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ood eTetel rae hod fl sle le Uiaonsd Cen eerie eR aC taty COL6QuIO INTERNACIONAL la fat INSTRUMENTO DA FANTASIA S SUPORTE DA MEMORIA Oo Colegées e arquivos fotograficos: constitui¢ao, fungdo social e conservagao coLdauio INTERNACIONAL 24 a 27 de maio de 2005 | Centro Cultural Banco do Brasil - Rio de Janeiro la raf INSTRUMENTO DA FANTASIA 8S foto SUPORTE DA MEMORIA PROGRAMA 24 DE MAIO Fotografia como patriménio social ‘Como e por que constitut um acervofotogréico Jean-Luc Monterosso Dirctor do Maison Europdenne de la Photographie - MEP, (Paris, Franga). Tereza Siza Diretora do Centro Portugués de Fotografia - CPF, (Porto, Portugal, Lygia Segala Antropéioga, Universidade Federal Fluminense Witeséi 25 DE MAIO Politicas publicas Alejondro Castellanos Diretor do Centro de ls Imagen (México DF, México). Paulo Herkenhoff Diretor do Museu Nacional de Belas Artes io de Janeico), Joaquim Margal Responsavel pela Divisio de leonografia dda Fundagdo Bibliotece Nacional (Rio de Janeiro) 26 DE MAIO Colegses e arquivos privados ‘Agnes Sire Diretora-executiva da Fondation Henvi Cartier: Bresson (Paris, Franca). Luis Priamo Fundaci6n Antorchas (Buenos Aies, Argentina. ‘Sérgio Burgi Coordenador da érea de fotografia do Instituto Moreira Salles (Rio de Janeiro) 27 DE MAIO Conservagao e classificagéo de acervos Peter Mustardo Ex-Coordenador Regional de Preservacao do National Archives (Washington) e Diretor do The Better Image (New Jersey, USA). Sandra Baruki Coordenadora do Centro de Conservagao € Preservacio Fotograica (CCPF) da FUNARTE (Rio de Janeiro). ‘Ana Maria Mauad Laboratorio de Historia Oral e Imagem ~ Universidade Federal Fluminense (Niteré, 25 DE MAIO Politicas publicas Alejandro Castellanos Centro de la Imagen, México DF, México, Paulo Herkenhoff Diretor do Museu Nacional de Belas Artes (MNBA) ~ Rio de Janeiro, Joaquim Marcal Fundacao Biblioteca Nacional Milton Guran Iniciamos, entio, a nossa segunda sesso de trabalho do colbquio ‘Coles ¢ arguivos foografios: consttuigd,fangdo sociale consercagao’. No dia de hoje vamos discutir as politicas piblicas. Temos oprazer de acolher o Sr. Paulo Herkenhoff, diretor do Museu Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro; o St. Joaquim Maral, responsivel pela Divisio de Ieonografia da Fundagio Bibli- oteca Nacional, do Rio de Janeiro e 0 nosso estimado amigo ¢ colega, Alejandro Castellanos, diretor do Centro de la Imagen do México. Alejandro, com a palavra para iniciar os trabalhos € muito obrigado a todos pela presenga Alejandro Castellanos Obrigado. Quero agradecer aos organizadores deste coléquio, especialmente ao Milton Guran. Realmente para nés, no México, o Brasil é sempre uma referéncia muito importante. E espero ‘que estar aqui sirva para engrandecer essas referéncias miituas, sobretudo pensando que entre Brasil, México € Argentina existem trés grandes continentes da fotografia latino-americana. E entre os trés seguramente sabemos poucos uns dos outros ¢ necessitamos conhecer mais. Resumindo, o que tenho previsto para apresentar aqui para vocés hoje é uma idéia de como sio as politicas piblicas no México, da fotografia, a partir tanto de uma visio hist6rica, por uum lado, como da ago ¢ das atividades que desenvolvemos no Centro de la Imagen, por outro. Quisera colocar duas referéncias gerais para que a partir delas possamos pensar estas idéias que vou falar. A primeira idéia que retomo é de uma pesquisadora ¢ fotdgrafa mexicana, Laura Gonzales, que por sua vez retoma uma idéia de Foucault, Para pensar o museu fotogré- fico como um espaco heterotépico, onde se dio diferentes situagdes a0 mesmo tempo, pela propria caracteristica que a fotografia tem de ter miiltiplos significados. Isso me parece muito importante como referéncia para se pensar a fotografia desde uma instituigo como é 0 Cento de la Imagen, em particular. A outra idéia, que igualmente me parece muito importante, 6 a de um te6rico americano, Jorge Judice, em um livro que fala sobre o recurso da cultura e como a cultura pode ser pensada em fungio de uma referéncia de mudanga e nao de estabilidade. Estes dois, ao meu ver, so conceitos-chave, ao menos no México neste momento, porque certamente vocés sabem que estamos vivendo uma etapa de transi¢ao muito grande. Depois, de haver tido um sistema politico durante muitos anos que praticamente abarcou todo século 2 XX, ¢, que, neste momento, esté totalmente num processo de renovacio que implica que to- das as atividades, incluindo as culturais, repensem seus pontos de vista. Estas idéias, que estou colocando como antecedentes, so precisamente para realcar que a fotografia no México, e no que é a atividade do Centro de la Imagem, est muito ligada a estas condiges de mudanga que esto se dando, Por um lado, se olharmos para trés hé uma tradigo nas instituigdes mexicanas que ao longo do século XX chegou a consolidar-se em grandes instituigdes, que foram as que tem protegido 0 patriménio piiblico no México. Uma delas é 0 Instituto de Antropologia ¢ Historia. Essas se fundaram, mais ou menos, nos anos cingiienta do século passado, E a outra instituigo grande é o Instituto Nacional de Belas Artes, ¢ uma terceira que é a Universidade Nacional Auténoma do México. Essas trés grandes instituigGes foram as que, de alguma forma, acompanharam o desenvolvimento das politicas do Estado e lhe deram projecio nao somente a nivel nacional, mas também internacional. Por exemplo, no caso da museologia ha uma tradigao no México que est, em grande medida, cristalizada no que 0 Museu de Antropologia da Cidade do México, no qual se resumiram muitas destas politicas piblicas que estavam embasadas, também, em uma visio do Estado patrimonial. Uma visio do Estado que se assentava na origem indfgena do pais e que, por sua vez, comegou também a interagir, a se conectar através desse passaco em um presente e em uma visio de modernidade que se desenvolveu no século XX. Esse relato nacional que se construiu através dessas instituigdes esteve muito ligado ao poder exercido durante muitos anos no México somente por um partido politico. Quiga, alguns de vocés tenham ouvido falar desse partido que € o Partido