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Representações de grupos

Ednei Ap. Santulo Jr.

27 de Novembro de 2018
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Capítulo 1

Ações de grupos

Este capítulo serve essencialmente como uma espécie de motivação ou introdução do


assunto principal desse livro, que são as representações de grupos, mas não é essen-
cial para o restante dos conteúdos. Aqui pode ser entendido porque as representações
são aplicações (homomorfismos na verdade) de um grupo G no grupo de automor-
fismos de um espaço vetorial. Além disso, posteriormente, utilizaremos o conteúdo
desse capítulo para introduzir a representação permutação.
Aqui introduzimos a ação de um grupo sobre um conjunto X , definindo os con-
ceitos básicos envolvidos a fim de obter a equação das órbitas. Nos exercícios desse
capítulo aparece uma bela aplicação dessa equação na demonstração do Teorema de
Cauchy.
Ao longo de todo o livro, utilizaremos notação multiplicativa para os grupos, de-
notando portanto o elemento neutro de um grupo G por 1G ou simplesmente por 1
quando não houver risco de ambiguidade.

Definição 1.1. Sejam G um grupo e X um conjunto não vazio. Uma ação à esquerda
do grupo G sobre o conjunto X é uma aplicação ϕ : G × X → X que satisfaz as seguin-
tes propriedades

(i) Para todo x ∈ X temos ϕ(1, x) = x;

(ii) Para quaisquer g , h ∈ G e qualquer x ∈ X , temos ϕ(g h, x) = ϕ(g , ϕ(h, x)).

Para simplificar a notação, passamos a denotar a ação ϕ(g , x) de g ∈ G sobre x ∈ X


simplesmente por g ∗ x. Usando essa notação, as condições (i) e (ii) tornam-se as
condições (i’) e (ii’) a seguir.

(i’) 1 ∗ x = x, para todo x ∈ X ;

(ii’) (g h) ∗ x = g ∗ (h ∗ x), para quaisquer g , h ∈ G e x ∈ X .

Analogamente podemos definir ação à direita impondo x ∗ 1 = x e x ∗ (g h) =


(x ∗g )∗h. Tudo o que é feito para ações à esquerda pode ser demonstrado de maneira

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análoga para ações à direita e, por uma questão de preferência por trabalhar com ho-
momorfismos no lugar da anti-homomorfismos, optamos por nos restringir a ações
à esquerda.
É praticamente obrigatório após se fazer uma definição apresentar exemplos, en-
tão ei-los a seguir. Fica como exercício para o leitor checar que as condições necessá-
rias são satisfeitas.

Exemplo 1.2. A ação mais simples que existe de um grupo G qualquer sobre um con-
junto X qualquer é a dada por g ∗ x = x para todo g ∈ G e todo x ∈ X . Tal ação é
chamada de ação trivial.

Exemplo 1.3. O grupo Z (com a adição usual) age sobre R por n ∗ x = n + x.

Exemplo 1.4. O grupo simétrico S n age naturalmente sobre um conjunto de n ele-


mentos indexados {x 1 , x 2 , . . . , x n } por σ ∗ x i = x σ(i ) , para todo σ ∈ S n e todo i entre 1 e
n.

Exemplo 1.5. Um grupo G age naturalmente à esquerda sobre o conjunto X subja-


cente a si mesmo pela translação à esquerda, isto é g ∗ x = g x; e à direita pela transla-
ção à direita, isto é, x ∗ g = xg .

Exemplo 1.6. Um grupo G também pode agir à esquerda sobre o conjunto subjacente
a si pela conjugação, isto é, g ∗ x = g xg −1 .

Dado um grupo G agindo à esquerda sobre um conjunto X , definimos a órbita


de x ∈ X por G como sendo G ∗ x := {y ∈ X : ∃g ∈ G, y = g ∗ x}. Por outro lado, ainda
considerando um x ∈ X fixo, é um exercício simples mostrar que o conjunto G x := {g ∈
G : g ∗ x = x} é um subgrupo de G. Esse subgrupo é chamado subgrupo de isotropia
de x em G ou subgrupo estabilizador de x em G. O resultado a seguir relaciona esses
dois objetos que acabamos de definir.

Proposição 1.7. Seja G um grupo agindo à esquerda sobre um conjunto X . Temos que
|G ∗ x| = (G : G x ).

Demonstração. Considere a aplicação ϕx : G → G ∗ x dada por ϕx (g ) = g ∗ x. Cla-


ramente essa aplicação é sobrejetora. Por outro lado, note que ϕx (g ) = ϕx (h) se e
somente se g ∗ x = h ∗ x ⇔ h −1 g ∗ x = x ⇔ h −1 g ∈ G x ⇔ g ∈ hG x . Assim, temos uma
correspondência biunívoca entre as classes laterais à esquerda de G com relação a G x
e os elementos da órbita de x por G, o que implica

|G ∗ x| = (G : G x ).

Um subconjunto de X particularmente útil é aquele formado por todos os ele-


mentos de órbita unitária, ou seja, pelos x ∈ X tais que G x = G. Esse conjunto é deno-
tado por X G .

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Repare que se definimos a relação ∼ em X dada por x ∼ y se y ∈ G ∗x. Essa relação
é reflexiva, pois x = 1∗x. Além disso ela é simétrica, pois se y = g ∗x então x = g −1 ∗ y,
e transitiva já que se y = g ∗ x e z = h ∗ y então z = (hg ) ∗ x. Desse modo, a relação ∼ é
de equivalência e, consequentemente, podemos decompor X na união disjuntas das
classes de equivalência oriundas dessa relação, mas note que cada classe de equiva-
lência corresponde a uma órbita, ou seja, X pode ser decomposto na união disjunta
de suas órbtias pela ação de G. Nesse caso, o quociente X / ∼, que é o conjunto das
classes de equivalências, é denotado por X /G. Assim, sendo X finito e usando a Pro-
posição 1.7, temos automaticamente a seguinte identidade.
X X
|X | = |G ∗ x| = (G : G x ). (1.1)
x∈X /G x∈X /G

Note que, se |G| = p n para um primo p e um inteiro positivo n, da Equação (1.1)


obtém-se que |X | ≡ |X G | (mod p), fato que é usado tanto na demonstração dos te-
oremas de Sylow, como também pode ser usado na demonstração do Teorema de
Cauchy (v. Exercício 6).
Agora seguiremos um caminho que nos aproximará mais dos conteúdos dos pró-
ximos capítulos.
Note que se um grupo G age à esquerda sobre um conjunto X , podemos definir
uma aplicação ρ : G → F X ,X , sendo F X ,X o conjunto de todas as aplicações de X para
X , do seguinte modo.
ρ(g )(x) = g ∗ x.

Note que, para qualquer g ∈ G, a aplicação ρ(g ) : X → X é uma bijeção. De fato,


para verificar a injetividade, se ρ(g )(x) = ρ(g )(y), temos que g ∗ x = g ∗ y, implicando
(g −1 g ) ∗ x = (g −1 g ) ∗ y e, portanto, x = y. Por outro lado, para verificar a sobrejeti-
vidade, dado x ∈ X , note que x = g ∗ (g −1 ∗ x) = ρ(g )(g −1 ∗ x). Assim, podemos res-
tringir o contradomínio de ρ a S X , o conjunto formado por todas as bijeções de X em
si mesmo. Perceba que, se considerarmos a operação de composição em S X , temos
um grupo e a aplicação ρ : G → S X é um homomorfismo de grupos. Com efeito, se
g , h ∈ G e x ∈ X , temos que

ρ(g h)(x) = (g h) ∗ x = g ∗ (h ∗ x) = ρ(g )(h ∗ x) = ρ(g )(ρ(h)(x)) = ρ(g ) ◦ ρ(h)(x).

Assim, ρ(g h) = ρ(g )◦ρ(h), para quaisquer g , h ∈ G. No caso em que X é finito S X é iso-
morfo a algum grupo simétrico S n e a ação acaba determinando um homomorfismo
de G em S n .

Exercícios

Exercício 1. Seja F um corpo. Diga se existe e, caso exista, descreva completamente


uma ação à esquerda de S 3 sobre F 3 tal que, para quaisquer a, b, c ∈ F satisfaça (12) ∗
(a, b, c) = (b, a, c) e (13) ∗ (a, b, c) = (c, b, a). Faça o mesmo para ação à direita.

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Exercício 2. Considere S 3 agindo à esquerda sobre si mesmo através da conjugação.
Determine o subconjunto formado pelos elementos de órbita unitária.

Exercício 3. Sejam G um grupo cíclico finito de ordem prima p e X um conjunto


finito com exatamente n elementos, sendo p ≤ n < 2p. Determine o número de ações
à esquerda de G sobre X que podem ser definidas.

Exercício 4. Sejam G um grupo finito de ordem m e X conjunto finito de ordem n.


Mostre que se m é um primo maior do que n a única ação à esquerda de G sobre X
que é possível definir é a ação trivial.

Exercício 5. Seja G um grupo de ordem p n , sendo p primo e n inteiro positivo. Mostre


que o centro de G não pode ser o grupo trivial. Mostre que se n = 1 ou 2, G é abeliano.
(Sugestão: considere G agindo sobre o conjunto subjacente a si pela conjugação.)

Exercício 6. Sejam G um grupo finito e p um número primo que divide a ordem de


G. Considere o conjunto X formado por todas as p-uplas (g 1 , g 2 , . . . , g p ), g i ∈ G para
i = 1, 2, . . . , p satisfazendo g 1 g 2 . . . g p = 1.

(a) Mostre que |X | = |G|p−1 .

(b) Mostre que se (g 1 , g 2 , . . . , g p ) ∈ X então (g p , g 1 , g 2 , . . . , g p−1 ) ∈ X .

(c) Sendo H o subgrupo de S p gerado pelo p-ciclo (123 . . . p), mostre que é possível
definir uma ação à esquerda de H sobre X de modo que

(123 . . . p) ∗ (g 1 , g 2 , . . . , g p ) = (g p , g 1 , g 2 , . . . , g p−1 ).

(d) Mostre que X H 6= ;.

(e) Utilizando congruência módulo p na Equação (1.1), mostre que G possui um sub-
grupo de ordem p

Exercício 7. Um anti-homomorfismo ψ : G → H entre dois grupos G e H é uma


aplicação que satisfaz ψ(g 1 g 2 ) = ψ(g 2 )ψ(g 1 ), para quaisquer g 1 , g 2 ∈ G. Seguindo a
mesma ideia do final deste capítulo, mostre que uma ação à direita de um grupo G
sobre um conjunto X induz um anti-homomorfismo ρ : G → S X .

Exercício 8. Seja ψ : G → S X um homomorfismo de grupos. Mostre que ϕ : G × X → X


dada por ϕ(g , x) = ψ(g )(x) é uma ação à esquerda de G sobre X .

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Capítulo 2

Conceitos e resultados básicos de


representações de grupos

2.1 Conceitos básicos

Embora a generalização seja de grande importância em matemática, ao se generali-


zar, em geral, perde-se estrutura e passa-se a trabalhar com uma estrutura mais po-
bre. Muitas vezes é tão ou mais interessante enriquecer a estrutura com a qual traba-
lhamos e, para tanto, é necessário particularizar um pouco nosso objeto de estudo. É
o que faremos com relação às ações de grupos.
Daqui em diante no texto, F denotará sempre um corpo e V um F -espaço vetorial
de dimensão finita e G um grupo finito.
Se um grupo G age à esquerda (à direita) sobre V e a ação é linear, isto é, para
quaisquer g ∈ G, u, v ∈ V e λ ∈ F temos g ∗ (u + λv) = g ∗ u + λg ∗ v, o espaço V é
chamado de um G-módulo à esquerda (à direita).
Como visto no final do capítulo anterior, a partir de uma ação à esquerda, pode-
mos definir uma aplicação ρ : G → S V tal que ρ(g )(v) = g ∗ v, para quaisquer g ∈ G e
v ∈ V . Como a ação de G é linear sobre V , repare que

ρ(g )(u + λv) = ρ(g )(u) + λρ(g )v;

para quaisquer u, v ∈ V , g ∈ G e λ ∈ F , ou seja, ρ(g ) além de ser bijetora em V , também


é um operador linear de V , o que passaremos a chamar de um F -automorfismo de V .
O conjunto de todos os F -automorfismos de V é denotado por AutF (V ). Além de ser
um subconjunto de S V , temos que AutF (V ) é um subgrupo de S V (verifique!); assim,
a aplicação ρ : G → AutF (V ) induzida pela ação é um homomorfismo de grupo.
Reciprocamente, partamos de um homomorfismo ψ : G → AutF (V ). Pelo exercí-
cio 8, a partir desse homomorfismo podemos definir a ação à esquerda de G em V
dada por g ∗ v = ψ(g )(v), e como ψ(g ) é linear para todo g ∈ G, a ação assim defi-
nida é linear e, portanto, V é um G-módulo. Esses comentários tornam mais natural
a definição dada a seguir.

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Definição 2.1. Uma representação ρ de um grupo G em V é um homomorfismo de
grupo ρ : G → AutF (V ).

Os comentários anteriores nos mostram que estudar representações de um grupo


G é o mesmo que estudar G-módulos. A seguir fornecemos alguns exemplos.

Exemplo 2.2. A representação trivial de um grupo G em V é o homomorfismo trivial


ρ : G → AutF (V ) tal que ρ(g ) = Id, para todo g ∈ G.

Exemplo 2.3. Considerando G como sendo o grupo multiplicativo {±1, ±i }, onde i é


raiz quadrada de −1, temos que ρ : G → AutR (R2 ) dada por

ρ(1)(a, b) = (a, b)
ρ(−1)(a, b) = (−a, −b)
,
ρ(i )(a, b) = (−b, a)
ρ(−i )(a, b) = (b, −a)

para quaisquer a, b ∈ R é uma representação de G em R2 (verifique!).

Quando dimF V = n ∈ N, temos que AutF (V ) ∼


= GL n (F ), o grupo linear geral for-
mado por todas as matrizes n × n invertíveis e com entradas em F e, para cada g ∈ G,
ρ(g ) pode ser identificado com a matriz [ρ(g )]B , sendo B uma base fixa de V . Por isso,
daqui em diante todos os espaços vetoriais considerados são de dimensão finita.
Dado um conjunto finito X = {x 1 , x 2 , . . . , x n }, o F -espaço vetorial livre V X gerado
por X é o conjunto de todas as F -combinações lineares formais dos elementos de X ,
munido de adição e multiplicação por escalar definidos naturalmente como a seguir.

(λ1 x 1 + . . . + λn x n ) + (µ1 x 1 + . . . + µn x n ) = (λ1 + µ1 )x 1 + . . . + (λn + µn )x n e

λ(λ1 x 1 + . . . + λn x n ) = (λλ1 )x 1 + . . . + (λλn )x n ;

para quaisquer λ, λ1 , λ2 , . . . , λn , µ1 , . . . , µn ∈ F . Essa construção nos permite, como


mostra o exemplo a seguir, construir um G-módulo que estende uma ação à esquerda
de um grupo G sobre um conjunto X .

Exemplo 2.4. Dada uma ação de um grupo G sobre um conjunto finito X , podemos
transformar o F -espaço vetorial V X em um G-módulo naturalmente através da ação

g ∗ (λ1 x 1 + . . . + λn x n ) = λ1 (g ∗ x 1 ) + . . . + λn (g ∗ x n ),

para quaisquer g ∈ G e λ, λ1 , . . . , λn ∈ F . A representação associada a esse G-módulo é


chamada representação permutação induzida pela ação de G sobre X .

Definição 2.5. O F -espaço vetorial livre gerado pelo conjunto subjacente a um grupo
finito G é denotado por F G. A representação permutação induzida pela ação de G
sobre esse conjunto através da translação à esquerda (v. Exemplo 1.5) é chamada
representação regular de G

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A representação regular desempenhará papel crucial mais adiante.
Sendo V um G-módulo, o subespaço W de V é um G-submódulo de V se, para
quaisquer g ∈ G e w ∈ W , g ∗ w ∈ W . A representação associada a um G-submódulo
W de V é chamada de uma subrepresentação da representação ρ associada a W .
Se W é um G-submódulo de V , podemos definir em V uma relação de equivalên-
cia ∼W dada por u ∼W v se v − u ∈ W . As classes de equivalência com respeito a essa
relação são bem comportadas com relação à adição e à multiplicação por escalar de
V , isto é, se u = w e v = z, para qualquer λ ∈ F , temos

u + λv = w + λz (verifique!).

Assim, V / ∼W possui uma estrutura natural de F -espaço vetorial. Esse espaço vetorial
é chamado espaço quociente de V por W e denotado por V /W .
Além disso, se u, v ∈ V são tais que u = v em V /W , então, para qualquer g ∈
G, temos que g ∗ u = g ∗ v (verifique!), e V /W admite naturalmente também uma
estrutura de G-módulo.

Exemplo 2.6. Os subespaços {0} e V são sempre G-submódulos do G-módulo V cha-


mados submódulos triviais de V .

g : λ ∈ F } é um G-submódulo de F G com ação induzida pela


X
Exemplo 2.7. {λ
g ∈G
representação regular (verifique!).

Um G-módulo de dimensão positiva é chamado irredutível se seus únicos G-


submódulos são os triviais. Se um G-módulo se decompõe como a soma direta de
G-submódulos irredutíveis, o mesmo é chamado completamente redutível.

Exemplo 2.8. O G-módulo do exemplo 2.3 é irredutível, já que o módulo em questão


possui dimensão 2 e não possui submódulos de dimensão 1, pois, caso os houvesse,
usando que i ∗ (a, b) = (b, −a), se (a, b) 6= 0 pertencesse a um tal submódulo devería-
mos ter i ∗ (a, b) = λ(a, b), implicando b = λa e −a = λb e, portanto, −a = λ2 a. Como
λ ∈ R, obtemos a = b = 0.

Exemplo 2.9. Nenhum G-módulo de dimensão maior do que 1 associado a uma re-
presentação trivial é irredutível, já que, nesse caso, todo subespaço é um G-módulo.

Exemplo 2.10. O Exemplo 2.7 mostra que o G-módulo F G não é irredutível.

Dado um subconjunto X de um G-módulo V , existe um G-submódulo 〈X 〉 de V


tal que todo G-submódulo W contendo X contém 〈X 〉 (v. Exercício 13). Dizemos que
〈X 〉 é o G-submódulo de V gerado por X .
Um G-submódulo W de V para o qual existe v ∈ V tal que 〈v〉 = W é chamado
de um G-submódulo cíclico de V . Repare que um G-módulo V é irredutível se e
somente se o mesmo é cíclico gerado por qualquer elemento não nulo de si mesmo
(v. Exercício 14).

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2.2 Homomorfismos de G-módulos e Lema de Schur

A exemplo do que ocorre com outras estruturas algébricas, chamamos de homomor-


mismo de G-módulos qualquer aplicação f : V1 → V2 , onde V1 e V2 são G-módulos
sobre um mesmo corpo F , satisfazendo

(i) f é uma transformação linear, ou seja, um F -homomorfismo;

(ii) para quaisquer g ∈ G e v ∈ V1 , temos que f (g ∗ v) = g ∗ f (v).

Ressaltamos que a ação de G considerada no primeiro membro da condição (ii) é a


ação de G sobre V1 enquanto que a ação considerada no segundo membro é sobre
V2 . Por uma questão de encurtamento de nomenclatura, passaremos a chamar ho-
momorfismos de G-módulos simplesmente de G-homomorfismos. No caso em que
V1 = V2 = V , dizemos que f é um G-endomorfismo de V . Se um G-homomorfismo
f : V1 → V2 é bijetor dizemos que f é um G-isomorfismo e que V1 é G-isomorfo a V2
(denota-se V1 ∼=G V2 ). Um G-endomorfismo bijetor de um G-módulo V é chamado
G-automorfismo de V . O conjunto dos G-homomorfismos de V1 para V2 é deno-
tado por HomG (V1 ,V2 ), o conjunto dos G-endomorfismos de um G-módulo V é de-
notado por EndG (V ) e o conjunto dos G-automorfismos de G-módulo V é denotado
por AutG (V ). Consideranado a adição e multiplicação por escalar usuais, o conjunto
HomG (V1 ,V2 ) possui uma estrutura natural de F -espaço vetorial, enquanto que, se
considerarmos ainda a operação de composição em EndG (V ), o mesmo é um anel
com unidade (v. Exercício 15).

Exemplo 2.11. A aplicação identicamente nula f : V1 → V2 é sempre um G-homo-


morfismo, chamado G-homomorfismo trivial.

Exemplo 2.12. Considere V1 = F G com a ação oriunda da representação regular e


V2 = FG com a ação oriunda da representação permutação induzida pela ação por
conjugação em FG. Se G não é o grupo trivial, a aplicação identidade de V1 para V2
não é um G- homomorfismo, pois se g 6= 1, g h 6= g hg −1 .

Exemplo 2.13. Sendo W um G-submódulo de V , as aplicações i : W → V e π : V →


V /W dadas por i (w) = w, para todo w ∈ W , e π(v) = v, para todo v ∈ V , são ambas
G-homomorfismos, sendo i injetora e π sobrejetora.

Se dois G-módulos são isomorfos, dizemos que as representações associadas a


eles são equivalentes. Note que, se traduzirmos as condições (i) e (ii) da definição de
G-homomorfismo para a linguagem de representações, obtemos que a representação
ρ 1 associada a V1 é equivalente à representação ρ 2 associada a V2 se existe um F -
isomorfismo f entre V1 e V2 tal que f ◦ ρ 1 = ρ 2 ◦ f .
Tal como ocorre para outras estruturas algébricas, se dois G-módulos são G-iso-
morfos, essencialmente eles são cópia um do outro, já que através do isomorfismo
que os relaciona, identifica-se os elementos de um e de outro de modo que cada ele-
mento de V1 comporta-se exatamente como aquele com o qual ele foi identificado
em V2 .

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A exemplo do que ocorre com outras estruturas algébricas, definimos o núcleo do
G-homomorfismo f : V1 → V2 como sendo ker f := f −1 (0) ⊂ V1 . Do Exercício 9, segue
que ker f é um G-submódulo de V1 . Também a imagem de f é um G-submódulo de
V2 (v. Exercício 17).
Repare que, dado um G-homomorfismo f : V1 → V2 , podemos definir a aplicação
f : V1 / ker f → Im f dada por f (v) = f (v). De fato, se v = w ∈ V1 / ker f , v − w ∈ ker f e
f (v) = f (v − w + w) = f (v − w) + f (w) = f (w) e a aplicação está bem definida. Além
disso, a mesma é de fato um G-homomorfismo, pois a linearidade segue da lineari-
dade de f e, se g ∈ G, f (g ∗ v) = f (g ∗ v) = g ∗ f (v) = g ∗ f (v). Como f é uma transfor-
mação linear, a mesma é injetora se e somente se ker f = {0}. Desse modo f é injetora,
pois se f (v) = 0, então f (v) = 0, o que implica que v pertence ao núcleo de f e, por-
tanto, v = 0 em V1 / ker f . Por outro lado, da definição de f segue que Im f = Im f e
f é um G-isomorfismo de módulos. Com isso, acabamos de provar um Teorema do
Isomorfismo para G-módulos, que vai enunciado a seguir.

Teorema 2.14 (Teorema do Isomorfismo). Dado um G-homomorfismo f : V1 → V2 ,


temos que V1 / ker f ∼
=G Im f .

Como comentado anteriormente, EndG (V ) possui uma estrutura natural de anel.


O resultado seguinte não deixa de ser surpreendente ao garantir que, se o corpo-
base F de V é algebricamente fechado e V é irredutível, quando a soma de dois
G-automorfismos de V não resulta no morfismo nulo, o resultado é um novo G-
automorfismo.

Teorema 2.15 (Lema de Schur). Sejam V,W G-módulos irredutíveis.

(i) Um G-homomorfismo f : V → W é a aplicação nula ou um isomorfismo.

(ii) Se o corpo F sobre o qual V está definido é algebricamente fechado e f : V → V é


um G-endomorfismo, existe λ ∈ F de modo que f = λId, ou seja, EndG (V ) ∼ = F.

