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Instrumentos Musicais de Moçambique

Domingos Morais (1994)

Expor uma colecção de instrumentos musicais de


Moçambique do Museu Nacional de Etnologia no espaço
OIKOS, em 1994, é uma afirmação da diversidade e riqueza
cultural de um país, Moçambique, e constatação de um dos
melhores contributos dados pela antiga potência colonizadora,
Portugal, no estudo e recolha dos testemunhos materiais e
documentais dos povos e culturas que vivem ou viveram
naquele território.
Quase todos os instrumentos expostos foram recolhidos
entre 1957 e 1961 por Margot Dias, que sobre eles escreveu
vários artigos em revistas especializadas culminando no livro
"Instrumentos Musicais de Moçambique" (IICT, Lisboa,1986),
obra publicada em português sobre a colecção reunida pela
autora, com referência aos instrumentos de Moçambique
existentes nos mais importantes museus do mundo,
bibliografia e iconografia, análise musical (acompanhada por
uma cassete com exemplos musicais) e alguns dos mais
lúcidos ensaios escritos sobre estas temáticas. Referência
obrigatória para quem quiser conhecer a música de
Moçambique.
Os 30 anos que nos separam da década de 60, trouxeram
consigo profundas mudanças em todo o continente africano,
que em Moçambique incluíram os conflitos anteriores e
posteriores à independência e a adversidade de catástrofes
naturais com deslocações de centenas de milhar de pessoas e
sequelas aos mais elementares níveis de sobrevivência. Não
constituindo situação única em África, o drama vivido pelos
moçambicanos teve profundas consequências nas suas
manifestações culturais, estando por fazer todo um
levantamento que actualize os estudos realizados no passado.
Que terá sobrado das músicas, danças, instrumentos e
saberes que constituíram afirmações identitárias de cada um
dos povos e culturas de Moçambique? Quais as
transformações que ocorreram nas populações forçadas a
deslocar-se para regiões distantes, confinadas à sobrevivência
em campos de refugiados, descontextualizadas, submetidas a
novas influências, despojadas de força anímica para
reencontrarem um novo equilíbrio?
O refazer de um país inserido numa região que procura
nos caminhos da paz e democracia a resolução dos muitos
problemas que afligem os africanos, passa necessariamente

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por uma revitalização das práticas culturais, num contexto de
mudança que não deverá no entanto impedir a coexistência
do modo próprio a cada povo de se exprimir, da língua aos
valores, da música e dança às festas e cerimónias que ainda
possam responder ao seu direito irrecusável de identidade.
Mas, quem se interessará hoje por estes instrumentos,
pelos povos que os tocam ou tocavam, pelos contextos e
funções que lhes davam sentido? Os testemunhos que se
seguem, são uma das respostas possíveis. Neles, alguns dos
mais credenciados investigadores sobre a música e dança
africanas dão-nos as chaves que nos possibilitam o acesso ao
que de mais essencial caracteriza os modos próprios de
expressão dos povos de Moçambique, que nestes (como em
alguns outros) domínios não são pobres, dependentes ou
carentes de ajuda exterior. Pelo contrário, temos muito a
usufruir e aprender com eles, capazes de nos surpreender e
fecundar pelo engenho, saber e humanidade de que são
detentores.
Se os soubermos ouvir. Se não os impedirem de se
expressar.

