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A entrevista de tipo qualitativo: considerações

epistemológicas, teóricas e metodológicas·



J~an POtlparl

No que é considerado como um dos primeiros manuais de metodologia associa-


dos aos trabalhos da Escola de Chicago, Palmer (1928) defende que a possibili-
dade de interrogar o alOres e utihzá-Ios enquanto recursoEra a compreensão dãs
rea. a es socia;sconstitui uma das grandes vantãgens das ci~ncias oclais glbre

l ãSci!iiêiãSQâ natureza, as ~is se interessam por objetos desprovidos de palavra.


Abordan o a questão da relação entre conhecimento leigo e conhecim"nto ci"ntl-
fico, Bourdi"u, Chambor"don" Pass"ron (1968: 56) ddend"m o contn1rio -" isto
a despdtõd" todas a;-;;o-m:rovérsias qu" UI;';-l~maÇãopossa levantar -, que
"t, talvez, a maldição das citncias do homem, a de ter relação COm um obJelo que
o
I fula";-pól!;J enrao, risco é grana" . e v"ra ciência cõnfundiras interpretações qu" os
tor"5 dão da reaLidade com a realidade tal e qual.
Esses comentários sobre a entrevista" sobre o "5tatUlo do material coletado
ilustram bem toda a ambiguidade ligada ao uso de um dos instrumentos de pes-
quisa tido como um dos mais freqüentem"nte em reEados nas ci~nci., ociais.
D" um lado, as entrevistas constituem uma porLa de acesso às realidades sociais,
apostando na capacidade de entrar em relação com as Outras, Do OUtrO, essas rea-
lidades sociais não se deixam facilmente apreender, sendo transmitidas atravês
do jogo e das ucstO"s das int"raçOes sociais que a rdação de entrevista necessa-
riamente implIca, assim com do jogocompl"xo das muluplas IOt"rpretaçOes
produzidas pelos discursos. -
Longe d" "5gotar o conjunto das ren«xôes conc"m"ntes ao uso das "ntrt\'IStas,
"5t" anigo tratará d" três temas rdativamente ao estatutO da wtrevisLa, t"mas estes
não sem rdação com o aspectos acima mencionados. Prim"irament", examinare.
os argumentos de ordem epist"molôgica e ético-politica, alegados, comumente,
lI) 'para justifica!.o recmso à entreViSlll de upo qualllativo,já que, para além da ques-
tões de método, o emprego deste in trum"nto acarreta diferentes conc"pçôes da

* Gostam. de agradecer a meus colaborDdores d~ pesquisa lRnis Btliveau. MyltncJaccoud c Mich~le


Lalonde:, e tambtOl aJocelync Dorion, revisora, por sua ajuda Wl revisão fmal desle lUla

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clencia e da pesquisa; para depois, então, deter-me nos argumentos de ordem m.!:.. ta ena, a sim, indispensável, não somenle como método para apreender a expe-
todológica. Abordarei de passagem algumas controvérsias suscitadas por esses ar- rién ia dos outros, mas, igualmeme, como insrrumemo que perrmle elucidar suas
gumentos. Num scgundo momenLO exporei um certo número de principiO que condutas, na medida em que estas só podem ser inlerpretadas, considerando-se a
o, em geral, tidos como adquiridos e correntemente associados à "arte' de fazer própria perspectiva dos atares, ou seja, o sentido que eles mesmo conferem às
05 outros falarem e de realizar uma entrevista. Ai residir~ a op nunidade de abor- suas aç6es. abe-se o quamo esse argumemo foi rundamemal, na sociologia amen-
dar as diversas estratég13s e o diversos elemenlo de "encenaçào', ao quais recor- cana, para Justificar o recur o aos método qualitativos. Dentre o exemplos mais
rem os entrevistadores, com o objellvo, denlre OUlros, de levar os entrevistados a frequememente citados, há, evidentememe, Thomas (J923), em razão da impor-
colaborar, e a sentirem-se confiantes e à vontade na situaçãn de entrevisla. E, por tJlncia que ele ambui à consideração da maneira pela qual os aLOres definem sua si-
fun, tratarei da unponãncia da questãO dos vieses nos debates sobre as entrevisL.'s, tuação. neve-se também mencionar Mead (1934) c Blu_mer (J 969) e, em sua linha-
de modo a apomar como algumas lradições metodológicas e epistemológicas ten- gem, os inlo:'!!,cionislas, que lambém insislem na necessiJade de explorar o sentido
taram resolve-la, ou, ainda, formulá-Ia diferentemente. Esta seçã p mlitirá abor- que os-ªtores dão às suas ações. Poder-se-ia, por 11m, acrescentar os elnorneLOdol;;-
dar sumariamente um relativo numero de dimensões fundamenLais , lais como a gistas, jã que eles buscam, no prolongamemo dos trabalhos de Garl1nkel (1967),
de!erminá ªº do conlexto na produção do d' CUTSO,-O pa~el da subjetividade do Jwreender.as Categorias do senso comum e explorar a maneIra cama os at~
constroem sua realida<!e, ao longo de suas ~nVldades cotidIanas.
pesquisador no processo de pesquisa e a inauéncia dos processos de transcrição na
produçãO d_os relatos elnográftcos. Essa posição epistemológica encomra Sua comrapartida no plano metodol gi-
coo Para apreender as realidades segundo OponLO de VI ta dos atares sociais, é pre-
o argumemos dc ordem epistemológica, elicG-politica e metodológica como cISO amda um metod que o permita. E com base em tal argumemo que o sociólo-
base do recurso à entrevista de tipo qualitativo gos da Es ola d~ Chicago, e, em sua continuidade, os inleracionislas justificam O
-recurso aos métodos qualitativos (POUPART, 1979-l980). Assim, conforme o su-
00 exame das justificativas habltualmeme alegadas pelos pesquisadores para geriam Park (cC. BRESLAU, 1988) e Becker e eer (J 957), misturar-se às atiVlda-
recorrer à entrevista de tipo quahtativo, trés tipos de argumentos se destacam. O des cotidianas dos alores, com a ajuda da observaçãO participame. constitui O me-
primeiro é de ordem epistemológica. a enlrevista de tipo qualitativo seria necessá- UlOr mela de erceber suas prállcas e interações, como também de lI1terrogá-los
') rLa, uma vez que uma !'Ploração em r9ru,"dida~a perspectiva dos ato~es so- durame a a~o. Por sua vez, Thomas preconizava analisar a correspondencia priva-
ciais é considerada indispensável para uma exata apreensão e compreensao as da, as autobiografIas e os diários fmimos, insisllndo no faLO de que estes maleriais
condutas sociais. O segundo tipo de argumenLo ê de ordem etica e olftica: a enlre- correm menos risco de ser 'contaminados' pelo pesquisador - conduta esta que,
Í\ vista de tipo qualitativo parece necessária, porque ela abriria a possibilidade de segundo ele, pcrmite assim apreender diferemes dimensões, como as atitudes e os
t compreender e conhecer imemameme os dilemas e queslões enfrentados elos valores. inalmeme, há uma opiniãO ampla me me divulgada na maioria das tradi-
áiore~socIDs~ Destacam-se, por fim, os argumentos metodológicos: a entrevista de ções sociolõgicas, segundo a qual o recurso às entrevistas, malgrado seus limites,
" tipo qualitativo se imporia entre as "ferramentas de informação' capazes de elu- continua sendo um dos melhores meios para apreender o sentido que os aLOres dão
cidar as realidades sociais, mas, pnncipalmente, como instrumemo privilegiado às suas c nthttas (os comportamentos nào falam por s. mesmos), a maneira como
de ac Oà expenê.ncia dos atares. Deve-se certamente observar que esses trés u- eles se representam o mundo e como eles vivem sua situação, com os a(Ores sendo
pos de argumentos c aplicam igualmente a conjumo do métodos qualitativos, e VIstOS como aqueles em melhor posiÇão para falar disso.
abordá-los aqui me parece tndispensàvel para compreender os multi pio usos que Esse primeiro lIpO de Jusllficallva está na origem de diferemes mdagaçõcs
se pretende fazer das entreVlSlas controvérsias, que não podem ser abstraidas a pantr do mamemo em que se julga
necessario realizar emrevistas e se pergunta seriamente 0...!lue se busca e O que
A analise das realidades sociais segltlldo a perspectiva dos arares sociais J><:lssivel dizer e fazer com o material de emrevista - uma quesL.'lO que se colõCã,
evidemememe, mesmo para aqueles que se esquecem de propO-la. Um dos temas
Voltemos primeiramente ao argumenLo de tipo epistemológico. O uso dos mé- do debate - no momemo, eu deixo de lado o tema preliminar da clif,culdade e da
todos qualilativos e da entrevista, em particular. roi e ainda hoje é tido como um possibilidade de reconstiluir, utilizando as entrevistas, o pomo de viSla ou a expe-
meio de dar coma d pomo de vista dos aLores sociais c de consider~-lo para com- riéncia dos atares - gira precisameme em tomo da questão de saber se os pomos de
preender e interpretar as suas realidades. As condutas sociais não poderiam scr vista dos atares são urli amenle coisas a descrever e a ex Iicar, sem relaçãO decau-
compreendidas, nem explicadas, fora da perspectiva do alores sociais. A entrevis- -;:, 1\ salidade dire~ com suas próprias condutas. Correntes como estas, que invocam a

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fenomenologia, tem razão em defender que as condutas sociais não são somente Le IntUu de sociologlle (1968) me parece ser uma boa expressão, Para es es auLO-
condicionadas pelo exterior por uma série de determinantes sociais, e que é preci- res, as interpr~ç~es que os atares sociais dã de sua própria realidade não devem
so necessariamente interpretã-Ias à luz da perspectiva dos atares, justificando, as- ser conIunClidas com "a realidade tal qual ela t", O fato de que os atares sejam dire-
sim, o recurso aos métodos qualitativos? tamente implicados nessas realidades não é, em si, uma garantia da e.xatidão de
Isso nos leva ao debate tradidonal entre as erspectivas subjetivistas e objetivis- suas interpretações. Bem ao contráno, isso pode obstaculizar os verdadeiros deter-
tas nas citncias sociais; debate travado diferentemente, segundo as tradições teóri- minantes de suas condut3S. Nesse sentido, O conhecimento cientifico é uperior àS
cas, ainda que uma tendtncia fone, ao longo das últimas décadas, tenha sido, cena- explicações originárias dos atar ,pelo falO de que atnda que ele mesmo continue
mente, a de dizer que seria preciso unir essas perspectivas, o que impedIria de criar sendo uma construção da realidade, ele é, todavia, o resultado de um esforço siste-
falsas dicOlomias'. Por outro lado, é importante notar que as posições nâo são, tal- mático da pane do pesquisador para romper com o pressupostos do senso co-
vez, tão categóricas como se o pretende. Assim, censuraram-se, por vezes, 05 intera- mum e c m aqueles da citncia estabelecida, e também para elaborar interpreta-
cionist3S de não se mteressarem senão em evidenciar a perspectiva dos ~; en- ções que se baseiam em construções te ncas submetidas não apenas à critica, mas
quanto, na realidade, eles também insistem na importância do papel do contexto so- igualmente ã prova da veriftcação emp,rica. No mesmo veio, algumas '"terpreta-
cial- por"exernplo, uma instituição ou os grupos de penencimento - na construção ções cientlficassão maiS plausfveis ou, em todo caso, "men s falsas" do que OUtras,
I'(
I do senudo e na formação das trajetórias sociais. EassIm que, em suas pesquisas res- por estarem mais em desacordo Com as explicações onginárias, e serem mais con-
pectivas sobre a carreIra moral do doente mental e sobre os fumantes de maconha, sistentes teoricamente falando, e mais fundamentadas empiricamente'
r r Goffrnan (1961) e Becker (J 963) tentaram descrever a maneira Como as cxperitn- '" Contrariamenle a essa posiÇão, citemos os argumemos apresentados por al-
I'
I cias soclllis são marcadas, simultaneamente, pelas interpretações que os atares dão guns pós-estruturalis~, como Clough (1992). Definindo-se como fClIllnlSta, ela
sobre elas e pelas coerções que O meio lhes impõe. Em contrapartida, reprovou-se defende que ~ interpretações da realidade elaboradas tanto pelos atares oeiais
Bourdieu por adatar um modelo de análise muito focado sobre os determinantes so- como pelos dentistas, são relatos, histórias que apresentam ver óes diferentes da
I
dais, não levando suficientemente em conta a perspectiva dos atares, enquanto ele
lenta, de fato, reconciliar as abordagens objetivista e subjelivista, por meio de sua
r~alidade, Para a autora, eslas histórias, que se pretendem "descrições realistaS" da rea-
lidade, nã são, de fato, senão projeções desta realidade, sem verdadeira relação
noção de habitU5 (ver, emre outros, BOURDIEU, 1992). com ela. O desejo de uns e de outros de apresentar a realidade sob a forma de um
OUlra controvérsia de natureza epistemológica que despena o inleresse pela retrato realista responde a necessidades de ordem psfquica'. Para lough, as di-
perspectiva dos atores: ual reconhecimento atribuir ao saber leigo, em relaçãO ao ferenças, em termos da credibilidade, entre a versão dada pelos iel1lislaS sobre o
saber cienlfl1co? Trata-se ai de uma questãO que surgiu desde queseco etam-de- mundo das pessoas pesquisadas e a versão destas últimas, e entre o fato de que as
poimentos, pois, por meio destes, os atores fornecem segurameme interpretações interpretações dos primeiros tfm mais chance de se impor incontestavelmente do
de sua experiência e do universo que os cerca. Além de suas próprias interpreta- que as dos segundos, devem-se mais posiÇão social privilegiada dos cientistas
ções, o pesquisador se encontra, portanto, diante não de uma, mas de várias inter- do que à superioridade de seu saber,
pretações de uma mesma realidade, já que cada pessoa ou grupo é capaz de dar '1' Uma terceira posiçãO, similar ao pós-modernismo, defende que os pesqUIsado-
uma interpretação diferente sobre ela. Qual crédito, então, atribuir a essas difgen- res deveriam, em seus relatórios etnográficos, não só tratar as pessoas omo suj ,-
tes versões da realidade, e em virtude dequaIS cmérios ou de quais principias as
versões dilas cientificas, ou algumas delas, deveriam sobrepor-se às outras?
A esse respeito, ao menos tres posições distintas se destacam, posições estas 3. Para uempl05de cnuca em rela~o ao ponto de vista póS-posiuvista. ver Oartigo de Finger (1989)
que eu me contento em apresentar aqui, sumariamente'. Uma primeira se inscreve f' e a excelente introduçâo de Dumont e Gagnon (t 9n). ao mimero tb revisca Rcchtrchts sociographl-
qUtS. dedicado ao vivido. 1nce.rrogando--se sobre os crittnos cU supenoridade do conhecimento elen·
na corrente do pós-p sitivismo, e a obra de Bourdieu, Chamboredon e Passeron - lífico em relaç:1o ao conheomcnlo ordmário. e emicando correntes sociológicas que explicam o
sodal rom da cx.pcrifnc13 dos atares, Dumom (Gagnon insIstem na Impor~nC13 de tnSUluir uma $O-
t1ologla que seja capaz, ao lIl<Smo tempo, de consIderar e de superar o ponto de viSta dos aton:> E.<te
1. Parol um exemplo, enrre outros, deste upo de poslçAO. ver &rthelot (1990) ponto de V\S13 St: une ~ terceira po5lçtO, apresemada nos PTÓX1IDOS pan1graJos.
2. Para uma aprc:srntaçto das posições eplStemol<>glcos positivista, pós-positi~;st.a. conslJUtivisla e ... Essa posiç:lo pro"oca vivas comrovérstaS, p;articUtarmenle: no intcnor da corrente remmiSta. Ver, so-
q couta, vrro exceltOu: arugo de Guba e Uncoln (1994). Como Alvaro Pires me razIa observar. aspa· bretudo. Odeb.llc corre Oougb (1993) e.Smith (1993), no qual Oough crilica a aboTcl3gem do scand-
SIÇÕG eplslemológlcas, pnncipalmente a pós-~lUvis~ .e a conslruUV\Sla, nao são ~mprc:: Lio radi· pomt de Smuh. VlS3Jldo R:produzir a expcriblcia dos atores, no caso, aexpcritllcla das mulh(res, privi·
as
ol1rnC:Qc( distintaS. na prática. como se aprOOta abirualmenle:-mdc), assUD 05 pesquisadores, tegiando seu pomo de visa Por sua vu, mnh censura loughde negar qualquer reiaçAo entre dlSCUr-
rrequentc.menlC:, de unu perspectiva à ourra. 50 c TC3licbde. e de: não conceber OUlr.l realidade do que a própria realtdade dos discursos

