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(Maron «Figo d'Arte » [Filho da Arte], « Entrevista com Alberto Vitali», in Comédien?! Clown?! [Ator?! Clown?!]. Lectoure: Bouffonneries, 1982. p.46-50. n° 7. Trad, de José Ronaldo FALEIRO cry BOUFFONNERIES: Qual é a sua definig&o de clown? ALBERTO: Ah! Isso a coisa mais complexa e mais dificil de explicar. A palavra clown abrange um conjunto enorme de coisas. Mas para as pessoas, 6 existe uma visdo: um tipo maquilado num circo, com sapatos grandes, com uma peruca e um nariz vermelho. Ele entra na pista, toca trompete. Um outro chega com um grande martelo @ bate na cabega do primeiro, o trompetista fica com os olhos cheios de lagrimas, um galo enorme aparece no seu craneo, e eles saem gritando. O piiblico néo entendeu direito a histéria, mas ela é visual, desiumbrante. Mesmo que nao seja engragado, os ‘clowns de hoje exploram sempre o mesmo filo, exceto algumas antigas familias de clowns tradicionais que executam entradas construidas, com talento. Hoje, os clowns que acabo de descrever esto morrendo. Jé ndo existe amor, jé ndo ha paixdo, j4 no existe transmissdo entre artistas e publico. Foi 0 circo que os matou. O circo tornou-se uma industria cada vez mais enorme. E quase como bater o ponto antes de comegar. ‘A gente chega, trabalha, faz dois espetéculos, desmonta o pavilhdo e chega a outra cidade onde se remonta, trabalha, etc. Tomou-se um automatismo. Nao espantoso que 0 clown esteja morto. Mas acredito que ha um outro modo de ser clown, aquele que Carlo e eu tentamos perpetuar: permanecer no cOmico. Nao ha palavra francesa, portuguesa ou italiana para definir um cOmico, para definir alguém que faga rir. Para mim, se quisermos empregar a palavra clown, 6 Charlie Chaplin, Buster Keaton, Olver Hardy. S4o clowns. Eles nao tinham o nariz vermelho, eles nao usavam a maquitagem tradicional, e no entanto provocavam o iso. E hoje, vendo os filmes deles, a gente continua a fir. Eles pegaram gags na tradicéo da Commedia del’Arte, na tradigao do circo, e os adaptaram &s personagens deles. Inventaram novas situagées, novas coisas, e € por isso que hoje eles ainda provocam o riso. Carlo e eu tentamos continuar nessa tradigéo. Pegamos idéias nas fontes da Commedia @ as transformamos para 0 nosso carater e para a nossa visdo e época em que vivemos; @ fica parecido com historias novas, parece que a gente inventou novas gags, novos ‘esquetes. Mas isso tudo muito antigo. Nada de novo debaixo do sol. B.: Entdo nao ha diferenga entre um ator e um clown? ‘A: Apesar de tudo, um ator 6 um pouco diferente de um clown. Mas eu digo que para ser um bom clown, a gente deve ser um! dtimo ator. Para ser ator, nao é preciso ser clown. B.: Que 6 que vooé pensa dessas pessoas que afirmam que é preciso vir do circo para ser clown? A: Nao é verdade. E completamente falso. Gtck nao era de uma familia de circo e se tomou um grande clown, Ha outros exemplos. Em compensagao, eu conhego nos circos pessoas que sdo filhos de gente de cingo: o pai era clown, o av6 era clown, € eles sdo um verdadeiro desastre. A gente @ clgwn, a gente ndo se toma clown. Pode- se aprender a técnica, mas o espirito a gente q tem dentro de si, Um exemplo mais do e 2 que evidente: com Carlo, tenho o papel do escada, por causa do meu fisico, e no entanto sou fiho de gente do oficio. O meu pai ndo era bem clown, ele representava 0 clown. $6 0 meu tio era um grande clown. Por meu fisico, por minhas caracteristicas, ‘soi aquele que dé a Carlo, 0 clown, o cdmico, a possibilidade de fazer as suas lorotas. Um tipo pequeno, gordinho, redondo, com dois olhos grandes, ja ¢ cOmico em si. Para um tipo grande, robusto, j4 é mais dificil. Femandel era um grande clown, mas 0 seu rosto por si s6 era cémico. Bourvil é fantastico. Mas imagine Alain Delon fazendo um clown! Quando se tem 0 tipo fisico, 6 mais facil ser cémico. Mas ser nascido numa familia de artistas néo quer dizer que automaticamente a gente va ser um bom clown. B.: Que que voo8 pensa dessas escolas que atraem o cliente com: « Encontre o seu clown, seja o seu clown »? poe A: Hoje em dia esté na moda ser clown. Ha pessoas que se aproveitam disso. Mas 0 que eles nao explicam € que para tomar-se_ clown € preciso_uma.vida.inteira. Nao. basta _quinze dias de est4gio. Podem-se aprender certas coisas, é claro, mas paray tomar-se clown é preciso anos e anos. Chega-se a 90 anos sem ter esgotado todas as possibilidades que existem