindo e castigando com pena de morte a qualquer soldado de qualquer condigéo que seja, ou indio que lhe fizer agravo ou avexa- 38 REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. cao, e o bastimento que houverem mister lh’o pe- diraéo com muita moderagao, sem Ihe damnarem as suas rocas nem creagoes, confiando delles que lh’o darfio com muito gosto e vontade, como de sua Londade se espera e se tem experimentado, ad- vertindo mais aos ditos moradores se deixem es- tar pacificos equietos, em quanto a nossa armada nao tiver lancado gente em terra, porquantoéa occasiiio de 0 poderem fazer ¢ demonstrarem sua lealdade e acudirem ao exercito, com o que pode- rem e lhe for necessario. oo. _ Advirta-se mais que, si 0 inimigo os nao vier buscar com poder, e a armada com a occasiao dos tempos se dilatar, correréo a campanha até a pa- ragem de S. Lourencgo e Vargea, emquanto a ar- mada néo chegar, e sempre terdo espaldas no ser- tao, para que o inimigo os nao corte como ja ficou dito, e desta paragem nao passarao adiante. _ i nesta paragem da Vargea e de seu districto queimardo quantos engenhos puderem queimar dos que tiverem occupado os framengos, e todos os cannaviaes abrasaraéo sem perdoar a nenhum. Procuraré com toda a diligencia e cuidado ajuntar assim todos os soldados gue por (14) an- dam espalhados, assim os que andam fazendo guerra 20 inimigo, como os que andam molestan- doos moradores. Todo o contecdo na iustrucgio atraz daréa execucdo o dito capitio-mér D. Antonio Philipe Camario com o zelo e cuidado que costuma ter ao servico de S.M. Bahia, 17 de Novembro de 1639. ** D, Joéo Lopes Barbalho ao (Conde da Torre?) —Ainda quea maior materia me nio poderd ‘cer- tificar de que V. Exe. me deixe de fazer mereé com toda largueza, a propria conveniencia do real ser- vico me faz reparar na pouea das ordens que me vieram, porque com ellas me nao fica logar nem REV. DOINST, ARGH E GEOGR, PERN. 39 nner para prometter um favor a quem emprehender algum effeito que merega e nem para castigar al- guem trahidor que convenha, nem para levantar gente, nem para que, ajuntando-se commigo André Vidal, estejadminha ordem, sendo mais moco que eu;em fim queem nenhuma materia tenho jurisdic. cdo alguma, porque me nao veio mais que uma carta simples com o treslado de uma ordem do Camarao, pela qual eu nao posso intentar nada, nem obrigar a ninguem ; e juatamente por onde vim achei algu- mas ordens em miaéos de mercadores, os quaes os quaes os nfo mandam reconhecer-me em cousa alguma ;e que, vindo rapaz, se me deram ordens mui largas em occasiao de pouco porte, é forca estranhar a limitag&o destas em occasiao de tanta consideragéo maiormente que nunca quizera nem perder o que me toca, nem tomar mais logar do que se me da; e para haver de governar isto, é ne- cessario usar de muita authoridade; como que nestas materias me vejo confuso, o que me faz.en- tender lhe pareceré a V. Exc. poderé o Camasdo remediar este defeifo, 0 que acredita minha pouca sorte, e bem a tivera por boa ter elle esse ca. edal, borgue, além de que assds o merecera eu ganhava muito em irisento desse trabalho, o que manifes- tara melhor a consideracéo do que eu o poderei fazer ; comtudo o gcsto de V. Exc. é maior interes- se, e Sendo elle tal, o tereieu mui grande de o po- der satisfazer, Hontem, 5 deste, chegamos a este passo de.Ca- maragibe, onde me disseram viram uns 400 Hollan- dezes. Quando succeder, espero benqueteal-os como convem, e assim aos mais que tiver occa- sido de o poder fazer, porém elles se previnem jé como V. lixe. o poderd entender; sem embargo fago as diligencias, para o que, e€ para mais segu- ranga, doze ou quinze leguas ao largo levo boas es- ; jas, das quaes tive aviso estarem neste forte 500 1omens, que o Mansvelt tem jd passado Seri- nhaem, e retirado os que alli estavam, e assim GH. E GEOGR. PERN. 40 REY. DO INS’ imos seguindo viagem. Queira Deus seja como até aqui. * A esta tropa se ajunton com a gente que tra- zia o capitéo Francisco da Cruz, havendo encalha- do em terra junto ao Porto dos Francezes, obrigado de 37 velas inimigas que por ahi passaram, sobre © que logo avisei a Bahia em um barco que para esse effeito fiz partir; cu tenho por boa sorte ir elle em esta companhia por ser pessoa de satisfa- go; e juntamente se nos vae ajuntando muita gente, porém os mais delles desarmados. , Tive por noticia que, assim emo rio de S Francisco, como aqui temo inimigo muito gado junto as forcas, ndo no devem gastar téo em breve que nao entremos em partilha. O capitiéo Pinheiro dard informacéo com mais largueza, e eu sempre esta- tei prompto ao que por V. Exc. me for ordenado, a quem Deus guarde, permitta prosperas victo- rias com a saude e vida que deseja, como have- mos mister. 6 de Janeiro de 1640. Joao Lopes Barbatho, Joio Mauricio, conde de Nassau, Catzenctlen- bogen, Vianden e Dietz, senhor de Beylstein, go- vernador, capitéo e almirante general do Estado do Brazil. * Faco saber a todos os moradores do Estado do Brazil que estio debaixo de nossa obediencia, que, porguanto tem chegado a nossa noticia por duas ordens que me vieram & mao do conde da Torre, general d’el-rei de Hespanha,e por uma carta do mestre de campo Luiz Barbalho, escripta de sua letra e signal a seu sobrinho Joao Lopes Barba- Iho, tomados estes papeis entre outros no fato do dito Joao Lopes Barbalho, cabo de companhi- as e tropas que vieram da Bahia, nas quaes or- REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. AA dens ordens e¢ carta se contem que nado desse quartel a nenhum framengo nem braziliano, an- tes os entregasse aos tapuyas, para que os ‘matas- sem a todos, desculpando-se com elles, e Ihe en- commenda mais sobre isso 0 roubar os morado- res, e Ihe ordena que para si Ihe tome negros e mais negros, endo fato nem dobroes, exceptuan- do desta crueldade somente dous engenhos por seus respeitos; e por ser digno de retribuicao tao erversa ordem e intengéo, mando que nenhum os ditos moradores receba em sua casa, nem fora della, nem por nenhuma via, esconda solda- do algum do inimigo, nem doente nem ferido, e si pelo dito inimigo Ihe for algum deixado forgo- samente em casa o manifeste, e leve logo no esta- - do em que estiver ao presidio mais visinho para o rigor que o inimigo deu. por ordem se executasse em nossos soldados, e sera morto sem piedade alguma, e seus bens dados em pilhagem a’ nossos soldados. _ Dado nesta cidade Mauricia, aos 24 de Feve- reiro de 1640, J. Mauricio, Comte de Nassau. Por ordem deS Exc. . Charles Tourlon. _ Mon cousin.—L’‘on m’a fait entendre que vous traitez favorablement les Religieux Racolets de quatre couvents de cet ordre, qui sont en I'Inde Occidentale, dont je vous sais beaucoup de gré, suivant laffection que j'ai pour tout ce qui regarde le service de Dieu, etla bonne volonté particuliére quej’ai toujours eue pour l’ordre de S. Francois. Cest ce que j'ai voulu vous témoigner par cette lettre, et vous convier, comnie je fais autant quill nvest possible, & continuer a departir aux dits re- 6 42 REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. Seen ICSD eS SuD SUEDE EDDC EEDCODEED DT EC CS oceocos ligieux votre protection et assistance, selon le besoin qu’ils en ont par dela. Deux de leurs reli- gieux, qui s’y en retournent, seront porteurs de la présente, lesquels je vous recommande avec les autres, vous assurant que je tiendrai 4 plaisir par. ticulier tout ce que vous ferez pour eux, et vous ferai connaitre le sentiment que j’en aurai en tou- tes les occasions qui m’en donneront le moyen, priant sur ce Dieu, qu'il vous ait, mon cousin en sa sainte garde. : Ev’erit & Saint Germain em Laye le 13 Avril 1640. Louis. 7 Bouthilier. A’ Monsicur le Conte de Nassau, governeur pour les Seigneurs E’tats Généraux des Provinces Unies des Pays-Bas en l’Inde Occidentale. * Com toda a suavidade e cortezia temos até hoje tratado a cobranca do que se deve 4 Compa- nhia, e por termos alcangado pouco effeito toma- mos de novo um meio, o ultimo nesta materia, pera que faltando-lhe Vmce. nelle se use de todo rigor, sem repararem damno ou ruina sua, pelo que Vie. logo se venha ver comnosco neste Supremo Conselho para tratarmos e accordarmos quantas caixas de assucar ha de dar esta safra_ por conta do que deve, conforme ao que tiver, e deixe Vmc. ordenado de mancira 9 sua moenda que nao faca 14 falta pelos poucos dirs que tiver de ausencia, porque logo em chegando Ihe daremos despacho, e por esta damos a Vme. por seguro de todo 0 arresto e diligencias da justica de qualquer outro acredor pera que venha sem nenhum receio. Guarde Deus a Vmc. Recife,..... (sem data nem assignatura). REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. 43 ee ** Mui Nobres Senhores do Supremo e Secre- to Concelho, Bem entendemos que nao ha cousa mais justa nem mais. precisa que acudir aos mantimentos dos soldados, mas tambem-entendemos que Vv. Ss. néo devem querer que se facam fintas, ese ponham ao povo mandamentos que nao (servem ?) mais que de extorgdes, e penas aos escoltetos, e desprezo aos maiores; assim nos parece que se- ria nova finta, si agora se fizedse. Vv. 8s. nos mandaram que se manifestassem todas as rocas, assim se fez, e depois de esgotar- mos as velhas, mandaram Vv. Ss. que logo se des- fizessem as novas, ficando a metade dellas pera © povo, e queda outra metade se desse logo a fa- rinha ; assim se ha feito, e temos por informacao que muitas rogas novas nao deram todas inteiras a farinha que se Ihe deitou nem a ametade della, por 0 tempo haver sido secco e pouco criador; e porque nao devemos obrigar o povo a impossiveis, dize- mos a Vv. Ss, que naéo,sabemos de outras rocas sobre que seja de deitar nem fintar farinha ; si nis- to houve engano, a diligencia que se pode fazer é mandal-as examinar, eisto faremos quando Vv. Ss. nol-o mandem. _ Temos ouvido em algumas partes que os com- missarios vendem a farinha, e como de repente se tirou tanta, e havemos acabado téo depressa, pe- dimos a Vv. Ss. que mandem examinara farinha que os commissarios receberam por os roes de nossas fintas,e em que a despenderam, porque nos parece que nisto se nfo procede como de- vera. Advertimos a Vv. Ss. que tambem os mora- dores do Recife,gastam farinha, e que essa que se deixou nao sé é pera os moradores, como Vv. Ss. Ihe prometteram, senio. que alguma deve vir ao Recife, aonde ha povo que se néo sustenta com pao, € val aqui hoje o menos a 20 reales, e assim AA REV. DO iNST. ARCH. E GEOGR. PERN. © promeltimento que se fez a0 povo com o susten- to que se Ihe nao podia tirar, e sendo que este Recife tem necessidade, sic consequencias que se devem considerar; ce com tudo Vv. Ss. poderdio mandar desfazer o resto das rogas todas no estado em que estiverem, ¢ applicar para execucao disto os soldados que o saberéo mui bem fazer, que os es- cabinos parece que devem receber este favor de Vv. 5s., escusando-se das imprecacées e clamores que sobre elles fara o povo reputando-os por au- tores destes damnos e miserias. No tocante a carne, apresentamos a Vv. Ss.a manifestagao de quatro freguezias ; quem occultou alguma mandem Vv. Ss. tomar-lh’a*; esta que esti manifestada mandem Vv Ss. destribuil-a, como lhe parecer, Dos homens deputados peraa avaliagio mandamos aVv. Ss. o rol com esta, pera que os commissarios os mandem chamar, quando houver gado pera o analysar. No Cabo e Pojuca demos ordem ao escoltete Ilol pera aceitar a manifestacgio ; do gado que se manifestou podem V s, Mandar se-naéo comani essas vaccas que ha; nao sabemos que dizer outra cousa sendo que se comam os bois, e yue aonde acharem oulros se lomem, porque assim o tem me- recido quem os occultou, e como isto de carne e fa~ rinha ha chegado a este estreito estado, pedimos a Vy. Ss. que, pera que néo sejamos odiosos ao povo, mandem peios soldados tomar-lhe o que lhe acharein de comer, que a nés_ nao convem fazer- mos s extoredes, ¢ na milicia nao sao tac es- tranhadas nos casos de necessidade, que antes entendemos ¢ permiltido aos soldados, e aos esca- Dinos seré grande vilupcrio o fazerem-no. Guarde Deus a Vv. por muitos annos. Mauricia, Janeiro de 1640. (4) (Sem assignatura), (1) Da aetado Suprei consla que se mandou t laf Assembléa di cra. Concetho de 40 de Janeiro de 1640 copia de: presentacdo para ser Desenove «afim de saberem o estado REV, DO INST. ARCH. E GEOGR..PERN. oe) prernnnrmnrrenrerrennnenrnrerrne nna neynnrenahineene * Ao Conde de Nassau.