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ESTRATEGIAS DE LEITURA I 4.1 APRESENTACAO Os_capitulos anteriores serviram para destrinchar em sua complexidade constitutiva o ato da leitura. Longe de ser uma sequéncia simples de gestos de decodificacdo de signos, a leitura é uma atividade guiada por diferentes tipos de expectativas, de niveis pessoal, social e mesmo cultural. Muitas sao as formas de leitura, segundo os interesses pessoais e as exigéncias contextuais em que tal atividade se da, e seu sucesso depende da aplicacao satisfatéria de técnicas para a obtencio dos objetivos almejados. A eficacia da leitura remete, assim, a um constante ajuste entre, por um lado, as particularidades do texto e da situagio concreta e, por outro lado, as capacidades subjetivas de apreensio do sentido textual. Para que essas iltimas se exercam de modo pleno, estratégias especificas Para a otimizacdo do entendimento devem ser constantemente postas em aco. Conforme também visto nos capitulos anteriores, as estratégias sio procedimen- tos tipicos para facilitar a compreensao do texto, aplicaveis nos mais diferentes niveis de construgio textual (palavras, frases, parégrafos, secdes). Por exemplo, reimnir informag6es sobre a publicacZo e o ptiblico a que originalmente a obra em estudo se dirige € uma estratégia que contextualiza o texto em relagio as questoes pertinentes de sua época; sublinhar trechos da pagina lida é uma estratégia que hierarquiza 0 contetido, e assim por diante. ‘Veremos, a seguir, um quadro em que as principais fungdes cumpridas pelas estratégias sio sistematizadas em relagio as fases da leitura (quadro 4.1). Antes, 88 © Leitura e Eserita de Textos Argumentativos voltemos a acentuar que muitas das dificuldades recorrentes de entendimento de textos em nivel académico ou profissional remetem a um desconhecimento das estratégias adequadas para os casos em pauta, Dado que algumas estratégias sio complexas e, entio, dificilmente seriam intuidas de modo espontaneo, essas dificuldades de leitura reenviam, em tiltima instancia, 4 énfase tradicional nos contetidos tematicos, sem que se ofereca um treino explicito dos procedimentos técnicos requeridos para efetivamente dominar 0 contetido em questo. Reforca- mos a intengao maior deste livro: expor detalhadamente ao menos algumas das principais estratégias para a compreensao de textos argumentativos comumente ‘empregados nas atividades académicas, em filosofia ou ciéncias, e mesmo na vida profissional ¢ piiblica dos interessados em geral. Em particular, sera privilegiada a leitura que busca 0 aprendizado formador e, assim, se abre ao entendimento das posicdes defendidas no texto conforme sua ordenagao expositiva, sem interpolar avaliagdes de preferéncias em relacao a elas; em suma, aquilo que nomeamos Leitura abrangente. 4.2 VISAO GERAL SOBRE AS ESTRATEGIAS Oato da leitura nao se esgota nos momentos em que se tem contato continuo com 0 texto, embora sem dtivida esse seja o exercicio central para a apreensio do sentido em foco. A medida que amadurece a consciéncia acerca das dificuldades inerentes a textos complexos e buscase aperfeicoar as préprias capacidades em vista dos objetivos propostos, ganham destaque momentos anteriores ou preparatérias 2 leitura e a momentos posteriores ou de sedimentacao do sentido apreendido. Dessa maneira, a leitura nao se reduz ao contato efetivo com o texto, pois, realizada de modo metédico com vista a formacao de longo prazo, exige certo preparo ¢, talvez de maneira ainda mais importante, certo cuidado para atribuir um formato estavel reconstrucio do sentido textual, preservando-a. Vamos apresentar um quadro sindptico das estratégias a serem detalhadas no correr deste livro, com base em uma divisio simples das fases da leitura, Acentuaremos também as fungdes gerais para o entendimento do texto que as estratégias cumprem nessas fases' 1. Seguimos, em tinhas gers, Artelt eT, Darfler, *Prderung von Lesckompetenz als Aufgabe aller Fiche Forschungergebniste und Antegungen far die Praxis", 2010, p. 30 [pp. 1336] Estratigias de Letra © 89 Quadro 4.1 Quadro sinéptico das estratégias de leitura Fase Estratgias Informarse sobre 0 texto Contextualizagio da obra Antes da leitura | — ——_ CO — Onganizarse para a leisura Preparo pessoal Esclarecer uso de termos © expressdes por recurso Clarificagio do sentido 8 dicionériose gramsticas Durante a leitara Sone & Bra — Hierarquizagio dos temas: Fazer notagdes no texto explicitacio do movimento expositivo Reconstrugio do sentido; Depois da leituraEserever fichas sobre 0 texto sedimentagio do contetido apreendido Essas so algumas das principais estratégias para a leitura abrangente de textos argumentativos (elas também sio cabiveis para outros tipos de leitura e para outros géneros textuais). Seguramente, outras poderiam ser enumeradas € discutidas, refinando ainda mais a apreensio dos contetidos textuais. De nossa parte, vamos nos contentar em apresentar essas cinco estratégias como uma espécie de quicleo metodoligico basico para o estudo produtivo de textos argumen- tativos, Veremos que algumas dessas estratégias (tais como fazer notacdes ¢, em particular, escrever fichas) abarcam diversos niveis de complexidade, de maneira que a destreza na aplicacio desse nticleo basico de estratégias no é algo tio facil de atingir, ja que exigira o treino met6dico de diversas etapas concatenadas. Vale a pena acentuar que o emprego de estratégias auxilia a desenvolver um tipo de nogdo estratégica geral, de cardter metacognitivo, por assim dizer’, Afinal, as estratégias nao esto necessariamente embutidas no ato de ler, mas so postas em acdo conforme uma andlise das dificuldades circunstanciais da leitura. £0 constante treino no tipo de funcao especifica exercida pelas estratégias no percurso de entendimento de um texto que refina a habilidade de ativé-las c retamente nas diferentes fases da leitura. A paulatina competéncia no emprego satisfatrio das estratégias faz também avancar nogdes metacognitivas relativas a cada fase da leitura, conforme o quadro 4.2 torna visivel: 2 Aqui também nos baseamos, em linhas geris,em C. Artet eT, Defer, op it, 2010, pp. 2080. 90 © Letra e Bserita de Tests Argumentativas Quadro 4.2 NocGes metacognitivas relatvas a cada fase da leitura Fase Compeincia metacognitiva Plangjamento da atvidade, buscando 08 recursos necessirios € Antes da leitura onganizando seu exercicio conforme os objetivos propostos Controle das atvidades exercidas a luz das expectativas de Durante a leitura Controle das: das expectativas di compreensio Avaliagao dos resultados obtiddos em relagio as dificuldades espe- Depois da leinura ificas do texto em estudo Em poucas palavras, o planejamento, o controle e a avaliagao sao as habilidades metacognitivas que se desenvolvem conjuntamente com o treino metédico das estratégias de leitura e que se configuram como habilidades de regulagéo do préprio emprego das estratégias. Dessa maneira, conhecer a utilizaco das estratégias nao se resume a automatizar procedimentos esquemiticos de lida com o texto, mas envolve @ maturacio de um saber pritico acerca da conveniéncia de utilizar esses esquemas, da correcio de sua aplicacdo ¢ do sucesso da empreitada. O treino das estratégias favorece, assim, essa densificacao da experiéncia da leitura, de modo que esta tiltima nao apenas disponha de recursos especificos para superar difi- culdades com o texto, mas implique saber quando ou nao empregélos ¢ fazé-lo satisfatoriamente. Desse ponto de vista, a boa aplicacao das estratégias exige um discernimento que, por sua vez, nao € ele mesmo redutivel a regras claras, mas remete a um reconhecimento pratico das circunstancias em vigor e & habilidade de responder adequadamente a estas. Nao é, entdo, apenas 0 conhecimento dos pasos metédicos das estratégias que por si s6 distingue os leitores maduros daqueles ainda aprendizes, mas a habilidade de empregé-las no momento certo € de avaliar a pertinéncia dos resultados. Esse saber eminentemente pratico, que tanto marca a Ieitura experiente, é justamente adquirido pelo treino constante das estratégias em diversas circunstincias concretas* # importante salientar, por conseguinte, que o entendimento frutifero das niio se encerra ao decorar 0s pasos metédicos de sua aplicacao. Para 08 leitores deste livro, esperamos que esse entendimento apenas se inicie assim, uma vez que somente a pritica regular dessas estratégias em diversas situacdes enriquecerd o discernimento de modo a permitir decisoes satisfatérias acerca de quais estratégias seguir, quando usélas e como avaliar se foram bem utilizadas ou se cabe refazer alguns de seus passos. Apresentaremos aqui alguns exemplos detalhados da aplicacdo das estratégias, por meio dos quais esperamos motivar 3. Sobre aideia de que a experinciapritca excede os componentes estitamente metidicos da interpretacio ‘textual, ver C. Romano, "La regle souple de Vherméneutique”, 2015, p. 464479 Estratégias de Leitura I © 91 os leitores a treinarem por si s6s as técnicas expostas e, assim, a ganhar paulati- namente seguranca sobre seu uso ¢ resultados alcancéveis. Passemos finalmente a uma exposicao detida das estratégias que compdem aquele niicleo metodolégico basico para o bom exercicio da leitura abrangente, Neste capitulo, apresentaremos as estratégias aplicaveis antes e durante a leitura. Nos dois seguintes, exporemos detalhadamente 0s fichamentos como principal estratégia de reconstrucio ¢ sedimentacdo do contetido lido. 43 ESTRATEGIAS ANTERIORES A LEITURA 4.3.1 Informarsse sobre 0 Texto 43.1.1 SELECGAO DE TEXTOS A estratégia mais basica de preparacao para a leitura é, conforme visto no quadro 4.1, informarse sobre 0 texto a ser lido. Vale notar que essa estratégia também é crucial para uma atitude ainda anterior, a saber, para a propria toma: da de decisao sobre a pertinéncia e a conveniéncia da leitura de um texto em certa ocasido. Essa estratégia pode entdo ser inicialmente usada para selecionar © que se vai ler. Muitos sao os casos em que nao ha margem de escolha sobre ler on nao ler um texto, como ocorre em cursos universititios, nos quais certa bibliografia ¢ previamente montada pelos professores, cabendo aos matriculados implesmente realizar as leituras indicadas como parte das tarefas obrigatérias No entanto, nos casos em que se vai estudar um tema por livre iniciativa ou em que ha escolhas relativas a uma bibliografia privilegiada (em uma pesquisa de longo prazo, por exemplo), julgar bem quais leituras merecem ser feitas é um fator decisivo para poupar esforcos intiteis ¢ valorizar o tempo disponivel. Alias, a disponibilidade de tempo é um dos critérios mais importantes para decidir se vale ou no a pena ler determinado texto em vista. Cabe ao leitor ponderar © que busca exatamente (se apenas um conhecimento generalista acerca de t6picos que desconhece, se complementacio ou atualizagao para sua formacio, se qualificaco para algum exame ou mesmo para a participacio em {runs