Demonstração. A afirmação (i) segue diretamente da irredutibilidade de V e W e de


ker f e Im f serem, respectivamente, G-submódulos de V e de W .
Para mostrar (ii), seja f ∈ EndG (V ). Em particular f é um operador linear de V e,
como F é algebricamente fechado, existe λ ∈ F de modo que x −λ divide o polinômio
característico de f . Em particular ker( f −λId) 6= {0}. Como λId é um G-endomorfismo
de V para qualquer λ ∈ F (verifique!), f − λId ∈ EndG (V ). De (i) segue que f − λId é a
aplicação nula e, portanto, f = λId.

Dados dois F -espaços vetoriais V e W , conhecemos uma maneira bastante sim-


ples de construir um F -homomorfismo entre eles: basta tomar uma base B de V e
considerar qualquer aplicação f : B → W . A mesma se estende de modo único, por
linearidade, a um F -homomorfismo fe : V → W . A seguir descrevemos uma maneira
de construir um G-homomorfismo de módulos a partir de um F -homomorfismo.

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Seja G um grupo finito e sejam V1 ,V2 dois G-módulos sobre um mesmo corpo F .
Denote por ρ 1 e ρ 2 , respectivamente, as representações de G em V1 e V2 associadas à
ação de cada um deles. Dado um F -homomorfismo f : V1 → V2 considere fe : V1 → V2
dada por
ρ 2 (g ) ◦ f ◦ ρ 1 (g −1 ).
X
fe = (2.1)
g ∈G

Como para todo g ∈ G, ρ 1 (g ) e ρ 2 (g ) são transformações lineares e f também é


linear, temos que fe é um F -homomorfismo. Considere h ∈ G e v ∈ V1 arbitrários,
temos que
à !
−1
fe ◦ ρ 1 (h)(v) = ρ 2 (g ) ◦ f ◦ ρ 1 (g ) ◦ ρ 1 (h)(v)
X
fe(h ∗ v) =
g ∈G

g ∈G ρ 2 (g ) ◦ f ◦ ρ 1 (g −1 ) ◦ ρ 1 (h) (v) = g ∈G ρ 2 (g ) ◦ f ◦ ρ 1 (g −1 h) (v)


¡P ¢ ¡P ¢
=
ρ 2 (hh −1 g ) ◦ f ◦ ρ 1 (g −1 h) (v)
¡P ¢
= g ∈G
à !
−1 −1 −1
ρ 2 (h) ◦ ρ 2 (h g ) ◦ f ◦ ρ 1 ((h g ) ) (v)
X
=
g ∈G Ã !
ρ 2 (h) ◦ ρ 2 (g ) ◦ f ◦ ρ 1 (g −1 ) (v) = h ∗ fe(v).
X
=
g ∈G

Exemplo 2.16. Considere G = S 3 e V = CS 3 com a representação regular. Conside-


rando o C-homomorfismo f : V → V tal que f (σ) = σ se σ é uma permutação par e
f (σ) = 0 se σ é uma permutação ímpar, note que f não é um G-endomorfismo de
CS 3 pois f ((12)∗(13)) = f (132) = (132), enquanto que (12)∗ f (13) = (12)∗0 = 0. Dada
σ ∈ S 3 , temos à !
−1
ρ(τ) ◦ f ◦ ρ(τ ) (σ) = σ = 3σ,
X X
fe(σ) =
τ∈S 3 τ−1 σ par

que, por ser múltipla da identidade, é um G-homomorfismo de CS 3 .


Note, no entanto, que, se f já é um G-homomorfismo, fe = |G| f (v. Exercício
19). A fim de “corrigir"essa diferença, quando charF não divide |G|, definimos o G-
homomorfismo induzido por f

1 e
Av( f ) = f.
|G|

2.3 Redutibilidade de G-módulos

Se fôssemos fazer uma definição de F -espaço vetorial irredutível análoga à que fize-
mos para G-módulos irredutíveis, teríamos que os espaços vetoriais irredutíveis se-
riam os de dimensão 1 e que todo F -espaço vetorial pode ser decomposto em uma
soma direta de subespaços irredutíveis. Nessa seção veremos que, com algumas hi-
póteses adicionais, todo G-módulo também pode ser decomposto em submódulos
irredutíveis, apesar de eles não possuírem sempre dimensão 1. O objetivo dessa se-
ção é demonstrar o Teorema de Maschke que garante a decomposição em submódu-
los irredutíveis de um G-módulo V quando a característica de F não divide a ordem
de G. Começamos por analisar as representações com auxílio de matrizes.

12
Reforçamos que, ao longo de todo o texto, salvo menção contrária, G denotará
sempre um grupo finito e todos os espaços vetoriais e G-módulos considerados serão
de dimensão finita. Ao lidarmos com um G-módulo V de dimensão finita, é bastante
natural fixar uma base B do mesmo e considerar, para cada g ∈ G a representação
matricial [ρ(g )]B , com respeito a essa base, da representação ρ associada à ação de G
sobre V .
É claro que seria conveniente encontrar uma base de V que tornasse essas ma-
trizes o mais simples possível. Em álgebra linear, a maneira natural de se fazer isso
com uma transformação linear T é considerar uma base formada pela união de bases
de subespaços T -invariantes, o que fornece a forma de Jordan da transformação. No
caso de representações poderíamos fazer algo semelhante se pudéssemos decompor
V em uma soma direta de subespaços G-invariantes, isto é, de G-submódulos. Re-
pare que se V se decompõe como soma direta de G-submódulos V1 ⊕ V2 ⊕ . . . ⊕ Vk , se
tomamos B = B 1 ∪B 2 ∪. . .∪B k , sendo B i base de Vi para qualquer i = 1, 2, . . . , n; temos
que, para todo g ∈ G,
 
[ρ 1 (g )]B 1 0 ··· 0
 
 0 [ρ 2 (g )]B 2 ... 0 
[ρ(g )]B =  , (2.2)
 
..

 0 0 . 0 

0 0 ... [ρ k (g )]B k

onde [ρ i (g )]B i denota o bloco d i ×d i correspondente à matriz da subrepresentação de


ρ no espaço Vi com respeito à base B i , sendo d i = dimF Vi . É claro que, quão menor
os tamanhos dos blocos envolvidos, melhor; assim, a melhor das situações possíveis
ocorre quando todos os G-submódulos Vi que aparecem na decomposição de V são
irredutíveis.
O lema seguinte será crucial na obtenção de tal decomposição.

Lema 2.17. Se charF não divide |G| e W é um G-submódulo de V , existe um G-sub-


módulo U de V tal que V = W ⊕U .

Demonstração. Tome π : V → V uma projeção qualquer de V em W , isto é, consi-


derando uma base {v 1 , . . . , v j } de W completamos a mesma com vetores v j +1 , . . . , v k
obtendo uma base para V e tomamos π o operador linear para o qual π(v i ) = v i se
1 ≤ i ≤ j e π(v i ) = 0 se j < i ≤ k. Repare que Im π = W e que π restrita a W é a identi-
dade. Dados v ∈ V e g ∈ G, π ◦ ρ(g −1 )(v) ∈ Im π = W e como W é G-submódulo de V ,
temos que ρ(g ) ◦ π ◦ ρ(g −1 )(v) ∈ W . Além disso, se v ∈ W , repare que

ρ(g ) ◦ π ◦ ρ(g −1 )(v) = g ∗ (π(g −1 ∗ v)) = (g g −1 ) ∗ v = v,

e, portanto, Av(π)(v) = v, para todo v ∈ W . Em particular, ker Av(π) ∩ W = {0} e


Im Av(π) = W . Do Teorema do Núcleo e da Imagem, segue que V = W ⊕ ker Av(π) .
Como Av(π) é um G-endomorfismo, seu núcleo é um G-submódulo de V e tomando
U = ker Av(π), temos o resultado.

13
A seguir apresentamos o Teorema de Maschke que fornece condições para que
todo G-módulo seja completamente redutível.

Teorema 2.18 (Teorema de Maschke). Fixado um grupo G e um corpo F , se charF


não divide |G|, temos que todo G-módulo V com corpo de escalares F é completamente
redutível.

Demonstração. A demonstração de que todo G-módulo V de dimensão finita é com-


pletamente redutível se dará por indução sobre dimF V . Caso dimF V = 1, V é irre-
dutível e o resultado vale. Suponha que todo G-módulo com dimensão menor do
que um natural n seja completamente redutível e seja V um G-módulo de dimensão
n. Se V é irredutível, ele é completamente redutível. Caso contrário, existe um G-
submódulo irredutível W em V , sendo dimF W < dimF V . Pelo Lema 2.17, existe um
G-submódulo U de V tal que V = W ⊕U . Pela hipótese indutiva, U pode ser decom-
posto na soma direta de G-submódulos irredutíveis e, portanto, V é completamente
redutível.

Exemplo 2.19. Considere V = CS 3 com a ação dada pela conjugação. Nesse caso
particular não é difícil exibir a decomposição de V como soma de irredutíveis, o que,
em geral, não ocorre. Considere V1 , V2 , V3 e V4 os subespaços gerados, respectia-
mente, por {1}, {(12) + (13) + (23)}, {(123) + (132)} e {(123) − (132)}. Uma vez que as
classes de conjugação de S n são determinadas pelos tipo cíclicos das permutações,
segue que V1 , V2 , V3 e V4 são S 3 -submódulos e como todos possuem dimensão 1,
são irredutíveis. Tomemos V5 que tem por base {(12) − (13), (13) − (23)}. Pelo Exer-
cício 11, para verificar que V5 é um G-submódulo, basta checar que a ação de qual-
quer elemento de S 3 sobre os elementos da base de V5 resultam em elementos de V5 .
De fato, os possíveis resultados para uma tal ação são ±[(12) − (13)], ±[(13) − (23)] e
±[(12) − (23)]. Claramente, nos dois primeiros casos temos elementos de V5 já que
são múltiplos de um elemento da base. Para o caso restante, note que ±[(12) − (23)] =
±[[(12) − (13)] + [(13) − (23)]] ∈ V5 . Para verificar que V5 é irredutível, temos que veri-
ficar que ele não possui submódulos de dimensão 1. Um elemento genérico de V5 é
da forma a(12) + b(13) + c(23) com a + b + c = 0. Note que se um tal elemento é não
nulo, os coeficientes de (12), (23) e (13) não podem ser todos iguais. Suponha a 6= b. A
ação de (23) sobre esse elemento resulta em b(12) + a(13) + c(23), que não é múltiplo
de a(12) + b(13) + c(23), já que a 6= b. Nos outros dois casos restantes, procede-se de
maneira análoga. Assim decompomos V = V1 ⊕ V2 ⊕ V3 ⊕ V4 ⊕ V5 .

Exercícios

Exercício 9. Seja V um G-módulo. Mostre que g ∗ 0 = 0, para qualquer g ∈ G.

Exercício 10. Sejam G um grupo e V um F -espaço vetorial. Dada uma ação à es-
querda linear ϕ : G × V → V de G sobre V , denote por ϕ
e a representação de G em V

14
dada por ϕ(g
e )(v) = ϕ(g , v), para quaisquer g ∈ G e v ∈ V . Por outro lado, se ρ : G →
AutF (V ) é uma representação de G em V , denote por ϕρ a ação à esquerda linear de
G sobre V tal que ϕρ (g , v) = ρ(g )(v), para quaisquer g ∈ G e v ∈ V .
Mostre que, para qualquer representação ρ de G em V , ϕ
fρ = ρ e que, para qual-
quer ação à esquerda linear de G em V , ϕϕe = ϕ.

Exercício 11. Sejam V um G-módulo, W um subespaço de V , B uma base de W e


X ⊂ G um conjunto que gera G. Mostre que W é um G-submódulo de V se e somente
se g ∗ w ∈ W para todo g ∈ X e para todo w ∈ B .

Exercício 12. Sejam G um grupo cíclico gerado por g , V um G-módulo de dimensão


finita e fixe v ∈ V \ {0}. Considere j o menor inteiro positivo para o qual o conjunto
{v, g ∗ v, g 2 ∗ v, . . . , g j ∗ v} é um subconjunto l.d. de V .

(a) Mostre que j ≤ |G|.

(b) O subespaço gerado por {v, g ∗ v, . . . , g j −1 ∗ v} é sempre um G-submódulo de V ?


Se sim, demonstre; caso contrário forneça um contraexemplo.

Exercício 13. Mostre que interseção de uma família de G-submódulos de um G-


módulo V é um G-submódulo de V . Mostre ainda que, dado X ⊆ V , existe um G-
submódulo 〈X 〉 de V tal que se W é G-submódulo de V e contém X , então 〈X 〉 ⊆ W .

Exercício 14. Mostre que um G-módulo V é irredutível se e somente se o mesmo é


cíclico gerado por qualquer elemento não nulo de si mesmo.

Exercício 15. Considere em HomG (V1 ,V2 ) as operações de adição e multiplicação


por escalar definidas por ( f 1 + f 2 )(v) = f 1 (v) + f 2 (v) e (λ f )(v) = f (λv) para quais-
quer f , f 1 , f 2 ∈ HomG (V1 ,V2 ), λ ∈ F e v ∈ V1 . Mostre que, munido dessas operações,
HomG (V1 ,V2 ) é um F -espaço vetorial.
Considerando em EndG (V ) além dessas operações uma multiplicação dada pela
composição, isto é, f 1 f 2 = f 1 ◦ f 2 , mostre que EndG (V ) é um anel com unidade.

Exercício 16. Mostre que se V é um G-módulo sobre um corpo F para o qual EndG (V )
é isomorfo a F , então V é irredutível.

Exercício 17. Mostre que a imagem de um G-homomorfismo f : V1 → V2 é um G-


submódulo de V2 .

Exercício 18. Sejam V e W dois G-módulos irredutíveis sobre um corpo algebrica-


mente fechado F e seja f : V → W um G-isomorfismo. Mostre que se q : V → W é um
G-homomorfismo, existe λ ∈ F tal que q = λ f .

Exercício 19. Sejam V1 ,V2 G-módulos e f : V1 → V2 um G-homomorfismo. Mostre


que fe, tal como definido na Equação (2.1), satisfaz fe = |G| f . Em particular, Av( f ) = f .

Exercício 20. Sejam V1 e V2 G-módulos. Mostre que a aplicação Av : HomF (V1 ,V2 ) →
HomG (V1 ,V2 ) que realiza f 7→ Av( f ) é um F -homomorfismo.

15
Exercício 21. Sejam V um G-módulo e U ,W G-submódulos de V tais que V = U ⊕W .
Mostre que a projeção π : V → V dada por π(u + w) = u para quaisquer u ∈ U e w ∈ W
é um G-homomorfismo de V em V . Conclua que U é G-isomorfo a V /W .

Exercício 22. Sejam V um G-módulo e U ,W submódulos de V tais que V = U ⊕ W .


Sejam ainda f : U → V e g : W → V G-homomorfismos. Mostre que F : V → V linear
de modo que F |U = f e F |W = g é um G-endomorfismo de V .

Exercício 23. Mostre que se V é um S n -módulo irredutível de dimensão 1, então a


representação ρ associada a ele é a trivial ou ρ(σ)(v) = (−1)σ v para quaisquer σ ∈ S n
e v ∈ V (chamada representação sinal), onde (−1)σ denota o sinal da permutação σ,
isto é, (−1)σ = 1 se σ é uma permutação par e (−1)σ = −1 se σ é ímpar. Encontre os
S n -submódulos irredutíveis de dimensão 1 de F S n com a representação regular.

Exercício 24. Mostre que o subespaço de F S 3 gerado pelos elementos 1+(12)−(13)−


(132) e 1 + (23) − (123) − (13) é um S 3 -submódulo irredutível de F S 3 munido da repre-
sentação regular. Com o auxílio do exercício anterior forneça uma decomposição de
F S 3 como soma de submódulos irredutíveis.

16
Capítulo 3

Caracteres

Ao longo de todo esse capítulo supomos o corpo base F dos G-módulos considerados
de característica zero embora a definição de caráter e mais alguns outros conceitos
sejam livres de característica.

3.1 Conceitos básicos

Definição 3.1. Sejam ρ : G → AutF (V ) uma representação de G em V e seja B uma


base de V . O caráter de ρ é a aplicação χρ : G → F dada por χρ (g ) = tr[ρ(g )]B , para
todo g ∈ G. Dizemos que o caráter χρ é irredutível se o G-módulo associado a ρ é
irredutível.

Antes de fornecer exemplos, cabe ressaltar que apesar de termos fixado uma base
para V , o caráter de uma representação independe da base utilizada para se obter a
matriz de ρ(g ), já que trAB A −1 = trB (v. próxima demonstração). Por essa mesma
razão o seguinte resultado é válido.

Proposição 3.2. Se g 1 , g 2 ∈ G estão em uma mesma classe de conjugação, então temos


χρ (g 1 ) = χρ (g 2 ).

Demonstração. Se g 1 e g 2 estão em uma mesma classe de conjugação, existe h ∈ G tal


que g 2 = hg 1 h −1 . Então

χρ (g 2 ) = tr[ρ(g 2 )]B = tr[ρ(hg 1 h −1 ]B = tr([ρ(h)]B [ρ(g 1 )]B [ρ(h)]−1


B ).

Como trAB = trB A, temos que tr(AB A −1 ) = tr(B A −1 A) = trB . Portanto,

tr([ρ(h)]B [ρ(g 1 )]B [ρ(h)]−1 )B = tr[ρ(g 1 )]B = χρ (g 1 ).

Exemplo 3.3. Seja ρ : S n → AutF F dada por ρ(σ)(λ) = (−1)σ λ. Então χρ (σ) = 1 se σ é
par e χρ (σ) = −1 se σ é ímpar.

17
Exemplo 3.4. Seja ρ : S 3 → CS 3 a representação regular. Nesse caso, temos três clas-
ses de conjugação, a saber, a de 1, que é unitária, a de (12), que contém todas as
transposições e a de (123), que contém todos os 3-ciclos. Pelo Exercício 25, temos
que χρ (1) = dimC CS 3 = 6. Repare que χρ (12) = χρ (123) = 0, pois considerando a base
canônica B de S 3 formada pelos elementos de S 3 , a ação de (12) (e também de (123))
sobre os elementos de B fornece uma permutação dos mesmos sem pontos fixos,
logo a matriz de ρ com relação a essa base é formada por zeros e uns, sendo que, em
cada linha e em cada coluna, aparece um único 1 e o mesmo não aparece na diagonal
principal da matriz. O mesmo se repete para qualquer representação regular de um
grupo finito G em F G, isto é, χρ (1) = dimF F G = |G| e χρ (g ) = 0 se g 6= 1.

No caso de uma representação permutação obtida da ação de G sobre um con-


junto finito X , repare que χ(g ) fornece o número de elementos de X fixados pela
ação de g .
Uma característica importante dos caracteres é que representações equivalentes
possuem o mesmo caráter.

Proposição 3.5. Sejam ρ : G → AutF (V ) e σ : G → AutF (W ) representações equivalen-


tes, então χρ = χσ .

Demonstração. Como ρ e σ são equivalentes, existe um F -isomorfismo f : V → W


satisfazendo f ◦ ρ(g ) = σ(g ) ◦ f , para todo g ∈ G. Assim, σ(g ) = f ◦ ρ(g ) ◦ f −1 e

χσ (g ) = tr[σ(g )]c = tr([ f ]CB [ρ(g )]B ([ f ]CB )−1 ) = tr[ρ(g )]B = χρ (g ),

para qualquer g ∈ G e χρ = χσ .

3.2 Caracteres irredutíveis

Como comentado no Exemplo 2.19, em geral não é uma tarefa fácil fornecer expli-
citamente uma decomposição de um G-módulo na soma direta de G-submódulos
irredutíveis. Os caracteres facilitam parcialmente esse trabalho já que, a partir deles,
é possível determinar como a decomposição se dá embora não seja possível, somente
pela análise dos mesmos, determinar uma base formada por elementos das bases de
cada um dos G-módulos envolvidos na decomposição. O lema a seguir é bastante
técnico, no entanto é fundamental no restante do capítulo para mostrarmos como
os caracteres facilitam parcialmente nossa vida. Em sua demonstração, utiliza-se o
Lema de Schur, para o qual precisamos que o corpo base dos G-módulos seja alge-
bricamente fechado, por isso, ao longo do restante do capítulo, supomos F algebrica-
mente fechado.

Lema 3.6. Sejam V1 e V2 dois G-módulos irredutíveis. Fixe uma base B 1 de V1 e uma
base B 2 de V2 e denote por ρ a representação de G em V1 e por σ a representação de
G em V2 . Para qualquer g ∈ G, denote ainda por ρ i , j (g ) (respectivamente σi , j (g )) a
entrada (i , j ) da matriz [ρ(g )]B 1 ([σ(g )]B 2 ).

18
(i) Se V1 não é isomorfo a V2 , para quaisquer índices p, i , j , s temos

1 X
σp,i (g )ρ j ,s (g −1 ) = 0.
|G| g ∈G

(ii) Se V1 = V2 (logo σ = ρ) e B 1 = B 2 , temos


(
1
1 X se p = s e i = j ;
ρ p,i (g )ρ j ,s (g −1 ) = dimF V1
|G| g ∈G 0 caso contrário.

Demonstração. Para provar (i) considere B 1 = {v 1 , v 2 , . . . , v d } e B 2 = {w 1 , w 2 , . . . , w c },


sendo, claramente, d = dimF V1 e c = dimF V2 . Denote por E i , j : V1 → V2 o F -homo-
morfismo que satisfaz:
(
wi se k = j
E i , j (v k ) =
0 caso contrário

B
Repare que [E i , j ]B 1 = e i j , a matriz cuja entrada (i , j ) é 1 e todas as demais são
2

nulas. Pelo Lema de Schur, o G-homomorfismo Av(E i , j ) deve ser nulo e, portanto, a
matriz do mesmo com respeito a quaisquer bases. Por outro lado,

B 1 X B 1 X
[Av(E i , j )]B 1 = [σ(g ) ◦ E i , j ◦ ρ(g −1 )]B 1 = [σ(g )]B 2 e i j [ρ(g −1 )]B 1 .
2 |G| g ∈G 2 |G| g ∈G

B
Assim, a entrada (p, s) de [Av(E i , j )]B 1 é dada por
2

1 X
σp,i (g )ρ j ,s (g −1 ) = 0,
|G| g ∈G

o que conclui (i).


Para o caso (ii), procedemos de modo análogo, sendo que nesse caso podemos ter
Av(E i , j ) = λId, com λ 6= 0. Como a matriz identidade é diagonal, a entrada (p, s) da
matriz [Av(E i , j )]B 1 deve ser nula se p 6= s, ou seja

1 X
ρ p,i (g )ρ j ,s (g −1 ) = 0.
|G| g ∈G

Repare que trocando g por g −1 no primeiro membro da igualdade acima, obtemos

1 X
ρ j ,s (g )ρ p,i (g −1 ),
|G| g ∈G

e, pelo mesmo argumento, essa soma deve zerar se i 6= j .


Para o caso p = s e i = j , repare que a aplicação identidade sobre V1 é um G-
homomorfismo e, portanto, Av(Id) = Id, pelo Exercício 19. Por outro lado, Id = E 1,1 +
E 2,2 + . . . E d ,d e, pelo Exercício 20,

d
X
Av(E i ,i ) = Id.
i =1

19
Seja j tal que Av(E j , j ) 6= 0, então a entrada (p, p) de [Av(E j , j )]B 1 possui o mesmo valor
λ 6= 0, qualquer que seja p = 1, 2, . . . , d . Assim,

1 X
ρ p, j (g )ρ j ,p (g −1 ) = λ.
|G| g ∈G

Novamente perceba que se trocarmos g por g −1 a igualdade se mantém, mas então

λ= ρ j ,p (g )ρ p, j (g −1 ),
X
g ∈G

que é a entrada ( j , j ) de E p,p , mas todas as entradas da diagonal principal de E p,p


devem ser iguais, ou seja, a igualdade se mantém para qualquer j = 1, 2, . . . , d . Como
p é arbitrário, temos que, para quaisquer 1 ≤ p, j ≤ d , vale

1 X
ρ p, j (g )ρ j ,p (g −1 ) = λ.
|G| g ∈G

Usando novamente que Id = E 1,1 + . . . + E d ,d , segue que λ = 1/d e concluímos a


demonstração.