—Cheguei a ésta praca com desejo de se me offerecerem occasides}de'servir a V. Exc. e com particular desejo de poder com- municar a V. Exe. materia de muita importancia assim para Y. Exc., como para mim. modo fi- que éeleicdo de V.Exc., ou enviando-me pessoa con- fidente com occasiao de tratar dos prisioneiros que tenho, de que véo com esta cartas, ou permittindo que eu envie d’aqui ao mesmo effeito. E si o sar- gento-mér Picardo fora vivo, poderia dizer a V. Exc. que eu fui quem Ihe _houve passaporte de S. M. pera ir de Lisboa 4 Hollanda com outros 200 prisioneiros, Esi-por ahi houver alguns destes poderao dizer a V. Exc. a boa passagem que thes fiz, e depois que cheguei a esta praga, dei passa- gem a todos os soldados prisioneiros que achei, porque me parece nisto que, ainda que com as ar- mas, tenhamos toda a boa correspondencia. E emtanto guarde Deus‘a V. Exc. muitos annos. () Bahia, 28 de Agosto de 1640. Marques de Montalvao. _, Ao Sr, Bernardino de Carvalho.—Estou mui informado dos bons precedimentos de Vmce. e de suas partes, eassim me quiz valer de Vme. e pe- dir-lhe me dé na mao de Gaspar Dias Ferreria a carta que serd com esta com o maior Segredo que for possivel, porque me importa muito que lhe che- gue ds maos, e Vmc. me accusara de como rece- Deu esta e deu a carta a Gaspar Dias Ferreira ; (1) Esta‘o as seguintes carlas, trocadas entre o Conde de Nassau e © Marquez. de Montalvao, sio copias authenticadas com a seguinte declaragio que se 1é no final de todas ellas : « Fatemur illustriss. D. Com, Mauritium a Nassau nobis communicasse has litteras, et in testitimonio (si opus sit) nos illas legisse subscribimus nostra nomine, Soler, Kesslerus. » 46 REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. ae Ene ES eS SUUIS ENE OEENSE DEE EE ELLE EEE ceeooe esteja certo que em tudo o que por ca se lhe offe- recer, me acharé com benigno animo. Guarde Deus a Vme. Bahia, 28 de Agosto de 1640. Marques de Montalodo. “A D. Jorge Mascarenhas, Marquez de Mon- talvéo.— Fui sabedor que V. Exc. era chegado a essa Bahia e me pareceu devia dar-Ihe as boas vin- das, como faco por esta, offerecendo-me a seu ser- vigo. Tive noticia que um nosso sargento por no- me Van den Brande (o qual tinha por morto n’um encontro que houve no Rio Real) estava prisionei- rode V. Exc. nessa Bahia, e tao honrado e bem tratado de V. Exc. como de sua illustre pessoa se espera, pelo que Ihe dou as gragas, e prometto cor- responder havendo occasiao em que 0 possa fazer. Si € possivel fazer-me V. Exc. mercé, mandar-me neste barco ao dito sargento-mor, o terei a grande mercé e favor, e dando-me o tempo por algum suc- cesso da guerra semelhante occasiao, nao faltarei em igual retribuicao. Tambem esté ahi prisioneiro um morador do — Rio Grande por nome Gartsman, que os annos pas- sados seguio a guerra, 0 qual levou comsigo 0 co- ronel Barbalho, pedindo-Ih’o eu por muitas cartas minhas, a que me nfo respondeu, quando passou pelas montanhas destas capitanias ; de presente sou importunado de sua mulher, que é porlugue- za, com peticdes representando-me a falta que lhe faz ua administragio de sua fazenda, e aos filhos que della tem. Sirva-se V. Exc. de querer reme- diar a esta pobre mulher por ser portugueza, ¢ mandal-o tambem neste barco, dos quaes favores nio serej esguecido nas occasides que o tempo me dér do servigo de V. Exc., cuja pessoa Deus guarde muitos* annos. de 1640. (Sem assignatura). Mauricia, 20 de Outubro REV. DO INST. ARCH. E GEOGR, PERN,. 47 porn nA een * Ao Marquez de Montalvéo.—Tendo escript a V. Exc. neste barco dando-lhe os parabens de sua vinda, de_ novo recebi a sua de 25 (98?) de Agosto por mao de Gaspar Dias Ferreira, e rendo a V. Exc. as gragas de sua boa vontade e corres- pondencia, de que me dou por mui agradecido, obrigado e certo, sem mais provas ou demonstra- gao. Dos prisioneiros trato a V. Exc. na outra que Ihe tenho escripto, e porque néo tenho pessoa di- gna que enviar a V. Exc., como me ordena, em rezéo da lingua que aos nossos é difficil, V. Exc. me fard grande mercé em mandar a quem Ihe pa- recer, efor de seu gosto; para o que me. tera V. Exe. sempre mui aparelhado com um animo mui obrigado a servil-o. Guarde Deus a V. Exe, mui tos annos. Mauricia, 24 de Outubro de 1640. * Ao Conde de Nassau.—Em resposta da que escrivi a V. Exc. recebi'a sua carta de 29 (21 ?) de Outubro t&o cheia de demonstragdes de boa corres- pondencia, que me deixa V. Exc. obrigado a con- tinual-a sempre da minha parte, com particular desejo de que V. Exc. conhega que a falta que pelo passado pode haver della, procederia (de) todas as occasides que o tempo e a guerra offereceu, fican- do intacto 0 conhecimento do muito que se deve 8 pessoa de V. Exc., de que eu me lembrarei em todo o successo pera cumprir com tao precisa obrigacgao. m outra: respondo a V, Ex. ao que me escreveu sobre os dous sargentos-méres prisio- neiros que estéo nesta praga, e pode V. Exc. es- tar certo que estimava muito mandar-lh’os neste barco, por ser a primeira cousa em gue V. Exc. me occupa de seu gosto; mas, apezar.de o nao po- der fazer (pelas causas que dou a VA Exc.), nfo é a menor demonstragao do meu desejo. * 48 REY. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. N&o mando pessoa a V. Exc. nesta occasiio « | comno me pede, porque espero que, havendo de passer adiante a pratica das conveniencias desta guerra, como respondi ao Senhor Bispo sobre a proposta que de la veio, (1) sera preciso haver passaportes e commissarios de parte a parte, € por essa via procurarei que V. Exc. entenda o animo com que vim a este Estado, para me empregar em tudo o que se offerecer de seu servico. Guarde Deus, etc. Bahia, 5 de Novembro de 1640. M. de Montaleéao. * Ao Marquez de Montalvo. —Tenho. escripto a V. Exc outra sobre a pratica das conveniencias desta guerra, e quando eu nao houvera alcancado em vir ao Brazil mais que conhecer a V. Ex. ¢ com- munical-o, creia-me que para mim foi a maior for- tuna e 6 ommaior premio ; todos os que a mim pa- receram defeitos nos tempos atraz, dou por bem padecidos, pois a presenga de V. Exc. os faz ditosos; na vontade com que V. Exc. vai multiplicando pera comigo mercés suas, me dou por téo empe- nhado que nenhum tempo, nem occasiao lhe pro- metto me escusaré da correspondencia‘della, por gue é impossivel faltar em mim o conhecimento e obrigacdo téo singular. A esta medida pode V. Exc. regular 0 empenho em que me poz na_mate- ria dos prisioneiros, porque na verdade mais obri- gado fico por elles do que si m’os mandara, pelo animo que de V. Exc. eu conheco no pezar de the nao ser possivel fazer-me um favor pelos impedi- mentos que na outra sua me aponta, os quaes con- fesso por mui justificados e bastantes. ,_ (1) Publicaremps depois a correspondencia sobre esta mar 1a, N. da R, * REV. DOINSE. ARCH E GHOGR PH ne RN AAR Encaminhei a pratica das conveniencias da guerra, como V. Exe. verd, a que logo honvesse commissarios ou refens, e 0s mando sem dilatar o modo, dando 0 logar possivel a que esses sejam os que convem, nos quaes espero que V. Exc. sup- ponha pessoas de calidade e partes} necessarias para materias de seu gosto, e na pressa de man- dal-os nao deixei de vencer algumas contradiccées no meu concelho, antepondo a todos o animo que alcango em V. Exe de me fazer fayores ¢ mercés. Nao sei que me disse este mogo que 14 man- dei acerca de uma sella @ outros aderecos de nosso uso, que me metteu em conflanca de mander a V. Exc. este par dellas de minha cavalhariga ; des- culpe V. Exc. a indecencia que tiverem a sua pes- soa com 0 animo de servir-lhe, eo erro deilh’as mandar com 0 desejo de o agradar, como farei em todas as cousas de seu servico. Guarde;Deus ete. Cidate Mauricia (sem data). * Ao. conde de Nassau.—Em outra tenho res- pondido a V, Exc. a tudo o que na sua me diz so- bre a pratica e conveniencias da guerra; nesta quizera achar modos sufficientes de dar a V. Exe. as gracas por tantas mercés e favores, como me faz, e pela deferencia com que engrandece minhas acgoes, que ndo tem outra cousa de louvaveis que serem encaminhadas ao servico de V. Exc. com mui grande vontade de poder merecer nelle a glo- maem que V. Exc me pde com tio antecipados agradecimentos ;, de tudo inflro « quanto interessa servir (?) » a V. Exc. com obras, pois tao liberal- mente concede V. Exc. aos offerecimentos da von- tade o premio que sd a ellas se devia; porem a mais alta recompensa de todas, espero eu tirar dos servicos que desejo fazer a V. Exc., que hao de ser : de calidade que tenham em si mesmo o mereci- mento eo premio. 7 DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. Muito reconhecido me deixa V. Exc. das con- tradiccdes que me diz venceu nesse concelho pera me mandar os refens com tanta pressa, e suppos- to que V. Exc. sabe dispor tudo com tanta atten- edo e prudencia, que pode ser mais invejado que encontrado, devo eu estimar muito que o animo de V. Exc. esteja disposto a todas as finezas que the merece e com que egualmeute lhe correspondo. Os refens que mando a V. Exc. so pessoas de ostos militares querespondem aos que cd vieram. E vindo de la delegado, como V. Exc. na sua me diz, ira de c4 outro da calidade que n’outras tenho insinuado a V. Exc., pera que cres¢a (?) tudo o que tocar as conveniencias da guerra, e asseguro a V. Exc. vocalmente do animo e desejo, com que vima este Estado, de servir a V. Exc., pois eu d’aqui nao posso fazer mais que com as demonstragdes que tenho feiloa V. Exc. A liberal grandeza de V. Exc. nao necessita pera si excogitar mais que de uma sombra de oc- casido, que isto vem a sero que esse mogo de V. Exe. devia referir acerca da sella, mas desta sorte fica sendo maior a minha obrigacéo e mais mani- festo oanimo de V. Exc. que com tanta generosi- dade se descobre entre a desculpa e o beneficio; es- te modo rendeu mais grandioso o presente, que sé por si e por vir da mao de V. Exc. era com effeito em extremo agradavel. A devida correspondencia fica reservada no meu animo, e essas ninharias que mando a V. Exc. servirdo s6 de acreditar esté em- penho, de que devo sahir melhor, quando o tempo, como espero, me conceder occasides de novas cou- sas do servicgo de V. Exc., a quem Deus guarde muitos annos. Bahia 4 de Janeiro de 1641. Marques de Montaloéo. REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. St * Ao conde de Nassau.