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UNIVERSIDADE VEIGA DE AMEIDA

PROGRAMA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA 2014 – PIC UVA

HÉLIDA LISBOA MENDES BATISTA


Orientador: Reynaldo Gomes Lopes, Me.

CONSIDERAÇÕES SOBRE O USO DE EXERCÍCIOS TÉCNICO-VOCAIS EM


CANTORES MIRINS

Rio de Janeiro.
2014
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
1 IDADE PARA O ENSINO DO CANTO

2 A LARINGE INFANTIL

2.2 PREGAS VOCAIS

3 TÉCNICA VOCAL PARA VOZES INFANTIS

3.2 CONSCIÊNCIA CORPORAL

3.2.1 CONSCIÊNCIA DA POSTURA PARA O CANTO

3.2.2 CONSCIÊNCIA DOS PONTOS DE TENSÃO DO PRÓPRIO CORPO PARA


RELAXÁ-LOS

3.2.3 CONSCIÊNCIA RESPIRATÓRIA

3.2.4 RESSONANCIA E ARTICULAÇÃO

3.2.5 TESSITURA

3.2.6 ATAQUE VOCAL

4 CONCLUSÃO
INTRODUÇÃO

A voz infantil é um tema complexo que sempre nos chamou a atenção


primeiramente no que se refere a preparação vocal de coros infantis, para, num segundo
momento despertar o interesse por um trabalho de pesquisa científico sistemático sobre
a possibilidade do ensino do canto para a voz da criança.

A experiência empírica baseada no contato com as vozes de crianças em coros


infantis diversos, sem dúvida nos oferece muitas informações e subsídios para falar
sobre o assunto, mas também nos oferece o risco de mantermos a discussão em um
nível raso. Para além da experiência, queremos questionar mediante revisão
bibliográfica os prós e contra de um trabalho técnico-vocal realizado na infância.

A Prática Coral infantil é comum no Brasil. Inúmeros coros se espalham com


uma enorme diversidade de timbres e propostas. Muito se fala sobre a função da música
na sociedade. Educadores musicais, musicólogos exaltam o ensino de música para
crianças como excelente forma de socialização, cognição. criatividade, desenvolvimento
psicológico... E é fato que a musica pode exercer essas várias funções, que vão desde o
desenvolvimento psicomotor infantil, passando pela educação, ate a recreação,
relaxamento... Mas a verdade é que, como defende Carnassale: "a musica sempre existiu
e sempre existirá independentemente da reflexão que façamos sobre ela. A música não
é de domínio apenas de estudiosos, mas também do publico leigo. Ela esta presente em
qualquer classe social, em qualquer cultura e qualquer pessoa pode fazer musica"
(CARNASSALE, 1995, P. 12). Ou seja, a voz cantada assume um papel importante por
se tratar de um instrumento musical acessível a todo indivíduo saudável. O grau de
vivência musical na infância tem influência direta sobre a musicalidade na vida adulta.
É comum encontrarmos cantores nas universidades de Música que começaram a cantar
quando crianças, em coros de igreja, escolas e instituições em geral que, quer por razões
educativas, quer por razões sócio-culturais investem nesses grupos. Heitor Villa-Lobos
defendia o canto coletivo como a melhor forma de desenvolver elementos considerados
essenciais a formação musical e em sua gestão como diretor da “Superintendência de
Educação Musical e Artística (SEMA)” das Escolas Públicas do Rio de Janeiro (então
Distrito Federal), deu total incentivo a implantação do canto orfeônico nos currículos
escolares (PAZ, 2000, p. 13).
Não é de hoje que a formação coral com crianças nos encanta. Desde a Idade
Média até os dias atuais as mais importantes Catedrais e Igrejas possuíam escolas de
formação musical teórica e técnica vocal básica para crianças. Segundo a tradição, já no
século VI o Papa Gregório fundou a "Schola Puerorum" na Basílica de São João e São
Pedro. No séc. XI, o "Micrologus", um Método de notação musical, foi composto para
Meninos Cantores por “Guido de Arezzo”. Com a proibição do canto feminino no
interior das igrejas da Europa ocidental no século V, as mulheres foram substituídas
pelas vozes infantis e, mais tarde, pelo canto em falsete dos tenores. Nos séculos XVII e
XVIII, a exigência musical operística, de um canto ágil, expressivo e de grande domínio
técnico alimenta o fenômeno “Castrati”. Meninos com belos timbres e talento musical
eram selecionados para um treinamento rigoroso no estudo do canto e castrados
visando manter pregas vocais pequenas (em torno de 14 a 18 mm) numa laringe
masculina, com a caixa torácica e a capacidade pulmonar de um homem. O resultado
eram cantores masculinos que cantavam papéis femininos com voz de soprano, meio-
soprano ou contralto com muito volume e extensão privilegiada. A maioria dos grandes
cantores dos séculos XVII e XVIII foram castrati. Farinelli (1705-1782), o mais
aplaudido castrato de todos os tempos, estreou aos quinze anos de idade (DIGAETANI,
1986, p.141)

Exemplos de cantores treinados na infância não nos faltam. E a Prática Coral


costuma ser o início dessa experiência. Entretanto no que se refere ao estudo técnico, o
músico instrumentista é incentivado desde cedo à prática do instrumento, ao contrário
do cantor. Numa análise preliminar é observado que cantores com experiência coral na
infância, quando perguntados sobre a influência da mesma em suas carreiras apresentam
respostas bastante diversas no que se refere à técnica vocal. Sendo assim, esse estudo
investigará quais os melhores caminhos para o aprimoramento vocal na infância, na
ótica Fonoaudiológica, de modo que, aspirantes a cantores profissionais, obtenham
melhores resultados estéticos e de manutenção de sua saúde vocal.

Como este trabalho de iniciação científica tem como objetivo maior buscar
estabelecer uma coleta de dados científicos por meio de revisão bibliográfica para ser a
base de reflexões coerentes sobre o tema e também servir de alicerce para a
continuidade do estudo em novas investidas científicas empíricas em um futuro breve,
efetivou-se buscas em livros, artigos científicos encontrados na Bireme, Google
Educacional, entre outros.
O presente trabalho está dividido em seis partes, nas quais temos a primeira
composta pela presente introdução, na segunda apresentamos as principais discussões
sobre a idade ideal para o ensino do canto, na terceira abordamos os aspectos da laringe
infantil e seus desdobramentos anatomofisiológicos e de uso da voz cantada em
crianças, na quarta as aplicabilidades das técnicas vocais em crianças e por fim as
nossas considerações finais sobre este relevante tema. No final do trabalho são
encontradas as referências bibliográficas usadas para a realização deste texto.