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tos capazes de analisar sua própria situação, mas igualmente produzir análises de a pobreza, mas também a miséria daqueles que, ocupando um lugar invejável no
'múltiplas vozes"; isto é, análises cm que o ponto de vista dos diferentes atares que plano social, nem por isso est.iio menos em uma situação desvalorizada em relação
participam da pesquisa se encontre expresso. Em lugar de dar urna versão única ao eu próprio grupo. Entretanto, é nas COrrentes criticas e feministas que mais se
sobre a realidade dos oUlros buscando se impor, as análises deveriam ser o resulta- encontra afirmada a idéia de que o pesquisador deve mostrar mais do que empatia
do de uma construção mútua, O produto d~ !,!m <U.<\lpgo entre o pesqu~dor e as e verdadeirameme se envolver em relação às pessoas pesquisadas; em suma,aban-
pessoas pesquisadas. As interpretaçõ seriam, desde então, o [nlto de um acordo danar a posição de fals."-.fleutralidade exigida pela ci 111 ia.pasiti.ya'.
érilTe pesquisadores e participantes da pesquisa. Este ponto de vista não é muito Entrewnto. cabe enfatizar que essa atilUde empáti a e engajada frente às con-
distante daquele defendido por alguns praticantes da pesquis!'-ação!: por algumas dições de exi lência dos desfavorecidos e dos oprinlidos deve- e, primeiramente. à
feministas', os quais avaliam que é preciso visar à produção de um saber ue~­ orientação do pCS<luisador, me mo que os mét dos qualitativos sejam considera-
moniza as inLerpretações dos alares com as dos pesquisadores. dos particularmente propicios para enfatizar a sua experiência, sobretudo pela
produçãO de texlOs quc lhe conferem verdadeiramente a palavra'. Se, em principio
Denunciar os preconceitos, as práticas discriminatórias e as íni'lüidades ao menos, a maioria das pesquisas baseadas nas entrevistas de lipo qualitativo se
atribui o obJetivo de dar satisfatoriamente conta da experiência e do POnto de vista
Ao argumento de ordem epistemológica, invocado para defender o recurso às dos entrevistados, e, assim, demonstrar, nesse sentido, a maior empatia passIvei,
entrevistas de tipo qualitativo. soma-se O argumento de ordem ética e politica. algumas não se propõem COmo missão defender a causa elas pessoas interessadas,
Como a entrevista permite uma exploraçãO em profundidade das condições de vlda nem mesmo descrever. se for esse o caso, os aspectos diflcei de sua vida. Os méto-
dos alores, ela é visla como um instrumento privilegiado pa~a denllfldar, de den- dos qll3litatiyo~são, geralmente, utilizados como métodos "de invesLigação", en-
tro. os ~econceilos sociais, as práticas discriminatórias ou de exclus'IQ., e as)rü- tre oULros, e não é illútillembrar que, sob a capa da simpatia e da empatia, as pes-
ql1idades, de que podem se tornnr objelO certos grupos considerados cjJN~ quisas, de qualquer natureza que sejam. podem servir de pretexto, conscientemen-
renles", "desviantes", ou "marginais' (doemes memais, homossexuais, delen- te ou não, para o exercicio de um maior cOUlrole sobre as populações pesquisadas.
to • consumidores de droga, sem teto. etc.), algumas min rias étnicas, ou. ainda, EsLe p·robkma é bem conhecido na antropologia, na qual se denunciaram tanto os
as "vitimas" de lodas as espécies, Lais como as de Aiels e de violencia conjuga\. Evi- riscos de emocentrismo do pesquisador quanto a maneira como esLa disciplina
dememente, a pesquisa qualitativa está longe de ter o monopólio da critica social e pOde servir, historicamente. a objctivos colonizadores (ver, por exemplo, Vidich e
da denúncia das siruaçOes de opressão. Falar no número de pobres. ou de desem- Lyman, 1994'). Poder-se-ia igualmente citar O exemplo da criminologiade inspira-
pregados, pode também ser t.iio capilal quanLo descrever suas dificuldades cotidia- ção positivista, na quaL, sob a aparência de urna certa fomla de humanismo, houve
nas. O recurso ã entrevista em profundidade comportaria, contudo, a vantagem de lendéncia a aclomf uma aLitude.. por nalureza, moralizadora e corretiva em relação
permiLir não apenas evidenciar o que essas pessoas vivenciam no cotidiano, mas 1o
aos desviantes •
igualmente dar-lhes a palavra~pensar, como já o sugeria Beckes em 126t.sua
Essa prenoção ou essa au ência de posicionamento, em alguns pesquisadores.
ausência ou sua a ta de 1'0 cr na sociedade. quanto a uma condula permitindo descrever e dar coma dos dilemas e das preocu-
La lIIísére du monde, sob a direção de Bourdieu (l993b), não constirui senão
um dos inúmeros exemplos desse hpo de argumenlação. AJiás, Bourdieu (1993a),
em ··Comprendre", considera as emrevisras como um meio de deümÍlar a condição 7. Para um e.xemplo de Unla s.:.me1hanlt: posição n:.Js corremcs re.mmislaS e cnucas, ver u Standpoint
de H.rtSock (1983) e de Smith (1987, L992).
social dos outros, aqui entendido no dupLo sentido de apreender satisfaLoriamente
e de explicar a experiên ia de oULrem. Para Bourdieu, as enLrevistas permiLem 8. Com ISto, eu quero dize.r que: não basU\ c'Wr O:» enln:,vLStados para se gabar de uma atitude empâll-
ca em relaçAo a eles, mesmo que isso seja um Inrdo.
compreender "a miséria do mundo'. não apenas a miséria dos que se balem contra
9. Na antropolog13, como em OUtras disciplinas, denunaou-se igualmente o perigo cootrdno: Ode
idcahur demais os mod~ de VIda ou os pontos de. Yista autóctones (g:oing nali\'(!'), o que. poderia n.ia
somente apresentar o risco de acarrelar um deito conlnino Aquele buscado c dcsservlraos inu~resses
5. Para uma apresentação da corre:nl(: da pesqUlsa·UÇãO, ver Groulx (l997) e Maye.r (1997). Paro. a desses grupos, como lambem prejudicar a objelivaç.;lo de suas condiçOes de exist/!:ncl:l c constituir
sfnleses dos trabalhos feministas. VeI. cnue outros. Cook e Fonow (1986), Hardmg (1987) e Ole- urna outra ronna de paternalismo Oll de colOnialismo.
50n (199+). 10. No contexto da anjlise: dos desviantcs. Matza (1969) enfatiza o dificuldade: de. adolar uma abor-
6. Gouldne.r (1968) crillcou ime.nsarnenlc esta pOsiçãO de Becker, defendendo, enLre outros pOntos. dagem que, evlta.ndo calr nas impe.rfeiçOes da criminologia posluvism, favoreceria a empatia e: penlli-
que o pesquisador não deve. se aler:i análise do ponto de vista dos undadogs, mas examin.ar igual. tiria denunciar as prãtic.15 discriminalÓt1M em rdação aos "desviantes", sem, contudo. negar as si-
menLe o dos grupos em siluaÇllo de poder. Essas duas perspeclivas n30 me parecem irreconciliáveis. tuações problemáticas ligadtls à própria experiência das íllividadrs socialme.nu: reprovadas.

