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LETRAMENTO MIDIÁTICO: A EXPERIÊNCIA DO PROGRAMA

RADIOFÔNICO NA PONTA DA LÍNGUA (NPL)

Isaura Maria Longo1 - UNIVALI


Fernanda Souza 2 - UNIDAVI
Carla Avena Camilotto 3 - UNIVALI
André Luiz Vailati4 - UNIVALI

Eixo – Alfabetização, Leitura e escrita


Agência Financiadora: não contou com financiamento

Resumo

Apesar dos grandes saltos no universo comunicativo, o rádio continua sendo um meio de
comunicação que encanta e ensina há muitas gerações. Sua função ultrapassa o papel de
entreter e informar. Ele educa, ensina, transforma. Nesse contexto, as dezenas de estações de
rádio existentes no Brasil, denominadas educativas, podem servir como poderoso instrumento
de interação sociodiscursiva no ambiente acadêmico, estimulando o desenvolvimento de
múltiplas competências, principalmente no que tange à habilidade discursiva de estudantes e
professores. A Rádio Educativa UNIVALI FM (Itajaí, SC), há 15 anos, traz em sua grade de
programação, o programa Na Ponta da Língua – Tudo o que você já sabia, mas acabou de
esquecer (NPL)5. Trata-se da veiculação de programetes6 com caráter didático-pedagógico
que visam a divulgar, de forma divertida e dinâmica, informações sobre o uso da Língua
Portuguesa, além de disseminar informações sobre Literatura e curiosidades de linguagem. A
partir deste contexto, o objetivo desse relato de experiência é compartilhar uma prática de
letramento vinculada a este Programa. Considerou-se para a definição do modelo adotado, os
1
Mestre em Linguística pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Professora da Universidade do
Vale do Itajaí (UNIVALI). Doutoranda no Programa de Pós-graduação em Educação (UNIVALI). Professora nos
cursos de comunicação da UNIVALI. Participa do Grupo de Pesquisa na linha de pesquisa Políticas Públicas em
Educação Básica e Superior. E-mail: isaura@univali.br.
2
Mestre em Educação pela Universidade Regional de Blumenau (FURB). Professora do Centro Universitário
para o Desenvolvimento do Alto Vale do Itajaí (UNIDAVI). Doutoranda no Programa de Pós-graduação em
Educação (UNIVALI). Líder do grupo de pesquisa Educação, Desenvolvimento e Tecnologias. E-mail:
fernandasouza@unidavi.edu.br.
3
Mestre em Educação pela Universidade do Vale do Itajaí. Doutoranda em Educação pela Universidade do Vale
do Itajaí. Participa do Grupo de Pesquisa na linha de pesquisa Políticas Públicas em Educação Básica e Superior.
Bolsista Capes. E-mail: carlaavena@uol.com.br.
4
Publicitário, Especialista em Novas Mídias (FURB), Mestre e Doutorando em Educação pelo PPGE
(UNIVALI). Professor nos cursos de comunicação da UNIVALI em Itajaí (SC). E-mail: andrev@univali.br.
5
NPL – Sigla utilizada para se referir ao nome do programa Na Ponta da Língua – Tudo o que você já sabia, mas
acabou de esquecer.
6
Termo utilizado para se referir a programas de curta duração, baseado em Prado (2006, p. 67).

ISSN
estudados de Kleiman (1995), Baltar (2010; 2012), Freire e Macedo (2011), Soares (1999),
Street (2003). Ao admitir a pluralidade das linguagens e o caráter que elas estabelecem na
relação de poder entre as posições dos interlocutores, traços do modelo ideológico de
letramento se mostram. Evidenciar a importância dessa estratégia de ensino é dar-lhe maior
credibilidade e, quem sabe, propagar novas investidas para que programas dessa natureza
façam parte, com mais frequência, das grades de programação das rádios educativas de nosso
país.

