Está en la página 1de 2

AINDA A VANGUARDA – Antonio Cícero Folha de São Paulo – Ilustrada – 31 maio

2008

Num artigo que aqui publiquei afirmei que tendo cumprido sua função, a vanguarda
acabou.(...) o feito principal da vanguarda enquanto vanguarda não foi de natureza
propriamente estética ou artística, mas cognitiva e, mais precisamente conceitual.
Não é que a partir da vanguarda a arte tenha ficado melhor do que era, mas que, sobre
ela, se aprendeu alguma coisa que não se sabia antes.
Deu-se um aprendizado, um progresso cognitivo após o qual se passou a saber algo
fundamental, antes não plenamente reconhecido, sobre a natureza da arte.
Com certeza, o divórcio mais célebre entre o feito conceitual e o feito estético de uma
obra não se deu no campo da poesia, mas no das artes plásticas. Refiro-me à “Fontaine”
o urinol que Marcel Duchamp pôs de cabeça para abaixo e expôs como arte. Como se
sabe, a partir de “Fontaine” e do conceito correlato de ready-made, foi profunda e
amplamente posto em discussão o próprio conceito da arte.
Ou seja, uma peça de valor artístico ou estético praticamente insignificante foi capaz de
ter uma importância conceitual incalculável.
Ora, evidentemente o valor conceitual de uma coisa está naquilo que ela ensinou, e não
nela própria.
É claro que nada impede que uma obra seja importante tanto do ponto de vista estético
quanto do ponto de vista conceitual.
Se o seu valor é puramente conceitual, porém ela não passa de um veículo para o que
ensina.
Logo que o que ensina é aprendido, ela passa a ser um mero exemplo do que ensinou,
dotado, no máximo de um valor histórico.
(...) A obra se torna supérflua. Assim quem quiser aprender sobre a Lei de Gravidade
fará melhor lendo um livro de física clássica do que os “Principia” de Newton, cujo
texto original tem hoje apenas um valor histórico.
Assim, também , hoje mais vale ler sobre “Fontaine” e ver as suas fotos do que
contemplar uma de suas réplicas (a obra “original” desapareceu há muito tempo).
O mesmo jamais poderia ser dito de uma obra dotada de valor estético, como “Lês
Démoisellles d´Avignon” de Picasso, ou o soneto “Salut” de Malarmé, cujas presenças
são insubstituíveis.
Supor que uma obra importante do ponto de vista cognitivo fosse necessariamente
importante do ponto de vista artístico ou estético foi um equívoco comum da vanguarda
e de seus admiradores.
Por outro lado, não perceber, ou negar que uma obra estética ou artisticamente
insignificante (“Fontaine” é o caso clássico) pudesse ter uma grande importância
conceitual e histórica, foi o erro dos detratores da vanguarda.
Não só o feito da vanguarda enquanto vanguarda foi primariamente conceitual, mas o
que com esse feito se aprendeu pode ser enunciado em poucas palavras. Aprendeu-se,
de uma vez por todas, não ser possível determinar nem a necessidade nem a
impossibilidade – em princípio – de que a arte empregue qualquer forma concebível.
Abriu-se para ela uma infinidade de caminhos possíveis, porém contingentes. O
“gênero” revelou-se como convencional e perdeu toda importância. A obra de arte não se vale
de direitos hereditários ou de prerrogativas de família. Isso não significa que todas as obras se
equivalham, mas que cada uma é antes um indivíduo do que um membro de uma espécie o
gênero e que é enquanto indivíduo que exige ser considerada.
Ora, o caminho até essas descobertas – que, no fundo, são o desdobramento de uma só – já foi
cumprido e não tem como se estender. Não é possível ir “além” ou voltar “aquém” delas. Nesse
sentido, não há mais vanguarda. O seu percurso já foi cumprido e nenhum artista o crítico
moderno pode dar-se ao luxo de ignorá-lo.
(...) Vanguarda é o destacamento que progredindo à frente do exército, abre caminho para este,
de modo, que analogamente, dizem-se vanguarda também os artistas que, progredindo à frente
dos demais, abrem caminho para estes, então essa designação só é de fato inteiramente
adequada aos artistas cujo progresso não pode deixar de ser reconhecido e assimilado pelos
demais.
Tal é o caso do progresso cognitivo que acabo de descrever, que não se dá na arte experimental
contemporânea.
Conceito: representação mental de um objeto abstrato ou concreto, que se mostra
como um instrumento fundamental do pensamento em sua tarefa de identificar,
descrever e classificar os diferentes elementos e aspectos da realidade. Segundo a
tradição racionalista da filosofia ocidental, de Platão (427-348 a.C.) a Hegel (1770-
1831), a manifestação da essência ou substância do mundo real.
Gênero: cada uma das categorias em que são classificadas as obras artísticas,
segundo o estilo e a técnica. Dicionário Houaiss.

También podría gustarte