Revolucionério Institucional (PRI), que foi descrito por Vargas Llosa como uma “ditadura perfeita’, pelo bem articulado que estava no que se refere & geracio de suas politicas, que tinham um efeito em muitas esferas. Octavio Paz, 0 pocta mexicano, também definiu esse estado como 0 “ganho filantropico”, ‘quer dizer, um estado que por um lado reprimia e funcionava, nao como uma ditadura com a forga que a tiveram os paises deste lado do continente, e sim como uma forma na qual foram encurtadas outras formagoes politicas. Nesse sentido, 0 que marca uma mudanga e um tiro nas politicas piblicas no México se dé a partir de 68, esse ano que para o mundo inteiro é muito importante. E, no caso do México, significou uma ruptura, um estado que se havia mantido estivel, que se havia mantido com um poder sobre todos os campos de atividade social ¢ cultural comegow a ter cisdes e rupturas. De alguma forma emerge ai, no caso de cam- Pos especificos como a fotografia, a idéia de autonomia. A idéia de que, independentemente das atividades do estado, podiam-se gerar atividades por parte dos préprios fotdgrafos, nesse caso. Acredito que seja muito importante ressaltar isso, no caso especifico do México. Foram 0s fot6grafos, os principais, digamos, promotores desse meio. Ou seja, inicialmente foram cles que propugnaram para que a atividade da fotografia fosse reconhecida. Precisamente a partir dos anos 70, quando existia, além disso, todo um ambiente politico muito carregado no México, porque todas as referéncias que chegavam até nos deste lado do continente através do exilio, através de todas as lutas que estavam acontecendo por aqui, era em grande medida um didlogo permanente com todos esses conflitos. Entio no México, de alguma forma, podia-se pensar em América Latina de uma maneira 6 global. Essa visio latino-americana que existe nestes anos € muito importante para reconhe- cer que 0s fot6grafos dessa época no México, quando menos esperavam criar um modelo no qual se pudesse integrar uma visio continental através da fotografia, é ai, também, nesses ‘anos, que se criam os grandes acervos. Como exemplo, eu gostaria de contar uma histéria que aconteceu quando dois desses fot6grafos, que impulsionaram esse movimento de que falo, tiveram um didlogo sobre um acervo que nesse tempo acabava de adquirir uma dessas grandes instituigdes das que falo, o Instituto de Antropologia ¢ Historia. Esse acervo, que é © “Acervo Casasola”, estava praticamente abandonado em alguns ‘escritérios’ na cidade do México ¢ tanto Pedro Meyer como Lizaro Blanco tiveram contato com funcionarios desse Instituto, propondo-Ihes que se ocupassem desse acervo. Este acervo € o interesse dos fotdgra- fos nos anos 70 geraram virias publicagdes. Uma delas - “Imagem Histérica da Fotografia no México“ - que no final dos anos 70 mostrou um primeiro panorama do que havia. Um panorama muito amplo, muito superficial se visto desde agora, mas muito importante naquele momento porque era a tinica referéncia que tinhamos. Nao havia outro livro, este era 0 tinico {que nos dava perspectiva do que havia sucedido no pais. Essa visio global dos arquivos fez. com que as instituigdes, como o Instituto de Antropologia, levassem em conta esses arquivos fotograticos e hes desse maior valor. Foi criada uma fototeca a nivel nacional, a Fototeca do Instituto de Antropologia, na qual foram integrados varios acervos. Um deles, quigé 0 mais conhecido, que é 0 “Arquivo Casasola”, que resume um. pouco da vida do México mais ou menos até meados do século XX. E junto com ele foram integrados outros arquivos de importantes fotégrafos, como Nacho Lépez que estio comple- tamente integrados a essa Fototeca. Foram criadas também publicacées sobre alguns desses arquivos. E 0 caso de Guillermo Khalo, que é um fotégrafo justamente mais conhecido pela fama de sua filha, Frida Khalo, do que pela propria obra, embora ele tenha sido um fotégrafo muito importante no inicio do século XX no México. Os grandes arquivos que existem nesta Fototeca formam um niicleo no qual pode-se dizer que sto base para a investigacao ¢ a referéncia sobre a historia da fotografia recente no México € complementam, por outro lado, 0 Arquivo Geral da Nagao do México que também tem grandes acervos sob sua custédia. Tem também acervos muito grandes como o de Enrique Diaz, que ¢ um fotojornalista atuante entre os anos de 1920 e 1950 no México. Por exemplo, estes livros que foram editados, dois ou trés, nos quais se recuperava a historia das pessoas que mandavam cartas aos presidentes com imagens para Ihes solicitar alguma melhora em sua vida. Hé uma tradigio no México muito forte que é esta figura central e onipresente que, neste caso, era encarnada na Presidéncia da Repiiblica ¢ & qual se solicitava qualquer coisa, desde consertar as rodovias de um povoado até dar remédios ao filho, qualquer situago desse tipo. Acredito que o valor destes livros esté nesta visio de recuperar uma historia social da fotografia desde uma perspectiva muito mais ampla do que somente a do autor: Junto com esta visio vem se consolidando cada vez mais em outros espacos, como na Universidade Nacional Auténoma do México, acervos de fotdgrafos importantes como Luis Marques, que participaram nesta época muito conhecida do cinema mexicano, sobretudo, na América La- tina nos anos 30 € 40. “ No México existem 32 diferentes Estados ¢ um deles € Guanajuato que é uma referencia a nivel nacional ¢ no qual este fot6grafo Romaldo Garcia 6, quic4, o mais representativo. No ini- cio do século XX, ele produziu, através do seu esttidio de retrato, uma espécie de olhar sobre asociedade mexicana dessa época, através destas imagens que significaram em seu momento ‘uma revalorizagio muito importante de um autor totalmente desconhecido até entio, salvo em sua época, ¢ essa agio foi uma das responsiveis pela eriagéo do Cento de la Imagen. Por isso vou tratar de articular essas duas coisas porque acredito que nesse sentido as politicas de difusdo da fotografia, de sua conservagao ¢ de sua classificagao tem sido dadas em funcdo desta difusdo. E 0 que tem acontecido no México, mesmo no caso dos acervos mais distantes como o de Yucatan, ao sul do pais, onde se logrou