especificos de discussio) e se hd algum prazo oficial estipulado, para entao ava- liar sua disponibilidade, em vista das demais tarefas cotidianas, para perfazer a Teitura dos textos em pauta’. Sugere-se mesmo que se tente organizar as tarefas semanais em uma tabela para destacar os hordrios disponiveis para a leitura 4. Devese notar que, mesmo quando no se rata de uma ctcunstincia em que bi wa data limite cara: ‘mente extaelecda, ainda ¢ possvel ponderar a pertinéncia da letura em termos de prac, propentos entio voluntariamente como um elemento organizador da progressio no esta de tu tema 92 © Leitwrae Escrita de Texts Argumentativos sopesar se sero ou nao suficientes para dar conta do material almejado’, Essa sugestao obviamente vale também para estudantes oficialmente matriculados em cursos com grande carga de leitura obrigatéria. Afinal de contas, a simples atribuicio de obrigatoriedade a leitura, embora alivie 0 esforco de decisio sobre o que ler, nada garante sobre a efetividade da leitura, uma ver que esta depende basicamente do tempo disponivel em funcao da totalidade de tarefas agendadas, Cabe a cada um avaliar de modo realista a possibilidade de cumprir certa carga de leitura até determinado prazo, 0 que exige levar em conta que a leitura abrangente de textos (supondo, é claro, que se busca exercé-la) nao € algo que se faz em modo “dindmico”, pois requer 0 cumprimento de varias tapas com considerivel grau de trabatho. Diante de limitacGes incontornaveis de tempo, sera preciso até mesmo escolher entre textos de leitura obrigatéria, € entio os critérios de centralidade para a ocasiéo em foco (por exemplo, em muitos cursos, os professores distinguem entre leitura bisica ¢ leitura de apoio) devem ganhar destaque na reflexao preparatéria. Em todo caso, ainda que as dificuldades de disponibilidade de tempo (e de cansaco) fossem todas idealmente resolvidas, os problemas ligados A decisi sobre 0 que ler permaneceriam. Afinal, nem todos os textos sobre um tépico oferecem contribuicdes relevantes, confiveis e logicamente bem justificadas. Supostamente, as dificuldades de selecdo das obras estao superadas nos cursos académicos, cujos professores tanto conhecem as obras consagradas como dis tinguem entre a bibliografia importante € textos desinteressantes ou mesmo contendo sérias imprecis6es sobre 0s t6picos em estudo. Porém, no caso de estudos autodidatas, a selecio de obras a ler é um desafio com consequéncias significativas para o entendimento do assunto em questio. Nesses casos, conforme afirmado ha pouco, a estratégia de informarse sobre o texto possuii um carter decisivo sobre a continuidade ou nao da leitura de certas obras. Assumindo, entio, que nem todos 0s textos sobre 0s tépicos em vista sio igualmente merecedores de atencio, como selecionar aqueles a serem lidos? Nesse caso, a busca de informacées sobre um texto deve favorecer um juizo decisivo sobre a lida com a obra eit patita naquela cireunstincia. Suponha, en- tio, que um leitor fique sabendo de um texto que parece tratar do assunto que ele busca estudar. Como proceder uma pré-avaliacao da pertinéncia do texto? Deve-se buscar informagées que permitam avalidlo em relagio aos objetivos almejados (seja conhecer genericamente o tema, seja desenvolver uma pesqui- sa de folego ou ainda avaliar posiedes disponiveis sobre uma polémica etc.). A fim de esquematizar essa pré-avaliacdo, sugerimos o questionamento critico dos diferentes tipos de contetidos veiculados pela obra 7 5. Voltaremas 2 esse ponto na préxina secio, Estratégias de Leitura 1 © 93 * Contetido factual: a exposicao e a discussiio de dados factuais acerca do tema séo centrais para a obra? Essa exposicao ¢ essa discussio sio feitas de modo confivel? Os métodos utilizados para a exposicio do contetido factual sio atualizados ¢ bem aplicados? Os dados utilizados estio estabe- lecidos de modo objetivo ¢ sio confirmados por fontes independentes? * Contetido 16gico-conceitual: a obra se insere na tradicio pertinente de discuss dos temas em vista, retomando corretamente o “estado da 10"? Os problemas sio desenvolvidos com a devida complexidade simplificagdes conceituais ¢ teméticas patentes? Hé um esforco sério para justificar racionalmente as posigdes defendidas? + * Contetido valorativo: a obra retoma de modo neutro as posigdes diver- gentes acerca do tema? Ela evita a defesa unilateral obstinada de uma posicio, reconhecendo as razSes contrarias com sua devida forca légica? ‘Tais questdes permite esbocar uma nocio mais detalhada sobre as con- tibuicdes tedricas efetivas da obra em anilise para a problematica discutida, Quanto mais respostas positivas, mais claramente se marca a robuster expositiva do texto, o que 0 torna meritério de uma leitura atenta. No entanto, a dificul- dade € obter ao menos algumas dessas respostas informativas sem efetivamente ter de ler 0 texto para avaliar todos esses aspectos em detalhe! Quando nao se dispoe ainda do texto, mas buscam-se informacdes que justifiquem consegui- -lo ou no, entio as principais fontes para tentar responder a essas questdes criticas sao: * Resenhas especializadas ou em veiculos de grande circulagéo: em muitos periédicos bem reputados pela comunidade académica ha secdes para a anilise de obras consideradas pertinentes para diferentes areas de saber, © que contribui sobremaneira para a decisio de ler ou nao determinado texto. Alguns jornais ¢ revistas de ampla circulacao ¢ veiculos de comu- nicagao on-line também oferecem resenhas titeis na tomada de decisio acerca da leitura de uma obra. * Opinides de especialistas: por vezes é possivel ter acesso, seja por vefcuc los de comunicacao especificos (revistas, jornais, blogs), seja mesmo por contato pessoal (conversas com um professor), as opinides de estudiosos da area em questio acerca das obras que se pretende ler. Uma anilise concisa ou mesmo poucos apontamentos de aspectos positivos e negati- vos da obra por quem possui grande dominio do assunto podem fazer a diferenca para a deciséo de iniciar ou nao uma leitura * Relatos de outros leitores: por vezes, as opinides de outros leitores do texto, ainda que nao sejam especialistas experientes no tema, auxiliam na decisao de ler ou nao uma obra, Além de colegas préximos, é cabivel 94 © Leivurae Eserita de Textos Argumentativas vasculhar andlises ¢ resenhas informais de leitura em varios tipos de foruns de discussio na internet. Algumas opinides, desde que cuidadosa- ‘mente elaboradas, evitando simplificapies ¢ juécos unilaterais obstinadas, ajudam, (embora em grau menor em comparacio com os itens anteriores) na tomada de decisio acerca da leitura de um texto, Essas fontes contribuem para a formacio de um juizo prévio acerca de um texto (se é bem avaliado por seus pares, se é pertinente para 0 t6pico em estudo etc.) €, assim, motivam ou desmotivam sua leitura. Além de tudo isso, quando se tem acesso direto ao texto em questdo, cabe exercitar uma leitura panoré- ‘mica, passando os olhos sobre suas partes a fim de examinar sua pertinéncia Para os objetivos pretendidos. Nessa leitura panoramica com vista A decisio de Posteriormente dedicar-se ou nao a uma leitura muito mais detalhada, importa salientar os marcadores temiticos do texto, isto é, a exposicao sistemitica daquilo de que o texto efetivamente trata. Daf a importincia de estudar 0 sumério do texto, avaliando pelas subdivisées anunciadas se a progressio ali contida recobre as expectativas da leitura. Também merecem atencao os subtitulos no interior dos capitulos ou secdes (quando houver) € mesmo a bibliografia utilizada (se disponivel), a fim de esclarecer o campo disciplinar e as tradigdes de pesquisa a que a obra se filia. Por vezes, vale a pena ler atentamente a seco introdutéria, na qual amitide um plano geral da obra é esbocado. No caso de artigos cien- tificos, a maior parte deles se inicia justamente com um resumo do contetido, © que facilita enormemente a decisio da conveniéncia de sua leitura completa para os fins em questio. Em uma situacao ideal de informarse sobre textos para selecionar o que se lerd, 0 leitor disporia de resenhas ou da opiniao de especialistas e colegas acerca da importancia do texto ¢ também teria acesso direto ao texto (em bibliotecas, livrarias ou mesmo sites da internet), para entao avaliar sua pertinéncia. Nao raro uma fonte de dados indireta reequilibra um juizo baseado no contato direto com 0 texto (por exemplo, ao folhear um livro, o leitor nao se convence de sua importancia, embora também nao reconheca nenhum problema conceitual grave. A opinido de um especialista acerca da pertinéncia da obra pode entao ser decisiva) e viceversa (por exemplo, um especialista recomenda a leitura de uma obra, mas uma leitura panoramica de seu contetido confirma que o tema importante para a pesquisa do leitor é tratado apenas lateralmente e sob uma perspectiva que nao interessa, 20 menos naquele momento). 4.3.1.2 DADOS SOBRE OS TEXTOS ‘Vamos supor que 0 leitor jé se decidiu acerca do que ler em determinada ocasiao, seja por obrigatoriedade académica ou profissional, seja por decisio 4 Estratégias de Leitura I © propria em conformidade com um plano de estudos individual, A estratégia de informarse sobre o texto volta a ser aplicada, tendo em vista, agora, a prepara- io para leitura. Nessa preparacdo, importa reunir de modo sistematico certos dados sobre o texto, alguns dos quais talvez.jé tenham vindo & luz nas reflexes acerca da decisio de lé-1o ou nao. Trata-se de informacées globais que auxiliam a entender a proposta do texto ¢ mesmo alguns tracos do contexto sécio-histérico €m que estd inserido. Como vimos no capitulo 3, toda compreensio de um texto € antecipada por uma pré-compreensio genérica que guia a leitura, ainda que seja transformada no decorrer desta tiltima. Pode-se dizer que a reuniao sistema- tica de informacdes sobre o texto contribui para elaborar de modo menos vago essa pré-compreensio, direcionando-a conforme algumas marcas que anunciam a problematica efetivamente enfrentada pelo texto, ¢ evitando, assim, 0 apelo a nogdes por vezes muito distantes daquilo de que a obra se compée. De modo pratico, como se aplica essa estratégia de preparacéo para a lei- tura? Trata-se de organizar algumas informacées basicas sobre o texto, seja por apelo aquelas fontes citadas anteriormente, seja também pelo manuseio da obra para uma coleta de dados iniciais. Por vezes, € preciso ler de modo atento a seco introdutéria, em que comumente as informages contextuais so apresentadas, A seguinte série de perguntas bem diretas serve de guia para essa organizacio: © Qual o titulo preciso do texto? * Quem é 0 autor? * Quando ¢ onde o texto foi publicado? °Em inhas gerais, de que o texto trata? * Qual 0 contexto da publicacio? * Caso se trate de traducdo, ha informagoes sobre sua qualidade? A resposta a essas perguntas oferece as informacées elementares para orientar a leitura de um texto. Nao se esclarece ainda quais posicdes sio de- fendidas no texto, problema que exige uma leitura paciente para ser solucio- nado. No entanto, essas informacées gerais delineiam de modo mais seguro 0 horizonte de sentido no qual as teses do texto serio desenvolvidas, delimitan- do, por exemplo, a época € 0 lugar em que o texto se tornou acessivel 20 pit blico. E importante salientar que esas perguntas de preparagio para a leitura sio desdobriveis em varias outras, conforme o interesse, as necessidades ¢ a disponibilidade do leitor: + Em relacio ao(s) autor(es), talvez, ndo baste apenas listar nomes, mas seja importante reconstruir uma pequena biografia, a fim de inserir a producio do texto em foco em certa fase de seu desenvolvimento intelectual em contraste com outras fases, marcadas por outros textos. 