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Iberografias
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Iberografias
Editores: Cristina Amaro da Costa (Coord.), Ana Aguiar, Cristina Parente, Daniela Costa, Helena Esteves Correia, Raquel Guiné,
Paula Correia, Cláudia Chaves
Autores: Ana Aguiar, Ana Entrudo, Andreia Martins, Ângelo Rocha, Aníbal Cabral, Carmo Bica, Cecília Delgado, Cláudia Chaves,
Cristina Amaro da Costa, Cristina Parente, Daniela Costa, Duarte Costa Guimarães, Emília Coutinho, Emiliano Tapia, Fábio
Gomes, Fernando Carlos Alves Martins, Fernando Delgado, Fernando Oliveira Batista, Filipa Almeida, Filipa Janson, Francisco
Bendrau Sarmento, Frederico Costa Guimarães, Helena Esteves Correia, Irene Aurora Santos, Isabel Mourão, Joana Neto, Joaquim
Pinho, José Rocha Fernandes, José Sousa Guedes, Liliana Pinto, Luísa Silva, Manuel António Silva, Maria C. Silva, Maria do Céu
Godinho, Maria Helena Marques, Maria Victória Garcia Medina, Paula Nelas, Paula Correia, Paulo Barracosa, Pedro Barbosa, Pedro
Reis, Sara Moreira, Raquel Guiné, Raúl Rodrigues, Rui Dionísio, Rui Jacinto, Telmo Costa, Vitor Barros
Âncora Editora
Avenida Infante Santo, 52 – 3.º Esq.
1350-179 Lisboa
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O Centro de Estudos Ibéricos respeita os originais dos textos, não se responsabilizando pelos conteúdos, forma e opiniões neles expressas.
A opção ou não pelas regras do novo acordo ortográfico é da responsabilidade dos autores
“Agradece-se ao Projeto PROJ/CI&DETS/CGD/0006: “Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica”, financiado através
da parceria entre o Politécnico de Viseu e Caixa Geral de Depósitos, e ao CI&DETS e CERNAS, financiados pela Fundação para a
Ciência e Tecnologia (FCT)”
Apoios:
Conceitos
Agricultura familiar e biológica: modelos tecnológicos e dinâmicas 29
Pedro Reis
Agricultura familiar e agricultura biológica: conceitos 33
Isabel Mourão
práticas
PROVE – Promover e vender 43
José Sousa Guedes
O que fazer para aproximar a agricultura familiar da agricultura biológica. 47
Ângelo Rocha
A Segurança alimentar, do ponto de vista da agricultura familiar e biológica, como 49
um caminho de cura do nosso planeta.
Liliana Pinto
Testemunho de um horticultor de agricultura convencional. 53
Manuel António Silva
Agricultura familiar, agricultura biológica e desenvolvimento rural. Perspetiva de 57
uma família de jovens agricultores.
Filipa Janson, Frederico Costa Guimarães, Duarte Costa Guimarães
Ao território e às pessoas
Os pequenos agricultores familiares e o direito à alimentação. 91
Aníbal Cabral
Un proyecto en Salamanca: “5 Colectivos en red – La dignidad de la vida para 95
permanecer en su propia tierra”.
Emiliano Tapia
Estratégia Terras de S. Pedro – Município de S. Pedro do Sul. 99
Joaquim Pinho
«O som é a enxada»: promover a agricultura de proximidade através de uma rádio 101
comunitária.
Sara Moreira e Filipa Almeida
Agricultura familiar: do direito à alimentação até ao consumo. 105
José Rocha Fernandes
Sociologia e território
Cultivar laços de confiança e afectividade no seio de uma agricultura familiar que se 113
quer de cariz biológico.
Paulo Barracosa
Olhares fragmentados sobre as paisagens rurais dos fogos de 2017 no interior do país. 117
Fernando Delgado
Agricultura familiar, agricultura biológica e desenvolvimento rural 129
Fernando Oliveira Batista
Rede Rural Nacional – Construir pontes para o Desenvolvimento Rural. 137
Ana Entrudo e Carmo Bica
Pontes entre a agricultura familiar e a agricultura biológica 141
Fernando Carlos Alves Martins
Ambiente
Por uma Cultura Agroalimentar Sustentável. 147
Vitor Barros
Agricultura familiar, agricultura biológica e desenvolvimento rural: aspetos em torno 153
da proteção das plantas.
Maria do Céu Godinho
Património frutícola do Minho – Bases para um desenvolvimento sustentável 157
Raúl Rodrigues
Rui Jacinto
cas que vêm de longe, potenciadas por tendências mais recentes, igualmente pesadas, onde
relevam alguns momentos marcantes, tais como:
(i) o êxodo rural e a atração urbana, fenómeno persistente que ocorre com ritmos,
destinos e intensidades, variáveis ao longo do último século, responsável pela con-
centração da população no litoral, nas áreas metropolitanas e nas capitais de distrito,
fenómeno que no passado mais recente levou à polarização demográfica nas sedes
de concelho;
(ii) o surto emigratório ocorrido depois da Segunda Guerra Mundial, muito intenso
nos anos 60, que veio reorientar o fluxo transatlântico para os países da Europa,
12
quase marginal em relação aos padrões europeus. Mudamos, literalmente falando, e sem quase
nos darmos conta disso, de mundo. Mudamos porque o mundo conheceu uma metamorfose sem
precedentes, não apenas exterior, mas de fundo”.
O saldo natural e o migratório negativos estão alinhados com outras variáveis
socioeconómicas. Consonantes, são a ponta dum iceberg que representa uma situação
difícil de contornar. O retrato frio e duro desenhado pelos indicadores demográficos
e sócioeconómicos projeta uma geografia que deixa pouca liberdade a interpretações
fora das dicotomias que balançam entre o preto e o cinzento carregado, onde o bran-
co dificilmente conquista alguma representação. A adjetivação de Interior e de rural
13
Os espaços rurais, como sabemos, são plurais e diversos, seja por influência das con-
dições naturais, da matriz edafoclimática ou das mudanças verificadas, onde o desapareci-
mento de funções tradicionais foi acompanhado da difusão nos campos de novos modos
de vida. Tais mudanças alteraram os quadros de referência bem como os sentimentos de
pertença, contributos decisivos para moldar uma nova identidade e alterar o conceito de
rural tanto aos olhos internos como externos, seja de quem nele vive, de lá é oriundo ou
aí chega de novo. O abandono demográfico e de algumas atividades ocorridas nos espaços
rurais, mais evidente em certas regiões do país, é correlativo de mudanças estruturais e pro-
fundas operadas na agricultura, confirmadas por vários estudos e ao longo dos sucessivos
Recenseamentos Agrícolas que foram sendo realizados2.
// Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
1
Em algumas passagens retomou-se o artigo Calcanhar do mundo: da geografia das ausências à geografia da
esperança publicado em 2015, na Revista Praça Velha, Revista Cultural da cidade da Guarda, CM Guarda,
Ano XVII, Nº 35, 1ª série, novembro 2015, pp.: 243-260.
2
Segundo INE a primeira referência a um “levantamento” exaustivo, sistemático e organizado de dados
estatísticos sobre a agricultura portuguesa foi o “Arrolamento Geral de Gados e Animais de Capoeira”, que
remonta ao ano de 1934, arrolamentos que se repetiram em 1940 e em 1972. Ao longo deste período, no
Continente, tiveram lugar outras operações igualmente importantes: Inquérito às Explorações Agrícolas
do Continente (1952-54 e 1968) e os Recenseamento Agrícola do Continente (1979, 1989, 1999, 2009
e 2019). Os últimos quatro Recenseamentos, que correspondem a levantamentos exaustivos e simultâneos
em todas as regiões do país, ocorreram depois de adesão de Portugal à União Europeia; aguardam-se os
resultados do Recenseamento de 2019 para se perceber o sentido e a profundidade das mudanças
estruturais verificadas na última década.
(http://ra09.ine.pt/xportal/xmain?xpid=RA2009&xpgid=ra_historia)
14
contrariadas por dinâmicas positivas, demasiado leves, que aqui e ali se observam, incapazes
de reverter o ciclo vicioso em que foram mergulhando. O apregoado renascimento do rural,
que possa pontualmente ocorrer em determinados contextos locais, do centro e norte do
Continente, acaba por ser demasiado ligeiro e, portanto, manifestamente insuficiente para
contrariar a perda em que se encontram a generalidade daqueles territórios.
Perante semelhante realidade, adquire maior interesse e significado trabalhos como os
elaborados no âmbito do projeto “Pontes entre agricultura familiar e agricultura biológica”.
Desde logo porque estão focados na agricultura familiar e na preocupação “de garantir a
3
INE, Recenseamento agrícola de 2009: análise dos principais resultados.
16
4
In Resumo do Projeto “Pontes entre agricultura familiar e agricultura biológica”. (http://www.cei.pt/iit/projetos-
selecionados-2017.html)
5
O estatuto da pequena agricultura familiar é relativamente recente, tendo sido criado pelo Decreto-Lei
nº 64/2018, de 07 de agosto de 2018 (Diário da República nº 151/2018) e regulamentado pela Portaria
n.º 73/2019, de 7 de março. Para este efeito, entende-se por:
a) «Agregado familiar», os cônjuges, os ascendentes e descendentes na linha reta em primeiro e segundo grau, os
parentes por afinidade, os que vivam em união de facto, e os demais a cargo que vivam em situação de econo-
// Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
mia comum com o titular da exploração agrícola e participem na atividade da exploração de forma regular;
b) «Agricultura familiar», o modo de organização de atividades produtivas, de gestão do ambiente e de suporte
da vida social nos territórios rurais, assente numa exploração agrícola familiar;
c) «Exploração agrícola familiar», a exploração agrícola em que a mão-de-obra familiar, medida em Unidade
de Trabalho Ano, representa mais de 50 % da mão-de-obra total da exploração agrícola;
d) «Mão-de-obra da exploração agrícola», o trabalho mobilizado na exploração agrícola, com origem na
família ou no assalariamento (trabalhadores permanentes, eventuais ou não contratados diretamente pelo
produtor);
e) «Mão-de-obra familiar», trabalho realizado pelo titular da exploração agrícola (produtor agrícola) e por
membros do seu agregado familiar;
f ) «Rendimento coletável», rendimento anual bruto, efetuadas as respetivas deduções específicas;
g) «Unidade de Trabalho Ano (UTA)», unidade de medida da mão-de-obra correspondente ao trabalho
realizado num ano por um trabalhador a tempo inteiro
17
Pontes. Ao longo destes dois anos de projeto, foram pontes que se construíram. E redes.
Desde os agricultores, que aqui nos trouxeram, passando por todos os que ajudaram na
construção, pelos que nos apoiaram e reconheceram (e particular o Centro de Estudos
Ibérico, o Politécnico de Viseu e a Universidade do Porto), até aos que vieram conversar e
ficaram para nos ouvir. A todos, bem hajam!
