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CURITIBA
2008
AS REPRESENTAÇÕES VISUAIS DA CRIANÇA NA IMPRENSA
UMA ANÁLISE DOS JORNAIS
FOLHA DE S. PAULO E O ESTADO DE S. PAULO
CURITIBA
2008
Angela Maria Farah
CURITIBA
2008
TERMO DE APROVAÇÃO
Esta dissertação foi julgada e aprovada para a obtenção do título de Mestre em Comunicação e
Linguagens, no Curso de Mestrado em Comunicação em Linguagens, da Faculdade de Ciências
Sociais Aplicadas, da Universidade Tuiuti do Paraná.
__________________________________
e adormecer as crianças.
comunicação, é a significação.
Roland Barthes
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 11
2 CRIANÇA, SOCIEDADE E IMPRENSA ................................................................ 18
2.1 A INVENÇÃO DA INFÂNCIA: A CONSTRUÇÃO DE UM CONCEITO................ 19
2.2 JORNAL, INFÂNCIA E SOCIEDADE: A CONSTRUÇÃO DA CULTURA ............ 25
2.3 A INVENÇÃO DA REALIDADE: CONFIGURAÇÕES DO JORNALISMO E DO
FOTOJORNALISMO ................................................................................................. 29
2.4 UMA INVENÇÃO PARA OS OLHOS E A CONSTRUÇÃO DE UMA “ÉTICA DO
VER” .......................................................................................................................... 37
2.4.1 A constituição de uma “ética do ver” ................................................................ 41
3 A RELAÇÃO ENTRE VERBAL E NÃO-VERBAL NO JORNAL IMPRESSO ....... 52
3.1 FORMA E SENTIDO NO JORNAL IMPRESSO: O CONJUNTO DA
SIGNIFICAÇÃO ......................................................................................................... 59
3.1.1 Os princípios do design de imprensa ............................................................... 61
3.1.2. A adaptação da informação textual (verbal e não-verbal) ao projeto gráfico... 65
3.1.3 Elementos gráficos-imagéticos que “gerenciam o nível de atenção” do leitor .. 69
3.1.4 O modo de leitura do homem do Ocidente e a valorização da imagem ........... 74
4 AS REPRESENTAÇÕES VISUAIS DA CRIANÇA NA IMPRENSA: ANÁLISE DO
CORPUS ................................................................................................................... 79
4.1 A SELEÇÃO DOS JORNAIS IMPRESSOS ......................................................... 79
4.1.1 Folha de S. Paulo ............................................................................................. 80
4.1.2 O Estado de S. Paulo ....................................................................................... 82
4.2 ANCORAGEM E COMPLEMENTARIDADE NO JORNAL IMPRESSO: UMA
PROPOSTA DE PESQUISA ..................................................................................... 85
4.2.1 Como a imagem da criança “ilustra” o texto verbal no jornal ............................ 87
4.3 PROPOSTA DE CATEGORIZAÇÃO DO CORPUS ............................................ 92
4.4 CATEGORIA 1 – VIOLÊNCIA ............................................................................. 99
4.4.1 Violência de Guerra .......................................................................................... 99
MATÉRIA 1 ............................................................................................................... 99
MATÉRIA 2 ............................................................................................................. 111
4.4.2 Violência Econômica ...................................................................................... 125
MATÉRIA 3 ............................................................................................................. 125
MATÉRIA 4 ............................................................................................................. 134
4.4.3 Violência Urbana ............................................................................................ 140
MATÉRIA 5 ............................................................................................................. 140
MATÉRIA 6 ............................................................................................................. 146
4.5 CATEGORIA 2 – POLÍTICA .............................................................................. 151
MATÉRIA 7 ............................................................................................................. 151
MATÉRIA 8 ............................................................................................................. 156
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................. 160
6 REFERÊNCIAS .................................................................................................... 168
7 OBRAS CONSULTADAS .................................................................................... 175
8 ANEXO A – CATEGORIA VIOLÊNCIA DE GUERRA ......................................... 177
9 ANEXO B – CATEGORIA VIOLÊNCIA ECONÔMICA ........................................ 180
10 ANEXO C – CATEGORIA VIOLÊNCIA URBANA ............................................. 183
11 ANEXO D – CATEGORIA POLÍTICA ................................................................ 186
LISTA DE FIGURAS
Previous studies of reportings published on the newspapers Folha de S. Paulo and O Estado de S.
Paulo indicate that the visual representation of children on journalistic photographies develops two
important roles: the anchor of the verbal text and the complementary, according to a distinc thought of
Barthes for a relation text-image on the discursive process. The first one uses photographies of
children to ilustrate the reportings about the thematic question of childhood, such as school/education,
safety, health and behaviour. The second one is used to complement the verbal information, not
always having direct conection with the non-verbal text, what can be considered, in some cases as an
element that leads to dramatic strengh on certain conflict themes in our society, like wars, tragedies
and accidents. This research has as its aim the analysis of the cases of visual representation of
children in reporting that indicate the complementary of the verbal information, examining how the
meanings are built and which are the efects of sense obtained by the image resources. The question
to be investigated, thus, is what is the role developed by the use of image of children in certain
journalistic reportings, which themes do not report directly the child purpose. For it, was analyzed the
journalistic treatment on the construction of a visual scene and on the articulation of the verbal text
and non-verbal text on the press. The “corpus” is built of a selection of reportings related to thematic
chosen on the newspapers Folha de S. Paulo and O Estado de S. Paulo, examined for eight months.
It looks for classification system of the categories of analysis, from the information given by the own
texts (verbal and non-verbal), to identify the differences on the format of the journalistic treatment used
on visual configurations. So from the studies of the theories of the journalism and photography, and of
discursive-semiotic and plastic, referring to the analyse itself, it was done a study of how the child is
visually represented on the brazilian press, according to the several strategies to keep and maintain
the attention of the reader.
1 INTRODUÇÃO
distinta. Desde o início das organizações sociais, passando pela sociedade da caça
fase vivenciada.
próprias da imprensa.
investigação sobre o tema desta pesquisa em várias bases de dados, como Banco
1
A história da infância nas diversas fases da sociedade mundial foi descrita por muitos estudiosos.
Para esta pesquisa, foram consultadas as obras de Stearns (2006), Del Priore (2006) e Ariès (2006).
12
principalmente nos meios Jornal Impresso e TV. A maior parte delas tem como
seleção e a leitura das reportagens nos jornais escolhidos, durante oito meses, de
sobre crianças e/ou sobre temas que se reportem diretamente à situação da criança,
no início deste trabalho, tinha-se como objetivo a pesquisa sobre o discurso verbal
2
A determinação do período pesquisado corresponde ao primeiro ano do curso de Mestrado em
Comunicação e Linguagens, no qual foi iniciada esta dissertação.
13
forma completa, ou seja, na união e na articulação entre o texto verbal e visual, além
fotografia, por exemplo) no discurso informativo atual. Desse modo, verificou-se que
o texto verbal não pode ser desvinculado da imagem, quando esta adquire novos
sentidos em função do texto com o qual se articula, além de sua posição no contexto
como ponto de partida, que serão então examinadas nesses vínculos com o verbal e
crianças.
3
A classificação é apontada por Barthes (1990, p. 31-34) nos anos 1960, na qual ele descreve as
relações entre a mensagem lingüística e a mensagem icônica, por meio das funções de fixação e de
relais, e é apresentada na segunda parte desta dissertação.
14
A recorrência deste último uso encaminhou a pesquisa dos casos em que tal
causa pelo recurso à sua imagem, quando as matérias não tratam da temática
infantil.
representação infantil;
condição infantil.
de sentido obtidos pelo recurso à imagem, é a questão central desta pesquisa. Para
articulação texto verbal e não-verbal na mídia impressa. Desse modo, esta pesquisa
pensamento social e vice-versa. Outra contribuição que essa pesquisa pode trazer
para tratar sobre crianças, este trabalho pode contribuir para a reflexão sobre a
produção de notícias e reportagens sobre o tema. Além disso, pode colaborar para a
sob o prisma da história com base nas obras de Philippe Ariès (2006), Peter Stearns
(2006), Mary Del Priore (2006) e Shirley R. Steinberg e Joe L. Kincheloe (2006), por
dos usos das imagens de crianças. Trata também das relações e interações entre
utilizando os estudos de Clarice Cohn (2005), Alberto Dines (1986) e Philip Meyer
fotojornalismo, Ciro Marcondes Filho (2002), Nelson Traquina (2005), José Rebelo
(2000), Jorge Claudio Ribeiro (1994), Margarita Ledo (1998) e Jorge Pedro Sousa
(2000) foram os autores que apoiaram a discussão. A reflexão sobre a “ética do ver”
Freund (1989) e Jorge Pedro Sousa (2000), e também nas obras de autores que
examinam a questão sobre o que pode e o que não pode ser visto em nossa
sociedade, como Susan Sontag (2003 e 2004), John Berger (2003), Vivian Sobchack
Pedro Sousa (2005 e 2000), Nilton Hernandes (2006), Manuel López (2004), José
Ignacio Armentia, Jon Elexgaray e Juan Carlos Pérez (1999), Antonio Celso Collaro
(2000), Donis A. Dondis (1997), Robin Williams (1995), Rafael Souza Silva (1985) e
Allen Hurlburt (2002). Para a parte de análise da vinculação entre o verbal e o não-
verbal, tem-se como base Roland Barthes (1990) e autores da semiótica discursiva
francesa, com seu principal estudioso, Algirdas Julien Greimas, assim como o
várias estratégias para captar e fixar a atenção do leitor. Nas considerações finais,
sua primeira parte, uma breve revisão histórica sobre a infância e a mudança da
tempo, a criança não foi percebida como uma pessoa em desenvolvimento e com
compreende4.
se constituiu uma “ética do ver"5, que determina social e culturalmente o que pode
ser visto e o que não pode ser visto pelas pessoas, apontam-se questões sobre a
meio social. Associando essas transformações também com a própria evolução dos
4
Tem-se um longo período histórico para ser revisado em relação à história da infância e de como a
criança foi percebida a cada ciclo, no entanto, nesta dissertação, deu-se destaque para o conceito
que começa a modificar-se a partir do século XVII.
5
A expressão é utilizada por Susan Sontag na obra Sobre fotografia.
19
crianças e velhos, governos e instituições, faz-se uma reflexão6 sobre o que pode
do final do século XVII. A mudança iniciou-se nas classes sociais mais altas7
nessa fase a distinção entre a infância e seus estágios (STEARNS, 2006, p. 74).
87).
segundo Stearns (2006, p. 90), que foram-se desenvolvendo ao longo dos séculos
6
Considera-se que a discussão exposta de forma breve nesse capítulo deve ser objeto de estudos
mais aprofundados, no futuro, em trabalho específico sobre o tema, porque envolve grande parte do
debate em torno da imagem e sua exposição ao longo do desenvolvimento da sociedade.
7
Analisando as mudanças do conceito de infância a partir do processo histórico, é preciso salientar
que, de maneira geral, as alterações no modo de viver e pensar iniciam-se sempre nas classes mais
altas, pois são elas que possuem condições econômicas, políticas e sociais para implementar tais
mudanças. No entanto isso não quer dizer que tais mudanças não tenham ocorrido em classes
desfavorecidas economicamente. De todo modo, como qualquer transformação histórico-social, as
alterações ocorridas no conceito de infância não sucederam de forma igualitária, linear e progressiva
em todas as classes sociais e sociedades.
20
param de trabalhar, houve o entendimento de que era preciso limitar o tamanho das
famílias para que todos pudessem ter seu sustento garantido. Desse modo, o
tradicionalmente em torno de 30% a 50% das crianças morriam até os 2 anos”. Essa
dar mais atenção e cuidado à criança. Dessa forma, a saúde das crianças passa a
muitas delas levaram muito tempo para estabilizarem-se como normas sociais.
Pode-se citar como exemplo o trabalho infantil, que se estenderá, segundo Stearns
Comittee, entre 1908 e 1917, mostrou crianças que trabalhavam mais de 12 horas
país.
modernidade.
