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MEMORIAS Do INSTITUTO OSWALDO CRUZ Tomo XxVII Setembro —-1933 Fasciculo 3 Contribuigao 4 EPIDEMIOLOGIA E PROPHYLAXIA DA LEPRA NO NORTE DO BRASIL ©) por H. C. de SOUZA-ARAUJO, Dr. Med., Dr. P. H. Chefe do Laboratorio de Leprologia do Instituto Oswaldo Cruz (Com as estampas XXXV—LXXIX). I. INTRODUCCAO A 14 de Dezembro de 1932 fui convidado por Suas Excias. os Snrs. Chefe do Governo Provisorio e Ministro da Educa¢&o e Satide Publica para fazer uma inspeccio preliminar sobre a situagdo do problema da lepra nos Estados do Norte, afim de elaborar um plano para a sua prophylasia, No desempenho dessa honrosa incumbencia parti para o Paré, em aviiio da «PANAIR», no dia 14 de Janeiro ultimo, nao tendo partido antes por motivo extranho 4 minha vontade, (*) Relatorlo apresentado ao Exmo, Snr, Prof, Dr, Washington Pires, Ministro da Educagio e Satide Publica, em 31 de Maio de 1933, 165 166 Memorias do Instituto Oswaldo Cruz XXVIT, 3 No mesmo dia 14 recebia 0 Exmo. Snr. Major Magalhaes Barata, In- terventor Federal naquelle Estado, o seguinte telegramma: «RIO, 14 de Janeiro. Apraz-me communicar-Ihe que seguiu para ahi o Dr. Souza Araujo, commissionado pelo governo para estudar o pro- blema da lepra no Paiz e propér medidas para a sua solucio, devendo co- megar os seus trabalhos por esse Estado. Saudacdes cordeaes. (a) GETULIO VARGAS, Chefe do Governo Provisorio». De Victoria até Belém do Pars, com excepc%io apenas de dous Es- tados, as auctoridades sanitarias esperavam-me nos respectivos aéroportos. Pude, assim, combinar com todas ellas a obtencao de dados estatisticos so- bre a lepra e trocar ideias sobre a melhor maneira de se crear ou intensifi- car a prophylaxia dessa doenca, em cada Estado. Na ida fui directa- mente até Mandos, onde iniciei os meus trabalhos. Na volta detive-me al- guns dias em cada capital. Em todos os Estados as auctoridades sanitarias facilitaram-me sobremaneira a minha missio, pelo que Ihes hypothéco a minha sincera gratidao. O meu tempo era limitado, por isso nao fui até ao Acre, assim tam- bem, por difficuldades de transportes, deixei de visitar 0 Piauhy e Sergipe. Os dados sobre a lepra nestes Estados, que aqui figuram, sio devidos 4 gen- tileza das respectivas auctoridades sanitarias. Em cada capital, apés a minha visita 4s organizacdes anti-leprosas existentes, convoquei os technicos estadoaes (hygienistas, leprologos, enge- nheiros, directores de obras publicas, etc.) para uma reunifio, onde se dis cutiu, francamente, a real situac¢o do problema e se accordaram as medidas de prophylaxia a serem suggeridas a0 Governo Federal. Essas reuniées te- chnicas foram presididas, algumas vezes, pelos respectivos Interventores Federaes ou pelos seus substitutos. Os assumptos ventilados nessas reunides foram subordinados ao seguinte questionario, que organizei para esse fim: 1) Quantos leprosos esto recenseados no Estado ? 2) Qual o seu total approximado ? 3) Quaes sfo os principaes fécos ? 4) Quantos esto isolados ? 5) Como resolver o problema ? 6) Quaes as medidas mais urgentes ? 7), A séde do leprosario € adequada ? 8) Convém ampliar o leprosario... ? Setembro, 1933 Souza-Araujo: A Lepra no Norte do Brasil 167 9) A situagio exige a creaciio de sanatorios para doentes abastados ? 10) Convém fundar dispensarios ? 41) Como realizar as obras ? 12) Como custear os servicos contra a lepra ? Ficou assim dividida a minha responsabilidade porquanto todas as medidas aqui indicadas foram largamente discutidas entre os interessados. Raros itens do meu questionario nao lograram um accordo unanime, sa- lientando-se, entre esses, o da frequencia da leprose. Para cada Estado 0 estudo é feito em trez sub-capitulos principaes: 1) Historico, 2) Situaciio actual, 3) Prophylaxia. E no final do relatorio minucioso de cada Estado indiquei as medidas prophylacticas urgentes e complenientares para alli se controlar o grave flagello. Indiquei essas medidas duma maneira geral, dando, entretanto, 0 or- camento approximado para cada obra a ser realizada. Os projectos e orga- mentos definitivos serio objecto de estudos posteriores, quando 0 Governo resolver iniciar a redemptora can:panha. A receita do sello «Eduvacio e Saude» garante recursos sufficientes para essa patriotica campanhi, que so extenderd, progressivamente, a todo © Paiz, e cujo successo dependeré muito da capacidade e efficiencia techni- cas do pessoal incumbido de a executar. Onde ir seleccionar e como prepa- rar esse pessoal technico jf indiquei a Ss. Excia. o Snr. Ministro da Educa- cao e Satide Publica, em saemorial elaburado a seu pedido e que lhe entre- guei no dia 9 de Dezembro de 1932. Todos sabem que o Brasil é hoje um dos maiores fécos de lepra, do mundo, e tambem ninguem ignora que elle € um dos paizes mais atrazados na organizacao prophylactica desse terrivel flagello. Appello, portanto, para © patriotismo dos nossos dirigentes, lembrando-lhes que essa humanitaria campanha nao pdéde mais ser procrastinada, e que sendo re-iniciada agora, com o caracter de «nacional», nao deve soffrer nunca mais solugao de con- tinuidade. ‘Aos Exmos. Snrs. Drs. Getulio Vargas e Washington Pires agradeco a opportunidade que me déram para realizar este trabalho. Manguinhos, 31 Maio de 1933 H. C. DE SOUZA ARAUJO. 168 Memorias do Instituto Oswaldo Cruz XXVII, 3 II. A LEPRA NO TERRITORIO DO ACRE HISTORICO A Commissio composta dos Drs. Carlos Chagas, Pacheco Lefio e Joao Pedroso, designada por Oswaldo Cruz para estudar as «Condigdes medico- sanitarias do valle do Amazonas», trabalhou, intensamente, durante 10 dias (20 a 30 de Dezembro de 1912), em Rio Branco, e nesse periodo s6 encon- trou alli dous casos de lepra tuberculosa (p. 23 do relatorio de (Oswaldo Cruz, Rio, 1913), pelo que se conclue que essa doenca nao era frequente no Acre, ha 20 annos. Mas, 4 pagina 52, desse mesmo relatorio, diz Oswaldo Cruz: . (J. L, Magalhdes — A Morféa no Brazil, Rio, 1882, p. 18). Em relatorio apresentado, em 20 de Agosto de 1888, ao Presidente da Setembro, 1933 Souza-Araujo: A Lepra no Norte do Brasil 173 Provincia pelo Provedor da Santa Casa de Mantos, Francisco P. R. Bitten- court, elle communicava que: «os morpheticos, por falta absoluta de local apropriado onde sejam recolhidos ¢ tratados, esto destinados a transitar € a mendigar pelas ruas da cidade». Em 12 de Fevereiro de 1889 0 Governo adquiriu do Dr. Joao Hos- sannah de Oliveira uma chacara, existente 4 margem do arroio Cachoeira Grande (hoje séde do Matadouro publico), ¢ entregou-a 4 Santa Casa para fundar alli o lazareto para os leprosos que vagavam pelas ruas da cidade, o qual, creado, recebeu o nome de Lazareto Bardo de Mandos, mas teve exis- tencia ephemera. Em 1900 0 Dr. Jonathas Pedrosa, grande clinico na capital amazo- hense, affirmava que «no interior do Estado os casos (de lepra) so raros; indo em maior numero em Maniios, onde se contam de 40 a 50 lepro- sos». (J. L. Magalhaes, La lépre au Brésil, Rio, 1900, p. 132), Segundo o Dr. Belmiro Valverde 1930 Hd, do. 1931 96 1932 122 » 1933 (até 23 de Janeiro) ees Setembro, 1933 Souza-Araujo: A Lepra no Norte do Brasil 177 Idade actual dos doentes De 1 mez a 5 annos 8 De 6 annos a 10 56 De 11 >» >» 20 241 De 21 >» » 30 271 De 31 » » 40 361 De 41 > » 50 253 De 51 » > 60 149 Mais de 61 annos 49 Informes deficientes 48 1.436 Estado civil Casados 510 Solteiros 590 Viuvos 158 Menores de 14 annos 134 Informes deficientes 44 1.436 Racas Brancos 715 Mesticgos (com indios e negros) 583 Pretos 38 Sem declaracio 100 1.436 Diagnose das leproses Leprose tuberosa 186 Dita anesthesica 1.059 Dita mixta 191 1.436 178 Memorias do Instituto Oswaldo Cruz Nacionalidade dos doentes Brasileiros Portuguezes Hespanhées Ttalianos Peruanos Syrios ‘Turcos Bolivianos Inglezes Barbados Venezuelano Colombiano Polonez Rumaico Marroquino Naturalidade dos brasileiros Acre Amazonas Para Maranhio Piauhy Ceara Rio Grande do Norte Parahyba Pernambuco Alagoas Sergipe Bahia Rio de Janeiro Districto Federal S. Paulo Rio Grande do Sul Minas Geraes Matto Grosso Sem declaracdo 1.305 mh 1 T 5 1 8 4 4) 7 2 2 1 ul t i 1 198 69 48 23, 373, XXVII, 3 Setembro, 1933 Procedencia dos doentes por municipios Rio Negro Manos Moura Barcellos S. Gabriel Sem declaragio de municipio Rio Branco Boa Vista Rio Solimées Manacapurit Coary Codajas Fonte Boa S. Paulo de Olivenca Tefé Benjamim Constant Sem declaragao de municipio Rio Puris Canutama Labrea Floriano Peixoto Rio Amazonas Itacoatiara Urucurituba Parintins Maués Rio Madeira Borba Manicoré Humayta Porto Velho Rio Jurud Carauary S. Felippe Souza-Araujo: A Lepra no Norte do Brasil 797 on oe 80 19 59 28 5 - sae Cy 179 180 Memorias do Instituto Oswaldo Cruz XXVII, 3 Procedente do: Acre St Matto Grosso 13 Para 10 Rio de Janeiro 2 Informes deficientes 13 1.436 Discriminacdo dos doentes do Municipio de Mandos quanto 4 procedencia Manos (séde) 569 Careiro 78 Cambixe 26 Purupurt, 16 Janauacd 22 Curari 30 Terra Nova Cacau Perera Lago Alexo Parana da Eva Iranduba Cataldo Varre Vento Xiburena Paricatuba Autaz-miri Anwes Airao Taupessassu Tabocal Ubim Acajatuba Lago Preto Mamori_ Marapata Amatari Ignorado ARR E ENV RRA OEN ROH AME | | | 797 Setembro, 1933 Souza-Araujo: A Lepra no Norte do Brasil 181 Dos 569 leprosos de Mandos, da presente estatistica, cerca de 60% j4 residiam nella ha muitos annos. tendo adquirido o mal em outros pon- tos do Estado. Estatistica de accérdo com as profissées e occupacdes Advogado ¢x-promotor ‘Advogado Auxiliar de professora Alfaiates Acougueiros Balateiros Barqueiro Barbeiro Cocheiro Catraieiro Canoeiro Caucheiro Carreiro Commercio Carpinteiro Conductor de bonde -osinheiro Costureira Carapina Chauffeur Caleeteiro Caldereiro Domestica Desenhista Encadernador Empregado publico Idem idem aposentado Electricista Engenheiro Escolar Estivador Funileiro Ferreiro Foguista Fazendeiro Fundidor Guardador de gado Engommadeira Guarda-livros Industrial Jornaleiro Jardineiro Leiloeiro © s nes SH MVERIR SRV OR MW NMENM WHEE MONEE DEN WR RADDA HEE x | | = & o Lavoura Lavadeira Lenhador Maritimo Marcineiro Mariscador Magistrado Militar Machinista Mechanico Marmorista Motorista Mateiro Modista Musico Negociantes Ourives Proprietario Empr. estrada de ferro Engraxate Estudante Rendeiro Regatiio Sapateiros Servente do Mercado Sem declaracao Torneiro Taifeiro Vendedor de leite Vendedor de peixe Padeiro Pintor Pedreiro Pescador Seringueiros Serraria Serralheiro Sem occupaciio Telegraphista Vaqueiro Vendedor de fructas Usineiro (assucar) 486 co mo eo 2 NOW RR RRR ORME OR NV ROR ER EEO _ a it oo Bree ee | | i 1.346 182 Memorias do Instituto Oswaldo Cruz XXVI, 3 E’ alarmante, nesta estalistica, a frequencia da lepra entre pess6as que vivem em contacto com o grande publico ou com a juventude Pela estatistica publicada pelo Dr. Matta, em 1929 (Sciencia Medica, Ne 3), quando o numero de fichas era de 971, os doentes do sexo masculino altingiam) a 69 9%. Hoje ainda excedem a 65%, 0 que se explica pelos dados epidemiologicos da regia, quasi os mesmos para todo o mundo. es 1.436 leprosos fichados 0 Dr. Matta calcula haverem fallecido 200 no correr destes ultimos 10 annos. SITUAGAO At AL Cheguei a Mandos no dia 21 de Janeiro de 1933. Nos 3’dias que alli permaneci reuni os dados sobre a situacio do problema da lepra. Gracas 4 béa yontade do Interyentor Federal interino, Professor da Faculdade de Direito, Dr. Waldemar Pedrosa, ¢ do Prefeito de Mandos, Engenheiro Cae- tano Cabral, tudo me foi facilitado. Os meus distinctos collegas Drs. Flavio de Castro, director interino dos Servigos de Prophylaxia (pelo Estado) e Alfredo Augusto da Matta, director da Hygiene Municipal e ad honorem chefe do Dispensario de Lepra (pela Municipalidade, especialmente desig- nado pelo Prefeito Cabral), foram os meus incangaveis collaboradores. Visitémos juntos 0 Leprosario de Paricatuba, 0 do Paredao — ainda nao utilizado —, o Dispensario da Lepra, o Instituto Pasteur, o Preventorio para filhos de leprosos e os Servicos de Prophylaxia, mantidos pelo Estado com sacrificios dignos dos maiores elogios. Fiz ainda outras visitas de interesse sanitario, como do Mercado Municipal, do Servico de Aguas, ete LEPROSARIO DO PAREDAO.