Palavras-chave: Letramento midiático. Programa radiofônico. Programete. Rádio educativa.

Introdução

A Rádio Educativa UNIVALI FM (Itajaí, SC), há 15 anos, traz em sua grade de


programação, episódios do Na Ponta da Língua – Tudo o que você já sabia, mas acabou de
esquecer. Tratam-se de programetes com caráter didático-pedagógico que têm por objetivo
divulgar, de forma divertida e dinâmica, orientações sobre o uso da Língua Portuguesa, além
de disseminar informações sobre literatura e curiosidades de linguagem. Entre 2002 e 2017,
os acadêmicos dos cursos de Jornalismo, Publicidade e Propaganda e Relações Públicas da
UNIVALI produziram mais de 2500 (dois mil e quinhentos) programetes, numa escala de
produção e veiculação de cinco programetes inéditos por semana.
Ao participar do programa, os acadêmicos são convidados a criar situações de
comunicação que primem pela adequação da linguagem, considerando – aquilo que ele
aprendeu em sala de aula, ou seja, o referencial teórico; o interlocutor, para quem ele está
dirigindo o texto, ou seja, o ouvinte; e a adequação das diversas linguagens presentes no
programete, ou seja, a situação de comunicação atrelada ao conhecimento de linguagem que
se quer divulgar. Além do roteiro escrito, o acadêmico é exposto a técnicas de locução,
potencializando a sua capacidade de comunicação.
Estudar a forma e conteúdo do NPL é um modo de demonstrar torna mais transparente
a importância de programas de cunho educativo para produtores e ouvintes, assim, o objetivo
desse relato de experiência é compartilhar uma prática de letramento vivenciada pelo
Programa Na Ponta da Língua (NPL) veiculado pela Rádio Educativa UNIVALI FM. Para tal
foi realizada revisão bibliográfica relativa ao tema em questão e descrição da metodologia
utilizada pelo programa para a transição e adequação de linguagens para o meio radiofônico
na para divulgação das informações.
Dois “para”, troquei o
segundo por “na”
Rádio educativa e letramento midiático

O rádio é um meio de comunicação que encanta e ensina há muitas gerações. Sua


abrangência é inquestionável, pois em qualquer lugar que se vá, há alguém sintonizando
alguma estação. Na cabeceira das camas, no carro ou no ônibus, esse veículo de comunicação
é um companheiro inseparável no dia a dia das pessoas. A simples narração de uma partida de
futebol é capaz de arrancar sorrisos e emoções. Roquete Pinto fundamentado em Prado (2006
p. 57), criador da primeira rádio do Brasil, citou: “O rádio é a escola dos que não têm escola, é
o jornal de quem não sabe ler, [...] é o divertimento gratuito do pobre, é o animador de novas
esperanças, o consolador dos enfermos e o guia dos sãos [...].”. Mas sua função ultrapassa o
papel de entreter e informar. Ele educa, ensina, muda. O rádio é difusor de novas culturas, de
novas linguagens e enfoques, e sua capacidade de persuasão faz com que seu público
sintonize uma estação todos os dias.
Nesse contexto, as dezenas de estações de rádio existentes no Brasil, principalmente as
denominadas educativas, se mostram muito importantes para o processo de formação do
produtor/ouvinte, propondo uma programação embasada em conceitos que agreguem
entretenimento e conhecimento. Uma rádio dessa natureza também pode servir como
poderoso projeto de letramento, assim como um instrumento de interação sociodiscursiva no
ambiente acadêmico. Baltar (2012, p. 18), afirma que os programas de uma rádio escolar, por
exemplo, “podem estimular o desenvolvimento de múltiplas competências, principalmente no
que tange à competência discursiva de estudantes e professores, bem como pode servir como
“dispositivo de ensinagem7 dos gêneros textuais orais e escritos”.
Sabe-se que a família, a igreja, a escola e a universidade são importantes instituições
formadoras de opinião, mas mister se faz considerar que paralelamente está a mídia, que
exerce grande influência na forma de agir das pessoas que vivem em sociedade. Constatado o
seu potencial, a presença do aparato midiático em instituições de ensino não pode servir como
mero reprodutor de forças hegemônicas tradicionais, pelo contrário, seu papel deve propiciar
a leitura crítica da sociedade, via leitura da mídia em si para que professores e alunos “possam
compreender os discursos forjados (atenuados ou destacados) nessa esfera social de forma
científica e sistematizada” (BALTAR, 2010, p. 218).