8
Do original: “Quizá empezamos a cansarnos de ver fotos de niños en el trabajo, le dice Hine a los
asistentes a una de sus muchas conferencias, pero os propongo que cansemos a todo el país con
este asunto de manera que cuando llegue el momento de llevar acciones adelante, estas fotos sean
solamente un recuerdo del pasado”.
22
pais e/ou da família. Mudando a visão social sobre a infância, surgiram leis,
convenções, acordos mundiais que definem o que é ser criança. A Convenção sobre
setembro de 1990, define criança no artigo 1 como “todo ser humano menor de
dezoito anos de idade, a não ser que, em conformidade com a lei aplicável à
criança, a maioridade seja alcançada antes”. A lei brasileira nº. 8.069, de 13 de julho
criança no artigo 2º: “Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até
doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos
válidas, no entanto a infância inicia uma nova fase com as inovações da sociedade
contato com informações que só teria quando fosse adulta, modificando sua relação
sociedade, criança e morte. Como já foi citado, o aumento dos cuidados dos pais
A partir do século XIX, nascem menos crianças, seus pais tomam mais cuidados
com elas e estabelece-se que elas não podem morrer, por isso as sociedades
especialistas indicavam que isso poderia não fazer bem à criança, ao seu
vivas tornou, sem dúvida, mais difícil aceitar as mortes que ocorressem” (STEARNS,
exemplo, pôde causar nos leitores dos primeiros periódicos a reproduzirem tais
cenas. Compreende-se também porque elas foram resguardadas, não dos fatos,
concluir que a criança hoje tem um papel ativo na sociedade com direitos, deveres e
Como já foi apontado neste trabalho, a criança sempre teve seu espaço de atuação
grande influência, por meio dos registros veiculados na TV, no rádio, na internet e no
dos adultos que surgem das crianças. A infância, nesse sentido, é uma chave única
para a experiência humana maior” (2006, p. 20). De alguma forma, toda criança
precisa passar por determinados estágios de aprendizado para chegar à fase adulta
As regras sociais são criadas por adultos, que um dia já foram crianças.
Muitas dessas regras não estão registradas em forma de documentos ou leis, mas
podem ser transmitidas, de forma explícita ou por meio de contratos tácitos, pelos
que os molda. Redefinição de conceitos, válida ainda nos anos 2000, pela qual a
(crianças, jovens, adultos, idosos), que são os responsáveis por vivenciar e repassar
que forma a cultura, “[...] não é mensurável, portanto, e nem detectável em um lugar
apenas – é aquilo que faz com que pessoas possam viver em sociedade
variadas formas, assim como podem gerar efeitos de sentidos 9 distintos sobre esse
mesmo grupo.
para a formação cultural de uma sociedade e que, assim como essa mesma
uma questão que vem sendo discutida amplamente nas universidades, pelos
atenção para a razão da crise do jornal, desmistificando-a. Ele afirma que essa crise
não é a primeira vivida pelos diários, pois já estava em andamento bem antes do
da comunicação que facilitaram a segmentação dos jornais, tornando mais difícil sua
sustentação financeira.
9
Greimas e Courtés (s.d., p. 136) definem efeito de sentido como “a impressão de „realidade‟
produzida pelos nossos sentidos, quando entram em contato com o sentido, isto é, com uma
semiótica subjacente. Pode-se dizer, por exemplo, que o mundo do senso comum é o efeito de
sentido produzido pelo encontro do sujeito humano com o objeto-mundo. [...] Situado na instância da
recepção, o efeito de sentido corresponde à semiose, ato situado no nível da enunciação, e à sua
manifestação que é o enunciado-discurso”.
10
Optou-se pelo termo “crise” para expressar essa fase de transformação e adaptação do jornal
impresso frente ao surgimento das tecnologias da informação por ser a mais utilizada nos debates
acadêmicos no Brasil, no entanto compreende-se que os termos “revisão” e “adaptação” ou ainda a
expressão “novas competências do jornal impresso” poderiam ser mais adequados, de acordo com
López (2004, p. 27-30).
27
qualidade e para manter a democracia em um país. Por isso, ele afirma que “A
comercial. Se o modelo funcionar, um jornal influente terá leitores que confiam nele
e, portanto, mais valor para os anunciantes” (MEYER, 2007, p. 18). Assim, o jornal
pode fazer de sua qualidade e credibilidade editorial uma ferramenta eficaz para sua
sobrevivência.
que obteve maior índice de confiança dos brasileiros (63%), na pesquisa de opinião
pública realizada pelo Ibope, entre maio e agosto de 200511. Essa pesquisa aponta
também que o público confia mais no jornal do que na TV e no rádio, que aparecem
Circulação (IVC).
11
A pesquisa Confiança nas Instituições foi realizada pelo Ibope em maio e agosto de 2005.
Considerou-se para esta pesquisa os dados obtidos pelo Ibope em agosto de 2005.
12
As instituições que ocupam os três primeiros lugares como as mais confiáveis na opinião dos
brasileiros são Médicos (81%), Igreja Católica (71%) e Forças Armadas (69%).
28
uma reflexão sobre a crise do papel, que fez a indústria do jornal pensar em
leitor. Apesar de ter sido escrito da década de 1970, os conceitos expostos pelo
autor sobre o jornal impresso podem ser considerados atuais, na medida em que
sentido, o autor afirma, assim como Meyer (2007), que o jornal impresso continuará
personalizada, pois cada leitor encontra algo no jornal que tem a ver com sua visão
questão do jornal é que apesar de os jornais impressos serem produzidos e lidos por
13
Kucinski refere-se aos quatro grandes jornais brasileiros (Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo,
O Globo e Jornal do Brasil) responsáveis pela definição da agenda nacional de discussões.
Considera-se, no entanto, para esta pesquisa, que a afirmação de Kucinski pode apoiar a importância
do conteúdo jornalístico produzido pelos jornais impressos como veículos de comunicação de grande
expressão e também como formadores de opinião, pois são reproduzidos em outros meios de
comunicação de grande alcance popular.
29
Além disso, mesmo nos anos 2000, caracterizados pelas rápidas mudanças
diversos espaços na Internet que produzem notícias. Como afirma Landowski (1992,
poderoso de integração dos múltiplos universos de referência que ele toma como
FOTOJORNALISMO
sociedade. Marcondes Filho (2002) em sua obra A saga dos cães perdidos faz uma
revisão da história do jornalismo e propõe uma divisão em quatro fases que marcam
terceira acontece até os anos 1960; e a quarta inicia na década de 1970. A fim de
14
De maneira geral, pode-se dizer que a Revolução Francesa foi marcada pela luta pelos direitos
humanos, pela destituição da aristocracia, pelo fim das monarquias e todo sistema absolutista, pelo
fim do monopólio da Igreja e da Universidade sobre o saber e o conhecimento. No entanto, é preciso
ressaltar que os ideais de liberdade, igualdade e fraternidade se aplicaram à burguesia e não ao
Terceiro Estado (“o povo”).
15
Segundo Marcondes Filho (2002), em 1631, a Gazette já tinha todas as características básicas de
um jornal impresso.
30
apresentadas a seguir.
marcam a primeira fase do jornalismo, de 1789 até a metade do século XIX. Antes
instrumento político.
o segundo jornalismo, que tem início a partir da segunda metade do século XIX,
custava caro aos proprietários dos jornais, que por isso começaram a pensar no
(2002, p. 14), uma “tendência – como se verá até o final do século 20 – [...] de fazer
de notícias”.
jornalística.
Nos anos 1970, o jornalismo entra em sua quarta fase, marcada como a era
eletrônicos fornecem material informativo, que pode ser recolhido em várias fontes.
Mas foi na segunda fase do jornalismo, descrita por Marcondes Filho, a partir
jornal. Essas tecnologias encareceram o custo do jornal, que foi buscar alternativas
produção jornalística até então era marcada pelo texto declaradamente opinativo,
com estilo literário, como descrito por Marcondes Filho, na primeira fase do
34).
(1994) afirmam que a invenção do telégrafo em 1844 e o telégrafo por cabo em 1866
como ela é, quase como um espelho, para a sociedade. Por meio das imagens
fotografia surge para sustentar a separação dos fatos da opinião, do juízo de valor, e
vai contribuir para a valorização de uma outra característica do jornalismo, que irá se
[...]”.
acontecimentos que seja válido para todos os leitores e não apenas para
este ou aquele indivíduo ou grupo de indivíduos‟ (REBELO16, 2000, p. 15).
Segundo Todd Gitlin (1979, p. 28, citado por TRAQUINA, 2005, p. 51), havia
fato muito mais credibilidade. Traquina (2005) apresenta ainda mais uma finalidade,
1970, a notícia passa a ser vista como uma construção. O paradigma da notícia
16
A obra de José Rebelo utilizada nesta pesquisa, O discurso do jornal, está publicada em Português
de Portugal.
17
A pirâmide invertida consiste na “disposição das informações, por ordem decrescente de
importância, em um texto jornalístico. [...] Com as informações mais „quentes‟ (o clímax) da notícia
logo no início do texto, o emprego da pirâmide invertida prende a atenção do leitor e permite que ele
se inteire dos principais fatos, mesmo que não leia todo o texto. Além disso, essa técnica facilita a
diagramação e a paginação: se a matéria estourar, podem ser cortadas as linhas de baixo para cima,
sem prejudicar o sentido do texto. [...]” (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 568).
18
Lead ou lide é a “abertura de texto jornalístico, na qual se apresenta sucintamente o assunto ou se
destaca o fato essencial, o clímax da história. Resumo inicial, constituído pelos elementos
fundamentais do relato a ser desenvolvido no corpo do texto. [...] Deve ser redigido de modo a „fisgar‟
o interesse do leitor para a leitura de toda a matéria. Na construção do lide, o redator deve responder
às questões básicas da informação: o quê, quem, quando, onde, como e por quê (embora não
necessariamente a todas elas em conjunto)” (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 426).
35
realidade, contudo também a constrói e por isso a notícia não pode ser o seu
objetiva também é impossível e por isso não pode repassar para o público o
para o repórter, que busca informações para redigir sua notícia, e para o
jornalístico é uma atividade que exige que seus profissionais observem, selecionem
impor ordem ao tempo e ao espaço, criando rotinas produtivas para que a notícia
19
Várias pesquisas têm demonstrado, porém, que se trata de efeito de sentido de objetividade.
36
Caetano (2005, p. 1), pois tem, assim como o discurso verbal, o intuito de informar,
fazendo um “recorte” da realidade, que se, por um lado, não pode ser desprezado,
VER”
1839, quando a invenção da fotografia foi considerada como domínio público pelo
Daguerre:
Entre 1839 e 1850, só uma pequena parcela das pessoas conseguiram ter
20
A história da fotografia, assim como a história do fotojornalismo, é ampla e contém muitos
acontecimentos importantes. Para esta investigação, foram destacados alguns acontecimentos que
se mostram relevantes no ponto de vista desta pesquisadora para o desenvolvimento da
argumentação desta investigação.
21
A obra de Freund, Fotografia e sociedade, utilizada nesta pesquisa, está redigida em Português de
Portugal.
38
principalmente por causa da periodicidade, pois as imagens tinham que ser feitas
fora do jornal. O investimento era alto para os jornais e seus proprietários ainda
recurso da fotografia.
(SOUSA, 2000, p. 26). Ainda segundo o autor, essa ilustração caracteriza-se como
ilustrar seus relatos, mesmo que ainda sejam utilizadas outras técnicas, como
daguerreótipo. Mas foi em 1880 que se reproduziu, pela primeira vez, uma fotografia
Em 1855, Fenton parte, com quatro assistentes, para fotografar a Guerra da Criméia,
onde, pelo excesso de calor, encontra dificuldades técnicas para realizar suas fotos.
39
Ele volta da Criméia com 360 placas, mas as fotografias não mostram a morte, a dor
Guerra Civil Americana, que iniciou em 1861, por iniciativa e investimento próprios.
Segundo Freund (1989) e Sousa (2000), as imagens dessa guerra mostraram, pela
horror22.
mais próximos, mesmo que muitas dessas fotografias sejam encenadas para
22
Expressão utilizada por Sousa (2005, p. 26) e definida por Barthes (2006) como foto-choque, essa
categoria de fotografia é abordada no último capítulo desta dissertação.