—Situado 4 margem esquerda do Rio Negro, defronte da f6z do rio Soli- mées e a 3/4 de hora em lancha, de Mandos, ou 20 minutos em automovel, pela estrada de Cachoeirinha. Esta situado em local elevado, salubre e de bela vista. A construcc¢ao desse estabelecimento, feita na administracgio do. Dr. Ephigenio Ferreira de Salles, durou 3 annos (1926—1929), tendo custado mais de 1.200 contos, devendo o Estado ainda cerca de 200 contos ao seu constructor, Engenheiro Caminha. 0 terreno pertencente ao Leprosario é pequeno — uns poucos hecta- res—, unico deffeito, segundo o Dr. A. da Matta, que impede de se trans- formar o estabelecimento em colonia. Como esta é optimo para sanatorio. A administragao. — Os edificios da administragio estao situados § cerca de 100 metros da margem do rio Negro, numa pequena praia arenosa, de pouco calado. Grande escadaria e paredio Setembro, 1933 Souza-Araujo: A Lepra no Norte do Brasil 183 de cimento dao accesso ao editicio central da administracio, construido, como os outros dois, de alvenaria de tijollos e cobertura de telhas francezas. Esse edificio central, de 2 pavimentos, destina-se 4 séde de toda a adminis- traco, taes como residencia do medico-director, portaria, secretaria, almo- xarifado, etc. Existe alli o centro telephonico do estabelecimento, que se communica com Mandos. Esse edificio, dotado de béas installacées de agua, luz e sanitarias, esté prompto para immediata utilizagio. A’ direita e 4 esquerda delle existem 2 casas terreas destinadas 4 residencia do pessoal subalterno e installacio das machinas. A administracio se communica com o leprosario por meio de uma escadaria de cimento, com mais de 100 degréos, que dA accesso 4 capella e 4 casa das religiosas. Essa escada, que o Dr. Achilles Lisboa achou bas- tante penosa para um homem da sua edade galgar, duas ou mais vezes ao dia, foi o principal motivo que o levou a condemnar 0 estabelecimento. (v. «A campanha contra a lepra no Amazonas iniciada pelo Dr. Achilles Lis- béa>. Folheto de 61 paginas, Imprensa Publica, Mandos, 1930). Zona dos doentes. — O leprosario consta de: 1) Um pequeno edificio de tijollos, situado atraz da residencia das religiosas, de um lado destinado 4 Pharmacia «Achilles Lisb6a» e do outro, com frente para a praca principal, ao Dis- pensario «Eduardo Rabello>. A praca principal é toda ajardinada, com canteiros cereados de blo- cos de cimento e tem varios bancos de pedra. No centro existe um repicho. 2) Todas as demais construcgdes sio de madeira (as paredes de ce- dro, taboas sobrepostas horizontalmente), sobre pilastras de alvenaria de tijollos, telladas, envidracadas e cohertas de telhas francezas, Sao ao todo cerca de 30, assim discriminadas: Um refeitorio geral, na frente da praca, seguido da cozinha geral e do edificio de diversdes denominado Escola-theatro «Souza Araujo». 6 ca- sas de habita¢ao collectiva, tendo uma yaranda tellada na frente, um salio com 5 janellas de cada lado, destinado a 20 camas, 2 banheiras ¢ 2 sentinas. Uma destas casas, situada 4 direita da praca, é destinada ao hospital do le- prosario, Essas casas so telladas, forradas e tém oculos de ventilacao no soto. 20 casas geminadas para 2 casaes ou 4 doentes solleires, comprehen- dendo: 2 varandinhas telladas na frente (sala de estar), 2 quartos, 1 sala, 1 banheiro e 1 sentina para uso commum. Uma casa para os padres, Uma Javanderia, Uma prisio. As construcgdes © installacdes terminaram em fins de 1929 quando © governador do Estado, Dr. Ephigenio Salles, declarou inaugurado official- mente o leprosario, que recebeu o nome de «Belisario Penna», Entretanto 184 Memorias do !nstituto Oswaldo Cruz XXVII, 3 os doentes de Umirisal nfo chegaram a ser transferidos para alli, porque 0 servico de captaciio de agua nao ficou terminado. O estabelecimento do Paredio, de aspecto elegante e construido a capricho, ficou abandonado durante 3 annos. Ha cerca de 4 mezes os pa- dres salesianos, com ordem do Interventor Federal, Commandante Rogerio Coimbra, comecaram a remover do paredio para o alto Rio Branco todo o material das installacdes de luz clectrica, de agua e exgottos. Removeram as bacias sanitarias e lavatorios de todas as casas (sé respeitando a casa das religiosas e a da administracio), a caixa d’agua e todo o seu encanamento e estio terminando o desenterramento das manilhas dos exgotlos. Até os postes da luz electrica foram arrancados ou cortados a machado ! Essas depredagées causaram grande prejuizo ao Estado, que, para aproveitar o estabelecimento teré agora de despender o dobro nas reinstal- lacdes desses servicos. Abandonar tudo seria impatriotico. Remover dalli as casas para 0 Paricatuha seria aproveitar algo. Mas o preferivel é recons- truir o destruido ¢ utilizar todo o estabelecimento para sanatorio de lepro- sos abastados e casos incipientes, curay A meu pedido o Interventor Federal interino, Dr. Waldemar Pe- drosa, ia sustar a obra destruidora dos salesianos ¢ aguardar uma solucdo do Governo Federal, sobre 0 aproyeilamento de tudo aquillo in loco: LEPROSARIO BELISARIO PENNA. ituado 4 margem direita do Rio Negro, no logar chamado «Paricatuba», 2 horas acima de Manios, em lancha 4 gazolina. O local é bonito, bem ventilado e salubre. O terreno pertencente ao leprosario é bastante vasto. A séde consta da zona chamada limpa, cerca de um hectare, onde se acham a casa das machinas,—captacio dagua, uzina de luz e forca—, a casa do medico e pharmacia. Essa pequena area ¢ fechada por uma cerca de arame. Moram alli, em casa annexa 4 uzina, os unicos dous empregados sadios do estabelecimento: 0 machinista e 0 foguista, os quaes ganham, respectivamente, 4508000 e 2408000 mensaes. Zona dos doentes. — O leprosario consta de: 1) Edificio central—grande construcciio, qua- drada, de alvenaria, cercada de varandas, piso cimentado, cobertura de te’ thas, tendo no centro um grande pateo. Alli funccionou, antigamente, a hos- pedaria de immigrartes. Nesse edificio existem: 10 salées dormitorios, com 280 doentes, i sala de musica, 1 sala bibliotheca-escola, 1 saldo refei- Setembro, 1933 Souza-Araujo: A Lepra no Norte do Brasil 485 torio geral, 1 cozinha-geral (fogao a lenha e 3 cozinheiros leprosos inacti- vos), 1 refeitorio para os empregados ¢ 3 chuyeiros ¢ 3 latrinas em cada uma das quatro alas. 2) Pavilhao «S. Lazaro»—mandado erigir pelas «Damas Protectoras do Leprosario», tendo custado cerca de 25: 0008000. Este pavilhio, todo de madeira, construido sobre pilastras de alyenaria de tijollos, é«cereado de varanda, coberto de telhas francezas e tellado. Esté dividido em 20 quar- tos, cada um tendo porta e janella para a varanda, com a 4rea de 8,10 ms2. Vi em cada quarto 2 camas ou rédes, com mosquiteiros. Devido ao calor os doentes conservam abertas as portas e janellas, dando entrada 4s moscas e mosquitos. Esse payilhdo nio tem agua corrente nem installacdes sanitarias, 6, porém, como todos os demais, illuminado 4 luz electrica. 3) 12 casas de madeira, para casaes, construidas numa unica fileira, A direita do edificio central. Essas casinhas, que so cobertas de telhas, tém agua encanada e luz electrica, custaram apenas 15 contos de reis (4: 2508000 cada uma) na administracio do Interventor Federal Rogerio Coimbra. Cada casa tem, no quintal, uma fossa perdida e terreno para horta e jardim. 4) Uma capella. 5) Uma sala de curativos, funccionando num pequeno quiosque junto 4 capella, tendo 2 torneiras com agua corrente e lavapés. 6) Uma lavanderia manual, atraz do edificio central, contendo 10 tanques com agua corrente. As lavadeiras sio enfermas. Asylados. — No dia 21 de Janeiro havia 309 leprosos asylados, na maioria (909%) casos avancados e activos, dos quaes os mais graves (cerca de 50), estavam na enfermaria. Servico medico. — Na ala da fronte do grande pavilhao existe o dispensario medico. Dous enfermeiros doentes attendem, alli, todas as manhiis, os doentes que desejam tomar injeccdes de derivados de chaulmoogra. Dos 309 apenas 70 se sujeitavam a esse irata- mento, Nao ha, no leprosario, como seria de desejar, um medico residente. E 0 proprio director do Servigo Sanitario do Estado quem visita o lepro- sario, uma yez por semana, percebendo uma gratificacdo de 1003000 por visita. Havia no dispensario regular stock dos seguintes medicamentos: 186 Memorias do Instituto Oswaldo Cruz XXVII, 3 Antileprol Bayer, Hansenyl Granado, Carpotreno A e B Machado, Alepol Wellcome Borroughs, Esteres do Instituto Oswaldo Cruz, verminoticos e medicamentos auxiliares. Administracio. — E’ administrador do leprosario o sergipano Joye- niano Alves, de 33 annos de edade, caso de lepra inactiva, que se acha isolado ha 6 annos. © administrador, que me pareceu ser homem bom e efficiente, re- cebe a gratificacdo mensal de 1203000. Ajudam-no, nos servicos internos, cerca de 30 leprosos, dos quaes 4 exercem funccdo policial, mediante pe- quenas gratificacdes. 0 enfermeiro ganha 60$000 e os 2 ajudantes 303000 cada um. A despesa principal do leprosario é custeada pelo Estado do Amazo- nas, Cada doente custa-lhe, diariamente, apenas 1$400. As «Damas Protectoras do Leprosario» e 0 commercio de Mandos fazem donatiyos periodicos ao leprosario. A vida. — O regimento interno do leprosario 6 muito severo, segundo me declarou o seu director, Dr. José Augusto Linhares. Os doentes apparentam aspecto triste, infeliz, mas sfio disciplinados e trabalhadores. Nos arredores do estabelecimento tém elles grandes plan- tages. O terreno é todo fertil. A yestimenta dos doentes 6, como convém, por causa do clima, muito yudimentar: a maioria usa pyjamas e sapatos de panno. ABRIGO MENINO JESUS.