in Programa da exposição Intrumentos de Musicais de Moçambique no


Espaço Oikos em 1994

A dança timbila e os marimbeiros Chopi

A dança timbila é uma das mais complexas, interessantes e


referenciadas formas de música/dança em Africa, com vários séculos de
aperfeiçoamento formal, de estilo e dos instrumentos. Os
característicos conceitos africanos de expressão pessoal no quadro de
formas estritas, de liberdade individual dentro da unidade do grupo, de
integração das dimensões pessoal e societária através do espectáculo,
de ritmos antagónicos, de estruturas de movimento e perceptivas em
permanente conflito, são evidentes nesta dança.
O povo CHOPI (cerca de 250.000 hab.) vive junto ao litoral, a sul de
Moçambique, nos Distritos de Zavala, Inharrime, Manjacaze e Xaixai. A
sua história está ligada ao reino de Monomotapa, que alcançou o
apogeu nos seculos XVI e XVII, sendo portuguesa a primeira descrição
da sua música e dança, em 1562, de André Fernandes.
Embora devastada recentemente pela seca, a sua região produz
alimentos tropicais ricos e variados, que Ihe permitiu dispor de tempo
para desenvolver um notável património musical, com destaque para
as orquestras de marimbas, que pela sua dimensão e complexidade se
diferenciam de tudo o que podemos ouvir em África.
A dança timbila e a orquestra de marimbas (referenciada desde o séc.
XVI como orquestra real) sempre esteve ligada ao poder político, ao
serviço dos régulos e das autoridades coloniais. Com a independência

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de Moçambique, em 1975, os regulados foram abolidos e as orquestras
de marimbas passaram a tocar para as entidades governamentais.
Infelizmente, é necessário distinguir entre tempo de paz e a situação de
violência actual; grande parte dos anos decorridos após a
independência têm sido marcados pela guerra civil entre o governo da
Frelimo e o movimento Renamo. Esta guerra trouxe inúmeras
dificuldades à terra CHOPI e, tal como aconteceu em todo o país,
dificultou o desenvolvimento económico e as deslocações das
populações tendo como consequência o quase desaparecimento de
toda a actividade cultural.
As duas orquestras de marimbeiros actualmente em actividade, situam-
se fora da região habitada pelos CHOPI; a primeira, em Maputo, e a
segunda na Africa do Sul, nas minas de Wildebeesfontein North, no
Transval, onde os músicos e bailarinos que a integram trabalham como
mineiros. É esta última que fez uma digressão na Europa em 1992,
tendo-se apresentado nos Encontros ACARTE da Fundação Calouste
Gulbenkian em Setembro desse ano.
Venâncio Mbande, que a dirige, é compositor e construíu ele próprio os
instrumentos utilizados pela orquestra. Trabalha há mais de 40 anos
nas minas e a ele se deve a qualidade atingida pelo grupo, tanto no
repertório como nos instrumentos utilizados. Convidado a realizar
conferências nos Estados Unidos e na Holanda, participou em diversos
filmes e recebeu em 1969 o 1.° prémio da "African Arts" para o melhor
trabalho discográfico.
Os textos da dança timbila são um bom exemplo dos mecanismos de
auto-regulação, próprios dos sistemas políticos tradicionais africanos. O
compositor/autor é livre, em principio, de tecer comentários sobre
qualquer assunto de interesse geral, social, político ou filosófico, sem
receio das consequências. Na prática, a situação conturbada actual
impede os compositores/autores moçambicanos de exercerem a crítica
política, por recearem pela sua segurança.
As marimbas CHOPI agrupam-se em 5 tipos diferentes, consoante a sua
tessitura se situa nas quatro oitavas equi-heptatonicas (divisão da
oitava em sete intervalos iguais) abrangidas pela orquestra. A
orquestra de Venâncio Mbande utiliza três tipos: sanje, no registo
agudo, na primeira fila de músicos; dibhinda, no registo médio, na
segunda fila; e no registo grave, chinzumana, na rectaguarda. Cerca de
doze materiais naturais diferentes são utilizados na sua construção,
incluindo madeira de mwenje, cera de abelhas, borracha pura (seiva) e
folhas' de palmeira. O timbre penetrante da timbila depende da
afinação rigorosa de cada tecla com o respectivo ressoador e da
membrana vibratória (por simpatia), feita de peritoneu de vaca,
colocada lateralmente em cada caixa (cabaça) de ressonância.
A música da dança timbila é constituida por uma série de andamentos,
à semelhança de uma suite orquestral, tendo cada um o seu caracter
específico. O primeiro, mitsitso, é a introdução, sem bailarinos.
Caracteriza-se por uma maior liberdade formal que a dos andamentos
dançados. Começa habitualmente por um motivo curto, uma introdução
a solo do maestro/solista (Venancio Mbande), a que a orquestra
responde, emudecendo de seguida. Não se trata do final do
andamento!... o solista continua, acompanhado pelo grupo, dando
inicio ao concerto. Durante a execução do mitsitso (introdução

