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MUNDO JURÍDICO

artigo de Paulo Marcos Schmitt e Luiz Antonio Grisard

O ESTATUTO DO TORCEDOR E SEUS REFLEXOS NAS FINANÇAS PÚBLICAS À


LUZ DA LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL

Paulo Marcos Schmitt


advogado pós-graduado em Responsabilidade Fiscal Pela UNIBRASIL, consultor da Zênite
Consultoria, professor do curso de pós-graduação em Direito Desportivo da Faculdade de Direito de São
Bernardo do Campo, Presidente da Comissão Especial de Justiça Desportiva do Governo do Paraná, debatedor
no fórum esportivo virtual CevLeis, membro do IBDD e conta com inúmeras publicações na área.

Luiz Antonio Grisard


advogado, aluno dos cursos de Especialização em Administração Esportiva pela Universidade do
Esporte e Direito do Teabalho pelas Faculdades Integradas Curitiba, Procurador do Tribunal de Justiça
Desportiva da Federação Paranaense de Futebol, Auditor da Federação Paranaense de Futsal, debatedor no
fórum esportivo virtual CevLeis e membro do IBDD.

O desporto nacional passou por uma de suas maiores transformações estruturais já


noticiada com a publicação das Leis 10.671 e 10.672, ambas de 15 de Maio de 2003. Sem
dúvida, a maior alteração normativa desde o advento da Lei n.º 9.615/98 e que dá
continuidade ao processo de sistemática atualização dos diplomas que têm o esporte como
foco principal.

Inspirada no Código de Defesa do Consumidor (Lei n.º 8.078/90), a Lei n.º 10.671
introduziu, de forma inédita, regramento normativo que trata da proteção e defesa do torcedor
de eventos esportivos, assim considerado, por força do artigo 2o, como toda pessoa que
aprecie, apóie ou se associe a qualquer entidade de prática desportiva do País e acompanhe
a prática de determinada modalidade desportiva.

Logo após a publicação da referida Lei, observou-se intenso e acalorado debate


acerca da aplicabilidade dos dispositivos ali insertos. Os holofotes, no entanto, foram
direcionados quase que exclusivamente para a polêmica responsabilização das entidades de
prática desportiva e de seus dirigentes pela segurança dos torcedores, culminando, inclusive,
com ameaça de paralisação do campeonato brasileiro de futebol.

Diversos outros temas, tais como a auto-aplicabilidade do Estatuto, seu alcance


quanto às modalidades não consideradas “profissionais” e a obrigatoriedade de publicidade às
decisões dos Tribunais de Justiça Desportiva, passaram ao largo dos debates.

Da mesma forma, quedaram-se silentes os analistas de plantão em relação ao tema


que ora se propõe. Diante deste cenário, o presente arrazoado tem o objetivo de destacar os
reflexos da adoção das imposições do Estatuto do Torcedor nas finanças públicas.

Antes de passarmos ao estudo da temática que ora se apresenta de forma mais


minuciosa, mister se faz esclarecer, sem entrar no mérito da questão, que a análise do impacto
orçamentário dos dispositivos do Estatuto do Torcedor terá como pano de fundo os estádios
de futebol, ainda que subsista a polêmica acerca do referido diploma a todas as competições
esportivas profissionais, assim entendidas como aquelas promovidas para obtenção de renda e
disputada por atletas cuja remuneração decorra de contrato de trabalho (parágrafo único do
artigo 26 da Lei n.º 10.672/2003).

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É incontroverso que a grande maioria das facilidades nas quais se realizam


competições esportivas futebolísticas são de propriedade do Poder Público, ou seja, de
Estados e Municípios.

Exsurgem, daí, três questionamentos: a) se o legislador previu, com antecedência,


o impacto financeiro a ser suportado pelo Poder Público para que sejam atendidas todas as
exigências do Estatuto; b) se as ações referentes às adaptações das praças esportivas devem
atender aos preceitos da Lei n.º 8.666/93 e c) se quanto às questões financeiras e
orçamentárias devem ser observados os princípios da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei
Complementar n.º 104/2001).

Das adaptações exigidas pelo novo regramento, destacam-se aquelas insertas nos
artigos 18 e 22, II.

O artigo 18 da Lei n.º 10.671/200 prescreve que “os estádios com capacidade
superior a vinte mil pessoas deverão manter central técnica de informações, com infra-
estrutura suficiente para viabilizar o monitoramento por imagem do público presente”.