Fixados um grupo G e um corpo F , dizemos que a aplicação r : G → F é uma


(F -)função de classe em G se elementos pertencentes a uma mesma classe de con-
jugação de G possuem a mesma imagem por r . Como mostrado na Proposição 3.2,
todo caráter é uma função de classe. O conjunto Cl F (G) de todas as F -funções de
classe de um grupo G, munido da adição e multiplicação por escalar usuais é um es-
paço vetorial (v. Exercício 26). Considere a aplicação (·|·) : Cl F (G) × Cl F (G) → F dada
por
1 X
(r |s) = r (g )s(g −1 ).
|G| g ∈G

Além da mesma ser uma forma bilinear simétrica (v. Exercício 26), temos que o con-
junto dos caracteres irredutíveis de G é um conjunto ortonormal com respeito a essa
forma. (Repare que essa forma somente está bem definida porque |G| é invertível, já
que estamos supondo F de característica zero.)

Proposição 3.7. Se χρ e χσ são caracteres irredutíveis de G temos


(
1 se ρ e σ são representações equivalentes;
(χρ |χσ ) =
0 caso contrário.

Demonstração. Sejam V e W , respectivamente, os G-módulos associados às repre-


sentações ρ e σ. Fixando uma base B para V e uma base C para W , denotamos por
ρ i , j (g ) a entrada (i , j ) da matriz [ρ(g )]B e por σi , j (g ) a entrada (i , j ) da matriz [σ(g )]C .
Então
ÃÃ !Ã !!
d1 d2
1 X 1 X
tr[ρ(g )]B tr[σ(g −1 )]C = ρ i ,i (g ) σ j , j (g −1
X X
(χρ |χσ ) = )
|G| g ∈G |G| g ∈G i =1 j =1

20
à !
d1 X d2 X
1 X
= ρ i ,i (g )σ j , j (g −1 ) .
|G| i =1 j =1 g ∈G
Pelo Lema 3.6, se ρ e σ não são equivalentes,

ρ i ,i (g )σ j , j (g −1 ) = 0,
X
g ∈G

para quaisquer i = 1, 2, . . . , d 1 = dimF V e j = 1, 2, . . . , d 2 = dimF W e, portanto,


(χρ |χσ ) = 0. Se ρ e σ são equivalentes, pela Proposição 3.5, χσ = χρ e podemos supor
V = W , σ = ρ e B = C . Nesse caso, novamente pelo Lema 3.6, sabemos que
1 X
ρ i ,i (g )ρ j , j (g −1 ) 6= 0
|G| g ∈G

se e somente se i = j e, nesse caso, o resultado é 1/d 1 . Assim, fazendo os cancelamen-


tos devidos, temos
d1 d1
1 X 1
ρ i ,i (g )ρ i ,i (g −1 ) =
X X
(χρ |χρ ) = = 1,
i =1 |G| g ∈G d
i =1 1

o que demonstra o resultado no caso em que ρ e σ são equivalentes.

Corolário 3.8. Os caracteres irredutíveis de um grupo G formam um subconjunto li-


nearmente independente de Cl F (G). Em particular, o número de caracteres irredutíveis
de G é menor ou igual ao número de classes de conjugação de G

Demonstração. Seja λ1 χ1 + . . . + λk χk = 0 uma F -combinação linear de G-caracteres


irredutíveis χ1 , . . . , χk resultando na função nula. Pela ortonormalidade dos χ j , temos
que, para qualquer j = 1, 2, . . . , k

(χ j |λ1 χ1 + . . . + λk χk ) = λ j .

Por outro lado,


(χ j |λ1 χ1 + . . . + λk χk ) = (χ j |0) = 0.

Logo λ j = 0, para todo j = 1, 2, . . . , k. Como dimF Cl F (G) é o número de classes de


conjugação de G, segue que o número de caracteres irredutíveis de G não supera
o número de classes de conjugação de G. Como G é finito, existe uma quantia fi-
nita de caracteres irredutíveis e, portanto, de G-módulos irredutíveis a menos de G-
isomorfismo.

3.3 Determinando a decomposição de um G-módulo em irre-


dutíveis através de caracteres

Seja V um G-módulo e sejam U e W dois G-submódulos de V tais que V = U ⊕ W .


Denote por ρ a representação de G em V e por ρU e ρW as subrepresentações de ρ,
respectivamente, de G em U e de G em W . Denote ainda o caráter de ρU por χU e o
caráter de ρW por χW .

21
Proposição 3.9. Com a notação fixada acima, χρ = χU + χW .

Demonstração. Tome BU = {v 1 , . . . , v r } uma base para U como F -espaço vetorial e


BW = {v r +1 , . . . , v r +s } uma base para W . Escrevendo a matriz de ρ(g ) na base B = BU ∪
BW , obtemos uma matriz como a da Equação (2.2) formada por dois blocos [ρU (g )]BU
e [ρW (g )]BW e claramente a soma dos elementos da diagonal principal de [ρ(g )]B é
igual à soma dos elementos da diagonal principal desses dois blocos, obtendo assim

χρ (g ) = χU (g ) + χW (g );

para qualquer g ∈ G, de onde segue o resultado.

A fim de estabelecer uma recíproca para o Teorema de Maschke, precisaremos do


seguinte lema.

Lema 3.10. Sejam V um G-módulo U1 , U2 G-submódulos irredutíveis de V G-iso-


morfos entre si e W1 , W2 G-submódulos de V tais que V = U1 ⊕ W1 = U2 ⊕ W2 . Então
W1 ∼
=G W2 .

Demonstração. Se U1 = U2 , pelo Exercício 21, W1 ∼


=G W2 . Se U1 6= U2 , pela irredutibi-
lidade de ambos segue que U1 ∩ U2 = {0} e existe um G-submódulo W de V tal que
V = U1 ⊕U2 ⊕W . Sendo f : U1 → U2 um G-isomorfismo, considere fe : V → V linear de
modo que fe|U1 = f , fe|U2 = f −1 e fe|W é a identidade. Note que fe, tal como definida,
é linear e bijetora e, pelo Exercício 22, temos que fe é um G-isomorfismo. Considere
F : V → V linear de modo que F |U1 = 0 e F |U2 ⊕W é a identidade. Segue novavemente
do Exercício 22 que F é um G-endomorfismo de V . Além disso, Im(F ) = U2 ⊕ W e
ker F = U1 . Pelo Teorema do Isomorfismo, segue que U2 ⊕ W ∼
=G V /U1 . Por outro
lado, F ◦ fe também é um G-endomorfismo de V . Como fe é bijetor, Im(F ◦ fe) = Im(F ) =
U2 ⊕W e ker(F ◦ fe) = fe−1 (ker F ) = U2 . Usando novamente o Teorema do Isomorfismo,
temos U2 ⊕ W ∼
=G V /U2 , de onde segue o lema.

A partir disso, conseguimos estabelecer uma recíproca para o Teorema de Mas-


chke.

Teorema 3.11. Dado um G-módulo V , a decomposição do mesmo em submódulos


irredutíveis é única a menos de isomorfismo, isto é, se V = V1 ⊕ . . . ⊕ Vk = U1 ⊕ . . . ⊕Ul ,
onde todos os Vi e U j são irredutíveis, temos que k = l e podemos ordenar os U j de
modo que, para todo i entre 1 e k, Vi ∼
=G Ui .

Demonstração. A demonstração é feita por indução sobre k. Para k = 1, V deve ser


irredutível e o resultado é imediato. Suponha que o resultado é válido para qualquer
G-módulo que é soma de k submódulos irredutíveis e considere V = V1 ⊕ . . . ⊕ Vk+1 =
U1 ⊕ . . . ⊕Ul . Denotando por χW o carárter da representação de G em um G-módulo
W , temos que (χV1 |χV ) > 0, pela Proposição 3.7 e pela Proposição 3.9. Mais ainda,
o resultado deve ser igual ao número de componentes Vi e U j que são G-isomorfas

22
a V1 , assim existe um submódulo U j , o qual renomeamos como sendo U1 , que é G-
isomorfo a V1 . Pelo lema anterior, V2 ⊕. . .⊕Vk+1 ∼
=G U2 ⊕. . .⊕Ul e, da hipótese indutiva,
segue que k+1 = l e existe uma reordenação dos U j tal que V j ∼
=G U j , para todo j entre
2 e k + 1.

Esse resultado possui uma consequência bastante interessante: o caráter de uma


representação determina a representação a menos de equivalência. Essa propriedade
segue da Proposição 3.5 e do corolário seguinte.

Corolário 3.12. Sejam ρ : G → AutF (V ) e σ : G → AutF (W ) duas representações de G.


Se χρ = χσ as representações ρ e σ são equivalentes.

Demonstração. Suponha V ∼
=G a 1V1 ⊕. . .⊕a k Vk , onde os V j são uma lista completa de
G-módulos irredutíveis dois a dois não isomorfos (são em número finito pelo Corolá-
rio 3.8) e a i Vi denota a soma direta de a i cópias de Vi para um inteiro não negativo a i .
Analogamente, temos W = b 1V1 ⊕. . . b k Vk (estamos assumindo as somas nos mesmos
módulos, pois pode ocorrer de algum(ns) a i ou algum(ns) b j ser(em) nulo(s)). Deno-
tando por χi o caráter da representação associada a Vi , i = 1, . . . , k, se χρ = χσ , temos
que
a 1 χ1 + . . . + a k χ k = χρ = χσ = b 1 χ 1 + . . . + b k χ k .

Como estamos assumindo o corpo F de característica zero e os coeficientes acima


são inteiros, temos que a 1 , . . . , a k , b 1 , . . . , b k ∈ F , mas pelo Corolário 3.8, caracteres ir-
redutíveis são linearmente independentes e, portanto, a j = b j , para todo j = 1, . . . , k.
Logo V ∼
=G W .

Tendo por base esses resultados, veremos que, se conhecermos, a menos de iso-
morfismo, todos os G-módulos irredutíveis, seremos capazes de determinar a de-
composição em irredutíveis de qualquer G-módulo, isto é, quais G-módulos irredu-
tíveis aparecem na decomposição de um G-módulo dado e com que multiplicidade,
sem obter uma base para cada G-submódulo irredutível de V . A fim de conseguir
isso, vamos considerar a representação regular de um grupo G qualquer. Como visto
no Exemplo 3.4, denotando por χ o caráter dessa representação, temos χ(1) = |G| e
χ(g ) = 0 se g 6= 1. Assim, se ψ é o caráter de uma representação de G em um G-módulo
irredutível V , temos que

1 X 1 |G| dimF V
(χ|ψ) = χ(g )ψ(g −1 ) = χ(1)ψ(1) = = dimF V.
|G| g ∈G |G| |G|

Por outro lado, como apontado na demonstração do teorema anterior, esse valor deve
corresponder ao número de G-submódulos irredutíveis G-isomorfos a V que apare-
cem na decomposição de FG em irredutíveis. Disso segue imediatamente o próximo
resultado.

Teorema 3.13. Dado um grupo finito G, sejam V1 ,V2 , . . . ,Vk todos os G-módulos irre-
dutíveis a menos de isomorfismo, considerando F G munido da representação regular

23
temos
FG ∼
=G d 1V1 ⊕ . . . ⊕ d k Vk ,
onde d i = dimF Vi , para todo i = 1, 2, . . . , k. Em particular,
k
d i2 .
X
|G| =
i =1
Vejamos, através de um exemplo, como esses resultados podem nos auxiliar a
obter a decomposição de um G-módulo qualquer como soma de irredutíveis.

Exemplo 3.14. Vamos obter, através dessas propriedades, a decomposição em irre-


dutíveis da representação de S 3 dada no Exemplo 2.19. Pelo Teorema 3.13 e pelos
Exercícios 23 e 24 temos que os S 3 -módulos irredutíveis, a menos de isomorfismo,
são: módulo V1 de dimensão 1 com a representação trivial, módulo V2 de dimensão
1 com a representação sinal e módulo V3 de dimensão 2 isomorfos ao submódulo de
F S 3 com a representação regular gerado por 1+(12)−(13)−(132) e 1+(23)−(123)−(13).
Denote por χi (resp. ρ i ) o caráter (resp. representação) associado a Vi , para i = 1, 2, 3.
Exibimos a seguir cada caráter avaliado em um elemento de cada uma das classes
de conjugação de S 3 . Claramente χ1 (1) = χ1 (12) = χ1 (123) = 1. Já χ2 (1) = −χ2 (12) =
χ2 (123) = 1. Para calcular χ3 , vamos exibir as matrizes de ρ 3 (σ) com respeito à base
B = {1 + (12) − (13) − (132), 1 + (23) − (13) − (123)}.
" # " #
1 1 0 1
[ρ 3 (12)]B = e [ρ 3 (123)]B = .
0 −1 1 −1
Portanto, χ3 (1) = 2, χ3 (12) = 0 e χ3 (123) = −1.
Vamos calcular agora o caráter χ da representação ρ de CS 3 induzida da conjuga-
ção. Calculando as matrizes de ρ(σ) com respeito à base canônica de CS 3 :
C = {1, (12), (13), (23), (123), (132)}, temos:
   
1 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0
   
 0 1 0 0 0 0   0 0 1 0 0 0 
   
   
 0 0 0 1 0 0   0 0 0 1 0 0 
[ρ(12)]C =  
 e [ρ(123)]C = 
  .
 0 0 1 0 0 0   0 1 0 0 0 0 

   
 0 0 0 0 0 1   0 0 0 0 1 0 
   
0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 1
Portanto, χ(1) = 6, χ(12) = 2 e χ(123) = 3. Por outro lado, CS 3 = aV1 ⊕ bV2 ⊕ cV3 como
S 3 -módulo para inteiros não negativos a, b, c. Pela Proposição 3.9, devemos ter χ =
aχ1 +bχ2 +cχ3 . Aplicando isso a um elemento de cada uma das classes de conjugação
de S 3 obtemos 
 a + b + 2c = 6


a −b = 2 ,


 a +b −c = 3
que tem como solução a = 3, b = 1, c = 1. Repare que nesse método não precisamos
ter um insight para encontrar os submódulos de CS 3 explicitamente. Só tivemos que
conhecer o caráter da representação e os caracteres irredutíveis. Outra maneira seria
calcular explicitamente (χ|χ1 ), (χ|χ2 ) e (χ|χ3 ), obtendo, respectivamente, a, b e c.

24
3.4 Número de G-módulos irredutíveis e tábua de caracteres
irredutíveis

Como apontado no início da demonstração do Corolário 3.12, temos o seguinte re-


sultado.

Proposição 3.15. O número de caracteres irredutíveis de um grupo G é menor do que


ou igual ao número de classes de conjugação de G.

Nosso propósito nessa seção é mostrar que, quando trabalhamos sobre um corpo
F algebricamente fechado e de característica zero, o que estamos assumindo desde a
Seção 3.2, o número de G-caracteres irredutíveis é exatamente o número de classes
de conjugação do grupo G.

Lema 3.16. Dadas uma representação ρ : G → AutF (V ) de G e f ∈ Cl F (G), a aplicação


ρ f : V → V dada por
ρf = f (g −1 )ρ(g )
X
g ∈G

é um G-endomorfismo de V . Mais ainda, se ρ é irredutível, ρ f = λId, onde

|G|
λ= (χρ | f ).
dimF V

Demonstração. Como ρ(g ) é operador linear de V , para todo g ∈ G, temos que ρ f


também o é. Para mostrar que ρ f é G-endomorfismo, basta mostrar que, para todo
h ∈ G e todo v ∈ V , h ∗ ρ f (v) = ρ f (h ∗ v), isto é ρ(h) ◦ ρ f (v) = ρ f ◦ ρ(h)(v), o que
ocorre se e somente se ρ f (v) = ρ(h −1 ) ◦ ρ f ◦ ρ(h)(v), para todo v ∈ V e, portanto, ρ f =
ρ(h −1 ) ◦ ρ f ◦ ρ(h) para todo h ∈ G. De fato, dado h ∈ G, temos

ρ(h −1 ) ◦ ρ f ◦ ρ(h) = ρ(h −1 ) f (g −1 )ρ(g h) = f (g −1 )ρ(h −1 g h)


X X
g ∈G g ∈G

f (h −1 g −1 h)ρ(h −1 g h) = ρ f .
X
=
g ∈G

No caso em que ρ é irredutível, segue do Lema de Schur que ρ f = λId para algum
λ ∈ F . Assim, qualquer que seja a base B de V , a matriz [ρ f ]B é a matriz identidade
multiplicada pelo escalar λ e tr[ρ f ]B = λ dimF V . Por outro lado

1 X
f (g −1 )tr[ρ(g )]B = f (g −1 )χρ (g ) = |G| f (g −1 )χρ (g ) = |G|(χρ | f ),
X X
tr[ρ f ]B =
g ∈G g ∈G |G| g ∈G

de onde segue o resultado.

Denote por χ1 , . . . , χk todos os G-caracteres irredutíveis de um grupo G e denote


por U o subespaço de Cl G (F ) gerado por estes caracteres. Para cada i = 1, 2, . . . , k,
representamos por K i o núcleo da transformação linear Ti : Cl F (G) → F dada por
Ti ( f ) = (χi | f ), para toda f ∈ ClF (G). Como Ti (χi ) 6= 0, temos que dimF K i = n − 1,
onde n = dimF Cl F (G), isto é, cada K i possui codimensão 1 em Cl F (G). Além, disso, se

25
1 ≤ i ≤ k −1, temos K 1 ∩K 2 ∩. . .∩K i 6⊂ K i +1 , pois χi +1 ∈ K 1 ∩. . .∩K i , mas não pertence a
K i +1 . Utilizando indução, segue do Exercício 28 que dimF K 1 ∩. . .∩K k = n −k. Repare
ainda que U ∩ (K 1 ∩ . . . ∩ K k ) = {0}, desse modo temos que Cl F (G) = U ⊕ (K 1 ∩ . . . ∩ K k )
e passamos a denotar K 1 ∩ . . . ∩ K k por U ⊥ . Considere f ∈ U ⊥ e ρ : G → AutF (F G) a
representação regular. Decompomos F G ∼ =G W1 ⊕. . .⊕Wm em soma de G-submódulos
irredutíveis e denotamos para i = 1, . . . , m a restrição da representação ρ a Wi por ρ i .
Pelo Lema 3.16, ρ f é um G-endomorfismo de F G. Dado v ∈ F G, escrevemos v de
maneira única como sendo v = w 1 + . . . + w m , onde w i ∈ Wi . Assim, para qualquer
v ∈ FG, temos
m X m X m
ρ f (v) = f (g −1 )ρ(g )(w i ) = f (g −1 )ρ i (g )(w i ) = ρ i f (w i )
X X X
i =1 g ∈G i =1 g ∈G i =1

m
X |G|
= (χi | f )w i = 0,
i =1 dim FV

Repare que a penúltima igualdade acima segue também do Lema 3.16 e a última
igualdade segue de f ∈ U ⊥ . Em particular,

0 = ρ f (1) = f (g −1 )ρ(g )(1) = f (g −1 )g ,


X X
g ∈G g ∈G

mas como G é uma base de F G, temos f (g ) = 0 para todo g ∈ G e como tomamos


f arbitrária em U ⊥ , segue que Cl F (G) = U e, como consequência, temos o seguinte
resultado.

Teorema 3.17. O conjunto de todos os G-caracteres irredutíveis formam uma base para
Cl F (G). Em particular, o número de caracteres irredutíveis de G é igual ao número de
classes de conjugação de G.

Agora, utilizando os diversos resultados desse capítulo, mostraremos através de


um exemplo simples como determinar todos os caracteres irredutíveis de um grupo
sobre C (ou qualquer corpo algebricamente fechado de característica zero). Os Exer-
cícios 34 e 35 também dizem respeito ao cálculo da tábua de caracteres irredutíveis
de um grupo sobre C.

Exemplo 3.18. Vamos obter uma tábua de caracteres irredutíveis para S 3 sobre C
sem determinar explicitamente uma decomposição de CS 3 munido da representação
regular, como feito no Exercício 24. Cada linha da tábua corresponderá a um caráter
irredutível e cada coluna a uma classe de conjugação do grupo. As entradas da tábua
são dadas pelo valor do caráter da linha da entrada avaliado na classe de conjugação
da coluna da entrada. Como o número de caracteres irredutíveis será igual ao número
de classes de conjugação, a tábua terá o mesmo número de linhas e de colunas. No
caso de S 3 , teremos

(1) (12) (123)


χ1 χ1 (1) χ1 (12) χ1 (123)
χ2 χ2 (1) χ2 (12) χ2 (123)
χ3 χ3 (1) χ3 (12) χ3 (123)

26
Convém considerar sempre o primeiro caráter como sendo o associado à representa-
ção irredutível trivial, assim devemos ter

(1) (12) (123)


χ1 1 1 1
χ2 χ2 (1) χ2 (12) χ2 (123)
χ3 χ3 (1) χ3 (12) χ3 (123)

Já determinamos anteriormente que os S 3 -módulos irredutíveis restantes pos-


suem dimensão 1 e 2. Isso fornece automaticamente o preenchimento da primeira
coluna da tábua. Observe que poderíamos chegar a essas dimensões usando o Teo-
rema 3.13 já que S 3 possui três classes de conjugação e a única maneira de escrever
|S 3 | como soma de três quadrados não nulos é justamente 6 = 12 + 12 + 22 . Como
o caráter do elemento neutro de um grupo fornece sempre a dimensão do mesmo,
temos

(1) (12) (123)


χ1 1 1 1
χ2 1 χ2 (12) χ2 (123)
χ3 2 χ3 (12) χ3 (123)

se convencionamos considerar as dimensões dos módulos em ordem crescente de


cima para baixo. Como o S 3 -módulo associado a χ2 possui dimensão 1, temos que,
para quaisquer σ, τ ∈ S 3 , χ2 (στ) = χ2 (σ)χ2 (τ). Como S 3 é gerado pelas transposições
e todas elas estão na classe de conjugação de (12), o valor de χ2 (12) determina o valor
de χ2 (σ) para toda σ ∈ S 3 . Por outro lado, (12)2 = (1) e, usando novamente que os
caracteres preservam a multiplicação no caso de dimensão 1, temos que χ2 (12) = ±1,
mas χ2 (12) 6= 1 pois, do contrário, obteríamos o caráter associado à representação
trivial. Assim χ2 (12) = −1 e χ2 (123) = χ2 (13)χ2 (12) = χ(12)2 = 1. Assim, avançamos
mais um pouco no preenchimento da tábua.
(1) (12) (123)
χ1 1 1 1
χ2 1 −1 1
χ3 2 χ3 (12) χ3 (123)
Para obter os valores restantes recorremos às relações de ortogonalidade. Delas
segue que
(
2 + 3χ3 (12) + 2χ3 (123) = 0
2 − 3χ3 (12) + 2χ3 (123) = 0,
já que a classe de conjugação de (12) possui três elementos e a de (123) possui dois
elementos. Assim, em concordância com o Exercício 24, obtemos

(1) (12) (123)


χ1 1 1 1
.
χ2 1 −1 1
χ3 2 0 −1

27
3.5 Caracteres e G-homomorfismos

Nesta seção, mostraremos como a forma bilinear simétrica definida na Seção 3.2 jun-
tamente com o Lema de Schur nos permite determinar dimF HomG (V,W ) quando F
é algebricamente fechado de característica zero.
Sejam V e W dois G-módulos cuja decomposição em irredutíveis é dada por

V∼
=G m 1V1 ⊕ . . . ⊕ m k Vk e W ∼
=G n 1W1 ⊕ . . . ⊕ n k Wk , (3.1)

sendo V1 ∼
=G W1 , . . . ,Vk ∼
=G Wk uma lista completa de G-módulos irredutíveis sobre F a
menos de G-isomorfismo e os inteiros não negativos m 1 , . . . , m k (n 1 , . . . , n k ) o número
de submódulos isomorfos ao Vi (Wi ) correspondente que aparecem na decomposi-
ção em questão, isto é,

m i Vi ∼
=G Vi ,1 ⊕ . . . ⊕ Vi ,mi ⊂ V (n i Wi ∼
=G Wi ,1 ⊕ . . . ⊕ Wi ,ni ⊂ W ),

com Vi , j ∼
=G Vi e (Wi ,l ∼
=G Vi ), para todo j = 1, . . . , m i ( j = 1, . . . , n i ) se m i 6= 0 (se n i 6= 0).
Sendo i um inteiro com 1 ≤ i ≤ k e j , l inteiros tais que 1 ≤ j ≤ m i se m i 6= 0 e 1 ≤ l ≤ n i
se n i 6= 0, denote por ϕi , j ,l : Vi , j → Wi ,l um G-isomorfismo fixado. Denotemos ainda
por ϕ
ei , j ,l : V → W o G-homomorfismo que satisfaz
(
ϕi , j ,l (v) se v ∈ Vi , j
ϕ
ei , j ,l (v) =
0 se V ∈ Vp,q com (p, q) 6= (i , j ),

e estendido por linearidade para todo V .

