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INSTITUTO FEDERAL DE MINAS GERAIS

CELESTE MARIA LEAL OLIVEIRA

ARQUITETURA PARA TODOS


Estudo e aplicação de método para atendimento de demandas populares.

Santa Luzia
2018
CELESTE MARIA LEAL OLIVEIRA

ARQUITETURA PARA TODOS


Estudo e aplicação de método para atendimento de demandas populares.

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de


Arquitetura e Urbanismo, do Instituto Federal de Minas Gerais-
SL, como requisito parcial para a Obtenção do grau de
Bacharel em Arquitetura e Urbanismo.

Santa Luzia
2018
CELESTE MARIA LEAL OLIVEIRA

ARQUITETURA PARA TODOS


Estudo e aplicação de método para atendimento de demandas populares.

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de


Arquitetura e Urbanismo, do Instituto Federal de Minas Gerais-
SL, como requisito parcial para a Obtenção do grau de
Bacharel em Arquitetura e Urbanismo.

Santa Luzia,

BANCA EXAMINADORA

Prof. Dr. ..............


Universidade ..............

Prof. Dr. ..............


Universidade ..............

Prof. Dr. ..............


Universidade ..............
Dedico este trabalho a Deus, fonte de toda
vida e sabedoria, à minha família pelo apoio, oração
e incentivo, em especial ao meu marido pelo
companheirismo e aos meus filhos pela
compreensão.
AGRADECIMENTOS

A Deus por tudo.


Ao meu marido Reginaldo pelo companheirismo, incentivo, apoio e dedicação.
Aos meus filhos Letícia e Lucas pela compreensão das minhas ausências
Aos meus pais Daniel e Maria pelas orações, apoio e incentivo.
Aos meus avós pelas orações.
Às minhas irmãs Shirley e Cláudia pelo companheirismo, torcida e apoio
Aos meus cunhados pelo apoio, torcida e cooperação, em especial ao Warlan pela
ajuda tecnológica.
Ao meu amigo e irmão Padre Ivanir, por tudo, desde o início.
À professora Dadí pela energia positiva e torcida.
À professora Paula Cristina pela torcida e carinho.
À professora Carolina Helena pelo apoio, pelas dicas e pelos livros emprestados.
À professora Anny Venâncio pela cooperação, torcida e incentivo.
Ao professor Ramon Paes pelas considerações edificantes.
Ao professor Breno Thadeu pela inspiração e positividade.
À professora Roxane Sidney, em especial, pelas orientações, companheirismo e
incentivo durante todo esse processo.
A todos os professores que contribuíram para minha formação, Helena, Thêmis,
Gilbert, Harley, Neymar, Juliana, Simone, Roberta, Fernanda, Danilo, Fúlvio, Ana
Isabel, Raquel, Eualdo, Rute, Neilson, Leandro, e os engenheiros que me mostraram
o lado "concreto" da vida, Marcos Hudson e João Neto. De cada Mestre levo uma
lição.
Aos meus colegas pesquisadores, Aline Gonçalves, Luara, Marina Poloni, Aline
Morais, Fernanda, Brenda, Giovana, Bruna Chara, Luiz Gustavo, Rafaela Ingrid,
Júlia Oliveira, Marina Ramos, Vitória, Katharine, Maria Clara, Sara Letícia, Tuane,
Luisa, Maria Teresa, Rafaela Araújo, Mauro e Jennefer, que deram uma contribuição
sem igual para esse trabalho.
Aos clientes atendidos, pela confiança e tempo empreendidos.
Aos meus amigos e colegas parceiros nessa jornada de cinco anos.
A todos os colaboradores dos IFMG- SL em especial Rosane, Leandro, Janaína.
A todos que contribuíram de alguma maneira.
Conquistar é um verbo coletivo, a conquista nunca é solitária, é sempre fruto de um
esforço mútuo, suas sementes são de esperança e seu sabor é doce, pois pode ser
multiplicado e compartilhado.
"O ato de ouvir exige humildade de quem
ouve. E a humildade está nisso: saber, não com a
cabeça, mas com o coração, que é possível que o
outro veja mundos que nós não vemos." (Rubem
Alves)
RESUMO

A temática deste trabalho surgiu a partir da vivência da autora, desde pequena, com
a prática da autoconstrução em sua casa, e reafirmado pela experiência como
bolsista de projeto de pesquisa no Laboratório integrado de tecnologia social- LITS,
do IFMG- SL. Essa monografia apresenta o estudo e aplicação de método para
atendimento de demandas populares, tendo em vista que o método convencional da
prática arquitetônica não é eficaz para o atendimento dessas demandas. O
distanciamento entre arquitetos e demandas populares é devido a vários fatores,
que tem início desde a formação acadêmica do profissional que não é preparado
para o atendimento dessas demandas. O objetivo principal da pesquisa é
desenvolver um método de abordagem de prática arquitetônica e adaptá-lo à
realidade dos moradores do entorno do IFMG-SL, a fim de viabilizar abertura de
escritório de arquitetura para atendimento de demandas populares na região de São
Benedito-Santa Luzia- MG. A pesquisa teve início com o estudo de práticas
arquitetônicas com abordagens não convencionais, seguida por aplicação do El
Método do arquiteto Rodolfo Livingston com clientes reais, através de disciplina
optativa: prática arquitetônica para demandas populares. O método para o
atendimento dessas demandas se mostrou eficaz, com algumas ressalvas. Através
dos resultados dos estudos e com base na capacitação do Bootcamp- SEBRAE,
foram desenvolvidas diretrizes para plano de negócio de consultório de arquitetura,
tendo em vista o grande mercado para negócios que sejam preparados e
capacitados para o atendimento de demandas populares.

Palavras-chave: Arquitetura, demanda popular, método, negócio.


ABSTRACT

The thematic of this work arose from the author's experience, from a young age, with
the practice of self-construction in her home, and reaffirmed by her experience as a
research project fellow in the IFMG-SL's Integrated Social Technology Laboratory.
This monograph presents the study and application of a method to meet popular
demands, considering that the conventional method of architectural practice is not
effective for meeting these demands. The distance between architects and popular
demands is due to several factors, which start from the academic formation of the
professional who is not prepared to meet these demands. The main objective of the
research is to develop a method of approach to architectural practice and adapt it to
the reality of the residents of the IFMG-SL, in order to make it possible to open an
architecture office to meet popular demands in the region of São Benedito-Santa
Luzia-MG. The research began with the study of architectural practices with
unconventional approaches, followed by the application of the El Rodolfo Livingston
Method with real clients, through an optional discipline: architectural practice for
popular demands. The method for meeting these demands was effective, with some
caveats. Through the results of the studies and based on the Bootcamp-SEBRAE
training, guidelines were developed for the business plan of an architectural practice,
in view of the large market for businesses that are prepared and trained to meet
popular demands.

Keywords: Architecture, popular demand, method, business.


LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 - Como o brasileiro constrói ...................................................................... 17


Figura 2 - Localização do Distrito de São Benedito- Santa Luzia ............................ 21
Figura 3 - Moradigna: reforma de banheiro - antes e depois ................................... 30
Figura 4 - Moradigna: reforma de uma sala- antes e depois ................................... 31
Figura 5 - Moradigna: reforma de uma cozinha - antes e depois ............................. 31
Figura 6 - Programa Vivenda: reforma de banheiro - antes e depois ...................... 33
Figura 7 - Panfleto de divulgação dos Arquitetos da família - frente e verso ........... 35
Figura 8 - Arquitetos da família: telefonemas que geraram atendimentos ............... 36
Figura 9 - Planta da casa de Laura e Ulisses antes da obra- atendimento Priscilla
Nogueira ................................................................................................................. 37
Figura 10 - Opção com cozinha aberta_ casa Laura e Ulisses- atendimento Priscilla
Nogueira ................................................................................................................. 38
Figura 11 - Manual de Instruções, cliente Luciane. Produzido pela arquiteta Hiromi
Sassaki, 2009. ........................................................................................................ 39
Figura 12 - Fragmento de Manual de Instruções produzido por Luiz Quintão ......... 40
Figura 13 - Arquitetura na periferia: Oficina de levantamento.................................. 42
Figura 14 - Arquitetura na periferia: exercício de montar os layouts com o kit
imobiliário ................................................................................................................ 42
Figura 15 - "Escuta do Cliente" em Cienfuegos, Cuba -1994 .................................. 43
Figura 16 - Arquitetos da Comunidade - Grupo Pioneiro de Holguín -1994 ............. 44
Figura 17 - Los ocho pasos - El Metodo .................................................................. 45
Figura 18 - Diagrama de globos- Rodolfo Livingston ............................................... 47
Figura 19 - Aparato para Juzgar variantes- Rodolfo Livingston ............................... 48
Figura 20 - Perspectivas feitas pelo arquiteto Gonzalo Manuele ............................. 49
Figura 21 - Consulta em pleno Voo. Variantes feitas à mão- Rodolfo Livingston .... 50
Figura 22 - Antes e depois de uma reforma e ajuste final- Rodolfo Livingston ........ 51
Figura 23 - Exemplo de Manual de Instruções - MI1 (Manual Mestre) Rodolfo
Livingston ................................................................................................................ 53
Figura 24 - Bairros atendidos .................................................................................. 55
Quadro 1 - Quadro de atendimentos ....................................................................... 56
Figura 25 - Casa dos estudantes- fachada .............................................................. 59
Figura 26 - Casa dos estudantes - área externa ..................................................... 59
Figura 27 - Casa dos estudantes- planta atual ........................................................ 60
Figura 28 - Casa dos estudantes - proposta final aprovada .................................... 61
Figura 29 - Casa dos gigantes: fotos do local.......................................................... 62
Figura 30 - Casa dos gigantes: levantamento e PC do cliente ................................ 63
Figura 31 - Cada dos gigantes: propostas apresentadas ........................................ 64
Figura 32 - Casa dos gigantes: proposta final aprovada ......................................... 64
Figura 33 - Casa do brechó, demanda e levantamento ........................................... 64
Figura 34 - Casa do brechó: fotos do local .............................................................. 65
Figura 35 - Casa do brechó: proposta final aprovada .............................................. 65
Figura 36 - Casa do brechó: lavanderia e área de lazer e novo layout da cozinha .. 66
Figura 37 - Casa dos desníveis- corte esquemático ................................................ 67
Figura 38 - Casa dos desníveis- situação atual ....................................................... 67
Figura 39 - Casa dos desníveis- PC- Projeto da cliente .......................................... 68
Figura 40 - Casa dos desníveis- proposta final aprovada ........................................ 69
Figura 41 - Demanda da "Casa da escada fora do padrão" .................................... 70
Figura 42 - Casa da escada fora do padrão - escada atual e escada proposta ....... 72
Figura 43 - Casa da escada fora do padrão: proposta final aprovada ..................... 73
Figura 44 - Casa da escada fora do padrão: etapas executadas da reforma .......... 73
Figura 45 - Casa da escada fora do padrão- escada executada em concreto armado
moldada in loco ....................................................................................................... 73
Figura 46 - Casa dos trabalhadores do SAMU - situação atual ............................... 74
Figura 47 - Casa dos trabalhadores do SAMU- fotos do local ................................. 74
Figura 48 - Casa dos trabalhadores do SAMU- opções de reforma ........................ 75
Figura 49 - Casa dos trabalhadores do SAMU- opção final aprovada ..................... 76
Figura 50 - Casa da artesã- projeto da cliente e planta atual da casa ..................... 76
Figura 51 - Casa da artesã- fotos do local, cozinha ................................................ 77
Figura 52 - Casa da artesã - fotos do local .............................................................. 77
Figura 53 - Casa da artesã- Proposta final aprovada .............................................. 78
Figura 54 - Casa da cabeleireira- planta atual e PC- projeto da cliente ................... 79
Figura 55 - Casa da cabeleireira- fotos do local ...................................................... 80
Figura 56 - Casa da cabeleireira- proposta final aprovada ...................................... 81
Figura 57 - Casa do terraço- fotos do local ............................................................. 81
Figura 58 - Casa do terraço - fotos do local ............................................................ 82
Figura 59 - Casa do terraço- PC- projeto da cliente ................................................ 82
Figura 60 - Casa do terraço- planta atual ................................................................ 83
Figura 61 - Casa do terraço- opções ....................................................................... 83
Figura 62 - Casa do terraço- opção final aprovada ................................................. 84
Figura 63 - Casa do terraço - imagem 3D interiores ................................................ 84
Figura 64 - Casa da porta da cozinha sem saída- levantamento e croquis ............. 87
Figura 65 - Casa da porta da cozinha sem saída- fotos do local- principais problemas
................................................................................................................................ 87
Figura 66 - Casa da porta da cozinha sem saída- PCs- projeto dos clientes ........... 87
Figura 67 - Casa da porta da cozinha sem saída- opção 1 - PC do marido ............. 89
Figura 68 - Casa da porta da cozinha sem saída- opção 2- PC da filha nº 1 ........... 90
Figura 69 - Casa da porta da cozinha sem saída- opção 3- PC da esposa e da filha
nº 2 ......................................................................................................................... 91
Figura 70 - Casa da porta da cozinha sem saída- opção final aprovada ................. 92
Figura 71 - Casa da sala barulhenta- foto do local .................................................. 94
Figura 72 - Casa da sala barulhenta - projetos feitos pelo engenheiro agrimensor
cedidos pelo cliente................................................................................................. 95
Figura 73 - Casa da sala barulhenta- fotos do local ................................................ 96
Figura 74 - Casa da sala barulhenta- fotos do local- área de serviço e sala de estar e
jantar ....................................................................................................................... 96
Figura 75 - Casa da sala barulhenta- situação atual- principais problemas ............. 97
Figura 76 - Casa da sala barulhenta- PC da família ................................................ 98
Figura 77 - Casa da sala barulhenta - Opção 1- PC da família ............................... 99
Figura 78 - Casa da sala barulhenta- opção 2- final aprovada .............................. 100
Figura 79 - Casa da sala barulhenta- opção 2- final aprovada .............................. 101
Figura 80 - Panfleto de divulgação do Consultório de Arquitetura Arquitodos ....... 106
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CAU Conselho de Arquitetura e Urbanismo


LITS Laboratório Integrado de Tecnologia Social
P.C. Projeto do cliente
PAC Programa de Aceleração do Crescimento
SAMU Serviço de Atendimento Médico de Urgência
SEBRAE Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas
IFMG- SL Instituto Federal de Ciência e tecnologia de Minas Gerais-
Santa Luzia
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................... 15
2 OBJETIVO E METODOLOGIA .............................................................. 21
2.1 OBJETIVO ............................................................................................. 21
2.2 METODOLOGIA..................................................................................... 22
3 PRÁTICA CONVENCIONAL DE ARQUITETURA E DEMANDAS
POPULARES .......................................................................................................... 23
4 PRÁTICAS ARQUITETÔNICAS COM ABORDAGENS NÃO
CONVENCIONAIS .................................................................................................. 29
4.1 MORADIGNA ......................................................................................... 30
4.2 VIVENDA ............................................................................................... 32
4.3 ARQUITETOS DA FAMÍLIA ................................................................... 33
4.4 ARQUITETURA NA PERIFERIA ............................................................ 41
4.5 EL METODO .......................................................................................... 43
4.5.1 Primeiro passo: a Pré entrevista ......................................................... 45
4.5.2 Segundo passo: a Primeira entrevista- El pacto ................................ 46
4.5.3 Terceiro passo: Sitio e Cliente ........................................................... 48
4.5.4 Quarto passo: a segunda entrevista- apresentação das variantes .. 49
4.5.5 Quinto passo: Devolução .................................................................... 50
4.5.6 Sexto passo: ajuste Final..................................................................... 51
4.5.7 Sétimo passo: escuta para o Manual de Instruções .......................... 52
4.5.8 Oitavo passo: Manual de Instruções .................................................. 52
5 APLICAÇÃO DO EL METODO COM CLIENTES REAIS: DISCIPLINA
OPTATIVA IFMG-SL .............................................................................................. 54
5.1 DESENVOLVIMENTO DA DISCIPLINA ................................................. 54
5.2 ALGUMAS PARTICULARIDADES DOS ATENDIMENTOS.................... 58
5.2.1 Casa dos estudantes ............................................................................ 58
5.2.2 Casa dos gigantes ................................................................................ 61
5.2.3 Casa do Brechó .................................................................................... 64
5.2.4 Casa dos desníveis .............................................................................. 66
5.2.5 Casa da escada fora do padrão ........................................................... 69
5.2.6 Casa dos trabalhadores do SAMU ...................................................... 73
5.2.7 Casa da artesã ...................................................................................... 76
5.2.8 Casa da cabeleireira ............................................................................. 78
5.2.9 Casa do terraço .................................................................................... 81
5.3 ATENDIMENTOS REALIZADOS PELA AUTORA: CASA DA COZINHA
SEM SAÍDA E A CASA DA SALA BARULHENTA .................................................. 84
5.3.1 Casa da cozinha sem saída ................................................................. 84
5.3.2 Casa da sala barulhenta ...................................................................... 93
6 CONSULTÓRIO DE ARQUITETURA: APONTAMENTOS PARA UM
NEGÓCIO DE ATENDIMENTO A DEMANDAS POPULARES ............................ 102
6.1 APRENDIZADOS ADQUIRIDOS .......................................................... 102
6.2 DIRETRIZES DO NEGÓCIO A PARTIR DO TREINAMENTO BOOTCAMP
104
7 CONCLUSÕES .................................................................................... 107
REFERÊNCIAS .................................................................................... 109
APÊNDICE A - Memórias da autoconstrução ....................................... 113
APÊNDICE B - Manual de Instruções da Casa da Porta Sem Saída .... 118
ANEXO A - Plano de Ensino da Disciplina Optativa IFMG-SL .............. 127
ANEXO B - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ................... 130
ANEXO C - Roteiro de Trabalho ........................................................... 132
ANEXO D - Manual de Instruções da casa dos estudantes .................. 133
15

1 INTRODUÇÃO

A temática deste trabalho surgiu a partir da vivência da autora, desde


pequena, com a prática da autoconstrução em sua casa (ver apêndice A "Memórias
da autoconstrução). O interesse foi ainda reafirmado através da participação da
mesma como bolsista da pesquisa “Alterações em Edificações ao longo da
consolidação dos bairros do entorno do IFMG - Santa Luzia”, desenvolvida em
2016/2017. O projeto foi desenvolvido no LITS (Laboratório Integrado de Tecnologia
Social), pertencente ao Campus Santa Luzia, e é uma referência para compreensão
tipológica dos bairros do entorno do campus e das tecnologias empregadas na
construção civil.
Nesta pesquisa, foram mapeadas as modificações mais recorrentes
realizadas pelos moradores no processo de adensamento de bairros do distrito de
São Benedito, propostos estudos de casos representativos e feitos levantamentos
das edificações na situação atual e prospecção ao longo do tempo. Tendo como
base este estudo, percebemos que, em sua maioria, as alterações nas construções
ocorriam devido a variações na dinâmica familiar, como o nascimento de novos
membros ou a mudança de parentes, ou à melhora financeira dos moradores que,
consequentemente, realizavam obras visando a ampliação, reforma ou outras
adequações às suas necessidades. Outro ponto constatado foi que grande parte
das obras foram realizadas pelos próprios moradores em processos de
autoconstrução e de autoprodução. Nesse ponto, se faz necessário entender a
diferenciação entre autoconstrução e autoprodução, ambos frequentes na produção
informal.
No âmbito da produção informal, temos a autoprodução, na qual se inclui a
autoconstrução. A diferença é que a autoprodução não implica
necessariamente que o sujeito que constrói tenha que
participar efetivamente da construção. Os casos em que ele põe
efetivamente a mão na massa, trabalhando diretamente no processo de
construção é chamado autoconstrução, em que a produção não está
separada da concepção nem do uso do espaço (MASCARENHAS;
DRUMOND; CAMPOS, 2012, p. 220).