9 96. © Leite Eseritade Texts Argumentaivns © Em relacio a data e ao local de publicacio, cabe esclarecer se 0 texto lido 6 a edicao original ou uma edicéo posterior modificada pelo au- tor. Cabe também aclarar, no caso de artigos e capitulos reunidos em coleténeas, quais as circunstancias da publicacao original. Por fim, é significativo saber se o texto foi publicado em vida pelo autor (quando entio foi avaliado como digno de circulacao publica), ou se se trata de publicacio péstuma de manuscritos ou notas que 0 autor ainda nao julgava prontos ou nem mesmo almejava publicar. * Em relacdo ao contexto de publicacao, importa clucidar se 0 texto se insere em alguma polémica espectfica, se era enderecado a algum pablico particular € se discute com outros textos especificos (0 que, por vezes, se esclarece por meio de referéncias bibliograficas explicitas) © Em relacio a textos traduzidos, vale a pena buscar informagées sobre a experiéncia do tradutor na area em questio, sobre a possivel participacto de revisores técnicos qualificados ¢, obviamente, sobre a qualidade da traducao em vista. Tradugdes repletas de imprecisdes conceituais impe- dem que se entendam corretamente as posicdes defendidas pelo autor €, no limite, ndo devem ser lidas. Para evitar dispersdo € confusio, as informacdes obtidas devem ser registra das em uma “ficha préleitura”, a qual se acrescentarao outras fichas construfdas nas demais fases da leitura. Ao final do processo de leitura, a ficha préleitura funciona como uma espécie de folha de apresentacio ou capa para as demais fichas. Como se ver4, ler bem equivalera a produzir uma espécie de “relat6rio de leitura” qualificado, do qual a ficha pré-leitura constitui somente o primeiro asso. ‘Vejamos alguns exemplos dessas fichas de informagdes prévias a leitura detida de um texto: iro 4.3. Exemplos de ficha de informagies de um texto pl ‘Texto: “O Método de Investigacio da Esséncia”™ ‘Autor: Edmund Husser! Edigdo: Husserl, E. Eunpa, Crise ¢ Renowagdo, Rio de Janeiro, Forense Universitiria, 2014, pp. 15.93, Informacées gers e context: trate de um artigo escrito originalmente em alemo, trade zido para o japonés e publicado na revista intislada Kaisa em 1928. £ um texto de divulge io para um piblico nio expecalizado e que, no geal, desconhecia os tabalhos de autor ‘Traducio do texto alemio: a cargo de Pedro M.S, Aves ¢ Carlos A. Morujo, renomados specialists na obra de Hasse Estratigias de Leitura I # ‘Texto: Ruma ao Catcismo Autor: Oswaldo Porchat Pereira Bdicio: S 10 Paulo, Editora da Unesp, 2006. Informaces gerais e contexto: tratase de uma coletinea de artigos publicados entre 1969 ¢ 2005, nos quais o autor, entre outras tarefas, refina uma posicao filoséfica propria, de cardter cético © empirista, ‘Texto: A Btica Protesante ¢0 “Espirito” do Capitalismo Autor: Max Weber Edicao; Sio Paulo, Companhia das Letras, 2004, Informagdes gerais ¢ contexto: tratase de uma obra ctissica de sociologia, publicada iniciak mente em dois volumes, em 1904 e 1905 e, posteriormente, em uma segunda edicio revista, em 1920. A edicio brasileira retoma a edicio original ¢ torna explicitos os acréscimos modificagdes da segunda edicao. ‘Traduciio: do original alemfo por José M. M. de Macedo, com supervisio tenica de Antonio F Pierucci, renomado pesquisador da obra de Weber. Como se vé, trata-se de registrar algumas informagdes basicas que permitam rapidamente reconhecer a edigio utilizada e, ainda que de modo superficial, se informar sobre o contexto da publicacao original. Desse modo, evitam-se confu- sdes acerca de qual exatamente é a versio lida, qual a época de surgimento do texto etc. Estabelece-se, dese modo, um ponto de partida seguro para a efetiva leitura do texto. 4.3.2 Organizarse para a Leitura Tendo ja registrado em uma ficha as informagdes basicas da publicacio, cabe entio organizarse para a leitura. E claro que ja é preciso ter se organi- zado para bem preparar a ficha de informacdes. Ocorre que a leitura da obra escolhida normalmente exige mais tempo e planejamento que a escrita dessas fichas. Por vezes, a organizacao se resolve de modo bastante simples, caso se tenha o texto mio e se disponha de tempo para lélo. Basta entio encontrar uum local adequado e entregarse @ leitura. Ocorre que nem sempre é assim tio facil, e a circunscricio de uma situacio favordvel de leitura por vezes exige di- ferentes tipos de decisio. Vamos abordar essa etapa organizatéria da leitura em um consideravel grau de detalhamento, tentando, assim, levar em conta varias das dificuldades tipicamente relacionadas a esse t6pico. De maneira geral, dois so os aspectos a serem considerados para o planejamento da leitura: aquele 7 98 © Leiturae Escrita de Texts Argumentativns da materialidade ou concretude do ato de ler ¢ aquele referente a gestio do tempo. Tratemos separadamente de cada um deles. 4.3.2.1 ASPEGTOS CONCRETOS DA LEITURA Esse primeiro t6pico se deixa abordar a partir da seguinte pergunta que cada leitor deve fazer a si mesmo: do que eu preciso concretamente para gfeluar a Iritura? A resposta deve abarcar as seguintes consideracdes: a. Disponibilizagio do texto: cabe decidir se 0 texto sera comprado, emprestado de uma biblioteca ou de um colega ou fotocopiado. Essa decisio nao é inécua para o aprofundamento da leitura. Por exem- plo, nao se deve fazer riscos ou notas em livros de bibliotecas, uma ver que isso, entre outros problemas, enviesaria a leitura de outros interessados. Entretanto, marcacdes no texto sao parte importante da leitura abrangente, como se ver’ na préxima secio. E patente que as circunstncias econémicas sao limitantes nesse ponto, mas, em relacao a textos centrais para a formacio em pauta, devese considerar seria mente a possibilidade de adquitilos, compondo assim uma biblioteca basica acerca do tema estudado. b. Disponibilizacdo de képis para as notacées no texto ¢ de papel € canc- ta para esbocar as fichas (ou de um computador, caso se decida por digité-las imediatamente) Disponibilizacio. de dicionérios (lexicais e especificos para o tema ou autor estudado, se for 0 caso) € graméticas: busca-se antecipar aqui dificuldades de compreensio de termos e expressbes durante a leitura, sanadas pela consulta a tais obras de referencia. 4, Disponibilizagio de um local adequado: na medida do possivel, deve- “Se buscar um local tranquilo e com boa iluminacio, Devese evitar in- terrupedes, 0 que implica, entre outras decisbes, absterse de (a0 menos durante os perfodos de estudos previamente estabelecidos) distracies dletronicas, Sem diivida, no ha como esgotar o tema aqui, mas vale mencionar que os aparelhos eletronicos (cetulares smartphones, tablets, laptops etc.) cada vez mais sio desenvolvidos de modo a fomentar ‘uma utilizagao constante por parte do “usuario”. Os aplicativos mais difundidos so aqueles de acesso a dados on-line especificos (de modo que ha repetidas notificacdes de contetidos novos dispontveis), ou de trocas de mensagens com outros usuiirios, 0 que leva a pessoa a consultar dezenas ou mesmo centenas de vezes por dia os aparelhos, a fim de atualizarse acerca daquilo que Ihe foi enviado. Nao ha nada de inocente nisso; esté-se diante de uma elaborada parceria entre engenharia design de produtos ¢ servigos, cujo resultado almejado Estratégias de Leitura 1 © 99 é capturar a atencio, mantendo o usuario diariamente fiel a certos aplicativos. Uma vez que nas complexas relagdes de valoracio das ¢m- presas ligadas & informatica o miimero de usuarios € certamente um fator central, as técnicas de cativagio da atencao sao decisivas para © sucesso das corporaghes responsdveis por esses aplicativos. Consultar seu smartphone a cada cinco minutos para rir das mensagens dos am gos nao € somente um livre exercicio da vontacde, mas principalmente tama repeticao irrefletida de um gesto aculado, de forma plane}ada, por grandes empresas que lucram enormemente com o direcionamen- to da atencio dos usuarios. ‘Nao vamos avancar muito mais na exploracao dos componentes do que se convencionou chamar de “economia da atencio”, isto é, da conside- racio das habilidades cognitivas como fonte de valoragao econémica’, ‘csim salientar um aspecto de grande importincia para a leitura abran- gente. A incitagio do habito da distracio pelo tipo de uso privilegiado esses aparelhos eletrSnicos prejudica a elaboracio e a sedimentacio do entendimento de textos complexos. A tendéncia de entrecortar a atividade continua da leitura com 0 acesso a diferentes contetidos on- “Tineow a intimeras mensagens sobre 0s mais diversos tépicos € deletéria para a compreensio do t6pico em estudo’. Certamente nao se deve entender por “atividade continua da leitura” uma espécie de decifragao do texto em um 6 folego, como se 0 leitor devesse voltar fixamente 0 olhar para o texto e dele s6 se desviar quando terminasse de absorver seu sentido, saindo de uma espécie de transe. Essa seria uma descricio ‘caricatural da leitura, Por experiéncia, cada um pode verificar que © ato de ler se desenrola em etapas curtas de decifracio das linhas, nas Gquais algumas frases ou quicd um pardgrafo sio assimilados, Entre es sas etapas, o olhar vagueia, 0 corpo se mexe, a atencao naturalmente fscila, Ocorre que essas pausas naturais durante a leitura fazem parte do to de lr, que envolve, entdo, fases de aproximacao e de afastamento do texto, Muitas vezes, € durante essas curtas fases de afastamento, quando 0 corpo se espreguica ¢ o olhar se perde no horizonte, que varias co” nexdes tematico-conceituais com base no que foi lido se estabelecem. Simplesmente deixar que o sentido se assente, ganhe forma em ligacoes {que muito mais ocorrem em nds do que as coordenamos Passo 3 Passo, 6. Sobre ese tema, ver P. Grogan €S. Kinsey, “Paying Attention: Towards a situ of Auenon Tee Soe 2M Thayne, “Prien Like Mine: The Production of Socalined Sbjct in dhe Auenton Eeonomy", 2012 Fee ito 8 alguns artigos centicos que confimam empiicamente es afiracio 100 © Leitura eBserta de Testes Argumentations é um momento fundamental de toda construcio do entendimento* ‘Todavia, é exatamente ai, nessas frestas fecundas da leitura, em qué © sentido ganha espontaneidade ¢ as ideias fixam como que Por st S65 ‘ontornos claros, e