Por sua vez, o artigo 22, II dita que ser direito do torcedor partícipe “ocupar o
local correspondente ao número constante do ingresso”.

Ainda que o Estatuto tenha estabelecido uma vacatio legis de 6 meses para que os
estádios cumpram tais determinações, pela inteligência do artigo 44, cabe analisarmos quais
os reflexos da adoção destas medidas para o Poder Público.

Passemos, pois, para os questionamentos anteriormente listados, bipartindo o


estudo entre a análise do princípio da licitação e a observância da Lei de Responsabilidade
Fiscal quanto aos recursos financeiros despendidos.

- O Estatuto do Torcedor e o princípio da licitação

De acordo com o disposto na Lei n.º 8.666/93, que regulamenta o art. 37, inciso
XXI, da Carta Federal e institui normas para licitações e contratos da Administração Pública,
à exceção das hipóteses de dispensa e inexigibilidade previstas nos artigos 24 e 25, o princípio
da licitação se impõe para todos os outros contratos, aí incluídos aqueles que futuramente
venham a ser celebrados para possibilitar as reformas nos Estádios de propriedade do Poder
Público.

Observe-se, neste caso, o § 2º e incisos do artigo 7º da Lei 8.666/93:

“§ 2º. As obras e os serviços somente poderão ser licitados quando:

I - houver projeto básico aprovado pela autoridade competente e disponível para


exame dos interessados em participar do processo licitatório;

II - existir orçamento detalhado em planilhas que expressem a composição de


todos os seus custos unitários;

III - houver previsão de recursos orçamentários que assegurem o pagamento das


obrigações decorrentes de obras ou serviços a serem executadas no exercício
financeiro em curso, de acordo com o respectivo cronograma;

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IV - o produto dela esperado estiver contemplado nas metas estabelecidas no


Plano Plurianual de que trata o art. 165 da Constituição Federal, quando for o
caso”.

Sobre a matéria, aduz com propriedade Airton Rocha Nóbrega 1:

“III. O PLANEJAMENTO DE OBRAS E SERVIÇOS.

A individuação do objeto há de ser feita em conformidade com a natureza do que


se pretende contratar. Visando a disciplinar esse particular aspecto da fase interna
da licitação, a Lei nº 8.666/93 trata de forma diferente, embora com os mesmos
objetivos, as situações alusivas a obras e serviços (art. 7º) e aquelas respeitantes às
compras (arts. 14 e 15). Em se tratando de obras e serviços, especialmente na área
de engenharia, ver-se-á a Administração compelida a providenciar a elaboração de
projeto básico, o qual será posteriormente consolidado em projeto executivo. Tais
projetos terão que reunir os requisitos postos no art. 6º, incisos IX e X, da LLC,
detalhando, assim, o que se pretende executar. Orienta a Lei no sentido da
padronização de projetos (art. 11), quando possível e conveniente, assim como
fixa requisitos que deverão ser considerados tendo em vista especialmente a sua
racionalidade (art. 12).

Mas não basta cumprir-se essa etapa alusiva à elaboração de projetos. Há


necessidade, ainda, de se buscar estimar o custo das obras e serviços, o que se fará
por intermédio de orçamento detalhado, expressando a composição de todos os
custos unitários (art. 7º, § 2º, II). Esse levantamento prévio - que servirá como
parâmetro para a quantificação dos custos estimados da contratação - deverá ser
realizado de forma responsável, por intermédio de adequada coleta de preços e
previsão de custos. É atividade que será cometida a pessoa dotada de competência
e de conhecimentos para tanto, a ela não se admitindo jamais atuar de forma
descompromissada e aleatória, baseada, às vezes, em favores de eventuais futuros
participantes do certame que em breve será instaurado.

Obtido o custo estimado da contratação, a etapa seguinte será a de verificar a


existência de previsão para a realização da despesa, mediante inclusão feita nas
leis orçamentárias. Quanto a esse aspecto específico, é necessário ter em mente
que é vedado o início de projeto não incluído na lei orçamentária anual, assim
como a realização de despesas ou a assunção de obrigações diretas que excedam
os créditos orçamentários ou adicionais (CF, art. 167, I e II). Não são admitidos,
outrossim, investimentos cuja execução ultrapasse um exercício financeiro sem
prévia inclusão no plano plurianual, ou sem lei que autorize a sua inclusão, pena
de ver-se o responsável incurso em crime de responsabilidade (CF, art. 167, § 1º).