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pações espec[fi as de determinados gmpos, assim como das discriminações de
Presente lama na antropologia quanto na sociologia, essa concepção positivis-
toda ordem das quais eles são vítimas, suscitam, evidentemente, cliversas questóes.
ta do entrevistado, considerado como um informante-chave permitindo descrever
Limito-me, aqui, a enfatizar algumas delas. Assim, além da questãO abordada, mais
o que se passa em uma sociedade, está longe de ter unanimidade entre as diversas
acima, de saber se a empatia, e mesmo o envolvimento, em relação aos grupos pes-
tradições teóricas e epistemol gicas. Certamente, reconhece-se, amiúde, que os
quisados, favorece, ou, ao contrário, impede a objetivação de suas condições de
entrevistados são os melhor colocados para falar s bre o que pensam, sentem, e,
existCncia, pode. e pergumar o que acontece quando o pesquisador abraça uma
em cena meclida, fazem; em suma, para descrever sua experiência. Porém, não há
opimão dJferente daquela das pessoas ou de determinados gmpos envolvidos no
processo de pesquisa. Para resolver essa clificuldade, basta apresentar todos os concordanda sobre o créclito a ser dado ao Informante;"ist~~,soºre a possjbJfi~­
pomos de vista contrários, com o objetivo de relativizar mais o pomo de vista de de que ele possaTornecer informações confiáveis, ou informações, simplesmemeJ
cada um, incluindo o do pesquisador? Deve-se, além disso, limitar as pesquisas aos sobre o fundonamento passado ou presente de um grupo, de uma orgartiza<;ão, ou
grupos pelo quais nutre-se um minimo de simpatia ou de empatia? A questão é de uma sociedade. Segllndo as perspectivas adotada ,essas informações são consi-
pertinente, sobretud porque alguns avaliam que ao se pretender denunciar as si- deradas ou como transmitidas, ou como reeonstruldas, ou ainda, como oriundas
tuações de opressão e de d' criminação seria preferfve.l tomar c mo objeto de estu- do ponto de vista dos informantes. Assim, na perspectiva positivista, os "infor-
do os grapos no poder, consIderados "responsãveis" por essas situaçóes. As con- mames" seriam semelhantes a cãmeras que permitem reconstituir a realidade pe.lo
vicções do pesquisad r influem, portanto, em suas atitudes em re.lação aos grupos cruzamento dos ãngulos de vista (cOJúrontação dos depotnlentos e das foOles); dar
pesquisados, o que, diga-se, renete na maneira como s:lo produzidos os dados. acarretando a neceSSidade de tomar um certo número de precauÇÕes técnicas, tais
como a seleçãO judiciosa dos informantes. Em contrapartida, na concepção cons-
Uma !erramenw de i'ifonnaçdD sobre as entidades sociais e um instrumento trutivista, os "informantes" ~em como inJérpretes, apresentando diferentes re-
privilegiado de exploraçãO do vivido dos OlOres sociais constru ões p-ªrciais e parcelares cL, realidade (ver, por exemplo, CLlFFORO,
1986); enquanto O pesquisador lambém procede à sua própri.1 reconstrução da
Além das ju tlficativas de ordem epistemológica e ético-politica, dois argumen- maneira pela qual os primeiro reconstroem a realidade. De acordo com lima ter-
tos de ordem metodológica são, geralmente, alegados para legitimar a entrevista de ccira perspectiva, finalmente, os "informantes, e, na eqüi!ncla, os pesquisadores,
tipo qualitativo, podendo ser invocados, simulUlneamente, em uma mesma pesqui- são vistos como novidadeiros que, dando às "informaçõcs" a aparência de um rela-
D sa. O primeiro, válido igualmeme para a entre.vis18 estruturada, é o de que a entrevis- to realisL31..f-riariam e moldariam a realidade. assim como no cinema e na literatura
lJ ta de tipo qualitativo constituiria um meio eficaz para, apesar de toda a ambigüidade ::pe;:-sPectiva esta adotada principalmente por Clough (J 992), e por ela qualificada
- da expressão, "coletar informações" sobre as estruturas e o funcionamento de urp de pós-estruturalista".
grupo, uma instituição, ou, mais globalmente, uma formação social determinada". I O segundo argumento de ordem metodológica, invocado, mais freqúentemen-
Na falta ele outras fontes de dados. tais como a análise documental e a observação di-
reta, ou ainda, paralelameme a elas, o entrevistado é visto como um informan-
-te, para justificar o recurso ã entrevista de tipo qualitativo, concerne ã eficácia deste
método, quando se trala de dar conta do pomo de Visla dos atares. Esse argumen.
te-chave, capaz precisamente de "in~r" não só sobre as suas próprias práticas e to retoma, de fato, as principais vantagens associadas a essa técnica de entre-
as suas próprias maneiras de pensar, mas também - na medida em que ele é conside- vista, as quais já haviam sido apontadas desde a virada dos anos 1930, no ãmbito
rado como "representativo" de seu grupo ou de uma fração dele-sobre os c1ivel5Os
e,2!!lponentes de sua SOCiedade e sobre seus diferentes meios de ~tencimento. Nes-

II
ta última acepção, Oinfonnanle é tido como uma testemunha privilegiada, um oh-
servador, de .cena forma, de sua sociedade, c?m base em qtl~ um Outro observa- D. Aqui, ainda, as posições sãO. cerlamente:, Il1llIS nuançadas e mais ambíguas do que eu as apresen·
I dor, o pesqUIsador, pode tentar ver e reconsOlU" a reabdade . let ASSIm, a perspectiva positivista considet3 que as "infonnaçoes" podem ser deturpadas pelo pomo
de vista do Informante, mas este limite aparece c.omo em parle superável pelo cruzamento dos pomos
de vista c das fomes. Para OS que SãO constrou,,' laS, mesmo defendendo que 3 realklnde MO pode ser
senüo uma reconstrução pardal e parcelar, alguns avaliam que há, todavia, melhores reconstruçOes
11. Para rdluOes acerca dos nfveis de re:.tlidade possfveis, ou rn'Ia, de apreender pelas entrevistas DO do que: outras, aproximando-se, assim, daquilo que eu descrevi como uma posição pós-posltivista
eontexto das histórias de vida, ver Gngnon e Jean (I 975), Bemux (I986) e Peneff( 1990). (sobre o estatutO ambíguo que alguns cOnslrulivisros conCerem li realidilde, vcr, entre outros, o artigo
de Woolgare Pawluch.1985). Enfim, voltando à posição de Clough (1992), caberia, prov.weJmem-t',
12. Pára uma apresentação em lrngun francesa da noção de informanle-chave, ve.ra artlgo c1ãssICO de pergunL.1f se da própna 0:1 adora um estilo realisla, procurando dizer (orno as coisas ocorrem na
Tremblay (1968). Paro wna análise das dificuldades que:l questão d05in~ rmanles propOe, ve.r Rabl- realidade, quando ela preu:nde desconstruir modo como as produçOcs científicas apresentam 11ma
now (1977). versão realista da realidade.

222
223
dos trab,l1hos de Palmer (1928) e de Roethlisberger e Dickson (1943"). Eu me A enrre\'ÍSta ~o-dirigida é também vista - e eis ar um" segunda vantagem, ge-
~l-LenL.'rre.i, aqui, em sintetizá-los, LOmando como ponlo de refere.ncia a entrevista ralmente alegada -corno uma forma de enriquecer o material de análise e O con-
não-dirigida, esta forma de entreV1Sta na qual o entrevistador, depois de ter dado teúdo da pesquisa. Isso é verdade na medida em que a nexibilidade d mélodo-
uma instntç.l0 inicial, visando nortear o entrevistado sopre o tema da pesstJ!~J!, que deixa o entrevistado livre para abordar os assumo que le julga pertinentes-
con[ere-Ihe Omáximo de liberdade no que diz respeito à maneira de tratar Oassun~ favorece a ~me.rg~ncia d,: dimensões novas não imaginada, de inIcio, pelo pc qui-
to, e tenta orientar seus relances sobre as dimensões abordadas pelo interlocutor sador. AqUI, amda, a vantagem é geralmente enfatizada em relação aos Itmlles
(MICHElJIT, 1975; GHIGLlONE&: MATALON,1978). Mesmo MO sendo a mais referentes ao questionário ou à entrevista estruturada (ROETHLlSBERGER E
utilizada, a entrevista não-dirigida me parece a que melhor ilustra os principias OICKSON, 1943; MICHELAT, 1975), ressaltando-se que, nestes ultimas casos,
subjacenles às entrevislas de tipo qualitativo. endo o comeúdo do material pesquisado inteirameme ou parcialmente fixado de
egundo a opinião do pesquisadores no qualitativo - opiniões compartilha- amemão, O entrevistado não tem.. entào, a escolha das questões abordadas, bem
das, cm certa medida, pelos partidários da entrevista estruturada -, a entrevista como o prõprio conteúdo de uas respostas já é fortemente estruturado, uma vez
não-dirigida apresenta inicialmente a vantagem de se basear adequadamen~ que estas devem necessariamente inserir-se nas categorias delimitadas de inlcio.
realidade do entrevistado. Gozando de um máximo de liberdade para se expressar Somente as questões abertas conferem uma cena liberdade de resposta ao emrevis-
sobre o ou os temas da pesquisa, ele é mais capaz de fazê-lo segundo suas próprias tado, maS empre dentro dos limites impostos pelo problema. Esta estratégia pres-
categorias e sua própria linguagem. Esta primeira vantagem é, em geral, alegada supõe que o pesquisador jã tenha delimitado senão todas as dllnensóes possíveis
por oposição ao questionário e à entrevista estruturada, estratégias que compor- da experiência dos entrevi tados, pelo menos as mais essen iais, mesma na hipót.e-
tam - e islO mesmo quando o pesquisador faz uma investigação preliminar e testa se, evidentemente, de um bom conhecimento anteriordo campo". Em OUtras pala-
previamente seu instrumento - riscos de pré-estruturação do discurso, elevados vras, se o questionário pode contribuir para o aparte de novos co'nhecimentos, es-
em razào da forma predeterminada das questões e das respostas. tes necessariamemegravitam em tomo das dimensõesjá inclusas no questionáriQ,
Contudo, tendo em conta os próprios limites da não-diretividade", o pesqui- .!'nquanto a entrevista não-dirigida favorece, graças à abertura do método, o anuxo
sador não elimina totalmente os riscos de pré-estruturação do discillso do <;!ll!!'-- de i,úoonações novas, que podem er determinantes para ~ compreensão do uni-
vistado, ao optar pela entrevista não-dirigi a. O entanto, e acor o com Rogers verso do entrevistado e do objeto pesquisado.
(1945), a entrevista não·dirigida reduz até um cena ponto esses riscos, na medida Terceira vantagem, a entrevista não-dirigida orereceria a possibilidade de ex-
em que ela permite que os entrevistados falem o mais livremente posslvel, dan- plorar mais em profunditi~de as difer~ntes fac~tas da experi~ncia do entrcvistado.
do-lhes a escolha dos assuntos que eles julgam pertinentes. O papel do entrevista- Com O grau de li erdade dado ao entrevistado, o a rofundamento -êOnstitui aliás
dor consiste simplesmente em facilitar, por suas atitudes e suas intervenções, a li- conforme GrawilZ (1969), '!.&,rande característica da cnL;:evista d~o quaJi~ativo:
vre ex ressão dos onlos de vista. Na concepção rogeriana da entrevista cllnica, se bem que a expressão "entrevista em profundidade" (deplh interview) seja, ge-
transposta ao dornfnio da investigação sociológica - concepção retomada, entre ralmente, empregada como sinOnimO. Cenamente, nenhuma romla de entrevista
outros, por Merton e K ndall (J 946) -, o entrevistado é considerado cal'az de ex- pode apreender a talai idade de uma experiência, nem mesmo a entrevista que se
plorar, em grande parte por si mesmo, as-dimensões de sua experiência, porquaT\- prolonga por várias seções, como no caso, às vezes, das histõrias de vida; contudo,
to, evidentemente, ele a eite jogar o jogo, e a entrevista toque seu universo exis- a entrevista não-dirigida ermitiria vasculh..:rr_tp~ a [u.nqo a experiência do entre-
tencial e o entrevistador saiba lhe fornecer a oportunidade para isso vistado,já ~e ela vi a, principalmente com a ajuda das técnic.1s da reformulação,
/ levar a~ver del<1lhadamente as dimensões abordadas. Além disso, o entrevis..
r tado gozaria habirua1mente de mais tempo para se expressar Nesse sentido, uma
I l4. Neste capítulo. a literatura recente sobre as vanUtgens da entrevista de tipo qualitatiVO revcla~se boa ':,ntrevisl<1 se de.flniria como aCluela em que o entrevistado rala sobre o que é
surlcit::.Dlemente repe.uuva em relação ao que escrt~\leram Palmer (1928). Roethlisberger ~ Olckson I verdadeiramente importante para ele, e em que Opesquisador obtém uma certa sa-
(1943), Rogers (1945), Merton e Kendall (1946) e Grawi12 (1969). Nem seçao, eu me baseei princt- turação dos temas tratados.
I palmenlc nestes últimos autores. Para OUUQ5 exe.mplos de trabalhos apresc.nlando uma argum~nl.3­
~do re1:11ivamenle semelhante. nos anOS 1970, ver Lonund (1971), haLzman e lrallSS (1973), Ilinda que menos freqt1entemente mencionada, uma quarta vantagem merece
Spradley (1979), além de Michehll ((975) e de Ghiglione e Matalon ((978), 1:1 ctllldos neste te.<to. f) ser ap nt.1da: a entreviSla não-dirigida possibilitaria uma melhor exposição da ex..
Paro uma3pre.se:m::u;ão maiS deLalhada dos lrnh:llhos de Palmer (1928) e de ROClhlisbergcr e Olckson
{1943" Yer Poupart (1993).
15. Ver a terceira eÇao do presente artigo, conce.me.nte às crfucas à entrevisla Mo.diriglda e à enlre· 16. Sobre os limir.es cb. pré-investigação Como etapa prePUr3lórill " enlrevista eSlrutumda e como meio
\'15l.3 padromtada. para remedJar a {tlIm de conhecimentos do pesqutsador, Ver;j crftica de Cicourel (l96-+" 72-1M).