entio experimentamos o sutil prazer de “capturar” algo antes desconhecido, é ai que os habitos (ou, dizendo de modo vrais franco, 08 wicios) de uso dos aparelhos se imiscuem. A tendéncia ralimentada pelo uso desses aparethos (que, entio, nao sio de modo algum “neutros", pois jé embutem formas privilegiadas de “usabilida- dae”) € preencher 0s instantes de relaxamento, os momentos de Patist tem que a produtividade do sentido se exerce espontaneamente, com? cpnatlta das ditimas mensagens recebidas ou das iltimas notificagbes ‘enviadas pelos aplicativos, sobrecarregando a atencio com indimeros ludos desconectados daqueles advindos da atividade central em questo (no caso, a leitura) e, assim, atrapalhando ou mesmo impedindo que ocorra aquele assentamento auténomo do sentido. Daf que se sugira, e no por mero pendor antitecnolégico, que» BST a progressio em um estudo sério, para a sedimentacio de uma com preensio aprofundada de um tema lido, deixem-se de ado os aparelhos a eeronieos, evitando dar vazao a tendéncia vicante (instigada pela pro- pria arquitetura do aparelho) de entrecortar a atencio. Recomendase, pelo contrario, que se respeitem os momentos de relaxamento inerentes 40 processo da leitura, de maneira que neles a atencao naturalmente xe tore difusa e favoreca concatenagées criativas entre os dados asst vnilados durante 0 exercicio da atencio focada na leitura’, Desperdicar ve instantes de abertura difusa da atencio, tormando-a imediatamente facada em novos dados advindos de aparethos eletronicos, significa sem ‘hivida mutilar o processo da leitura, amputando talver. set nicleo de espontaneidade, Deve-se ter em vista que faz parte do proceso da lei- tera a elaboracio cognitiva dos contetidos em conjuntos significativos, co que exige uma liberdade do pensar incompativel com a servidao da srengao imposta pelos modos privilegiados como os aparelhos eletrd- nicos sao usados"® Disposicio psicofisca: sem divida, os aspectos Tigados @ satide deve ser levados em conta na preparacao para a leitura. Deve-se notar que 5. Acabedoria de serie dese momentos em qe aaznclo reac os conti sine OANA Aa re comm ds areas da experiencia madura da cra, menconada Wt PON ona md ifs em mundo Toad a tenia € eta por Haars OO) 1A Mind for Numbers (2014, cap 2) tidade dos aparelhos cletronicos para as vias situacoe ss pen acentuamos sa periccsdade estrtural quando fas sess de Teta Estratégias de Leitura T © a leitura (tal qual a apresentamos) nao é uma atividade simples, nem mesmo em relacao as suas exigéncias cognitivas. Exercer bem a leitura abrangente é algo trabalhoso ¢ capaz de gerar uma dose consideravel de cansaco em alguns momentos. Logo, se alguém se sente indisposto (quaisquer que sejam as causas psicofisicas), é recomendavel recuperar seu estado de equilfbrio em vez de dedicarse a algo que pode compro- meter ainda mais seu estado de satide. A sugestao geral é, entio, que a pessoa deve se sentir bem para prati- car de maneira frutifera a leitura abrangente. Porém, nao raros si0 os ‘casos em que justamente porque se tenta ler assim é que se sente mal. Referimo-nos aos efeitos corporais de passar longos perfodos sentados (supondo que essa seja a postura privilegiada), 0 que, se feito de modo descuidado, gera lombalgias e ciatalgias. Nao se deve negligenciar 0 aspecto postural da leitura, ¢ é preciso adaptar, na medida do possivel, mesas, cadeiras, ¢ outros méveis usados nas sessdes de estudo as parti cularidades do corpo (altura, peso etc.). Fatores aparentemente banais como 0 conforto do assento e 0 posicionamento do livro podem gerar lesdes por repetico de ma postura, e a prevencao se faz, necessaria. Recomenda-se mesmo uma consulta a um especialista postural (educador fisico ou fisioterapeuta) para indicagdes precisas de como se posicionar adequadamente durante as sessées de leitura a fim de evitar desgastes € les6es, bem como para a indicacao de exercicios de fortalecimento € alongamento. Outro fator corporal importante é a satide dos olhos. Cabe verificar periodicamente a necessidade do uso de éculos ou do ajuste das lentes. Dores de cabeca recorrentes, tonturas, néuseas, € mesmo alterag6es no campo visual durante e logo depois das sessdes de Ieitura podem ser indicativos de problemas de visio. 4.32.2 GESTAO DO TEMPO" Resta ainda, como parte da estratégia de organizarse para a leitura, con- siderar a duracao necessaria & tarefa em pauta. A questio guia & gual o tempo disponivel para a leitura? Para bem responder, é preciso, sobretudo, coordenat 0s perfodos de leitura em relacdo as demais atividades disrias. Nesse ponto, é Util distinguir entre aqueles que tém no estudo, entendido como miicleo de um ciclo de formacao, a atividade principal de suas vidas ¢ aqueles que, além de estudar, devem trabalhar ou dedicarse a obrigacoes variadas, tais como cuidar a esta seco, recebi sugestoes valiosas de Andrés E, Sechini, bem como disci oassunto com Guilherme G. Dinize Frederico A.C. Martins, 101 102 © Leitura eEscrita de Textos Argumentativos de familiares. A quantidade e, por assim dizer, a qualidade do tempo disponivel em cada um desses casos sera bem diferente. Para aqueles que tém a possibilidade de dedicar-se apenas a atividades de estudo, normalmente hé flexibilidade para montar varias sessdes de leitura no correr da semana, dividindo as tarefas de modo a evitar 0 cansaco e a facilitar a sedimen- tacdo, decorrente de um contato reiterado com o tema. Qual duracio devem ter as sessdes € algo que depende das circunstancias concretas ¢ mesmo do ritmo pessoal. Calcular precisamente o tempo exigido para completar as leituras em vista é dificil, dada a interferéncia de muitos aspectos contingentes, como a dif culdade inerente de certos trechos, interrupcGes inesperadas ete. Sugerese a cons- trucdo de um quadro com as atividades semanais para entéo decidir os horérios expecificos de estudo, Para tanto, deve-se levar em conta a quantidade de tarefas exigidas ¢ também a disposi¢ao psicofisica, no sentido de buscar privilegiar os perfodos em que 0 leitor se reconhece mais produtivo e concentrado. Dedicar ao menos entre cinco € seis horas de estudo por dia (incluido o periodo de aula), entrecortadas Por pausas maiores e menores, permite avancar a passos largos na compreensio dos temas em estudo. E importante planejar com certa antecedéncia as sesses de estudo obviamente tentar cumprilas, evitando distracdes e procrastinacées, ainda que se deva sempre guardar certa flexibilidade diante de imprevistos. Eis um exemplo de quadro em que se distribuem as sessdes de estudo sem ignorar as demais dimensoes da vida pratica: Quadro 44. Planejamento semanal seen | Quarta Gama J 7 REP [recetcin [2 [OH Lsraicma_ [stato [Domings “Ranh [aude [Auda tar |e | iat ita ‘Almogo __ — = 1? parte T Livre snipe de Tareiae do ae z fs Bude | atindede da [tite [re sudo anche i = ® pate aa ie Pownior a lian [fac [nga Race [rn —lanae, _ { Programar inpode Noite | Filmes | [etude | lore Lowe tore | aiemana EEE — —_Liequinte _ 12, Sem diva, hi situagdes em que estudar é parte central do trabalho, tal como acorre com bolts de orgraduacio, pesquisadores profesore, Nesses cass, certo tempo do trabalho ji deve ser naturalmente volo a eiura Estratégias de Leitura 1 © 103 Muitas sio as dificuldades Para seguir a risca o planejamento semanal. £ ceene: contudo, haver algum planejamento, para que as atividades nao se sucedam a esmo, ¢ sim conforme principios de organizacdo assumidos refletida- mente, Propor uma agenda detalhada de atividades facilite a hierarquizacio de Prioridades, dimensiona a dedicacio exigida pelastaretas « disciplina a conducao Glas capacidades produtivas semana adentro. Se Preciso for, recomendase que sg poximem periodos criticos, como os de avaliacéo, quando entdo € natural dedicar mais tempo aos estudos. Indica-se sempre deixar periodos livres no quadro, que servem tanto para descansar como Para resolver imprevistos ou fenn® POT tarefas nio cumpridss em seu devido horirio, Cabe também frequentemente avaliar a factibilidade da agenda proposta: alguinas vezes supe- Testimamos nossas capacidades e preenchemos excessivamente a semana com Sempre sera mais dificil. E preciso reconhecer as limitages de tempo (¢ mes mo de inimo) e entio organizarse estrategicamente, Devese acentuar também que, em geral, o excesso de esforco nao garante Por saesso de ganhos, mas por vezes prejudica severamenre © desempenho, For conseguinte, € imprescindivel respeitar os sinas de cansaco e incluir pausas OK * LeituraeBserita de Taos Argumentativus 4.4 ESTRATEGIAS PARA FACILITAR A COMPREENSAO DURANTE A LEITURA Apés ter decidido qual texto ler, ter se informado minimamente sobre 0 autor, a edigao € 0 contexto da publicacio, apés também ter se organizado em relagio aos materiais ¢ espacos adequados bem como quanto ao tempo, final- mente se inicia, em sentido estrito, a leitura abrangente, Cabe entio exercer as capacidades treinadas no correr da alfabetizagao, decodificacao sensivel e memo- rizacio do sentido lido, conforme descrito no primeiro capitulo, Mesmo nesse ponto, nio se Ié de uma maneira s6, ¢ algumas estratégias tornam a apreensio do sentido textual muito mais eficaz. Vamos nos concentrar em duas delas, as quais se deixam aplicar conjuntamente durante uma sé leitura, conquanto en- volvam técnicas de realizacdo bem diferentes. Comentaremos a seguir cada uma detalhadamente, 4.4.1 Esclarecer 0 Sentido de Termos e Expressies por Recurso a Diciondrios ¢ Graméticas Essa é uma técnica em principio bastante simples ¢ da qual grande parte dos leitores teve alguma nocao durante o processo de alfabetizagao escolar. Merecem destaque, no entanto, algumas nuances importantes em sua aplicagao. ‘A ideia basica dessa técnica € que, para avancar corretamente no enten- dimento do texto, deve-se conhecer 0 sentido de todos 0s termos e expresses ali utilizados. Caso se ignore o sentido de termos e expresses no correr do texto, e mesmo de algumas formulacdes gramaticais, entio certas conexdes tematicas ou conceituais parecerio imprecisas, 0 que prejudica a compreensio de trechos especificos, com repercussées negativas para o entendimento global do texto, Assim, diante de termos desconhecidos ou de formas gramaticais que geram dtividas, recomenda-se uma breve interrupcao da leitura para consultar as obras de referéncia (dicionarios e gramaticas) que permitam sanar as di- vidas. Uma vez que essas diividas vocabulares € gramaticais surgem relativas a quaisquer textos, sugere-se, conforme exposto anteriormente, que se tenham disponiveis as obras de referéncia durante a leitura, O sentido do termo du- vidoso se escreve sobre 0 préprio termo ou nas margens do texto, para ser devidamente fixado. Muitos sites na internet disponibilizam gratuitamente a consulta obras de referéncia, o que dispensa sua manipulacao em formato fisico, por vezes livros pesados e desconfortiveis. F preciso cuidado, porém, para que, sob 0 pretex- to da consulta facilitada a obras de referéncia, a