Temos como palavras chave voz, saúde vocal, voz cantada, coral infantil, voz
infantil, Fonoaudiologia.
1 IDADE PARA O ENSINO DO CANTO

É importante frisarmos que, independente do trabalho de um fonoterapeuta ou


professor de canto a criança desenvolverá um padrão vocal de acordo com o meio
social: a família, professores e a escola, o coral infantil e o maestro (se houver). Estes
são elementos que atuam sobre o desenvolvimento da criança em todos os níveis, moral,
intelectual, social, físico e artístico, musical e, claro, vocal (seja este processo
consciente ou inconsciente, mediante ou não a um trabalho educativo). E como intervir
neste padrão inconsciente sem utilizar-se da técnica vocal para atingir os objetivos
estéticos do repertório e, ao mesmo tempo, preservar a voz da criança?:

O fazer musical se dá mediante técnicas de execução, sejam


elas intuitivas ou organizadas de forma metodológica. O
domínio de tais técnicas pressupõe o quão bom músico se é.
Quando puramente intuitivas, tais habilidades são
desenvolvidas pelo próprio músico, mediante informações
colhidas em diversas fontes aliadas à prática constante do
instrumento, assim como pela vivência e o meio musical onde
o indivíduo está inserido. São os chamados autodidatas. Por
uma definição de dicionário, autodidata é quem se instrui por
esforço próprio, sem a ajuda de mestres (HOUAISS, 2001). É
comum encontrarmos músicos que nunca estudaram música
formalmente e que, ainda assim, apresentam grande
desenvoltura em um dado fazer musical, especialmente nos
instrumentos musicais cujo acesso é mais democrático (no que
se refere a custo e facilidade de aquisição e/ou manutenção).
Num outro extremo encontramos os músicos formados por
escolas, universidades e conservatórios de música em geral,
que se dedicam plenamente ao estudo de métodos, mediante o
acompanhamento regular de um professor. Em ambos os casos
percebemos artistas focados no aprimoramento técnico, no
domínio de seus respectivos instrumentos, visando melhorar o
desempenho (BATISTA, 2011, P. 12)

Leda Osório Marsico em seu livro “A voz infantil e o desenvolvimento músico


vocal” citando Chevais (1937) explica que o primeiro ato do recém-nascido é o grito. A
criança grita inicialmente por reações negativas, motivadas pelo medo (ruídos e sons
desconhecidos), dor, necessidades fisiológicas... E por reações positivas caracterizadas
pela atenção auditiva que permite a identificação de sons e ruídos. Conforme ela
compreende que seus gritos são sucedidos pela satisfação de suas necessidades, suas
reações se organizam positivamente. As reações positivas levarão a ação. Por volta do
terceiro e quarto mês a criança manifesta prazer aos estímulos sonoros e passa a
diferenciá-los, assim como provocá-los em atitudes como balançar o berço, brincar com
chocalhos, bater com a colher no prato, etc. Neste período a intensidade chama mais à
atenção da criança que a qualidade sonora. Por volta do quinto e sexto mês, os órgãos da
audição e fonação progridem rapidamente. É a etapa de imitação, onde a criança
murmura, vocaliza e articula determinadas sílabas por conta própria. A partir do décimo
mês a criança passa a copiar modelos, reproduzindo não somente sílabas e palavras
como acentuações e entonação para, a partir daí enriquecer o processo da fala. Podemos
dizer que este primeiro balbuciar representa o primeiro exercício vocal de um individuo.
Com a idade de10 a12 meses, a criança aprende a compreender e a exprimir certas
associações de sons. Aprende e fixa palavras simples. (MARSICO, 1979, p. 12). O
ritmo das repetições leva o cérebro a registrar estas expressões vocais de maneira
duradoura. Este período vai conduzi-la ao pleno desabrochar da linguagem. A família é
o guia por excelência nessa fase e a criança reproduz o modelo vocal que a cerca. Isso
sem falar nas personagens dos jogos infantis e dos contos, os personagens da rádio ou
da televisão, que adquirem vida através da imitação vocal, assim como os ruídos de
automóvel, motos, avião, ar condicionado...

A partir de 3 ou 4 anos as crianças entram no ambiente pré-escolar. Nesse


momento ela começa a se autoafirmar numa nova realidade, o que na prática significa
ser mais forte, mais barulhenta. Intuitivamente cantam as canções infantis com uma voz
"dura", quase sempre muito forte e estridente. Geralmente reproduzem o modelo vocal
que o educador emite ou permite. Esta reprodução de modelo o seguirá até a escola. O
professor sempre será um exemplo a seguir inclusive vocalmente. E ao imitarmos a voz
alheia comprometemos nossa própria voz. Se considerarmos a formação dos
professores, veremos uma situação sensivelmente idêntica à dos educadores de infância
que, na sua formação não tiveram nenhum contato com técnicas vocais. Falam e cantam
sem nenhum controle, explorando diariamente a voz indiscriminadamente, o que
culmina não raras vezes numa voz rouca, ferida por um mau uso, algumas vezes até
com nódulos ou outras manifestações patológicas.

Muitas escolas possuem coros na sua grade de atividades. O regente do coral


também é um modelo vocal para crianças e adolescentes. Pode parecer óbvio dizer que
um bom coro deve recorrer a técnica vocal para um melhor rendimento. Heffernan
observa que:“Regentes de coros que aspiram a um alto nível de excelência artística
devem, portanto, se verem não apenas como líderes de organizações como também
professores de técnica vocal" (HEFFERNAM, 1982). Mas ao tratarmos de coros infantis
a discussão deixa de ser tão obvia:
O Canto como instrumento diferencia-se por sua
característica intuitiva. O instrumento é o próprio corpo. É
muito mais comum encontrarmos cantores autodidatas.
Todavia é interessante notarmos o quão fácil é encontrarmos
literatura adequada orientando e incentivando regentes e
preparadores vocais a usarem um trabalho técnico-vocal em
coros adultos. É consenso que um bom coro precisa de
ferramentas técnicas para execução exemplar de seu repertório.
Ao tratarmos de coros infantis o consenso deixa de existir
dando margem a diversos questionamentos. Alguns autores
trabalham canto com crianças sem utilizar as ferramentas da
técnica vocal (APFELSTADT, 1984; JONES, 1971;
WOLNER, PYLE, 1933 apud SOBREIRA, 2003), enquanto
outros não somente utilizam essas ferramentas, como
recomendam seu ensino, especialmente no que se refere a
trabalhos de relaxamento, uso adequado da respiração, do
apoio vocal, e exploração dos ressonadores.(BATISTA, 2011,
P.9)

Maria José Chevitarese, regente do Coral Infantil da UFRJ, reconhecido por sua
qualidade técnica propõe exercícios vocais para coros infantis em sua dissertação de
Mestrado “A questão da afinação infantil discutida a partir do “Guia Prático” de Villa-
Lobos e das “20 rondas infantis” de Edno Krieger”.

O grande questionamento no quesito técnica vocal infantil é como trabalhar uma


voz ainda em formação sem comprometer sua qualidade futura ou como preparar um
futuro cantor desde a infância. Cabe ainda questionarmos se a ausência de trabalho
vocal em cantores mirins não daria margem a possíveis prejuízos vocais, dado o mau
uso da voz.

Pedro Moreira (1937) defende em seu “Compêndio de téchnica vocal” que o


período educacional da voz infantil compreende a faixa etária entre 9 e 10 anos até os
primeiros sinais de muda vocal, dada a fragilidade dos órgãos fonatórios da criança.
Gabriela Carnassale em sua Dissertação de Mestrado “O ensino de canto para crianças e
adolescentes” questiona tal fragilidade citada por Moreira visto que, se as crianças
fossem vocalmente tão sensíveis, apresentariam problemas vocais em sua maioria, a
julgar pelo esforço vocal referente aos gritos, tão comuns nesta idade (CARNASSALE,
1995, p. 22). A autora não apenas defende o estudo vocal, como propõe um método de
canto para crianças, assim como Felicity Laurence em artigo para o livro “The
Cambridge Companion to Singing”:

Muitas pessoas estarão familiarizadas com os elementos básicos - postura,


relaxamento, entonação, respiração e aticulação. O que não é bem
compreendido é que as crianças são realmente capazes de aprender sobre
esses conceitos ecolocá-los em prática desde a idade pré-escolar. Eu ouvi
um número incontável de vezes, de pessoas cultas musicalmente, que elas
simplesmente não sabem quais as partes do estudo de canto que podem ser
úteis e seguras para as crianças. Eu gostariade dizer claramente: todas
elas!(LAURENCE, 2000, P. 221. Tradução nossa.).1

Carnassale defende que é difícil estabelecer categoricamente uma idade ideal


para o início do estudo do canto infantil porque a opinião dos estudiosos não é unânime.
Argumentos como fragilidade do trato vocal infantil, fase de muda vocal na
adolescência e imaturidade dos órgãos relacionados ao canto, não são suficientes para
condenar a instrução vocal formal. Antes, a técnica vocal pode ser um agente
contribuinte para o desenvolvimento de uma voz saudável e expressiva desde que esta
seja ministrada por profissionais competentes e devidamente preparados. Estes devem,
portanto, estar cientes das possibilidades limites de uma voz ainda em formação
(CARNASSALE, 1995, p. 23 e 24).

