Economia Social e Solidária e A Inclusão Dos Portadores de Transtornos Psicológicos No Mercado de Trabalho. Maira Aliane G. Pereira Armazém Das Oficinas
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Economia Social e Solidária e a Inclusão Dos Portadores de Transtornos Psicológicos No Mercado de Trabalho. Maira Aliane G. Pereira Armazém Das Oficinas
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Economia Social e Solidária e A Inclusão Dos Portadores de Transtornos Psicológicos No Mercado de Trabalho. Maira Aliane G. Pereira Armazém Das Oficinas
Economia Social e Solidária e a inclusão dos portadores de transtornos
psicológicos no mercado de trabalho. Maira Aliane G. Pereira (Armazém das
Oficinas)
Esse artigo tem como objetivo abordar a Cooperação Triangular Sul-Sul na
Economia Social Solidária, apresentando uma experiencia de inclusão social de portadores de transtornos mentais, através do trabalho e geração de renda.
A Cooperação Internacional para o desenvolvimento consiste na busca de
estratégias para combater as dificuldades ecônomicas e sociais, promovendo o intercâmbio de experiências entre os países em desenvolvimento, de forma sustentável e duradoura. Essa modalidade de cooperação técnica internacional surgiu no final da 2ª Guerra Mundial, quando teve início o processo de descolonização, durante o qual várias colónias de potências europeias ganharam a sua independência, mas a maioria deles se encontrava em estágio de extrema pobreza. Essa ajuda mútua entre países veio como uma alternativa para favorecer o desenvolvimento dos mesmos. O primeiro marco das relações da Cooperação Sul-Sul aconteceu em Bandung – Indonésia, em 1955 durante a Conferência Afro-Asiática, onde reuniu a maior parte dos países do mundo, promovendo a cooperação entre eles e os representando em fóruns multilaterais (como a ONU). Em 1978 a ONU criou uma Unidade de Cooperação Sul-Sul afim de fomentar o comércio entre os países em subdesenvolvidos, despertando o desenvolvimento econômico e só à partir de 1990 essa cooperação internacional começou à gerar maior influência sobre o campo do desenvolvimento humano, através não só do comércio, mas da melhoria social também. A UNPFA – que é o Fundo de População das Naçoes Unidas, é o organismo da ONU responsável por questões populacionais, é a agência de Cooperação Internacional para o desenvolvimento humano, que promove os direitos humanos, como o de se viver uma vida saudável, garantir oportunidades iguais à todos, formular políticas e programas de redução da pobreza, além de outras atividades. Desde 2002 a UNPFA Brasil desenvolve atividades dentro da Cooperação Triangular Sul-Sul, conhecida por ser um processo de articulação política e de intercâmbio econômico, científico, tecnológico, cultural e em outras áreas entre países em desenvolvimento (conhecidos até os anos 1990 como nações do Terceiro Mundo, e hoje chamados de Sul Global). Essa cooperação internacional é de extrema importância no desenvolvimento mundial e na melhoria da qualidade de vida dos seres humanos. Mediante à esse mecanismo coletivo que vem se tornando tendência mundial, é interessante considerar como funciona a Economia Social e Solidária e como ela pode agir na elaboração de novas políticas públicas e no intercâmbio de práticas e experiências entre os países em desenvolvimento. A economia Social e Solidária gera quantidade e qualidade de empregos e promove o desenvolvimento local. Pode-se dizer que é um conjunto de práticas econômicas de produção, oferta de serviços, comercialização, finanças e/ou consumo, baseados na democracia e na cooperação coletiva. É uma forma de organização e distribuição de riqueza, caracterizada pela igualdade e centrada na valorização do ser humano, e não pautada na valorização do capital. Ao invés de competir, todos devem trabalhar de forma colaborativa, unindo esforços e capacidades, buscando interesses em comum e partilhando os resultados. No empreendimento solidário não há patrões e funcionários, mas uma hierarquia de trabalhadores organizados coletivamente gerindo seu próprio trabalho no formato de autogestão e lutando por sua emancipação. A Economia Solidária ainda pode exercer influência em outras esferas para além da econômica. Ela também pode ser notada no campo da cultura, pois enfatiza o desenvolvimento local, incentivando o consumo consciente, destacando o desenvolvimento sustentável, alertando sobre a importância da conservação do meio ambiente, trazendo para a discussão o comércio justo, a tolerância e a coletividade. Isso