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O pensamento hebraico comparado ao grego

Para entender melhor a Bíblia

Adotar uma perspectiva hebraica das Escrituras ajuda a entender o pensamento dos autores
bíblicos?

Na Antiguidade, dentre as várias cosmovisões existentes, duas, em especial, se destacavam.


Grécia e Israel tinham modos bem distintos de pensar. É preciso admitir que os gregos
deixaram uma herança muito rica para o Ocidente, nas artes, na ciência e na cultura. Sem eles,
não seríamos o que somos hoje. No entanto, do ponto de vista religioso, a influência grega
trouxe mais problemas do que vantagens. Se hoje temos tanta dificuldade para entender a
Bíblia, em grande parte, isso se deve à nossa mente “helenizada” (é preciso lembrar que os
autores bíblicos eram, em sua maioria, hebreus e que até o Novo Testamento, escrito em
grego, reflete o modo hebraico de pensar). Daí a importância de entender mais a fundo a
mentalidade hebraica antiga.

O objetivo deste artigo é relacionar, de modo sucinto, algumas das principais nuances do
pensamento hebraico, comparando-as ao pensamento grego, que, via de regra, é também o
pensamento ocidental.

Vale lembrar que nem todos os gregos e hebreus pensavam de maneira idêntica. Havia, dentro
de cada cultura, diferentes ramificações quanto à religião e à filosofia. As características abaixo
representam cada modo pensar de forma geral, sem levar em consideração as diferentes
subdivisões.

Concreto x abstrato

No idioma hebraico antigo (língua predominante do Antigo Testamento), ao contrário do


grego, as ideias eram muito mais concretas do que abstratas. Até conceitos abstratos, como os
sentimentos, costumavam ser associados a algo concreto.

Em hebraico, a palavra “ira” ou “raiva”, por exemplo, é ’af (Êx 4:14), a mesma que é usada para
“nariz” ou “narinas” (Jó 40:24). Mas o que tem que ver nariz com raiva? Geralmente, quem fica
com muita raiva respira de modo acelerado, e as narinas se dilatam. Talvez esse seja o motivo
concreto por trás da relação entre as duas palavras.
Outro exemplo desse concretismo hebraico é a palavra “fé”, ’emunah (Hc 2:4), que em vez de
significar apenas crença ou aceitação mental – como no grego –, expressa também qualidades
como firmeza, fidelidade e estabilidade. Ter fé, na visão hebraica, é se firmar em Deus, como
uma estaca fincada no chão (ver Is 22:23, onde “firme” vem do verbo’aman, a mesma raiz
de ’emunah). Portanto, crer, do ponto de vista bíblico-hebraico, inclui também a ideia de se
apegar a Deus e ser fiel.

Dinamismo x ócio

Na Grécia antiga, dava-se mais valor à falta de ocupação do que ao trabalho, principalmente
entre os atenienses. Não ter que trabalhar e se dedicar apenas à contemplação e ao mundo
das ideias era considerada a mais nobre das “atividades”. Já os hebreus eram um povo
extremamente dinâmico e seu idioma refletia isso.

No português, como em outras línguas, o sujeito vem em primeiro lugar na frase, e o verbo,
geralmente, é colocado logo em seguida. Exemplo: “Antônio obedeceu a seu pai.” Em
hebraico, a ordem das palavras ficaria assim: “Obedeceu Antônio a seu pai.” Isso mostra o
valor das ações para os hebreus.

Até substantivos que, para nós, não implicam necessariamente uma ação, para eles envolviam
algum movimento. A palavra “presente” (ou “bênção”), berakah em hebraico (Gn 33:11), por
exemplo, vem da raiz brk (“ajoelhar”), e significa “aquilo que se dá com o joelho dobrado”,
fazendo referência ao costume de inclinar o corpo ao presentear alguém. A palavra
“joelho”, berek (Is 45:23), por sua vez, significa, literalmente, “a parte do corpo que se dobra”.

O conceito hebraico de comunhão – “andar com Deus” (Gn 6:9; Mq 6:8) – também envolve
movimento e significa manter um relacionamento constante com Ele. E a palavra
“júbilo”,rwa‘ ou ranan (Sl 100:1; 149:5), significa “dar um grito retumbante de alegria”.

Para os hebreus, havia uma íntima relação entre aquilo que se fala e o que se faz. Entendia-se
que a palavra de um homem deve corresponder às suas ações. Aliás, “palavra”, em hebraico,
significa também “coisa” ou “ação”, dabar. Logo, dizer algo e não agir de acordo implicava
mentira, falsidade.

Essência x aparência

Os gregos descreviam os objetos em relação à sua aparência. Os hebreus, ao contrário,


consideravam mais a essência e função das coisas. Exemplo: Se nos mostrassem um lápis e nos
pedissem para descrevê-lo, como seria nossa descrição? Provavelmente, diríamos: “O lápis é
azul”, ou “é amarelo”; “tem ponta fina”, ou não; “é cilíndrico”, ou “é retangular”; “é curto”, ou
“é comprido”; etc. Note que em todas essas características a ênfase está na aparência.