consolidar também uma série de institui- es como a Universidade de Yucatan, espacos para a preservaco de acervos que guardam a historia do Estado, Em alguns casos, houve a possibilidade de que se gerarem politicas, no 86 de conservagao, como de difusao deste patriménio local. E 0 caso, por exemplo, do Estado de Vera Cruz, onde chegaram a ser feitos oito livros, com esta idéia de motivar os habitantes de alguma localidade em especial a reconhecer-se através das imagens. Essa aco foi muito importante pois aconteccu durante 0 processo de institucionalizago da fotografia nas politi cas piiblicas, porque, por um lado estava a Universidade de Vera Cruz apoiando pesquisas, € 0 Governo do Estado promovendo a edigdo destes livros e, por outro, havia a proposta de que todo esse material chegasse ao conhecimento piblico, que nao ficasse somente na aca- demia como infelizmente acontece com esse tipo de trabalho, Da mesma maneira,ao norte do ais, deram-se processos como no caso de Monterrey, uma cidade que nos titimos anos esta ganhando importancia, uma presenga cada vez maior no campo da cultura gerando também projetos proprios. Existe uma fototeca que abriu ha cinco anos, em Monterrey, que depende diretamente do Estado de Nuevo Leén, e que é um dos grandes espacos para fotografia hoje no México. Pode-se dizer que tudo isso € muito recente. No caso da fototeca, por exemplo, tudo surgiu a partir de uma exposic&o de 400 anos de fundagio da cidade, “Monterrey em 400 fotogra- fias”, preparada pelo Museu de Arte Contemporinea de Nuevo Leon. Toda a colegio que foi gerada a partir dessa exposicio foi parar nessa fototeca, que se encontra em Monterrey. E baseado em um projeto futuro o Forum Internacional de Culturas, que aconteceu em Barce- Jona ano passado ¢ que seré realizado no préximo ano em Monterrey, justamente no espago da fototeca, junto com outros centro de cultura, Essa perspectiva de reconhecimento piblico da imagem, como é 0 caso de Nuevo Leon, fez com que as pessoas emprestassem suas ima- ‘gens para que se editassem livros de fotografia mediante os quais esto fazendo conhecer seu pasado recente. ‘Tudo isso também tem acontecido, ao mesmo tempo que um processo paralelo inédito no México, porque geralmente toda a ago cultural era definida pelo governo e nos iltimos anos, como acontece em muitos lugares do mundo, ganhou espago a agio privada de algumas ins- tituigdes. No caso particular da fotografia, a empresa de televisio que é mais conhecida em todos os lugares, “Televisa”, encarregou a Don Manuel Alvarez Bravo, no principio dos anos 6 80, uma colecao, Essa colegio € muito importante e muito valiosa, ndo s6 pela colecio em si mas por quem a formou. Tivemos a fortunia no México de contar com essa visio que fez com que a fotografia se arraigasse fortemente & cultura, que € a visio de Alvarez Bravo. No inicio eles haviam apostado em um espaco para a arte contemporiinea que ia além da cole¢io de fotografia em si, em seguida cancelaram 0 projeto do espaco e ficaram praticamente com a colecao de fotografia como base de toda sua politica institucional de promoco, Grandes atdlogos foram produzidos, quando existia 0 Centro Cultural Televisa, como este de Lola Alvarez Bravo, quig, 0 maior catilogo ja ‘organizado sobre algum fotégrafo no México. Lola Alvarez Bravo foi a primeira mulher de Manuel Alvarez Bravo, também fotografa, que faleceu ha varios anos e cujo acervo, em uma grande parte, se nao for todo, me parece que se encon- tra no Arizona, no depésito do Centro de Fotografia Criativa do Arizona. Junto com isso, ¢ essa ago também se deve as empresas, deu-se inicio, ou formalizou-se, uma agio de colecionador, como 0 caso de Jonge Carretero, que em Puebla, que é uma cidade que fica a 2 horas da Cidade do México, tem uma coleco muito valiosa de fotografia, Ou como o caso de Oaxaca que se destacou nos iltimos anos por ter uma atividade cultural muito impor- tante. Sobretudo devido ao trabalho de um par de artistas, - um ja morreu e o outro afortu- nadamente continua vivo-. Rodolfo Morales ¢ Francisco Toledo, que recuperam a tradigo indigena de uma palavra chamada “tequil”, que implica em devolver & comunidade parte do trabalho proprio, Em particular no caso de Francisco Toledo, apoiando a fundago de um Centro Fotografico, um centro pequeno que esté localizado na cidade de Oaxaca, onde ha ‘uma magnifica colegio de fotugralias que esta & disposicao do publico. ‘Toledo é um artista muito querido e admirado por outros artistas O Caso do acervo da fotégrafa Mariana Yampolsky é emblemético do que vem acontecendo Fecentemente. Antes de morrer ela propos com um grupo de amigos que seu arquivo nao pase sasse a fazer parte do Estado, como tradicionalmente acontece, ¢ sim que fosse criada uma fundagio. Uma fundagao na qual se organiza e coordena seu trabalho. £ 9 mesmo ‘caso,por exemplo, de Juan Rulfo, outro grande artista mexicano muito conhecido por sua obra litertia, mas também, recentemente, sobretudo por suas imagens. A criagao dessas fundagdes é um fen6meno relativamente recente no México que apenas esté arraigando, porém definitiva- mente existe uma série de condigdes dificeis para manté-las, sustentéclas. So projetos muito complexos e custasos, Da mesma forma sucede que existem casos de colecionismo privado sobre a fotografia no México que esto associado a projetos de grandes alcances. © maior deles fica nos Estados Unidos sob a ago de Bill Wittiff, que € um colecionador fot6grafo, norte-americano, que vive em Austin. Ele formou uma colegio tanto de fotografia mexicana como de fotografia do sudoeste dos Estados Unidos. De alguma forma esse intercambio todo entre essa fronteira ‘Go grande que temos com os Estados Unidos, ele busca refletir através dessa coleco. Inicial- mente ele foi assessorado por Mariana Yampolsky, essa fotdgrafa de quem falamos a pouco € que foi muito importante para o México, ele adquiriu obras importantissimas como a de Graciela Iturbide junto com muitos outros autores. 