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Fundamentos do
pensamento bakhtiniano: uma epistemologia ancorando a busca de uma
mudança no ensino de Língua Portuguesa. In:do
Fundamentos ______. Linguística
pensamento
Aplicada. Florianópolis: LLV/CCE/UFSC, 2011. p. 199-215.
bakhtiniano CAPÍTULO 09
9 Fundamentos do pensamento
bakhtiniano: uma
epistemologia ancorando a
busca de uma mudança no
ensino de Língua Portuguesa
Embora a produção intelectual do Círculo de Bakhtin tenha ocor-
rido entre 1919 e 1974, sua divulgação no ocidente começa a partir da
metade da década de 1960 e, no Brasil, passa a ser estudada de modo
mais intenso a partir de 1980.
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A autora ainda comenta que, mesmo que Bakhtin não tenha tido
como foco o ensino de línguas, como mencionado no parágrafo pre-
cedente, há em seus textos considerações acerca da temática, que sur-
preendem pela atualidade, como podemos observar nos excertos que
reproduzimos a seguir:
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mas a de interação entre sujeitos situados historicamente. Em Marxismo
e Filosofia da Linguagem, Bakhtin (Volochínov) afirma que
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Não existe, por isso, um abismo, nem ruptura qualitativa (do não
semiótico para o semiótico) entre a atividade mental e sua expres-
são externa. Há, sim, uma mudança quantitativa, ou seja, o discur-
so interior adapta-se às condições sociais da situação de interação.
Assim, a natureza da linguagem não pode ser reduzida à meio de
expressão do pensamento, uma vez que o pensamento já é consti-
tuído/organizado pela linguagem, no curso histórico do sujeito nas
suas relações sociais com os outros e seus discursos. Sintetizando: a
linguagem expressa a exteriorização do pensamento, mas se o pen-
samento é constituído pela linguagem, a natureza/função da lin-
guagem não pode ser a de traduzir para signos o pensamento, que
já é sígnico. Além do mais, o discurso interior constitui-se a partir das
relações interativas com o outro (BAKHTIN, 2003 [1979], p. 270).
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O autor salienta que não se pode dizer que esses esquemas estejam
errados e que não correspondam a certos aspectos reais da comunica-
ção, mas quando esses esquemas pretendem dar conta, representar o
todo da linguagem (ou, ainda, ser a sua norma, poderíamos acrescen-
tar), esses esquemas passam para os limites da ficção. Assim, “Aquilo
que o esquema representa é apenas um momento abstrato do ato pleno
e real da compreensão ativamente responsiva, que gera a resposta (a que
precisamente visa o falante) [...] o papel ativo do outro no processo de
comunicação discursiva sai extremamente enfraquecido” (BAKHTIN,
2003 [1979], p. 272-273, grifos do autor). Entre outras razões, aponta-
remos duas das apresentadas pelo autor: o ouvinte que recebe e com-
preende a significação (linguística) de um enunciado simultaneamente
adota, para esse discurso, uma postura de resposta ativa, construída a
partir dos seus horizontes axiológicos (valorativos). Para Bakhtin, com-
preender é contrapor às palavras do outro a nossas contrapalavras.
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Para a consciência que vive nela [língua], a língua não é um sistema abs-
trato de formas normativas, porém uma opinião plurilíngüe concreta
sobre o mundo. Todas as palavras evocam uma profissão, um gênero,
uma tendência, um partido, uma obra determinada, uma pessoa defini-
da, uma geração, uma idade, um dia, uma hora. Cada palavra evoca um
contexto ou contextos, nos quais ela viveu sua vida socialmente tensa;
[...] Em essência, para a consciência individual, a linguagem enquanto
concreção sócio-ideológica viva e enquanto opinião plurilíngüe, colo-
ca-se nos limites de seu território e nos limites do território de outrem.
(BAKHTIN, 1993 [1975], p. 100).
O texto “O discurso no
romance” foi escrito entre Para Bakhtin (Volochínov) (1988[1929]), o enunciado é o produto
1934 e 1935.
da interação de dois (ou mais) sujeitos socialmente organizados. A pa-
lavra, o discurso, dirige-se a um interlocutor, seja ele imediato ou não,
situado socialmente. Não há, pois, enunciado dirigido ao abstrato; o ou-
tro, mesmo que seja presumido ou um desdobramento do próprio eu, é a
contrapartida, a medida da nossa fala. Com essas considerações, aponta
para a relação ativa do outro (interlocutor) nos processos interacionais e
como a possível reação-resposta desse outro é constitutiva na produção
do enunciado. A orientação da palavra/discurso para o interlocutor na
interação é explicada pela metáfora da ponte entre os interlocutores:
ela se apoia tanto no locutor quanto no interlocutor; ela é o território
comum dos dois. Assim,
[...] toda palavra comporta duas faces. Ela é terminada tanto pelo fato de
que procede de alguém, como pelo fato de que se dirige para alguém.
Ela constitui justamente o produto da interação do locutor e do ouvinte.
Toda palavra serve de expressão a um em relação ao outro. (BAKHTIN
[VOLOCHÍNOV], 1988 [1929], p. 113, grifos do autor).
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socioavaliativas. Na interação vista pelo olhar bakhtiniano, não se
trocam mensagens, mas se dialogizam axiologias [valores, pontos
de vista]” (FARACO, 2005, p. 219). Através da linguagem o sujeito
pratica ações/atos que não existiam antes de sua fala, bem como
age sobre seu interlocutor. Também a interação não pode ser vista a
partir de duas ou mais pessoas autossuficientes, pois a interação é a
condição da possibilidade de sua existência, que se constitui como
tal na medida em que o sujeito só se constitui na relação com ou-
tros, por isso sua identidade e sua individualidade se definem na
relação com a alteridade.
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para quem é essa escola, qual a finalidade dessa escola, por que ensina a
e b? Do que necessitam os sujeitos dessa escola para sua inserção social
plena nas diversas esferas sociais?
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