—Em 21 de Abril de 19280 Dr. Samuel Uchéa, director dos servicos de Sanea- mento Rural, fundou em Mandos a Créche «D. Alice de Salles», destinada aos filhos de leprosos. A administracdo revolucionaria deu-lhe nova séde € novo nome: «Abrigo Menino Jesus», installado num excellente edificio publico de 2 pavimentos, situado em centro de terreno, 4 rua Duqite de Caxias, n° 1, em Mandos. © sua directora D. Maria de Miranda Leaio («A miesinha>) e me- dico honorario o Dr. A. da Matta. No dia da minha visita (23-1-933) havia alli 15 filhos de leprosos, © mais mogo de 40 dias e 0 mais velho de 11 annos. Em 1932 morreram alli 5 recemnascidos, dos quaes 2 nao eram filhos de ileprosos, mas kim lengeitados no jardim do abrigo. Setembro, 1933 Souza-Araujo: A Lepra no Norte do Brasil 187 Custeio. — A despesa mensal do estabelecimento de 2: 4003000, ou seja um per capita de 1608000. O governo do Estado di-lhe séde, agua e luz e 5008000 mensaes a Prefeitura de Mandos auxi- lia-o com 4008000. As Prefeituras do interior ajudam, periodicamente, com alguma cousa. O estabelecimento est com deficit de meia duzia de contos. DISPENSARIO DE LEPRA. -Annexo ao Instituto Pasteur (Avenida 7 de Setembro, lado Oeste, Manios) existe, desde Marco de 1922, 0 Dispensario «Oswaldo Cruz» com uma seceaio de Doengas Venereas, funccionando diariamente das 7 4s 10 (homens) e das 13 4s 16 horas (mulheres), e outra de Lepra, funccionando, em pequeao edificio independente, 4s tercas ¢ sabbados, das 7 4s 10 horas. O Dr. A. da Matta, director de Hygiene Municipal de Mandos 6, ex-officio, director do Instituto Pasteur. Neste estabelecimento existe um laboratorio destinado aos dous servicos — lepra e doengas venereas—, estando, porém, suspensas as pesquizas s6rologicas, ha mais de 1 anno, por falta de verba Dos 663 leprosos fichados na capital, cerca de 200 estio matricula- dos no Dispensario. E’ enfermeiro do Dispensario, desde 1922, Malachias Péres Duarte (3008000 mensaes) que attende nfo sémente na séde como tambem em domicilio, os leprosos em tratamento, O guarda-sanitario en- carregado da remocio dos leprosos, Joaquim Felix de Araujo, ganha 2608000. O Servico de Vigilancia domiciliar dos leprosos, que era feito por 2 guardas-sanitarios (2003 cada um) esta suspenso por falta de verba, desde 30 de Dezembro de 1930. No Dispensario o Dr. Matta vaccina e examina (para effeito do diag- nostico da lepra) todos os menores destinados 4 matricula nas escolas pu- blicas ou particulares. Em 1925 os Professores Richard P. Strong e George C. Shattuck, membros da Missio Scientifica Hamilton Rice, visitaram o dispensario e declararam que: «As condigées hygienicas do dispensario eram excessivamente pobres. Alli niio existe logar adequado para a desinfecedo dos instrumentos nem agua corrente. Observimos, ndo sem frequencia, leprosos em diffe- rentes pontos da cidade assim como nos bondes electricos>. Contam que yiram um leproso e uma leprosa no hospital da Santa Casa, em promiscuidade com doentes de outros males e accrescentam que: «A yista destas condicdes parece certo que a doenca continuard a augmentar ». a 188 Memorias do Inslitulo Oswaldo Cruz XXVIIL, 3 Em Nova York tambem dezenas de leprosos andam correndo hos- pitaes e ambulatorios, em franca promiscuidade com outros enfermos ou Ppess6as sadias, como pude verificar em Agosto de 1925. .Depois de se manifestarem a favor da transmissio da lepra por con- tacto, de homem a homem, os auctores affirmam: «From a study of the question there would appear to be little doubt that the disease is spreading in parts of Amazonia particularly on account of the faillure to isolate sufficiently cases which are in’ the active stages of the disease». (Medical Report... Hamilton Rice, Cambridge, Harvard University Press, 1926, pp. 64, 65 e 67). O quadro abaixo mostra como esta reduzida a frequencia do dispen- sario, em relacio a 1930: de 400 doentes por mez baixou a 50. Anno de 1930 (Média_mensal) Anno de 1932 (Média _mensal) Mulheres 9 Mulheres 72 Meninos 10 Meninos 80 Meninas 5 Meninas 40 50 400 | | Homens 26 Homens 208 PROPHYLAXIA Na tarde de 23 de Janeiro de 1933 realizou-se, no Palacio do Go- yerno, uma reunifio de technicos, convocados a meu pedido, afim de dis- cutirmos a situacio do problema da lepra no Estado e combinarmos as medidas de prophylaxia a serem suggeridas no meu relatorio, Compare- ceram 4 reunitio: Interventor Federal interino, Professor Waldemar Pe- drosa, que a presidiu; Sccretario Geral, Snr. Raymundo Nicolau da Silva; Prefeito de Mandos, Dr. Caetano Cabral; Director dos Servigos Techaicos, Dr. Lourival Moniz; Director interino do Servigo de abastecimento de agua, Dr. José Ferreira da Silva Junior; Director interino da Prophylaxia Rural, Dr. Flavio de Gastro; Director de Hygiene Municipal, Dr. Alfredo da Matta eo Dr. H. C. de Souza Araujo, commissionado pelo Ministerio da Educacao e Satide Publica. Setembro, 1933 Souza-Araujo: A Lepra no Norte do Brasil 189 Depois do exame de varios dados e da discussio dos itens do meu questionario, ficou esclarecida a situacio assim: 1) De 1922 a 1933 (23 de Janeiro) foram recenseados no Estado 1.436 leprosos, dos quaes provavelmente ja falleceram 200. 2) Para 400.000 habitantes estima-se em 3.000 0 total dos leprosos. 3) Os fécos priucipaes sao: Municipio de Mandos, com 570 leprosos tichados, dos quaes cerca de 250 ja esto isolados em Paricatuba; Manaca- puri, com cerca de 240, dos quaes 80 fichados c Fonte-Boa, 0 maior féco do interior, com 59 leprosos fichados. 4) Estao isolados em Paricatuba 310. 5) Crear nos terrenos do Paricatuba uma colonia agricola para 700 leprosos (Dr. Matta e Dr. Souza Araujo). 6) Medidas mais urgentes a) Installagdo de um dispensario modelo, em Manéos, incumbido dos exames diagnosticos, do tratamento ambulatorio dos casos incipientes e da vigilancia domiciliar dos leprosos nao isolados ¢ dos seus communicantes. b) Intensificacéo do censo no interior, por meio de commissdes am- bulantes. c) Acquisi¢do de uma embarcacdo adequada para o transporte de leprosos. d) Melhorar as condigdes do Asylo de Paricatuba 7) Utilizar 0 leprosario do Paredao para leprosos de classe e inci- pientes. 8) Construir em alvenaria os edificios da séde da colonia agricola e em madeira de lei todas as residencias. 9) Realizar essas obras por concorrencia, 10) Mandar fazer o levantamento topographico ¢ o nivelamento dos terrenos pertencentes ao leprosario de Paricatuba, afim de se escolher a séde do nucleo agricola, N. B. O Interventor, Dr. W. Pedrosa, me declarou que o Estado nao péde contribuir para essas obras, nem manter, sem 0 auxilio da Unido, os servigos sanitarios existentes, 190 Memorias do Instituto Oswaldo Cruz XXVII, 3 As suggestdes prophylacticas dividem-se em: a) Medidas urgentes — a) Distribuigio do credito de 600: 000$000; b) fundacao de um nucleo agricola, para 500 leprosos, nos terrenos do actual leprosario de Paricatuba. Essa construccao, em madeira, com excep- go dos edificios da séde que deveriio ser de alvenaria de tijollos, custara alli cerea de 250 contos ou sejam 5008000 per capita, de alojamento. A séde constaré, apenas, de: 2 pavilhdes «Carville», typo tropical, com 12 quartos a 2 leitos, para servirem de enfermarias, uma para cada sexo; 1 edificio para posto medico; 1 edificio para a administracdo; 1 edificio escola e diversdes; 1 capella e 80 casas de madeira, para grupos de 4 a 6 doentes, espalhadas pelos lotes agricolas. ¢) Installacio do leprosario do Paredio: agua, exgotto, luz e mo- biliario para 200 leprosos. Ser4 reservado como sanatorio para os casos incipientes ou de classe. Essa despesa poderd ser feita com 250: 0008000. ) Installacao definitiva de um dispensario anti-leproso em Manios, annexo ao Instituto Pasteur. Essa installacdo e 0 custeio do servico, du- rante 1933, esto calculados em 100: 0008000. b) Medidas complementares — a) A partir de 1934 convém iniciar © censo dos leprosos no interior do Estado por meio de commissées itine- rantes de Prophylaxia Rural, as quaes fardio ao mesmo tempo a vaccinacio anti-variolica e o tratamento dos casos de malaria e helminthoses que en- contrarem. b) Organizagao do tratamento antileprotico systematico no Dis- pensario ¢ nos Leprosarios. c) Amplia¢%o do preventorio para os filhos dos leprosos. d) Ampliacio e melhoria dos leprosarios. Estas medidas complementares, que serio executadas progressiva- mente, de accdrdo com as necessidades, nao poderao ser orcadas de an- temo. A partir de 1934 0 Governo Federal tera de contribuir com, pelo me- 0s, metade do custeio dos leprosarios. Para 0 Amazonas um per capita annual de 720$000 ser4 sufficiente. Do fundo a ser constituido com a receita do sello xEducagio e Saude» tera de sahir a quota parte da Unido destinada ao referido custeio. Seria, entretanto, preferivel que a Unido custeasse toda a campanha contra a lepra no paiz inteiro. S6 assim podera haver uniformidade de accio @ ‘garantia de successo. MEMORIAS DO INSTITUTO OSWALDO CRUZ. ESTAMPA XXXVI ——— Tomo xxvit—1933 AMAZONAS — Leprosatio . Em 1810 0 Senado da Camara de Belém , com o seu engenho, olaria e ,plantacdes, ti- nham sido dados de esmola 4 Santa Casa, em 1787 (2), pelos religiosos mercenarios, que os haviam aforado perpetuamente, em 1746. Em 1814 outra representacio do Senado da Camara pedia 4 Santa Casa que fundasse um hospital onde se recolhessem os . A Santa Casa attendendo a esse justo pedido iniciou, no mesmo anno (1814) a adaptacao de um telheiro da olaria do sitio do Tocunduba, para aquelle fim. Por aviso de 13 de Outubro de 1815 0 Principe Regente, D. Joao, concedeu anta Casa cinco loterias annuaes, de 16:000$000 cada uma, sem beneficio do hospital dos lazaros», ao qual caberiam’ 120, ¢ os res- tantes 88 9%, seriam distribuidos em’ premios. Essas loterias nio foram bem succedidas. No mesmo anno de 1815 foram recolhidos ao abrigo do Tocunduba os 5 primeiros leprosos, Em’ 1816 era esse rustico abrigo inaugurado com © nome, que ainda hoje conserva, de «Hospicio dos Lazaros». Em 1820 a eee ee een Tee Te 192 Memorias do tnstituto Oswaldo Cruz XXVII, 3 J se achavam alli isolados 38 leprosos, e em 1822, 61 ! Destes, dizem os documentos, 42 eram mulheres e 19 homens. Talvez fosse 0 contrario, Treze delles eram procedentes de Santarém, entdo grande féeo do mal, No dia 20 de Julho de 1823 a Meza da Santa Casa informou 4 Junta Governativa Civil que muitos escravos lazarentos eram internados no To- cunduba ¢ suggeriu-lhe a creagiio de outro asylo de leprosos em Santarém, Para os seus doentes. Neste sentido foram feitas varias tentativas, sempre frustradas, Tendo o General Soares de Andréa (Bardo de Cacapava) dominado a cabanagem, foi nomeado 1° Presidente da Provincia do Para. Esse fi- dalgo militar conhecia bem a gravidade do problema da lepra no Pard e muito fez pela sua solugio. Em 1838 mandou organizar «um mappa de- monstrativo do mal da morphéa». Esse primeiro censo deu para Belém, que tinha entio 13.000 habi- tantes, 79 leprosos, dos quaes 34 estavam isolados no Tocunduba e 45 vi- viam espalhados pelas ruas principaes da cidade (v. A Santa Casa de Mi- sericordia Paraense, 1902, de Arthur Vianna). Em 2 de Maio de 1838 0 Presidente Soares de Andréa mandou 4 As- sembléa Legislativa Provincial um memorial sobre a expansio da lepra © pediu-lhe uma lei de prophylaxia. Essa lei foi votada, e por elle sanccio- nada em 12 de Maio de 1838, sob 0 n° 10. Essa laconica mas perfeita lei prophylactica auctorizava o Governo Provincial a crear um Hospital para os Lazaros, nas immediagdes de Belém. A lei estabelecia que o hospital fosse situado em local ‘saudavel e aprazivel, mas de onde os doentes nfo poudessem sahir facilmente para ir 4 cidade; que alli fossem accommodados 0s doentes em rigorosa separa- glo de sexos; que o Governo isolaria alli todos os individuos leprosos, sem distinccAo de sexo, edade ou condicio social; que os doentes teriam todo 0 conforto material, espiritual e medicinal (haveria alli um capellio e um ci- rurgifio approyado); a lei estabelecia mais que os