Os dados levantados pela pesquisa do LITS nos permitem ainda afirmar que
o processo de autoconstrução acontecia, em sua maioria, pelo distanciamento
físico, cultural e financeiro com profissional habilitado, seja ele arquiteto ou
engenheiro civil. Em alguns casos, a autonomia no processo construtivo foi
16

considerada satisfatória, mesmo existindo problemas, dentre eles, o gasto


dispensável com materiais e falta de recurso para a conclusão das etapas. Por outro
lado, muitas das reformas realizadas comprometiam o conforto ambiental da
residência, afetando questões de privacidade, autoestima, sociabilidade e
praticidade.
A qualidade do ambiente construído das casas é de suma importância para
garantir o conforto e saúde de seus habitantes. Em entrevista à Revista Expressa
Extensão (ESTEVÃO, MEDVEDOVSKI , 2017), a arquiteta Mariana Estevão disse
que as medidas necessárias para atingir o bem-estar físico, mental e social passam
por ações de responsabilidade de diferentes setores e não, exclusivamente, pelo
setor da saúde, que sejam capazes de intervir positivamente no ambiente natural,
político e social de indivíduos e grupos.
Segundo Fernando Assad, "a casa é mais do que essa necessidade básica
primitiva, de abrigo e segurança, ela exerce uma função psicológica, ela é uma
plataforma para o desenvolvimento humano psíquico e social" (REFORMAS...,
2015). Problemas como infiltrações, janelas com distanciamentos inadequados para
divisas, instalações elétricas com fios aparentes sem a devida proteção, escadas
irregulares, estreitas e íngremes, espaços mal distribuídos, pouca ventilação e
iluminação natural insuficiente podem provocar vários tipos de doenças e acidentes
aos moradores. De acordo com Margaret Chan, diretora-geral da Organização
Mundial de Saúde, em entrevista ao jornal O Globo (BAIMA, 2016, [s.p.]) "um
ambiente saudável é a base de uma população saudável. Se os países não agirem
para tornar mais saudáveis os ambientes que as pessoas vivem e trabalham,
milhões vão continuar a adoecer e morrer mais jovens".
Neste sentido, compreende-se a necessidade de aproximar o processo
convencional de projeto utilizado por arquitetos e a autoprodução gerada por
demandas populares, como forma de proporcionar melhor conforto ambiental às
residências. A inserção do Instituto Federal na região de periferia potencializa a
aproximação de saberes, sendo um dos fatores que estimulou a escolha deste tema
como objeto de pesquisa para a elaboração do Trabalho de Conclusão de Curso
(TCC).
A estrutura multicampi e a clara definição do território de abrangência das
ações dos Institutos Federais afirmam, na missão destas instituições, o
compromisso de intervenção em suas respectivas regiões, identificando
problemas e criando soluções técnicas e tecnológicas para o
17

desenvolvimento sustentável com inclusão social. Por essa via,


compreende-se que a educação não ocorre apenas nos espaços de
educação formal. Ela resulta das experiências vivenciadas em todos os
espaços da sociedade. (PACHECO, 2008, p. 5).

Num país em que a maior parte da arquitetura das grandes e médias cidades
é resultado de construção feita ou gerida pelo próprio morador, ignorar esse
universo é, no mínimo, um sinal de alienação (SANT'ANNA, 2013). No Brasil,
segundo pesquisa (CAU/RS, 2017), mais de 50 milhões de brasileiros vivem em
moradias autoconstruídas sem o auxílio de um arquiteto ou engenheiro civil.
A pesquisa qualitativa realizada pelo CAU/BR e o Instituto Datafolha
confirmou que a questão financeira é o principal motivo pela preferência por mestres
de obras e pedreiros. No entanto, cerca de 70% das pessoas que compõem a
população economicamente ativa afirmam que contratariam os serviços de um
arquiteto e urbanista para construções ou reformas. Outros motivos apontados para
a contratação de mestre de obras foram o fácil acesso a esses profissionais por
meio de indicações e desconhecimento de alternativas (CAU/BR, 2015).

Figura 1 - Como o brasileiro constrói

Fonte: CAU/BR (2015)


18

A grande maioria dos entrevistados que já realizou reforma ou construção


disse que a experiência foi ruim, por uma série de problemas, em especial pela
dificuldade de encontrar mão-de-obra qualificada. De maneira geral, os participantes
da pesquisa qualitativa dividiram as dificuldades encontradas em três eixos
principais: planejamento, mão de obra e material. Cada um com suas dificuldades
específicas (CAU/BR, 2015).
Quanto ao planejamento, as principais dificuldades aprontadas se referem ao
orçamento e tamanho da obra, sendo que a falta de conhecimento e má assessoria
são os principais motivos para uma previsão incorreta dos gastos. Outro problema é
saber qual é a quantidade certa de material comprar, orientados por pedreiros, na
maioria das vezes, não acertam a quantidade.
Na pesquisa qualitativa, os poucos participantes que utilizam serviços de
arquitetos e urbanistas são das classes sociais mais altas. Em todos os casos, o
principal motivo para esse tipo de contratação é a indicação de amigos ou parentes,
ocorrendo também, como menor frequência, indicações por meio de lojas de
material de construção, do engenheiro ou corretor (CAU/BR, 2015).
Enquanto as demandas populares esperam por alternativas que solucionem
questões espaciais e construtivas relativamente simples, os arquitetos oferecem
projetos fundados em noções abstratas, que vão de doutrinas estilísticas a
metáforas do universo literário ou filosófico (KAPP; NOGUEIRA; BALTAZAR, 2009).

Diante da dinâmica própria da autoprodução, não faz sentido desvincular


atendimentos de projetos nem projetos de obras. Todos esses passos
fazem parte de um mesmo pacote. Não obedecem a um ordenamento
sequencial, como na produção formal, e nem a hierarquias. Todos os
agentes nesse caso seriam parceiros na realização do produto que em vez
de ser um projeto, seria de fato a construção (NOGUEIRA, 2010, p. 168).

A carência de recursos econômicos da classe popular não é o único fator


distanciador entre os arquitetos, mas também o que Bourdieu (2007) chama de
"gosto de necessidade", isto é, a submissão à necessidade, que leva as classes
populares a uma "estética" pragmática e funcionalista, adaptando suas preferências
e desejos a um universo de “oportunidades objetivas”. Esse fato relaciona-se ao
habitus, isto é, a fonte motivadora de práticas e de qualquer julgamento pelas
práticas, que são determinantes no estilo de vida. Nesse contexto, a demanda
19

popular na arquitetura está relacionada mais a reconfigurações espaciais e soluções


técnicas do que a "projetos espetaculares", que remetem ao status social
normalmente associado ao serviço prestado pelo profissional de arquitetura.

Acredita-se que seja possível desenvolver métodos mais coerentes e


eficientes para a autoprodução e que estejam comprometidos com o
processo inteiro da construção e que de fato integrem projeto, construção e
uso. A hipótese é a de que, dessa maneira, os agentes1 da construção
possam trabalhar de maneira colaborativa. (NOGUEIRA, 2013, p. 70).

A diferença entre o trabalho intelectual realizado nos escritórios e o trabalho


manual realizado no canteiro de obras é fator crucial que afeta a prática
arquitetônica principalmente quando as obras começam. Saber desenhar
não é o mesmo que saber construir. Além de ser também um problema de
comunicação e transmissão de informações, há uma fundamental diferença
entre três aspectos: o que é representado graficamente, as técnicas de
construção oficializadas pelo campo da engenharia e as técnicas próprias
dos trabalhadores da construção (NOGUEIRA, 2010, p. 134).

Nesse sentido, acredita-se que o modo de abordagem das demandas


populares e seu atendimento devem ser adaptados à realidade a que se aplica. O
déficit habitacional do Brasil é de 7,7 milhões de moradias, segundo a Fundação
João Pinheiro (FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO, 2015). Enquanto isso, 14,7 milhões
de residências construídas têm graves inadequações e necessidade de reformas –
mais que o dobro. Como pelo menos 60% da produção habitacional é informal, há
muito o que ser adequado e acabado, defende a ONG Soluções
Urbanas (CAU/BR, 2018).
Segundo matéria no site do CAU/BR (2018), enquanto o Governo Federal
investe mais fortemente na construção de novas moradias (R$ 243 bilhões
destinados ao Minha Casa, Minha Vida entre 2009 e 2015), a adequação e a
reforma das existentes ficam em segundo plano (R$ 39 bilhões destinadas a
programas de melhoria habitacional do PAC entre 2007 e 2015, incluindo

1
Agentes, são todos os que realizam qualquer ação relacionada à prática arquitetônica. Pertencem,
portanto, não somente ao campo da arquitetura. Não são necessariamente pessoas físicas podendo
ser instituições. Desta forma, agentes são arquitetos, engenheiros, clientes, operários, prefeituras,
órgãos de classe, empreiteiros, incorporadores, decoradores, vendedores e fornecedores. Cada um
desempenha determinados papéis e funções no ciclo da produção arquitetônica de modo a viabilizar
algumas práticas, sustentando algumas e mitigando outras. (Nogueira, 2010, p 134)
20

infraestrutura, saneamento e melhorias residenciais). É um mercado aberto à


iniciativa privada.
Diante dessa realidade, esse trabalho apresenta diretrizes de plano de
negócio voltado para abrir um escritório de arquitetura especializado em
atendimentos de reformas para demandas populares. Para isso, foram consideradas
como referências as experiências estudadas nos capítulos 4 e a experiência
adquirida durante o curso de capacitação Bootcamp Empreendedorismo em Ação
que foi ofertado em setembro de 2018, no IFMG campus de Santa Luzia, citada no
capítulo 5. Outra importante referência foi o material de pesquisa relacionado ao
atendimento de demandas populares aplicada na disciplina optativa Prática
arquitetônica: estudo de método para atendimento de demandas populares.
21

2 OBJETIVO E METODOLOGIA

2.1 OBJETIVO

O principal objetivo deste estudo é investigar práticas arquitetônicas


alternativas de abordagens e atendimento de demandas populares para a
estruturação de empreendimento rentável na área da arquitetura, visando a
melhoria das condições de moradia.
Como objetivos específicos temos: desenvolver método de prática
arquitetônica a partir do estudo de métodos já aplicados e adaptá-los à realidade
dos moradores do entorno do IFMG Campus Santa Luzia; desenvolver diretrizes
para plano de negócio voltado à abertura de escritório de arquitetura para
atendimento de demandas populares na região do distrito de São Benedito-Santa
Luzia-MG2 (FIG.2).

Figura 2 - Localização do Distrito de São Benedito- Santa Luzia

Fonte: Instituto Pristino, Fundação João Pinheiro (2018)

2 O São Benedito foi fundado pela lei estadual nº 2764 em 30 de dezembro de 1962 (Prefeitura de
Santa Luzia, [s.p.]). A avenida Brasília, principal via do distrito, pode ser destacada
por sua heterogeneidade comercial que garante uma diversidade de atendimentos que enriquecem e
valorizam esse centro local, garantindo também uma geração de novos empregos e renda para os
pequenos empreendedores locais. A proximidade desse distrito com Belo Horizonte, pode ser
destacado como um dos grandes influenciadores de crescimento local.
22

2.2 METODOLOGIA

A pesquisa foi feita a partir de procedimentos metodológicos qualitativos, que


segundo Naresh (MALHOTRA, 2010) é exploratória por natureza e fundamentada
em pequenas amostras, de forma flexível e não estruturada. Naresh (MALHOTRA,
2010) afirma ainda que, por ser conduzida em uma amostra pequena e não
representativa, seus resultados devem ser considerados direcionamentos a ser
utilizados como ponto de partida para uma pesquisa adicional.
Para desenvolver o estudo de método para atendimento de demandas
populares, a pesquisa foi dividida em quatro partes. A primeira consiste na
problematização do tema estudado, desenvolvida na introdução e capítulo 3. A
segunda parte, capítulo 4, é o estudo e análise do procedimento de trabalho de
arquitetos que atuam nessa área. Nesse momento, é apresentado o método
desenvolvido pelo argentino Rodolfo Livingston, tendo como referência seus textos
principais, Cirurgia de Casas (LIVINGSTON, 2014) e Arquitectos da Família – El
Metodo (LIVINGSTON, 2009); o estudo da arquiteta Priscilla Silva Nogueira
(NOGUEIRA, 2010) , que aplicou o método de Livingston em sua dissertação de
mestrado, adaptando-o à sua realidade local (Belo Horizonte); os empreendimentos
de Negócio Social "Moradigna" e" Vivenda" (São Paulo); e Arquitetura na Periferia
em Belo Horizonte da arquiteta Carina Guedes de Mendonça ( MENDONÇA, 2014).
A terceira parte, capítulo 5, é a formulação de diretrizes para um plano de
negócios, analisando a viabilidade de implantação de um empreendimento na
Região do Distrito de Santa Luzia- MG, para atendimento de demandas Populares,
através de consultoria do SEBRAE.
A quarta parte, capítulo 6, já de caráter empírico, consiste na aplicação do
Método de Rodolfo Livingston a demandas reais da região do distrito de São
Benedito, chegando à discussão e reformulação de alguns aspectos do
procedimento ao longo dos experimentos. Esta etapa foi realizada através de uma
experiência paralela com estudantes do IFMG- SL na disciplina optativa "Prática
arquitetônica para demandas populares" no 2º semestre de 2018, ministrada pela
professora Roxane Sidney, com colaboração da autora que também foi tutora da
disciplina.
23

3 PRÁTICA CONVENCIONAL DE ARQUITETURA E DEMANDAS POPULARES

Os textos de Sérgio Ferro, “Arquitetura experimental” (FERRO, 1965),


“Arquitetura nova” (FERRO, 1967) e “O canteiro e o desenho (FERRO,1976), tratam
a prática convencional de arquitetura como parte dos instrumentos de dominação
capitalista do trabalho nos canteiros de obra. A prática convencional é teorizada e
institucionalizada, cujo foco está no projeto e no discurso; enquanto as demandas
populares e suas práticas são pautadas na experiência empírica e focada na
construção e no uso (KAPP; NOGUEIRA; BALTAZAR, 2009).
Sérgio Ferro (FERRO, 1976 apud NOGUEIRA, 2010, p. 52) afirma que o
projeto arquitetônico não passa de um mecanismo de controle sobre a obra,
colaborando para que relações de dominação se perpetuem. O arquiteto se mantém
afastado do canteiro e se dedicando à prática de escritório, onde o saber construtivo
dá lugar ao desenho técnico. O desenho técnico torna-se um objeto contabilizável,
mantendo os arquitetos dominados pela pressão das medições de serviços, ao
mesmo tempo em que serve para o controle das tarefas na obra. Nesse sentido, o
desenho técnico impõe uma nova ordem ao canteiro de obras, ele é o novo
mediador entre produto e produtor.
Segundo Telles (1993, p. 139), conforme citado por (SANTOS, 2008, p.
79) no Brasil colonial, a atividade construtiva está a cargo dos “mestres de risco” e
dos “construtores licenciados”, embora, muitas vezes, as construções sejam
erigidas sem a interferência de oficiais3. As raras figuras de engenheiro ou arquiteto
têm sua atuação restrita à construção de fortificações e arsenais, no âmbito da
chamada engenharia militar, e de edifícios públicos e igrejas. No livro "A nova
Arquitetura", Artigas lembra como era o processo tradicional:

Aqui em São Paulo os homens eram italianos. A técnica era distribuída por
um grupo de artesãos capaz de realizar a prática da construção da
residência: o escadeiro, o telhadeiro, que era o homem que fazia o telhado,
via onde pôr as tesouras e tal, o pedreiro, e essa coisa fantástica que é o
encanador. E havia ainda um misteriosíssimo, o fachadista, que era capaz
de bordar com cal e areia em uma fachada, todos os desenhos que se
pudesse imaginar, volutas (ARTIGAS,1997, apud ARANTES, 2002, p. 20).

3
Oficial quer dizer os praticantes dos ofícios (carpinteiro, marceneiro, pedreiro, canteiro, funileiro
etc.), termo correlato ao profissional de hoje.
24

A construção civil baseada no saber artesanal e num certo poder dos


operários foi profundamente alterada pelos arquitetos modernos, decorrente de um
processo de transformação iniciado ainda no século XIX (ARANTES, 2002).

Na verdade, o início dessa transformação nas relações de produção é


anterior aos modernos, e data, no Brasil, da chegada da Missão Francesa
e formação da Academia Imperial de Belas-Artes no Rio de Janeiro: em
princípios do século XIX. Desde então os nossos mestres e pedreiros
“incultos” e suas construções “de ar despretensioso e puro” vão sendo
substituídos por arquitetos embebidos no ecletismo estrangeirizante. Os
mestres italianos que começam a aportar no fim do século XIX colaboram
na vulgarização do ecletismo e introduzem técnicas novas para realizá-lo
(ARANTES, 2002, p. 21).

O modernismo rompe definitivamente com essa tradição no Brasil,


instaurando uma nova relação de produção, centralizando nas mãos de um único
artista o controle do processo. O desenho passou a exercer um domínio sobre a
natureza, mas também domínio sobre os que não sabem decifrá-lo (ARANTES,
2002). Nesse sentido, o arquiteto é refém da lógica do capital, submetendo- se a um
sistema padrão de convenções meramente técnicas, distanciando-se cada vez mais
do canteiro de obras e consequentemente das demandas populares.

Demandas populares se caracterizam, em primeiro lugar, pelo fato de


serem oriundas de pessoas físicas ou pequenos grupos e não de
empresas, nem de instituições públicas. Na maior parte dos casos, trata-se
de necessidades relacionadas à moradia, embora também possam incluir
usos mistos, pequenas instalações produtivas ou comerciais e até
equipamentos coletivos criados por iniciativa de seus usuários (KAPP;
NOGUEIRA; BALTAZAR, 2009, p. 8).

São extintas desta definição os grandes projetos arquitetônicos de habitações


construídos por grandes construtoras e incorporadoras, ou pelo poder público,
mesmo que estes sejam destinados à classe popular (KAPP; NOGUEIRA;
BALTAZAR, 2009, p. 8). Tais empreendimentos são mais direcionados para
atender aos interesses dos empreendedores do que às reais necessidades dos
usuários podendo ser classificadas como demandas empresariais ou institucionais.
25

Na arquitetura glamorosa e ao alcance de poucos, o produtor não se


reconhece mais em sua obra, o desenho penetra as relações de produção,
abstrai (separa, aparta, alheia) o trabalhador de seu saber e de sua
autodeterminação relativa — o trabalho passa a ser ele próprio abstrato.
Comandado por um desenho-destino que lhe é heterônomo, o produtor não
se reconhece mais em sua obra — ela agora é simples produto (ARANTES,
2002, p. 22).