Estes dois anos de trabalho comum e participado permitiram estabelecer pontes entre
a agricultura familiar e a agricultura biológica, e contribuir para uma maior adoção deste
modo de produção. Partimos de uma reflexão teórica sobre a proximidade entre a realidade
das práticas agrícolas da agricultura familiar e agricultura biológica, para propor práticas e
recomendações ao nível das orientações de políticas públicas, que permitam aos agricultores
familiares alcançar modos de produção mais sustentáveis e saudáveis.
O que alcançamos foi partilhado em três seminários, com uma estrutura comum, mas
// Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
enriquecida por diferentes oradores que em cada uma das ocasiões vieram trazer a sua ‘espe-
cial’ perspetiva – desde os conceitos, às práticas e ao papel económico, social e ambiental da
agricultura familiar, com enfoque nos desafios, nos resultados que possamos atingir, e que
traduzimos agora neste livro.
Começamos por tentar esboçar uma análise da realidade destes dois setores (agricultura
familiar e agricultura biológica) discutindo conceitos, estatísticas e casos de boas práticas.
Neste início, ficaram muitas questões em aberto: como contabilizar o valor da mão de obra
ou do autoconsumo das explorações de agricultura familiar? como ultrapassar a resistência ao
associativismo ou a menor produtividade destas explorações e calcular o valor do trabalho?
19
estar, de opções pela sustentabilidade, mas cada vez mais pela saúde – preocupação que é,
em cada um de nós, cada vez maior.
E aqui surgem as políticas. As políticas que deviam ser feitas por pessoas e para as
pessoas. As políticas que precisam interiorizar, para além dos modelos técnicos, os mode-
los sociais. As políticas que, quase sempre em prol do desenvolvimento e da economia,
têm consequências, em particular nos grupos sociais mais frágeis, como é o caso de tantos
pequenos agricultores.
Os desafios que aqui se colocam são diversos, e o que hoje é uma realidade, foi em
tempos uma dificuldade. Principalmente, porque aquilo que definimos para a mudança
20
A agricultura familiar baseia-se num modelo agrícola organizado e praticado por pro-
prietários rurais de modo a garantir a produção agrícola, gerido por uma família com base
em mão-de-obra familiar não assalariada, assumindo um papel importante e fundamental
nas zonas rurais.
A agricultura familiar, pelas suas caraterísticas próprias, assume, de forma mais ou
menos declarada, os princípios que norteiam a agricultura biológica: princípio da saúde,
da ecologia, da justiça e da precaução (FAO, 2014; IFOAM, 2016).
Em dezembro de 2011, a Assembleia Geral das Nações Unidas declarou 2014 como
o Ano Internacional da Agricultura Familiar e em 2018 entrou em vigor em Portugal,
coesão territorial
o Estatuto da agricultura familiar.
O desenvolvimento de explorações em agricultura familiar pode passar pela adoção de
modos de produção como a agricultura biológica, assente em princípios como alimentar
Biológica
o solo, otimizar os ciclos de nutrientes através da gestão dos animais e plantas no espaço e
sustentável,
veis e da agricultura biológica, bem como ouvir e aprender com exemplos de sucesso e de
e territórios:
boas práticas.
Pontes entre
25 // Lugares
FAO (2014). 2014 International Year of Family Farming - Feeding the world, caring for the earth.
Food and Agriculture Organization of the United Nations.
IFOAM (2016). Princípios da agricultura biológica. IFOAM, Bonn: 4p. https://www.ifoam.bio/
sites/default/files/poa_portuguese_web.pdf
26 // Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
Pedro Reis
Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária
rências dos regimes de proteção social (as pensões e reformas) ou remessas de emigrantes;
c) os avanços tecnológicos (ao nível dos inputs variáveis, das inovações e equipamentos de
menor escala) e organizativos do funcionamento da exploração, como é o caso do recurso
à externalização de serviços na EA (Baptista, 1993; Baptista e Rolo, 2017).
A agricultura familiar está fortemente associada à pluriatividade e ao plurirrendimento.
Apenas 13,9% da população agrícola familiar ativa (PAFA) trabalha a tempo completo na
EA, e um terço desta PAFA tem uma atividade exterior à exploração agrícola (INE, 2017).
Relativamente aos rendimentos constata-se que em 78,8% das explorações agrícolas fami-
liares, mais de 50% do rendimento do agregado doméstico do produtor provém de fora da
(disponibilidade e custo) e mais fáceis de aplicar. Pelo lado da tecnologia é mais exigente
em conhecimento, em economias de escala e mão-de-obra. Mas, apesar destas dinâmicas
tendenciais impulsionadas pelo funcionamento dos mercados, existem casos de sucesso,
com bom desempenho, associados a jovens empreendedores, com atividades de pequena
transformação e grande foco no consumidor e no marketing.
As pontes entre a agricultura familiar e a agricultura biológica têm de ser dinamizadas
através de políticas públicas e assentes na mobilização dos agentes interessados. As políti-
cas públicas têm de veicular os benefícios para a sociedade e para as gerações futuras. No
tocante à mobilização social é crucial ter consciência da sua relevância, sobretudo quando
Referências
Isabel Mourão
Centro de Investigação de Montanha, Escola Superior Agrária de Ponte de Lima,
Instituto Politécnico de Viana do Castelo
Em meados do séc. xx, 30% da população mundial vivia em áreas urbanas, pas-
sando para mais de metade em 2018 (55%) e estimando-se que aumente para 68%
até 2050 (ONU, 2018). A sustentabilidade das cidades, a capacidade de atraírem ati-
36 // Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
Referências
Artmann M, Bastian O, Grunewald K (2017). Using the Concepts of Green Infrastructure and
Ecosystem Services to Specify Leitbilder for Compact and Green Cities—The Example of the
Landscape Plan of Dresden (Germany). Sustainability, 9, 198.
DL (2018). Decreto-Lei n.º 64/2018 de 7 de agosto – Estatuto da Agricultura Familiar. Diário da República,
1.ª série, 151, 3946-3949.
EEA (2018). The circular economy and the bioeconomy – Partners in sustainability. European Environment
Agency, Dinamarca, 60 p.
Rodale (2011). The Farming Systems trials – celebrating 30 years. Rodale Institute, Kutztown,
USA, 21 p.
Sendim AC (2011). Comercialização de produtos diferenciados na perspetiva do produtor. Reunião
da Sociedade Portuguesa de Ovinotecnia e Caprinotecnia – Evolução Recente dos Sistemas
de Produção de Pequenos Ruminantes no Sul de Portugal, 25 de Maio, Évora. http://www.
ovinosecaprinos.com/programa_f.html
Simon-Rojo M, Recasens X, Callau S, Duzi B, Either S, Hernandez-Jimenes V, Kettle P, Laviscio
R, Lohrberg F, Pickard D, Scazzosi L, Vejre H (2016). From urban food gardening to urban
farming. In: Lohrberg F, Licka L, Scazzosi L, Timpe A (eds). Urban agriculture Europe. Berlin:
Jovis Verlag GmbH, 22-29.
senvolveu um manual muito prático, que depois experimentou e aperfeiçoou, com a colaboração
da Ader-Sousa e da Monte, também associações de desenvolvimento local, a primeira do Norte e
a segunda do Sul de Portugal, de forma a testar diferentes realidades. A definição da metodologia,
para além de ter ido “beber” experiências a França e Espanha, foi desenvolvida em parceira com
outras entidades, produtores e consumidores. Entretanto o PROVE tem sido disseminado por
vários territórios de Portugal, com o apoio de outras associações de desenvolvimento local.
O PROVE veio dar solução à afirmação de uma produtora da península de Setúbal
“Produzir todos sabemos; comercializar o que produzimos é mais difícil”. No entanto, essa
afirmação engloba uma problemática mais complexa que se observa nos territórios:
Tabela 1
Resultados do PROVE a Outubro de 2018
Resultados
Quantidade Núcleos de produtores 117
Explorações agrícolas 132
Locais de entrega 158
Consumidores 4890
Toneladas comercializadas semanalmente 39
Referências
Bandeiras C, Costa C, Calheiros JP, Alvarez L, Sampaio M, Alter M (2009). PROVE – Contributo para
um Processo Territorial de Proximidade. ADREPES, Quinta do Anjo, 166p. http://www.portugalglobal.
pt/PT/RoadShow/Documents/2016/Santarem_PROVE-Contributo-para-um-Processo-Territorial-de-
Proximidade.pdf
46 // Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
Ângelo Rocha
Quinta da Comenda/BeiraBio
Liliana Pinto
Agrinemus
fruteiras: no entanto, foi sempre reservado um espaço para horta de subsistência, que
cresceu no últimos 3 anos, e outras culturas anuais. Foi nestes espaços que se começou a
produzir a semente, o tremoço, cultivado nesta região há muitos anos...
Em 2010 iniciou-se a transformação de produtos agrícolas em modo produção bioló-
gico, nomeadamente o tremoço pronto a consumir com ervas aromáticas e posteriormente
picante. A unidade de transformação desta bela leguminosa tradicional portuguesa foi
ampliada em 2018, bem como a sua equipa de trabalho e os seus produtos!
Desde 2014, os princípios da permacultura complementaram as práticas já imple-
mentadas na exploração, permitindo uma visão mais holistica de como curar o nosso
Carta de Princípios
(https://amap.movingcause.org/carta-de-principios/ )
Tabela 1
Agricultura sustentável e as bases para o movimento agroecológico solidário
Sustentabilidade
Económica Social Ambiental
Redução do desperdício na colheita e Evita a exclusão da pequena agricultura/ Transporte reduzido ao mínimo
material de embalagem agricultura familiar
51 // Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
A obra publicada Directrizes para apoio à promoção da Agricultura Familiar nos países da
CPLP no nosso entender deveria estar referenciada como documento suporte ao Decreto-
-Lei 64/2018, de 8 de agosto - Estatuto da Agricultura Familiar, porque descreve de forma
mais pormenorizada o que está na base de reconhecimento de uma Agricultura Familiar e
os conceitos que estão interligados (ex. direito à alimentação saudável).
a produção de hortícolas.
Temos culturas tradicionais e variedades autóctones como a cebola e penca da povoa e
o tomate coração. São variedades registadas no catálogo Nacional de Variedades e reconhe-
cidas pelos consumidores. A introdução de novas variedades e adoção de novas técnicas,
nomeadamente a enxertia, veio permitir maior produtividade
Estamos na maior bacia leiteira do País e a economia circular ao nível do que são os
efluentes pecuários é importante. Alguns colegas tentaram técnicas hidropónicas, mas os
resultados demonstram que se tratarmos o solo como um ecossistema vivo o tradicional
continuará a prevalecer.
cedimentos e criação de condições físicas para que o prestígio dos nossos produtos de excelência
correspondam também a uma plena segurança alimentar. Para isso, eram necessários deter-
minados requisitos nomeadamente a capacitação, registos, certificação, etc, que a própria
legislação veio criar condições para tal.