BLATT (1983, apud CANDIDO,1999), afirmou que o intervalo de mudança de


voz, é precisamente o período que o jovem cantor deveria seguir o instrumento musical,
treinando sob a instrução de professores de canto e experimentando no treinamento
técnicas e tendo orientação do otorrinolaringologista para avaliar e monitorar suas
aptidões, já que a mudança de voz é um processo natural de maturação. Entretanto
desenvolver a habilidade de cantar, numa criança é freqüentemente difícil para a autora
que adverte para a possível necessidade de adiamento do treinamento formal até a idade
de 17 ou 18 anos para garotos e 16 anos para garotas, quando a troca de voz se torna
completa e o risco de danos no desenvolvimento é mínimo. Porém, a mesma autora
colocou que, o problema de sucesso na mudança de voz pode ser resolvido se planejado
um programa de treinamento para crianças cantarem durante a pré-puberdade,
puberdade e fases de mudança de voz, na adolescência, para desenvolverem técnicas
fixas num processo dinâmico de cantar: respiração, fonação, ressonância e fonética.

GREENE (1983, apud CANDIDO,1999) defende que a voz no período


mutacional deveria descansar e o canto e o teatro evitados, já que é possível danificar a
voz de canto feminina permanentemente assim como a voz de um rapaz, embora a voz
da fala não se mostre prejudicada na maioria dos casos, após esforço na adolescência.
Mara Behlau afirma que, “após estudo da variação de parâmetros vocais
decorrentes da utilização de aquecimento vocal para coro infanto-juvenil (idades entre
6 e 13 anos), que o canto coral é altamente benéfico para cantores nesta faixa etária e,
no caso das crianças com vozes alteradas, pode ajudar no processo terapêutico, não
substituindo a fonoterapia”. (PELA; BEHLAU, 2001, p. 77).

Em oito anos de experiência com vozes infantis em coros - como preparadora


vocal do coral infantil da UFRJ e atualmente dos coros da escola de música Villa-
Lobos- e como professora de canto - no Curso de Formação Inicial da Escola de Música
Villa-Lobos – a autora deste trabalho vê quanto a experiência mostra que o aparelho
fonador infantil é capaz sim de se adequar a um trabalho técnico desde que bem
orientado. Discordamos dos autores contrários ao treinamento vocal na infância
entendendo que a voz cantada exige adaptações prévias específicas e conscientes,
diferentemente da voz falada, em geral natural e inconsciente, não necessitando de
ajustes ou treinamentos precedentes. Behlau afirma:

Enquanto a emissão falada geralmente prima pela transmissão


de mensagem, com a necessidade de articulação precisa para a
transmissão do conteúdo verbal, a voz cantada tem, no controle
de sua qualidade, sua principal caracterização, podendo ser
observadas reduções articulatórias, prolongamento de vogais e
introdução de recursos específicos (Behlau, 2005, p. 300, 301).

Marsico citando Nitsche (1967) diz que é sempre preferível prevenir com o uso
do trabalho vocal na infância a adiar para a idade adulta (como em geral se faz) a
correção de deformações e desgastes devidos a função vocal inadequada. Para o autor
quanto menor for a criança tanto mais a aprendizagem se dará de forma inconsciente,
através de exercícios lúdicos, de natureza espontânea. Idalete Giga afirma que "a idéia
generalizada de que a criança é incapaz de assimilar um mecanismo fonatório
destinado aos adultos tem constituído um álibi para mascarar a penúria educativa
neste campo. O desconhecimento de que é possível ajudar a criança a construir
progressivamente a sua voz cantada antes da puberdade, tem levado a descurar este
aspecto importantíssimo da educação vocal infantil."( GIGA, 2004, P. 1).

Andrade e Martins (2012) citando Batle (2003) afirmam:

(...) todas as crianças podem ser ensinadas a cantar se elas


começarem sua descoberta vocal desde muito cedo e se forem
ensinadas por alguém que não apenas acredita que toda criança
pode cantar, mas também possui competências para ensiná-la a
fazê-lo (BARTLE, 2003, p.8)

Nesta perspectiva analisaremos como a Fonoaudiologia pode contribuir para o


desenvolvimento da saúde da voz infantil cantada.

Numa análise preliminar observamos mediante revisão de literatura as diferenças


fisiológicas entre a laringe infantil e adulta no decorrer dos anos.
2 A LARINGE INFANTIL -

A Laringe tem função vital respiratória e proteção das vias aéreas superiores, e
também se torna uma estrutura de complexa função fonatória. "Ao nascimento a laringe
é muito pequena. Existe alguma diferença de opinião quanto ao comportamento real das
pregas vocais. Existe um grande aumento no tamanho da laringe entre os 2,5 anos e 5
anos (CANDIDO, 1999, p. 12)"

Ao terceiro mês de vida fetal a laringe já possui praticamente as mesmas


características anatômicas reconhecíveis ao nascimento e em ambos os sexos, a ela é
praticamente igual até a puberdade, quando ocorre um crescimento evidente, mais
acentuado nos homens.

O tamanho menor não é o único diferencial entre a laringe infantil e adulta.


Existem diferenças morfológicas, histológicas e topográficas que não nos deixa
considerar a laringe infantil uma miniatura da laringe adulta.

A laringe do recém nascido se apresenta muito alta no pescoço (a borda inferior


da cartilagem cricóide encontra-se na altura equivalente à terceira vértebra cervical).
Durante as primeiras semanas de vida o recém nascido é obrigatoriamente um
respirador nasal quando então a laringe começa sua descida. Durante a infância, a
laringe se desloca para posições mais baixas no pescoço, partindo da vértebra cervical
C3, no recém-nascido, passando por C5 e C6 (a borda inferior da cartilagem cricóide
encontra-se na altura equivalente à quinta e sexta vértebra cervical) em crianças de 5
anos, por C7 dos 15 a 20 anos, onde permanece durante a vida adulta, posicionando-se
abaixo de C7 em pessoas idosas (PINHO, 1998 p.57).

A laringe infantil apresenta um aspecto mais compacto que a laringe do adulto,


especialmente pela configuração e proximidade de suas cartilagens. As cartilagens da
laringe infantil são mais maleáveis e flexíveis que as do adulto.