disponibilidade continua da internet nio se torne foco de distrac40, como quando cada acesso as paginas Estratégias de Leitura I ‘on-line de dicionarios ¢ acompanhado de olhadelas em paginas de noticias, redes sociais etc. Lembremos que a preparacao do ambiente adequado para o estudo envolve a minimizacéo do contato com aparelhos eletrénicos, uma das maiores fontes atuais de distracdes. Nao é tio ficil encontrar 0 equilibrio entre a dis ponibilidade dos recursos on-tine de referéncia eo desvio constante de atencio arquitetonicamente embutido como modus operandi de tais aparelhos. Talvez seja 0 caso de usar 0 computador para acessar as obras de referéncia fora da mesa ou local de estudo, de maneira a evitar que ele fique sempre ao alcance da mao ¢ seja irrefletidamente usado para preencher os importantes momentos de pausa durante a leitura. Caso se note que, mesmo assim, 0 acesso a internet leva muito mais a distracdes que a esclarecimentos titeis, recomendase 0 uso de obras de referencia impressas, As dificuldades de reconhecimento de vocabulario e formas gramaticais normalmente sio ainda maiores quando se tenta ler textos em outras linguas. A aquisicao da fluéncia em idiomas estrangeiros é um proceso demorado; dai que muitas vezes as leituras de textos em lingua estrangeira demandem esfor- 0s adicionais, devido exatamente 4 quantidade de termos ¢ expresses cujo sentido se deve esclarecer. Nao ha alternativa aqui sendo praticar metédica e constantemente o idioma em questo. Além disso, no caso da leitura de tex- tos traduzidos, deve-se considerar a hipétese de que trechos gramaticalmente confusos e com imprecisées conceituais derivem de falhas na tradugao, 0 que 86 se verificaré por meio da consulta do texto em sua versio original. Caso isso ndo seja possivel, traducdes disponiveis para outros idiomas podem ajudar a dirimir diividas. Outra dificuldade para circunscrever 0 sentido de termos remete as camadas histéricas interpostas entre a escrita da obra e sua recepcao, 0 que deve ser tomado bastante a sério quando se estudam textos de periodos muito distantes. Trata-se de um problema que nio se limita a palavras ¢ expresses desconhecidas pelo leitor atual. Afinal, mesmo alguns termos conhecidos utili- zados em tradugées ou edigdes recentes de textos classicos no necessariamen- te eram compreendidos, no contexto de producao da obra, da mesma forma como agora. Por exemplo, ao ler um texto de Platio traduzido para o portu- gués em que é empregado 0 termo “amor”, um leitor atual pode compreender imediatamente 0 sentido dessa palavra com base no uso dela em seus circulos de amizades ou tal como difundido nos meios de comunicacdo de massa Ocorre que talvez as acepedes privilegiadas dessa palavra nesses contextos nao capturem a finura conceitual com que o termo grego correspondente era em- pregado por Platao ¢ seus contemporancos. Em seu uso original, esse termo implica distincdes conceituais e oposicdes semanticas com outros termos que nao sio reproduzidas pelo uso corrente de “amor” em portugués. Destarte, para entender bem textos classicos, escritos sob uma teia conceitual que nao 105 106 * Leitura Escrita de Textos Argumentativas é imediatamente partilhada pelo horizonte atual de sentido vivenciado pelo leitor, € preciso consultar obras filolégicas que reconstruam as particularidades conceituais de textos de determinados perfodos (diciondrios histéricos, por exemplo). Tais particularidades, por serem tomadas como ébvias na época de produgio do texto, vigoravam apenas como referéncias implicitas, reativaveis sem grandes dificuldades por aqueles que partilhavam desse contexto, Con- forme visto no capitulo 3, inferir o que os termos empregados em um texto querem dizer em um contexto amplo de sentido é algo inerente a toda leitura bemsucedida, algo que se realiza mesmo irrefletidamente pelos leitores. No entanto, em relacio a textos de perfodos muito distantes, a rede conceitual im- plicada pelo emprego dos termos nao esta mais disponivel, ¢ € preciso refazéla artificialmente, por meio de um minucioso trabalho de reinsercao do texto em sua especificidade hist6rica. Seria extremamente ingénuo ignorar as camadas hist6ricas entre a produgao e a recepedo da obra ¢ simplesmente assumir que © contetido significativo se decifra sem entraves pela ativacao do horizonte de sentido implicito do leitor atual, Na verdade, € preciso admitir que 0 contetido significativo nao carrega algum tipo de verdade eterna imediatamente reco- nhecivel, mas que é justamente significativo em relaco a marcos conceituais perectoeis, que devem ser minimamente recompostos para que as posicdes ali defendidas sejam compreendidas em sua relativa autonomia, ¢ niio somente ‘como um tipo de reflexo das preocupagées presentes. Ha ainda um tiltimo aspecto importante acerca da clarificacdo de termos € expressées durante a leitura. Vimos que a consulta a dicionarios permite resolver as diividas acerca do uso lexical de um termo desconhecido, ou seja, torna 0 leitor ciente do modo comum de empreg: Io. Vimos também que 0 uso de dicionarios hist6ricos torna possfvel recompor, mesmo se imperfeitamente, © sentido de um termo tal como empregado em um contexto historico bem delimitado. Porém, nem todos os termos sobre os quais se tem dtivida em um texto se deixam elucidar dessa forma. Afinal de contas, muitos sio os termos que justamente recebem uma defini¢ao ou ao menos uma cireunscri¢a0 de seu sentido no decorrer da exposigdo em que sio empregados. Nao nos referimos aos casos em que o autor simplesmente estipula um sentido para um termo, fixando uma forma de uso antes inexistente (consideremos, por exemplo, que muitos termos cientificos sto formados dessa maneira, como quark, fon, boson etc.), situago em que se pode capturar o sentido do termo de modo relati- vamente univoco. Interessa-nos 0s casos em que os autores elaboram termos gerais que ja possuem um amplo emprego antes de figurarem em seus textos, mas que ali recebem pacientemente camadas conceituais especificas, que mar- cam um tipo particular de emprego, nao redutivel (ao menos nao totalmente) a0 uso lexical. Pensemos, por exemplo, até que ponto termos gerais, como “esséncia’, “justica’, “fendmeno”, “direito”, “consciéncia’, “ser”, “vontade”, Estratégias de Leitura T # “tiberdade”, “mundo”, “valor”, “conceito”, “fanatismo”, “discursividade”, “onto- logia”, “arte”, “historicidade”, entre tantos outros, comportam varias definigdes técnicas, instituidas em conformidade com o sistema conceitual ou teérico em que sio utilizados. Muitas vezes, diante desses termos gerais, 0 problema nao € admitir que nao se sabe o sentido da palavra ou expresso, mas é, pelo con- trério, julgar que se entende o que se quer dizer com elas e, por conseguinte, apelar irrefletidamente para certa acepcio comum ou vaga de seu sentido, sem se preocupar em discernir as nuances conceituais a elas atribuidas pelo texto em questao. £ preciso ler com atencdo para distinguir quais termos gerais recebem camadas especializadas de sentido no decorrer da exposicéo, sem in- genuamente supor que seu emprego é algo Sbvio apenas porque se sabe usar aqueles termos em outros contextos". Importa circunscrever o sentido que esses termos gerais adquirem na exposicdo textual em vista. Para tanto, dificilmente se vai resolver esse tipo de dui- vida vocabular (com que sentido esse termo x € empregado neste texto?") por apelo a dicionarios comun: ‘Tornam-se extremamente titeis entao dicionérios especializados, que apresentam as principais definicdes dos termos gerais con- forme as areas dé estudo, ¢ mesmo, por vezes, conforme certos autores (si0 comuns no ambito da filosofia obras didaticas que esclarecem 0 Iéxico técnico empregado por um autor, como Dicionério Descartes, Dicionério Hegel etc.). Em todo caso, em relagéo a esses conceitos gerais, compreender seu significado deve ser um dos resullados almejados pela leitura, de modo que muitas vezes nao é possivel esclarecer plenamente seu sentido antes de reconstruir pacien- temente 0 movimento expositivo do texto. No capitulo 5, sugeriremos um tipo especifico de ficha para organizar a riqueza conceitual associada a um termo P para organi iq geral em um texto. 4.4.2 Fazer Notagées no Texto Entendemos por notagio.um sistema de marcagdes gréficas a serem em- pregadas diretamente sobre o texto, a fim de tornar mais facil a progressio da leitura. O uso ordenado de recursos graficos permite ao leitor ganhar uma consideravel margem de controle acerca da exposigéo textual, cujo encadea- mento tematico vai, entdo, sendo deixado visivel A medida que a leitura avanca. Normalmente, o texto € editado de forma amplamente homogénea, com poucos sinais de destaque graficamente vigentes (h4, por exemplo, as formas de italico ‘ow negrito aplicadas a termos ou expresses, bem como o destaque de titulos 18, Para mais informacées sobre as defnigdes tedreas de trmos gerais, ver M. Sacrini, Indu @ Andie Arpumeniatioa. Tara ePrtica, 2016, cap. 6 107 108 © Leituva e Bscrita de Textos Argumentativos € subtitulos). Sugerimos que a leitura se sirva de recursos grificos muito mais ricos para realcar conceitos, distinguir etapas da exposicio, hierarquizar temas, apontar tarefas légicas cumpridas, enfim, para tornar imediatamente perceptivel a0 menos parte da complexa estruturaco do movimento expositivo. As marca- Ses no texto devem ser algo provis6rio, uma vez que 0 avanco na assimilacao de partes posteriores comumente altera aquilo que se julgava entender das partes anteriores, ou mesmo em uma releitura pode-se decidir destacar outros aspectos nao abarcados pelas marcacdes originais. Dai a recomendacao de que as mar- cages sejam feitas a lépis, pois poderao ser facilmente refeitas, se for preciso. Talver. essa estratégia de fazer notagdes seja uma das que mais comporte particularidades individuais em sua aplicacdo. Muitos sio os sistemas de notacao, propostos conforme as necessidades e mesmo a criatividade do leitor. De nossa parte, vamos sugerir trés tipos de notacdo, o que nos parece suficiente para facilitar a apreensio do movimento expositivo textual. Tomemos como exemplo privi- legiado neste t6pico trechos do livro Ideias para Uma Fenomenologia Pura e Uma Filosofia Fenomenoldgica, de Edmund Husserl, publicado inicialmente em 1913". 