Para uma região em que a agricultura familiar é uma realidade enraizada até na forma da
passagem do acesso à terra, de pais para filhos e confrontados com dicotomia agricultura bio-
lógica versus agricultura convencional, continuamos a acreditar no conhecimento científico,
baseado na experimentação e reconhecimento. Lembro ainda, quando em 2011, houve a
contaminação bacteriológica com Escherichia coli, na Alemanha, isso foi um problema
Filipa Janson
Frederico Costa Guimarães
Duarte Costa Guimarães
Dona Ovelha, Lda, Quinta Vila Caiz – Agricultura Biológica
Numa altura em que cada vez mais se discutem estratégias para o desenvolvimento
rural, é imprescindível que se apoiem mais as famílias que, tal como o presente caso, dei-
xaram a cidade para investirem no campo. Uma aposta mais incerta, e consequentemente
mais arriscada, tanto do ponto de vista pessoal como económico-financeiro num interior
cada vez mais desertificado.
Para tal, é necessário a adoção de medidas verdadeiramente pragmáticas: a divulgação
esclarecida e alargada dos benefícios que advêm da prática desta atividade – saúde, preser-
vação da natureza e incentivo ao consumo local –, aproximando famílias de produtores a
famílias de consumidores.
Pedro Barbosa
Estames e Carpelo, Sociedade Agrícola, Lda & Flores em Casa.
Paula Correia
Raquel Guiné
Politécnico de Viseu, CERNAS, CI&DETS
coesão territorial
maior enfoque político sobre o rendimento e emprego, mercados e preços, incluindo o
contributo destes agricultores através da componente de autoconsumo), (3) estabilidade
(acesso a alimentos em todos os momentos e a preços justos) e (4) utilização (acesso aos
Biológica
sustentável,
nutrientes adequados).
e Agricultura
Neste capítulo, são abordadas estas temáticas: desde o direito e políticas relacionadas
com a produção de alimentos e o seu consumo, bem como os territórios e as pessoas que
Familiar turismo
Paula Correia
Raquel Guiné
Politécnico de Viseu, CERNAS, CI&DETS
FAO (2014a). Agricultura familiar é vital para segurança alimentar e desenvolvimento sustentável globais.
Food and Agriculture Organization of the United Nations. https://nacoesunidas.org/agricultura-
-familiar-e-vital-para-seguranca-alimentar-e-desenvolvimento-sustentavel-globais-diz-fao/
FAO (2014b). The State of Food and Agriculture. Innovation in family farming. Food and Agriculture
Organization of the United Nations, Roma.
FAO (2017). The future of food and agriculture: Trends and challenges. Food and Agriculture Organization
of the United Nations, Roma.
FAO, IFAD (2019). Family Farming 2019-2028: Global Action Plan. Food and Agriculture Organization
of the United Nations and International Fund for Agricultural Development. Roma.
IIED (2019). Modern food systems to emerge in new decade of family farming. International
Institute for Environment and Development. https://www.iied.org/modern-food-systems-
emerge-new-decade-family-farming
Inades-Formation (2014). Family farming as a sure way to ensure sustainable food production. Workshop
on Family Agriculture, Swiss Centre for Scientic Research. Suiça. www.inadesformation.net/en/
poltical-influence/family-farming-as-a-sure-way-to-ensure-sustainable-food-production/
70 // Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
Cecília Delgado
Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa
CICS.NOVA – Centro Interdisciplinar de Ciências Sociais – FCSH.UNL
Introdução
de Freguesia de Silvares, no Fundão, que serve 112 refeições/dia. O desafio destas escolas
passa pelo aprovisionamento semanal de produtos biológicos.
propõe-se:
A – Estratégia Territorial
A expansão da % AB em relação à SUA implica um processo faseado no tempo e no
território. A Tabela 1 ilustra as 4 fases de expansão propostas: 1) aumento da SAU nacio-
nal de modo a responder à procura interna e reduzir a balança de importações; 2) este
aumento deverá ser acompanhado pela expansão percentual de superfície de AB; 3) uma
aposta política clara na expansão da Agricultura Urbana - AU, mais próxima da localização
4
Com certificação, o que implica um desafio adicional.
Tabela 1
Estratégia Territorial
Faseamento
Território Ação Curto Prazo Médio Prazo Longo Prazo
1 Nacional Aumentar a SAU
2 Aumentar a % SAU em AB
3 Local Aumentar AU
4 Aumentar a % AB em AU
B – Princípios de Intervenção
1) Políticas Públicas – É essencial que as políticas publicas se retro – alimentem atra-
vés de abordagens multissetoriais, facilitadoras de respostas concretas e convergentes dos
atores no território.
2) Mediação – A mais valia resultante da parceria entre a Junta de Freguesia de Olivais
e a Agrobio demonstra a relevância da mediação técnica e institucional. Um modelo que
deve ser testado e eventualmente replicado à escala nacional.
3) Monitorização e Avaliação – A estratégia de monitorização do desperdício alimen-
tar no Fundão provou ser relevante para o desempenho do projeto. Importa replicar o
modelo e trabalhar o processo, numa perspetiva de fecho do ciclo metabólico.
Agradecimentos
A autora agradece à Micaela Gil (Fundão), Anabela Silva e Rua Silva (Olivais), Paula
Rodrigues (Torres Vedras) e António Lopes (Agrobio / Agricoop – Bio) pela disponibili-
dade e generosidade da partilha. A investigadora é financiada por fundos nacionais através
da FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I.P., no âmbito da Norma Transitória
- [FCSH001730].
Estratégia Integrada para a Promoção da Alimentação Saudável (2017). Despacho n.º 11418/2017
de 29 de Dezembro. Diário da República nº 249 – 2ª Série. Gabinetes do Ministro da
Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural, da Ministra do Mar, dos Secretários de Estado
dos Assuntos Fiscais, das Autarquias Locais, da Educação, Adjunto e da Saúde e Adjunto e do
Comércio e das Secretárias de Estado da Indústria e do Turismo. Lisboa
Estratégia Nacional para a Agricultura Biológica e Plano de Ação (2017). Resolução do Conselho
de Ministros n.º 110/2017 de 27 de Julho. Diário da República, nº 144 – 1.ª Série. Lisboa
Estatuto da Pequena Agricultura Familiar (2018). Decreto-Lei n.º 64/2018 de 7 Agosto. Diário da
República, nº 151 – 1.ª Série. Presidência do Conselho de Ministros. Lisboa
Lei da Descentralização (2018) – Lei-quadro da transferência de competências para as autarquias
locais e para as entidades intermunicipais. Lei n.º 50/2018 de Agosto. Diário da República,
N.º 157 – 1.ª Série. Assembleia da República. Lisboa
(2011) salientam a necessidade das mulheres terem acesso igualitário aos recursos naturais e
produtivos como um componente fundamental para a realização do DHAA, igualdade esta
que é restringida em muitos países como consequência da legislação ou construções sociais.
O papel de centralidade das mulheres na alimentação em todas as etapas que per-
meiam, desde o cultivo do alimento até a sua chegada à mesa, é evidente e reconhecido.
Contudo, é necessário não perder de vista que essas mulheres são gravemente afe-
tadas por uma condição estrutural que deve ser imperativamente desconstruída. Por outro
lado, por meio da resiliência, essas mesmas mulheres são agentes de mudanças ativas e
contundentes na luta contra a sua própria opressão para a realização dos seus direitos.
Referências
ACTUAR (2017). As lutas das mulheres rurais pelo acesso à terra e outros recursos naturais nos Países
de Língua Portuguesa. Relatório do debate virtual.
ACTUAR (2015). Direitos das Mulheres Rurais na CPLP. ACTUAR, Coimbra.
Beauvoir S (2009). O Segundo Sexo. Tradução Sérgio Milliet. 2ª ed. Rio de Janeiro, Nova Fronteira.
Bellows AC, Scherbaum V, Lemke S, Jenderedjian A, Viana RS (2011). Gender-specific risks and ac-
countability: Women, nutrition and the right to food. Right to Food and Nutrition Watch, 23-29.
FAO, FIDA, UNICEF, PMA, OMS (2018). SOFI. El Estado de la Seguridad Alimentaria y la
Nutrición en el Mundo. Fomentando la resiliencia climática en areas de la seguridad alimentaria y
la nutrición. Food and Agriculture Organization of the United Nations, Roma.
FIAN (2018). An appetite for feminism. FIAN International, the FoodFirst Information and Action
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Nobre M, Miguel MM, Moreno R, Freitas TV (2008). Economia feminista e soberania alimentar:
avanços e desafios. Brasília, DF: Oxfam.
Nuila A, Claeys P (2016). Los derechos de las mujeres rurales: en la declaración de las naciones uni-
das sobre los derechos de los campesinos y de otras personas que trabajan en zonas rurales. FIAN
International, the FoodFirst Information and Action Network. https//www.fian.be/IMG/pdf/
droits_fe_rurales_es_web.pdf>.
Rivera M, Álvarez I (2017). Del enfoque mercantil a la centralidad de la vida: un cambio urgente para
80 // Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
las mujeres. Observatorio del Derecho a La Alimentación y a La Nutrición: Vencer la crisis alimen-
taria Mundial. Watch, 10: 40–45.
análise é o produto da coevolução entre ser humano e natureza, numa evolução integrada
entre cultura e ambiente (Norgaard, 1999), a agroecologia põe em valor as diferentes for-
mas de maneio que foram surgindo como fruto dessa interação, e que se traduziram em
formas sustentáveis de reprodução social e ecológica dos agro-ecossistemas, reconhecendo
assim que as experiências que as agricultoras/es adquiriram, desenvolveram e acumularam
com o tempo, na sua interação entre os sistemas agrários tradicionais, é um ponto base im-
prescindível para o desenho de formas de maneio mais sustentáveis (Guzmán et al., 2000).
Esta abordagem de análise teórica e metodológica da agroecologia foi a utilizada no
trabalho de investigação realizado em 2016 (Santos, 2017), com o interesse e inquietação
1
Comunicação elaborada a partir da tese de doutoramento em Antropologia intitulada “Para não perder o inço.
Práticas, discursos e conflitos em torno da guarda de sementes.” (Marques, 2014). A pesquisa focou, entre
outros aspetos, as motivações que levam à manutenção ou ao abandono da guarda de sementes para posteriores
sementeiras, bem como as razões subjacentes à preservação ou não de variedades locais de hortícolas. O
trabalho de campo foi desenvolvido, numa primeira fase, nos concelhos de Ponte de Lima, Miranda do Douro,
Cantanhede, Loulé e Silves. Privilegiando-se, posteriormente, a investigação em duas regiões: uma, no nordeste
transmontano, mais concretamente em duas aldeias da Terra de Miranda (Ifanes e Paradela, concelho de
Miranda do Douro); e, outra, no sul, em sítios e aldeias situados entre o Barrocal e a Serra algarvia (Monte
Ruivo e Brazieira, respetivamente nas freguesias de Alte e Salir, concelho de Loulé; Vale Figueira, Cortes, Torre
e Portela da Mó, na freguesia de São Bartolomeu de Messines, concelho de Silves).