—O logar-tenente Juan Langtéo me informou de aleune particulares, em que deve receiar a justiga de V. Exc., querendo que eu me valha em seu favor da conflangca que Vv. Exc. me tem dado para lhe pedir mercés, e como justamente péde obrigar-me com as leis de hospe- dagem a ter empenho em seus perigos. e por ser cousa do V.Exc., lhe devo desejar todo o bom sue= cesso. _ Peco a V. Exe. se sirva com sua naturel be- nignidade querer que, nesta occasiao, bastem por satisfacéo da justiga os motivos da miséricordia usada em testemunho da muita mercé que ’V. Exc. me faz, e essa devo esperar de seu generoso ani- mo, obrigagéo que me terd em perpetuo reconheci- mento, como acreditaréo as occasides, em que V. Exe. for servido mandar-me. . Guarde Deus, etc. Bahia, 7 de Janeiro de 1644. M. de Montalvao. (Seguem-se uma carta de Montalvao datada de 2 de Margo de |641, e outra de Mauricio de 42 do mesmo mez. N§&o as reproduzimos, porque se en- contram a pgs. 155 e 156 da Hist. das Lutas dos Hol. no Br., 1 edic.) * Ao conde de Nassau.- Depois de partida a néo, em que dei conta a V. Exc., como S, M. orde- nou queeu deixasse este governo e me fosse a Por tugal, chegou esse bareo, e o trombeta que nelle velo trouxe uma carta de V. Exc. para mim, que deu aos senhores governadores, a que elles devem de responder; e sé me chegou que V. Exc. se queixa de mim, mas eu creio que, tornando V. Exc. a exeminar o fundamento da sua queixa, jul- gard que era mui féra de que lhe. eu merecia. Com o rigor do tempo nao tive logar até agora- ,para partir, o que farei logo que estiver mais so- 52 REV. DO J » ARCH, E GEOGR. PERN. cegado, ¢ hei de trabalhar muito por dar fundo de- fronte desse Recife, assim para que de mais perto mostrea V. Exc. o sentimento que me causou esta sua carta, como para pedir a V. Exc. uma memo- ria do que em que o hei de servir em Portugal, porque, ainda que as mudancas deste governo di- vertirdo esta nossa visinhanga, e o muito com que esperava servir a V. Exc., tambem se podera o tempo tornar a comporde maneira que, fore d’aqui, tenha eu muitas occasides de me desempenhar com V. Exe. C pintor fica acabando o retrato que V. Exc. Ihe ordenou fizesse, e creio que nado haverd tempo para me deixar outro, e assim pego a V. Exc. se sirva de lh’o mandar copiar, e de me fazer mercé mandar-m’o remetter por Flandres a Lisboa. Guar- de Deus, etc. Bahia, 13 de Maio de 1641. M. de Montalodo. ** Aos senhores governadores da Bahia.—O tenente general, Martim Ferreira, que envio a Vv. Ss. nesta néo, é digno de toda honra pela militar perseveranca e prudencia, com que aqui se houve comnosco em tio longa hospedagem no tempo que esteve fazendo a (a tencia) de refens a que foi mandado ; e me parece a mim que mais mereceu elle na tolerancia de tao prolixu detencdo do que si 9 fizera combatendo com alguma forga. Estimarei que Vv. Ss. assim 0 cophecam, e de toda a mercé que lhe fizerem me darei por empenhado pare 0 co- nhecer nas occasides do servicgo de Vv. Ss., & quem Deus guarde muitos annos. Mauricia, 22 de Junho de {641. Maurice, comte de Nassau. REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. 53 ** Ao M. de Montalvao.—A promiptidao e per- severanga militar, com queo tenente general, Mar- tim Ferreira, se-houve nesta assistencia e acto de refens.a que V. Exc. 0 mandou a este Pernambuco, foi tanta que, assim pelo merecimento della como pela amizade de tao prolixa hospedagem, me-sinto obrigado a pedir a V. Exc. 0 conheca por merece- dor de toda a honra, e da que V. Exe. lhe fizer para com S. M., farei eu grande estimagao, e ajuntarei ais mais mercés recebidas das maos de V. Exc., cuja pessoa Deus guarde muitos annos. Mauricia, 22 de Junho de 1644. Maurice, comte de Nassau. “* Ao conde de Nassau —A opinido de valido de V. Exc. 60 maior motivo para todos se valerem de mim, e eu, pot me conservar nella, nao pude négar esta carla‘a quem m‘a_pedio, que, por ser pessoa a quem devo obrigag ao, Ihe desejo todo o bom successo, e Como me affirmou que nas maos de V. Exe. estava, tambem eu lhe assegurei 0 favor. 0 caso é que, partindo d’aqui em companhia, das néos da India outra por nome Nossa Senhora da Conceigéo, de que era capitio Joao Lopes Faria foi tomada por navios de Hollanda na costa de An- gola, e levada a esse Recife, adonde me dizem esté a fazenda depositada até se julgar si foi tomada em tempo que se possa dar por presa; e porque fui informado que, quandu a tomaram, era depois de publicadas as pazes (néo se culpando_nisto a quem a tomou, puis nao sabia do estado das cou- sas), pego a V. Exc. seja servido, por me fazer mercé, favorecer o livramento deste navio e fazen- das delle, e em caso que haja nisto algum’ incon- Veniente forcoso que n&éo dé logar a que V. Exc Ihe faca este favor, pelo. menos Pala V. Exc. por bem de ordenar que se nao disponha da fazenda SSR armenian ennnnennmceasnnnnmn mann names seensehuurnpethaencmacinsne sawn Ba REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. alé vir a resolucéo de Hollanda, e toda a mercé que V. Exc. fizer aos que procurarem esta causa seré de grande estimagao para mim, € eu procura- rei servir a V. Exc. em toda a occasiéo que,se of- ferecer, para 0 que sempre me achard V. Exc. tao prompto como devo, ao reconhecimento de minhas obrigacdes. Guarde Deus, etc. Lisboa, 12 de Novembro de 164. M. de Montaivéo. ** Ao conde Mauricio.—Vim tio obrigado 4 mercé que recebi de V. Exc., em quanto fui vice- rei nesse Brazil, que nao quiz que passasse esta caravela, sem tocar esse porto do Recife para signi- ficar a V. Exc. que cheguei a esta cidade com boa saude, e que me fez S. M., que Deus guarde, a mercé que Ihe mereco por minhas qualidades e servicos, occupando-me nas cousas de maior im- portancia de sen servigo, como sao as de sua fa- zenda, aprestacéo de todas suas armadas e con- quistas, com logar no governo e Concelho de Es- tado,ea mercé de que fiz_mais estimacac foi no- meat ao Principe nosso Senhor por coronel da nobreza deste Reino, e fazer-me seu tenente ; e porque sei que ha V Exc. de estimar estas novas, por serem de um tao grande seu servidor, lh’as quiz mandar e juntamente para obrigar a V. Exc. a que me mande muitas suas acompanhadas de occasides de seu servico, estandy certo que me em- pregarei nelle com mui particular gosto | Com esta occasiio nado quero deixar de dizer a V. Exc. 0 sentimento que S. M. e todo este Reino tem de ver que, em tempo que com tao urgentes causas se tratava de lornar este Reino 4 antiga amizade que sempre teve com os illustres Estedos da Hollanda, e quando se juntavam suas armadas. eas de Franca a ajudar a couservagio deste Rei- REV. DO INST. ARCH. EGEOGR. PERN. 55 a no, fossem por outra parte a occupar nossas coh- quistas. Bem cuido eu que néo teve V. Exe. parte em materia que tanto tem escandalisado o mundo. etambem creio que faré o que devea seu illustre sangue com lembrar e persuadir aos Senhores ‘do Governo da one emendem acgéo tao injusta, como a que se tem feito. 7 AS. M., que Deus guarde, representei o modo em que iames correndo, e affirmo a V, Exc. que lhe esta mui obrigado, ecom grande desejo de que V. Exc. tenha a mor parte do governo de suas ar- mas; e iamos tratando deste particular, quando chegou a.nova da jornada que o tenente Hender- son fez a Angola. V. Exc. me diga si 6 servido que eu vA conti- nuando esta pratica, porque entendo seré de muita importancia a V. Exc, ea seus servidores. O Reino tem um pé de guerra bem formado, e temos as fronteiras bem guarnecidas e providas, e eu vou pondo as cousas do mar em mui bom estado, que sdo as novas que posso dara V. Exc., e pedir-lhe que, pois a paz esta celebrada por dez annos, es- creva a Henderson, accommode as cousas de ma- ueira que nos nao obrigue a desfazer o que esta feito neste particular, e espero que em tudo o que toca a esse Brazil faga V. Exc. 0 mesmo por cre- dito de sua opiniao, e por ter mais obrigado a S. M. eatodo este Reino. Guarde Deus, etc. Lisboa, 12 de Marco de 1642. (I) M. de Montalvéo. * (1) Esta carta seencontra 4 pag. 162 da Hist das Luias.dos aaah a com ee jue nae ter sido conrigi- . arta authentica, tal como foi, redigida pelo Marquez de Monlalvao, 6a que acima fica. Biss i Nv da R. 56 REV, DO INST ARCH. £ GEQGR. PERN * Ao mesmo.—Todos os que sabem a muita mercé que V. Exc. me faz e de nossa boa corres- pondencia se valem de mim, e assim o fazem agora o padre frei Joao da Cruz, primo de Gongalo Novo de Lira, a quem me dizem que V. Exc. fuvorece, e frei Francisco de 8. André, seu companheiro, que ambos passam a esse Estado com passaporte de S.M. ; € porque a maior conflanca que leva para y. Exc. lhe por os olhos, e os amparar, como es- pero de sua benignidade, é esta minha carta, peco a V. Exe. que, por me fazer mercé, lhe mostre tao boa vontade, que vejam estes religiosos quanto ihe aproveitou a minha intercessdo, e eu a muita opiniao que gréngeo em me terem por tao grande servidor de V. Exc., a quem Deus guarde muitos annos. . Lisboa, 14 de Marco de 1642. M. de Montaleao. ** Ao M. de Montalvao.