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orquestral) o espectador poderá tentar escutar dois aspectos que
podem melhorar a sua apreciação da totalidade da obra. O primeiro é o
sempre presente ostinatti ritmico de cada parte. Pode encontrá-lo nas
frases rítmicas dos tocadores de maracas. O segundo, são os sinais
(sonoros) dados pelo solista com o seu instrumento, que lhe permitem
controlar toda a obra. Em resposta a um destes sinais, por exemplo,
toda a orquestra toca uma resposta em uníssono, preparando-se para,
depois de um número fixo de ciclos, iniciar uma nova parte, ou o verso
seguinte de um texto, ou uma nova sequência dançada, ou o fim da
obra.
Os bailarinos entram em cena, gritando, durante o último mitsitso.
Seguem-se os seis andamentos dançados. Os mais enérgicos têm
apenas uma breve linha de texto, cantada próximo do final. Com o
andamento lento, mzeno, ou da «canção grande», atinge-se o climax
do espectáculo. Quando o mzeno é tocado na terra CHOPI, os
espectadores levantam-se e juntam-se à volta da orquestra e dos
bailarinos para cantar com eles, sendo este um momento de grande
emotividade. O final é tocado pela orquestra, que executa um último
mitsimo.

Andrew Tracey
(International Library of African Music)
in "Programa dos Encontros ACARTE", 1992, p.42.
(tradução de Domingos Morais, 1992)

Primeira notícia de xilofones em Moçambique

«Sao muito dados aos prazeres de cantar e tocar. Os seus instrumentos


são umas cabaças ligadas com cordas, e um bocado de madeira
dobrado em arco, umas maiores, outras mais pequenas, na abertura
das quais põem trombetas com cera de abelhas bravas para melhorar o
tom e têm instrumentos tiples e baixos (...)
De noite vão fazer serenatas ao rei e a quem quer que lhe fez um
presente, e aquele que faz mais barulho é considerado o melhor
músico.
As suas canções são em geral de louvor àqueles para quem estão a
cantar, como por exemplo «este é um bom, deu-nos isto ou aquilo, mas
ainda nos há-de dar mais».
Duas canções são muito vulgares entre eles: uma é Abenezaganbuia, o
que significa que os portugueses comem muitas coisas ao mesmo
tempo, ou muitos pratos diferentes, pois os Pretos não comem mais do
que uma coisa de cada vez, e nunca comem e bebem ao mesmo
tempo, não por temperança mas por hábito»