Proposição 3.19. Seguindo as notações acima, fixados 1 ≤ i ≤ k e 1 ≤ j ≤ m i o con-


junto {ϕi , j ,l : 1 ≤ l ≤ n i } constitui uma base para HomG (Vi , j ,W ). Consequentemente,
o conjunto {ϕ
ei , j ,l : 1 ≤ i ≤ k; 1 ≤ j ≤ m i ; 1 ≤ l ≤ n i } é uma base para HomG (V,W ).

Antes de apresentar a demonstração, convém observar que no enunciado da pro-


posição há um abuso de notação, ao denotar por ϕi , j ,l na verdade a aplicação ı ◦ϕi , j ,l
sendo ı a imersão natural de Wi ,l em W .

Demonstração. Fixados i e j como no enunciado da proposição, considere ϕ : Vi , j →


W um G-homomorfismo. Segue do Lema de Schur, do Teorema do Isomorfismo e do
Teorema 3.11 que Im ϕ ⊆ Wi ,1 ⊕ . . . ⊕Wi ,ni e podemos considerar ϕ : Vi , j → Wi ,1 ⊕ . . . ⊕
Wi ,ni . Para cada l = 1, 2, . . . , n i , denote por πl o G-endomorfismo de Wi ,1 ⊕ . . . ⊕ Wi ,ni
que é a projeção dada por
πl (w 1 + . . . + w ni ) = w l ,

para quaisquer w s ∈ Wi ,s , s = 1, . . . , n i . Pelo Exercício 21, πl é um G-homomorfismo.


Assim, para cada l entre 1 e n i , temos πl ◦ϕ ∈ HomG (Vi , j ,Wi ,1 ⊕. . .⊕Wi ,ni ). Além disso,
é de simples verificação de que

ϕ = π1 ◦ ϕ + . . . + πn1 ◦ ϕ.

28
Como, para cada l , a imagem de πl ◦ ϕ está contida em Wi ,l ∼
=G Vi , j irredutíveis, pelo
Exercício 18, temos que existe λl ∈ F tal que πl ◦ ϕ = λl ϕi , j ,l e, portanto,

ϕ = λ1 ϕi , j ,1 + λ2 ϕi , j ,2 + . . . + λi , j ,n1 ϕi , j ,ni

e {ϕi , j ,l : 1 ≤ l ≤ n i } gera HomG (Vi , j ,W ). Esse conjunto também é linearmente inde-


pendente, pois se λ1 ϕi , j ,1 + . . . + λi , j ,ni ϕi , j ,ni = 0, , temos que, para cada l entre 1 e
n i , πl ◦ λl ϕi , j ,l = 0, implicando λl = 0. A última afirmação da proposição segue do
que acabamos de provar e de que dado ψ ∈ HomG (V,W ), cometendo novamente um
pequeno abuso de notação, temos

ψ= ψi , j ,
X
1≤i ≤k;1≤ j ≤m i

sendo ψi , j a restrição de ψ a Vi , j . Seja ψ


e i , j = ψi , j ◦p i , j , sendo p i , j : V → Vi , j a projeção
dada por p i , j (v 1,1 +. . .+v k,mk ) = v i , j , sendo cada v p,q pertencente a Vp,q . Desse modo,
ψ=ψ
e 1,1 + . . . + ψ
e k,mk . Para cada ψ e i , j , temos
à !
ni ni
ψ
e i , j = ψi j ◦ p i j = λl ϕi , j ,l ◦ p i , j = λl ϕ
X X
ei , j ,l .
l =1 l =1

Assim B = {ϕ
ei , j ,l : 1 ≤ i ≤ k, 1 ≤ j ≤ m i , 1 ≤ l ≤ n i } gera HomG (V,W ).
λi , j ,l ϕ
X
Agora suponha ei , j ,l = 0. Em particular, fixados 1 ≤ p ≤ k e 1 ≤ q ≤ m k
i , j ,l
para qualquer 0 6= v ∈ Vp,q , 1 ≤ p ≤ k e 1 ≤ q ≤ m i , temos

λi , j ,l ϕ
X
ei , j ,l (v) = 0,
i , j ,l

implicando
np
λp,q,l ϕ
X
e p,q,l (v) = 0.
l =1
Como ϕ
e p,q,l (v) ∈ Wp,l então λp,q,l ϕ
e p,q,l (v) = 0, para todo l = 1, . . . , n p . Como v 6= 0
e ϕi , j ,l um G-isomorfismo, temos λp,q,l = 0. Assim B é base de HomG (V,W ).

Em particular, obtemos a dimensão de HomG (V,W ).

Corolário 3.20. Sejam V e W dois G-módulos cujas decomposições em módulos irre-


dutíveis são tais como na Equação (3.1). Temos que

dimF HomG (V,W ) = m 1 n 1 + m 2 n 2 + . . . + m k n k = dimF HomG (W,V ).

Cabe observar que a demonstração da proposição anterior não utiliza charF = 0,


somente F algebricamente fechado e que charF não divide |G|. No entanto, quando,
além disso, trabalhamos com um corpo F de característica zero, o caráter de uma re-
presentação a determina a menos de equivalência. Assim, da ortonormalidade dos
caracteres irredutíveis com respeito a forma bilinear simétrica (·|·), temos uma ma-
neira de calcular a dimensão de HomG (V,W ) utilizando-a.

Corolário 3.21. Sejam V e W dois G-módulos e χV e χW seus respectivos caracteres.


Então dimF HomG (V,W ) = (χV |χW ).

29
Exercícios

Exercício 25. Seja ρ : G → AutF (V ) uma representação de G em V . Mostre que χρ (1) =


dimF V .

Exercício 26. Fixados um grupo G e um corpo F mostre que Cl F (G) munido da mul-
tiplicação por escalar e adição usuais é um F -espaço vetorial. Mostre ainda que (·|·) :
Cl F (G) × Cl F (G) → F é uma forma bilinear simétrica.

Exercício 27. Sejam C 1 , . . . ,C k ⊆ G as classes de conjugação de um grupo finito G e,


para cada i entre 1 e k, denote por δi : G → F a aplicação que satisfaz
(
1 se g ∈ C i ;
δi (g ) =
0 se g 6∈ C i .

Mostre que {δ1 , . . . , δk } forma uma base de Cl F (G) e que, portanto, a dimensão de
Cl F (G) é igual ao número de classes de conjugação em G.

Exercício 28. Sejam V um F -espaço vetorial de dimensão finita e sejam W e U su-


bespaços de V sendo que W possui codimensão 1 e U 6⊂ W . Então dimF (U ∩ W ) =
dimF U − 1. (Use que V = U + W .)

Exercício 29. Seja G um grupo finito abeliano. Mostre que o número de G-caracteres
irredutíveis sobre um corpo algebricamente fechado de característica zero é |G|. Mos-
tre ainda que um grupo G é abeliano se e somente se todo G-módulo irredutível pos-
sui dimensão 1.

Exercício 30. Descreva todos os caracteres irredutíveis sobre C de um grupo cíclico


de ordem n.

Exercício 31. Considere G = {±1, ±i} munido da multiplicação usual de números


complexos. Mostre que RG = W1 ⊕ W2 ⊕ W3 como soma de G-módulos irredutíveis,
onde {1+i+(−1)+(−i)} é uma base de W1 (repare que 1+(−1) 6= 0), {1−i+(−1)−(−i)}
é uma base de W2 e {1 − (−1), i − (−i)} é uma base de W3 . Explique por que isso não
contradiz o Teorema 3.13. Obtenha a decomposição de CG como soma direta de G-
módulos irredutíveis.

Exercício 32. Seja G um grupo e ρ : G → V uma representação, sendo V um F -espaço


unidimensional. Se g ∈ G possui ordem n, mostre que (χρ (g ))n = 1.

Exercício 33. Seja G um grupo e seja g ∈ G tal que G é gerado pela classe de conju-
gação de g . Mostre que se ρ : G → V e ψ : G → W são representações e dimF V = 1 =
dimF W e χρ (g ) = χψ (g ) então V e W são G-isomorfos.

Exercício 34. O objetivo desse exercício é obter a tábua de caracteres irredutíveis de


A 4 sobre C, o subgrupo formado por todas as permutações pares S 4 .

(a) Forneça todas as classes de conjugação de A 4 a fim de determinar o número de


caracteres irredutíveis.

30
(b) Determine as dimensões de todos os A 4 -módulos irredutíveis dois a dois não iso-
morfos.

(c) Utilizando os últimos dois exercícios, encontre todos os A 4 -módulos unidimen-


sionais a menos de G-isomorfismo.

(d) Utilizando as relações de ortogonalidade dos caracteres irredutíveis, determine


os caracteres irredutíveis restantes.

Exercício 35. Nesse exercício você deve determinar a tábua de caracteres irredutíveis
de G = {(1), (12), (34), (12)(34), (13)(24), (14)(23), (1324), (1423)} ≤ S 4 .

(a) Forneça todas as classes de conjugação de G.

(b) Determine as dimensões de todos os G-módulos irredutíveis dois a dois não iso-
morfos.

(c) Forneça os caracteres dos G-módulos unidimensionais.

(d) Encontre os demais caracteres irredutíveis e forneça a tábua de caracteres irredu-


tíveis de G.

Exercício 36. Seja V um G-módulo irredutível sobre um corpo F algebricamente fe-


chado de característica zero. Mostre que V é irredutível se e somente se o caráter χ
associado a V satisfaz (χ|χ) = 1. (Sugestão: use os corolários 3.20 e 3.21.)

31
32
Capítulo 4

Representações restritas, induzidas


e os teoremas de Frobenius e
Clifford

4.1 Representações induzidas e o Teorema de Frobenius

Dada uma representação ρ : G → AutF (V ) e um subgrupo H de G existe uma maneira


bastante natural de definir a restrição de ρ a H , denotada por ρ ↓H , por

ρ ↓H (h) := ρ(h); ∀h ∈ H ,

no entanto, partir de uma representação de um subgrupo de G e dela induzir uma


representação de G exige um trabalho maior.
Considere ρ : H → V uma representação de um subgrupo H de G em um F -
espaço vetorial V . Dada uma transversal à esquerda de H em G, isto é, elementos
(G:H
[)
g 1 , g 2 , . . . , g (G:H ) ∈ G tais que G = g i H , considere o F -espaço vetorial g 1V ⊕ . . . ⊕
i =1
g (G:H )V , onde para cada i = 1, 2, . . . , (G : H ), g i V é uma cópia do F -espaço vetorial V .
A cópia do elemento v ∈ V em g i V é denotada por g i v. Define-se a representação
induzida de ρ como sendo o homomorfismo ρ ↑G : G → AutF (g 1V ⊕ . . . ⊕ g (G:H )V ) que,
para todo g ∈ G, todo g i na transversal e todo v ∈ V é dada por

ρ ↑G (g )(g i v) := g j ρ(h)(v),

e é estendida por linearidade sobre g 1V ⊕ . . . ⊕ g (G:H )V , sendo h o único elemento de


H e g j o único elemento da transversal que satisfazem g g i = g j h. Ou seja, h é o único
elemento de H tal que h = g −1
j
g g i . Assim, podemos reescrever

ρ ↑G (g )(g i v) = g j ρ(g −1
j g g i )(v), (4.1)

sendo g j o único elemento da transversal tal que g −1


j
g gi ∈ H .
Vamos checar que, de fato, ρ ↑G (g ) é um F -automorfismo de g 1V ⊕ . . . ⊕ g (G:H )V ,
qualquer que seja g ∈ G. Primeiro note que ρ ↑G (g )(g i V ) ⊂ g j V onde g g i = g j h,

33
para algum h ∈ H , já que essa condição não depende do elemento de g i V no qual
ρ ↑G (g ) é aplicada. Por outro lado ρ(h)(v) = 0 se e somente se v = 0, então, como
dim g i V = dim g j V , temos que ρ ↑G (g )(g i V ) = g j V . Suponha agora ρ ↑G (g )(g i V ) =
ρ ↑G (g )(g k V ). Então existem h, h 0 ∈ H satisfazendo g g i = g j h e g g k = g j h 0 , o que
implicaria g i , g k ∈ g −1 g j H e como g i , g k pertencem a uma transversal à esquerda de
H em G temos g i = g k . Portanto ρ ↑G (g ) é injetora (porquê?) e, portanto, bijetora.
A aplicação ρ ↑G (g ) também é linear em cada g i V (e, tal como definida, é linear),
pois, se u, v ∈ V e λ ∈ F , temos

ρ ↑G (g )(g i u + λg i v) = ρ ↑G (g )(g i (u + λv)) = g j ρ(h)(u + λv),

onde h = g −1
j
g g i . Como ρ(h) é linear, temos

ρ ↑G (g )(g i u + λg i v) = g j ρ(h)(u) + λg j ρ(h)(v) = ρ ↑G (g )(g i u) + λρ ↑G (g )(g i v).

Verifiquemos agora que ρ ↑G é homomorfismo de grupos. Sejam g e g 0 elementos


arbitrários de G, então

ρ ↑G (g g 0 )(g i v) = g j ρ(g −1 0
j g g g i )(v),

sendo g j o único elemento da transversal à esquerda de modo que g −1


j
g g 0 g i ∈ H . Seja
g k o único elemento da transversal dada de modo que g k−1 g 0 g i ∈ H . Note que, nesse
caso, g −1
j
g g k ∈ H . Assim

ρ ↑G (g g 0 )(g i v) = g j ρ(g −1 −1 0 G −1 0
j g g k )(ρ(g k g g i )(v)) = ρ ↑ (g )(g k ρ(g k g g i )(v)).

Novamente, da definição de ρ ↑G , segue que

ρ ↑G (g g 0 )(g i v) = ρ ↑G (g )(ρ ↑G (g 0 )(g i v)) = ρ ↑G (g 0 ) ◦ ρ ↑G (g 0 )(g i v).

Outro fato importante a se verificar é que, escolhendo-se outra transversal à esquerda


qualquer, obtém-se uma representação equivalente. Sejam então {g 1 , g 2 , . . . , g k } e
{h 1 , h 2 , . . . , h k } duas transversais à esquerda de H em G tais que h i ∈ g i H para todo
i = 1, . . . , k.
Considere a aplicação f : g 1V ⊕ . . . ⊕ g k V → h 1V ⊕ . . . ⊕ h k V dada por f (g i v) =
h i w, para todo i = 1, 2, . . . , k e estendida por linearidade para todo o espaço, onde
w = ρ(h)(v) sendo h ∈ H o único elemento que satisfaz g i = h i h. Também podemos
escrever
f (g i v) = h i ρ(h i−1 g i )(v),

sendo h i o único elemento da transversal {h 1 , . . . , h k } tal que h i−1 g i ∈ H .


Para checar que f é linear, basta mostrar que a mesma é linear em cada g i V . De
fato, considerando g i v 1 , g i v 2 ∈ g i V , λ ∈ F , temos que

f (g i v 1 + λg i v 2 ) = f (g i (v 1 + λv 2 )) = h i w,

34
onde g i = h i h e w = ρ(h)(v 1 + λv 2 ) = ρ(h)(v 1 ) + λρ(h)(v 2 ). Logo

f (g i v 1 + λg i v 2 ) = h i [ρ(h)(v 1 ) + λρ(h)(v 2 )] = h i ρ(h)v 1 + λh i ρ(h)v 2 = f (v 1 ) + λ f (v 2 ).

Para checar que f é bijetora, basta checar que f |g i V : g i V → h i V é bijetora para


cada i . Dado que estamos trabalhando com espaços vetoriais de dimensão finita com
a mesma dimensão, basta checar a injetividade. Suponha que f (g i v) = h i 0, então
existe h ∈ H satisfazendo ρ(h)(v) = 0, mas ρ(h) é um F -automorfismo de V e, por-
tanto, v = 0. Assim ker f |g i V = {g i 0} e f é injetora. Finalmente, denotando por σ e τ,
respectivamente, as representações induzidas de ρ a g 1V ⊕. . .⊕g k V e a h 1V ⊕. . .⊕h k V ,
vamos mostrar que, dado g ∈ G, f (σ(g )(g i v)) = τ(g )( f (g i v)), para quaisquer v ∈ V e
i = 1, . . . , k. De fato, para qualquer i = 1, . . . , k e qualquer v ∈ V , temos

f (σ(g )(g i v)) = f (g j ρ(g −1 −1 −1 −1


j g g i )(v)) = h j ρ(h j g j )(ρ(g j g g i )(v)) = h j ρ(h j g g i )(v)

= h j ρ(h −1 −1 −1 −1
j g h i h i g i )(v) = h j ρ(h j g h i )(ρ(h i g i )(v))

= τ(g )(h i ρ(h i−1 g i )(v) = τ(g )( f (g i v)),

sendo g j e h j , respectivamente, os únicos elementos das transversais à esquerda


g 1 , . . . , g k e h 1 , . . . , h k tais que g −1
j
g g i ∈ H e h −1
j
g j ∈ H . Devido à linearidade de f ,
segue que f preserva a ação de G e é portanto um G-isomorfismo. Assim, obtemos o
seguinte resultado.

Proposição 4.1. Seja H um subgrupo de um grupo finito G, seja ρ : H → AutF (V ) uma


representação de H com σ e τ duas representações induzidas de ρ. Então σ e τ são
representações equivalentes.

Exemplo 4.2. Considere H = A 3 o subgrupo de G = S 3 formado por todas as permu-


tações pares de S 3 , a saber, a identidade e os 3-ciclos. Considere ρ : A 3 → AutF (C) a
representação que satisfaz
à p !
−1 + i 3
ρ(123)(z) = z.
2

Então o S 3 −módulo V associado a ρ ↑G é C ⊕ (12)C ∼ = C2 munido da ação que satisfaz


ÃÃ p ! Ã p ! !
−1 + i 3 −1 − i 3
(12) ∗ (z 1 , z 2 ) = (z 2 , z 1 ) e (13) ∗ (z 1 , z 2 ) = z2 , z1 ,
2 2

já que (13) = (12)(132) e ρ(132)(z) = ρ(123) ◦ ρ(123)(z). Note então que χ(1) = 2,
χ(12) = 0 e χ(123) = −1 e, portanto, V , como S 3 -módulo, é irredutível pois seu caráter
é irredutível (v. tábua construída na Seção 3.4).

Exemplo 4.3. Considere a representação ρ do grupo H = {±1, ±i } em R2 tal como


no Exemplo 2.3. Vamos construir a representação induzida por essa no subgrupo
multiplicativo G = {±1, ±i , ± j , ±k} dos quaternios. Vamos considerar a transversal
T = {1, j }. O G-módulo associado será então R2 ⊕ j R2 ∼= R4 . Faremos essa identifica-
ção do seguinte modo: denotaremos (x, y) + j (z, w) por (x, y, z, w). Assim:

ρ ↑G (i )(x, y, z, w) = (−y, x, w, −z), ρ ↑G ( j )(x, y, z, w) = (−z, −w, x, y) e

35
ρ ↑G (k)(x, y, z, w) = (w, −z, y, −x),

já que i j = k = j (−i ) e k j = −i = 1(−i ).

Vejamos como se comporta o caráter de uma representação induzida. Denotare-


mos o caráter de ρ ↑G por χ ↑G . Primeiro, repare que ρ ↑G (g )(g i v) ∈ g i V se e somente
se g i−1 g g i ∈ H pela Equação (4.1). Note que se isso ocorre e g 0 H = g i H , temos que
g 0 = g i h para algum h ∈ H e, portanto,

g 0−1 g g 0 = h −1 g i−1 g g i h ∈ H

e essa propriedade independe do representante tomado na transversal. Assim, se


na classe de conjugação de g ∈ G não se encontra qualquer elemento de H , temos
que χ ↑G (g ) = 0. Por outro lado, se na classe de conjugação de g ∈ G encontra-se
h ∈ H e g i é um elemento da transversal à esquerda para o qual g i−1 g g i ∈ H , perceba
que podemos restringir ρ ↑G (g ) a g i V e que o traço da matriz desse operador linear
de g i V coincidirá com o traço do operador ρ(g i−1 g g i ) de V . Escolhendo uma base
B = B 1 ∪ . . . ∪ B k de g 1V ⊕ . . . ⊕ g k V , sendo B i base de g i V para todo i , fica claro, ao
considerarmos [ρ ↑G (g )]B que essa matriz é uma matriz de ordem (G : H )d de blocos
d ×d , sendo d a dimensão de V . Como observado anteriormente, ρ ↑G (g )(g i V ) = g j V
onde g g i ∈ g j H . Assim, se i 6= j , o bloco correspondente não será um bloco diagonal.
No caso em que g g i ∈ g i H , os elementos da diagonal do bloco correspondente caem
exatamente na diagonal principal de [ρ ↑G (g )]B . Assim, temos

χ ↑G (g ) = χ(g i−1 g g i ).
X

g i−1 g g i ∈H

Dessa maneira, conhecido somente o caráter da representação ρ conseguimos


determinar o caráter da representação induzida e podemos definir, de modo natural
a partir de uma função de classe r em H , a função de classe induzida r ↑G em G, dada
por
r ↑G (g ) = r (g i−1 g g i ),
X

g i−1 g g i ∈H

onde os g i percorrem uma transversal à esquerda de H .


Vamos checar que se r ∈ Cl F (H ) então r ↑G , tal como acima, de fato pertence a
Cl F (G). Sejam g , g 0 ∈ G tais que g 0 = ug u −1 para algum u ∈ G. Então

r ↑G (g 0 ) = r (g i−1 g 0 g i ) = r (g i−1 ug u −1 g i ).
X X

g i−1 g 0 g i ∈H g i−1 ug u −1 g i

Considere g j tal que u −1 g i ∈ g j H , então u −1 g i = g j h para algum h ∈ H e

r (g i−1 ug u −1 g i ) = r (h −1 g −1
X X
j g g j h).
g i−1 ug u −1 g i h −1 g −1
j
g g j h∈H

Como h −1 g −1
j
g g j h ∈ H se e somente se g −1
j
g g j ∈ H e r ∈ Cl F (H ), temos

G
r (h −1 g −1 r (g −1
X X
j g g j h) = j g g j ) = r ↑ (g )
h −1 g −1
j
g g j h∈H g −1
j
g g j ∈H

36
e, portanto, r ↑G ∈ Cl F (G).
A restrição de uma função de classe em G pode ser naturalmente definida em
qualquer subgrupo H do mesmo.
A partir disso, dados χ ∈ Cl F (G) e ψ ∈ Cl F (H ), podemos tentar relacionar (ψ ↑G
|χ)G e (ψ|χ ↓H )H , sendo a primeira forma considerada sobre Cl F (G) e a segunda sobre
Cl F (H ). Nesse caso, temos que

1 X 1 X
(ψ ↑G |χ)G = ψ ↑G (g )χ(g −1 ) = ψ(g i−1 g g i )χ(g −1 ).
X
|G| g ∈G |G| g ∈G g −1 g g ∈H
i i

Agora vamos trocar a ordem dos somatórios envolvidos. Fixado g i na transversal à es-
querda, repare que somente aparecerão parcelas com fator ψ(g i−1 g g i ) se g i−1 g g i ∈ H ,
ou seja, se e somente se g ∈ ϕ−1
g −1
(H ), sendo ϕg −1 o automorfismo interno de G asso-
i i

ciado a g i−1 . Repare que, então, fixado g i e variando g , para cada g ∈ ϕ−1
g −1
(H ) temos
i
um g i−1 g g i distinto em H . Além disso, como χ ∈ Cl F (G), temos χ(g −1 ) = χ(g i−1 g −1 g i ).
Assim, temos que

1 X X 1 XX
(ψ ↑G |χ)G = ψ(g i−1 g g i )χ(g i−1 g −1 g i ) = ψ(h)χ(h −1 )
|G| g i g ∈ϕ−1 (H ) |G| g i h∈H
g −1
i

(G : H ) X 1 X
= ψ(h)χ ↓H (h −1 ) = ψ(h)χ ↓H (h −1 ) = (ψ|χ ↓H )H .
|G| h∈H |H | h∈H
Com isso, acabamos de provar o Teorema de Frobenius sobre a Reciprocidade que
vai enunciado a seguir.