2
Ou seja, o de garantir, a partir da exploração agrícola, os géneros necessários à sobrevivência quotidiana do
núcleo doméstico.
reside não só na maior rentabilidade destas variedades como nos hábitos dos consumidores.
Entre as variedades indicadas, por exemplo, em duas aldeias vizinhas de Miranda do
Douro (Ifanes e Paradela) e das quais se guardam sementes para posteriores sementeiras,
estão o melão carrasco, a ervilha torta, o feijão (macarronete, capão) para as cascas ou casulas
(vagens de feijão, partidas e secas ao sol), para serem cozinhadas no Inverno com o butelo
(ou, em mirandês, butiêlho4), o grão-de-bico antigo, a couve berdenhal, o feijão cordeiro (de
3
Dados mais recentes (GPP, 2017) indicam que entre 1999 e 2016, a diminuição do número de explorações
agrícolas foi de 37,7% (menos 156 986 explorações que em 1999), sobretudo de pequena dimensão.
4
Enchido de porco, feito com o bucho do animal e recheado com ossos tenros da costela e do espinhaço,
cartilagem e alguma carne.
ção, utilização e do esforço dos seus utilizadores para, ao longo do tempo, melhorarem
o seu desempenho e rendimento na interacção com as condições naturais específicas de
cada local ou região (como o clima, tipo de solos, recursos hídricos, etc.). Elas são, assim,
produtos sociais e culturais.
A troca de sementes possibilita, portanto, uma contínua recombinação genética da
qual resulta a própria resiliência agronómica das variedades tradicionais, ou landraces, e
esta contínua recriação de diversidade não serve para alimentar apenas comunidades espe-
cíficas mas constitui um repositório de recursos genéticos que pode ser determinante para
o futuro da produção alimentar global (Kloppenburg, 2010).
Referências
Altieri M, Merrick LC (1987). In situ Conservation of Crop Genetic Resources through Maintenance
of Traditional Farming Systems. Economic Botany, 41(1), 86-96. Altieri, M. e Nicholls, C. (2009).
Mudanças climáticas e agricultura camponesa: impactos e respostas adaptativas. Agriculturas, 6
(1), 34-39.
GPP (2017). Análise sumária da evolução das características estruturais das explorações agrícolas - Inquérito
à Estrutura das Explorações Agrícolas 2016. Gabinete de Planeamento, Políticas e Administração
88 // Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
Aníbal Cabral
Associação Distrital dos Agricultores de Castelo Branco
estar informada sobre as condições e com que químicos são produzidos e conservados, e
também sem qualquer informação quanto às condições de transporte, enquanto os pro-
dutores nacionais não conseguem vender os seus produtos, produtos geralmente de boa
qualidade, que, quando conseguem vender, o fazem quase sempre a preços muito baixos.
Este modelo intensivo, que visa o lucro máximo para as transnacionais da indústria,
da produção e da grande distribuição, é também responsável pela redução da biodiversi-
dade, do esgotamento dos recursos naturais, ao mesmo tempo que gera desperdício ali-
mentar e inviabiliza o escoamento da produção local com o esmagamento dos preços,
como aconteceu ainda recentemente com a batata no produtor a 5 cêntimos, enquanto os
Emiliano Tapia
Aseocoba – Asociación de Desarrollo Cumunitario Buenos Aires
tableciendo sobre todo con la manera de entrar y permanecer en las políticas agrícolas
comunes. Ha sido un duro golpe para los pequeños y medianos campesinos y su forma
de ser y de vivir.
Como colectivos hemos aprendido a luchar y a organizarnos defendiendo juntos y
juntas los intereses de los pueblos y sus gentes a través de las distintas iniciativas, para que
la población encuentre la manera digna de permanecer en su propia tierra frente a esta
agresión y expolio.
Es verdad que no hemos logrado frenar las perversas intenciones de la PAC, que hace
que esta tierra de pequeños y medianos campesinos pierda su identidad fundamental, que
3.º Nuevas relaciones entre el Medio urbano y Medio rural como apuesta
de futuro
Poco a poco, entre estas tres realidades, (en barrios, pueblos y empobrecimiento),
están creciendo propuestas comunes que fortalecen la economía solidaria y comunitaria,
las relaciones entre el medio rural y el medio urbano, o los cuidados entre la propia población,
96 // Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
Joaquim Pinho
Terras de S. Pedro, Município de S. Pedro do Sul
O Município de São Pedro do Sul tem vindo a desenvolver uma estratégia denomi-
nada Terras de S. Pedro, para apoiar os agricultores do concelho através da promoção de
circuitos curtos de comercialização e através de apoio técnico que proporciona aos produ-
tores. Até à data, foi possível apoiar cerca de 100 agricultores que praticam uma agricultura
tradicional e produzem para o mercado. Estes agricultores situam-se num escalão etário
acima dos 50 anos e têm explorações na ordem do 1,5 ha.
As principais dificuldades detetadas, com maior evidência nos pequenos agricultores,
foram as seguintes: fiscalidade (não registo na Segurança Social e Finanças enquanto agri-
cultores); compra de fatores de produção de síntese (pesticidas e fertilizantes); segurança
e higiene alimentar; estruturas de apoio à exploração; assistência técnica; mão-de-obra e
escoamento do produto.
Por outro lado, em S. Pedro do Sul estão localizadas diversas explorações de agricul-
99 // Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
tura biológica, que reúnem atores com dinâmicas reconhecidas a nível local e nacional,
nomeadamente as empresas Vasco Rocha Pinto, Casa do Aido, Quinta da Comenda, Mais
Ecológico, entre outras. Para além destas explorações, existem diversos outros produtores
biológicos (21 produtores). Estes agricultores são mais jovens, a maior parte a tempo parcial,
e com exceção das empresas mencionadas, os restantes produtores possuem também áreas
de exploração não superiores a 2 ha.
As iniciativas desenvolvidas no âmbito da estratégia Terras de S. Pedro dividem-se em
dois grupos: os circuitos curtos de comercialização e o apoio técnico. No que diz respeito
aos circuitos curtos de comercialização, as atividades desenvolvidas incluem:
Sara Moreira
Dimmons, IN3, Universitat Oberta de Catalunya; Instituto de Sociologia/UP
Filipa Almeida
Engenheira do Ambiente, Consultora e formadora independente
Introdução
Face aos desequilíbrios sociais, económicos e ambientais que resultam dos modelos
dominantes de produção, consumo e distribuição agroalimentar num mercado neoliberal
e globalizado, multiplicam-se as iniciativas que procuram caminhos mais justos, saudáveis
e solidários para cuidar dos sistemas que nos alimentam. Difundir as histórias e dilemas de
quem está a construir alternativas – das hortas urbanas às redes de consumo e produção,
das novas técnicas ao resgate dos saberes ancestrais – representa um contributo modesto
para desbravar o caminho que está a ser trilhado.
Neste artigo, fazemos uma análise dos temas e territórios abordados num programa
de rádio comunitária do Porto que, desde finais de 2015, tem vindo a explorar práticas e 101 // Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
conceitos ligados à agricultura de proximidade.
A organização do I Encontro Nacional das Associações pela Manutenção da Agricultura
de Proximidade (AMAP)1, em novembro de 2015 no Porto, serviu de mote para a criação
do programa O Som é a Enxada na Rádio Manobras2. Se inicialmente a intenção era só
fazer a cobertura de um evento de um fim de semana, passados três anos a emissão persiste
com os seus “registos e conversas sobre a agricultura de proximidade”. O programa, feito
1
As AMAP assentam na relação direta entre um grupo de consumidores e um ou mais produtores, que parti-
lham os riscos, responsabilidades e recompensas inerentes à atividade agrícola: http://amap.movingcause.org/
2
Rádio comunitária do Porto, fundada em 2011: http://radiomanobras.pt
Do ponto de vista temático, identificaram-se oito tipos de rúbricas (Tabela 1), sabendo
que cada programa pode conter mais do que uma.
Tabela 1
Número de programas dedicados a cada uma das rúbricas identificadas.
Rúbricas Número de programas
Entrevistas/Conversas 35
Dicas hortícolas 28
Visitas de campo 15
Leituras 15
Cobertura de eventos 12
Divulgação/Campanha 4
Experimental 4
Rádio-eventos 2
Apesar desta extensão, não foi possível obter dados sobre as audiências. Sendo que o
objetivo da Rádio Manobras é disponibilizar informação num território alargado, e não a
procura ativa por audiências, resta a certeza de que só quem tem acesso à tecnologia é que
consegue aceder à mensagem.
Perspetivas de futuro
104 // Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
Após três anos e meio no ar, O Som é a Enxada perspetiva a continuidade do seu
trabalho construindo sobre o que aprendeu das colheitas passadas. Tal como o agricultor
que precisa de melhorar o escoamento da sua produção, também O Som é a Enxada quer
apostar em canais de distribuição mais eficientes e em novas parcerias que potenciem o
efeito de disseminação do programa. À imagem da horta com cultivo de múltiplas varie-
dades, o programa almeja alargar o seu campo de acção, contactando com mais iniciativas
e projetos para além da sua rede de proximidade.
5
Disponível em https://tinyurl.com/mapaenxada
Temos assistido nos últimos anos, em Portugal, a uma discriminação positiva da agri-
cultura familiar, como fator de desenvolvimento do mundo rural e da coesão territorial.
O apoio aos circuitos curtos alimentares é um bom exemplo dessa tendência. A crescente
preocupação com a comercialização dos produtos locais, que tem vindo a assumir uma
importância crescente, por contribuir para a dinamização da atividade agrícola, criação de
emprego, aumento do rendimento dos agricultores e fixação da população no meio rural,
é outro bom exemplo.
O projeto “Da Nossa Terra”, iniciado em 2012 numa parceria entre a Câmara Municipal
de Penafiel, a Direção Regional de Agricultura e Pescas do Norte e a Cooperativa Agrícola
de Penafiel, visando a comercialização em circuito curto, dos produtos hortofrutícolas pro-
duzidos localmente, é um caso a ter em conta. Este projeto visa estimular a economia local,
promovendo o consumo dos produtos alimentares produzidos localmente. Os produtos
105 // Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
iniciar, possam criar novas dinâmicas locais capazes de dar mais vida aos territórios
rurais. Para que seja atingido esse desígnio, terá que ser fortalecido o sistema de acon-
selhamento técnico, incentivada a cooperação entre agricultores e entre estes e outros
membros da cadeia alimentar, melhorados os mercados municipais dando maior visi-
bilidade aos produtos de venda direta ao consumidor, articulado o turismo rural com
os produtos, gastronomia e saber fazer local, elaborado um “Guia de Boas Práticas”
para a segurança alimentar e rastreabilidade dos produtos e continuados os estudos
sobre estas questões.