7
7 Baltar (2012) usa o termo “ensinagem” a fim de ressaltar uma posição contrária à dicotomia ensino-
aprendizagem.
Assim, as rádios educativas, principalmente no âmbito universitário, podem exercer
importante papel para as práticas de letramento, ou seja, para as atividades realmente
significativas de linguagem. Segundo Blois (2003), uma rádio educativa não é uma rádio na
comunidade, mas da comunidade. Baltar (2010), ao fazer referência à criação de um espaço
midiático escolar, reafirma que este deve ser um espaço da escola, e não apenas o tratamento
de textos midiáticos na escola. Como consequência, o ambiente discursivo escolar se
reconfigura

e possibilita a real emersão de gêneros de textos midiáticos escolares, advindos de


uma prática legítima e legitimada pela comunidade escolar de interação
sociodiscursiva, que provocará diferentes modos de agir dos sujeitos envolvidos
nesse processo. (BALTAR, 2010, p. 219).

As rádios educativas estão focadas na difusão do conhecimento e na formação da


opinião do ouvinte, permitindo um diálogo entre as culturas local, regional e nacional. Entre
suas funções está a de valorizar e preservar a memória histórica e cultural da comunidade da
qual é parte, abrindo espaço em sua programação para expressões multiculturais. Várias são
as formas utilizadas para chegar aos seus propósitos e alcançar os ouvintes: cursos e séries
instrucionais, radiojornalismo, entrevistas, séries e spots culturais ou de utilidade pública,
seleções musicais, prestação de serviços à comunidade.
A Rádio UNIVALI FM é uma emissora educativa, que segundo Ferraretto (2001, p.
49) são aquelas “sem fins lucrativos, [...] mantidas pela União, governos estaduais ou
municipais, [...] ou universidades”. Esse tipo de rádio tem seu foco na difusão do
conhecimento e na formação da opinião do ouvinte, além de estabelecer uma relação próxima
entre a cultura local, regional e nacional, enfatizando o multiculturalismo. (BALTAR, 2012).
Essa rádio é mantida pela Fundação Universidade do Vale do Itajaí e possui uma programação
variada que agrega entretenimento à educação, mantendo fiéis, programas produzidos pelos
acadêmicos da universidade, com o auxílio de professores capacitados. Atuante desde março
de 1999, possui como premissas a promoção da educação, da cultura e do entretenimento,
sempre visando ao bem-estar da comunidade em geral.
O NPL enquadra-se nos formatos educativo-cultural, que Ferraretto (2001, p. 63)
relata serem “adotados pelas emissoras não-comerciais, voltadas a uma programação que
pretende formar o ouvinte, ampliando seus horizontes educativos e culturais”, já que os
programetes veiculados visam a auxiliar os ouvintes na sua capacitação de compreensão
linguística, e na adequação da língua nas diferentes situações vivenciadas.
Noções sobre letramento