40
A Primeira Guerra Mundial teve cobertura extensiva dos fotógrafos que têm
suas fotos publicadas em suplementos ilustrados dos jornais. Como conta Sousa
(2000), “No final da Grande Guerra [Primeira Guerra Mundial], a maior parte dos
Já não é apenas a imagem isolada que interessa, mas sim o texto e todo o
„mosaico‟ fotográfico com que se tenta contar a „estória‟, não raras vezes
interpretando-se o acontecimento, assumindo-se um ponto de vista,
esclarecendo-se ou clarificando-se, explorando-se a conotação, mesmo que
não se desse conta disso (p. 72-73).
É também em 1930 que surge a Leica, uma marca que se torna mítica para
fotógrafos do mundo todo, e que “comercializa pela primeira vez um modelo dotado
porque não precisa usar o flash constantemente e tem seu trabalho facilitado pelo
41
uso das objetivas que permitem alcançar seu objeto, mesmo que não esteja tão
principalmente para as revistas ilustradas, como a Life, nos Estados Unidos, que
seu lugar e outros lugares, geralmente distantes, por meio das imagens captadas
pelos fotógrafos.
Ela [a fotografia] muda a visão das massas. Até então o homem vulgar
apenas podia visualizar fenómenos que se passavam perto dele, na rua, na
sua aldeia. Com a fotografia, abre-se uma janela para o mundo. Os rostos
das personagens políticas, os acontecimentos que têm lugar no próprio país
ou fora de fronteiras tornam-se familiares. Com o alargamento do olhar o
mundo encolhe-se. A palavra escrita é abstracta, mas a imagem é o reflexo
concreto do mundo no qual cada um vive. A fotografia inaugura os mass
media visuais quando o retrato individual é substituído pelo retracto
colectivo (FREUND, 1989, p. 107).
homem. Berger (2003), em seu artigo Usos da fotografia, escrito em 1978 para
discutir a obra Sobre fotografia da filósofa Susan Sontag, reflete sobre o impacto
causado por essa substituição. A fotografia privada, para Berger (2003, p. 56),
isolado o fato ou a pessoa naquela foto, não é deslocado porque as pessoas que
tem como objetivo relatar eventos dos quais a maioria das pessoas não
participaram. Para o autor, esse tipo de fotografia, ao ser retirada do seu contexto
conserva não é a imagem das pessoas com suas histórias e, sim, as aparências.
novas possibilidades, mas “Agora, em lugar de oferecer novas escolhas, seu uso e
forma, diferente daquela vista apenas e diretamente por seus olhos, como diz
Benjamin (1994, p. 94), “a natureza que fala à câmara não é a mesma que fala ao
como diz Berger (2003, p. 57), o homem tem contato com imagens de
acontecimentos que lhe são estranhos, registrados por outra pessoa que chama sua
44
atenção e grita: olhe! Para o autor, essa é uma sensação que o incomoda, na
desconhecido, [...] [e] se prestam para qualquer uso” (BERGER, 2003, p. 57).
com esse fim e para evitar o mau uso da fotografia, Berger propõe que cada imagem
sistema radial em torno da fotografia, de modo que ela possa ser contemplada em
dos fotógrafos porque, segundo Sousa (2000, p. 33), “a guerra sempre foi um tema
acidentes, fatalidades da vida diária do homem ganham evidência nas páginas das
revistas e dos jornais, assim como acontecem com as fotografias de crianças vítimas
fatalidades têm sobre as pessoas. Sontag (2003) reflete sobre o registro das guerras
questões econômicas e políticas, como razões que fazem com que o homem se
sinta atraído pelas imagens de morte, assim como possa sentir repulsa por muitas
dessas imagens que mostram o lado grotesco das ações do ser humano.
morrer passou por mudanças radicais ao longo dos séculos”. A partir do século XVI
até o XVIII, há uma ruptura entre a morte e a vida social, que torna a morte irracional
da cultura vitoriana do século XIX [...]. Surge o fascínio mórbido, histérico e erotizado
com a idéia da morte. A morte passa a ser associada não apenas ao erótico mas
também ao exótico”. Mesmo assim, a morte natural ainda era vivida pela família, que
em 1850, aprova uma lei que proíbe a venda de fotografias de nu, classificadas pela
46
justiça como escândalo público. O que para a época atual não levantaria discussões
morais mais acaloradas nem teria sua veiculação proibida, como analisa Freund,
“Em quantas sex shops não vemos nós, hoje, fotografias mais ousadas, que não
pornográfico, têm sua própria segmentação de mercado com revistas, filmes, lojas e
uma infinidade de produtos, que podem ser vistos, mesmo que ainda sofram alguma
4). A partir disso, as pessoas eram levadas para o hospital para serem cuidadas por
ainda que
Desse modo, o homem começa a “ver”, por meio dos olhos de outra pessoa,
diversas naturezas vividos por outros homens. E o choque é ainda maior porque a
graves e expostos. A utilização desse tipo de fotografia pela imprensa não era e
ainda não é rara23, configurando para os meios de comunicação, assim como para
23
Durante o levantamento do material para esta pesquisa, pôde-se perceber é que o uso da
fotografia de violência está se tornando cada vez mais comum, inclusive a fotografia de crianças
vítimas de violência.
24
Do original: “Como modelo dominante, en la forma, en el contenido, y en su función, la foto
traumática, y de manera más global la foto-shock organizaron el discurso visual en los medios de
comunicación” (LEDO, 1998, p. 99).
48
foram discutidas por muitos estudiosos do tema e são, muitas vezes, tema de debate
levantadas, tanto pelo senso comum quanto por intelectuais25, são a banalização da
violência, que aconteceria por meio da saturação das imagens, provocadas, por sua
anestesia dos sentimentos, uma não-reação a algo que deveria deixar as pessoas
fotografias que conseguem causar o choque, de algum modo, podem mostrar algo
novo. No jornalismo, por exemplo, ter algo novo para mostrar e contar para o seu
público é um dos pilares de seu discurso. Nesse sentido, para alcançar o choque, a
inclusão desse elemento, recurso ou estratégia novos pode ter um alto custo, porque
tivesse sempre que “aumentar a dose” de horror que registra, para conseguir chamar
a atenção de seu público ou, ainda, tornar a ação violenta explícita em um “corpo
25
Sobre essa discussão, os autores a seguir podem ser consultados: Baitello Júnior (1999; 2005);
Kamper , Mersmann e Baitello Júnior (2000) e Rosa (2007).
49
visível, de forma abrupta”, como diz Sobchack (1984, p. 12-13). Sobre a repetição
das imagens e o aumento da violência a cada foto, Sontag (2004) diz que:
visão crítica e reflexiva sobre a realidade. Para Sontag (2004), o caráter excessivo
enquadramento, pode não conservar sua carga emocional. De alguma forma, porém,
sociedade mundial contra a Guerra do Vietnã. A menina, Kim Phuc, que corre nua
BBC World Service em 2000, Kim Phuc deu sua opinião sobre a importância dessa
fotografia: “Eu acho que todas as pessoas deveriam ver essa foto, mesmo hoje.
Porque essa foto mostra claramente como uma guerra é terrível para as crianças.
Você pode ver o terror no meu rosto. Basta ver a foto, para as pessoas aprenderem”.
Referindo-se à fotografia de Nick Ut, Sontag (2004) diz que fotos como essa
50
guerra do que cem horas de barbaridades exibidas pela televisão” (p. 28).
FONTE: <http://theonlinephotographer.typepad.com/the_online_photographer/2007/06/what_a_change_i.html>
No entanto, não se pode dizer o mesmo de todas as fotos sobre a violência contra
as crianças nos dias atuais. Como diz Agamben (2007, p. 30), a fotografia exige do
homem, senão uma ação que provoca mudança, um eterno lembrar porque “as fotos
são testemunhas de todos esses nomes perdidos, semelhantes ao livro da vida que
o novo anjo apocalíptico – o anjo da fotografia – tem entre as mãos no final dos dias,
seres humanos” (p. 110). Pensando dessa maneira, os profissionais que selecionam
determinada imagem para compor o relato da notícia deveriam, aos olhos de Sousa
outros seres humanos, e tal sentido pode contribuir para transformações de algumas
documental, como diz Agamben (2007, p. 29), “A imagem fotográfica é sempre mais
apresentarem para a sociedade “um modo de ver o sofrimento à distância”, como diz
Sontag (2004, p. 98). No entanto, ver de perto ou de longe, com a mediação de uma
que se tem dele, e é isso que tem feito desde seu surgimento e sua popularização.
lugares, seja perto ou longe, não é tarefa fácil para o homem. Talvez, como diz
Sontag (2004, p. 98), “Se pudéssemos fazer algo a respeito daquilo que as imagens
não-verbal, que dão origem ao texto 26 no conceito dado pela semiótica. A linguagem
entretenimento, mas pode ser usado em outras editorias, como economia, política ou
geral, quando o assunto merecer maior destaque ou for de maior relevância para o
público do jornal. Dessa forma, a linguagem verbal também pode cumprir o papel da
26
O conceito semiótico de texto é apresentado em seguida neste capítulo.
53
426) definem como sistemas sincréticos aqueles “que [...] acionam várias linguagens
Dessa forma, pode-se afirmar que o jornal apresenta um discurso sincrético ao leitor,
sentido.
por meio da articulação do verbal e do não-verbal, não foi sempre assim. Até a
década de 1960, o texto verbal era predominante nos jornais, pois o pensamento
dominante acreditava que o conteúdo era o que mais interessava e não a forma
como era apresentado. Mesmo com o surgimento da fotografia no século XIX, ela foi
usada durante algum tempo mais para ilustrar o conteúdo verbal das matérias do
que para realizar, junto com o verbal, a articulação de sentido entre as duas
mundo (SOUSA, 2005; LÓPEZ, 2004). Para López (2004, p. 84), a mudança na
infografia, foi provocada pelo crescimento do meio televisão e pela melhoria das
artes gráficas. Nesse sentido, López ainda considera que “Sobre a fotografia recaiu
boa parte das fórmulas renovadoras do jornalismo impresso desde que as técnicas
91).
de “ler” as informações ali dispostas, pois, como afirma Dondis (1997, p. 132), “A
da fotografia utilizada para compor a página do periódico, assim como o uso dos
elementos gráficos.
se que seu objetivo é “determinar o que o texto diz, como o diz e para que o faz”
27
Do original: “Sobre la fotografía ha recaído buena parte de las fórmulas renovadoras del periodismo
impreso desde que las técnicas gráficas pasaron del plomo al offset".
55
(BARROS, 2005, p. 8). Dessa maneira, o texto comporta uma relação entre o
(s.d., p. 150) definem o destinatário também como “sujeito produtor do discurso, por
ser a „leitura‟ um ato de linguagem (um ato de significar) da mesma maneira que a
que estabelece para a interação entre essas instâncias um caráter de contrato entre
impresso, em que, para conseguir obter uma relação com seu enunciatário, o leitor,
partilha com ele uma série de valores estabelecidos em um contrato tácito, não
interpretações‟, „ser objetivo e imparcial nos relatos‟, „mostrar a realidade‟” (p. 18)
são as “cláusulas” principais no contrato entre jornal e leitor, que possibilitam que o
jornal consiga realizar sua comunicação com o leitor. Desse modo, Barros (2005)
determinados, para que se deixe manipular” (p. 28). Assim, em muitos casos, a
um regime cognitivo.
56
recursos que o jornal utiliza em seus textos, verbal e não-verbal, reconhecidos nas
pessoa para narrar a notícia; e o uso das fotografias “como mais uma „prova‟ da
veracidade do relato”.
com uma novidade e esperando que o leitor aceite a manipulação28. Nessa história,
Assim, para conquistar o leitor, o material disponibilizado no jornal busca gerar uma
empatia no leitor, por meio dos valores semelhantes entre veículo e leitor. A
curiosidade também deve ser despertada no leitor e para isso o jornal pode lançar
recursos verbo-gráficos em seus títulos ou chamadas, por exemplo, ou, ainda, por
28
Segundo Greimas e Courtés (s.d., p. 269-270), “a manipulação caracteriza-se como uma ação do
homem sobre outros homens, visando a fazê-los executar um programa dado [...]. [...] a manipulação
é sustentada por uma estrutura contratual e ao mesmo tempo por uma estrutura modal. Trata-se, com
efeito, de uma comunicação (destinada a fazer-saber) na qual o destinador-manipulador impele o
destinatário-manipulado a uma posição de falta de liberdade (não poder não fazer), a ponto de ser
este obrigado a aceitar o contrato proposto”. No entanto, várias estratégias são adotadas para que
essa “posição de falta de liberdade” apareça como um querer ou um poder. Nisso consistem as
estratégias da enunciação.