Teorema 4.4 (Frobenius). Dadas χ ∈ Cl F (G) e ψ ∈ Cl F (H ) onde H é subgrupo do grupo


finito G, temos que (ψ ↑G |χ) = (ψ|χ ↓H ).

4.2 O Teorema de Clifford

Considere agora ρ : G → AutF (V ) uma representação, sendo V um G-módulo irredutí-


vel e seja H um subgrupo normal de G. Considere ainda W um H -submódulo irredu-
tível de V com respeito a ρ ↓H . Note que, fixado g ∈ G, o subespaço g ∗ W = ρ(g )(W )
é um H -submódulo de V que possui a mesma dimensão de W . De fato, g ∗ W é um
subespaço vetorial com a mesma dimensão de W , pois é a imagem do subespaço W
por ρ(g ). Além disso, dados h ∈ H e w ∈ W , temos que

ρ ↓H (h) ◦ ρ(g )(w) = ρ(hg )(w) = ρ(g g −1 hg )(w) = ρ(g )(ρ(g −1 hg )(w)) ∈ g ∗ W, (4.2)

já que H é normal e, portanto, g −1 hg ∈ H . Vejamos que podemos afirmar que g ∗ W


é irredutível. Suponha U um H -submódulo de g ∗W e considere ρ(g −1 ) : g ∗W → W .
Como ρ(g −1 ) é um F -isomorfismo, ρ(g −1 )(U ) é um subespaço de W . Além disso, se
u ∈ U e h ∈ H , temos que

ρ ↓H (h) ◦ ρ(g −1 )(u) = ρ(hg −1 )(u) = ρ(g −1 g hg −1 )(u) = ρ(g −1 )(ρ(g hg −1 )(u)),

37
o qual pertence a ρ(g −1 )(U ), novamente pela normalidade de H e ρ(g −1 )(U ) é um
H -submódulo de W , que é irredutível. Logo ρ(g −1 )(U ) = W ou {0}. Como ρ(g −1 ) é
F -isomorfismo, U = g ∗ W ou {0} e g ∗ W é irredutível.
Denotemos por χH o caráter de ρ ↓H e por χg ∗W o caráter de H sobre o H -submó-
dulo g ∗ W . Fixando bases {w 1 , . . . , w k } e {g ∗ w 1 , . . . , g ∗ w k } para W e g ∗ W , respec-
tivamente, para escrever as matrizes das subrepresentações de ρ ↓H (h) a W e g ∗ W ,
respectivamente, segue da Equação (4.2) que

χg ∗W (h) = χW (g −1 hg ),

para todo h ∈ H . Assim,

1 X 1 X
(χW |χ ↓H ) = χW (h)χ(h −1 ) = χg ∗W (g hg −1 )χ(g h −1 g −1 )
|H | h∈H |H | h∈H

1 X
= χg ∗W (h 0 )χ(h 0−1 ) = (χg ∗W |χ ↓H ).
|H | h 0 ∈H

Com isso, se F é algebricamente fechado, podemos concluir que a multiplicidade


com que módulos isomorfos a W aparece na decomposição de V em H -módulos ir-
redutíveis é igual à multiplicidade de H -módulos irredutíveis isomorfos a g ∗W , qual-
quer que seja g ∈ G, o que se torna extremamente interessante levando-se em conta
X
de que W e g ∗ W , em geral, não são módulos H -isomorfos e também que g ∗W
g ∈G
é um G-submódulo de V . Removendo-se convenientemente algumas parcelas, obte-
mos
r
M
V= mg i ∗ W,
i =1

para um certo número r de H -módulos irredutíveis, dois a dois não isomorfos, g i ∗W ,


todos com a mesma multiplicidade m de W . Assim, obtemos o Teorema de Clifford,
que vai enunciado a seguir.

Teorema 4.5 (Clifford). Sejam G um grupo finito, H subgrupo normal de G e V um


G-módulo irredutível sobre um corpo algebricamente fechado F . A decomposição de V
na soma direta de H -módulos irredutíveis é da forma
r
M
V= mWi ,
i =1

onde W1 , . . . ,Wr são dois a dois não isomorfos, todos aparecendo com a mesma multi-
plicidade m e todos possuindo a mesma dimensão.

A seguir fazemos um exemplo.

Exemplo 4.6. Considere G = A 4 e H = {(1), (12)(34), (13)(24), (14)(23)} considerando o


corpo base como sendo C.
Analisando a tábua de caracteres irredutíveis de A 4 (a qual você deve ter obtido
no Exercício 34), vemos que três módulos irredutíveis são unidimensionais e portanto

38
também são H -módulos irredutíveis, mas há um A 4 -módulo irredutível tridimensio-
nal V cujo caráter avaliado em cada classe de conjugação de A 4 é cado por χ(1) = 3,
χ(123) = χ(132) = 0 e χ((12)(34)) = −1. Como H é abeliano, todos os seus módulos
irredutíveis são unidimensionais e, pelo Teorema de Clifford e levando-se em conta
que dimV = 3 que é um número primo, temos que V é soma direta de três H -módulos
irredutíveis isomorfos ou é soma de três H -módulos irredutíveis não isomorfos entre
si.
A tábua de caracteres irredutíveis de H pode ser facilmente calculada e é explici-
tada a seguir.

(1) (12)(34) (13)(24) (14)(23)


χ1 1 1 1 1
χ2 1 −1 −1 1
χ3 1 −1 1 −1
χ4 1 1 −1 −1

Enxergando V como um H -módulo e denotando por χH o respectivo caráter, te-


mos que

χH ((12)(34)) = χH ((13)(24)) = χH ((14)(23)) = χ((12)(34)) = −1.

Por outro lado, para toda σ ∈ H , temos

χH (σ) = χi 1 (σ) + χi 2 (σ) + χi 3 (σ),

onde i 1 = i 2 = i 3 ou i 1 6= i 2 6= i 3 6= i 1 , com cada i j pertencente a {1, 2, 3}. Em particular,


se ocorre i 1 6= i 2 6= i 3 6= i 1 , podemos supor, sem perda de generalidade que i 1 < i 2 < i 3 .
Assim, as única maneira de satisfazer essas condições todas é com i 1 = 2, i 2 = 3 e i 3 =
4, ou seja, visto como H -módulo, a decomposição de V em submódulos irredutíveis
éV ∼=H W2 ⊕ W3 ⊕ W4 , sendo Wi o H -módulo irredutível de caráter χi .

4.3 Exercícios

Nos exercícios a seguir, o corpo F considerado é algebricamente fechado de caracte-


rística zero.

Exercício 37. Sejam ρ 1 , ρ 2 e ρ 3 todas as representações irredutíveis de A 3 (sobre o


corpo dos complexos). Descreva ρ 1 ↑S 3 , ρ 2 ↑S 3 e ρ 3 ↑S 3 . Faça o mesmo para as repre-
sentações irredutíveis do subgrupo {(1), (12)} de S 3 .

Exercício 38. Considere G como sendo o grupo diedral D 5 e H seu subgrupo de or-
2πi
dem 5. Seja ρ : H → AutC (C) a representação que satisfaz ρ(1 2 3 4 5)(z) = e 5 z.
D5
Descreva ρ ↑ .

Exercício 39. Seja G um grupo finito e seja ρ : {1G } → AutF (F ) a representação tri-
vial. Mostre que ρ ↑G é equivalente à representação regular de G. Use o Teorema
de Frobenius para mostrar que se σ : G → AutF (V ) é uma representação de G, então
(χσ |χG ) = dimF V , sendo χG o caráter da representação regular de G.

39
Exercício 40. Sejam G um grupo finito e H subgrupo de G. Dados uma representação
ρ : G → AutF (V ) e W um H -submódulo de V com respeito a ρ ↓H considere K = {g ∈
G : ρ(g )(W ) = W }. Mostre que K é um subgrupo de G que contém H .

Exercício 41. Sejam G um grupo finito, H subgrupo normal de G, V um G-módulo


irredutível e W um H -submódulo de V . Mostre que K = {g ∈ G| g ∗ W ∼
=H W } é um
subgrupo de G que contém H .

Exercício 42. Sejam G um grupo, H subgrupo normal de G e V um G-módulo irre-


dutível de dimensão prima. Mostre que se, como H -módulo, V não é irredutível ele
é soma direta de H -submódulos unidimensionais. Mais ainda, se os submódulos en-
volvidos na decomposição de V não são todos isomorfos então esses submódulos são
dois a dois não isomorfos.

Exercício 43. Considere G = {(1), (12), (34), (12)(34), (13)(24), (14)(23), (1324), (1423)} ≤
S 4 e H = {(1), (12)(34), (13)(24), (14)(23)}. Tal como feito no Exemplo 4.6, obtenha a
decomposição em H -módulos irredutíveis dos G-módulos irredutíveis sobre C que
possuem dimensão maior do que 1.

Exercício 44. Considere G como sendo o grupo diedral D 5 e H seu subgrupo de or-
dem 5. Tal como no exercício anterior, obtenha a decomposição em H -módulos ir-
redutíveis dos G-módulos irredutíveis sobre C que possuem dimensão maior do que
1.

Exercício 45. Considere a ação de S 4 em C2 que satisfaz:

(12) ∗ (x, y) = (x, −x − y), (13) ∗ (x, y) = (−x − y, y) e (14) ∗ (x, y) = (y, x).

(Acredite, isso realmente define uma ação linear à esquerda de S 4 sobre R2 . Se não
acredita, verfique!)

(a) Mostre que C2 com respeito a essa ação é um S 4 -módulo irredutível.

(b) Vendo C2 como um A 4 -módulo, obtenha a decomposição do mesmo em submó-


dulos irredutíveis.

40
Capítulo 5

Produto tensorial, extensão de


corpos e irredutibilidade absoluta

5.1 Produto tensorial de espaços vetoriais

Sejam V e W dois F -espaços vetoriais. Definimos o produto tensorial de V por W


sobre F denotado por V ⊗F W , ou simplesmente por V ⊗ W , quando não há risco
de ambiguidade quanto ao corpo F considerado, o espaço quociente de VV ×W , o F -
espaço vetorial livre livremente gerado pelos elementos de V × W , pelo subespaço
gerado por todos os elementos da forma (λv 1 + v 2 , w) − λ(v 1 , w) − (v 2 , w) e (v, λw 1 +
w 2 ) − λ(v, w 1 ) − (v, w 2 ), para quaisquer v, v 1 , v 2 ∈ V , w, w 1 , w 2 ∈ W e λ ∈ F . Como
o conjunto gerador do espaço vetorial livre considerado, via de regra, é infinito (por
exemplo se F possui característica zero), os elementos desse espaço vetorial são as
combinações lineares dos elementos de V × W que possuem uma quantidade finita
de parcelas.
Sendo v ∈ V e w ∈ W , o elemento (v, w) ∈ V ⊗ W é denotado por v ⊗ w e é cha-
mado um tensor puro de V ⊗W . Nem todo elemento de V ⊗W é um tensor puro. De
fato, (1, 0)⊗(1, 0)+(0, 1)⊗(0, 1) ∈ R2 ⊗R R2 não pode ser escrito como um único tensor
puro. Isso ficará claro mais adiante, quando exibirmos uma base para o produto ten-
sorial de dois espaços vetoriais, mas, como todo elemento de VV ×W se escreve como
combinação linear de elementos da forma (v, w), com v ∈ V e w ∈ W , é claro que todo
elemento do produto tensorial é combinação linear de tensores puros.
A fim de determinar uma base para V ⊗ W , primeiramente verifiquemos que o
produto tensorial de dois espaços vetoriais goza de uma propriedade universal.

Teorema 5.1 (Propriedade universal do produto tensorial). Sejam U , V eW F -espaços


vetoriais e seja φ : V × W → U uma aplicação bilinear, isto é,

φ(λv 1 + v 2 , µw 1 + w 2 ) = λµφ(v 1 , w 1 ) + λφ(v 1 , w 2 ) + µφ(v 2 , w 1 ) + φ(v 2 , w 2 ),

para quaisquer v 1 , v 2 ∈ V , w 1 , w 2 ∈ W e λ, µ ∈ F . Existe uma única transformação


linear ψ : V ⊗ W → U de modo que ψξ = φ, onde ξ : V × W → V ⊗ W satisfaz ξ(v, w) =
v ⊗ w, para qualquer (v, w) ∈ V × W .

41
Em outras palavras, o diagrama a seguir comuta.

φ
V ×W - U

ξ
ψ
?
V ⊗W

Demonstração. Para satisfazer a comutatividade do diagrama acima, repare que, para


qualquer tensor puro v ⊗ w de V ⊗ W , devemos ter ψ(v ⊗ w) = φ(v ⊗ w) e, como os
tensores puros de V ⊗ W geram V ⊗ W e desejamos que ψ seja linear, existirá uma
única ψ que faz o diagrama comutar, caso ela esteja bem definida.
Como V × W é uma base de VV ×W , existe uma única transformação linear χ :
VV ×W → U tal que χı = φ, sendo ı a inclusão natural de V × W em VV ×W . Repare
ainda que ξ = πı, sendo π a projeção de VV ×W em V ⊗W . Ou seja, existe ψ : V ⊗W → U
linear fazendo o diagrama acima comutar se e somente se a mesma ψ faz o diagrama
a seguir comutar.
χ
VV ×W - U

π
ψ
?
V ⊗W

Mas uma aplicação linear ψ fazendo o diagrama anterior comutar só estará bem
definida se ker π estiver contido em ker χ. Mas como φ é bilinear em V × W e φ = χı,
temos que, para quaisquer v 1 , v 2 ∈ V , w ∈ W e λ ∈ F ,

χ(λv 1 + v 2 , w) = φ(λv 1 + v 2 , w) = λφ(v 1 , w) + φ(v 2 , w) = λχ(v 1 , w) + χ(v 2 , w),

e, portanto, como χ é linear, (λv 1 + v 2 , w) − λ(v 1 , w) − λ(v 2 , w) ∈ ker χ, quaisquer que


sejam v 1 , v 2 ∈ V , w ∈ W e λ ∈ F . Um argumento análogo é usado para mostrar que
(v, λw 1 + w 2 ) ∈ ker χ, quaisquer que sejam v ∈ V , w 1 , w 2 ∈ W e λ ∈ F . Assim, todo
elemento gerador de ker π pertence a ker χ e, portanto, existe ψ : V ⊗ W → U fazendo
o diagrama anterior comutar, de onde obtemos o resultado.

Já mostramos que todo elemento de V ⊗ W pode ser escrito como combinação


linear de tensores puros. Fixemos bases B de V e C de W .Se v ⊗ w é um tensor puro
de V ⊗ W , existem v 1 , v 2 , . . . , v m ∈ B , w 1 , w 2 , . . . , w n ∈ C e λ1 , . . . , λm , µ1 , . . . , µn ∈ F tais
que
v = λ1 v 1 + . . . + λm v m e w = µ1 w 1 + . . . µn w n .

Então, dos elementos geradores do subespaço pelo qual quocienta-se VV ×W para ob-
ter V ⊗ W segue que
m X
n
λi µ j (v i ⊗ w j ),
X
v ⊗w =
i =1 j =1

42
e, portanto, todo elemento de V ⊗ W pode ser escrito como combinação linear de
elementos de B ⊗C := {v ⊗ w|v ∈ B e w ∈ C }.
Agora consideremos v 1 , . . . , v m ∈ B e w 1 , . . . , w n ∈ C distintos dois a dois e para
cada i = 1, . . . , m e j = 1, . . . , n, escalares λi j ∈ F de modo que

m X
n
λi j (v i ⊗ w j ) = 0.
X
i =1 j =1

Para cada par i , j de inteiros como acima, considere ψi , j : V ⊗W → F como sendo


o único funcional linear para o qual ψi , j ξ = φi , j sendo φi , j : V × W → F a aplicação
bilinear que, quando aplicada em um par (v, w) ∈ B ×C qualquer, satisfaz
(
1 se (v, w) = (v i , w j )
φi , j (v, w) =
0 se (v, w) 6= (v i , w j ).

Então
à !
m X
n m X
n
0 = ψi , j λkl (v k ⊗ w l ) = λkl ψi , j (v k ⊗ v l ) = λi j .
X X
k=1 l =1 k=1 l =1

Assim, além de os elementos de B ⊗ C gerarem V ⊗ W , o conjunto B ⊗ C também


é linearmente independente, o que garante o resultado seguinte.

Teorema 5.2. Sejam B uma base para o F -espaço vetorial V e C uma base para o F -
espaço vetorial W . Então B ⊗C constitui uma base para V ⊗W . Em particular, quando
V e W possuem dimensão finita, V ⊗ W também possui dimensão finita e

dimF (V ⊗ W ) = (dimF V )(dimF W ).

5.2 Produto tensorial de G-módulos

Se V e W , além de F -espaços vetoriais forem também G-módulos (de dimensão fi-


nita) com representações associadas ρ 1 e ρ 2 , respectivamente, consideramos V ⊗ W
também um G-módulo com representação ρ 1 ⊗ ρ 2 (chamada produto tensorial in-
terno de ρ 1 por ρ 2 ) dada por

(ρ 1 ⊗ ρ 2 )(g )(v ⊗ w) = (ρ 1 (g )(v)) ⊗ (ρ 2 (g )(w))

para cada um dos tensores puros de V ⊗ W e estendida por linearidade sobre todo
V ⊗ W . Que tal representação está bem definida segue do Exercício 48. O caráter
dessa representação é denotado por χ1 ⊗χ2 , sendo χ1 o caráter de ρ 1 e χ2 o caráter de
ρ 2 e é chamado de produto tensorial interno de χ1 por χ2 .
Fixados g ∈ G, B = {v 1 , . . . , v m } base de V e C = {w 1 , . . . , w n } base de W ; denote
[ρ 1 (g )]B = [a i j ]m×m e [ρ 2 (g )]C = [b i j ]n×n . Ordenamos a base B ⊗ C de V ⊗ W com
B ⊗C = {u 1 , . . . , u mn } de modo que

u nq+r = v q+1 ⊗ w r ,

43
sendo q e r inteiros com 1 ≤ r ≤ n. Ou seja

B ⊗C = {v 1 ⊗ w 1 , v 1 ⊗ w 2 , . . . , v 1 ⊗ w n , v 2 ⊗ w 1 , . . . , v 2 ⊗ w n , . . . , v m ⊗ w n }.

Assim temos que a entrada (nq 1 + r 1 , nq 2 + r 2 ) (novamente 1 ≤ r 1 , r 2 ≤ n) será


a q1 q2 b r 1 r 2 já que

m−1 n
(ρ 1 ⊗ ρ 2 )(g )(v q2 +1 ⊗ w r 2 ) =
X X
a q1 +1,q2 +1 b r 1 r 2 (v q1 +1 ⊗ w r 1 ).
q 1 =0 r 1 =1

Ou seja,a matriz [(ρ 1 ⊗ ρ 2 )(g )]B ⊗C tem a seguinte forma:


 
a 11 b 11 a 11 b 12 . . . a 11 b 1n a 12 b 11 . . . a 12 b 1n ... a 1m b 1n
 
 a 11 b 21 a 11 b 22 . . . a 11 b 2n a 12 b 21 . . . a 12 b 2n ... a 1m b 2n 
 
 .
.. .
.. .
.. .
.. .. .. .. .. .. 

 . . . . . 

 
 a 11 b n1 a 11 b n2 . . . a 11 b nn a 12 b n1 . . . a 12 b nn ... a 1m b nn 
 
 
 a 21 b 11 a 21 b 12 . . . a 21 b 1n a 22 b 11 . . . a 22 b 1n ... a 2m b 1n .
 
 .
.. .
.. .
.. .
.. .. .. .. .. .. 

 . . . . . 

 
 a 21 b n1 a 21 b n2 . . . a 21 b nn a 22 b n1 . . . a 22 b nn ... a 2m b nn 
 
 .. .. .. .. .. .. .. .. .. 

 . . . . . . . . . 

a m1 b n1 a m1 b n2 . . . a m1 b nn a m2 b n1 . . . a m2 b nn ... a mm b nn

Sendo M = [a i j ]m×m e N = [b i j ]n×n , a matriz Q de ordem mn ×mn obtida a partir


de M e N como acima é chamada de produto tensorial de M por N ou produto de
Kronecker de M por N e é denotado por M ⊗ N .
Repare que
à !à !
n
m X m n
(χ1 ⊗ χ2 )(g ) = b j j = χ1 (g )χ2 (g ).
X X X
ai i b j j = ai i
i =1 j =1 i =1 j =1

As ideias expostas nesta seção podem ser generalizadas.


Considere V um G-módulo e W um H -módulo, ambos de dimensão finita sobre
o mesmo corpo de escalares F , sendo G e H grupos finitos. O espaço vetorial V ⊗ W
transforma-se naturalmente em um G × H -módulo, com a ação dada por

(g , h) ∗ (v ⊗ w) = (g ∗ v) ⊗ (h ∗ w).

A representação associada a essa ação é o produto tensorial exterior de ρ 1 por ρ 2


(denotado por ρ 1 ⊗ ρ 2 , sendo ρ 1 e ρ 2 , respectivamente, as representações associadas
à ação de G sobre V e à ação de H sobre W . Note que só há risco de confusão entre
os produtos tensoriais interno e o exterior de duas representações somente se G = H ,
mas que, mesmo nesse caso, torna-se claro de qual produto tensorial se trata dado
que uma é representação de G e a outra de G ×G.
Repare que a estrutura de G-módulo considerada anteriormente sobre V ⊗ W ,
quando ambos são G-módulos trata-se da restrição ao subgrupo H = {(g , g ) : g ∈ G} ∼
=
G da estrutura de G ×G-módulo de V ⊗ W .

44
Fazendo cálculos análogos aos realizados anteriormente, obtemos novamente
[(ρG ⊗ ρ H )(g , h)]B ⊗C = [ρG (g )]B ⊗ [ρ H (h)]C , para quaisquer g ∈ G e h ∈ H (conside-
ramos a ordenação da base B ⊗ C de V ⊗ W tal como anteriormente a partir da or-
denação das bases B e C ) e que χV ⊗ χW (g , h) = χV (g )χW (h), sendo χV , χW e χV ⊗W ,
respectivamente, os caracteres associados a V , W e V ⊗ W .
Uma pergunta que surge naturalmente é: se V e W são, respectivamente, um G-
módulo e um H -módulo irredutíveis, o G × H -módulo V ⊗ W é sempre irredutível?
Novamente precisamos do Lema de Schur para assegurarmos essa condição, o que
nos leva a exigir que o corpo F sobre o qual trabalhamos seja algebricamente fechado.

Teorema 5.3. Sejam G e H grupos e, respectivamente, V um G-módulo e W um H -


módulo ambos sobre um corpo F algebricamente fechado de característica zero. V ⊗W
é um G × H -módulo irredutível se e somente se V e W são módulos irredutíveis. Mais
ainda, todos os G × H -módulos irredutíveis são isomorfos ao produto tensorial de um
G-módulo irredutível por um H -módulo irredutível.