O termo letramento é uma versão para o Português da palavra da língua inglesa


literacy. Ele vem do latim littera (letra), com o sufixo –cy, que quer dizer qualidade,
condição, estado. Assim, literacy “é o estado ou condição que assume aquele que aprende a
ler e escrever” (SOARES, 1999, p. 17). Nesse conceito está implícito o sentido de que a
escrita traz consequências em múltiplos universos social, político, cultural, cognitivo,
linguístico, tanto para o grupo que se apoderou dela, quanto para o indivíduo. A palavra
letramento, portanto, surge da união da expressão inglesa literacy (do latim littera) letra, e do
sufixo –mente, que denota o resultado de uma ação. Letramento é, pois, “o resultado da ação
de ensinar ou de aprender a ler e escrever: o estado ou a condição que adquire um grupo
social ou um indivíduo como consequência de ter-se apropriado da escrita” (SOARES, 1999,
p. 18).
Cabe ressaltar que um indivíduo pode não saber ler e escrever, ser analfabeto, e
mesmo assim ser letrado, ou seja, se na vida de um adulto existe a presença frequente da
leitura e da escrita, se ouve a leitura de jornais feita por alguém alfabetizado, se dita textos
para que outros escrevam, se pede para que outros leiam anúncios, notas, indicações de
lugares, isto significa que este adulto está se envolvendo com determinadas práticas sociais de
leitura e escrita, sendo assim letrado. Essa situação fica mais evidente quando se observa uma
criança ainda não alfabetizada. Ao folhear um livro, fingindo lê-lo, ao brincar de escrever,
ouvir histórias ao dormir, percebendo a função de cada ação, ela já está se conectando com o
mundo do letramento (SOARES, 1999, p. 24). Neste cenário, o evento não está somente
ligado ao ato de ler e escrever, mas à oralidade, pois esta começa a ter as características da
oralidade letrada, já que é com a mãe que as práticas orais são adquiridas (KLEIMAN, 1995,
p. 18). Portanto, percebe-se que o conceito de letramento é muito mais abrangente e ultrapassa
a mera aquisição da tecnologia do ler e do escrever, representada pelo termo alfabetização.
Assim, o grande desafio daquele que deseja ensinar, o professor, é o de ensinar letrando.
Existem pelo menos dois modelos de letramento: o autônomo e o ideológico. O
letramento autônomo está relacionamento a atividades descontextualizadas de leitura e de
produção de textos escritos. São práticas de produção de linguagem voltadas à aquisição da
norma padrão/culta da língua que não levam em consideração os contextos político-
ideológicos e socioeconômicos. Esse tipo de letramento é praticado prioritariamente nas
escolas. Nele o conteúdo é priorizado, assim como as competências cognitivas individuais
(BALTAR, 2010, p. 216). A preocupação aqui é com a aquisição da tecnologia de ler e
escrever voltada para si mesma, ou seja, as pessoas aprendem uma forma de decodificar as
letras e depois fazem com esse conhecimento o que desejarem, como se isso implicasse um
impacto de forma autônoma em âmbito individual ou social. Kleiman (1995, p. 22) aponta
algumas características desse modelo, em decorrência da ênfase no processo de interpretação
determinado pelo funcionamento lógico interno ao texto escrito: 1) a correlação entre a
aquisição da escrita e o desenvolvimento cognitivo; 2) a dicotomização entre oralidade e a
escrita; 3) a atribuição de “poderes” e qualidades intrínsecas à escrita, e por extensão, aos
povos ou grupos que a possuem. Neste modelo, os elementos culturais e ideológicos sobre os
quais se baseia seriam percebidos como neutros e universais, o que não passaria da imposição
de conceitos ocidentais de letramento a outras culturas (STREET, 2003, p. 1).
Atrelado a uma visão que envolve a distribuição de poder na sociedade, está a noção
de letramento ideológico. Nessa concepção, a prática do letramento se faz permeada por um
processo histórico, a neutralidade está longe de existir. As práticas sociais “estão abertas à
investigação sobre a natureza em termos de hegemonia de cultura, de poder, das relações
sociais e das ideologias dos discursos contemporâneos” (BALTAR, 2010, p. 216). Nessa
