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Sem reajuste salarial desde 2005 e descontentes com os critérios usados para o pagamento da
chamada “bonificação por resultados”, professores das escolas técnicas (Etecs) e faculdades de
tecnologia (Fatecs) do estado de São Paulo ameaçam entrar em greve nas próximas semanas.
Uma das principais queixas foi a inclusão, em 2007, de critérios de produtividade para a
concessão do benefício aos docentes. Quem aprova mais alunos, recebe um bônus maior.
Especialista em avaliação, Luiz Carlos Freitas, professor de Educação da Unicamp, afirma
que o modelo gera corrupção no sistema. Confira a entrevista concedida a CartaCapital.
CartaCapital: Como o senhor avalia essa política de bonificação instituída na rede pública
paulista?
Luiz Carlos de Freitas: A ideia da bonificação é importada da iniciativa privada. Os
reformadores empresariais da educação acreditam que a educação é uma atividade como
qualquer outra, passível de ser administrada pelos critérios da iniciativa privada, ou seja, a
escola é vista como se fosse igual a uma pequena empresa. Para este pensamento, o problema
educacional se resolve com um choque de gestão. Uma empresa vai bem quando os lucros
aumentam, e na escola, o equivalente aos lucros são os resultados dos testes. Se eles aumentam,
então a escola vai bem, logo seus profissionais merecem um bonus, se as notas não aumentam,
então alguém tem que ser responsabilizado, ou seja, demitido – tal como s e fosse uma fábrica
de sapatos. Ocorre que não há intercambiabilidade entre a área dos negócios e a área da
educação. São lógicas diferentes. No mercado há ganhadores e perdedores e os ganhadores não
têm que se preocupar com os perdedores. A educação é um direito de todos e temos que nos
responsabilizar pelo avanço de todos. São lógicas incompatíveis. Os testes ganham então uma
relevância extraordinária. Há, entretanto, um princípio antigo, de Campbell, que diz que quanto
mais um indicador social é usado para controle, mais ele distorce e corrompe o processo social
que ele tenta monitorar.
CC: Por que o senhor acredita que o sistema de bonificação por resultados, como o
implantado em São Paulo, gera corrupção no interior das redes de ensino?
LCF: Há muitos exemplos que comprovam isso. Recentemente, Beverly Hall, Superintendente
do sistema educacional de Atlanta nos EUA foi demitida do seu cargo em função de que uma
investigação governamental encontrou fraude na avaliação de 58 escolas públicas de Atlanta.
Na Cidade de Nova York, John Klein deixou o cargo de Superintendente depois que em junho
do ano passado a bolha de desempenho da cidade de Nova York explodiu mostrando que as
altas notas que os alunos estavam tirando nas escolas estavam infladas.Cathleen Black, que o
sucedeu, vindo de um posto bem sucedido na iniciativa privada (Hearst Magazines) conseguiu
ficar apenas três meses no cargo e foi demitida no começo de abril. Black não conseguiu
administrar o sistema de educação da cidade de Nova York pois não dominava o mundo
educacional, apenas era uma gestora bem sucedida no campo da iniciativa privada. Entre suas
gafes está sua recomendação de que as sala de aulas superlotadas de alunos poderiam ser
mudadas se houvesse mais controle de natalidade. Isso tudo mostra que entre o mundo dos
negócios e o mundo da educação há uma grande distância. A escola não é uma pequena
empresa.
CC: O sindicato dos professores do ensino técnico afirma que a bonificação tem sido usada
como desculpa para a falta de reajustes salariais nos últimos anos e que o sistema leva em
conta critérios que não dependem só do docente, como evasão escolar e aprovação dos
alunos. Essas críticas procedem?
LCF: Procedem. Em geral, todos admitem que mais de 50% das variáveis que explicam o bom
rendimento do aluno se deve a fatores que estão fora da escola. Entretanto, na hora de pensar
nas soluções para aumentar o rendimento dos alunos isto é esquecido e se pensa exclusivamente
em termos de variáveis intraescolares, em especial o papel do professor. Isso leva à tentação de
aumentar o salário somente para aqueles professores que possam ser associados à melhoria do
rendimento de seus alunos, medido em testes, e demitir aqueles que não são associados à
melhoria do rendimento do aluno. Por isso, os defensores destas políticas são contra o aumento
salarial para todos e são igualmente contra a estabilidade do emprego do professor, pois
precisam ameaçar com a demissão ou com o não pagamento de bônus .