57
pelo jornal para gerenciar o nível de atenção do leitor, e podem ser divididos em três
afetividade. Isso causaria uma disforia no leitor, ou seja, ele sentiria falta de algo, de
próprio periódico cria condições para fazer o leitor retornar ao estado de tensão,
para que ele possa estabelecer o hábito de ler aquele jornal, pois a estrutura de uma
matéria jornalística não apresenta todo o saber em uma única edição. Assim, o leitor
deve voltar ao diário no dia seguinte para ser, outra vez, estimulado pela
necessidade de querer-saber.
obter conhecimento sobre o seu entorno, o leitor tem a possibilidade de viver outras
histórias, de “sentir” que faz parte do mundo, “sentindo” de fato o mundo em que
vive, por meio das tristezas, das alegrias, do sofrimento e das “paixões” dispostas
nas páginas do jornal, nas histórias de outros semelhantes. Oliveira (2007, p. 66), na
não só pelo seu aspecto inteligível ou cognitivo que dominaram a práxis semiótica,
menos intenso. Esse “algo” percebido é o que “orienta nossa atenção, que a ela
resiste ou a ela se oferece” (p. 47). Nesse sentido, o autor explica que essa
presença percebida é “O afeto que nos toca, essa intensidade que caracteriza nossa
relação com o mundo, essa tensão em direção ao mundo” (p. 47). Esse modo de
percepção está ligado à escolha de ponto vista, a visada, “que guia e direciona o
para que o leitor “perceba algo” antes de sua leitura total, pelo aspecto do sensível.
Em razão disso e do uso cada vez mais intenso da fotografia como recurso para
SIGNIFICAÇÃO
por esse veículo, assim como é imprescindível ter clareza de qual é o público desse
missão, seus objetivos, sua fórmula editorial e quem serão os leitores. Além disso,
quesitos já apontados, formular sua proposta de apresentação gráfica, uma vez que
não-verbal, pois como constata Landowski (1992, p. 118), “[...] o jornal precisa
possuir também o que se chama uma imagem de marca, que o identifique no plano
sujeito semiótico”.
60
planejamento editorial, por meio das reuniões de pautas diárias, nenhum elemento
gráfico ou imagético presente em uma página de jornal pode estar ali sem a
realização prévia de um projeto 29. Assim, do mesmo modo que uma matéria deve
cumprir uma função informativa, qualquer elemento gráfico presente em uma página
deve conter uma função comunicativa e informativa, assim como não deve gerar
dúvidas ou contradições, a não ser que isso seja intencional, para causar
seus leitores.
porque define o espaço do material a ser publicado, como esse material será
mostrem ao leitor que ele está lendo o jornal X e não o jornal Y. Assim, cada diário
usa recursos gráficos que o compõem e, também, retratam a sua linha editorial, que
leitores.
29
Tanto o planejamento editorial quanto o gráfico significam a possibilidade de organização de todo o
material levantado para a edição de um jornal. No entanto, o planejamento de uma publicação não
pode ser rígido devido à imprevisibilidade dos fatos.
61
composição de uma proposta gráfica, que evita elementos similares em uma página,
compreensão do homem.
62
são as recorrências a recursos utilizados nos jornais, como a cor, a forma, a textura
criar uma unidade visual, devem ser seguidos pelo profissional responsável pelo
projeto gráfico. Armentia, Elexgaray e Pérez (1999) citam normas gerais que podem
segundo os autores, foram esses elementos os responsáveis por uma das grandes
como:
30
Do original: “[…] la estricta organización en secciones, la división en bloques informativos, las
llamadas de primera página, las ventanas promocionales de las portadillas, los cintillos de las
páginas, los antetítulos localizadores de las informaciones y las referencias a otras secciones son
63
página do jornal em uma série de retângulos, a estrutura modular faz com que “a
forma, buscam “uma harmonia assimétrica que trata de evitar os blocos cinza e
algunos de los elementos que emplean con más o menos acierto casi todos los diarios con el fin de
reclamar la atención del lector y enviarle mensajes referenciales sobre el conjunto del contenido”.
31
Do original: “[…] la página adquiera movilidad y fragmentación, a la vez que afronta el desarrollo del
diseño de cada plana en bloques de distinto tamaño referidos a informaciones, imágenes y
publicidad. (El-Mir, Lallana y Hernández, 1995, 33)”.
32
Do original: “[…] huyendo de la composición simétrica y de la uniformidad monolítica en la que se
basaba el estructuralismo. […] una harmonía asimétrica que trata de evitar los bloques grises y
compactos de masas de texto”.
64
quase a totalidade de sua receita financeira da publicidade, que precisa estar bem
planejamento editorial para não ter o seu produto, a informação, afetado pela má
material publicitário que tenha sido acordado com o setor comercial do periódico,
as suas marcas identitárias de maior alcance ao público leitor, pois é por meio delas
33
De maneira geral, conforme Rabaça e Barbosa (2001, p. 405-406), os gêneros jornalísticos são
classificados em jornalismo informativo (notas, notícias, reportagem, entrevista, enquete), opinativo
65
branco entre notícias, colunas, blocos informativos, sem o uso de filetes, para
chamar a atenção do leitor ou mesmo para dar um descanso para os “olhos” do leitor
(p. 194). Outros recursos podem ser usados para organizar o material publicado,
orientação. As cores também devem ser utilizadas como recurso gráfico para
legibilidade das informações dispostas nele, o projeto gráfico não pode ser rígido,
empresas jornalísticas, precisam a todo momento pensar em seus leitores para que
que definirá, por exemplo, o destaque que certa notícia terá na capa do jornal, uma
tarefa destinada aos editores35 que determinam o que é mais importante para o seu
público leitor, assim como o espaço que esse acontecimento deve ocupar no jornal.
Esse destaque pode ser dado de diversas formas, como valorizar o título, a
fotografia, as chamadas, o lead, entre outros elementos, fazendo com que ele
busque ler a notícia nas páginas internas do jornal. Nesse sentido, a escolha dos
recursos gráficos que serão utilizados para determinar o que é mais importante em
35
Conforme Traquina (2005, p. 149-152), a teoria do gatekeeper considera que o processo de
produção da informação jornalística é realizado por meio de escolhas. Assim, todas as notícias
passam pela avaliação dos jornalistas responsáveis pelas decisões finais do que entrará no jornal,
papel ocupado pelos editores, chamados nesse estudo de gatekeeper. A hierarquia das notícias,
assim como das informações que compõem o texto verbal, e de todos os recursos gráficos utilizados
no jornal, é decidida pelos editores que deixam determinada notícia passar pelos gates (portões em
inglês) ou não. Se for escolhida, a notícia chega até o público, e se não for, não será publicada.
67
fator preponderante no aspecto visual do trabalho”, afirma Collaro (2000, p. 17). Para
mais comum são as serifadas, porque são mais agradáveis e propiciam descanso
para o olho humano, pois são mais regulares. Além da tipologia, os jornais, de
outro.
página, assim como os títulos do material informativo nas páginas internas, têm
toques, fazendo com que o tamanho do corpo da fonte fique maior, com o objetivo
tratamento especial àquele assunto escolhido pelo jornal como o mais importante,
Fernando Collor de Mello. Essa capa não usa os módulos de manchete definidos no
utilizada para o título, apenas com uma palavra, “impeachment”, toda em caixa alta,
descontinuidade.
69
FIGURA 2 – IMPEACHMENT!
acordo com o autor, para que o leitor valorize a notícia da mesma maneira que o
jornal a valorizou na sua capa, os jornais usam diversas formas para organizar seu
oferecer uma leitura rápida e eficiente, fazendo com que o leitor chegue facilmente à
dada ao material; construir uma publicação que alie beleza e praticidade para que o
padrões visuais que facilitem a busca do leitor por determinada informação (p. 187).
infográfico. Esses dois elementos são muito utilizados pelos jornais impressos e
podem ser considerados textos sincréticos, pois utilizam a linguagem verbal e não-
leitor. Esse recurso surgiu, segundo Sousa (2005), a partir da metade dos anos 1980
no computador.
Em poucos anos quase todos os jornais utilizam esse recurso visual com a
intenção de informar mais e melhor. Aquilo que é complicado explicar com
palavras pode ser expresso de modo direto e contundente por meio de uma
imagem. Não se trata de fazer infográficos espetaculares, o objetivo é ser
claro e fazê-lo de forma atrativa para que o leitor capte o conteúdo da
informação36 (ARMENTIA; ELEXGARAY; PÉREZ, 1999, p.196).
36
Do original: “En pocos años casi todos los diarios utilizan este recurso visual con la intención de
informar más y mejor. Aquello que es complicado explicarlo con palabras puede ser expresado de
modo directo y contundente por medio de una imagen. No se trata de hacer infográficos
espectaculares, el objetivo es ser claro y hacerlo de forma atractiva para que el lector capte el
contenido de la información”.
71
proporcionando ao jornal a redução dos textos verbais e, por outro lado, a economia
ainda é preciso que a imprensa reveja o modo como usa esse recurso, porque ele é
usado na maior parte dos periódicos37, muitas vezes, apenas repetindo em forma de
dos textos verbais, mas como acréscimo de informação. Para o autor, a fotografia
fundamental dos jornais: coletar e divulgar os fatos atuais para o seu público.
recebem fotografias que nem sempre estão de acordo com a proposta editorial do
acontecimento no mundo todo, por meio dos grandes jornais que são “alimentados”,
37
O autor espanhol refere-se, principalmente, aos jornais espanhóis, no entanto pode-se aplicar sua
afirmação aos jornais brasileiros, pois é possível encontrar muitos exemplos do uso inadequado do
infográfico nos periódicos do Brasil, que apenas “traduzem” o verbal do texto jornalístico para a
imagem do infográfico.
72
jornais. Para eles, o espaço destinado às imagens nos jornais tem aumentado nos
de 2001, para jornais do mundo inteiro, que foi realizada pelas grandes agências de
notícia. Segundo Rosa (2007, p. 176), “As fotografias das agências só contribuíram
38
Do original: “Cada día se ve con más claridad que la parte gráfica de un diario es información y no
decoración. La forma en la que ha mejorado la calidad de impresión ha hecho que los elementos
gráficos adquieran importancia por sí mismos provocando que en ocasiones el texto pase a un
segundo plano. El grado de sensibilidad de los periodistas hacia esta modalidad informativa ha
ayudado también en buena medida a su desarrollo y ha logrado que los fotógrafos recobren su
verdadero status de informadores, dejen de estar aislados de la redacción y pasen a formar parte de
los núcleos de decisión de los periódicos”.