visão, a aparente neutralidade ideológica das práticas de alfabetização/letramento exercidas
pelas agências de letramento tradicionais como escolas e universidades é refutada e instaura-
se um processo analítico-crítico reflexivo sobre a distribuição dos bens culturais e
econômicos” (BALTAR, 2010, p. 216). Street (2003, p. 5) afirma que o letramento ideológico
é uma prática de cunho social, que não é apenas o desenvolvimento de uma habilidade técnica
e neutra. Todo processo envolve princípios epistemológicos socialmente construídos. A forma
como as pessoas utilizam a leitura e a escrita vem impregnada de elementos que marcam a sua
identidade, o seu conhecimento e a sua maneira de ser.
Ainda conforme sugere Street (2003, p. 5), a maneira como professores ou
facilitadores e seus alunos interagem é sempre uma prática social e como tal afeta a natureza
do letramento a ser aprendido, as ideias dos novos aprendizes e a sua posição nas relações de
poder. O processo não é neutro e nem é dado de modo neutro uma vez que as relações
interpessoais vão se dando no caminho e criando amálgamas e se (re)construindo, difícil
imaginar que os efeitos sociais sejam experimentados apenas posteriormente.
Para Freire e Macedo (2011, p. 49), não basta aprender a ler e escrever criticamente, é
preciso perceber que a alfabetização/letramento vai muito além: professor e alunos devem
analisar não só o modo como constroem suas experiências pessoais dentro das relações de
poder existentes, mas também como a construção social dessas experiências gera sentido e dá
expressividade às suas necessidades, como parte de um projeto de empowerment individual e
social. Ler o mundo é ser capaz de ser crítico consigo mesmo e a partir daí entender a
natureza política dos limites e avanços a que nos expomos. Freire (ano) enfatiza uma relação
dialética entre as pessoas através da linguagem e da ação transformadora. A linguagem não é
mera habilidade técnica, mas instrumento de liberdade. Inerente ao projeto político, afirma o
direito e responsabilidade que homens e mulheres têm não só de ler, mas de transformar suas
experiências pessoais, construindo uma relação mais ampla com a sociedade.
Compreender a alfabetização/letramento como leitura de mundo e da palavra é,
teoricamente, analisar como se produz o conhecimento e como se constroem nas relações de
interação entre professores e alunos, atores de seus próprios mundos. Discutir a natureza
ideológica do conhecimento é o centro do trabalho educativo crítico. O verdadeiro conteúdo
do conhecimento, neste caso, se constrói no próprio ato pedagógico (FREIRE e MACEDO,
2011). Analisando por este prisma, o professor passaria a assumir a função de agente de
letramento, ou seja, “organizar, em contextos sociodiscursivos situados, atividades/práticas
letradas que permitam o desenvolvimento de múltiplos letramentos nos sujeitos” (BALTAR,
2012, p. 28). Um posicionamento dessa natureza poderia levar à discussão e à compreensão
das práticas de letramento nas escolas e universidades propiciando o rompimento com o
modelo autônomo, considerado mecânico, centrado no domínio da escrita como uma
tecnologia dissociada da vida social (BALTAR, 2012).
No entanto, após uma breve reflexão de cunho didático sobre os modelos autônomo e
ideológico de letramento, algumas ressalvas devem ser pontuadas. Street (2003, p. 8) sugere
seja feita uma leitura mais cuidadosa dos conceitos e afirma que os modelos nunca foram
propostos como “opostos polares”, o modelo ideológico de letramento envolve o autônomo.
Ao privilegiar as práticas de letramento de grupos específicos de pessoas, considerando uma
abordagem neutra do ato de ler e escrever, o modelo autônomo já está usando uma estratégia
ideológica. O modelo ideológico, portanto, reconhece que as habilidades técnicas estão
inseridas em um cenário social e ideológico, assim, mesmo que o modelo autônomo se
pretenda neutro, este recheia as palavras, as frases, os textos com significados com os quais o
aprendiz se vê envolvido. Assim, qualquer prática de letramento, até mesmo a sua mais tenra
aquisição é sempre ideológica, ao mesmo tempo em que envolve habilidades técnicas e
conhecimento (STREET, 2003, p. 9).