6 E nesse cenario que se insere a agao do Centro de la Imagen, fundado em 1994. O Centro origi- nou-se das agdes de fotografos como Pedro Meyer, Lazaro Blanco, José Luis Neira e outros, que nos anos 70 fundaram o Conselho Mexicano de Fotografia. Esta instituigo condensou © movimento que eu comentava no inicio, no qual os fot6grafos buscaram reconhecimento para seu campo de trabalho ¢ se manteve vigente e vivo sobretudo nos anos 80. De alguma forma, isso também teve a ver com a crise em que 0 estado mexicano caiu ao final dos anos 80. Como vocés sabem, houve um momento que o PRI, este partido tinico do qual eu Ihes falava, comesou a declinar, Comegam a acontecer miiltiplas manifestagdes piblicas e agrupamentos politicos comegam a ter, para sorte de um processo democratico, melhor e maior presenga em todos os campos. Esse processo de mudanca atingiu instituigées como o Conselho Mexicano de Fotografia, que teve um papel muito importante, mas que depois nao se sustentou. De alguma forma, a mensagem foi levada adiante por outros autores, outros fotdgrafos que também fizeram parte desse niicleo, Um deles em particular, Pablo Ortiz Monasterio, fez uma transicio do que foi o projeto do Conselho Mexicano de Fotografia e a criagio do Centro de {a Imagen. Isso foi no final dos anos 80, principio dos anos 90. © Centro é um espago muito agradivel para se trabalhar, ocupa um espaco pequeno em um edificio colonial, no qual desenvolvemos todo um projeto de difustio da fotografia. Quando Pablo Ortiz Monastério projetou esse lugar, junto com uma equipe de colaboradores, entre os quais estava Patricia Mendonza, que foi a primeira diretora do Centro, cles pensaram em retomar as atividades do Conselho Mexicano de Fotografia, Entre elas a Bienal de Fotografia, que é um concurso que se realiza a cada dois anos no México e d um prémio de aquisicdo aos dois melhores fotogra- fos do pais, sendo que as obras passam a fazer parte da colecao do Centro. Esse projeto, junto com o festival que organizamos que se chama Foloseptiembre, sio as duas atividades de maior alcance piiblico do Centro. Fotosepticmbre tem alcance nacional, ou seja, © Centro de la Imagen faz. uma convocagio € con- vida fot6grafos de todo o pais a participarem desse programa, inscrevendo exposigdes que so integradas a um catilogo geral. Aproximadamente se fazem 350 exposigdes durante 0 festival. Nem tudo acontece em setembro, vai de julho, agosto a outubro, novembro em dife- rentes lugares. E através dessa agao que temos diversos tipos de produtos. Um deles, quigé 0 ‘ais significativo, que também foi fundado por Pablo Ortiz Monasterio, é uma revista, Luna Cornea. Ele foi editor dessa revista durante varias anos e, hoje é dirigida por Alfonso Morales « Patricia Gola, Jé sio 27 nimeros publicados, sendo que o primeiro deles foi dedicado a Manuel Alvarez Bravo, uma revisio sobre seu trabalho no México, em particular, suas rela- Ges, suas referencias. México teve um momento brilhante na fotografia nos anos 1920 ¢ 1930, quando a obra de Don Manuel estava comegando a se gerar ¢ tivemos a presenga de outros fotégrafos como Edward Weston, ou Tina Modotti, que foram muito importantes para 0 desenvolvimento da fotografia no pais. O Centro é concebido, nao somente como espaco expositivo, mas também como um centro cultural no qual a fotografia é desenvolvida através de quatro programas: um programa de exposigdes, com exposigdes permanentes ao longo de todo o ano, tanto no ” Centro como itinerantes (0 Centro também envia exposigdes a outros lugares do pais); um programa educativo, que esta fundamentado basicamente em oficinas entre as quais, por ‘exemplo, uma a cargo de David Levi-Strauss. Sio oficinas curtas de uma semana, que tém um. piiblico especifico que basicamente so fotografos que buscam complementar sua formagio profissional. Mesmo assim, podemos dizer que é 0 campo que esté mais vinculado com todas as idéias deste coloquio, um espago de informagao no qual ha uma pequena biblioteca, com aproximadamente 3.500 volumes, especializada em fotografia e que é aberta ao piiblico, Junto ‘com essa biblioteca, existe um acervo de imagens, de aproximadamente 25.000 imagens, que basicamente sao de consulta. um arquivo com slides, algumas imagens em positivo, mas que nao constituem uma colecao. Estamos trabalhando exatamente em algo que me parece muito importante neste campo do que estamos falando aqui. Como qualificar esta informagio que temos no Centro ¢ como Ihe dar um sentido maior e uma aproximagio maior aos seus usuarios, uma possibilidade de aproximagao melhor. Nao é facil porque, geralmente, € acredito que essa é uma situaglo que se da nas instituigdes do mundo todo, a parte mais esquecida é esta dos acervos. Ea parte que tem menos possibilidades de desenvolvimento porque tem menos possibilidades de conexio de recursos. Pelo menos, isso acontece no México, Por outro lado, nossa idéia é de que este tra- balho que estamos desenwolvendo no Centro sirva para que tenhamos uma maior consciéncia sobre esta informago que temos, mas, também, sobre a criagao de algo, que é com o que vou fechar minha palestra, uma colegio de fotografia, em particular, de fotografia contempordnea no México. Paralelamente a essas atividades, temos uma area no caso especifico da pesquisa sobre foto- grafia, e sobre aspectos historicos ou teéricos, na qual pudemos publicar um livro que coloca (0 projeto de formagao de fundos fotograficos, que temos no Centro. Este livro, “160 anos de fotografia no México”, é um diretério similar ao que editou Boris Kossoy aqui no Brasil, que apresenta uma perspectiva global sobre a fotografia no pais. De alguma forma o Centro ¢ toda esta atividade se complementam, ¢ isso faz. com que a ago do Centro, as politicas de diregdo que tem, siga em fungao dessa perspectiva geral. Nesse sentido, nao € um projeto que cst ligado somente a uma destas linhas de atividade, como poderia ser com as exposicdes ou com a educagdo, mas que busca gerar uma consciéncia sobre a imagem fotografica através de todas essas linhas. Estamos trabalhando atualmente em um programa que seria por um lado fazer uma retros- pectiva sobre a fotografia no México até 1970, uma exposicio que seré mostrada durante 0 proximo Fotoseptiembre, E para essa exposigao fizemos uma parceria com dois organismos espanhéis, a Editorial Lumber € a empresa Telefonica para gerar esse projeto de pesquisa ¢ de