doentes abastados deve- riam pagar uma joia de entrada, e em se tratando de escravos, essa joia seria paga pelos seus senhores, e, por fim, sabiamente estabelecia que alli seria dada «occupacio honesta, suave e util aos enfermos». Para séde desse hospital o Presidente Andréa adquiriu, em 7 de Junho de 1838, a Fazenda do Pinheiro, por 8: 0003000. Para garantir a exacta applicaciio, com os lazaros, da subvencio pro- vincial a elles destinada, o Governo requisitou o Hospicio do Tocunduba da Santa Casa. A administragao official nfo deu bom! resultado e o Asylo foi restituido 4 Santa Casa pela Lei n. 43, de 15 de Outubro de 1839. Pela lei n. 78, de Outubro de 1840 a Fazenda do Pinheiro foi incorporada ao pa- trimonio da Santa Casa, em virtude de nao ter podido o Governo installar Setembro, 1933 Souza-Araujo: A Lepra no Norte do Brasil 193 alli o Hospital dos Lazaros. Em 1869 0 Governo comprou de novo essa Fazenda para servir de séde 4 Villa do Pinheiro, que ainda existe. Em 1847 0 Hospicio do Tocunduba tinha 69 leprosos, dos quaes s6- mente 4 eram de raca branca, Dentre esses 69 doentes havia—os proce- dentes de Santarém e outros fécos considerados novos: Obidos, Cameta, Acard, Monte-Alegre, Capim, Marajé e Vigia. Em 1848 subio a 77 o numero de asylados. Nesse anno 0 Governo subyencionou 0 hospicio apenas com 4:0008000. Segundo o relatorio (30-VI-1818) do Provedor Geraldo José de Abreu, era bem triste a situacdo do hospicio nesse tempo: havia desordem na distribuicio dos alimentos, falta de vigilancia, os doentes fugiam: e iamy vender na cidade as suas roupas, os seus alimentos, etc.; embriagavam-so © promoviam desordens no estabelecimento. Dizia mais que alli nao havia nenhum facultativo para tratal-os. Esse Provedor reclamava uma Junta de seis medicos para lavrar a sentenca de separacdo do doente da sociedade. Achava que um s6, ou mesmo dous profissionaes, nZio bastavam para fazer o diagnostico da lepra e decidir sobre o isolamento do doente. No periodo de 1848 a 1880 a média dos asylados variou entre 70 e 80. O hospital j4 tinha passado por varios melhoramentos, Em 1883 havia nelle 84 leprosos, sendo 53 homens e 31 mulheres, ¢ 30 alienados, dos quaes 10 mulheres, «amontoados» em sete cellas immundas ! Em 1898 o Dr. Azevedo Ribeiro, director do Hospicio, chamava-o de «Arraial de horrores» onde vegetavam cento e tantos infelizes.. . Gastava nessa épocha 0 Governo, com a manutencio delles, a diaria de 28222 per capita. Neste seculo, a comecar de 1901, a despesa annual do Tocunduba subiu 4 cerca de 150 contos, entretanto 0 per capita diario foi sempre in- ferior Aquelle de 1898. No relatorio de 1906 a Santa Casa denunciou que os doentes do To- cunduba sahiam, 4 noite, a passeio pela cidade, e no relatorio de 1909 disse que s6 os leprosos indigentes ou vagabundos eram encaminhados para o Tocunduba; «que os que tinham familia ou dispunham de recursos viviam disseminados pela cidade e eram encontrados nos bonds, nos hoteis, nos bo- tequins, por toda parte emfim, em contacto, constantemente, com pessdas Sis, constituem, sem exaggero, um numero quatro yezes, on mais ainda, su- perior ao existente em Tocunduba». Essa situacdo alarmante foi se aggravando sempre, de modo assus- tador. Em 1912 0 Dr. Souza Castro apresentou 4 Camara dos Deputados do Paré um projecto instituindo varias medidas de prophylaxia da lepra e 194 Memorias do Instituto Oswaldo Cruz XXVII, 3 em 1914, 0 Governador Dr. Enéas Martins mandou construir, no Tocun- duba, uma nova enfermaria, com 30 leitos, que pouco alliviou a superlo- taco do asylo. Em 1917, no Governo Lauro Sodré, foi iniciada uma larga campanha contra a lepra, tendo sido angariada. por subscripgdes publicas, a respeita- vel somma de 266: 041$180, que foi gasta pelo proprio governo Lauro Sodré em servicos extranhos 4 prophylaxia da lepra. Era sua intencdo constrair um novo leprosario nas proximidades do Tocunduba, cuja pedra fundamen- tal foi collocada em 4 de Janeiro de 1920. Movimento do Hospital do Tocunduba. — Em 1879 havia no hospi- tal 77 leprosos. De 1879 a 1920 entraram 1,226, falleceram 883. sahiram alguns e passaram 253 para 1921. Os annos de maiores entradas foram os de 1914, 1916, 1917 e 1918. Os de maior mortalidade, 1909 (devida ao impaludismo) e 1918 (devida 4 epidemia da grippe). Custeio do hospital. — 0 orcamento do Hospital de Tocunduba para 1921 foi de 161:606$000, assim discrimi- nados : 3° Hospital dos Lazaros: I Pessoal conforme a tabella n. 3 14: 2563000 II Expediente, livros e outros objectos 2003000 III Drogas e medicamentos 16: 0003000 IV Reparos e melhoramentos, 2: 8008900 V Carretos e transportes ~ 3: 3005000 VI Vestuario e calcado 18: 0003900 VII Festividade de S. Lazaro 508000 VIII Conduc¢ao de cadayeres 2: 0003000 IX Custeio geral (alimentac’io) 105: 0008900 Total: 161: 6068000 Setembro, 1933 Souza-Araujo: A Lepra no Norte do Brasil 195 Por conta do Estado o Gurro do Maguary fornecia 3.900 kilos de carne fresca por mez, ou sejam 46.800 por anno, no valor de 45: 0008000, perfazendo 0 total de 206: 2068000 que, dividido por 268 doentes, que foi a média no anno de 1920, deu um per capita annual de 771000 ou sejam 28111 reis por dia. 2a, PHASE: 1921 a 1933. — O Governo do Para, na gestao Lauro Sodré, assignou com a Unido, no dia 30 de Dezembro de 1920, um accdrdo para ser creado alli o Servigo de Prophylaxia Rural, nos termos do art. 990 do Regulamento Sanitario Federal. baixado com o Decreto n. 14.354, de 15 de Setembro de 1920. Assignou esse accérdo, por parte do Para, o Deputado Dr. Sousa Castro. O custeio dos servicos seria feito em partes eguaes, pelos dous Go- vernos. Pela clausula ila., desse accdrdo, 0 Estado do Para se compre- mettia a contribuir com 200:000$000 para a construc¢io de um leprosa- rio, que a Unio faria construir, com a maior urgencia possivel, «sem ou- tro auxilio do Estado, assumindo a respeito compromisso formal» (clausula 12a.). No dia 21 de Abril de 1921 foi designado o chefe de Servico da Di- rectoria de Prophylaxia Rural, D. N. S. P., Dr. Heraclides Cesar de Souza Araujo, para organizar e d ir os Servigos de Prophylaxia Rural no Pard, inclusive os de Prophylaxia da Lepra e Doengas Venereas. No dia 9 de Junho de 1921 eram installados, em Belém, esses Servi- gos. O Dispensario de Prophylaxia da Lepra foi installado no dia 28 de Junho, 4 rua Jo%o Diogo, no edificio do Instituto Pasteur, que foi transfe- rido para o Instituto de Hygiene. O Dr. Souza Araujo dirigia pessoalmente esse dispensario anti-leproso, onde trabalhava diariamente, das 8 4s 13 horas, auxiliado pelos Drs. B. Rutowitcz, Hilario Gurjio e outros. Foi tal a affluencia de leprosos ao Dispensario, que, no fim de Dezembro do mesmo anno ja havia 600 doentes fichados. sem contar os 268 do Hospicio de To- cunduba, cuja direcco technica o Dr. Souza Araujo assumira no dia 2 de Julho, confiando-a aos Drs. B. Rutowitez e T. Pacheco, que alli trabalha- vam alternadamente. Com os servicos de prophylaxia da lepra e das doen- ¢as venereas no Para, despendeu a Unido, em 1921, 66:9208000. No 2° semestre de 1921 0 Servico de Prophylaxia, a meu cargo, despendeu no Asylo do Tocunduba 9:350$000 na acquisic¢fio de uma casa e installagio do posto medico, e noutros melhoramentos. De Julho de 1921 a Junho de de 1922 0 Servigo de Prophylaxia gastou com esse Asylo (medico, auxilia- res, utensilios medicos e medicamentos) 40:000$000. Em média foi essa a despesa annual com o Tocunduba, feita pela Prophylaxia Rural, durante a minha gestio, de 1921 a 1924. A partir de 1922 0 orgamento da Santa Casa, para o custeio do 196 Memorias do Instituto Oswaldo Cruz XXVI, 3 «Hospicio dos Lazaros», soffreu uma reduccfio de 25: 3808000, correspon- dentes a drogas e medicamentos, custeio geral e pessoal que passaram a ser pagos pela Prophylaxia. Quando completou o 1° anno de funccionamento do Servi¢go de Pro- phylaxia j4 havia este recenseado, no Estado, 1.354 leprosos, dos quaes mantinha sob assistencia cerca de 300, no Tocunduba, e cerca de 600 no Instituto Therapeutico da Lepra, fundado por mim 4 rua Caldeira Castello Branco, no primeiro trimestre de 1922. Nao era possivel adiar por mais tempo a fundaco do leprosario fe- deral. A 5 de Junho de 1922 suggeri ao Governo Federal a compra do Instituto do Prata, para esse fim. LAZAROPOLIS DO PRATA HISTORICO O estabelecimento onde se acha installado esse leprosario, origina- riamente chamaya-se «Instituto S. Antonio do Prata» e era um educanda- rio destinado aos filhos dos indios da regido do rio Guama A sua fundagiio teve inicio em Abril de 1900, com a construcgao da Egreja Santo Antonio do Prata, auctorizada pelo Governador do Para, Dr. Paes de Carvalho, e que sé foi inaugurada em 1908 A miss%io dos Capuchinhos gastou nella 135: 0008000. O grande pa- vilhfio, ao lado dessa egreja, onde funccionava o «Instituto Feminino», teve inicio tambem em 1900 (13 de Junho) para ser inaugurado em) 6 de Janeiro de 1905. O grupo dos trez pavilhdes, onde funccionava o «Insti- tuto Masculino», teve 2 sua construccio iniciada em 1907 (13 de Novembro) para ser inaugurado em 1910 (27 de Dezembro). De 1908 a 1910 foi tam- bem construida a Capella de Santo Izidoro, no sitio do mesmo nome. Em 1912 este sitio possuia vastas plantacdes, sobretudo de Seringueiras e .ca- caueiros. O engenheiro-architecto italiano, Antonio Mazzini, foi o principal constructor do estabelecimento. Este mesmo engenheiro iniciou, em 1907, a construccio do ramal «Ferro-Carril do Prata», que vae da cidade de Igarapé-Asstt & séde da colonia do Prata. Em 1913, historiando esse entio famoso estabelecimento, diz 0 En- genheiro Palma Muniz: «Paes de Carvalho foi o creador da ideia; Augusto Montenegro 0 re- modelador e principal factor da sua existencia e Joao Coelho, que o con- cluiu, além do Frade que trabalhou». (Lazaropolis do Prata — por H. C. de Souza Araujo, Empreza Graphica Amazonia, Belém, Para, 1924). Setembro, 1933 Souza-Araujo: A Lepra no Norte do Brasil 197 Nessa épocha Palma Muniz ayaliava o estabelecimento em 1.307: 0618688, sendo: Ferro-carril do Prata 440: 000890 Edificios 500: 000000 Egreja 135: 0003900 Engenho, serraria, ete. 30: 0008000 _ Campos de experiencias (plantacdes) 60: 0003000 _ Retiro S. Izidoro 15: 0008900 Capella S. Izidoro 6: 0008000 440 lotes agricolas a 25 hectares 112: 2503000 4,196 hectares de terras distribuidas aos indios 8: 8118688 0618688 Total 1.30’ © estabelecimento funccionou como educandario, durante cerea de 13 annos, pois, pela Lei m. 1.747, de 18 de Novembro de 1918, foi trans- formado em «Colonia Correccional», tendo esta sido installada em 10 de Agosto de 1921, sob a direcciio do Capittio reformado da Policia de Estado, Sr. José Euclydes Mendonca Beltrio, Por suggestiio do Desembargador Julio Costa, Chefe de Policia do Para, fui, acompanhado do Dr. Bernardo Rutowitez, visitar a Colonia Cor- reccional do Prata no dia 27-de Maio de 1922, afim de verificar si ella se Prestava para leprosario. A impresstio recebida foi optima. O Governador, Dr. Souza Castro, promptificou-se a transferil-a 4 Unifio para séde do le Prosario federal, por 300:0008000. descontando 200: 0008000, que seriam a contribuicdo do Estado para a construccdo do leprosario, nos termos da clausula 11a. do accérdo Paré-Uniao, firmado em 30 de Dezembro de 1920, para a creaco do Servico de Prophylaxia Rural naquetle Estado, A clausula 11a., do alludido accordo, diz: «O Governo do Estado recolherd a Delegacia Fiscal do Thesouro Na- Cional no Estado do Paré a importancia de duzentos contos de reis, a dis- Posicio do Departamento Nacional de Saude Publica, e que representard @ contribuicdo do Estado para a construccao de um leprosario». A clausula 12a. resa: «A Unido, com a maior urgencia possivel, construiré o leprosario sem outro auxilio do Estado, assumindo a respeito compromisso formal». 