Agricultura familiar
e desenvolvimento rural:
sociologia, território e ambiente
Ana Aguiar
GreenUP & DGAOT, Faculdade de Ciências da Universidade do Porto
Cristina Amaro da Costa
Politécnico de Viseu, CERNAS, CI&DETS
Paulo Barracosa
Politécnico de Viseu
os indicadores de racionabilidade e razoabilidade, temos a clara sensação que pela frente nos
espera uma tarefa hercúlea ao jeito de “um David contra Golias”. Um sistema de produção
desta natureza parecia estar condenado ao fracasso, se não existirem diretivas e incentivos que
promovam esta atividade. Contudo pode ser que o próprio evoluir das sociedades conduza
naturalmente esta prática ao sucesso na devida proporção para cada uma das realidades quer
em termos de dimensão demográfica quer pela localização geográfica. A recente publicação
do estatuto de Agricultura Familiar e a tendência em incentivar a produção e o consumo
apelidado de “quiilómetro zero”, mesmo pelas cadeias retalhistas, são sinais que apontam
numa visão de estratégias de futuro que privilegiem a proximidade física e afetiva limitando o
Fernando Delgado
Direção Regional de Agricultura e Pescas do Centro
Não conheço os labirintos eruditos que permitem decifrar a noção de paisagem – a sua
origem, as múltiplas tendências, as eventuais relações com a pintura, a música, ou qualquer
outra forma de arte. Para mim, paisagem é simplesmente perceção, é olhar, é procurar
entender os elementos – o que toco com as mãos e a linha do horizonte. E, sendo territó-
rio, é inevitavelmente o espaço regulado em que espero encontrar as marcas das sucessivas
transfigurações, sejam elas o resultado da natural evolução das sociedades ou os restos de
fenómenos dramaticamente destrutivos. São fragmentos deste olhar cru sobre as paisagens
rurais dos fogos de 2017 que me proponho partilhar.
Como é simples fazer diagnósticos a partir da sabedoria local e como é difícil entrar
neste mundo de realidades cruamente expostas com o olhar treinado pelas sociedades ur-
banas. Não há máscaras nos rostos e olhares destas gentes, mas apenas sulcos escavados na
pele onde se adivinham cicatrizes e escorrências de dias difíceis. Quando as mãos se abrem
sem pudor mostram encontros e desencontros num percurso sinuoso de amanhãs incertos.
Neste caudaloso leito de águas rumorosas, a tentação de encontrar soluções breves para
realidades de um tempo longo é muito forte, mas a única forma de compreender este
percurso é resistir à tentação de uma racionalidade negativa e compreender que existem
espaços com vidas próprias que exigem soluções específicas.
Recomeça…./ Se puderes/ Sem angústia e sem pressa./ E os passos que deres,/ Nesse caminho duro/
Do futuro/ Dá-os em liberdade./ Enquanto não alcances/ Não descanses./ De nenhum fruto queiras só me-
tade./ E, nunca saciado,/ Vai colhendo/ Ilusões sucessivas no pomar./ Sempre a sonhar,/ E vendo/ Acordado,/
O logro da aventura./ És homem, não te esqueças!/ Só é tua a loucura/ Onde, com lucidez, te reconheças…
Miguel Torga, Sísifo. Diário XIII.
«Nas aldeias perdidas no fundo das montanhas, onde o tempo parou na pedra seca das casas e nos
hábitos estereotipados por séculos de abandono, a paz bucólica que tanto impressiona os visitantes
citadinos, não assenta apenas na harmonia dos homens com a natureza, mas na harmonia conjugada
dos habitantes. Foi esta harmonia que exigiu, por razões de sobrevivência, a repartição dos ofícios
principais e a consequente eliminação de concorrência. Por isso existiu sempre em Valmatos um único
alfaiate, um único sapateiro, uma única taberna e um único barbeiro.»
120 // Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
E também espaços aparentemente vazios, sem pessoas, que de forma rápida foram
invadidos por matagais (de forma dissimulada também denominados incultos) numa de-
monstração da capacidade regenerativa da natureza, mas também de um aparente caos
que só o tempo conseguirá reordenar. Estes espaços cresceram paulatinamente sobre os
povoados, reduzindo o campo agrícola até cercar as habitações de vegetação (espontânea
«Lembremos que o ano de 2017 terminou com uma área queimada contínua que se
estende desde o sul do Tejo quase até Viseu, no coração florestal do país, e que afetou
de maneira indiferente pinhais e eucaliptais. Urge reconhecer que essas paisagens são
insustentáveis e indefensáveis, sobretudo face ao processo de alterações climáticas que
aumenta a frequência de situações de elevado risco meteorológico de incêndio e ao
abandono rural, que retira capacidade de controlo sobre o território.»
José M. Cardoso Pereira in Revista Cultivar.
Tudo indica que o despovoamento destes territórios irá continuar, com causas diversas
– os fenómenos de atração ou repulsão urbano/rural e litoral/interior, ainda que artifi-
cializados a partir de diagnóstico breves, parecem justificar motivações que quase sempre
se alicerçam em escolhas entre modos de vida e suportes económicos associados –, mas
1
Fotografias: Arquivo pessoal do autor.
Embora com critérios diferentes, tanto nas unidades familiares, como nas explorações
capitalistas, a adoção do modo de produção biológico tem de se compatibilizar com as
condições de que depende a viabilidade económica das unidades agrícolas.
Indicam-se, de seguida, esquematicamente, algumas destas condições para as explorações
familiares. Tradicionalmente, considera-se que para estas unidades o objetivo económico é
maximizar o rendimento familiar, em que está incorporada a remuneração do trabalho da
família. Na produção para o mercado, o valor do rendimento obtido depende, por um lado,
das despesas e, por outro, do montante conseguido na venda e dos subsídios recebidos. A
maximização pretendida depende da estrutura produtiva de que dispõe o agricultor, ou seja,
Só quando esta é positiva – mesmo que seja por ser inevitável – é que se pode esperar a
adopção generalizada de um modelo tecnológico.
Os apontamentos que vão seguir-se nesta terceira nota centram-se no rural interior a
norte do Tejo, ou seja, num rural de baixa densidade de que se destacam algumas caracte-
rísticas. É um território que desde há décadas regista um acentuado declínio populacional
e, para o qual, as projeções preveem a mesma tendência, ou seja, uma persistente e futura
com que são concebidas e aplicadas as políticas públicas. Com efeito, pretende-se acautelar
o vigor das fileiras económicas mas descura-se o modo de o fazer com impactos positivos
na vitalidade dos territórios. Além do que, o rural interior Norte é inequivocamente mar-
ginalizado na distribuição dos apoios públicos pelo território. Finalmente, as dificuldades
a nível local, que foram de dois tipos. Por um lado, as fragilidades da população mergu-
lhada na economia do “modelo residencial” para promover e concretizar novas iniciativas.
Noutros países e regiões, estas foram efetuadas sobretudo por agentes com outro perfil
ainda que, frequentemente, com raízes e ligações familiares no local. Por exemplo, o neto
que estudou e trabalhou na cidade e que depois retoma, ainda que apenas em tempo
articulados com o mundo urbano mas não sufocados pelas cidades médias do interior.
mas equitativo.
Referências
Buhler EA, Guibert M, Oliveira VL (2016). Agriculturas empresariais e espaços rurais na globaliza-
ção. Abordagens a partir da América Latina. UFRGS editora, Porto Alegre, 284 pp.
Cordovil F (2019). Incêndios rurais, territórios e políticas públicas.
Figueiredo E (coord) (2011). O Rural Plural – olhar o presente, imaginar o futuro. 100Luz editora,
Castro Verde, 494 pp.
Ana Entrudo
Carmo Bica
Rede Rural Nacional, Direção Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural
Estados Membros.
Uma das atividades estruturantes para o envolvimento dos diversos membros da
Rede tem sido a organização de Grupos de Trabalho Temáticos (Figura 2). Há duas
temáticas obrigatórias e permanentes (LEADER e Inovação) e outras cinco selecionadas
pelos membros da RRN em 5 workshops regionais, nos quais participaram cerca de
250 entidades.
• Transferência de conhecimento;
• Sensibilização para consumo de produtos locais provenientes da AF.
A RRN poderá contribuir para a divulgação dos resultados do Projeto “Pontes entre
Agricultura Familiar e Agricultura Biológica” e para a concretização de algumas das suas
conclusões através da organização de “Roteiros Temáticos” que possibilitam dar a conhecer
e debater localmente Boas Práticas; através da organização de seminários e reuniões para
promoção de debates e transferência de conhecimento e de informação e ainda através do
aprofundamento da temática em Grupos de Trabalho.
Pontes: é disso que se trata. Vivemos num mundo de crescentes contradições. A ali-
mentação está no centro do debate sobre a viabilidade da nossa existência humana.
Enquanto assistimos a uma crescente dificuldade em proporcionar a alimentação de base
em vastas regiões do globo, coexistem situações de mercados com persistentes excessos de
oferta, como é o exemplo dos cereais.
O sistema alimentar precisa, assim, de uma necessária mudança. Qual o seu sentido
para a nossa realidade é a grande questão. A abordagem que se propõe é no sentido de uma
abordagem territorial de sistemas alimentares saudáveis baseados na agricultura familiar,
suportados em modos de produção sustentáveis que promovam a biodiversidade, que
garantam a preservação dos conhecimentos tradicionais.
O estabelecimento de pontes entre a agricultura biológica e a agricultura familiar
numa determinada região poderá ser uma das vias para o alcançar através da criação de
141 // Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
bio-regiões.
“Uma bio-região resulta de uma intervenção territorial ampla onde os agricultores,
consumidores, operadores turísticos e autoridades públicas realizam, de forma participativa,
um acordo para a gestão sustentável dos recursos locais, com base na produção biológica
e no consumo sustentável”
Vitor Barros
Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária
Finalizaremos com uma parte mais focalizada na questão agrícola, atividade significativa
na ocupação do espaço.