A nova organização capitalista do trabalho trouxe uma perca generalizada do


saber fazer popular. Lúcio Costa (1951) diz que há uma regressão do "povo
artesão" para o "povo proletário”. Esse povo não detém mais o saber de todas as
etapas da construção, e ainda, não possui proventos para adquirir a tão sonhada
casa própria, optando pela autoconstrução, produzindo um bem precário, muitas
vezes insalubre e inadequado.

No seu texto “A casa popular”, de 1969, Sérgio Ferro afirma que se trata de
um reencontro amargo do trabalhador com sua obra. Isso porque a falta
de recursos e a urgência na construção impedem a oportunidade para
ousar uma invenção. A técnica não é aprendida, mas “vivida”, como um
joão-de-barro construindo a sua casa, daí o caráter pré-histórico desse
trabalho. O resultado é a imagem da contradição: A precisão imposta pela
economia na produção ressurge como precisão no produto, precisão
amarga não resultado de engenho programado e escolhido, mas depósito
obrigatório de infinitas carências. A autoconstrução, assim, torna-se
uma antipoética da economia: extraindo do mínimo apenas o mínimo para a
sobrevivência (ARANTES, 2002, p. 190).

Na autoprodução, uma vez que o construtor é ao mesmo tempo autor,


produtor e futuro usuário, é estabelecida uma nova relação de produção, sem
patrões e alienação. Diante da dinâmica própria da autoprodução, segundo
Nogueira (NOGUEIRA, 2010) não faz sentido desvincular atendimentos de projetos
nem projetos de obras. Todos os agentes nesse caso seriam parceiros na
realização do produto final que em vez de ser um projeto, seria de fato a construção.
Nesse caso, segundo (ARANTES, 2002, p. 191), o desenho volta a ser fundamental,
não como abstração- alienação, mas como instrumento de um projeto coletivo.
Para se entender melhor a definição de projeto coletivo será usado o conceito
de Flusser (2007, p. 96) como citado em (NOGUEIRA, 2010, p. 143) afirmando que
há duas maneiras de trocar informações: uma é a discursiva, que preserva as
informações como uma maneira de resistir a mudanças. A outra é a dialógica, na
qual são trocadas informações a fim de sintetizar novas. A forma dialógica é a
26

essência do projeto coletivo. Segundo Nogueira (NOGUEIRA, 2010, p. 161) no


projeto coletivo, a divisão do trabalho não é rígida, deixando condições para que as
competências se misturem e colaborem entre si, onde a fluidez dos papéis culmine
em resultados positivos para os usuários e para os agentes da construção.

A diferença mais importante entre esses tipos de troca de informações é o


grau de distanciamento com relação aos seus receptores. Os discursos são
como monólogos, não permitindo o retorno de informação, ao contrário dos
diálogos, nos quais o receptor é ativo. Tal diferenciação flusseriana é útil
para compararmos um tipo de produção de edificações heterônoma,
discursiva, de um tipo de produção mais informal, dialógica, onde as
informações são de fato trocadas e não impostas por alguns agentes sobre
outros (NOGUEIRA, 2010, p. 143).

A autoprodução advinda de demandas populares visa prioritariamente a


valores de uso cotidianos, não a valores simbólicos, nem a valores de troca e
menos ainda à extração sistemática de mais-valia que caracteriza a produção
capitalista de imóveis4 (KAPP; NOGUEIRA; BALTAZAR, 2009, p. 11). Tal
característica pode ser um dos fatores distanciadores entre arquitetos e demandas
populares.

Os arquitetos são treinados para projetar obras com alto nível de


formalização técnica, que pressupõem soluções inteiramente definidas e
uma estrutura especializada de execução, com projetos complementares,
orçamentos, cronogramas e um canteiro organizado hierarquicamente e
comandado por pessoas que conhecem os códigos do desenho técnico
(KAPP; NOGUEIRA; BALTAZAR, 2009, p. 13).

A prática convencional trata a construção como um processo de via única,


no qual voltar atrás implica retrabalho, o que é indesejável. Em suma: o
projeto elaborado pelas vias formais, cujo objetivo, direto ou indireto, é a
acumulação de capital pelo trabalho de construção, não condiz com as
necessidades financeiras, técnicas e de cronograma da autoprodução. Por
outro lado, na autoprodução os recursos poderiam ser mais bem
aproveitados e há deficiências que são motivo de queixa dos próprios
autoprodutores: ambientes escuros e mal ventilados, espaços ociosos e
reduzidos, infiltrações etc. (NOGUEIRA, 2010, p. 21).

4
É importante não equiparar mercado imobiliário, produção capitalista de imóveis e especulação
imobiliária (Ribeiro, 1997). Embora os discursos neoliberais tenham nos habituado a identificar esses
termos, cabe lembrar que mercado é uma instância de compra e venda, capitalismo é um modo de
produção, e especulação é um expediente improdutivo de apropriação circunstancial de valor. Todo
produto, seja qual for seu modo de produção, pode chegar ao mercado e pode até se tornar objeto
de especulação. (KAPP; NOGUEIRA; BALTAZAR, 2009, p. 11)
27

O arquiteto é conduzido, desde a sua formação, a seguir os caminhos de


grandes arquitetos e treinado a fazer grandes projetos. Segundo o arquiteto
argentino Rodolfo Livingston (LIVINGSTON, 2014), a formação do arquiteto se
desenvolve sob o signo do movimento moderno orientado sempre para as grandes
obras ou em direção às pequenas "pérolas" isoladas. Considerava-se que quem
sabia planejar um centro cultural para cinco mil pessoas, sabia também encarar
uma reforma, o que não é verdade. Em seus primeiros trabalhos reais, Livingston se
deparou com uma realidade totalmente diferente. As demandas reais foram de
pequenas reformas que variavam entre um quarto de um bebê que está para
nascer, ou ainda a ampliação de um pequeno banheiro na periferia.

[...] o arquiteto obtém seu título sem ter visto jamais um cliente real durante
toda sua formação universitária. O papel do cliente é desempenhado por
um ajudante ou professor que fala a mesma linguagem (avarandados,
enfatizações, volumes que se destacam etc.) afastando o estudante da
prática profissional concreta... se acostuma a fixar na sua mesa de desenho
papéis em branco... não dão reformas como exercício de projeto, salvo
alguma exceção recente (LIVINGSTON, 2014, p. 103).

O sistema convencional de projeto foi pensado para obras novas, onde o


arquiteto consegue o projeto e somente depois anuncia o preço ao cliente,
tornando-se totalmente inadequado para reformas de demandas populares.
Segundo Livingston (2014) a reforma originada de um bom diagnóstico pode
resultar em uma "não construção", alcançar o máximo de benefício com o mínimo
de quebra-quebra, sendo necessárias apenas algumas adequações, que, pelo fato
de serem tão pequenas, o cliente consiga realizá-las por conta própria. Dessa
forma, é preciso que o arquiteto ofereça um serviço ágil de consulta e informação,
sendo que, em geral, apresenta-se pouco preparado para tal.

Os arquitetos, por sua vez, estão programados para fazer obras, não para
evitá-las. Tanto é assim que a tarifa de honorários, que é de aplicação
obrigatória, está baseada em uma porcentagem sobre o que se executa. É
evidente então que para encarar lucidamente estes trabalhos é necessário
reformar não somente a tarifa de honorários, mas também o planejamento
completo de uma profissão que, tanto do ponto de vista do público, como
dos profissionais mesmo, só se destacam fazendo obras, ou seja,
mostrando objetos visíveis (LIVINGSTON, 2014, p. 114).
28

As demandas populares, em muitos casos, são atendidas por outros


profissionais, como pedreiros e bombeiros. Segundo Nogueira (2010), esses
profissionais, embora ofereçam soluções construtivas razoáveis, muitas vezes o
fazem irrefletidamente, de uma maneira que atende somente necessidades
imediatas, repetindo padrões construtivos com os quais têm familiaridade. Ainda
assim, mesmo com tais problemas, os clientes optam por tais profissionais por se
sentiram mais à vontade em fazer mudanças durante o processo sem
constrangimentos. Segundo Livingston (2014), as pessoas, no caso das reformas,
temem ao arquiteto, porque pensam que ele vai querer fazer uma grande obra, vai
querer modificar tudo e que terá ideias "muito loucas".

Arquitetos ainda são vistos como profissionais das elites, econômicas e


culturais: têm um gosto peculiar e tentam misturar intelectualidade e
originalidade. Essas características são cotidianamente expostas pela fala,
roupas, lugares frequentados, músicas ouvidas e canais de televisão
favoritos, conformando uma esfera de costumes distinta das camadas
populares, que constrangidas, não se sentem parte dessa realidade.
(NOGUEIRA, 2010, p. 22).

A distância é muito mais imposta socialmente do que economicamente, já


que grande parte do público popular dispõe de recursos econômicos, mas não
dispõe do mesmo traquejo social predominantemente praticado entre arquitetos
(NOGUEIRA, 2010, p. 22). A compreensão dos motivos desse distanciamento entre
arquiteto e demandas populares pode ser o início de um novo modo de pensar a
arquitetura e a partir dele uma nova maneira no atendimento a tais demandas.
29

4 PRÁTICAS ARQUITETÔNICAS COM ABORDAGENS NÃO CONVENCIONAIS

As investigações iniciais para a elaboração dessa pesquisa partiram do


desejo de elaboração de diretrizes para um plano de negócios de empresa de
arquitetura especializado em reformas para famílias de baixa renda. Nesse intuito,
foram investigados negócios sociais na área de arquitetura: Moradigna e Vivenda,
que tem como princípio o atendimento de reformas financiadas para famílias de
baixa renda. Essas experiências serviram como referências iniciais de pesquisa, no
entanto, considera- se seus atendimentos pragmáticos e funcionais, não pensando
o cliente como um ser integral e participante do processo de projeto. Por esse
motivo, continuou- se a investigação por trabalhos que trouxessem contribuições
mais efetivas na relação entre o profissional habilitado e o cliente de baixa renda.
Nesse viés, foram estudadas a dissertação de Nogueira (2010) articulada a
experiência dos "Arquitetos da família" do Grupo Morar de Outras Maneiras (MOM)
(UFMG, 2010), a dissertação de Carina Mendonça, "Arquitetura na periferia"
(MENDONÇA, 2014), e o El Metodo de Livingston (2014).
A dissertação de mestrado de Priscilla Nogueira: Práticas de arquitetura para
demandas populares - a experiência dos arquitetos da família (NOGUEIRA, 2010),
apresentou, além da proposta de um negócio, um novo método de abordagem para
atender a demandas populares, que vai muito além do funcional, sendo a
construção de uma relação entre arquiteto e cliente.
A experiência dos "Arquitetos da família" (UFMG, 2010) surgiu através dos
atendimentos feitos para a pesquisa da dissertação de Priscilla Nogueira e teve
como fundamento a metodologia do arquiteto Rodolfo Livingston, desenvolvedor
do El Metodo, bem como o trabalho "Arquitetura na periferia" da arquiteta Carina
Guedes de Mendonça (MENDONÇA, 2014) que oferece prestação de assessoria
técnica, porém, aplicado à mulheres de baixíssima renda.
Diante dessas experiências, partimos para o estudo, propriamente dito, do El
Metodo, por considerá-lo como uma forma de conciliar o atendimento a demandas
populares a uma abordagem de qualidade, que vai além de soluções de questões
patológicas (mofo, problemas com ventilação etc.). Segundo Livingston (2014) não
existe uma experiência "funcional" ou prática por um lado, e uma experiência
estética por outro. O ato de percepção é complexo, mas único.
30

A seguir, foram expostas tais experiências que serviram de base para


elaboração de diretrizes do plano de negócio voltada à realidade do entorno do
campus do IFMG Santa Luzia em um processo de aprendizado com os erros e
acertos e adaptação de métodos.

4.1 MORADIGNA

Moradigna é um “negócio social” que reforma, a um preço acessível, as


casas dos moradores do Jardim Pantanal e do Parque Paulistano- São Paulo, um
bairro vizinho onde a empresa está sediada. O negócio foi fundado por Matheus
Cardoso, engenheiro civil, Vívian Sória, arquiteta, e Rafael Veiga,
contador (MORADIGNA, 2015), com o objetivo de “retirar as famílias das condições
de insalubridade de suas residências”, muitas delas com a umidade nas paredes,
falta iluminação e de ventilação (EL PAÍS, 2017).
Os serviços são planejados desde o orçamento até a entrega final da obra.
Estão incluídos no serviço todos os materiais de construção, a mão de obra e a
gestão de uma “reforma express”, já que as obras geralmente duram apenas cinco
dias úteis, e pode ser parcelada em até 12 vezes no boleto ou cartão de
crédito (MORADIGNA, 2015). Todo esse planejamento e rapidez são um dos pilares
para que o serviço seja mais acessível aos clientes que não têm muito dinheiro e
tempo para gastar.
Em relação à metodologia e representações de projeto executados pelo
Moradigna, não foram encontrados dados que demonstrassem tais aspectos. As
únicas informações que foram encontradas foram os registros fotográficos das obras
realizadas (FIG. 3, 4 e 5).

Figura 3 - Moradigna: reforma de banheiro - antes e depois

Fonte: Moradigna (2015)


31

Figura 4 - Moradigna: reforma de uma sala- antes e depois

Fonte: Moradigna (2015)

Figura 5 - Moradigna: reforma de uma cozinha - antes e depois

Fonte: Moradigna (2015)

Matheus e Vivian, através de um crowdfunding, campanha online de


financiamento coletivo, arrecadaram para iniciar o negócio 16 mil reais, o que
possibilitaram financiar as primeiras obras e reformas (DRAFT, 2015). Em seguida,
o Moradigna recebeu o apoio de uma das maiores aceleradoras de negócios sociais
do mundo, a Yunus Social Business, do economista Muhammad Yunus, obtendo
orientações de especialistas das mais variadas áreas de negócios.
32

Para conseguir realizar as obras com valores acessíveis, o Moradigna


conseguiu fechar parcerias com empresas de construção civil. A
Votorantim, de cimentos, a Coral, de tintas, e a Vedacit, de
impermeabilizantes, a Amanco, de tubulação, estão entre algumas das que
apoiam a empresa. Há um acordo diferente para cada uma, desde valores
diferenciados ou descontos no material, até o patrocínio ou fornecimento de
material gratuito. Além disso, o Moradigna possui uma parceria com o
Instituto Phi, ONG que faz a ponte entre pessoas físicas ou jurídicas e
projetos sociais. Ele patrocina reformas do Moradigna para famílias listadas
no Serviço de Assistência Social à Família da Prefeitura de São
Paulo (DRAFT, 2015).

Outro diferencial do Moradigna é a capacitação das equipes de mão de obra


existentes na própria comunidade, por meio de empresas parceiras, aumentado a
qualidade dos serviços prestados à demanda de moradores do próprio bairro. “Isso
cria um empoderamento para a comunidade, gera renda para a comunidade, faz
com que a riqueza fique dentro da comunidade” disse Matheus Cardoso em
entrevista ao Jornal El País (EL PAÍS, 2017). Outro ponto é a diminuição do valor da
mão de obra, pois, não é preciso somar gasto de transporte ao custo final da obra.

4.2 VIVENDA

O Programa Vivenda criado por Fernando Assad, Marcelo Coelho e Igiano


Souza, desenvolve kits de reforma – o kit banheiro, kit revestimento, kit ventilação,
kit antiumidade, etc – baseados em soluções integradas que resultam em obras
eficazes (planejadas e desenvolvidas por mão de obra qualificada), rápidas (levam
cerca de cinco dias) e financeiramente acessíveis (o custo é baixo e pode ser
parcelado em 12 vezes) para moradores de favelas do Jardim Ibirapuera- São
Paulo. O serviço (FIG.6) é ofertado por meio de um escritório montado dentro da
comunidade e no qual trabalham arquitetos, pedreiros, ajudantes, estagiários e
equipe de venda, todos contratados pela empresa em regime de
CLT (DRAFT, 2015).
33

Figura 6 - Programa Vivenda: reforma de banheiro - antes e depois

Fonte: Vivenda (DRAFT,2015)

Para chegar a esse formato, que atualmente opera no Jardim Ibirapuera,


complexo de pelo menos três favelas na periferia da zona sul de São Paulo e com
nove mil casas, o Vivenda passou por diversas fases. Da concepção da ideia ao
início das primeiras obras, em maio de 2014, foram necessárias pesquisas,
conversas na comunidade e um processo de aceleração na
Artemisia (DRAFT, 2015).
Em sua tese de mestrado, Fernando (ASSAD, 2012) desenvolveu a ideia
para sua empresa, um negócio social, focado em habitação. Em relação à
metodologia e representações de projeto do Programa Vivenda, não foram
encontradas informações que demonstrassem tais aspectos.

4.3 ARQUITETOS DA FAMÍLIA

Arquitetos da Família5 é o nome da pesquisa realizada pela arquiteta e


pesquisadora Priscilla Nogueira, desenvolvida entre 2008 e 2010. A ideia inicial da
pesquisa era investigar processos participativos de projeto, especialmente os que

5
A denominação Arquitetos da Família não tem nenhuma relação com o Programa do Arquiteto da
Família criado pelo Grupo Risco, formado por alunos da Universidade Estadual de Campinas
(www.gruporisco.org) nem tem qualquer relação com programas de Assessoria Técnica propostos
pelo CREA e ou IAB.
34

envolvessem o atendimento de clientes populares, com renda média e média-baixa,


que não estão habituados a contratar um arquiteto, mas que demandam dicas,
ideias ou qualquer tipo de orientação em suas reformas e
construções (UFMG, 2010). Inicialmente os atendimentos eram realizados apenas
pela Priscilla, no entanto, devido à grande demanda, outros arquitetos integraram a
pesquisa, nascendo assim os Arquitetos da Família, vinculado ao grupo de pesquisa
Morar de Outras Maneiras (MOM) da UFMG.
As ideias de Livingston serviram como ponto de partida para o trabalho,
concluído em fevereiro do ano de 2010, com a defesa da dissertação intitulada
“Práticas de Arquitetura para Demandas Populares – A experiência dos Arquitetos
da Família”. Uma das partes da pesquisa consistiu na aplicação do procedimento de
Livingston a demandas reais, incluindo desde a captação de clientes, passando pela
realização de atendimentos, chegando à discussão e reformulação de alguns
aspectos do procedimento ao longo dos experimentos. Ao longo de 12 meses,
foram realizados 110 contatos, dos quais 38 resultaram em atendimentos.
A captação de clientes para aplicação do El Metodo se deu de três formas
diferentes: pela distribuição de panfletos, pela publicação desses panfletos em
jornais de bairro e por indicações, o popular boca-a-boca. A distribuição de panfletos
(FIG. 7) foi a ideia inicial, supondo-se ser a mais condizente com o perfil de cliente
desejado: pessoas que estivessem em busca de soluções construtivas e espaciais,
mas que não contratariam um arquiteto por desconhecerem seu trabalho, ou por
julgarem não poder pagar, ou por acreditarem ser o arquiteto um profissional que só
atende demandas mais sofisticadas.