Um hebreu descreveria o mesmo lápis de forma bem mais simples e objetiva: “É feito de
madeira, e eu escrevo palavras com isto.” Na cosmovisão hebraica, a essência das coisas e sua
função eram mais importantes que a forma ou a aparência.

Por isso, os elogios de Salomão à sua amada no livro de Cantares parecem tão estranhos para
nós, ocidentais. Dizer a uma mulher: “O teu ventre é [um] monte de trigo” (Ct 7:2) pode não
soar bem hoje em dia. Mas, na cultura da época, a imagem do trigo trazia a ideia de fertilidade
e fartura (função e essência), e ter muitos filhos era o sonho de toda mulher.

Outro exemplo é a descrição feita sobre a arca de Noé e o tabernáculo do Antigo Testamento
(Gn 6:14-16; Êx 25-28). Qualquer um que lê o que a Bíblia diz a respeito dessas construções
nota que há muito mais detalhes sobre a estrutura e os materiais empregados na confecção do
que em relação à sua aparência.

Além de funcional e essencial, o estilo de descrição dos hebreus era também pessoal – o
objeto era descrito de acordo com a relação dele com a pessoa. Ao descrever um dia
ensolarado, em vez de dizer: “O dia está lindo”, um hebreu diria: “O sol aquece meu rosto!”
Daí a descrição de Davi: “O Senhor é o meu pastor” (Sl 23:1).

Teoria x prática

Na cosmovisão grega, “saber” era mais importante do que “ser”. Para os gregos, sabedoria era
o resultado sobretudo do estudo, da contemplação e do raciocínio. O conhecimento era
essencialmente teórico, limitado ao mundo das ideias, e o mais importante era conhecer a si
mesmo.

Para os hebreus, no entanto, o conhecimento era essencialmente prático. Conhecer era,


principalmente, experimentar, se envolver com o objeto de estudo. O conhecimento de Deus
era o mais importante, e a verdadeira sabedoria estava em saber ouvir, especialmente a Ele –
“Ouve, ó Israel [...]” (Dt 6:4). Na mentalidade hebraica, “temer a Deus” é o primeiro passo para
ser sábio (Sl 111:10; Pv 1:7).

Tempo x espaço
Quando queremos incentivar alguém a prosseguir, dizemos: “Bola pra frente!”, e quando
queremos dizer que algo ficou no passado, falamos: “Ficou para trás.” Mas quem nos ensinou
que o futuro está à nossa frente e o passado atrás? Possivelmente, os gregos. Eles tinham uma
visão espacial do tempo, e nós herdamos isso.

Os hebreus (que valorizavam mais o tempo do que o espaço) enxergavam passado e futuro de
modo diferente. Para eles, mais importante do que localizar o tempo de forma espacial era
defini-lo em ações completas e incompletas (aliás, “completo” e “incompleto” são os nomes
que se dá aos tempos verbais do hebraico).

Na mentalidade hebraica antiga, o passado (tempo completo) estava à frente (as


palavrastemol e qedem, “ontem” ou “antigamente”, significam também “em frente”), e o
futuro (tempo incompleto) estava atrás – mahar, “amanhã” ou “no futuro”, vem da raiz ’ahar,
que significa, entre outras coisas, “ficar atrás”, ou “para trás”. (Veja Êx 5:14; Jó 29:2; Êx 13:14 e
Dt 6:20.)

E por que eles entendiam o tempo assim? O pensamento hebraico era simples e direto. O
passado já foi completado, por isso podemos olhar para ele como se estivesse diante dos
nossos olhos. O futuro, porém, ainda está indefinido, incompleto, por isso, ainda é
desconhecido e é como se estivéssemos de costas para ele.

História cíclica x linear

Os gregos viam o curso da história como uma espécie de roda gigante. Para eles, a história se
repetia eternamente, num eterno vai e vem sem destino.

Para os hebreus, no entanto, a história era linear e climática. Deus foi quem a iniciou (Gn 1:1),
e é Ele quem faz com que ela prossiga para um fim, um clímax, o chamado “Dia do Senhor”
(yom Yahweh; Sf 1:7, 14; Jl 2:1; 2Pe 3:10). Mas essa descontinuidade da história será apenas o
começo da eternidade (‘olam; Dn 12:2).

