Está en la página 1de 204

INvESTIGACÃO OPERáRIA

EMPRESáRIOS, MILITARES E PELEGOS CONTRA OS TRABALHADORES

reaLização:

Projeto Comissão de ministério da


marcas da memória anistia Justiça

apoio:

Investigação Final.indd 1 25/11/14 18:12


nota tÉCniCa
Essa publicação não poderá ser vendida.
As fontes documentais pesquisadas e a bibliografia consultada de cada um
dos capítulos encontram-se organizadas ao final do livro.
Os depoimentos transcritos foram realizados pelo Projeto Memória da OSM-SP.
Quando são de outra origem, são citadas as fontes.
Consta a indicação dos acervos públicos e privados, dos quais procedem
os materiais cedidos e utilizados no livro.
A Oposição Sindical Metalúrgica de São Paulo, ao longo de sua história,
recebeu milhares de fotos que foram usadas nas suas diversas iniciativas
políticas – muitas vezes, numa relação de militância com o fotógrafo, ou seja,
relação não comercial. Hoje, esse acervo é parte do Projeto Memória da OSM-SP.
As fotos cedidas por instituições privadas, arquivos públicos,
arquivos pessoais e fotógrafos estão identificadas.
No caso das fotos com autoria não identificada, foram realizadas as tentativas
possíveis de localizar o profissional. Pela importância histórica do tema e
pelo fato de não ser uma atividade comercial, optamos pelo uso das fotos
e solicitamos informações que possam nos ajudar a identificar
seus autores para dar-lhes os devidos créditos.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


C 766i

Investigação Operária: empresários, militares e pelegos contra os


trabalhadoresos / Conselho Político do Projeto Memória da OSM-SP.
2014 – São Paulo: IIEP – Oposição Sindical Metalúrgica de São Paulo /
Projeto Memória, 2014.
204p.:il.

ISBN

1. Tortura. 2. Repressão. 3 Ditadura militar – Brasil. I. IIEP.


II. Oposição Sindical Metalúrgica de São Paulo
CDU 365.0981

O presente projeto foi apresentado no ano de 2011 à II Chamada Pública


do projeto Marcas da Memória, da Comissão de Anistia do Ministério
da Justiça, e selecionado por Comitê independente para fomento. A realização
do projeto objetiva atender as missões legais da Comissão de Anistia de
promover o direito à reparação, memória e verdade, permitindo que a
sociedade civil e os anistiados políticos concretizem seus projetos de
memória. Por essa razão, as opiniões e dados contidos na publicação são
de responsabilidade de seus organizadores e autores, e não traduzem opiniões
do Governo Federal, exceto quando expresso em contrário.

Investigação Final.indd 2 25/11/14 18:12


Conselho Político
Anízio Batista de Oliveira
Carmem Sylvia Vidigal Moraes
Elias Stein
Ênio Borges
Francisco Carlos de Souza (Chico Gordo)
Geraldo Ferreira da Silva
Helio Bombardi
Hercílio Correa Filho
Jean François Germain Tible
Jorge Luís dos Santos Oliveira (Jorge Preto)
José Carlos Cândido (Marrom)
Olair Cardoso
Raimundo Moreira de Oliveira (Raimundinho)
Ronaldo Cândido
Salvador Pires
Sebastião Neto
Stanislaw Szermeta
Vito Giannotti
Waldemar Rossi

Equipe IIEP
Carolina Alvim de Oliveira Freitas
Edméa Barbosa da Luz
Eliane Gonçalves (Lia)
Fabíola Andrade
José Cláudio de Paula
Maria Goretti Rodrigues
Milena Fonseca Fontes
Paula Ribeiro Salles
Pedro Mauricio Garcia Dotto
Rodolfo Machado
Valderi Antão Ruviaro (Valdo)
Vanessa Miyashiro
Yara Silvia Tucunduva

Pesquisadores
Angela Bicalho
Marina Kiriyama
Ronilde Machado
Rosi Aparecida Soares
Sofia Dias Batista
Sueli Bossam
Vicente Garcia Ruiz

Redação e colaboração
André Luzzi
Alana Moraes
Arlete Neves Martins
Claudia Santiago
Danilo Fernandes Costa
Delmira Isabel de Jesus
Josué Medeiros
Maria das Merces Aparecida Apostolo
Maria José Soares
Maria Rosangela Battistoni
Marcelo Antônio Chaves
Paulo Cavalcanti
Paulo Fontes
Reginaldo Moraes
Rodrigo Bruder
Silvia Adoue

Textos autorais
Adriana Gomes Santos
Alípio Freire
Antonio Fernandes Neto (Neto)
Ivan Seixas
Murilo Leal Pereira Neto

* Os membros do Conselho Político e da Equipe IIEP muitas vezes participaram de diversas etapas desse processo. A não repetição dos seus nomes é intencional.
Projeto gráfico e diagramação: Caco Bisol. Revisão de texto: Guilherme Salgado Rocha

Investigação Final.indd 3 25/11/14 18:12


Presidenta da República
DILMA VANA ROUSSEFF

Ministro da Justiça
JOSÉ EDUARDO CARDOZO

Secretário-Executivo
MARIVALDO DE CASTRO PEREIRA

Presidente da Comissão de Anistia


PAULO ABRÃO

Vice-presidentes da Comissão de Anistia


SUELI APARECIDA BELLATO
JOSÉ CARLOS MOREIRA DA SILVA FILHO

Conselheiros da Comissão de Anistia


ALINE SUELI DE SALLES SANTOS
ANA MARIA GUEDES
ANA MARIA LIMA DE OLIVEIRA
CAROLINA DE CAMPOS MELO
CAROL PRONER
CRISTIANO OTÁVIO PAIXÃO ARAÚJO PINTO
ENEÁ DE STUTZ E ALMEIDA
HENRIQUE DE ALMEIDA CARDOSO
JUVELINO JOSÉ STROZAKE
LUCIANA SILVA GARCIA
MANOEL SEVERINO MORAES DE ALMEIDA
MÁRCIA ELAYNE BERBICH DE MORAES
MARINA SILVA STEINBRUCH
MÁRIO MIRANDA DE ALBUQUERQUE
MARLON ALBERTO WEICHERT
NARCISO FERNANDES BARBOSA
NILMÁRIO MIRANDA
PRUDENTE JOSÉ SILVEIRA MELLO
RITA MARIA DE MIRANDA SIPAHI
ROBERTA CAMINEIRO BAGGIO
RODRIGO GONÇALVES DOS SANTOS
VANDA DAVI FERNANDES DE OLIVEIRA
VIRGINIUS JOSÉ LIANZA DA FRANCA

Diretora da Comissão de Anistia


AMARÍLIS BUSCH TAVARES

Chefe de Gabinete
LARISSA NACIF FONSECA

Coordenadora Geral do Memorial da Anistia Política do Brasil


ROSANE CAVALHEIRO CRUZ

Coordenador de Projetos e Políticas de Reparação e Memória Histórica


EDUARDO HENRIQUE FALCÃO PIRES

Coordenador de Articulação Social, Ações Educativas e Museologia


BRUNO SCALCO FRANKE

Coordenadora do Centro de Documentação e Pesquisa


ELISABETE FERRAREZI

Coordenador Geral de Gestão Processual


MULLER LUIZ BORGES

Coordenadora de Controle Processual, Julgamento e Finalização


NATÁLIA COSTA

Coordenador de Pré-análise
RODRIGO LENTZ

Coordenadora de Análise e Informação Processual


JOICY HONORATO DE SOUZA

Investigação Final.indd 4 25/11/14 18:12


5

investigação operária

APRESENTAÇÃO DA COMISSÃO DE ANISTIA

A
Comissão de Anistia é um órgão do Esta- pleto fundo documental sobre a ditadura bra-
do brasileiro ligado ao Ministério da Jus- sileira (1964-1985), conjugando documentos
tiça e composto por 26 conselheiros, em oficiais com inúmeros depoimentos e acervos
sua maioria, agentes da sociedade civil ou pro- agregados pelas vítimas. Esse acervo será dis-
fessores universitários, sendo um deles indi- ponibilizado ao público por meio do Memorial
cado pelas vítimas e outro pelo Ministério da da Anistia Política do Brasil, sítio de memó-
Defesa. Criada em 2001, há treze anos, com o ria e homenagem às vítimas, em construção na
objetivo de reparar moral e economicamente cidade de Belo Horizonte. Desde 2008 a Co-
as vítimas de atos de exceção, arbítrio e vio- missão passou a promover diversos projetos de
lações aos direitos humanos cometidas entre educação, cidadania e memória, levando, por
1946 e 1988, a Comissão hoje conta com mais meio das Caravanas de Anistia, as sessões de
de 70 mil pedidos de anistia protocolados. Até apreciação dos pedidos aos locais onde ocorre-
o ano de 2012 havia declarado mais de 35 mil ram às violações, que já superaram 70 edições;
pessoas “anistiadas políticas”, promovendo divulgando chamadas públicas para financia-
o pedido oficial de desculpas do Estado pelas mento a iniciativas sociais de memória, como
violações praticadas. Em aproximadamente 15 a que presentemente contempla este projeto; e
mil destes casos, a Comissão igualmente re- fomentando a cooperação internacional para o
conheceu o direito à reparação econômica. O intercâmbio de práticas e conhecimentos, com
acervo da Comissão de Anistia é o mais com- ênfase nos países do Hemisfério Sul.

Investigação Final.indd 5 25/11/14 18:12


6

investigação operária

COMISSÃO DE ANISTIA DO MINISTÉRIO DA JUSTIÇA


COMPOSIÇÃO ATUAL

PRESIDENTE:

Paulo Abrão
Paulo Abrão é Secretário Nacional de Justiça do Brasil. Presidente do Comitê Nacional para Refugiados, do
Comitê Nacional para o Enfrentamento ao Trafico de Pessoas e da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça
que promove processos de reparação e memória para as vítimas da ditadura militar de 1964-1985. Diretor do
Programa de Cooperação Internacional para o desenvolvimento da Justiça de Transição no Brasil com o PNUD.
Integrou o Grupo de Trabalho que elaborou a Lei que institui a Comissão Nacional da Verdade no Brasil. Juiz
integrante do Tribunal Internacional para a Justiça Restaurativa em El Salvador. Membro diretor da Coalização
Internacional de Sitio de Consciência e presidente do Grupo de Peritos contra a Lavagem de Dinheiro da
Organização dos Estados Americanos. Atualmente coordena o comitê de implantação do Memorial da Anistia
Política no Brasil. Possui doutorado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e é
professor do Curso de Mestrado e Doutorado em Direito da Universidade Pablo de Olavide (Espanha). Possui
publicações publicadas em revistas e obras em língua portuguesa, inglesa, alemã, italiana e espanhol.

VICE-PRESIDENTES:

Sueli Aparecida Bellato


Conselheira desde 06 de março de 2003. Nascida em São Paulo/SP, em 1º de julho de 1953.
Religiosa da Congregação de Nossa Senhora - Cônegas de Santo Agostinho, Advogada do Centro de Direitos
Humanos de São Miguel Paulista - São Paulo, do Centro de Orientação de Direitos Humanos de Guarabira-
Paraíba, do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Pilões e Borborema – Paraíba, advogada do Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra - MST, Rio Grande do Sul. Membro e coordenadora da Associação Nacional
de Advogados Populares – ANAP. Advogada do Departamento de Trabalhadores Rurais da Central Única
dos Trabalhadores, da Secretaria-executiva do Fórum Nacional contra Violência no Campo. Assessora da
Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão /MPF. Assessora da Comissão de Direitos Humanos da Câmara
dos Deputados e assessora parlamentar dos Senadores Tião Viana e Siba Machado. Assistente de Acusação
do Processo contra os acusados do assassinato do ambientalista e sindicalista Chico Mendes, João Canuto e
Expedito Ribeiro. Membro da Comissão Brasileira Justiça e Paz e Rede Social de Direitos Humanos. Compôs a
Coordenação do Grupo de Trabalho Araguaia - GTA Membro do Tribunal Internacional de Justiça Restaurativa
de El Salvador. È Mestranda do Programa de Pôs Graduação de Direitos Humanos da UNB.

José Carlos Moreira da Silva Filho


Conselheiro desde 25 de maio de 2007. Nascido em São Paulo/SP, em 18 de dezembro de 1971, é graduado
em Direito pela Universidade de Brasília, mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina e
doutor em Direito pela Universidade Federal do Paraná. Atualmente é professor da Faculdade de Direito e
do Programa de Pós- Graduação em Ciências Criminais da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande
do Sul (PUCRS).

Investigação Final.indd 6 25/11/14 18:12


7

investigação operária

CONSELHEIROS:

Aline Sueli de Salles Santos


Conselheira desde 26 de fevereiro de 2008. Nascida em Caçapava/SP, em 04 de fevereiro de 1975, é graduada
em Direito pela Universidade de São Paulo, mestre em Direito pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos e
doutoranda em Direito pela Universidade de Brasília. É professora da Universidade Federal do Tocantins/TO.

Ana Maria Guedes


Conselheira desde 04 de fevereiro de 2009. Nascida em Recife/PE, em 19 de abril de 1947, é graduada em
Serviço Social pela Universidade Católica de Salvador. Atualmente é membro do Grupo Tortura Nunca Mais
da Bahia e integrante da comissão organizadora do Memorial da Resistência Carlos Mariguella, Salvador/BA.

Ana Maria Lima de Oliveira


Conselheira desde 26 de abril de 2004. Nascida em Irituia/PA, em 06 de dezembro de 1955, é Procuradora Federal
do quadro da Advocacia-Geral da União desde 1987 e graduada em Direito pela Universidade Federal do Pará.

Carolina de Campos Melo


Conselheira desde 02 de fevereiro de 2012. Nascida na cidade do Rio de Janeiro, em 22 de janeiro de 1976,
é graduada e mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e doutora
em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). É Advogada da União desde setembro de
2003. É também Professora do Departamento de Direito da PUC-Rio e Coordenadora Acadêmica do Núcleo
de Direitos Humanos. Atualmente é assessora na Comissão Nacional da Verdade.

Carol Proner
Conselheira desde 14 de setembro de 2012, nascida em 14 de julho de 1974 em Curitiba/PR. Advogada,
doutora em Direito Internacional pela Universidade Pablo de Olavide de Sevilha (Espanha), Professora de
Direito Internacional da Universidad Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Co-Diretora do Programa Máster-
Doutorado Oficial da União Européia, Derechos Humanos, Interculturalidad y Desarrollo - Universidade Pablo
de Olavide/ Univesidad Internacional da Andaluzia. Concluiu estudos de Pós-Doutorado na École de Hautes
Etudes de Paris (França). É autora de artigos e livros sobre direitos humanos e justiça de transição.

Cristiano Paixão
Conselheiro desde 1º de fevereiro de 2012. Nascido na cidade de Brasília, em 19 de novembro de 1968, é mestre em
Teoria e Filosofia do Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), doutor em Direito Constitucional
pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e fez estágio pós-doutoral em História Moderna na Scuola
Normale Superiore di Pisa (Itália). É Procurador Regional do Trabalho em Brasília e integra a Comissão da Verdade
Anísio Teixeira da Univerisidade de Brasília, onde igualmente é professor da Faculdade de Direito. Foi Professor
visitante do Mestrado em Direito Constitucional da Universidade de Sevilha (2010-2011). Co-líder dos Grupos
de Pesquisa “Direito e história: políticas de memória e justiça de transição” (UnB, Direito e História) e “Percursos,
Narrativas e Fragmentos: História do Direito e do Constitucionalismo” (UFSC-UnB).

Eneá de Stutz e Almeida


Conselheira desde 22 de outubro de 2009. Nascida no Rio de Janeiro/RJ, em 10 de junho de 1965, é graduada
e mestre em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro e doutora em Direito pela Universidade

Investigação Final.indd 7 25/11/14 18:12


8

investigação operária

Federal de Santa Catarina. É professora da Universidade de Brasília, onde coordena um Grupo de Pesquisa
sobre Justiça de Transição no Brasil, e leciona e orienta na graduação e pós-graduação em direito. Integra
ainda a Comissão Anisio Teixeira da Memória e Verdade da UnB.

Henrique de Almeida Cardoso


Conselheiro desde 31 de maio de 2007. Nascido no Rio de Janeiro/RJ, em 23 de março de 1951, é o representante
do Ministério da Defesa junto à Comissão de Anistia. Oficial de artilharia do Exército pela Academia Militar
de Agulhas Negras (AMAN), é bacharel em Ciências Econômicas e em Ciências Jurídicas pela Universidade do
Estado do Rio de Janeiro.

Juvelino José Strozake


Conselheiro desde 25 de maio de 2007. Nascido em Alpestre/RS, em 18 de fevereiro de 1968, é advogado
graduado pela Faculdade de Direito de Osasco (FIEO), mestre e doutor em Direito pela Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo. É membro da Rede Nacional de Advogados Populares (RENAP).

Luciana Silva Garcia


Conselheira desde 25 de maio de 2007. Nascida em Salvador/BA, em 11 de maio de 1977, é graduada em
Direito pela Universidade Federal da Bahia, mestre em Direito Público pela Universidade do Estado do Rio
de Janeiro, Especialista em Direitos Humanos e Processos de Democratização pela Universidade do Chile e
Doutoranda em Direito pela Universidade de Brasília. Atualmente é diretora do Departamento de Defesa dos
Direitos Humanos da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.

Manoel Severino Moraes de Almeida


Conselheiro desde 01 de junho de 2013. Nascido em Recife, em 22 de fevereiro de 1974, é Bacharel em Ciências
Sociais (1999) e Mestre em Ciência Política (2004) pela Universidade Federal de Pernambuco. Membro da Comissão
da Memória e Verdade Dom Helder Câmara de Pernambuco. Professor de Direitos Humanos e Ciência Política
da UNINASSAU. Associado do IDHEC - Instituto Dom Helder Camara; Dignitatis – Assessoria Técnica Popular;
Cendhec - Centro Dom Helder Câmara de Estudos e Ação Social e Associação Nacional de Direitos Humanos,
Pesquisa e Pós- Graduação - ADHEP; IDEJUST - Grupo de Estudos sobre Internacionalização do Direito e Justiça
de Transição. Ex-Conselheiro do Conselho Nacional de Segurança Pública – Ministério da Justiça (CONASP -
2010/2011) e colaborador do Conselho Nacional de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana CDDPH; Signatário
do PNDH3. Colaborador da rede de defensores e defensoras de direitos humanos das Américas mediado pela
Anistia Internacional (RED DE DEFENSORES Y DEFENSORAS DE DERECHOS HUMANOS DE LAS AMÉRICAS).

Márcia Elayne Berbich de Moraes


Conselheira desde 23 de julho de 2008. Nascida em Cianorte/PR, em 17 de novembro de 1972, é advogada
graduada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). É especialista, mestre
e doutora em Ciências Criminais, todos pela mesma instituição. Foi integrante do Conselho Penitenciário do
Estado do Rio Grande do Sul entre 2002 e 2011 e ex. professora da Faculdade de Direito de Porto Alegre
(FADIPA). Atualmente é professora de Direito Penal do IBMECRJ.

Marina da Silva Steinbruch


Conselheira desde 25 de maio de 2007. Nascida em Guaíra/SP, em 12 de abril de 1954, é graduada em Direito

Investigação Final.indd 8 25/11/14 18:12


9

investigação operária

pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo/SP. Atuou como defensora pública da União por 22
anos. É funcionária pública desde 1973.

Mário Albuquerque
Conselheiro desde 22 de outubro de 2009. Nascido em Fortaleza/CE, em 21 de novembro de 1948. É membro da
Associação Anistia 64/68. Atualmente preside a Comissão Especial de Anistia Wanda Sidou do Estado do Ceará.

Marlon Alberto Weichert


Conselheiro desde 13 de maio de 2013. Procurador Regional da República, atuando há mais de dez anos
com o tema da Justiça de Transição, especialmente responsabilização criminal e civil de perpetradores de
graves violações aos direitos humanos, acesso à informação e à verdade, implantação de espaços de memória
e reparações imateriais. Perito em justiça de transição indicado pela Comissão Interamericana de Direitos
Humanos da OEA. Coordenador do Grupo de Trabalho Memória e Verdade da Procuradoria Federal dos
Direitos do Cidadão. Coordenador do projeto Brasil Nunca Mais Digital. Mestre em Direito do Estado pela
PUC/SP e graduado em Direito pela Universidade Federal Fluminense. Especialista em Direito Sanitário pela
Universidade de Brasília – UnB.

Narciso Patriota Fernandes Barbosa


Conselheiro desde 25 de maio de 2007. Nascido em Maceió/AL, em 15 de setembro de 1970, é graduado em
Direito pela Universidade Federal de Alagoas e possui especialização em Direitos Humanos pela Universidade
Federal da Paraíba. É advogado militante nas áreas de direitos humanos e de segurança pública.

Nilmário Miranda
Conselheiro desde 1º de fevereiro de 2012. Nascido em Belo Horizonte/ MG, em 11 de agosto de 1947, é Jornalista
e mestre em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Foi deputado estadual, deputado
federal e ministro da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República (SEDH – 2003/2005).
Quando deputado federal Presidiu a Comissão Externa para Mortos e Desaparecidos Políticos. Foi autor do
projeto que criou a Comissão de Direitos Humanos na Câmara, que presidiu em 1995 e 1999. Representou por 07
(sete) anos a Câmara dos Deputados na Comissão Especial dos Mortos e Desaparecidos Políticos. É membro do
Conselho Consultivo do Centro de Referência das Lutas Políticas no Brasil, denominado “Memórias Reveladas”. Foi
presidente da Fundação Perseu Abramo por 05 (cinco) anos. Atualmente é Deputado Federal por Minas Gerais e,
na Câmara dos Deputados, é Vice-Presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, titular da Comissão
de Desenvolvimento Urbano e suplente da Comissão de Legislação Participativa.

Prudente José Silveira Mello


Conselheiro desde 25 de maio de 2007. Nascido em Curitiba/PR, em 13 de abril de 1959, é graduado em
Direito pela Universidade Católica do Paraná e doutorando em Direito pela Universidade Pablo de Olavide
(Espanha). Advogado trabalhista de entidades sindicais de trabalhadores desde 1984, atualmente leciona
nos cursos de pós-graduação em Direitos Humanos e Direito do Trabalho do Complexo de Ensino Superior de
Santa Catarina (CESUSC).

Rita Maria de Miranda Sipahi


Nasceu em Fortaleza/CE, em 1938. Formada pela Faculdade de Direito da Universidade do Recife. Servidora

Investigação Final.indd 9 25/11/14 18:12


10

investigação operária

pública aposentada pela Prefeitura do Município de São Paulo. Suas principais atividades profissionais situam-
se na área educacional, do Direito e da gestão pública. Militante política a partir dos anos 1960. Participa do
Núcleo de Preservação da Memória Política de São Paulo e do Coletivo de Mulheres de São Paulo. Conselheira
da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça desde outubro de 2009.

Roberta Camineiro Baggio


Conselheira desde 25 de maio de 2007. Nascida em Santos/SP, em 16 de dezembro de 1977, é graduada em
Direito pela Universidade Federal de Uberlândia, mestre em Direito pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos
e doutora em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina. Atualmente é professora na Faculdade de
Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre/RS.

Rodrigo Gonçalves dos Santos


Conselheiro desde 25 de maio de 2007. Nascido em Santa Maria/RS, em 11 de julho de 1975, é advogado,
graduado e mestre em Direito Público pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos/UNISINOS. Professor
licenciado do Curso de Direito do Centro Universitário Metodista Isabela Hendrix de Belo Horizonte. Consultor
da Fundação Getulio Vargas (FGV).

Vanda Davi Fernandes de Oliveira


Conselheira desde 26 de fevereiro de 2008. Nascida em Estrela do Sul/MG, graduada em Direito pela
Universidade Federal de Uberlândia e doutoranda em Direito Ambiental pela Universidad de Alicante
(Espanha). É presidente da ONG Ambiente e Educação Interativa - AMEDI, e membro do CBH Paranaíba.

Virginius José Lianza da Franca


Conselheiro desde 1º de agosto de 2008. Nascido em João Pessoa/PB, em 15 de agosto de 1975, é advogado
graduado em Direito pela Universidade Federal da Paraíba, especialista em Direito Empresarial pela mesma
instituição. Atualmente é Coordenador-Geral do Conselho Nacional de Refugiados do Ministério da Justiça
(CONARE) e Diretor Adjunto do Departamento de Estrangeiros do Ministério da Justiça. Ex-diretor da Escola
Superior da Advocacia da Ordem dos Advogados – Seccional Paraíba. Ex-Procurador do Instituto de Terras
e Planejamento Agrário (INTERPA) do Estado da Paraíba. Igualmente, foi Secretário-Executivo do Conselho
Nacional de Combate à Pirataria (CNCP).

Investigação Final.indd 10 25/11/14 18:12


11

investigação operária

APRESENTAÇÃO DO PROJETO MARCAS


DA MEMÓRIA DA COMISSÃO DE ANISTIA
Marcas da Memória: Um projeto de memória e reparação coletiva para o Brasil

C
riada há dez anos, em 2001, por meio de individual em um processo de reflexão e apren-
medida provisória, a Comissão de Anistia dizado coletivo, fomentando iniciativas locais,
do Ministério da Justiça passou a integrar regionais e nacionais que permitam àqueles que
em definitivo a estrutura do Estado brasileiro viveram um passado sombrio, ou que a seu estu-
no ano de 2002, com a aprovação de Lei n.º do se dedicaram, dividir leituras de mundo que
10.559, que regulamentou o artigo 8º do Ato permitam a reflexão crítica sobre um tempo que
das Disposições Constitucionais Transitórias. precisa ser lembrado e abordado sob auspícios
Tendo por objetivo promover a reparação democráticos. Para atender estes amplos pro-
de violações a direitos fundamentais pratica- pósitos, as ações do Marcas da Memória estão
das entre 1946 e 1988, a Comissão configura- divididas em quatro campos: a) audiências pú-
-se em espaço de reencontro do Brasil com seu blicas; b) projetos de coleta de história oral; c)
passado, subvertendo o senso comum da anis- chamadas públicas de fomento à iniciativas da
tia enquanto esquecimento. A Anistia no Bra- Sociedade Civil, como a que selecionou o pre-
sil significa, a contrário senso, memória. Em sente projeto; d) publicações.
seus 10 anos de atuação, o órgão reuniu milha- O projeto “Marcas da Memória” reúne depoi-
res de páginas de documentação oficial sobre a mentos, sistematiza informações e fomenta ini-
repressão no Brasil e, ainda, centenas de depoi- ciativas educativas, intelectuais e culturais que
mentos, escritos e orais, das vítimas de tal re- permitam a toda sociedade conhecer o passado
pressão. E é deste grande reencontro com a his- e dele extrair lições para o futuro. Seu objetivo é
tória que surgem não apenas os fundamentos descentralizar do Estado o processo de fomento
para a reparação às violações como, também, a à memória histórica sobre as violações aos direi-
necessária reflexão sobre a importância da não tos humanos e de cidadania ocorridos no passa-
repetição destes atos de arbítrio. do, garantindo a insurgência de memórias plu-
É neste contexto que surge o projeto “Marcas da rais, que reflitam a diversidade de perspectivas
Memória”, que expande ainda mais a reparação que o povo brasileiro tem de sua própria história.