224
22S
perttnc:ia.do enlIevisrado, Efenvamente, além de trazer informações concernentes Também não há concordãn ia emre os pesquisadores sobre a própria natureza
às suas caraeterí ticas, com o sexo, a idade, o pertencimelllo émico ou de classe, e das intervenções no COnt~xto de uma entrevista de tipo qualitativo, A tItulo de
de possibilitar indagar de maneira mais ou menos direta sobre sua traj tória sodal, exemplo, alguns consideram que, com um tipo panicular de entrevistados, uma
de modo a melhor compreender situar seu discurso", a entrevista não-dirigida escuta benevole_nte é insu[[ iente para produzir um material válido entendendo
se prestaria a uma exploraçãO em profundidade.do contexto de vida e do meio de êj'ü'e dai não resulta senão um material estereotipado ou superfici~1 (PENEFF,
penendmcnto do entrevistado, resultando em um mmeria! que permite mais ade- 1990 ,Segundo eles, onvém, eutão, precipitar as coisas, fazer-se de advogado...f!o
quadamente circunscrever sua experiência e seu POOLO de vista, bem como eviden- diabo, como Osugerem.SchaLZmªn e Strauss (1973), Ainda que nem t dos adotem
ciá-Ias, Ainda graças à sua nexibilidade, O método também permitiria ao entrevis- essa opiniãO, uma cs écie de confronta -o do entTCvistado é, assim, preconizada,
tado estabelecer as ligações que ele julga úteis enlIe os diversos elementos de sua indo de encontro às atitudes habitualmente julgadas aceitãveis, Lanto no contexto
vida, Por exemplo, em uma pe qui a sobre o desemprego, ele poderia se exprimir elas entrevistas de tipo qualitativo (MERTÜN & KJ:NDALL, 1946) quanto no da
sobre a maneira pela quaL esta condição transforma, ou não, as suas relações com o entrevistas de tipo quantitativo". V--se, portanto, que por trás dessas múltiplas
trabalho, a familia e os amigos, formas de con eber a conduta ieleal de llma entrevista enc ntram-se coneepçõe
Enf1m, as entre\'ÍStas de ripo qualitativo são vistas como mais apropriadas à diferentes, seja no que se refere à boa forma de realizaras enrrevistas, ou quanto as
pesquisa de determinados grupos ou objeLOs, AsSIm, para tomar dois exemplos relações a estabelecer com as pessoas entrevistadas,
clássicos, não se vê como, armado de questionário, Becker (l963~ teria podido rea-
lizarsatisfatoriamemeseu estudo sobre os fumant de maconha, e Whyte (1943), Princípios e est'!'atégias subjacente ã arte de fazer falar o Outro
por sua vez, a pesquisa Street Comer Society Da mesma forma, parece diflcil fazer a
análise das aspirações de carreira, como no caso de minha investigação sobre os jo- Não é raro ouvir dizer que dirigir uma entrevista é uma arte, Ainda que exis-
gadores de Itochcy (Poupan, 1978), sem adotar Uma estratégia de entrevista de tipo tam divergéncias sobre o que implica essa arte, não resta dúvida de que a entrevis-
retrospectivo, permitindo retraçar no t<:JllPO as v rias fases de envolvimento do_io:.... ta, pouco importa sua forma, sempre foi conside'!'ada como um meio adequado
divíduo em sua atividade, para levar uma pessoa a dizer o que pensa, a descrever o que viveu ou o que viu, ou
Deve-se dizer, no entanto, que, apesar das vantagens que nela geralmente se aquilo de que foi testemunha, Há, cenamente, uma espécie de convicçáo de base,
reconhece, a entrevista não-dirigida é alvo de algumas crIticas sobre as quais retor- de que, idealmente, uma boa entrevista deveria permitir que o entrevistado se re-
narei mais adiante, Além disso, não se deveriã pensar que há unanimidade entre os pone satisfatoriamente.e que aquilo que ele diz seja considerado, segundo as posi-
defensores do qualitativo sobre o que é uma entrevista de tipo qualitativo e sobre o ções epistemológicas dos pesquisadores, como uma história verdadeira, uma re-
que implica a sua condura, A pane o fato de que subsiste uma certa imprecisão construção da realidade ou uma mera encenação da mesma,
quanto à de[[nição de entrevista de tipo qualitativo, e que, atrás deste r6tu!9, perfi- Em tomo desse objetivo fundamental de "bem fOler falar os outros:, organi-
la-se uma variedade de práticas, a própria noção de não-diretividacfe e a m~neira de zou-se um conjumo de princlpios e de estratégias, dos quais alguns f ram decodi-
aplicá-la suscitam algumas divergências, Assim, segundo o ideal rogeriano, o en- ficados nos n~:.~is._d~ metodolOgia e outros permaneceram, pode-se dizer, impli-
trevistador deveria orientar O menos passIvei as falas do entTevistado, om ~5, ciLameme, Baseando-me na literatura metodológica sobre as entrevistas e em mi-
anos de II1tervalo, Palmer (1928) 130urdieu (1993a) avaliam, d ua pill'te, que.Q. nha própria experiéncia de pesqui a, descr verei alguns desses pnnc/pios e algu-
entTevistad r deve estabelecer um compromisso entre a não-direúvidade e urna mas dessas estratégias, explicitando, porém, que minha intenção aqui não é a de
certa orientação a dar à entrevista, em função do objeto pesquisado. Adolando me pronunciar sobre sua legitimidade. Com efeito, adotando um pro dimento se-
uma lógica muito próxltna aos métodos quantitativos, Panon (1980) e Burgess melhante ao de Silverman (1973), que se interessou pelas representações, tanto
(1984) emendem, por sua vez, que uma maio'!' não-diredvidade prejudica a gene- dos entrevistadores quanto dos entrevistados, sobre a maneira pda qual uma en-
rahlOção dos resultados, tornando mais diffcei as comparações entre as entrevis- trevista deveria se desenrolar, eu me empenharei mais em evidenciar de>.=..
laS, Êste ponto de vista parece, contudo, bastante contestável, na medJda em que construi!. d cena forma, um determinado número de tdéias e de táticas geralmen-
ele equivale a resrnngir a generalização à produ~o de um material padronizado, iéassociada a !Jm~re~ta conSiderada bem-su~~ -

17_ No contexto da n:1o·dtf€llvldade (ver, por exemplo. Merton e KendaU, 1946). recomenda·se. co-
ICI:Ueste gcnero de tnrormaç;'lo no fim da entrevista, de modo a não envolvt·la numa dInâmica de 18. A propó Ita da neutrnlidade do e.ntrevlstador, comultleme desejada no âmbito das entrevistas e5-
perguntas c: rc:sposlaS. p3rG nao susc.ilar uma atitude passivn no entrevistado. trulurndas, ver o que dIZem 9 respeito Bloncllaux (lQ9l), assim orno Fonwlla e frey (1994).

226 227
I No c ntexLO das entrevistas, particularmente de tipo qualitativo, um detemli-
nado nllmero de princlpios - que são, em geral, tidos como adquiridos, no entido
elnomeLodoiógi Odo termo - são, de faLO, omument alegados, com o objetivo de
numa entrevi ta para O upar Otempo, ou para enContrar pessoas de fora da prisão,
diz muito sobre as condições de ua detenção".
- a colaboraÇão dos entrevistados, tida como necessária, requer, evidentemen-
fazer com que o entrevIstado possa verdadeiramenLe dar conta de sua visão ou de te, vári~ iaçõ.e5. que podem OCOrrer Lanto anLes quanto durante a entrevis-
sua experiência: obter a melhor colaboração do entrevistado; colocá-lo O mais à ta (CU INGHAM-BURLEY, 1985) enamente, a colabornçao dos entrevista.
vonLade posslvel na situação de entTevista; ganhar sua confiança e, enfim, fazer dos nunca é definll1vamente adquLrida, e eles podem manifestar suas reticencias por
com que ele fale espontaneameme e aceIte se envolver. A aplicação desses pnncl- meto de diferentes sinais de impacifucia, Lais Como consultar seus relõglos, ou per-
pi s, que tentam, ao menos em parte, reproduzir a condições d uma relação de guntar aoemrevistador se ainda restam muiLos outros pomos a abordar Essas nego-
familiandade e de cumplicidade emre as pessoas, evidenLemenLe só ocorre porque ciações imphcam também uma quesLão de estatuto, pois OS entreVIStados, c mo os
a relação de entrevista põe em cantata pessoas que habITualmenLe não se conhe- entrevistadores, podem estar emsltuaçao de poder, uns em relaÇão aos outros.
cem e que nem sempre lem muitas coisas em comum. AI m dISSO, essa relação Para levar as pessoas solicitadas a colaborar na pesquisa, o entreVIstadores re-
pressupõe um contexLo de inLerações com o qual a mai ria dos entreVlSLados esLá correm a várias e5IT3Iegias. A mais comum consisle em tentar, num pnmeiro mo-
pouco familiarizada, sem contar que essas tnLerações se desenvolvem, em geral, mento, convencê-Ias do interesse e da mihdade da investigação, defendendo, por
em um lapso de tempo relativamente curto. exemplo, que esta permitirá fazer avançar 05 conhecimentos, fazer valer uma cau-
, ou atnda, expressar 05 seus pontos de vist.' sobre o lema da pesqUIS3. Uma vez
Obter a colaboraçdo do enLrevislado qu os interesses e os enfoques do entrevistados e dos entrevi tadores raramente
são Identicos, pode-se bem imagmar que essa estratégia nem sempre é suficiente. 05
Um primeiro pnncipio, tido como fundamenlal na arte de bem fazer falar 05 enlrevistad res apostam, portanlO, em utros "recursos", que, sendo totalmente ex-
outros, refere-sc ã Importância de obLer a olaboração do. enlrevistado. Para que a teriores a naLUreza mesma da pesquisa, podem revelar-se determinantes para garan-
entrevista seja válida, entendida no sentido de produção de um discurso que seja o tir a cooperaçao dos entrevistados. É este o caso, sobretudo quando e~ fazem inter-
mais verdadeiro e o mais aprofundado possível, considera-se cssencial que o entre- vir a rede social e se apóiam sobre os laços de reCIprocidade. tais como as considera-
vistado aceite verdadeiramente cooperar, jogar o Jogo, não apenas consentindo na ções de arn4i!de, famillares u p~ofissionais, para o recrutamemo de d te.nninados
emrevÍSta, mas também dizendo o que pensa, no decorrer da mesma. entrevistados. Na falla de tais laços de reCiprocidade, alguns entrevistadores tenLam
Em Leoria, O referido princIpio parece evidente. Na prática, conludo, obter a criá-los, fazendo-se aceitar no mei pesquisado, ou estabelecendo relações de amiza-
cooperação do entrevistado não é coisa simples. Primeiramel1le, como fazer com de com membros da comunidade, como no caso das pesquisas classica de Whyte
que ele aceite ser indagado e, particularmenle, como vencer as mllltiplas re istên- (1943) e de Uebow (1967). Se as condições não o permitem, como quando há so-
cias que ele poderia manifestar - tais como a falta de tempo e de imeresse, o semi- mente um únko enconlro com o entrevistado, os enLrevisl3.dores lentarão estabe-
menta de servir de cobaia, o temor de ver invadida a sua intimidade, de não e~ ii lecer lai laços, durante a entrevista, através de atitudes como a escuta e a empatia.
Por fim, não é raro que os entrevistadores apelem para a aULOndade de um terceiro,
altura, ou de sofTer consequéncias negativas por causa da entrevista -, e que pode-
para levar os eventuais entrevistados a partlClparem da entreVISta, por exemplo,
nam tradUZir-se numa recusa ou numa d 151 nCla? DepoIS, mesmo que Oentre-
apoiando-se em unta organizaçao para lllVestigar eus membros, ou tirando provei-
vi tado consinta na entrC\'ista, como saber se ele quer verdadeiramente colaborar?
lO da credIbilidade de uma p oa, para solicitar a de uma outra.
Quais o, além dISSO, as razões que o I vam a aceitar? be-se que os entrevistados
podem se ubmeter as entrevistas por motivos que, à primeira vista, too pouco ou EV1denlemente, essas várias trat gias uscitam, no plano élico, um conjunto
de questões, principalmente no que diz respeito às abordagens que podem seracei-
ãs vezes mesmo nada a ver com o tema da pesquisa, lalS como a polidez, a vontade
távelS para solicilar a colaboraÇãO dos entrevistados e para a existência de uma re-
de prestar serviço, o medo de represãlias, a esperança de retirar delas um beneucio
ciprocidade alllêntica entre o entrevisLadores e os entrevistados Por outro lado,
qualquer (por exemplo, uma vantagem monetária ou profissional), ou ainda o de- se o principIO da colaboraçao parece se mlpor para que o entrevislado possa dIZer
sejo de fazer como os OUtrOS, ou de simplesmente passar o tempo. Essas diversas verdadeiramente o que pensa, ele levanta, na pratica, várias mdagações em termo
consIderações capazes de motivar a aCeltaç Ode uma entrevista não mvalidam em do valor dos dados. E_~nmeiro lugar, como saber se o entrevistado co pcra real-
I O conLeúdo do di curso que o entrevistado estabelecerá. Ao contrário, elas são
importantes para esclareCê-lo. Por exemplo, para um detemo, o fato de con.se!ltir
19. Estl úllima observação se baseia em um come:nuno df: Mlchi:lc: LaJonde...