A concepção e o roteiro de produção dos programetes

Em 2002, surgiu foi implementado um projeto de extensão do curso de Comunicação


Social – Publicidade e Propaganda, da Universidade do Vale do Itajaí: o programa Na Ponta
da Língua – Tudo o que você já sabia, mas acabou de esquecer. Fruto da motivação de um
grupo de estudantes do primeiro período de Publicidade e Propaganda, incentivados pela
professora de Língua Portuguesa, o programa nasceu tímido em sua formatação e em
conteúdo. Mas, com o passar do tempo, houve o aprimoramento de foi aprimorando a sua
apresentação. Esse projeto nasceu foi construído com o objetivo de promover o uso adequado Nasceu
da Língua Portuguesa, de acordo com a situação de comunicação, bem como divulgar aparece
duas
informações sobre diversos assuntos, entre eles: literatura, curiosidades da língua, vezes
comunicação, cultura local, educação, entre outros, por meio da produção de programetes
veiculados de segunda a sexta-feira na rádio.
Entre os objetivos que o programa pretende alcançar estão os seguintes: veicular
informações sobre o uso da norma culta da Língua Portuguesa; promover a cultura local
através da criação de personagens com características peculiares; promover o entretenimento
cultural da audiência; usar o espaço radiofônico educativo para fomentar a reflexão sobre
temas da atualidade; estimular a interdisciplinaridade, focalizando diferentes assuntos na área
das Ciências Sociais Aplicadas; conscientizar a comunidade a respeito do preconceito
linguístico, resgatando e valorizando as identidades regionais.
No processo de produção, os acadêmicos voluntários procedem primeiramente à
pesquisa do assunto a ser tratado no programete, posteriormente produzem o roteiro, seguindo
o formato estipulado,(colocaria um ponto aqui) Na elaboração do texto, escolhem os efeitos
especiais e os BGs (backgrounds – músicas de fundo) de acordo com o tema a ser abordado.
Em seguida, os textos são apresentados à coordenadora do projeto para serem revisados.
Normalmente, a professora faz uma série de observações e devolve os roteiros para serem
corrigidos e, posteriormente, gravados. Os acadêmicos editam os programetes, escolhendo
efeitos e BGs. Finalmente é enviada uma planilha à Rádio Educativa UNIVALI em que
constam os spots que devem ser divulgados nos próximos 30 dias. São veiculados 5
programetes por semana, agrupados por escala. Os arquivos têm, em média, 1 minuto e 30
segundos de duração, sendo veiculados diariamente durante a programação.
Os elementos componentes do roteiro estão demonstrados na Figura 1. O formato do
programa obedece a uma ordem de apresentação de informações: na Parte 1, tem-se os
elementos referenciais, em seguida na Parte 2, apresenta-se a vinheta de abertura, na Parte 3
há a identificação dos efeitos especiais e o fundo musical; já na Parte 4, é apresentada uma
situação do cotidiano, a situação-problema ou situação-introdução (uma estória ou fato com
personagens criadas e interpretadas pelos acadêmicos), que tem sua continuidade e finalização
logo após a Parte 5, que, por sua vez, traz uma pergunta e uma resposta à pergunta feita pelo
locutor. Em seguida há um efeito sonoro opcional conforme o tema. Na Parte 6, tem-se a
vinheta de encerramento e na Parte 7, apresenta-se a referência utilizada para a redação do
tema em questão.

Figura 1 – Modelo de roteiro do programete Na Ponta da Língua


Fonte: Montagem sobre roteiro elaborado pela equipe do programa.