—Supposto que a resti- tuigdéo de V. Exc. nao foi para mim cousa nova ou nao esperada, pela-certeza_ que tenho da_ pruden- cia e acertadas acgées de V. Exc., comtudo havia eu sentido tanto a molestia que V. Exc. padeceria entretanto na reclusdo, que lhe confesso foi egual o gosto da nova da restituicéio a pena que havia recebido ; e disto esperava que V. Exc, me desse logo o parabern, porém sem isto o tomo eu, pois nao cabe o dar-se-lhe a V. Exc. de cousa que, a meu ver, por muito certa, néo alterou oestado nem a opinido de V. Exc, ; mas de todo o modo é bem qué seus servidores nos alegremos com V. Exc. e Ihe ajudemos a festejar o haver querido S. M. tanto en da importancia que tem na pessoa de - Exe. Logo que aqui cheguei, flza V. Exc. sabedor de que me tinha mais perto mui a seu servigo, escre- GEOGR, PERN vendo-lhe pelo padre frei Raphael, que veio em mi- nha companhia, e desejo saber si foi aportar por 14 4 presenga de V. Exc. Depois recebi do Brazil, em umas ndos que de ld vieram, uma de V. Exc. de 30 de Abri] de 4644 com duas copias de duas de 20 de Julho de 1643, e com ellas a mereé costumada’ que sempre recebi de V. Exc., da qual aqui de Hol- landa Ihe torno a confessar ou retificar meu empe- nho, como fazia do Brazil, porque a memoria dos muitos em que estou para com V. Exc. é sempre em mim tao viva, como em V. Exc. a continuagao com que Os vae cada vez mais multiplicando. Dos particulares que V. Exc. me trata n’uma das copias de 20 de Julho de 1643 nao sei dizer a V. Exe. cutra cousa gue haver sempre estado prestes a seu servigo, e obrigado a muita vontade que confesso em V. Exc. para me occasionar gran- des vantagens, e com egual inclinacéo aos pro- gressos desse Reino, observando sempre a obri- gacao natural que devo a estes Estados, Nenhuma das cousas que V. Exc. me aponta, vi aqui tratar, e 860 faz embaixador dos negocios da India. Os Senhores Estados Geraes eS. Alteza me promoveram, pouco tempo depois de chegado, a lenenle general da cavallaria destes Estados, e-a governador da praca e cidade de Wesel, sem me deixarem levar alguns mezes de ocio que entendia vinha buscar, _ Em toda a parte e logar me tem V. Exc. mui feito a seu servico, cuja pessoa Deus guarde mui- tos annos. Haya, 2 de Janeiro de 1645. Maurice, comte de Nassau. * Por proviso d’el-rei de Hespanha em tempo que possuia o Estado do Brazil, foi ordenado que no tocante as cobrangas por via de juizo aue sé fa- 58 REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. ziam contra os moradores, senhores de engenho e lavradores, nao se lhes tomasse nada de suas fa- bricas,nem selhes fazia separacao em partes del- las por respeito das notaveis perdas que resulta- vam, desannexando-se das fazendas o meneio-del- las, e s6 se fazia execucdéo nas fazendas por ar- rematacao das safras, isto emquanto o acredor nao egualava seu debito ao valor de toda a fazenda do devedor ; assim o declaro ser costume e registo de provisao, e as mais pessoas assignadas. Hoje, 1) de Dezembro de 1642. Estavam assignados o Dr. Manoel Barbosa da Silva, Felipe Paes, Balthasar Gonsalves Moreno, Francisco Barbosa Nunes, Luis Bras Pereira, Fernéo Soares da Cunha, Fernao d@Olanda, Joao Pimenta, Augusto Lopes de Moura. ** Sendo advogado em a villa de Olinda, vi ob- servar nao se fazer penhora nem executar em os escravos do meneio dos partidos de cannas aos lavradores dellas, e assim tambem se guardava nos escrovos e mais fabrica dos engenhos, porque em favor da lavoura e agricultura das cannas que éa que nesta terra ha, ede que depende a conservacio de todos os moradores, se lhe aplicava a estes bens todos os privilegios que o dircito concede aos bois de arado @ instrumentos rusticos da lavoura. E por elles nao havia execugéo nos ditos bens, nem por dividas do ‘o real nem de particulares, ex- cepto nado tendo os condemnados outros bens, por- que se fazia execugio tambem nelles. E neste caso vi por sentenga dada na cidade da Bahia, na Rela- ¢ao que ahi esteve, mandarem que se fizesse pri- meio execugdo em umas dividas que nomeou o condemnado, por cujo respeito se ficou guardando se admiltisse a execucdo nesta terceira especie de bens, que sao dividas e accdes aptes de se fazer nos escravos e mais bens da lavoura das cannas. E quando se chegava a fazer execugdéo em enge- REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. 59 nhos, néo se desmembrava delles a fabrica e pecas com que elles mofam, porque se reputavam por corpo mistico, e ndo se lhe mandavam tirar as partes integrantes delles par nao perecer. E as- sim se vendia todo incorporado ou arrendava, con- forme a quantidade das dividas, e porque muitas vezes succedia ser a divida pequena, neste caso, ne propter ces aliennm modicum possessio magna dis- trahatur, ficava em arbitrio do Juiz o dispor sobre isso, mandando vender ou arrendar, o que a meu parecer se fundava na doutrina referida por: Me- noch. de arbitr.—vide lb. 2, centuria 2, casu 182, n.° 34, cum duobus sequentibus, e casu 183, n.° 24 usque ad 26. E sempre sem damno consideravel se favoreceu mais a conservagdo da lavoura e en- genhos. Isso vi se praticar e por verdade fiz este. Recife em 18 de Marco de 1643. Antonio Pereira. * Aos Illustres Senhores do Concelho de Zelan dia.—Illustrissimos Senhores. Notorio deve ser a Vv. Ss. o que de sua parte fez o capiléo Carlos Torlon na conquista deste Estado do Brazil, pelo que mui justamente pudera esperar mui grandes Premios, mas em logar delles Ihe permitte sua for- tuna o castigo de ser desterrado de sua casa e fa- zeuda em que vivia casado comigo, sem mais ouea que a infermagaéo que quizeram der alguns que lhe eram pouco affectos, e como o sentimento de sua falta me toca mais a mim (?).......« pego humilde- mente de mercé a Vs. Ss. se sirvam querer favo~ recer Sua causa, pera que se possa vir pera sua casa e fazenda, onde podera ser.de utilidade sua pessoa e exemplo:-de acharem muitos. servi¢os.e, tesicssestiesemtatmnenn 60 REY. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN, buscar o emprro de Vv. Ss., cujas illustrissimas pessoas guarde Deus. Pernambuco, 27 de Agosto de 1837. (1) * Aos mui nobres Sexhores do Supremo Conce- Iho no Estado de Pernambuco. — Tenho noticias certas que os senhores directores de Angola tratam ao governador Pedro Cesar de Menezes com tanto aperto, que nao sé se falta 4 decencia’e policia, com que os Senhores Estados costumam tralar os pri-’ sioneiros de sua qualidade e posto, mas ainda se passa a termos de piedade. E supposto que de Vs. Ss. tenho entendido que 0 governo de Angola esta separado do dessas capitanias, o justo sentimento que este excesso merece me obriga a recorrer a V. Ss. sem embargo desta declaracdo, para que pelos meios que fér possivel se sirvam lembrar aos Se- nhores Directores que nem o governador Pedro Ce- sar Ihes merece castigo pela culpa de muito confi- ado, nem fica bem correspondida a vontade com (1) Esta caria é de D. Anna Paes que na mesma data diri- gio outra aos Estados Gerves. Na acta da s dos Estados Geri Anna Paes, mulhe em Pernambuco a Tourlon, por t i 10 s Novembro de sido recebida uma ¢ ; apitio Carlos ‘Tourlon, escripia de Agosto de mesmo anno, dizendo que corrida no desagrado do Conde Mauricio, foi enviedo para a Hollanda, ficando ella em Pernambuco mui afflicia pe aust marido, epedindo que Tourlon fosse restiluido a sua casa ¢ fazenda Ouvidosos membros dos Estados Geraes que, como d sées da Assembléa dos Dezenove, e declarando elles que alli na- da constava contra ‘Tourlon, resolveram os Estados Geraes que fosse permitlido a ‘Tourlon vollar a Pernambuco como particu~ ¢ para tratar dos seus negocios, salvo si, depois da dissolu- Gao day assembléa, se verifi ser elle culpado em algu- ma cousa. Da acta do Supremo Concelho do Brazil d 1637 consta tambem que o conde the commni teve para por em seguranga Carlos Tourlon, ¢ da-N. da R, de Margo, de razbes que ‘apitéio da guar- B_ REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN, 61 Sa LEDER que S. M. pretende continuar a allianga, que sempre os senhores Reis, seus predecessores, tiveram com os Senhores Estados, e que é forca que estes aviso& se recebam com grande estranheza no mes- mo tempo, em que S. M. me manda corresponder neste Estado com a benevolencia devida & confianga com que se acha, que eu espero ver em Vs. Ss. mui assegurada nesta occasido, e nas mais que se offerecerem, como da minha parte procurarei em tu- do o que tocar a meu logare pessoa, que sempre €s- timarei empregar no servico de Vs. Ss., a quem Deus guarde, Bahia 13 de Dezembro de. 1643. Antonio Telles da Silva. “Ao Exm. Sr. Conde de Nassau. Emquanto o tempo me manda occasido paru as demonstra- goes com que desejo servir a V. Exc., devo ao me- nos ndo faltar ao cuidado de procurar as boas no- vas de sua saude, que é o primeiro intento desta missdo, das quaes farei a estima que mere-, cem, quando Y, Exe. se sirva de mandar-me as que espero, Aos Senhores do Supremo Concelho dou as noticias que tenho do mau tratamento que em An- golo se dé ao governader Pedro Cesar de Menezes, gue em tudo é muito contrario ao que se deve nao 86 a0 seu logar e pessoa, mas ainda a prisionei- ros. E comono animo de V, Exc. é t&o natural a justesa e a clemencia, espero que pelo modo que for possivel se servira V. Exc, de advertir aos Se- nhores Directores de Angola a obrigagdo que tem, € as Causas que devem respeitar para moderar seu rigor, que nao refiro por muite conhecidas. E posto que o governo de Angola nao esteja subordi- nado a V. Exc. (como V. Exe. me ha dito), confi que resulte a mesma obediencia do respeito. que sé 62 REV. DO INST. ARCH. EGEOGR. PERN, nn deve ao parecer e advertencias que V. Exc, for ser- vido fazer neste particular, ficando eu obrigado a empregar-me no servico de V. Exc. com a vonta- de que devo. Guarde deus, ete. Bahia 13 de Dezembro de 1643. Antonio Telles da Silva. * D. Joao por Graca de Deus rei de Portugal e dos Algarves, etc. Faco saber aos muito prudentes, honorificos, discretos e estimados assisientes com a pessoa do Conde de Nassau que do padre frei Estevao de Je- sus, que veio a esta corte a tratar negocios seus, entendi 0 bom termo, com que eram tratados os catholicos que se acham nas capitanias desse dis- tricto, de que recebi tao particular satis‘acéo que me parecee manifestal-a com esta carta a tao pru- dentes ministros, significando-lhes gue em reco- nhecimento desta accaéo (que thes rogo e encom- mendo muito queiram continuar com as ventagens que merece esta offerta), me acharao sempre com muilo boa vontade para tudo 0 que convier ao com- mum e particular de cada um delles. Escripta em Lisboa a [8 de Janeiro de 1644. il-Rei. ** Fragmento da copia ou minuta de uma carte sem endereco, data nem assignatura. «Nem ¢a menor cousa que devemos oppor contra a avessa correspondencia de V. S. 0 receber os foragidos é salleadores que fogem des- ta nossa jurisdicedo para sua sombra e acolheita, como para parte inimiga, como fez Thomé Delga- ,do:.com o.seu barco e os que nelle foram fugidos. ‘REV. DO INST. ARCH. E GEOGR, PERN. 63 nner com a fazenda. alheia, e agora Domingos:da Rocha, de Serinhaem, com um barco de assucares e mui- tos portuguezes devedores aqui, que vao todos le- vantados com o alheio para o Rio de Janeiro, mal- dade digna dé grande castigo, com e qual ousadia se levantam aqui muitos de todas as nagées, rou- bando e matando homens, e levando escravos, e levou accorrendo para 14, como faziam no: tempo de toda a hoslilidade, devendo V. S. agora man- dar-nol-os logo aqui presos, como assentamos com os seus delegados, enema resposta dos assen- tes da boa correspondencia (que com elles. aqui tratamos e tomamos) esperando-a, a tivemos até hoje de V. S., e si ao principio nos punha esta fal- ta somente em admiracéo, hoje vemos que o foi das consequencias que experimentamos.» ** Serenissimo Principe eSenhor.