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Universidade Católica Portuguesa

Faculdade de Direito – Escola de Lisboa

Direito da Cultura

Prof. Dr. Vasco Pereira da Silva

Legislar Sobre a Cultura – O Património Cultural Escrito e


Falado

Mª Raquel Gandra Neves


Número de aluno : 140109504

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Ano lectivo de 2010/ 2011

Direito da Cultura ......................................................................................................1


Legislar Sobre a Cultura – O Património Cultural Escrito e Falado..................... 1
Introdução...................................................................................................................3
A Ratificação .........................................................................................................5
O Acordo Face aos Direitos Linguísticos.............................................................. 6
O Mirandês................................................................................................................. 7
Na Origem do Mirandês......................................................................................... 7
Língua ou Dialecto?............................................................................................... 7
Na Actualidade....................................................................................................... 8
Medidas Legislativas e suas Motivações..............................................................9
Conclusão................................................................................................................. 10

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Introdução

No âmbito da cadeira de Direito da Cultura foi-nos proposto elaborar uma


apresentação sobre a relação entre estas duas realidades – o Direito e a Cultura –
abordando para tal um tema à nossa escolha que fosse demonstrativo desta mesma
relação.

Antes de explicar a minha opção, cabe aqui desenvolver um pouco o conceito de


cultura, uma realidade que todos conhecemos e mais do isso experimentamos todos os
dias, e que no entanto não é de definição óbvia. Pode dizer-se talvez que, num sentido
amplo, cultura é aquilo que nos rodeia, um fenómeno complexo, ligado não só à
criação cultural propriamente dita, àquilo que o ser humano cria no campo das letras,
das artes, das ciências mas também à vivença dos povos, àquilo que é tradição em
cada comunidade e lugar, que vai passando de geração em geração, desde o vestuário
aos usos sociais, passando pela língua, pela gastronomia, pela família… Nesta
acepção a cultura desprende-se da acusação de elitista, que aliás surge apenas quando
não olhamos para o fenómeno cultural na sua totalidade.
Neste sentido, felizmente, cresceu a consciencia acerca do valor do chamado
património cultural imaterial. De facto, a herança cultural, na explicação da própria
UNESCO, não se encontra limitada a aspectos materiais, é muito mais do que isso,
engloba as expressões vivas, as tradições, a oralidade transmitida pelas gerações.

Posto isto colocam-se algumas questões, nomeadamente aquelas que serviram de


ponto de partida para este trabalho.
Num primeiro ponto, a cultura é um fenómeno colectivo, existe onde quer que exista
uma comunidade de pessoas. Em que medida é então importante introduzir aqui uma
dimensão normativa ? Não fará parte da cutura esse elemento de espontaneidade, não
se caracterizará por estar em permanente evolução e mutação ? Creio que a resposta a
todas estas questões deve ser afirmativa. Se é verdade que a cultura se transforma por
si, sem interferências mais ou menos « artificiais », também é verdade que nunca
esteve em causa ir contra o sentido evolutivo que a língua já tomara. E é com esta

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consciência que, na minha opinião, devemos encarar o Novo Acordo Ortográfico, sem
prejuízo de oportunas considerações.
Mas há ainda um outro tipo de iniciativa legislativa no que concerne à língua, que se
prende com as necessidades de conservar viva esta dimensão cultural. Aqui interessa
já não questionar a intervenção legislativa mas antes conhecer o que foi e está a ser
feito para defender o património linguístico. Neste sentido propus-me falar sobre o
Mirandês.

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O Novo Acordo Ortográfico

A Ratificação

A Língua Portuguesa é uma das mais faladas no mundo, com cerca de 200 milhões de
falantes. No entanto, verificam-se diferenças mais ou menos significativas de país
para país (dir-se-ia até de região para região) que representam um entrave ao diálogo
entre os países e à divulgação da língua e das obras literárias em Português.
Concretamente, tem-se defendido um maior intercâmbio e cooperação sobretudo no
espaço da CPLP, uma vez que dispomos do que é, afinal, um instrumento priviligiado,
a língua comum.
Outro dos grandes incentivos ao Novo Acordo foi a vontade de fazer com que a
língua Portuguesa integrasse o núcleo de línguas oficiais da ONU da qual sempre foi
excluída devido à existência de tantas variantes.
A resolução da Assembleia da República nº 35 de 2008, analisada na apresentação,
aprovou a ratificação de Portugal ao Acordo do Segundo Protocolo Modificativo ao
Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, que entrou em vigor a 13 de Maio de
2009. A nova ortografia começará a ser ensinada nas escolas a partir do ano lectivo de
2011/ 2012, sendo que em 2012 os documentos oficiais passarão também a obedecer
às novas regras.
Além de Portugal ratificaram o Acordo o Brasil, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe e
Timor-Leste, sendo que ele só cumprirá o seu objectivo quando os restantes países de
Língua Oficial Portuguesa o ratificarem, isto é, Angola, Guiné-Bissau e Moçambique.

