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A miopia do debate sobre a inflação de

alimentos
Por Marcos Fava Neves
07/05/2008

Nas últimas semanas, presenciamos várias discussões mundiais acerca da explosão dos preços
dos alimentos, trazendo inflação e fome. É uma preocupação real na Europa (3,6%), China
(8,3%), EUA (4,0%), Rússia (12,7%) e em outros mercados. Diversos estudos têm apontado
apenas os biocombustíveis (a) como causa da alta nos preços, ignorando outros fatores, velhos
conhecidos, como o crescimento da população mundial (b), enquanto outros são fenômenos
recentes, como o desenvolvimento e a distribuição de renda (c) em países populosos; programas
governamentais (d) de assistência e acesso a alimentos; o impacto da urbanização (e) e formação
de megacidades, aumentando o consumo e mudando hábitos; os preços do petróleo (f), cujo
barril subiu de US$ 35 para US$ 125 em 5 anos (aumento no custo de produção e dos
transportes); a desvalorização do dólar (g); escassez na produção devido à fatores climáticos e
doenças (h) e movimentos de fundos de investimentos nas commodities (i). Qual é a
porcentagem de responsabilidade de cada um desses nove fatores, que juntos trouxeram o
problema da inflação? Se são apenas os biocombustíveis, por que preços de produtos não
relacionados têm subido intensamente nos últimos anos (arroz, feijão, suco de laranja, por
exemplo)?

Investimentos globais sustentáveis em biocombustíveis têm sido severamente prejudicados por


opiniões equivocadas. Um economista bem informado declarou que "mesmo políticas para
biocombustíveis aparentemente positivas, como a fabricação brasileira de etanol de cana-de-
açúcar, aceleram o aquecimento global ao promover desmatamento", ignorando nossa geografia.
Representante da ONU classificou biocombustíveis como "crime contra a humanidade" e o diretor
geral do FMI considerou-os como "problema moral". Pesquisas sérias atestando experiências
positivas em sustentabilidade dos biocombustíveis devem ser lidas e estudadas antes que se
emitam opiniões. Periódicos internacionais publicam artigos negativos com metodologias obscuras
e generalizam os resultados de forma perigosa. Biocombustíveis não podem ser colocados na
mesma cesta, há grandes diferenças entre as diversas matérias primas. A sociedade mundial
deve se perguntar quem está patrocinando esses "estudos" e por quais interesses. Um bom ponto
de partida seria analisar quem perde margens com as mudanças. Como contribuição para o
debate sobre inflação, uma agenda global de 10 pontos seria um caminho a ser percorrido,
trazendo resultados à produção sustentável de alimentos e biocombustíveis.

Expandir horizontalmente a produção (1) em novas áreas, com sustentabilidade ambiental. A


América do Sul usa apenas 25% de sua capacidade e este crescimento poderia ser a redenção da
África. No Brasil, reconhecidas instituições atestam mais de 120 milhões de hectares a serem
usados, em sua maioria tomando terras degradadas de pastagem e sem tocar em ecossistemas
frágeis. Há também a expansão vertical (2) em terras que poderiam produzir mais caso fossem
feitos investimentos em tecnologia. A quantidade de milho que um fazendeiro norte-americano
pode produzir é duas ou mesmo três vezes maior que outros países.

Redução das tarifas de importação, outras barreiras importantes e protecionismo (3). Os preços
de certos alimentos são artificialmente inflacionados. A carne bovina na União Européia chega a
custar quatro ou cinco vezes mais que a de mesmíssima qualidade encontrada nas lojas do
mesmo varejista europeu no Brasil ou na Argentina. Outras taxações e impostos internos sobre
gêneros alimentícios poderiam ser reduzidos aliviando os preços. O novo patamar alcançado pelos
preços agrícolas pode permitir que as agriculturas locais se tornem competitivas. Investimentos
em logística (4) para que custos sejam reduzidos. Parte dos países produtores apresenta logística
extremamente deficitária, como nosso caso. Os governos deveriam aumentar já investimentos
nessa área e promover as mudanças institucionais necessárias para facilitar a privatização (para
ontem) ou PPPs de portos, estradas, aeroportos, ferrovias e outros equipamentos para
distribuição de alimentos. O grau de investimento trará muitas oportunidades de investimentos
para privatização, desde que o governo remova suas travas ideológicas e administrativas.

São Paulo mostra ser possível avançar na produção de alimentos e biocombustíveis sem
impacto nos preços

Redução dos custos de transação (5), via reformas institucionais, uma vez que cadeias
internacionais de alimentos são mal coordenadas e apresentam redundâncias, mal uso de ativos,
corrupção, oportunismo e ineficiências que são responsáveis por grande parte das perdas,
aumento dos custos e presença de agentes que não adicionam valor à cadeia de alimentos. Uso
das melhores fontes de biocombustíveis (6), de maneira totalmente sustentável. O Brasil produz
etanol usando apenas 1% das terras aráveis e suprindo 50% do consumo de combustível, sem
causar impacto nos alimentos. São Paulo mostra ser possível avançar na produção de alimentos e
biocombustíveis. Produzir etanol a partir de milho não se mostra a melhor solução.

Investimentos em novas gerações de fertilizantes (7), de fontes alternativas, em plantas que


absorvam maiores quantidades de energia do sol e em reciclagem de subprodutos como fonte de
fertilizantes para mitigar os enormes riscos e custos destes no futuro. Pesquisa e investimentos
em inovação (8) principalmente no desenvolvimento genético, novas sementes, para que soluções
sejam levadas para a produção com sustentabilidade. Necessitamos de mais contratos de
fornecimento sustentáveis para produtores (9). Estímulos nos preços são o melhor incentivo para
o crescimento da produção com tecnologia e inclusão. A concentração de agroindústrias e varejo
retém margens que poderiam ser melhor distribuídas aos produtores rurais, estimulando o
desenvolvimento. Finalmente, trabalhar a mudança do comportamento de consumo de alimentos
e combustíveis (10). Alimentos são, por vezes, excessivamente consumidos em muitos países,
levando à obesidade, uma grande preocupação da saúde. Também o investimento e o uso de
transportes coletivos pela sociedade é fundamental e suas políticas de conscientização.

Minha contribuição neste artigo foi organizar nove efeitos causadores da inflação e propor 10
sugestões para este importante debate. Passamos por um momento crítico, um ponto de inflexão.
Nós podemos retroceder, tentando aumentar o protecionismo, fomentar a auto-suficiência de
regiões ineficientes, banir os biocombustíveis, criar taxas de exportações, ou mesmo ameaçar
transformar companhias privadas em empresas públicas. Ou, então, a sociedade pode caminhar
para frente; e eu realmente espero que os interesses globais nos permitam seguir uma agenda
positiva, no trilho certo para a sustentabilidade, para o desenvolvimento dos países mais pobres,
vencendo interesses escusos e pensamentos medievais.

Marcos Fava Neves é professor de Estratégia da FEA-USP de Ribeirão Preto (


www.favaneves.org ).

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