exposigo. Como eu falava no principio, existe um corte na cultura do México, de acordo « essa idéia que nos anos 70 existiu uma nova posigio para identificar os processos culturais, Essa nova posigdo faz. com que estejamos pensando em organizar para o préximo ano uma exposigdo que vai complementar essa primeira a que acabo de me referir. Nessa exposicio faremos uma revisio do que tem sido a fotografia no México, nfo desde uma perspectiva 6 global, e sim de uma perspectiva critica ou analitica procurando trazer linhas de reflexdo sobre esse fenémeno no México. Para isso estamos desenvolvendo, juntamente com um grupo de curadores e de criticos, as idéias com as quais faremos o projeto. Isso esta fundamentado, em grande medida, na colecio de fotografias que o Centro tem, a partir de seus concursos, das Bienais de fotografia. Existe um sistema no México que logrou sustentar-se sob muitas criticas e pressdes, mas que tem apoiado artistas a desenvolverem seus trabalhos. Este sistema é um projeto que surgiu nos anos 90 que se chama “Sistema Nacional de Criadores”, através do qual um artist, j4 com alguma trajetoria profissional, ganha uma bolsa por trés anos para desenvolver seu trabalho. Existem também bolsas por um ano para jovens artistas com até 35 anos para igualmente terem a possibilidade de desenvolverem um projeto. E 0 caso de Katia Brailovsky que agora faz parte do Sistema de Criadores. Existe outra Bienal no México que também convoca, particularmente os fotojornalistas, a Bienal de Fotojornalismo, que reine tudo o que acontece no pais a partir dos anos 90. E esta meméria recente, que vem através desta bienal de fotojornalismo, reflete, de alguma forma, 0 que se vive € 0 que esperamos recuperar expressamente neste projeto que temos. Este € um panorama, uma perspectiva que espero poder conversar mais no debate e espero que tenha dado uma aproximagio do que ¢ o campo da fotografia ¢ a agio das politicas pibli- cas no México, Obrigado. Milton Guran Muito obrigado, Alejandro, com a palavra Paulo Herkenhoff Paulo Herkenhoff Eu gostaria de iniciar agradecendo ao FotoRio na pessoa do Milton Guran, ao convite para apresentar a idéia de uma Colegio Nacional de Fotografia no Museu Nacional de Belas Artes. E igualmente a presenga de todos. Eu queria relembrar uma passagem na historia das ins- tituigdes de fotografia do Rio de Janeiro, quando, em 1965, 0 Governador Carlos Lacerda discursa na inauguragio do Museu da Imagem e do Som. Ele menciona a constituigao de ‘uma retina fotografica através daquela institui¢ao. Como eu estou me recuperando de uma cirurgia de correcio de retina, eu tenho uma certa dificuldade de ler o texto que se segue, mas vou me consolar com Leothar € Adorno. Leothar diz que “ver nao é ler”, em sua teoria sobre a densidade da visio. Ao mesmo tempo Adorno, na sua cortante “Minima muralha”, diz que “o cisco em meu olho pode se tornar a minha lente de aumento”. Gostaria de transformar as minhas afligdes fisicas em uma reflexio conceitual e num certo apanhado histérico rapido sobre a presenca institucional da fotografia entre nés. Para pen- sar uma Colegio Nacional de Fotografia num Museu Nacional de Belas Artes é necessério 0 entender como a prépria fotografia se poe no horizonte cultural brasileiro, e, sobretudo, no ‘campo institucional. Eu tenho, nos iiltimos 20 anos, me dedicado a escrever, a debater, a organizar exposigoes ¢ colegdes, e discutir algumas questées da tradigio visual brasileira num quadro de trabalho sobre sinteses da tradico da nossa cultura, que gostaria de mencionar, do que seria o campo de trabalho de uma colegio daquela ordem. A primeira questdo: precisa- ‘mos compreender a complexidade do tempo na cultura brasileira, Podemos pensar, por exem- plo, que num lapso de menos de 3 décadas, temos as grandes obras barrocas de Aleijadinho € uma invengio da fotografia por Hercule Florence, em Campinas, em 1830. Essa pode ser uma matriz de todas as dissincronias, assincronias, destopias, e, até, sincronias, na trajetéria da fotografia no Brasil. Depois, também, poderiamos pensar na trajetéria da luz na arte brasileira. A obscuridade da pintura brasileira até 0 século XIX, um pais que no admitia a arte civil, a fotografia € a pintura do Plener convivem com uma descoberta da Iuz tropical numa mesma época. Gostaria de pensar que a fotografia nesse instante est4 conformando uma retina brasileira, Depois poderiamos pensar na transversal antropofigica, na nossa condenacio ao moderno, na responsabilidade ética e como a arte no Brasil também se define como um exercicio experi- mental da liberdade. N6s poderiamos pensar como a fotografia € recorrente nos diagramas de agenciamento social pela arte, poderiamos pensar na vontade construtiva, na busca de auto- ‘nomia da linguagem e no didlogo internacional, na questio da multiplicidade dos sentidos de cada um de nés como autor ¢ agente da percepcao fenomenolégica, e, finalmente, o que € a pluralidade do Brasil e a nossa decisio de pertencermos aquilo que se define como Brasil Para celebrar essa realizacio do FotoRio, eu queria, entio, comegar com uma conclusio: O Rio de Jancito é, ¢ sempre foi, o epicentro do trabalho cultural e institucional com a fotografia em nosso pafs, Por mais duras que hoje sejam as condigdes dessa empreitada, como o proprio FotoRio este ano experimenta, o Rio de Janeiro criou para o Brasil as bases mais s6lidas de uma espécie de civilizagio da fotografia, O primeiro motivy Ue uinta Golegao Nacional de Fotografia talvez seja pensar que, - desde 1840, com o Abade Compte, quando a fotografia -, daguerreotipia, tem uma insercio social mais forte, ela passa a ser, entio, parte do processo formativo do olhar brasileiro. No Pago de Sao Cristévao, o Imperador Pedro I, talver. tenha se tornado, naquele momento, 0 primeiro fotégrafo da América Latina. Talvez, também, ali tenha se desenhado o primeiro grande colecionador em todo o mundo ao receber e guardar aquelas imagens, que sio as mais antigas imagens remanescentes das Américas, as imagens feitas pelo Abade Compte, no Rio de Janeiro. Ao mesmo tempo, o conjunto imperial vale nio 6 pela época em que ele se inicia, mas, também, pela qualidade, pelo espectro