73
guerra seja vista de um ponto único [...]”. Dessa forma, como diz Sontag (2004), a
imagem que se tem da guerra termina por ser uma única fotografia, uma dessas que
O bom uso dos dois elementos mais utilizados nos jornais, a fotografia e a
matéria verbal, nos veículos impressos é uma discussão antiga, desde que a
harmônica dos dois elementos, para atrair e informar melhor o leitor. Utilizados de
harmonia, como afirma Kotscho (1986), “[...] Repórter e fotógrafo têm que trabalhar
sempre juntos [...]. O repórter nunca deve se esquecer que o texto e as fotos têm
exatamente a mesma importância dentro do jornal” (p. 20). A mesma regra está
O repórter de texto que tem uma visão abrangente de sua atividade sabe
que a „dobradinha‟ com o fotojornalista só enriquece o resultado final do seu
próprio trabalho. É fundamental, nesse caso, a sintonia entre ambos e de
cada um deles com os demais setores do processamento da informação
(2001, p. 32).
articulação entre o texto escrito e a fotografia, esta tem sido mais valorizada a partir
uma crescente valorização do uso da fotografia nos jornais diários, sobretudo, com a
ordem do sensível com o leitor, que é atraído pela imagem e só depois dirige seu
74
olhar para o texto verbal. É nesse sentido que o Manual de Redação do jornal Folha
de S. Paulo indica que a fotografia jornalística não deve mais ser usada como
próprios para informar sobre os fatos noticiados e rompe com a idéia de que a
por exemplo, que, em sua última reforma gráfica, em 2004, também abriu espaço
maior para a fotografia jornalística. Nos dois casos, a busca pelos efeitos estéticos e
o processo de leitura do ser humano. Nesse sentido, Silva (1985) cita a teoria de
Edmund Arnold, que apresenta a página impressa com zonas de visualização, pelas
seguir:
75
A idéia é a seguinte: o leitor inicia sua leitura pela zona primária (1),
localizada no canto superior esquerdo, que, por isso, deve conter um elemento forte
para atrair a atenção do leitor. Dessa zona de visualização, o olhar humano desloca-
48).
ambientais, por isso o modo de leitura do olho humano não seria tão ordenado como
aponta Silva citando Edmund Arnold (1985). Hurlburt conta sobre uma experiência
da qual participou certa vez, utilizando uma câmara óptica e que buscava mapear as
76
277) cita um estudo em laboratório, realizado por García, Stark e Miller (1995), que
tamanho da imagem também interfere na leitura, quanto maior ela for, mais atenção
ela gera. A seqüência que o olhar faz durante a leitura da página não é fixa, mas
disso, a leitura dos textos verbais ligados a fotografias coloridas é feito com mais
profundidade. A página impressa é vista como uma unidade e não como módulos, e
é bem aceita pela maioria dos leitores, mais do que os tons cinza, preto e branco.
relatada. Ainda segundo essa pesquisa, 70% dos leitores conseguem processar as
nesse sentido, o diagramador pode elaborar uma composição agradável aos olhos
nível de atenção do leitor. Segundo Hernandes (2006, p. 191), a primeira lei afirma
que “Dar mais espaço valoriza. Dar menos espaço desvaloriza”, o que é confirmado
segunda lei diz que “tudo o que estiver na parte de cima tem mais valor do que na
parte de baixo”. A valorização da capa está descrita na terceira lei, que confirma que
não há regras rígidas nem respostas definitivas, como uma receita ou uma fórmula
jornalismo, do design, pesquisas de opinião, entre outras. Embora não haja normas
padrão que fará com que o leitor identifique o jornal que prefere ler e que, ao mesmo
utilizado.
colocado na página por mero acaso, pois faz parte de um projeto editorial e gráfico.
determinado aspecto, mas, por outro lado, pode não proporcionar a compreensão
elementos.
79
CORPUS
Para tanto, alguns títulos de veículos foram levantados, como o jornal Brasil
de Fato, a revista Carta Capital e a revista Caros Amigos. Sob análise, esses
veículos não foram considerados adequados para unirem-se aos outros dois
caso das revistas, as características distintas entre os veículos revista e jornal foi o
foram a política editorial de cada um deles, a tiragem de cada jornal, que estão entre
os quatro jornais com maior circulação no Brasil, e a tradição dos dois jornais no
mercado jornalístico do país. Além disso, como se verá a seguir, os dois jornais
80
que é relevante para esta pesquisa. Em muitos momentos históricos do país os dois
do Brasil40”. Surgiu em 1921 como Folha da Noite. Quatro anos depois, foi criado o
jornal Folha da Manhã. Em 1949, nasce o jornal Folha da Tarde. Em 1960, esses
três títulos são incorporados a um só, quando é fundado o jornal Folha de S. Paulo,
jornalismo a ser realizado pelo jornal, assim como prevê as metas a serem atingidas
39
A grafia adotada de forma abreviada (S. Paulo) segue o padrão utilizado pelos jornais analisados
desde o surgimento até os dias atuais.
40
A informação foi retirada do site FolhaOnline, no link Conheça a Folha, que registra a história do
jornal, assim como as características do jornalismo praticado pelo veículo.
41
Segundo o site Folha Online, “Em 1984, foi publicada a primeira edição do Manual Geral de
Redação do jornal, com o intuito de expor regras gramaticais, padronizar a linguagem dos textos
jornalísticos, dar noções de produção gráfica, definir conceitos e incentivar as discussões na redação.
A segunda edição, revista e ampliada, foi lançada em 1987. O Novo Manual da Folha surge em 1992
e, em 2001, o Manual da Redação dá maior maleabilidade as regras publicadas anteriormente, e está
em vigor nos dias atuais”.
81
de S. Paulo ocupou a primeira posição como jornal mais vendido com circulação
média de 309.383 exemplares. De acordo com seu próprio discurso, “[...] O Projeto
eis aí a maior recompensa que poderíamos almejar, e também o maior risco. [...] 42”.
42
Informação retirada do site Folha Online, do texto “Projeto Editorial 1988-1989, Agosto de 1988 - A
hora das reformas – Aprendendo com as falhas”.
43
Idem.
82
circular com o nome atual. É chamado pelos seus leitores de Estadão. O jornal foi
José Alfredo Vidigal Pontes, no texto sobre a história do jornal44, mas afirma ser um
44
A informação foi retirada do site do Grupo Estado, no link Resumo Histórico, que registra a história
do jornal.
83
jornais Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo no século XX. Nos anos 1950, o
Estadão ocupava a posição de jornal mais lido. Na década de 1980, essa posição
fica com a terceira posição dos jornais mais lidos no Brasil, com circulação média de
45
A informação foi retirada do site do Grupo Estado, no link Resumo Histórico, que registra a história
do jornal.
46
Foi durante o movimento Diretas Já para eleições diretas para presidente da República que o jornal
Folha de S. Paulo fez crescer sua circulação, investindo em seu novo projeto editorial e de marketing
como o jornal da democracia (SILVA, 2005 e KOTSCHO, 2006).
47
Apesar de o jornal O Globo ocupar a segunda posição em tiragem, segundo o IVC, optou-se neste
trabalho pelo jornal O Estado de S. Paulo pelo histórico do veículo e sua tradição jornalística, como já
foi afirmado anteriormente.
84
Paulo foi considerado o jornal mais admirado do país, na sétima edição da pesquisa
S. Paulo, que conquistou o primeiro lugar nas edições de 2001 e 2002. O resultado
apontadas por Dines (1986), Kucinski (1998), Silva (2005) e Meyer (2007), os dados
seu alcance no meio jornalístico, hoje a imagem tem uma grande importância para o
discurso informativo.
48
Segundo dados do Instituto Verificador de Circulação (IVC), em 2006, o jornal Folha de S. Paulo
ocupa a primeira posição dos jornais mais lidos no Brasil, com circulação média de 309.383
exemplares, seguido, respectivamente, pelos jornais O Globo, do Rio de Janeiro, com circulação
média de 276.385 exemplares; O Estado de S. Paulo, com 230.901 exemplares; e o Jornal do Brasil,
do Rio de Janeiro, com 78.658 exemplares.
49
O estudo Veículos mais admirados: o prestígio da marca é realizado pela Editora Meio&Mensagem
e Troiano Consultoria de Marca, com apoio do Instituto Qualibest, desde 2000. Em 2006, os
questionários foram respondidos por 644 profissionais que atuam no mercado publicitário por meio do
portal Meio&Mensagem Online, que votaram nas categorias TV Aberta, Jornal, Revista, Rádio, TV por
Assinatura e Internet.
85
PROPOSTA DE PESQUISA
por meio das funções de fixação e de relais. A primeira seria a de fixar a idéia
50
“Um termo será chamado conotativo se, ao ser denominado um dos atributos do conceito
considerado do ponto de vista de sua compreensão, ele remete ao conceito tomado na sua totalidade
(cf. J. S. Mill). O (ou os) atributo(s) tomado(s) em consideração depende(m) quer de uma escolha
subjetiva, quer de uma convenção de tipo social [...] a conotação se parece com a figura retórica bem
conhecida, a metonímia [...]” (GREIMAS; COURTÉS, s.d., p. 77).
51
Os dois textos foram publicados no Brasil no livro O óbvio e o obtuso, pela Editora Nova Fronteira,
em 1990.
52
“Um termo é chamado denotativo quando cobre uma definição que visa a esgotar um conceito do
ponto de vista de sua extensão (cf. J. S. Mill): assim, por exemplo, uma unidade linguística terá o
caráter denotativo quando subsumir todas as ocorrências” (GREIMAS; COURTÉS, s.d., p. 106).
86
usada para “ilustrar” conteúdos. Nesse caso, o autor afirma que o texto verbal,
imagem, que seria orientada pelo verbal. A segunda função, segundo Barthes, é
imagem não ilustra mais a palavra; é a palavra que ilustra a imagem” (BARTHES,
criança complementa a informação verbal, nem sempre tendo ligação direta com o
sentidos.
texto verbal e não-verbal do material jornalístico dos jornais selecionados para esta
53
“[...] devorada, de uma certa forma, pela mensagem iconográfica, a mensagem verbal parece
participar de sua objetividade: a conotação da linguagem „purifica-se‟ através da denotação da
fotografia [...]” (BARTHES, 1990, p. 20).
87
matérias que não tratam diretamente da temática da criança, esta pesquisa levantou
capítulo.
Estado de S. Paulo, com o objetivo de mostrar a utilização desse recurso por esses
jornais, mas que pode ser estendido a outros jornais brasileiros e internacionais.
O tema “educação” aparece com freqüência nos jornais analisados, por isso
novembro de 2006. Com o título “Matrícula cai na rede básica de ensino”, a matéria
fotografia (figura 5) mostra uma sala de aula cheia, contrariando o título, ao mesmo
54
Apesar de citar as matérias como exemplo de ancoragem, pode-se perceber que a leitura do
material apresenta certa ambigüidade na leitura, que dificulta a classificação plena do material
analisado como “ancoragem”, na acepção de Barthes. Desse modo, demonstra-se que a importância
da análise do material em seu contexto (tanto da página como o social) para evitar a ambigüidade da
leitura.
88
tempo em que faz referência a crianças estudando, que apresenta articulação com o
também houve queda: foram 121,5 mil matrículas a menos em 2006” reforça a
mensagem, apesar de a imagem mostrar uma sala de aula cheia e essa informação
ensino.
abandonada serve como local para recreação de alunos da pré-escola que foram
55
Segundo Joly (1996, p.75), mensagem visual é a expressão que substitui o termo “imagem” e pode
ser definida pelo conjunto dos signos figurativos ou icônicos, dos signos plásticos e dos signos
lingüísticos.
91
está a palavra da imagem, menos parece conotá-la [...]”, pode-se perceber que
fica evidente em certos casos de ironia. Durante a leitura e a seleção das matérias
56
O jornalismo pode ser dividido em três gêneros: informativo, interpretativo e opinativo. Apesar
dessa divisão, as fronteiras são tênues, se não inexistentes. O jornal expressa em suas páginas sua
linha editorial, assim como cada jornalista, fotógrafo, designer, entre outros profissionais que ali
trabalham. Nesse sentido, o jornal pode ser considerado como um veículo opinativo do início ao fim
porque cada matéria é produzida a partir de um viés subjetivo de escolha de enfoque, por exemplo,
para citar apenas um aspecto das possibilidades subjetivas de escolha. Este trabalho optou em
analisar apenas o material informativo, que pode ter a forma de notícia ou reportagem, no conceito
tradicional desses termos, mas considera que o jornal expressa sua opinião no conjunto do projeto
gráfico e editorial (BELTRÃO, 1980; RABAÇA e BARBOSA, 2001; LIMA, 2004; HERNANDES, 2006).
93
páginas, é muito extenso para ser analisado em uma pesquisa que pretenda atingir
um nível de análise que leve a resultados tangíveis. Por isso propõe-se, para este
explica Fontanille:
pesquisa, com o intuito de eleger representantes das páginas dos jornais a serem
sentido que o leitor terá ao ler essa página que expõe uma fotografia de uma criança
suja, magra, solta no chão, com um cenário pobre, junto a um texto verbal sobre a
política dos bancos mundiais para com os países em desenvolvimento, por exemplo.