é uma maneira simbólica de mudar do paradigma de competição para o da colaboração e da inteligência coletiva, livre e partilhada. Ainda avaliando onde a Economia Social e Solidária pode contribuir, chegamos à esfera política, onde ela pode ser considerada como um movimento social, que luta por uma forma inovadora de desenvolvimento e por uma mudança profunda na sociedade, tornando o ser humano a estrutura de maior valor, possibilitando empreendimentos construídos pela população a partir de valores como a solidariedade, a democracia, a cooperação, a presevação ambiental e os direitos humanos. O professor e autor Demo coloca a cidadania na raiz dos direitos humanos e da emancipação das pessoas, que é o progresso democrático possível. A centralização decorre do reconhecimento consensual de que o desenvolvimento não se restringe à questão do mercado, ainda que seja meio indispensável, mas considera os fins comuns da sociedade, como qualidade de vida, equidade e justiça social. Avanços decorrem dessas propostas no momento em que são reintegrados meios econômicos e fins sociais. À partir dos preceitos já vistos, temos como exemplo um projeto social, fundamentado na Economia Solidária que tem como objetivo a reinserção de pessoas com transtorno mental ao mercado de trabalho. Essa proposta de projeto teve início no Brasil em 1924, na cidade de Campinas SP, quando o Serviço de Saúde Cândido Ferreira, foi criado para atender portadores de transtornos mentais. Ao longo de sua história desenvolveu diversas alternativas de reinserção social dos pacientes e tornou- se referência em saúde mental no país em 1993, tendo como eixo fundamental a promoção dos Direitos Humanos. “Tratar o sujeito em sua existência e em relação com suas condições concretas de vida. (...)Isso significa não lhe administrar apenas fármacos ou psicoterapias, mas construir possibilidades (...) concretas de sociabilidade e subjetividade.” O Núcleo de Oficinas e Trabalho (NOT) nasceu à partir do setor de terapia ocupacional do Cândido Ferreira, utilizando à princípio a equipe e o espaço físico que compunham o referido setor, onde eram desenvolvidas as atividades de marcenaria, trabalhos com fios e pintura e montagem de prendedores de roupa. Já em 1993, poucos anos depois da implantação das oficinas, o sucesso já era grande, e fez-se necessária a criação de outra instância jurídica para atender as necessidades da unidade, que precisava agilizar, facilitar e administrar os recursos financeiros gerados pelas vendas, e distribuir aos participantes, mensalmente, a renda denominada “bolsa-oficina”. Por isso, neste mesmo ano de 1993, foi fundada a Associação Cornélia Vlieg, por usuários, familiares e trabalhadores do Cândido Ferreira e de serviços de saúde mental de Campinas, que propunham e acreditavam que na desospitalização e na construção de um novo modelo voltado para a humanização dos cuidados e para a defesa do direito à cidadania das pessoas com sofrimento mental, buscando unir trabalho, saúde, convivio social e cultural. A Associação viabiliza o funcionamento das oficinas de trabalho, odferecendo suporte administrativo para a compra de matéria-prima e comercialização dos produtos e serviços das oficinas. Todo um processo de reconstrução da assistência à saúde mental e de construção de modos diferenciados de atendimento ao portador de sofrimento mental é fundamentado na lógica antimanicomial, que valoriza o cuidado em liberdade, e no conceito de reabilitação psicossocial entendida por Saraceno como “um conjunto de meios (programas e serviços) que se desenvolvem para facilitar a vida de pessoas com problemas severos e persistentes de saúde mental.” Oito anos após a fundação da Associação Cornélia Vlieg, ocorreram reestruturações nos serviços de atenção à saúde mental, implantando novas atividades e ampliando as já existentes. Essa reestruturação resultou no crescimento da equipe e das oficinas e com isso, mais uma questão veio à tona: a necessidade de dar um nome à marca dos produtos e serviços das oficinas do NOT, que atualmente é chamada de ‘Armazém das Oficinas’, nome este que foi escolhido depois de muitas etapas de sugestões e votação dos oficiantes. “Esse dispositivo a que chamamos oficina é geralmente convocado quando se fala em “novas” propostas terapêuticas. Seu uso tem sido frequente para designar um amplo espectro de experiências terapêuticas e extraterapêuticas, de diferentes formatos e composições. O universo das oficinas não se define por um modelo homogêneo de intervenção e nem tampouco pela