Necessário fazer-se o registro de que nem todas as exigências contidas na Lei se


mostram compatíveis com serviços alheios à área de engenharia, devendo a
Administração, em tais casos, efetuar as necessárias adequações. Exemplo disso é
a exigência alusiva a projetos básico e executivo, impossível de obter-se, com o

1
O Planejamento da Licitação. Informativo de Licitações e Contratos – ILC, Zênite, Seção
Doutrina/Parecer, Dezembro, 1998.

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grau de detalhamento e conteúdo estabelecidos, quando se tratar de serviços


comuns. Cuidado que se deve ter, em relação a estes, é o de definir
adequadamente o objeto, detalhando-o em memoriais. A intenção da Lei é a de
evitar a instauração da licitação e a posterior contratação de algo que, por ausência
de definição prévia, não se preste a atender às necessidades da Administração.”

No mesmo sentido, cabe transcrever algumas conclusões veiculadas em


orientação objetiva publicadas no Informativo de Licitações e Contratos de Julho de 1997,
senão vejamos:

“- Obras e serviços de engenharia são as atividades desenvolvidas exclusivamente


pelos profissionais de Engenharia, Arquitetura e Agronomia, ou seja, aquelas
atividades que somente poderão ser desenvolvidas e ou executadas mediante o
acompanhamento dos profissionais das áreas. A Lei n° 8.666/93, em seu art. 6°,
conceitua obra como toda construção, reforma, fabricação, recuperação ou
ampliação realizada por execução direta ou indireta.

- As atividades e atribuições dos profissionais da engenharia vêm descritas no art.


7° da Lei n° 5.194/66 e na Resolução n° 218/75 - CONFEA.

- O registro na entidade profissional competente é condição indispensável para o


exercício legal da profissão de engenheiro, arquiteto ou engenheiro agrônomo.

- A finalidade da ART é definir os responsáveis pela obra ou serviço de


engenharia.

- A partir de 1987, os CREAs adotaram modelo-padrão da ART.

- A demonstração de qualificação técnica dos licitantes será realizada através da


comprovação da aptidão técnico-operacional e técnico-profissional do licitante.

- A qualificação técnico-operacional refere-se à comprovação de aptidão da


empresa como pessoa jurídica tecnicamente qualificada para a execução do objeto
a ser contratado. Já a comprovação da capacidade técnico-profissional diz respeito
ao profissional que a empresa tenha em seus quadros, à pessoa física, que já tenha
sido o responsável técnico pela execução de objeto similar ao licitado.

- A comprovação técnico-operacional deverá ser feita nos termos do inciso II do


art. 30. Já a comprovação técnico-profissional deverá ser auferida conforme a
determinação do inciso I do § 1° do art. 30, vedadas neste caso as exigências de
quantidades mínimas ou prazos máximos.”

Superada a questão que envolve a necessidade de realização de procedimento


licitatório por ocasião da reforma de estádios patrimoniados pelo Poder Público e tendo em
vista que a gestão do futebol encerra exploração de atividade econômica, o que demonstra, de
forma inolvidável, sua natureza de desporto profissional, devemos passar a considerar o
interesse público na realização de tais obras à finalidade suscitada. Estará presente o requisito
da motivação suficiente ao ensejo de tais adaptações ao Estatuto do Torcedor para a
realização de partidas válidas por competições promovidas por particulares?

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Nesse particular aspecto, é preciso enfrentar o tema também sob o aspecto da


aplicação de recursos públicos em estádios pertencentes aos clubes de futebol. Para tanto,
compulsamos parecer do Ministério Público junto ao TCU (Proc. TC-011.194/90-1 - Tomada
de Contas Especial - Recurso de Revisão), in verbis: “A propósito, em que pese o alegado
interesse da população local pelo destaque estadual alcançado pelo clube de futebol do Novo
Horizonte, tal argumento, por si só, não tem o condão de regularizar o ato praticado, uma vez
que recursos federais foram empregados em desacordo com o objeto do convênio e em
proveito de associação.”

- O Estatuto do Torcedor e a Lei de Responsabilidade Fiscal

Inicialmente, destaca-se que as regras a serem observadas em relação às despesas


públicas tornaram-se mais rígidas com o advento da Lei de Responsabilidade Fiscal, que
estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal. Tais
normas visam garantir o equilíbrio das contas públicas, mediante o cumprimento de metas de
resultados entre receitas e despesas e obediência aos limites e condições relativos a renúncia
de receita, despesas com pessoal, dívida pública, operações de crédito, concessão de garantia
e inscrição de restos a pagar.