57
Esses temas se entrecruzam obviamente; por exemplo, a discriminação social e racial podem estar
inseridas no item guerra ou violência urbana. A separação aqui é puramente metodológica e atende a
critérios de predominância de um foco semântico.
94
assassinadas por uma guerra sem fim. Muitas dessas fotografias que representam a
na acepção de Barthes58.
mostram uma situação dramática. Um evento sazonal traz mais elementos para esse
grupo: a Copa do Mundo 2006. A imprensa fez muitas reportagens especiais, nas
quais os países da África, que participaram da Copa do Mundo, tiveram sua história
Brasil, porque o país viveu momentos difíceis durante o período pesquisado para
Outro evento sazonal que recebeu atenção dos jornais analisados foram as
2006.
se à sua análise, com base nas categorias de análise elaboradas a partir de dados
CATEGORIA 1 - VIOLÊNCIA
VIOLÊNCIA DE GUERRA
FIGURA 9 – MATÉRIA 1
da página está o nome da seção do jornal, Mundo, em cor azul. Uma faixa azul59,
(Bush faz visita-supresa ao Iraque Pág. A10) para uma matéria nas páginas internas
do caderno Mundo. Apesar de o “navegador” azul apontar para outra matéria, ele
termina na fotografia principal, o que pode ser entendido como um “fio condutor” de
leitura que leva à foto e vice-versa. O título da matéria, que abre a página, Israel
mata 11 em Gaza, na ação mais violenta em 4 anos, ocupa três linhas e três
colunas, e tem alinhamento à esquerda. O subtítulo Alvo era van com militantes que
de tamanho menor do que o título, também está alinhado à esquerda, e ocupa duas
59
A “faixa azul” é denominada no novo projeto gráfico da Folha de “navegadores”. Eles estão
presentes sempre nas capas dos cadernos, correspondendo a sua cor, com o objetivo de auxiliar o
leitor a identificar as principais notícias da editoria.
60
A “lupa”, uma das modificações realizadas no projeto gráfico da Folha em maio de 2006, é uma
nova entrada de leitura das reportagens principais da Folha para destacar mais elementos
importantes da matéria antes do início do texto.
100
principal, sob o título Para europeus e islâmicos, ação dos EUA no Iraque é risco
maior que Irã, e subtítulo Maioria em dez países crê que guerra ao terror piore
colunas no lado direito inferior da página, o primeiro ocupa duas linhas e o segundo,
uma linha. Tanto a matéria principal quanto a segunda são assinadas como DA
REDAÇÃO, em caixa alta, sem negrito, e no fim de cada texto está a observação em
duas autoridades entre aspas e apresentar os “dois lados” do fato. Todas essas
vertical, com a legenda Palestino durante o enterro de uma criança morta ontem na
uma publicidade do jornal Valor Econômico, com o qual o Grupo Folha tem
publicidade, separada do material jornalístico por fios61 finos pretos, tem 26 cm.
61
Linha usada para dividir os diferentes textos no jornal, como artigos de opinião, notícias,
reportagens e também elementos gráficos. Também pode ser chamado de filete.
101
diferentes. Cria-se, com isso, um efeito de ambivalência, que faz pensar sobre a
possível fazer relação com a religião islâmica, o que implica conhecimento cultural
do leitor, pois, como explica Guimarães (2003, p. 45), a cor verde está presente na
na maioria das vezes não é percebida pelo leitor” (2003, p. 47). A utilização da cor
verde também pode ser apontada como um recurso estético para a composição da
o jornalismo.
dia mata mais civis e, também, mais crianças. A foto foi feita em perspectiva,
morta que está em primeiro plano62, enrolada em uma bandeira suja de sangue, com
62
O primeiro plano “é onde ocorre a fotografia. O primeiro plano é o que dá interesse à fotografia. Na
maioria dos casos é no primeiro plano que devemos colocar o foco e ajustar a profundidade de
campo. É do primeiro plano que deve sair a linha de condução da foto” (RAMALHO e PALACIN,
2004, p. 155).
102
fazem com que a criança pareça grande aos olhos do leitor, maior do que é, o que
criança que aparece na foto está morta realmente, o que pode despertar a emoção
aproximação entre o sentimento do palestino que sofre pela morte da criança com o
linhas que acompanham o corpo da criança, que são percebidas por meio do pano
63
O ângulo de tomada “é o ângulo que adotamos entre a câmera e o sujeito. Temos três ângulos
básicos: picado, normal e contrapicado. O ângulo de cima para baixo, ou picado, diminui o objeto. O
ângulo normal tem um efeito neutro. O ângulo de baixo para cima ou contrapicado aumenta o objeto”
(RAMALHO e PALACIN, 2004, p. 162).
64
Escala é o uso “de perspectiva para dar importância e senso de profundidade [...]. Coloque algum
elemento identificável para que o assunto possa ser medido” (RAMALHO e PALACIN, 2004, p. 167).
103
sua própria definição, ou seja, pela “imagem” que faz de si mesmo, assim como pela
“imagem” que o outro faz do homem, e também pelo reconhecimento das diferenças
(2002, p. 9). Por isso, sentir a presença do outro, nesse caso, a criança morta, tem o
poder de fazer o homem parar e ser mobilizado pela leitura da imagem, dada a
das palavras de Landowski (2002, p. 9), que “de um discurso com pretensão racional
um discurso do afeto puro e simples”. Desse modo, é possível verificar que essa
e termina em seus pés, usando cores claras. O primeiro quadro apresenta a criança
foto, encontram-se três crianças aos pés da criança morta, tendo duas delas olhares
65
“[...] à distância entre os pontos nítidos mais próximo e mais afastado do ponto focado chama-se
profundidade de campo. Em termos simples, a profundidade de campo é a zona nítida da imagem,
em termos de profundidade. [...] A utilização expressiva da profundidade de campo é comum em
fotojornalismo. Uma pequena profundidade de campo pode servir, por exemplo, para relevar objetos
em relação ao fundo e ao(s) primeiro(s) plano(s). Uma grande profundidade de campo é importante,
por exemplo, na fotografia de paisagens” (SOUSA, 2004, p. 76).
104
sentado, com a cabeça baixa e as mãos sobre o rosto. As cores são escuras e agem
faz com que as pessoas que estão aos pés da criança pareçam pequenas.
corpo da criança podem proporcionar mais de uma leitura: uma poderia ser a de
uma faixa de pano branco e um pedaço da bandeira amarela, que aparecem do lado
já descrito, que é utilizado pelo jornal para provocar a leitura subjetiva, ligada à
ordem do sensível, pois a direção do olhar faz um percurso linear de baixo para
corrobora para que o leitor “leia” a foto e depois desloque seu olhar para o texto. A
“faixa azul” pode servir como “fio condutor” para a primeira leitura da fotografia, no
sentido da atração da cor e por terminar na foto, como também pode contribuir para
Depois de ser atraído pela fotografia e ter sido despertado por aspectos
informações sobre a criança ou as crianças que vivem naquele lugar e que morrem
todos os dias vítimas da violência da guerra. Também não vai encontrar nenhum
depoimento ou história que relate algo sobre a morte das crianças nessa guerra.
Embora o subtítulo e o lead relatem a morte de duas crianças, o texto verbal relata a
morte das duas crianças e dos três socorristas, em forma de relato objetivo e
rapaz de 30 anos conta que ele morreu enquanto tentava acalmar as crianças da
vizinhança, que estavam nervosas por causa do barulho dos disparos. O jornal
oferece o nome do pai e do rapaz, mas não há referências dos nomes das crianças
66
O enquadramento ou formato da fotografia “diz respeito à colocação do assunto em um retângulo
vertical ou horizontal. O tamanho, a forma e a natureza do assunto diz qual é a melhor orientação da
cena” (RAMALHO e PALACIN, 2004, p. 166).
106
fazer essa relação entre o verbal e a imagem que está ao lado. Se a imagem chama
o leitor e o comove, fazendo com que ele volte seus olhos para o texto verbal, os
impulso de leitura da matéria principal para saber mais sobre essa situação.
verbal, pode-se dizer que a fotografia utilizada nessa matéria tem como função ser
um elemento para despertar no leitor o sentido de disforia, para que ele continue a
leitura e mantenha-se ligado ao jornal. Como reflete Barthes (1990, p. 20) a respeito
que pode fazê-lo desistir de ler o jornal ou aquela matéria. A relevância dessa
análise, assim como as outras que serão apresentadas, está em demonstrar quais
da página para verificar as estratégias usadas pelos jornais para atrair e despertar a
CATEGORIA 1 - VIOLÊNCIA
VIOLÊNCIA DE GUERRA
FIGURA 11 – MATÉRIA 2
o tema que será tratado na página. Logo abaixo do “chapéu” está uma seqüência de
de tinta, acusam governo de ter sangue nas mãos. Os créditos das fotografias são
da Folha. O título ocupa uma linha, assim como o subtítulo Artilharia israelense
atinge bairro residencial em Beit Hanun, no pior ataque nos territórios palestinos em
Sanah e de suas filhas Rima (D) e Ala no necrotério de hospital em Beit Hanum, na
Faixa de Gaza: oito crianças e sete mulheres estão entre os mortos. A legenda
67
Palavra, nome ou expressão, sempre destacada com negrito ou sublinhado, usada geralmente
acima do título e em corpo pequeno, para caracterizar o assunto ou personagem da notícia. Pode ser
chamado também de cabeça.
112
utiliza o negrito e a caixa alta para fazer chamada na foto e utiliza a letra D, entre
parênteses, para indicar que aquela criança está à direita na fotografia. O crédito da
duas abaixo dela. A matéria é assinada por Daniela Kresch, escrito em corpo normal
e em negrito. Abaixo está especificado, em caixa alta e sem negrito, Especial para o
infográfico. Sinalizado pela faixa verde, entre fios, o infográfico tem o título Onde Foi,
em caixa alta e cor branca. Abaixo do infográfico há a citação da origem dos dados
Governo israelense dá 24h para Exército se explicar, que ocupa três colunas, ao
lado direito da página. O texto verbal inicia com três pontos vermelhos como marca
responde pedindo ataques a americanos ocupa uma linha e cinco colunas, assim
seqüência de fotografias abrir a página, que tem ao todo seis imagens, acredita-se
que é a fotografia da matéria principal que chama a atenção do leitor por ocupar o
113
maior espaço entre todas as imagens na página e por expor a morte de uma mulher
e duas crianças. O rosto da mãe está em primeiro plano, ocupando o centro do eixo
D da regra dos terços68, é o rosto da criança maior, que está virado para o lado
esquerdo da foto, que prende o olhar do espectador. Essa criança está no centro da
fotografia, junto com um pedaço de pano (não dá para saber se é uma peça de
roupa ou um lençol) marcado pelo sangue das vítimas. A segunda criança, a menor,
está localizada no quadrante central superior da fotografia, o que torna sua imagem
destacada na imagem. Sem aplicar a regra dos terços, o olhar recai diretamente nas
gaveta, a maca e um espaço não preenchido por objetos nos cantos esquerdo e
de cima para baixo, que tende a diminuir, desvalorizar, ou, nesse caso, mostrar a
chocante para obter o nome e sobrenome das crianças e da mãe mortas na legenda
vínculo já foi estabelecido pela força da imagem, que mostra a família morta ainda
68
A regra dos terços “foi criada há muito tempo, lá pelo século XIV durante o período conhecido como
Renascença. [...] para usar essa regra é [preciso] dividir a cena em três linhas verticais e horizontais
[...]. A interseção das quatro linhas cria quatro pontos focais [...]. Esses pontos são o centro passivo
das atenções para quem olha uma cena. [...] A regra dos terços nos diz para colocarmos o assunto de
maior atenção em algum dos terços da cena. Não é necessário ocupar todos os pontos ou linhas,
mas situar em algum deles o elemento principal da foto. [...]” (RAMALHO e PALACIN, 2004, p. 157).