Iniciei a distribuição dos panfletos em associações de bairro onde havia


pessoas conhecidas como as dos bairros Califórnia, na região noroeste,
Sarandi, na região da Pampulha e Jardinópolis, na região oeste. Depois
passei a distribuí-los em grandes lojas de material de construção como
Leroy Merlin, Telha Norte e Lar & Construção, para alcançar uma
quantidade maior de pessoas... Escolhi as manhãs de sábado, por
constatar que são os períodos de maior movimento (NOGUEIRA, 2010,
p. 89).
35

Figura 7 - Panfleto de divulgação dos Arquitetos da família - frente e verso

Fonte: Nogueira (2010, p. 89)

Os experimentos aconteceram em dois momentos diferentes. Na primeira


fase, os clientes eram atendidos pela própria arquiteta Priscilla Nogueira. Com o
aumento progressivo de pessoas interessadas nos serviços oferecidos, foi formado
um grupo de arquitetos para dar conta do número crescente de atendimentos. Essa
foi a segunda fase dos atendimentos.

Do total de 110 telefonemas recebidos, 38 serviços foram de fato


realizados, entre projetos de casas novas, reformas residenciais e não
residenciais, troca de mobiliário, escolha de imóveis para compra, mudança
de layout e escolha de novos acabamentos. O retorno obtido foi de 35%
(NOGUEIRA, 2010, p. 93).
36

Figura 8 - Arquitetos da família: telefonemas que geraram atendimentos

Fonte: Nogueira (2010, p. 93)

Os anúncios de jornal renderam vários telefonemas, mas,


proporcionalmente, menos serviços efetivados do que as indicações
pessoais. Ao contrário do público atraído pelos jornais, todas as pessoas
que nos contataram por indicação de alguém conhecido efetivaram partes
do trabalho e várias chegaram a executar a obra. Já os jornais
proporcionaram muitos telefonemas de pessoas que elogiavam o anúncio e
quer iam apenas conhecer o trabalho, mas nem tantos trabalhos foram
concretizados (NOGUEIRA, 2010, p. 94).

Os honorários dos arquitetos foram calculados de acordo com a hora técnica


trabalhada. Segundo Priscilla (NOGUEIRA, 2010) os valores das Opções e dos
Manuais não foram categorizados de acordo com metragem das construções, mas
se relacionavam com o grau de dificuldade do trabalho de maneira geral, avaliado
durante a entrevista e a visita ao local. Os critérios para isso foram o tipo do terreno,
se plano ou acidentado, a quantidade de pessoas a usar o espaço e a distância até
o local. Dessa maneira, a cobrança seria feita sobre a quantidade de horas
trabalhadas, proporcionais ao grau de dificuldade de cada situação.

Eu esperava que houvesse certa resistência dos clientes em pagar pela


Primeira Entrevista. Houve algumas pessoas que de fato se surpreenderam
e chegaram a questionar por que teriam que pagar por uma entrevista
sobre o espaço, mas que acontecia fora dele. Nesses casos, eu explicava
que o espaço seria visitado, porém após uma primeira
conversa (NOGUEIRA, 2010, p. 113).

Tanto nas Entrevistas como nas Consultas, foram muito frequentes as


dúvidas dos clientes sobre a legalização das edificações. Muitas pessoas
37

apresentavam a demanda de um Projeto Legal. O Metodo de Livingston


não se atém a essa questão, mas, para o nosso grupo, tornou-se
impossível não oferecer esse serviço. Decidimos que os arquitetos
estipulariam a quantidade de horas necessárias à elaboração dos
desenhos e cobrassem um valor fechado, como um serviço paralelo e
independentemente do método (NOGUEIRA, 2010, p. 121).

Segundo Priscilla (NOGUEIRA, 2010) em alguns atendimentos, os clientes


consideraram que seriam capazes de construir ou reformar usando apenas os
desenhos de Opções, sem um Manual de Instruções. No entanto, devido a
formação dos arquitetos ser limitada quanto ao conhecimento de soluções
construtivas, as opções, para que pudessem ser usadas na construção, deveriam
ter uma consistência técnica maior do que usualmente se apresenta em estudos
preliminares convencionalmente praticados e ensinados nos cursos de graduação.
Segundo Priscilla (NOGUEIRA, 2010), é importante salientar que
apresentar soluções bem resolvidas tecnicamente não requer desenhos acabados,
mas informações consistentes transmitidas com clareza. A pouca atenção aos
aspectos construtivos poderia inviabilizar alguma opção apresentada.

Figura 9 - Planta da casa de Laura e Ulisses antes da obra- atendimento Priscilla Nogueira

Fonte: Nogueira (2010, p. 62)


38

Figura 10 - Opção com cozinha aberta_ casa Laura e Ulisses- atendimento Priscilla Nogueira

Fonte: Nogueira (2010, p. 62)

Segundo Nogueira (2010), o grupo, após alguns atendimentos, passou a


conceber uma combinação dos exercícios de escuta da entrevista com os critérios
da visita ao adotar o atendimento nos moldes de uma consulta médica. Realizavam-
se primeiro alguns exercícios de escuta do cliente, para então proceder à
inspeção do lugar. O objetivo era solucionar problemas com dicas e croquis
feitos imediatamente, quase à maneira de uma receita médica. Dessa maneira, o
número de atendimentos aumentou.

Aparentemente, a Consulta era percebida pelos clientes como um


procedimento mais informal do que a Entrevista. No entanto, ao realizá-las,
o grupo percebeu que a maioria dos clientes subestimava seus problemas
espaciais ou construtivos. Assim, as Consultas deram origem a mais
Manuais de Instrução do que as próprias entrevistas. Várias pequenas
demandas resultaram em Manuais simplificados, que as pessoas utilizavam
para variados fins, como orçamentos ou a decisão de compra de um
material de revestimento. Algumas Consultas deram origem à elaboração
de variantes e, nesses casos, os passos do Metodo poderiam seguir
normalmente. (NOGUEIRA, 2010, p. 119).

Outra particularidade em relação às consultas, segundo


Priscilla (NOGUEIRA, 2010), foi que elas revelaram o despreparo geral dos
arquitetos sobre assuntos ligados à construção. Os clientes, por serem
autoprodutores, estão muito mais a par do que acontece no canteiro do que os
próprios arquitetos. Sendo assim, as soluções imediatas das questões, não era
possível, como era a intenção inicial. Nesse sentido, em geral, as respostas vinham
39

depois de uma breve pesquisa e eram enviadas por email ou explicadas em um


telefonema posterior.

Figura 11 - Manual de Instruções, cliente Luciane. Produzido pela arquiteta Hiromi Sassaki, 2009.

Fonte: Nogueira (2010, p. 120)

Nogueira (2010), durante o desenvolvimento de sua pesquisa, realizou uma


visita ao Estúdio Livingston em Buenos Aires - Argentina, onde ela pôde
acompanhar atendimentos realizados no Estúdio; conhecer outros arquitetos que
aplicam o Metodo; observar possíveis limitações e diferenças com relação à
realidade brasileira; contatar clientes já atendidos e visitar obras.

Os pagamentos são sempre realizados ao fim de cada passo do Método,


sendo que as Variantes e o Manual são pagos em duas parcelas, metade
no início do trabalho e a metade na entrega final. Percebi que o montante
pago por um projeto do Estúdio Livingston é muito próximo ao que é
cobrado em escritórios convencionais. A diferença está nos benefícios
trazidos pelo Método: a objetividade na abordagem dos clientes, a maneira
de cobrança, o processo criativo e as ferramentas utilizadas.[...] Um dos
diferenciais da prática do Estudio Livingston é a organização da
informação. Tudo o que eles produzem para os clientes é
incluído automaticamente em um vasto banco de dados. O conteúdo dos
projetos é sistematicamente categorizado e serve como uma espécie de
catálogo. O escritório é repleto de marcações de distâncias na horizontal e
na vertical e de projetos expostos. Sempre que um cliente tem algum
40

questionamento, há um exemplo ilustrativo por perto (NOGUEIRA, 2010,


p. 99-100).

Nogueira (2010) realizou ainda uma experiência paralela com estudantes,


que se dedicaram à aplicação do Método com clientes reais, intitulado “Cirurgia de
Casas”. O tema foi ministrado por três semestres consecutivos com turmas do sexto
período da Escola de Arquitetura da UFMG, na disciplina Projeto III (UFMG, 2010).

[...] os estudantes se sentiram estimulados pelo fato de a relação concreta


entre cliente e arquiteto ser abordada sistematicamente, pois, isso não
costuma ocorrer nas disciplinas de projeto. A maioria conseguiu construir
uma relação frutífera de interação com as pessoas. Por outro lado,
perceberam suas deficiências no campo das técnicas construtivas, pois
tiveram grandes dificuldades em demonstrar como as coisas poderiam ser
construídas. Isso fez com que se engajassem em pesquisas sobre o tema e
percebessem a importância da presença no canteiro (NOGUEIRA, 2010,
p. 65).

Figura 12 - Fragmento de Manual de Instruções produzido por Luiz Quintão

Fonte: UFMG (2010)


41

4.4 ARQUITETURA NA PERIFERIA

O projeto Arquitetura na periferia consiste em oferecer assessoria técnica a


grupos de mulheres da periferia de Belo Horizonte- MG, na ocupação Dandara.
Para a melhoria da moradia, elas são apresentadas às práticas e técnicas de projeto
e ao planejamento de obras, e recebem um micro financiamento para que
conduzam sem desperdícios as reformas de suas casas (ABRACE O
BRASIL, 2017). A primeira edição ocorreu entre setembro de 2013 e junho de 2014,
com três famílias.
A pesquisa partiu da hipótese de que é possível oferecer assessoria técnica
de arquitetura a uma camada socialmente excluída, mediante a reformulação dos
procedimentos profissionais convencionais, sem depender de recursos públicos e
sem que seja necessária a organização prévia dos moradores.

Essa pesquisa apresenta um processo de assessoria pautado pelo trabalho


em grupo e pelo compartilhamento de informações, ao invés da
simples oferta de um produto. Tal processo não se restringe à elaboração
de projetos técnicos – abrange desde a explicitação das necessidades e
desejos do morador até o planejamento, o financiamento e o
acompanhamento das obras. Sobretudo, visa à autonomia das
participantes, no sentido de lhes fornecer as informações para ampliarem o
seu leque de escolhas e tomarem as decisões, em vez de torná-
las dependentes (MENDONÇA, 2014)

A iniciativa busca favorecer a autonomia das participantes, ampliando sua


capacidade de análise, discussão, planejamento e cooperação que, por fim, leva a
um aumento de sua autoestima e confiança. Todo o processo de planejamento das
obras funciona como um grande aprendizado, as mulheres aprendem a medir,
desenhar, planejar na oficina de levantamento (FIG. 13) e executar alguns serviços
de construção (FIG.14).
42

Figura 13 - Arquitetura na periferia: Oficina de levantamento

Fonte: Mendonça (2014)

Figura 14 - Arquitetura na periferia: exercício de montar os layouts com o kit imobiliário

Fonte: Mendonça (2014)


43

4.5 EL METODO

Rodolfo Livingston, um arquiteto argentino com ideias bastante diferenciadas


sobre o descompasso entre os serviços oferecidos pelos arquitetos e das demandas
dos clientes, questiona a prática projetual convencional e propõe um método de
atendimento baseado nos seguintes pressupostos: redução de formalidades,
abandono da ideia de solução fechada e definitiva, possibilidade de interrupção dos
serviços, adoção de conhecimento técnico aplicado e não somente teórico.

[...] o campo da arquitetura portenha vê Livingston quase como um “anti-


arquiteto”. O fato de não haver na biblioteca da Escuela de Arquitectura da
Universidad de Buenos Aires um só exemplar de Arquitectos de Família e
somente um exemplar de Cirugia de Casas pode ser uma boa evidência de
que a comunidade acadêmica não o vê com bons olhos. Acadêmicos
afirmam que ele é um arquiteto pouco criativo por fazer exatamente “o que
os clientes querem” (NOGUEIRA, 2010, p. 99).

A escuta do cliente é considerada por Livingston como um elemento


essencial na criação, tão importante quanto as dificuldades, vistas por ele como
estímulos e não como obstáculos ao pensamento (NOGUEIRA, 2010).

Figura 15 - "Escuta do Cliente" em Cienfuegos, Cuba -1994

Fonte: Livingston (2009, p. 315)


44

A origem do El Metodo está na primeira experiência profissional de Livingston


(2009): a produção de um grupo de moradias na cidade de Baracoa, na ilha de
Cuba na década de 1960. Segundo seus relatos, essa experiência foi marcada
pelas contradições de um arquiteto recém-formado, trabalhando para operários da
construção civil que ali deveriam executar suas próprias casas. Mais tarde, a partir
de demandas de menor porte para a classe média de Buenos Aires, Livingston
aprimorou e sistematizou seu método. Ele o denomina participativo, pelo fato de os
projetos serem desenvolvidos com ampla participação dos usuários na definição das
demandas e na escolha de soluções.

Figura 16 - Arquitetos da Comunidade - Grupo Pioneiro de Holguín -1994

Fonte: Livingston (2009, p. 315)

Segundo Livingston (2014), por alguma misteriosa razão, a palavra


"metodologia" foi difundida em lugar de método, que quer dizer caminho. O método
elaborado pelo argentino consiste em entender a demanda do cliente em duas
entrevistas, não sem antes marcar o pacto das datas, serviços e honorários. El
Metodo é composto por oito passos dividido em duas etapas (FIG. 17). Fazem parte
da primeira etapa a pré entrevista, a primeira entrevista que é composta pelo El
pacto, El Sítio e o Cliente, além da apresentação das variantes, a devolução das
45

variantes e o Ajuste Final. A segunda etapa é composta pela escuta para o Manual
de instrução e a entrega do Manual de instrução. Segundo Rodolfo (LIVINGSTON,
2009). a duração total desses oito passos será entre três e cinco semanas.

Figura 17 - Los ocho pasos - El Metodo

Fonte: Livingston (2009, p. 17)

4.5.1 Primeiro passo: a Pré-entrevista

A pré-entrevista é o primeiro contato do arquiteto com o cliente e pode ser em


um encontro casual ou uma conversa ao telefone que, segundo Livingston (2009)
não precisa ultrapassar os dez minutos. É importante esclarecer nesse momento a
forma como o arquiteto trabalha, explicar sobre as etapas e quais as formas de
pagamento. O arquiteto deve ainda fazer algumas perguntas chaves: se o cliente já
vive no local, se a resposta for sim, provavelmente será uma reforma. Deve-se
então saber quais os principais problemas.
46

Ainda na pré-entrevista é pedido ao cliente que leve no dia da entrevista o


P.C. (Projeto do Cliente), e nele colocar as suas ideias de projeto. É importante que
o cliente entenda que não desenhos elaborados, mas sim que reflitam seus desejos.
.

4.5.2 Segundo passo: a Primeira entrevista- El pacto

Um colega que conhece meu método de trabalho me disse: "eu trabalho


igual a você, faço o que o cliente me pede". Não é meu caso, lhe
respondo, eu faço o que ele deseja, o que necessita, e quase nunca
coincide com o que ele pede (LIVINGSTON, 2009, p. 35).

Na primeira entrevista, as formas de trabalho e as etapas são novamente


retomadas, o arquiteto deve apresentar a Hoja de ruta (Roteiro de trabalho) (ver
Anexo C), onde ficam claras todas as etapas e os honorários do arquiteto. É
importante, nesse momento que os clientes digam se concordam ou têm dúvidas
sobre alguma etapa. Após esse momento, arquiteto e cliente estabelecem El pacto,
marcando o início da relação. Segundo Rodolfo (LIVINGSTON, 2009) o melhor lugar
esta entrevista é no escritório do arquiteto, para não haver interrupções, e poder
contar com elementos que podem ser úteis (fotos, projetos, dados etc.).
Para melhor compreensão do espaço onde será realizada a reforma e da
família que o habita, Rofolfo (LIVINGSTON, 2014) propõe vários exercícios de
escuta, onde é possível conhecer sobre sua história, seus hábitos, desejos e
sonhos. O primeiro dele é o P.C. Rodolfo (LIVINGSTON, 2014) sugere que o
arquiteto entenda o P.C. (Projeto do Cliente), observando seu desenho e anotando
ordenadamente as explicações que o cliente faz sobre ele, tentando compreender
como o cliente entende o espaço onde vive. Rodolfo também sugere ouvir um pouco
da história da casa, como foi adquirida, há quanto tempo eles moram nessa
residência, conhecer a família, nomes, idades, profissões.

As informações sobre a história da família e da casa não devem ocupar


mais de meia página em nossas anotações, isto é, que nos serão
suficientes as respostas curtas, sintéticas, evitando cair em um
interrogatório como em um psicólogo (LIVINGSTON, 2009, p. 51).
47

O segundo exercício é o C.F.D (Casa Final Desejada), onde o cliente deve


imaginar que sua casa não existe, e que seu orçamento é levemente maior ao
verdadeiro (LIVINGSTON, 2014), o que permite que a imaginação do cliente se
despegue do seu P.C. e voe um pouco mais, pois, frequentemente o cliente, devido
aos altos custos, não pede o que realmente deseja. Esse exercício oferece a
oportunidade de registrar desejos do cliente que estavam ocultos.
O terceiro exercício é o Exercício Fiscal. Nele o cliente deve apenas reclamar
da casa. Por vezes, o cliente não reclama de determinadas características da casa
por achar que não tem solução (LIVINGSTON, 2014). Similar ao terceiro, quarto
exercício é o do Mais, menos, no qual cada membro da família diz o que mais e
menos gosta na casa. Segundo Rodolfo (LIVINGSTON, 2009), a pergunta os faz
pensar, as informações adquirem relevo e conduzem às melhores opções.
O quinto exercício é o diagrama de globos (FIG. 18). Quando se trata de
reformas, os globos servem para obter uma comparação sintética entre a casa
existente e a casa desejada (LIVINGSTON, 2009, p. 17). Muitas vezes existem mais
ambientes que o necessário, porém são mal utilizados. No diagrama é proposto ao
cliente unir determinados ambientes e suas funções.

Figura 18 - Diagrama de globos- Rodolfo Livingston

Fonte: Livingston (2009, p. 49)

Os exercícios de escuta não necessitam seguir essa mesma ordem, devem


ser feitos espontaneamente. Após os exercícios de escuta o arquiteto deve fazer o
"Aparato " para se juzgar variantes (FIG. 19), que se trata de uma síntese contendo
todas as informações obtidas, nome dos moradores, profissão e idade, problemas e
48

desejos de acordo com as respostas do exercício fiscal e C.F.D. Essas informações


serão úteis ao longo do processo (LIVINGSTON, 2009).

Figura 19 - Aparato para Juzgar variantes- Rodolfo Livingston

Fonte: Livingston (2009, p. 54)

4.5.3 Terceiro passo: Sitio e Cliente

Este passo está relacionado ao levantamento da casa e seu entorno.