André Fernandes, l562

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A Dança em Moçambique

Não é fácil dar em poucas palavras uma ideia geral da dança


moçambicana, se tal fosse mesmo possível. Tentamos só situá-la,
compreendê-la no que significa para os seus criadores e descrever
alguns traços que nos parecem típicos.
A dança, cremos, foi desde os princípios remotos uma necessidade
espontânea, seja como expressão natural da vibração física, seja como
meio de exteriorizar estas forças interiores da vida e impressionar ou
influenciar o ambiente. Este influenciar estendia-se sobre o ambiente
visível, como confirmação da própria existência, por meio de ruído,
como meio de defesa (dança de guerreiros, defesa contra os perigos do
mato), assim como sobre o ambiente invisível que teria sido a «força
suprema» e todo o mundo dos antepassados e espíritos de todas as
espécies.
Por isso a dança pode ter em muitas destas culturas um carácter
sagrado, e em Africa ainda o tem, embora o conceito do «sagrado»
difira do conceito europeu, que é cunhado por uma outra religião.
Dançar, pôr o corpo em movimento, em vibração, significa uma espécie
de comunhão com as forças vitais, com tudo o que adoram, e o que
temem; e, além disso, une e reforça neste intuito a comunidade.
Dançar é uma necessidade que liga até os vivos aos espíritos dos
antepassados mortos e que facilita a comunhão com eles.
A dança tem lugar em todas as cerimónias, como nos ritos da
puberdade - as danças dos vanalombo, mestres da circuncisão e a
dança do mapiko - de investidura de iniciados em poderes superiores -
a dança dos vahumu -, em ritos de passagem - a dança por ocasião de
um casamento, e sobretudo em todas as cerimónias de exorcismo,
onde o curandeiro precisa de chamar à superficie as grandes forças
vitais, que ele, por meio de vibração prolongada e simpática, procura
influenciar; objectivo em que, sem dúvida, às vezes é bem sucedido.
O centro importante dos movimentos da dança moçambicana é o
tronco e a vibração ágil de todos os músculos da bacia e dos rins. Os
movimentos das pernas servem ao transporte do corpo numa maneira
rítmica de passos e saltos, mas com menos significado. Ainda menos
importância têm os movimentos dos braços e das mãos, que
simplesmente funcionam como contrabalanço do equilíbrio. Nisso existe
um contraste enorme com as danças dos povos orientais (India,
Indonésia, etc.), onde as posições de pernas e especialmente de
braços, de mãos, e até de dedos formam uma linguagem intencional.
A dança moçambicana está profundamente enraizada na terra, não
procura gestos que abstraiam da vida natural e exprimam formas
abstractas, estáticas e estéticas. Os gestos da dança moçambicana não
tomam posse de um vasto espaço diagonal, restringem-se mais a uma
posição básica, onde o tronco é levemente inclinado para a frente, as
pernas com uma ligeira quebra nos joelhos, na posição de maior
prontidão de reacção, e os braços fazendo equilibrio. À volta desta
posição surgem as oscilações e, às vezes, ondulações e torções,
sustentadas pelos passos rítmicos. Os dançarinos preenchem esta
posição - às vezes aparentemente parada - com virtuosismo de
tremuras parciais dos músculos.

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Nas danças de mulheres, como consequência natural da sua construção
e função, os movimentos são muito mais restritos, e muitas vezes elas
satisfazem-se com passos pequenos, inclinações de cabeça ritmicas e
bater de palmas; com excepção das danças dos ritos da puberdade
feminina, onde também as mulheres, ocultas dos olhares dos homens,
dão largas à exuberância física. Como posição típica encontramos, aqui
também, sempre esta linha diagonal do tronco em relação ao solo e a
importância do movimento dos ombros e da bacia, tudo sustentado por
passos pequenos, com uma enorme sensibilidade e leveza rítmica dos
pés. Estes passos são guiados coreograficamente em forma de roda, ou
em bicha ou fila, ou de duas filas enfrentando-se.
Queremos ainda mencionar uma forma de dança que se destaca da
forma grupal: a de solistas, entre os quais temos de contar
especialmente os dançarinos rituais e dançarinos de máscaras, que
estão inteiramente integrados na função social do grupo, através da
máscara que os despersonaliza, embora a sua arte sobressaia da do
grupo.
Também dentro desta forma de dança funcional existe espaço para
personalidades que desenvolveram a dança em direcção a uma forma
mais individual; permitem-se gestos ou representações de ideias que
ultrapassam o âmbito descrito e formam com isso quase uma primeira
célula do que se pode chamar teatro. Como exemplo podemos invocar
os mestres dos ritos da circuncisão dos rapazes Makonde, que dançam
sem máscaras e incluem nas suas danças tradicionais (que se limitam
aos movimentos descritos) cenas dramáticas ou cómicas da vida,
representadas com gestos de dança e às vezes com acrobacias.
Uma outra forma de dança acrobática representam também as danças
com andas, que conhecemos em Moçambique só nos Makonde, como
dança nocturna, shilo, cercada de grande mistério e medo por parte
das mulheres e crianças não iniciadas perante o Espirito do Mal,
Nandenga, e ligada às iniciações. A figura do Nandenga é quase
invisível, por a dança se realizar somente em noites de lua-nova. Além
dessa, aparecem também os dançarinos em andas, ao som dos
tambores, no extremo Nordeste de Moçambique, em Nangade, Palma e
Quionga, mas aí já influenciados pelos dançarinos da vizinha Tanzânia,
onde se realizam as danças durante o dia e principalmente em
acontecimentos festivos, e só ligeiramente ainda ligadas às cerimónias
da puberdade. Os movimentos acrobáticos, a vestimenta de panos
coloridos, e a máscara facial em frente da cara, geralmente com um
feixe de cabelos imitados saindo por baixo do lenço que cobre a parte
de trás da máscara, provocam um ambiente de festa alegre.
(...)
(As danças dos CHOPI)
As danças dos Chope, junto com a orquestra das marimbas, são uma
das formas de dança mais espectaculares de Moçambique, que, tendo
um certo aspecto de dança guerreira (talvez proveniente dos tempos
da guerra com os invasores Zulu, nos quais se inspiraram quanto ao
uso do trajo, da azagaia e do escudo, que nas danças é usado até como
instrumento rítmico, batendo com ele no chão), são danças de grupo,
que incluem todas as outras formas: a dos solistas, que se destacam
com estranhos saltos e vibrações do corpo, e a das mulheres, que
surgem com ligeiros passos pelo meio dos bailarinos .