Quanto ao futuro da atividade agrícola colocam-se no essencial três cenários: um pri-
meiro tem que ver com a produção agrícola competitiva no mercado; um segundo é o da
qualidade, com destaque para a produção de alimentos diferenciados, DOP e também
agricultura biológica e modos de produção e proteção integrada; por último um terceiro
cenário ligado à prestação de serviços à sociedade por parte dos agricultores, na medida
em que estes desempenham mais funções que a mera produção de alimentos, sobretudo
funções ecológicas, as quais deverão ser remuneradas.
de bens agrícolas existem alterações que importa salientar. Faz-se uma breve referencia aos
principais aspetos que fragilizam um ecossistema agrícola numa perspetiva de autorregula-
ção. A grande redução de diversidade especifica que se verifica num ecossistema agrícola,
com fortes variações, dependendo do sistema em causa, em particular na componente
botânica é o primeiro aspeto a regular. Efetivamente, o número de espécies de plantas
presentes na parcela agrícola é limitado, muitas vezes o objetivo é a redução a apenas uma
espécie que constitui a cultura agrícola, verificando-se a eliminação de plantas adventícias,
tradicionalmente indesejadas. Outro aspeto é a ausência de continuidade temporal e os ci-
clos culturais curtos que impõem intervenções/práticas agrícolas com intervalos pequenos.
Raúl Rodrigues
Centro de Investigação de Montanha, Centro de Investigação e Desenvolvimento
em Sistemas Agroalimentares e Sustentabilidade, Escola Superior Agrária de
Ponte de Lima, Instituto Politécnico de Viana do Castelo.
Raízes históricas
tadas e baseava-se, em grande escala, na troca de produtos alimentares3 por escravos africanos.
Como refere Miller (1982 e 1983), “a área bantu do Atlântico transforma-se, assim, no
cenário ideal para a produção de escravos, face à insegurança alimentar”. Isto explica parcialmente
a taxa de lucro do tráfico de escravos no Império Luso-Brasileiro.
1
O do Oriente, formado no início do século xvi e que declina no final do mesmo; o do Brasil com início
nessa altura, com apogeu no século xviii e final no primeiro quartel do século seguinte; e o Africano, que se
impulsiona dificilmente no século xix e acaba com a descolonização em 1975.
2
De onde se salienta o açúcar.
3
A troca de produtos agrícolas brasileiros por mão-de-obra africana estabelece-se ao redor de vários produtos,
sendo imprescindível referir a cachaça ou aguardente de cana, fumo, couro, cavalos, mandioca, carne e peixe
salgados e secos, entre outros.
Face aos problemas político militares verificados em alguns países, modelo produtivo dominante herdado do
4
período colonial e novas condições no sistema alimentar mundial, em particular a partir da década de 80 do
século passado.
5
Nesse sentido, o Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional da Comunidade dos Países de Língua
Portuguesa deliberou na sua II Reunião Ordinária realizada em Julho de 2018 em Cabo Verde: “Registar,
com preocupação, a severidade dos impactes da seca e das alterações climáticas nos ecossistemas e nas comunidades
rurais dos Estados-Membros, que afetam de forma particular os grupos mais vulneráveis, reconhecendo a urgência
em aumentar a resiliência dessas comunidades” (Artigo 13).
163 // Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
6
“Promover programas de educação e iniciativas para construção de capacidades em soberania alimentar, incluin-
do agroecologia, através do diálogo entre academia, governos e sociedade civil” (artª 12); “Trabalhar no sentido
de que os alimentos fornecidos através de programas de alimentação e saúde escolar sejam crescentemente
provenientes da agricultura familiar agro-ecológica nacional” (artº 13); “Saudar a criação de um Centro de
competências e rede de transferência de tecnologias que apoie a construção de capacidades para a agricultura
familiar sustentável na CPLP, em São Tomé e Príncipe” (artº 10) ;“Promover políticas públicas de fomento
à produção sustentável biológica e agro- ecológica desenhadas, implementadas e monitoradas com a ativa
participação dos agricultores familiares e suas organizações representativas” (artº18).
7
“Os Estados-Membros comprometem-se a proteger, promover, respeitar e garantir a gestão participativa do acesso
e do uso da biodiversidade, dos recursos naturais, da paisagem e dos conhecimentos tradicionais associados, assim
como apoiar a preservação ativa dos sistemas agrícolas tradicionais, através do estímulo de processos de candidatura de
Sistemas Agrícolas Património da CPLP ao Globally Important Agricultural Heritage System (GIAHS) desenvolvido
pela FAO” (artº 10).
Referências
Cláudia Chaves
Politécnico de Viseu, CI&DETS
Doutoranda Ciências de Enfermagem, Instituto Ciências Biomédicas Abel
Salazar, SIGMA Phi Xi Chapter
Ana Aguiar
GreenUP & DGAOT, Faculdade de Ciências da Universidade do Porto
Cristina Parente
Instituto de Sociologia, Faculdade de Letras da Universidade do Porto
A agricultura familiar tem um papel fundamental no mundo rural, do ponto vista econó-
mico, ambiental, social e cultural (FAO, 2014). Estes sistemas de produção baseiam-se em
explorações de pequena dimensão, geridas por uma família que depende essencialmente
de mão-de-obra familiar não assalariada e cujo saber se transmite de geração em geração.
Quase 90% das explorações agrícolas no mundo são de agricultura familiar, apresentam
167 // Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
pequena dimensão (mais de 475 milhões de explorações têm menos de 2 hectares), pro-
duzem cerca de 70% dos alimentos consumidos no mundo e garantem o sustento de
40% das famílias do mundo (FAO, 2014; Lowder et al., 2014).
Em Portugal, o setor agrícola é alicerçado, em grande parte, em explorações familiares
(96% das 280 mil explorações existentes no Continente). Utilizam predominantemente
mão-de-obra familiar, ocupam 67% da Superfície Agrícola Utilizada do continente, repre-
sentam 38% da população residente em meio rural e 25% do emprego regional (INE, 2011).
Por todo o mundo, estes agricultores constituem uma população envelhecida – 75%
tem mais de 65 anos – e com baixos níveis de formação escolar e profissional – 80% adquiriu
a sua divulgação poderá sustentar uma intervenção pedagógica (de prevenção e promoção
da saúde) focalizada nestes agricultores.
O conhecimento obtido serviu de suporte ao desenho de um conjunto de recomendações,
direcionadas aos decisores e agentes locais e regionais, baseados num pilar como a agricultura
biológica, a que se associam a um conjunto de benefícios sociais (promover o conhecimento e a
coesão, num contexto sociocultural específico); culturais (preservar sistemas tradicionais de
produção); económicos (proporcionar valor acrescentado às produções locais e aumentar a
competitividade); ambientais (adotar sistemas de produção menos intensivos e poluidores
e com maior enfâse na conservação de recursos). A partir dos resultados dos grupos focais,
Referências
Mancini S, Fernandes EN, Athie AA (2016). Agroecologia enxuta. 1º Simpósio Luso-Brasileiro sobre
Modelos e Práticas de Sustentabilidade, FCT/UNL, Lisboa, Portugal, 11-12 de julho.
Mansuri G, Rao V (2013). Localizing Development: Does Participation Work? World Bank, Washington,
DC: 308p.
Quivy LV, Campenhaudt R. (2008). Manual de Investigação em Ciências Sociais. Gradiva, Lisboa: 276p.
von Dach SW, Romeo R, Vita A, Wurzinger M, Kohler T (Eds.) (2013). Mountain farming is
family farming: a contribution from mountain areas to the International Year of Family Farming
2014. FAO, Rome: 100p.
World Bank (2011). Gender dimensions of community-driven development operations: a toolkit for
practitioners. World Bank, Washington, DC: 32p.
Cristina Parente
Instituto de Sociologia, Faculdade de Letras da Universidade do Porto
Introdução
suportar os custos relacionados com a mesma (Assis & Romeiro, 2007; Lampkin, 1990;
Olabisi et al., 2015).
Acrescem razões de cariz social, nomeadamente o facto de os agricultores familiares
constituírem uma população envelhecida – 75% têm mais de 65 anos – e com baixos
níveis de formação escolar e profissional – 80% adquiriram os conhecimentos através da
experiência prática e da transmissão de conhecimentos entre familiares, vizinhos e amigos
(FAO, 2014).
Se é verdade que os fatores de resistência se tendem a impor, nunca vivemos uma
época tão favorável à agricultura biológica, com a promoção de políticas e estratégias
Tabela 1
Caraterização sociodemográfica e profissional dos participantes
n %
Sexo
Masculino 11 55.0
Feminino 9 45.0
Idade
25 a 35 anos 1 5.0
36 a 45 anos 8 40.0
46 a 55 anos 7 35.0
Mais de 55 anos 4 20.0
preocupado com a qualidade dos produtos alimentares para a sua saúde e bem-estar e com
a sustentabilidade do meio ambiente, havendo uma escassez de informação ao nível do
consumidor; iii) mercado exíguo, estando tendencialmente territorializado nas duas áreas
metropolitanas e na região sul do país.
“Quem consome os produtos biológicos é Lisboa, Porto e Algarve. Era importante conse-
guirmos, em termos de transporte, levá-los ao Litoral. Aos grandes centros” [homem, 41 anos]
Neste sentido, foi também notório que, apesar de referido enquanto fator de adesão
à agricultura biológica, o valor económico destes produtos no mercado, caraterizado por
Referências
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Ana Aguiar
GreenUP & DGAOT, Faculdade de Ciências da Universidade do Porto
Introdução
Das 570 milhões de explorações agrícolas do mundo, mais de 500 milhões são explora-
ções familiares sendo responsáveis pela produção de mais de 70 % dos alimentos (Lowder
et al., 2014).
Estima-se que as explorações familiares possam contribuir em larga escala para a pro-
moção da limitação natural e dos serviços do ecossistema associados à resiliência dos sistemas
agrários. Por pressão externa ou por convicção, cada vez mais empresas agrícolas adotam
referenciais de produção que garantem a sustentabilidade como a agricultura de precisão,
a produção integrada ou a agricultura biológica.
Dos vários mecanismos que a sociedade desenvolveu para que a agricultura adote
práticas sustentáveis, destaca-se a exigência, por parte das cadeias de supermercados do
181 // Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
Agricultura é uma atividade humana que tem como principal objetivo produzir alimentos
e fibras pelo uso deliberado e controlado de plantas e animais (Spendding 1988). O desafio,
hoje, é produzir sustentável, considerando-se sustentável o que utiliza os recursos naturais
e humanos de forma a satisfazer as necessidades atuais sem comprometer as gerações futuras,
tal como definido em (Brundtland, 1987).
A sustentabilidade não está limitada a práticas pré-definidas (Menalled et al., 2008)
contudo algumas práticas têm um impacto favorável e outras não, sendo que, nas últimas dé-
cadas têm sido desenvolvidos referenciais que, devidamente aplicados constituem modos
de produção que contribuem para a sustentabilidade da agricultura.
Considerando a evolução dos modos de produção agrícola, até aos dias de hoje que,
esquematizados na imagem (Figura 1) verifica-se que, no século xxi, uma maior consciên-
182 // Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
para que conheçam a agricultura biológica e passem a praticar uma agricultura sustentável.