Rodolfo (LIVINGSTON, 2009) estabelece uma metodologia para esse momento:
observar a rua e seu movimento, as árvores, compreender o contexto da
residência. Em seguida deve-se compreender a casa como um todo, seu perímetro
e fluxos para só então tirar as medidas. Por fim, deve-se andar pela casa
novamente percebendo o espaço como um todo. Durante a visita o arquiteto deve
49

estar atento não só à casa, mas também em ouvir novamente o cliente, pois, ele
pode se lembrar de algo esquecido na primeira entrevista

4.5.4 Quarto passo: a segunda entrevista- apresentação das variantes

A segunda entrevista acontece geralmente uma semana após a primeira. Em


primeiro lugar, o arquiteto apresenta ao cliente seu P.C., e lhe pergunta se está
corretamente interpretado, em seguida apresenta todas as variantes. Segundo
Rodolfo (LIVINGSTON, 2009) se o estudo foi bem feito, as variantes serão no
máximo três a cinco.

As Variantes são sempre elaboradas à mão e não apresentam detalhes,


mas são bastante claras e realizadas com base em informações
extremamente precisas. Os arquitetos estão muito habituados com o
trabalho e, portanto, são muito ágeis. O grande diferencial das Variantes
são as perspectivas apresentadas juntamente com as plantas. As
perspectivas de Gonzalo, realizadas sobre as fotos dos lugares, são
extremamente expressivas. Apesar de serem desenhos muito bonitos não
são desenhos sofisticados (NOGUEIRA, 2010, p. 101).

Figura 20 - Perspectivas feitas pelo arquiteto Gonzalo Manuele

Fonte: Nogueira (2010, p. 102)

O cliente poderá também nesse momento propor novas variantes a partir das
existentes, gerando novas versões. O morador poderá levar os desenhos para casa
e retornar depois de alguns dias. Os desenhos entregues ao cliente são
processuais, apenas recebem alguns retoques e arremates gráficos. Usa-se sempre
50

o papel transparente para facilitar a intervenção de novas ideias que poderão gerar
novas variantes (LIVINGSTON, 2009).

4.5.5 Quinto passo: Devolução

Ao analisar todas as variantes, o cliente retorna ao escritório com a opção


escolhida. O cliente, ao acompanhar este processo de ajustes, passa a considerá-lo
como coautor do projeto (LIVINGSTON, 2009)

Trata-se de uma participação controlada, dirigida e orientada pelo


profissional, que deve ter isso sim, a honestidade de saber escutar, na
segunda entrevista, ao seu cliente, disposto a aprender algo de sua vida
que invalide ao seu projetinho preferido (que sempre
existe) (LIVINGSTON, 2014, p. 93).

Figura 21 - Consulta em pleno Voo. Variantes feitas à mão- Rodolfo Livingston

Fonte: Livingston (2009, p. 254)


51

4.5.6 Sexto passo: ajuste Final

O ajuste final é feito pelo arquiteto após a devolução das variantes e


a aprovação de uma delas. Nesse momento, em alguns casos, o atendimento pode
se encerrar, pois alguns profissionais (pedreiros, mestre de obras), ou até mesmo o
próprio cliente, conseguem executar a obra apenas com os desenhos processuais
(LIVINGSTON, 2009).

Figura 22 - Antes e depois de uma reforma e ajuste final- Rodolfo Livingston

Fonte: Livingston (2009, p. 290)


52

4.5.7 Sétimo passo: escuta para o Manual de Instruções

Nessa etapa é retomada a escuta do cliente, compreender como pretende


realizar a obra, quais materiais serão usados, quais etapas serão realizadas
primeiro, tais aspectos são de suam importância para a elaboração de um bom
Manual de Instruções.

4.5.8 Oitavo passo: Manual de Instruções

O Manual de Instruções se parece ao tradicional "projeto" e se diferencia


dele na linguagem que não é apropriada para dirigir-se a uma empresa
construtora, nem para defender-se de possíveis conflitos legais ("os
materiais serão de primeira qualidade", "... as regras da arte", etc.), mas
para ser compreendido por uma pessoa comum, sem conhecimento sobre
desenhos técnicos. (LIVINGSTON, 2014, p. 14).

O manual pode ser chamado também de ”la documentación", não sendo


meramente informativo, deve ser também didático.

Os Manuais também são feitos à mão ou, para obras de maior porte, no
computador. São repletos de números e abreviaturas, que remetem aos
detalhes de cada parte da obra. Há sempre um Manual mestre, formado
por vários Manuais menores, denominados MI-1, MI-2 etc. O diferencial
dessa etapa está no áudio gravado por Livingston. Ele passa horas
gravando instruções, descrevendo detalhadamente cada parte da obra e o
porquê de cada decisão. Percebi que o áudio é a marca registrada de
Livingston, mas que já virou quase um cacoete. Poucos construtores o
ouvem de fato, muitos por já estarem acostumados com os seus projetos
(NOGUEIRA, 2010, p. 102).

Rodolfo (LIVINGSTON, 2014) acredita que essas medidas conferem


versatilidade à obra que, dependendo do caso, pode ser planejada por etapas. Não
se trata, portanto, de dar ordens de serviço, mas de um mecanismo de comunicação
e transmissão de informações, que deve ser fornecido ao proprietário e repassado
ao chefe da obra num mesmo momento.
53

Figura 23 - Exemplo de Manual de Instruções - MI1 (Manual Mestre) Rodolfo Livingston

Fonte: Livingston (2009, p. 190)

As experiências apresentadas acima são pioneiras, cada uma à sua maneira,


e apresentam grandes possibilidades de aprendizado. Os recursos técnicos bem
executados e a parceria com grandes investidores do Moradigna e Vivenda; a
disposição de aplicar e compartilhar uma nova metodologia da Priscilla Nogueira e
os Arquitetos da Família, O envolvimento com a comunidade e suas demandas da
Arquitetura na periferia da Carina Mendonça e a inovação de Rodolfo Livingston
com o El Metodo que serviram de referência para vários dos estudos realizados, são
ponto de partida para esse novo olhar sobre a arquitetura.
54

5 APLICAÇÃO DO EL METODO COM CLIENTES REAIS: DISCIPLINA


OPTATIVA IFMG-SL

No período entre agosto e novembro de 2018 foram feitos atendimentos a


clientes por estudantes de arquitetura do IFMG-SL, sob a orientação da prof.ª
Roxane Sidney, durante a disciplina optativa do 2º semestre/2018, intitulada de
“Prática arquitetônica: estudo de abordagem de método para demandas populares”.
O objetivo pretendido com a disciplina foi aproximar os estudantes de demandas
populares reais e aplicar o El Metodo, passo a passo, com a finalidade de validar a
hipótese de que o método de Livingston obtêm bons resultados para o atendimento
de demandas populares. A disciplina, com carga horária de 30 horas, foi proposta
de maneira condensada, a fim de que os dados da pesquisa estivessem disponíveis
para a finalização desse trabalho.

5.1 DESENVOLVIMENTO DA DISCIPLINA

A disciplina optativa "Prática Arquitetônica: estudo de método para demandas


populares" obteve uma boa aceitação por parte dos alunos que se manifestaram
interessados com o tema relativo a demandas populares, pois, em sua maioria,
sentiam um déficit de aprendizado nesse sentido. Foram ofertadas vinte vagas, no
entanto, devido a demanda, foram matriculados vinte e dois alunos, distribuídos
entre o 2º e o 10º períodos de Arquitetura e Urbanismo.
A disciplina teve início no dia 7 de agosto de 2018. Nesse dia, foram
apresentados aos alunos o tema da disciplina, o cronograma e metodologia (Anexo
A), fazendo-se uma breve explicação a respeito do método do arquiteto Rodolfo
Livingston. Após as aulas expositivas e o seminário para discussão de textos
indicados, os atendimentos começaram.
Os alunos captaram clientes com demandas reais de reforma na Região do
São Benedito. As demandas foram apresentadas em sala de aula para verificação
se eram realmente demandas populares. Três casos não puderam dar
prosseguimento no atendimento. O primeiro tratava-se da reforma de uma casa
para fins de locação, impossibilitando a aplicação do método, pois, não havia
moradores, e sim futuros inquilinos. O segundo, tratava-se de um acréscimo de área
em apartamento, o que iria contra a legislação. O terceiro, tratava-se da construção
55

de uma pequena habitação para um adolescente, porém, sua responsável legal


negou sua participação.
A captação dos clientes se deu através da indicação de amigos e parentes.
Somente um grupo de três alunos divulgou a proposta em uma rede social, o que
rendeu várias demandas que foram analisadas e escolhida a que mais se
identificava com a proposta. Ao todo, foram feitos onze atendimentos, sendo três no
Bairro Londrina, dois no Bairro Asteca, dois no Bairro São Cosme de baixo e os
restantes nos Bairros Liberdade, Jaqueline, Baronesa e Luxemburgo. Todos esses
bairros do distrito São Benedito, com exceção do Jaqueline, que se localiza em Belo
Horizonte. No entanto, devido sua aproximação com o distrito, foi aceito para a
pesquisa. No mapa abaixo (FIG. 24) estão em destaque os bairros onde foram
realizados os atendimentos com indicação do número de atendimentos feitos em
cada um deles.

Figura 24 - Bairros atendidos

Fonte: produzido pela autora, 2018

Todas as pré-entrevistas foram realizadas de maneira informal, pessoalmente


ou pelo telefone. Nesse primeiro, contato foi esclarecida a proposta de trabalho e
pesquisa e conhecida a demanda principal do cliente. Cada atendimento foi
56

nomeado nessa pesquisa de acordo com as características do projeto ou de seus


moradores, conforme quadro abaixo.

Quadro 1 - Quadro de atendimentos

Atendimentos Estudantes responsáveis Demanda principal Localização


Casa dos estudantes Aline G., Luara e Marina P. Reconfigurar os ambientes Asteca
(6º p.)
Casa dos gigantes Aline M. (4º p.) e Fernanda Acrescentar banheiro suíte Liberdade
(2º p.)
Casa do Brechó Brenda e Giovana (4º p.) Aumentar a sala Londrina
Casa dos desníveis Bruna C., Luiz Gustavo e Reconfigurar o banheiro e cozinha Asteca
Rafaela (4º p.)
Casa da escada fora Júlia, Marina R. e Vitória Refazer escada e reconfigurar São Cosme de
do padrão (8º p.) planta baixo
Casa dos Katharine, Maria Clara e Nova garagem, nova área de Jaqueline
trabalhadores do Sara Letícia (2º p.) serviço e área de churrasqueira
SAMU
Casa da artesã Tuane e Luisa (2º p.) Retirar as muitas portas da São Cosme de
cozinha baixo
Casa da cabeleireira Maria Teresa e Rafaela (2º Colocar piso na cozinha e inverter Londrina
p.) sala e quarto
Casa do Terraço Mauro e Jenefer (4º p.) Projeto luminotécnico da sala e Londrina
nova área de lazer
Casa da cozinha sem Celeste O. (10º p.) Fazer escada e área de lazer Luxemburgo
saída
Casa da sala Celeste O. (10º p.) Transferir a sala de televisão para Baronesa
barulhenta um lugar menos barulhento

Fonte: produzido pela autora,2018

Nas entrevistas agendadas, o método de trabalho era novamente explicado.


O cliente tomava ciência da pesquisa acadêmica e assinava um Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido (Anexo B). Neste momento, também era
apresentado o Roteiro de Trabalho (Anexo C), que especifica as etapas de trabalho
e os valores de cada uma, informados nessa pesquisa apenas para análise da
aceitação de preços, pois os clientes não foram cobrados pelo serviço. Houve boa
57

aceitação por parte dos clientes, pois consideraram os valores justos, porém, em
dois casos, os clientes disseram que ainda assim não teriam o dinheiro para tal.
As orientações de Rodolfo (LIVINGSTON, 2009) sugerem que a entrevista
seja feita no escritório, para se evitar interrupções, no entanto, por se tratar de
estudantes que ainda não possuem escritório e para facilitar o deslocamento do
cliente, as entrevistas foram feitas nas residências, exceto duas, que foram
realizadas no IFMG- SL.
Também na primeira entrevista, os clientes levaram os PCs (Projeto do
cliente). Em alguns casos, houve um pouco de resistência ao desenho, mas ao se
explicar que eram apenas desenhos simples, os moradores se dispuseram a fazê-
los. As entrevistas duraram em média uma hora e meia, onde foram executados os
exercícios de escuta, como sugerido no El Metodo. As entrevistas realizadas no
IFMG, transcorreram tranquilamente, o que difere das realizadas nas residências,
pois, os moradores, por vezes queriam mostrar os problemas na residência.
A etapa seguinte foi a visita ao local, denominada El Sítio, nessa etapa, foram
feitos os levantamentos e medidas das residências e observação do entorno. Uma
das dificuldades enfrentadas pelos estudantes foram as medidas irregulares das
paredes e a falta de esquadrejamentos, alinhamentos e nivelamentos nas
construções. A partir do levantamento e das informações obtidas na entrevista e o
PC, foram produzidas as variantes e apresentadas aos clientes. Todos os grupos de
estudantes receberam orientações da professora, para só então apresentarem as
opções aos clientes. Os estudantes que cursavam o 2º período tiveram um pouco
mais de dificuldade e receberam um tempo maior para a produção das opções. Na
maioria dos atendimentos houve poucos ajustes na entrega final.
Todos documentos produzidos durantes os atendimentos foram registrados e
postados em uma pasta no Google drive (MENDONÇA, 2018) para
compartilhamento, incluindo uma apresentação denominada pasta catálogo, produto
apresentado na SNCT em outubro de 2018. Nessa apresentação, os estudantes
partilharam todos os processos aplicados até então.
O produto final da disciplina foi o Manual de Instruções, produzido por cada
grupo de acordo com a escolha da opção final do cliente, sob a orientação da
professora. Cada grupo trabalhou de forma diferenciada, gerando uma grande
diversidade de manuais. Após avaliação final da professora e os devidos ajustes, os
58

manuais foram entregues aos clientes. Cada grupo de alunos, ao final da disciplina,
fez uma análise crítica da aplicação do El Metodo.
Nas análises produzidas, alguns apontamentos foram recorrentes. Os
estudantes pesquisadores consideraram o El Metodo eficaz no atendimento a
demandas populares, ressaltaram os benefícios dos exercícios de escuta, pois,
através dos exercícios era possível descobrir que existiam demandas que o cliente
ainda não havia mencionado. No entanto, criticaram alguns exercícios que
consideravam repetitivos, como o Exercício fiscal e o Mais- Menos que poderiam ser
unificados. Alguns grupos de estudantes também criticaram o tempo determinado
para cada etapa, considerando ser necessário um tempo maior para os
atendimentos.

5.2 ALGUMAS PARTICULARIDADES DOS ATENDIMENTOS

Através da aplicação do El Metodo em situações reais foi possível fazer


algumas constatações em relação à sua aplicabilidade. Todos os atendimentos
seguiram todas as etapas do El Metodo, porém, devido às variáveis inerentes à
pesquisa (clientes, demandas, estudantes em diferentes períodos), surgiram
algumas peculiaridades em alguns casos que enriqueceram ainda mais a pesquisa.
Os atendimentos realizados pelos alunos foram descritos a seguir, de forma sucinta,
apontando suas particularidades, exceto os atendimentos feitos pela autora, que
foram descritos de maneira detalhada.

5.2.1 Casa dos estudantes

Localizada no Bairro Asteca, a casa é habitada por três estudantes, e até


2016 servia como depósito, quando foi reformada pelo pai dos estudantes para
adequá-la à função de moradia. Foram refeitos sistemas hidráulicos e elétricos, a
casa foi pintada e mobiliada. A residência faz parte de um conjunto de casas
e edificações comerciais que ocupam o mesmo terreno (vila) (FIG. 25, 26 e 27).
A demanda principal da casa era melhorar os ambientes internos, dois
quartos maiores e área de estudo. Os problemas principais apontados foram o
banheiro pequeno, a porta da sala emperrada e inutilizada, a entrada apenas pela
porta da cozinha, as paredes úmidas e mofadas, devido ao efeito da capilaridade.
59

Nesse caso, a reforma será executada pelos estudantes que não são muito
experientes, e serão auxiliados pelo pai. Por esse motivo a produção do Manual de
Instruções, a partir da proposta final aprovada (FIG.28) foi um pouco mais
detalhada, com informações acerca do modo de execução das etapas, além de
fornecer orçamento da primeira fase da reforma (ver Anexo D).

Figura 25 - Casa dos estudantes- fachada

Fonte: adaptado pela autora, foto de Aline G., Lutara e Marina P. (MENDONÇA, 2018)
60

Figura 26 - Casa dos estudantes - área externa

Fonte: foto de Aline G., Luara e Marina P. (MENDONÇA, 2018)

Figura 27 - Casa dos estudantes- planta atual

Fonte: adaptado pela autora, produzido por Aline G., Luara e Marina P. (MENDONÇA, 2018)
61

Figura 28 - Casa dos estudantes - proposta final aprovada

Fonte: produzido por Aline G., Luara e Marina P. (MENDONÇA, 2018)

5.2.2 Casa dos gigantes

Localizada no Bairro Liberdade, com aproximadamente 100 m², a casa foi


construída há pouco mais de cinco anos. A residência é habitada por um casal,
professores de educação física, sendo o marido ex-jogador de basquete. O casal
possui altura fora dos padrões, a esposa 1,86 m e o marido 2 m. A demanda
principal é a construção de um banheiro suíte, pois o casal tem a intenção de ter um
filho em breve. Nos exercícios de escuta, os moradores apontaram o sol da manhã
na janela do quarto como o maior benefício para eles (FIG.29 e 30).
62

Figura 29 - Casa dos gigantes: fotos do local

Fonte: Foto de Aline M. e Fernanda, (MENDONÇA, 2018)


63

Figura 30 - Casa dos gigantes: levantamento e PC do cliente

Fonte: adaptado pela autora e produzido por Aline M. e Fernanda (MENDONÇA, 2018)

Após os exercícios de escuta, foram apresentadas quatro propostas (FIG.31)


que mantinham o quarto do casal exposto ao sol da manhã, porém, todas foram
rejeitadas pelo cliente. Na proposta 1, o quarto teve suas dimensões reduzidas para
ser colocado o banheiro no fundo. Na proposta 2, o quarto foi alongado e o banheiro
colocado ao lado. Deste modo, não houve corredor dentro do quarto. Apesar disso,
ao colocar o banheiro do lado do quarto foi acrescido 35 cm para fora, esta medida
gerou uma saliência na passagem de fora da casa que desagradou a cliente. Na
proposta 3, o banheiro da suíte gera um corredor dentro do quarto, porém, a área
dele continua com as mesmas dimensões. Na proposta 4, não houve corredor e foi
criada uma varanda para manter a luz do sol da manhã. Para isso, o banheiro foi
colocado no fundo do quarto, na direção da área de serviço, o que gerou um
ambiente pequeno. Tendo em vista que os clientes possuem medidas fora do
padrão, o casal não agradou da proposta.
64

Figura 31 - Cada dos gigantes: propostas apresentadas

Fonte: produzido por Aline M. e Fernanda (MENDONÇA, 2018)

A proposta final aprovada (FIG.32) pelos clientes foi a que estava baseada no
PC do cliente, apesar de não ter mantido a incidência do sol da manhã e ser
necessário realocar a janela do quarto para o corredor lateral. Mesmo os clientes
tendo sido alertados quanto à perda da qualidade do ambiente, eles optaram por
fazer a proposta. Foi acrescido um metro em direção aos fundos do terreno,
possibilitando um banheiro com dimensões mais favoráveis e mantendo o quarto do
casal com a mesma área.