114
fotografia, que corresponde ao fundo da gaveta do necrotério, faz com que o leitor
expressão é de choro. Por ser uma imagem de violência, portanto chocante, o leitor
Oriente Médio pelos mantos que cobrem a cabeça. Em seguida, o olhar recairia para
mais uma imagem de protesto, na qual se destaca uma mulher com a bandeira de
Israel com uma mancha vermelha, compreendida pelo leitor como uma mancha de
sangue. O leitor só saberá que a marca vermelha na bandeira é tinta e não sangue,
olhar do observador recairia na fotografia principal, que mostra a mãe e suas duas
seqüência de fotos na abertura da página, destaca a cor verde, que, como já foi
modo, a leitura inicia por uma das imagens de violência, que leva o leitor ao texto
provoquem o leitor para iniciar seu percurso pela página por essa imagem,
Faixa de Gaza, não deveria ser alvo da guerra. Os recursos utilizados pelo jornal
para mostrar como o ataque foi “absurdo” e “incompreensível” foram o registro das
autoridades. A ênfase maior está nos dois primeiros parágrafos que registram a
resposta às perguntas do lead (o quê, quem, quando, onde, como e por quê) e a
de Hernandes (2006),
mesmo nome. Nesse texto, ele faz crítica a uma exposição de fotos-choque em
Paris, afirmando que esse tipo de fotografia não provoca nenhum sentimento no
Barthes, para que o leitor possa participar da leitura da fotografia. Acredita-se que a
seja, o caráter de “natural” que essas fotografias recebem na sociedade, que faz
117
com que o observador reflita sobre a imagem e a informação que traz. Nesse
proporcionem reflexão por meio de sua “naturalidade”, mas que, de alguma maneira,
reflexão. O mais importante para o autor é que o observador seja instigado a refletir,
fotógrafo.
Margarita Ledo também reflete sobre as fotos-choque e diz que esse tipo de
sentimento de dor, piedade ou terror, e não conseguisse passar disso. Por outro
lado, Sontag (2003) afirma que a busca do choque por meio da fotografia jornalística
69
Do original: “La denotación pura, la imagen „que suspende el lenguaje y bloquea la significación‟, la
imagen que, desde un punto de vista antropológico, nos conduce a las leyes de proximidad psico-
afectiva, en relación con la idea de la muerte y con la creencia determinista de sumisión a las fuerzas
de la naturaleza, si la vinculamos con la categoría „castigo‟, es una de las de mayor éxito cuando se
conjuga con situaciones depresivas y de indefensión”.
118
preciso mostrar essas realidades para que as pessoas reflitam e resolvam tomar
imagens „chocantes‟, que pode causar a saturação do olhar, fazendo com que as
pessoas tornem-se insensíveis às imagens ou mesmo aos fatos. Baitello Jr. (2005,
p. 20) afirma que o excesso de imagens de todos os tipos causa uma “[...] fadiga
[que] se instala no olhar que já não vê o que avista, já não enxerga o que vê, já não
anima o que enxerga”. Além disso, Caetano e Fischer (2006) apontam que a
Essa dificuldade em “enxergar o que se vê” pode ser apontada como um dos
imagens que pode impedir que a fotografia toque seu público e o faça refletir. A
imagem explícita, exagerada e, muitas vezes, grotesca pode tornar tão forte a
imagem para o público observador, que o impede de perceber nessa foto elementos
para reflexão sobre o tema ou acontecimento retratado. Ainda pode-se refletir sobre
os efeitos de sentido gerados pelo produto final do jornal impresso, isto é, pela
conotada.
119
ser classificada como foto-choque, foi utilizada como elemento capaz de despertar
mundo. O texto verbal ancorou-se na fotografia para atingir o leitor e conquistar sua
leitura por meio do uso da imagem da criança, que remete à idéia de cuidados
afetividade no leitor.
120
A fotografia da mãe Sanah e das filhas Rima e Ala também foi publicada no
mesmo dia pelo jornal Folha de S. Paulo. No entanto, não foi fotografia idêntica,
tinha outro plano e mais um personagem: um homem que mexe nos corpos da
mulher e das crianças. E não é essa a única diferença. O tom da legenda e do texto
agência Reuters, é o autor da foto, que tem como legenda Homem observa corpos
de uma mulher palestina e de duas filhas dela, vítimas do ataque israelense em Beit
Hanoun, em Gaza. Essa legenda não oferece o nome da família, nem da mulher e
das crianças. Sob o título Israel mata 8 crianças em Gaza, e Hamas cobra revide, e
agirem contra israelenses, o texto verbal conta que o bombardeio matou ontem 18
pessoas, entre eles 8 crianças e 5 mulheres, e feriu mais 58 pessoas, mas não se
Hanun, e para a Folha é Beit Hanoun. Enquanto para o jornal O Estado de S. Paulo
S. Paulo não usa a fotografia como estratégia de opinião. Ambos os jornais apelam
CATEGORIA 1 - VIOLÊNCIA
VIOLÊNCIA ECONÔMICA
FIGURA 17 – MATÉRIA 3
Logo abaixo dessa fotografia vem a matéria principal, sob o título Número de
refugiados é o menor desde 1980, diz ONU, e subtítulo Relatório mostra, porém, que
houve aumento dos deslocados em seus próprios países. O título ocupa duas linhas,
quatro colunas e está alinhado à esquerda, e o subtítulo tem apenas uma linha na
largura de quatro colunas e está justificado. O texto da matéria principal ocupa cerca
caixa alta e sem negrito. Com essa disposição, a imagem tem um papel de destaque
com um quadro intitulado Deslocados do mundo, que está separado do texto por fio
médio preto e caixa cinza para o título em preto, o fechamento do quadro é feito com
normal negritados.
mesmo tema, que ocupa quatro colunas sob o título Brasil recusa 60% dos pedidos
padrão da caixa alta com negrito para o nome do autor e caixa alta sem negrito para
padrão de caixa alta e normal negritado (Sexo). A quarta coluna é ocupada por um
O canto inferior direito é ocupado por um texto noticioso sem imagem e por uma
nota informativa também sem imagem. A página fica, então, contaminada pela
mulheres vestem mantos que cobrem sua cabeça. Algumas crianças vestem
camisas abertas e duas crianças estão sem camisa. Bem no centro da fotografia, em
primeiro plano, há uma mulher coberta por um manto, que abraça um menino, que
está com a cabeça virada para trás e tem os olhos fechados. Não se consegue
desviar o olhar desse menino que não olha, que não vê, e espera, cansado e com
127
comentadas anteriormente, essa foto não retrata pessoas mortas e, sim, mulheres e
violência explícita, mas é o olhar de cada mulher e de cada criança que apresenta
vivem. A legenda informa sobre essa espera. Se não fosse ela, o observador não
saberia o que aquelas pessoas estavam fazendo nem de onde são. Porém, o
superfície da imagem estão preenchidas com tomada em primeiro plano. É isso que
estão em sua memória, pois, em sua maioria, conhece a realidade dos povos de
outros países por fotografias publicadas pelos jornais, ou pelas imagens veiculadas
128
compreender a que se refere a imagem. O texto verbal, por sua vez, não faz
das Nações Unidas (ONU), o universo dos refugiados seja composto de 25% de
segue como se estivesse acompanhando uma onda, para cima e para baixo. Como
diz Flusser (2002, p. 8), o olho percorre circularmente a fotografia e, por isso “o olhar
tende a voltar sempre para elementos preferenciais. Tais elementos passam a ser
primeiro está relacionado à data da produção da foto. O crédito indica que a foto foi
seu texto verbal trata de um relatório divulgado no dia anterior, ou seja, no dia 9 de
70
Muitos brasileiros também só conhecem as diversidades culturais do seu próprio país por meio dos
meios de comunicação, principalmente pela fotografia e pelas imagens veiculadas na TV.
129
de qual seria a razão, diante de tanta tecnologia, pela qual ainda se publiquem
tantas imagens “antigas” nos jornais, pois se verifica que o leitor, ao comprar um
jornal, procura notícias novas e atuais, referindo-se não apenas ao texto verbal, mas
hoje boa parte dos jornais do nosso contexto mais imediato oferecem uma abertura
informativa de meia página com uma fotografia extraída de arquivo. Talvez seja uma
boa instantânea, mas não é de atualidade”71 (LÓPEZ, 2004, p. 91). Nesse sentido,
pode-se concluir que o jornal reabilita uma foto antiga em um contexto ao qual ela
não pertence e que esse recurso deve-se à estratégia de utilizar a imagem como
citado no capítulo 2 desta dissertação, propõe que cada fotografia venha sempre
ancorada de informações específicas sobre seu contexto, para que o leitor não
jornal. Sontag (2004), ao refletir sobre a criação dos livros de fotografia, refere-se às
71
Do original: “Compruébese que aún hoy buena parte de los periódicos de nuestro entorno más
inmediato ofrecen una apertura informativa de media página con una fotografía extraída del archivo.
Quizás sea una buena instantánea, pero no es de actualidad”.
130
recontextualizada pode adquirir outros efeitos de sentido, pois “Uma foto é apenas
à deriva num passado flexível e abstrato, aberto a qualquer tipo de leitura (ou de
Sontag (2004), essa é uma característica da fotografia: encontrar o belo onde nem
brasileiro Sebastião Salgado. Para a filósofa, “De fato, o triunfo mais duradouro da
da fotografia despertam o leitor para a beleza da fotografia, o que não impede que
CATEGORIA 1 - VIOLÊNCIA
VIOLÊNCIA ECONÔMICA
FIGURA 19 – MATÉRIA 4
o título Balanço, que traz notas informativas sobre temas ligados à editoria e ocupa
seis colunas, com aproximadamente 7,5 cm de altura. Um fio grosso e um fio fino
título Brasil ganha mais com alta de preços e, em seguida, o subtítulo FAO diz que
importação mundial de alimentos deverá chegar a US$ 388 bi este ano, ante US$
379 bi em 2005. Os dois ocupam seis colunas e uma linha cada. A matéria é
assinada e não há indicação de ter sido feita com o auxílio de agências de notícia. A
matéria, texto verbal e fotografia, ocupa quatro colunas. O “olho”72 da matéria está
entre fios finos duplos e em negrito. Há apenas um entretítulo no texto verbal (Maior
quadro que se abre com uma faixa marrom, separado do texto verbal principal por
fios finos e pretos, que contém o título Números em caixa alta e cor branca.
como a Somália, são os que mais sofrem com aumentos. A fotografia mostra
72
O “olho” é um “Intertítulo ou pequeno trecho destacado da matéria, diagramado em corpo maior e
colocado em janelas da composição corrida” (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 522).
135
com uma camiseta grande para o seu tamanho, está sentado em cima de um saco,
das roupas das mulheres que estão atrás do menino, o que evidencia um tratamento
do céu e marrom-claro da terra; a presença da cor laranja nas roupas das mulheres
contrastam com a cor escura da pele e também com os tons claros do céu e da
terra. O saco, no qual o menino está sentado, que deve ser de alimento, dá ao leitor
dele há uma outra mulher sentada sobre dois sacos e outra em pé, com uma
criança, menor do que o menino, no colo. Traça-se uma linha ascendente do rosto
do menino até o rosto da mulher que está em pé. O desenho no saco do alimento é
cortado pela fotografia, mas deixa entrever as cores vermelha, branca e azul,
memória, formada por imagens, da situação que o jornal está tratando. Além disso,
mostra ao leitor uma criança triste, com olhar vago, sem possibilidades de mudança.
mesma situação, que agrida nessa fotografia. Rever essa imagem faz com que o
Como diz Sontag (2003), toda memória é individual, entretanto, ao longo da história,
muitas imagens foram feitas e expostas, a fim de construir “nossa idéia do presente
e do passado imediato” (p. 72). Por isso, muitas imagens têm o poder de fazer o
observador prestar atenção em uma fotografia, pela lembrança que ela invoca em
especificamente à Somália, país que esteve presente de modo massivo nos grandes
africano, mais freqüentes. Nesse caso, pode-se pensar que a fotografia foi escolhida
para ilustrar a matéria, porque não haveria imagem atual e/ou de ação para publicar,
mas, sobretudo, a escolha por essa foto passa pela necessidade de criar vínculo
com o leitor, por meio de relações intersubjetivas, como seu conceito de criança e,
CATEGORIA 1 - VIOLÊNCIA
VIOLÊNCIA URBANA
FIGURA 21 – MATÉRIA 5
mortos por policiais desde o fim de semana tem ‘longa ficha criminal’ e a manchete
PM diz que não matou inocentes ocupam as seis colunas da página. Logo abaixo do
Elba, policial dá cobertura a colegas durante ação que envolveu 400 homens,
acompanham a ação.
correlatas ao tema dos ataques do PCC em São Paulo. Abaixo da fotografia está
uma matéria sem imagem, que ocupa quatro colunas. Abaixo do texto verbal ligado
à manchete há uma matéria também sobre os ataques do PCC, em São Paulo, sem
colo, mais ao lado direito. O rosto da criança está virado para o policial, que está
entre a parede e o jovem que se apóia com a mão no carro, bem no centro da
fotografia. Esse policial está com a arma apontada para a frente. Compõe a cena,
ainda, uma mulher que está em frente ao homem, com a criança no colo, e em frente
de que parece que o policial está apontando a arma para a criança, que está no colo
mensagem visual é essa: o policial parece apontar a arma para a criança, que está
Há uma ligação entre a foto e a manchete, que salta aos olhos do leitor. É a
junção do verbal e do visual que dão maior sentido para a matéria. Ao dizer na
manchete que a PM afirma não ter matado inocentes na semana anterior, a foto
demonstram medo ou insegurança por estar diante de um policial armado. Será que
os moradores desse lugar estão tão habituados à violência que não sentem medo de
um policial armado tão perto deles? Será que o homem que segura a criança no colo
não tem medo que o policial possa atingi-la acidentalmente? Ou a foto seria uma
142
produção do fotógrafo, uma montagem para conseguir uma boa foto? É difícil para
um repórter, seja ele fotográfico ou não, acompanhar a ação da polícia, porque ele
também corre o risco de ser atingido pelas balas dos policiais ou dos bandidos.