Neste período de realização do projeto, isto é, de 2002/2 a 2017/1, já foram produzidos


e veiculados na Rádio Educativa UNIVALI FM perto de 2500 (dois mil e quinhentos)
programetes, que focalizam os assuntos ressaltados nos objetivos do programa. Pelo menos
cinco programetes são criados por semana, roteirizados e gravados pelos acadêmicos e
supervisionado e orientado pela coordenadora do projeto. São veiculados cinco programetes
inéditos de segunda a sexta, quatro vezes ao dia. O Quadro 1 ilustra a planilha das temáticas
selecionadas e divulgadas no ano de 2016, num total de 146 programetes.

Quadro 1 – Temáticas divulgadas nos programetes em 2013


Enfim x em fim Cegonha Superlativo Marcos Konder
Norma Culta Morfologia Concelho x conselho Conurbação
Permuta Avexado Cacetinho Camera x câmara
Poema Semântica Vereda Pagar mico
Soneto Sinonímia Beneficiente x beneficente Rasgar seda
Norma Gramatical Fonologia Carreteiro Pé na jaca
Salva de Palmas José de Alencar Estar com a corda no pesçoco Segurando vela
Semana de Arte Moderna Cabeleireiro Estorno Consciência negra
Release Obséquio Férias Ferreira Gullar
Conotação Origem da Língua Memória de elefante Namorar com
Inconsciente Paródia A meu ver Salvador Dali
Meteorologia x metereologia O Diário de Anne Frank Perda x perca Sal
Vinícius de Moraes Comer com os olhos Porreta Gótico
Paulo Leminski Almohada Fazer uma vaquinha E agora José
Acento agudo (acordo ortográfico) Forró Pizza Dia Nacional da Língua Portuguesa
Infraestrutura (acordo ortográfico) Chutar o balde Couvert Barroco
Ôos e Êem (acordo ortográfico) Companhia x compania Despensa x dispensa Literatura
Pé de moleque (acordo ortográfico Desaconchegar x desconchegar Etc Balzaquiana
Reforma ortográfica Haikai Meio x meia jabuti ou tartaruga
Toquinho Mortandela x mortadela Muçarela Literalmente
Senão x se não Sufixo oso Sequer Emigrante x imigrante
Epônimos À beça Tampouco x tão pouco Fangs
Fabrício Carpi Nejar Textos dramáticos Tons pastel Mas x Mais
Biopirataria Barbarismo Bem-vindo Acento ou assento
Ditongo Flagrante x fragrante À vista x a vista Carpe diem
Português de Portugal e do Brasil Cora Coralina Recorde Diacrítico
MPB Figuras de linguagem Layout (leiaute) Com a corda toda
Faroeste Caboclo Solecismo Teaser Flagrante x Fragrante
M antes de P e B Pleonasmo Convir conjugação Merchandising
Tráfego x tráfico Hino Nacional Brasileiro Mas e porém Pimenta do Reino
Gerundismo Ditado popular Pousar x posar Ouvir x Escutar
Tritongo Etnologia Haja x aja Olhar X Ver
Ruth Rocha Expressões idiomáticas Ao invés de x em vez de Ab-rogar X Ab rogar
Lenda Marejada Adevogado x advogado Menos X Menos
Palíndromo Obscenidade Cruz e Souza Seje X Seja
Ambiguidade Moda Eureka Estrangeirismo
Fonte: Elaborado pela equipe do programa.

A Rádio Educativa UNIVALI FM atinge uma população de quase um milhão de


pessoas num raio de 40 km, boa parte dos municípios atingidos pela rádio estão localizados na
faixa litorânea de Santa Catarina. Pelo menos 500 acadêmicos participaram como voluntários
do processo de criação, produção e gravação dos programetes. Este cenário conduz à busca de
uma reflexão mais profunda sobre os impactos de abrangência desse modelo de letramento no
que diz respeito aos usos da língua tanto para aqueles que o produzem, quanto para aqueles
que o ouvem. Daí Por isso a sugestão de pesquisas que possam subsidiar de modo mais
fecundo o referencial teórico relativo ao letramento.
Considerações Finais

A importância do rádio como instrumento para as práticas de letramento é inegável.