Demonstração. É claro que se V ⊗ W é irredutível, então ambos, V e W são irredu-


tíveis. Do contrário, se U é submódulo próprio e não nulo de V (de W ), temos que
U ⊗ W (V ⊗U ) é submódulo de V ⊗ W .
Usando o Exercício 36, para mostrar que V ⊗ W é irredutível basta mostrar que
(χ|χ) = 1, sendo χ o caráter associado a V ⊗ W .
De fato, denotando por χV e χW os caracteres associados, respectivamente, a V e
W , temos

1
χ(g , h)χ(g −1 , h −1 )
X
(χ|χ) =
|G × H | (g ,h)∈G×H
1
χV (g )χW (h)χV (g −1 )χW (h −1 )
X
=
|G||H | (g ,h)∈G×H
à !à !
1 X −1 1 X −1
= χV (g )χV (g ) χW (h)χW (h )
|G| g ∈G |H | h∈H
= (χV |χV )(χW |χW ) = 1.

Com isso mostramos a primeira parte do teorema. Para a segunda parte, repare
que a classe de conjugação de (g , h) ∈ G × H é determinada unicamente pela classe
de conjugação de g em G e pela classe de conjugação de h em H . Assim, o número
de classes de conjugação de G × H é o produto do número de classes de conjugação
de G pelo número de classes de conjugação de H . Por outro lado, o número de G ×
H -módulos obtidos como produto tensorial de um G-módulo irredutível por um H -
módulo irredutível é justamente esse mesmo número. Basta então verificar que se
V e V 0 são G-módulos irredutí veis e W e W 0 são H -módulos irredutíveis, se temos
V ⊗W ∼ =G×H V 0 ⊗W 0 , então V ∼
=G V 0 e W ∼
=H W 0 . Se χV ⊗χW = χV 0 ⊗χW 0 , em particular
devemos ter (χV ⊗ χW |χV 0 ⊗ χW 0 ) = 1 6= 0.

45
Por outro lado,

1
(χV ⊗ χW |χV 0 ⊗ χW 0 ) = (χV ⊗ χW )(g , h)(χV 0 ⊗ χW 0 )(g −1 , h −1 )
X
|G × H | (g ,h)∈G×H
1
χV (g )χV 0 (g −1 )χW (g )χW 0 (g −1 )
X
=
|G||H | (g ,h)∈G×H
à !à !
1 X 1
χV (g )χV 0 (g −1 ) χW (h)χW 0 (h −1 )
X
=
|G| g ∈G |H | h∈H
= (χV |χV 0 )(χW |χW 0 ).

Note que (χV |χV 0 ) 6= 0 6= (χW |χW 0 ) só acontece se V ∼


=G V 0 e W ∼
=H W 0 , pela irre-
dutibilidade dos mesmos. Assim, obtemos o resultado desejado

Em geral isso não ocorre para o produto tensorial interno de dois G-módulos. De
fato, se G não é abeliano e V é um G-módulo irredutível de dimensão máxima, V ⊗ V
não é irredutível (v. Exercício 50)

5.3 Extensões do corpos de escalares

Sejam F um corpo e K uma extensão de F , isto é, K é um corpo que contém F , e seja


ainda V um G-módulo sobre F . Podemos considerar o (somente) espaço vetorial K ⊗F
V como um K -espaço vetorial através da multiplicação por escalar dada por λ(µ⊗v) =
(λµ) ⊗ v, para quaisquer λ, µ ∈ K e qualquer v ∈ V ; e estendida por linearidade para
todo K ⊗V . Denotamos esse K -espaço vetorial por VK e, a fim de evitar ambiguidades,
denotamos o espaço vetorial V original por VF . Fixada uma base B de VF , o espaço
vetorial VK tem por base 1 ⊗ B . De fato, todo tensor puro λ ⊗ v ∈ K ⊗ V pode ser
decomposto em
n
λ ⊗ v = λ ⊗ (α1 v 1 + . . . + αn v n ) = λαi (1 ⊗ v i ),
X
i =1

sendo os αi ∈ F ⊂ K e, portanto 1 ⊗ B gera K ⊗ V como K -espaço vetorial. Por outro


lado, sejam λ1 , . . . , λn ∈ K tais que λ1 (1 ⊗ v 1 ) + . . . + λn (1 ⊗ v n ) = 0. Seja C uma base de
K como F -espaço vetorial, então, para cada i = 1, . . . , n existem únicos µi 1 , . . . , µi ki ∈ C
ki
e αi 1 , . . . , αi ki ∈ F tais que λi = αi j µi j . Assim, temos
X
j =1

à !
n n ki ki
n X
λi (1 ⊗ v i ) = αi j µi j (1 ⊗ v i ) = αi j (µi j ⊗ v i ).
X X X X
0=
i =1 i =1 j =1 i =1 j =1

Como µi j ⊗v i ∈ C ⊗B , que é uma base para K ⊗V como F -espaço vetorial, e os αi j ∈ F ,


temos que todos os αi j acima são nulos e, consequentemente, λ1 = . . . = λn = 0.
Assim, como K -espaço vetorial, K ⊗ V é naturalmente isomorfo ao K -espaço ve-
torial gerado por {v 1 , . . . , v n } se esse conjunto é uma base de V . Assim, essa identifica-
ção pode ser utilizada para denotar os elementos de VK usando λ1 v 1 +. . .+λn v n para

46
denotar λ1 (1⊗v 1 )+. . .+λn (1⊗v n ). Em geral, especialmente nas demonstrações, con-
tinuaremos a utilizar a notação com ⊗ por acreditarmos que, para quem está tendo
um primeiro contato com esse tipo de construção, fica mais claro em que ambiente
os objetos estão sendo considerados, se sobre o corpo menor ou se sobre a extensão
para o corpo maior.

Exemplo 5.4. Considerando o R-espaço vetorial R2 , temos então que C ⊗ R2 é iso-


morfo, como C-espaço vetorial, a C2 , via z 1 (1 ⊗ (1, 0)) + z 2 (1 ⊗ (0, 1)) 7→ (z 1 , z 2 ), para
quaisquer z 1 , z 2 ∈ C. Uma argumento errado que pode surgir é o seguinte: se C é
isomorfo a R2 então C ⊗ R2 é isomorfo a C ⊗ C ∼
= C. Isso não ocorre pois

C ⊗R R2 ∼
= C ⊗R C ∼
6 C ⊗C C ∼
= = C,

pois como C é um espaço vetorial real de dimensão 2, C ⊗R C é um espaço real de


dimensão 4 e, portanto, um espaço complexo de dimensão 2, enquanto que C ⊗C C é
um espaço complexo de dimensão 1.

Sendo V um G-módulo associado a uma representação ρ, podemos considerar o


K -espaço vetorial K ⊗ V como um G-módulo através da representação ρe dada por

ρ(g
e )(1 ⊗ v) = 1 ⊗ ρ(g )(v),

para quaisquer g ∈ G e v ∈ V e estendida por linearidade sobre VK . É uma conta


bastante simples verificar que a matriz de ρ(g ) em uma base B = {v 1 , . . . , v n } de VF
coincide com a matriz de ρ(g
e ) na base 1 ⊗ B = {1 ⊗ v 1 , . . . , 1 ⊗ v n } e, portanto, o cará-
ter de uma representação permanece o mesmo mediante uma extensão do corpo de
escalares.
Sendo VF um G-módulo, vejamos, através de um exemplo, que VK pode se com-
portar diferentemente de VF como G-módulo, sendo K uma extensão de F .

Exemplo 5.5. Considere novamente V = R2 , F = R e K = C. Consideremos a ação já


apresentada anteriormente de G = {±i , ±1} ∼
= Z4 em R2 dada por i ∗ (x, y) = (−y, x).
Já vimos que V é um G-módulo irredutível. Repare que a ação de G sobre R2C ∼
= C2
é dada por i ∗ (z 1 , z 2 ) = (−z 2 , z 1 ). Para que exista um submódulo unidimensional em
C2 , devem existir (z 1 , z 2 ) 6= 0 e λ ∈ C tais que (−z 2 , z 1 ) = λ(z 1 , z 2 ). Aplicando nova-
mente i sobre (−z 2 , z 1 ), obtemos −(z 1 , z 2 ) = λ2 (z 1 , z 2 ) e temos λ = ±i . Para λ = i
temos z 1 = i z 2 e o subespaço gerado por (i , 1) é um G-submódulo unidimensional.
Para λ = −i , obtemos z 2 = i z 1 e o subespaço gerado por (1, i ) é outro submódulo uni-
dimensional.

O resultado a seguir nos mostra porém que, quando VK é irredutível, então VF


também é irredutível.

Lema 5.6. Sejam V um G-módulo sobre F e considere K uma extensão de F . Se W é


um G-submódulo de VF , então WK é um G-submódulo de VK . Em particular, se VK é
irredutível, então VF também é irredutível.

47
Demonstração. Dados um tensor puro λ ⊗ w ∈ K ⊗ W = WK ⊂ VK e g ∈ G, temos que
g ∗ (λ ⊗ w) = λ ⊗ g ∗ w ∈ WK e, da linearidade da ação de G, segue que WK é um G-
submódulo de VK .

O resultado anterior motiva a seguinte definição.

Definição 5.7. Um G-módulo V sobre um corpo F é absolutamente irredutível se é


irredutível e se VK é irredutível para qualquer extensão K de F .

Então passamos a buscar condições sobre o corpo F que garantam que um G-


módulo irredutível sobre F seja absolutamente irredutível.

Teorema 5.8. Sejam VF e WF dois G-módulos associados, respectivamete, a represen-


tações ρ e σ e seja K uma extensão de V . Então

HomG (VK ,WK ) ∼


= K ⊗ HomG (VF ,WF )

como K -espaços vetoriais.

Demonstração. Comecemos fixando bases BV = {v 1 , . . . , v m } de VF , BW = {w 1 , . . . , w n }


de WF , B K de K como F -espaço vetorial e B H = {ξ1 , . . . , ξs } de HomG (VF ,WF ). Consi-
dere ψ : K ⊗ HomG (VF ,WF ) → HomG (VK ,WK ) a transformação linear que satisfaz

ψ 1 ⊗ ξ j = ξej ,
¡ ¢

sendo, para qualquer φ ∈ HomG (VF ,WF ), φ e : VK → WK a transformação linear que


satisfaz φ(1
e ⊗ v i ) = 1 ⊗ φ(v i ), para todo i = 1, . . . , m.
Primeiramente verifiquemos de fato que se φ ∈ HomG (VF ,WF ) então a aplicação
φ
e assim definida pertence a HomG (VK ,WK ). Como φ
e já é definida como a única trans-
formação linear satisfazendo φ(1⊗v
e i ) = 1⊗φ(v i ), para todo i = 1, . . . , m; basta verificar
que σ
e (g ) ◦ φ
e=φ
e ◦ ρ(g
e ), para todo g ∈ G. Como ρ, e σeeφ e são K -lineares, basta verificar
que isso ocorre sempre que os membros da igualdade acima são aplicados a elemen-
tos genéricos da base de VK . De fato, para qualquer v i ∈ BV e qualquer g ∈ G, temos

σ
e (g ) ◦ φ(1
e ⊗ vi ) = σ
e (g )(1 ⊗ φ(v i )) = 1 ⊗ σ(g )(φ(v i )) = 1 ⊗ φ(ρ(g )(v i )) = φ(1
e ⊗ ρ(g )(v i ))


e ◦ ρ(g
e )(1 ⊗ v i ).

Afirmamos que a aplicação ψ é injetora. Seja ϕ ∈ K ⊗HomG (VF ,WF ) tal que ψ(ϕ) =
0. Considere λ1 , . . . , λs ∈ K os únicos escalares tais que

ϕ = λ1 (1 ⊗ ξ1 ) + . . . + λs (1 ⊗ ξs ).

Então ψ(ϕ)(v) = 0 para qualquer v ∈ VK . Em particular, ψ(ϕ)(1⊗v j ) = 0, para todo


v j ∈ BV . Assim,
0 = λ1 (1 ⊗ ξ1 (v j )) + . . . + λs (1 ⊗ ξs (v j )).

Considere então αki j ∈ F , k = 1, . . . , s, i = 1, . . . , n, j = 1, . . . , m tais que

ξk (v j ) = αk1 j w 1 + . . . + αkn j w n .

48
Então

0 = (λ1 α11 j + λ2 α21 j + . . . + λs αs1 j )(1 ⊗ w 1 ) + . . . + (λ1 α1n j + . . . + λs αsn j )(1 ⊗ w n ),

para todo j = 1, . . . , m. Assim, para quaisquer i e j , temos

λ1 α1i j + λ2 α2i j + . . . + λs αsi j = 0.

Repare que, tal como αki j foi definido, ele corresponde à entrada (i , j ) da matriz
de ξk com respeito às bases BV e BW . Assim o sistema de equações acima é equiva-
lente a
B B
λ1 [ξ1 ]BV + . . . + λs [ξs ]BV = 0.
W W

Como K ⊗ HomG (VF ,WF ) está naturalmente contido em K ⊗ HomF (VF ,WF ), que
é isomorfo a K ⊗F M n,m (F ) ∼
= M n,m (K ) (v. Exercício 47), temos

λ1 (1 ⊗ ξ1 ) + . . . + λs (1 ⊗ ξs ) = 0

e, portanto, ker ψ = {0} e ψ é injetora.


Para a sobrejetividade, considere φ ∈ HomG (VK ,WK ) arbitrária. Dado v j ∈ BV ,
escreva φ(1 ⊗ v j ) como sendo

φ(1 ⊗ v j ) = λ1 j (1 ⊗ w 1 ) + . . . + λn j (1 ⊗ w n ).

Cada λi j pode ser escrito como combinação linear de elementos de B K . Como os


λi j são em número finito, é possível escrever todos os λi j como combinação linear
dos mesmos elementos µ1 , . . . , µr de B K (admitindo alguns coeficientes nulos). Então

λi j = αi j 1 µ1 + . . . + αi j r µr ,

onde µk ∈ B K e αi j k ∈ F ; para quaisquer i = 1, . . . , n, j = 1, . . . , m k = 1, . . . , r .


Assim,
à à !!
n X
r r n
φ(1 ⊗ v j ) = µk (1 ⊗ αi j k w i ) = µk 1 ⊗ αi j k w i
X X X
,
i =1 k=1 k=1 i =1

para cada j = 1, . . . , m. Seja θk ∈ HomF (VF ,WF ) satisfazendo


n
θk (v j ) = αi j k w i ,
X
i =1

para quaisquer j = 1, . . . , m e k = 1, . . . , r .
Vamos mostrar que cada θk assim definida pertence a HomG (VF ,WF ). Para isso,
denotemos por ρ a representação de G em VF , por ρe a representação de G em VK ,
por σ a representação de G em WF e por σ
e a representação de G em WK . Como φ ∈
HomG (VK ,WK ), para qualquer g ∈ G, temos que σ
e (g ) ◦ φ = φ ◦ ρ(g
e ). Por um lado,

φ ◦ ρ(g
e )(1 ⊗ v j ) = φ(1 ⊗ ρ(g )(v j )).

49
Existem únicos γ1 j , . . . , γm j ∈ F tais que

ρ(g )(v j ) = γ1 j v 1 + . . . + γm j v m ,

e, portanto,
à à !! à à !!
m r n r m n
φ ◦ ρ(g γp j µk 1 ⊗ αi pk w i µk 1 ⊗ γp j αi pk w i
X X X X X X
e )(1 ⊗ v j ) = = .
p=1 k=1 i =1 k=1 p=1 i =1

Por outro lado,


à à à !!! à à !!
r n r n
σ
e (g ) ◦ φ(1 ⊗ v j ) = σ µk 1 ⊗ αi j k w i µk 1 ⊗ σ(g )(αi j k w i )
X X X X
e (g ) = .
k=1 i =1 k=1 i =1

Como φ ◦ ρ(g
e )=σ
e (g ) ◦ φ, segue das duas últimas equações que
à !
m m
(σ(g ) ◦ θk )(v j ) = γp j θk (v p ) = θk γp j v p = (θk ◦ ρ(g ))(v j ),
X X
p=1 p=1

para todo k = 1, . . . , r e para todo j = 1, . . . , m, portanto, θk ∈ HomG (VF ,WF ), para todo
k. Do modo como definimos os θk segue que
à !
r
φ=ψ µk ⊗ θk ,
X
k=1

e obtemos que ψ é sobrejetora.

O seguinte corolário é imediato.

Corolário 5.9. Sendo K uma extensão do corpo F , temos

dimF HomG (VF ,WF ) = dimK HomG (VK ,WK ).

Em particular, EndG (VF ) ∼


= F se e somente se EndG (VK ) ∼
=K.

Em particular, do Lema de Schur, do Exercício 16 e do corolário anterior obtemos


mais um corolário.

Corolário 5.10. Seja V um G-módulo sobre um corpo F algebricamente fechado. Se V


é irredutível, então V é absolutamente irredutível. Em particular todo G-módulo sobre
C que é irredutível é absolutamente irredutível.

Outro corolário interessante é o seguinte.

Corolário 5.11. Seja K um corpo que estende o corpo F e sejam VF e WF G-módulos


irredutíveis não isomorfos. Nenhum submódulo irredutível de VK pode ser isomorfo a
algum submódulo irredutível de WK . Ainda mais, se V1 , . . . ,Vm forma uma lista com-
pleta de G-módulos irredutíveis dois a dois não isomorfos sobre F e m é o número de
classes de conjugação de G, se (Vi )K não é irredutível, o mesmo é soma direta de módu-
los isomorfos.

50
Demonstração. Pela primeira parte do Lema de Schur, HomG (VF ,WF ) = {0}. Do Co-
rolário 5.9, segue que HomG (VK ,WK ) = {0}. Se houvesse submódulos irredutíveis iso-
morfos em VK e WK seria possível construir um G-homomorfismo não nulo de VK
para WK que, restrito a esse submódulo de VK fornecesse um isomorfismo dele para
o respectivo submódulo de WK .
Para a segunda parte basta notar que, pelo que acabamos de mostrar, o número de
G-módulos irredutíveis sobre K , a menos de G-isomorfismo, é maior do que ou igual
ao número de G-módulos irredutíveis sobre F . Como por hipótese o número de G-
módulos irredutíveis sobre F é o número de classes de conjugação de G, a quantidade
de G-módulos irredutíveis sobre K , dois a dois não isomorfos, não pode ser maior do
que o número de G-módulos irredutíveis sobre F . Assim, se (VK )i se decompõe em
soma direta de G-módulos irredutíveis, todas as componentes devem ser isomorfas
entre si.

Vamos fornecer um exemplo agora de um grupo G cujo número de classes de con-


jugação coincide com o número de G-módulos irredutíveis não isomorfos sobre R tal
que nem todos os módulos considerados permanecem irredutíveis quando fazemos
a extensão dos escalares a C.

Exemplo 5.12. Considere a ação de G = {±1, ±i , ± j , ±k} em R4 como no Exemplo 4.3


pela indução da representação fornecida no Exemplo 2.3. Como calculado lá, temos:

i ∗ (x, y, z, w) = (−y, x, w, −z), j ∗ (x, y, z, w) = (−z, −w, x, y) e

k ∗ (x, y, z, w) = (w, −z, y, −x).

É fácil encontrar outros quatro G-módulos unidimensionais não isomorfos entre si.
Como o número de classes de conjugação de G é cinco, se mostrarmos que R4 , com
essa ação, é irredutível, teremos encontrado uma lista completa de G-módulos ir-
redutíveis sobre R. É fácil verificar que R4 não possui submódulos unidimensio-
nais. Assim, se o mesmo não possuir submódulos de dimensão dois, será automa-
ticamente irredutível. Se R4 possuísse um G-submódulo bidimensional, existiriam
x, y, z, w ∈ R, não todos nulos, de modo que {(x, y, z, w), i ∗ (x, y, z, w), j ∗ (x, y, z, w)}
seria linearmente dependente. Em particular, pelas três primeiras coordenadas des-
ses vetores, teríamos  
x y z
 
det 
 −y x  = 0,
w 
−z −w x

o que nos fornece x(x 2 + y 2 + z 2 + w 2 ) = 0. Como x, y, z, w ∈ R não são todos nulos,


devemos ter x = 0. Usando o mesmo argumento para as três últimas coordenadas
desses mesmos vetores, obtemos w(x 2 + y 2 + z 2 + w 2 ) = 0; de onde w = 0. Conside-
rando a primeira, a segunda e a última, obtemos y(x 2 + y 2 + z 2 + w 2 ) = 0; de onde,
y = 0. Mas então {(0, 0, z, 0), (0, 0, 0, −z), (−z, 0, 0, 0)} deve ser linearmente dependente
e, portanto, z = 0. Assim, não há submódulo de dimensão dois e R4 é irredutível.

51
No entanto, 12 + 12 + 12 + 12 + 42 6= 8. Portanto, esse G-módulo irredutível não
pode ser absolutamente irredutível, já que os de dimensão 1 certamente o são. Então,
pelo corolário anterior, ao estendermos o corpo de escalares desse módulo para C,
devemos obter uma soma direta de móduos isomorfos. Pela condição da soma dos
quadrados das dimensões dos G-módulos irredutíveis sobre C, temos que há um G-
módulo irredutível de dimensão dois e mais, R4 ⊗ C é isomorfo à soma direta de duas
cópias de tal G-módulo irredutí vel.

5.4 Exercícios

Exercício 46. Sejam U , V e W F -espaços vetoriais. Mostre que:

(a) F ⊗ V ∼
=V.

(b) V ⊗ W ∼
= W ⊗V .

(c) (U ⊕ V ) ⊗ W ∼
= (U ⊗ W ) ⊕ (V ⊗ W ).

(d) (U ⊗V )⊗W ∼
= U ⊗(V ⊗W ). (Então podemos escrever U ⊗V ⊗W sem preocupação.)

Exercício 47. Seja M p,q (F ) o espaço vetorial formado pelas matrizes de ordem p × q
com entradas no corpo F e seja K uma extensão de F . Mostre que K ⊗F M p,q (F ) = ∼
M p,q (K ).

Exercício 48. Sejam V e W dois G-módulos de dimensão finita e considere B base


de V e C base de W . Denotando por ρ 1 e ρ 2 , respectivamente, as representações
associadas a V e a W , considere a representação ρ de G em V ⊗W definida da seguinte
maneira:
ρ(g )(v ⊗ w) = (ρ 1 (g )(v)) ⊗ (ρ 2 (g )(w)) se v ⊗ w ∈ B ⊗C ;

e estendida por linearidade sobre todo V ⊗W . Mostre que, para qualquer tensor puro
de V ⊗ W ,
ρ(g )(v ⊗ w) = (ρ 1 (g )(v)) ⊗ (ρ 2 (g )(w))

e que, portanto, o produto tensorial interno de representações está bem definido.

Exercício 49. Sejam U , V e W G-módulos. Mostre que (U ⊕V )⊗W ∼


=G (U ⊗W )⊕(V ⊗

W ) e que V ⊗ W =G W ⊗ V .

Exercício 50. Sejam V e W dois G-módulos. Mostre que se dimF V = 1 e W é irre-


dutível então V ⊗W é um G-módulo irredutível. Forneça um exemplo de G-módulos
irredutíveis U e V de modo que U ⊗ V não seja irredutível.

Exercício 51. Mostre que a transformação linear ψ definida na demonstração do Te-


orema 5.8 é injetora

52
Capítulo 6

Representações de grupos abelianos


finitos e graduações de álgebras

6.1 Representações de grupos abelianos finitos

No Exercício 30 você deve ter encontrado todos os G-módulos irredutíveis sobre C no


caso em que G é um grupo cíclico finito. Como esses módulos são todos de dimen-
são 1, já que G é abeliano, a tábua de caracteres é unicamente determinada pelos
valores de cada caráter aplicado a um g tal que G = 〈g 〉. Mais ainda, podemos enu-
merar os caracteres como sendo χ0 , . . . , χn−1 de modo que χi (g ) = ωi , sendo n = |G| e
ω uma raiz n-ésima primitiva da unidade. Repare que o mesmo se dá se trocarmos C
por qualquer corpo algebricamente fechado de característica zero. Uma vez que todo
grupo abeliano finito é o produto direto de grupos cíclicos, pelo Teorema 5.3, temos
que os caracteres irredutíveis de um grupo abeliano finito G serão dados pelos pro-
dutos tensoriais dos caracteres irredutíveis dos grupos cíclicos da decomposição de
G como produto direto.em cujo produto direto o grupo abeliano se decompõe. Lem-
brando que o produto tensorial de caracteres é dado pelo produto desses caracteres,
podemos obter facilmente a tábua de caracteres de qualquer grupo abeliano finito.