228 22'3
mente? Esta colaboração é, em geral, Lida como adquirida, pelo sLmples fato de que [revista na casa do entrevistado, em eu local ele trabalho, ou em espaços semipú-
os entrevi tados aceilam falar. Além disso, salvo as recusas direLas, os entreviSLa- bllco , para desorientá-lo o menos passivei em relação aos seus hábnos de vida. e
dores são nisso frequenLemenLe reduzid 5, como nas conversas comuns. a se re- colOCá-Ia numa snuação de!, ada, evitando, por exemplo: r~er uma entrevista
meLer a alguns indicias, tais como as amude,<, dos entrevistados, durante a entre- com uma pessoa sindicalizada, nos escnlónos reservados ao patrões. Recomen-
VlSLa; inriJcios esLes, por OULTO lado, diIlceis de perceber e que, em geral, permane- da-se, igualmente, escolher um local calmo, em que os riscos de que elementos ex-
cem implícilos. A seguir, qual é o grau de colaboração julgado suficiente para que ternos venham prejudIcar o andamento da enlrevista sejam menores.
o~dados coJetaclos sejam considerados coJllO..Yáh los? e as recusas em responder
Da mesma forma, o entrevistad r se esforçará em reduzir o efeilo possIvelmente
a algumas questões, ou as reticências em colaborar, da pane dos entTe\'ÍStadOs,são
negativo dos insrrument de re istro e se contentará com que os entrevistados pos-
em SI reveladoras", e se, além do mais, os entrevisladores espt'-ram, geralmenle,
sam, na medida do possrvel, esque er a sua presença. Se ele desejar utihzar o grava-
ompensar a falta de coopt'-ração de uns, por uma maIOr cooperação de outros, não
dor, ele deverá, digamos, fazê-lo com o máximo de discrição, nexibihdade e eficácia,
menOs verdade que o nivel de colaboração do entrevistado não é simples de avali-
ar e coloca mais globalmente a queslào da relaçãO que o pesquisador estabelece e segundo um ritual que não atrapalhe demasiadamente o desenvolvllnenlo d: en-
com o grupo das pessoas pesquisada, e do efeito que i lO pode ler, ainda aquI, so- trevista. Nos casos em que ele proceda tomando nolaS, loda uma rie de habilidades
bre a produção dos dados.

Colocar o entrevistatlo d vonlade por elemcntos de encenaçdo


I
serão consideradas necessánas para fazer com que este meio de regi Iro seja sufi-
ctentemente confiave! e penurbe o menos posstvel a entrevista em curso"
Mas, os elementos de encenação da enrrevista não se reslTingem apenas às
queslões C~el]lentes ao mo=n'o lugar Llé.D1icas de regiStro. Efellvamente.
m egundo pnncipio consIderado LDd!Spensável à fala do entrevistado se re- aconselhar-se-á os entrevistadores a também levar em cont;'aspeclo ,como o ves-
fere à com~cção de que ele só chegará de falo a se expres ar bem, se ele esliver ver- l~á~ Partindo da idéia de que mesmo os detalhes mais anódmos podem criar
dadeiramente fi vontade na situação de entreviSla. Sendo esta uma situaçáo um uma distAncia e que IOda reuni o social compona suas convençôe., recomen-
lantO arúfic13I,Cõnsi era-se que o pesquisa or eve tentar reconfortar seu LDlerlo- dar-se-á adolar uma indumentária "adaptada" às circunstâncias da entrevista, de

Iculor, panindo, ainda aqUi, da tdéia de que quanlo mais ele ficar à vonlade, mais
ele falará com facilidade e abordará queslões que lhe são igTIlficalivas.
Para chegar a 15S0, os entrevistadores farão intervir, de modo mais ou menos
modo, por exemplo, a atenuar as diferenças d p sição social, sem, para tanto, che-
gar -,:~uná-l3?' - -
Por fim, uma dunensão fundamental da encenação da entTevista concerne ao
conscienle, o que se poderia denominar, s,egundo a fórmula de GofIman (1973), ~
que se considera S~lli'P~ (l!'e o entrevislad r é obrigado a desempenhar. Mes-
elememos de encenação da entrevista. EfeLivameme, podem-se designar dessa for-
mo sem sempre haver, como já o vimos, concordância sobre as atitudes que ele
ma as várias disposiçõesLOmadas pelos entrevistadores com o objelivo de fazer
com que os entrevi tados esqueçam tudo o que, no conrcxlo da entrevista, possa deve adotar durante a entrevista, el deveria, segundo as regr.~eralmentepreco-
obstaculizar a enunciação de seus discursos, ou, melhor ainda, com a intenção de nizadas, esforçar- e colocar o entrevistado à vO~lade e enCOrajá.:i"o a fular:,)an-
proporcIonar um ambiente favorável ii c nfidtncia. Cert.,mente, o sucesso e a mar- do-lhe prgyas e ~ua ane, de um máximo de eSCUla, empalia e inleresse pelo que
gem de manobra do enlreviStadores nessa encenação dependem das iluaçôes e este último diz..Ile tambél~l deveria evitar intcrromper o entrevistado, f.lZer julga-
das pessoas cnvolvldas. e em panicular da reação dos entrevistados, tanto é que ge- menl 5 sobre aquilo quulj:Jbe revela, e, evidentemente, abster- e de argumentar
ralmente e acous lha aos entrevistadores para que façam o máxtmo para criar um com ele, ou de conteslá-lo Para além dos conselhos, inúmeras vezes, rependos. no
amb,ente e um conteXlO favorávC1S à entreVI ta que se refere ao papel que deveria cumprir o entrevistador, ha também, como o oh-
Entre es vário elementos de encenação figura, primeIramente, ~olha do
momenlO mais propIcio à entrevisla. de modo que Oentrevistado. ei! entrevislador
21.A ma,! ria dos manuais de mtlodol gt3 (ver, por exemplo. LOFlAND. 1971) compara as vant."lgens
se sintam verdadeiramente disponivei ,e o primelfo tenha lempo uEiciente para
respecnvas da uliltzaçio do gravador c das anotações EI larn.Jxm dào const.lhos sobrt a manelna de.
se expressar. Outro elemento de repres nta ola: encontrar o lugar mais favorável explorar bem essas. ItoUcas Sem nos delttmo!!' n~ questões, observemos, contudo, que, cada \lU
ao adequado desenvolvimento da enrrevista. ugere-se, assim, que se rea lZe a eD- maIS, n:c mmda·se o tmprego do \oideo. que pcrmmria dar mdhor nla <b fonna como as tntelilçÕ(S
n3O-"crbais São capazes de inflUir n3 produçAo do diSCUrso Alguns S( opOem ao uso do ,·(dto. cnrali-
zando o tfeilo que este pode tu-sobre: OentrcvlSl3do; deno que: poderia, cenamenre, vanar confonne
rr 20. Ver Pollak (1986) sob..-e. ... Im~tãnc!:!.~ o ulSlldor de se: tnda~ sobre as rellclncias dos esse eqUlpamenLO seja familiar, ou nao, ao emre\'1stado. Epos51vt.l que t ap;ui(ão do gravador teutu 1e:·
c:ntre\-;st:tdos em faI3r.~!lda, _sobre: o senr.id~ d~_se:!,_ .Ilndo sobre: determina questOes. vanlado. outrora, o mesmo tipo de obJecao. o que: não ImpedJu que seu uso se d1fun~,

230 231
serva Si!verman (1973), várias expeclauvas tmpltcitas quanto ã maneua pela qual Uvar o ,"trevistado a tomar a iniciativa do rtlaLO e a se envolver
deve se desenrolar a entrevista, e à uLilizaÇãO que poderá er felLa do que nela for
dilO. Assim, a maioria das pessoas entrevistadas supõe que seja o entrevistador DOIS outros pnndpi Ocomumenle associados ao sucesso de uma entrevista.
quem propõe as quesLões, e elas se Itmitam habitualmente a respondê-las. Além O pnmeiro consisle em Lentar levar o emrevislado a lomar a micimiva do relalo. Tal
disso, elas presumem que seja o entreVlStado quem imcia e finaliza a entrevista, e pnnclpio se b3SCJa na id la de que quanto mais o dis urso é csp Dlãneo, menos ele
elas lhe delegam Ocuidado de depoIS interpretar suas falas c de fazer bom uso de- poderá ser maculado pelo do pesquis.,dor, permitindo assim a aproximação ao Ideal
las, introduzindo desta forma, comO o ressalta i1verman, uma assimetria na rela- pesquisado, o de um dIScurso 'verdadeiro". Eu lerei oponunidad d voltar mais de-
talhadamente a esse assuntO, um pouco maIS adiante. Para facilitar a espOntaneida-
ção enge o enLrevistad~E ellgevij;tado..
de, vários procedimenLos su ciladas pelas regras da não-diretividade são preconiza-
dos: evitar imerromper o entrevistado, enqu IltO ele Íala (ROETHUSBERGER &:
Gallhar a cQllfiall a do elltrcvislCldo
Dl K5 N, 1943); respenar os momeDlos de si! ncio, de modo que ele possa enca-
u
De uma forma geral, considera-se que não basta convencer uma pessoa a parti- dear as id ias por si mesmo, se necessãrio ; utilizar as técnicas da reformulaçãO com
cipar dá pesquisa, e nem cnar um contexlO que lhe p rmiLa estar à vontade na SiLU- o objetivo de lhe explicitar ou esclarecer os temas abordados.
ação de entrevisLa. É ainda preciso que ela se sinla suficieOlemente confiante para O egundo princípIO visa favorecer o maior envolvimento posslvel do entrevis-
a eitar "verdadeiramente falar", Outro princípio considerado primordial para O tado. Segundo MlchcJal (1975), o discurso mais ignificativo é aquele no qual o
êxllo da enU:~. entrevisLado se envolve mais, ou, em outras palavras, aquel em que ele se refere o
AqUI, ainda, os entrevistadores recorrem, com maior ou menor sucesso, a Me- mais posslvel ao seu prõprio vlvldo. No contcxto, por exemplo, das pesquisas re-
rentes esLratégla , visando Lranqúilizar os entrevisLados quanto as uas boas inlen- laLivas a Lemas como a família, o lrabalho e o lazer, a entrevista será considerada
ções e quanto aO uso que serã feiLo de suas palavras. Primeiramente, eles se apres- como "mc!hor", e as falas do entrevislado como maIS reveladoras, se ele abordar
sam - ainda que esLe não seja o caso em todas as pesqulS3S-em garantir aos entre- esses Lemas de uma maneira mais pes oal e falar mais parricularrnenLe de sua fami-
vistados o anODlm.to, de modo que esLes não tenham a lemer pelas eventuais con- ha, de seu trabalho de.us lazeres, na condição, evidentemente, de que essas di-
sequências de seus depoimentos. Em segUida, eles tenLam convencê-los de sua mensões façam >cnLido para ele. Esse pnneípio, baseado em Rogers e transposto da
"n utralidade", insiSLindo, por exemplo, n faLO de que sua pesquisa é "lOdepen- emrevisla clínica, coloca, cntretamo, um ceno número de dificuldades, já que ele
deme", principalmenle dos grupos e das organizações das quais os emrevisLados equivale ou poderia equivaler a resLringir exclusivamente aos discursos nos quais
poderiam depender, ou com as quais eles poderiam Ler um conniLO de imeresses. O indivíduos "se envolvem", aqueles dis ursos que são socialmcntesignificativos.
Os entrevistadores também podem ser levados a apla ar os recei de seus inLcrlo- As referidas observações sobre os principias e as esLratégias, amiúde Lidas
cutores quanto utilização que poderá ser feila de suas falas, assegurando-lhes que como essenciais à realização de entrevistas, são, sem dúvida, uficientes para ilus-
estas serão apresentad corretameme e de forma anõDlma. Asslln como é o caso Lrar alguns paradoxos da entrevista de pesquisa: primeirameme, o da elahoração
nas enLrevistas de opo chnico, eles também se esforçam, peJa manif tação da es- de um irlStrumenLO que, no plano técnico, pretende-se o maIS rigoroso e o mais
CUla, da empana e do mLeresse, em eslabelecer, durante a entrevisLa, uma relação "cICDtlfico" paSSivei, mas que, ao me mo Lempo, busca reproduztr, do melhor
calara a, também ela capaz de comnbwr para suscitar a confiança d entrevislado, modo, as condições das trocas "narurais" e "espontâneas". Paradoxo lambém de
Enfim, para favorecer o estabeledmenLO de uma boa relaçã c mos emrevisLado , um irlSlfUmento que, para além das lecnicas de conduLa de entrCVlSLa utilizadas,
os entrevistadores dobram-se às regras elememares de sociabilidade, Lais como aposLa tanto nos faLOS quanto nas "compelências ooais" do entrevisLador, no SCD-
aceilar uma bebida, ou dispor de tempo para falar de uma coisa e oULra, anLes que a tido fenomenológiCO do LemlO, Lais como a capacidade de estabelecer relações, de
entrevista comece. La última dimensão, que passa geralmenle dC!>apercebida, re- lançar mão, se neces ária, de seus "recursos sociaIS e culturaIS", para favorecer a
quero conhccimento implíciLO das convenções sociais e a capacidade de se acomo- colaboraçãO dos entrevlSLados, e de se adaplar às diversas imposições e ao caráler
dar a elas. Ela ilusLra bem em que a realização de entrevislas pressupoe que os en- inslável da siLuação de entreviSLa.
lrcvistadore5 recorram ao conjunto de S1l3S compelências sociais, com o objeLivo
de eSLabelecer relaçoes com os oULro .