É consabido que, regra geral, na Lei de Diretrizes Orçamentárias, estão


compreendidas: (i) prioridades e metas da administração pública para o exercício a que se
referem; (ii) estrutura e organização dos orçamentos anuais; (iii) diretrizes para elaboração,
execução e alteração dos orçamentos; (iv) disposições relativas às despesas com pessoal e
encargos sociais, dívida pública, política de aplicação dos recursos das agências financeiras
oficiais de fomento; (v) disposições sobre alterações na legislação tributária e disposições
gerais.

E, nos termos do art. 4.º, § 1.º da LRF, deverá integrar o projeto de Lei de
Diretrizes Orçamentárias o Anexo de Metas Fiscais, no qual serão estabelecidas metas anuais
em valores correntes e constantes relativas a receitas, despesas, resultados nominal e primário,
e montante da dívida, para o exercício a que se referirem e para os dois subsequentes. O
conteúdo do referido Anexo, está disposto no § 2o do mesmo diploma legal, cabendo destacar
o “demonstrativo das metas anuais, instruído com memória e metodologia de cálculo que
justifiquem os resultados pretendidos, comparando-as com as fixadas nos três exercícios
anteriores, e evidenciando a consistência delas com as premissas e os objetivos da política
econômica nacional.”

Assim, o detalhamento de cada uma das prioridades e metas de governo deve


conter informações que possibilitem a realização ou implementação de programas e ações,
bem como a definição de responsabilidade e consolidação destas no orçamento anual.

Ressalta-se o estabelecido na LRF quanto a investimentos (despesas com o


planejamento e a execução de obras):

“Art.5o ...

(...)

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§ 5o A lei orçamentária não consignará dotação para investimento com duração


superior a um exercício financeiro que não esteja previsto no plano plurianual ou
em lei que autorize a sua inclusão, conforme disposto no art.167 da Constituição.”

Ainda, com relação à execução de obras:

“Art. 16. A criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental que


acarrete aumento da despesa será acompanhado de:

I – estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que entrar em


vigor e nos dois subsequentes;

II – declaração do ordenador da despesa de que o aumento tem adequação


orçamentária e financeira com a lei orçamentária anual e compatibilidade com o
plano plurianual e lei de diretrizes orçamentárias:

(..)

§ 4o As normas do caput constituem condição prévia para:

I – empenho e licitação de serviços, fornecimento de bens ou execução de


obras;”

Da análise dos argumentos expedidos anteriormente, verificamos a importância


das premissas de planejamento integrado e o estabelecimento de ordem de precedência,
determinando que a inclusão de novos projetos na lei orçamentária apenas se dará quando
estiverem contempladas as despesas tidas como prioritárias (art. 8º da Lei nº 8666/93 e art. 45
da LRF).

Como se vê, quanto aos impactos das adaptações na finanças do Poder Público,
devemos considerar as regras da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar n.º
101/2000), especialmente no tocante a novas ações governamentais que acarretam aumento de
despesa pública, nos termos dos artigos 16 e 17 do referido diploma, sob pena de que a
geração de despesas realizada em inobservância ao comando destes artigo serem
consideradas não autorizadas, irregulares e lesivas ao patrimônio público.

Destarte, hão que ser observadas, principalmente, as normas de preservação do


patrimônio público que estabelecem que novos projetos somente poderão ser incluídos no
planejamento orçamentário após adequadamente atendidos os em andamento nos termos em
que dispuser a Lei de Diretrizes Orçamentárias (art. 45 – problema das obras inacabadas).

A confusão é tão grande que envolve também a priorização no dispêndio e


recursos públicos ao atendimento das necessidades sociais, que, certamente, não são focos do
Estatuto do Torcedor.

Inquestionável, pois, que o Estatuto do Torcedor, neste âmbito, traz exigências em


prazo pouco razoável de forma a desconsiderar as premissas de contratação pública e
planejamento orçamentário e financeiro, não apontando soluções viáveis de implantação.

Finalmente, não podemos nos furtar de fazer menção à falta de auto-aplicabilidade


do Estatuto do Torcedor, que ainda depende de adequada regulamentação, principalmente em

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face dos tópicos aqui mencionados, de forma a responsabilidade imposta por Lei à
Administração Pública venha a ser transferida para os contribuintes.

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