Refletir sobre uma experiência de letramento midiático é trazer à tona um olhar mais atento
aos conceitos que se tem sobre linguagem, língua e todos os elementos que compõem uma
situação de comunicação.
Concebido com o intuito de divulgar a Língua Portuguesa, essa proposta utiliza
situações de uso da língua oral presentes no cotidiano para ilustrar um tipo de registro mais
coloquial, e, posteriormente apresenta, por meio de Pergunta e Resposta outro tipo de registro
da língua. Não existe o privilégio de um tipo em detrimento de outro. O que se deseja é
mostrar que muitos elementos devem ser considerados no contexto discursivo.
Ao produzirem as situações-problema a partir de pesquisa de sua própria realidade, os
acadêmicos percebem que linguagem e realidade se fundem, num processo social,
impossibilitando-se assim uma desconexão entre essas partes. Ao admitir a pluralidade das
linguagens e o caráter que elas estabelecem na relação de poder entre as posições dos
interlocutores, traços do modelo ideológico de letramento se mostram, pois a forma como os
acadêmicos utilizam a leitura, a língua falada e escrita, marca a sua maneira de ser atrelada ao
conhecimento e à realidade em que vivem.
O objetivo desse relato de experiência foi compartilhar uma prática de letramento
vivenciada pelo Programa Na Ponta da Língua (NPL) veiculado pela Rádio Educativa
UNIVALI FM. Ao refletir sobre os aspectos dessa prática de letramento, muitas questões
podem ser levantadas no que tange a forma e ao conteúdo trabalhados no NPL e sua relação
com os modelos de letramento. O NPL não pretende apenas desenvolver habilidades técnicas
no uso da língua de seus participantes. Reconhece que nenhuma linguagem é neutra, e mesmo
que se pretenda neutra, já está ideologicamente concebida na medida em que seus
interlocutores a constroem a partir de um contexto social.

REFERÊNCIAS

BALTAR, Marcos. Rádio escolar: uma experiência de letramento midiático. São Paulo:
Cortez, 2012.

BALTAR, Marcos. Mídia, escola, agentes de letramento e gêneros textuais. In SERRANI,


Silvana (Org.). Letramento, discurso e trabalho docente. Vinhedo: ed. Horizonte, 2010, p.
211-233.
BLOIS, Marlene. Rádio educativo no Brasil: uma história em construção. Trabalho
apresentado no Núcleo de Mídia Sonora, XXVI Congresso Anual em Ciência da
Comunicação, Belo Horizonte/MG. 2 a 6 de set. 2003.

FERRARETTO, Luiz Artur. Rádio. O veículo, a história e a técnica. 2. ed. Porto Alegre:
Editora Sagra Luzzatto, 2001.

FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler – em três artigos que se completam. 8.ed. São
Paulo: Cortez, 1984.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 50.ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2011.

FREIRE, Paulo; MACEDO, Donaldo. Alfabetização: leitura do mundo, leitura da palavra.


Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2011.

KLEIMAN, Angela B. Modelos de letramento e as práticas de alfabetização na escola. In


KLEIMAN, Angela B. (Org.). Os significados do letramento: uma nova perspectiva sobre
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http://www.drm-brasil.org/content/novas-emissoras-de-radio-fme-e-tv-tve-educativas-no-
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O que é uma rádio educativa. Disponível em http://www.agert.org.br/index.php?


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PRADO, Magaly. Produção de rádio. Um manual prático. Rio de Janeiro: Elsevier, 2006.

SOARES, Magda. Letramento: um tema em três gêneros. São Paulo: Autêntica, 1999.

STREET, Brian. Abordagens alternativas ao letramento e desenvolvimento.


Teleconferência Unesco Brasil sobre ‘Letramento e Diversidade’, out. 2003.

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