Comissão de Anistia do Ministério da Justiça

Investigação Final.indd 11 25/11/14 18:12


Sumário

14 A lutaPELA VERDADE

15 NOSSA APRESENTAÇÃO

17 O CONTINENTE TRABALHO

18 ÀS MULHERES E AOS HOMENS QUE LUTARAM CONOSCO

19 INTRODUÇÃO

21 O PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DA MEMÓRIA DOS TRABALHADORES

31 A DITADURA MILITAR DE 1964-1985


33 O GOLPE DE 1964. A DISPUTA ENTRE DOIS PROGRAMAS
ALÍPIO FREIRE

37 contexto político eantecedentes históricos

57 O SINDICATO, A OPOSIÇÃO E AS ELEIÇÕES


59 OS METALÚRGICOS DE SÃO PAULO ANTES E DEPOIS DE 1964
MURILO LEAL

62 O sindicato

85 A ASSOCIAÇÃO ANTI-OPERÁRIA
88 O EMPRESARIADO E A REPRESSÃO
107 A RELAÇÃO PROMÍSCUA ENTRE O EMPRESARIADO E A REPRESSÃO POLÍTICA
IVAN SEIXAS

110 A FÁBRICA DE MORTOS


115 TECNOFORJAS: EMPRESAS, DOPS, TUMA
120 NEM TODOS COLABORARAM

122 O SINDICALISMO A SERVIÇO DE DOIS SENHORES: O ESTADO E O PATRÃO


137 “CAIU A COORDENAÇÃO DA OPOSIÇÃO...”
141 A OPOSIÇÃO SINDICAL NO EXÍLIO AOS OLHOS DA REPRESSÃO
145 GREVES: DAS PRISÕES SELETIVAS À REPRESSÃO EM MASSA
160 NOSSAS BRAVAS MULHERES
166 A AÇÃO DO II EXÉRCITO NO “ENCONTRO DOS TRABALHADORES COM O PAPA”
171 OPERÁRIOS NO PARLAMENTO
176 NOSSOS MORTOS
187 MASSACRES, TORTURAS E PRISÕES: O TERROR EM TODO O PAÍS

197 CONCLUSÃO

200 FONTES

Investigação Final.indd 12 25/11/14 18:12


INvestiGacão Operária
empresários, militares e pelegos contra os trabalhadores

Investigação Final.indd 13 25/11/14 18:12


14

investigação operária

A luta pela verdade

E
sse trabalho foi beneficiado pelo momento político que o país atravessa, em que
os perseguidos, vitimados, familiares, amigos conseguiram, após tantos anos,
colocar na pauta política a busca da memória e da verdade. Nossa tarefa é com-
provar, a partir dos testemunhos e da documentação, como esse sistema de terror
atingiu as classes trabalhadoras.

Seria impossível nomear aqui cada uma das associações, entidades, centros de memó-
ria de trabalhadores, organização de trabalhadores ex-presos políticos, centrais sindi-
cais, comissões e comitês da memória e verdade, que foram fontes de informações,
fornecimento de documentos e contatos.

Continuaremos irmanados visando a JUSTIÇA e a REPARAÇÃO dos desmandos


conduzidos pelo estado policialesco a serviço das classes dominantes.

Investigação Final.indd 14 25/11/14 18:12


15

investigação operária

NOSSA APRESENTAÇÃO

“Estes revolucionários de uma outra época envelheceram, mas não parecem cansados. Não sabem o que quer
dizer a frivolidade. Sua moral é muda, mas não dá margem à ambigüidade. Ela já não entende mais o mundo. (...)
Quem os conhece fica espantado ao ver como são pouco indecisos e como carregam tão pouca amargura, muito
menos do que seus visitantes mais jovens. Eles não são melancólicos. Sua cortesia é proletária e a dignidade, de
pessoas que jamais capitularam. Não têm que agradecer a ninguém. Não foram “promovidos” por ninguém. Não
tomaram nada para si, nem consumiram bolsas de estudo. O bem-estar não lhes interessa. Tem a consciência
intacta. Não são tipos acabados: sua disposição física é extraordinária.(...) Não lamentam nada. Suas derrotas
não serviram para ensinar-lhes algo ruim. Sabe que cometeram erros, mas não voltam atrás. Os velhos homens
da revolução são mais fortes do que tudo que veio depois deles.”
(ENZENSBERGER, Hans Magnus. “O Curto Verão da Anarquia”. São Paulo: Companhia Das Letras, 1987)

Q uando fizemos o lançamento do Projeto


Memória da OSM-SP, em 30 de novembro
de 2007, usamos uma conhecida frase do
filósofo alemão Hegel:“a coruja de Minerva le-
tos do livro vão mostrar que pais, mães e filhos
da classe operária não se alimentam de PIBs,
tampouco se preocupam com altas ou baixas
da Bolsa de Valores. Querem tão somente res-
vanta só vôo com o cair do crepúsculo”. Só po- peito, dignidade e justiça. Esses são seus maio-
demos avaliar os fatos depois que eles aconte- res valores.
ceram. Desde então, nesses sete anos passados, Em maio de 1970, nosso companheiro Ola-
dezenas de companheiros e companheiras se vo Hanssen é preso, barbaramente torturado e
empenharam na tarefa de pesquisar documen- morto por agentes do DOPS. O então deputado
tos, ouvir relatos e colher depoimentos de tra- federal Franco Montoro denuncia essa violên-
balhadores e trabalhadoras perseguidos, pre- cia na Câmara Federal. A Comissão de Direi-
sos e torturados. tos da Organização dos Estados Americanos -
Esse trabalho exaustivo e demorado só veio OEA pede explicações ao Governo brasileiro.
comprovar aquilo que sabíamos há muito tempo: Amparado pelos EUA e com a mídia do seu
o objetivo de militares e empresários não visava lado, os militares deixam o assunto ser esque-
apenas o combate às organizações que enfrenta- cido. As reações à violência da ditadura ga-
vam a ditadura com armas nas mãos. Queriam nham força em 1975, nos protestos à tortura e
os trabalhadores de joelhos, sem condições de se morte de Vladimir Herzog. O Movimento do
contrapor à política de super exploração imposta Custo de Vida será outro ponto alto da revolta
já nos primeiros dias do golpe. popular contra o sistema dominante.
Conseguiram seus objetivos, principalmen- Toda essa efervescência na sociedade, nos
te depois do AI-5. O terror implantado nos movimentos de bairro em luta por creches, saú-
“anos de chumbo”, que pesou sobre os ombros de, transportes, que se conjugam com as greves
de toda a população, fez o país crescer a incrí- dos anos 70 e 80 levam finalmente à derrota da
veis taxas de 12, 13% do PIB ao ano! Os rela- ditadura.

Investigação Final.indd 15 25/11/14 18:12


16

investigação operária

Mas, a coruja terminou seu vôo? Já pode- os crimes, as violências, as corrupções que a di-
mos conhecer toda a História desse período de tadura cometeu em seus 20 anos de existência.
trevas? Ainda não. Mas isso não está ao nosso alcance, depende de
Este livro levanta o véu de uma parte som- decisões de altas esferas: Executivo, Legislati-
bria que estava encoberta: como os empresá- vo, Judiciário, comando das Forças Armadas.
rios se aliaram aos aparelhos de repressão para E eles só vão se mexer se houver pressão
vigiar, perseguir e prender trabalhadores. E muito forte de baixo. Quando milhões tiverem
depois, com suas “listas negras”, impedir que consciência da importância de conhecer o pas-
esses operários e operárias encontrassem em- sado, conseguiremos evitar que aqueles fantas-
prego para sua sobrevivência. A leitura de de- mas voltem a nos assombrar no futuro. Quando
poimentos, os documentos que foram encon- todos os véus tiverem sido levantados e toda a
trados, mostram a que ponto chegou o ódio de verdade surgir à tona, aí então a coruja de Mi-
empresários contra trabalhadores que só que- nerva terá terminado seu voo.
riam direitos para uma vida digna para eles e Este livro quer ser um vento favorável para
seus filhos. isso.
Outros véus precisam ser levantados, para a
sociedade brasileira conhecer em toda extensão O Conselho

Investigação Final.indd 16 25/11/14 18:12


17

investigação operária

O CONTINENTE TRABALHO

“S
e são excluídos certos momentos prodigio- próprio ou alheio, e não somente como uma uto-
sos e singulares que o destino nos coloca, pia, mas também no aqui e agora.
o amor ao próprio trabalho (que, por des- Como se aquele que sabe trabalhar fosse um
graça, é privilégio de poucos) constitui a maior servo, e como se, ao contrário, quem não trabalhar
aproximação concreta do que seja a felicidade ou trabalhasse mal, ou que não quisesse trabalhar,
na terra, porém esta é uma verdade que poucos fosse por essa mesma razão um homem livre.
conhecem. É tristemente verdade que muitos trabalhos
Esta região sem limites, a região da labuta, não são agradáveis, porém é muito prejudicial
do CURRO, do BOULOT, do JOB, enfim, do entrar no debate carregado de preconceitos e de
trabalho cotidiano, é menos conhecida que a ódio. Quem o faz se condena por toda a vida a
Antártida e, por um triste e misterioso fenôme- odiar não só o trabalho, mas também a si mesmo
no, acontece que os que mais falam dela, e com e ao mundo. Pode-se e deve-se lutar para que o
maior entusiasmo, são precisamente aqueles fruto do trabalho permaneça nas mãos de quem
que menos a percorreram. o realiza, e para que o trabalho como tal não seja
Para exaltar o trabalho, nas cerimônias ofi- apenas um puro penar; porém o amor, como tam-
ciais se mobiliza toda uma retórica insidiosa, ci- bém o ódio em relação à obra são um dado inter-
nicamente fundada nas considerações que um no, originário, que depende mais da história do in-
elogio ou uma medalha rendem mais e custam divíduo do que das estruturas produtivas em cujo
menos que uma melhora salarial. torvelinho se desenvolve o trabalho.”
Porém existe também uma retórica de sinal
contrário, não cínica mas profundamente estúpi- La llave estrella, de Primo Levi, Muchnik
da, que tende a denegri-lo, a pintá-lo como algo editores 2001 Barcelona, pgs 77 e 78.Tradução
vil, como se fosse possível prescindir do trabalho, Giuseppe La Barbera e Elias Stein.

Investigação Final.indd 17 25/11/14 18:12


Às mulheres e aos homens que lutaram conosco

Esse livro é nossa retribuição às centenas de trabalhadoras e


trabalhadores, na sua maioria metalúrgicos, que participaram das
diversas fases dessa reconstrução histórica.
Agradecemos também às muitas e aos muitos que, nunca
tendo trabalhado em fábricas, militaram na OSM-SP,
tanto ou até mais do que os metalúrgicos.
A elas e a eles é que são dirigidas essas memórias, porque são os
personagens reais dos feitos aqui narrados.
Nosso carinho especial é dirigido também aos que não
puderam estar até o fim desta jornada conosco para que
fossem homenageados em vida.
De nossa De nossa parte, faremos quantas horas extras forem
necessárias para terminar essa tarefa

Conselho Político

* Toda a condução do Projeto, assim como as decisões, são de responsabilidade coletiva dos membros do Conselho Político.

Investigação Final.indd 18 25/11/14 18:12


19

investigação operária

IntroduÇÃO

E
ssa obra é parte do esforço na cidade de São Paulo, capital do dos operários, não podia ser posta
coletivo do Projeto Memó- principal Estado industrial e uma em prática apenas pelos militares.
ria Oposição Sindical Meta- das maiores concentrações de tra- Para oprimir os trabalhadores
lúrgica de São Paulo de desven- balhadores do país. em praticamente todos os aspec-
dar a repressão sofrida pela classe A maior prova da existência tos do dia a dia, os militares con-
trabalhadora urbana. A questão dessa luta está no conteúdo fun- taram com a colaboração e com
aqui não é desvalorizar as violên- damental deste livro, que é de- o protagonismo dos patrões, das
cias sentidas por outros setores nunciar a engenharia repressiva elites civis da indústria metalúr-
das classes populares, sejam eles montada contra os trabalhadores gica de São Paulo. Ademais, essa
camponeses, povos indígenas, metalúrgicos de São Paulo pela perseguição total só seria exitosa
classe média. Cada parcela da so- Ditadura, em conjunto com a elite se a estrutura repressiva contasse
ciedade brasileira que se levantou econômica e em parceria com os com a participação de elementos
contra a Ditadura recebeu de volta interventores sindicais nomeados oriundos da própria classe traba-
sua carga de violações, de vigilân- pelos militares, também conheci- lhadora, o que ocorreu com a in-
cia e perseguições, prisões, tortu- dos como pelegos. dicação dos interventores para a
ras e assassinatos. Novamente, ilustrar a repressão direção do Sindicato dos Metalúr-
Mesmo assim, existe um senso vivenciada pela classe trabalhado- gicos de São Paulo, já em 1964.
comum instalado na opinião pú- ra através do exemplo de uma ca- Em nossa investigação, foi
blica do país de que os trabalha- tegoria específica, a dos Metalúr- possível revelar os diversos me-
dores assistiram passivamente ao gicos de São Paulo, não implica canismos que comprovam essa
golpe e que sua mobilização con- em desvalorizar as lutas e os en- aproximação entre civis e milita-
tra o regime teria explodido ape- frentamentos protagonizados por res na perseguição aos trabalha-
nas em 1978, na região do ABC outros setores dos trabalhadores dores, bem como alguns episó-
paulista, quando o então metalúr- brasileiros. Pelo contrário, o que dios de violações que envolvem
gico Luiz Inácio Lula da Silva te- se pretende é utilizar esse estudo particularmente os metalúrgicos
ria liderado as primeiras grandes de caso para jogar luz na situação e militantes sindicais da cidade
greves no Brasil em uma década. vivida pelo conjunto dos setores de São Paulo. Embora focada nos
O intuito é, portanto, descons- das classes subalternas do país or- metalúrgicos, a pesquisa esbarrou
truir esse senso comum, demons- ganizados politicamente, situação em episódios envolvendo outras
trando que a luta dos trabalhado- essa pautada pela contradição en- categorias, e não apenas na cidade
res que explodiu em 1978 foi fruto tre resistência e repressão. de São Paulo.
e resultado de uma resistência Os trabalhadores e militan- A metodologia de trabalho
contínua e incansável de operá- tes sindicais metalúrgicos de São utilizada envolveu cerca de tre-
rios combativos. E mais, é preci- Paulo sofreram com a perseguição zentos metalúrgicos e militantes
so também não deixar dúvidas de política exercida nos locais de tra- reunidos em oficinas de memó-
que tanto essa resistência quanto balho, moradia e militância, com rias regionais e encontros centra-
as lutas de massa que explodem prisões, torturas e assassinatos. lizados, trazendo os participantes
em fins dos anos 1970 ocorreram Uma repressão desse tipo, que en- para um processo de trabalho co-
em outras regiões, principalmente volve todas as dimensões da vida letivo, onde foram priorizados os

Investigação Final.indd 19 25/11/14 18:12


20

investigação operária

testemunhos, seja pela via oral ou dos contra os trabalhadores apro- Organização
escrita, ao longo de dois anos. ximam as esferas civil e militar do livro
Este rico processo se consti- a partir da troca de informações
tuiu em uma inovadora forma de entre as empresas e o DOPS-SP, Com essa perspectiva, orga-
fazer pesquisa e elaborar o livro, bem como do financiamento e co- nizamos o livro. Após o primei-
na qual os trabalhadores, sujeitos laboração de empresários e suas ro capítulo, que busca reconstruir
do processo, não só deram entre- associações, para a estruturação e o contexto histórico e político no
vistas mas participaram, de dife- manutenção de órgãos de repres- qual o golpe militar ocorreu, dos
rentes maneiras, da construção são. Estes mecanismos de colabo- anos 1940 a 1960, o capítulo se-
do livro: levantando e analisando ração reforçam a trama formada guinte conta um pouco da histó-
documentos, escrevendo e discu- pelos militares e empresários para ria do Sindicato dos Metalúrgicos
tindo entre si as interpretações por eliminar qualquer tipo de movi- de São Paulo e dos militantes da
eles elaboradas. Ademais, todas mentação que fugisse às regras
Oposição Sindical Metalúrgica
as reuniões oficiais e os diversos impostas pelo regime de exceção.
de São Paulo (OSM-SP), que lu-
encontros estão registrados em ví- Contudo, não foram apenas
taram fora do sindicato quando a
deo e em fotografias. mecanismos sutis que atingiram
ditadura impôs os pelegos na di-
Foram realizadas pesquisas os trabalhadores. As prisões, tor-
reção. Finalmente, é no terceiro
nos arquivos pessoais dos meta- turas e até mesmo mortes também
capítulo que o corpo principal do
lúrgicos, bem como nos arqui- foram práticas comuns. Alguns
livro aparece, onde apresentamos
vos da resistência como o Cen- assassinatos exemplares seguem
tro de Documentação e Pesquisa sem esclarecimento. Especial- a engenharia repressora montada
Vergueiro (CPV) e o Projeto Me- mente, quatro mortes marcaram a por militares, patrões e pelegos,
mória da OSM-SP, Centro de Do- dinâmica de opressão política aos bem como as resistências e avan-
cumentação e Memória do Sindi- metalúrgicos de São Paulo: Ola- ços na luta dos metalúrgicos de
cato dos Metalúrgicos de Osasco e vo Hanssen, em 1970, Luiz Hirata São Paulo.
Região, Fundação Arquivo e Me- em 1971, Manoel Fiel Filho, em Passemos finalmente à leitura!
mória de Santos, Fundação Per- 1976, Santo Dias, em 1979. A luta é contínua!
seu Abramo, Fundação Maurício A intenção também é, portan-
Grabois, além do acervo do De- to, registrar a importância desses
partamento de Ordem Política e eventos trágicos do processo de
Social (DOPS) do Arquivo Públi- repressão e de resistência dos ope- Nota: O livro apresenta os re-
co do Estado de São Paulo, o Cen- rários metalúrgicos de São Paulo à sultados do projeto Contemos
tro de Memória Sindical e o Cen- ditadura e ao controle dos patrões, a nossa história – Os mecanis-
tro de Documentação e Memória buscando demonstrar que a enge- mos de repressão e persegui-
da UNESP (CEDEM/UNESP). nharia de opressão e perseguição ção política durante a ditadura
Os mecanismos de demissão aos trabalhadores brasileiros, en- – Memória dos Trabalhadores
dos trabalhadores são sutis, nem volveu tentativas de destruição fí- metalúrgicos e militantes de
sempre rastreáveis, porém foram sica, psicológica e moral da classe São Paulo, selecionado em Edi-
eficientes, atingindo o trabalha- trabalhadora. Felizmente, como a tal Público do Projeto Marcas da
dor na sua única fonte de renda, história demonstrou, o resultado Memória da Comissão de Anistia
impedindo-o de vender a sua for- foi outro, e os trabalhadores se- em parceria com o Intercâmbio,
ça de trabalho. guiram resistindo, seguiram de- Informações, Estudos e Pesqui-
Concluímos que os mecanis- fendendo seus valores e seus mo- sas (IIEP).
mos de repressão política utiliza- dos de vida.

Investigação Final.indd 20 25/11/14 18:12


21

O processo de construção
da memória dos trabalhadores

O processo de construção
da memória dos trabalhadores

O
nosso objetivo nesse livro
não foi mostrar apenas os
mecanismos de perseguição
e repressão aos trabalhadores,
mas as resistências, lutas e vitó-
rias dos trabalhadores.
Os metalúrgicos foram e ain-
da são a maior categoria operária
na cidade. Mesmo com a eman-
cipação de Osasco e Guarulhos
no início dos anos 1960, os me-
talúrgicos formaram um contin-
gente de aproximadamente 400
mil trabalhadores nos anos 1970.
Em São Paulo, a característica
era a diversidade da produção (de
pregos a mísseis), com mais de 13
mil estabelecimentos, muitas fá-
bricas pequenas ou oficinas e uma
constelação de grandes empresas,
líderes em sua atividade e grandes
concentrações industriais: Leo-
poldina, Lapa de Baixo, Ilha do
Sapo, Socorro, corredor da Na-
ções Unidas, nomes pelos quais
os trabalhadores se referiam a es-
sas regiões industriais.
Uma eleição dos metalúrgi-
cos exigia a mobilização de mais
de 800 trabalhadores que deve-
riam, durante uma semana fal-
tar ao trabalho para fiscalizar o
processo. Isso quando conseguí-
amos o direito de fiscalizar. Em Revista sobre a história
da Comissão de Fábrica
1978, a eleição sindical foi anu- da Asama.
lada pelo procurador do Minis- O caderno em pdf está dsponível em www.iiep.org.br

tério do Trabalho que se dirige


aos pelegos com a famosa frase:

Investigação Final.indd 21 25/11/14 18:12


22

investigação operária

“Lamento pelos meus amigos”.


O ministro do Trabalho da dita-
dura, ignorando a não apuração e
as demandas judiciais, empossou
mais uma vez o Joaquinzão.
A Oposição, na construção de
suas ideias e referências, será mui-
to influenciada pela organização
da Oposição de Osasco que se ele-
ge para o Sindicato em 1967. O es-
tatuto da Comissão de Fábrica da
Cobrasma de Osasco será um nor-
te na luta pelas Comissões, e as li-
ções da Greve esmagada em 1968
serão valiosas para a organização
da Oposição nos anos 70, naqui- Lançamento do Projeto Memória da OSM-SP. Na mesa, Hélio
Bombardi, Chico Gordo, Aldo Escobar, Cleodon Silva,
lo que foi o chamado “exílio nas Sebastião Neto, Anízio Batista e Elias Stein.
fábricas”. A Comissão de Fábrica Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM/SP

da Asama, a mais representativa


do trabalho da Oposição, adota-
rá o estatuto da Cobrasma. Quan-
do irrompem as lutas de 1978, e
acontece a primeira greve geral de
categoria pós 68, centenas de me-
talúrgicos reivindicam e conquis-
tam as Comissões de Fábrica.

Luta dos
trabalhadores
pela preservação
da memória
Lançamento do Projeto
Memória da OSM-SP, 2007
A ideia de recuperar a memória Acervo IIEP/Projeto Memória
da OSM/SP
da Oposição vinha circulando há
anos. Em 2007, após várias reu-
niões, foi lançado oficialmente o
Projeto Memória da OSM-SP e,
finalmente, diversas iniciativas
foram tomadas para recuperar
e, em seguida, divulgar história
que se atreveu a ser chamada de
“Saga da Oposição”. É possível CD com imagens e vídeos
sim denominar uma “saga”, pois sobre a OSM-SP, 2007
Acervo IIEP/Projeto Memória
tivemos nossas grandes batalhas, da OSM/SP

Investigação Final.indd 22 25/11/14 18:12


23

O processo de construção
da memória dos trabalhadores

nossas vitórias e nossas derrotas.


Nossos feridos, demitidos, de-
sempregados pela sua luta e nos-
sos mortos. Nunca vamos esque-
cer Olavo Hanssen, Luiz Hirata,
Manoel Fiel Filho e Santo Dias.
Mas essa saga precisava ser co-
nhecida e divulgada. Era preciso
classificar, sistematizar e, sobre-
O livro em pdf está
disponível em tudo, divulgar o que fez a Oposi-
www.iiep.org.br ção. Divulgar, não para “colher
louros”, mas para as ideias e ideais
da Oposição sejam aproveitados
pelas novas gerações. É consenso
que hoje há uma crise do sindica-
lismo. Os 30 anos de neoliberalis-
mo e reestruturação produtiva das
últimas décadas provocaram enor-
me destruição nas fileiras das clas-
ses trabalhadoras. O sindicalismo
O livro em pdf está
disponível em se ressente enormemente destes
www.iiep.org.br ataques. Daí a importância de di-
Guia das
publicações
vulgar experiências, formas de re-
da OSM-SP, sistências e concepções que norte-
lançado em 2011 aram o trabalho da Oposição.
Acervo IIEP/Projeto
Memória da OSM/SP Vários passos foram dados
Todas as publicações
estão disponíveis em
nessa direção. Houve diversos
www.iiep.org.br encontros gerais reunindo, de
maneira ampla, companheiros
e companheiras que estão cons-
truindo essa Memória, com dife-
renças e sensibilidades distintas.
Em novembro de 2009, promo-
veu-se um grande encontro para
apresentar os resultados do Pro-
jeto em seus primeiros anos de
existência e os avanços na con-
solidação do arquivo do Projeto
Memória OSM-SP.
Em dezembro de 2010, ini-
Caderno sobre o
Projeto Memória ciamos a Campanha “Contemos
da OSM-SP nossa história”, junto com o lan-
lançado em 2009 çamento de dois livros. O primei-
Acervo IIEP/Projeto
Memória da OSM/SP ro foi a tese da educadora Maria

Investigação Final.indd 23 25/11/14 18:12


24

investigação operária

Oficina na Mooca. Associação


de Trabalhadores da Mooca,
Oficina na Região Sudeste. Casa de 06/08/2011.
Solidariedade, 23/07/2011. Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM/SP
Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM/SP

Oficina na Oeste.
Sindicato dos
Químicos Unificados
de Osasco e Região,
09/07/2011.
Acervo IIEP/Projeto
Memória da OSM/SP

Oficina na Sul. APEOESP – Subsede Santo


Amaro, 29/07/2011.
Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM/SP
Oficina da Leste. Espaço Lua Nova, 19/09/2011.
Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM/SP

Investigação Final.indd 24 25/11/14 18:12


25

O processo de construção
da memória dos trabalhadores

os trabalhadores metalúrgicos nas


antigas concentrações industriais,
nos chamados setores ou regiões
em que a OSM-SP se organizava
piqueteiros, cipeiros, militantes
clandestinos dos grupos de fábri-
ca, membros eleitos das Comis-
sões de Fábrica, os que ficaram
desempregados nas lutas, aque-
les que não se venderam aos pa-
trões. Conseguiu reunir a diversi-
dade do que foi o chamado apoio,
Lançamento da revista os que estavam fora das empresas
“Militantes de A a Z”. Memorial da Resistência, 15/10/2011.
Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM/SP e cumpriam funções essenciais
para a luta sobreviver e avançar.
O apelo foi correspondido e
compareceram dezenas e dezenas
de companheiras e companhei-
ros que orgulhosamente testemu-
nharam sua participação nas lutas
contra os pelegos, a estrutura sin-
dical e a repressão patronal imbri-
Campanha Salarial Unificada, 1985 cada nos aparatos de vigilância e
Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM/SP
repressão do Estado. Fizeram-se
presentes os camaradas de outras
Revista “Militantes de A a Z”.
categorias que foram de Oposição
Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM/SP Sindical, os que retomaram seu
sindicato e os que, como a OSM-
-SP “não ganharam”, mas conti-
nuaram na militância nos mais di-
versos espaços, vários em outras
categorias.
Nilde Mascellani “Uma pedago- 1970, sob sua coordenação pe- Em 15 de outubro de 2011,
gia para o trabalhador”, e, o outro, dagógica. Esses cursos resulta- como um dos primeiros resultados
“Confronto Operário. A Oposição ram na fundação da Escola Nova da Campanha “Contemos a nossa
Metalúrgica de São Paulo nas gre- Piratininga. Rosângela, “Rose” história”, foi lançada a revista “Os
ves e Comissões de Fábrica”, de Batistoni, foi ativa militante na militantes de A a Z”, com a foto de
Maria Rosângela Batistoni. OSM-SP e sua tese, “Entre a fá- todos aqueles que passaram pela
Maria Nilde teve convivência brica e o Sindicato: os dilemas da Oposição Metalúrgica. Os traba-
de décadas com a militância da Oposição Sindical Metalúrgica lhadores e suas famílias ocuparam
OSM-SP, que culminou nos pri- de São Paulo”, é um estudo refe- o Memorial da Resistência.
meiros cursos para formar pro- rencial sobre nossa história. Parte significativa de dirigen-
fissionalmente a militância me- A Campanha “Contemos nos- tes de sindicatos operários da
talúrgica, no final da década de sa história” se destinou a reunir Grande São Paulo teve militância