—Da tempe- rancga dos ares procede a fertilidade das terras, eda clemencia dos principes o augmento e tran- quillidade dos povos ; porém com rezéo podemos dizer gue o tempo nos lem mostrado acontecer isto pelo contrario na edade dos primeiros tres annos antes da vinda de V, Exc. Nao desculpo, Senhor, aos moradores ¢ larga- rem suas casas e fazendas com tao pouca conside- racdo eerrado conselho, como o mesmo tempo tem mostrado, sem pera isso poderem allegar rezéo alguma que os desculpe, nem que com isso livras-_ sem os que cd ficaram, porque pela minha causa padeceram trabalhos e affrontas ; e posto queeu (fazia) como preso companhia aos mais sem liber- dade.. ........de ma(neira) que a tivesse pera’ tornar a minha-casa, conhecendo quaes poderiam: . ser os fins de téo errados principios,; 6 retirado a’. minha casa pela licenca que jé d’antes:tinha dos... senhores. do. governo, . me fui,accordar.com elles oa 64 REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. nas cousas mais essenciaes de nossa allianga que me deram por escripto. Em_rezao deste accordo, Senhor, procurei persuadir por minhas cartas a todos os moradores. que se tinham retirado, aos que ellas puderam alcangar, se retirassem ds suas casas e fazendas pera livremente as gosarem e gosarem sua reli- giao, conforme o dito accordo é elles o fizeram, confiando mais de minhas palavras que das espe- rancas de se poderem cumprir cousas prometti- das, posto que dignas de nos.....: com ellas, se- gundo o exemplo que temos dos que escreveram dizendo que a palavra é um tronco tao verdadeiro e forcgoso que até aos inimigos ha de guardara pro-~ messa. Soffremos comtudo, Senhor, este jugo de mal contentes com os encargos de quem estd sujeito, sentindo comtudo o damno deiles, e muito mais por conhecermos serem sem ordem dos que tinham poder pera castigar culpas, quando as houvera 3e si os damnos que padecemos alcangaram a mui- tos, a mim em particular mais que a todos, como” preso esbulhado de meus bens, sem ordem nem culpa alguma, nem presumpecao della, nem (cau- sa) que a que quiz odirector Emses (Ypo Eyssens), parecendo lhe que com scmelhante rigor me po- dia obrigar a lhe dar por mulher uma sobrinha que me havia pedido, ¢ eu lle havia negado, por estar em poder de seus pais. a Durou, Senhor, esta priséo até 4 vinda de V. Exc., de quem recebi o fructo de minha liberdade e fazenda, que nao logrei emquanto durou minha prisdo, e em que recebi notavel perda e sobretudo ade um irmdo morto em poder de g(ente) selva- gem, pessoa de mais reputucéo e de mais idade que a minha ; tudo isto sem ordem dos que a ti- nham pera semelhantes castigos, quando houvera culpas que o mereceram. No que fica dito, Senhor, se tem mostrado quaes foram o proccdimento da primeira edade, ¢ DO INST, ARGH GR PERN. 65 i quaes vieram a ser com a vinda de V. Exe.; coma qual néo somente cessaram estesdamnos, mais ainda até perdoaram culpas que mereciam ser cas- tigadas, de maneira que geralmente podemos dizer, como cada hora dizemos—si faltéra'a vinda de V. Exc., jd nao houvera portuguezes que tivessem vida_nem fazenda, i E como em nés, Senhor, ha este conhecimento, por que sempre estaremos obrigados a dar agrade cimentos, temos razdo de sentir o damno que po- demos receber com 0 que se publica de V. Exc., que jé nos esté pondo em grande tristeza e desam— paro, quando assi acontega, e sia, ida é por falta de alimentos da Companhia, cousa é que os povos po- dem muito bem remediar com téo larga vontade,: como a que V. Exc. sempre teve e tem pera’ nos emparar e fazer mercés. Pelo que peco a V. Exe. mui encarecidamente em nome de todos osmoradores destas capitanias, em especial da Parahyba, seja por bem desistir de sue ida, pois nao somente serve de emparo de todos, mas ainda de augmentar os bens e rendas’, da Companhia e dos Estados da Hollanda. O que mais temos pera pedir e peco em nome de todos é materia de muita consideracao, pois della pende néo somente o augmento da terra~e seus habitadores destas capitanias e mercadores, como da mesma Companhia,.e estas, Senhor, con- sistem em tres cousas: a 4* no favor que os Se- nhores do Supremo Concelho podem dar aos ditos moradores em diversidade de cousas ; a 2* em ces- sarem os interesses, que tem posto a todos em mi- seravel estado ; a 3° ndo se fazerem execugdes de escravos e bois, porque, si sobre isto se fizer um verdadeiro exame, se .acharé que de muito mais consideragdo serd aos credores alimentarem Seus devedores do que sera fazerem execugéo em seus bens, cousa que jé em outro tempo aconteceu. commercio nao péde deixar de faltar, faltan- do a lavoura, ¢ 0 tempo tem:.bem mostrado ‘este 9 66 REV, DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. desengano, porque se nao acharé testemunho de pessoa que diga, nem se accorde do que vemos de presente na falta e carestia de mantimentos, e que dura ha tio largo tempo, nem que si visse estarem os engenhas pejados em tal tempo; tudo isto, Se nhor, vem a ser em damno geral dos nomeados, e faltando o remedio das cousas apontadas, se per- derd tudo, pelo que de novo peco a V. Exc. e mais Senhores do Supremo Concelho queiram remediar isto de modo que todos alcancem os bens que te- mos reséio de desejar. 8 de Novembro de 1643. Duarte Gomes da Silveira. ** Ao Concelho Supremo.—Justamente me pre- vinem Vv. Ss. 0 allivio que posso ter na ausencia do senhor conde de Nassau, com me darem a en- tender a successio de seu governo nas pessoas de Vv. Ss., do qual devemos eu eos moradores dessa capitania esperar sempre os mesmos acertos, € a mesina benevolencia que experimentamos até aqui em S. Exc. 0 senhor conde de Nassau, para que reconheca sempre nesta nossa correspondencia a obrigacdo que me fica de cuidadosamente a procu- rar, como 0 farei em as occasides que se offerece- rem, € em todas as que Vv. Ss. se servirem man- dar-ine, confiando receber a mercé que Vv. Ss. me asseguram, ¢ de seu animo devo esperar. Guarde Deus, etc. Bahia, 1 de Abril de 1644. Antonio Telles da Siloa. ** Nobilissimos, espectatissimos ¢ prudentissi- © mos Dezenove Senhores.—Posto que algumas ne- REV. DO INST. ARCH. E GEOGR, PERN. 67 cessidades nos tem constrangido a pedir a Vv. Ss., como a nossos superiores, 0 remedio dellas, 0 nao pedimos porque em parte as remediaram sempre os Senhores que aqui nos governam, € porque nado achamos 0 mesmo remedio na que de presente se nos offerece, os escabinos e pessoas das mais no- bres neste povo, humilhados e sob o respeito devi do & nobilissima presenga de Vv. Ss., Ih’o pedi- mos nesta occasiao em que nos parece convem, e as consideragdes que nos obrigam e causam. Depois que por Vv. Ss. foram estas capitanias vencidas, esta foi governada por directores, que veramente procederam de tal maneira que nos obrigaram a que-os amassemos, e |hes obedeces- semos reciprocamente, e assi temos continuado até agora ; tempo em que os Senhores do Supre- mo Concelho mandsram retirar para o Recife ao director Gisberto de With, que actualmente esta presidindo, e néo entendemos queem seu logar po- nham outro que a governe ea este povo, que é grande, e que dista do de Pernambuco 25 ou 30 le- guas, aonde se nao pode ir com a facilidade que infinitas vezes as oppressdes succedem obrigar a cada qual de nés, e algumas nao soffrem dilacao os riscos dellas; e tambem nao podemos deixar de sentir a ausencia do dito director, que nao sé como tal nos assistio, mas como intimo amigo, acudindo em todo o tempo e horas a nossos des- pachos e requerimentos, tratando-nos com affavel cortezia, remediando nossas afflicc6es,zelando nos- sos bens, conservando a justica e boa policia, e fi- nalmente unindo e inclinando a si os animos de to- dos nés, epondo esta capitaniajem mais quietagéo & paz do que nunca esteve; eficitos que ndo pode- mos deixar. de sentir a falta delles, e que de boa vontade nos obrigam ao desejar por superior pera sempre ou algum dilatado termo, no que V. Ss. nos faréo singular mercé. E jé nos contentaremos com que lhe, succedesse outra pessoa que conhecamos bor superior, porque sem elle. parece nao pode ha- 68 REY. DO IN ARCH GEOGR, PERN, ver conformidade em republica alguma, e estamos antevendo mil descordias, ou nossa ruina ¢au- sada da desinvoltura dos militares contra os popu- lares, ecada qual ha de querer dominar, e sempre © pobre ha de ficar succumbente, e pera havérmos de recorrer 6 Camera de Justiga, de mais de que seus poderes sio limitados, difficilmente reme- deard o damno causado dos salteadores brancos ¢ pretos, ea diversos mil que cada hora se offere- cem, que sé pode remedear a autoridade de um director, e ainda que o poder de dita Camera se estenda, como os mais dos moradores nestas par- tes vivem em suas fazendas apartadas umas das outras, e distantes da cidade, es6 se ajuntam nos dias que tem limitado pera as audiencias, e os mi- litares ndo quererdo obedecer, e commumente sao insolentes, por mais que seus officiaes os refreiem ; quem ha de ser o que ha de supprir a semelhantes faltas, si néo for um, ajustado e perito no governo, director ? Mui nobres Senhores, consideracées sao estas que sem exageracao fizemos, a que Vv. Ss. sem di- lagéo devem deferir com o remedio, e si o virmos, viveremos satisfeilos, e confiados em gue somos sugeitos a quem nos é propicio, e continuaremos em informara Vv. Ss. dos mais particuleres, assi dos que necessilarmos como dos que nos parecerem uteis ao andamento do bem da ampla general au- torisada Companhia, a quem Deus dé sempre feli- ces successos. Frederica da Parahyba, 23 de Junho de 1644. Affecios subditos de Vv. Ss. : Miguel van der Venne, escabino presidente, eleitor ; Thomé Leitio, escabino, eleitor ; Joao van Ool, escabino, senhor de engenho ; André Dias de Figueiredo, escabino, senhor de dous engenhos ; Gaspar do.Valle, escabino, eleitor ; Joao Goute- ries, escabino ; Ferndo Rodrigues de Bulhées, se- REV. DO INST. ARCH, E GEOGR. PERN: 6 nr nnanannraeanninninneneetnsmnsnsnnnaminnetin cretario du camara, eleitor ; Etmondo Fosse, vice- secretario ; Gongalo. maa de Oliveira, notario _pu- blico; Christovao Dias de Oliveira, mercador; Joao Nunes dos Passos, mereador; Jodo Tibur, merca- dor; Pieter Tonneman, mercador; Samuel Gerard, eleitor e administrador da:camara dos orphaos: ; Francisco de Aranzedo, idem; Fernaéo de Moraes d’Alto, administrador da camara dos orphaos; An« tonio Correia de Valadares, senhor de engenho ; Jorge Homem Pinto, eleitor, senhor de 6 enge- nhos ; Joao de Souto, eleitor, senhor de engenho ; Hyeromino Cadena, senhor de engenho ; Antonio Barbalho. Bezerra, senhor de engenho; Joannes Lermitte, eleitor ; Edward van Muinickiever, ‘elei- tor, mercador ; Joao Cornelio .van Delman, eleitor ; Joseph Falc&o de Souza, cidadaéo 3 Jodo Barbosa de Mesquite, lavrador de cannas; M. Jodo Tavares de. atos, * Ao Senhor conde de Nassau ea Vv. Ss. re: presentei em outra occasigo a indecencia grande com que era tratado em Angola o governador -Pe- ‘dro Cesur de Menezes, a que Vv. Ss. se servirao de me responder que logo avisariam aos senhores di- rectores de Loanda 0 tivessem com o devido res- peito a sua qualidade e merecimento. E nao tenho até hoje noticias de estar jé alliviado da prisdoe aperto, em que‘o havia a primeira inhumanidade, € porque crelo que com as advertencias de Vv. Ss. haveraé j4 mudado de fortuna, -peco a Vv. Ss, me communiquem as novas que de sua pessoa tive- rem, porque, quando nao sejam as que devo espe- rar do procedimento de ministros tao politicos, co- mo os que me persuado haver naquelle governo, 0 manifeste_a S. M. pera’ que.com os mui altos e doderosos Estados'se trate do melhoramento que Solicito a-este fidalgo. : 70 REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. en enrennnnnnnrnennnnnnmnennnaeaensn naan Ao tenente de mestre de campo general, André Vidal de Negreiros, tenho concedido licenga pera se passar ao reino de Portugal a servir a S. M. nas fronteiras pela ociosidade em que se acha no so- cego deste Estado, e sabendo que enviava eu estes cartas, me pedio que o quizesse fazer portador dellas pela conveniencia que ihe resultava de se poder com esta occasiao ir despedir e beijar a mao @ seus pais, que tem na cidade da Parahyba, e por- que € tao justa a peticado, me parecen fazer-Ihe este favor debaixo da dependencia de Vy. Ss. 0 quere- rem permittir, 0 que estimarei muito por nao ficar mallogrando a viagem, nem eu o desejo de Ihe prester esta minha intercessao, que tenho por mui ibrada na boa amisade e nobre correspondencia de Vv. Ss., que nunca faltarei em tudo o que Vv. Ss. seservirem mandar-me. Guarde Nosso Senhor, etc. Bahia, 14 de Agosto de 1644. Antono Telles da Suva. * Ao Supremo Concelho—Vindo o sargento- mor Martim van Elst a despedir-se de mim, em nome do Exm.