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O documento discute a relação entre o Estado e os trabalhadores no Brasil nas décadas de 1930 e 1940. Nesse período, o Estado elaborou legislação para regular o mercado de trabalho e valorizar a figura do trabalhador. No entanto, existiam limites na implementação completa dessas políticas devido a fatores estruturais e à recepção ativa dos trabalhadores.
O documento discute a relação entre o Estado e os trabalhadores no Brasil nas décadas de 1930 e 1940. Nesse período, o Estado elaborou legislação para regular o mercado de trabalho e valorizar a figura do trabalhador. No entanto, existiam limites na implementação completa dessas políticas devido a fatores estruturais e à recepção ativa dos trabalhadores.
O documento discute a relação entre o Estado e os trabalhadores no Brasil nas décadas de 1930 e 1940. Nesse período, o Estado elaborou legislação para regular o mercado de trabalho e valorizar a figura do trabalhador. No entanto, existiam limites na implementação completa dessas políticas devido a fatores estruturais e à recepção ativa dos trabalhadores.
“O trabalhador, mesmo sendo pobre, era um homem bom e honesto.
Suas dificuldades e sua pobreza não deviam ser associadas a falhas morais, mas às condições estruturais do sistema sócio-econômico, que podiam ser vencidas. A ascensão social do trabalhador estava, portanto, relacionada à intervenção do poder público e na dependência deste, única força capaz de superar os enormes problemas que condicionavam e impediam sua realização pessoal. Era o Estado, personificado na figura de Vargas, que possibilitaria o acesso dos trabalhadores aos instrumentos de realização individual e social. Desde então, no Brasil, a relação homem do povo/Estado fundou-se, em grande medida, nessa mitologia do trabalhador e do trabalho como fonte de riqueza, felicidade e ordem social.” p. 71. Anos revolucionários “Os anos 30 e 40 são verdadeiramente revolucionários no que diz respeito ao encaminhamento da questão do trabalho no Brasil. Nesse período, elabora-se toda a legislação que regulamenta o mercado de trabalho do país, bem como estrutura-se uma ideologia política de valorização do trabalho e de “reabilitação” do papel e do lugar do trabalhador nacional. A dinâmica entre os dois processos reforça-os mutuamente. No entanto, neste texto, estaremos mais atentos ao segundo, recorrendo ao primeiro apenas marginalmente.” p. 53. Estrutura histórica da pobreza. “Durante muitos séculos, no Brasil e no mundo, a pobreza fora entendida como um fato inevitável e até útil, uma vez que consistia em estímulo ao trabalho. Os “pobres” tornavam-se operosos por força da necessidade, enquanto cabia aos “homens bons” a responsabilidade social por sua existência e pelo progresso da nação. O processo pelo qual a pobreza começa a ser identificada como incômoda e até perigosa, e portanto nem tão útil, é longo e associa-se ao desenvolvimento das relações capitalistas, fundamentalmente identificadas ao mercado de compra e venda da força de trabalho. No Brasil, tal processo acelera- se após a proclamação da República e mais particularmente após a I Guerra Mundial.” p. 53-54. Abolição e mudança no estatuto do trabalho “Tal diagnóstico pode ser mais bem compreendido quando se observa que a Abolição encerra uma experiência de três séculos, na qual uma imensa população de trabalhadores — os escravos — era definida pela ausência de qualquer reconhecimento social e político. Se durante o Império o processo de State building estava em curso e teve amplo sucesso (com a manutenção da unidade territorial e a expansão do aparelho de Estado), o processo de nation building estava comprometido pela própria existência da escravidão. Só com a Guerra do Paraguai, a Abolição e a República — nas décadas que vão de 1870 a 1890 — que se pôde passar da construção do Estado para a construção da nação, enfrentando-se a questão chave da extensão dos direitos de cidadania, quer fossem civis, políticos ou sociais.” p. 54. “Ou seja, a formulação liberal clássica que associa o ato de trabalhar com riqueza e cidadania sempre estivera ausente do país e produzir uma identidade social e política para o trabalhador era um esforço muito grande.” p. 55. Repensando a pobreza e o trabalho aqui “O que ocorria de novo nesses diagnósticos sobre as causas dos problemas do país era a demanda de novas esferas de intervenção do Estado que incluíssem áreas como educação, saúde e o mercado de trabalho. Neste último caso, tais reflexões objetivavam claramente o trabalho urbano, conturbado por agitações grevistas cada vez mais consideradas ameaçadoras, mas alcançavam também o trabalho rural, visto como desorganizado e completamente abandonado.” P. 54. “É a partir desse momento, demarcado pela Revolução de 30, que podemos identificar de forma incisiva toda uma política de ordenação do mercado de trabalho, materializada na legislação trabalhista, previdenciária, sindical e também na instituição da Justiça do Trabalho. É a partir daí que podemos igualmente detectar — em especial durante o Estado Novo (1937-45) — toda uma estratégia político-ideológica de combate à “pobreza”, que estaria centrada justamente na promoção do valor do trabalho. (...) Promover o homem brasileiro, defender o desenvolvimento econômico e a paz social do país eram objetivos que se unificavam em uma mesma e grande meta: transformar o homem em cidadão/trabalhador, responsável por sua riqueza individual e também pela riqueza do conjunto da nação.” p. 55. “O trabalho, desvinculado da situação de pobreza, seria o ideal do homem na aquisição de riqueza e cidadania. A aprovação e a implementação de direitos sociais estariam, desta forma, no cerne