22. Sobre os diferentes tipos de siltnclo, ver Legras (1971).

232 233
Reflexões sobre os vieses e a con trução social do discursos para tanto, soluções fundamentalmente técnicas. A segunda tendência apareceu nos
anos 1970 e se baseia em perspectivas mais coostruLivistas, tais como o interaci nis-
Na concepção correnLe e pOSilivisUl de. entrevista, o enLrevistado é visto como mo simbólico e a em melOdologia, assim como nas renexôes oriundas, mais recen-
detentor de uma ve.rdade: a slla, evidenlemeL1le., mas também, por meio da sua, a temente, das correntes feminista, pós-estTUturalista e pós-modema. Ela trata, dife-
de seu grupo ou a de sua comunidade. Segundo essa concepção, é passivei apTeen- rentemente, a questão d s vieses, indagando sobre a maneira pela qnal, até o mo-
der essa verdade essencialmente pela utilização correta do instrumentos adequa- mento, haviam sido considerado alguns tipos de vieses, lais como a subjetividade
dos. Se, nes a ótica, o objeLivo da entrevisla parece claro -a saber, o de apreender a do pesquisador, e, sobretudo, preslando uma maior atenção II forma pela qual os dis-
verdadeira experiência e o verdadeiro p mo de vista do entrevistado -, a forma de cursos são socialmente construidos Enquanto a primeira tendência reside na bus a
alcançá-lo o é menos, conforme o atestam os múltiplos questionamentos de que de um discurso "verdadeiro", isento de viés e a salvo de todas as innuências contex-
essa técnica se tornou objelO. Como superar, efelivamente, os diversos obstáculos tuais; a segunda pretende, preferencí:llmenle, mostrar que os discursos são indi 0-
que se interpõem a essa busca e conquista da verdade? Particularmente, como fa- ciáveis de seu contexlO de produção e de enunciação.
zer com que esse disposiLivo de pesquisa permita atingir os objeLivos da pesquisa
sem f'li eaT a própria natureza das narrarivas coleladas? Se, como muitos O aftr-
A reflexlJ.O em 10m o tia quesllJ.o dos vieses
mam, a entrevista constillli uma forma de interação social ultrapassando o ãmbito
estrito das trocas verbais, como impedir - e eria passivei impedif- que esta forma Evidentemente. não é o caso de apresentar, aqui, o conjunto das pesquisas re-
ele intera ãO nào acabe contaminanelo os dados produzidos? Em uma, como o diz [erentes aos vieses possíveis na entrevista. Excetuando os trabalhos clássicos de
Blondiaux (1991), a propósito dos dUemas cnfrentados pelos sondadores de opi- Hyman etal. (1954), existe uma Uteratura abundante sobre esse as.sunto (KANDEL,
nião entre 1935 e 1.950, quanto vaUdade de seu instrUmento, como estar certo de 1972; GHlGUONE &: MATALON, 1978; MISHLER, 1986; BLONDlAUX, 1991.). [u
que O que diz o entrevistado, ao longo de uma entrevista, reflete verdadeiramente me contentarei e.m fazer UJn breve chamado concernente à natureza desses viescs,
o que ele pensa ou o que ele sente, e como estar scguro de que seu discurso não é com OobjeLivo de esclarecer o modo como se tentou resolvê-los.
um artefato da situação de pesquisa?
Ainda que em diferentes graus, conforme as épocas, essa questão Telativa aos Os diferentes lipo de vieses
vieses capazes de perverter a entrevista não deix u d preocupar os pesquisadores.
Esquematicamente, é possivel destacar três tipos de vieses: os vieses ligados
Pode-se dizer, efetivamente, que uma boa parte das reflexões em torno da cientifi-
cielade desse método dizia e ainda diz respeito a essa questão. Desde os anos 1920, ao dispositivo de investigaçãO, os vieses associados à relação entrevistador-entre-
aUlores como Palmer (1928), Roelhlisberger e Dickson (1943) interrogaram-se vistado e à sua respectiva situação social, e, por fim, os vieses referentes ao contex-
sobre o modo como os dois principais tipos de entreVIStas, as entrevistas padroni- to de pesquisa. Os vieses possivelmente devidos ao dispositivo de investigação re-
zadas ou estruturadas, de um lado, e as entrevistas qualitativas, de outro, podiam metem às deformações que poderiam engendrar, por exemplo, a maneiTa de inda-
alterar a nanlreza elo que era dilO, e e perguntavam qual dess tipos era capaz de gaT (o conteúdo e a forma das questões), as técnicas de registro dos dados (anota-
melhor dar conta do ponto de vista dos entreVIstados. Nos anos 1940 e 1950, tra- ções, gravador, video), ou as circunstancias de tempo e de lugar nas quais se efe-
tuOU a investigaçãO. Este primeiro tipo de viés e Tefere, portanto, em boa parte,
balho> Importantes, como os de Hyman et aI. (1954), foram Tealizados com o obje-
tivo de medir O efeito que podia ter a rt:iação entrevistador-entrevistado sobre o ao que eu denominei, anteriormente, de elementos de encenação da entrevista.
Esses vieses são suficientemente conhecidos, para que eu não tenha de me deter
comeüdo do discurso prodUZIdo, e também de encontrar, como se verá mais adi-
ante, soluções para 05 diversos problcmas I vantados pela existéncia de viés. Ainda tleles; eu me limitarei a sublinhar que não é absolutamente fáeU avwar seus efei-
que um bom numero dos "fatores" capazes ele alte.rar o mate.rial proveoiente de en- tos, na prática.
trevistas já tenha sido ressaltado desde os anos 1950, a reflexão sobre os vieses No que diz respeito aos vieses que poderiam ser atribuíveis ao enlrevi lador,
prosseguiu, Com a diferença essencial entre o período dos 25 últimos anos e os pe- cabe dizer que muito se indagou obre as conseqüéncias que podiam ter sobre o
ri dos precedentes residindo, talvez, menos na precisão do inveotári dos vieses, entrevislado as suas intervenções, lanto verbais quanto não-verbais, lais como os
do que na muelança d perspectiva frente a essa questão. "hum-hum", os meneio de cabeça, os sorrisos, as diferentes posturas corporais, e
Com efeito, é pc ível destacar duas tendências na maneira de considerar a mesmo as suas atitudes ao longo da entrevista, como a exislência ou a falta de ime-
questão dos vieses. A primeira d minou até O final dos ano 1960 e se articula a uma resse manifestado em relação ao Telato d entrevistado. Também muito se questio-
concepção positivista da ciência. Ela tenla resolver a questão dos vieses, trazendo, nou sobre o efeito que podiam produzir seus pressupostos quanto ao objeto de es-

234 Z35
lUdo, ou àS pessoas concernidas, tanto em sua maneira de colocar as questões, funç Ode quais critério se deva constitUlr essa homologia, e que uma homologia
como na forma de interpretar as respostas. De modo mais geral ainda, pergun- perfeita seja dificilmente imaginável, ela não impede que as questões de estatuto
lou-se qual peso podiam ter a sua situação e as suas diversas caractel;sticas sociais possam intervir, a não ser precisamente pelo fato de que os estatuLos relativamente
- idade, sexo, etnia, classe social, e OUlras -, as quais são capazes de se revdar por idênticos possam fazer com que algumas realidades sejam tidas como adquiridas.
meio de vários indicio, tais como a apartncia flsica, a linguagem e a posiÇão social Além disso, há algumas vantagens em combinar os estallltos, apresentando, ao
ocupada Kandel (j 972) lembra, com razão, como j, no inicio dos anos 1940, KalZ mesmo tempo. as Irnilitudes e as diferenças com O grupo pesqUIsado. Chap ulie
(1941) bavia mostrado que as respostas dos entrevistados podiam vanar conside- (198~) I.embra ainda que Hughes sugeria aos seus alunos que pesquisassem os gru-
ravelmente, segundo as caraclerisucas do entrevistador. pos aos quai> eles estivessem naturalmente afiliados, aproveitando o dIstancia-
Dessa lisL.'\ não-exaustiva dos vários elementos que, em relação ao enlrevi5la- mento que lhes oferecia a sua condição de e tudame. E, para lentar objeuvar me-
dor, são capazes de influenciar o discurso do entrevistado, vamos nos deter no ulti- lhor a situação desses grupos,llughes apostava em OUlra coisa além da proximida-
mo aspecto apomado, o da caractelÍsticas sociais do ntrevi tador e dos efeitos de social, preconizando, sobretudo, Orecurso às [erramemas c nceituais, ao méto-
que elas podem ter quanto ao conteúdo da entrevista, independememente da von- do comparativo e à capacidade refiexiva do pesquisador.
13de dó enrrevistad r, ou de sua competência técnica. Essa questão sempre ocupa, Em resumo, as imervenções, as atitudes e as caracterlsticas do entrevistador
com efeito, o topo da cena, são capazes de marcar as falas d entrevistado. Da mesma r rma, a percepção que o
Pata minimizar as distãncias entre os discursos imputáveis às diferenças de si- cnrrevist.~dor tem da pOS1Ção social do entrevi tado pode igualmente inauir sobre
tuação e de posição sociais, pensou-se, primeiramente, em apltcar O princ.fpLO da suas réplicas, e, mais globalmente, sobre a natureza de suas Illterpretações. Quanto
maior homologia paSSivei emre os entrevistadores e os entrevistados, Tratava-se, ao entrevistado, é ImpOrtante observar que, apesar do que se tende muito freqüen-
digamos, de selecionar os emrevistad res em função das aracte.rlsticas principais temente a crer, ele tem apenas um papel passivo e readonal na siruação de entrevis-
do gmpo pesquisado. Assim, parecia preferivel que mulheres fossem pesquisadas UI. Como O dão a emender v, rins análises, seu discurso pode ser fortemente infiuen-
por mulberes, jovens por jovens, autóctones por autóctones, pobres por pobres, ciado não sõ pela representação que ele constroi sobre o que e o entrevistador, e so-
etc., em razão de uma maior proximidade de linguagem. de cultura e de preocupa- bre o que ele busca saber, mas também pela percepção que ele tem do gmpo que re-
ções. Acreditava-se que uma maior proximidade não someme reduziria o riscos presenta este último (CHABROL, 1982), ou dos outro alores presentes na pesquisa,
de intrusão de viés, de ln ompreensão e de etnocenlrismo, mas também faria com e ujos pomos de visla sã ,provavelmente, diferentes do seu, Em oUlras palavras, a
que OentTevistado fo e ainda mais longe na exploração de seu vivido. esttatégia de argumemação do entrevistado pode ser fotjada tamo em função do en-
trevistador, como de terceiras pessoas imaginadas ou reais, Assim, em uma investi-
Levado ao extremo, es e ponto de vista reafiTma que um pesquisador só é real-
gação sobre as condições de encarceramemo, alguns detentos p dcm denun iar
mente habilitado a pesquisar os gmpos com os quais ele tem um máximo de simili-
funcionamemo das prisões, na esperança de erem ouvid s por m ia da pesquisa e
tudes sociais, o que invalida, de pronto, um bom numero de estudos passados e re-
de que seus pontOS de vista possam favorecer algumas mudanças.
cemes, Na prática, entretanto, bem poucos pesquisadores adotam uma posiÇãO tão
radical. Em verdade, a proximidade devida a um mesmo penencimento social, ou Este último aspecto po síbilita introduzir o tercei r lipo de viés, refereme ao
adquirida no campo de pesquisa, é, em geral, percebida, como uma condi ão que comexto da pe:.quisa e às suas repercussões passiveis, tantO no discursos dos en-
favorece uma boa compreensão do grupo pesquisado. Em contrapanida, ela é trevistados, como nos dos entre istadores, Para tOmar O exemplo dos entrevista-
igualmeme vista como capaz de consrituir um obStáculo, na medida em que uma dos, sabe-se que suas percepções dos enfoques que uma pesquisa representa para
demasiada familiaridade com o grupo poderia impedtr o pesqUlsador de tomaT a eles são pasSiveis de afetar suficientemente o que eles p dem dizer, ou decidir não
dlStãncla necessária para reconsiderar as evidencias ou as racionalizações prõprias dizer. Em sua investigação junto a um grupo de trabalhadores, Roethlisberger e
ao grupo. Nesse sentido, para um pesquisador, o fala de pertencer a um outro gru- Dickson (1943) já colocavam a possibilidade de que seus sujeitos pudessem men-
po do que aquele pesquisado poderia ser um trunfo precioso, uma vez que isto fa- tir por temor de represálias, e também calar acerca de sua apreciação real sobre o
funcionamento da empresa que o empregava. Emre o pesquisad res tradidonai
cilitaria le~ar em consideração as diferenças culturaIS e sociais de cada um, Uma
voltados à pesquisa de um discurso "verdadeiro", que dá conta do que realmente
r ai recipro idade das perspectivas sõ seria, no entanto, possivel, caso o pesquisa-
pensa o entrevistado, a preocupação principal parece precisamente ser a de detec-
dor fosse bastante próximo ao grLIpo pesquisado.
tar os "fatores" que podem levar este último a modificar, conscientemente ou não,
Concluindo, nào há regras simples, no que diz respeito a essa queslão da ho- seu discurso, e a de descobriT se ele disse mesmo a verdade. Em resumo, seria pre-
mologia entre entrevistador e enrrevislado. Mesmo que não seja fá ii dellnir em ciso não somente tentar inserir o entrevistado em um contexto que lhe permitisse