442.1 NOTAGOES PARA DESTACAR OS CONTEUDOS TEMATICOS CENTRAIS NA EXPOSICAO_ Sio feitas diretamente nas linhas do texto e almejam realcar quais sio os conceitos ali empregados e quais as sentencas em que estio concentrados os aspectos nucleares da exposicéo. Recomenda-se como recurso principal 0 uso de sublinhas, conforme o exemplo a seguir: Quatro 4.5 Notagdo de destaque 1: sublinhar os aspectos centrais da exposicio © conhecimento natural eomeca pela experigneia ¢ permanece na experiéncia. Naotientacao ‘com uma s6 palaura: o mundo. As ciéncias dessa orientacio originatia sio, portanto, em stia totalidade, cgncias do mundo, ¢ enquanto elas predominam com exchisividade, ha coincidéncia dos conceitos “ser verdadeiro”, “ser efetivo", isto 6, ser real ¢ ~ como todo real se congrega na unidade do mundo ~ “ser no mundo". Deve-se buscar sublinhar a sentenca ou as sentencas que exprimem os aspectos mais importantes do tema no trecho em pauita. Isso envolve ja algum grau de interpretacao sobre como 0 contetido significativo de um trecho esta 14. A obra foi uaduzida para o portugués por Mércio Suzuki lancads no Brasil em 2006, Doravante, ses ‘mencionada coma fd. 15, Idem, 81, p. 38, Estratégias de Leitura I * ordenado, para entio selecionar 0 excerto a ser sublinhado. A precisio desse jjuizo interpretativo é algo treindvel, ¢ 0 aperfeicoamento deve ser buscado por meio de constantes exercicios. & normal ter diivida sobre o que sublinhar, ‘mais de uma tentativa por vezes deve ser feita em um trecho para atingir um resultado satisfat6rio. Em todo caso, um erro comum deve ser evitado: sublinhar excessivamente 0 trecho, conforme o exemplo a seguir. Quadro 46 Notacio de destaque 1: echo sublinhado excessivamente ‘teorica que champamos “natural, 0 horizonte total de insestiguctes passives & pals designe ‘com uma sé palavra:o mundo. As ciéncias dessa orientacio origina sie. portanlo. ) € enquadrar os termos auxiliares ({—) ligados a esse termo central em um trecho. Vejamos um exemplo em que esses recursos sio usados conjun- tamente com as sublinhas: 1 de, siden. 10 © LeituraeBserita de Tetos Argumentatons Quadro 4.7. Notacio de destaque 2: circular os termos cenras e enquadrar os termosauxiiares ‘Géncias empiticas sia cincas de Gan) Os tos cognitivos fundantes da experiéncia pdem © real individualmenteleles 0 pGem comolespago-temporalmente existente |como algo que esti rusts momento do tempo, tem ext sua duragio ¢ um contetido de realidade que, por sua e+ séncia, poderia igualmente estar em qualquer outro momento do tempo; paem-no, por outro Ido, como algo que esti neste lugar, com esta forma fisica (por exemplo, esté dado juntamente ‘com tm corpo desta forma), embora este mesmo real, considerado segundo sua esséncia, pu ‘desse igualmente estar noutra forma qualquer, em qualquer outro lugar, assim como poderia rmodifcarsc, quando é faticamente imutive, ou poderia modifcarse de modo diferente daquele pelo qual faicamente se modifica. Dito de maneira bem geral, rm Ele é assim, mas poderia, por sua esséncia ser diferente] ‘Ainda que determinadas leis posam ser valida, gracas as quais, se tase tis circunstancias reais sio fiticas tas ¢ tai determinadas consequéncias também o tém de ser, ainda assim esas leis cexprimem apenas regulamentacdes fiticas, que poderiam ter um teor inteiramente outro, € J pressupdem, como de antemio inerente & esénca dos objetos da experiéncia possivel, que, considerados n si mesmos, esses objetos por elas regulamentados sio contingentes". Outra marcacio, imprescindivel para a escrita das fichas de andlise (tema do capitulo 5), € numerar os parégrafos em uma sequéncia simples, notando os numerais no recuo inicial de cada um deles, da seguinte maneira: Quadro 4.8 Notacio de destaque 3: numerar os parigrafos em sequéncia simples ""§ 15 — Objetos Independentes e Dependentes. Concreto e Individuo 1 Carecemos ainda de uma outra distingio fundamental, ent objtos independenes ¢ depen dents. Uma forma categorial, por exemplo, & dependente, visto que remete necessariamente um substrato, do qual & a forma. Substrato e forma sio interdependentes um em relacio 20 ‘outro, esséncias impenséveis “uma sem a outra". [..] 2 Aqui nos interessa especialmente o estado-decoisas nos substratos sltimos e, ainda mais cstritamente, nas esténcias de substrato material. Subsistem para elas duas possibilidades: ou o faz [1 3 Dai resultam determinacBes importantes dos conceitos categoriais formais “individuo”, “concreto” e “abstrato”, Uma esséncia dependente se chama um abstrao; uma esséncia abso- utamente independente, wm concto. Um cchama um individua, tal esséncia funda, junto com uma outra, a unidade de wna sé esséncia, ou to aqui” euja esséncia material é um concreto, se 4 Se compreendemos a “operacio” de generalizacio sob 0 conceito de “variaclo” Logica agora ampliado, podemos dizer: individuo & 0 proto-objeto requerido pela légica pura, 0 absoluto 6gico, a que se referem todas as variagbes logicas 17, Hem, § 2. pp. 3435, Estratégias de Leitura I # 5 Um conereto é, evidentemente, uma singularidade eidética, ja que espécies ¢ géneros (expressdes que habitualmente excluem as diferencas iltimas) sio, por principio, dependents. As singularidades eidéticas se dividem, pois, em abstratas e concreas, Lal Por mais dificil que um texto pareca a primeira vista, mumerar os pargrafos a0 menos garante uma compreensio minima da sucessio tematica e prepara 0 terreno para uma das tarefas bésicas interpretativas: dividir as partes da exposicao. Exporemos com detalhes essa tarefa no capitulo 5. Por ora, apenas acentuamos a numeracdo dos pardgrafos como uma notacdo importante durante a leitura, Recomenda-se que a cada capitulo ou secdo de um livro a contagem seja reini Ciada, Para textos curtos, tais como artigos, é cabivel propor uma contagem s6, independentemente das subdivisoes" 4422 NOTAGOES PARA EXPLICITAR A FUNCAO LOGICA DE CADA PARAGRAFO feitas nas margens do texto, ao lado de cada pardgrafo. Tratase de tentar exprimir em poucas palavras qual é a tarefa I6gico-conceitual que cada pardgra fo cumpre. Entendem-se, por tarefas l6gico-conceituais as diferentes operacoes por meio das quais 0 tema é desenvolvido: apresentar conceitos, dar exemplos, retomar uma concepcio adverséria, afirmar uma tese, lancar uma objecio, entre tantas outras. Ocorre que na maioria dos casos essas operacées sio realizadas na exposi¢ao do texto sem serem ai explicitamente nomeadas. Ora, grande parte do processo de compreensio de um texto argumentativo consiste em ganhar clareza acerca dessas operacées, em reconstrulas de modo explicito, Para tanto, deve haver um esforco especialmente voltado & nomeacio da tarefa cumprida em cada trecho lido. O leitor deve ter em vista a cada pardgrafo a seguinte questio: “Qual tarefa l6gico-conceitual € realizada neste trecho?”. A resposta, uma hipétese inter pretativa, deve ser anotada de forma esquematica na margem, ao lado do texto decifrado. Com a pratica, cada vez menos se interrompe a leitura para avaliar especulativamente que tipo de fungao légica ali se cumpre, mas se aprende a Teconhecer as caracteristicas tipicas das principais funcdes constitutivas de textos argumentativos (formulacio de problemas, exposicao de conceitos, defesa de teses, exemplificacdes, extracdo de consequéncias etc.). Vale notar que muitas funcées légico-conceituais se estendem por mais de um paragrafo, o que permite 18. Idem, pp. 5954, 19, Outras notagies entre as sentencas do texto sio sem vida possves. Por exemplo, para analsar um ‘echo estritamente argumentativo (em que uma sentenca¢ wna concisio derivada de outras sentences, ‘que als operam como premiss) recomendase separar cia sentenca com colchetes ¢ numeriss, Ea método (diagramagio de angumentos)€ exposto com detalhes em M, Sarin, op eit, 2016, cap. 3. Now © apresentaremos resumidamente no capitul 6 UL 112 © LeituraeBsrita de Tests Argumentativos distinguir blocos ou subdivisdes no decorrer da exposicao. E preciso marcar essas subdivis6es (exporemos uma sugestao simples ao comentar 0 préximo tipo de notagio), uma vez que é justamente com base nelas que se reconstruira a estru- tura global do texto por meio de fichas. Também nao se deve descartar que, por vezes, em um pardgrafo longo mais de uma tarefa I6gico-conceitual é cumprida Deve-se entio analisar se ha uma relacdo de subordinacao entre elas ou se sio tarefas de igual importincia justapostas na exposicao. Bis um exemplo de aplicacao dessa notacdo, conjuntamente com a anterior: Quadro 49 Notacio na margem para explictar a fungio logica de cada parigrafo Testo Notas na margem § 3 Visio de Esséncia e Intuigio Individual 1 “Esséncia" designon, ants de mais nada, aquilo que se encontra no ser | Define terme proprio de um indivfduo como o que cle é. Mas cada um desses “o qué” cle 6, pode ser “posto em ideia™ A intuicio empitica ou individual pode ser convertida em @ido de esséneD (ideacio) ~ possibilidade que também nao | Relactona- deve ser entencida como possibilidade empirica, mas como possiblidade | S*enci de esséncia, O apreendido intutivamente € entio a exséncia pura corres pondente ou Gidas)seja este a categoria suprema, seja uma particularizacio dela, dat descendo até a plena concrecio. 2 a ancia, ¢ eventualmente a dé de modo origindrio, padc sx fadauada]|como a que podemos factmente ob- | twutho ter, por exemplo, da esséncia “som”; mas pode também ser mais on menos incompleta finadequada" isso ndo apenas com respeito & maior ou menor clareza e distineio. E da eonformacio propria de certas categorias eidéticas ue suas esséncias $6 possam ser dadas por um lado e, subsequentemente, | Eyclarece a ‘varios lados} jamais, porém, “por todos os lados"; correlativamente, | © intwicdo- 4s singularizagdes individuas a elas correspondentes $6 podem, portanto, ser experimentadas ¢ representadas em intuicdes empiricas inadequadas, “unilaterais, Isso vale para toda esséncia referente & coisa, ou seja, para toda esséncia que a ela se refira segundo qualquer um dos componentes cidéticos da extensio on da materialidade; aliss, considerando melhor (as. anélises que se fario mais tarde © tornario evidente), isso vale pare fodas 1s realidades em geral, pelo que as expressBes vagas “um lado” e “varios la- dos" ganhario, sem duivida, significagdes precisas, e diferentes espécies de inadlequacio deverio ser distinguidas. 83 Basta por ora.a indicagio de que mesmo a forma espacial de uma coisa fisica s6 pode ser dada, por principio, em meros perfis unilaterais; de que | Dedeméte toda qualidade Fisica] nos enreda nas infinidades da experincia, mesmo | ¢ dominio- : | da fazendo abstracio dessa inadequacio, que se mantém constante apesar | Sradequacde de todo o ganho e qualquer que seja o avango que se faga em intuigbes | continuas; ¢ de que todafmuldplicidade empiricd, por mais abrangente que scja, ainda deixa em aberio determinagOes mais precisas € novas das coisas, Estratégias de Leitura T # 4 Nio importa se a intuicéo individual seja de tipo adequado ou nio: ela | Propée-regrar pode ser convertida em visio de esséncia, ¢ esta tiltima, quer seja adequada dde maneira correspondente, quer ndo, tem 0 cardter de um ato doador. Iso, no entanto, implica o seguinte: 5 A essincia (wis) é wma nova espécie de objeto, Assim como 0 que é dado | Eytyracs ‘na intuigo individwal ou empirica é um objeto individual, assim também o que ¢ | Consequenciar dado na intwigo de eséncia uma eséncia ura. (..