Investigação Final.indd 25 25/11/14 18:12


26

investigação operária

na OSM-SP. Com a emergência Questionário da


do sindicalismo classista no início “Investigação Operária”
Acervo IIEP/Projeto Memória da
dos anos 1980, terão participação OSM/SP

nas ASSOCIAÇÕES DE TRA-


BALHADORES, depois nas CUT
Zonais e, em 1985, na vitoriosa
Campanha Salarial Unificada da
cidade de São Paulo. Campanha
na qual irmanaram metalúrgicos,
vidreiros, borracheiros, químicos, Lançamento do projeto
plásticos, trabalhadores dos frigo- “Investigação Operária”.
Na mesa, Jorge Luís,
ríficos na maior mobilização ope- Salvador Pires, Anízio
rária depois da greve de 1953 e da Batista e Sebastião Neto
campanha pelo 13º nos anos 1960, - APEOESP, 24/03/2012.
Jesus Carlos
além de ser uma greve vitoriosa de Acervo IIEP/Projeto Memória
da OSM/SP
operários. Esse é o ambiente polí-
tico em que vicejava a Oposição
Metalúrgica.
A construção, a ferro e fogo,
da riqueza na cidade de São Paulo
tem muito a ver com os 400 mil
metalúrgicos que compunham a
maior categoria operária da Amé-
rica Latina, no fim dos anos 1970.
Reconstruir essa Memória é revi-
ver a participação e as formas de
luta, entre outras, na Siderúrgica
Aliperti, com 12 mortos em aci-
dentes de trabalho em três anos;
é o enfrentamento na Metal Leve,
onde a Oposição Metalúrgica
puxa uma greve de 25 dias, ele-
ge 11 dos 13 cipeiros e a empresa
os demite, sabendo que eles não
teriam o respaldo da diretoria do
Sindicato.
Os trabalhos de pesquisa e re-
gistro da memória dos militantes
permitiram perceber o quanto os
mecanismos de vigilância e re-
pressão atingiam a todos, no dia
a dia, dentro das fábricas e nos Apresentação do questionário durante o lançamento
bairros, e o quanto esse contro- do projeto. APEOESP, 24/03/2012.
Jesus Carlos
le permeava todas as categorias. Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM/SP

Investigação Final.indd 26 25/11/14 18:12


27

O processo de construção
da memória dos trabalhadores

Oficina da “Investigação Operária” na


região Sudeste. Casa da Solidariedade,
23/06/2012. Oficina da “Investigação Operária” na
Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM/SP
região Leste. Centro Pastoral São José,
11/08/2012.
Jesus Carlos
Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM/SP

Oficina da “Investigação Operária” Oficina da “Investigação Operária” na


na região Oeste/Norte. Sindicato dos região Sul. Sindicato dos Químicos –
Químicos – Subsede Lapa, 15/09/2012. Subsede Santo Amaro, 12/05/2012.
Jesus Carlos Ennio Brauns
Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM/SP Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM/SP

66ª Caravana da Anistia. Casos:


66ª Caravana da Anistia. Casos: Militantes da Militantes da Oposição Metalúrgica
Oposição Metalúrgica de São Paulo. Na mesa, de São Paulo. Memorial da Resistência,
Waldemar Rossi, Sebastião Neto, Luciana 08/12/2012.
Dias, Rita Sipahi, Sueli Bellato e Paulo Abrão. Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM/SP
Memorial da Resistência, 08/12/2012.
Ennio Brauns
Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM/SP

Investigação Final.indd 27 25/11/14 18:12


28

investigação operária

A partir dessa constatação ava- Vicente Garcia


liou-se que era preciso avançar e Ruiz, Sofia
Dias Batista,
desenvolver uma pesquisa mais Sueli Bossam e
abrangente com financiamen- Salvador Pires
to. Assim, em 2012 construímos da equipe de
pesquisadores.
um projeto destinado à investiga- Todo o
ção dos mecanismos de contro- trabalho
le e vigilância dos trabalhadores no acervo
APESP/DOPS foi
durante a ditadura civil militar. militante.
Com esse projeto concorremos Acervo IIEP/
Projeto Memória
no 2º Edital do Projeto Marcas da da OSM/SP
Memória, da Comissão de Anis-
tia, Ministério da Justiça e fomos
contemplados.
Teve início uma nova fase do
trabalho. Mantivemos a dispo-
sição de recuperar documentos,
conclamações, fotos, “mosqui-
tinhos” e “praguinhas” acumu-
ladas pelo tempo; mas fortalece-
mos a ideia de confrontar esses
documentos históricos com a voz
viva dos trabalhadores.
Para a reconstrução da his-
tória foi criada uma publicação
intitulada “Questionário Operá-
rio”, com perguntas sobre a per- Reunião do Conselho do Projeto
seguição aos trabalhadores nas “Investigação Operária”, 2014.
fábricas, colaboração de empre- Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM/SP

sários e/ou de membros do Sin-


dicato com a ditadura. O “Ques-
tionário Operário” foi usado nas
diversas oficinas e permitiu que
os metalúrgicos resgatassem e
registrassem individual e coleti-
vamente os episódios de repres-
são que muitas vezes eram trata-
dos como cotidianos.
As oficinas objetivaram a con-
solidação do livro com a partici-
pação direta dos trabalhadores.
Os encontros reuniram dezenas
Debate sobre a primeira versão do livro.
de participantes nas regiões Sul, Teatro Heleny Guariba, 04/05/2013.
Sudeste, Leste/Moóca e Oeste/ Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM/SP

Investigação Final.indd 28 25/11/14 18:12


29

O processo de construção
da memória dos trabalhadores

nas, permitiu uma pesquisa poste-


rior mais qualificada nos Centros
de Memória e Documentação, e
Arquivos Públicos. A busca e a
análise de toda documentação e
fotos ocorreram com a participa-
ção direta dos próprios trabalha-
dores perseguidos. Os membros
da Oposição pesquisaram no Ar-
quivo Público do Estado de São
Paulo, analisaram e separaram o
material usado para a recuperação
da memória da repressão, resistên-
Waldemar Rossi, Jorge Luís, Chico Gordo, Sebastião cia e luta.
Neto, Sueli Bellato e Vito Giannotti. Apresentação Foi criado um conselho do Pro-
dos primeiros resultados da “Investigação Operária”. jeto Memória da OSM-SP que se
Memorial da Resistência, 14/12/2013.
Jesus Carlos reunião mensalmente para acom-
Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM/SP
panhar o projeto. Esse conselho
participou da escrita dos textos,
leu e selecionou os documentos
históricos, acompanhou todos os
passos dados pelo Projeto.
Em 2013, uma versão do livro
foi levada à análise dos metalúr-
gicos. A oficina no Teatro Heleny
Guariba, no Centro de São Paulo,
reuniu mais de 30 pessoas para
uma leitura coletiva do texto.
Em dezembro do mesmo ano,
o trabalho até então desenvolvi-
Apresentação dos primeiros resultados da “Investigação
operária”. Memorial da Resistência, 14/12/2013. do e os documentos encontrados
Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM/SP que comprovavam a perseguição
contada pelos trabalhadores em
depoimentos foram apresenta-
dos aos militantes da Oposição
Norte. Houve dois grandes en- As informações coletadas tiveram em uma grande plenária no Me-
contros com todos os participan- o respaldo dos testemunhos dos morial da Resistência.
tes das oficinas regionais, um no militantes. Outro resultado dessas Percebemos, agora, imersos
início do projeto e o outro após oficinas, foi o movimento criado nesse processo, que estamos so-
todas as oficinas regionais. Todas entre os militantes para doação mente no começo da caminha-
as atividades ocorreram durante dos documentos guardados em da. Esperamos que os lutadores
2012. As reuniões por região fo- arquivos pessoais. tirem proveito de ver, ler, ouvir
ram filmadas e cada pessoa forne- O método de trabalho para co- e refletir sobre essa reconstrução
ceu os dados de sua participação. letar os dados, por meio de ofici- histórica.

Investigação Final.indd 29 25/11/14 18:13


Investigação Final.indd 30 25/11/14 18:13
A DITADURA
MILITAR DE
1964-1985

Investigação Final.indd 31 25/11/14 18:13


32

investigação operária

Investigação Final.indd 32 25/11/14 18:13


33

Capítulo 1
a DITaDuRa mILITaR DE 1964-1985

A DISPUTA ENTRE DOIS PROGRAMAS

aLÍPIO fREIRE

H
á 50 anos, na noite de 31 de O programa defendido pelo partir de uma cesta básica capaz
março de 1964, uma coluna presidente Goulart, anunciado de atender às reais necessidades
de blindados, caminhões, ji- publicamente no comício que re- de uma família de trabalhadores;
pes e grande contingente huma- alizou no dia 13 de março de 1964 a criação de uma central sindi-
no sob o comando do general frente à Estação Central do Bra- cal (até então proibida); ensino
Mourão Filho, deixa Minas Ge- sil (Rio de Janeiro), e que reuniu público, universal e gratuito em
rais rumo ao Rio. cerca de 200 mil pessoas, impli- todos os níveis; reforma política
Era o golpe. cava as chamadas Reformas de que garantia voto aos analfabetos
Base, que previam, entre outras e o direito de todo cidadão a ser
Chegávamos, assim, ao final medidas, a nacionalização dos candidato, além de tantas outras
de uma disputa – que se estendia setores estratégicos da nossa eco- medidas de interesse popular, vi-
há anos – entre dois programas nomia; reforma agrária; reforma sando o desenvolvimento de um
para o Brasil. urbana – com o controle dos alu- capitalismo nacional, cuja inde-
Um programa de desenvolvi- guéis; taxação das grandes for- pendência implicava também – e
mento nacional independente, tunas; controle das remessas de de modo indispensável – o direi-
fundado na distribuição de ren- lucro pelas empresas estrangei- to de escolher parceiros interna-
da – encabeçado pelo presidente ras para as sua sedes no exterior; cionais para as suas trocas, para
João Goulart – o Jango; e um pro- desenvolvimento da pesquisa e além daqueles “permitidos” por
grama de desenvolvimento na- tecnologia nacionais, o que vi- Washington e o grande capital
cional subordinado ao grande ca- sava o não pagamento de royal- internacional. Ou seja, negociar
pital internacional e à geopolítica ties ao capital internacional e o e manter laços econômicos, polí-
dos Estados Unidos, fundado na uso de tecnologias adequadas ao ticos e de amizade com os países
concentração de renda – defendi- nosso desenvolvimento social; socialistas e do Bloco dos Não-
do pelos golpistas. um salário mínimo calculado a -Alinhados.

Investigação Final.indd 33 25/11/14 18:13


34

investigação operária

Este programa envolvia dife- nia diferentes projetos. As ques- Adido Militar de Washington em
rentes projetos, partilhados pelos tões mais agudas que os unificava nosso país – senhor Vernon Wal-
trabalhistas (então representados era a defesa (que todos faziam) da ters, foi encarregado de articular
pelo Partido Trabalhista Brasi- subordinação absoluta dos inte- os militares brasileiros para o gol-
leiro – o PTB, partido do presi- resses do Brasil à geopolítica dos pe, e deu a palavra final para a in-
dente Goulart); por nacionalistas Estados Unidos e às estratégias dicação do marechal Humberto de
em geral; por setores da demo- do grande capital internacional, Alencar Castello Branco na con-
cracia-cristã; setores socialis- utilizando-se para isto da histeria dição de primeiro presidente do
tas; e mesmo pelo PCB – Partido anticomunista própria da guerra- novo regime, imposto pelo golpe.
Comunista Brasileiro, ainda que -fria e, junto com isto, promover O resultado de tudo isto, co-
este último mantivesse durante um desenvolvimento fundado na nhecemos muito bem: está em
todo o tempo uma postura am- mais dura concentração de rendas todas as dificuldades do Brasil
bígua com relação ao Governo. – na super exploração dos traba- que temos hoje. Para resumir,
Além dos partidos, o programa lhadores e do povo, o que impli- basta lembrarmos que – de acor-
de Reformas de Base encontra- cava, além do arrocho salarial, a do com o DIEESE – o salário mí-
va apoio no movimento sindi- perda de muitos direitos (sociais nimo atual (outubro de 2014), de
cal urbano e rural, nas entidades e políticos) já conquistados – ou R$ 724,00, para ter o mesmo po-
estudantis, e numa série de mo- em vias de serem conquistados – der de compra de uma cesta bá-
vimentos e organizações de tra- pela classe trabalhadora. Como sica semelhante àquela proposta
balhadores e do povo (povo = ex- apenas um dentre muitos exem- pelas Reformas de Base, deveria
plorados e oprimidos), além de plos, citamos a questão da estabi- ser de R$ 2.976,00.
setores nacionalistas e legalistas lidade no emprego. Os golpistas É importante lembrar que o
das Forças Armadas, e dos seto- tinham sua vanguarda política na presidente Goulart o único caso
res progressistas do capital na- UDN – União Democrática Na- em nossa história, de um presiden-
cional – a chamada burguesia na- cional (principal partido de direi- te que foi eleito duas vezes para o
cional progressista. O tamanho ta, entreguista e verdadeiro braço mesmo mandato. Explicamos:
e poder desse setor da burgue- político de Washington em nosso naquele então, o sistema eleitoral
sia minguaram desde o Governo país); o Partido Libertador (PL), brasileiro permitia que o cidadão
Juscelino Kubitscheck, quando os setores mais conservadores do votasse no presidente de uma cha-
muitos capitais nacionais, inves- Partido Social Democrata (PSD) pa, e no vice de outra. Assim, no
tidos em atividades subsidiárias e da Democracia Cristã; a mais pleito de outubro de 1960, o resul-
das grandes plantas industriais alta cúpula da Igreja Católica e o tado foi a eleição de Jânio Qua-
estrangeiras (sobretudo no setor Estado do Vaticano; as grandes dros, cabeça da chapa da direita
de autopeças e no setor quími- empresas internacionais que aqui mais conservadora (União Demo-
co-farmacêutico), acabaram por funcionavam e suas subsidiárias; crática Nacional, Partido Traba-
atrelar seus interesses àqueles do o latifúndio; a Escola Superior de lhista Nacional, Partido Liberta-
grande capital internacional. Guerra e seus discípulos; e o Go- dor, Partido Democrata Cristão e o
verno estadunidense e suas agên- Partido Republicano) e, para vice,
o programa dos golpis- cias de inteligência (CIA, FBI, o vice da outra chapa, encabeçada
tas, por sua vez, ia totalmente à etc.). Neste sentido, vale lembrar pelo marechal Henrique Teixeira
contramão do que propunham o que o embaixador dos EUA no Lott: João Goulart. A chapa Lott-
Governo Goulart e seus aliados. Brasil naquela ocasião, senhor -Goulart tinha o apoio do PTB e
Como as Reformas do presiden- Lincoln Gordon, além de diplo- do PSD, além de imensa popula-
te, o programa dos golpistas reu- mata era funcionário da CIA, e o ridade entre os trabalhadores e o

Investigação Final.indd 34 25/11/14 18:13


35

Capítulo 1
a DITaDuRa mILITaR DE 1964-1985

povo. militares nacionalistas e legalis- do golpe, mostra a grande adesão


No dia 25 de agosto de 1961, tas, e de amplos setores, o plebis- d@s brasileir@s às reformas e ao
porém, com menos de oito meses cito foi antecipado para janeiro Governo do presidente Goulart.
de Governo, o senhor Jânio Qua- de 1963. Esta pesquisa está disponível
dros, de repente, renuncia à Pre- A campanha pelo Presidencia- para consultas no AEL – Arqui-
sidência – na verdade, uma tenta- lismo tomou conta do Brasil, e o vo Edgard Leuenroth – Unicamp
tiva de golpe de Estado, que seria presidente João Goulart apresen- (Campinas-SP).
mal sucedida. Seu vice – João tou-se já com um programa de E, desde o primeiro dia do gol-
Goulart, na ocasião encontrava- reformas. Resultado: o sistema pe, militares e civis de direita, não
-se em visita à República Popu- Presidencialista venceu. E ven- hesitaram um só instante de lançar
lar da China, em missão designa- ceu com uma grande margem de mão dos mais torpes métodos para
da pelo próprio presidente Jânio votos. Naquele ano, os cidadãos perseguir e destruir seus adversá-
Quadros. Os três ministros mili- aptos a votar, somavam cerca de rios. E fizeram tudo isto com o res-
tares (Exército, Marinha e Aero- 18 milhões, dos quais, 12 milhões paldo, apoio e participação do Go-
náutica) formaram uma junta e, compareceram às urnas. O Presi- verno dos Estados Unidos e suas
juntamente com outros setores da dencialismo alcançou 9 457 448 agências de inteligência.
direta, tentaram impedir a volta votos, contra magros 2 073 082 dos Informações que circularam já
e posse do legítimo sucessor do favoráveis ao Parlamentarismo. no primeiro dia do golpe, davam
presidente demissionário o vice. É nesse sentido que podemos conta de que milhares de campo-
Houve até tentativas de derru- afirmar que o presidente Goulart neses – especialmente no Nor-
bar o avião em que viajava João foi eleito duas vezes para a deste – haviam sido fuzilados por
Goulart. Foram dias de grande Presidência da República. capangas dos latifúndios onde
tensão no país, que esteve à beira Apesar da grande vitória, a trabalhavam, e outro tanto joga-
de uma guerra civil. A resistên- conspiração da direita prosseguiu dos ainda com vida nas caldeiras
cia do Governador do Rio Gran- durante todo o Governo Goulart, das usinas. Hoje, os movimentos
de do Sul, do comandante do Ter- cujo desfecho seria o golpe. de Anistia, de Direitos Humanos
ceiro Exército, general Machado e Comissões da Verdade, buscam
Lopes, e dos movimentos e or- o uso da violÊnCia Como apurar essas denúncias.
ganizações de trabalhadores, do instrumento de chegada ao Caíam assim as trevas so-
povo, dos estudantes, no entanto, poder e para sua subseqüente bre um povo que até a véspera
garantiram a volta do vice. Sua manutenção e aplicação do seu sonhava construir outro País.
posse, no entanto, resultaria de programa, era consenso entre os Trevas que durariam 24 anos
uma “solução de compromisso”, golpistas. E não poderia ser di- e que, volta-e-meia, vemos que
segundo a qual, ele assumiria a ferente. Se lembrarmos da for- não foram dissipadas de todo.
Presidência, num sistema Parla- ça que garantiu a volta do ainda
mentarista. Uma cláusula porém vice João Goulart e sua posse em o perigo nos ronda a to-
estava posta: no início de 1965 – 1961; do resultado do plebiscito; do o momento. Nestas últimas
menos de um ano antes do final e de toda a mobilização popular eleições presidenciais (2014), as
do mandato do presidente Gou- a seu favor, certamente conclui- ameaças e violências foram cons-
lart, seria realizado um plebiscito remos que sem muita violência, tantes. Os inimigos de sempre, as
para saber se o país prosseguiria a direita jamais conseguiria em- ameaças de sempre. Porrada, gol-
sob o Parlamentarismo, ou volta- placar seus objetivos. Mais ain- pes, uma mídia obscena, mentiras
ria ao Presidencialismo. O fato é da: pesquisa do Instituto Ibope, e farsas.
que, por pressões inclusive dos realizada semana e meia antes Já antes e sempre, a criminali-

Investigação Final.indd 35 25/11/14 18:13


36

investigação operária

zação dos mais pobres, dos mais dividida em classes – está for- nosso terreno principal de dispu-
fracos – a presença do Estado nos matado sob a hegemonia da clas- ta de interesses de classe: ruas,
bairros populares se faz quase que se dominante, o grande capital. praças, avenidas, estradas e, so-
unicamente através das PMs, tro- Sim, foram seus representantes, bretudo, nossos locais de traba-
pas de choque, policiais e militares. a força majoritária na Constituin- lho, de moradia e outros espaços
Sem dúvida alguma, não te- te que deu à luz a Carta de 1988. que reúnam trabalhadores e de-
mos o Estado terrorista dos anos Ainda assim, emplacamos mui- mais camadas populares.
da ditadura – tanto assim, que tas conquistas. Sem organizações indepen-
nos permitimos escrever e pu- O problema é que, lutar ape- dentes e autônomas da classe tra-
blicar este texto, o que antes era nas no interior das instituições é balhadora e do povo, dificilmen-
impensável. Ou seja, muitas con- – como fica claro – escolher o ter- te seremos capazes de garantir as
quistas fizemos – e importantes, reno onde o inimigo é mais for- conquistas feitas, e menos ainda
e devemos zelar para não retro- te, como nosso principal (ou até avançar rumo a tanta coisa ainda
cedermos. Mas não dá para dizer exclusivo) campo de disputa, só a ser feita.
que está tudo bem. nos levará a derrotas e asfixia. Só seremos sujeito político, se
Não nos basta intervir nas ins- Sem em momento algum subes- formos um sujeito coletivo.
tâncias do Estado, uma vez que timar essa luta institucional, é in- E só seremos um sujeito cole-
este – como em toda sociedade dispensável que fortaleçamos o tivo, se estivermos organizados.
Vamos juntos.

Investigação Final.indd 36 25/11/14 18:13


37

Capítulo 1
A ditadura militar de 1964-1985

contexto político e
antecedentes históricos

E
ste livro narra a luta dos tra- ência democrática de massas no ta política. Os que tiraram Vargas
balhadores metalúrgicos de Brasil, revelam a dimensão da do poder não se conformam com
São Paulo contra a aliança en- disputa de projetos que dividia a a dinâmica da vida democrática.
tre militares, empresários e pele- sociedade brasileira. Tentam impedir a posse do pre-
gos para aumentar a exploração Desde pelo menos o suicídio sidente eleito, Juscelino Kubits-
do operariado brasileiro. É fun- de Getúlio Vargas, em 1954, as chek, e fazem as rebeliões milita-
damental, inicialmente, apresen- classes dominantes desejavam res de Jacareacanga e Aragarças.
tar a contextualização histórica atacar a democracia, com o obje- São anistiados, mas em 1961,
e política sobre o regime militar tivo de não perder o controle das com a renúncia de Jânio, ten-
instalado em 1964, que não sur- mudanças em curso no Brasil, tam impedir a posse do vice João
giu da noite para o dia, tampouco que se modernizava rapidamen- Goulart. A direita quer assumir
se deu como acaso ou fato sem te, com novas indústrias e cresci- o governo a partir de uma inter-
consequências. Pelo contrário, mento das cidades. Da década de venção militar. Dez anos depois
foi o resultado de uma soma de 30 ao final da década de 60, o Bra- do suicídio de Vargas, e de várias
conflitos políticos e sociais. sil deixa de ser um país esmaga- tentativas, o golpe deu certo.
A partir do final da Segunda doramente rural para ter mais de A ditadura consolidou uma
Guerra Mundial, em 1945, o ca- 60% da população nas cidades. modernização capitalista con-
pitalismo internacional busca- A partir da chamada “Revolução servadora, vinculada aos inte-
va articular, em conjunto com as de 30”, em que Getúlio Vargas resses do capital internacional,
elites brasileiras, um projeto para fica 15 anos no poder, passando sem nenhum aspecto democráti-
o Brasil. As sucessivas tentati- pelo fim da Segunda Guerra, e o co ou popular. Ela selou um ciclo
vas de golpe ensaiadas de 1954 a intervalo democrático até 1964, de disputas políticas que ocor-
1964, durante a primeira experi- o Brasil vive uma intensa dispu- riam no Brasil desde a década

Investigação Final.indd 37 25/11/14 18:13


38

investigação operária

de 1950, e que representavam a


contradição entre os interesses
das classes populares e os das
elites dominantes. Contradições
que se radicalizaram nos anos
1960, acompanhando o aumen-
to das tensões políticas em escala
mundial, e que opunham capita-
listas e comunistas.
O quadro da geopolítica inter-
nacional que surgiu do pós-Se-
gunda Guerra foi o da divisão do
mundo em dois grandes campos:
o capitalista, liderado pelos Esta-
dos Unidos, e o bloco comunis-
ta, protagonizado pela União das Protesto contra o bloqueio à Cuba.
Repúblicas Socialistas Soviéti- Rio de Janeiro/RJ, outubro de 1962. No cartaz:
cas (URSS). Passaram a disputar “Pela paz contra a guerra, exigimos o fim
do bloqueio norte-americano”.
cada pedaço do planeta, tentan- Apesp/Fundo Última Hora
do abranger mais países em sua
esfera de influência. Começava
a Guerra Fria, assim denomina-
da porque EUA e URSS estavam
em conflito permanente, mas não
era direto, ou “quente”.
Os EUA, já no século XIX,
consideravam a América Lati-
na o seu “quintal”, postura re-
forçada pela Guerra Fria. Não
admitiam perder o controle de
qualquer país da região, não im-
portasse o custo. Os poderosos
dos EUA deixavam claro que, se
preciso, atacariam a democracia
para fazer valer seus interesses.
Para agravar a situação de
conflito, em janeiro de 1959 um Protesto contra a invasão de Cuba.
grupo de revolucionários tomou Rio de Janeiro, abril de 1961. No cartaz:
“os operários navais com Fidel Castro”.
o poder em Cuba, ilha que fica a Apesp/Fundo Última Hora
apenas 165 km do território es-
tadunidense. Fidel Castro, Che
Guevara, Camilo Cienfuegos,
Raul Castro, entre outros, der-
rubaram uma ditadura alinhada

Investigação Final.indd 38 25/11/14 18:13


39

Capítulo 1
A ditadura militar de 1964-1985

aos EUA e iniciaram a constru- (PCB), como nós o conhecemos


ção de outro projeto de socieda- Países Não hoje, fundado como Partido Co-
de. Não demorou muito e a re- Alinhados munista do Brasil. Dois anos de-
volução cubana se proclamou O Movimento dos Países Não pois de sua fundação, o PCB se
socialista, com alinhamento di- Alinhados (MNA) foi criado em torna a seção brasileira da III In-
reto ao campo soviético. A rea- 1955 como mecanismo para ternacional Comunista. Em seu
ção dos EUA à ousadia do povo nações se posicionarem na geo- início, priorizou a organização da
cubano não tardou e, a partir de política internacional sem se fi- classe trabalhadora nos sindicatos
outubro de 1960, impuseram liarem ao campo capitalista, do- e a participação no Bloco Operá-
embargo econômico a Cuba, que minado pelos EUA, ou ao campo rio Camponês (BOC), frente elei-
dura até hoje. Com ele, proibiam socialista, liderado pela URSS. toral conduzida pelo PCB, no fi-
e ameaçavam qualquer empresa Inicialmente, foi composto por nal da década de 20.
ou país capitalista de negociar 25 nações, todas elas ex-colônias Em 1934, Luiz Carlos Prestes
com Cuba, sob pena de sofrerem europeias na Ásia e África. O ob- é aceito no partido e se torna o
sanções. Além disso, em agosto jetivo era reunir os países do ter- principal dirigente, até sua saí-
de 1959 os EUA apoiaram uma ceiro mundo, pois unidos teriam da, em 1982. Um ano depois, em
tentativa de invasão ao território mais força para resistir às pres- 1935, os comunistas passam a
cubano, orquestrada pela dita- sões das grandes potências. impulsionar a luta antifascista no
dura da República Dominicana. Brasil por meio da Aliança Na-
Em 1961, eles mesmos coman- cional Libertadora (ANL), mo-
daram um ataque contra a revo- vimento que teve significativa
lução cubana, no evento conhe- adesão operária e de setores das
cido como Invasão da Baía dos classes médias. No mesmo ano,
Porcos. Ambos os movimentos possibilidade de existência de um o PCB é colocado na ilegalidade
fracassaram e a revolução cuba- partido que representasse as aspi- por tentar tomar o poder contra o
na se consolidou. rações das classes trabalhadoras, governo Vargas, no episódio co-
A tensa situação mundial dos como foi o papel que jogou o Par- nhecido como Levante de 1935.
anos 1960 se refletia no Brasil. tido Comunista Brasileiro na re- Em 1945, o partido se consoli-
Com exceção de Cuba, os EUA democratização do pós-guerra e da como a maior força de esquer-
não perderam o controle de ne- na Assembleia Nacional Consti- da no Brasil, elegendo 14 depu-
nhuma outra nação na América tuinte de 1946. Em 1947, a justiça tados federais e um senador, Luiz
Latina, muito menos de um país brasileira cassou o registro legal Carlos Prestes – o senador pro-
estratégico como o Brasil: ainda do Partido Comunista Brasileiro porcionalmente mais votado até
que João Goulart não ameaçasse (PCB), alegando que se tratava aquele momento. Com a cassa-
entrar no bloco comunista, ten- não de um partido brasileiro, mas ção do partido, em 1947, sua sede
dia a aumentar o bloco dos países de seção brasileira do movimento é invadida, jornais fechados e os
não alinhados, criado em 1955 comunista soviético. mandatos dos parlamentares são
pela Índia, Indonésia e Egito. A Revolução Bolchevique na cassados até 1948. Além disso, a
As classes dominantes do Bra- Rússia, em 1917, e sua repercus- Confederação dos Trabalhadores
sil estavam em completa sintonia são no movimento operário brasi- do Brasil (CTB), central sindical
com o ambiente internacional, leiro, em contexto de greves gerais fundada por iniciativa do parti-
alimentando o sentimento antico- em São Paulo e no Rio de Janei- do, é proibida definitivamente
munista desde a redemocratiza- ro, levaram à fundação, em 1922, por meio do decreto do presiden-
ção em 1946. Não suportavam a do Partido Comunista Brasileiro te Dutra, em 7 de maio de 1947.