Figura 32 - Casa dos gigantes: proposta final aprovada

Fonte: produzido por Aline M. e Fernanda (MENDONÇA, 2018)


65

5.2.3 Casa do Brechó

Localizada no Bairro Londrina, a casa é habitada pela mãe (56 anos), que
tem um brechó, e dois filhos (25 e 20 anos). A demanda inicial apontada foi a
ampliação da sala e a demanda posterior foi a transformação do quarto de
brinquedos e a lavanderia em uma varanda integrada (FIG.33 e 34).
Após os exercícios de escuta, os próprios moradores chegaram à conclusão
de que a demanda principal era reformar o quarto de brinquedos e a lavanderia. Os
estudantes apresentaram duas propostas e com os ajustes, foi aprovada a opção
final (FIG.35)

Figura 33 - Casa do brechó, demanda e levantamento

Fonte: adaptado pela autora e produzido por Brenda e Giovanna (MENDONÇA, 2018)
66

Figura 34 - Casa do brechó: fotos do local

Fonte: foto de Brenda e Giovanna (MENDONÇA, 2018)

Figura 35 - Casa do brechó: proposta final aprovada

Fonte: adaptado pela autora e produzido por Brenda e Giovanna (MENDONÇA, 2018)
67

Os moradores se manifestaram satisfeitos com a proposta, pois, os


estudantes apresentaram soluções para problemas que eles não haviam
mencionado formalmente, como a escolha de um espaço mais adequado para o
brechó e readequação do layout da cozinha. Esses problemas foram percebidos
através da visita ao local e nos exercícios de escuta. Abaixo (FIG.36) segue o
detalhamento do layout da opção aprovada.

Figura 36 - Casa do brechó: lavanderia e área de lazer e novo layout da cozinha

Fonte: produzido por Brenda e Giovanna (MENDONÇA, 2018)

5.2.4 Casa dos desníveis

Localizada no Bairro Asteca, a casa é herança na qual moram duas famílias,


em pavimentos distintos. A cliente manifestou o interesse pela reforma da casa, pois
viu a divulgação feita pelos estudantes através de anúncio em uma rede social.
A família da casa em questão é composta pelo marido (44 anos), a esposa
(37 anos), um filho de 1 ano e 2 meses, e o irmão da esposa (34 anos) que
atualmente mora com o casal. A demanda principal é a ampliação da casa, melhorar
os ambientes da cozinha e o banheiro e criar um estúdio para guardar o material de
68

som do irmão. Um dos problemas é o desnível da cozinha e da área de serviço em


relação ao restante da casa, causando transtornos a todos (FIG.37 e 38).

Figura 37 - Casa dos desníveis- corte esquemático

Fonte: produzido pela autora, 2018

Figura 38 - Casa dos desníveis- situação atual

Fonte: produzido por Bruna, Luiz e Rafaela (MENDONÇA, 2018)

O principal motivo de reforma é que a casa já não atende às necessidades da


família com a vinda do irmão para a residência e o nascimento da filha. A casa é
abaixo do nível da rua e existe um “barracão” alugado para uma senhora, mas com
entrada independente. Durante a entrevista, a esposa gostou da ideia de ter
69

banheiros compartilhados para dois quartos e disse que a conversa a fez pensar no
que ela deseja para sua casa. A esposa falou sobre a vista privilegiada que se tem
da área de serviço e cozinha, porém, no PC feito por ela (FIG. 39), é proposto um
banheiro que impede essa visão. Após conversa, ela entende que sua proposta iria
acabar com esse privilégio.

Figura 39 - Casa dos desníveis- PC- Projeto da cliente

Fonte: produzido por Bruna, Luiz e Rafaela (MENDONÇA, 2018)

Os moradores foram muito suscetíveis às propostas, consideraram que os


estudantes possuem uma visão diferenciada e demostraram muito satisfeitos com a
proposta final aprovada (FIG. 40). A cozinha e a área de serviço ficaram no mesmo
nível do restante da casa, facilitando as atividades do dia a dia.
70

Figura 40 - Casa dos desníveis- proposta final aprovada

Fonte: produzido por Bruna, Luiz e Rafaela (MENDONÇA, 2018)

5.2.5 Casa da escada fora do padrão

Localizada no Bairro São Cosme de baixo, a residência abriga quatro


moradores: esposa (52 anos), marido (58 anos), filhos (27 anos e 23 anos). A
demanda da reforma era de adequação da escada que dá acesso ao piso superior
da casa que está com os degraus com alturas desiguais; mudança da entrada
principal da casa que é bloqueada pelos carros da garagem; mudança no layout
interno da sala de jantar (FIG.41).
71

Figura 41 - Demanda da "Casa da escada fora do padrão"

Fonte: Adaptado pela autora e produzido por Júlia, Marina R. e Vitória (MENDONÇA, 2018)

Todas as etapas do processo foram acompanhadas apenas pela esposa,


sem a presença do marido, o que trouxe algumas contradições, pois, a cada
proposta, a esposa dizia que o marido não havia concordado por diversas razões.
Conseguida a presença do marido em um dos encontros dos ajustes finais, foi
possível perceber que ele estava de acordo com a proposta final apresentada,
sendo a esposa contrária, pois, disse ao final, não gostar de reformas. Nesse caso,
comprova-se a hipótese de que o acompanhamento de todos os moradores em
todas as etapas é de suma importância, para se evitar futuros constrangimentos,
retrabalho e prejuízo ao fluxo do processo.
Pelo fato da escada fora do padrão dar acesso aos quartos no pavimento
superior, a solução foi pela a troca da mesma por uma escada pré-moldada de
72

rápida instalação (FIG. 42). As estudantes fizeram orçamento em dois locais e


disponibilizaram aos moradores.

Figura 42 - Casa da escada fora do padrão - escada atual e escada proposta

Fonte: produzido por Júlia, Marina R. e Vitória (MENDONÇA, 2018)

Após a aprovação por todos da proposta final (FIG.43) o processo deu


continuidade e os estudantes puderam produzir o Manual de Instruções. No entanto,
antes que ele estivesse pronto, os moradores executaram boa parte da reforma6
(FIG. 44) apenas com a apresentação da proposta final. Nesse caso, vale salientar
que a reforma foi realizada por um pedreiro experiente e de confiança da família,
pois já havia feito vários trabalhos bem executados para os moradores.

6
A realização dessa reforma não fere as leis do município. Lei 3.615 - Institui o Código de
Edificações do Município que estabelece no artigo 12- Estão dispensados da aprovação de projeto e
licenciamento as seguintes obras:I- Construção de muro, III- Modificações internas às unidades
residenciais que não gerem alteração da área líquida edificada, nos termos da Lei de Parcelamento,
Ocupação e Uso do Solo; IV- Reformas;
73

Figura 43 - Casa da escada fora do padrão: proposta final aprovada

Fonte: produzido por Júlia, Marina R. e Vitória (MENDONÇA, 2018)

Figura 44 - Casa da escada fora do padrão: etapas executadas da reforma

Fonte: foto de Júlia, Marina R. e Vitória (MENDONÇA, 2018)


74

Os moradores executaram a escada, mas optaram pelo concreto armado,


moldado in loco (FIG.45). O pedreiro aproveitou a parte da antiga escada, quebrou o
patamar e continuou pra baixo. No primeiro dia, foi demolida a parte da lateral e o
patamar, os moradores acessavam o pavimento superior por uma escada de apoio
metálica de três degraus. No segundo dia, foi construído o restante dos degraus pra
baixo, eles continuaram subindo pela escada metálica a partir de onde estava o
patamar. No terceiro dia, não foi possível acessar o pavimento superior,
foram terminados os degraus que foram aproveitados.

Figura 45 - Casa da escada fora do padrão- escada executada em concreto armado moldada in loco

Fonte: foto de Júlia, Marina R. e Vitória (MENDONÇA, 2018)

5.2.6 Casa dos trabalhadores do SAMU

Localizada no Bairro Jaqueline, em Belo Horizonte, a casa é habitada por três


moradores, um casal e uma filha de 15 anos. A esposa é socorrista do SAMU, o
marido é motorista do SAMU e a filha estudante. A filha mais velha se casou e mora
75

no pavimento superior. A principal demanda é a reforma da área de serviço,


garagem e área externa (FIG.46 e 47).

Figura 46 - Casa dos trabalhadores do SAMU - situação atual

Fonte: adaptado pela autora e produzido por Katharine, Maria Clara e Sara (MENDONÇA, 2018)

Figura 47 - Casa dos trabalhadores do SAMU- fotos do local

Fonte: adaptado pela autora, foto de Katharine, Maria Clara e Sara (MENDONÇA, 2018)
76

Inicialmente o desejo da esposa era aumentar a janela da cozinha, melhorar


a área de serviço e criar área de lazer para a família. O marido propôs a construção
de uma laje em toda a área externa e fazer uma piscina com churrasqueira sobre
ela. Porém, após alertado pelas estudantes que esta construção não estaria de
acordo com a legislação e que seria necessário um projeto estrutural para tal, ele
desistiu da ideia. Foram apresentadas três opções (FIG.48) e após os ajustes foi
proposta final (FIG.49).

Figura 48 - Casa dos trabalhadores do SAMU- opções de reforma

Fonte: produzido por Katharine, Maria Clara, Sara (MENDONÇA, 2018)


77

Figura 49 - Casa dos trabalhadores do SAMU- opção final aprovada

Fonte: produzido por Katharine, Maria Clara e Sara (MENDONÇA, 2018)

5.2.7 Casa da artesã

Localizada no Bairro São Cosme de baixo, a casa (FIG.50) é habitada por


uma artesã (52 anos) e o filho (25 anos), que atualmente mora na casa, mas tem
planos de se mudar em breve.

Figura 50 - Casa da artesã- projeto da cliente e planta atual da casa

Fonte: adaptado pela autora e produzido por Luisa e Tuane (MENDONÇA, 2018)
78

A demanda principal é adequar a cozinha que possui muitas portas (FIG. 51),
sendo que para se chegar ao banheiro é preciso passar pela despensa que é
acessada pela cozinha (FIG 52).

Figura 51 - Casa da artesã- fotos do local, cozinha

Fonte: adaptado pela autora e produzido por Luisa e Tuane (MENDONÇA, 2018)

Figura 52 - Casa da artesã - fotos do local

Fonte: adaptado pela autora e produzido por Luisa e Tuane (MENDONÇA, 2018)
79

Um sonho da moradora é ter uma suíte e um espaço adequado para produzir


seus artesanatos, o que foi priorizado na proposta final aprovada (FIG.53).

Figura 53 - Casa da artesã- Proposta final aprovada

Fonte: adaptado pela autora e produzido por Luisa Salun e Tuane Gonçalves, (MENDONÇA, 2018)

5.2.8 Casa da cabeleireira

Localizada no Bairro Londrina, a casa é habitada por cinco pessoas, a


esposa, o marido e três filhos. A principal demanda apresentada pela cliente na
entrevista foi a troca do piso da cozinha e em seu PC ela desenhou a inversão dos
ambientes da sala e quarto dos meninos (FIG. 54).
80

Figura 54 - Casa da cabeleireira- planta atual e PC- projeto da cliente

Fonte: adaptado pela autora e produzido por Maria Teresa e Rafaela (MENDONÇA, 2018)

Na etapa do levantamento, as estudantes perceberam problemas que não


foram citados pela cliente na entrevista. A laje da casa está totalmente mofada
devido a infiltrações e o revestimento do banheiro está oco e estufado (FIG.
55). Mesmo depois de questionada a respeito, ela não manifestou o desejo de
resolver esses problemas nesse momento. Dessa forma a demanda continuou
sendo a troca do piso da cozinha e reconfiguração da planta, conforme atendido na
proposta final aprovada (FIG. 56).
81

Figura 55 - Casa da cabeleireira- fotos do local

Fonte: foto de Maria Teresa e Rafaela (MENDONÇA, 2018)

Figura 56 - Casa da cabeleireira- proposta final aprovada

Fonte: adaptado pela autora e produzido por Maria Teresa e Rafaela (MENDONÇA, 2018)
82

5.2.9 Casa do terraço

Localizada no Bairro Londrina, a casa é habitada pela esposa (23 anos) e o


marido (27 anos). A construção é relativamente nova (FIG. 57 e 58) e com
acabamentos em bom estado. A demanda principal apresentada na pré-entrevista
foi o desenvolvimento de um projeto luminotécnico para a sala, que deveria ser
ampla e com poucos móveis. Durante os exercícios de escuta e através do PC (FIG.
59), a cliente manifestou o desejo de fazer um terraço, com área de lazer e
churrasqueira e um telhado sobre a laje do segundo pavimento.

Figura 57 - Casa do terraço- fotos do local

Fonte: adaptado pela autora, foto de Mauro e Jennefer (MENDONÇA, 2018)


83

Figura 58 - Casa do terraço - fotos do local

Fonte: adaptado pela autora, foto de Mauro e Jennefer (MENDONÇA, 2018)

Figura 59 - Casa do terraço- PC- projeto da cliente

Fonte: (MENDONÇA, 2018)


84

Figura 60 - Casa do terraço- planta atual

Fonte: adaptado pela autora e produzido por Jennefer e Mauro (MENDONÇA, 2018)

A moradia está no segundo pavimento, acima de uma oficina, e possui ainda


o terceiro pavimento onde está o terraço (FIG. 60). Os estudantes produziram todas
as opções em imagens 3D (FIG. 61, 62 e 63), tornando o atendimento inviável em
uma situação real de prestação de serviços, pois o tempo exigido para tal não
condiz com os valores cobrados sugeridos.

Figura 61 - Casa do terraço- opções

Fonte: produzido por Jennefer e Mauro (MENDONÇA, 2018)


85

Figura 62 - Casa do terraço- opção final aprovada

Fonte: produzido por Jennefer e Mauro (MENDONÇA, 2018)

Figura 63 - Casa do terraço - imagem 3D interiores

Fonte: produzido por Jennefer e Mauro (MENDONÇA, 2018)

5.3 ATENDIMENTOS REALIZADOS PELA AUTORA: CASA DA COZINHA SEM


SAÍDA E A CASA DA SALA BARULHENTA

Os atendimentos realizados pela autora foram mais detalhados devido à sua


participação ativa na pesquisa voltada para a aplicação do El Metodo a demandas
reais.

5.3.1 Casa da cozinha sem saída

Localizada no Bairro Luxemburgo, a casa é habitada por cinco pessoas. A


família é composta pela esposa (51 anos), o marido (55 anos) e três filhos, filha nº 1
(28 anos), filha nº 2 (22 anos) e o filho nº 3. A mãe é doméstica, trabalha o dia todo
86

e chega em casa por volta das 17 horas, porém folga aos fins de semana,
momentos em que ela gosta muito de reunir a família e receber os amigos. Já o pai
é vigilante, trabalha em dois empregos, o dia todo, todos os dias e está em casa
apenas à noite e durante as férias. A filha nº 1 é estudante, a filha nº 2 é manicure,
chega em casa muito tarde e folga aos domingos e segundas-feiras. Já o filho nº 3 é
mecânico, frequenta a casa poucas vezes.
A família comprou a casa inacabada há oito anos. Anteriormente, moravam
em um apartamento. Após comprarem a casa, ocuparam um barracão improvisado
na parte da frente do terreno, até que as obras terminassem. Quando se
mudaram não conheciam ninguém no bairro. Para começar as obras contrataram
um pedreiro sem indicação que executou parte do serviço com alguns erros,
recebeu parte do pagamento e abandonou o serviço. Após o acontecido, e por
indicação do ex proprietário da casa, contrataram um novo pedreiro que deu
continuidade a obra. O interior da casa recebeu os acabamentos e eles puderam se
mudar. Porém, ainda faltava terminar a parte externa, o porão e resolver a questão
da cozinha, que não tinha acesso ao quintal.
A família mora no mesmo bairro que a autora e possui uma relação próxima.
Antes mesmo de iniciar a pesquisa, a cliente já havia pedido uma visita para
resolver essas questões, que foi feita em dezembro de 2017. A primeira informação
que a cliente queria obter era o valor do projeto, mas a autora não sabia como
cobrar por tais serviços. Nesse caso, a insegurança e a falta de tempo impediram a
autora de dar início ao projeto. Essa questão suscitou ainda mais a pesquisa por
métodos de atendimentos a demandas populares. Em agosto de 2018, criada a
oportunidade através da disciplina optativa, o atendimento à família foi retomado.
As demandas da família foram: nova área de serviço; construir escada para
acesso ao quintal; terminar o porão; garagem para dois carros; área de lazer para
a família com churrasqueira, piscina e academia; horta e jardim. A esposa gosta
muito de lidar com a terra, já fez várias tentativas de plantio no quintal, porém, a
área que ela utilizou é inundável, e por vezes a água levou embora suas plantas.
Na visita ao local, foram confirmados os problemas já citados pela cliente na
pré-entrevista. Os principais problemas diagnosticados foram a porta da cozinha
sem acesso ao quintal; pilar que impede a entrada de mais carros; porão inacabado
e sem utilização; parte da área do terreno inundável; área de serviço improvisada
(FIG. 64 e 65).
87

Figura 64 - Casa da porta da cozinha sem saída- levantamento e croquis

Fonte: produzido pela autora, 2018

Figura 65 - Casa da porta da cozinha sem saída- fotos do local- principais problemas

Fonte: arquivo pessoal da autora, 2018


88

A primeira entrevista foi realizada com a esposa e a filha nº 1. Na entrevista


foram apresentados os PCs de cada morador (FIG. 66), sendo que, a filha nº 2
produziu o seu PC juntamente com sua mãe e o filho nº 3 não o fez. No PC do
marido, a ideia principal era construir uma grande laje no nível da casa e fazer a
área de churrasqueira, área de serviço e banheiro e, no porão, colocar apenas uma
mesa de sinuca. O PC da esposa e da filha nº 2 apresentou uma laje onde ficaria o
banheiro, a área de serviço não estava definida e propunha utilizar o porão como
área de churrasqueira e academia, além de uma piscina, horta e jardim no quintal. O
PC da filha nº 1 também apresentava uma laje onde seriam feitas a área de serviço
e no porão ficariam a área de churrasqueira, o banheiro, piscina e uma pequena
área gramada.

Figura 66 - Casa da porta da cozinha sem saída- PCs- projeto dos clientes

Fonte: arquivo pessoal da autora, 2018

Na primeira entrevista, foram feitos ainda os exercícios de escuta dos


clientes. Pelo fato de ser o primeiro atendimento da autora, os exercícios pareceram
89

um pouco sistemáticos e não ocorreram de forma fluida, apesar da intimidade entre


os envolvidos. Ao término da entrevista ficou agendado o próximo encontro, em um
horário propício para a participação do marido.
A segunda entrevista foi realizada com a esposa, o marido e a filha nº 1, onde
foram apresentadas as variantes produzidas a partir dos PCs (FIG. 67, 68 e 69) e
uma variante produzida a partir dos resultados dos exercícios de escuta, os desejos
dos clientes e propostas da autora.