tematico, pelo Ambito geogréfico ¢ pela quantidade. Sua colegio tinha a perspectiva da formagao de um teatro das diferencas do mundo. Nas décadas que se seguiram, por um periodo largo no século XIX, a Academia Imperial de Belas Artes aceitava em suas exposigdes gerais a presenca de fotografia. Ha uma involugao, nesse sentido, a ponto de na década de 90 0 Museu Nacional de Belas Artes, sucessor da Academia, ter recusado algumas doagdes fotograficas, porque justamente nao era capaz de 50 ‘manipular tecnicamente, de catalogar e de guardar esse tipo de material. Mas essa vocago, essa condenagao para a modernidade também se desloca para o olhar dos fotégrafos. Nos podemos pensar nessa imagem dos “30 Valérios”, do Valério Vieira, criador da experimenta- io na arte brasileira, que até hoje nao sabemos, perplexos, se é uma imagem do século XIX {ja sendo uma imagem do século XX. A fotografia brasileira nunca mais, desde Valério Vieira, poderia ser reduzida a retratistica, ao registro iconogréfico ou etnolégico, ao fotojornalismo, ou a0 fotopictorialismo. Outro fordgrafo no Rio de Janeiro Augusto Malta, contratado pela prefeitura do Distrito Federal para registrar a vida da cidade, passou décadas registrando em dezenas de milhares de chapas o que foi a vida do Rio de Janeiro. O Rio foi, entio, moderno antes do modernis- mo. Ja era moderno no final do século XIX no confronto, por exemplo, entre o mar parado de Ferrez ¢ 0 mar agitado de um Castanheto, Mas, também, temos que pensar que a moder nidade carioca sempre teve um sentido coletivo, dai a presenga tio marcante de um Malta. O modernismo paulistano, em contrapartida, eclode como espasmos individuais de grandes intelectuais numa atitude organica de filiago ao projeto oligarquico da burguesia paulista, de uma dominagao geopolitica sobre o pats. Nao é a toa que a semana de arte moderna se dé num teatro, reencenando a estratégia do choque dadaista contra a platéia provinciana de tum pretenso Café Voltaire. Enquanto os modernistas Mario ¢ Oswald de Andrade, em sua primeira fase, atacavam a fotografia com desdém, o Rio de Janeiro apontava para as muitas possibilidades modernas da linguagem e do meio fotogrifico. Saltando algumas décadas, tenho que falar de Gilberto Ferrez. E 0 pioneiro, inventa 0 cole- cionismo, inventa uma hist6ria, inventa 0 mapa fotogréfico do Brasil. Tirou a nossa fotografia, de uma trajetéria quase grafa ao inventar essa cartografia, Ferrez tem que ser visto, também, ‘como um paradigma daquilo que € o colecionismo privado no Rio de Janeiro. A nossa cida- de é uma cidade nacional, essa é sua gloria, sua tragédia e sua riqueza. Diferentemente de colecionismos regionais, os colecionadores privados do Rio montam colegdes que so retratos do Brasil. Ferrez, Chateaubriand, Marinho, Fadel, Satamine, sio alguns desses exemplos. Nenhuma cidade brasileira teve um colecionismo de reconhecimento do pais como nosso 0 Rio de Janciro. Depois, também, poderiamos pensar que esse grande mapeamento do Brasil, no pos-guerra, feito pelas revistas “O Cruzeiro” ¢ “Manchete”, so uma produgio impar, também, nessa coesio, que pela primeira vez 0 olhar do Brasil tem sobre o proprio pats. Eu quero mencionar aqui neste seminério a presenga do fot6grafo Flavio Damn, como represen- tante desse niicleo de inventores do Brasil. Pulando para o plano institucional, eu gostaria de citar a Biblioteca Nacional que guarda uma das primeiras colecdes internacionais com fotografia, hoje, composta pela fusio de seu proprio acervo e da colecio Thereza Christina, doada pelo Imperador a seu pais no momento que partia para o exilio. Contra todas as dificuldades de uma instituigo federal, Joaquim Margal algou a fotografia a novo nivel no plano da Biblioteca Nacional, superando a subalternidade a que estava submetida no cdnone da instituigo ¢ inovando, em termos nacionais, em for- mas de tratamento, e, sobretudo, na democratizagao do acesso das imagens pela coletividade, st Honra do tesouro brasileiro, formado no Rio de Janeiro, é 0 Arquivo Nacional. Conhego pouco dele, mas vou mencionar que duas décadas de Celina Amaral Peixoto e Jaime Antunes, © Arquivo Nacional foi capaz de propor politicas arquivistas a partir da fotografia, Na forma- do do Museu da Imagem e do Som do Rio de Janeiro, destacaram-se 0 proprio governador, Carlos Lacerda, Antonio de Almeida Braga e Gilberto de Castro, pesquisador da obra de ‘Malta. Termos aj uma alianga entre um Governador, um banqueiro e um pesquisador. Desde entio o museu carioca criava 0 modelo de instituigao cultural que hoje se espalhou por todo © pais. Poderiamos dizer, de Sao Paulo a Goiania. Ha 40 anos, no entanto, 0 Rio de Janeiro espera por governantes que possam ter 0 mesmo envolvimento sensivel ¢ produtivo em instituigdes culturais. O MIS, hoje confiado a Edino Krieger, busca sua sobrevivéncia e a crenga que esta luz no fim do tinel possa ser uma luz verdadeira. Depois, temos que pensar no grande salto epistemolégico representado pela constituicao da FUNARTE, inicialmente seu niicleo de fotografia. Roberto Parreira, Zeka Araijo, Edmira Faledo, Solange Ziiiga, Angela Magalhaes, Nadja Peregrino, Pedro Vasquez, Sergio Burgi e Sandra Baruki, espero nao estar esquecendo de ninguém, que ao longo de duas décadas constituiram, viram crescer, puderam sedimentar, condensar experiéncias que passa- vam pela pesquisa, pelas ediges, pelas exposigées, pela Rede Nacional de Fotografia, pelas bolsas de estudo, pelo processo de preservacao, constituindo pela primeira vez um verdadeiro sistema de fotografia para o pais, Essa instituigo, no entanto, naufraga numa montante da tragédia cultural das instituigdes pUblicas federais, criada com 0 Ministério José Aparecido © desprestigio da propria Fundagao Nacional de Arte, prossegue com o radical desmantela- mento da cultura pelo obscurantista Fernando Collor de Mello ¢ se consolida na calculada pasmaceira do Ministro Francisco Weffort. © Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro foi por duas vezes a cena da fotografia experi- mental ¢ moderna brasileira. Poclemos pensar, por exemplo, nos seus primérdios, numa expo- sigdo de Fernando Lemos que marcou bastante a instituigao, depois Flavio Damm e