existência de um único regime de produção, ao contrário, é composto de naturezas diversas, numa multiplicidade de formas, processos, linguagens.” A renda gerada através da produção das oficinas é transformada em uma remuneração denominada ‘bolsa-oficina” e não é um valor fixo para cada oficineiro, mas sim o resultado das horas dedicadas à atividade e da avaliação de desempenho na função exercida no grupo, assim, o valor recebido pelos oficineiros varia de R$10,00 à R$700,00 por mês. Ainda em relação à renda, por mais insignificante que seja o valor recebido, ele tem um significado que transcende o real valor monetário, pois possibilita o aumento do poder de contrato dessas pessoas na rede de relações sociais e principalmente interfere nas relações familiares, tendo uma função muito importante na inclusão social. “A importância da venda dessa produção além de terapêutica é social, quando se transforma em geração de renda para o usuário, ampliando assim suas possibilidades de reinserção social” – como descrito no site do projeto. Analisando as perspectivas da Cooperação Internacional Sul Sul e a Economia Solidária na região de Campinas, poderia-se pensar em uma mostra, em formato de feira que proporcione ao participante não só a compra de produtos ou a contratação de serviços, mas também uma oportunidade de aprendizado. Através da concepção de espaços do nosso dia a dia, como um cômodo ou uma praça, existiriam conexões multidiciplinares, como palestras ou oficinas, que garantiriam a experienciação e o aprendizado em múltiplas áreas. O espaço seria projetado, construído, equipado e abastecido por diferentes profissionais. A feira seria como um agente aglutinador de idéias na busca de soluções sustentáveis, comércio justo e conciente e o fomento de conceitos de desenvolvimento sustentável. Constituída como uma pequena cidade, as atividades pensam o espaço, o convivío, o comércio, e a inteligência coletiva. A Economia Solidária no município de Campinas está alinhada à política Nacional e procura dialogar com as políticas transversais no âmbito municipal. Através do Programa Municipal de Economia Solidária, gerida pela Coordenadoria de Economia Solidária da Secretaria Municipal de Trabalho e Renda, atua em diversas frentes, como no financiamento de estrutura, na assessoria técnica, na articulação do movimento dos fóruns municipal, regional e estadual, na rede de gestores nacional, na comercialização e no processo de inserção dos trabalhadores e dos empreendimentos. Sua atuação se dá através de parcerias, convênios com instituições de assessoramento de cooperativas e associações, e também com universidades, sempre dentro dos princípios da Economia Solidária. Este Programa Municipal de Economia Solidária é dividido em quatro subprogramas, sendo o Programa de Resíduos Sólidos, que presta assessoria para 13 cooperativas singulares, uma associação de catadores, duas cooperativas de segundo grau (constituída por 3 ou mais cooperativas singulares) e uma associação de cooperativas; o Programa de Comércio Justo e Solidário, prestando assessoria para cinco feiras de artesanato, organizando artesãos e empreendimentos em associações, articulando a formação de uma rede de comercialização, promovendo parcerias para capacitação e qualificação dos artesãos; o Programa de Agricultura Urbana e Periurbana que fomenta e assessora tecnicamente dois grupos produtivos com base orgânica e agroecológica; e o Programa de Segmento e Produção, que atende grupos produtivos de produtos de vestuário e produtos alimentícios, que são cooperativas de confecção e de padaria. O fortalecimento desse movimento está levando a uma nova consciência coletiva e a um novo paradigma econômico, transformando o trabalhador cooperado e associado em protagonista da sua própria existência. Atualmente o Programa de Economia Solidária do Município atende cerca de 1.137 (mil cento e trinta e sete) trabalhadores nos diversos grupos e cooperativas. O trabalho decente, considerado como o trabalho produtivo remunerado adequadamente, exercido em condições de liberdade, equidade e segurança, capaz de garantir uma vida digna ao trabalhador, é condição para a superação da pobreza e a efetivação dos direitos sociais fundamentais. O trabalho exercido de maneira decente garante a efetividade do princípio da dignidade da pessoa humana, bem como os direitos sociais, uma vez que, trabalhando, o cidadão tem a oportunidade de melhorar suas condições de vida, fomentando sua inclusão na sociedade, bem como a inclusão de seus dependentes. O