198 Memorias do Instituto Oswaldo Cruz XXVII, 3 Na qualidade de chefe do Servico de Prophylaxia Rural transmitti essa proposta ao Dr. Belisario Penna, director geral desse Servico, em te- legramma de 30 de Maio de 1922. Mandei-lhe, em seguida, um memorial descriptivo do estabelecimento. 0 Dr. Belisario Penna approvou essa proposta, que foi encaminhada a0 Ministro da Justica e Negocios Interiores, communicando-me, em tele- gramma n. 575, de 2 de Julho de 1922, 0 seguinte: «Espero resolver bréve satisfactoriamente questo leprosario vossa proposta». Entabolada a venda da propriedade, foi apresentado 4 Camara do Para, em 31 de Outubro de 1922, pelo deputado Deodoro de Mendonca, 0 Seguinte projecto de lei, que recebeu o n. 1.858: «Art. 1°—Fica o Governador auctorizado a transferir ao Governo Federal, para a installacdo de um leprosario modelo, 0 edificio e terras do Instituto e Colonia do Prata, promovendo os accérdos e contractos que julgar conyenientes e necessarios aos interesses do Estado, revogados os direitos de terceiros». Ete. Esse projecto soffreu grande opposicio do deputado Bacharel Al- fredo Chaves, mas foi approvado na Camara e no Senado e convertido na lei n, 2,128, de 7 de Novembro de 1922: cArt. 1°—Fica 0 Governador do Estado auctorizado a transferir ao Goyerno Federal, para a installacio de um Leprosario Modelo, 0 edificio e terras do Instituto e Colonia do Prata, promovendo os accérdo e contractos que julgar convenicntes ¢ necessarios aos interesses do Estado, resalvados. os direitos de terceiros. «Art. 2°—Revogam-se as disposi¢ées em contrario» Auctorizagao da compra do Prata Communicado ao Governo Federal o tedr da lei n. 2.128, de 7 de Novembro de 1922, 0 Sr. Dr. Joio Luiz Alves, Ministro da Justiga e Ne- gocios Interiores, por telegramma n. 997.900, de 23 de Dezembro do mesmo anno, dirigido ao Delegado Fiscal do Thesouro Federal no Paré, mandou lavrar e assignar a escriptura de compra do Prata e dar quitagaio ao Es- Setembro, 1933 Souza-Araujo: A Lepra no Norte do Brasil 199 tado da quantia de 200:0008000 de seu compromisso de entrar com tal importancia para a construccao do leprosario neste Estado, nos termos da clausula XI do accérdo firmado em 30 de Dezembro de 1920. No mesmo dia 23 de Dezembro o Sr. Ministro da Justiga pediu ao ibuir 4 Delegacia Fiscal do Pard a Ministro da Fazenda mandasse di: quantia de 100: 0008000, para paar ao Estado a differenca, isto 6, 0 resto da quantia por quanto foi adquirida a propriedade do Prata. A escriptura de compra foi lavrada pelo tabellido José Joaquim Pe- reira de Araujo, de Belém, no dia 30 de Dezembro de 1922, tendo-a assig- nado, como representante do Estado, 0 Dr. Francisco de Gouvéa ;Cunha Barreto, e 0 Goyerno da Republica foi representado pelo 2° escripturario da Delegacia Fiscal do Thesouro Nacional no Pard, Sr. Arthur de Lemos Monteiro, Transcrevo, dessa escriptura, 0 seguinte trecho: «E, perante as mesmas testemunhas, disse-me 0 representante do Estado do Pard, doutor Francisco de Gouvéa Cunha Barreto, que o dito Estado € dono legitimo senhor e possuidor do immovel denominado «Co- lonia do Prata>, no municipio de Igarapéassti, n’este Estado, com a area de mil quatrocentos e vinte e um hectares e constando de um predio de so- brado com vinte e trez metros (23,0) de frente e dezesseis metros e cin- coenta centimetros (16m,50) de largura, com dois pavilhdes aos lados, me- dindo, cada um, oito metros (8m,0) de largura ¢ quarenta e oito metros (48m,0) de comprimento, ligados, ao corpo central, por passadicos de de- zenove metros ({9ms,0) de comprimento por trez metros e noventa centi- metros (3ms, 90) de largura e mais um predio que serve, actualmente, para quartel do destacamento policial da Colonia e ainda os sitios denominados «Santo Antonio», «So Felix» e «Sio Francisco», todos com atarea de dois kilometros e quinhentos metros quadrados; que, pela presente escrip- tura e melhor férma de Direito, 0 Estado do Para, Taz venda de toda essa propriedade, isto é: terrenos, edificagdes, bemfeitorias e serviddes, ao Go- verno da Republica, pela quantia de trezentos contos de réis (300: 000$000) paga da seguinte mane’ duzentos contos de réis (200; 000$000) repre- sentados pela contribuicdo devida pelo Estado, para construceto de um leprosario, conforme 0 contracto de trinta de Dezembro de mil noyecentos € vinte, existente entre o Governo Federal ¢ 0 Estado do Para, a0 Governo da Unido, ¢ 100: 0008000 que serio ulteriormente pagos pelo Governo Fe- deral, que, assim sendo céde e transfere o Estado do Para, ao Governo Fe- 200 Memorias do Instituto Oswaldo Cruz XXVII, 3 deral todo o direito, dominio, acefio e senhorio que tinha na propriedade vendida . . .» No dia 14 de Maio de 1923 recebi do Rio de Janeiro o seguinte: «Telegramma official n. 522. Rio de Janeiro, 14/5/1923. Accuso re- rebimento traslado escriptura Colonia Prata. Additamento meu numero 433 vos senhor Ministro Justiga expediu seguinte telegramma ao Delegado Fiscal nesse Estado: «Auctorizo effectueis pagamento cem contos de réis governo desse Estado restante importancia compra propriedade de- nominada Instituto Prata. Immovel esse deverd immediatamente ser en- tregue Chefe Commissio Saneamento Prophylaxia Rural livre desembara- cado qualquer onus inclusive liberto occupantes». Lembro-vos dia trinta e um Maio cée referida importancia exercicios findos, correu por conta vota~ Ao orcamento mil novecentos e vinte e dous. Etc. Lafayette Freitas (a) Director». No dia 1° de Junho de 1923 recebi, na qualidade de Chefe do Ser- vico de Prophylaxia Rural, o immovel do Prata e no dia 24 do mesmo mez e anno fundei alli o leprosario federal com o nome de «Lazaropolis do Prata», recolhendo nelle, immediatamente, 22 leprosos, aos quaes incumbi da conserva¢ao da propriedade. No dia 30 de Junho enviei ao Director do Saneamento e Prophylaxia Rural um memorial (v. p. 54 ¢ seguintes do meu livro «Lazaropolis do Prata>, Belém-Pard, 1924) com a descripeao do estabelecimento eo projecto da installacio definitiva do leprosario Por escriptura lavrada pelo tabellitio J. Araujo, a 10 de Agosto de 1923, 0 Governo do Para doou ao Departamento Nacional de Saiide Publica, a meu pedido, para ampliar os dominios do leprosario do Prata, 88 lotes com 2.200 hectares de terrenos e muitas bemfeitorias, pelos quaes pagou de indemnizacd :0008000 (v. pp. G8 a 70 da obra citada), Ficou assim 0 estabelecimento com 4,300 hectares, segundo 0 caleulo do Enge- nheiro Charles Henry, da Directoria de Obras Publicas do Estado do Para. Valor da propriedade. — O Governo Federal comprou do Estado do Para uma propriedade que valia no dia do do recebimento, 1° de Junho de 1923, a quantia de 750: 0008000 por 300: 0003000 e destes s6 pagou 100: 000$000, Setembro, 1933 Souza-Araujo: A Lepra no Norte do Brasil 201 Aquelle valor foi especificado assim: Edificios e 1.421 hectares terras 500: 0008000 Egreja 135: 0003900 Sitio S. Izidoro e Capella 30: 0003000 88 lotes agricolas, 2.200 hectares a 208000 44 2.000 hectares de terrenos de pastagens ¢ florestas a 10$000 20: Bemtfeitorias: plantacdes, barracas, ete. at: O Ferro-carril do Prata ficou fazendo parte do asservo da E. F. de Braganca, pertencente ao Estado. Adaptages, — Em Agosto de 1923 0 Ministro da Justica deu o se- guinte despacho no processo de installaco do lepro- sario do Prata: . f Desse credito 97:000$000 foram applicados na compra de moveis e utensilios para o leprosario e 120:000$000 nas adaptacces dos edificios existentes. A demora na distribuigao do credito e as difficuldades de transportes de material para o Prata retardaram a installagdo do leprosario, e por isso nao foi possivel inaugural-o a 1° de Janeiro de 1924. Tabella de vencimentos do pessoal. — Por despacho de 25 de Marco de 1924, 0 Sr. Ministro da Justiga e Negocios Interiores approvou a seguinte tabella de vencimentos do pessoal do leprosario: Director (medico) 1; 2003000 Medico-auxiliar 5008000 Administrador 4803000 Superintendente agricola 5008000 Guarda-chefe ¢ microscopista 5003000 Pharmaceutico e administrador do hospital 4808900 Escripturario-dactylographo 3008900 Auxiliar de laboratorio 2503000 Enfermeiro-chefe 3503000 202 Memorias do Instituto Oswaldo Cruz XXVIL, 3 1 enfermeiro 2003000 2° enfermeiro 1503000 Capataz agricola 2003000 Encarregado da rouparia 1503000 Cozinheiro 1003000 Trabalhadores agricolas 903000 Auxiliares de enfermeiros (leprosos validos) 308000 Serventes (leprosos validos) 308000 As nomeacées sero feitas de accérdo com o Regulamento appro- yado pelo Decreto 16.300, de 31 de Dezembro de 1923. Os empregados com exercicio no leprosario do Prata nao terao direito a diarias». O Inspector da Lepra propéz a creaciio do logar de Medico-bacterio- logista com 1:000$000, extinguindo-se os de Medico-auxiliar e Guarda- Chefe-microscopista. Regimento interno. — A 31 de Marco o Dr. Souza Araujo submetteu 4 approvacio do Inspector-Chefe de Prophy- laxia da Lepra o pp. 170-186). A Inspectoria da Lepra nunca se manifestou sobre esse Regimento e nem organizou qualquer outro. Inauguragaéo. — No dia 24 de Junho de 1924, 0 Dr. Souza Araujo, na qualidade de chefe do Servico de Saneamento Rural no Pard, inaugurou com a presenga do Goyernador do Estado, Dr. Souza Gastro, e demais auctoridades, 0 primeiro leprosario federal, que re- cebeu o nome de «Lazaropolis do Prata». Nesse dia hayia alli 300 lepro- sos e 14 pessoas sadias, que acompanharam os parentes enfermos, no iso- lamento, sujeitando-se 4 disciplina interna como estabelece 0 Regala-> mento Sanitario Federal. Por esse grande acontecimento 0 Chefe do Servico de Prophylaxia recebeu tclegrammas de congratulacdes do Sr. Presidente da Republica, dos presidentes de varios Estados, e auctoridades sanitarias superiores da Republica, Assumiu a direccfio da Lazaropolis o Dr. A, Damasceno Junior. A 15 de Julho de 1924 0 Dr. Souza Araujo exonerou-se de Chefe do alludido servigo afim de partir para os Estados Unidos da America, em missio scientifica da Fundacio Rockefeller. Foi nomeado para substituil-o 0 Dr. Joo Auzier Bentes, que, visi- Setembro, 1933 Souza-Araujo: A Lepra no Norte do Brasil 203 tando 0 leprosario no dia 22 de Novembro, alli deixou ‘registradas as se- guintes impressées: «Na qualidade de Chefe do Servico de Saneamento Rural visito, pela primeira vez, a Lazaropolis do Prata, A minha impressio 6 a seguiute: Local magnifico; installagdes excellentes; direccdo modelar, criteriosa ¢ humanitaria; aspecto dos internados de relativa felicidade. Manifesto desta forma os meus sinceros elogios ao illustre collega Dr. Damasceno, espi- rito de administrador e de abnegado 4 causa que abracou, como aos seus dignos auxiliares, incentivando-os para que concluam a victoria incommen- surayel