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Resumo: A investigação das possíveis relações entre dois eixos temáticos: educação de jovens e
adultos (EJA) e economia solidária é o que direciona o meu trabalho de Dissertação de Mestrado em
Educação, na tentativa de refletir sobre o papel da EJA na formação para a geração de trabalho e
renda. Este artigo, portanto, explora um recorte desta pesquisa descrevendo a sua constituição e a
atenção para as questões da crescente produção do desemprego e das práticas pedagógicas da EJA que
podem estar fundamentando um novo vínculo entre a educação e o trabalho numa perspectiva mais
conscientizadora e humana.
Palavras-chave: educação de jovens e adultos; economia solidária; desemprego.
INTRODUÇÃO
Este artigo aborda algumas questões que tenho investigado em minha Dissertação de
Mestrado em Educação com a tentativa de refletir sobre as possíveis aproximações entre dois
eixos investigativos: a educação de jovens e adultos e a economia solidária. Para situar o
leitor, descreverei, brevemente, o estudo que venho investigando. O trabalho busca
compreender o papel da educação de jovens e adultos na formação em economia solidária,
uma formação para uma alternativa de geração de trabalho e renda. A investigação, em
andamento, procura analisar as práticas pedagógicas que evidenciam um novo vínculo entre a
educação e o trabalho, de forma a promover uma educação mais humana e comprometida com
uma prática emancipatória e com um projeto democrático de sociedade. Neste sentido, a
pesquisa aborda também a questão do desemprego estrutural que tem levado setores populares
a resistir e a desenvolver formas alternativas de geração de trabalho e renda.
A investigação tem se desenvolvido através de observações e entrevistas semi-
estruturadas em uma escola municipal de educação de jovens e adultos de uma cidade
integrante da região metropolitana de Porto Alegre que incorpora no currículo a geração de
trabalho e renda. O estudo desta experiência em questão merece atenção pela possibilidade de
construção de um novo vínculo entre a educação e o trabalho, de conceber o trabalho como
princípio educativo capaz de resgatar a dignidade do sujeito e a educação de jovens e adultos
como possibilidade de conexão destes dois eixos. Uma situação que pode estar ao mesmo
tempo contribuindo para a diminuição do desemprego e da desvalorização do trabalhador e
criando possibilidade de construir as relações sociais pautadas no respeito, igualdade,
solidariedade e democratização. Bases estas que caminham no sentido de desenvolver um
projeto popular, uma sociedade diferente. Uma vinculação que parece ultrapassar os limites
teóricos da EJA como modalidade escolar que contempla uma dívida social com os sujeitos
que não tiveram acesso à educação na idade própria, apresentando um caminho que se articula
na tentativa da inclusão social, econômica e cultural.
Especificamente, neste artigo, desenvolvo uma breve análise dos eixos investigativos
que orientam esse estudo em andamento e faço um exercício de reflexão sobre a aproximação
entre a EJA e a economia solidária.
[...] a educação popular [...] ganha corpo num debate que dessacraliza os saberes
ditos acadêmicos, buscando ressignificá-los à luz dos saberes da vida cotidiana.
Saberes de homens e mulheres que, à margem dos saberes formais, organizam e
vivem a vida ensinando os seus filhos e netos, enfrentando as adversidades,
produzindo culturas e afirmando identidades carregadas de tradição e criação
(MOLL, 2004, p. 6).
Uma educação progressista em EJA, que valorize o humano em sua pluralidade, nos
seus saberes de vida e preocupação com o coletivo do qual este educando faz parte aponta
para um trabalho configurado sob a ótica da emancipação, da compreensão da educação como
ato permanente, dialógico, e da valorização do sujeito como ser social. Estas bases
contemplam uma opção, um entendimento de que a educação pode estar a serviço de um
outro mundo possível, assim como esta é uma luta da economia solidária.
Logo, esta educação voltada para a formação integral do sujeito, que valoriza a palavra
dos educandos e o trabalho solidário, aponta para a perspectiva de dialogar com a hipótese de
que “[...] todo o ato educativo tem uma intencionalidade política que vai além do aprendizado
de aspectos pontuais e tem como horizonte uma opção política por um protótipo de ser
humano” (ARROYO, 1999, p. 29).
Quando se pensa nestas ações progressistas que embasam o desenvolvimento
educacional na EJA percebe-se que muitas delas se guiam por aquilo que Oliveira (2003)
descreve como fundamental: a escola como espaço, por excelência, da aprendizagem da
cidadania e não somente do que está legitimado como saber pela classe dominante. A intenção
de auxiliar na constituição da cidadania, do trabalho coletivo, da transformação da realidade,
da conscientização, demonstra o direcionamento ideológico e político desta forma de ensino.
Portanto, a aproximação entre os eixos investigativos: educação de jovens e adultos e
uma alternativa de geração de trabalho e renda reflete-se como possível e capaz de construir
novas bases para a educação. Essa aproximação é um caminho para a transformação, ou seja,
uma nova possibilidade de se formar uma relação entre a educação e o trabalho,
fundamentando a economia e as relações sociais como trajeto possível para a construção do
conhecimento e a superação do trabalho como mercadoria precarizada. E essa relação se
traduz como um movimento que colabora na formação humana do sujeito, pois uma educação
que procura desenvolver a autonomia intelectual, moral e social é uma educação
comprometida com uma prática emancipatória e com um projeto democrático de sociedade.
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