Até a puberdade a laringe é bem semelhante em ambos os sexos. Nesse período


ocorre seu crescimento que é mais acentuado nos homens. Esse crescimento associado à
ação dos novos níveis hormonais transforma a laringe infantil em laringe adulta,
chamada de mutação vocal fisiológica, ou simplesmente muda vocal. O período de
muda vocal que ocorre na puberdade é o momento crucial para a definição de uma voz
adulta. No homem ocorre ao redor de 13-15 anos, enquanto nas mulheres é ao redor de
12-14 anos. A vida sedentária e hábitos alimentares podem atrasar o processo, bem
como a influência do clima que nas regiões quentes podem adiantar e nas frias atrasar a
mudança:

Nesse período há aumento considerável no crescimento das


cartilagens laríngeas. O ângulo tireóideo aumenta em garotos e
o “pomo de Adão” se desenvolve com um aumento
correspondente em comprimento das pregas vocais. Nas
meninas o comprimento médio é de 15 mm antes da puberdade
e pode aumentar para 17 mm numa contralto. Durante o
período mutacional as pregas vocais de um garoto podem
aumentar para um máximo de 23mm numa voz de baixo. O
comprimento mínimo das pregas vocais para os do sexo
masculino é de 17 mm e, portanto, pode-se ver que um tenor e
um contralto podem ter a mesma faixa de tom, mas são os
ressonadores maiores da laringe, faringe e particularmente do
tórax que distinguem a voz masculino da feminina
(CANDIDO, 1999, p. 13)

2.2 PREGAS VOCAIS

O comprimento das pregas vocais não difere entre os sexos até os 10 anos. A
partir daí inicia-se a diferenciação e após os 15 anos as pregas vocais são mais longas no
sexo masculino.

Em recém-nascidos, o comprimento de prega vocal é de 2,5 a 3,0 mm. Cresce


com a idade até 20 anos. Em adultos, o comprimento da prega vocal é de 17 a 21mm em
homens e de 11 a 15 mm em mulheres. Acima da idade de 15 anos, a prega vocal é mais
comprida em homens que em mulheres. A estrutura das pregas vocais modifica-se
durante toda a vida; somente o epitélio escamoso mantém-se inalterado durante todo o
processo de maturação.

No Recém nascido a lâmina própria é muito espessa, mais solta e flexível.


Existem imaturas maculas flavas, constituídas de tecido fibroso nas terminações
membranosas. Entre 1 e 4 anos de idade surge um ligamento vocal imaturo, pouco
espesso, que não toca o músculo vocal. Nesta faixa não há diferenciação entre a camada
de fibras elásticas e colagenosas. Entre 6 e 12 anos de idade inicia-se a diferenciação
das camadas e o ligamento vocal torna-se mais espesso. Aos 15 anos de idade
evidencia-se claramente a estrutura de três camadas do adulto. (PINHO, 1998 p.21)

Em meninos de 12 anos existe nas prega vocal leve


diferenciação da camada das fibras elásticas para a camada das
fibras colagenosas. No menino de 16 anos existe uma estrutura
de camada, como observa-se em adultos. Pode diferenciar o
epitélio; a camada superficial; a intermediária; e as camadas
profundas da lâmina própria; e o músculo. A estrutura da
camada da prega vocal, amadurece durante a adolescência.
Assim, a mudança de voz é associada não somente com o
aumento do tamanho da prega vocal, mas também com as
mudanças na estrutura interior da mucosa da prega vocal
(CANDIDO, 1999, P. 19)

O comprimento da parte membranosa da prega vocal em recém-nascidos é de1,3


a 2,0 mm. Cresce com a idade, até os 20 anos. Em adultos, o comprimento se estende
14,5 a 18,0 mm em homens e de 8,5 a 12,0 mm em mulheres. abaixo da idade de 10
anos o comprimento é igual entre os sexos. Acima de 15 anos, é maior em homens que
em mulheres. O comprimento da parte cartilaginosa da prega vocal, em recém-nascidos,
é de 10,0 a 14,0 mm. Cresce com a idade e aparece para alcançar o comprimento adulto
um pouco antes dos 20 anos. Em adultos, o comprimento se estende de 2,5 a 3,5 mm em
homens e de 2,0 a 3,0 mm em mulheres. Comparando a parte membranosa, o aumento
do comprimento da parte cartilaginosa não é tão marcante e nem a diferença entre os
sexos:

A proporção de crescimento da parte membranosa para aquela


parte cartilaginosa da prega vocal do recém-nascido é de 1,1 a
1,8 mm. Cresce com a idade até mais ou menos 20 anos. Em
adultos, a proporção se estende de 4,7 a 6,2 mm em homens e
3,3 a 4,5 mm em mulheres. A diferença na proporção entre
homens e mulheres é observada depois dos 15 anos.
Comparando as pregas vocais de um homem de 58 anos e de
uma criança de 6 meses, observou-se que na criança, a parte
membranosa é relativamente curta. As propriedades mecânicas
da parte membranosa podem ser reguladas a uma grande
extensão pelas atividades dos músculos laríngeos,
considerando que a parte cartilaginosa tem pouca
ajustabilidade. Maior movimento da prega vocal durante a
vibração acontece na parte membranosa. Por essa razão, o fato
de que a parte membranosa não só é absolutamente, mas
também relativamente maior em adultos que em crianças
apresenta evidência morfológica que os adultos são superiores
às crianças na habilidade potencial de controle de voz.
(CANDIDO, 1999, P. 17)
3 TÉCNICA VOCAL PARA VOZES INFANTIS

Entendendo técnica nesta pesquisa como sistematização de um determinado


fazer, esta passa a ser uma solução científica para problemas de execução, seja do ponto
de vista estético como no que se refere a saúde do artista.

O músico instrumentista é incentivado desde cedo à prática do instrumento, ao


contrário do cantor, que pelo senso comum deveria estudar canto somente quando seu
“aparelho fonador” estivesse plenamente desenvolvido. Questiona-se até que ponto é
possível trabalhar uma voz ainda em formação sem comprometer sua qualidade futura
ou ainda, se é possível preparar um cantor desde a infância. Entretanto não poderíamos
questionar se a ausência de um trabalho técnico-vocal em coros infantis não daria
margem a possíveis prejuízos vocais, dado o mau uso da voz?

Quando falamos em técnica vocal sem dúvida nos referimos a um universo


extremamente amplo, repleto de propostas e características sonoras antagônicas. Por
outro lado, abrir mão de seu uso pode não ser conveniente levando-se em conta a
qualidade performática desejável. Além disso, existe a necessidade de proteger o órgão
vocal de possíveis problemas. Para Carnassale:

Quando se trata de ensinar canto a crianças isto significa, no


mínimo, manter sua saúde intacta,e no Maximo, desenvolver
suas potencialidades de forma a conseguir o maior resultado
com o menor esforço físico. Para deixar bem claro: a eficiência
esta relacionada com desempenhar uma tarefa da melhor
maneira possível, ou seja, atingir o melhor resultado com o
mínimo de esforço (gasto de energia). A importância da técnica
vocal no ensino de crianças reside no fato de que a maneira
particular que elas adquirirão no desempenho do canto pode
não ser eficaz (não atingir as expectativas) ou pior, não ser
eficiente, danificando o aparelho fonador, o que resultara em
prejuízo artístico, psicológico, social e físico (CARNASSALE,
1995, p. 18).

Na presente pesquisa, entendemos que o estudo técnico pode e deve ser usado na
preparação vocal de crianças. Utilizando a definição sugerida por Perelló, técnica vocal
seria: “um conjunto de diretrizes sistematizadas, cuja realização progressiva por um
sujeito saudável pode proporcionar uma capacidade de execução vocal bela e correta em
termos de altura, intensidade, timbre e sem fadigar-se” (PERELLÓ, 1982). O objetivo
da técnica vocal, segundo o autor (e concordamos com tal afirmação) consiste em
aprender a respirar corretamente, impostar a voz de forma adequada e articular
claramente os fonemas (tendo em vista que as palavras “corretamente” e “adequada”
podem apresentar diversas interpretações conforme a linha de estudo em questão). O
que seria um treinamento vocal correto e adequado, tendo em vista a multiplicidade de
técnicas e ideais timbrísticos? Escolher um caminho para tal treinamento não é fácil.
Para tanto, a presente pesquisa propõe apresentar mediante referencial teórico aspectos
que devem ser observados na busca de um caminho técnico- vocal satisfatório baseados
na plena consciência corporal.