° Sr. Conde de Nassau, Ihe encom- mendou o rvm.° padre frei Ignacio de S Bento, re- ligioso da mesma ordem, que esta carta ha de dar a V. Ss., alcancasse licenga para se poderem pas- sar a esta cidade umas sobrinhas suas, que tem hessa capitania, padecendo algumas incommodi- , dades ; ¢ desenganado de nao haver effeito por esta inlerposicio, me pedio agor: licenga para nesta embarcacio poder ir pessoalmente a solicitar da benevolencia de V. Ss..o favor de as poder trazer comsigo. E lembrando-me eu que a todas as pes- Soas que 0 Sr. conde Nassau quiz mandar ir desta terra pera e: nesta ultima nao, as deixei ir livre- mente, me nado atrevia negar-lhe a disposigéo com que de minha parte podia concorrer para esta accao REV. DO INST. ARGH. E GEOGR. PERN. 74 tne e lao piedosa, assegurando-me a egualdade com que V. Ss. devem querer substituira S, Exe na-corres- pondencia devida a nossa visinhancga € amisade, enesta fé estimarei que ¥.Ss. se sirvam de lhe dar essa permisséo, nao a encentrando por algu- ma via ou as_resdes d’Estaudo desse governo, ou algumas particulares do gosto de V. Ss., porque esse 6 pera mim o preceito mais poderoso, eo mais suave seré mandar-me V. Ss. suas occasides que desejo merecer em seu servico. Guarde Nos- so Senhora V.Ss. muitos annos. Bahia i4de Agosto de 1644, Antonio Telles da Silva, P. S. A este porto chegou um navio de Lis- boa que trouxe as duas cartas que serao com esta, que S. M., que Deus guarde, foi servido mandar escrever, uma ao Exm.° Snr. conde de Nassau, e outraa V. Ss., remettendo-m’as ambas a mim, pera queas enviasse, por haver fallecido o padre frei Es- tevao de Jesus, que os trazia, e supposto que tenho por sem duvida que ja S. Exc. deve ser partido pera Hollanda, como-me tinha avisado, comtudo, considerando que'se podia dilatar mais a jornada, ue quiz ficar com o exemplo de faltar em’ lh’a re- metter. * Ao Supremo Concelho.—Os Snrs. Gisberto de Witth do Concelho de Justiga, e Theodoro de Hoochstraten, governador dos soldados no cabo de S. Agostinho, deputados de V. Ss., ¢ pessoas de cujos merecimentos e qualidade fiz toda a esti- macao devida, me deram a carta de V. Ss.e pro- puzeram a materia a que V..Ss. os mandaram a esta Bahia. E supposto. que,eu'desejasse sempre 72 REV. 00 INST ARCH. & GEOGR. PERN vincular maiores obrigagdes ¢ correspondencia desta nossa boa visinhanga, comtudo me nao foi possivel dar-the outra resposta que aque serg presente a V. Ss., a quem estimarei. que queiram significar a experiencia qe. achardo em meu ani- mo, para o que tenham V. Ss. entendido, e se as. segurem que em tudo o que depender deste gover- no, estou muito prompto para fazer o que devo, assi em cumprimento da verdadeira fé, com que el-rei meu senhor me manda que observe a capi- tulagao das pazes, como pelo natural effeito, com que estimo a agradavel amisade de V. Ss., em cuja benevolencia espero merecer as occasides que me offerecerem de seu servico e gosto. Guarde N.S. etc. Bahia 19de Fevereiro de 1645. Antonio Telles da Silva. * Idem.—Vi as tres proposigées que compre- hendem o papel que V. Mes. me resentaram em nome dos mui nobres senhores do Supremo Con- celho, governadores em Pernambuco. EB havendo eu considerado com particular attengdo e desejado sempre com todo o affecto, que posso encarecer, estreitar cada vez mais a correspondencia e lhaneza desta nossa amisade e visinhanga, fico sentidissi- mo de se nao estenderem meus poderes a praticar: nem contrahir capitulacéo alguma sem particular € expressa ordem de S, M., el-rei, meu senhor. ‘as pera que os ditos senhores tenham entendido qudo deliberada tenho a vontade a solicitar todos os meios de complicar com maiores obrigegdes a benevolencia reciprova destes dous governos, da- rei logo conta a S. M. nestas primeiras embarca- ges que estéo para partir com copia das mesmas proposigées, para que com seus embaixedores se determine 0 effeito dellas com os muitos pederosos. Senhores Ordens Geraes. E estimarei eu que se REV. po INST. ARCH, —E Grocr. PERN. disponham de maneira que se figue consesuindo 0 qule sé pretende, eeu muitas ‘occasides: de mére- aed V. Ss. as que me quizerem dar ‘de set: sger_ fens ; ‘ Bahia 13 de Fevereiro de 1645," Antonio Telles da Silva. . Por ordem bem o tenha assim enten- ido bara dispor o que lhe melhor convier, com tal consideracio como sua de Vme., a quem adver- limos que estes senhores flamengos com suas traigdes ¢ aleivosias nos fi cram romper em armas, € requeremos aVme. o faca da mesma maneira 4 sangue « fogo, porque desta sorte 0 buscam, ¢ quando Vie. se etermine a vir seja com toda a brevidade, porque qualquer dilacéo poderd ser damnosa, eesta nos flea copiada em nosso. livro 82 REV. DO INST. ARCH. E GR. PERN, nr que em tao valente capitao é erro affirmar cimentos quando a rezio & tao clara, nos nao di- latamos mais, porque ficamos esperandc a Vme, com a casa da Virgem de Nazareth coberta pera nella todos exaltarmos o Santissimo Sacramento, cuja invocagao demos 4 fortaleza rendida, em que achamos breu e outras cousas que podem servir, Deus Guarde a Vme. Francisco Bravo se re- commenda a Vme. muito ¢ wos mais senhores, encare. Pontal 6 de Setembro de 1645. M. Soares Moreno. A. Vidal de Negreiros. *** Antonio Telles da Silva do concelho de guer- rade S.M., governador e capitiio general de mar é terra deste Estado do Brazil, (4) Em razio das sedigdes e motins levantados pelos moradores portuguezes da cap'tania de Per- hambuco, de que tive noticia por carta dos Senho- res governadores da mesm:z capitania por parte dos Estados Geraes, resolvi ajudar com toda a di- ligencia a remediar taes excessos, no s6 porque m’o pediram os referidos governadores, como para nao faltar 4 devida correspondencia e¢ boa amisa+ de, como me foi mui recommendado por S.-M. Ca- tholica, para o qual fim nomeei capitio a Jerony- mo Serrao de Paiva, que se regulara por estas in- strucgdes no commando dos navios e mais barces que lem a sua disposicéo. Tanto que partir @aqui, dirigira o seu curso para Pernambuco, e navegaré 20 ou 30 leguas afastado da costa nlé a altura de 10 gréos, onde brocurara descobrir terra e reconhecer as Alagoas; Sl, antes de chegar a essa altura, encontrar vento (1) Traduzida do Hollandez. REV. DO INST. ARCH, E GEOGR. PERN. 83 fresco para o sul, faré toda a dilligencia por nao passar a terra de noite, e, tendo-a reconheuido, trataraé de dar desembarque 4 gente, com aviso dos pilotos mais praticos, para maior seguranca em Una, Lagamar ou Tamandaré, que fica tres le- guas ao sul da ilha de S, Aleixo. Nao vindo a tomar os referidos portos, tomara o dos Fernambius (2) ou olagamar de Maracuipe, quedemora. (em branco) Jeguas ao norte da dita ilha de S. Aleixo 5%e si, tendo feito toda a necessaria dilligencia, nao pu- der tomar nenhum dos mencionados portos, bus- cara o das Gallinias, procurando em todo 0 caso desembarcar a gente entre Barra Grande e o porto das Gallinhas, com a recommendacao de que mui attentamente vigiaré que os navios ndo sejam des- viados dessas paragens por correntes ¢ ventos, € acontecendo ‘que 4 tarde ou 4 noite cheguem dian- teda Barra Grande langarao ancoras para traze- rem a terra sempre bem reconhecida. — Tendo desembarcado a gente ¢om as munigées de guerra, seguiré com os navios para o porto de Pernambuco, e entregaré a thinha carta aos. Se. nhores do Concelho Supremo, governadores dessa cupitania, remettendo-a logo que ahi chegar, E caso aconlega, o que Deus néo permitta, que‘um ou mais navio, por forca de correntes ou tempesta- de, desgarrem ou percani as ancoras e se afastem do porto, procurard com muito cuidado e diligen- cia, logo que acaimar o tempo, juntar-se de novo ho mesmo lugar diante do dito porto, e, continuan- do a tempestade por muito tempo, iré tomar. a ba- hia da Traicéo, onde se reunirao para assi junta- mente effectuar o seu intento. . A fiel execugéo desta minha ordem me obriga- ré a procurar adiantamento a todo aquelle que melhor se houver na observancia della, assim como nao deixarei tambem de castigar os infractores, como cumprir. E pois que os,casos s&o incertos e duvidosos, o que nesta nao for expresso, deixo 80 prudente arbitrio do capitio-mér Jeronymo Sér~ BG INST ARCH rao de Paiva, flando-me do seu bom comportamen- to, experiencia de tantos annos e de sea valor, que me 6 bem conhecido. Bahia 21 de Julho de 1645. 15) Anton‘o Telles da Siloa, Por ordem deS Exe. Bernardo Vieira Ravasco. *** A Serrio de Paiva. (2)—Na mesma tarde em que Vme partiu d‘aqui, chegou a S. Antonio Sal- vador Correia, e hontem entrou no porto. Com- quanto en tenha feito toda a diligencia para despa- chal-o quanto anies, elle nao poderdé sahir sendo amanha, pois que hoje nao é possivel partir. Si ndo levar toda a frota, irao pelo menos dez navios for- tes, com os quaes mais se pode contar para effe- ctuar a ordem que Ihe foi transmittida para descan- co desses senhores do Supremo Conselho. Assim que Vme., tendo primeiro e principalmente posto em terra a nossa infanteria, andard & capa e es- peral-o-ha na visinhanca da ilha de S. Aleixo du- rante este pouco tempo até ‘que elle chegue afim deirem juntamente para o Recife na conformida- de das instrucedes dadas a Vme., e que Vme. se- guird em tudo. Com esta vae a relacéo das mu- nigoes que cabem a sua frota afim de que Vme. tenha mais ou menos conhecimento dellas. Como este barco pertence ao numero dos que séo desti- nados para S. Vicente, deve elle voltar immedia- ‘Soypt), Na mesma data foi passado o acto de nomeagio de Serrio de Paiva para capilio-mor da frota que se deslinave a Pernambuco. (2) Traduzida do hollandez, ARCH. EGEOGR. PERN. — 85 REY. DO INS' tamente; Vmc,o despachard.com toda.apressa, fazendo por em terra primeiramente a pessoa que vae por capitao delle, Guarde Deus-a Vine. Bahia, 24 de Julho de 1645. Antonio Telles da Silva. *** Idem. (4)—Antonio Telles da Silva, depois de communicar que fez seguir Salvador Correia para o Recife, com cuju frota se juntariaa de Ser- rio de Paiva, accrescenia: “ « Como Salvador Correia é um general de S. M., conselheiro do seu Concelho Ultramarino, néo pude deixar, nesta occasiao, de preferil-o 4 dispo- sicdo, corm que puz a Vmc. como capitao-mor des- sa armada, desejando eu fazer a Vmc. general de uma muior. Assim, chegando elle, Yme. arriaré bandeira e fard igar ao mastareo uma bandeirola, eo mesmo fara o vice-almirante. _ « Tendo eu ordenado ao referido general que, occorrendo ahi algum caso em que tenha necessi- dade do avisado concellio dos mestres de campo Martim Soares Moreno e André Vidal, ‘para melhor. governo das duas frotas, com o vice-almirante e os mais capitées convovara os que Ihe parecer pe Vic. 0 obedeceré, e se regulard segundo o que for resolvido, como conflo de sua prudencia, ¢ no ae observaré Vc. o que nas suas instrucgées lhe recommendado. Guarde Deus, etc. Bahia 28 de Julho de 1645. » Antonio Telles da Silva. ““* A Salvador Correia(4)—Os coroneis e 0 capi- (1) Traduzida do hollandez. 