Figura 67 - Casa da porta da cozinha sem saída- opção 1 - PC do marido

Fonte: produzido pela autora, 2018


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Figura 68 - Casa da porta da cozinha sem saída- opção 2- PC da filha nº 1

Fonte: produzido pela autora, 2018


91

Figura 69 - Casa da porta da cozinha sem saída- opção 3- PC da esposa e da filha nº 2

Fonte: produzido pela autora, 2018

Apresentadas todas as opções, os clientes fizeram algumas observações e


considerações, analisando a opção que atenderia melhor às necessidades de todos.
O primeiro questionamento veio por parte do marido. Sua dúvida era em saber qual
a opção que teria mais tubulões, isto é, a mais cara. Ao saber que seria a dele, pois
é a que possui a maior área a ser construída, a opção foi descartada.
As análises, a partir desse momento foram em torno da escolha da opção
com a menor área a ser construída e que trouxesse os maiores benefícios para a
família. Dessa maneira, a opção final aprovada foi a produzida pela autora (FIG. 70).
92

Figura 70 - Casa da porta da cozinha sem saída- opção final aprovada

Fonte: produzido pela autora, 2018

Escolhido o projeto, iniciaram-se as conversas sobre a produção do Manual


de Instruções (ver Apêndice B). Os clientes decidiram por realizar a construção em
duas fases. A primeira é a construção do alicerce delimitando a área inundável e
elevando o nível do quintal e a construção da escada e área de serviço. E a
segunda fase é a construção da área de lazer no porão, com churrasqueira, lavabo,
academia, horta, jardim e piscina. O Manual de Instruções produzido foi apenas
para a primeira fase que será executada de imediato, já o manual da segunda fase
será produzido posteriormente.
93

Em relação à piscina, os clientes ainda não se decidiram se irão construi-la


ou não. A sugestão da autora é deixar o espaço no quintal para se instalar uma
piscina desmontável, pois seu uso não será frequente, e uma piscina fixa demanda
muita manutenção. Em relação à coluna que impede a entrada de mais carros na
garagem foi indicada a consulta a um engenheiro civil, assim também para o projeto
estrutural da escada e área de serviço.
Outro questionamento foi em relação à rede de esgoto que está acima do
nível do lavabo e da pia de apoio da churrasqueira propostos no porão. A solução
foi a instalação de fossa biodigestor de fácil acesso no mercado e valor acessível. O
Biodigestor é uma miniestação de tratamento de esgoto residencial, é 100%
impermeável e possui um sistema de extração do lodo, dispensando o uso do
caminhão limpa fossa (ver Apêndice B).
Outra questão é a umidade por capilaridade no porão, a solução foi a
impermeabilização da parede antes da aplicação da primeira fiada de tijolos, e a
impermeabilização do muro de arrimo do porão antes dos acabamentos (ver
Apêndice B). Após pesquisa, a melhor solução encontrada foi a aplicação de um
produto que faz o uso de nanotecnologia, um aditivo em pó para impermeabilizar
concretos e argamassas que reage com o cimento durante o processo de
hidratação, dando origem a substâncias minerais que bloqueiam a rede capilar,
proporcionando uma elevada impermeabilidade ao concreto ou argamassa
(Rebotec..., 2018).
Os procedimentos de instalação do biodigestor e impermeabilização do muro
e paredes foram detalhados no Manual de Instruções, por se tratar de serviços
específicos, apesar da experiência do pedreiro contratado. Esses apontamentos
estão relacionados à segunda fase da obra, porém foi preciso resolvê-los de
antemão para se averiguar a viabilidade do projeto, além da viabilidade financeira.

5.3.2 Casa da sala barulhenta

Localizada no Bairro Baronesa, a casa é habitada por quatro pessoas, a


esposa (42 anos), marido (49 anos) e dois filhos de 19 e 15 anos. A esposa é
professora da Educação infantil em horário integral, já o marido é gerente de posto
de gasolina, trabalha em horários variados. A esposa relata que após a separação
dos pais, os irmãos, sobrinhos e familiares passaram a frequentar mais a sua casa,
94

sendo o ponto de referência para as comemorações e festividades. Dessa forma, a


demanda principal da família é em relação à sala de estar, devido à proximidade
com a rua muito barulhenta (FIG. 71)

Figura 71 - Casa da sala barulhenta- foto do local

Fonte: arquivo pessoal da autora, 2018

A família é amiga da autora há muitos anos, e a questão foi levada até ela em
uma conversa informal. A cliente já havia pensado em uma solução, mas não sabia
se era viável e gostaria de uma opinião sobre o assunto. Marcada a entrevista, a
autora aplicou os exercícios de escuta, dessa vez de uma forma muito mais
espontânea, a conversa fluiu naturalmente. Surgiram novas demandas a partir da
escuta, os moradores gostariam de uma área de lazer para receber os amigos e
parentes e comentaram da dificuldade do marido em acessar as escadas, pois
sofreu um acidente há alguns anos que gerou uma necessidade física especial.
O terreno é herança de família e a casa foi construída há 12 anos. Na época,
o marido pediu a um engenheiro agrimensor, que trabalhava na mesma empresa,
para fazer o projeto arquitetônico, porém, ele o fez sem ir até o local, usando
apenas medidas padrões de um lote. Quando o engenheiro foi até o terreno
percebeu que o projeto não se enquadrava. A partir das novas medidas foi feito o
novo projeto, de acordo com os pedidos dos clientes: uma casa térrea, com sala e
cozinha amplas (FIG. 72).
95

Figura 72 - Casa da sala barulhenta - projetos feitos pelo engenheiro agrimensor cedidos pelo cliente

Fonte: arquivo pessoal da autora, 2018

O segundo projeto foi aceito pelos clientes, que contrataram um pedreiro para
realizá-lo. Porém, o engenheiro agrimensor não pode acompanhar a obra, nem
tampouco os clientes, que trabalhavam o dia todo. Dessa maneira, a implantação foi
feita errada e a casa ficou na divisa com a rua. Além disso, como o terreno é em
aclive necessitaria de um desaterro para que a casa ficasse no nível da rua, o que
não foi feito. Os clientes só perceberam o erro quando a fundação estava sendo
feita. Outro problema em relação à execução foi supressão do corredor que ligava a
área de serviço ao quintal dos fundos, decisão tomada pelo pedreiro, que prejudicou
muito o fluxo da casa, tornando o quintal de difícil acesso (FIG. 72).
Esses problemas geraram a demanda atual (FIG. 73, 74, 75). Devido à
proximidade com uma rua muito movimentada e a casa estar acima do nível dela, a
sala recebe muitos ruídos externos. A família já enfrentou diversos problemas com
pedreiros e teme uma nova reforma. Desejam a solução do problema, mas ainda
não sabem que profissional irão contratar para executar o projeto.
96

Figura 73 - Casa da sala barulhenta- fotos do local

Fonte: arquivo pessoal da autora, 2018

Figura 74 - Casa da sala barulhenta- fotos do local- área de serviço e sala de estar e jantar

Fonte: arquivo pessoal da autora, 2018


97

Figura 75 - Casa da sala barulhenta- situação atual- principais problemas

Fonte: produzido pela autora, 2018

Na primeira entrevista, participaram o marido e a esposa, os filhos estavam


em casa, porém, não quiseram opinar. O casal apresentou apenas um PC (FIG. 76).
A ideia principal era transferir a sala de televisão para a atual área de serviço,
construir uma laje próxima à cozinha e fazer a nova área de serviço, além de abrir
uma porta na sala para acessar o quintal. A esposa também manifestou o desejo de
reconfigurar a cozinha, pois, a considera muito grande e pouco funcional.
98

Figura 76 - Casa da sala barulhenta- PC da família

Fonte: adaptado pela autora, 2018

Na segunda entrevista, estavam presentes a esposa e o marido. Foram


apresentadas duas opções, a opção 1 (FIG. 77) de acordo com o PC da família e a
opção 2 (FIG. 78 e 79) de acordo com os desejos da família e sugestões da autora.
O casal escolheu pela opção 2, pois não haveria acréscimo de área construída, e
apesar da redistribuição do espaço da cozinha com a área de serviço, a cozinha
ficou muito mais funcional.
O casal não pretende realizar a obra nesse momento, e por esse motivo o
Manual de Instruções será produzido posteriormente.
99

Figura 77 - Casa da sala barulhenta - Opção 1- PC da família

Fonte: produzido pela autora, 2018


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Figura 78 - Casa da sala barulhenta- opção 2- final aprovada

Fonte: produzido pela autora, 2018


101

Figura 79 - Casa da sala barulhenta- opção 2- final aprovada

Fonte: produzido pela autora, 2018


102

6 CONSULTÓRIO DE ARQUITETURA: APONTAMENTOS PARA UM NEGÓCIO


DE ATENDIMENTO A DEMANDAS POPULARES

Nesse capítulo, foram analisadas as experiências adquiridas com os estudos


de métodos e os atendimentos a demandas populares de clientes reais aplicando o
El Metodo de Livingston (2009;2014) a partir de disciplina optativa no IFMG-SL. Em
seguida, a partir da capacitação feita em curso do SEBRAE, foram feitos
apontamentos para um negócio de arquitetura para atendimento de demandas
populares.

6.1 APRENDIZADOS ADQUIRIDOS

A partir da pesquisa de práticas arquitetônicas não convencionais vista no


capítulo 4, e a aplicação do El Metodo com clientes reais: disciplina optativa no
capítulo 5, apresenta-se uma análise crítica sobre os dados levantados. A pesquisa
das práticas arquitetônicas não convencionais aguçou uma curiosidade inicial:
existem negócios de arquitetura que atendem demandas populares? E como o
fazem?
Quanto à primeira pergunta, a partir dos estudos realizados, a resposta é sim,
porém em relação à segunda, a resposta não ficou muito clara. As fontes de
pesquisa e a disponibilidade de informações inviabilizaram certos entendimentos
sobre a forma de trabalho desses escritórios, modo de financiamentos e redução do
custo de mão de obra. Nos negócios sociais Moradigna e Vivenda, em especial, as
particularidades de funcionamento, dia a dia da empresa e métodos de
atendimentos não ficaram claros. Apesar de seus atendimentos serem pragmáticos
e funcionais, a experiência de negócio seria muito válida para o enriquecimento da
pesquisa.
Quanto às pesquisas Arquitetura na periferia de Mendonça (2014) e a
Arquitetos da família de Nogueira (2010;2013) foi possível avançar um pouco mais,
devido às informações dos procedimentos nas dissertações. O mesmo aconteceu
com o El metodo de Livingston (2009;2014), sua forma de trabalho e atendimento
estavam muito claras em seus livros e na dissertação de Nogueira (2010).
Abstraídas as realidades de cada experiência estudada, as lições que se
aprendem são que, para se atender demandas populares, é necessário assimilar os
103

desejos e necessidades dos clientes, desenvolver uma nova abordagem que inicie
uma relação de confiança entre arquiteto e clientes, usar instrumentos de
representações mais ágeis e que facilitem o entendimento do cliente, visando assim
menor tempo de trabalho e valores mais acessíveis, além de estabelecer regras
claras de cobrança de honorários e serviços.
A palavra "Cliente" usada em todas as experiências, exceto na "Arquitetura
na periferia" (MENDONÇA, 2014) que denomina as mulheres atendidas como
participantes, pode parecer um termo distanciador da relação de confiança que se
deseja. Porém, é um termo muito usual nas relações de comércio e prestação de
serviços populares, como salões de beleza, costureiras, manicures. Essas relações,
no entanto, não são apenas relações de consumo, mas de fidelidade ao serviço ou
produto de qualidade que esses profissionais oferecem. E o modo diferencial de
atendimento de cada um desses profissionais é o que garante a eles sua clientela
fiel.
Nos atendimentos realizados pelos estudantes na disciplina optativa, o termo
cliente também foi usado e as relações estabelecidas foram de parceria e
cooperação. Apesar do fato dos atendimentos não terem sido cobrados, foi possível
perceber por parte dos clientes um interesse em contratar novos serviços. No
entanto, não foi possível diagnosticar a real aceitação do preço, já que isso só seria
efetivamente comprovado quando os serviços fossem realmente cobrados.
Os atendimentos a clientes reais possibilitaram responder uma outra questão:
O El Metodo se aplica ao atendimento de demandas populares? Diante dos
resultados e produtos dos atendimentos a resposta é sim, com algumas
considerações. A falta de experiência do arquiteto nos exercícios de escuta pode
prejudicar a efetividade do método, pois, a perspicácia de seu sucesso está
justamente no saber ouvir, o restante do processo é apenas consequência.
A agilidade do arquiteto em relação à produção das variantes também é de
suma importância, pois, se o processo é demorado torna-se inviável. Nos
atendimentos foram usados vários tipos de instrumentos de desenho e
representações, que dependiam da agilidade de cada estudante. Cabe então a cada
profissional entender suas limitações e habilidades e usá-las a seu favor. No
entanto, isso não quer dizer que o El Metodo não careça de revisões de acordo com
a realidade de cada local. Como apontado pelos alunos da disciplina, existem
104

alguns entraves no processo que prejudicaram a agilidade dos atendimentos.


Exercícios de escuta com a mesma finalidade poderiam ser unificados,
Em relação à demanda popular, ficou claro que as necessidades vão além de
soluções funcionais, os clientes demandam questões que poderiam ser
classificadas como supérfluas ou desnecessárias, tais como áreas de lazer,
churrasqueiras e piscinas. No entanto, o bem-estar do ser humano está ligado à
realização de seus desejos e sonhos. Por isso, arquitetura popular deve ser
pensada para além das soluções dos problemas simplesmente técnicos e
funcionais. É possível realizar sonhos que poderiam ser caríssimos com a escolha
de materiais acessíveis.

6.2 DIRETRIZES DO NEGÓCIO A PARTIR DO TREINAMENTO BOOTCAMP

O Bootcamp Empreendedorismo em Ação é um curso de capacitação do


Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE) destinado a
quem busca começar ou redesenhar o modelo de negócio da empresa para crescer
no mercado e ao mesmo tempo desenvolver uma postura mais empreendedora. É
uma capacitação que utiliza ferramentas e técnicas para auxiliar na criação de
novos projetos, produtos, serviços e negócios.
Através de parceria entre o IFMG-SL e o SEBRAE, a autora do presente
trabalho participou da referida capacitação realizada nos dias 20 e 21 de setembro
de 2018 no Campus Santa Luzia. O curso abordou os seguintes temas: Mindset
Empreendedor, que tem por definição a configuração da mente empreendedora;
estudos sobre cliente e mercado; problema e solução; prototipagem e Mínimo
Produto Viável. Foram apresentados ainda canais de vendas e Modelos
Financeiros; o Lean Canvas ou "quadro de modelo de negócios" que é uma
ferramenta de gerenciamento estratégico que permite desenvolver e esboçar
modelos de negócio novos ou existentes; e a elaboração do "Pitch", que se trata de
uma apresentação sumária de 3 a 5 minutos com objetivo de despertar o interesse
da outra parte (investidor ou cliente) pelo seu negócio.
O objetivo inicial da autora em participar dessa capacitação foi se preparar
para possível implantação de escritório de arquitetura para atendimento de
demandas populares. No entanto, o conhecimento adquirido pode ser usado em
diversas outras experiências empreendedoras, é válido para a vida toda. As
105

considerações que se seguem só foram possíveis a partir do despertar que o curso


do SEBRAE proporcionou a autora para um negócio de atendimento diferenciado.
De acordo como o estudo preliminar do negócio feito durante o curso Bootcamp, foi
possível apontar diretrizes iniciais do negócio.
Em decorrência de pesquisas e experiências que abordaram demandas
populares para a melhoria do ambiente construído de moradias, chegou-se a
conclusão que o negócio proposto não será denominado de escritório de arquitetura
e sim "Consultório de Arquitetura", cuja versão preliminar do slogan de futura
divulgação pode ser vista na FIG. 80. O principal objetivo do negócio é o
atendimento de demandas populares por reformas, que tem como princípio
essencial a escuta do cliente, tratando-o de forma singular em seus anseios e
necessidades, tal como um paciente anseia em uma consulta a um médico de
família que lhe inspira confiança.
A partir da experiência com os atendimentos a clientes reais de bairros do
distrito São Benedito, os principais problemas a serem resolvidos pelo "Consultório"
são as reformas malsucedidas e intermináveis que geram gastos excessivos,
desperdício de material e má qualidade de vida. Para viabilizar a solução desses
problemas, pretende-se oferecer um plano ou projeto de reforma que possa ser
executado em etapas sem perda de qualidade, se diferenciando também na forma
de pagamento do projeto que também poderá ser fracionada.
Outro ponto importante a ser considerado, é a necessidade de se diferenciar
do mercado para viabilizar o negócio. Para isso, é preciso investir em propaganda,
fazer parcerias com o comércio local, sabendo-se que são nos depósitos de
materiais de construção locais que a maioria do público alvo faz suas compras.
Estabelecer uma rede de confiança entre a arquiteta, o comerciante, o pedreiro e o
cliente torna-se vital para o sucesso do empreendimento.
A proposta inicial é começar com pouco investimento, realizando os
atendimentos em espaço próprio, buscar parceiros na área administrativa, evitando-
se grandes riscos, fazer planos a curto e médio prazo e mudá-los sempre que
houver necessidade e definir perdas aceitáveis. A experiência a partir do Bootcamp
nos alerta para explorar várias possibilidades, já que uma única fonte de renda
deixa o negócio vulnerável. Nesse sentido, a médio prazo, a proposta é ofertar o
acompanhamento da obra pela arquiteta e formar uma equipe de pedreiros
associados com mão de obra qualificada.
106

Essas são apenas diretrizes iniciais para o plano de negócio a ser produzido
a partir dessa pesquisa, sendo que o "Consultório de Arquitetura” deverá investir em
pesquisas ininterruptas no campo da arquitetura, buscando sempre adotar soluções
técnicas que viabilizem projetos de qualidade e que sejam acessíveis à demanda
popular.

