Documentos de Académico
Documentos de Profesional
Documentos de Cultura
Resumo
O Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade é uma das principais causas de procura de
ambulatório de saúde mental de crianças e adolescentes. Assim, o encaminhamento para os
serviços de saúde em crianças com dificuldades de aprendizagem escolar ou com problemas
de comportamento tem sido freqüente. Muitos desses encaminhamentos realizados por uma
queixa escolar têm como objetivo de que seja identificado alguma doença, distúrbio ou
deficiência que impede a criança de aprender. O objetivo desse artigo é fazer refletir sobre o
conceito de TDAH, o qual pode ser totalmente resignificado quando tomado pelo modelo
explicativo biospsicossocial, pois a doença não torna-se o único foco e os demais fatores
(sociais, psicológicos, fisiológicos) apresentam e contribuem equitativamente para o aumento
ou diminuição do transtorno. Assim como os estudos de Auto Organização podem contribuir
para uma visão mais abrangente do processo saúde-doença.
Introdução
Nos últimos anos tem-se observado considerável diminuição das taxas de mortalidade
infantil, acompanhada de alterações do perfil da morbidade da faixa etária pediátrica. Essas
mudanças devem-se, principalmente, ao impacto positivo das ações dirigidas ao controle das
doenças infecto-contagiosas, com conseqüente redução da magnitude de doenças como
diarréia e aquelas passíveis de prevenção pela vacinação. Desta forma, a atenção se dirigiu
para as doenças crônicas, da violência, dos acidentes e das queixas relativas a transtornos
psicossociais (LAURIDSEN e TANAKA, 2005). Dentre essas queixas no Brasil temos aquela
referente ao diagnóstico do Transtorno de Déficit de Atenção com ou sem Hiperatividade
(TDAH). Assim, o encaminhamento para os serviços de saúde de crianças com dificuldades
de aprendizagem escolar ou com problemas de comportamento tem sido freqüente. Muitos
desses encaminhamentos realizados por uma queixa escolar têm como objetivo de que seja
identificado alguma doença, distúrbio ou deficiência que impede a criança de aprender. O
1
Mestranda em Saúde Pública – e-mail: lujaniapc@gmail.com
2
Professor Adjunto do Departamento de Educação do Instituto de Biociências – UNESP – Campus de Botucatu
134
fracasso escolar, muitas vezes, é visto como um problema de saúde, que necessita de uma
solução médica, ou de outros profissionais de saúde em que são desconsideradas as questões
pedagógicas e o contexto escolar.
O Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade é uma das principais causas de
procura de ambulatório de saúde mental de crianças e adolescentes. A prevalência do
TODA/H não é facilmente detectada, pois mesmo sendo considerado um transtorno muito
comum na infância, há dificuldade quanto a sua delimitação e ao uso de critérios diagnósticos.
Isso influencia diretamente os dados a respeito de sua prevalência (GOLFETO e BARBOSA,
2003). Ainda que alguns estudiosos possam insistir nas semelhanças, a maioria dos estudos
revela variações nos diferentes países, e também dentro de um mesmo país (GOLFETO e
BARBOSA, 2003). Para exemplificar esse fato, citemos a prevalência do transtorno
apresentada pelos estudos brasileiros já conduzidos até o momento: ela varia
consideravelmente entre 5 e 17% (SOUZA, 2008).
Os percentuais de 3 a 5% de crianças em idade escolar são frequentemente
generalizados como taxas médias (BARKLEY, 2002; BENCZIK, 2000ª; CYPEL, 2001;
GOLDSTEIN & GOLDSTEIN, 1996; LIMA, 2005). Grande parte da literatura aponta os
EUA como um pioneiro em detecção da incidência, prevalência e tratamento do TODA/H. De
acordo com a estimativa do DSM-IV, a prevalência nos EUA do TODA/H encontra-se entre
5 e 13% nas crianças em idade escolar. Esses resultados são maiores do que os das versões
anteriores - DSM-IIITR e DSM-III (GOLFETO e BARBOSA, 2003).
Diagnóstico
O Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (DSM-IV) da Associação
Americana de Psiquiatria, quarta edição (APA, 1994) e o DSM-IV-TR (APA, 2003) indicam
uma série de critérios para diagnóstico do TODA/H, diferenciando em critérios de desatenção,
hiperatividade, impulsividade e critérios gerais tal como descritos nos quadros abaixo. Tais
critérios foram baseados principalmente em manifestações infantis de TODA/H.
1. Critérios de Desatenção:
a) Frequentemente não presta atenção em detalhes e comete erros por omissão em
atividades escolares, de trabalho ou outras;
b) Com freqüência mostra dificuldade para sustentar a atenção em tarefas;
135
2. Critérios de Hiperatividade:
a) Frequentemente agita as mãos e os pés e fica se remexendo na cadeira;
b) Frequentemente abandona sua cadeira em sala de aula ou em outras situações em
que se espera que permaneça sentado;
c) Frequentemente corre ou escala em demasia, em situações impróprias (em
adolescentes e adultos, pode se limitar a sensações subjetivas de inquietação);
d) Com freqüência tem dificuldade de brincar ou se envolver silenciosamente em
atividades de lazer;
e) Está frequentemente “a mil”, ou como se estivesse “a todo vapor” e
f) Frequentemente fala em demasia.
3. Critérios de Impulsividade:
a) Frequentemente dá respostas precipitadas antes que tenham sido reformuladas
completamente as perguntas;
b) Com freqüência tem dificuldade de aguardar a sua vez e
c) Frequentemente interrompe ou se intromete em assuntos alheios (por exemplo, em
conversas ou brincadeiras).