outros. Nos anos 70, com a sala experimental, também, a fotografia ganhou um espaco distinto em termos dos conjuntos das instituiges muscologicas brasileiras. Em 85, ao assumir a curadoria geral da instituigao, firmou-se a idéia de que ela se tornasse uma espécie ce enciclopédia da cultura visual no Brasil. O MAM, que sobreviverd de um incéndio inexplicado até hoje, em 78, voltaria com um novo perfil. Jé possuia como principal acervo 0 extrzordinario edificio projetado por Reidy, a cinemateca permanecera intacta, 0 museu se preparava para receber a colecdo Gilberto Chateaubriant, faltaria estender a sua aco para a fotografia, o campo das artes decorativas, das artes graficas ¢ da propria arquitetura, Nesse sentido, a fotografia foi o Primeiro passo e com a presenga de Pedro Vasquez na area conceitual, ¢ naquele momento Marcia Melo na érea de apoio, a instituigao pode criar um departamento de fotografia, ada tir 4 mil obras, desde de daguerredtipos até experimentos da década de 80, ¢, assim se fez tum acervo de 4 mil obras num periodo bastante estreito. Por um triz, escapamos daquilo que chamo de “turbanato” na cultura brasileira que se monta na década de 90, assaltando inclu- sive 0 mercado de fotografia histérica no pais. 32 Por quase uma década depois, esse acervo foi submergido numa deliberada estagnacio. O MAM e certas instituigdes brasileiras sio feitas a revelia do poder por curadores e coleciona- dores ¢ nao no campo da hierarquia. Gilberto Chateaubriant, 0 esteio cultural do MAM, com seu olhar generoso sobre a produc brasileira comeca no fim da década de 90 a olhar para 0 fotégrafos e para os artistas que usam o meio fotografico, expande o campo de sua colegio de modo que hoje os senhores tera nesse momento, no MAM do Rio, uma bela exposigio de novas aquisigdes em que se integram todlos os meios de linguagens. Depois, ainda, para falar do Rio de Janeiro temos que mencionar o Instituto Moreira Sales formando no apenas um acervo de ja quase 300 mil imagens, mas, sobretudo, um padrao, um paradigma, um valor no sentido de que o pais tao carente de referéncias, tem ali uma nova valoragao da fotografia. Evidentemente, que agdes dessa maneira implicam num empresariado iluminado. Também, em quadros técnicos, podemos mencionar o Franceschi e o Burgi, de modo que uma emprei- tada dessa natureza possa, finalmente, realizar aquilo que seria a conversio do capital finan- ceiro em capital simbélico. Eu, nesse répido arco das instituigdes, gostaria de conclamar para agora todo 0 apoio ao FotoRio e ao seu visiondrio Milton Guran, para a sua préxima edigio, nao é possfvel que se faga com tanto esforgo ¢ peniiria sem o apoio das instituigdes do Estado, Estado aqui eu digo nas trés instincias federal, estadual ¢ municipal, tendo em vista que 0 FotoRio é hoje 0 ‘inico evento que ainda mantém a cidade na rota internacional das artes plasticas. Promover © FotoRio & um esforgo urgente contra 0 colonialismo interno, cada vez, mais sustentado pela Lei Rouanet, que se fortalece no pais. Mas, ao mesmo tempo, eu tenho certeza de que essa é ‘uma luta numa cidade de trago canibal de seus intelectuais, do obscurantismo antifotografico de algumas universidades, de tal modo que eu acho que é um grande esforgo que se realize, que precisa de cada vez mais apoio. Assim sendo, tomamos a realizagio deste FatoRio como 0 momento de anunciar a constituigio da Colegio Nacional de Fotografia, no Museu Nacional de Belas Artes, que, de resto, tem em Milton Guran, talvez, 0 seu mais entusiasta apoiador. No entanto, gostaria, ainda, de indicar alguns desafios dessa tarefa. Ela surge numa situagao de excesso ¢ falta, Ela surge num espago de certo cansaco da fotografia em que hé excesso de presenga, excesso de noticia e de espetdculo imediato, excesso de convencimento como prova, excesso de saber, excesso de conceito, 0 excesso de manipulagao politica, excesso de arquivos € das formas de controle ¢ esquecimento no arque de Derrida ¢ na obra de Renné, excesso de auséncia, excesso de apropriagao como novo cénone, excesso do real e da incapacidade do cidadio frente a esse real manipulado pelas corporagoes internacionais de comunicagées, tio pavorosamente descrito por Paulo Virilio na sua Bomba da Informagdo. Pode-se falar, também, de uma onipresenga da fotografia. ‘Como Deus, a fotografia € onisciente ¢ onipresente, no entanto, entre as instituigdes brasileiras, foi, muitas vezes, uma auséncia, Por isso, eu queria ressaltar o papel de todos esses que recobra- ram nossas instituigdes fotograficas. Porque ela havia sido peso morto na Biblioteca Nacional eno Arquivo Nacional, virou um mausoléu no Museu da Imagem do Som e fantasma con- ceitual no Museu Nacional de Belas Artes. No ressurgimento dessas instituigdes museolégicas brasileiras da fotografia ndo deveriamos jamais esquecer do apoio decisivo da insubstituivel 38 Fundagio Vitae, que nos tiltimos 15 anos criou e constituiu infra-estrutura técnica para arqui- ‘vos de fotografia de norte a sul do pais. O antidoto para essa hiper-presenca da fotografia nao 0 déficit, e, mesmo em lugar da modéstia, talvez melhor, seja no caso do Museu Nacional de Belas Artes, pensar em uma nogio de justeza. Nao se trata de uma perspectiva heréica ou pessimista, mas entender face & consciéncia das limitagdes impostas pelas possibilidades do real de formago de um gigantesco acervo fotografico em nosso museu. A colegio deve buscar seu ponto de presenga equilibrada no contexto da cultura visual do Brasil, E no contexto da colegao geral do Museu Nacional de Belas Artes. E preciso que o MNBA esteja vacinado con- tra o mal de arquivo descrito por Derrida, conhecer 0s sintomas da febre arquivista ¢ medicar- se contra os procedimentos do controle € do esquecimento tao facil nos arquivos. O lancamento desta Colegio Nacional é o inicio de uma discussio do lugar da fotografia e dda propria missio requalificada do Museu Nacional de Belas Artes, justamente no momento que estamos iniciando 0 processo de elaboracao, em conjunto com a Fundagao Getulio Var- gas, d6 primeiro plano diretor de nossa instituicao. E um momento em que a instituigao vive um ponto crucial entre tornar seu espago, seu prédio, numa espécie