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dizer abertamente o que pensa, e, melhor ainda, tudo o que pensa, como também risco de deformar o ponto de vista do entrevistado, mas acrcditavam ser possível re-
procurar, por diferentes procedimentos, revelar se ele mente, ou verificar se o que duzi-lo por meio de uma pré-investigação e de um pré-teste. Eles avaliavam, sobre-
ele diz corresponde verdadeirnmente à realidade tal qual ela é. Essa preocupação lUdo, que esse inconveniente cra amplamente compensado pelas vantagens que a
exiSte tanto entre os adeptos da entrevista pad.ronizada (BLONDIAUX, 1991), padronização devia proporcionar no plano da generalização dos resultados".
quanto entre os defensores da entrevista qualitativa, como o atestam, aliás, os ani- Comentando os trabalhos de Hyman et aI. (1954), que ele julga represemati-
gos de Dean e Whyte (195B) e de Becker (l95B) sobre a onfiabilidade do depoi- vos de tal posição, Cicourel (1964) considera que adotar o referido modelo equiva-
mentOS das pessoas pesquisadas.
le exatamente a querer substilUir o entrevistador por um autOmato capaz de "inte-
raçOes" unifomles com os entrevistados. Segundo esse modelo ideal, o entrevi ta-
Reprotlllçc1o <10 contexto ,lo laboratório em oposi <10 ii coleta de discursos "lIa- dor deve 5<'mpre formular as perguntas da mesma maneira, para que os entrevista-
turais" dos reajam a um mesmo estimulo, e wmbém deve ser capaz de reagir uniformcmen-
Uma vez delimitado os vieses geralmente associados às entTevistas de pesqui- te ás respostas destes últimos, para evitar que as mesmas sejam detllrpadas por suas
sa, como se tentou remediá-los? Na perspectiva de inspiração positivista, as solu- próprias interpretaÇÕeS. Uma semelhante intençào remete, segundo Blondiaux (J 991),
ções consideradas tomaram duas direções OpOStas. Os partidários da entrevista pa- a querer fazer uma ciência sem aLores.
dronizada esforçaram-se em criar condições que lhes permitissem realizar entre- Por sua vez, os pesquisadores que privilegiam as entrevistas de upo qualitativo
vistas em um contexto que se aproximasse O mais possfvel daquele que caracteriza quiseram resolver o problema dos vieses seguindo uma perspectiva oposta. A fim
as experiências de laborat rio. Os pesquisadores no qualitanvo tentaram, ao con- de r produzir o mais integralmente e fielm nte passivei o ponto de vista dos atO-
trário, realizar suas entrevistas em condições semelhantes ãquelas que exi tem nas res, esses pesquisadores alegam dois pnncipios fundamentais. Eles apostam, em
siruações naturais, devendo o depoimentos coibidos aproximar-se, assun, das fa- primeiro lugar, na uperioridade dos discursos coletados em seu contexto naLUral.
las espontâneas, como é o caso nas cooversas comuns. Por aí, eles reconhecem as condições que mais se aproximam daquelas da vida co-
Como o enfatizam Cicourel (1964), Blanchet et aI. (1985), Misbler (1986) e tidiaml dos entrevistados, de modo que os artuicios da situação de pesquisa sejam
Blondiaux (1991), a propósito das pesquisas que se inserem na Unha dos trabalhos atenuados e estes últimos se sintam o mais ã vontade passiveI. As ·conversas natu-
de Hyman et aI., durante os anos 1950, pensou-se que a melhor soluçãO para con- rais", tal como se desenvolvem no dia-a-dia (PALMER, 1928), ou ainda as conver-
tornar os riscos que representavam os vieses consistia em reproduzir um modelo sas colhidas ao vivo, no contexto da obscrvação in si til (BECKER & GEER, 1957,
de prática da entrevista quese assemelhasse o mais passivei ao contexto do labora- 1958), são por muitos consideradas como superiores. egundo Becker e Geer, a
tório. Para tanto, duas estratégias foram consideradas. Primeiramente, buscou-se observação in sinl permite ao p quisador, sobretlldo, indagar os atores sobre o
padronizar as condições de pesquisa, Com o cuidado, por exemplo, de que as en· que eles estão fazendo ou dizendo, apenas observando diretamente as condutas.
trevistas fossem realizadas em um local idêntico e conforme a mesma fomla de Visw sob esse ãnoulo, a situação ideal seria aquela em que os atores envolvidos, ao
contato ou a mesma técniCa de registro dos dados. Essa padronizaçãO das técnicas terem tomado conhecimento dos interesses do pesquisador, aceiwm colaborar es-
tinha por função garamir O exerclcio de um melbor controle sobre as "variáveis" pontaneamente, explicando o mais sinceramente passivei aquilo que eslá aconte-
capazes de alterar o teor dos discursos. Na referida I gica, toma-se totalmente con- cendo. Nessa perspectiva, e contrariamente ao que é preconizad na ab rdagem
tra-indicado entrevistar uma pessoa na presença de uma outra. As entrevi tas de voltada à padronização, entrevistar uma pessoa na presença de uma terceira. por
grupo são também imediatamente excluidas, na medida em que fica difldl medir exemplo, um cOnjuge, ou ainda, como o aponta Burgess (984), fazer entrevistas
precisamente o efeito que isso possa ter, e, ainda, que se complicam proporcional- de gntpO, não são mais situações vistas como inapropriadas, pois elas são propiCIas
mente as comparaçõe eventuais entre as entrevistas. a tipO de interações difíceiS de apreender diferentemente.
A segunda estratégia preconizada foi a de padronizar as intervenções do entre-
vistador, tantO no que diz respeito à forma e ao conteúdo das perguntas, quanto no
que se refere à maneira de coligir as respostas. om as perguntas e as respost"s sen- D. No dcb"e que lrndlclonnlmem opOs os parudanos dos métOdos qwl!lIallvQS aos do quanllUluvo.
~Ies uJumos admitem, habilualmeme, que. o qualitativo pOSSibllíl4t 31 ançar IDo.Ils racLlm~nte um con-
do estruturadas previamente, pensava-se em conter a subjetividade do entrevistador teúdo maJ5 Mrko" c mais prOX'imo 30 Ylvldo dOS310rcs. assim (om OS primeiros admitem IgUJlmentC'
e impedi-lo de se entregar a improvisaçOes e interpretações duvidosas, diminuindo as v3nt.'lgens de uma certa pad.roniznçào. As pnncipais discordttnclas concernem tnal5 a qUe5I/\IJ de S<t·
proporcionalmente os ri cos de ingerência e de deformação. Os partidários da entre- ber se e preciso reservar unicamente às abordngens padronlz:lClas :l possibilidAde de fazer gcntrahu·
çõcs c de verificar teorias. Para um exemplo cláSsico do debate em lOmo dessa quolM 1 nos anos I 60.
vista padrorlizada estavam conscientes de que uma tal padronização comportava o
bem como d:.l posi~o adotnda por alguns defensores do qualitativo. ver Glase.r c Strauss. (1967).

238 239
o segundo principio é o da superioridade dos discurso "espoOlãneos", em como uma realidade. Em uma obra na qual critica O pressuposLoS da entreVISta
relação aOS discursos suscitad s pelo pesquisador. Para autores como Palmer padronizada, Mishler (1986) resume várias pesquisas precisamente voltadas a
(1928), Becker e Geer (1957), assim como Schatzman e trauss (1973), o dtScurso mostrara existência de Imp rtantes desigualdades na fonna de realizar as eOlrevis-
mais verdadeir cOOlinua sendo aquele menos afetado pelas intervenções do I es- taS, eja enLre diferenLes entrevisLadores, ou em um mesmo. Malgrado os esr rço
qUlSador". A situação ideal seria, ainda aqui, aqueL, em que os atores pe quisad s, empreendidos para eliminá-las, invesLindo, por exemplo. em uma melhor fom'a-
COtlSClentes dos inleress de pesquisa do pesquisador, ou, melhor ainda, incons- ção dos enLrCV1stadores, parece dificil, senão impossível, segundo Mishler, supn-
cIentes desses intere es para eviLar a pré-estrutUTaçao de seu dIscurso. consenti- mi-las LOtalmeOle.
nam em narrar o matS espontaneamente possrvel a sua experiencta. Na falta de po- A própria padrolllzação também pode ser r nte de vieses. Estes podem ser 111-
der encontrar "espoOlaneamente essa esp ntaneidade", buscou-se, mão, repro- troduzidos duranLe a análise, por exemplo, com a omissão de lUdo o que nã se in-
duzi-la pelo disposnivo de investigação, obreLudo peja forma de ind ga ão. Ê, sere nas categorias esLabelecida prevtamente, ou com a enonne importância aLri-
efeLivameme, sobre essa imen ã de limitar o efeitos das iOlervenções do entre- buída à busca de COnSLantes. Lévy (1974) aponta, nesse eOlido, a tendencia nas
vistador sobre o enLrevi tado, qu Rogers (l945) se baseia para justificar o recurso análises de comeúdo convencionais, baseadas em 8erelson, em enfatizar as "regu-
ã entre,visLa não-dirigida no conLexto das investigações nas ciencias oeiais, reco- landades", ocultando, assim, O que é considerado como "irregularidades", bem
ohecendo Simplesmente que essa forma de lnteração não é em si natural. como tudo o que parece aáplco. Esses vieses impuLavelS ã padronização podem
Em suma, tanto do lado quantiLativo como do qualitativo, buscou-se resolver igualmente se prodUZir dUTaOle a coleta dos dado, pelo fat de que uma aborda-
o problema dos VIeses na entrevista. Porém, quer se tralaSse de reproduzir o con- gem padronizada corre o risco de não ter suftcientemente em onta particularida-
texto de I.boralório, ou, ao contrário. de obLer o discurso mais "natural" possivel, des própna às sl[lIaçOes e às pessoas. P13get Já havia pressenudo esse problema.
as soluções considerada por UllS e outros permaneccm, em primeiro lugar, e antes Assim, desde os anos 1920, COIUO o r portalU Ghiglione e Matalon (1978: 74), ele
de Ludo, de ordem Lécnica. havia proposto um método clinico no qual preconizava "uma atilude do experi-
mentador que não fosse inteiramente padronizada, mas que buscasse se adaptar a
Os mitos da padrolll.zaçdo e da ndo-drrerividadc cada sujeito, adoLando, na medida do POSSlvel. seus conceitos e sua representa áo
da situação; portanto, uma amude radicalmente posta ã padronização dos Lestes
A partir d 5 atlos 1970, e, sobretudo, nos anos 1980, tanto a padrolllzação ou dos procedtmenLos experimentais". RlSCOS de deformações devidas ã padroni-
quanto a não-diretividade foram objeto de severas críticas, aparecendo defltlltiva- zação lamb m surgem no caso das pesqUIsas qualaauvas, quando os emrevtStado-
mente como milos: mito, primeiramellle, no que se refere à possibilidade de arin- res devem se submeter às instntções padronizada de Lomada de contato com os
gir, na prática, a perfeita padronizaçãO ou a perfeita não-diretividade; mito, em e- enrrevistados e de inicio de entrevista. A esse respeiLo, Palmer (1928) avaliava er
guida, qualllo à sua capacidade de resolver a questãO do vieses. NUIll prinleiro preferível modificar e adaptar Lais instntçOes, em função das particularidades e ca-
momento, enfatizarei, principalmente, as criticas de ordem metodológica dirigidas raclerisdcas dos grupos ou das pessoas pesquisadas".
contra a padronização e a não-diretividade, para, num segundo momento, ater-me A cnuca mais Importante a respeito da padronização concerne, no entanto, à
ã criuca que, no plano epIStemológico, pode ser fonnulada em relaçãO ã perspecti- Impossibilidade de esta elíJnjnar Oque, na perspectiva positivista, denomina-se os
va pOSlllvista sobre a questão dos Vieses ·efeu s do conLexto". Baseando-se em uma per pe uva interaciolllsta e eU1Ome-
Lodológica, Cicourel (l964, 1987) e Misbler (1986) insisLem, ambos, na maneira
As crfticas endereçadas ã padronizaç o e mo O onLe.XLO impregna o conteúdo das perguntas e das respostas. e isto mesmo
Por ser, na prática, difícil, e mesmo impossível de atingir, OIdeal da padroniza-
ção foi freqüentemente desacreditado, mUIlO o vendo mais como um mito do que 25. Professor convidado p:l1"3 um de meus semin.uios. Chnsl13n OtbUYSl, da Escola de Cnmlnologia
da Universidade: Calól1ca de louvam, tr.l=ia O exemplo dos lestes de. mtelJgenci.a par3 ponta r os b-
mites da padronizaçto. Para tVllaros nstos de vits e pennuira compa.l1lç:lo, esses lestes de\'enamser
todos admmlsLrados da mesma Comla Ora, o que fazer quando o U!cnico se d..1 conta de que Omdiví-
2"". Em V1Slad1sso, Palmer (1928) conside.rava que malS valia IOttrvirde uma maneira não-vubal. ou duo ao qual ele aplicou o teste compreende mal as mSlntçÕes, ou njo se sente à vontade? Ele deve
quase nao-vc:rbal. comt"l por meneios de cabeça, sorrisos. "hum-huns", do que verbalJlle.nle; sendo as modificar sua aborcL.tgem, de modo a guranur que eSle tlllimo façn o leSte no melh r de suas cllpacl-
intervençôcs do pomeiro tipo V151aS como menos capazes de innuenciar as ralas do CnlrCVl5lado. Eu dades, ou ele deve se prender inslruçOcs est:lbe.le.cidas' Nesta ultima evenlU3hdadc:, de 0:.\0 corre-
já apontci,antcrionnente, que II próprias atitudes nâo-verbais do enlrevísl3dor sâo nmlüde conSide- na orisco de Inlroduzir um viés. na medida cm que os Trsu!rodo5 do tes~ decolTtnam tanto da forma
radas como uma fonte: de ytts como este t admmlSLJ"3do, quanlo das capacidades da pessoa e.m ques~o?