4. Critérios Gerais:
136
Etiologia
Os estudos sobre etiologia referem-se ao TDAH como um resultado de anormalidades
no desenvolvimento cerebral. Entretanto, as origens neurobiológicas do TDA/H não se
encontram completamente elucidadas. Os mecanismos neurobiológicos que participam do
TDAH são de natureza complexa e não estão na dependência de um único neurotransmissor.
Segundo esses estudos, a variação clínica dos casos de TDAH já reflete a intensa
complexidade dos processos neuroquímicos inibitórios e excitatórios implicados na origem
dos seus sintomas (COELHO et. al, 2010).
Várias teorias foram formuladas para explicar a fisiopatologia do TDAH. Há
relatos de que, em testes neuropsicológicos de crianças portadoras de TDAH, estas
apresentavam desempenho prejudicado, nas tarefas que exigiam funções cognitivas, como
atenção, percepção, organização e planejamento, pois tais processos se encontram
relacionados com o lobo frontal e áreas subcorticais (SWANSON, 1998). Evidências
farmacológicas favoreceram, a princípio, a teoria dopaminérgica do TDAH, segundo a qual
déficits de dopamina no córtex frontal e núcleo estriado seriam responsáveis pelas
manifestações dos sintomas.
Nos últimos anos têm sido atribuídos papéis, de forma interacional, a outros
neurotransmissores bioquímicos menos estudados, como a serotonina, glutamina e
137
138
Conceito de Doença
Nessa perspectiva, observa-se que o paradigma, ainda hegemônico, como modelo de
saúde é o biomédico, o qual, ainda, concentra suas intervenções na doença e não do sujeito
social. Sendo o modelo biomédico um referencial reducionista, reforçando explicações que
reduzem o processo saúde-doença à sua dimensão estritamente biológica; já o modelo
biopsicossocial, permite que a doença seja vista como um resultado da interação de
mecanismos celulares, teciduais, orgânicos, interpessoais e ambientais, em que o estudo de
139
qualquer doença deva incluir o indivíduo, seu corpo e seu ambiente circundante como
componentes essenciais de um sistema total (único ou particular) (ENGEL, 1977).
De acordo com Engel (1977) ao considerar o individuo como um ser biopsicossocial
pela sociedade e comunidade médica reduz-se o estigma e retira-se o rótulo de sua doença(
pela inclusão de aspectos culturais, psicológicos, comportamentais e sociais, ao lado dos
biológicos no processo de adoecimento), instaurando a possibilidade de enfrentamento por
aquele que apresenta alguma fragilidade mental ou física. No caso do TDAH, ao encará-lo
pelo paradigma biopsicossocial, a doença não se torna mais o único foco, tendo importância
igual as condições que o cerca (família, escola, amigos, economia, etc), que podem contribuir
para o aumento ou diminuição da sua vulnerabilidade.
140
humanos, seria caracterizada pela dinâmica presente no embate entre diferentes elementos,
nesse caso, as interações que a criança tem com o seu corpo e com o ambiente (a escola).
141
Conclusão
O objetivo desse artigo é fazer refletir sobre o conceito de TDAH, o qual pode ser
totalmente resignificado quando tomado pelo modelo explicativo biopsicossocial, pois a
doença não torna-se o único foco e os demais fatores (sociais, psicológicos, fisiológicos )
apresentam e contribuem equitativamente para o aumento ou diminuição do transtorno. Com
isso, é possível, dentro desse modelo, reduzir o estigma e a culpabilização da criança.
Os estudos de AO e da complexidade dos organismos vivos permitem uma
compreensão das interações e da interdependência biopsicossocial do ser humano,
possibilitando compreender o transtorno como uma vulnerabilidade latente que inicia com o
período educacional emergindo da interação da criança (corpo) com o ambiente (escola).
Dessa forma, tomado como modelo de saúde o biopsicossocial, proposto por Engel; o
conceito de transtorno que os profissionais (sejam estes os educadores ou de saúde) pode ser
amplificado e entendido não como sinônimo de doença, mas sim como uma perturbação no
processo de vida da pessoa como entende diversos teóricos da Auto-Organização. Neste
sentido, a teoria não tem a pretensão de substituir ou corrigir os conhecimentos específicos de
cada área e disciplina científica, mas contribuir para uma visão integral do ser humano que
perpasse as diversas disciplinas que estudam os diversos aspectos deste ser.
Referências
143
DOYLE, A.E.; et al. Are endophenotypes based on measures of executive functions useful for
molecular genetic studies of ADHD? J Child Psycholog Psychiatry, v. 47, p.774-803, 2005.
DSM-IV-TR. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. 4.ed. Porto Alegre:
Artmed, 2002.
ENGEL, G.L. The need for a new medical model: a challenge for biomedicine. Science 1977;
196: 129-136.
144
PEREIRA JR, A.; LUSSI, I.A.O.; PEREIRA, M.A.O. Mente In: Universos do Conhecimento.
Belo Horizonte: Faculdade de Letras da UFMG, p. 201-19, 2002.
VARELA, F.; THOMPSON, E.; ROSCH, E. The embodied mind. Cambridge, Mass.: MIT
Press, 1991.
Abstract
Attention Deficit Hyperctivity Disorder is one of the main reasons for seeking outpatient
mental health of children and adolescents. Thus, referral to health services for children with
learning difficulties in school or behavior problems have been very common. Many of these
referrals made by a school complaint aim that any disease, disorder or disability that prevents
the child from learning to be identified. The purpose of this article is to reflect on the concept
of ADHD, wich can be fully resignified when taken by biopsychosocial explanatory model,
because the disease does not become the sole focus and other factors (social, psychological,
physiological) present and contribute equally to the increase or decrease of the disorder. As
well as studies of Self Organization can contribute to a more comprehensive view of the
health-disease process.
145