Referências
Telmo Costa
Politécnico de Viseu
Introdução
cionar possíveis relações entre variáveis que expressam perceções relativamente ao uso
de pesticidas e à agricultura biológica e atitudes, bem como com as variáveis socio de-
mográficas. A partir daqui, e devido ao elevado volume de variáveis e a inexistência de
hipóteses preestabelecidas (Palmer, 1993; Doey e Kurta, 2011), foi realizada uma análise
exploratória de dados, com recurso a uma análise de correspondência
Após a análise de correspondência, que mostrou a existência de diferentes grupos (ti-
pologias) de agricultores familiares, foi feita uma análise de clusters hierarquizada, para
1
explorações agrícolas que utilizam maioritariamente mão-de-obra familiar e cujo rendimento da família
provem essencialmente da exploração agrícola.
O presente trabalho envolveu 163 agricultores familiares, com uma idade média
de 56,7 anos (variando entre os 20 e os 90 anos) sendo que 31% dos participantes
eram do sexo feminino e 69% do sexo masculino (Tabela 1). Estes valores estão em
linha relativamente aos dados do INE (2017) no que diz respeito ao sexo (66,2%
do sexo masculino), mas verificou-se uma diferença entre a idade média da amostra
e dos dados do “Inquérito à estrutura das explorações agrícolas” (INE 2017) que é
de 65 anos. O nível de educação é, em geral, baixo – 55% dos inquiridos possui o
1º ciclo ou inferior e apenas 10% frequentou ou completou o ensino superior. Face
aos dados do INE (2017), isto representa um aumento para o dobro de indivíduos
com o ensino superior concluído e uma redução de 16% face aos indivíduos com o
ensino básico ou inferior.
Tabela 1
Características sociodemográficas da amostra (163 inquiridos)
Género
Feminino 30.7%
Sem formação 8%
4º Ano (ISCED 1) 47%
Escolaridade 9º Ano (ISCED 2) 25%
12º Ano (ISCED 3) 10%
> 12º ano (> ISCED 3) 10%
Tabela 2
Número de inquiridos por local e dimensão média das explorações
de agricultores familiares da região norte e centro de Portugal em 2018
Através de uma análise de clusters, foi possível identificar três tipologias de agricultores
familiares, que se designaram “Convencionais”, “Tradicionais/Naturalistas” e “Modernos”
(36%, 31% e 34% dos inquiridos).
2
Equipamento de Proteção Individual
Cluster 2
Cluster 1 Cluster 3 F (Nível
Variável “Tradicionais/
“Convencionais” “Modernos” de Sig.)
Naturalistas”
Atitudes e Perceções
Atitudes
Correção de pH 0,448a 0,140 b 0,655 c 0,000
Análises de solo/água /foliares 0,603 0,040 b 0,455 a 0,000
Permite a presença de infestantes 0,310 0,380 0,236 0,284
Desfolha e/ou poda de rebentos 0,690 a 0,420 b 0,655 a 0,009
Luta biológica 0,155 ab 0,100 a 0,309 b 0,017
Luta biotécnica 0,224 a
0,040 b
0,418 c
0,000
Luta química 1,000 a 0,780 b 0,909 ab 0,001
Análises de resíduos de pesticidas 0,018 a 0,000 a 0,236 b 0,000
Faz registos escritos 0,414 a
0,180 b
0,564 a
0,000
Uso de Equipamentos de Proteção Individual
EPI - Nenhum 0,069 a 0,380 b 0,000 a 0,000
EPI - Parcial 0,621 a
0,540 a
0,091 b
0,000
EPI - Total 0,310 a 0,080 b 0,909 c 0,000
Perceções
Para os agricultores familiares, os pesticidas são:
Indispensáveis mesmo que tóxicos 0,466 a 0,120 b 0,000 b 0,000
Seguros não fazem mal nenhum 0,069 0,100 0,091 0,840
Nocivos, mas podem-se usar 0,397 a 0,320 a 0,636 b 0,002
Muito nocivos e a evitar 0,069 a
0,460 b
0,273 b
0,000
Conhecimento, prática e confiança dos agricultores familiares face à agricultura biológica (AB)
Acredita e confia na AB 0,000 a 0,200 b 0,036 a 0,000
Atitude neutra face à AB 0,345 a
0,620 b
0,727 b
0,000
Não acredita na AB 0,655 a 0,180b 0,236 b 0,000
Número de Inquiridos 58 50 55
191 // Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
Nota: Método K-means cluster, n=163. Pontuações na mesma linha com sobrescritos diferentes são significativamente
a,bc
Tabela 4
Comparação das características sociodemográficas entre
tipologias de agricultores familiares, do norte e centro de Portugal, em 2018
Cluster 2
Cluster 1 Cluster 3
Características “Tradicionais/ F (Nível de Sig.)
“Convencionais” “Modernos”
Naturalistas”
Sexo
Masculino 86,2a 60,0b 60,0b 0,002
Feminino 13,8 a
40,0 b
40,0 b
0,002
Idade
≤ 40 5,2a 2,0a 25,5b 0,000
192 // Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
40 – 65 44,8 ab
78,0 a
67,3 b
0,001
> 65 50,0ab 20,0a 7,3b 0,000
Educação
Primária (ISCED 0-1) 65,5a 80,0a 20,0b 0,000
Secundária (ISCED 2-4) 29,3 a
12,0 a
61,8 b
0,000
Superior (ISCED 5-6) 5,2 8,0 18,2 0,062
Região
Norte 8,6a 54,0b 81,8c 0,000
Centro 91,4 a
46,0 b
18,2c 0,000
Nota: Pontuações na mesma linha com sobrescritos diferentes são significativamente diferentes quando p<.05 (teste de
a,bc
Referências
Luisa Silva
Faculdade de Ciências da Universidade do Porto
Ana Aguiar
GreenUP & DGAOT, Faculdade de Ciências da Universidade do Porto
as parcelas com maior dimensão foram Lousada e Penafiel (50% das explorações, cada).
Por sua vez, as explorações de menos dimensão estavam concentradas em Penafiel (58%
das explorações).
Em relação à mão de obra, observou-se que, em 51% das explorações, predominava a
componente familiar, com 1 a 2 pessoas a trabalhar a tempo inteiro, para além do próprio
agricultor e que, em 51% das explorações, a mão de obra familiar a tempo parcial não
estava presente. O recurso a mão de obra contratada a tempo inteiro não existia em 93%
das explorações e em 65% das mesmas não se recorria a mão de obra contratada a tempo
parcial (mão de obra eventual). Verificou-se que a distribuição do número de elementos
Luisa Silva
Faculdade de Ciências da Universidade do Porto
Ana Aguiar
GreenUP & DGAOT, Faculdade de Ciências da Universidade do Porto
Cristina Parente
Instituto de Sociologia, Faculdade de Letras da Universidade do Porto
Introdução
das etapas do processo que devem ocorrer à medida que são necessárias; (4) puxar o
fluxo, ou seja, a encomenda do cliente (interno ou externo) é o gatilho para iniciar o
fluxo de valor e da produção - produto certo, no momento certo e na quantidade certa;
(5) perfeição, através da promoção de uma cultura de melhoria contínua, em que cada
pessoa envolvida no fluxo de valor deve identificar e propor melhorias no processo
pelo qual é responsável, de modo a reduzir ou eliminar completamente o desperdício
(Womack e Jones, 2003).
Existem várias ferramentas de implementação do Lean tais como o Mapeamento do
Fluxo de Valor (VSM), que consiste na identificação de todas as atividades que ocorrem
Figura 1. Os 6S’s (The Box Maker, 2016) 201 // Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
A cultura da alface (Lactuca sativa L.) foi selecionada para este trabalho por apresentar
uma forte representatividade da Póvoa de Varzim, na região entre Douro e Minho, como
cultura em estufa no inverno e ao ar livre na primavera-verão.
202 // Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
1
Equipamentos de Proteção Individual
Resultados e discussão
Figura 2. Fluxograma da colheita de alface em estufa: (a) atividades que não agregam valor mas são necessárias, (b)
atividades que agregam valor. As oportunidades de melhoria estão assinaladas com estrelas.
ao longo do tempo; (f ) lavagem superficial (e não profunda) das alfaces, de acordo com o
pedido pelo cliente.
O Lead Time (tempo que um produto ou serviço consome desde o início até ao fim
do seu processamento ou conclusão) da alface em estufa foi de 70 dias e a mão de obra
necessária à realização de todas as operações culturais da plantação de 600 m2 em estufa,
no inverno, foi de 46 horas e 20 m.
De igual modo, elaborou-se um fluxograma da plantação e colheita de alface ao ar
livre, com o objetivo de identificar as atividades que agregam valor, as que não agregam
mas são necessárias e as que não agregam valor (Figura 3).
Considerações finais
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207 // Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
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Cláudia Chaves
Politécnico de Viseu, CI&DETS
Doutoranda Ciências de Enfermagem, ICBAS, SIGMA Phi Xi Chapter
Fábio Gomes
Estrutura Residencial para Idosos da Casa do Povo de Leomil, Moimenta da Beira
Emília Coutinho
Politécnico de Viseu, UICISA:E, SIGMA Phi Xi Chapter, CI&DETS
Paula Nelas
Politécnico de Viseu, UICISA:E, CI&DETS
para a produção doméstica como para a venda (SafeWorK, 2000; Trauger, 2004; Doss, 2014;
Mahendran, 2019). Muitas das mulheres trabalhadoras na agricultura estão na agricultura
de subsistência, por conta própria ou como membros da família não remunerados (Trauger,
2004; Ferreira, 2016), estando a baixa escolaridade associada a trabalhos manuais ou à agri-
cultura familiar (Machado, 2019). As mulheres continuam a assumir, além de um trabalho re-
munerado, a principal responsabilidade por tarefas domésticas como a limpeza da habitação,
a aquisição e confeção dos alimentos, o cuidar das crianças, dos doentes e idosos (SafeWorK,
2000; WHO, 2010; Perista et al., 2016). Assumem não só o papel de produtoras como o
de comerciantes dos alimentos nos mercados locais (Trauger, 2004; Ferreira, 2016).
39,7% do género feminino, enquanto 32,7% têm idade compreendida entre os 51-60 anos,
sendo esta a faixa etária onde se regista o valor percentual de 29,9% de homens e 35,6%
de mulheres. Constata-se ainda que 28,0% dos participantes possuem idade ≥ 61 anos,
dos quais 31,2% são homens e 24,7% mulheres.