3.2 CONSCIÊNCIA CORPORAL

No presente trabalho, entendemos por consciência corporal o domínio do corpo


como um instrumento musical. O corpo é o instrumento do cantor. Todo o corpo
colabora direta ou indiretamente na produção da voz. Qualquer instrumentista
desenvolve seu som a partir de elementos externos e palpáveis. Ele pode segurar seu
instrumento, sentir sua forma com as mãos. Com o cantor é bem diferente. A voz nasce
dentro dele. Não vemos esse mecanismo. Quase sempre não observamos as sensações
do seu funcionamento. Só o notamos quando alguma coisa vai mal. Através de
consciência corporal entendemos e controlamos nossa emissão resultando uma técnica
consciente e apurada.

3.2.1 CONSCIÊNCIA DE UMA POSTURA PARA O CANTO

Coelho faz uma analogia entre o canto e outros instrumentos musicais para
explicar a relevância de uma postura corporal ideal durante a fonação:
"Em qualquer instrumento musical, a sonoridade não depende apenas da técnica e do
sentimento do artista, mas também da qualidade do material empregado e do
refinamento presente em cada detalhe de sua construção. No canto, o instrumento a ser
executado é o próprio corpo. Fazendo uma analogia: a saúde geral, física e psíquica,
corresponde à qualidade do material empregado; a postura, ao refinamento de sua
construção."(COELHO, 1994, p. 25- 27). O processo de consciência corporal deve
vincular-se desde sempre à conscientização postural. Segundo Hofbauer (1978, apud
Coelho, 1994) “os principais objetivos de um trabalho de postura são: adquirir
consciência do próprio corpo, colocá-lo em posição natural, manter ou restabelecer sua
elasticidade, e desenvolver equilíbrio e autocontrole.”. Uma postura consciente dá
leveza e flexibilidade ao corpo inteiro, incluindo os órgãos ligados à fonação. Cantar
por si só implica numa série de movimentos musculares. Tais músculos precisam
equilibrar relaxamento e tensão em doses corretas. Se por um lado os músculos de
pescoço e ombros devem estar relaxados para o canto, outros músculos ligados ao
manejo respiratório precisam de tonicidade para o seu melhor aproveitamento. É através
de uma boa postura que tal equilíbrio é atingido.

Chevitarese (1996) enfatiza: "Outro ponto importante na obtenção de um bom


resultado sonoro com a afinação precisa é a consciência de que relaxamento e postura
têm que caminhar junto. É preciso que a postura adotada durante o canto facilite o
controle da expiração e o encaminhamento da coluna de ar em direção à laringe (onde
se localizam as cordas vocais) e às caixas de ressonâncias (CHEVITARESE, 1996,
p.37).

Entende-se como uma boa postura para o canto segundo os autores consultados:
"É importante observar as seguintes alterações: arqueamento
de ombros, posicionamento da coluna, anteriorização do
queixo, inclinação e/ou rotação da cabeça, pois elas
comprometerão a qualidade vocal e, com o uso prolongado
da voz, possivelmente prejudicarão a livre excursão de
laringe, o mecanismo respiratório e o processo vocal como
um todo. As posições da cabeça, do pescoço, dos ombros, do
tórax são particularmente importantes, pois estas partes do
corpo contribuem diretamente para a emissão da voz agindo
sobre a laringe, as pregas vocais, a respiração e as cavidades
de ressonância" (Souza, D.P.D.; Silva, A.P.B.V.; Jarrus,
M.E.; e Pinho, S.M.R.; 2006; p. 218).

1. Pés um pouco afastados na largura dos quadris distribuindo o peso do corpo


sem sobrecarregar os calcanhares. O ideal é que o corpo se mantenha
flexível, porém firme, apoiado sobre os dois pés, mas pronto para
movimentar-se. Quando sentado (em ensaios, por exemplo), deve-se apoiar o
quadril, cuidando de não apoiar-se no encosto da cadeira, mantendo pernas e
pés paralelos; quadris bem encaixados e tronco vertical ; queixo paralelo ao
chão, sem inclinar a cabeça para trás”.

2. Quadris soltos e encaixados. Joelhos ligeiramente flexionados nunca rígidos,


sempre prontos para o movimento. O peso do corpo deve estar distribuído
igualmente sobre ambas a s pernas.

3. Ombros descontraídos sem tensionar as articulações.

4. Manter a cabeça numa posição centralizada, posicionada ligeiramente à


frente (nunca para cima) numa posição retilínea com o tronco por meio de um
alinhamento da coluna vertebral. Desvios nessa relação exigem o rearranjo da
musculatura circunvizinha, alterando e tensionando diversos grupos
musculares.

3.2.2 CONSCIÊNCIA DOS PONTOS DE TENSÃO DO PRÓPRIO CORPO PARA


RELAXÁ-LOS

Cantar pode parecer um ato extremamente natural e fisiológico para alguns.


Temos a sensação de que o corpo nasceu totalmente preparado para a fonação, mas é
sabido que a fonação é uma função secundária do corpo. O que chamamos de “aparelho
fonador” é um conjunto de órgãos emprestados de outros aparelhos orgânicos cujas
funções são vitais para a nossa sobrevivência. Nem sempre as necessidades do canto se
aplicam ao caráter vital de tais órgãos. Um grande exemplo disso são os articuladores
mandíbula e boca. A função fisiológica desses órgãos está ligada à digestão, e seu
movimento natural é o fechamento. No canto, boca e mandíbula se abrem para a
fonação, e, quanto mais relaxado esse movimento, melhor o som produzido. Portanto, é
fato que determinados pontos do nosso corpo terão uma tendência natural ao acúmulo
de tensões.

Ressaltamos alguns pontos de acúmulo de tensões prejudiciais à fonação


frisados pela bibliografia consultada:

1 – Pescoço – Região onde se encontra a laringe. Neste caso, incluímos também as


tensões na musculatura supra-hióidea2 e a tensão relacionada à posição da laringe no
pescoço. A tensão na musculatura supra-hióidea provoca uma posição elevada da
laringe e dificulta a livre expansão mandibular tornando a produção vocal menos
flexível. Essa elevação laríngea reduz a caixa de ressonância e torna o espectro vocal
mais pobre em harmônicos (BEHLAU, 2005). É comum observarmos elevação de
cabeça e pescoço em cantores não treinados especialmente na emissão de notas agudas:

2
Osso hióideo - pequeno osso em forma de ferradura situado na parte anterior e média do pescoço, entre
a base da língua e a laringe (HOUAISS, 2000) - Músculos supra-hióideos: Músculos digástrico, estilo-
hióideo, milo-hióideo, e genio-hióideo (http://www.auladeanatomia.com/sistemamuscular/pescoco.htm).
“No canto, como na palavra falada, a laringe, que é um órgão móvel, deve estar livre
para executar movimentos de elevação ou abaixamento que estão relacionadas com as
flutuações da linha melódica (...). Ela muda também de lugar conforme a posição da
cabeça (inclinada à frente, ela se abaixa; levantada, ela se eleva)” (DINVILLE, 1993, p.
32). As crianças devido abaixa estatura tendem a levantar o pescoço freqüentemente
para cantar ou falar.