na profissdo. Dito isso, quanto mais se envelhece, mais se esta bem - um clown comeca a ficar bom quando passou dos quarenta.anos. Quando se & jovem, € muito mais dificil fazer rir. Com a idade, o rosto enrugado, os dentes faltando, os olhos estrabicos, etc... 6 mais simples! B.: Hoje, os grupos de clowns, a maior parte do tempo, so criados por atores. Hé alguns que s&o bons, outros menos bons, mas todos déo uma imagem muito classica, muito tradicional do clown: nariz vermelho, maquilagem, etc... Sera que vocés acreditam que existe ai uma possibilidade de regenerar o clown de circo? A: Falei com muitos atores que representam maquilados como clown: ara esconder 0 rosto deles. Uma mascara de clown é um pouco.como.a mascara da ‘Commedia: faz cinquenta por cento da personagem, pelo menos assim se acredita. Pedi a pessoas que trabalham com mascara para fazer a mesma personagem. sem ela. Ai as eases se_complicam. E depois, tudo isso € moda. Ha quinze anos, com Carlo, a gente excursionava quase que por toda a Europa, e quando nos apresentavamos, dizendo: « Temos um espetéculo de clowns », as pessoas nos olhavam com olhos muito abertos. As pessoas nao viam clowns em nés, no sentido tradicional. Pouco a pouco, levamos 0 nosso trabalho por toda a parte, e cada vez mais se viram trupes que comecaram a representar como clowns. Hoje em dia se Tepresentam até pegas tradicionais com trajes de clowns. Se ha um erro, se a peca no atingiu um bom nivel, como clowns se toma admissivell Representar como clowns se toma uma desculpa para certos groupos. B.: Tudo isso vai morrer? A: Sem divide B.: Muitos, dentre as pessoas que viram votés hé uns dez anos, acham que vocés fazem sempre os mesmos esquetes. 4 3 ‘A: So eles que pedem para a gente os fazer! Mas ndo é verdade que a gente faca sempre os mesmos. Fizemos trés espetaculos e estamos preparando um outro. Cada espetdculo 6 totalmente diferente do anterior. Nao ha duas gags iguais. Mas ¢ sempre I © mesmo estilo. E nossa caracteristica: ridicularizar, tomar ridicula a imagem herdica que 0 pubblico tem do artista e da obra de arte. Queremos eliminar todas essas estruturas 6 iifraestruturas; queremos voltar & origem do teatro. Antigamente se fazia isso nas ruas e nas pragas, e se contava tudo 0 que acontecia nas aldeias ou na corte. Mas hoje em dia mesmo o teatro popular se industrializou, tomando-se um espetaculo «de arte ». Hoje em dia tudo 6 classico, a luz deve cortar assim, a cortina deve dobrar assado, a misica deve entrar assim; tudo & cronometrado, preciso. Para mim, isso j4 vy nao 6 teatro. E preciso fantasia, que cada um veja as coisas de um modo diferente. O pliblico esté cansado: 0 progresso trouxe uma regres jos 08 campos e as pessoas se revoltam, cansadas com tudo isso. Hoje, 0 contato ator/ptiblico € necessério, as nossas relagdes com a platéia so relagSes de seducdo. Nao ha necessidade de disfargar-nos para fazer com que o piblico participe. Estamos vestidos «normalmente » como empregados: casaco e gravata. Nao pode ser mais clown. B.: Freqlentemente vocé fala em(improvisagao) Que 6 que vocé entende por isso? A: A improvisagao quase néo existe. Num espetaculo, ela representa 2 073%. E olhe la! Nem em todos os espetaculos. A improvisac jue s6 acontece uma vez de tempos em tempos. Em compensacdo,|existe a improvisacao controlada: eee espetaculo. Que é a improvisago controlada? Nascidos istico;“nos comegamos a aprender o nosso oficio com 2 anos. Trabalhando com os pais e vendo’) ‘0s outros clowns trabalhar, assimilamos centenas de gags, de piadas. A improvisago situacdo... A improvisagao nada mais é do que a adaptacdo de uma gag e a adaptagdo de uma gag numa determinada situagdo. A improvisagéo espontanea, a coisa que chega pela primeira vez, muito rara. B.: E 08 2/8 que sobram? A: Ea 1A técnica da Commedia detrarte. Jogat com a situagSo, com os objetos, coma fantasia, com o piblico, sobretudo. Um roteiro, uma histéria de base sobre a qual se pode trabalhar. Pode-se entrar, sair, mas permanecer nos limites e dar ao outro a possibilidade de fazer o seu jogo. Quanto mais a gente trabalha junto, tanto mais 0 jogo se toma perfeito, como um reldgi B.: Vooés fazem ou fizeram estagios. Isso trouxe alguma coisa para 0 trabalho de voo8s? A: Sim, cansago. N&o, isso néo traz nada. E por isso que ha muito tempo ja nao fazemos estagios © ndo temos a intengdo de voltar a fazé-los!

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