Exemplo 6.1. Considere G = C 6 ×C 3 , sendo C n o grupo cíclico de ordem n, e denote-


mos por g um gerador de C 6 e por h um gerador de C 3 . As tábuas de caracteres de C 6
e de C 3 são então:

1 g g2 g3 g4 g5
ψ0 1 1 1 1 1 1
2
1 h h2
ψ1 1 −ω ω −1 ω −ω2
ϕ0 1 1 1
ψ2 1 ω2 ω 1 ω2 ω e ,
ϕ1 1 ω ω2
ψ3 1 −1 1 −1 1 −1
ϕ2 1 ω2 ω
ψ4 1 ω ω2 1 ω ω2
ψ5 1 −ω2 ω −1 ω2 ω
p
−1 + i 3
onde ω é uma raiz cúbica primitiva da unidade (você pode considerar ω = ).
2

53
Assim, o caráter irredutível χi de G será dado por χi (g s , h t ) = ψqi (g s )ϕr i (h t ), com
i = 0, . . . , 17 sendo que 0 ≤ q i ≤ 5, 0 ≤ r i ≤ 2 de modo que i = 3q i + r i . Explicita-
mente, temos a seguinte tábua parcial (omitimos os elementos de cálculo mais fácil
por questão de espaço).

(g , h) (g 2 , h) (g 3 , h) (g 4 , h) (g 5 , h) (g , h 2 ) (g 3 , h 2 ) (g 5 , h 2 )
χ0 1 1 1 1 1 1 1 1
2 2
χ1 ω ω ω ω ω ω ω ω2
χ2 ω2 ω2 ω2 ω2 ω2 ω ω ω
2 2
χ3 −ω ω −1 ω −ω −ω −1 −ω2
χ4 −ω2 1 −ω ω2 −1 −1 −ω2 −ω
χ5 −1 ω −ω2 1 −ω −ω2 −ω −1
2 2 2
χ6 ω ω 1 ω ω ω 1 ω
2 2 2
χ7 1 ω ω 1 ω ω ω 1
2
χ8 ω 1 ω ω 1 1 ω ω2
χ9 −1 1 −1 1 −1 −1 −1 −1
2 2
χ10 −ω ω −ω ω −ω −ω −ω −ω2
χ11 −ω2 ω2 −ω2 ω2 −ω2 −ω −ω −ω
2 2
χ12 ω ω 1 ω ω ω 1 ω2
χ13 ω2 1 ω ω2 1 1 ω2 ω
2 2
χ14 1 ω ω 1 ω ω ω 1
2 2 2
χ15 −ω ω −1 ω ω −ω −1 ω
2 2 2
χ16 −1 ω −ω 1 ω −ω −ω 1
χ17 −ω 1 −ω2 ω 1 −1 −ω ω2

Claro que podem ocorrer produtos tensoriais triplos, quádruplos, etc. mas basta
proceder de modo similar.
Como dito anteriormente, dado um grupo cíclico finito C n , podemos enumerar
seus caracteres irredutíveis em χ0 , . . . , χn−1 de modo que χi (g ) = ωi , sendo ω uma raiz
n-ésima primitiva da unidade e sendo g um gerador de C n . Podemos munir os carac-
teres de C n de uma estrutura de grupo abeliano dada por (χi χ j )(g k ) = χi (g k )χ j (g k ) =
ω(i + j )k = χi + j (g k ) (aqui o índice i + j é considerado módulo n). Desse modo Ĝ, for-
mado pelos caracteres irredutíveis de G, é naturalmente isomorfo a G, quando G é um
grupo cíclico finito. O mesmo ocorre para qualquer grupo abeliano finito, pelo proce-
dimento anterior. De fato, sendo G abeliano finito ele é isomorfo a C n1 × · · · ×C nk (até
que podemos assumir que n i +1 divide n i , mas não será necessário). Como vimos,
cada caráter irredutível de G é da forma χi 1 ⊗ · · · ⊗ χi k , onde
j j i j i j
χi 1 ⊗ · · · ⊗ χi k (g 11 , . . . , g kk ) = ω11 1 · · · ωkk k ,

onde g s é gerador de C n s ; 0 ≤ i s ≤ n−1; e ωs é uma raiz n s -ésima primitiva da unidade.


Assim, há uma bijeção natural entre Ĝ e G. Além disso, é natural definir uma operação
em Ĝ de modo que

(χi 1 ⊗ · · · ⊗ χi k )(χ j 1 ⊗ · · · ⊗ χ j k ) = χi 1 χ j 1 ⊗ · · · ⊗ χi k χ j k .

54
Dessa forma, Ĝ ganha uma estrutura de grupo isomorfo a G. Logo, passaremos a de-
notar os elementos de Ĝ = {χg : g ∈ G} sendo que χg χh = χg h (substituímos a notação
aditiva pela multiplicativa).

6.2 Graduações em álgebras e representações de grupos abe-


lianos

Dado um corpo F , uma F -álgebra A é uma estrutura algébrica que possui, ao mesmo
tempo, uma estrutura de F -espaço vetorial e de anel associativo com unidade, sendo
as adições da estrutura de espaço vetorial e da estrutura de anel a mesma operação.
Além disso, impõe-se uma condição de compatibilidade entre a multiplicação por
escalar e a multiplicação do anel, a saber:

λ(ab) = (λa)b = a(λb),

para quaisquer a, b ∈ A e λ ∈ F . De modo análogo ao que ocorre com as demais es-


truturas algébricas, diz-se que uma aplicação entre duas F -álgebras é um homomor-
fismo (de álgebras) se essa aplicação é, ao mesmo tempo, um homomorfismo de anel
e uma transformação linear com respeito a essas duas estruturas das F -álgebras.
Sendo G um grupo, uma G-graduação de uma álgebra A é uma decomposição
de A em uma soma direta de subespaços indexados pelos elementos de G, ou seja,
M
A= A g , de modo que A g A h ⊆ A g h para quaisquer g , h ∈ G. Um dos exemplos
g ∈G
M
mais banais de graduação é a Z-graduação de C[x] dada por C[x] = Cn [x], sendo
n∈Z
Cn [x] = {ax n : a ∈ C} se n ≥ 0 e Cn [x] = {0} se n < 0.
Os elementos pertencentes a um subespaço A g são chamados G-homogêneos de
grau g .
Perceba que 1 A ∈ A 1G . Primeiro tome B uma base de A formada exclusivamente
por elementos G-homogêneos (isso claramente é possível). Então 1 A ·b = b para todo
X
b ∈ B . Escrevendo 1 A de maneira única como 1 A = c g , com c g ∈ A g , temos
g ∈G

à !
X X
b= cg b = c g b.
g ∈G g ∈G

Como cada b considerado é G-homogêneo, devemos ter c g b = 0 se g 6= 1G . Portanto

1 A · b = b = c 1G b e c g b = 0,

para todo b ∈ B e todo g 6= 1G . Assim, c 1G a = a para toda a ∈ A (por linearidade).


Em particular, c 1G 1 A = 1 A , implicando 1 A = c 1G e c g = 0 se g 6= 1G , de onde segue o
afirmado.
Dada uma G-graduação de uma álgebra, sendo G um grupo abeliano finito, po-
demos definir uma ação de G em A com algumas propriedades extras, como veremos

55
a seguir. Primeiramente perceba que, dado a ∈ A, existem únicos a g ∈ A g , g ∈ G, de
X
modo que a = a g . Definimos então a ação de h ∈ G em A por:
g ∈G

χg (h)a g .
X
h∗a =
g ∈G

É fácil verificar que essa ação é linear e que (h 1 h 2 )∗a = h 1 ∗(h 2 ∗a). Esta última segue
do fato de os caracteres envolvidos serem unidimensionais e, portanto, homomorfis-
mos. Essa ação ainda satisfaz uma propriedade extra: h ∗ (ab) = (h ∗ a)(h ∗ b).
P P
Vamos verificar essa propriedade. De fato, sendo a = a g e b = b g , temos

χg (h)a g )( χu (h)b u = χg (h)χu (h)a g b u .


X X X X
(h ∗ a)(h ∗ b) = (
g ∈G u∈G t ∈G g u=t

Fixado t ∈ G e considerando todos os pares (g , u) de G × G tais que g u = t , temos


X X
a g b u = c t ∈ A t , e, consequentemente, ab = c t . Assim,
g u=t t ∈G

χg (h)χu (h)a g b u = χg u (h)a g b u = χt (h) χt (h)c t ,


X X X X X X X
a g bu =
t ∈G g u=t t ∈G g u=t t ∈G g u=t t ∈G

de onde segue que (h ∗ a)(h ∗ b) = h ∗ (ab).


Além disso, para todo h ∈ G, h ∗ 1 A = 1 A . De fato, como 1 A ∈ A 1G , temos

h ∗ 1 A = χ1G (h)1 A = 1 A ,

uma vez que χ1G (h) = 1, para todo h ∈ G, por se tratar do caráter trivial.
Desse modo, sendo ρ a representação associada a essa ação, além de ρ(h) ser uma
transformação linear invertível de A como espaço vetorial, temos que ρ(h) também
preserva o produto e a unidade da álgebra, o que o torna um automorfismo da álgebra
A. Por isso, diz-se que G age em A por automorfismos.
É natural perguntarmos se a recíproca também ocorre, isto é, se dada uma ação
de um grupo abeliano finito por automorfismos em uma F -álgebra A a mesma in-
duz uma G-graduação em A. Como veremos a seguir, a resposta a essa pergunta é
afirmativa.
Considere uma ação de G em A por automorfismos. Pelo Teorema de Maschke,
A se decompõe como soma direta de G-módulos irredutíveis. Como estamos assu-
mindo que F é algebricamente fechado de característica zero e G é abeliano, esses
submódulos irredutíveis são unidimensionais. Cada um desses G-submódulos irre-
dutíveis está associado a um caráter de Ĝ. Para cada g ∈ G, definamos A g como sendo
a soma direta de todos os submódulos irredutíveis cujo caráter é igual a χg ∈ Ĝ. Tal
como definido, cada A g é um subespaço de A (inclusive é um G-submódulo de A).
Vamos verificar que A g A h ⊆ A g h . Se A g A h = {0}, nada há a fazer. Caso contrário,
tomando a ∈ A g e b ∈ A h tais que ab 6= 0, temos que, para qualquer u ∈ G,

u ∗ (ab) = (u ∗ a)(u ∗ b) = (χg (u)a)(χh (u)b) = χg (u)χh (u)(ab) = χg h (u)ab.

56
De modo que o subespaço gerado por ab é um G-submódulo unidimensional de ca-
ráter χg h . Afirmamos que ab ∈ A g h . De fato, ab pode ser escrito de maneira única
P
como uma soma da forma ab = t ∈G c t , onde c t ∈ A t . Então

χg h (u) c t = χg h (u)(ab) = u ∗ (ab) = χt (u)c t ;


X X
t ∈G t ∈G

para qualquer u ∈ G; de onde concluímos que χt (u) = χg h (u), para quaisquer u ∈ G,


se c t 6= 0. Desse modo, necessariamente devemos ter c t = 0 se t 6= g h e ab ∈ A g h .
Assim, fica mostrado o seguinte resultado:

Teorema 6.2. Sejam F um corpo algebricamente fechado de característica zero e G um


grupo abeliano finito.

(i) Dada uma F -álgebra G-graduada A, existe uma ação de G em A por automor-
fismos de modo que h ∗ a = χg (h)a, para todo a ∈ A g .

(ii) Reciprocamente, dada uma ação por automorfismos de G em A, temos que A =


⊕g ∈G A g , onde A g = {a ∈ A : h ∗ a = χg (h)a; ∀h ∈ G}, o que define uma G-gradu-
ação em A.

Exemplo 6.3. Considerando G = C 2 × C 2 = {(1, 1), (1, −1), (−1, 1), (−1, −1)}, (notação
multiplicativa), considere a G-graduação de M 4 (C) na qual cada matriz e i j é G-homo-
gênea com os seguintes graus: e i j possui grau (1, 1) se i − j = 0; e i j possui grau (1, −1)
se i + j ≡ 3 (mod 4); e i j possui grau (−1, −1) se i + j ≡ 1 (mod 4); e e i j possui grau
(−1, 1) se i − j ≡ 2 (mod 4). Vamos agora indexar os caracteres irredutíveis de G por
elementos de G de modo que χg χh = χg h . Devido à simetria de G, o único caráter cujo
índice é unicamente determinado é o caráter trivial, que deve ser indexado por (1, 1);
os demais caracteres podem ser indexados por qualquer um dos demais elementos.
Vamos então fixar o seguinte:

(1, 1) (1, −1) (−1, 1) (−1, −1)


χ(1,1) 1 1 1 1
χ(1,−1) 1 −1 1 −1
χ(−1,1) 1 1 −1 −1
χ(−1,−1) 1 −1 −1 1

Assim, obtemos a seguinte ação de G em M 4 (C):

α β γ δ α γ
   
−β −δ
 ε ζ η θ  ζ θ 
   
 =  −ε −η

(1, −1) ∗  ,
 ι κ λ µ   ι −κ λ −µ 
   

ν ξ o π −ν ξ −o π

α β γ δ α β
   
−γ −δ
 ε ζ η θ 
= ε ζ
   
 −η −θ 
(−1, 1) ∗  .
 ι κ λ µ   −ι −κ λ µ 
   

ν ξ o π −ν −ξ o π

57
Repare que a ação de (−1, −1) fica unicamente determinada pelas ações apresen-
tadas acima uma vez que (−1, −1) = (1, −1)(−1, 1).
Pelo último teorema, segue que essa ação é uma ação por automorfismos, mas
vamos explicitar os automorfismos envolvidos. Denotando por ρ a representação as-
sociada a essa ação, temos que ρ(1, −1) é o automorfismo interno ψ A e que ρ(−1, 1) é
o automorfismo interno ψB , sendo
   
1 0 0 0 1 0 0 0
   
 0 −1 0 0 
 eB = 0 1 0 0 

A= ;
 0 0 1 0   0 0 −1 0 
   

0 0 0 −1 0 0 0 −1

onde ψ X denota o automorfismo interno de M 4 (C) induzido por uma matriz inver-
tível X ∈ M 4 (C), i.e. ψ X (C ) = XC X −1 , para toda C ∈ M 4 (C). Consequentemente,
ρ(−1, −1) = ψ AB .

Exemplo 6.4. Vamos fazer agora um exemplo inverso. Consideremos o mesmo grupo
G do exemplo anterior e considere ρ : G → Aut(U T3 (C)) dada por

ρ(1, 1) = IdU T3 (C) , ρ(1, −1) = ψ A , ρ(−1, 1) = ψB e ρ(−1, −1) = ψ AB ,

onde    
1 0 0 1 0 0
   
A=
 0 −1 0  , B =  0 −1 0 
  
0 0 1 0 0 −1

e ψ X denota o automorfismo interno de U T3 (C) induzido por uma matriz invertível


X ∈ U T3 (C), i.e. ψ X (C ) = XC X −1 , para toda C ∈ U T3 (C).
Como {Id, A, B, AB } é um grupo multiplicativo isomorfo a G e como, para quais-
quer duas matrizes invertíveis X , Y ∈ U T3 (C), temos ψ X ◦ ψY = ψ X Y , temos que ρ
assim definida é um homomorfismo de grupos entre G e Aut(U T3 (C)), definindo por-
tanto uma ação por automorfismos de G em U T3 (C).
Vamos agora definir uma G-graduação em U T3 (C) a partir dessa ação. Assim,
U T3 (F )(1,1) = {C ∈ U T3 (C) : h ∗ C = χ(1,1) (h)C ; ∀h ∈ G}. Como χ(1,1) (h) = 1, para todo
h ∈ G, temos que C ∈ U T3 (C)(1,1) se e somente se ψ A (C ) = ψB (C ) = C (repare que,
como ψ AB = ψ A ◦ ψB , a condição anterior implica ψ AB (C ) = C ). Como
       
α β γ α −β γ α β γ α −β −γ
ψA   e ψ B  0
       
 0
 δ ε 
 =  0
  δ −ε   δ ε 
 =  0
  δ ε 
,
0 0 ζ 0 0 ζ 0 0 ζ 0 0 ζ

uma matriz C satisfaz ψ A (C ) = ψB (C ) = C somente se C é diagonal e, portanto, a


componente U T3 (C)(1,1) é constituído pelas matrizes diagonais da álgebra.
Usando χ(1,−1) e χ(−1,1) tais como na tábua dada no exemplo anterior, vamos de-
terminar as demais componentes da graduação. Assim, U T3 (F )(1,−1) = {C ∈ U T3 (C) :

58
h ∗ C = χ(1,−1) (h)C ; ∀h ∈ G} e uma matriz C pertence a essa componente somente se
−ψ A (C ) = ψB (C ) = C , ou seja,
 
0 0 0
 
 0 0 ε
C =  , i.e. U T3 (C)(1,−1) = Ce 2,3 .

0 0 0

De modo análogo conclui-se que U T3 (C)(−1,1) = Ce 1,3 e U T3 (C)(−1,−1) = Ce 1,2 .

6.3 Exercícios

Exercício 52. (a) Seja G um grupo abeliano finito. Mostre que, dada uma aplicação
f : M n (C) → G pode-se definir uma G-graduação em M n (C) de modo que cada
matriz e i j é G-homogênea de grau f (i )−1 f ( j ).

(b) Explicite uma ação de G por automorfismos em M 2 (C) que induz a G-graduação
dada no item anterior para G = C 3 , f (1) = 1 e f (2) = ω (considere C 3 = {1, ω, ω2 }).

Exercício 53. Seja e idempotente que é também um elemento G-homogêneo de uma


álgebra G-graduada A. Mostre que o grau de e é 1G .

Exercício 54. Sendo F um corpo e G um grupo, repare que F G possui uma estrutura
natural de F -álgebra com a multiplicação dada pela multiplicação do grupo esten-
dida por linearidade para todo o espaço vetorial.

(a) A ação de G em FG que é associada à representação regular é uma ação por au-
tomorfismos? Se sim, determine as componentes de uma G-graduação envol-
vida.

(b) Faça o mesmo para a ação dada pela conjugação.

Exercício 55. Mostre que existem exatamente ϕ(n) isomorfismos entre o grupo cí-
clico C n e Cˆn , sendo ϕ a função de Euler-Fermat.
L
Exercício 56. Seja A g uma G-graduação de uma álgebra A. Mostre que, dado um
automorfismo Φ de G, a soma direta A = B g , onde B g = A Φ(g ) é também uma G-
L

graduação de A. Construa um exemplo concreto a partir da G-graduação fornecida


no Exemplo 6.4.

Exercício 57. Seja G = C n1 ×· · ·×C nk . Explique como, a partir de isomorfismos α1 , . . . , αk ,


sendo αi : C n → Cˆn , pode-se construir um isomorfismo entre G e Ĝ.
i i

Exercício 58. Sejam G um grupo abeliano finito e A uma F -álgebra com F algebrica-
mente fechado de característica zero. Mostre que, se existe um subgrupo H do grupo
multiplicativo formado pelos elementos invertíveis de A com H ∼= G, então existe uma
ação por automorfismos natural de G em A. Descreva a graduação proveniente dessa
ação.

59
L
Exercício 59. Seja A g uma G-graduação de uma álgebra A e seja f : A → A au-
L
tomorfismo. Mostre que B g , onde B g = f (A g ) é também uma G-graduação dessa
álgebra.

Exercício 60. Seja A a subálgebra de M 4 (C) a seguir:


 

 ∗ 0 ∗ ∗ 

 
 
 0 ∗ ∗ ∗ 
A= 

 ,



 0 0 ∗ 0 


 
0 0 0 ∗
 

onde as entradas com ∗ podem assumir qualquer valor. Considere ainda a decompo-
sição de A em A = A (1,1) ⊕ A (−1,1) ⊕ A (1,−1) ⊕ A (−1,−1) , onde

A (1,1) = C(e 11 + e 22 ) ⊕ C(e 33 + e 44 ) ⊕ C(e 13 + e 14 + e 23 + e 24 )


A (−1,1) = C(e 11 − e 22 ) ⊕ C(e 13 + e 14 − e 23 − e 24 )
A (1,−1) = C(e 33 − e 44 ) ⊕ C(e 13 − e 14 + e 23 − e 24 )
A (−1,−1) = C(e 13 − e 14 − e 23 + e 24 )

(a) Verifique que a decomposição acima define uma C 2 ×C 2 -graduação em A.

(b) Encontre uma ação por automorfismos de C 2 ×C 2 em A que induza essa gradua-
ção.

(c) Descreva todos os automorfismos de C 2 × C 2 e, para cada automorfismo Φ 6= Id,


forneça a G-graduação obtida a partir desse automorfismo, como descrita no
Exercício 56.

(d) Seja ρ a representação associada à ação que você construiu no item (b). Mostre
que se g 6= 1C 2 ×C 2 , então ρ(g ) não é um automorfismo interno de A.

60
Capítulo 7

Representações irredutíveis do
grupo simétrico

Nesse último capítulo, dado um natural n ≥ 2, vamos exibir, a menos de equivalência,


todas as representações irredutíveis do grupo simétrico S n . O caso n = 2 é bastante
simples, pois nesse caso o grupo é isomorfo a Z2 e o caso n = 3 já foi discutido, mas a
abordagem adotada é geral e funciona inclusive para esses casos também.

7.1 Partições, diagramas de Young, tabelas e tabloides

Primeiramente convém observar que Q é um corpo de decomposição para S n e as


bases dos S n -módulos irredutíveis aqui calculados (sobre Q) continuam a ser bases
de S n -módulos irredutíveis sobre qualquer corpo F de característica zero.
Vamos começar definindo partição de um inteiro.

Definição 7.1. Fixado um inteiro n ≥ 2, uma partição λ de n (denota-se λ ` n) é uma


k-upla de inteiros positivos λ = (n 1 , . . . , n k ) satisfazendo n 1 + . . . + n k = n e n 1 ≥ n 2 ≥
. . . ≥ nk .

Há uma maneira bem natural de associar uma permutação σ ∈ S n a uma partição


de n. Escrevendo σ como produto de ciclos disjuntos em ordem decrescente de com-
primento incluindo os 1-ciclos formados pelos pontos fixos de σ, associamos σ à par-
tição (n 1 , . . . , n k ), sendo n i o comprimento do i -ésimo ciclo que aparece na decompo-
sição de σ. É importante observar que, a fim de cumprir a condição n 1 + . . . + n k = n,
é imprescindível que todos os 1-ciclos associados aos pontos fixos de σ sejam consi-
derados. Vejamo o exemplo seguinte. Tomando
à !
1 2 3 4 5 6 7
σ= ,
4 2 5 1 7 6 3

a decomposição de σ como ciclos disjuntos satisfazendo as condições pedidas fica

σ = (3 5 7)(1 4)(2)(6)

61
e σ é associada à partição (3, 2, 1, 1) ` 7, que caracteriza a classe de conjugação a que
pertence a permutação σ, já que todas as permutações dessa classe de conjugação
possuem mesmo tipo cíclico.
Assim, a cada partição de n vamos associar um S n -módulo irredutível distinto.
Um problema interessante que é geralmente deixado de lado na bibliografia acerca
do assunto é determinar o número de partições p(n) do inteiro n. A razão para essa
omissão é que o método envolvido na demonstração da fórmula é essencialmente
analítico e não dialoga com o restante do assunto. Além do mais, a fórmula não é das
mais fáceis como pode ser visto a seguir.
à à s µ ¶!!
1 X ∞ p d 1 π 2 1
p(n) = p k A k (n) 1
senh n− ,
π 2 k=1 d n n − 24 k 3 24

onde
k−1 j hj
µ
hj
¹ º
1

2πi hn
e πi αh,k (n) , sendo αh,k (n) =
X X
A k (n) = − − − ,
h≤k;mdc(h,k)=1 j =1 k k k 2 k

e fica a título de curiosidade. Essa fórmula foi obtida por Rademacher em 1937,
baseando-se em estimativas assintóticas obtidas primeiramente por Ramanujan e
Hardy em 1918.
Voltando ao nosso assunto principal, dada uma partição λ ` (n 1 , . . . , n k ) do in-
teiro n, um λ-diagrama de Young é uma tabela vazia com k linhas, sendo que na
i -ésima linha há n i células que constituem essa linha. A seguir exibimos diagramas
de Young D 1 , D 2 , D 3 e D 4 associados, respectivamente, às partições (3, 2, 1, 1), (4, 2, 1),
(7) e (1, 1, 1, 1, 1, 1, 1) de 7.