Quanto à existência de uma relação com companheiro, verifica-se um claro predomí-
nio de participantes com companheira/o (84,7%), sendo este o estado civil de 92,2% dos
homens e de 76,7% das mulheres. A diferença encontrada entre o género e o estado civil
dos participantes é bastante significativa (X²=6,931; p=0,008), com diferença nas mulheres
que não têm companheiro e nos homens que têm companheira.
são mulheres. No que respeita à doença oftalmológica 14,7% referiram que na família estas
doenças estão presentes, fazendo parte deste grupo 11,7% participantes do sexo masculino
e 17,8% do sexo feminino. Verificou-se que 10,0% referiu que as doenças dos ouvidos estão
presentes no agregado familiar, com 5,2% participantes do sexo masculino e 15,1% partici-
pantes do sexo feminino. No que se refere à saúde individual dos agricultores, de acordo com
o apurado em relação às doenças osteoarticulares crónicas, 38,7% referem que as doenças os-
teoarticulares são uma realidade, correspondendo a 29,9% de agricultores do sexo masculino
e 47,9% de agricultores do sexo feminino. Relativamente à presença de enxaquecas, 21,3%
dos agricultores afirmam sofrer deste problema de saúde sendo 18,2% do sexo masculino e
embora não existam dúvidas que o primeiro passo será a consciencialização individual/
/coletiva quanto à adoção de práticas seguras.
A enfermagem comunitária deve contribuir através da sua experiência profissional e
intervenção com o individuo, família e comunidade para uma interação e integração da
atual geração de agricultores com mais saúde e qualidade de vida. O cumprimento dos
deveres em enfermagem comunitária obriga a um conhecimento real dos determinantes
em saúde em todos os grupos da comunidade com uma visão de cooperação entre todos
os profissionais através de processos de influência social, mobilizadores de sinergias entre
instituições comunitárias, com vista à satisfação das necessidades em saúde de todos.
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214 // Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
Cláudia Chaves
Politécnico de Viseu, CI&DETS
Doutoranda Ciências de Enfermagem, Instituto Ciências Biomédicas Abel
Salazar, SIGMA Phi Xi Chapter
Fábio Gomes
Estrutura Residencial para Idosos da Casa do Povo de Leomil, Moimenta da Beira
Emília Coutinho
Politécnico de Viseu, UICISA:E, SIGMA Phi Xi Chapter, CI&DETS
Rui Dionísio
Unidade de Saúde Pública, ACES Dão Lafões
Politécnico de Viseu, SIGMA Phi Xi Chapter
Portugal é dos países com maior diversidade geodemográfica e agrícola. Abordar práti-
cas agrícolas numa perspetiva salutogénica remete-nos para o indivíduo e os seus contextos.
Considerar o agricultor como pertencendo a um dos grupos profissionais que maiores
215 // Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
adversidades enfrentam no âmbito da sua atividade laboral será excessivo? Talvez não!
Revendo estudos anteriores sobre esta atividade profissional, os mesmos permitem averi-
guar a evolução e o impacte na saúde dos agricultores sendo que sobressaem os acidentes
de trabalho mortais (McNamara et al., 2018), ou incapacitantes, como é o caso, das am-
putações (Reed, 2004), as doenças ocupacionais (Santos & Almeida, 2016; McNamara
et al., 2018), como os problemas respiratórios, cancro da pele pela exposição às radiações
ultravioletas (Hérnandez et al., 2008; Bauer et al., 2011; Cezar-Vaz, 2015; Smit-Kroner e
Brumby, 2015). Nas explorações de pequena e média dimensão, o agricultor tem uma inter-
venção constante e esta permanente laboração, em termos de avaliação dos riscos, conduz a
únicas presentes neste grupo. Num estudo realizado por Gerrard (1998), os agricultores
inquiridos manifestaram que o sistema de prestação de cuidados de saúde era inadequado
e que as suas necessidades de saúde e segurança ocupacionais não estavam asseguradas.
A agricultura apresenta um risco de acidentes mortais seis vezes superior, quando com-
parada com a generalidade das indústrias, sendo que cerca de 100 crianças morrem anual-
mente nos EUA por acidentes em explorações agrícolas. Destaca-se principalmente o uso
de tratores e, secundariamente, situações relacionadas com animais e quedas (Hartling et
al., 2004; Farquhar et al., 2008). São vários os fatores associados a um risco de maior toxi-
cidade, nomeadamente, ausência de Equipamentos de Proteção Individual (EPI), baixo
ganhos em saúde que o mesmo Plano descreve, através do alinhamento de objetivos comuns,
integração de esforços de todos os setores da sociedade, assim como das abordagens Whole-
of-society e Whole-of-government. Nesta perspetiva, na elaboração dos Planos Locais de
Saúde dos Agrupamentos de Centros de Saúde, em alinhamento com o Plano Nacional e
Regional de Saúde, deveriam ser delineadas estratégias de proximidade através das Unidades
de Cuidados na Comunidade, com os agricultores da sua área geográfica (concelho) de modo
a que se efetuasse um diagnóstico de saúde deste grupo profissional e assim se pudesse
promover literacia em saúde com vista à capacitação da pessoa/família/comunidade para a
adoção de comportamentos saudáveis e autogestão da situação de saúde.
a população para esta vacinação alertando que esta é uma vacina que faz parte do programa
nacional de vacinação, que deverá ser administrada, aos 10, 25, 45, 65 anos de idade e, poste-
riormente, de 10 em 10 anos e que só está protegido quem tem a vacina em dia, na medida em
que esta é uma vacina que não dá a chamada imunidade de grupo (WHO, 2001; DGS, 2014).
Apresentar a visão dos agricultores e eventuais relações entre saúde e agricultura, é
um dos objetivos ao participar ativamente no projeto “Pontes entre a agricultura familiar
e biológica – impacte na saúde”, nomeadamente na componente da Agricultura familiar
e desenvolvimento rural: economia, sociologia e ambiente. Contribuir para a sensibili-
zação dos profissionais de saúde, em especial, enfermeiros, para áreas fundamentais de
ACT (2015). Guia de segurança e saúde no trabalho para o setor Agro-florestal. Autoridade para as
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220 // Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
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Cristina Parente
Instituto de Sociologia, Faculdade de Letras da Universidade do Porto
Joana Neto
Faculdade de Ciências da Universidade do Porto
Ana Aguiar
GreenUP & DGAOT, Faculdade de Ciências da Universidade do Porto
Telmo Costa
Politécnico de Viseu
Raquel Guiné
Daniela Costa
Helena Esteves Correia
Paula Correia
Cristina Amaro da Costa
Politécnico de Viseu, CERNAS, CI&DETS
Cláudia Chaves
Politécnico de Viseu, CI&DETS
Doutoranda Ciências de Enfermagem, Instituto Ciências Biomédicas Abel
Salazar, SIGMA Phi Xi Chapter
coesão territorial
Introdução
Cumpre-se neste capítulo uma das propostas apresentadas no âmbito do projeto “Pontes
Biológica
sustentável,
entre agricultura familiar e agricultura biológica”: uma proposta de recomendações dirigida aos
diferentes atores envolvidos, sejam decisores de políticas públicas europeias e nacionais, regio-
e Agricultura
nais e locais, sejam a organizações representativas dos diversos interesses em causa, como coope-
Familiar turismo
1
Para um maior desenvolvimento da metodologia dos grupos focais, consultar cap. 4.2 – Adesão e resistência
a práticas de agricultura biológica entre agricultores familiares: uma abordagem a partir de grupos focais
Tabela 1
Recomendações construídas e respetiva votação
forma aleatória, sendo dotados de uma elevada heterogeneidade com participantes de dife-
rentes contextos socioeconómicos e tipos de conhecimentos e entendimento distintos face aos
temas discutidos. A discussão foi rica pela grande diversidade de intervenções, não obstante a
aleatoriedade da constituição dos grupos possa ter causado alguma dificuldade interativa e as
dinâmicas de discussão terem sido bastante variadas entre grupos. Apesar disso, os grupos de
discussão foram bastante concordantes quanto às categorias de medidas de operacionalização
a que deram maior relevância. Saliente-se, desde já, a ausência de variações territoriais das pro-
postas de implementação discutidas, não havendo diferenciações significativas entre a região
norte da Área Metropolitana do Porto (Vairão) e a região centro (Guarda e Viseu).
Figura 1. Pontuação total atribuída a cada recomendação no conjunto dos três seminários,
em resultado da votação de 125 participantes (R.1 a R.15).
Decreto-Lei nº 64/2018, de 07 de agosto de 2018, Diário da República nº 151/2018 – Estatuto agricultura familiar.
2
Após uma análise das práticas de operacionalização definidas para cada recomendação
ao longo dos três seminários, é possível verificar que a medida “Promoção e facilitação do
processo de venda com ações de marketing orientadas para a valorização consumo local”
(medida C) foi a mais votada pelos participantes. Seguidamente a “Formação e apoio téc-
nico” (medida A) e as “Plataformas de colaboração entre entidades públicas, associações
de produtores e agricultores familiares” (medida D) são a segunda e terceira medidas que
reuniram mais consenso, respetivamente (Figura 2).
Estes resultados são indicativos das áreas de intervenção que os participantes con-
231 // Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica
Numa segunda análise mais detalhada dos grupos de discussão, é também possível com-
preender que as recomendações que motivaram a sugestão de maior quantidade e diversidade
de medidas de operacionalização, e quais as medidas com maior transversalidade. A partir da
observação da Figura 4 é possível afirmar que as discussões das recomendações mais votadas,
a “Criação de um serviço de apoio específico a agricultores e associações com agricultores
familiares” (R.1) e a “Criação de grupos de proximidade entres produtores e consumidores
com garantia de compra e venda” (R.5) geraram um maior número de medidas de operacio-
nalização, e apresentam elevada diversidade nas categorias referidas, novamente com elevada
O processo de construção das recomendações releva alguns aspetos que interessa destacar
a título conclusivo: a ausência de diferenças regionais no que diz respeito a recomendações
e medidas de operacionalização revelam que a agricultura familiar ainda não tem o estatuto
de maioridade garantido no nosso país, pelo que, antes da criação de medidas territoriais
adequadas às especificidades, é necessário reconhecer a categoria de agricultores fami-
liares como tal nas suas idiossincrasias e a sua importância económica e social no
desenvolvimento territorial. Assim, as medidas de espectro amplo e de reconhecimento
macro revelam-se da maior urgência no discurso dos participantes e com um carater de
anterioridade face às especificidades regionais. A própria atualidade e o surgimento recente
do estatuto de agricultor familiar são uma novidade, ainda não integrada como uma vantagem
comparativa para os participantes que não reveem no estatuto do agricultor familiar me-
didas de discriminação adequadas às especificidades das pessoas, explorações e práticas
da agricultura familiar. As discussões tendem assim a ficar circunscritas ao contexto de
reconhecimento da própria agricultura familiar, não favorecendo a reflexão sobre medidas
concretas de operacionalização.
Referências
Brown J, Isaacs D (2008). The world café: awakening collective intelligence and committed action.
In: Torvey M, Collective intelligence: creating a prosperous world at peace. Earth Intelligence
Network, Virginia.
234 // Pontes entre Agricultura Familiar e Agricultura Biológica