Investigação Final.indd 39 25/11/14 18:13


40

investigação operária

em curso uma revolução verme-


lha e denunciava a formação de
uma república sindicalista.
Esse conflito fundamental que
pautou a vida política brasileira
no século XX e que resultou no
golpe militar de 1964 se processa
entre capital e trabalho. Com fre-
quência, o esquema nacionalis-
mo versus imperialismo esconde
a contradição entre burguesia e
trabalhadores. Porém, como na-
cionalistas e entreguistas foram
os termos hegemônicos da dispu-
ta política nos anos 1950 e 1960,
deve-se narrar essa história fa-
zendo uso das categorias.
O chamado bloco nacionalis-
ta, ainda em formação, era com-
Bancada comunista, em 1946, que contava, entre outras,
posto pelas forças de esquerda
com figuras como Amazonas, Prestes, Gregório Bezerra, e progressistas. Dentro de uma
Jorge Amado e Carlos Marighella. pluralidade de setores, o PCB se
ACERVO CASMOB/IAP-CEDEM/UNESP
destacava. Mesmo na ilegalida-
de, era a principal organização de
esquerda do Brasil. Outro setor
relevante foi a esquerda do Parti-
No inicio do governo Juscelino três dos seus dirigentes foram do Trabalhista Brasileiro (PTB),
(1956), o partido altera seu nome chacinados. A redemocratização ala mais radical da agremiação
para Partido Comunista Brasileiro do País, a partir do início da dé- criada por Vargas em 1945, na
– PCB, para facilitar a sua legali- cada de 1980, permitiu a reorga- qual havia parlamentares, pre-
zação; e em 1962, uma dissidên- nização da esquerda brasileira, e sente no movimento sindical.
cia, liderada por João Amazonas com os comunistas não foi dife- O bloco agregava movimentos
e outros, funda o Partido Comu- rente. PCB e PCdoB se rearticu- populares e sindicais, pequenos
nista do Brasil – PCdoB, ficando laram com presença significativa grupos de esquerda, amplas par-
assim dois partidos comunistas: o nos movimentos sindical e estu- celas de intelectuais e estudantes,
PCB e o PCdoB, com linhas polí- dantil, convivendo com o surgi- empresários nacionais, a esquer-
ticas distintas. mento de outro partido político da da Igreja Católica e poucos
Ambos os partidos comunis- de esquerda, o Partido dos Traba- segmentos militares.
tas foram perseguidos pela re- lhadores (PT), fundado em 1980. Do outro lado, estavam as for-
pressão. De 1973 a 1975, grande Nesse clima, a partir de 1963 as ças conservadoras e reacionárias,
parte da direção do PCB foi as- elites brasileiras afirmaram que o unidas na chamada frente entre-
sassinada pela repressão políti- País se encontrava em uma encru- guista: pregavam a abertura do
ca; o PCdoB foi vítima, em 1976, zilhada. A propaganda conserva- capitalismo brasileiro aos inte-
do Massacre da Lapa, quando dora dizia com alarde que estava resses internacionais, sobretudo

Investigação Final.indd 40 25/11/14 18:13


41

Capítulo 1
A ditadura militar de 1964-1985

Bancários em greve. Passeata após assembleia


no Automóvel Clube. Rio de Janeiro/RJ, 1963.
ACERVO APESP/FUNDO ÚLTIMA HORA

dos EUA. Mais organizadas, com no Brasil, de intensa industriali- lário e salário-família. Em 1962,
recursos muito superiores e forte zação e urbanização. surge o Comando Geral dos Tra-
apoio estrangeiro, reuniam gran- A polarização entre os dois balhadores (CGT), semelhante a
des negócios modernos (bancos, blocos representou uma disputa uma central sindical (ver box p. 8).
indústrias, redes comerciais), a de quase duas décadas. De 1945 É preciso destacar que a partir
velha oligarquia agrária, grupos a 1964 houve intensa discussão de 1955 até o momento do golpe
de ultradireita, oficialidade das sobre qual era o modelo político militar havia uma efervescência
Forças Armadas e hierarquia da econômico que o Brasil deveria cultural e política que favoreceu
Igreja Católica, além de significa- adotar. Durante 20 anos, ocorre- e mobilizou o bloco nacionalista.
tivo apoio da classe média e rela- ram centenas de greves, dezenas O futuro do País era discutido em
tiva presença nos meios operários. de congressos e conferências de praças públicas, fábricas, campo
As duas frentes eram uma res- operários e camponeses. A classe e universidades.
posta das diferentes classes so- operária conquistou aumentos sa- No início dos anos 1960, o
ciais à realidade que se formava lariais e benefícios, como 13º sa- chamado bloco nacionalista sin-

Investigação Final.indd 41 25/11/14 18:13


42

investigação operária

expressivos movimentos popula-


CGT res e dos trabalhadores.
O Comando Geral dos Trabalhadores (CGT) foi a principal tentativa por Eram cinco as principais re-
parte do sindicalismo brasileiro pré-golpe de 1964 de organizar uma cen- formas de base propostas pela
tral sindical nacional, cujo objetivo era orientar, dirigir e coordenar o mo- frente nacionalista na conjuntura
vimento sindical no Brasil. Foi criado em São Paulo, em 1962, durante o política que precedeu o golpe de
IV Congresso Sindical Nacional dos Trabalhadores, após a grande greve 1964: reforma agrária - preten-
geral daquele ano, quando 700 mil trabalhadores cruzaram os braços. O dia desapropriar os grandes lati-
CGT reunia vários sindicatos, federações e confederações, sendo as prin- fúndios improdutivos e distribuir
cipais bases os setores ferroviário, marítimo e portuário. Era dirigido pelo terras para a massa de campone-
PCB e ala esquerda do PTB. O Comando nunca foi reconhecido pelo Mi- ses pobres; reforma tributária
nistério do Trabalho, e acabou sendo desarticulado por ocasião do golpe - o objetivo era cobrar impostos
militar de 1964. mais altos da parcela mais rica
da população e taxar as remessas
de lucros das empresas multina-
cionais para o país de origem; re-
forma política - garantiria o di-
reito de voto para os analfabetos
e baixas patentes das Forças Ar-
madas; reforma urbana - resol-
veria o déficit habitacional das
grandes cidades sem recorrer ao
inchaço das favelas e periferias;
e, finalmente, a reforma univer-
sitária - acesso ao ensino supe-
rior seria democratizado, dei-
xando de ser privilégio dos mais
ricos e da classe média.
Raphael Martinelli e Clodesmidt Riani, membros da As reformas de base represen-
executiva do CGT em 64. São Paulo/SP, 2013.
Acervo IIEP/Projeto Memória OSM-SP tavam modernização e, sobretu-
do, democratização e diminuição
das injustiças históricas. Eram o
elemento mobilizador do desfe-
cho para ambos os lados da dis-
puta. A frente entreguista utili-
tetiza as propostas das “reformas cialista Brasileiro (PSB), Partido zou esse programa de reformas
de base”, pelas quais a esquerda Comunista do Brasil (PCdoB) e como “espantalho” para justifi-
brasileira lutava por transforma- Ação Popular (a AP, organização car o golpe, enquanto a frente na-
ções estruturais na sociedade. Era que agregava os militantes socia- cionalista ampliou a mobilização
liderado pelo PCB, conhecido listas oriundos do catolicismo, com os dizeres “reformas de base
como partidão, e composto por majoritária no movimento estu- na lei ou na marra”.
outros partidos e organizações, dantil, dirigindo a União Nacio- Na conjuntura radicalizada de
entre elas o Partido Trabalhis- nal dos Estudantes). A frente na- 1945 a 1964, os trabalhadores ti-
ta Brasileiro (PTB), Partido So- cionalista tinha a adesão dos mais veram relevante papel político

Investigação Final.indd 42 25/11/14 18:13


43

Capítulo 1
A ditadura militar de 1964-1985

A situação se altera somente a


partir de 1951, quando o ex-di-
tador Getúlio Vargas assumiu a
presidência, dessa vez pelo voto
popular. Vargas colocou em prá-
tica uma política nacionalista
que ia ao encontro das deman-
das dos movimentos populares.
A campanha do “Petróleo é Nos-
so”, que culminou na criação da
Petrobras em 1953, é o exemplo
mais conhecido da nova conjun-
tura política. A repressão política
aos comunistas e à esquerda em
geral se enfraqueceu, e o Minis-
tério do Trabalho deixou de usar
instrumentos como intervenção
sindical e atestado de bons ante-
Trabalhadores apoiam as Reformas de Base cedentes para controlar o movi-
e pressionam o governo Jango. Greve de
ferroviários na Leopoldina. Rio de Janeiro/RJ, 1963.
mento sindical, que voltou a fa-
Acervo pessoal Martinelli/IIEP zer greves com força renovada.
O governo Vargas termina com
seu suicídio em agosto de 1954,
após uma crise política que du-
rou o ano inteiro, primeiramente
com a decisão dele e de seu novo
e social. Nos primeiros anos da 1945). Por exemplo, somente em ministro do Trabalho, João Gou-
redemocratização pós-1945, o maio de 1945 os trabalhadores fi- lart, de aumentar o salário míni-
movimento sindical lutou para zeram 365 greves, nas quais con- mo em 100%, em seguida com a
desarticular as amarras da es- quistaram de 30% a 40% de au- tentativa de assassinato por parte
trutura sindical oficial. O sindi- mento salarial. de um segurança, próximo a Var-
calismo de esquerda apresentou As greves continuam explo- gas, do jornalista Carlos Lacer-
propostas, como fim do Estatu- dindo pelo Brasil, com diversas da, principal opositor, principal
to Padrão – que o Ministério do categorias promovendo parali- opositor do presidente. Os em-
Trabalho impunha às entidades sações. A luta dos trabalhadores presários e a alta hierarquia mi-
sindicais –, soberania das assem- se radicaliza. A direita e o bloco litar estavam incomodados com
bleias gerais dos trabalhadores entreguista não tardaram a rea- o aumento da mobilização dos
de cada categoria e fim da proibi- gir. Os comunistas são postos na trabalhadores e gradativamente
ção de organizações por local de ilegalidade. Os trabalhadores e o se afastam de Vargas, até que em
trabalho e de organizações sindi- movimento sindical sofrem com agosto ele se mata.
cais nacionais. A luta salarial e as repressão, prisões e intervenção Apesar da morte, não se alte-
greves retornaram à cena políti- nos sindicatos. A organização rou a situação política de mobi-
ca brasileira, após os anos de re- operária se reduz à clandestini- lização da esquerda, trabalhado-
pressão do Estado Novo (1937- dade nas fábricas. res e frente nacionalista. A partir

Investigação Final.indd 43 25/11/14 18:13


44

investigação operária

de 1955, as disputas políticas se


radicalizaram. Os trabalhadores
viviam inédita melhora no seu
padrão de vida, com ganhos sala-
riais reais, geração de emprego e
acesso a novos bens de consumo.
Na mesma medida em que os
operários intensificavam as gre-
ves, os estudantes ampliavam as
mobilizações e os camponeses
aumentavam a organização, a di-
reita e o bloco entreguista se ar-
ticulavam. O objetivo era barrar
o avanço democrático das forças
populares, sempre levantando a
possibilidade de um golpe de Es-
tado. A burguesia, setores da clas-
se média reacionária, elites mili- TRABALHADORES SE ORGANIzAM.
tares e clericais assistiam à nova FinaL do 3° ConGresso sindiCaL naCionaL.
conjuntura política com temor de ao Centro, CLodesmidt riani.
entre as prinCipais resoLuçÕes: reVisão
perder privilégios históricos, e do saLário-mÍnimo e deFesa do saLário móVeL
clamavam por uma solução que para aCompanHar a inFLação.
desse fim ao perigo comunista. rio de Janeiro/rJ, aGosto de 60.
aCerVo apesp/Fundo ÚLtima Hora
A principal tentativa de golpe
por parte da direita foi em 1961,
após a renúncia do presidente Jâ-
nio Quadros. O vice-presidente
João Goulart teve a posse amea-
çada por uma coalizão de empre-
sários, militares e políticos de di-
reita, ou seja, o bloco entreguista.
Após intensa negociação políti-
ca, João Goulart finalmente toma
posse, depois de aceitar reduzir
seus poderes com a adoção, pelo
Brasil, do regime parlamentarista.
Porém, se não fosse a grande
mobilização popular de resistên-
cia organizada pelo bloco nacio-
nalista, denominada Campanha
da Legalidade, certamente Gou-
lart não teria assumido a presidên-
CAMPANHA DA LEGALIDADE peLa posse
cia. Uma das marcas da campa- de JanGo. porto aLeGre/rs, setemBro de1961.
nha da legalidade foi a ameaça de aCerVo apesp/Fundo ÚLtima Hora

Investigação Final.indd 44 25/11/14 18:13


45

Capítulo 1
A ditadura militar de 1964-1985

de direita, como os da Guana-


bara (Carlos Lacerda), São Pau-
lo (Ademar de Barros) e Minas
Gerais (Magalhães Pinto). Ape-
sar disso, a greve foi vitoriosa.
Não apenas o presidente mudou
o ministério, como o Congresso
aprovou, pressionado pelos tra-
balhadores, a lei que instituiu o
13º salário.
Ao final do processo, comu-
nistas e trabalhistas de esquerda
criam o Comando Geral dos Tra-
balhadores (CGT) que, em outu-
bro de 1963, lideraria uma gre-
Greve dos Ferroviários nos anos 60.
Fortaleza/CE.
ve geral na cidade de São Paulo.
Acervo pessoal Martinelli/IIEP Pela primeira vez, 78 sindicatos
se unem em uma campanha sala-
rial unificada e exigem negocia-
ção direta com a Federação das
Indústrias – Fiesp. A reivindica-
ção era 100% de aumento.
resistência armada no Rio Gran- destruir definitivamente os mo- Durante seis dias, de 29 de
de do Sul, comandada pelo então vimentos populares e as redes outubro a 3 de novembro, 700
governador Leonel Brizola. No progressistas, mesmo que para mil trabalhadores param a cida-
processo, novamente emergiu o isso fosse imprescindível elimi- de; cerca de 2 mil trabalhadores
papel dos trabalhadores. Um dos nar a formalidade democrática presos pela polícia paulista, que
principais movimentos a favor da por algum tempo. havia feito curso com a polícia
posse foi a chamada Greve da Le- As greves, que já se intensifi- carioca após a repressão, na Gua-
galidade, greve geral que se tor- cavam desde os anos 1950, assu- nabara, contra a Greve da Legali-
nou nacional em distintas catego- mem caráter nacional, cada vez dade em 1961. Ao final, os traba-
rias, com adesão de milhares de mais politizado. Em julho de lhadores conseguem um acordo
trabalhadores. 1962, os comunistas e a esquerda de 80% para todos, o que atingia
Sem dúvida, a vitória da es- do trabalhismo, majoritários no diretamente os interesses da bur-
querda e da frente nacionalista movimento sindical, organizam guesia em seu coração industrial.
em 1961, com a posse de João uma grande greve geral nacional Foi a situação limite que im-
Goulart, foi o marco decisivo da pela derrubada do ministério de peliu a frente entreguista a bus-
polarização política brasileira João Goulart, considerado domi- car a solução definitiva para os
até 1964. As forças progressistas nado pela direita. conflitos políticos que se mani-
acreditavam que sua capacidade O movimento, que se dividiu festavam no Brasil desde a déca-
de mobilização havia chegado em duas grandes greves gerais, da de 1950. Os jornais de gran-
ao limite, sem possibilidades de com duração de alguns dias em de circulação são os principais
derrota. Já as forças reacionárias ambos os casos, foi duramente vetores da campanha da direita.
e a direita sabiam que era preciso reprimido pelos governadores O Globo e o Estado de S.Paulo,

Investigação Final.indd 45 25/11/14 18:13


46

investigação operária

entre outros, estimulavam a radi- João Goulart. Não apenas isso:


calização, anunciando a ameaça
Aliança para os EUA se prepararam para en-
comunista, clamando por uma o Progresso viar para a Baía da Guanabara a
intervenção que restaurasse a A Aliança para o Progresso foi 4ª Frota Marítima, com enorme
ordem no Brasil. a principal iniciativa de coope- capacidade bélica e um plano
Os empresários se reuniam ração internacional promovida concreto de invadir o território
com partidos de direita e mili- pelos Estados Unidos no territó- brasileiro caso o bloco naciona-
tares, e usavam os grandes jor- rio da América Latina. De 1961 a lista conseguisse organizar a re-
nais para denunciar o perigo do 1969, a Aliança para o Progresso sistência armada. O cenário não
sindicalismo tomar o poder nas investiu 20 bilhões de dólares se concretizou. O bloco entre-
fábricas. Os altos índices de de- oriundos dos EUA e de organis- guista conseguiu a adesão das
semprego e a inflação eram atri- mos internacionais. Seu objetivo principais forças organizadas do
buídos à agitação operária e co- declarado era conter o avanço País, pelo convencimento políti-
munista, que prejudicava os comunista na região e manter
co ou pelo medo.
negócios. Por fim, a articulação Enfim, o Brasil se tornou o la-
isolado o regime socialista de
da alta hierarquia da Igreja Cató- boratório de muitos outros gol-
Cuba.
lica com a frente entreguista foi pes militares que os EUA e as
fundamental para a radicalização burguesias de diversos países da
promovida pela direita. As mani- América do Sul organizaram de
festações de massa onduzidas ou 1964 a 1984. Seguiram num pro-
apoiadas pela organização cató- cesso de cooperação autoritária
lica Sociedade Brasileira de De- por meio de doação de alimen- que gerou a articulação dos apa-
fesa da Tradição, Família e Pro- tos, iniciativas assistencialistas, relhos repressivos de cada país,
priedade (TFP) foram decisivas de convênios com governos lo- com a coordenação permanente,
para montar a justificativa ideo- cais, mesmo em oposição a go- técnica e ideológica dos EUA. É
lógica imprescindível para o gol- vernos nacionais. Criava uma o caso da Operação Condor, na
pe de Estado. face simpática para o imperialis- qual Argentina, Brasil, Uruguai e
Em 1964, a reação ganhou e mo e fomentava grande propa- Paraguai se juntaram para perse-
o golpe militar ocorreu. A fren- ganda anticomunista, pautando guir conjuntamente seus oposi-
te entreguista tomou a iniciativa, na imprensa a Revolução Cuba- tores em toda a região.
estava mais organizada e unifica- na como exemplo negativo para A primeira iniciativa do golpe
da, com apoio direto dos EUA. A a região. No Brasil, penetraria foi imobilizar qualquer resistên-
presença dos norte-americanos principalmente no interior, nas cia possível. Os militares imedia-
na política brasileira era estrutu- áreas mais carentes, para difun- tamente atacaram as organizações
rada e disseminada; atuavam por dir essas ideias. populares e camponesas, além de
meio de vários organismos desde Documentos recentemente li- sindicatos. Centenas de sindicatos
antes do golpe. Dos mais conhe- berados provam que foi direto o tiveram a diretoria cassada e pre-
cidos, havia o Instituto Brasileiro envolvimento do governo norte- sa. Interventores foram nomeados
de Ação Democrática (IBAD) e -americano no processo do gol- e listas de militantes eram procu-
o Instituto de Pesquisas e Estu- pe militar de 1964. O embaixa- radas nas sedes, para vigiá-los e
dos Sociais (IPES). Outra grande dor estadunidense no Brasil, prendê-los. No campo, polícia e
ferramenta usada pelos EUA foi Lincoln Gordon, articulou com milícias dos proprietários busca-
a Aliança para o Progresso, que a CIA e elites brasileiras ações vam as lideranças camponesas
atuava em toda a América Latina de desestabilização do governo para prendê-las ou eliminá-las.

Investigação Final.indd 46 25/11/14 18:13


47

Capítulo 1
A ditadura militar de 1964-1985

Em alguns lugares, essa política


se traduziu em verdadeiros mas-
sacres. A sede da UNE foi ocupa-
da e destruída. Estudantes eram
expulsos das faculdades e milita-
res nacionalistas foram excluídos
das Forças Armadas.
A ditadura manteve uma fa-
chada democrática que alimenta-
va a ideia de que os militares fica-
riam pouco tempo no poder. Em
1965, os militares autorizaram
eleições diretas em dez Estados,
para governador, incluindo Rio
de Janeiro e Minas Gerais, nos
quais venceram candidatos que
apoiaram o golpe, mas não iden-
Conflitos políticos provocados por tificados com a ditadura. O resul-
elementos do IBAD, na porta do Clube de tado foi a publicação, no mesmo
Engenharia, quando os
mesmo corriam listas contra as reformas de
ano, do Ato Institucional número
base. Março de 1964. 2, que extinguiu o pluripartida-
ACERVO APESP/FUNDO ÚLTIMA HORA
rismo e promoveu a intervenção
dos militares no Judiciário. Ain-
da assim, a ditadura manteve as
eleições gerais de 1966, que re-
novaram o Congresso Nacional
e um terço do Senado, já sob o
signo do bipartidarismo. Aque-
les que apoiavam o regime mi-
litar eram filiados à Aliança Re-
novadora Nacional (Arena), e os
opositores tolerados pelo regime
ingressavam no Movimento De-
mocrático Brasileiro (MDB).
A expectativa de novas elei-
ções presidenciais fez com que
ex-governadores golpistas rom-
pessem com a ditadura, entre eles
Ademar de Barros, Carlos La-
cerda e Magalhães Pinto. Porém,
não foi isso o que aconteceu, e,
Anos 60 - Protesto de trabalhadores para alguns golpistas, a carrei-
da construção civil desempregados.
ra terminou poucos anos depois,
Brasília, 20 março de 1964.
ACERVO APESP/FUNDO ÚLTIMA HORA cassados como os antigos adver-

Investigação Final.indd 47 25/11/14 18:13


48

investigação operária

A ditadura, além de intervir


nos sindicatos, eliminou a esta-
bilidade no emprego, a fim de
produzir um exército industrial
de reserva que permitisse a exe-
cução de uma política de arrocho
salarial, fundamental para o au-
mento dos lucros das empresas.
As duas iniciativas foram cen-
trais para a política econômica
da ditadura. Havia ainda a desar-
ticulação do sindicalismo com-
bativo, executado pela repressão
direta, com prisões, demissões
e intervenção nos sindicatos. A
nova política econômica e a re-
pressão garantiram os lucros aos
empresários e fizeram aumentar
a produtividade.
O novo regime autoritário or-
Manifestação massiva contra a ditadura em 68.
Intelectuais, religiosos e populares aderem ganizou um Estado altamente in-
ao protesto. Na foto: Fernando Sabino, tervencionista na economia, com
Antonio Calado, Eneida, Otavio Morais, fortes investimentos na constru-
Dias Gomes, Odete Lara e Clarice Lispector.
Rio de Janeiro/RJ, 16 de junho de 1968.
ção de uma infraestrutura (tele-
ACERVO APESP/FUNDO ÚLTIMA HORA comunicações, hidroelétricas, es-
tradas, portos) que servisse aos
interesses do grande capital – o
que era financiado por emprésti-
mos estrangeiros que multiplica-
ram a dívida externa do Brasil.
sários. O regime entrava em um deveria garantir a remessa dos lu- Por fim, a ditadura editou uma
caminho de consolidação: a di- cros extraordinários das multina- legislação amplamente permis-
tadura era um dos objetivos per- cionais instaladas no Brasil para siva de acesso das grandes mul-
manentes da revolução. Não era o país de origem, sem as limita- tinacionais ao mercado interno
intervenção curta, cirúrgica ou ções causadas pela mobilização e às riquezas naturais do País.
passageira. popular. Para isso, a nova equi- Criou uma nova Lei de Remessa
Os primeiros anos do golpe pe econômica – Roberto Campos de Lucros, sem qualquer obstá-
não foram apenas de repressão, à frente – precisava aumentar os culo ou exigência para as empre-
cassações, censura e proibições benefícios do capital estrangeiro sas estrangeiras aqui instaladas.
de todo tipo, mas de elaboração e diminuir os direitos dos traba- Nos primeiros anos da ditadu-
de uma política econômica que lhadores, de modo a fazer cres- ra, a nova política econômica não
superasse a situação de inflação e cer pesadamente os investimen- alterou a situação de crise econô-
recessão que o Brasil vivera nos tos externos na industrialização mica. O Brasil entrou em queda
anos 1960. A política econômica do País. livre; nada mais crescia, exceto