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Não é necessario afirmar que a dança moçambicana, na sua
espontaneidade, é inseparável da música que tem geralmente como
núcleo instrumental um ou mais tambores, senão mesmo - como nos
Chope - uma base orquestral de xilofones, tambores e ideofones
(maracas e o barulho dos escudos batendo no chão), e ainda o canto.
Mas os tambores são em alguns casos substituídos pelo bater das
palmas, pelo canto, ou por outros instrumentos de ritmo. Em alguns
sítios a dança está também ligada a um coro de flautas ou mirlitons.
Além desta função mágica que cumpre a dança e que temos acentuado
nestas linhas, existe hoje em muitas sociedade negras a dança como
puro divertimento, em pares, principalmente depois de começada a
destribalização, segundo a influência da civilização ocidental. Contudo,
a influência foi recíproca. Não podemos negar em seguida a influência
da dança negra nas formas de dança nas sociedades ocidentais, depois
de estas terem tido um melhor conhecimento do poder mágico da
expressão das forças vitais na dança dos Negros.

Margot Dias
Instrumentos Musicais de Moçambique, Ed. I.l.C.T., Lisboa, 1986 (p. 217 a
220)

A Orquestra Real

.«Serve-se mais o Quiteve do outro género de cafres, grandes músicos


e tangedores que não têm outro offício mais que estarem assentados
na primeira sala do rei e à porta da rua e ao redor das suas casas,
tangendo muita differença de instrumentos músicos e cantando a elles
muita variedade de cantigas e prosas, em louvor do rei, com vozes mui
altas e sonoras. O melhor instrumento, e mais músico de todos em que
estes tangem, chama-se ambira, o qual arremeda muito aos nossos
orgãos. Este instrumento é composto de cabaços de aboboras
compridas, uns muito grossos, e outros muito delgados, armados de tal
feição que ficam todos juntos, postos por ordem, os mais pequenos e
mais delgados, que são os tiples primeiro, postos da mão esquerda ao
revez dos nossos orgãos e logo após os tiples, se vão seguindo os mais
cabaços, com suas vozes differentes, de contraltos, tenores e baixos,
que por todo são dezoito. Cada um destes cabaços tem uma bocca
pequena feita na ilharga, junto ao pé e em cada fundo tem um buraco
do tamanho de um patacão e nelle posto um espelho, feito de umas
certas teas de aranha, muito delgadas, tapadas e fortes, que não
quebram. E sobre todas as boccas destes cabaços, que estão eguaes, e
postos em carreira, tem armada uma ordem de teclas, de paus
delgados, e sustentadas no ar com umas cordas, de modo que cada
tecla fica posta sobre a boca de seu cabaço, em vão, que não chegue à
mesma boca. Depois disto assim armado, tangem os cafres por cima
destas teclas com uns paus, ao modo de paus de tambor, nas pontas
dos quaes estão pegados uns botes de nervo, feitos em peloiros, muito
leves, do tamanho de uma noz, de maneira que tangendo com estes
dois paus por cima das teclas, retumbam as pancadas dentro nas
boccas dos cabaços, e fazem uma harmonia de vozes mui consoantes e
sua ves, que se ouvem tão longe como as de um bom cravo. Destes
instrumentos há muitos, e muitos tangedores, que os tocam muito
bem»

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Frei João dos Santos, Ethiopia Oriental, 1586.

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