de lugar de seqiiestro pelo conservacionismo cego ¢, ao mesmo tempo, buscar recompor a prevaléncia da reflexdo critica sobre a arte, sobre a tecno-burocracia ¢ a excessiva relevancia que sendo meio torna- se as vezes fim, que é a prépria museologia. Passo agora a discutir um aspecto que seria da transversal antropofigica na fotografia. Temos que reproblematizar a velha idéia de que @ fotografia seria um mecanismo de devoragao de almas. Assim a fotografia poderia ser tratada como uma componente significativa do processo antropofigico de constituigao da identi- dade, temperada com a produgao de subjetividade na experiéncia brasileira. Devemos, pois, continuar a desconfirmacao das nogdes ocidentais de canibalismo e reinventar uma idéia de antropofagia fotografica como processo politico de troca cultural. Como em casos essenciais como o da Claudia Andujar, ¢ aquilo que hoje se desenvolve entra algumas comunidades indigenas no Norte do pais, como no Acre. Uma questio de uma Colecao Nacional de Foto- grafia no MNBA seria respondida, primeiro porque a fotografia surge para alterar o dilogo imaginario no Brasil. ‘Do imagindrio de um pais que vinha de uma estrutura quase cega, de uma tradigio quase cega, que foi a auséncia de pintura, tem na fotografia um modelo moderno, sem grande gap centre a fundagio da academia e a introducao da propria fotografia no pais. Todos nés estaria- mos de acordo que a fotografia seja uma dimensao de arte essencial A cultura contemporanea. Esta no nosso inconsciente ético, citando Kraus, no grao da voz das poéticas visuais, pensando em Barthes, todo o nitcleo produgio contemporanea. A missio de nosso Museu Nacional isso Lebreton, e a fundacio da de Belas Artes surge em 1816, com a Missio Francesa, a Academia encaminhando-se rapidamente para a construgio de um arco da histéria da arte brasileira, do colonial ao contemporaneo, posto em didlogo com as primeiras civilizagdes que aqui estavam e com a arte internacional. Por isso, so muito bem vindas as doagdes de fotégrafos estrangeiros, que jé anunciaram doa- ‘ges a0 MNBA, como o artista polonés radicado na Franga Piotro Klansky ¢ o portugués Jorge 4 Molder. Tomada ainda como produgao simbolica, a arte brasileira, no acervo do MNBA, deve cada vez mais testemunhar a nossa propria historia, sua diversidade de meios e estratégias soci- ais da arte e da cultura visual, Abrigar as fronteiras entre os meios, a multiplicidade geogrfica © suas nuances culturais, a nossa prépria pluralidade de informagao. A fotografia talvez seja 0 meio que melhor nos propicie, hoje, esta ampliagio do escopo simbilico da produco do Bra- silno seu Museu Nacional de Belas Artes. Guia-nos aqui uma explicagdo de Clarice Lispector sobre © Brasil e os brasleiros: “somos unidos, existimos por uma vontade de participar” Gostaria de assinalar neste momento a doagiio pelo IRB'de uma selecao de imagens de Alberto Ferreira, a partir das gestdes do Milton Guran, Também assinalo as doaces jé realizadas Pelos préprios artistas, por seus herdeiros ou terceiros, ou em processo de concretizaco que Constituem aquela vontade de participar que nos falava Lispector. Assim nos chegam obras de Chico Albuquerque, Claudia Andujar, Orlando Azevedo, Luis Braga, Miguel Rio Branco, Mario Gravo Neto, Alberto Ferreira, Milton Guran, Ana Maria Maiolino, Augusto Malta, Vik Muniz, César Oiticica, Helio Oiticica, Julio Bressane, José Oiticica Filho, Joaquim Paiva, Rosangela Renné, Vilma Slomp, Paula Troppe, Adriana Varejao, Pedro Vasquez, num hori. zonte jé constituido ¢ a se constituir brevemente. Finalmente, bastaria nesse processo uma Justicativa porque a propria fotografia compe o campo da arte, ¢ a arte é, segundo Mario Pedrosa “a resisténcia possivel ao processo entrépico da vida”. Milton Guran Muito obrigado, Paulo, com a palavra Joaquim Marcal: Joaquim Marcal Boa tarde a todos. Em primeiro lugar agradeco o convite, quero dar os parabéns ao Milton Guran ¢ toda equipe do FioRio e desejar vida longa a este encontro. Paulo Herkenhoft jé falou muito bem da importincia desse evento, ndo apenas para o Rio, mas para o Brasil ¢ como contribui¢do mesmo para a comunidade internacional. Agradeco, também as palavras do Paulo Herkenhoff , sempre me sinto emocionado, sempre lembro que esse é um trabalho na Biblioteca Nacional que nai € apenas meu, na verdade é um trabalho de toda uma equipe. Em alguns momentos o préprio Paulo Herkenhoff, tenho que devolver aqui, também foi uma figura muito importante, pelas propostas, pela firmeza, pelo apoio. Na Biblioteca, ao longo desses iltimos 20, 25 anos em que a gente esta lé trabalhando deve- ‘mos muito a intimeros colegas, alguns deles desde 0 inicio até hoje, outros que ja se foram. E « colegas das outras instituigdes com as quais a gente trabalhou o tempo todo desde o inicio, 20 qual o Paulo Herkenhoff se referiu, como por exemplo, Solange Ziiga, que eu vejo aqui, que era da Funarte, a Sandra Baruki, e a equipe dela, também, participaram a partir de certo ‘momento, enfim... Esse um trabalho da Biblioteca, envolveu muita gente nio s6 da Biblioteca, mas de outras instituigSes, especialmente da Funarte, mas, também, de outras insttuigées brasleras, Em muitos momentos a gente contou com o apoio, também, de etrangeiros, ejo, 5s Por exemplo, o Peter Mustardo aqui, uma pessoa que no inicio do trabalho também nos aju- dou como consultor. E um trabalho de muita gente que continua, Bom, eu estou me propondo aqui a falar hoje um pouquinho da experiéncia da Biblioteca Nacional. Se a gente considerar que, no campo das bibliotecas, a Biblioteca Nacional seria nossa principal referéncia enquanto meméria da cultura brasileira no plano bibliogrfico, Entio, me proponho a falar um pouco sobre as origens, o estigio atual e as perspectivas da nossa colesdo fotografica. Embora as bibliotecas nacionais estejam tradicionalmente vincu- ladas as questBes que giram entorno do livro e dos documentos escritos em geral, os acervos de imagens sempre tiveram lugar de destaque em muitas delas, como acontece na Biblioteca Nacional do Brasil, que desde as suas origens hd quase dois séculos - a data oficial de fuandacio

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