}2 No exemplo do quadro 4.9, as notagdes das tarefas de cada trecho se de- ram por meio de verbos ativas, o que torna visivel que a estrutura expositiva nio € um ente estitico, mas uma sequéncia de operacées propostas pelo autor. Em todo caso, também é comum que se destaque de modo mais conciso a tarefa em foco somente por meio de substantivos gerais, tais como argumento, exemplo, con- sequéncia, regra etc, Cumpre a cada leitor testar diferentes maneiras de anotar as tarefas I6gico-conceituais e dispor delas conforme as circunstincias € 0 interesse. 44.2.5 NOTACOES PARA EXPRIMIR A COMPREENSAO DURANTE A LEITURA Esse tipo de notacio também é feita nas margens do texto, podendo se estender as margens superiores ou inferiores das paginas, se for 0 caso. Tratase de registrar, do ponto de vista do préprio leitor, de que maneira a assimilacao dos significados esta ocorrende, isto é, se flui bem e alimenta conexées entre temas € novas ideias, ou se envolve muitas dificuldades. Registram-se, assim, a0 ‘menos as principais impresses de leitura, 0 que pode ser de grande utilidade para a reconstrugio global do sentido textual (via fichamentos). Para tanto, uum sistema de sfmbolos simples deve ser adotado e usado de modo coerente, facilitando © reconhecimento de situacdes tipicas da leitura. Quais 0s posiciona- ‘mentos subjetivos a serem notados ¢ os simbolos a se empregar sio questiona- ‘mentos para os quais néo ha resposta tinica, Ha boa margem para inventividade nesse ponto, e a seguir listamos algumas sugestes de simbolos, entre muitas, outras possiveis, a se anotar nas margens laterais dos textos, a0 lado do trecho ‘a que se referem: Quadro 4.10 Sugestdes de notagdes para exprimir a compreensio durante a leitura Sinbolo__Indicagdo > ‘Trecho que gera alguma diva de compreensio, e deverd ser posterior ’ mente reanalisado, ! ‘Trecho que surpreende, inesperado. 20, B. Hluser, op it, 2006 (1913), pp. 8586. 13 14. © Leitura e Eserita de Textos Argumentativns ile ero > ‘Trecho importante, em que t6picos centrais io expostos. ®] eran tee pac cominent ae ies {im pequeno traco ao final de um parigrafo ou grupo de parigrafos indica {que um bloco temético foi encerrado, © que logo abaixo outro se ici } | Distingue um trecho a0 qual cabe aplicar quaisquer dos outros simbolos ‘sfmbolos para marcar relagdes entre trechos nao continuos no texto. Quando, coco P: oes entry texto. Quand se usa “*" ao lado de um trecho, espera-se entdo encontrar ao menos mais i ‘um “+” em outro trecho, e assim por diante. Quando os trechos esto muito | tttantes,consém marcar as pginas a que se referer abso ow acima dos {| 2 Sfibotos Por exemplo, quando se usa + map. 58 de um texto, remetendo Zh | SL Stamsema iso p85 enti sob 0+ 58 5¢ mara “fp 85,6900 | 4+ da p. 55 se marca “ef p. 58" Gada simbolo anuncia um comentitio mais longo do letor, relativo ao trecho tem que é aplicado. Entio 0 comentirio € desenvolvide como uma nota no nen rodapé om na margem superior da pagina ‘Cada letra deve ser associada a um tema ou conceito ¢ ser anotado ao lado de todas suas ocorréncias na obra, Paralelamente, devese listé-tas em uma ficha, Por exemplo: a),b).0) a) Liberdade: pp. 18, 35, 42 ») Intencionalidade: pp. 2, 79, 5. [Esse procedimento permite a produedo de um tipo particular de fcha, que nalisa o emprego de conceitos especificos no decorrer de uma obra*! Por meio desses simbolos, é possivel deixar marcadas nitidamente diferen- tes impressdes relativas aos trechos lidos, bem como desenvolver comentdrios pessoais acerca do texto. Salientamos diversas vezes nos captulos anteriores que a leitura abrangente deve permitir a reconstruco do movimento expositivo do texto de forma neutra em relacao as valoracdes subjetivas do leitor. Isso nao deve significar, por sua ver, a mera repressio ou aniquilamento dos posicionamentos do leitor. Na verdade, 0 que importa ndo é nao ter opinides pessoais sobre 0 texto, mas saber distinguir entre as valoracées subjetivas e a estruturacao imanente a0 texto, Essa distingio pode vigorar j4 nas notagbes graficas durante a leitura £21, 0 méiodo para elabori-ia ser exposto no capilo 6 Estratégias de Letra 1 ® 115 (Os dois conjuntos de notagdes expostos anteriormente se voltam principalmen- te A explicitago do movimento expositivo inerente ao texto. J4 essas notacbes, simbélicas, embora certamente contribuam para essa explicitagao, guardam um Tugar para as impresses subjetivas, as quais ficam registradas nas paginas por meio de simbolos ¢ comentarios que servem de ponto de partida para notas pessoais mais livres®®. Em relagao a isso, as notas mais elaboradas, nas margens superiores e inferiores do texto, permitem importantes conexdes entre 0s temas lidos ¢ outras ideias, servindo de ocasiao privilegiada para esbocar posiciona- mentos ou relacionar t6picos com outros textos jé lidos ¢, dessa forma, fazer avangar um estudo ou pesquisa de maior félego. Vejamos um exemplo da aplicacio desse sistema simbélico, juntamente com os recursos gréficos expostos nos itens anteriores. Para distinguir as notas de margem que sio explicitacdes das tarefas légico-conceituais ¢ aquelas que exprimem impressdes do leitor, sugere-se que estas tiltimas aparecam entre colchetes ({ ]) Quadro 4.11 Notagio para diferenciar as notas que identificam tarefas logico-conceituais das notas que exprimem impresses do leitor Texto Notas na marge § 4-Visio de Esséncia e Imaginacio. Conhecimento de Essencia Independentemente de Todo Conhecimento de Fato 10 sides «cP pode exemplars instante em | dados de experiéncia, tas como pereepeio, recordagio etc, mas ‘gualmente, também em mers dados de imaginagio. Por conseguinte, pata aprender intuitivamente uma csséncia cla mesma e de modo ‘mas igualmente também de ntuiies ndoempiricas, que ndo apreendem um cxistnte ou, melhor ainda, de intuiies “meramenteimaginrias Betraw consequncior | 2 Se em imaginacio live produsimos figuras no espaco, me lodias, procesios sociais ete. ot Fingimos atos de experiéncia, de | Descreve-e-processo- prazer ou desprazer, de querer et, podemos por “ideacio” neles apreender, em intuicio origindria ¢ eventualmente a€ adequada, diversas esséncias pura, tais como a esséncia da figura espacial, da relodia, do processo social em galet, ou a essénca da figura da melodia ete. do spo particular em questio. Findiferente, neste aso | Formulay wma se algo asim jf tenha sido dato ou nio numa experiéncia atl. Se | FOS” a livre ficcio, no importa por que milagres psicoldgicos, levasse & 22. No capitulo 6, apresentaremos modelos de fichas de comentitios pessoas 116 © Leitura eRscrita de Textos Argumentativns imaginagéo de dados que, por principio, fowem de uma now expe | 1 «ic, por exemplo dado senses que jamais estem ocordo em | « cxperiéncia alguma io em nada modifiariao dado origi da | essnciacorespondente: ox dadosimaginados, no entant, jamais sero dados efetivos 3 Baenciimene conecado ino et ue pose, ames de | 7 ogo de tudo, Greens itd inca nao imple mininanene «|| posed) posicdo de algum existente individual; puras verdades de esséncia ndo . ‘uni 4_minina fimacia sb aus, poranto, dela tampouco se | * elarece relax Pode inferir a mais infima verdade factual. Assim como todo pen- | Fat samento, toda enunciacio acerca de fatos precisa ter sua fundacio na experiéncia (if que esta é necssariamente requerida pela eséucia 4o acert de tal pensamento), assim também 0 pensamento acerca de esséncias puras —pensamento sem mistura, que no vineula fats «€ esncias ~ precisa tera apreensio intuitiva de esséncia como seu. licence de fundaga * tua hipdtete toms agus alcance factual ou vale come mara poubilae Luca? Relacionar conv tect de'O 44.2.4 COMENTARIO GERAL SOBRE AS NOTAGOES: Conforme os exemplos devem ter deixado claro, 0 emprego de notacoes durante a leitura rompe a homogeneidade grifica dos textos ao propiciar des- taques ¢ hierarquizagées tematicas, bem como ao fomentar um posicionamento ativo do leitor diante do contetido textual. Por meio das notagoes, as hipoteses interpretativas acerca do sentido textual se deixam jé vishumbrar na superficie fisica do texto, ¢ a leitura, longe de ser um ato espiritual de decifracao, se revela, destarte, como um confronto material com o texto, do qual as notacdes sio tanto © guia concreto quanto os vestigios para que a reconstrucao final da exposicao (via fichamentos) tenha lugar. Faz sem diivida muita diferenca ler um texto sem nada marcar nas paginas, apenas contando com a atengao ¢ a meméria, ou utilizar algum sistema de notacio, As notagdes alteram a face sensivel do texto, acrescentando-Ihe as marcas do esforco metédico de compreensio. Esperase que, com a pritica, o sistema de notagio adotado torne-se imediatamente signi- ficativo ¢ operante na percepcio, de maneira que, em uma releitura, 0 texto seja apresentado nao somente conforme o padrao sequencial grafico comum, mas como ordenado segundo parametros estruturais (blocos temiticos, ramificacdes conceituais, entrelacamento de tarefas logicas etc.) atestados sensivelmente. 28. F. Huser, opt, 2006 (1918), pp. 889. Estratégias de Leitura I # E preciso admitir, entretanto, que essa virtude das notacdes — conduzir a percepcao do texto como conjunto tematico estruturado ~ por vezes enviesa © entendimento, As notacdes carregam a relacéo com 0 texto, jé no nivel per ceptivo, de certos esquemas interpretativos, os quais impedem que esquemas alternativos sejam desenvolvidos. Ao sublinhar certas frases, circular determi- nados termos, anotar alguns simbolos e palavras, conduzimos a apreensio do sentido em conformidade a uma linha interpretativa, que exatamente ai, nos grafismos, ganha contornos precisos. Caso se avalie posteriormente (seja por si 86, ao escrever os fichamentos, seja alertado por alguém mais experiente) que a interpretacao delineada padece de incorregGes ou insuficiéncias, entio, ao re- tornar ao texto para reler certos trechos ainda mal compreendidos, as notagoes, ali gritantes para a percepcio, prejudicam que novas linhas interpretativas se elaborem no correr da leitura. Seré preciso apagélas, levando a percepcao do texto a homogeneidade gréfica original, para, a partir dali, novamente esculpir uma nova captura sensivel da estruturacdo, por meio de outras marcas gratficas. As notacdes so recursos valiosos para a elaboracao do entendimento do texto; contudo, seu potencial de direcionamento da leitura nao deve ser ignorado, € € preciso saber flexibilizé-las se a ocasidio assim exigit. 45 EXERCICIOS Nos trechos a seguir, busque o sentido de termos desconhecidos (se for 0 caso) e empregue as notacdes sugeridas neste capitulo: a) Rousseau, J-J. Do Contrato Social. 