Investigação Final.indd 48 25/11/14 18:13


49

Capítulo 1
A ditadura militar de 1964-1985

o desemprego. Paralelamente, as
insatisfações populares aumenta- Greves de Em julho, houve a greve de
Osasco. Nela apareceram novas
vam e o ano de 1968 marca nova Contagem e
formas de organização, que dei-
encruzilhada. As manifestações Osasco xaram a direita assustada: surgem
de rua se intensificavam, com pas- as comissões de fábrica, ao lado da
Contagem é cidade próxima a
seatas de estudantes e adesão de conquista do Sindicato dos Meta-
Belo Horizonte e um dos principais
intelectuais e setores das clas- lúrgicos de Osasco pelos trabalha-
centros industriais do Estado. Em
ses médias. Multiplicavam-se os dores combativos, que derrotaram
março de 1968, 2 mil trabalhadores
protestos contra a política econô- os interventores no ano anterior. A
marcaram presença no ato contra
mica, censura e ditadura. As pas- greve de Osasco trouxe novos ti-
o aumento do custo de vida. Em
seatas cresciam durante o ano: pos de lutas, que marcaram o mo-
16 de abril do mesmo ano, a greve
20 mil, 50 mil, 100 mil pessoas vimento operário brasileiro; entre
explodiu e mais de mil operários da
nas ruas, cada vez mais radica- eles, a ocupação da fábrica e deten-
Belgo-Mineira cruzaram os braços,
lizadas. ção da diretoria dentro da empre-
exigindo 25% de aumento, contra
No meio do ano soou um sinal sa. Havia ainda a proximidade, em
os 10% “concedidos” pelos patrões.
de alarme, pois os trabalhadores Osasco, entre estudantes e operá-
A greve se expandiu, atingindo 20
mostraram que estavam em movi- rios. Diversas lideranças operárias
mil trabalhadores metalúrgicos. A
mento contra a ditadura, em atos eram estudantes secundaristas que
ditadura direcionou a Contagem
de oposição ao aumento do custo participavam, simultaneamente,
uma brutal repressão, com força
de vida e greves operárias, inicia- da organização sindical e da orga-
policial, prisões, intervenção no sin-
tivas rigorosamente proibidas. A nização estudantil, no Centro de
dicato, demissões sumárias e proi-
rebeldia chegava aonde mais in- Estudantes de Osasco – CEO. Mais
bição de aglomerações. O movi-
comodava o capital: a produção ainda: havia aqueles que participa-
mento resistiu poucos dias, e então
da riqueza. Primeiramente, houve vam de organizações políticas de
foi duramente reprimido.
greve em Contagem, Minas Ge- esquerda. Distintas correntes, sur-
Osasco é município vizinho à ca-
rais, e uma vã tentativa de abafar gidas no final da década de 1960,
pital paulista, faz parte da Grande
a sua propagação, haja vista que, criticavam a política nacionalista e
São Paulo e possuía nos anos 1960
em seguida, em Osasco, São Pau- conciliadora do PCB e buscavam
enorme concentração operária e
lo, surge um movimento ainda meios radicais de enfrentamento,
metalúrgica. A greve de 1968 foi
mais radical (ver box). como a guerrilha urbana e rural.
precedida pelo ato do 1º de Maio
A conjuntura política nacio- A greve de Osasco se transfor-
na Sé, promovido pelos sindicalis-
nal piorava para o regime e, além mou no ponto alto da luta operá-
tas interventores, com consenti-
disso, havia divisões no agrupa- ria em 1968. O movimento, que se
mento e presença do governador
mento conservador. Empresários inicia no dia 16 de julho, quando 3
Abreu Sodré, mas operários e mi-
e políticos próximos aos milita- mil operários ocupam a empresa
litantes de base se revoltaram con-
res manifestavam descontenta- Cobrasma, foi preparado durante
tra os pelegos que discursavam.
mento com a política econômica anos. Desde 1965, os trabalhado-
Primeiramente, com vaias e depois
recessiva. Organizações empre- res que faziam oposição aos inter-
atirando objetos, os trabalhado-
sariais criticavam cada vez mais ventores nomeados pela ditadura
res impediram a continuidade dos
fortemente a equipe econômica e organizaram uma Comissão de
discursos oficiais, mostrando a in-
parlamentares faziam ataques e Fábrica na Cobrasma. A Comissão
satisfação da classe trabalhadora
denuncias à ditadura. desenvolvia um trabalho cotidia-
contra o arrocho e o desemprego, e
Mas a evolução da crise foi no na empresa, passando em cada
enfrentando a violência policial.
mais rápida do que a organiza-
continua

Investigação Final.indd 49 25/11/14 18:13


50

investigação operária

seção, conversando com os ope-


rários sobre os problemas da ca-
tegoria, especialmente as perdas
salariais. Rapidamente a iniciativa
se alastrou para outras empresas
da região. Em 1967, o sindicalismo
combativo reconquista o sindicato
e elege uma diretoria jovem para
a gestão da entidade, composta,
entre outros, por José Ibrahim e
Zequinha Barreto.
Quando os operários ocuparam
a Cobrasma, não faziam parte de
um movimento “espontâneo” e
“surpreendente”, mas manifesta-
vam seu descontentamento com a
situação política brasileira. A expe-
Greve de OSASCO.
riência de democracia operária foi
Fábrica ocupada pelos trabalhadores.
Osasco/SP, 16 de julho de 1968. exercida na Comissão de Fábrica e,
Apesp/Fundo Última Hora ao mesmo tempo, na participação
no sindicato.
Os trabalhadores aderiram em
massa ao movimento, assustando
a ditadura e os patrões, diante da
possibilidade de se espalhar aque-
le exemplo de poder operário, que
ocupou uma empresa de destaque.
Sem qualquer negociação, os mi-
litares fizeram nova intervenção
no sindicato, cercaram a cidade
de Osasco com tanques e tropas e
prenderam as lideranças (cerca de
600 pessoas). Após três dias, a gre-
ve foi encerrada.
Quando, dez anos depois, em
1978, as grandes greves metalúr-
gicas do ABC paulista e da cidade
de São Paulo explodiram, todas as
lideranças combativas reivindica-
Greve de Contagem. vam a herança da greve de Osas-
Metalúrgicos da Belgo-Mineira, MG. Abril
de 1968. co de 1968, marco da democracia
Apesp/Fundo Última Hora operária no Brasil.

Investigação Final.indd 50 25/11/14 18:13


51

Capítulo 1
A ditadura militar de 1964-1985

ção popular e as correntes opo-


sicionistas. Não se consolidaram O “Milagre
as oposições internas ao regime, Econômico”
como a chamada Frente Ampla
O período de forte crescimento
dos ex-governadores cassados.
da economia (1969 a 1973, taxa mé-
As oposições antissistema, as or-
ganizações de esquerda, eram dia de 10% ao ano) ficou conhecido
extremamente reduzidas e des- como “Milagre Econômico Brasilei-
preparadas. A crise tomava dire- ro”. O processo de desenvolvimento
ção contrária àquela que esperava econômico capitalista, dirigido pelo
grande parte da esquerda: à reces- ministro Delfim Neto, que ocupou a
são se seguia uma recuperação, o pasta da Fazenda de 1967 a 1974 e,
chamado “Milagre Econômico”. depois, a pasta do Planejamento de
A política econômica da di- 1979 a 1985, foi possível somente por
tadura enfim dava resultados: uma articulação de iniciativas que jo-
os pesados investimentos exter- gou todo o peso do processo produti-
Década de 60:
nos levaram ao crescimento re- vo nas costas da classe trabalhadora. o país se industrializava,
corde do Produto Interno Bruto O primeiro elemento fundamen- mas as condições de
tal para o “Milagre” foi a repressão ao trabalho eram penosas.
(PIB), que aumentou em média Trabalhadores da
10% de 1968 a 1973, desempe- movimento sindical. Sem um sindica- construção civil. Rio de
nho que impressionou o mundo. lismo combativo reivindicando salá- Janeiro/RJ.
Apesp/Fundo Última Hora
Não resta dúvida de que as taxas rios, redução da jornada de trabalho e
de desenvolvimento econômico condições dignas nas fábricas, as altas
foram fundamentais para a dita- taxas de lucratividade das empresas
dura acalmar os setores descon- estavam garantidas. Para ilustrar o
tentes e consolidar sua hegemo- quadro, em 1971 não se registra greve sil. Além do controle do movimento
nia na sociedade (ver box). de trabalhadores no Brasil, o que não sindical, a ditadura aprovou uma lei
Não apenas o crescimento eco- ocorria desde os primeiros anos da de remessas de lucros totalmente fa-
nômico foi o instrumento usado ditadura do Estado Novo (1937-1945). vorável aos interesses estrangeiros.
pela ditadura para consolidar seu O segundo elemento fundamen- Mais ainda, executou grandes obras
domínio. No mesmo ano de 1968 tal do “Milagre Econômico” foi a en- de infraestrutura para escoar os pro-
começa a era mais dura do regi- trada no Brasil de imensas somas de dutos das empresas multinacionais,
me, período que vai do Ato Ins- capital estrangeiro. A maior parte do e a elas entregou abundantes maté-
titucional 5 à Lei de Anistia, de enorme investimento capitalista se rias-primas e recursos naturais.
1979. Do ponto de vista da dita- direcionou ao setor industrial, sobre- A desigualdade brutal na distribui-
dura e da grande política, a data tudo às empresas multinacionais. ção de renda cresceu, e o Brasil pas-
mais marcante é 13 de dezembro Houve a explosão da dívida externa sou a liderar os países mais desiguais
de 1968, com o AI-5, que fecha como principal consequência do aflu- do mundo. Para não promover a dis-
o Congresso, suspende as garan- xo de dinheiro internacional. tribuição da renda, Delfim Neto ar-
tias civis e instaura a censura. O terceiro elemento do “Milagre” gumentava que “era preciso primeiro
Símbolo da mudança radical, o foi o conjunto de facilidades ofereci- fazer o bolo crescer para depois dis-
golpe dentro golpe. do pelo Estado às grandes indústrias tribuir”. Os resultados sociais do “Mi-
Sob a ótica do movimento de
transnacionais que estavam no Bra- lagre” foram desastrosos e podem
resistência, entretanto, o 1º de
continua

Investigação Final.indd 51 25/11/14 18:13


52

investigação operária

ser verificados, por exemplo, no


escandaloso consumo de luxo que
se estabeleceu no Brasil. Ao lado
de amplos contingentes da popu-
lação que viviam na mais extrema
pobreza, havia os condomínios
sofisticados, carros importados e
roupas de grife.
Outro exemplo, tão trágico
quanto o anterior, foi o elevadís-
simo número de acidentes de tra-
balho durante a ditadura, especial-
mente no período do “Milagre”.
Uma das facilidades concedidas
pelo Estado às indústrias multina-
cionais foi a possibilidade de trans- O milagre econômico consolidou a indústria.
ferir, para o Brasil, as unidades ins- As condições de trabalho continuaram
taladas nos países ricos, máquinas deprimentes. Fábrica Hervy de metais
sanitárioS. Osasco/SP, 1979.
e equipamentos obsoletos. Objeti- Ricardo Alves
vamente, o que era lixo nos EUA e Acervo IIEP/Projeto Memória OSM-SP

na Europa aqui se tornava investi-


mento.
Contudo, não por acaso, as
máquinas estavam sendo descar-
tadas. Além do próprio desenvolvi- Maio de 1968 é a última gran- lhos de repressão contra os tra-
mento tecnológico capitalista, que de mobilização organizada pe- balhadores nas empresas, cam-
gera novos processos produtivos, los trabalhadores com razoável poneses nas fazendas, partidos,
os equipamentos rejeitados nas liberdade, obrigando pelegos e associações da sociedade civil e
matrizes eram velhos, com proble- governador a fugirem da Praça imprensa impedia as críticas de
mas de funcionamento de tal gra- da Sé. se espalharem pelo País. O truci-
vidade que ameaçavam a vida dos O final dos anos 1960 e prati- damento dos militantes que par-
trabalhadores que os operavam. A camente toda a década de 1970 ticiparam da luta armada contra a
classe trabalhadora infeliz literal- foram difíceis para a esquerda e ditadura mostra o nível de cruel-
mente sentiu na pele esses defei- para os trabalhadores. A ditadura dade do regime.
tos. Fomos durante muitos anos atingiu expressiva legitimidade Além disso, a ditadura apro-
campeões mundiais de acidentes graças ao “Milagre Econômico”, veitou o bom momento econômi-
de trabalho. Milhares de trabalha- ao mesmo tempo em que dissemi- co e o esmagamento da esquer-
dores perderam a vida nos 20 anos nou o medo e o terror com a bru- da e das organizações populares
de regime militar, outros milhares tal repressão que atingiu os opo- para difundir a ideologia de “Bra-
tiveram o corpo mutilado, em am- sitores do regime após o AI-5. Se sil Potência”, de que finalmen-
biente de perseguição ao movi- por um lado o crescimento eco- te chegaria a seu lugar de direito
mento sindical combativo que não nômico implicava melhora ime- entre as grandes nações. O País
podia lutar contra a situação. diata à vida cotidiana, por outro, do futuro enfim estava nascen-
a violência bárbara dos apare- do, e frases como “Brasil: ame-o

Investigação Final.indd 52 25/11/14 18:13


53

Capítulo 1
A ditadura militar de 1964-1985

ou deixe-o” sintetizavam o clima que se massificavam com rapi-


ufanista provocado pelos milita- dez na base das categorias, pois
res. Mesmo a Seleção Brasileira mesmo os trabalhadores alheios
de Futebol, que conquistou o tri- à situação política do País sen-
campeonato na Copa do Mundo tiam no bolso o peso do arrocho
de 1970, foi capturada pela pro- salarial. De 1975 a 1977, alguns
paganda ideológica do regime. sindicatos e as oposições sindi-
O grande império de mídia da cais começaram a se movimen-
família Marinho, as Organiza- tar reivindicando aumento de
Campanha da ditadura
ções Globo, consolidou-se nes- no auge do milagre. Cópia
salário maior do que aquele con-
se processo: a ditadura fornecia de um lema americano. cedido pela ditadura. As greves
condições para a expansão das dos metalúrgicos do ABC pau-
afiliadas da Rede Globo que, ao lista em 1978 e dos metalúrgi-
se interiorizar, difundia a ideolo- cos da capital paulista no mes-
gia triunfalista dos militares e do mo ano se difundem pelo Brasil
“Milagre Econômico”. e em outras categorias. São o re-
Apesar da determinação dos sultado do trabalho de prepara-
ção feito anos antes pelos ope-
militares de esmagar a oposição
rários combativos, presentes ou
ao regime, a resistência popular
não nos sindicatos.
não morreu. Custou caro ao re-
Novamente, os trabalhadores
gime o fim do “Milagre Econô-
se tornam protagonistas da vida
mico” em 1973, em decorrência
política brasileira, agora enga-
da crise internacional do capita- jados direta e massivamente na
lismo, que começou nesse ano luta pela redemocratização.
com a chamada Crise do Petró- Um elemento simbólico desse
leo, quando o preço do produto momento é a “comemoração” do
triplicou. A inflação voltou com primeiro ano da morte do dele-
ímpeto, piorando as condições gado-símbolo da repressão, das
Metalúrgicos de SBC
de vida das classes trabalhado- desencadearam as greves torturas e assassinatos, Sergio
ras. A ditadura, comprometida operárias de 1978. Paranhos Fleury. Reunida no fa-
em manter as altíssimas margens São Paulo/SP.
Tribuna Metalúrgica moso e emblemático estádio de
de lucro dos empresários, mani- Vila Euclides, em São Bernar-
pulava os índices de inflação e do, no ano de 79, a multidão de
determinava aumentos salariais operários, estudantes e populares
por decreto, que sempre implica- faz “um minuto de barulho” para
vam perdas salariais. Em outras “homenagear” o morto “ilustre”.
palavras, intensificava-se a polí- nador biônico, nomeado pelos Em breve, a ditadura também
tica do arrocho salarial. militares, que impedia a perda morreria.
A insatisfação das classes po- do controle do Parlamento. Pa- O ponto final da ditadura é
pulares não demorou a aparecer. ralelamente, os trabalhadores se simbólico. Ainda que a Lei de
Nas eleições de 1974 a Arena foi reorganizavam nos sindicatos e Anistia de 1979 seja um momen-
derrotada pelo MDB nas gran- empresas, apesar da repressão. to marcante, pois com ela os ba-
des cidades. A derrota eleitoral Um dos vetores da rearticulação nidos e cassados conquistaram o
forçou a criação da figura do se- foram as campanhas salariais, direito de retornar à sua pátria, a

Investigação Final.indd 53 25/11/14 18:13


54

investigação operária

data que melhor ilustra a reentra-


da dos trabalhadores na cena na-
cional é o 1º de Maio de 1980. Os
metalúrgicos em greve e o povo
ocupam a praça, em São Ber-
nardo do Campo, enfrentando a
proibição militar e o cerco de tro-
pas, cavalos, helicópteros e car-
ros de combate.
Outro elemento simbólico des-
se evento é a “comemoração” do
primeiro ano da morte do delega-
do-símbolo da repressão, das tor-
turas e assassinatos, Sergio Para-
nhos Fleury. Reunida no famoso e
emblemático estádio de Vila Eu- Apesar da direção da greve estar presa,
clides, em São Bernardo, a mul- 100 mil pessoas ocupam as ruas no meio do dia
tidão de operários, estudantes e e a repressão derrotada se retira.
SBC/SP, 1° de maio de 1980.
populares faz “um minuto de ba- Ricardo Alves
rulho” para “homenagear” o mor- Acervo IIEP/Projeto Memória OSM-SP

to “ilustre”. Em breve, a ditadura


também morreria.
O final dos anos 1970 e a déca-
da de 1980 se caracterizam pela
retomada das lutas operárias e
associação das lutas às mobili-
zações populares que ocorriam
nos bairros durante os anos 1970,
com reivindicações como direito
ao transporte, moradia e saúde,
e combate ao aumento do cus-
to de vida. Foi ainda um período
de reorganização do movimento
estudantil, avanço do movimen-
to sindical autônomo em todo o Trabalhadores enfrentam
Brasil e rearticulação do movi- firmemente e derrotam a repressão.
mento camponês pelo direito à SBC/SP, 1° de maio de 1980.
Ricardo Alves
terra e contra o latifúndio. Acervo IIEP/Projeto Memória OSM-SP

Houve consequências dire-


tas e históricas: reconstrução da
União Nacional dos Estudantes
(UNE), criação da primeira cen- nascimento do Movimento dos político de massas, organizado
tral sindical brasileira, a Central Trabalhadores Rurais Sem Terra por operários, o Partido dos Tra-
Única dos Trabalhadores (CUT), (MST) e fundação de um partido balhadores (PT).

Investigação Final.indd 54 25/11/14 18:13


55

Capítulo 1
A ditadura militar de 1964-1985

Obviamente nem tudo foram


FRENTE FRENTE flores. A direita se organizou para
NACIONALISTA ENTREGUISTA manter sua hegemonia em tem-
Política externa independente Política externa entreguista pos de democracia. A não realiza-
Relações diplomáticas com Cuba Alinhamento com os EUA, ruptura ção das eleições diretas em 1985
e URSS; ingressar no grupo dos de relações com Cuba e URSS. e a vitória de Fernando Collor de
países não alinhados. Melo contra Luiz Inácio Lula da
Silva em 1989, na primeira elei-
Política econômica nacionalista Política econômica pró-capital
ção presidencial desde 1960, são
Controle de lucros, nacionalização Legislação favorável ao capital
momentos-chave de manutenção
dos trustes (energia, petróleo, estrangeiro, permitindo
dos privilégios das classes domi-
minas), políticas de distribuição de monopólios, remessa de lucros,
nantes. Mesmo a Constituição de
renda, como impostos mais altos retirando os impostos dos mais
1988, intitulada Constituição Ci-
para os mais ricos e aumento ricos e desonerando os
dadã em decorrência dos direitos
salarial para os trabalhadores. investimentos externos. Forte
ali contidos, foi limitada pela for-
arrocho salarial para os
ça da burguesia e latifundiários.
trabalhadores.
O direito à terra não foi efetiva-
Política para o campo Política para o campo do, e a maior parte da estrutura
Reforma agrária, com divisão dos Modernização agrícola do sindical autoritária se manteve e,
latifúndios para os camponeses. latifúndio (quimificar, mecanizar). ainda hoje, impede a organização
de um movimento sindical autô-
Política urbana Política urbana
nomo no Brasil.
Lei do Inquilinato, reforma urbana Defesa da propriedade privada,
No período de redemocratiza-
para superar o déficit de moradia. concentração da riqueza e
ção a repressão aos trabalhadores
Distribuição da riqueza e serviços serviços nos bairros de elite.
nas fábricas permaneceu intensa,
pelas periferias.
especialmente contra a catego-
Liberdades civis Liberdades civis ria dos metalúrgicos. A associa-
Direito de voto para analfabetos, Proibição do voto para ção entre empresários, pelegos e
cabos, soldados e marinheiros. analfabetos, cabos, soldados e sistema repressivo renovou seus
marinheiros. instrumentos, adaptando-os ao
período do neoliberalismo, em
Política partidária Política partidária
que o desemprego e a reestrutu-
Liberdade partidária. Proibição do PCB.
ração produtiva desmontaram o
Política sindical Política sindical setor metalúrgico em São Paulo.
Liberdade sindical: direito à Proibição de organizações Antes de entrar no tema, é fun-
criação de centrais sindicais, fim sindicais horizontais e de base. damental entender a história re-
do atestado ideológico e liberdade Proibição de os sindicatos cente (a partir dos anos 1960) dos
para organização de base. fazerem política. operários do ramo metalúrgico na
capital paulista, como a repres-
Política social Política social
são atuou contra os trabalhado-
Forte investimento na saúde e Privatização da saúde e educação. res em geral e contra os metalúr-
educação públicas.
gicos em particular e, finalmente,
como se deu a organização da
Oposição Sindical Metalúrgica
de São Paulo (OSM-SP).

Investigação Final.indd 55 25/11/14 18:13


2

56

investigação operária

Investigação Final.indd 56 25/11/14 18:13


57

Capítulo 2
O SINDICaTO, a OPOSIçãO E aS ELEIçõES

O SINDICATO,
A OPOSIÇÃO
E AS ELEIÇÕES

Investigação Final.indd 57 25/11/14 18:13


58

investigação operária

Investigação Final.indd 58 25/11/14 18:13


59

Capítulo 2
O SINDICaTO, a OPOSIçãO E aS ELEIçõES

OS METALúRGICOS DE SÃO PAULO


ANTES E DEPOIS DE 1964
muRILO LEaL

1º DE MAIO DE 1980 no aBC. diriGentes da GreVe presos.


oposição reaFirma a deFesa da LiBerdade sindiCaL.
riCardo aLVes
aCerVo iiep/proJeto memória da osm-sp

O
processo da industrialização econômica, social e política de ramo industrial de importância
brasileira desenvolveu-se por grande relevo. estratégica. Socialmente, de todas
aproximadamente seis déca- Economicamente, o diversi- as categorias operárias, foram os
das, dos anos 30 aos anos 80 do ficado parque industrial meta- metalúrgicos os que promoveram
século passado. Neste decurso, do lúrgico de São Paulo abastecia a a “proletarização” do trabalhador
final da década de 1950 a meados indústria brasileira de peças, má- brasileiro de forma mais massiva,
dos anos 1980, os metalúrgicos de quinas, equipamentos, insumos, profunda e consequente, incorpo-
São Paulo cumpriram uma função configurando-se, portanto, como rando trabalhadores rurais, mi-

Investigação Final.indd 59 25/11/14 18:13


60

investigação operária

grantes, peões da construção civil, vos à organização das Comissões ca era constituída por jovens com
mulheres, jovens. Tratou-se de de Fábrica, ao piquete de greve, à idade entre 14 e 18 anos que, por
uma verdadeira “educação para a solidariedade operária. O Sindi- serem em sua maioria considera-
classe” e “para a modernidade”, cato mantém-se sob o controle da dos “aprendizes”, recebiam salá-
no tempo e com as feições da rea- burocracia, mas isto não impede rios 50% menores do que os adul-
lidade brasileira. Finalmente, po- que a Oposição tenha uma parti- tos. Cerca de 8% eram mulheres,
liticamente o movimento operá- cipação significativa na recons- que também recebiam salários
rio foi, cada vez mais fortemente trução do sindicalismo brasileiro mais baixos. Em 1958, 80,5% da
a partir de 1953, influenciado pela combativo e classista. categoria recebia no máximo 1,62
liderança do Sindicato dos Me- Em 1950, os metalúrgicos salários-mínimos mensais. Até o
talúrgicos de São Paulo. Essa in- eram 77.579 na cidade de São final dos anos 1950, as fábricas
fluência pode ser diferenciada em Paulo. Este número mais do que onde esse grande grupo humano
três períodos: dobrou em dez anos, chegando labutava ainda estavam concen-
- De 1953 a 1964: hegemonia a 160.950 em 1960. Vivia-se o tradas nos velhos bairros operá-
dos socialistas e comunistas na di- tempo de um crescimento indus- rios: Brás Mooca, Belém, porém,
reção do Sindicato. Construção trial massivo, que iria prolongar- começavam a se espalhar cada
de Comissões de Fábrica, valori- -se até os anos 1980, e a indústria vez mais pelos quatro cantos da
zação dos delegados sindicais, or- metalúrgica liderava o processo, metrópole.
ganização de greves da categoria ultrapassando a têxtil em número Foi sob um processo de mobi-
e greves gerais, apoio político às de operários, estabelecimentos e lização contínuo de 1953 a 1964
reformas de base e aos projetos produção industrial. Esse cres- – tendo seus momentos culmi-
nacionalistas. O Sindicato desem- cimento deveu-se à nova fase da nantes nas greves dos 300 mil em
penhou função importante na or- industrialização brasileira im- 1953, dos 400 mil em 1957 e dos
ganização da classe operária e no pulsionada pelo Plano de Metas 700 mil em 1963 – que o sindica-
desenvolvimento de suas lutas. do Governo JK, que privilegiou a lismo metalúrgico definiu um per-
- De 1964 a 1978: tomada do produção de máquinas, bens du- fil político classista e combativo.
Sindicato pela burocracia ligada ráveis e veículos a motor. A aliança entre PSB e PCB na di-
ao Ministério do Trabalho, à di- Esses 160.950 metalúrgicos reção do Sindicato, representada
tadura civil/militar, ao sindicalis- estavam espalhados por 3.606 por Remo Forli e José de Araújo
mo norte-americano, aos Círcu- empresas, a maior parte deles Plácido, e a posterior conquista da
los Operários da Igreja Católica (82,4%) em empresas de porte pe- presidência por Afonso Delellis,
e ao empresariado. Delação dos queno e médio (até 49 emprega- do PCB, garantiram a orientação
delegados sindicais, fechamento dos). Vieram do interior do Esta- de classe. Não se tratava, porém,
de subsedes, bloqueio às greves do e também de outros Estados, de uma perspectiva revolucio-
e à solidariedade de classe, apoio principalmente Bahia, Minas Ge- nária ou de ruptura com o proje-
à ditadura. O Sindicato desempe- rais, Pernambuco e Alagoas. Em to nacional-desenvolvimentista,
nhou função importante na con- sua maioria, eram trabalhadores mas influenciar esse projeto com
tenção da classe, na desorganiza- semiespecializados, que apren- as pautas da classe operária.
ção das lutas, na liquidação das diam o ofício na prática, ensina- Em 12 de setembro de 1963,
lideranças. do por colegas de trabalho, ou o presidente do Sindicato dos
- De 1978 a 1987: a Oposição faziam cursos rápidos, de menos Metalúrgicos, Afonso Delellis e
Metalúrgica se fortalece, promo- de um ano de duração em escolas o vice, José de Araújo Plácido,
ve greves, organiza os trabalhado- técnicas. Quase 10% da força de foram presos por determinação
res, retoma e confere novos objeti- trabalho na indústria metalúrgi- do II Exército, sob a acusação