iniciada apenas ha cinco mezes». (a) J. Auzier Bentes. A 28 de Agosto de 1924 0 Professor E. Brumpt, da Faculdade de Medicina de Paris, visitou a Lazaropolis e alli deixou escriptas as seguintes impress6es : «Pour lutter contre la lépre le seul moyen efficace est Visolément des malades et 1a seule facon humanitaire @obtenir cet isolément est @oftrir aux lepreux en plus dun bien étre plus grand que celui qu’ils ont chez eux, Yespoir @une guerison. Est avec un grand plaisir que j'ai pu constater aujourdhui, en visi- tant la trés importante leproserie du Prata, que ces desiderata ont été par- faitement compris par le gouvernement du Pard, Les malades sont soignés avec une grande competence et avee bien- yeillance, ils sont bien nourris, bien traités, les enfants sont‘instruits et touts dans leur physionomie indique qu’ils sont parfaitement heureux. Aussi je suis certain que le jour ot le governement aidé du grand public, pourra donner une subvention suffisante, la segregation des malades sera tout 2 fait complete et la lépre, ce terrible fléau social, si important au Para, ces- sera deffrayer les immigrants étrangers. En adressant mes sincéres eloges au Directeur, le Docteur Amaro Damasceno et au personnel sous ses ordres pour le devouement, dont ils sont preuves, je souhaite que les pouvonirs publics s'impressent de faire le necessaire pour donner le plus grand de- veloppement possible et la plus grande efficacité prophylactique possible 4 la leproserie du Prata». (a) Brumpt. Movimento dos doentes. — Durante os primeiros quatro annos de funccionamento do leprosario do Prata foi o seguinte o movimento de doentes alli: 204 Memorias do Instituto Oswaldo Cruz XXVII, 3 1924 1925 1926 1927 Do anno anterior =_ 322 374 379 Entraram. 360 91 64 43, Sahiram 26 35, 39 ni Falleceram 12 4 20 17 Ficaram 322 374 379 388 Portanto 0 total de entradas foi de 558 doentes. Desses sahiram 103 (18,4 9) e morreram 67 (129%). Por esta estatistica se vé que o estabele- cimento pouco progrediu em 4 annos. Em 1926 0 Dr. A. Damasceno Junior foi substituido pelo Dr. Ber- nardo L. Rutowitez, na direcgiio do leprosario. Melhoramentos. — Attendendo ao pedido que me fez o Dr. Jayme Aben-Athar, Chefe do Servico de Saneamento Rural no Para, em carta de 17 de Fevereiro de 1927, interferi junto ao Professor Clementino Fraga, director geral do Departamento Nacioaal de Satide Publica, afim de obter delle a auctorizacio para que fossem intro- duzidos no Prata os seguintes melhoramentos, dentro da verba distribuida: 1) Montagem da lavanderia a vapor, adquiridaha mais de 2 annos; 2) Installacao de luz electrica, servico orcado em 30:000$000; 3) Reforma do servico de abastecimento de agua. Para a execucao desses imprescindiveis melhoramentos sé faltava auctorizacdo superior, isto 6, do Director de Saneamento Rural. Pouco tempo depois o Prof. Clementino Fraga me informou ter ordenado a exe- cugaio dessas obras, que foram inauguradas em 1928. Os annos de 1929 e 1930 foram de difficuldades administrativas para a Lazaropolis, tendo baixado alli o numero de internados. Em 30 de Dezembro de 1930 0 Governo Provisorio suspendeu, nos Estados, os Servicos de Saneamento e Prophylaxia Rural, inclusive os de lepra e doencas venereas, $i o Governo Proyisorio do Paré nfo houvesse assumido a responsabilidade da manutengio da Lazaropolis do Prata, este estabelecimento estaria hoje extincto, com grande prejuizo para o paiz‘e os seus internados estariam jogados ao abandono © Interventor Federal paraense, Major Magalhfes Barata, visitou © leprosario, e achando-o bom e bem administrado, amparou-o ¢ fel-o progredir. Em 1931, j o numero de internados subiu a 492, e em 1932 a 550. O anno de 1933 é ainda mais promissor para a Lazaropolis, Setembro, 1933 Souza-Araujo: A Lepra no Norte do Brasil 205 CENSO DOS LEPROSOS. — No primeiro anno de actividade do Servico de Prophylaxia Rural no Para (1921 a 1922) recensedimos, eu e os demais medicos daquelle servico, 1.354 leprosos, assim discriminados (v. Dr. Souza Araujo, A frequencia ¢ prophylaxia da lepra no Para, 1922, p. 123): Quanto a0 sexo eram: Masculinos 834 Femininos 520 — 1.354 Quanto 4 raca eram: Brancos 591 Mestigos 670 Pretos 93 1.354 Quanto 4 nacionalidade eram: Brasileiros 1.246 Extrangeiros 108 —_—_— 1.354 Quanto 4 edade actual cram: De 1a 5 annos 17 De 6a,i0 » 127 De i1a20 > 399 De 21a 35 » 412 De 36a50 » 261 Acimade 50» 138 ae 1.354 Quanto 4 forma clinica soffriam de: Lepra tuberculosa 359 » — anesthesica 668 mixta. 321 » indeterminada 6 =_—— 1.354 206 Memorias do Instituto Oswaldo Cruz XXVII, 3 A pesquiza do bacillo de Hansen no muco nasal foi positiva: na lepra tuberculosa em na lepra anesthesica em na lepra mixta em 78,4 % 37,2 % 64,4 9 A reaccfio de Wassermann no sangue foi positiva: na lepra tuberculosa em na lepra anesthesica em na lepra mixta em 51,10 9% 25,10 0 43,80 90 Estatistica de 30 mezes. — De 1 de Julho de 1921 a 31 de Dezembro de 1923 © Servigo de Prophylaxia Rural recenseou (vy. Souza Araujo, A Lepra no Estado do Para, Sciencia Medica, vol. 2, 1924, p. 366) 2.052 leprosos, assim discriminados: Quanto ao sexo eram: Masculinos Femininos Quanto 4 raga eram: Brancos Mestigos Pretos Quanto 4 nacionalidade cram Brasileiros Extrangeiros Os brasileiros eram naturaes dos 1.246 806 ——— 2.052 974 947 131 a 2.052 1.892 160 a 2.052 seguintes Estados: Para 1.220 (59,45 0); Ceara, 273; Rio Grande do Norte, 151; Maranhao, 57; Para- hyba, 55; Amazonas, 33; Pernambuco, Bahia, 15; Sergipe, 8; Rio de Janeiro, 7; raes 2, e Espirito Santo, Parana, Goyaz e nao informou (alienado). 28; Piauhy, 16; Alagoas, 16; Acre, 4; S. Paulo, 2; Minas Ge- Matto Grosso, 1 de cada e 1 que Setembro, 1933 Souza-Araujo: A Lepra no Norte do Brasil Quanto ao estado civil eram: Solteiros 911 Casados 504 Viuvos 188 Menores de 15 annos 447 Nio informaram 2 2.052 Quanto 4 edade actual eram: De 1a 5 annos 27 De 6a10 » 188 De 11 a 20 582 De 21a35 >» 604 De 36a 50 » 429 Acima de 50 221 Nao informa 1 2.052 207 Destes, 1.069 adquiriram a lepra antes dos 20 annos de edade, ou sejam 520. Quanto 4 férma clinica soffriam de: Lepra tuberculosa 568 anesthesica 1.098 >» mixta 379 >» indeterminada ") A pesquiza no bacillo de Hansen no muco nasal foi positiva: Na lepra tuberculosa em 75,10 oo Na lepra mixta em 65,80 90 Na lepra anesthesica em 35,00 90 A reaccio de Wassermann no sangue foi positiva: Na lepra tuberculosa em 16,30 0 Na lepra mixta em 44,20 9 Na lepra anesthesica em 31,00 90 A positividade global foi, approximadamente, de 40 0. 2.052 | 208 Memorias do Instituto Oswaldo Cruz XXVII, 3 Conforme os dados que me forneceu o Dr. Hilario Gurjio, foram re- censeados mais 1.560 leprosos no Par&, de 1 de Janeiro de 1924 a 3 de Fevereiro de 1933, assim discriminados : Quanto ao sexo eram: Masculinos 1.035 Femininos 525, a 1.560 Quanto 4 raca eram: Brancos 813 Mestigos 597 Pretos 150 a 1.560 Quanto 4 nacionalidade eram: Brasileiros 1.445 Extrangeiros 115 Saami 1.560 Quanto 4 edade eram: Menores de 15 annos 444 De 16 a 25 annos 341 De 26a 45 » 522 Acimade 45» 253 a 1.560 Resumindo, temos: De 1 Julho de 1921 a 31 de Dezembro de 1923 2.052 De 1 Janeiro de 1924 a 3 de Fevereiro de 1933 1.560 Total 3.612 Deduzindo-se os que falleceram ou se mudaram do Estado de 1921 a 1932, calcula-se o total de fichados em 3.000. Para se estimar o total approximado dos leprosos do Estado os technicos accrescentam a esse nu- mero mais um terco, perfazendo, portanto, 4.000. Setembro, 1933 Souza-Araujo: A Lepra no Norte do Brasil 209 ASSISTENCIA SOUZA ARAUJO.—De accdrdo com o documento abaixo a Santa Casa da Miseri- cordia do Para creou, em Abri! de 1928, um servigo de assistencia medica domiciliaria aos leprosos de Belém: «15-VI-1928. Eximo. Snr. Dr. Heraclides de Souza Araujo. ‘Temos © maximo prazer em communicar que o Conselho Administrativo @esta Associacdo resolveu, em sua sess%io de 26 de Abril, crear um servico de assistencia domiciliaria aos leprosos Cesta capital. Dando asia assistencia 9 nome de «Souza Araujo», quer a Santa Casa da Misericordia do Pard ren- der justo preito de gratidao pelos inestimaveis servicos que V. E tou aos lazaros do Para. Esperamos, pois, que V. Excia. acceitaré gela homenagem, com a qual muito se honra esta Associacio de Caridade. Etc.» (aa.) Antonio Faciola, Dr. Raymundo Vianna, Dr. Alvaro Adolpho, Dr. Ausier Bentes, Dr. Orlando Lima, Dr. Azevedo Ribeiro, Dr. Guilherme Paiva, Cel. José Leite Chermont, Raul Cardoso da Cunha Coimbra. A pagina 37 do Relatorio do anno de 1928, da Santa Ca tram-se os seguintes informes: a, encon~ A ASSISTENCIA SOUZA ARAUJO «Constitue a segunda Seccaio do Servicgo de Assistencia ao Lazaro. © Conselho Administrativo resolveu dar-Ihe essa denominacio em home- nagem ao Dr. Heraclides de Souza Araujo, que muito trabalhou aqui pelo combate 4 lepra. Foi elle que installou o Servico de Prophy' Rural, do qual foi o primeiro chefe, montou 0 Lazaropolis do Prata e nao pequeno auxilio conseguiu do departamento que chefiava para o Tecunduba, cus- teiando honorarios medicos, medicamentos © ordenados de parte do pes- soal interno. Em 1923 concorreu com 0 auxilio de dez contos de réis para as obras realizadas no Pavilhao Cypriano Santos. O Seryigo de Assistencia Souza Araujo foi installado em Junho, em proprio da Associacio, 4 rua 13 de Maio n. 36 e cuida exclusivamente do tratamento de doentes nao internados, em suas residencias, sem qualquer despeza para elles. Contractou, para isso, os servicos do Dr. Henrique Es- teves, que faz visitas domiciliares e acompanha o tratamento de cada doente, auxiliado por dois enfermeiros habilitados. Os medicamentos,—in- jecgdes de Alepol ¢ outros que se facam mistér, como auxilio a feste, stio fornecidos gratuitamente Inscreveram-se para receber tratamento da Assistencia Souza Araujo 306 doentes, 210 Memorias do Instituto Oswaldo Cruz XXVII, 3 Despendeu a Santa Casa de Junho a Dezembro com o pessoal e medicamentos Rs. 17: 8988048» Pelo relatorio do Dr. Henrique Esteves verifica-se que dos 306 doentes matriculados, em 31 de Dezembro de 1928, 275 continuaram em tratamento com Alepol, A assistencia applicou ou forneceu nesse periodo 5.265 injecgdes com o total de 18.274 c.c. do soluto, Forneceu ainda aos doentes do Tocunduba 31.700 c.c. de medicamento. No anno de 1929 matricularam-se mais 102 leprosos, perfazendo 0 total de 377. Destes falleceram 8, foram transferidos para o Prata 21 e para o Tocunduba 7 e abandonaram o tratamento 60. A 31 de Dezembro havia 281 doentes em tratamento. A despeza em 1929 subiu a 32: 8978980, sendo: pessoal 17: 6838300, medicamentos 5:034$880 e Despezas Geraes 9: 9798800. Em 1930 matricularam-se mais 45 doentes, perfazendo o total de 326, dos quaes 84 abandonaram o tratamento, 9 falleceram, 4 foram trans- feridos para o Prata e 9 para o Tocunduba, passando para 1931, 220 doentes. A despeza com esse servico foi em 1930 de 31:3648757, sendo: pessoal 18: 8408000, medicamentos 4: 7848607 e despezas geraes 7: 7408150. Por motivo de economia, diz o Relatorio de 1930 da Santa Casa (p. 20), 0 servico da 3 1$000 Classe D— > > $500 Esta ultima categoria 6 para socios collectives representados pelas fabricas, usinas ou emprezas onde trabalhem. Afim de ser oblida uma renda de certo vulto e permanente, a Liga solicitou 4 