2 - Mandíbula – Tem como função vital o fechamento (mastigação). Isso explica a


dificuldade de alguns cantores, entre eles os mirins, em abrirem a boca para emissão
vocal. Uma limitação na abertura da mandíbula dificulta os ajustes necessários à
emissão especialmente de notas agudas: “O cantor prende a articulação, em alguns
casos jogando o queixo para frente, em outros, entortando a boca, o que provoca uma
abertura deformada” (CHEVITARESE, 1996, p. 70). A posição de mandíbula
influencia diretamente na qualidade sonora. Para sonoridades mais abertas e claras, a
abertura tende a horizontalidade, se assemelhando à fala. Para uma sonoridade mais
arredondada, mandíbula deverá estar aberta na vertical, tendo como padrão a forma da
vogal O.

3 – Língua – A língua é um dos principais articuladores, portanto um foco natural de


tensões, já que sua função vital é ligada ao aparelho digestivo. Para digestão a função da
língua é simplesmente preparar o alimento. Para a fonação, a língua é responsável por
uma gama considerável de fonemas cujo ponto articulatório se dá com sua participação
direta, já que se trata de um articulador ativo. É unânime em técnica vocal que a língua
deve permanecer relaxada ao mesmo tempo em que ativa na execução dos fonemas que
lhe são cabíveis. A tensão de língua promove uma retração deste órgão, causando uma
modificação do trato vocal e no foco de ressonância, podendo, de forma indireta,
provocar tensão no modo vibratório das pregas vocais e nas estruturas laríngeas
supraglóticas (BEHLAU, 2005, p.291). Quando não solicitada diretamente na execução
de algum fonema, a língua precisa manter-se relaxada: “(...) Os movimentos da língua
exercem influencia na elevação do véu palatino, na posição da mandíbula e sobre toda a
cavidade faríngea (...).” (PERELLÓ, 1982, p.233). Quando solicitada, a língua precisa
cumprir seu papel com êxito, expressando claramente o fonema proposto. Chevitarese
(1996) apresenta dois exemplos de tensão na língua, tensão na base posterior e retração
lingual: " A tensão na base da língua prende a laringe e impede a livre emissão (...).
Retração lingual - Tendência da língua em se retrair na base, ficando sua a ponta
suspensa no meio da boca. O resultado é uma ressonância pobre, sem boa definição das
vogais, pois a massa lingual impede a passagem do ar na sua cavidade natural de
ressonância (CHEVITARESE, 1996, p.62)".

3.2.3 CONSCIÊNCIA RESPIRATÓRIA

A respiração é o primeiro e o ultimo ato da vida humana. É a base de toda a vida


e também da fonação.

O esquema respiratório para o canto difere consideravelmente do esquema


utilizado para a fala. Behlau (2005) compara tais diferenças, entendendo o mecanismo
usado para cada intenção. A autora explica que na voz falada, a respiração é natural e o
ciclo respiratório completo varia de acordo com as emoções e o comprimento das frases,
diferente do canto, onde a respiração é treinada e os ciclos respiratórios são pré-
programados de acordo com as frases musicais. A autora explica que durante a fala, a
inspiração pode ser relativamente lenta e nasal (em pausas longas) como também mais
rápida e bucal utilizando quase sempre um volume médio de ar, exceto em situações de
forte intensidade. Para o canto, a inspiração é quase sempre muito rápida e bucal,
utilizando um volume de ar bem maior. No canto ocorre grande movimentação dos
pulmões na tomada de ar, com expansão de todas as paredes do tórax. Na fala, a
movimentação pulmonar é pequena com pouca expansão da caixa torácica. A
respiração de um bebe e de um adulto dormindo é semelhante; predomina-se o uso da
musculatura inferior do tórax e dos músculos abdominais. Por alguma razão, o homem
ao crescer passa a realizar uma respiração mais alta, usando músculos claviculares, o
que leva a uma menor oxigenação sangüínea (CASTELO BRANCO, 1997, p.3) .O
processo respiratório passa a ser superficial e com movimentos excessivos da parte
superior da caixa torácica (o famoso ato de estufar o peito e levantar os ombros ao
inspirar). Essa respiração nos prejudica muito porque impede uma tomada de ar ampla e
profunda.

Laurence incentiva o treino respiratório na infância, ainda que diferenciado do


treino em fase adulta:
Embora crianças não possam e não precisem realizar o
treinamento intensivo no controle da respiração exigido aos
cantores adultos em determinados gêneros musicais, podem ser
incentivadas a ter consciência de sua respiração, e da sua
importância em seu canto. Acho que chamar a atenção delas
para longe da área do peito, minimiza a possibilidade de aperto
no pescoço e ombros, e ajuda a manter uma sensação de
relaxamento nessas áreas (LAURENCE, 2000, p. 225.
Tradução nossa3.)

Marsico concorda e apresenta fontes bibliográficas que indicam dificuldades


respiratórias em um número significativo de crianças: Paul Nitsche4(1967, apud
MARSICO, 1979, p.32) constatou num grupo de alunos da terceira série que de cada
quarenta alunos, 16 respiravam bastante bem, ainda que não de forma perfeita (lê-se
sem esforço clavicular), enquanto 24 levantavam os ombros e contraiam o abdômen
durante a inspiração, demonstrando para o autor deficiência na atividade do diafragma.
Sobre isto Marsico conclui: “Daí se conclui que a respiração deficiente e defeituosa
encontra-se quase sempre na raiz dos males do funcionamento vocal; por isso seria
recomendável à prática da respiração natural como medida preventiva (MARSICO,
1979, p. 32). Comprovamos estes dados em nossa vivência em preparação de coros
infantis. As reclamações em frases musicais longas de trechos sem pausa para
respiração sempre são muitas e veementes.

Mediante os autores consultados, concluímos que a respiração adequada ao


canto compreende uma tomada de ar quase sempre bucal; não apresenta esforço
clavicular; valoriza a expansão da cinta abdominal; é rápida e silenciosa.

O grande desafio da respiração para o canto é transformar um movimento que é


naturalmente passivo, numa ação consciente e condicionada. Esta é uma opinião
unânime entre os profissionais envolvidos no treinamento e na reabilitação de
cantores:o suporte respiratório é essencial para o canto. O mecanismo de suporte
constitui a fonte geradora de um vetor de força na coluna de ar, que irá passar entre as
pregas vocais (BEHLAU, 2005, p.308). Chamaremos tal mecanismo de apoio. Usando a

3
While children cannot and need not undertake the intensive training in breath control required by adult
singers in certain musical genres, they can be encouraged to be aware of their breathing, and that it is
important in their singing. I find it to draw their attention away from the chest area, to minimize the
chance of tightness in the neck and shoulders, and to help maintain a relaxed feeling in those areas.
4
NITSCHE, P.. Higiene de la voz infantil. Buenos Aires, Eudeba, 1967.
definição de Coelho: "Apoio, portanto, é o controle elástico e consciente da força retrátil
passiva e espontânea do movimento de elevação do diafragma ao promover a expiração,
e é conseguido pelo domínio de seus antagônicos-- músculos abdominais e intercostais--
com a finalidade de manter o equilíbrio da coluna de ar e aplicá-la a fonação". Em
resumo o apoio respiratório consiste em dosar a saída de ar de acordo com a duração,
com a intensidade e com o objetivo da frase musical (Souza, D.P.D.; Silva, A.P.B.V.;
Jarrus, M.E.; e Pinho, S.M.R.; 2006, p.218).