Investigação Final.indd 60 25/11/14 18:13


61

Capítulo 2
O SINDICaTO, a OPOSIçãO E aS ELEIçõES

de terem apoiado a rebelião dos de Arnaldo José França Mazzei sucesso, conquistar o Sindica-
sargentos deflagrada em Brasí- Nogueira, as características do to para seu projeto. Após 1964,
lia. Apenas em janeiro de 1964 setor metalúrgico no município aquela antiga oposição recebeu o
voltaram a assumir a direção do de São Paulo dificultaram a cons- Sindicato dos militares e o man-
Sindicato. Em abril de 1964, o trução da identidade de classe e teve como o bastião mais impor-
Sindicato dos Metalúrgicos so- da unidade de organização e de tante do projeto de moderniza-
freu intervenção, permanecendo ação dos metalúrgicos. A disper- ção conservadora da ditadura no
por dez dias ocupado por agen- são industrial em grande exten- meio operário brasileiro.
tes do DOPS. Foram demitidos são territorial, o equilíbrio entre A Oposição Sindical Metalúr-
advogados, médicos, auxiliares e pequenas e médias empresas, a gica do pós-1964, por sua vez,
funcionários. No dia 10 de abril, diversidade de padrões tecnoló- representou uma retomada e ao
tomou posse a Junta Intervento- gicos, de gestão e organização do mesmo tempo uma negação do
ra liderada pelo assessor jurídico trabalho são fatores que confe- sindicalismo combativo dos anos
da DRT, Breno de Oliveira Ma- riram diferenciação e heteroge- anteriores ao golpe. Retomada
chado, e em 1965 foram realiza- neidade aos metalúrgicos, difi- porque a experiência da organiza-
das eleições. Joaquim dos Santos cultando sua identidade de classe ção nas fábricas, dos piquetes, das
Andrade (Joaquinzão) tornou-se e ações unitárias (NOGUEIRA, greves, das assembleias massivas,
presidente, sendo eleito em cha- 1997, P. 63). O Sindicato, con- estava entranhada em militantes e
pa única e voltou a eleger-se su- duzido pela burocracia ministe- na memória do período anterior.
cessivamente até 1984. rialista, não cumpriu a função de Negação porque os sujeitos e os
Em 1967, a oposição metalúr- compensar estas determinações projetos políticos eram outros. Os
gica se organizou para concor- estruturais: ao contrário, seu pro- militantes ligados à Pastoral Ope-
rer às eleições, lançando a Cha- jeto assistencialista, autoritário e rária passarão a ter um peso im-
pa Verde, liderada por Waldemar desmobilizador alimentava-se e portante, e suas ideias, conheci-
Rossi. Também concorreu con- fortalecia-se com a dispersão e a mento e técnicas de organização
tra a Chapa Azul, de Joaquinzão, heterogeneidade da categoria. pela base influenciarão fortemen-
a Chapa Amarela, liderada por Pode-se afirmar que antes te os destinos do novo movimen-
Santo Rizzo. A Oposição Sindi- de 1964, o movimento operário to metalúrgico. A esquerda crítica
cal em 1967 era constituída por paulistano foi dirigido por uma ao PCB e ao nacionalismo tam-
uma tendência ligada à Pastoral articulação entre três categorias bém terá participação destacada,
Operária e à Juventude Operária principais: metalúrgicos, têxteis fortalecendo as concepções de in-
Católica, por grupos de esquer- e gráficos, cabendo aos primei- dependência de classe.
da, por sindicalistas contrários à ros um papel de liderança a par- A aliança entre governo mi-
diretoria do sindicato e sindica- tir de 1957, aproximadamente. litar e sindicalismo pelego blo-
listas ligados ao PCB. O Sindicato dos Metalúrgicos ti- queou uma organização e ação
Os metalúrgicos de São Pau- nha função ativa nessa constru- de classe mais decisiva por par-
lo mantiveram e até ampliaram ção, permanecendo, de 1953 a te dos metalúrgicos de São Pau-
sua presença no total do pessoal 1964, sob a direção de comunis- lo, mas não impediu que a oposi-
ocupado na indústria no municí- tas, socialistas e nacionalistas. ção ativasse um forte movimento
pio de São Paulo durante os anos Na oposição, os velhos “minis- que manteve toda uma cama-
de chumbo da ditadura. Em 1980 terialistas”, os católicos conser- da dos metalúrgicos ligados aos
eram 387.813 trabalhadores, re- vadores dos Círculos Operários, passos das mudanças políticas e
presentando 40% do pessoal os admiradores do sindicalismo da construção de um novo sindi-
ocupado. Como revela o estudo norte-americano tentavam, sem calismo nos anos 1970 e 1980.

Investigação Final.indd 61 25/11/14 18:13


62

investigação operária

O SINDICATO

ASSEMBLEIA durante CampanHa


saLariaL na porta do sindiCato dos
metaLÚrGiCos de são pauLo.
aCerVo unesp/Fundo oBoré

Investigação Final.indd 62 25/11/14 18:13


63

Capítulo 2
O SINDICaTO, a OPOSIçãO E aS ELEIçõES

A
ntes de 1964, o Sindica-
to dos Metalúrgicos de São
Paulo exercia intensa e sig-
nificativa liderança no operaria-
do paulistano. A partir dos anos
50, os metalúrgicos passaram a
ter papel de liderança, além de
exemplo de representatividade
e combatividade do movimento
sindical do principal polo indus-
trial brasileiro, até então exer-
cido por marceneiros, têxteis e
gráficos. Afonso Delellis, presi-
dente do Sindicato, cassado pelo
golpe militar em 1964, afirma-
va que “existiam 1600 delega-
dos sindicais metalúrgicos, com
cerca de 400 participando ativa-
mente das assembleias, da vida
do Sindicato”.
De 1951 a 1963, foram 12 gran-
des campanhas salariais organiza-
das pelo Sindicato dos Metalúrgi-
cos. Em sete delas (1951; 1953;
1954; 1957; 1960; 1962; 1963), as
lutas por melhores salários assu-
miram a forma de greves da cate-
goria. O Sindicato, ao lado de ou-
tras categorias, organizará quatro
greves gerais (1953; 1954; 1957;
1963). Em 1961, os metalúrgi-
cos cumpriram papel de destaque
JORNAL DO SINDICATO deFende CuBa e ConVoCa
na organização e mobilização da reunião reGuLar dos ConseLHos sindiCais de
Greve da Legalidade. empresa. dezemBro de 1963.
Nos 20 anos de intervalo entre aCerVo Centro de memória sindiCaL

a ditadura de Getúlio e a militar


de 64, a experiência dos traba-
lhadores brasileiros, mais espe-
cificamente dos metalúrgicos de
São Paulo, era sentir o despotis- trabalho nas fábricas ao sistema O tema jornada de trabalho
mo fabril pesar no dia a dia de escravista. Leis trabalhistas pou- merece destaque especial na re-
trabalho. O Sindicato dos Meta- co modificavam a situação, ape- construção do papel histórico que
lúrgicos comparava o regime de nas a disfarçavam. o Sindicato cumpriu nas lutas da

Investigação Final.indd 63 25/11/14 18:13


64

investigação operária

capital. O combate ao controle e


à disciplina de trabalho impostos
pelos patrões foi a principal luta
da categoria na década de 1950.
Essencialmente, a reclamação
dos trabalhadores é que os patrões
se valiam do chamado “princípio
da assiduidade”, que condiciona-
va o direito do descanso sema-
nal remunerado (“o pagamento
do domingo”) à presença do ope-
rário nos demais dias da sema-
na, não podendo atrasar minutos
na entrada do trabalho, ou faltar.
O princípio da assiduidade exis-
tia para restringir os direitos dos Entre 1978 e 1979 a Oposição protesta para ter direito de
trabalhadores, reduzir salários e falar nas Assembleias do Sindicato.
ARQUIVO: Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM-SP – Doação Pereirinha
justificar demissões. O Sindica-
to exigia que os direitos fossem
1978 – Aspecto
garantidos mesmo se o operário tradicional de
faltasse um dia de trabalho, desde assembleia no
que justificado. Sindicato, na Rua
do Carmo. Ao
Em junho de 1952, a luta con- centro Joaquim,
tra o princípio da assiduidade foi de um lado José
organizada no Rio de Janeiro, en- Maria e do outro
Malvezi.
tão Distrito Federal, reunindo 17 Acervo IIEP/Projeto
sindicatos. Rapidamente a cam- Memória da OSM-SP –
Doação Pereirinha
panha se espalhou pelo Brasil e
em São Paulo o movimento or-
ganizou cerca de 60 entidades.
O Sindicato dos Metalúrgicos
foi uma das lideranças do movi-
mento, que gerou várias greves foi promulgada, proibindo o uso a força dos metalúrgicos sendo
nas empresas e manifestações de da frequência dos operários para exemplo para outras categorias.
ruas do movimento sindical uni- restringir direitos trabalhistas. Os metalúrgicos eram, nos
ficado. O resultado foi a tramita- A consolidação do Sindicato anos 1960, e assim permanece-
ção de um projeto no Congresso como uma entidade respaldada ram durante a ditadura, setor in-
Nacional para acabar com a cláu- pelos trabalhadores e respeita- dustrial decisivo e estratégico
sula da assiduidade. Em cada da pelos patrões passou por es- para o capitalismo brasileiro. A
campanha salarial, os sindicatos sas lutas e a consolidação de um categoria entrará no século XXI
rejeitavam esse princípio nos di- grupo coeso de dirigentes com a com aproximadamente 200 mil
versos acordos coletivos dos me- eleição de Remo Forli como pre- trabalhadores.
talúrgicos e de outras categorias. sidente em 1953. Até o golpe, os A chamada indústria metalúr-
Em 1955, finalmente a nova lei empresários se depararam com gica engloba a produção siderúr-

Investigação Final.indd 64 25/11/14 18:13


65

Capítulo 2
O Sindicato, a Oposição e as eleições

gica, metalúrgica, mecânica e de


material eletro/eletrônico. Na ci- Um novo regime fabril:
dade de São Paulo, todos os tra- vigilância e controle
balhadores desses setores estão militarizados e superexploração
no mesmo Sindicato. da força de trabalho
Diversidade produtiva e pro-
dução estratégica para a indús- Os resultados da pesquisa bano periférico, articulação en-
tria nacional são os traços espe- realizada pela equipe organi- tre capitais privados nacionais,
cíficos e estratégicos da indústria zadora do projeto Investigação estrangeiros e estatais. Uma
metalúrgica da cidade de São Operária permitem-nos enxer- mudança radical, entretanto,
Paulo. Uma fortaleza, portanto, gar de perto não apenas a re- ocorreu no controle da força de
a ser defendida pelo capital. As pressão empresarial/militar no trabalho, na relação de forças
forças do capital e as classes do- cotidiano das fábricas paulistas entre direitos conquistados e
minantes tinham consciência de no período da ditadura, como deveres impostos. No período
que o centro nervoso do capita- também as engrenagens de um democrático de 1945 a 1964, as
lismo brasileiro não podia ter novo regime fabril. Já sabíamos fábricas de São Paulo podiam
“infecções subversivas”. que, no período em questão, as ser geridas de três formas: pa-
fábricas haviam promovido um ternalista, com a presença física
Oposição regime de “acumulação preda- ou simbólica do proprietário no
Metalúrgica tória”, nas palavras de Edmilson cotidiano e a dosagem de con-
Costa em “A política salarial no cessões e disciplina de acordo
Os militantes da Oposição Brasil”, com o pagamento da com critérios pessoais; tayloris-
sempre tiveram consciência des- força de trabalho abaixo de seu ta, com a formação de equipes
sa centralidade do ramo metalúr- valor. O resultado, no setor me- de engenheiros de produção, a
gico paulistano para o capitalis- talúrgico, foi que, entre 1966 e adoção de critérios “racionais”
mo brasileiro. Vito Giannotti fala
1974, o salário real médio man- de controle da produtividade e
que “São Paulo, do ponto de vis-
teve-se no mesmo patamar, ao a concessão de estímulos ma-
ta da indústria metalúrgica, era o
passo que a produtividade do teriais para os mais produtivos;
grande centro. Toda organização
trabalho cresceu 99%. A parti- ou “selvagem”, sem respeito
que se prezasse, que tivesse mi-
cipação dos salários no produ- a direitos, recurso geralmente
litante para deslocar, dizia: ‘Vai
to industrial era, no Brasil, das adotado por empresas menores
para São Paulo ser metalúrgi-
co’. Víamos três polos de poder mais baixas do mundo (17%). e menos preparadas para a con-
no Brasil: o primeiro, o governo Mas como foi possível obter ta- corrência. Com a ditadura mi-
central; o segundo, o Estado de manhas taxas de exploração? O litar as grandes empresas ado-
São Paulo (o governo do Estado que mudou dentro das fábricas taram um novo regime fabril,
de São Paulo com a Fiesp); e o depois de 1964? baseado na colaboração entre
terceiro, para nós, era o Sindica- As bases do novo ciclo de empresas, sindicatos comanda-
to dos Metalúrgicos de São Pau- crescimento industrial foram dos pelo Ministério do Trabalho
lo. Era ali que estava o cerne da semelhantes às do período e polícia política, resultando na
questão, que decidiria aonde iria nacional-desenvolvimentista: vigilância e controle militariza-
o sindicalismo brasileiro”. migração em massa para as do nas fábricas, na intensifica-
Waldemar Rossi destaca que regiões fabris, crescimento ur- ção da repressão à organização
em São Paulo se produzia tudo,
continua

Investigação Final.indd 65 25/11/14 18:13


66

investigação operária

e aos direitos e na superexplora- mais minuciosa que fosse. O período democrático de 1946-
ção da força de trabalho. tratamento dado pelas chefias, 1964, que assegurou os níveis
Cabe lembrar que a fabrica a posição da “chapeira” com os mais elevados do salário mínimo
“fordista” sempre foi um espaço cartões de ponto, mais próxima real em toda a história (apesar
de disputa, o “laboratório secre- do portão de entrada ou da se- de módicos, mesmo assim) e os
to da produção”, onde a jorna- ção do operário, a segurança e coeficientes de Gini de desigual-
da tem de render o máximo em a salubridade, os mecanismos dade social mais baixos, cons-
quantidade de horas e intensida- formais e informais de controle, tituindo o lastro efetivamente
de do trabalho realizado. Desen- todas estas características defi- popular do populismo, esta foi
volve-se diariamente um con- niam os regimes fabris “de fato”, a meta sócioeconômica mais
flito entre o poder disciplinador e foi isto o que mudou significa- importante visada pela ditadura
dos patrões, que se exerce pelas tivamente com o golpe de 1964. civil-militar. O novo regime fabril
chefias, e a resistência aberta Não que antes de 1964 o re- permitiu contabilizar as maiores
ou difusa dos operários, visando gime nas indústrias fosse de- taxas de mark-up do mundo à
impor limites à exploração e ao mocrático ou mais humano. A época, como demonstra Edmil-
despotismo, assegurar direitos extensão do poder patronal, son Costa no livro citado, e para
previstos em lei, inventar “novos dentro e fora do espaço da fá- tanto foi necessário, entre outras
direitos”, organizar-se, circular brica, porém, era, sem dúvida, coisas, prolongar brutalmente
no espaço da fábrica. A conquis- menor. As oficinas realizadas as jornadas de trabalho para 12
ta das leis trabalhistas, desde a pela Investigação Operária, com horas diárias em quase todas as
década de 1920, significou uma a apresentação de dezenas de fábricas de São Paulo, neutra-
primeira “invasão” do território depoimentos de metalúrgicos lizar reações ao incremento da
privado pelo princípio público, e metalúrgicas, foram funda- quantidade de mortos e mutila-
com a defesa do trabalhador por mentais para uma reconstitui- dos por acidentes de trabalho.
meio de garantias dadas pelo Es- ção detalhada das novas formas As páginas deste livro contri-
tado. As leis trabalhistas fizeram de controle social estabelecidas buem para aprofundar a visão
entrar na disputa entre patrões e após 1964, permitindo uma vi- que temos sobre os embates e
empregados um terceiro agen- são mais nítida e em profundida- antagonismos que se proces-
te, o Estado, mas não alteraram de do que foi, verdadeiramente, savam na ditadura civil-militar.
estruturalmente a natureza do a base sócioeconômica do novo Passamos da esfera da resistên-
conflito fabril. Tratava-se, agora, “bloco de poder”. cia política e cultural, onde vía-
de “interpretar” a lei, de “usá-la Pode-se concluir que, embora mos jovens guerrilheiros e ato-
a nosso favor”. Dirigentes ope- delatores, listas negras, repres- res libertários duelando contra
rários e patronais não podiam, são, aliança entre empresários e a repressão política e a censura,
depois da CLT, exercer suas fun- polícia fossem elementos pree- à esfera sócioeconômica, onde
ções sem a assessoria de um xistentes à ditadura civil/militar, encontramos operários resistin-
advogado, sem a formação, no sua articulação, capilarização, do a serem consumidos até a
caso dos operários, de grupos de militarização, produziram um última gota de energia vital pelo
base conhecedores das leis. Mas fenômeno novo, um novo re- apetite do capital protegido e
o conflito fabril ia muito além gime fabril. Quebrar a rede de associado ao autoritarismo dos
dos conteúdos que podiam ser organização operária constru- militares.
regulamentados pela lei, por ída passo a passo, dia a dia, no Murilo Leal

Investigação Final.indd 66 25/11/14 18:13


67

Capítulo 2
O Sindicato, a Oposição e as eleições

como máquinas, peças de reposi- ENOS Encontro


ção, peças de automóveis, peças Nacional das
Oposições
de avião e até tanques de guerra. Sindicais.
Durante a ditadura, o Sindica- Primeira
to dos Metalúrgicos se tornou ce- iniciativa
nacional
leiro de interventores e pelegos. para criar a
Mas, por seu poder irradiador e CUT. Orador
pela mobilidade de muitos ope- Stan Szermeta
ao seu lado
rários vítimas da rotatividade no Gushiken.
seu emprego, seria viveiro, ain- Antonina Silveira
Acervo IIEP/Projeto
da, de oposições sindicais e ex- Memória da OSM-SP
perimentos políticos inovadores.
Até mesmo pela descentraliza-
ção da categoria metalúrgica Campanha
no Cine
(milhares de empresas espalha- Roxy em 1979.
das por um grande território), os Oposição
operários que decidiram, por di- reage a
versos motivos, lutar pelos seus truculência
dos “Décio
direitos e contra os interesses do Malhos”.
capital, precisavam de alta dose Acervo IIEP/
Projeto Memória
de criatividade política. da OSM-SP
A OSM-SP foi a principal ex-
periência operária nesse período
no Brasil, por sua longa e com-
bativa trajetória, organizando os
trabalhadores nas fábricas e no
Sindicato contra a exploração, a
dominação e todas as formas de
repressão impostas pela ditadu- de trabalhadores. Eram os ope- Juventude Operária Católica. Es-
ra dos patrões. Sua luta se dirigia rários combativos, de diversas ses cristãos antecedem em mui-
contra a estrutura sindical e a dire- correntes políticas e ideológicas, to a “teologia de libertação”. Em
toria do Sindicato dos Metalúrgi- que não negavam a importância São Paulo a JOC, a ACO – Ação
cos, instrumentos do regime mili- das organizações e partidos, mas Católica Operária e as iniciativas
tar e cúmplices da classe patronal. se submetiam às regras do cole- do Movimento dos Trabalhadores
Pelo seu projeto político e tivo. Não era uma frente de ten- Cristãos estarão presentes no mo-
sindical, a Oposição se tornou a dências ou de grupo políticos. vimento operário antes do golpe.
referência da qual surgiram di- É possível afirmar que a OSM- Na área da Igreja Católica, são ad-
versas oposições sindicais entre -SP teve origem em três raízes. versários radicais das concepções
os trabalhadores da cidade e do Uma delas formada pelos tra- e práticas dos Círculos Operários
campo. Seu método foi o de in- balhadores que tomaram cons- Católicos, dominados pelas ideias
tenso investimento no trabalho ciência da luta sindical a partir de conciliação de classes. A JOC
de base e no poder de decisão da militância cristã de esquerda será um celeiro de quadros para
dos próprios trabalhadores, con- comprometida com o mundo do o movimento operário e também
figurando-se como uma frente trabalho, particularmente a JOC – para as organizações de esquerda.

Investigação Final.indd 67 25/11/14 18:13


68

investigação operária

A segunda fonte importante


A resiliente ser o interesse da nação defini-
da OSM-SP foram os militan-
estrutura do pelo próprio Estado. tes de organizações de esquerda
Nesse sentido, os sindicatos que lutavam contra a ditadura na
sindical passam a ser vinculados ao Es- clandestinidade. Se somaram na
brasileira: tado via Ministério do Trabalho. Oposição os que, por experiên-
não muda, Para viabilizar essa ligação, o cia ou formação, repudiavam a
não muda, Estado cria a unicidade sindical: visão gradualista e reformista do
não muda... cada categoria só pode ter um Partido Comunista. Tinham uma
sindicato em cada município profunda identidade com os cris-
Estrutura sindical é o nome ou aglomerado de municípios. tãos na crítica ao mandonismo e
dado, no Brasil, ao conjunto de Além disso, os sindicatos da ao cupulismo. Intuíam que sem a
leis, decretos e normas que re- mesma categoria são autori- participação da base seria impos-
gulam a prática sindical no País. zados a formar federações es- sível construir uma alternativa
Trata-se de um apanhado jurídi- taduais e confederações inte- operária consistente.
co que organiza a ação e limita restaduais, porém a criação de As oposições sindicais, em
o alcance dos sindicatos em ter- centrais sindicais que unifiquem especial a OSM-SP, representa-
mos geográficos e políticos. as categorias é proibida, bem vam convergência de forças no
A atual estrutura sindical bra- como as diversas formas de or- mundo dos trabalhadores. Os
sileira ganhou sua forma duran- ganização por local de trabalho. militantes viveram um “exílio”
te o primeiro mandato de Getú- O Ministério do Trabalho nas fábricas, bairros e nos pró-
lio Vargas, que assumiu o poder cria ainda um estatuto padrão prios sindicatos. Só contavam
no Brasil após a Revolução de para todas as entidades, de- com sua capacidade profissional
1930, permanecendo na presi- e não tinham nenhuma estrutura
terminando data das eleições,
dência até 1945. Nesses quinze por trás. Sabiam que o caminho
exigência do atestado de bons
era árduo e, embora respeitassem
anos, Vargas criou o Ministério antecedentes dos candidatos à
os que foram para a luta armada,
do Trabalho em 1930, por meio diretoria da entidade sindical, e
não se dispuseram a isso.
do qual sintetizou tanto o apa- pode até anular uma eleição ou
Nos anos 70, com as organiza-
rato legal que institui os direitos proibir a posse de alguns mem- ções armadas destruídas, muitos
trabalhistas previstos na Con- bros da diretoria. ex-presos políticos se integrarão
solidação das Leis Trabalhistas Atualmente, a maior parte não só à Oposição, mas também
(CLT), de 1943, quanto deu for- dessa estrutura sindical segue aos trabalhos de bairro. Metódi-
ma à estrutura sindical. vigente. Algumas mudanças cos, moleculares e participati-
O princípio que norteia a es- ocorreram como a permissão da vos. Uns aprendendo com os er-
trutura sindical desde Vargas é o existência de centrais sindicais ros dos outros. A simbiose entre
da colaboração entre o capital e e o fim do controle do ministé- as Oposições Sindicais e os mo-
o trabalho. É o que se denomi- rio sobre as eleições sindicais. vimentos populares que também
na ideologia corporativa, pela Pontos centrais, porém, perma- brotarão nos anos 70 foi constru-
qual o Estado assume o papel necem inalterados, como a proi- ída pacientemente por gente ca-
de coordenar a colaboração de bição de organização por locais lejada e pela afluência de traba-
patrões e empregados em prol de trabalho ou a pluralidade sin- lhadores que se rebelavam. Esses
do interesse maior, que vem a dical. militantes estarão presentes em
inúmeras iniciativas nos bairros.