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O Acordo Face aos Direitos Linguísticos

Há, inegavelmente, um património a defender. Decalcando as conhecidas palavras de


Fernando Pessoa, a nossa Pátria é a Língua Portuguesa. É justamente neste sentido de
reconhecimento do pleno valor do património cultural imaterial e da sua importância
para as comunidades que surgiu o reconhecimento dos direitos linguísticos, com
vários reflexos no mundo do Direito, nomeadamente através da criação de uma
Declaração Universal dos Direitos Linguísticos, assinada em Barcelona em 1996.
Uma das ideias que se retiram deste documento é o respeito pela diversidade,
encontrada não só nas muitas línguas existentes mas também nas diversas
manifestações de uma mesma lingua espalhada pelo globo.
É claro que se o processo de transformação da língua não existisse falaríamos ainda
latim. Mas a questão vai além disso. Será legítimo que o Estado imponha a todos os
falantes do Português alterações na sua escrita ? Será que eu tenho o direito a exigir
que a língua seja preservada de interferências externas a ela mesma ?
Penso que a resposta vai depender da natureza das alterações em causa. De facto
pode-se argumentar que há algumas regras arcaicas no respeitante à ortografia, não só
Portuguesa mas também brasileira (veja-se o trema). Enquanto as novas regras não
fizerem mais do que tornar obrigatórias algumas mudanças ortográficas que
correspondem mais à realidade falada dos nossos dias penso que não são de rejeitar
mas é necessário ter muito cuidado pois há uma ténue linha entre uniformizar algumas
regras ortográficas e impôr aquilo que são na verdade especificidades próprias da
realidade de alguns países. É que são precisamente essas especificidades que devemos
abraçar, que dão cor à língua e correspondem a identidades culturais que são, e devem
ser, diferentes.
Na minha opinião o Acordo, ainda que eventualmente pouco feliz, não interfere na
estrutura da língua, pelo que não fere os direitos linguísticos nem implica uma forçosa
descaracterização. De resto, semelhantes reformas já tinham sido feitas no passado.
Posto isto não há dúvida de a diversidade linguística e cultural é uma riqueza para
Portugal, integrante da nossa identidade. Pode dizer-se que a chamada “democracia
linguística” é um elemento importante da democracia em geral.

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O Mirandês

A estrutura da apresentação em powerpoint abordou as origens do Mirandês, o seu


significado e importância na actualidade, a discussão quanto à sua qualificação como
língua ou apenas como dialecto e a legislação que lhe diz respeito, assim como a
análise dos seus fundamentos. Irei portanto seguir aqui idêntico esquema.

Na Origem do Mirandês

Trata-se de uma língua de tradição oral anterior à independência de Portugal,


contando com mais de mil anos de História. Surgiu no então reino de Leão e, apesar
de terem como herança comum o latim, ao contrário do Português que deriva do
Galaico-Português, o Mirandês surgiu a partir do Asturo-Leonês. Os textos recolhidos
em Mirandês mostram a envolvência de traços fonéticos, sintácticos ou vocabulares
das diferentes línguas: o Português era considerado língua culta, fidalga, importante.
Tendo a língua Mirandesa uma forte tradição oral, passando de pais para filhos ao
longo dos tempos, só em 1882, por José Leite de Vasconcelos, começou a ser
investigada e fixada em escrita.
É espantoso que tenha sobrevivido ao longo dos séculos através da “mera” tradição
oral. A explicação está no isolamento da região, assim como no contacto continuado
com as regiões fronteiriças contíguas, sobretudo Aliste e Sayago, onde se falava
leonês ou uma sua derivação pelo menos até fins do século XIX.

Língua ou Dialecto?

É geralmente aceite que uma língua se distingue de um dialecto pelo seu


reconhecimento político, o aconteceu com o Mirandês através da lei 7/99, de 29 de

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Janeiro, aprovada pela Assembleia da República.
Pode dizer-se que uma língua existe sempre que estejamos perante um sistema
linguístico gramaticalmente perfeito e com características distintivas próprias, o que
poderá ser reconhecido ao Mirandês desde que, nos fins do século XIX, foi estudado
por José Leite de Vasconcellos.
Língua ou dialecto, qualquer que seja, é um direito fundamental que radica na
dignidade de cada uma das pessoas que a falam, bem como da comunidade que
através dela se expressa e se identifica. Esta é a questão essencial.

Na Actualidade

O Mirandês é falado apenas por um grupo diminuto de pessoas, cerca de dez mil,
essenciamente no concelho de Miranda do Douro. Em 1999 foi reconhecido como
Língua Oficial Regional mas, apesar de viva, tem vindo a sofrer alguma erosão, em
particular desde meados do século passado. O facto explica-se, numa primeira fase,
com o impacto da vinda de milhares de falantes de Português para construção das
barragens do Douro internacional, Picote, Bemposta e Miranda do Douro, e depois
com a generalização do ensino, da rádio e da televisão e, em geral, com a melhoria
das condições de mobilidade das pessoas.
Mas se mesmo aqueles que ainda sabem Mirandês falam sobretudo Português – como
é possível então que aquele “irmão pobre” não seja completamente substituído? A
verdade é que as duas línguas convivem em simultâneo devido aos diferentes usos das
duas. O Português é a língua institucional e de contacto com elementos estranhos à
comunidade; o Mirandês é a língua da comunidade, quer nas relações sociais e
familiares, quer nas relações de trabalho, sobretudo em círculos com alguma
intimidade.