2. ed. Trad. L. S. Machado. Sao Paulo, Abril Cultural, 1978 [1762], pp. 28-24 (Os Pensadores). Testo ‘Notas 1 — Das Primeiras Sociedades [A rmais antiga de todas as sociedades, ¢ a tinica natural, 6 da fauna; ainda assim 86 se prendem 0s filhos 20 pai enquanto dele necesstam para a prépria conservacio. Desde que tal necesidade cesta, desfarse 0 liame natural. Os filhos, isentos da obedigneia aque devem 20 pai, e este, sento dos euidados que deve aos ios, voltam todos a ser igualmente independentes. Se continuam uni- dos, jé nfo é natural, mas voluntariamente, ea pr6pra familia s6 se mantém por comvencio. ssa liberdade comum é uma consequéneia da natureza do homem. Sua primeira lei consiste em zelar pela propria conservacio, seus | primeiros euidados sio aqueles que se deve asi mesmo, ¢, assim que aleanga a idade da rario, sendo © nico ju dos meios adequados para conservarse, tomase, por isso, senhor de si U7 118 © Letura Burt de Tests Argumentativas ‘A familia €, pois, se assim se quiser, 0 primeiro modelo das so- iedades politicas: 0 chefe & a imagem do pai; 0 povo, a dos filhos, © todos, tendo nascido iguais e livres, s6 alienam sua liberdade fem proveito proprio. A diferenca toda esti em que na familia, 0 amor do pai pelos filhos © paga pelos cuidados que Ihes dispensa, cenquanto no Estado o prazer de mandar substitui tal amor, que 0 chefe mio dedica a seus povos. Grotius nega que todo o poder humano se estabeleca em favor dagqueles que sio governados: cita, como exemplo, a escravidio. Sua ‘maneira mais comum de raciocinar 6 sempre estabelecer o direito pelo fato, Poderseia recorrer 2 método mais consequente, nio, porém, mais favoravel aos tiranos. [..] b) Conn, M. C. da. “Por uma Hist6ria Indigena e do Indigenismo’. In: Cultura com Aspas. Sao Paulo, Cosac Naify, 2009 [1989], Testo A hist6ria dos povos indigenas no Brasil esti mudando de figura [Até 08 anos 1970, os indios, supunha-e, no tinham nem futuro, nem passado, Vaticinavase 0 fim dos iltimos grupos indigenas, deploravase sua assimilagio irreversivel ¢ a sua extingio tida por inelutivel diante do capital que se expandia nas fronteiras do pais ‘A.auséncia de passado, por sua vez, era corroborada por uma dupla reticéncia, de historiadores e de antropélogos. A reticéncia dos historiadores era metodolégica, © a dos antropélogos, teérica. Os historiadores, afeitos a fontes escritas ~¢ escritas por seus atores ~ hesitavam ainda em pisar nas movedicas areias da trad de uma documentagio sistematicamente produzida por terceiros: io oral ou missionsiios, inquisidores, administradores, vajantes, colonos, inter- ‘medistios culuuras, em suma, com interesses préprios e geralmente antagdnicos aos das populagdes descritas. Em tais condigdes, essas fontes vinham viciadas por distorcées, por incompreensbes inevits- veis, que fltravam e refratavam as informagdes. Com uma arqueo- logia ainda por fazer, com auséncia de quaisquer monumentos que atestassem grandes impérios, nlo era tangivel a existéncia de uma historia antes de 1500. AA abstengio dos antropélogos, por sua vez, provinha de varias diferentes fontes tedricas, Havia,jé um tanto anacrénica, a velha doutrina evolucionista, para quem os indios no tinham passado, por serem, de certa forma, o proprio passado, ponto zero da socia- bilidade. Essa teoria,vigorosa no fim do século xrx, havia substitu lo, vale a pena lembrar, outra vigente no comeco desse século © associada aos nomes de Buffon ¢ de Cornelius de Pauw, que tinha a Notas pp. 125-196 [125-131]. Notas Texto peculiaridade de explicitamente ligar a auséncia de futuro a ausén- cia de pasado para os indios; eles seriam como que a decadéncia prematura da humanidade, frégeis habitantes de um continente ‘onde nada podia prosperar, onde a infancia se ligava diretamente & velhice, sem passar pela maturidade, Assim como nao havia grandes ‘mamiferos na América, igualmente sus habitants ram facos, sem vitaldade e sem port No periodo moderno, por sua vez, a retcéncia dos antropé- Jogos em tratar da hiséra indigena derivava de outras ideas: as fancionalias ¢ as estrutarlistas. Ambas as escola privilegiavam uma anise sistémica e sincrOnica da sociedade (sitando-s uma no nivel empiric, ontra no nivel dle uma organizacio subjacente 20 empirico) como chave de sia intetigibildade. E verdade que RadeiffeBrown, que nso se asemelhava 0s historiadorestradicio- nas, renunciava & pesquisa histrica em sociedades gratis nao por ser irelevante, mas por ser impossvel de ser feitaadequadamente Quanto ao esruturalismo, embora preconizase a histra, no vn rela um nivel de onganizacio e um poder explicativo comparivel 20 da sineronia. A histria era sobretudo a auséncia de sstoma, © impondersvel ¢ portanto o ininteligivel: acontecimentos que vinham se abater sobre o sistema que procurava resistirIhes, s indios, no entanto, tém futuro: ¢ portanto tém passado, Ou seja, 0 interesse pelo passado dos povos indigenas, hoje, nio € disso- civel da pereepeio de que eles serio parte do nosso futuro, A sua presenca crescente na arena politica nacional e internacional, sua também crescente utilizagdo dos mecanismos juridicos na defesa de seus direitos tornam a histéria indigena importante politicamente, (0s direitos dos indios & sua tera, diz a Constiaieac a historia adquire uma imediata utilidade quando se trata de Slo histéricos, provar a ocupacéo, Mas ela tem também um cariter de resgate de dignidade que nao se pode esquecer. No Brasil, contrariamente a0 México e ao Peru, 3 falta talvex de civilizagies da peda, exalton-se © indio desde a Independéncia, mas nfo se exaltou sua histria. Isso {eve tanto vantagens como desvantagens: de certa forma, a histbria indigena ficou virgem, ou quase. F esté noiva nio de uma ideologia de Fstado mas do movimento indigena. Estratigias de Leitura © 119 Notas ©) MELLO E Souza, G. O Tupi ¢ 0 Alatide. 2. ed. So Paulo, Editora 34/Duas Ci- dades, 2003 [1979], pp. 89. Texto [Escrito em seis dias de rabalho ininterrupto, durante umas férias de fim de ano, em dezembro de 1926; corrigido © aumentado em ja neiro de 1927; publicado em 1928 ~ Macunasma logo se transformots no livro mais importante do nacionalismo modernista brasileiro. | 120 © Leitura ¢ Escrita de Textos Argumentativos A impressdo fulminante de obraprima, que os companheiros de Mario de Andrade tiveram na época a0 tomar contato pela pri- ira vez com © manuscrito, permanece até hoje, cinquenta anos depois da sua publicagio. Com o pastar do tempo, as experiéncias de linguagem e a utilizagio satirica dos achados obscenos talvez tenham perdido a viruléneia; mas em compensagio, & medida que ‘0s estudos sobre o lio vio se aprofundando, comecam a vir tona, a seguranca impecivel de sua construcio ea maestria no aprovei- tamento da cultura popular, que tece o pano de fundo colorido da aventura do heréi brasileiro. No inicio, Matio de Andrade resistiu em reconhecer a face ver dadeira de sua eriagio € tomou apenas como “um jeito pensatvo «© gozado de descansar umasférias" a violenta explosio que na ver dace arrematava tum perfodo fecundo de estuda e de divas sobre ‘ cultura brasileira Mas a0s poutos foi obrigado a aceitar que de {ato semeara o texto com tima infinidade de intences,referéncias figuradas,simbolos e que tudo isso definia os elementos de uma psicologia propria, de uma cultura nacional ede uma filosofia que cscilava entre “otimismo ao excess e pessimismo a0 excesso", entre a confianca na Providéncia © a energia do projeto. {Uma andlise pouco mais atenta do livto mostra que ele foi cons: truido a partir da combinacio de uma infinidade de textos preexi- tentes,elaborados pela vadicio oral ou escrita, popular ou erudita, ceuropeia ou brasileira. A originalidade estrutural de Macunatina deriva, deste modo, do lio ndo se basear na mimesis, isto €, na de- pendéncia constante que a arte estabelece entre o mundo objetivo © «fcc; mas em ligarse quae sempre a outros mundos imaginsros, a sistemas fechados de sinais,j regidos por sgnificacio auténoma. Ente process, parasitiriona aparéneia, éno entanto curiosamente inventivo; pois, em ver de recortar com neutralidade nos entrechos originais as partes de que necessita para reagrupslas,intactas, numa cordem nova, atua quase sempre sobre cada fragmento, aterando-o em profundidade. Deste modo, a designacio de “composicio em mosaico", adotada por alguns estudiosos como Florestan Fernandes «¢ Haroldo de Campos, parece inadequada; ela sugere a justaposicio simples dos empréstimos tomados a sistemas diversos, mas oblitera, a elaboracio criadora complexa que, num primeiro momento, os desarticula, rompendo a sua inteligibilidade inicial para, em seguida, insuflar sentido diverso no agenciamento novo dos fragmentos. O processo talvez se aproximasse mais da bricolagy, tal como a descreve LéviSurauss, e isso também jé foi lembrado pela critica Bstratégias de Leitura I © 121 4) Durst, E. As Regras do Método Socioligic. 3. ed. Trad. P. Neves, Sio Paulo, _Martins Fontes, 2007 (1895), ilo 1 ~ O que é um Fato Social? Antes de procurar qual método convém ao estudo dos fatos Sociais, importa saber quais fatos chamamos assim Aquestio ainda mais necessria porque sulla esa qualificacio | sem muita precisio, Fla ¢ empregada correntemente para designar ‘mais ou menos todos os fendmenos que se dio no interior da so- ciedadle, por menos que apresentem, com uma certa generalidade, algum interesse social. Mas, dessa maneira, nio hd, por assim dizer, ‘acontecimentos humanos que nio possam ser chamados socais. Todo individuo come, bebe, dorme, raciocina, e a sociedade tem todo 6 intereste em que essasfunoSes se exercam regularmente. Portanto, Ss esses falos fossem sociais, a sociologia no teria objeto préprio, € seu dominios confundiria com o da biologia © da psicologia ‘Mas, na realidade, ha em toda sociedade um grupo determinado de fendmenos que se distinguem por caracteres definidos daqueles | aque as outs cincias da natureza estan Quando desempenhio minha trea de irmio, de mario ou de Sidadio, quando execto os compromissos que sai, eu eure dleveres que esto defnidos fora de mim ede meus ats, nedivige nos ontumes. ida que eles estejam de aord com meuseentimnes, tos préprose que eu sini interiormente a realidadedelesexa nto dei de ser objet pois néo fi eu que os fz, mas os recebi pel ‘ducacio, Ald, qantas vezes do nos ocore ignorarmoso detihe das obrigagdes que nos incumbem e precsarmes, pra conhect ine consular o Cédigo e seus intéspretes autorzadox! Do mesme made as crengas as priicas de su vida religiosa, oil as encontro inter ramenteprontas ao nace; els exsian antes dele, ¢ que extem fora dele © sistema de signos de que me sirvo para exprimir men Pensamento,o sistema de moedas que emprego para pagar mintos iso nsaments de eto ge iene ers | comerciais as pritcas observadas em minha profisio, et fmeionsmn Independentemente do uso que facodeles. Que se tomem wm ang todos o# membros de que é composiaa sociedad,» que precede Poder ser repetido a propésto de cada um dees Fi a, portant | 1manciras de air de pensar e de sentir que apresentam exes motive propridade de exnirem fora das conscincis ndvidvan ses tipos de conduta ou de pensamento no apenas slo exterior "es a0 individu, como também so dtados de una fore imposing € coercitva em virtude da qual se impdem a ee, quer le queine ‘quer nfo. Certamente, quando me conformo vontaramente sel esta coerce no se fz on pouco se fz sentir, endo int Nem por | iso ela deixa de serum carter intineco dene fats, «a prov

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