Figura 80 - Panfleto de divulgação do Consultório de Arquitetura Arquitodos

Fonte: produzido pela autora, 2018


107

7 CONCLUSÕES

Os problemas relacionados ao distanciamento entre arquitetos e demandas


populares são visíveis e palpáveis. Arquitetos sem trabalho, casas inacabadas e
sem qualidade, pessoas infelizes com suas não realizações. De acordo com os
estudos realizados, práticas arquitetônicas para atendimentos de demandas
populares ainda estão distantes da realidade das faculdades e dos escritórios de
arquitetura, e os métodos convencionais não atendem tais demandas, por isso é
preciso estudar métodos de abordagens não convencionais que supram essa
necessidade.
O objetivo principal dessa pesquisa foi estudar o El Metodo do Rodolfo
Livingston (LIVINGSTON,209;2014), aplicá-lo a demandas com clientes reais,
analisar a eficácia de sua aplicabilidade com a finalidade de ter parâmetros para a
criação de um negócio próprio nesse nicho. Através da pesquisa empírica da
disciplina optativa, puderam ser observados os efeitos e os resultados do El metodo,
ficando comprovado sua eficácia com algumas ressalvas.
A pesquisa empírica, juntamente com a capacitação do Bootcamp, trouxe a
oportunidade de entender as reais necessidades dos clientes, descobrir possíveis
falhas de abordagem e da aplicação do método, como a repetição de exercícios de
escuta de forma desnecessária, sendo possível assim desenvolver, a partir desses
resultados, uma forma específica para a realidade local, entender o mercado e o
público a que se destina o Consultório de Arquitetura.
A viabilidade de negócio de arquitetura para demandas populares não pôde
ser certificada precisamente nessa pesquisa, porém, a demanda existe e não há
profissionais que a atendam, sendo assim, há um vasto mercado a ser explorado
por profissionais que compreendam a necessidade de se adaptar a esse novo modo
de atendimentos e projetos. Promover a aproximação desses clientes com
profissionais habilitados é estabelecer uma relação de confiança entre ambos, por
isso a metodologia de abordagem deve receber maior atenção nesse processo de
aprendizado.
Preparar os estudantes ainda na graduação de arquitetura para atender a tais
demandas, evitaria as incompatibilidades entre arquitetos e demandas populares. A
aplicação do El Metodo a partir da disciplina optativa com estudantes em diversos
períodos da graduação comprovou que é possível e necessário promover essa
108

aproximação ainda na faculdade, formando um profissional muito mais preparado


para o mercado.
Os resultados obtidos nessa pesquisa são de grande relevância para o
campo da arquitetura, tendo em vista sua real necessidade, e é certo que o tema
carece ser aprofundado, tendo em vista suas implicações e importância acadêmica
e social.
109

REFERÊNCIAS

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VIVENDA. Programa Vivenda: A mudança vem de dentro. Disponível em:


<http://programavivenda.com.br>. Acesso em: 3 dez. 2018.
113

APÊNDICE A — Memórias da autoconstrução

Primeira Experiência
Lembrança é um negócio engraçado, às vezes se confunde com o que te
contaram sobre você ou com você, então você não sabe se são realmente suas
lembranças ou lembranças do que te contaram a seu respeito. Minha primeira
lembrança com a construção foi quando eu tinha apenas 4 anos de idade. Meu avô
materno, carpinteiro, pedreiro, entre outras coisas mais, estava nivelando o forro da
laje da nova casa, e, sem outra pessoa que o auxiliasse, lá estava eu à disposição.
Subi a escada e minha função era avisar quando o forro estivesse nivelado,
enquanto ele lá debaixo iria colocando os calços necessários. À cada cunha
colocada, ele fazia a pergunta se já estava bom, e a resposta era ligeira: “só mais
um pouquinho”. Por fim, ao averiguar o trabalho, meu avô se deparou com o forro
totalmente acima do nível desejado. Esse é um dos casos nas rodas de conversa
em família que por vezes se repete.

Sempre em mutirão

Poder contar com a ajuda da família e dos amigos é algo incomparável.


Ajudar, contribuir e produzir o próprio espaço onde se abrigar sempre foi algo
natural em minha família. Meu pai aprendeu o ofício de pedreiro com meu avô e em
tantos empregos que trabalhou na construção civil. No entanto, ele acabou trilhando
outros caminhos que a vida lhe ofereceu, sem nunca, porém, deixar de construir e
reformar sua própria casa.
Quando por fim pudemos adquirir um lote, após oito anos morando de
aluguel, a construção foi feita em mutirão familiar. Lembro-me muito bem de todo o
movimento. Eu já tinha meus oito anos de idade, com muito mais experiência que
no caso anterior, diga-se de passagem. A construção foi erguida em trinta dias
corridos, pois, precisávamos desocupar a casa que morávamos de aluguel. Para
diminuir os custos da construção, meu pai comprou um milheiro de tijolos de uma
obra próxima, que foram transportados no carrinho de mão por ele mesmo. À
tardezinha, assim que chegava do trabalho, lá estavam minhas duas irmãs mais
novas e eu ajudando nosso pai no transporte, subindo e descendo tijolos do
114

carrinho, brincando e aproveitando o tempo e o caminho na presença uns dos


outros.

Essa casa que construímos em mutirão é a mesma que moram meus pais até
hoje. Lá eu cresci e comigo também cresceu a casa. Tudo começou com apenas
dois cômodos com paredes sem acabamento, telhado de amianto e um banheiro
improvisado. Aos poucos a casa ganhou mais paredes e as paredes ganharam
reboco e o reboco ganhou tinta, o telhado de amianto transformou-se em laje. E as
reformas foram muitas, tantas que se perdem na memória, mas um fato marcou
uma dessas. Sabe aquele desejo de adolescente de sempre querer algo novo,
diferente? Em um belo dia, minhas irmãs e eu decidimos, com o apoio de nossa
mãe, pintar as paredes, queríamos uma casa colorida como a de todos os colegas
(a nossa casa ainda era apenas rebocada). Fomos até o depósito e compramos cal
e xadrez vermelho e passamos nas paredes da casa com uma brocha. A coloração
ficou próximo de uma rosa bebê, lindo (para os nossos conceitos). Foi um dia
115

divertido e cansativo, mas o resultado foi perfeito, a satisfação de executar algo com
as próprias mãos foi um sentimento maravilhoso. Não sei se este sentimento que
nos alegrava pode se comparado com a surpresa que teve meu pai quando chegou
do trabalho e encontrou nossa casa totalmente cor de rosa. Chocado com o
resultado, superado o susto, ele nos deu parabéns pelo trabalho e iniciativa. Mesmo
assim, algum tempo depois, tratou ele de comprar tinta branca e cobrir aquele tom
de rosa totalmente audacioso. Talvez não tivesse gostado tanto!

Os “Natais”

Quando a gente pensa em Natal, sempre vem à nossa mente uma imagem
bonita de uma mesa muito bem arrumada com muita comida gostosa, uma bela
árvore de natal, rodeada de presentes. Os natais lá em casa sempre foram um
pouco diferentes. Novembro e dezembro sempre foram os meses preferidos para
fazer as reformas e melhorias na casa, pois era quando o dinheiro sobrava um
pouquinho. Geralmente as obras se prolongavam durante todo o mês de dezembro,
tornando-se impossível uma bela “arrumação” na data natalina. Em um desses
natais chovia muito, e, como estávamos rebocando a sala e assentando o piso
cerâmico, tínhamos apenas uma pequena varanda de mais um menos uns três
metros quadrados que abrigava um tanque. Como gostamos muito mais de um bom
churrasco que de uma ceia de natal, nos reunimos, então, na sala em obras, entre
os sacos de cimento, acendemos a churrasqueira e celebramos entre família, como
fazíamos sempre.

Celebrar

Durante um período de nossas vidas, percebi que as obras e reformas


haviam diminuído, os acréscimos haviam cessado, ainda morávamos em apenas
quatro cômodos, dois quartos, sala, cozinha, banheiro e uma pequena varanda.
Durante muito tempo ficou no quintal uma laje pré-fabricada que seria para cobrir a
casa que ainda era de amianto e que se deteriorou com tempo.
Eu era muito jovem e não me inteirava muito dos assuntos financeiros da
família, meu pai sempre foi o administrador financeiro. Só depois de muitos anos fui
entender essa grande pausa nas reformas. Quando fiz meus quinze anos meus pais
116

me presentearam com uma bela festa, nada se comparado a esses grandes


eventos de hoje, mas para mim foi algo grandioso. Meus pais sempre foram muito
justos no tratamento com as filhas, sempre quiseram oferecer o mesmo para todas
igualmente. Tenho duas irmãs mais novas, com diferença pouca de idade, então
foram praticamente três festas de quinze anos em um curto espaço de tempo. As
obras deram lugar à celebração da vida.

Um sonho

Não sei bem quando esse sonho começou, eu devia ter meus dezesseis ou
dezessete anos, me encantava os telhados das mansões da Pampulha, suas
formas e desenhos me faziam sonhar. Entre os parentes e amigos eu sempre
repetia que um dia eu teria uma casa com um telhado igual a um daqueles, cheguei
a criar um apelido para tais telhados: “telhados repicados” (telhados com várias
águas).
Me casei com vinte e um anos e minha casa também foi construída em forma
de mutirão. Meu marido (embora não exercesse a profissão) aprendeu o ofício de
pedreiro com seu pai, juntamente com seus irmãos. Assim, com a ajuda de seu pai
e irmãos, além do meu pai, meu avô e alguns amigos, a casa foi erguida em um
ano. Os acabamentos internos foram concluídos também nesse período, além de
uma ampla varanda, restando apenas os acabamentos externos, que foram feitos
aos poucos ao longo dos anos.

E os anos passam muito rápido, mas o sonho do “telhado repicado” não. O


desejo continuava. A casa era coberta apenas com laje, e isso trouxe muitos
problemas. Depois de alguns anos, conseguimos um empréstimo na CAIXA,
destinado a reformas e com juros baixos. Mas o valor do empréstimo não era o
suficiente para comprar o material e pagar a mão de obra. Meu marido já havia
trabalhado como carpinteiro e, com algumas orientações do meu avô, decidimos
fazer nós mesmos o telhado. E fizemos juntos durante as férias, ele e eu, com a
ajuda dos pais, irmãos, cunhados e amigos. Foram oito mil telhas erguidas uma a
uma, de mão em mão, e o sonho foi ganhando forma, e o desejo transformou-se em
realidade. A casa ainda não está totalmente pronta, a família cresceu, temos dois
117

filhos atualmente com treze e sete anos de idade, o que nos fez trocar, por vezes,
as obras para a celebração da vida.
Os planos continuam vivos, e descobri, ao longo dos anos, a importância de
realizá-los, ainda que eles mudem com o tempo. Tenho um caderninho onde anoto
todas as reformas que planejo fazer e, quando percebo que várias etapas já foram
executadas, a satisfação é imensa. Percebo que, mesmo a passos lentos, estamos
caminhando.
118

APÊNDICE B — Manual de Instruções da Casa da Porta Sem Saída


119
120
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122
123
124
125
126
127

ANEXO A – Plano de Ensino da Disciplina Optativa IFMG-SL

PLANO DE ENSINO DE DISCIPLINA


Professor (a): Roxane Sidney R. de Mendonça
Curso: Bacharelado em Disciplina: Prática arquitetônica:
estudo de método para demandas
Arquitetura e Urbanismo populares
Carga Horária Semestral: 30
Nº Aulas Semanais: 1
horas
Semestre:
Turno: Noturno (18:30 às 20:45)
2018-2

EMENTA

Estudo do “EL MÉTODO”, do arquiteto argentino Rodolfo Livingston. Estudo e aplicação


de método voltado para o atendimento de famílias de média a baixa renda, público
geralmente sem acesso a serviços de profissionais de arquitetura. Desenvolvimento
individual ou em duplas de projetos de reformas de casas ou outros espaços de pequena
escala para atender demandas reais da região do São Benedito, Santa Luzia. Resolução de
problemas tendo em vista aspectos de diversidades sócio-culturais e ambientais. Análise
crítica do resultado.

OBJETIVOS GERAIS E ESPECÍFICOS


Instrumentalizar o aluno para que ele seja capaz de interpretar uma situação real com
questões práticas e ampliar o conhecimento acerca da produção do espaço cotidiano;
interpretar demandas de clientes diversos e estudar a melhor forma de se comunicar e
apresentar propostas; avaliar situações espaciais e construtivas instaladas com proposição de
melhorias; dimensionar o tempo de trabalho. Analisar e criticar o método aplicado. Fornecer
dados, produzidos durante a disciplina, para produção de Trabalho de Conclusão de Curso
de Arquitetura e Urbanismo da aluna Celeste Maria Leal Oliveira que também participará
da disciplina.

METODOLOGIA DE ENSINO
O programa será desenvolvido através de aulas expositivas, seminários com a participação
dos alunos e dinâmicas de atendimento de demandas reais da comunidade local. São
previstas orientações participativas em grupo e individuais para o seu desenvolvimento. A
atividade avaliativa principal é o desenvolvimento de projeto através da construção do
manual de instruções para atender as demandas e a confecção de pasta catálogo com os
registros de todo o processo.

RECURSOS DIDÁTICOS
Apresentação oral; Aulas expositivas com uso de multimídia; Seminários de alunos;
Debates sobre
leituras sugeridas pelo professor; Visitas aos locais correspondentes ao tema; Orientações
em grupo ou individuais.

PROCEDIMENTOS DE AVALIAÇÃO
A avaliação da disciplina será feita a partir de cinco trabalhos descritos a seguir:
● TP01 - Seminário. Grupo (15 pts)
128

● TP02 - Orientações do processo de produção do Manual de instruções. Grupo (25 pts)


● TP03 - Pasta catálogo. Dupla (30 ptos)
● TP04 - Entrega do Manual de instruções e relatório crítico. Dupla (30 pts)

Exigência mínima para aprovação: média de 60 em 100 pontos, e frequência mínima de 75% da carga horária
da disciplina.

RECUPERAÇÃO

Não estão previstas atividades de recuperação para esta disciplina

CONTEÚDO PROGRAMÁTICO

UNIDADE I – Seminários

1.1. Arquiteto sempre tem conceito, esse é o problema (KAPP et al).


1.2. El Metodo (Rodolfo Livingston).
1.3. Cirurgia de Casas (Rodolfo Livingston).

UNIDADE II – Estudo e aplicação do Método Arquitetos de Família

2.1. Arquitetura para demandas populares. Casos existentes (Moradigna, Vivenda,


Arquitetura na periferia, Arquitetos de família/UFMG).
2.2. Estudo dos aspectos sócio-culturais e ambientais do distrito de São Benedito, Santa
Luzia.
2.3. Processo participativo (estudo e aplicação do método): pré-entrevista, entrevista,
elaboração de opções, discussões de opções com o cliente e ajustes finais.
2.4 Análise crítica das demandas do cliente e das soluções propostas.

UNIDADE III – Produção da pasta catálogo e Manual de instruções

3.1 Organização das informações e produção da pasta catálogo.


3.2 Elaboração do Manual de Instruções.
3.3 Análise crítica da aplicação do método para atender clientes no distrito de São
Benedito, Santa Luzia.

BIBLIOGRAFIA BÁSICA
ARANTES, Pedro Fiori. A Arquitetura Nova. 1. ed. São Paulo: Copyright © Editora 34
Ltda., v. 1, 2002. 256 p.
BOURDIEU, Pierre. A distinção: crítica social do julgamento. 2. ed. rev. Porto Alegre:
Zouk, 2006. 556 p.
WEIMER, Günter. Arquitetura popular brasileira. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2012.
333 p.
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BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR
LIVINGSTON, Rodolfo. Cirugia de Casas. Buenos Aires: Nobuko, 2003. (Download
gratuito em: http:// www.estudiolivingston.com.ar/cirugia/index.php)
LIVINGSTON, Rodolfo. Arquitectos de Familia. Buenos Aires: Nobuko, 2006.
KAPP, Silke; NOGUEIRA, Priscilla Silva; BALTAZAR, Ana Paula. “‘Arquiteto sempre
tem conceito - esse é o problema’”. Seminário Projetar 2009, São Paulo, 2009.

CRONOGRAMA DE ENSINO DE DISCIPLINA


Aula Data Conteúdo Pts.
Apresentação da Disciplina
Plano de Ensino/Cronograma
01 a 03 07/08
Lançamentos dos textos para Seminário
Escolha do Cliente (Pré-entrevista)
Seminários: Discussão dos textos
04 a 06 21/08
Apresentação do Cliente/ Pré-entrevista
15
Seminários: Discussão dos textos
07 a 09 28/08
Apresentação do Cliente/ Pré-entrevista
10 a 12 04/09 Discussão Entrevistas (Orientações)
13 a 15 11/09 Discussão Visitas (Orientações)
16 a 18 18/09 Discussão Elaboração de opções (Orientações)
25
19 a 21 25/09 Discussão de opções com o cliente, ajustes finais (Orientações)
22 a 24 02/10 Elaboração do Manual de instruções (Orientações)
25 a 27 09/10 Elaboração do Manual de instruções (Orientações)
Semana da Ciência e Tecnologia - Apresentação de Pasta
28 a 30 16/10 30
catálogo
31 a 33 23/10 Elaboração do Manual de instruções (Orientações)
34 a 36 30/10 Elaboração do Manual de instruções (Orientações)
Entrega Final - Manual de Instruções
37 a 39 06/11 30
Relatório avaliativo do método para demandas populares
40 13/11 Finalização e análise crítica da Disciplina e entrega de notas
130

ANEXO B - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Você está sendo convidado(a) como voluntário(a) a participar da pesquisa:


Prática Arquitetônica: estudo de método para demandas populares

A JUSTIFICATIVA, OS OBJETIVOS E OS PROCEDIMENTOS: O motivo


que nos leva a estudar o problema é alta demanda de serviços para arquitetura nas
classes populares e a não contratação de arquitetos para tais serviços. A pesquisa
se justifica pela falta de conhecimento da população a respeito das habilidades de
um arquiteto. O objetivo desse projeto é estudar um método que aproxime a
demanda de serviços ao arquiteto de forma eficiente e economicamente possível.
O(s) procedimento(s) de coleta de dados serão da seguinte forma: através de
entrevistas e conversas.

RISCOS: O produto final desta pesquisa será um projeto arquitetônico em


formato de Manual de Instruções que será produzido por estudantes com orientação
de professor, sendo que para executá-lo, o proprietário da edificação deverá
procurar por um profissional habilitado.

GARANTIA DE ESCLARECIMENTO, LIBERDADE DE RECUSA E


GARANTIA DE SIGILO: Você será esclarecido(a) sobre a pesquisa em qualquer
aspecto que desejar. Você é livre para recusar-se a participar, retirar seu
consentimento ou interromper a participação a qualquer momento. A sua
participação é voluntária e a recusa em participar não irá acarretar qualquer
penalidade.
O(s) pesquisador(es) irá(ão) tratar a sua identidade com padrões
profissionais de sigilo. Seu nome ou o material que indique a sua participação não
será liberado sem a sua permissão. Você não será identificado(a) em nenhuma
publicação que possa resultar deste estudo. Uma cópia deste consentimento
informado será arquivada na coordenação do Curso Arquitetura e Urbanismo do
IFMG- SL e outra será fornecida a você.
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CUSTOS DA PARTICIPAÇÃO, RESSARCIMENTO E INDENIZAÇÃO POR


EVENTUAIS DANOS: A participação no estudo não acarretará custos para você e
não será disponível nenhuma compensação financeira adicional.
Em caso de dúvidas poderei chamar a estudante Celeste Maria Leal Oliveira
ou a professora orientadora Roxane Sidney Resende de Mendonça ou o professor
co-orientador(a) Breno Luiz Thadeu da Silva no email: roxane.resende@ifmg.edu.br
ou telefone (31)3634-3910.

Declaro que concordo em participar desse estudo. Recebi uma cópia deste
termo de consentimento livre e esclarecido e me foi dada a oportunidade de ler e
esclarecer as minhas dúvidas.

______________________________________________________________
Nome Assinatura do Participante
Data

______________________________________________________________
Nome Assinatura do Pesquisador
Data
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ANEXO C - Roteiro de Trabalho


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ANEXO D — Manual de Instruções da casa dos estudantes


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