D1 = , D2 = , D3 = , D4 = .

Uma λ-tabela de Young t λ (ou simplesmente t quando não há risco de ambigui-


dades) é um diagrama de Young com suas células preenchidas, sem repetições, com
inteiros de 1 a n, do qual λ é partição. Assim, fixada uma partição λ de n, existem n!
λ-tabelas de Young. Dizemos que duas λ-tabelas de Young são linha-equivalentes se
os elementos em cada linha dessas tabelas são os mesmos. No exemplo a seguir, as
tabelas t 1 e t 2 são linha-equivalentes, mas t 1 e t 3 (e, portanto, t 2 e t 3 ) não são linha-
equivalentes.
t1 = 1 3 6 , t2 = 6 1 3 ,t =
3
3 1 6 .
2 7 7 2 2 7
5 5 4
4 4 5
Claramente a noção de linha-equivalência é uma relação de equivalência. Além
disso o número de tabelas em cada classe de equivalência é o mesmo, a saber, λ! :=

62
λ1 !λ2 ! . . . λk ! e, portanto, o número de classes de equivalência é n!/λ!. Repare ainda
que sempre podemos escolher um representante de cada classe possuindo as entra-
das das células de cada linha em ordem crescente. Cada classe de equivalência é cha-
mada um λ-tabloide e dada uma λ-tabela t , denotamos o λ-tabloide associado a ela
por t e com os números preenchidos em negrito. Considerando t 1 dada no exemplo
acima, temos
t1 = 1 3 6 = 6 1 3 .
2 7 7 2
5 5
4 4

Fixado um inteiro n ≥ 2 e uma partição λ do mesmo, existe uma maneira bas-


tante natural de se definir uma ação à esquerda de S n sobre o conjunto de todas as λ-
tabelas de Young, sendo σ∗t a tabela obtida trocando i por σ(i ), para todo i = 1, . . . , n,
como no exemplo a seguir, considerando σ = (1 3 7)(2 5) ∈ S 7 .

σ∗ 1 3 6 = 3 7 6 .
2 7 5 1
5 2
4 4

Note que dadas duas λ-tabelas s e t quaisquer sempre é possível encontrar σ ∈ S n


tal que s = σ ∗ t , basta definir, para cada i = 1, . . . , n, σ(i ) = j sendo j o inteiro que
ocupa em s a posição que i ocupa em t . Repare ainda que, se t 1 e t 2 são duas λ-
tabelas de Young linha-equivalentes, σ ∗ t 1 e σ ∗ t 2 também serão linha-equivalentes,
então a ação à esquerda definida acima induz uma ação à esquerda de S n sobre os λ-
tabloides. Essa ação transforma o Q-espaço vetorial M λ que tem por base o conjunto
formado por todos os λ-tabloides {t1 , . . . , tn!/λ! } em um S n -módulo.

7.2 Módulos de Specht

Infelizmente, como pode ser constatado no Exercício 61, os S n -módulos M λ não são
os S n -módulos irredutíveis de S n (as relações de ortogonalidade não são satisfeitas).
Nesta seção iremos definir um submódulo S λ (chamado λ-módulo de Specht) para
cada M λ que será enfim o S n -módulo irredutível procurado. Dada uma λ-tabela t
definimos o subgrupo C t de S n como sendo o subgrupo formado por todas as permu-
tações de S n para as quais as entradas de cada coluna de t permanecem as mesmas.
Por exemplo, considerando

t= 1 3 ,
2 4
5

temos que C t = {(1), (1 2), (1 5), (2 5), (1 2 5), (1 5 2), (3 4), (1 2)(3 4), (1 5)(3 4), (2 5)(3 4),
(1 2 5)(3 4), (1 5 2)(3 4)}.

63
Com isso, para uma λ-tabela t , definimos o politabloide associado a t como
sendo e t ∈ M λ dado por
(−1)σ σt.
X
et =
σ∈C t

É importante ressaltar que, em geral, se t = s, mas t 6= s, então e t 6= e s . Consi-


derando ainda t dada no exemplo acima, perceba que s = (1 3) ∗ t satisfaz s = t, no
entanto
et = 1 3 + 2 3 + 3 5 − 1 4 − 2 4 − 4 5 ;
2 4 4 5 1 4 2 3 3 5 1 3
5 1 2 5 1 2
e
es = 1 3 + 1 2 + 1 5 − 3 4 − 2 4 − 4 5 .
2 4 4 5 3 4 1 2 1 5 1 3
5 3 2 5 3 2
O lema a seguir descreve como C t e e t se comportam com respeito a uma permu-
tação de S n .

Lema 7.2. Dada uma λ-tabela t e dada σ ∈ S n ,

C σ∗t = σC t σ−1 e além disso, e σ∗t = σ ∗ e t .

Demonstração. Uma permutação τ pertence a C σ∗t se ela mantém fixas as colunas


de σ ∗ t . Assim dados 1 ≤ i , j ≤ n, temos que σ(i ) e σ( j ) pertencerão à mesma co-
luna de σ ∗ t se e somente se i e j pertencerem à mesma coluna de t . Mas então
τ ∈ C σ∗t se e somente se, dados σ(i ) e σ( j ) em uma mesma coluna de σ ∗ t acontecer
de τσ(i ) e τσ( j ) permanecerem na mesma coluna em que estavam. Sejam k e l tais
que σ(k) = τσ(i ) e σ(l ) = τσ( j ). Então temos que σ(k) e σ(l ) pertencem à mesma
coluna de σ ∗ t . Pelo mesmo raciocínio empregado antes, isso ocorre se e somente se
k e l pertencem à mesma coluna de t , mas k = σ−1 τσ(i ) e l = σ−1 τσ( j ). Assim, temos
que τ ∈ C σ∗t se, e somente se, dados i e j em uma mesma coluna de t , tivermos que
σ−1 τσ(i ) e σ−1 τσ( j ) também pertencem a uma mesma coluna de t ; ou seja, τ ∈ C σ∗t
se e somente se σ−1 τσ ∈ C t . Logo, τ = σπσ−1 para alguma permutação π ∈ C t , o que
mostra que C σ∗t ⊆ σC t σ−1 . A inclusão reversa segue do mesmo raciocínio conside-
rando que t = σ−1 σt .
Para a segunda igualdade, basta aplicar o que acabamos de provar.

(−1)π π ∗ (σ ∗ t) = (−1)στσ (στσ−1 ) ∗ (σ ∗ t) = (−1)τ (στ) ∗ t =


X X −1 X
e σ∗t =
π∈C σ∗t τ∈C t τ∈C t
à !
σ∗ (−1)τ τ ∗ t = σ ∗ e t .
X
τ∈C t

Dada uma partição λ ` n, o módulo de Specht S λ associado a λ é o submódulo


cíclico de M λ gerado por um λ-politabloide e t . De fato, qualquer que seja o polita-
bloide tomado, o módulo gerado é o mesmo já que, dadas t e s duas λ-tabelas quais-
quer, considerando σ tal que σ ∗ t = s, temos, pelo lema anterior, e s = σ ∗ e t ∈ 〈e t 〉

64
e 〈e s 〉 ⊆ 〈e t 〉. Como t e s são arbitrárias, a inclusão reversa também vale e temos a
igualdade.
Finalizamos essa seção com alguns exemplos.

Exemplo 7.3. Considere λ = (1, 1, . . . , 1) ` n e considere a tabela

t= 1 .
2
..
.
n

Nesse caso, C t = S n e e t possui n! parcelas, aparecendo todos os λ-tabloides em


sua expressão. O λ-tabloide s aparece multiplicada por (−1)σ onde σ ∗ t = s. Repare
que C s = S n também e que

(−1)τ τ ∗ s = (−1)τ (τσ) ∗ t = (−1)σ (−1)τσ (τσ) ∗ t = (−1)σ e t .


X X X
es =
τ∈S n τ∈S n τ∈S n

Ou seja, para qualquer outra λ-tabela s, temos e s = ±e t e, portanto, S λ possui dimen-


são 1. Além disso, lembrando que σ ∗ e t = e σ∗t , segue que a representação associada
a S λ é a representação sinal de S n apresentada no Exercício 23.

Exemplo 7.4. Para não passar a falsa impressão de que todo módulo de Specht é uni-
dimensional consideremos λ = (n − 1, 1). Vamos denotar por t a tabela preenchida
com os números de 1 a n − 1 em ordem crescente da esquerda para a direita na pri-
meira linha e com o inteiro n na segunda linha. Então e t = t − (1 n) ∗ t. Claramente
e (n−1 n)∗t não é múltiplo escalar de e t .
Vamos determinar uma base para S λ . Primeiramente observe que o conjunto

{e t , e (2 n)∗t , e (3 n)∗t , . . . , e (n−1 n)∗t }

é linearmente independente. Com efeito, somente em e (i n)∗t aparece um tabloide


com i na segunda linha multiplicado por um coeficiente não nulo e se

α1 e t + α2 e (2 n)∗t + . . . + αn−1 e (n−1 n)∗t = 0,

cada αi ∈ Q deve ser nulo. Para mostrar que esse conjunto gera S λ como espaço
vetorial, basta mostrar que, qualquer que seja a λ-tabela s, e s se escreve como com-
binação linear desses elementos. De fato, seja i a primeira entrada da primeira linha
de s e seja j a entrada da segunda linha, temos que e s = e (1 i )∗t − e (1 j )∗t .

7.3 Irredutibilidade dos módulos de Specht

A fim de mostrar que os módulos de Specht são irredutíveis e que módulos associados
a partições diferentes de n não são isomorfos, vamos introduzir uma relação de or-
dem parcial , chamada dominância, no conjunto Λn formado por todas as partições
de n.

65
Definição 7.5. Dadas duas partições λ = (λ1 , . . . , λk ) e µ = (µ1 , . . . , µl ) de Λn , dizemos
que λ domina µ (denota-se λ  µ) se, para todo i = 1, . . . , l tivermos

λ1 + . . . + λi ≥ µ1 + . . . + µi .

Caso i > k, considera-se λi = 0.

É um exercício bem simples verificar que a dominância é uma relação de ordem


(v. Exercício 62). É importante ressaltar que essa ordem não é total já que, por exem-
plo, (2, 2, 2) e (3, 1, 1, 1) não são comparáveis em Λ6 .
O lema combinatório seguinte será necessário mais tarde.

Lema 7.6. Sejam λ, µ ∈ Λn para as quais existem tabelas t λ e s µ de modo que, para
toda linha de s, todos os elementos de uma mesma linha de s aparecem em colunas
distintas de t . Então λ  µ.

Demonstração. Como vale para todas as linhas de s, em particular vale para a pri-
meira linha de s e todos os elementos da primeira linha de s devem aparecer em co-
lunas distintas de t . Como o número de colunas de uma tabela é igual ao número
de elementos da primeira linha, segue que λ1 ≥ µ1 . É possível então encontrar em
C t uma permutação σ1 de modo que os elementos da primeira linha de s apareçam
na primeira linha de t 1 = σ1 ∗ t . Como σ1 ∈ C t , os elementos em cada coluna de t e
de t 1 são os mesmos. Repetindo indutivamente esse argumento, é possível sempre
alocar os elementos da i -ésima linha de s nas primeiras i linhas de t sem alterar os
elementos de cada coluna de t , bastando para isso aplicar σi ∈ C t a t i −1 que mande
os elementos da i -ésima linha de s que aparecem abaixo da i -ésima linha de t para a
célula da mesma coluna a que pertencem na i -ésima linha de t , obtendo t i de modo
que os elementos das primeiras i linhas de s aparecem nas primeiras i linhas de t e,
portanto,
λ1 + . . . + λi ≥ µ1 + . . . + µi ,

qualquer que seja i = 1, . . . , l e λ  µ.

Além da dominância precisaremos introduzir um produto interno em M λ para


alcançarmos nosso objetivo. Considere então 〈·, ·〉 o produto interno em M λ para
o qual o conjunto formado por todos os λ-tabloides formam uma base ortonormal.
Convém agora considerar QS n como uma álgebra e considerar a ação à esquerda de
QS n sobre M λ induzida da ação de S n (v. Exercício 64). O lema anterior permanece
válido se trocamos Q por qualquer corpo F de característica zero.

Lema 7.7. Seja H um subgrupo de S n e denote por H − ∈ QS n o elemento

H− = (−1)σ σ.
X
σ∈H

Em particular, e t = C t− ∗ t.

(i) Se σ ∈ H , σH − = H − σ = (−1)σ H − .

66
(ii) Para quaisquer u, v ∈ M λ vale 〈H − ∗ u, v〉 = 〈u, H − ∗ v〉.

(iii) Se a transposição (b c) ∈ H , existe p ∈ F S n tal que H − = p((1) − (b c)).

(iv) Se t é uma λ-tabela, os inteiros b e c estão em uma mesma linha de t e a trans-


posição (b c) ∈ H , então H − ∗ t = 0.

Demonstração. (i) Dada σ ∈ H

σH − = (−1)τ στ = (−1)σ (−1)στ στ = (−1)σ H − .


X X
τ∈H τ∈H

A conta para H σ é análoga.


(ii) Devido à bilinearidade, basta considerar o caso u = t e v = s para duas λ-


tabelas t e s arbitrárias. Repare que se não existe σ ∈ H tal que σ∗t = s então 〈H − t, s〉 =
0. Como σ ∗ t = s se e somente se t = σ−1 ∗ s, nesse caso, também não existe τ ∈ H
satisfazendo τ ∗ s = t e 〈t, H − s〉 = 0. Caso contrário, denote por Ht,s o subconjunto de
H formado por todas as permutações σ que satisfazem s = σ∗t. Repare que σ ∈ Ht,s se
e somente se σ−1 ∈ Hs,t . Devido à ortonormalidade dos tabloides, e a (−1)σ = (−1)σ ,
−1

segue que
〈H − ∗ t, s〉 = (−1)σ = (−1)τ = 〈t, H − ∗ s〉.
X X
σ∈Ht,s τ∈Hs,t

(iii) Se (b c) ∈ H , as classes laterais à esquerda do subgrupo {(1), (b c)} em H são,


todas elas, formadas por dois elementos da forma {σ, σ(b c)} de paridades opostas, já
que (b c) é uma transposição. Logo podemos escolher para, cada classe lateral, sem-
pre um representante σi par. É possível então decompor H em uma união disjunta
da forma
|H |/2
{σi , σi (b c)}.
[
H=
i =1
Assim, Ã !
|H |/2

σi (1 − (b c)).
X
H =
i =1
(iv) Se b e c pertencem a uma mesma linha de t , então ((1) − (b c)) ∗ t = 0 e o
resultado segue de (iii).

Corolário 7.8. Sejam λ, µ ∈ Λn e sejam t uma λ-tabela e s uma µ-tabela. Se C t− ∗s 6= 0,


então λ  µ e se λ = µ, então C t− ∗ s = ±t ou C t− ∗ s = 0.

Demonstração. Pela contrapositiva do item (iv) do lema anterior, dados dois intei-
ros b e c quaisquer em uma mesma linha de s, a transposição (b c) não pertence a
C t− . Em particular, esses elementos devem pertencer a colunas distintas de t . Logo o
resultado segue do Lema 7.6.
Se λ = µ, e C t− ∗s 6= 0, pelo item (iv) do lema anterior, quaisquer elementos em uma
mesma linha de s aparecem em colunas distintas de t . Logo, como λ = µ, é possível
encontrar σ ∈ C t tal que σ ∗ t = s. Pelo item (i) do lema anterior segue que

C t− ∗ s = C t− σ ∗ t = (−1)σC t− ∗ t = ±e t .

67
Em particular, temos o seguinte corolário

Corolário 7.9. Se u ∈ M λ e t é uma λ-tabela, então C t− ∗u é um múltiplo escalar de e t .

O teorema a seguir nos garante a irredutibilidade dos módulos de Specht.

Teorema 7.10. Se U é um submódulo de M λ então U ⊇ S λ ou U ⊆ (S λ )⊥ . Em particular


S λ é irredutível.

Demonstração. Se existem u ∈ U e uma λ-tabela t para os quais C t− ∗ u 6= 0, do coro-


lário anterior segue que C t− ∗u = αe t , para algum α ∈ Q \{0} e, portanto, e t ∈ U . Como
S λ = 〈e t 〉, temos que S λ ⊆ U .
Do contrário, para qualquer u ∈ U e qualquer λ-tabela t , temos C t− u = 0. Do item
(ii) do Lema 7.7 segue que

〈u, e t 〉 = 〈u,C t− ∗ t〉 = 〈C t− ∗ u, t〉 = 0.

Ressaltamos que, nesse caso, essa igualdade é válida para qualquer u ∈ U e qualquer
λ-tabela t . Como S λ é cíclico gerado por e t , temos que {σ ∗ e t | σ ∈ S n } gera S λ como
espaço vetorial. Além disso σ∗e t = e σ∗t e, portanto 〈u, σ∗e t 〉 = 0 para qualquer u ∈ U .
Assim, existe uma base {e t1 , . . . , e tk } de S λ satisfazendo 〈u, e ti 〉 = 0 para qualquer i e
qualquer u ∈ U , de onde segue que U ⊆ (S λ )⊥ . Assim, se U ( S λ então U ⊆ (S λ )⊥ .
Logo U ⊆ S λ ∩ (S λ )⊥ = {0} e, portanto, S λ é irredutível.

=G S µ .
Agora só resta checar que se λ, µ ∈ Λn são partições distintas então S λ 6∼

Lema 7.11. Considere λ, µ ∈ Λn para as quais existe ϕ ∈ HomG (S λ , M µ ) não nulo. En-
tão λ  µ.

Demonstração. Como S λ = 〈e t 〉 e ϕ 6= 0, então ϕ(e t ) 6= 0. Repare ainda que podemos


decompor M λ = S λ ⊕ (S λ )⊥ , assim podemos definir um G-homomorfismo ϕ
e : Mλ →
M µ que estende ϕ impondo ϕ(u)e = 0 se u ∈ (S λ )⊥ . Então
à !
− − −
ϕ(e t ) = ϕ(C t ∗ t) = C t ∗ ϕ(t) = C t ∗ αi si .
X
i

Logo, para algum i , C t− si 6= 0, sendo s i uma µ-tabela e, pelo Corolário 7.8, λ  µ.

Teorema 7.12. O conjunto {S λ | λ ∈ Λn } forma uma lista completa de todos os S n -


módulos irredutíveis sobre Q a menos de isomorfismo.

Demonstração. Como comentado anteriormente, basta mostrar que se λ e µ são duas


partições distintas de n, então S λ ∼
6 G S µ , já que o número de módulos de Specht é
=
igual ao número de classes de conjugação de S n . Mas se S λ ∼
=G S µ , como S µ ⊂ M µ ,
denotando por ϕ : S λ → S µ um S n -isomorfismo entre os dois, a aplicação ı µ ◦ϕ : S λ →
M µ , onde ı µ denota a inclusão de S µ em M µ , é um S n -homomorfismo não nulo e,
pelo lema anterior, λ  µ. Por outro lado, aplicando o mesmo raciocínio a ϕ−1 e ı λ
temos µ  λ e, portanto, λ = µ.

68
7.4 Exercícios

Exercício 61. Sendo λ1 = (3), λ2 = (2, 1) e λ3 = (1, 1, 1) as partições de 3. Forneça os


caracteres χi , i = 1, 2, 3 associado a M λi .

Exercício 62. Mostre que a dominância constitui uma relação de ordem parcial em
Λn .

Exercício 63. Mostre que a recíproca do Lema 7.6 também vale, isto é, se λ  µ em Λn ,
existem t λ e s µ de modo que, em qualquer linha de s os elementos da linha aparecem
em colunas distintas de t .

Exercício 64. Sejam G um grupo e V um G-módulo. Mostre que F G munido do pro-


duto oriundo do produto do grupo e estendido por linearidade sobre todo F G é uma
F -álgebra com unidade (chamada álgebra grupo), isto é, o produto é associativo, dis-
tribui à esquerda e à direita com respeito à adição de F G; dados α ∈ F e p, q ∈ F G,
temos que α(pq) = (αp)(q) e existe elemento 1FG que é neutro com respeito ao pro-
duto da álgebra. Nesse caso é possível definir uma ação à esquerda de F G sobre V
dada por à !
αg g v =
X X
g (αg v);
g ∈G g ∈G

para qualquer v ∈ V . Mostre que, dados p, q ∈ F G e v ∈ V vale (pq)v = p(q v) e que


(1F G )v = v. Mostre ainda que se ϕ : U → V é G-homomorfismo entre os G-módulos
U e V , dado p ∈ F G, ϕ(pu) = pϕ(u), para todo u ∈ U .

Exercício 65. Forneça bases para os seguintes módulos de Specht S (2,1) , S (3,1) , S (2,2)
e S (3,1,1) . Calcule também os caracteres de cada um desses S n -módulos avaliados em
cada uma das classses de conjugação do respectivo S n .

Exercício 66. Mostre que se λ ` n sempre existe um submódulo unidimensional de


M λ . Fixado n natural, descreva todas as partições de n para as quais M λ é irredutível.

Exercício 67. Seja λ = (1, 1, . . . , 1) ` n. Mostre que M λ ∼


=S n F S n , onde F é o corpo de
escalares sobre o qual consideramos M λ . Em particular, qualquer que seja a partição
µ ` n, temos S µ isomorfo a um submódulo de M λ .

Exercício 68. Determine o caráter associado a M (2,2) e, a partir dele e dos caracte-
res dos S 4 -módulos irredutíveis, determine a decomposição de M (2,2) em módulos
irredutíveis.

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Bibliografia

[1] R.A. Horn and C.R. Johnson. Topics in Matrix Analysis. Cambridge University
Press, Cambridge, 1991.

71
Índice

ação de grupo, 3 Lema de Schur, 11


ação linear, 7 linha-equivalência, 62
ação por automorfismos, 56
módulo de Specht, 64

caráter, 17 módulo quociente, 9

irredutível, 17 número de caracteres irredutíveis, 21

diagrama de Young, 62 órbita, 4


dominância de partições, 66 ortogonalidade de caracteres irredutíveis,
20
elemento G-homogêneo, 55
equação das órbitas, 5 partição, 61
espaço vetorial livre, 8 politabloide, 64

espaço quociente, 9 produto tensorial, 41


de matrizes, 44
F -automorfismo, 7 exterior de representações, 44
função de classe, 20 interno de caracteres, 43
interno de representações, 43
G-automorfismo, 10
G-endomorfismo, 10 representação, 8
G-graduação, 55 induzida, 33
G-homomorfismo, 10 permutação, 8
induzido por F -automorfismo, 12 regular, 8
núcleo de, 11 restrição de, 33
trivial, 10 subrepresentação, 9
G-isomorfismo, 10 trivial, 8
G-módulo, 7 subgrupo de isotropia, 4
completamente redutível, 9
irredutível, 9 tabela de Young, 62

módulos equivalentes, 10 tabloide, 63

G-submódulo, 9 tensor puro, 41

cíclico, 9 Teorema de Clifford, 38

gerado por um conjunto, 9 Teorema de Frobenius, 37


Teorema de Maschke, 14
irredutibilidade absoluta, 48 recíproca do, 22
irredutibilidade dos módulos de Specht, Teor. do Isomorfismo para G-módulos,
68 11

72

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