O apoio respiratório é a ação do sustento constante do som vocalizado,


utilizando a respiração costo – diafragmático - abdominal. A duração das sustentações é
o resultado de uma excelente administração do ar e não uma prova de força. O apoio
respiratório consiste em dosar a saída de ar de acordo com a duração, com a intensidade
e com o objetivo (SOUZA, D.P.D.; SILVA, A.P.B.V.; JARRUS, M.E.; e PINHO,
S.M.R.; 2006, p.218).

Sundberg (1987) e Behlau (2005) sintetizam o termo por meio de duas


expressões americanas: belly in e belly out: “na técnica belly in – barriga pra dentro, a
parede abdominal fica contraída durante o canto; ao contrário, na técnica belly out –
barriga para fora, a parede abdominal fica distendida ao longo da emissão.”(BEHLAU,
2005, p. 301). O objetivo nas duas técnicas é controlar a saída de ar durante a emissão
fonatória. Sundberg também inclui outros dois tipos de apoio, um tipo misto onde
abdômen e diafragma se contraem e outro em que se observa a contração do diafragma
apenas nos começos de frase (SUNDBERG, 1987, p. 47). Sundberg explica ainda que o
único requisito exigido do aparelho respiratório que é realmente necessário às pregas
vocais para que essas produzam som vocal, é uma pressão de ar subglótica. Neste caso
as diferentes maneiras como se inspira e expira seriam equivalentes, exceto por duas
razões: diferentes mecanismos de expiração permitem algum controle da pressão
subglótica, afetando a dinâmica (intensidade sonora) e afinação no canto; a laringe esta
interligada ao aparelho respiratório e, portanto, diferentes estratégias respiratórias
podem afetar a fonação de várias maneiras (SUNDBERG, 1987, p. 25)
3.2.4 RESSONANCIA E ARTICULAÇÃO

Por uma definição de dicionário, ressonância é “a vibração do ar contido nas


cavidades supraglotais, numa freqüência correspondente ao seu volume e à sua forma,
que causa a intensificação do tom fundamental ou de alguns harmônicos do som
produzido pelas cordas vocais“ (HOUAISS, 2000). Coelho afirma que “Todas as
cavidades do corpo cujo conteúdo aéreo e cujos componentes ósseos, cartilaginosos ou
musculares entram ou podem entrar em vibração são cavidades de ressonância (Coelho,
1996)”. A energia sonora recém-criada começa a se amplificar já nas paredes da laringe,
enquanto procura a saída mais próxima (porque está sendo pressionada pra cima pelo
mecanismo de apoio, de quem falamos anteriormente). Ao chegar ao centro do rosto,
atrás da boca (região orofaríngea), acontece a primeira grande amplificação dessa
energia. Quanto mais se dá a expansão sonora, mais outras cavidades passam a vibrar
em ressonância. Para a autora, não somente as cavidades, como músculos, ossos,
cartilagens, propagando o som por todo o corpo, enquanto houver sopro. Quanto mais
distribuído o som, melhor a sua qualidade timbrística. Ao contrário, se mal distribuído
teremos uma qualidade vocal questionável:

O foco ressonantal, controlado pelas diferenças no formato e


tensão do trato vocal, tem relação direta com a região do trato
vocal onde predomina a amplificação da voz, como um todo.
Mereceram nossa atenção basicamente o foco nasal (rinolalia
aberta e fechada, hiponasalidade e denasalidade), foco
laringofaríngeo e foco faríngeo. No foco faríngeo, a voz é
metálica e estridente. Ocorre contração de pilares faríngeos
(músculos palatoglosso e palatofaríngeo), de constritores
faríngeos e elevação do dorso da língua. Nesta situação, há
uma tendência ao estiramento dos lábios em sorriso, podendo
estar presente o sigmatismo lateral. O foco laringofaríngeo é o
mais comumente observado diante dos quadros de disfonia. Há
uma concentração de tensão muscular na região cervical, com
tendência à posteriorização da língua, gerando som abafado e
sem projeção. Na ressonância por rinolalia aberta ocorre o
desvio do fluxo oral para a cavidade nasal, gerando nasalidade.
As causas que justificam a deficiência no fechamento
velofaríngeo podem ser funcionais ou orgânicos. Na
denasalidade, também chamada ressonância oral, ocorre a
ausência completa de nasalidade durante a emissão de sons
nasais por desvio completo da corrente de ar para a cavidade
oral, seja por distúrbios puramente orgânicos (polipose nasal,
adenóide volumosa) ou quadros funcionais (deficiente
auditivo). A rinolalia fechada, a voz de resfriado, implica,
necessariamente, em presença de alteração nasal orgânica.
Ocorre função velar normal, com direcionamento do fluxo de
ar para a cavidade nasal, havendo, porém, distorção dos sons
nasais devido às condições locais, por presença de edema das
estruturas internas do nariz; rinite alérgica ou gripe; polipose
nasal; desvio de septo; etc. (SOUZA, D.P.D.; SILVA,
A.P.B.V.; JARRUS, M.E.; e PINHO, S.M.R.; 2006, p.218).

Mesmo sabendo que o termo ressonância dificilmente é usado no seu sentido


científico, mas informalmente associado ao timbre vocal, o ensino do canto associa-se
todo o tempo imagens às sensações nas cavidades de ressonância do trato vocal para
ajudar a descrevê-las (as sensações proprioceptivas). No trabalho com vozes infantis às
associações são ainda mais metafóricas e menos científicas. Portanto cabe ao preparador
vocal entender que tipo de direcionamento vocal essa criança faz intuitivamente para
induzi-la ludicamente ao som esperado. Por exemplo, se uma criança canta com voz
anasalada, é preciso entender os porquês desta emissão e induzi-la através de exercícios
apropriados aliados a imagens e associações ao som desejável.

Nesta pesquisa incentivamos vozes ditas “na máscara” ou de cabeça, o que


indica que o foco de ressonância concentra-se na parte superior do trato vocal. A voz
com predominância de ressonância na caixa torácica não é incentivada, visto que torna a
voz pesada, de difícil timbragem. Mesmo as vozes mais graves são incentivadas à uma
colocação vocal mais alta.

Uma boa maneira de esclarecer para as crianças a questão dos ressonadores é


fazê-las sentir esta distribuição sonora em seu próprio corpo. Behlau (2005, p. 459)
recomenda o uso de sons nasais, como aliado para reduzir o foco de ressonância
laringofaríngea.

A forma como se dará a distribuição sonora nas cavidades de ressonância em


muito está ligada à articulação dos fonemas, a arte final” do processo fonatório. O que
diferencia a voz humana dos outros instrumentos musicais é a capacidade de juntar
música e texto, o que só é possível graças ao trabalho dos articuladores. Eles
transformam o som vocal em fonemas reconhecíveis da fala. Coelho diz que “os
articuladores são basicamente dentes, boca e língua, podemos incluir em tal lista o
palato mole, cujo movimento define oralidade ou nasalidade. Perelló (1982) explica que
os diferentes fonemas são produzidos por modificações no tubo vocal, o som puro, que
sai livremente são as vogais, e os ruídos produzidos pela passagem do ar expirado pelos
obstáculos originados da aproximação dos articuladores são as consoantes. As vogais
são veículos de som por excelência, elas têm o poder de dar cor e foco à voz. A
formação das vogais tem influencia direta sobre a qualidade sonora:
A intensificação, sustentação e caracterização da linha
melódica se dá pelas vogais e pela forma como são usadas,
quais sejam, sua forma e ponto de articulação, bem como
posicionamento das cavidades de ressonância empregadas. O
timbre claro e aberto, chegando até o estridente, se contrapõe
ao timbre escuro e fechado, que pode chegar ao extremo do
som velado, mudando diametralmente a sonoridade de uma
mesma vogal. É necessário dar especial atenção as cores das
vogais, e também neste ponto á semelhança das questões
relacionadas a ressonância, o ouvido externo é o melhor juiz.
(COELHO 2005, p.. 47)

Uma boa voz implica em articular com precisão cada som do texto e pronunciar
com clareza e flexibilidade permitindo a compreensão.