trabalho descente é o ponto de convergência dos quatro objetivos estratégicos da OIT: o respeito aos direitos no trabalho, a promoção do emprego produtivo e de qualidade, a extensão da proteção social e o fortalecimento do diálogo social. A promoção do trabalho decente deve visar não apenas à identificação de meios para geração de ocupação e renda, mas também ao estímulo a que as ocupações desenvolvam-se em condições tais que representem meios efetivos de alcance de condições dignas de vida. Consequentemente, envolve ações nas áreas de segurança e saúde no trabalho, combate à discriminação e busca por oportunidades de trabalho mais equânimes, com liberdade de associação e com abertura à participação e ao diálogo social. Destaca-se igualmente o objetivo de erradicação de formas degradantes de trabalho, como o trabalho infantil, o trabalho forçado e outras práticas espúrias. Para se atingir esses objetivos - ambiciosos e fundamentais para a construção de uma sociedade mais justa -, o crescimento econômico é condição necessária, mas não suficiente. Sua efetividade nesse projeto está condicionada a uma atenção especial para setores que gerem mais empregos e ao embasamento em mecanismos - públicos e da organização social - que permitam melhor distribuição das riquezas e melhor qualidade da ocupação ofertada. O trabalho representa a forma mediante “a qual o homem produz suas condições de existência, a história, o mundo propriamente humano, ou seja, o próprio ser humano. Nesta perspectiva, o trabalho assume uma nova centralidade, na medida em que possibilita ao homem a sua emancipação enquanto sujeito, a partir da possibilidade de participação e de inserção social. E é esta emancipação do sujeito, enquanto trabalhador e cidadão inserido no contexto social, que o trabalho decente busca alcançar, na medida em que pretende superar a precarização do trabalho e as condições indignas às quais, muitas vezes, o trabalhador acaba sendo exposto. O exercício da cidadania pode ocorrer pela via do trabalho, na medida em que o trabalhador, ao exercer uma atividade remunerada dignamente e participar do processo de produção de bens e serviços, se vê inserido no contexto social. Para isso, as ações de cooperação técnica e boas práticas de inclusão social e psicossocial pelo trabalho poderiam ser desenvolvidas em outros países, com distintas realidades, afim de refinar as atividades propostas, aumentar sua visibilidade e divulgação e aumentar a eficácia de seus projetos. O aumento da cooperação brasileira tem especial importância numa conjuntura de crise mundial que piorou o acesso da maioria dos países pobres aos mercados, ao mesmo tempo em que retraiu as ajudas internacionais ao seu desenvolvimento. “Nossa cooperação se pauta por levar as tecnologias e políticas públicas que estão tendo bons resultados no Brasil para os países em desenvolvimento, sempre elaborando e empreendendo os projetos junto com eles para que sejam adequados às suas necessidades e para que possam continuá-los depois de forma autônoma” (Ministro Marco Farani, diretor da Agência Brasileira de Cooperação – ABC). O Brasil está mudando a cooperação internacional com sua nova forma de praticá-la. É uma cooperação de mão dupla, na qual o Brasil também aprende muito e estreita suas relações com outros países, amadurecendo o debate sobre temas de interesse comum. Não se trata de exportar o modelo brasileiro, mas de aproveitar as lições da experiência nacional.
REFERÊNCIAS:
AMARANTE, P.. Novos sujeitos, Novos direitos: O debate sobre a Reforma
Psiquiátrica no Brasil. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 1995. Armazém das Oficinas, Disponível em http://armazemoficinas.com.br/novo/nucleo-de- oficinas-e-trabalho/. Acesso em 27 de setembro de 2016. DEMO, P. Cidadania tutelada e cidadania assistida. São Paulo: Autores Associados, 1995. ECOSOL Base Brasília, Disponível em http://www.ecosolbasebrasilia.com.br/index.php/economia-solidaria/videos/. Acesso em 2 de outubro de 2016. Fórum Brasileiro de Economia Solidária, Disponível em http://cirandas.net/fbes/o-que- e-economia-solidaria. Acesso em 25 de setembro de 2016. GALLETTI, M.C. Oficina em saúde mental: instrumento terapêutico ou intercessor clínico? Goiânia: Ed. UCG; 2004 Prefeitura Municipal de Campinas, Disponível em http://www.campinas.sp.gov.br/governo/trabalho-e-renda/programa-economia- solidaria.php. Acesso em 6 de outubro de 2016. UNPFA Brasil, Disponível em http://unfpa.org.br/novo/index.php/sobre-o- unfpa/cooperacao-sul-sul. Acesso em 30 de setembro de 2016.