240 241
no mbito da entrevi ta padronizada. Cicourel, por exemplo, argumenta que, fonnulações onduzem o entrevistado a modificar sensivelmeme O comeudo de
numa entrevista estruturada, a natureza das imervenções, tanto da parte do emre- seu dis ur o. assim como seu grau de envolvimento em seu rela lO.
vistador quanto da do entrevistado, deve-se ao modo como se organiza a totahdade
A cfltiea mais severa em relaç o à entrevista nào-diriglCla foi fom1Ulada por
da entrevista. Assim, não se pode ISolar o jogo das perguntas e das respostas, da tO-
Kandel (1972). Ela argumenta, efeLivameme, que esta forma de entrevista não
talidade das trocas verbais e não-verbais durante a entrevista, assim como, mais
pode impedir o jogo dos vários componemes da iDleração envolvidos na situação
globalmente, do contexto social particular no qual esta se desenvolve. Baseada no
COTlStrullvlsmo, essa ntica será retomada mais adiante, a propõsito dos limites da de pesquisa, taIS como a intervenções não-verbais do entrevistador, ou ainda, as
posição posinvista concernente aos vieses r pecuvas percepções do entrevistador e do entrevistado, em função de suas ca-
racterísticas sociais reais ou presumidas. Se a entrevista nào-dingida é meno pas-
s!vel de produzir um malerial que constitulTia o fato do pesqUISador, ISSO não im-
As criticas endereçadas ii não-diretividade pede a intervenção de outras dimensões, independememeOlc da boa vomade da
Se a padronização Coi objeto de virulentas criticas, a não-diretividade tamp u- competênCIa do entrevi tador.
co escapou delas". Assim como ocorreu em relaçãO à padronização. alguns aponta-
ram, pflmeiramente, que a perCeita não-direnvidade e apenas um mitO. De fato, é o A entrevista eo.oo discurso socialmente constnúdo
pesqUISador quem define o lema ou os temas da entre,'ista. Além disso, apesar dos
principias professado, não é sempre conCortável para um pesquisador aLer-se ex- A observação de Kandel (1972) possibilita introduzir diretamente a cTíuca
c1usivamenle aos temas introduzidos, na seqüênCla, pelo entrevistado. MaIS Cun- epistemologiea cOTlStrulda relativamente ao ponto de vista posiLivlSw sobre os vie-
damentalmente ainda, as intervenções do entrevi tador correm. apesar d tudo, o ses, segundo o qual, deve-se vISar a produção de um discurso depurado d todas as
nsco de serem marcadas por suas próprias preo upações e pressupostos. Não mais mfluências contextuais, e enLão buscar reproduzir Overdadeiro pomo de vista dos
do que no caso da padronização, a Connação dos entrevistadores e a autocrítica sO entrevistados, eliminando, por precauç es t~cnicas, principalmente na escolha do
podem unicamente garanur que essa imperCeição possa ser cvitada. tipo de entrevista, essas influências dilas extenores e vistas corno fontes potenciaiS
Por outro lado, a entrevista não-dirigida não é t O neu lra como bem se o quer de viés A própria idéia de que ~ possivel fazer com que o contexto não intervenha
fazer crer. Basta ter praticado pouco que seja essa teenica, para se dar conw de que, de netlhuma Corma na produçã dos dados e no discurso mantido pelo entrevista-
a despeito das precauções tomadas para que caela um se sinta à vontade, esse tipo do COI Conemente contestada a parur dos anos 1970, entre outro, por autores de
de entrevista cria uma situação que está I nge de ser empre percebida como naru- orientação COTlSlrutlvista. A fim de dar coma de seu pontos de vista, retomarei
ral pelo emreviswdo, e, até certo pontO, pelo entrevistador. Assim, Oentrevistado aqui os argumentos alegados por PCohl (197B), no que se refere ao modo como as
pode se sentir coagido a Calar, sem contar, por outrO lado, o leque de reações passi- pesqlllsas de orientação positivista temaram resolver a qu tão dos vieses capazes
veis a esse gênero de abordagem, rcaçOes que variam confonne os indivíduo e os de Calsear os diagnõsticos profISsionais. Essa criuca me parece perfeitamente trans-
grupo sociais, em virtude, principalmente, como o apomam Schatzman e Strauss portável para o ãmbitO das entrevistas.
(1955"), de uma relaçãO diCerente com a linguagem Al~m disso, a entrevISta Com base numa perspeCtiva etnometodológica, PCohl analisa, primeiramente,
não-dirigida raramente corresponde ii imagem que os eotrevistados Cazem de uma as considerações e o mecanismos que podem intervir na construção dos dIagnós-
entreVISta de pesquISa. Como estes ultimas, geralmente, esperam que se lhes pro- ticos, tais como os jogos de poder entre profi ionais, o sistema de categonas utilt-
p nham questões, o entrevistador se eocontra amiude na obrigação de Cazer escla- zado para reconstruir os casos, a maneira como fonnulam os diagnósticos para
recimentOS quanto ao gênero de emre''1SLa ."perado. Enfim, mesmo as retomadas dar a aparência da objetividade e para garantir que eles sejam aceitos pelas instân-
aparentemente mais neutras, isto é, aquela que visam essencialmeote que o entre- cias de isórias. Em resumo, PCohl busca mostrar a inUuência do que, numa pers-
vistado expliclle ou esclareça o que c!Jsse, podem influir em seu discurso. Nesse pectiva positivista, seria considerado como vieses a eliminar, os quai ,a redita-se,
sentido, Blancbet (19 7) mostra bem como as variações na prõpria Corma das re- impedem de decidir obre a natureza real dos casos. Ele considera, no entanto, que
é tOtalmente ilusório querer supnmtr o jogo das interaçõcs e relações sociais que
intervêm na constituição dos d13gnosueos,Já que ele é merente ao própno proces-
26. Pal"3 t.xe.mplos d~ criuo à n~o-dlrtltvid3de. \'!.r BourdJe:u, Chambom:lon e Passc:ron (1968), so do diagnO tico. Segundo Pfohl, todo diagn rico ~ urna cODStrução so ial, nã
Bt'Dche< (t982). Ch.brol (988). somente porque pressupõe o recurso a um sistema de categorias, mas também por-
27. Ver 3 apre:sentaç1o e n tradução desse lexto em Bourdlcu. Cbamboredon e Pa.sse.ron (1968: que toma COnTIa por meio do jogo e das questões das múltiplas interações sociais
222-237). próprias ao contexto particular no qual ele é produzido.

242 243
uma retórica própria às ciências sociaLS, os pesquisadores tenUtm, atravês desses do rela lOS, O malerial produzido pela entrevista é, assim, considerado por alguns
relatos, convencer Oleilor da justeza de sua interpretação, bem como impor a sua como uma co-conslrução da qual tomam pane lanLO o entrevisLador quanto li en-
própria visão da realidade. u·evislado. O modo como 05 relatório de pesquisa descrevem a experiência dus
Essa rrente de reflexão suscita, no enlamo, controvérsias, pois não há abso- al res é tambem considerado como largameme dependeme da orieoLação do p -
lutamente acordo sobre a quesl O de saber e os latos etnográficos podem, ou quisadores, dos enfoques e dos processos de escrita empregados. A relação entre o
não, reproduzIr a experiêncIa dos atores. Alguns, como Oillord (1986) ou Van que dizem 05 correvistados e o que se prelende que eles digam nào é, portanto. tão
Maanen (1988), lenlam tomar distância em relação ao POntO de visLa p siúvLSta, Imples, ou, prefenndo- e, é amda mal complexa do que se tinha tendência a crer.
que acrediLa na possibilidade de reproduZIT a experiência tal qual ela é. Eles não atê recentemenle.
consideram os lalOS dos pesquisadores como tradu ões da realidade, avahando Em seguida, sob a uilluência principalmente d correntes femmisla e pos-
preferencialmente que eles SÓ podem ser versóes parciais e parcelares dessa reali- modema, um bom número de pesquisadores in isle na importância de dar ainda
dade. No mesmo sentido, Denzm (1994) argumenta, por sua vez, que não pode ha- mais espaço aos diversos pomos de visla dos atores sociais. nos relatórios de pes-
ver senão múltiplas versões da realidade, segundo a perspectiva teórica e epistemo- quisa. Eles também insislem na necesldade de tomar partido do grupos pesquIsa-
logica adoLada. Outros, como C10ugh (1992), que eu já haVia mencionado, adolam dos. bsas idéias. evidentemente. não são totalmente oovas. Vimos que diferentes
uma POSiçãO exlrema e recusam a própria existência de uma correspondência possi- tradições 110 interior dos métodos qualitativos já insistiam nesses aspecLOs. Mam
vel entre 05 relatos dos pesquisadores e a experiência dos atores, Além de Smith festando um interesse marcante por essas questões, essas correntes obngam, con-
(1993), aULOres como Atkinson e Hammersley (]994), e Altheide eJohnson (1994) tudo. 05 pesquisadores a refletir e a LOmar claramente posiçãO quanlo ao senlido
reconhecem, de sua pane, a contribuição da corrente pós-modema, quando ela cha- que eles atribuem ao seu procedimento.
ma atenção para a imporlância de considerar devidamente o papel do processo de
escriLa e da retonca na exposição que 05 pesquisadores fazem da realidade. assim
Referências
como a necessidade de examinar a maneira como os cientistas buscam, por meio de
eus lextos, impor e apresenLar uma imagem de uma ciênda objetiva. Eles lemem, AlTHElDE, D.L. &'JOHNSON.J.M. (]994). "Criteria ~ r As essing Interpr t.uve
contudo, que essa corrente vá muito longe, ao considerar os lexLOS de pesquisa estri- Validily in Qualilalive Research". ln DENZIN, NK &' LI COl • Y. (orgs.).
tamenle sob o ãngulo de uma produção lextual e negar qualquer fundamemo a 5 Halldbaoh ofQuolitolive RestareI!. Thousand Oaks (Califórnia). Sage, p. 485-499.
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Neste capitulo, apresentei os argumemos clássicos alegados para justificar o
tions sociales. Paris: Halier.
recurso àS entrevistas de tipo qualitauvo: tenlei "descooslrULr" os principios e as
estratégias geralmente associadas ao ilO de uma entrevista; e discorri sobre a BECKER, H.S (1967). "Whose Slde Are We On?" Social Problems, vol. 1+, p.
evolução dos debates em torno da questão do vieses Com isso. pretendi nem tall- 239-2-18.
lO mostrar que o uso desse instrumento ultrapassa, como sabemo, as dimertsões _ _ (1963). OUlSidas - tudes de scclologie dc lo deviance (]985). Paris: Metaihé.
exclusivamente técnicas. quamo insisur nas diversas lIldagações de ordem episte-
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mológIca, teórica e metodológica, SllSdtadas por sua utilização. Dentre essas mda-
AmtncQII Sociological Revlew, vol 23. n. 6, p. 652-660.
gações, vimos, por exemplo, que se a entrevista qualitativa é geralmente considera-
da como uma via de acesso privilegiado para apreender O pomo de vista e a ""Pe- BECKER, H.S. &' GEER, B. (1958). "Parti ipam Observalion and Interviewmg: A
riência dos atores, não há necessariamente concordancia sobre o que a análise d Rejoindcr". Human Orgalllzalion, vol. 17. n. 2. p. 39-40.
seus diSCUrsos permite dIZer a propósiLO das reaiidades sodais, nem sobre o que 05 ___ (1957). ·Particlpam Observauon and Interviewing: A Companson" Hu-
pesquisadores devem fazer socialmente com 05 depoimentos colhidos. mail Organlzarioll, vol. 16, n. 3, p. 28-33
Para terminar, eu gOSLaria de voltar a duas reflexões aluais concernentes ao es- BERTAUX, D. (1986). "Fonctlons dlverses des récilS de vie dans le processus de
tatuLO das entrevistas, e que me parecem fecundas. Primeiramente, os textoS do recherche". ln: DESMARAlS. D. &' GRELL, P (orgs.). l.Ls rtalS de vie: théorie, métho-
ultimes anos enfatizam preferencialmente o papel dos pesquisadores na produção de et trajectoires types. Montreal: Saint-Marún. p. 2l-34.

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