86 REY. DO INST. ARC FOGR. PERN, tao mor da frota deram-me ici t a fi -me noticia da boa fort com que ahi chegaram : a gente foi posta em ten eget a marchar para ir apasiguar ag es que nessa capitania appareceram, felici. hee e esta que eu Ihes asseguro com a pro- eae pecs poet frota, do que entendo de- Pa prosperidade que se pd esej sepeaicne p q péde desejar nessa Por uma carav i ela que aqui chegou de Li rey iaeart i Sboa os carta, que vae junto, deS. M.,a quem Deus cage ae ao mais, nenhuma no- portancia. D. Catharina beij a de imp : iio a m muilas vezes. Guarde Deus a Ve. Bahia 17 de Agosto de 1645. ° Antonio Telles da Siloa, . .* Salvador Correia de Sa e Benevides. (1 ee ae envio muito saudar, $i ematene Serene i: es nesse Estado, houver nelle avisos pete * se haja por cerlo seri commettido dos ini Wasa aon ane vol-o requerer o governador pa ae da Silva, vos detereis nelle emquan- a aaieaa Paar ma eu de vés que sem ; ] areis, si houver causa pega. Escripta em Aleanta raaQd de Muto dees. Rei. Para F 7 Parva o general das frotas do Brazil, oe Sai i via ae a de Paiva, (2) Recebi a carta de i vin aS ste nul agradavel por saber da fe- noe ceaT oa jc, ¢ que a nossa infanteria fora op terra 5 pesa-me porém a sua queixa so- 4) Carta authographa (2) Traduzida do hallanden. REV. DOINST. ARCH E GEOGR. PERN. 87 bre a pouca marinhagem, pois me parecia que ha- via eu provido cada navio com os marinheiros que Ihe eram necessarios, Neste barco mando 30 que Vme. recebera, segundo a lista inclusa, de que temos aqui copia para que eu saiba, por avise de Vme. si falta alguem e castigar o que faltar, co- mo cumprir. Vme. destribuiré essa gente pelos navios que estiverem menos providos, e ordena- raé a todos os capities que facam pertinentemente mostra da sua gente, afim de que eu saiba com quantos cada em se acha, mandando-me Vme. de tudo listas para serem conferidascom a quota da gente destinada para cada navio,e nesta conformi- dade fazer eu castigar-os que severificarem que com asubita partida da frota ficaram em terra. O capitéo deste barco me referio que a mu- lher de Salvador Correia em sea galedo the disse- ra—provavelmente para que elle repetisse—queel- lesforam mandados asulcar o deserto do mar, 80 passo que eu, aqui descangado, aguardaria a hon- ra de restaurar-Pernarnbuco, dando com isto a en- tender que se querem,esquivar; eu nao creio que ella o tenha dito, mas tao excessivos foram os meios com que esse homem procurou escusar-se desta viagem, fazendo-a imposslvel, por mais que eu a facilitasse com a importancia do servigo de S. M.., e tal era a resolucao com que elle embarcou levando mulher e filhos, gue; comquanto eu néo creia que elle deixe de obedecer 4s minhas instru- ccdes, bem como a carta de S. M,, que agora lhe envio--todavia se péde tirard’ahi uma forte pre~ sumpeao para duvidar da sua boa disposigao, ¢ que elle ndéo quer ser presente a essa faccdo. E o vice-almirante de sua frota tanto parecia tel-o ercebido que se offereceo para fazer tudo'o que Ihe fosse ordenado; mosirei-Ihe a copia das instru- ccées de Salvador Correia celle se apartou de mim com a promessa de nao seguil-o, si Salvador Cor- reia_se fosse embora : Portanto, si Vmc. vir que Salvador Correia 88 REY. DO 1 ARCH. E GEOGR. PERN. rrr rrr ane quer pactir, em qualquer occasiao que seja, pro- teste immediatamente contra elle, declarando em nome de S. M. e no meu que por modo algum pode elle abandonar a frota de Vmec. em 40 impor. tante occasido, porquanto com as dnas frotas reu- nides poder-se-hia obter a pacificacéo que se pre- tende, e, indo-se elle embora, nao somente deixaria Vm. exposto ao perigo que Ihe pode sobrevir dos 8 navios hollandezes, que estado a vista de Vm., (sendo tambem) que eu nao BOSso crer, nem mes- mo por ém duvida o bom exito da faccado assegu- rado pelos galedes. Vm. apresentaré tambem esse protesto ao vice-almirante, mandando fazer escri- pturas authenticas delle, bem como da resposta e Mas suppondo que Salvador Correia—segundo as presumpcées e€ as anteriores demonstracées— resolva finalmeute ir-se embora, e 0 vice almirante falte 4 sua promessa, e considerando que, pelo poder com que os Hollandezes se acham no mar, seja de receiar que elles, des Sperados com a obra dos moradores, nio tenlam em attengéo o favor que eu Ihes facocom enviar para li essa frota sob o mando de Vm., e lalvez tentem fortuna eguol & que tiveram com o conde da Torre, tenho entendi- do advertir a Vm, que em tal caso communique com os mestres de campo, © resolva com elles 0 que for mais conveniente, ou bermanecer Vm. ahi eante do Recife até o fim da empresa, ou voltar com a frota para a Bahia, por terem conhecimento que 0 poder dos navios delles 6 maior de modo que OS nossos néo Ih es possam resistir, ¢ segundo o bom conselho e aviso gue derem a Vim., faréo que mais cumprir ao servico de S, M., reputacdo das nossas armas, e desempenho do dever que nos Corre, pois eu dou tudo bor mui bem confiado ao valor e prudencia de Vm., e henhum conselho REV. DOINST. ARCH, E GEOGR. PERN. 89 SanaRaRanRRRRRRRRRRRROREmaEanamenene ee EE posso dar a Vm. sobre casos futuros que ahi.oc- corram € 0 que mais convenha se faga, visto como os fundamentos e as rcumstancias dos mesmos casos nao me sao tio bem conhecidos como aos mestres de compo e a Vm. para tomar resolugéo acerca da conveniencia de voltar a frota para aqui ou ficar ahi na costa. : Do zelo de Vm.espero que neste materia se haverd como sempre, e segundo a confianca que tenho de suas obrigagées,-certo de que Vin. serd um dos mais interessados na honra de livrar a esses senhores, 0s. quaes espero ver nesse descan- co que eu thes proctiro. A ninguem Vm. deixard ver esta. Guarde Deus a Vm. Bahia, 17 de Agosto de 1645. Antonio Telles da Silva. P. S. Faco saber a Vm. que estou mui pre- occupado assim a respeito dessa frota, como: do Successo em terra, e si Deus nao conciliar. os mo- radores e us ‘Hollandezes, e nao forem as cousas dispostas a esse descanco e paz que-eu lhes desejo, é muitissimo necessario que Vm. me mande aviso immediatamente e quanto antes de tudo o que oc- correr, @ me dé conta promptamente do que se passar, afim de que eu tenha de tudoa conveniente noticia sem demora. “A Antonio Telles da Silva — Recebi com grande satisfacaéo a carta de V.S datada de 17 de Agosto, porquanto por ella soube da boa disposi- ¢ao de V.S., a quem o Senhor Deus queira accres- centar muitos e felizes annos para nossa protecgao. Recebi tambem os marinhciros que V. S. me enviou, que ao todo sao 90, segundo o numero que na Bahia se fixou; de modo que a falta nao é tanto na quantidade como no valor e substancia, por se- rem muitos delles mo¢os, e nisto é que consistiaa 12 90 REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN, a, falta. Com esta mando a V. S. a lista dos que se acham em todos os navios, inclusive capitées, pi- lotos, dispenseiros e artilheiros. Vi mais o que V. S. me escreven sobre o que Ihe dissera 0 capitio do bareo, referindo-se 4 mu- ther de Salvador Correia; bem pode ser que lal tenha acontecido, mas cu nao sei, nem a ella ouvi dizer cousa alguma. Darei conta a V. S. do que se passou com o seu marido Salvador Correia, que é o seguinte: Logo que tive aviso delle e houve vista dos seus navics, sahi immediatamente ao seu encontro para saudal-o, e tivemos a felicidade de que todos os nossos navios sahiram ao mesmo tempo com vento de terra, juntando-se somente ao vice-almirante no dia seguinte, e quando fui com elle, immediata- mente arriei a minha bandeira, como V. §. me or- denira, e juntos seguimos para o Recife, onde achamos 8 navios e um hyate, entrando mais um no dia seguinte com sua bandeira no alto. No ou- tro dia mui cedo tratou Salvador Correia de enviar dous emissarios pam terra, sendo um delles sea sobrinho Martinho Ribeiro eo outro o ouvidor da armada, a quem entreguei a carta que V_S. me re- commendou enviasse (ao Supremo Concelho), acompanhada de uma outra minha. Partidos os emissarios, nos reunimoas eu e os capities no navio de Salvador Correia justamente #0 tempo em que lhe foi enviada pelos ‘coroneis ¢ ountras pessoas de experiencia, com os quaes se ti- nham conformado, uma proposicgdo, onde lhe fa- ziam ver que era perigoso estar sobre ancoras no porto de Pernambuco no mez de Agosto ; propo- Sicio esta que clle immediatamenie. nos apresen- tou, e nés achamos conveniente e acertado afas- tarmo-nos para o sul {quanto fosse possivel, do que se fez um acto, engrossando elle (0 perigo) com 0 numero dos navios ¢ gente que nelles tinhamos ; boslo que isto se Ihe fez bem patente na Bahia, comludo reconhecemos tudo redondamente e as- REY. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. ot signamos todos o referido acto, por nos parecer que deste modo o obrigariamos a ndéo nos ahando- nar, tanto mais quanto elle fingia ndo saber o fim para que viera, comquanto bem soubesse gue a sua viagem era para soccorrer-nos. Finalmente, depois de se terem levantado algumas questdes, concluio Salvador Correia que nada se podia resol- ver com seguranga antes de recebermos a resposta que os emissarios trariam, e assim ficou este ne- gocio suspenso até que elles viessem. No dia seguinte vieram-no visitar alguns Hol- landezes, trazendo cartas dos nossos deputados, as quaes Salvador Correia nos mostrou ; resavam que os Hollandezes estavam irritadissimos contra mim, porque eu puzera gente em terra, em vez de trazel-a directamente para o Recife, communicava- nos o bom tratamento e honra que os Hollandezes lhes dispensavam, pediam criados e vestidos para se demorarem um peuco em terra, e avisavam que eneral do mar o viria visitar no dia seguinte. Salvador Correia nao lhes enviou criados nem vesti- dos, mas pelo contrario ordenou que voltassem: immediatamente, e elles assim fizeram na tarde do mesmo dia em que os flamengos visilaram o gene+ ral, e trouxeram cartas. oe : Aconteceu nesse mesmo dia cahir um forte pé de vento, com que os navios quasi foram impelli- dos sobre o meu; nisto Salvador Correia se fez 4 vela, e eu teria feito o mesmo, si néo fora suppor que Salvador Correia se movia por causa da forte yentania, o que muitas pesscas tambem me disse- ram, de modo que fiquei perado. . . Sendo manhé, nao vi mais Salvador Correia nem nenhum dos seus navios. Achei-me sé com os meus, excepto o de Jodo Alves Soares que de- pois nao tornei mais a ver, nem delle tive noticia ; mas, sendo Joao Alves téo cuidadoso e diligente, é de suppor que, com o favor de Deus, nao tenha naufragado.. Levantei immediatamente ferro, e me fiz ao mar para procurar Salvador Correia ; en~ 92 REY. Du INST. ARCH. E GEOGR. PE! nn contrei os emissarios em um barco, lhes Perguntej pelo general, e lhes pedi que se passassem para o meu navio, ¢ fiz por o batel ao mar. Elles porém chamaram 4 falla um navio de Salvador Correia, para onde se passaram, e @’ahi me escreveram que esse navio viera do cabo de S. Agostinho, e nao tinha encontrado nem visto 2 armada, pelo que se encostava ao vento para ir procural-o na Bahia da Traicao ; do que depois concluimos que 0 mesmo navio devia de Ihes ter dado alguma commissio, € por causa della alli ficaram, poisque nelle fo. ram. (i) Isto 6 0 que se passou. euente a Salvador Corr 1a, nunca mais soube delle, . Na 2." noite, quando andava eu oceupado em Procural-o, partio-se a verga grande do mastro de traquete do Patacho @ Elrei, o que pol-o em grande perigo. Sendo necessario refazel-o, entramos na Bahia da Traicgao afim de por a verga, e, isto feito, sahinios de novo ao mar, e€ com mui fortes ventos e tormentas tornamos a haver vista de Pernambuco na altura do Cabo de §. Agostinho, Ouvindo nos tiros de peca, mandei 4 terra, e soube que 0s coro- neis estavam em Nazareth; avisei os da minha volta, e lhes pedi que me mandassem as suas or- dens sobre 0 que me cumpria fazer, Responderam que eu me mettesse no porte de Nazareth, dizendo- me que alguns poucos tiros de peca que eu devia esperar fossem disparados do farte nada eram, e nada importavam, Quiz cumprir esta ordem, mas todos me disseram (alguns porque sabiam, outros porque assim lhes Pareceu) que isto seria a ruina da frota, visto como esta necessariamente devia oncorar deante do forte, de modo que em poucas © breves horas seriamos anniquilados, @0 proprio piloto que veio para pér-me dentro do porto, decla- _ 1) « Weer uit wij daernaer besloten dat dat selve schip bun Cenige bootschap most gedaen hebben ende om harentwille op daer gebleven sijn, alsoo sy daer Op gingen,» REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN 93 . rou isto mesmo deante de 16s todos; além de que cu nao tinha navios que podessem deter-se na cos- ta A espera de tempo proprio ‘para entrar, pois cheguei com o mastro de Pedro Duarte partido, navio de Calavar somente provido de uma ancora, e Cacio (Cascao ?) com os mastros derribados, em summa tudo em um estado miseravel. 0 que com- muniquei aos coroneis, respondendo-lhes que, pa ra salvar-me, ia outra vez metter-me no porto Tamandaré, e, si quizessem ouvir o meu parecer, este era nao brigar ou ter guerra com pessoa alguma, e ser necessario voliar com a frota para a hia. 1 : - ean ceponderam-me os cvroneis, dizendo com muita insistencia que era_do mais alto interesse que eu nao partisse, mas ficasse e me fosse metter * no porto de Nazareth; ordem esta que eu de boa vonlade quiz cumprir, mas deante da entrada cre bahia appareceram cinco navios, um hyate e i barcos (hollendezes), de modo que nao pu ee zel-0. Agora, ao escrever esta, veem ‘se mais s navios no mar que parece quererem se juntar com estes, e ainda hao de vir mais quatro, poisque a onze as velas que elles tem, as‘quaes anteriorme! te andavam divididas em duas esquadras para me expellir da costa. 7 Dato sea me acho eu, e, si Deus me salvar, irei immediatamente para Nazareth. De boa von- tade eu sahiria resolutamente contra o inimigo, mas disseram-me os pilotos que d’aqui nao se pode sahir senio com vento de terra, que nesta epoca nao é certo, e nao sopra continuamente, que oe s vezes somente, uma ou duas velas sahem, po a do as outras ficar no porto, e para.néo ne a perigo, deixei-me ficar, regulando-me pe i qu ae doo mundo entendia. Supponho que, logo que i ilden hoo- 4 +. endé by aldien hare Ed. myn advys wil zi ren St net selve was van met niemant te willen spel one Yeon logh hebben, ende nodich le syn met de floot na de keeren »,.. 94 REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. elles sejam todos juntos, hao de entrar, e eu me acho sé com sete navios nas condigées que V. §, sabe. Pedi aos coroneis soccorro de gente, e si este me for enviado a tempo e eu o receber, quero crer que, com o favor de Deus, teremos um bom successo, E como na primeira reunido que tivemos com Salvador Correia néo podemos chegar a uma reso- lucdo, e ficou assentado que de novo nos reuniria- mas, logo que voltassem para bordo os embaixado- res, para deliberarmos sobre o que se devia fazer, eu nao tive occasido de fazer pedido ou protesto contra elle, visto como muito antes de haver eu recebido o aviso deV. S. elle partira, sem se im- portar com a adiada resolucio ou com a sua pala- vra dada; e o vice-almirante ndo me fallou de cousa alguma, do que resultou que nés nos vemos sdés e abandonados. V. S. queira desculpar a minha prolixidade, pois nao achei meio de ser breve. O Senhor Deus guarde a V.S, muitos e felizes annos com tal pros- peridade nos seus designios, qual a que Ihe dese- Jamos e se faz mister. A bordo da almiranta em Tamandaré, Setem- bro de 1645. ; Jeronymo Serrtio de Patwa. “* Carta de Jeronymo de Faria Figueiredo a Manoel de Campos da Bahia. (1) «...Depois que nos fizemos 4 vela da Bahia, desembarcamos em Ta- mandaré, fizemos cercar logo Porto Calvo, e mar- chamos para Sei nhdem, onde encontramos 80 hol- landezes e 60 indios, aos quaes immediatamente cercamos ; renderam-se por accordo, mas os in- dios foram estrangulados. Depois viemos a este logar de Nazareth para sitiar 0 Pontal com 6 com- (1) Traduzida do hollandez. REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PERN. 95 ias, e com as outras 6 fomos para a Varzea aoa aesahando o nosso governador André Vidal, hem como a Jodo Fernandes Vieira e todos os mo- radores do campo, que elle commandava. Sendo ahi chegados, apprehendemos 230 Hollandezes e 120 indios na casa que anteriormente Dorenetana Jeronymo Paes junto do arrayal velho, a qual i foi recenlemente construida de pedra e cal. Simples- mente com tiros os obrigamos a entregarem-se, @ passamos os indios a fio de espada. Isto feito, a minha companhia e a de Amaro da Silva vier para cé escoltando o nosso dito governador : acha- mos a nossa gente occupada, eo Pontal sitiado. Por um particular favor de Deus, elles se nos a tregaram hoje sabbado, 3 de Setembro, sem dar um tiro de mosquete, e so em numero de 250.» =** Carta de Gaspar da Costa escripta no Cabo para iemiaced da Costa, residente na Bahia. @ « Vou passando soffrivelmente neste Pontal de y Senhora de Nazareth que, apoz um cerco de dias. se rendeu, e isto tanto mais facilmente quanto oschefes qne commandavam na praga Sao eeendoe com mulheres portuguezas e tem os seus nner tes arredores ; sobretudo o capitéo de cer (Gaspar van der Ley) tinha grande vontade de - entregar. Concedeu-se a todos boas oe oar mo as que desejavem, e ainda por cima 4, a cados. No forte achamos 300 Hollandezes, a me: lhor gente que elles tinham e142 pegas de ee sendo 4de calibre 2%, bem como viveres para mee zes, de sorte que, si nao se effectuasse esta oppor tuna rendicdo, nos havia de custar muita gente, ao passo que néo Pendens senéo um homem q foi morto por um tiro de pega. : ‘Antes da rendigéo tithamos tomado um barco (1) Traduzida do hollandez. 96 REV. DO INST. ARCH. E GEOGR. PE! nnn que tentaéra sahir do Pontal; levava o escolteto, bem como algumas mulheres que pretendiam ir para o Recifecom avisos. Temamoso eséolteto, bem como um outro de Serinhdem, e os entregamos ds maog dos moradores que em breves instantes os fizeram passar desta para a outra vida. Um destes dous era casado com uma portugue:a de Serinhdem, a qual disse que havia ainda de banhar as méos em sangue portugues, e por isso as mulheres deram sobre ellae a privaram da vida, como lhes cum- pria. (1) Os vencidos se acham quasi todos em Santo Antonio para serem enviados para a Bahia, e mui- tos delles se tem: posto ao nosso servico. Suppée- se que os indios e flamengos, mortos ou presos, andam por 1,300, Salvador Correia de Si nao ap- parece com a sua esquadra, parece-me que elle se fol. Os nossos estéo cruzando ayui, mas ha 3 ou 4dias que nféo os vemos. O flamengo tem 12 na- vios no mar que, segundo supponho, se pegarao com os nossos. O Recife esta cercado, bem como todos os fortes. Lourenco Carneiro esté em Porto Calvo que se quer rend Dizem os judeus que deu-se ordem para ser retirada para o Recife a tro- pa do Rio Grande, Parahyba e rio de S. Francisco. lo Recife ha grande discordia entre judeus e fla- mengos, dizendo aquelles que os flumengos ven- deram a terra, e estes que os judeus é que a ven- deram. Seguem 4 officiaes Superiores para a Ba- hia, entre elies 0 governador das armas, todos pre- sos. No mesmo dia que houvemos o Pontal che- gou aqu: um harco do Recife, trazondo ordem para que nao se rendessem (e resistissem) até o ullimo (4) Wy hebben dien schoul met noch een schoul van Seri- nhden genomen ende over gelevert in handen van de inwoon- ders, die hun in corten stonden van dit leven voort hielpen, een van dese twee was gelrout met een portugese vrouwe in Seri- nhaem, ende sy seyde dat sy haer handen noch in der portu~ xesen bloet soude wassen, washalven de vrouwen haer opt liff Vielen, en beroofiden haer Vant leven, als haer locquaom. REV. DO INST. ARCH, E GEOGR. PERN. OT: ee homem, bem como viveres emunigdes de guerra que ao todo importam em 2,500 ducados. Hoje 5 de Setembro de 1645. 2 Camarada de Ve. Gaspur du Costa de Abreu. SEGUEM-SE VaRIAS CARTAS PARTICULARES TRADUZIDAS PARA O HOLLANDEZ, DAS QUAES DAMOS OS TOPICOS PRINCIPARS ¢ *** Carta de Simao de Vasconcelos, jesuita resi- dente na Bahia, a Salvador Correia.—« O Sr. go- vernador Antoni? Telles da Silva ficou satisfeitissi- mo com a carta de V. S., e certo de que V. S. se haveraé nessa facgéo conforme.o seu grande valor € coragem, e eu tenho firme confianga que V. S., em consideragéo deste senhor, ndo dard attencado a circumstancia alguma de menor monta. 48 de. Agoslo de 1645. » “De D. Jorge deSouza da Bahia ao mesmo, 18 de Agosto.—- « Desejo muito que tudo succeda‘a V. S. tio bem nessa conguista que se possa tapar a bocca a todos os calumniadores e maldizentes. Neste barco vae ordem de 8. M., recommendando a V. 8S. que se detenha ahi ainda algum tempo.» “*De Jorge Mendes da Silya ao mesmo, 17 de Agosto. - Sobre a boa noticia. que um barco trou- xera de Pernambuco, por se esperar o ee 1

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