Nesse sentido, a foto poderia ser “arranjada”. Essa é uma possibilidade, mas não se
tem como confirmá-la, nem interessa para o analista de imagem. O que é relevante
É certo que o policial não está apontando a arma para o rosto da criança. O
ângulo escolhido pelo fotógrafo passa essa mensagem para o leitor, mas o texto
verbal não indica essa situação. Porém, esse primeiro olhar dado pelo leitor
disse Barthes (2005, p. 197), em texto escrito em 1977, “A foto, como a palavra, é
uma forma que quer dizer de imediato alguma coisa”. Nesse caso, o recurso à ironia,
tanto da foto quanto de sua vinculação com o verbal, é que inscreve a “imediatez
(CAETANO, 2006).
143
CATEGORIA 1 - VIOLÊNCIA
VIOLÊNCIA URBANA
FIGURA 23 – MATÉRIA 6
publicada no caderno Aliás, que tem como objetivo realizar a análise dos principais
fatos ocorridos durante a semana. São Paulo, naquele período, vive o momento dos
colunas. O uso do negrito para destacar algumas informações da “lupa” podem ser
Como há muito texto na página e pouca cor, a fotografia fica responsável por
para baixo, e no lado direito da foto, em segundo plano, está um homem com uma
criança no colo. Atrás deles há uma mulher (lado direito) e um homem (lado
utilizado por bandidos e não por homens da polícia. Quando usado pela polícia,
representa uma situação de gravidade extrema, quase uma guerra 73. O olhar de lado
do homem que segura a criança no colo para o soldado mostra esse sentimento
confuso de não saber bem o que fazer ou em quem confiar. A criança, no colo, com
seus braços em volta do pescoço do pai, é a única da fotografia que olha para o
soldado é grande e tem o rosto coberto, o que configura uma zona escura na
junto com eles ou não) passa a idéia de família. Unindo a isso o fato de a criança
está passando a família brasileira. Assim, aqui a criança assume um papel diferente
São Paulo porque o jornal considerou que a foto poderia representá-lo bem. A
de uma idéia de terror, claramente dada por todos os elementos citados, ratificada
73
Essa representação pode ter sido modificada com o conhecimento dos soldados do Bope,
massificado, principalmente, pelo filme Tropa de Elite, de José Padilha, lançado em 2007.
148
CATEGORIA 2 - POLÍTICA
FIGURA 25 – MATÉRIA 7
que sorri, em cima de uma bicicleta, ocupa três colunas e está na vertical. A legenda
de uma criança em S. Paulo. O texto verbal dessa matéria ocupa apenas a primeira
partido, nas cores que o representam, amarelo e azul. Logo abaixo da fotografia
principal, há outra fotografia, que abre outra matéria sobre a campanha da candidata
com crianças, não faz nenhuma referência. O curioso dessa fotografia é que ela foi
que se trata de uma fotografia que segue os princípios do marketing político para
estratégia mais sutil para atingir o leitor. A relação entre a promessa do candidato
o futuro e a criança representa esse futuro para a sociedade como já foi apontado no
[...] a imprensa dispõe hoje em dia de recursos técnicos que lhe permitem
não apenas nos informar, pela escrita ou pela fala, sobre as „posições‟
políticas que exibem os homens do poder. Graças à fotografia, mesmo a
imprensa „escrita‟ está em condições de captar, além disso, e de nos fazer
sentir diretamente as „posturas‟ – também elas políticas, mas em um nível
mais profundo – que eles adotam corporalmente (p. 52).
CATEGORIA 2 - POLÍTICA
MATÉRIA 8 – Cabral vai hoje a Lula por verbas para Pan e renegociação da dívida
154
FIGURA 27 – MATÉRIA 8
MATÉRIA 8 – Cabral vai hoje a Lula por verbas para Pan e renegociação da dívida
República, para resolver questões essenciais para sua gestão, como a liberação de
eleitores”.
crianças no Jardim Botânico: governador eleito quer reduzir custeio do Estado pela
do marketing político.
74
Publicidade é aqui compreendida como comunicação persuasiva, que utiliza técnicas específicas
para influenciar a opinião, o sentimento e a atitude de um determinado público. Segundo o Dicionário
da Comunicação (2001, p. 598), “em geral, não se fala em publicidade com relação à comunicação
persuasiva de idéias (neste aspecto, propaganda é mais abrangente, pois inclui objetivos ideológicos,
comerciais etc.); a publicidade mostra-se mais abrangente no sentido de divulgação (tornar público,
informar, sem que isso implique necessariamente persuasão)”. Apesar de serem apontadas
diferenças entre propaganda e publicidade, considera-se para esta pesquisa a tendência de as duas
expressões serem utilizadas no mesmo sentido, no Brasil, também apontada no Dicionário da
Comunicação (2001, p. 598).
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Do original: “[...] una parte del fotoperiodismo – especialmente los retratos de famosos que
categorizamos como people -, se ha impregnado de los procedimientos de fotogenia de la fotografía
publicitaria a partir de un acercamiento al estilo claro, limpio y de gran calidad formal, tradicional en la
publicidad”.
157
fotografias de imprensa, o que, segundo Baeza (2001), tem sido feito sem reflexão,
governador. Como diz Sontag (2003, p. 100), “havia uma enorme e insuperável
criança de cada lado de seu rosto, beijando-o. As cores das camisetas das crianças,
amarela e vermelha, dão o tom final para esse caráter híbrido da fotografia, entre o
durante o período das eleições 2006), para despertar a atenção para a reportagem,
“efetivamente” com o texto verbal, depois de ter sido “atraído e conquistado” pelo
objeto. Nesse sentido, pode-se considerar que a matéria analisada provoca a junção
utilizando a criança para criar uma imagem para o próprio político, de afeto,
esperança e cuidado.
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“O termo disjunção é utilizado para denominar os critérios que permitem a introdução do
descontínuo na continuidade sintagmática do discurso. Falar-se-á, assim, de disjunções gráficas,
espaciais, temporais, actoriais, lógicas, tópicas, tímicas, etc.” (GREIMAS; COURTÉS, s.d., p. 130).
77
“Denomina-se junção a relação que une o sujeito ao objeto, isto é, a função constitutiva dos
enunciados de estado” (GREIMAS; COURTÉS, s.d., p. 249).
159
S. Paulo. A cada uma poderia ser dada uma leitura, iniciada sempre pela fotografia.
criando um vínculo emocional com o jornal. Com o intuito de apenas mostrar outros
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Das duas principais funções de relação descritas por Barthes (1990) entre a
sentidos para atrair o leitor nos âmbitos cognitivo e afetivo, pela articulação entre o
verbal e o não-verbal.
que por isso necessita de cuidados especiais, é muito utilizada nos jornais Folha de
no leitor. Desse modo, é possível afirmar que a representação visual da criança nos
jornais tem como objetivo a utilização da criança como vetor cognitivo e afetivo para
qual foram selecionadas aproximadamente 500 matérias, foi possível detectar que a
Folha utiliza mais a imagem, desde a fotografia como outros recursos gráficos,
perceber também que a fotografia tem sua qualidade preservada na Folha, devido à
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para outra. Por exemplo, nas matérias do Estadão e da Folha (Categoria Violência
de Guerra – Matéria 2), que utilizam fotografias similares, percebeu-se que, apesar
piedade e terror são despertados no leitor, por meio de uma construção visual
crianças e, sim, o registro do fato, relatando como foi o conflito, por que aconteceu e
que providências serão tomadas para não mais acontecer ataques surpresa como o
violência sofrida por outra criança, que pode despertar no leitor sentimento de
impotência em relação aos cuidados com a infância. Pôde-se observar que, nos
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últimos dois anos (2007 e 2008), as fotografias utilizadas para mostrar a violência
urbana trazem a criança de forma mais presente, principalmente nas matérias que
tratam da violência nas grandes cidades como São Paulo e Rio de Janeiro. Embora
mesmo vítima direta da violência nos jornais analisados não deixa ver o sangue e as
Como foi visto na primeira parte desta pesquisa, a partir da queda da taxa de
coletiva (a sociedade), qualquer pessoa, ao ler o jornal, seja ele pai, mãe ou não, se
sentirá também responsável e penalizado ao ver uma criança que foi morta em um
entre o leitor e o jornal, pautada pelo regime do sensível, com base no pressuposto
dos direitos da infância e dos cuidados especiais a ela requeridos. Desse modo, a
fotografia nessas matérias tem como objetivo estabelecer um vínculo emocional com
fotografia documental; a segunda tem seu principal aspecto ligado à memória das
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elemento em comum: em primeiro plano está a criança. Mais do que isso, é o rosto,
afetividade.
qual as crianças estão expostas, diante da falta de controle do Estado no que diz
população. A primeira imagem tem uma forte relação com o título da chamada de
adulto, que se supõe seu pai, que é a quem a criança recorre diante da imagem do
está na força policial armada, mas as crianças, que figuram como elementos
ressaltar que as matérias demonstram a guerra urbana sem sangue, sem violência
como essa situação se refletirá no futuro de quem ainda é muito pequeno e indefeso
para se cuidar sozinho. Como diz Sontag (2003, p. 72), “As fotos traçam rotas de
integrada com o político, mas as imagens não têm relação com o texto verbal das
matérias, que relatam o que, onde, quando e como os candidatos estão realizando
trazidas nas análises de cada eixo temático, há uma dinâmica relacional com o leitor
que sobredetermina todas elas, que ora se pauta pela dominância da “mediação
crítica” de caráter cognitivo, como nos casos em que se recorre à ironia, ora pela
O artista de rua inglês, conhecido como Banksy, tem uma ilustração na qual
faz crítica ao modo como a mídia, de maneira geral, trata o sofrimento da criança em
FONTE: <http://www.banksy.co.uk/indoors/media.html>
No entanto, seria ingênuo afirmar que a mídia só utiliza a criança para atrair
fotógrafo, o repórter e o editor, por exemplo, também são pessoas de seu tempo e
deixam refletir, nas escolhas e ações que efetuam, os seus próprios valores diante
desencadeadas pelo seu desrespeito nas relações sociais, pois, como dizem
Caetano e Lemos (2007, p. 6-7), “o fotógrafo se coloca sempre como alguém que
167
quer ver (...), ainda que seja para expor aquilo que normalmente não se vê ou que
A mídia não faz nada mais do que exponencializar tal sistema de valores
tomando as ações com (ou cometidas contra) a criança como fenômenos extremos.
infração contra o respeito e o gesto humanitário: por isso, tornam-se uma espécie de
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