Deus x “eu”

Na cosmovisão grega, o “eu” (ego) era o centro de tudo. Diz a lenda que à entrada do Oráculo
de Delfos, na Grécia Antiga, havia a frase “Conhece-te a ti mesmo”. Na cultura hebraica, por
outro lado, Deus era o centro de todas as coisas. Os hebreus não dividiam a vida, como nós
fazemos, em sagrada e secular. Para eles, essas duas áreas eram uma coisa só, sob o domínio
de Deus.
Até mesmo as tarefas do dia a dia eram consideradas, de certa forma, sagradas. A palavra
hebraica ‘abad – “servir” ou “adorar” (Sl 100:2) – pode ser também traduzida como
“trabalhar”. Na lavoura, na escola ou no templo, a vida era vista como um constante ato de
adoração (1Co 10:31; Cl 3:2; 1Ts 5:17). Para eles, a adoração era mais do que um evento, era
um estilo de vida.

Pensamento corporativo x individualismo

Os gregos consideravam a individualidade um valor supremo e praticamente inegociável. Os


hebreus, por sua vez, tinham uma “personalidade corporativa” e enfatizavam a vida em
comunidade. Na cosmovisão hebraica, havia uma ligação inseparável entre o indivíduo e o
grupo. A vitória de um era a vitória de todos, e o fracasso de um representava o de todos. Por
isso, para os cristãos, se, por um lado, a falha de Adão lá no Éden representou nossa queda,
por outro lado, a morte de Cristo na cruz dá a todos a oportunidade de salvação (1Co 15:22; Jo
3:16).

Amor: decisão x emoção

No mundo grego, o amor, em suas várias formas, se resumia muitas vezes a um mero
sentimento. Na visão hebraica, porém, amor é mais que isso: é uma escolha (em Ml 1:2, 3 e
Rm 9:13, “amar” e “odiar” são sinônimos de “escolher” e “rejeitar”). É algo prático, traduzido
em ações – a Deus e ao próximo (Mt 22:35-40).

Paz: presença x ausência

No pensamento ocidental, paz depende das circunstâncias. É a ausência de guerras, problemas


e perturbações. Mas para os hebreus, paz não implicava, necessariamente, ausência, e sim
presença. Só a presença de Deus pode trazer bem-estar, segurança e felicidade – que são
ideias contidas na palavra shalom (Jz 6:24).

Integral x dualista

Os gregos tinham uma visão dualista da realidade. Com base nos ensinamentos de Platão,
acreditavam que havia dois mundos: o das ideias (ou do espírito) e o mundo real. De acordo
com essa visão, o ser humano era formado por duas partes: espírito (ou alma) e corpo. Para
eles, o corpo e as coisas materiais eram ruins, e apenas o “espírito” e as coisas do “além”
podiam ser considerados bons. Assim, a morte, na verdade, seria a libertação da alma, que,
enquanto estivesse no corpo, estaria presa ao mundo material.
Já os hebreus tinham uma visão integral da vida. Para eles, o ser humano era completo,
indivisível. Na mentalidade hebraica, alma se refere ao indivíduo como um todo (corpo, mente
e emoções). De acordo com Gênesis 2:7, nós não temos uma alma, nós somos uma alma, ou
seja, seres vivos (nefesh hayyah, em hebraico). Ao contrário dos gregos, que criam na
imortalidade do espírito, os hebreus acreditavam na mortalidade da alma e na ressurreição (Ez
18:4; Dn 12:1, 2).

Espiritualidade x misticismo

Para os gregos, espiritualidade era algo místico. Ser espiritual significava desprezar totalmente
a matéria e se conectar ao “outro mundo”. Esse desprezo das coisas materiais variava entre
dois extremos. Alguns, por exemplo, renunciavam completamente os prazeres físicos, tais
como a alimentação e o sexo, a ponto de mutilar seus órgãos genitais. Outros, por outro lado,
se entregavam a todo tipo de sensualidade e orgia. Ambos os comportamentos tinham como
base a ideia de que o corpo é mau, e que, no fim das contas, o que importa mesmo é a “alma”.

Mas para a cosmovisão hebraica, o corpo foi criado por Deus, e por isso é sagrado. A Bíblia diz
que “do Senhor é a Terra” (Sl 24:1). E enquanto criava o mundo, Deus viu que este “era bom”
(Gn 1:10, 12, 18, 21) – e não mau, como acreditavam os gregos. Deus fez o mundo (as coisas
materiais), e deu ao ser humano a responsabilidade de cuidar dele.

Para os hebreus, portanto, espiritualidade tinha que ver, sim, com esta vida. Na cosmovisão
bíblica, não é preciso se isolar em um monastério, recorrer à meditação transcendental ou
entrar num estado de transe para atingir “o mundo superior”. É possível ser “santo” e
desenvolver a espiritualidade no dia a dia, nas situações comuns da vida e no trato diário com
as pessoas (Lv 20:7; 1Pe 1:16).

Conclusão

Embora devamos muito aos gregos como herdeiros de sua cultura, é fundamental que
adotemos uma perspectiva hebraica ao estudar as Escrituras, a fim de que nossa hermenêutica
se aproxime ao máximo do modo de pensar dos autores bíblicos, bem como do sentido
original do texto.

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