Interventoria a creacio do imposto de $100 por kilo de carne consumida no Estado e, depois de auscultada a opiniao publica, 0 sr. Major Magalhaes Barata baixou o decreto n. 682, de 30 de Junho de 1932, ins- tituindo aquella taxa obrigatoria, cujo resultado damos na discriminacio da receita. Tambem corremos no commercio paraense uma subseripedo, que, juntamente com donativos expontaneos, rendeu uma importancia que niio 6 para desprezar. Procurdémos conseguir um bonus de $005 por senha de passagem nos bondes de Belém, mas a Companhia que explora o servico offereceu- nos apenas $002, importancia que n&o compensa o trabalho de arrecada- cao e propaganda; assim, essa fonte nado chegou a ser aproveitada. , Pleiteamos uma quéta de 2 mil contos de réis como auxilio aos nos- Setembro, 1933 Sowza-Araujo: A Lepra no Norte do Brasil 213 sos servigos, retirada da receita do sello de «Educacio e Satide», ultima- mente creado pelo Governo Provisorio da Republica. Do Ministerio de Educagio e Satide mandaram-nos que nos habili- tassemos nos termos dos decretos n. 20.351 21.220, que exigem prelimi- narmente que a institui¢%o requerente tenha de funccionamento perma- nente ‘mais de dois annos e como a hossa sé tem dez mezes, reconhecemos a inutilidade dos nossos esforcos. Adoptimos, tambem, para obter mais alguma renda, 0 uso de co- tres em estabelecimentos commerciaes, cinemas, emprezas e fabricas, com © fim de receberem obulos voluntarios dos que quizessem concorrer em be- neficio dos servicos da Liga, mas ainda nao fizemos a collecta e por isso ignoramos 0 seu resultado. As despesas obrigalorias, da Liga, tém sido minimas, constando do seguinte: Aluguel de casa 2008000 Guarda livros e encarregado da séde 2508900 Escripturario cobrador 1008000 Daetylographa 303000 Serventa 303900 Despesa mensal Rs. 610$900 Agora, em Janeiro, foram augmentados para 3008000 e 1508000 os ordenados do guarda-livros e escripturario, respectivamente. Além dessas, ha os gastos de expediente, publicagdes e varios outros, que até agora importaram em 3: 231$200. As despesas de installacio da séde, que funcciona 4 rua 15 de No- vembro n. 171, montaram a 1:795$200. A Liga ja tem a seu cargo 50 leprosos recolhidas, desde Setembro de 1932, 4 Lazaropolis do Prata, com os quaes despende, mensalmente, a quantia de 4:2003000, além do gasto de installacdo, que importou em 9: 690$000. Em Agosto de 1932 recebemos da Interventoria Federal no Estado a determinacdo de custear as despesas dos asylos de Tocunduba, com 311 leprosos, e de Santa Therezinha (créche onde se abrigam os filhos de le- Prosos) mantidos até aquella data pela Santa Casa de Misericordia, que, por suas pessimas condi¢des financeiras, os entregou ao Governo estadoal, Estamos a despender com esses asylos a somma mensal de 14: 4348000, agora accrescida com a de 5:0003000, para o pagamento da carne nelles consumida e que até 31°de Dezembro de 1932 vinha sendo 214 Memorias do Instituto Oswaldo Cruz XXVII, 3 fornecida pela Interventoria. O fornecimento de carne ao Tocunduba era tradicionalmente feito por conta do Estado. Eis os algarismos que illustram este memorial, retirados do balango em 31 de Dezembro de 1932. RECEITA Donativos 38: 2468100 Renda Eventual Mensalidades Renda do sello de S. Lazaro Imposto sobre a carne 319: 7498450 363: 7128650 DESPESA Moyeis e Utensilios 2:221$000 Despesas Geraes 6: 891$200 Despesas de Propaganda 967$000 Manutencaio do asylo de Tocunduba (as des- pesas de Dezembro nao estio incluidas) 41: 4288850 Manutenciio dos nossos asylados na Lazaropolis do Prata (as despesas de Dezembro nao estfio incluidas) 20: 7783000 Planta topographica (por conta) 7:5008000 Beneficios e despesas no Prata 80: 3318050 Saldo. Discriminagao do saldo supra: No Banco do Brasil 238: 4288350 No Banco Commercial do Para 31: 375$000 Em Caixa 1: 2403000 Em poder da Sociedade Cooperativa de Indus- tria Pecuaria do Para Ltda., proveniente da ar- recadacio da semana (importancia recolhida ao Banco do Brasil em 2 de Janeiro de 1933) 12:338$250 283: 3818600 Por esta demonstra¢io do movimento da Liga, em 7 mezes, isto é, de Junho a Dezembro de 1932, poder ser avaliado o estado das suas fi- Setembro, 1933 Souza-Araujo: A Lepra no Norte do Brasil 215 nangas, sendo bom que se faga notar que da sua renda do imposto da carne, cuja média mensal é de 53:000$000, a Liga gasta mensalmente, nao con- tando com os extraordinarios, como agora, em Janeiro ou Fevereiro, em que tera de despender mais de 12:000$000 com roupas e calcados: para os asylados do Tocunduba, a Liga gasta mensalmente, repetimos, a quantia approximada de 24:000$000 (certo 23:634$000) ficando um saldo de 29:0008000 para a execucdo do plano que acabimos de expor. A Liga tem os seguintes corpos dirigentes: Directoria, Cunselho Te- chnico Consultivo ¢ Conselho Deliberativo. Sao membros da Directoria: Presidente Dr. Guilherme Paiva 1° Vice-Presidente Dr. Hygino Amanajas Filho Qo» > Mme. Samuel Mac-Dowell 1° Secretario Padre Florencio Dubois Donat Professor Sant Anna Marques Be Tente. Joao Baptista de Souza Thesoureiro José de Leal Martins Vice-Thezoureiro Antonio José Pereira Leal ; Francisco Baptista de Oliveira > > Romano Augusto Machado (fallecido) > , Joao Francisco de Souza Fazem parte do Conselho Technico: Dr. Jayme Aben-Athar Dr. Raymundo Tavares Vianna Dr. Alvaro Adolpho da Silveira Cel. Joaquim Chaves Tenente Ismaeclino de Castro Dr. Joaquim Magalhies Dr. Hilario Gurjao Sobrinho Dr. Feliciano Mendonca. Conselho Deliberative é composto de nomes de relevo de todas as classes sociaes desta capitals. 2. PREVENTORIO (Asylo Infantil Santa Therezinha).—Fundado na administracio do Interventor Magalhaes Barata, em 6 de Janeiro de 1931, Funcciona 4 rua José Bonifacio, n. 51A, em edi- 216 Memorias do Instituto Oswaldo Cruz XXVII, 3 ficio adquirido e adaptado pelo Estado (30:0008000) e doado 4 Santa Casa da Misericordia para o Preventorio. A Santa Casa devolveu-o ao Estado em 1° de Outubro de 1932 e esta sendo mantido pela Liga contra a Lepra. E gerente do Preventorio D. Angela Martins (de 60 annos), auxi- liada por 9 empregados subalternos. No dia da minha visita havia 21 internados (30-I-933), sendo: 12 meninos de 1 mez a 6 annos e 9 meninas ‘de 2 mezes a 7 annos, Nove dessas criancas vieram da Créche da Lazaropolis do Prata, em 2 de Ja- neiro de 1933. ‘ Das criancas internadas no Preventorio falleceram sete alé hoje e duas foram removidas para o leprosario por terem ficado leprosas. A pri- meira teve apenas 9 mezes de contacto com a mie leprosa c a segunda, 3 annos e 9 mezes. 0 preventorio tem os seguintes empregados: uma gerente (2008000), uma enfermeira (603000), 5 guardas-criancas (a 45$000), uma lavadeira (503000), uma cozinheira (40$000), um criado-correio (658000) e um ser- vente (503000). Total mensal: 6908000. O custo per capita e por dia é, approximadamente, de 28500. Na séde desse preventorio funccionou, em sua 2" phase, a . E accrescentou: «Nem mesmo com um servigo qual o organizou no Paré o Snr. Dr. Souza Araujo e cuja melhor recommendagao esta na frequencia registrada pelos seus dispensarios anti-leprosos ainda ao cabo de tres annos de exis- tencia, se poderia pensar em fazer do isolamento uma medida de excep- Gio». (Consideracdes sobre a endemiologia e a prophylaxia da Lepra. e casa do medico, reser- yando-se os pavilhdes que actualmente occupa aos proprios doentes, que assim ficarfio mais desafogados. Tendo sido provada a grande urgencia de ampliar aquelle asylo, a Liga contra a Lepra vae jé atacar a construccio de cinco pavilhées a 24 leitos, cuja manutencio ficaré a seu cargo, de accordo, entretanto, com as Setembro, 1933 Souza-Araujo: A Lepra no Norte do Brasil 237 suas possibilidades. O Tocunduba continuard para os novos casos de maior gravidade e de emergencia. Aquelles pavilhées serio de um typo moderno, adoptados no grande leprosariode «Carville» nos Estados Unidos, com as devidas adaptacdes ao nosso clima, adaptagdes que os tornarfio de custo muito mais modico. A interventoria prop6z ao Dr. Souza Araujo, representante do chefe do governo provisorio, a troca da ilha de Cutijuba pelo patronato Manuel Barata, no Outeiro, ilha de Caratateua, com todas as suas officinas ¢ inte- gral patrimonio, com a condi¢io de ser construido, installado ¢ mantido pelo Governo da Unido, naquella ilha, um leprosario modelo, e de ficar faquelle patronato a cargo do governo do Estado, A Colonia Reformatoria, cujas bases foram lancadas na ilha de Cuti- juba, sera transferida para o Outeiro, que ahi ficara perfeitamente instal- lada. A idéa da permuta referida é oriunda da visita de inspeccito que fez © Dr. Souza Araujo dquellas localidades — Cutijuba ¢ Outeiro — acompa- nhado do director e altos funccionarios da Satide Publica, conforme ja no- ticiémos, que ficaram perfeitamente accérdados na grande conveniencia da installagao de um leprosario naquella primeira ilha, para os doentes do Para, leprosario capaz de mais tarde receber os asylados do Prata e do Tocunduba, que entio serao extinctos Aceeita foi a idéa da installacio dos dispensarios pelo governo da Unido, com a finalidade explicita pelo Dr. Souza Araujo: tratamento, nes- ses dispensarios, dos casos incipientes e, nos domicilios, dos contagiantes. O Snr. interventor interino hypothecou a inteira solidariedade e o maximo apoio do governo do Estado’& ac¢io da Liga e aos planos do Dr. Souza Araujo, representante do Governo da Unitio, certo de que desta acco conjugada muito tera a lucrar o nosso Estado nos assumptos que se pren- dem ao problema da lepra. : 0 Dr. Souza Araujo manifestou a sua sympathia e a sua grande boa vontade pela causa da extinc¢aio do mal de Hansen em nosso Estado e ainda mais pelo amparo aos infelizes flagellados, declarando que se constitui: nosso advogado nessa campanha, mesmo porque reconhece que esta regio € uma das mais attingidas pela lepra e na qual mais bem organizados estio 9s seus servicos de prophylaxia. Terminou por dizer que conta iniciar aqui 6s seus trabalhos ainda neste primeiro semestre do anno corrente, fazendo um appello 20 bom coragao dos paraenses para que auxiliem com empeaho aquelles que estio tentando levar de vencida o maior problema sanitario da nossa patria. E assim findou essa reunidio, 4s 11 1/2 da noite (antigas), cujas re- solugdes poderdo importar no maior bem a ser deixado as geragdes futuras ». 238 Memorias do Instituto Oswaldo Cruz XXVI, 3 a) Medidas urgentes.—Para alliviar 0 problema da lepra no Para sio necessarias as seguintes medidas urgentes: a) Construcgdo, na séde da Lazaropolis do Prata, de 5 pavilhdes typo «Carville», modificado para clima tropical, cada um com 24 leitos, tendo uma cozinha e um refeitorio communs. Esses pavilhées, com o total de 120 léitos, se destinam a desafogar os antigos, que estaio superlotadissimos. Um delles ficaria reservado para as meninas e outro para os meninos. A Liga contra a lepra comprometteu-se a mandar construir, immedialamente, esses pavilhdes e annexos, conforme serd especificado adeante. b) Mudanga da residencia do medico e da administracao, do edificio central, respectivamente, para a «Casa do medico» e créche, fora do le- prosario. c) Transformagio do edificio central em hospital. d) Reforma da egreja S. Antonio do Prata. e) Intensificagado do censo dos leprosos no interior por meio dos pos- tos e commissées de saneamento rural. f) Reabertura do antigo Dispensario Anti-leproso em Belém onde se- rao tratados, systematicamente, os leprosos que nfo possam ou nio preci- sem ser isolados. Todas estas ultimas cinco providencias sero realizadas pelo Governo do Estado, que tambem continuard a manter os actuaes leprosarios (Prata e Tocunduba) e o preventorio. A’ Unido caberé uma outra medida urgente : LEPROSARIO DA ILHA CUTISUBA.