Está en la página 1de 55
Fundamentos para uma CeTOVUIE oT Ne eLOeMUAroManecHaL®) [As frontciras do dacumentitio compsem um horizonte de dificil defini- lo. A quaificagio de uma narrativa como documentiria, até bem pouco tempo, era negada por parcela de nossos eriticos, seguindo algumas for- :mulagies proprias& semiologia dos anos 1960." falta de conceits espect- ficos provocou dificuldades no desenvolvimento de ferramentasanaliticas, comprometenda o horizonte da produgio ndo ficional. Seo documento io existe, quem faz documento faz 0 4 ‘umentério confunde-se com a forma esilistica da narrativa documentécia cm seu modo clissico, provocando confusao. Alguns autores se referem a documentirio em geral, mas tém no horizonte o documentéro cléssico, confundindo a parte com 0 todo. Predominante nos anos 1930/1940, 0 documentério cléssco enuncia baseado em vor over? fora-de-campo, de- tentora de saber sobre o munda que retrata, Na medida em que a ideologia cdominante contemporinea foi criada na desconfianca da representagio ob- Jetiva do mundo ~ e na desconfianga da espessura do sujeito que assume aver de saber sobre 0 mundo ~, # narrativa que se locomove com natu- ralidade nesse meio sof carga critica. Nos anos 1990, a0s poucos, fi se criando um consenso de que o documentirio é um campo que existe para além de sus narrativa mais clissicd: Uma vez expandido o campo, jovens cm sintonia com seu tempo podem dizer, sem constrangimento, que fa- em docimentérie, apresentando narratvas diversas como resultado de seu trabalho, Incorporando procedimentos abertos pela revolugéo estilistica chamada cinema diretofverdade, trabalhando com imagens manipuladas digitalmente, tomadas com cimeras mintisculas ¢ 4geis, o documentirio contemporineo possui uma linha evolutiva que permite enxergar a tota- lidade de uma tradigio. Uma totalidade que tem a origem de sua concei- twalizagio nas formulagdes griersonianas e que sofre as inflexdes de seu tempo. ? Muitas vezes 0 conceito do- a. ramen aa ra tea do decametio ‘Tanto em sua versio de grande produgio das televisdes a cabo quanto 1nos formatos mais alternativos, nos quais 0 horizonte da primeira pessoa ‘ocupa espaco, a narrativa documentéria possui tragos esilsticos recorren- tes eum nome (dacumenidra),abrangendo a diversidade. A principal van- tagem do nome é termos um conceito carregado de contetido histbrico, rmovimentos estéticos, autores, forma narrativa, transformag6es radicais, mas em torno de um eixo comum, Dentro desse eixo comum, podemos afirmar que o docomentrio é uma nacrativa basicamente composta por ima- ‘gens-cimera, scompanhadas muitas vezes de imagens de animago, carre- -gadas de ruidos, misica e fala (mas, no inicio de sua histra, rmadas), para as quais olhamos (nés, espectadores) em busca de asseees sobre 0 mundo ‘que nos € exterior, seja esse mundo coisa ou pessoa. Em poucas palavras, documentirio é uma narrativa com imagens-cimera que estabelece aver~ {es sobre 0 mundo, na medida em que haja um espectador que receba essa narrativa como assergio sobre 0 mundo, A natureza das imagens-cimera ¢, principalmente, a dimensdo da tomada através da qual as imagens sio cons- tituidas determinam a singularidade da narrativa documentéria em meio a ‘outros enunciados assertvos, escritos ou falados. As assercies Mas... qual a diferenca entre documentério e ficci0? Ao contritio da ficgio, o documentario estabelece assercdes ou proposigées sobre o mundo histérico. Sio-duas tradigdes narrativas distntas, embo- Fa muitas vezes se misturem. © fato de autores singulares explicitamente romperem 0s limites da ficgio e do documentério no significa que no possamos distingui-los. Em nossa abordagem, o trabalho de definicio do documentério & conceitual, Estamos trabalhando com ferramentas analiticas que tém por trés de si uma realidade histérica, Nao se trata aqui de esta- belecermos uma morfologia do documentério, com ¢ mesma metodologia que cerca, por exemplo, definigGes nas ciéncias naturais. Diferengas entre documentiri ¢ fiegio, certamente, no sio da mesma natureza das que cxistem entre répteis ¢ mamiferos. Lidamos com o horizonte da liberdade criativa de seres humanos, em uma €poca que estimula experiéncias ex- tremas e desconfia de definigdes. Artistas no querem se sentir classifica- dos ¢ sio estimulados por nossa sociedade nessa postura, No entanto, se Nesatut.oeveé meno tcurentio? A ueremos pensar a produgdo cultural de nosso tempo, temos de lidar com concetos, com palavras mais on menos precisas que desigmem o universo a que estamos nos referindo, Na tradigio narrativa’ documentiria podemos vislumbrar uma hist6ria na qual alguns tragos estraturas so recorrentes, formando perfodos. A repetigio de conjuntos, mais ou menos homogéncos, podemos dar nomes. Documentério é um desses nomes, Designa um con- junto de cbras que possuem algumas caracterfsticas singulares e estives, que as diferenciam do conjunto dos filmes iecionzis. As proposiqées, as assergées, do documentirio sto enunciadas através de stiles diversos, variando historicamente. Hi sempre uma voz que enun- cia no documentitio, estabelecendo assercdes. No documentério cssico, até 0 final dos anos 1950, predomina a locugio fora-de-camapo (a vor over ou voz de Deus). E uma vor que possui saber sobre 0 mundo, enunciada, em geral, por meio de tonalidades grandilogientes. A produgao brasilei- 12 do Ince (Instituto Nacional do Cinema Educativo) em seus primeiros anos (1937/1945) pode ser citada como exemplo caracteristico. A voz que nos acompanha em Wy We Fight, série norte-americana de documentirios dirigida por Frank Capra (1942-1945), pode ser outro bom exemplo. A escola documentarista inglesa produs. diversos filmes ness linha, embora a flexio poética cla voz ver (trabalhada, entre outros, pelo brasileiro Alber- to Cavalcanti) deva ser considerada como diferenciada. Alguns exemplos contundentes do documentério clissco britinico, como Night Mail [Cor- rio notarno], 1985, Coa! Face (Cara de caruao), 1985 ¢ Industrial Britain, 1933, trabalham de modo inovador a vor. ver (ou lug), distendendo-a com vozes mitiplas, enunciadas por corais, fleionando-a por meio de melodias com atonalidades de vanguarda, ‘A partir dos anos 1960, com o aparecimento da estilistca do cinema direto/verdade, o documentétio mais autoral passa a enunciar por asser- .0es dialégicas. Assemelha-s, eno, ao modo dramatico, com argumentos sendo expostos na forma de disloges. O mundo parece poder falar por si, ¢ fala do mundo, a fala das pessoas, é predominantementedialégica ‘A tendéncia mais participativa do cinema direto/verdade introduz no do- ‘cumentério uma nova mancira de enunciar: « entrevista ou 0 depoimen- to, As assergies continuam dialégicas, mas sio provocadas pelo cineasta. No documentirio contempordineo mais crativo, hé uma forte tendéncia fem se trabalhar com a enunciagéo em primeira pessoa. E geralmente 0 eu? que fila, estabelecendo asserges sobre sua propria vida. O filme de

También podría gustarte