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Medidas Legislativas e suas Motivações

Pelas razões já apontadas, tornou-se necessário criar mecanismos para a manutenção


da língua. É aqui que intervém o Direito. Em defesa daquela foram tomadas várias
medidas, destacando-se pelo seu âmbito a aprovação do Decreto-Lei 7/99 de 26 de
Janeiro (“Reconhecimento oficial de direitos liguísticos da comunidade Mirandesa”).
Partindo da alínea c) do artº 161 da CRP, foi analisado na apresentação o referido
Decreto-Lei, que reconheceu a língua Mirandesa como património cultural de
interesse nacional, o valor do ensino e aprendizagem desta língua e permitiu também
a publicação de uma segunda versão dos documentos oficiais, no concelho de
Miranda do Douro, em Mirandês. A grande crítica é que na verdade este decreto-lei
não é suficiente, na medida em que se fica pelo reconhecimento da língua e de direitos
associados a ela.
Entretanto, o ensino desta língua foi regulamentado pelo Despacho Normativo, do
Ministro da Educação, n.º 35/99, de 5 de Julho, na sequência do referido Decreto-Lei.
A língua Mirandesa tem sido também ensinada na UTAD – Universidade de Trás-os-
Montes e Alto Douro e é objecto de estudo também em universidades estrangeiras. A
Câmara Municipal tem-se encarregado de publicar livros em Mirandês, assim como
promover anualmente um concurso de canções e um concurso literário. Em 2006 a
Câmara Municipal deliberou ainda a favor da tradução de todas as placas toponímicas
da cidade e continua a trabalhar no sentido da divulgação da língua, nomeadamente na
sua difusão nos meios de comunicação social.
Acrescentes-se como demonstração do interesse demonstrado em difundir esta língua
que já existe uma Wikipédia em Mirandês, a Biquipédia, e vários sites internacionais
como o WordPress, o hi5 ou o Photoblog oferecem versões em Mirandês.

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Conclusão

Numa recente entrevista ao Jornal de Letras, o embaixador de Portugal na UNESCO,


Manuel Maria Carrilho, recorda uma ideia defendida por Eduardo Prado Coelho : « a
estreita articulação que deve existir entre a política da língua e a política da cultura,
que devem ser concebidas e activadas como as duas fases da mesma moeda. »

Tendo toda a minha vida desenvolvido um grande interesse pelas línguas e pela
literatura, a investigação para este trabalho foi na verdade muito satisfatória. Espero
ter conseguido transmitir isso no pouco tempo em que foi possível fazer a
apresentação oral mas creio que talvez tenha conseguido pois a resposta que obtive
dos colegas foi muito positiva, muito participativa.

Creio que as palavras de Amadeu Ferreira expressam a minha convicção ao terminar


esta exposição melhor que quaisquer outras :
“As leis não mudam a realidade mas criam condições para que essa mudança
aconteça. A mudança depende das pessoas e das instituições.”

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Bibliografia

• Associação de Professores de Português (APP) – « Novo Acordo Ortográfico


da Língua Portuguesa », INCM APP, 1ª ed., Agosto de 2010

• CEOLIN, Roberto (2002) - "Um enclave leonês na paisagem unitária da


língua Portuguesa" in Revista Philologica Románica, nº 3, p. 62-83

• GOMES, José António – “Defender a Língua Portuguesa” in O Militante n.


268 Janeiro/ Fevereiro de 2004.

• SILVA, Vasco Pereira da – “A Cultura a Que Tenho Direito. Direitos


Fundamentais e Cultura”. 1ª ed. Coimbra, Almedina, 2007.

• SOARES, Virgínia Prado -– “Cidadania Cultural e Direito à Diversidade


Linguística: a Concepção Constitucional das Línguas e Falares do Brasil
como Bem Cultural” in Revista Internacional de Direito e Cidadania. São
Paulo, n.1, p. 83-101, Junho/2008.

Outras Fontes

• Centro de Linguística da Universidade de Lisboa, in


http://mirandes.no.sapo.pt/.

• Câmara Municipal de Miranda do Douro, in http://cm-mdouro.pt.

• Panorama BBC - especial sobre o Novo Acordo Ortográfico, gravado na


Biblioteca Nacional em Lisboa a 2 de Março de 2009, in
http://www.bbc.co.uk/portuguese/multimedia/2009/03/090302_panoramadeba
te.shtml.

• MARTINS, Cristina (2002)


"A situação da língua Mirandesa antes e depois da aprovação da lei 7/99 de 29
de Janeiro" , in http://mirandes.no.sapo.pt/LMRenasc.html.

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