Investigação Final.indd 68 25/11/14 18:13


69

Capítulo 2
O Sindicato, a Oposição e as eleições

Serão essenciais na organização Essa característica da OSM- zações clandestinas. Foram assas-
dos movimentos populares por -SP demonstra que foi uma ex- sinados em momentos diferentes:
saneamento, transporte, saúde, periência inovadora e única no Olavo Hanssen em 1970, Luiz Hi-
que marcarão a década de 80. movimento operário e sindical rata em 1971, Manoel Fiel Filho
A terceira fonte que alimentou brasileiro. O desafio para os mi- em 1976, e Santo Dias em 1979.
a militância da OSM-SP foram litantes da OSM-SP era construir As mortes foram eventos centrais
os trabalhadores que desperta- um organismo de intervenção na construção da resistência da so-
ram para a luta diretamente pela autônoma, com enraizamento de lidariedade e da energia militante
questão fabril ou sindical. Eram base nas fábricas, capaz de res- da Oposição Metalúrgica.
operários que tomaram consci- gatar e reelaborar princípios e Nos anos que vão da ressaca
ência da necessidade de se orga- orientações políticas inspiradas do AI-5, 13 dezembro de 1968,
nizar e combater o capital, a di- no pensamento e na experiência até a explosão de lutas em 1978,
tadura e seus aliados na direção do movimento revolucionário se consolida a organicidade da
sindical, a partir de problemas dos trabalhadores. OSM-SP, período muito fértil de
cotidianos na fábrica: vítimas de As teses e polêmicas sobre o discussões, enfrentamentos, de-
acidentes de trabalho; do ritmo caráter da revolução no Brasil, finições que serão influenciadas
da produção e do ambiente asfi- entre outras discussões dos gru- por uma pluralidade de referên-
xiante, das péssimas condições pos de esquerda, estavam pre- cias. Sempre com muita crítica
de trabalho, o não cumprimento sentes nas conversas da direção ao chamado socialismo real, a es-
de direitos previstos em lei. Os da Oposição Sindical Metalúrgi- trutura sindical e uma visão mui-
patrões se aproveitavam da situ- ca. Essas se combinavam com a to classista de não conciliar com
ação e escorchavam ao máximo. luta cotidiana contra a delação do as correntes políticas burguesas.
A prática da OSM-SP foi aglu- Sindicato dirigido pelos ex-in- Eram, por definição, militantes
tinar toda a pluralidade de grupos e terventores, contra a exploração do sindicalismo e revolucioná-
concepções de esquerda que exis- dos patrões, enfim, com a luta rios socialistas. Isso é válido in-
tiam na categoria metalúrgica, em para organizar a classe operária clusive para os de origem cristã.
consequência de seu método de para a luta contra o capitalismo. Parte desse processo de ela-
organização, amplamente demo- Na OSM-SP conviveram, ao borações rumo a uma concepção
crático. Havia trabalho de base longo dos anos, militantes de sindical própria foi alimentada
com operários que começavam a praticamente todas as organi- pela influência de diversos pro-
se unir às suas bandeiras, assem- zações de esquerda existentes. cessos de luta dos trabalhadores
bleias nas quais os trabalhadores Umas de forma mais fugaz, bus- que estavam ocorrendo na Euro-
decidiam todas as ações e inicia- cando fazer entrismo, outras não pa e na América Latina. A década
tivas do grupo: se defenderiam se submetendo à democracia in- de 1970 viu os operários italianos
uma greve, como participariam terna, ou se retirando para cons- criarem fortíssimas experiências
da campanha salarial, como mon- truir força própria na categoria, o de luta operária com ocupações
tariam uma chapa para as eleições que nenhuma conseguiu de ma- de fábrica, sobretudo com a cria-
sindicais ou qual seria o programa neira consistente. ção de organismos autônomos de
da chapa. Nenhuma organização Vivenciaram-se as consequ- luta, recuperando a tradição dos
conseguia ter força para direcio- ências mais trágicas do regime – Conselhos de Fábrica de Turim
nar e dirigir, isoladamente, a luta prisões, torturas e assassinatos. dos anos 1920. O exemplo italia-
dos trabalhadores metalúrgicos. Todos os quatro assassinados da no, suas lutas e suas discussões te-
Todos contribuíam e aceitavam as OSM-SP tinham ligações mais óricas, tiveram influência decisi-
contribuições alheias. ou menos orgânicas com organi- va nos seus debates e definições.

Investigação Final.indd 69 25/11/14 18:13


70

investigação operária

O mesmo se afirma da experi- Greve Geral


ência das Comissiones Obreras, de 1983. À
esquerda
as CCOO do Estado espanhol. Waldemar
Os enfrentamentos dos trabalha- Rossi. Na
dores espanhóis nos sindicatos faixa ao
fundo: “Fora
verticais do franquismo, a ma- Figueiredo”.
neira que 10 milhões de trabalha- Acervo IIEP/
Projeto Memória
dores pararam a França no maio da OSM-SP
de 68 permitiam vivas discus-
sões, assim como as iniciativas
de autogestão, como na fábrica
LIP, que encantou aqueles que ti-
nham uma visão autogestionária
do processo produtivo.
A influência mais próxima
foi a experiência do Chile com
o governo do socialista Salva- A onda de criação de Oposições sindical, se dará pela divergên-
dor Allende. Muitas lideranças Sindicais pelo Brasil adotará essa cia sobre como participariam os
da OSM-SP estudaram as lutas visão. Era um mantra: destruir a trabalhadores da base na CON-
da CUT chilena, em especial a estrutura sindical. É necessário CLAT (Conferência Nacional
formação, o desenvolvimento e lembrar que nos anos 80, quan- das Classes Trabalhadoras, em
os impasses dos Cordões Indus- do se discute criar a CUT, eram 1981, na Praia Grande) caso as
triais, pelos quais os operários poucos os dirigentes sindicais re- diretorias de seus sindicatos se
defenderam o governo popular conhecidos como defensores dos recusassem a participar. Seguirá
com armas, barricadas e, mais trabalhadores que estavam dentro na polêmica sobre o adiamento
importante, organizando a pro- da estrutura sindical. Eram pou- dos congressos para criar a CUT
dução e distribuição de produtos cos os nomes de expressão nacio- até, finalmente, ocorrer o desen-
essenciais à população, contra o nal reconhecidos como “sindica- lace quando o bloco autênticos
boicote organizado pela burgue- listas autênticos”: Olívio Dutra, mais oposições sindicais deci-
sia, que impedia a distribuição João Paulo Pires de Vasconcelos, dem fazer o maravilhoso Con-
de alimentos e paralisava a pro- Lula, Jacó Bittar, Wagner Benevi- gresso de fundação da CUT,
dução das empresas para produ- des, Abdias dos Santos. A estes se rompendo com o imobilismo do
zir o caos. juntaram centenas de sindicalistas outro bloco.
Circulava muita literatura da que eram lideranças locais, mas o Importante ressaltar o papel
esquerda do movimento comu- núcleo de dimensão nacional era dos sindicalistas do campo que
nista no mundo, como também muito reduzido. aderiram à ideia de criar a CUT.
de teóricos heréticos para a es- A ideia matriz da Oposição Eles também perderam a paci-
querda tradicional (leia-se PCB, de São Paulo será adotada pelas ência com o então presidente
PcdoB), como Rosa Luxembur- Oposições em todo o País e será da CONTAG, José Francisco. A
go, Gramsci, Bordiga, Trotsky e decisiva quando da fundação da primeira executiva da CUT terá
Pannekoek. CUT na definição de seus prin- dois trabalhadores rurais de sin-
Em 78, a Oposição transfor- cípios e estatuto. O rompimento dicatos de base, fora da estrutura
mou em viga-mestra a expressão com o chamado bloco pelego- confederativa. Avelino Ganzer,
“Oposição à estrutura sindical”. -reformista, aferrado à estrutura de Santarém, que sequer era da

Investigação Final.indd 70 25/11/14 18:13


71

Capítulo 2
O Sindicato, a Oposição e as eleições

Federação do Pará, e o histórico


José Gomes Novaes, um dos fun-
dadores da CONTAG e membro
da sua primeira executiva. Caiu
na clandestinidade em 64.
Comunista histórico, diri-
gente do PCdoB até 1976, quan- “Está crescendo no Brasil um movimento chamado
do sobrevive à Chacina da Lapa, Oposição Sindical. A finalidade desse movimento é
trazer o sindicato para seu verdadeiro sentido... Aqui
que dizimou o Comitê Central do em Santarém nós chamamos de CORRENTE SINDICAL” -
Partido. Tinha saído da casa jun- Jornal Lamparina – Informativo da Corrente Sindical
to com Elza Monerrat e o delator “LAVRADORES UNIDOS”. Nov. 79
Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM-SP
Jover Telles. Ele e Elza não foram
assassinados porque a repressão
não podia expor seu colaborador.
Essa figura lendária da mesma
estatura de outros fundadores da
CONTAG, como Lindolfo Silva e
Nestor Vera, volta ao cenário sin-
dical na Executiva da CUT Nacio-
nal como membro do Sindicato de
base de Vitória da Conquista.
1972 – Disputa
A presença de dois rurais de sem nenhuma
base profundamente ligados à democracia
corrente das Oposições Sindi- leva a reflexão
e ao exílio nas
cais diz muito da importância fábricas. Em 1978,
das Oposições na definição dos chapa voltou na
rumos do sindicalismo naquele crista da onda
das greves.
momento. Acervo IIEP/Projeto
Memória da OSM-SP

As eleições para
o Sindicato dos
Metalúrgicos de
São Paulo entre
1967 e 1993 grande onda de perseguições, tos Andrade, com mais de 50%
intervenções e prisões do golpe dos votos, numa eleição sem
Apesar de a OSM-SP se carac- tinha passado. O grupo da OSM- qualquer democracia, com os
terizar como um movimento que -SP resolveu arriscar. O maior aliados dos militares, todos ex-
priorizava o trabalho de base nas mérito dessa iniciativa foi rearti- -interventores, ditando todas as
fábricas, e não só a conquista do cular forças que estavam disper- regras do pleito. Mas a derro-
Sindicato, as eleições ajudam a re- sas, que combatiam a ditadura e ta não significou a desarticula-
construir a cronologia do sindica- sua política de arrocho salarial. ção da Oposição. Pelo contrá-
lismo metalúrgico de São Paulo. O resultado eleitoral confir- rio, após o primeiro pleito alguns
A primeira chapa montada mou a vitória dos interventores operários seguiram se reunindo
pela OSM-SP foi em 1967. A liderados por Joaquim dos San- para aprofundar suas concepções

Investigação Final.indd 71 25/11/14 18:13


72

investigação operária

e propostas políticas, que ainda tico. Não havia como acompa- com a chapa de oposição por-
apresentavam um grau genérico. nhar a eleição. Nessa época as di- que algum tempo antes a grande
As eleições seguintes ocor- retorias pelegas se preocupavam maioria do pessoal que iria com-
rem no ano de 1969 e nessa dis- em impedir o registro de chapas por a chapa de oposição contra o
puta a OSM-SP não monta uma de oposição e garantir o quórum Joaquinzão tinha sido presa. Na
chapa. Estavam cautelosos com para validar o processo eleitoral. época, se exigia atestado ideoló-
a repressão que recrudescia. Os O resultado do pleito era procla- gico para concorrer ao Sindica-
pelegos, por outro lado, começa- mado. Por sua parte, as eleições to. Obviamente quem tinha saído
vam a se consolidar, legitimados não motivavam os trabalhadores. da prisão encontrava um proble-
pelas eleições de 67 e se benefi- O resultado eleitoral não refletia ma, então não conseguimos fa-
ciando da recuperação econômi- o trabalho da Oposição. Era um zer a chapa de 1975. Mas nessa
ca do País que permitia negociar trabalho em condições dificíli- época começamos a fazer as ar-
algumas concessões aos traba- mas. O colégio eleitoral também ticulações entre as fábricas, para
lhadores. refletia as mudanças no Sindica- trocar experiências, pensar lutas
A ditadura militar muda o es- to e a relação com a base. comuns. A gente usava um mé-
tatuto dos sindicatos e o mandato Havia uma base de apoio dos todo que eu gostava muito, per-
das diretorias passa a ser de três pelegos nos sindicalizados que guntando para os companheiros
anos. A eleição seguinte só ocor- necessitavam dos serviços do como está sua fábrica, com quan-
rerá no ano de 1972. Sindicato. A OSM-SP avalia que tas pessoas conseguiu conversar,
A chapa de 1972 mostra clara- necessita fazer um trabalho mais que tipo de discussão vocês têm
mente as três raízes de militantes consistente na base, organizar lá dentro, que tipo de problemas,
da oposição: os de origem cristã, nos bairros e ter uma base orga- estão pensando em fazer alguma
militantes de organizações po- nizada nas fábricas. Esse traba- coisa? O início das reuniões In-
líticas e vanguarda das fábricas lho subterrâneo brotará em 1978. terfábricas coincide com o final
– sendo que uma caracterização Em 1975, não há chapa de opo- de 1974, 1975. Na Interfábrica
não exclui a outra. O programa sição. Um ano antes, em 1974, da Zona Sul, as pessoas de várias
da chapa já era mais consisten- dezenas dos principais militantes fábricas diferentes da região co-
te do que de 1967, refletindo os da OSM-SP tinham sido presos, meçam a sentar para discutir ex-
avanços da reflexão entre os mi- o que desarticulou o trabalho nas periências e elas tinham diferen-
litantes. Tinham se passado cin- fábricas. Elias Stein explica que tes níveis de experiência. Nosso
co anos desde o último enfren- “um militante fichado não podia trabalho começou a crescer”.
tamento eleitoral. O resultado disputar sindicatos. Era o chama-
divulgado foi de que a situação do atestado de bons anteceden- 1978. A virada
teve 70% dos votos. Para os tes, com frequência usado con-
membros da chapa de Oposição, tra a OSM-SP. Nessa situação de Em 78, o País assistirá à irrup-
estas eleições foram totalmente processados pela Lei de Segu- ção das lutas dos trabalhadores
fraudadas. rança Nacional, não podíamos no cenário político. Há uma epi-
Era o terror da era Médici, ha- concorrer em eleições sindicais. demia de greves no primeiro se-
via um silêncio pesado na socie- Por isso se resolveu não montar mestre em São Paulo, quando em
dade. Expor o nome numa chapa chapa de oposição em 1975”. centenas de fábricas os trabalha-
de Oposição não era arriscar pou- Hélio Bombardi relata a difi- dores paravam e queriam aumen-
co. Não havia acesso a nenhuma culdade de concorrer e o traba- to fora da campanha salarial, que
informação sobre as eleições. lho de articulação das Interfá- seria em outubro. Junto com as
Simplesmente um edital burocrá- bricas: “Não conseguimos sair greves, reivindicar Comissão de

Investigação Final.indd 72 25/11/14 18:13


73

Capítulo 2
O Sindicato, a Oposição e as eleições

A chapa da tral da sua concepção de demo-


onda das cracia sindical, pois significam
greves e
comissões não apenas uma organização por
de fábrica. local de trabalho, mas também
Encabeçada uma forma embrionária de poder
por Anízio
Batista da operário, pela qual os trabalha-
Toshiba, dores poderiam até mesmo as-
primeira sumir o controle da fábrica, uma
fábrica a
parar em São
vez que eles dominavam todo o
Paulo. processo produtivo.
Acervo IIEP/
Projeto Memória
As Comissões de Fábrica
da OSM-SP eram vistas como estruturas ho-
rizontais de poder. Retomava-
-se em São Paulo uma elabora-
ção semelhante à que orientou a
Comuna de Paris, os Soviets e os
Conselhos Operários. As leituras
das experiências internacionais e
a visão crítica generalizada sobre
como a esquerda se relacionou
com as forças burguesas antes do
Procurador golpe eram muito fortes entre os
Osvaldo
Preuss anula militantes de vanguarda.
as eleições A bandeira das Comissões
de 1978 por de Fábrica se tornaria uma mar-
fraude e diz:
“lamento
ca da OSM-SP e se espalharia
pelos meus pelo Brasil e por outras catego-
amigos...”. rias. A OSM-SP, pelo seu traba-
Acervo IIEP/
Projeto Memória lho cotidiano e real nas fábri-
da OSM-SP cas, tinha chances concretas de
vencer o pleito. Havia uma eu-
foria alimentada pelas lutas di-
rigidas por militantes da Oposi-
Fábrica se tornou um ato políti- ções em junho serão anuladas por ção. Anízio Batista, o candidato
co generalizado. Havia uma total fraude, mas, em seguida, o minis- a presidente, trabalhava na pri-
desconfiança com a diretoria do tro Arnaldo Prieto usa o poder nor- meira empresa a entrar em greve
Sindicato. mativo do Ministério do Trabalho em São Paulo, a Toshiba. San-
As eleições seriam no fim de e intervém nas eleições: empossa to Dias da Silva, conhecido pela
junho. A diretoria do Sindicato fi- a chapa situacionista. sua coerência e persistente tra-
cou atarantada. A OSM-SP mal ti- Havia já uma elaboração e balho de organização na base,
nha gente e estrutura para acom- uma cultura comum na Coorde- foi o candidato a vice.
panhar cada greve, mas, mesmo nação da Oposição de pensar e As eleições de 1978 são tam-
assim, São Paulo durante três me- defender a formação de Comis- bém as mais tumultuadas da his-
ses foi uma festa operária. As elei- sões de Fábrica como parte cen- tória do Sindicato. A diretoria do

Investigação Final.indd 73 25/11/14 18:13


74

investigação operária

Sindicato foi atropelada pelas


greves. Os trabalhadores reivin-
dicavam Comissões de Fábrica
e os patrões, para terem uma ga-
rantia jurídica, queriam que um
diretor do Sindicato assinasse os
acordos para encerrar as greves.
Os trabalhadores desconfiavam
ou repudiavam os diretores.
Essas eleições estão registra-
das no filme Braços Cruzados,
Máquinas Paradas. O pano de
fundo é dado pela irrupção dos
enfrentamentos populares e ope-
rários contra a ditadura, forçando
os limites da abertura que tentava
fazer uma transição pactuada pe- Na traição de 1979, Último orador da OSM-SP
las elites. No movimento popu- Joaquim recebeu uma no encerramento da greve
chuva de ovos jogados de 79, Vito GianNotti, tinha a
lar, irrompem várias iniciativas, pelos grevistas. condição de dialogar com
particularmente o “Movimento Acervo Oboré os piqueteiros. Na parede,
do Custo de Vida”, bem retratado a marca dos ovos jogados
em Joaquinzão.
no filme, mas o centro são as gre- Ennio Brauns
ves dos metalúrgicos da capital e
as eleições para o Sindicato.
O filme documenta as escara-
muças dos metalúrgicos com os
seguranças do Sindicato e com a
Polícia Civil para tentar fiscali-
zar as eleições, bloqueando a sa-
ída dos carros com as urnas, exi-
gindo a presença dos fiscais da
Oposição.
Quando chega a época da
Campanha Salarial em outu-
bro, a categoria estava ressabia-
da pela inoperância da diretoria
nas greves do primeiro semestre
e muito informada a respeito da
fraude das eleições. A Campanha
de 1979 contou com assembleias Rossi encabeça a chapa dos que
fizeram as lutas de 1978 e 1979. a
massivas, eleição de comandos Oposição sai dividida.
regionais de greve, eleição da Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM-SP

Comissão de Salários. Os meta-


lúrgicos de São Paulo fazem a

Investigação Final.indd 74 25/11/14 18:13


75

Capítulo 2
O Sindicato, a Oposição e as eleições

primeira greve geral de categoria


no País depois de 1968.

1981. Infelizmente
divididos

Em 1981, a oposição chega


forte e se sente em condições de
ganhar a disputa eleitoral do ano
de 1981. Encabeçada por Walde-
mar Rossi, dessa vez a OSM-SP
teve que disputar as eleições não
apenas contra os pelegos, mas
enfrentou a divisão com outra 1984 – A vitória nas fábricas não bastou para
chapa organizada basicamente derrotar a máquina assistencial. Hélio Bombardi
pelos militantes do PCdoB. encabeçou a chapa.
Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM-SP]
As chapas de oposição obti-
veram juntas mais votos do que
a chapa de situação. No segundo
turno, entretanto, os pelegos re-
verteram a situação e conquista-
ram mais um mandato. A votação
estável dos aposentados e a con-
fusão de duas chapas dão outro
mandato à diretoria. O PCB e o
MR-8 somam-se à chapa da situ-
ação. Parte do sentimento oposi-
cionista é diluído. Essas forças,
já em 1979, propõem como visão
estratégica entrar na diretoria e
disputar “por dentro”. 1984 – A chapa única teve o apoio do movimento
sindical Cutista.
Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM-SP
1984. A vitória nas
fábricas Joãozinho,
Geraldo, Hélio
e Anízio na
As eleições de 1984 ainda re- apuração da
presentam esse momento de auge eleição de 1984
das lutas de massas dos trabalha- comemoram
a vitória nas
dores brasileiros em geral e dos fábricas.
metalúrgicos em particular.Afinal, Acervo IIEP/Projeto
Memória da OSM-SP
elas ocorreram entre dois grandes
movimentos grevistas, a saber, a
greve geral de 1983 e a Campa-
nha Salarial Unificada de 1985.

Investigação Final.indd 75 25/11/14 18:13


76

investigação operária

A chapa única da CUT sai de Oposição


uma convenção encabeçada por enfrenta os
“Décio Malho”
Hélio Bombardi. A novidade é na chamada
que o PCdoB se desloca para “Batalha do
compor com a diretoria. A di- Carmo”.
Acervo OborÉ
vergência de fundo, além da tá-
tica, está em que os partidos co-
munistas defendiam a unicidade
sindical. A CUT, recém-fundada,
assume a bandeira da liberdade
sindical e proclama que a unida-
de não pode ser imposta por lei,
impedindo a livre organização Na “Batalha
do Carmo”
dos trabalhadores. a Oposição
O dado mais interessante do pela primeira
pleito de 1984 é o resultado final vez expulsa
da rua os
de votos com a separação por fá- bate-paus da
bricas, isto é, dos operários que diretoria.
estão de fato trabalhando, e o Acervo Oboré

voto na sede do Sindicato, feito


majoritariamente pelos aposen-
tados. A vitória da OSM-SP nas
empresas é incontestável, o que
dá uma dimensão da força viva
que era a Oposição na categoria
metalúrgica. Eis os números:

Votos 1º Turno
Chapa 1 Chapa 2 relações entre os resultados elei- a ditadura militar e para a Fiesp,
Situação Oposição torais e as lutas operárias daquele era importante demais para man-
Nas fábricas 15.106 16.737 período. “Ganhamos o Sindicato ter o sindicalismo brasileiro em
Na sede 7.410 2.178 em 1978 e foi anulada a eleição, um rumo. Mas nós queríamos dar
Total 22.516 18.915
aquele trambique total já comen- outro rumo e estávamos dando já
Votos 2º Turno
tado tantas vezes. Veio o minis- outro rumo, na luta cotidiana, no
Chapa 1 Chapa 2
tro Arnaldo Prieto para manter enfrentamento. Só por isso deu
Situação Oposição
Nas fábricas 14.546 17.320
o Sindicato na mão da ditadu- pra fazer frente à máquina sindi-
Na sede 7.916 2.168 ra. Ganhamos de novo em 1981, cal, ao apoio dos patrões, empre-
Total 22.462 19.348 quando vencemos as eleições sários e militares”.
nas fábricas. Dezenas de pessoas As greves e campanha sala-
Essas três eleições (1978, nossas foram feridas naquela ba- riais continuam ocorrendo, mas
1981 e 1984) marcaram o auge talha de 1984 para tentar ganhar em situação cada vez mais desfa-
do movimento combativo dos o Sindicato e simplesmente não vorável. É preciso registrar ain-
metalúrgicos. Vito Giannotti re- ganhamos porque aquele Sindi- da que a categoria começa a ser
sume esse processo a partir das cato era importante demais para atingida pela crise econômica e

Investigação Final.indd 76 25/11/14 18:13


77

Capítulo 2
O Sindicato, a Oposição e as eleições

“Batalha do direita, ocupando o lugar de Joa-


Carmo”. Em quinzão.
1984, a OSM-SP
dá um basta à A chapa da Oposição Sindi-
violência no cal, saída da convenção cutista,
Sindicato. não terá o apoio da CUT. Embo-
Acervo Oboré
ra Meneguelli tenha respeitado a
decisão da convenção, e de cor-
po presente feito campanha nas
fábricas, era uma figura isolada,
um apoio protocolar. A OSM-
-SP estava rifada, como diziam
os trabalhadores. Foi uma cam-
panha sem recursos e sem apoio
Oposição político. Lula, pressionado, tira
vence a
“Batalha do uma foto com Carlúcio, mas não
Carmo” e autoriza a divulgação. A chapa
alegremente de Bellentani terá o apoio ma-
ocupa a Rua
do Carmo.
terial dos Metalúrgicos de São
Acervo Obor Bernardo e da maioria da CUT.
A questão de fundo está na
disputa interna da CUT. A cha-
pa da OSM-SP, encabeçada por
Carlúcio, está ligada à tendên-
cia CUT PELA BASE, e a ou-
tra chapa, à corrente majoritária
da CUT. A unidade cutista, dian-
te do adversário comum, estava
despedaçada. A luta interna se
pela reestruturação produtiva. O mesa. A parte derrotada, encabe- sobrepunha à luta contra o sindi-
número de votantes diminui de çada pelo presidente da Comis- calismo conservador.
1981 para 1984, já refletindo um são de Fábrica da Ford no Ipi- Para agravar a situação, o pro-
quadro de desemprego. ranga, Lúcio Bellentani, monta grama de ambas as chapas era ex-
outra chapa que também se apre- tremamente parecido, o que con-
1987. A chapa cutista senta como da CUT. A chapa en- tribuiu para aumentar a confusão
e a outra chapa cabeçada por Lúcio é resultado e dividir os votos. O resultado fi-
cutista de composição com a corrente nal foi desastroso para a OSM-SP,
majoritária do PT, os diretores que amargou um terceiro lugar,
Carlúcio Castanha sai ven- do PC do B, que foram afastados assistindo à outra chapa ir para o
cedor da convenção cutista que da diretoria do Sindicato, e pelos segundo turno. A OSM tomou a
contou com a presença de Jair que tinham sido do PCB e que decisão política, em assembleia
Meneguelli e teve o Guiba, Hei- foram diretores até 1987. Medei- muito dividida, de apoiar a ou-
guiberto Della Bella Navarro, da ros, rompido com todos os prin- tra chapa, para constrangimento
Confederação Nacional dos Me- cípios, tinha se tornado a estre- de muitos de seus militantes. Em
talúrgicos da CUT, presidindo a la emergente do sindicalismo de algumas fábricas, como a Arno,

Investigação Final.indd 77 25/11/14 18:13


78

investigação operária

1987 – Carlúcio,
combativo
cipeiro da Arno,
encabeçou a chapa
da convenção
Cutista. A divisão da
Oposição contribui
para a derrota.
Acervo IIEP/Projeto
Memória da OSM-SP

Lula com a camiseta


da chapa encabeçada
por Carlúcio. Como
outra chapa também se
apresentava como da
CUT, essa foto não teve
divulgação autorizada.
Divulgada aqui pela
primeira vez.
Acervo IIEP/Projeto Memória
da OSM-SP

1990 – Chico Gordo e Vital Nolasco


encabeçam a chapa da CUT com a CSC
Em 1987, a chapa da CUT faz avaliação (Corrente Sindical Classista).
após a derrota para apoiar a outra Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM-SP
chapa de oposição
Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM-SP

Investigação Final.indd 78 25/11/14 18:13


79

Capítulo 2
O Sindicato, a Oposição e as eleições

onde trabalhava Carlúcio, os tra- assim, a Oposição fará em 1990 dários e trabalhando a ideologia
balhadores se recusaram a aca- uma chapa cutista em aliança do “sindicalismo de resultados”.
tar a decisão do apoio, embora o com a Corrente Sindical Classis- Essa tática é desastrosa para os
próprio Carlúcio tivesse pacien- ta (CSC), tendência criada pelo militantes da Oposição.
temente explicado os motivos da PCdoB. Eles tinham sido afas- A estratégia de Medeiros e
decisão e entregue material escri- tados do bloco pelego-reformis- seus seguidores é apontar, para
to nesse sentido. ta e iniciavam uma aproximação os trabalhadores, os membros da
Dessa vez, a OSM-SP foi der- com a CUT. Oposição fazendo aparentes elo-
rotada inclusive nas fábricas, Chico Gordo, da CUT, como gios e, dessa forma, tornando fá-
indicando que o trabalho coti- candidato a presidente, e Eustá- cil sua identificação, música para
diano nas empresas estava cada quio Vital, da CSC, como vice. os ouvidos da segurança das em-
vez mais fragilizado. A direção Chico era deputado estadual e presas que identificam o militan-
do Sindicato se renovava, ago- Vital vereador. Naquela euforia te. A diretoria faz uma forte coop-
ra era dirigido pelo ex-militante do início da breve era Collor, a tação da vanguarda das fábricas
do PCB, Luiz Antonio Medeiros, chapa da Oposição – que era a num período de muito medo do
convertido ao credo neoliberal. chapa da CUT com a CSC – será desemprego. Ao militante de-
cognominada a chapa dos ma- sempregado ou da empresa em
1990. O começo rajás. O mesmo mote que serviu crise é oferecida a oportunida-
do fim para a burguesia entronizar o go- de de ser “assessor” do Sindi-
vernador de Alagoas como o sal- cato. São dezenas de bons luta-
Em 1990 acontece outra virada. vador da pátria servirá para der- dores cooptados. A euforia não
Lucio Bellentani tinha migrado rotar a chapa de Oposição. durará muito, nem o emprego,
para o outro lado e se tornado pre- mas o estrago na vanguarda será
sidente da Confederação Nacio- 1993. Sem permanente. A categoria chegará
nal dos Trabalhadores Metalúrgi- retaguarda em 1993 desmotivada e insegura
cos da Força Sindical. Medeiros quanto ao emprego.
será o homem do “sindicalismo Os anos que antecedem as Para completar, a consolida-
de resultados” e se aliará a Collor eleições de 1993 serão de des- ção da Força Sindical redefine o
que havia derrotado Lula na elei- concerto da esquerda. A CUT, a jogo. É feito um pacto tácito. A
ção presidencial de 1989. O País partir de 90, decide ser proposi- CUT para de tentar ganhar sindi-
estava dividido, a derrota da Fren- tiva e menos contestadora; o PT catos da Força Sindical, a disputa
te Brasil Popular o jogou numa busca uma estratégia e uma ex- é congelada, cada um fica com o
aventura, mas enquanto durou o plicação para a derrota eleitoral que já conquistou. A CUT aban-
desgoverno Collor houve uma en- de 1989; Collor, com a política dona a política de apoio às oposi-
xurrada de derrotas para as clas- dita de abertura e modernização, ções sindicais.
ses trabalhadoras e a esquerda. O causa a liquidação de milhares de A Oposição, penosamente,
mundo soviético estava desmoro- empregos. O complemento sin- monta uma chapa em 1993 enca-
nado. O PT aturdido. dical do período é a ascensão da beçada por, Mauro Farabotti, tra-
Os que tinham passado pela Força Sindical com um ideário balhador da mesma Ford, onde
tentativa de ganhar o Sindicato abertamente neoliberal e priva- havia trabalhado Bellentani. Não
“por dentro” estavam desaloja- tista. A prática sindical de Medei- terá uma convenção, não há en-
dos e, assim como os membros ros é fazer greve “saca-rolhas”, tusiasmo. A maioria da CUT co-
da OSM-SP, com dificuldades de conseguindo vitórias pontuais loca as condições para apoiar,
permanecer nas fábricas. Mesmo nas fábricas por motivos secun- mas todos sabem que o jogo está

Investigação Final.indd 79 25/11/14 18:13


80

investigação operária

terminando. Será a última parti- 1969 – “Luta Operária”.