de uma ampla política de revalorização do trabalho caracterizada como dimensão essencial de revalorização do homem. O trabalho passaria a ser um direito e um dever; uma tarefa moral e ao mesmo tempo um ato de realização; uma obrigação para com a sociedade e o Estado, mas também uma necessidade para o próprio indivíduo encarado como cidadão.” P.55 Manipulação da classe trabalhadora? “Porém, o processo de produção do consentimento não se sustenta somente em apelos ideológicos, tendo uma explícita dimensão sócio- econômica. Isto é, ele está fundado em procedimentos que asseguram a existência de vantagens materiais efetivas para os grupos dominados. A legitimidade de um arranjo institucional não advém simplesmente da manipulação e/ou repressão políticas, deitando raízes em práticas que incorporam — em graus muito variados — interesses e valores concretos dos que estão excluídos do poder.” p. 56 Limites e dificuldades aqui “Contudo, o problema da distância entre a existência da legislação e sua “real” (completa e eficaz) implementação situa questões cruciais que envolvem, de um lado, a percepção dos limites existentes à execução de medidas que signifiquem vantagens para as classes populares; de outro, a ocorrência de confrontos e brechas no interior das próprias políticas elaboradas pelo governo, que não é um todo harmônico e sem fissuras. Finalmente, a elaboração e execução de políticas públicas têm como desdobramento a recepção dessas políticas por seu público-alvo, no caso, os “trabalhadores”. Como se sabe, tal recepção é um processo ativo que ressignifica os próprios objetivos originais das políticas, dotando-as de novos sentidos e interferindo no curso dos resultados antecipados pelos planejadores. Assim, se o Estado Novo “releu” a experiência da classe trabalhadora da Primeira República, dela se apropriando e produzindo um novo discurso, também a classe trabalhadora dos anos 40 e 50 “releu” a proposta do Estado, atribuindo-lhe sentidos diversos e tornandoa patrimônio de suas vivências históricas. Mas aqui não nos ocuparemos desses processos, sem dúvida essenciais e particularmente complexos.” P. 57. Trabalho, ciência, estado “O Estado Nacional do pós-1937, por seu ideal de justiça social, voltava-se para a realização de uma política de amparo ao homem brasileiro, o que significava basicamente o reconhecimento de que a civilização e o progresso eram um produto do trabalho. “Toda moderna concepção econômica, política e social deverá ter por base a idéia-fato: trabalho. E todo programa voltado para o mundo novo a constituir será contido nesta fórmula: defesa, representação e dignificação do trabalho.” P. 57. O ideal de justiça social ia sendo explicitado como um ideal de ascensão social pelo trabalho, que tinha no Estado seu avalista e intermediário. O ato de trabalhar precisava ser associado a significantes positivos que constituíam substantivamente a superação das condições objetivas vividas no presente pelo trabalhador. A ascensão social, principalmente em sua dimensão geracional, apontava o futuro do homem como intrinsecamente ligado ao “trabalho honesto”, que devia ser definitivamente despido de seu conteúdo negativo. O trabalho era civilizador: “O trabalho não é um castigo nem uma desonra. Só o é para os que alienam o seu valor de colaboradores sociais e trabalham bestializados sob o império da máquina. A mecanização, sem inteligência e sem ideal, é que torna o homem mercadoria das forças econômicas”. P. 58. Permanências de representações do período escravocrata. “Uma política de organização científica do trabalho devia encontrar o equilíbrio entre os esforços de mecanização da produção (essenciais à industrialização dos países) e a proteção dos valores humanos e cristãos do trabalhador brasileiro. Era esse o grande esforço do novo Estado nacional. Ele enfrentava a questão social não como uma questão operária, mas como um problema de todos os homens e de todas as classes, já que são trabalhadores todos aqueles que produziam, que colaboravam com o valor social de seu trabalho.” p.59. Dessa forma, o Brasil incorporava definitivamente o conceito de medicina social que se desenvolvera na Europa desde o século XIX, tendo Bismark como figura central. O trabalhador passara a ser assistido pelo Estado, que se preocupava não só com a sua saúde física como também com sua adaptação psíquica ao trabalho que realizava. O homem que exercesse profissão compatível com seu temperamento e habilidade produziria mais. Daí a relação entre política de saúde e as modernas técnicas de seleção e orientação profissionais: “se queremos um rendimento maior e mais perfeito, é lógico que só é possível esse rendimento e essa perfeição nos indivíduos hígidos mentalmente”. p. 60. Combate à malandragem “A atuação do Estado para com a arte popular destacava-se, por exemplo, pelo reconhecimento do valor e do “poder de sugestão” da música, sendo os efeitos da nova política social sentidos em um grande número de composições. Até então, como se observava, os sambas tinham como temática recorrente o elogio à malandragem, caracterizando o trabalho como um longo e penoso sofrimento. O malandro do morro — “o enquistamento urbano do êxodo das senzalas” — que repudiava o trabalho era o herói do cancioneiro popular. Mas tal panorama vinha-se modificando pela presença das leis que reconheciam os direitos dos trabalhadores e pela política de derrubada das favelas e dos mocambos. Surgiam dessa nova perspectiva personagens que se empregavam em fábricas e outros afazeres. Assim, o primado do trabalho, reconhecido pelo Estado, chegava também à voz dos compositores populares sob o estímulo e censura do Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP).” p. 64