A dificuldade do trabalho de articulação passa pelas características individuais


do alunos e, no caso das crianças, pelo fato dos articuladores estarem em constante
processo de adaptação ao crescimento, nova dentição e em alguns casos aparelhos
ortodônticos.

As vogais prediletas no trabalho técnico vocal determinarão a sonoridade do


coro, ditarão se a "cor" do som será mais escura e fechada, mais clara e aberta... Quanto
às consoantes, articulá-las com energia contribui com a precisão do ataque vocal. As
consoantes, como são as “dobradiças” da articulação, devem servir de trampolim
projetando as vogais a frente. Recomendamos uma pronuncia acentuada das consoantes,
sem temer o exagero, tornando o texto cantado plenamente compreensível. Trabalhando
a articulação consonantal, língua e lábios ganham maior flexibilidade, firmeza e
agilidade. Além disso, consoantes constituem força dramática.

3.2.5 TESSITURA

O termo tessitura é utilizado para designar o conjunto de notas cuja emissão é


mais cômoda. Diferente de extensão vocal, que seria o conjunto de todas as notas que
um cantor é capaz de emitir. Usando a definição de Garde (1970, p. 115, apud Marsico,
1979) é o conjunto de sons que convém melhor a uma voz. Os autores apresentam
opiniões diversas quanto a classificação vocal de crianças e a melhor região para
incentivá-las ao canto. A escolha da tessitura ideal para a voz infantil é mais um campo
polêmico no que se refere ao estudo de técnica vocal na infância. A extensão vocal dos
pequenos apesar de aparentemente simples em sua classificação pode sofrer influência
de diversos fatores, culminando inclusive em problemas de afinação. Em coros, em
geral, dividimos as vozes em sopraninos (para as vozes agudas) e contraltinos (para as
mais graves). Lembrando que antes da muda vocal meninos e meninas tem vozes iguais.
Em nossa vivência com coros infantis as crianças são encorajadas a cantar em
regiões mais agudas. Para algumas crianças determinadas notas do grave são possíveis
sem esforço, mas é minoria. Vozes médias e agudas constituem a grande maioria dos
coros com os quais trabalhamos até hoje. O repertório geralmente compreende de dó3 à
Mi4. Para tanto empregam-se exercícios vocais que estendam a tessitura da voz infantil,
que treinada, chega a dobrar sua extensão com beleza e facilidade de emissão. Inicia-se
o trabalho vocal na região média, trazendo aos poucos os graves e agudos. O simples
incentivo a um canto mais “suave” pode ajudar a criança a acessar uma colocação vocal
dita "mais alta". A dificuldade nos tons mais agudos apresentada por algumas crianças
muitas vezes está ligada ao fato da criança cantar imprimindo força como quem busca
muito volume no "grito".

3.2.6 ATAQUE VOCAL

O ataque vocal diz respeito a como se inicia a adução glótica durante a fonação.
Pode ser suave, brusco ou aspirado. O ataque vocal suave consiste na adução glótica
suave, sincronizada com a expiração controlada. O ataque vocal brusco pode ser
causado por uma adução intensa, ou adução precoce e fluxo expiratório excessivo diante
de adução intensa. O ataque vocal aspirado pode ser fruto de uma adução deficiente ou
atrasada (SOUZA, D.P.D.; SILVA, A.P.B.V.; JARRUS, M.E.; e PINHO, S.M.R.; 2006;
p. 219). “Ataque é, no canto lírico, o termo para definir se o ar deve sair antes (ataque
macio), ao mesmo tempo (ataque sincronizado) ou depois (ataque duro) das pregas
vocais se fecharem para a emissão vocal” (FARAH, 2010, p. 64).

O ataque vocal que incentivamos nesta pesquisa é suave, ou seja, uma adução
glótica suave, sincronizada com a expiração controlada.
4 CONCLUSÃO

Certas contribuições relativas à experiência de vida das crianças somente a


música pode oferecer e o corpo é o nosso primeiro instrumento e o de mais fácil acesso
para a experimentação musical. Dessa forma, o canto ocupa lugar de destaque no
processo de educação musical porque trabalha mediante consciência corporal
manifestação de parâmetros tais como altura, intensidade, ritmo, senso harmônico
(quando em coro), aspectos de agógica e contrastes.
Mesmo sem estudar canto formalmente, as crianças aprenderão a cantar; bem ou
mal, de forma afinada ou desafinada, com essa ou aquela qualidade vocal, a partir de
seus modelos (pais, professores, colegas, artistas veiculados pela mídia, etc). Nesse caso
a probabilidade de haver prejuízo no desenvolvimento da qualidade da voz é imensa,
pois a criança tenta modificar o seu timbre (a característica qualitativa de sua voz) para
adequar-se ao modelo disponível. Portanto, é melhor que tenham um bom exemplo, de
pessoas preparadas para orientá-las através de um desenvolvimento técnico estruturado
em todos os sentidos, pensado especialmente para faixa etária em questão.
O estudo da voz infantil depende do reconhecimento das características
específicas do órgão vocal das crianças e sua relação com o treinamento vocal. Neste
trabalho buscamos descrever brevemente tais peculiaridades que são derivadas de
condições anatômicas e fisiológicas também especificas.
A laringe infantil se encontra numa posição mais alta em relação a coluna
cervical que a laringe de um adulto. Essa localização determina que o comprimento do
trato vocal seja menor, o que influência na ressonância da voz. Por outro lado, as pregas
vocais infantis são caracterizadas por uma ausência do suporte rígido composto do
ligamento vocal. O ligamento é formado gradualmente, a partir de 4 anos de idade, até
que, em torno de dezesseis anos forma uma unidade histológica distinta. O sistema
respiratório, embora apresente as mesmas características anatômicas de adultos, trabalha
com um volume de ar muito menor, e, portanto, menos força muscular. Isto pode
influenciar aspectos da fonação relacionados à duração e intensidade da voz emitida.
Cientes destas peculiaridades trabalharemos a questão técnico-vocal a partir destes
saberes privilegiando o que a voz infantil tem de melhor: sua delicadeza e suavidade.
Propomos um trabalho técnico baseado em consciência corporal por entender que
poucas pessoas são convidadas a perceber e conhecer o próprio corpo em suas
atividades diárias. O estudo do canto pressupõe o estudo do próprio corpo, já que o
instrumento fonador é parte de nossa fisiologia. Cantar exige direta ou indiretamente,
uma nova relação com seu corpo, desde a postura ideal para o canto até o domínio da
chamada respiração fisiológica, controle do sopro e domínio da emissão.
Reafirmamos o papel fundamental de um trabalho técnico-vocal embasado e
consciente com vozes infantis, entendendo mediante a bibliografia consultada que a voz
infantil não é tão frágil como se imagina e, que, com ou sem aulas de canto a criança
desenvolverá intuitivamente padrões vocais que poderão colocar em risco a sua saúde
vocal. O uso de exercícios fonoterápicos seria uma excelente maneira de proteger as
vozes infantis de futuros prejuízos, além de trabalhar a qualidade estética das vozes em
questão.

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