—A creac&o de uma colonia agricola modelo, para 1.000 leprosos, na ilha Cutijuba, que o Estado comprou por 37:000$000 e ce- dera 4 Unido para esse fim. Essa ilha, de que damos planta neste trabalho, fica a hora e quarto de Belém, em lancha e a 10 minutos da ilha dejAra- piranga onde existe a maior olaria da Amazonia, barateando, desse modo, o transporte do material de construcciio. A ilha tem 1.031 hectares de terreno cultivavel e varios lagos pis- cosos. Da visita feita a essa iJha, em companhia dos Drs. Guilherme Paiva, Mario Chermont, Hilario Gurjio, Amanajas filho e outros technicos, no dia 5 de Fevereiro, trouxémos a melhor impressiio. I’ a séde ideal para um grande leprosario, perfeitamente isolado, com a vantagem de ficar pro- ximo da capital. Com mil contos de réis a Uniio poder construir alli um lepros rio modelo, para 1.000 doentes, desde que obedeca a um plano technico bem orientado. Setembro, 1933 Souza-Araujo: A Lepra no Norte do Brasil 239 Num futuro mais ou menos remoto o leprosario de Cutijuba ficaria sendo 0 unico do Estado, podendo comportar mais de dous mil leprosos. Na ilha de Cilion, nas Philippinas, em area muito inferior 4 de Cutijuba, existe uma colonia com 6,000 leprosos, vivendo vida perfeita- ‘mente normal. NOVO N JCLEO AGRICOLA NO PRATA.—Na hypothese dos go- yernos preferirem am- pliar o leprosario do Prata a construir outro na ilha Cutijuba, suggiro para séde de um novo nucleo a area comprehendendo os létes 383 a 405 e 34% a 371 (5 kilometros quadrados). ome¢gar do travessio do rio Maracana, em direcg’o aos limites do Municipio Joo Pesséa. Esse novo nucleo, para 500 ou 1.000 leprosos, se suppriria de agua potavel nesse rio. Do lado do rio Prata as aguas estio escasseando cada vez mais. Com o fim de indicar essa séde inspeccionei, a cavalo, as terras do Prata, no dia 2 de Fevereiro, em companhia do Engenheiro Bertino Barbosa de Lima, da Directoria de Obras Publicas, e do agrimensor Inno- cencio Bentes. Ambos concordaram com essa escolha. aso se resolva fundar alli esse novo nucleo de leprosos, 6 aconselha- vel a creacdo de uma olaria, proximo ao Maracani, e a installagio de uma serraria volante, utilizando-se um locomovel a lenha. Desde logo devo informar que o custo per capita de alojamento, no Prata, em egualdade de condigdes, sera 0 dobro do de Cutijuba, haveada alli mais a grande diffuculdade de administragio e encarecimento do cus- teio do leprosario, pela enorme distancia da capital. Em qualquer das duas hypotheses o velho asylo do Tocunduba nao poder ser fechado to cédo, como é muito desejavel. Seria isso possivel si os governos do Estado e da Unido, num grande gesto de solidariedade, realizassem obras capazes de dotar o Prata e o Cutijuba com lotacdo para recolher 70% dos leprosos do Par (cerca de 2.800), que representam os seus casos em periodo contagiante. Realizado isso, com 25 annos de cam- panha descontinua o problema da lepra naquelle Estado estar dominado. As obras da Liga no Prata. — Elaborado o projecto do pavilhao «Carville», modificado para clima tropical, tendo 2 dormitorios de 7 x 12 mts., cada um com 12 quartinhos separados por tabique de madeira (acapit) de 2 metros de altura, e ao centro, na entrada, um varandim de 7,5 x 2,5 metros, seguido de uma sala de estar com 7,50 x 4,30, dahi seguindo-se um corredor de 1,5 até ao fundo, dando entrada, 4 direita, 4 rouparia (3,00 x 2,80) ¢ a trez W. C. 240 Memorias do Instituto Oswaldo Cruz XXVIE, 3 de 1,30 x 1,00; e a esquerda dando entrada a um quarto com 4 ‘lavabos (3,0 x 2,0) e a outro de 3,00 x 1,50 com 2 banheiros. © comprimento total do pavilhao é de 3ims.,80 por 7ms.,30 de largura. A seguinte discriminacio executiva da construccio de cinco pavi- Ihées, segundo as dimensées acima e disposicdes ¢ aspecto de um projecto fornecido aos interessados, servio para a abertura da coneurrencia publica para a sua construccio: 1) Alicerces — Serao de alvenaria de pedra vermelha com argamassa de cimento ¢ areia na proporciio de 4 x 1, sobre ter- reno solido, nas dimensdes cubicas do desenho, tomadas como minimas 2) Castellos. — Serao de alvenaria de concreto, com argamassa de 6 x Le altura de um metro, sendo rebocadas e caiz das sémente as faces visiveis. 3) Paredes externas. — Serio de alvenaria de tijolo, com espessura de 0,15, apoiadas, na altura do pordo, so- bre vigas de cimento armado com trilhos «decauville», reforgadas e atra- cadas com pregos de 4” em cada cinco fiadas por »rumos de acapti de 6” x 6”, isto é, da largura da mesma parede, revestidos de conereto até a-al- tura do soalho e enterrados em concreto e terreno solido de um metro de profundidade sobre um taco de pranchio de macaranduba, paredes ess tecidas e rebocadas, inclusive os prumos, que serio picados a enx6 para esse fim, com argamassa de 6 x1 externamente, tido caiado de ambos os lados com tres. demios. 4) Paredes internas. — Serfio de tabique singelo de acapti, com dois metros de altura, ficando as dos sanitarios sobre um rodapé de tijolo a cutelo, tudo rebocado e caiado, sendo a face de dentro dos banheiros, sentinas ¢ layabo com cimento branco polido. 5) Biombos. — As camas nos dormitorios, serfio separadas lateral- mente por um hiombo de taboas de freij6 apparelha- das, macheadas e pintadas a oleo de ambas as faces, tendo 2,50 de comprimento por dois de altura ¢ deixando um espaco de 0,10 em baixo, para facilitar a lavagem do soalho. Setembro, 1933 Souza-Araujo: A Lepra no Norte do Brasil 241 6) Soathos ¢ pisos. — Os dos dormitorios, sala de estar, rouparia ¢ corredores serio de taboas apparelhadas ¢ macheadas de acapt ¢ amarello sobre vigamento de acapti, madres de 6” ¢ barrotes de 4”. Os do varandim serio de regoas de acapti separadas de um centimetro. Os pisos dos sanitarios, inclusive lavabo, serao de cimento ar- mado reyestidos de mosaico. 7) Telhado. — Sera de telha , municipio Joo Pessoa, a 120 kilometros de Belém. Fundada por Souza Araujo na administragao Souza Castro (1924). Fig. 23 — Os 3 pavilliGes primitivos, tendo ao centro a administragio e servigos medicos. Fig. 24 — Lado opposto da praca Santo Antonio, mostrando os typos de casas de leprosos com familias. (Photos originaes) ESTAMPA XLVI MEMORIAS DO INSTITUTO OSWALDO. TOMO XXVII—1933, PARA — , no municipio Joao Pessoa. Fig. 25 — A egreja Santo Antonio e o pavilhdo dos homens, com 14 salas-dormitorios. Fig. 26 — Ar- mazens dos fornecedores do leprosario, A. Ramos e Cia., no kilometro 18 da linha do Prata. (Photos originaes) MEMORIAS DO INSTITUTO OSWALDO CRUZ ESTAMPA XLVIL ————— TOMO Xxvit_1933 PARA — «Lazaropolis do Prata», no tunicipio Joao Pessoa. Fig. 27 — A multidao de leprosos defronte do pavilhlo central, tendo 4 sta frente os Drs. Rutowitez (irector), Souza Araujo, Mario Chermont ¢ Hilario Gurjio. Fig. 28 — Um grupo de leprosos eminentemente contagiantes (Typo C3.) em 1-2-933. (Photos originaes) MEMORIAS DO INSTITUTO OSWALDO CRUZ ESTAMPA XLVIII ——— TOMO xxvil—1933 PARA — . Fig. 32 — Planta da séde do leprosario mostrando, em negro, os pavilhdes existentes, © em xadrez {95 locaes excolhidos para os 5 novos que a Liga contra a Lepra do Para vae mandar construir alli, em 1933, 05 fotes ja teem muitas construcgdes. (Original) MEMORIAS DO INSTITUTO OSWALDO CRUZ TOMO XXVII—1933 or ESTAMPA LI ILE DE | MARAJO strando a séde da itha de Cu minutos em lancha. Esss ilha, com 1,031 hectares de tert a0 governo do Estado, esta reservada para séde de uma nova colonia agricola para leprosos, juba em relagdo 4 cidade de Belém, de que dista 75 no cultivavel, além dos lagos piscosos, pertencente (Copia do mappa do Amazonas de Paul le Cointe) : J Setembro, 1933 Souza-Araujo: A Lepra no Norte do Brasil 243 A differenca entre o meu calculo e essas propostas é enorme. Achei exhorbitantes todas ellas, sabendo-se que a standardizacio de todo o ma-~ deiramento para 5 pavilhdes baratearia a obra. Allegam que o milheiro de tijollos custa em Belém 1608000 (em Sio Paulo, 303000) e o frete, carga e descarga de Belém ao Prata 1108000, num percurso de 120 kilometros ! O milheiro de telhas convexas custa 1803000 e o de telhas francezas 380$000, postas em Igarapé-Assti, havendo ainda o transporte até o Prata (24 kilometros em ramal Decauyille). No leprosario de Pirapitinguy (S. Paulo), foram construidos 2 typos de pavilhdes «Carville», um de 38:000$000, todo de alvenaria de tijollos, de 30ms,50 de comprimento por 9ms.50 de largura, com paredes internas até a altura do tecto, contendo: 1 sala de estar com 3,40 x 8,60 mts., com uma porta e 4 janellas; 1 corredor com 23ms,60, dando entrada, 4 direita, para: 1 copa com 1,80 x 3,50; 1 rouparia com 3,40 x 3,50; 5 quartos de 3,40 x 3,50, a 2 camas; 1 compartimento com 3 W. C. a 1,00 x 1,60 e outro compartimento de 3,20 x 1,80 com 4 lavabos. E 4 esquerda 7 quar- tos de 3,40 x 3,50 dos quaes 6 a 2 camas e 1 com 2 banheiros. Ao fundo: terraco de 2,20 x 8,90 mts. com escada para o quintal. O corredor com 3 claraboias com telhas de vidro. Total de leitos 22. Per capita de alojamento 1:722$222. O outro typo de pavilhao, de custo de 28: 6008000, tem 23 metros de comprimento por 8,80 de largura, tambem todo de alvenaria de tijollos, comprehendendo: 1 terrago aberto de 2,40 x 5,20; 1 corredor de 18 me~ tros por 1,40, e 4 direita deste 4 quartos com paredes até 0 tecto de 3,40°x 3,50 para 2 camas cada um; 1 banheiro de immersio, 1 chuveiro, separado, 2 W. C. e 2 lavabos. A’ esquerda do corredor: 5 quartos eguaes dquelles. Ao fundo: terrago de 2,40 x 5,00 e escada para o quintal. Tolal de leitos: 18. Per capita: 1:588$888. Copias dos projectos destes 2 typos de pavilhdes «Carville», para vlima temperado, ficaram com o Dr. Guilherme Paiva, presidente da Liga. Pavilhdo do typo estudado para o Prata—calculei em 20: 0003000 tanto para o Amazonas como para o Acre. Péde-se admittir um maximo de 1:000$000 per capita. Si n&o fOr possivel construir esses pavilhdes no Prata, de accordo com a discriminagao, 4 razio de 1:5008000 per capita, sera preferivel abandonar o plano e mandar construir barracas de paredes de barro e co- bertura de telhas convexas, taes como as que tém sido feitas, de excellente aspecto e duracio, 4 razio de 2:000$000, isto 6, a 5008000 per capita. 50 casas para 4 doentes, nessas condigées, custariam 100: 0003000, 244 i Mentorids do Instituto Oswaldo Craz, V. A LEPRA NO ESTADO DO MARANHAO HISTORICO O Prof. Nina Rodrigues diz que a . (Dic. Hist, e Geog. da Provincia do Maranhio, 1870, Cesar Marques, citado por Cassio Miranda). Em 1886 esse quadro era 0 mesmo segundo o Dr. Nina Rodrigues, e o que elle presenciou em Anajatuba nfo era menos tetrico. Em 1888 Nina Rodrigues (Gaz. Med. da Bahia, anno 20, 1888/89, p. 110) dizia que era zona leprosa a regiio banhada pelos rios Pindaré, Gra-

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