Acervo IIEP/Projeto
cipação da Oposição nas eleições Memória da OSM-SP
no Sindicato. Em 1989, num epi-
sódio de extrema violência, a
Oposição conseguiu falar numa
atividade do Sindicato pela últi-
ma vez. Apesar do espancamen-
to de muitos militantes, de tiros
disparados por assessores da di- 1976 – “Luta Sindical”.
Acervo IIEP/Projeto
retoria, não houve indignação e Memória da OSM-SP

condenação forte por parte dos


dirigentes da CUT. Era o sinal
dos tempos que se avizinhavam.

1996. Natal amargo.


O jogo acabou.
1978 – “Jornal dos
Em 1996, o Sindicato fará o Jornais”.
edital de convocação das elei- Acervo IIEP/Projeto
Memória da OSM-SP
ções durante o recesso de final de
ano, entre o Natal e o Ano Novo.
O amargo presente de Natal dará
15 dias para o registro das cha-
pas. Em uma reunião arrancada
a fórceps na CUT conclui-se pela
impossibilidade em concorrer.
Difícil imaginar que as pri-
meiras batalhas das Oposições
Sindicais para participar das
eleições eram vasculhando os
jornais para descobrir os escon-
didos editais de convocação, ou
olhar atrás das portas do Sindi-
cato porque o edital poderia es-
tar colado lá. Que os continuado-
res de práticas pelegas detonem
a democracia sindical é parte do
jogo. Já uma Central Sindical de-
sistir de disputar a influência en-
tre os trabalhadores não condiz 1979 - “1º
Congresso da
com os princípios de liberdade, Oposição Sindical
autonomia sindical e livre orga- Metalúrgica de
nização dos trabalhadores que São Paulo”.
Acervo IIEP/Projeto
nortearam a fundação da CUT. Memória da OSM-SP

Investigação Final.indd 80 25/11/14 18:13


81

Capítulo 2
O Sindicato, a Oposição e as eleições

1979 – o
“Jornal dos
Jornais”
publica
caderninho
sobre as
greves.
Acervo IIEP/
Projeto
Memória da
OSM-SP

1980 - “Estatuto da Central Operária


Boliviana”. Editado pela OSM-SP.
1979 – “Comissões Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM-SP
de Fábrica”
Acervo IIEP/Projeto
Memória da OSM-SP

1982 –
“Centrais Sindicais
1979 - “Enos – Anampos
Mundiais”
1981/1982” Acervo IIEP/Projeto Memória
Acervo IIEP/Projeto da OSM-SP
Memória da OSM-SP

1982 - “Seminário sobre


a Organização dos
Trabalhadores e a
Política do Sindicato
dos Metalúrgicos de
São Paulo”.
Acervo IIEP/Projeto Memória
da OSM-SP

1980 - “Máquinas
Piratininga” sobre os 35
dias de greve.
Acervo IIEP/Projeto Memória
da OSM-SP

Investigação Final.indd 81 25/11/14 18:13


82

investigação operária

1982 - “Comissões de
Fábrica”. Cadernos
publicados pela OSM-SP.
Acervo IIEP/Projeto Memória
da OSM-SP

1982 - “Nas raízes da


democracia operária”
(A história da OSM-SP).
Acervo IIEP/Projeto Memória
da OSM-SP

1983 - “O livro negro da


Cipa da Arno”
Acervo IIEP/Projeto Memória
da OSM-SP

1983 - “CUT pela Base”


editado pela Comissão
Sindical Nacional da
Anampos.
Acervo IIEP/Projeto Memória da
OSM-SP

1983 - “Metalúrgicos de 1983 - “Encontro de


São Paulo – sobre as Fábricas de São Paulo”.
Acervo IIEP/Projeto Memória
eleições sindicais de 84” da OSM-SP
Acervo IIEP/Projeto Memória
da OSM-SP

Investigação Final.indd 82 25/11/14 18:13


83

Capítulo 2
O SINDICaTO, a OPOSIçãO E aS ELEIçõES

1984 - “piQuetão”. BoLetim


da osm-sp.
aCerVo iiep/proJeto memória
da osm-sp

1984 - “suBsede dos


metaLÚrGiCos de santo 1984 – “BeLLa Ciao”. a osm
amaro” produziu um teXto soBre a
aCerVo iiep/proJeto memória da peça.
osm-sp aCerVo iiep/proJeto memória da
osm-sp

1986 - “oLHo ViVo”


puBLiCação perÍodiCa de
1986 a 1999.
aCerVo iiep/proJeto memória da
osm-sp

1985 - “ComissÕes de
FáBriCa em são pauLo”. 1986 - “Construir a Cut
dados soBre as peLa Base”
ComissÕes, sua oriGem, aCerVo iiep/proJeto memória da
osm-sp
Lutas, Composição, etC.
aCerVo iiep/proJeto memória da
osm-sp

Investigação Final.indd 83 25/11/14 18:13


2

84

investigação operária

Investigação Final.indd 84 25/11/14 18:13


85

Capítulo 2
O Sindicato, a Oposição e as eleições

A ASSOCIAÇÃO
ANTIOPERÁRIA

Investigação Final.indd 85 25/11/14 18:13


86

investigação operária

Investigação Final.indd 86 25/11/14 18:13


87

Capítulo 3
a aSSOCIaçãO aNTIOPERáRIa

aCerVo pessoaL

“É
FamÍLia deLeLLis
lógico que vi no 64, e eu chamo a atenção que se modificaram
todas as questões. Se interveio em dezenas, em centenas ou mi-
lhares de Sindicatos, interveio em Federações etc etc etc. Se
modificou com um bocado de leis também em cima do golpe de 64,
mas também não se mexeu uma vírgula na estrutura sindical, quer di-
zer, a estrutura sindical continua servindo em todos os regimes, em to-
das as oportunidades, porque é uma estrutura que nós não discutimos,
os trabalhadores não discutiram, os trabalhadores não propuseram,
nós é que tivemos que entrar dentro disso que nós herdamos.
É lógico que vai passar a redemocratização, vai vir golpe. Se mo-
difica tudo, se prende gente, se intervém mas ninguém mexe na estru-
tura sindical, porque isso serve perfeitamente para explorar nossos
trabalhadores, para tirar mais valia dos trabalhadores, para arrancar o
lucro e para até fazer milagre se quiser.”

Afonso Delellis no filme


“Braços Cruzados, Máquinas Paradas”

Investigação Final.indd 87 25/11/14 18:13


88

investigação operária

O EMPRESARIADO
E A REPRESSÃO

POLíCIA MILITAR DENTRO


da empresa BosCH em
Campinas.
aCerVo moVimento.

Investigação Final.indd 88 25/11/14 18:13


89

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

C
entenas de trabalhadores, par- recerem um desvario e descon- tava no País e começava sua luta
ticularmente metalúrgicos, trole dos esbirros da repressão. por direitos básicos.
participaram de oficinas, reu- Não. A atividade para conter as O País começa a se industria-
niões, gravação de depoimentos, lutas sociais e o direito de organi- lizar para superar a necessidade
para recuperar e tentar entender os zação política dos trabalhadores de importação de bens e produtos
mecanismos de repressão que cei- foi uma ação de Estado organi- dos países capitalistas centrais.
faram tantas lideranças, entre as zada metodicamente pelo menos Em São Paulo, a riqueza advinda
décadas de 60 e 90, de metalúrgi- desde a década de 20, com maior da exportação do café gerará di-
cos na cidade de São Paulo. Mui- ou menor intensidade, conforme visas para a expansão industrial.
tos desses operários trabalharam o momento político. Mas, na dé- Cresce vertiginosamente a mi-
em diversas categorias profissio- cada de 30, já estavam estrutura- gração de mão de obra desde o fi-
nais e vivenciaram distintas ex- dos todos os mecanismos e fun- nal do século XIX. Primeiramen-
periências de luta e enfrentamen- damentos contra a organização te para o café, em seguida para a
to contra a opressão patronal e os dos trabalhadores. O aparato não indústria. Muitos trabalhadores
aparatos do Estado. foi alterado, apenas apropriado e vinham com experiências de lu-
A combinação entre testemu- aperfeiçoado pelo governo em- tas em seus países. O movimen-
nhos e documentos foi a base presarial-civil-militar, que ten- to operário vai, gradualmente, se
de todo o trabalho de pesquisa. tou manietar a vida democrática articulando e se organizando. A
Todas as afirmações feitas nes- a partir de 1964. luta da classe operária era, fun-
te livro são baseadas em docu- Nisso, emerge sinistramente o damentalmente, por melhores
mentações, provas e evidências DOPS. Todos os poderes do Es- condições de vida e de trabalho,
coletadas ao longo do processo tado e suas instituições têm sua por aumento salarial e proteção
de pesquisa. A cada descoberta cota antiluta dos trabalhadores. As social. A contragosto, o alto em-
de documentos com novas in- Forças Armadas, os órgãos minis- presariado e o Estado tinham que
formações, foram buscados os teriais – inclusive os supostamen- se curvar a determinadas reivin-
testemunhos de trabalhadores e te reguladores ou de defesa dos dicações dos trabalhadores, a fim
militantes que confirmassem os trabalhadores, como os do Minis- de evitar greves.
dados encontrados. tério do Trabalho ou as Delega- A greve geral de 1917, em São
Nas atividades, os coordena- cias Regionais do Trabalho – atu- Paulo, comandada pelos anarquis-
dores da Investigação Operária aram mancomunados. O DOPS é tas, foi o primeiro grande movi-
conviveram intensamente com uma espécie de espinha dorsal do mento da classe operária nascen-
outros ex-presos políticos, estu- mecanismo antitrabalhadores. É o te no País. A corrente anarquista
diosos, especialistas da memó- que pretendemos demonstrar. tinha enorme importância dentro
ria política. Algumas conclusões A célebre frase “a questão so- do movimento operário naquele
foram se firmando: a primeira, cial é caso de polícia”, atribuída momento histórico e passa a so-
mais forte e definitiva, de que o ao ex-presidente Washington Luís frer disputa com os comunistas
golpe de 64 foi um movimento (1926-1930), resume bem a pos- que, no ano de 1922, fundam o
civil-militar, objetivamente ne- tura dominante em relação às rei- Partido Comunista do Brasil.
cessário e direcionado para os in- vindicações dos trabalhadores no Os empresários começam a
teresses empresariais. A segun- curso da República Velha (1889- se organizar no mesmo período
da, ao estudar os mecanismos de 1930) no Brasil. Com o processo para fazer frente ao avanço da
repressão, nos convencemos que de industrialização já no fim do classe operária. Em 1928, criam
a repressão era sistêmica, orien- século XIX, mas intensificado no o Centro das Indústrias do Esta-
tada e programada, apesar de período da Primeira Guerra Mun- do de São Paulo (CIESP), em-
tantas torturas e assassinatos pa- dial, uma classe operária despon- brião da futura e poderosa Fede-

Investigação Final.indd 89 25/11/14 18:13


90

investigação operária

ração das Indústrias do Estado de que se aparelhou a polícia. Um nas décadas seguintes na política
São Paulo (FIESP). órgão para centralizar a vigilân- brasileira: edulcorados pela aura
O DOPS é criado pela Lei cia e efetuar a prisão daqueles de lutadores pela justiça estarão
nº. 2034, de 30 de dezembro de que, na visão governamental e esmagadoramente a serviço das
1924. Em alguns momentos terá empresarial, perturbassem a “or- classes dominantes.
a sigla DEOPS. O Brasil era go- dem pública”, isto é, que se in- Com a Revolução de 1930,
vernado, sob estado de sítio, por surgissem socialmente contra as tem início a Era Vargas, com
Arthur Bernardes, enquanto São classes dominantes. Toda a lógi- o Governo Provisório (1930-
Paulo é governado por Carlos de ca da intervenção do DOPS nos 1934). Houve um relativo are-
Campos. A polícia paulista é re- movimentos dos trabalhadores, jamento político: estava em cur-
organizada com a criação de sete desde sua criação, é para garan- so um rearranjo entre as classes
delegacias especializadas. tir que não haja nenhuma pertur- dominantes, e a sociedade, saída
Não bastava tratar a questão bação no local de trabalho ou de dos velhos costumes, pressiona-
social como caso de polícia. Pre- moradia dos trabalhadores para va por um ambiente democráti-
cisavam de método, estratégia e não ameaçar o dia a dia de explo- co. Mas a repressão aos trabalha-
especialistas dedicados a isso. O ração das classes populares. dores e ao movimento sindical,
estudioso Marcos Tarcísio Flo- Nos 60 anos de sua existên- mesmo amenizada, não prescin-
rindo (2006, 27) ressalta: cia, passando pelos governos da diu do mecanismo de deportação
A formação da polícia especia- República Velha e Estado Novo, de lideranças e há registros de
lizada de ordem política social o chamado intervalo democráti- muitas prisões:
de São Paulo, em 1924, foi par- co de 1946 a 1964, e, particular- (...) Na tentativa de marcar
te integrante dessa estratégia mente, na Ditadura Civil-Militar suas diferenças em relação ao
de readequação do aparato es- de 1964 à 1988, o DOPS, além governo deposto, os políticos
tatal de controle e vigilância da de servir aos propósitos políticos da Aliança Liberal, no entan-
sociedade às transformações de qualquer governo, foi o centro to, suspenderam temporaria-
ocorridas no mundo do traba- nevrálgico da vigilância, contro- mente o intenso controle po-
lho. A modernização requeria le, perseguição e repressão aos licial sobre as organizações
do Estado um maior zelo em re- movimentos dos trabalhadores e sindicais. Isso possibilitou ao
lação à administração de suas de suas organizações políticas. movimento operário um respi-
instituições e ao preparo do seu Na década de 1920, a Colu- ro depois de anos ininterruptos
pessoal. na Prestes, movimento político- de perseguição às suas organi-
(...) A polícia adentrava no tem- -militar brasileiro originário do zações. Convém lembrar que
po dos especialistas, da forma- tenentismo e que lutava pela mu- esse vácuo durou pouco, não
ção de agentes com treinamen- dança da ordem social da Repú- mais que o tempo necessário
to específico para o combate às blica Velha, ficou no imaginário à reorganização da adminis-
diferentes modalidades do cri- da população como proposta al- tração dos órgãos do Estado.
me e do criminoso... ternativa de organização políti- Como já afirmamos, o novo
ca e social. A Coluna nunca der- governo, em sua visão dos pe-
Era papel da polícia velar pela rotada militarmente se exaure, rigos oriundos das classes su-
própria versão moderna de li- seus remanescentes se dividem. balternas, não diferia das ve-
berdade da sociedade capitalis- Dos movimentos de militares da lhas oligarquias depostas. O
ta, não mais relacionada ao não década de 20, sairão diferentes relaxamento esteve provavel-
trabalho, e sim à venda da mão correntes. Prestes aderirá ao co- mente relacionado à própria
de obra. Nesse sentido, foi para munismo e outros derivam para confusão reinante no aparelho
controlar o mundo do trabalho a direita e serão figuras de proa político após o golpe, princi-

Investigação Final.indd 90 25/11/14 18:13


91

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

palmente em estados como o


de São Paulo, nos quais as eli- A LSN Essa propaganda se casa
tes depostas do poder central Em 1935, inaugurando um com um tipo de ideias rasteiras
eram as mesmas que governa- novo ciclo de repressão, é pro- que a direita martelará nas dé-
vam no âmbito regional. (FLO- mulgada a Lei de Segurança cadas seguintes, como a de que
RIANO, 2006, p. 64-5) Nacional (LSN), com o objetivo “os comunistas comem crianci-
explícito de conter o agrava- nhas, que os russos vão invadir
Pressionado entre a crescen- mento da tensão política que o Brasil, que os nacionalistas
te oposição por parte da oligar- cercava o governo. Foi um ins- são melancia (verde por fora e
quia tradicional, que culmina vermelha por dentro), que se
trumento que deu poderes le-
no movimento constitucionalista chegarem ao governo vão en-
de 1932, em São Paulo, e a ex- gais ilimitados ao governo cen-
tral. Qualquer tipo de demanda trar na sua casa e dividir suas
pansão da Aliança Nacional Li-
trabalhista ou de rebeldia dos coisas”. A partir do que a direita
bertadora (ANL), movimento de
massas de iniciativa do Partido trabalhadores podia ser classi- chamará “intentona comunis-
Comunista Brasileiro e encabe- ficada como ameaça à ordem. ta” se constrói toda uma mito-
çado pela emblemática figura de A LSN é promulgada para o go- logia anticomunista.
Luiz Carlos Prestes, o governo verno getulista combater a crise A retórica fica um pouco
de Getúlio Vargas radicaliza sua política que enfrentava, tanto à congelada quando Getúlio,
estratégia de repressão aos opo- esquerda quanto à direita do es- após muito negociar diploma-
sitores, combinada com acordos pectro político. ticamente entre o eixo nazi-
com oligarquias regionais que fascista (Alemanha, Itália, Ja-
No mês de novembro desse
lhe darão sustentação. pão) e os aliados (EUA, URSS,
mesmo ano, ocorre a conheci-
O Estado Novo começa, de Inglaterra, França), coloca as
fato, em 1935, com a perseguição da “Rebelião Comunista”, com
a tomada de vários quartéis tropas brasileiras ao lado dos
aos opositores e o recrudescimen-
pelo território nacional, como aliados. Havia, apesar da di-
to da repressão direcionada ao mo-
vimento dos trabalhadores. Nesse no Maranhão, Recife e no Rio tadura e dos comunistas e de-
primeiro governo Vargas, tem iní- de Janeiro. Na cidade de Natal, mocratas encarcerados, uma
cio a estruturação do aparato ins- onde o movimento foi mais for- enorme pressão popular para
titucional de vigilância, controle e te, foi instaurado um governo o Brasil entrar na guerra.
repressão aos movimentos políti- revolucionário provisório que A polícia de Getúlio colabo-
cos organizados, além da prática teve duração de três dias. rava técnica e politicamente
sistemática de prisão e tortura aos Esse levante comunista ser- com os aparatos de repressão
dissidentes do regime. do nazismo: o serviço diplo-
viu de justificativa para Getúlio
A Carta Constitucional de mático brasileiro tinha orien-
Vargas encarcerar milhares de
1937, após o golpe de Getúlio tações antissemitas para difi-
Vargas em 10 de novembro, ma- pessoas condenadas sumaria-
mente a longas penas, afastar cultar a migração dos judeus
terializa e legitima a ditadura do
governo getulista. As benesses centenas de membros das For- perseguidos, e a expulsão e
trabalhistas para as massas era ças Armadas e criar um mantra o mapeamento de italianos
combinada com uma desvairada de que os comunistas sorratei- e espanhóis indesejáveis fa-
repressão e a proibição absolu- ramente tentaram matar seus ziam parte da cooperação
ta do exercício de reivindicações colegas de farda. com a ditadura franquista e
dos trabalhadores. Vargas ainda
continua

Investigação Final.indd 91 25/11/14 18:13


92

investigação operária

implanta o controle do Ministério É extinto no final de 1982, dez


com a Itália, sob o fascismo do Trabalho sobre a vida sindical dias antes da posse do primei-
de Mussolini. e patrocina o sindicalismo minis- ro governador eleito em eleições
Anos depois, já sob a ótica terialista. diretas, Franco Montoro. Seus
da Guerra Fria e a vitória da Passado o breve momento de arquivos foram colocados sob a
Revolução Cubana em 1959, participação política no fim da guarda de Romeu Tuma, nomeado
a propaganda anticomunista Guerra com a libertação dos pre- superintendente da Polícia Fede-
sempre apontará o adversá- sos e a Constituinte, até a cassa- ral pelo governo do general João
rio vermelho nos movimentos ção do Partido Comunista em Batista Figueiredo. Ficam sob sua
sociais para justificar a repres- 1947, o governo Dutra usará toda guarda até o início dos anos 90,
são e impedir a legalização a mão pesada do aparato criada no quando passam à guarda da Secre-
dos partidos comunistas. Esse governo getulista e fará interven- taria da Cultura do Governo, sen-
caldo de cultura reacionária ções nos sindicatos tão generali- do seu secretário Adilson Montei-
zadas como fará a ditadura militar ro Alves. Aproximadamente uma
terá papel importante para
de 1964. A praga do sindicalismo década foi o tempo suficiente para
derrubar o governo de Jango
ministerialista empesteará o dia a documentação ser desconfigura-
e determinar as consequên- a dia dos trabalhadores. Nenhum da e desconstruída.
cias trágicas da repressão de- dos governos seguintes alterará os Romeu Tuma participa do
sencadeada a partir de 1964. pilares da estrutura sindical, nem DOPS desde 1969 como analis-
Os agentes do IV Exérci- a estrutura do DOPS. ta de informações, trabalhando
to no Nordeste torturavam Com o golpe civil-militar de em sala contígua ao sinistro dele-
trabalhadores rurais que ti- 1964, a arquitetura institucio- gado Fleury, o todo-poderoso do
nham participado das Ligas nal de repressão aos trabalhado- DOPS. Tinham portas vizinhas
Camponesas perguntando res, formulada no Estado Novo com sistemas de luzes de aviso
sobre os cubanos que teriam e mantida inalterada durante a para informar momentos de reu-
vindo ao Brasil para fazer vigência do chamado “interva- niões, torturas ou interrogatórios.
guerrilha. O mesmo ocorre lo democrático” de 1946-1964, Faziam a clássica dupla do poli-
durante as lutas de Trombas cumprirá papel extremamente cial mau (Fleury) com o policial
significativo na articulação dos bonzinho (Romeu Tuma).
e Formoso, no norte de Goi-
mecanismos estatais de perse- Em 1977, sendo secretário
ás, quando a repressão pro-
guição e repressão dirigida ao de Segurança o coronel Erasmo
duz a figura de um inimigo movimento dos trabalhadores. Dias, Tuma assumirá a chefia do
estrangeiro comunista no O DOPS, sobretudo, foi um DOPS. Em 1983, é nomeado pelo
imaginário dos torcionários. aparelho estatal a serviço da bur- general Figueiredo, o último dita-
O líder camponês e deputa- guesia e do empresariado, con- dor militar, para superintendente
do estadual por Goiás, José cebido para vigiar, perseguir e da Polícia Federal e secretário da
Porfírio, preso na região, reprimir os trabalhadores que se Receita Federal.
desaparecerá logo após ser rebelassem contra a lógica de ex- Tuma foi um homem podero-
solto. Foi visto pela última ploração e de opressão do capi- so na transição “lenta, gradual e
vez na Estação Rodoviária tal. O DOPS funcionará ao lon- segura” anunciada pelo general
de Brasília e está na lista de go da ditadura civil-militar com Geisel e será entronizado como “o
lutadores desaparecidos sob força redobrada para desarticular policial do diálogo”. Em 1979, em
a classe trabalhadora e assassinar São Bernardo do Campo, no 1º de
a responsabilidade das au-
seus militantes mais combativos maio de 1979, a morte de Fleury
toridades militares.
e atuantes. será ruidosamente comemorada.
.

Investigação Final.indd 92 25/11/14 18:13


93

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

Em 1980, a direção da greve cas Mapri e Bardella: dois do-


dos metalúrgicos do ABC será cumentos do DOPS, datados de Como as
presa, inclusive Lula. Tuma, o 1944, mostram como se estrutura- empresas se
policial bonzinho, permitirá que va o serviço de vigilância sobre a associavam
Lula vá ao enterro da mãe, dona classe trabalhadora em São Paulo.
Lindu. Será somente afastado para vigiar e
Esses documentos são questioná-
da chefia da Polícia Federal em rios do DOPS respondidos pelas controlar os
1992, após a queda de Collor. A indústrias Bardella e Mapri, na trabalhadores?
essa sinistra figura que cresceu época instaladas na Barra Funda. Organização de associações
no subterrâneo do aparato repres- Os questionários possuíam per- formais ou informais de chefes
sivo serão confiados os arquivos guntas referentes ao tipo e ao ta- dos Ris (Responsáveis Indus-
do DOPS por mais de nove anos. manho da produção da fábrica, se triais) e/ou RHs (Recursos Hu-
Apesar do excepcional traba- sofrera redução na produção em manos) que elaboravam listas
lho do Arquivo Público do Esta- relação ao ano anterior e o motivo de trabalhadores a não serem
do de São Paulo – APESP de or- disso; pediam informações sobre contratados e que repassavam
ganização dos documentos e da o número de empregados e quan- informações de demitidos; não
montagem dos quebra-cabeças tidade de homens, mulheres e me- contratação de quem havia
de décadas de espionagem, apre-
nores; situação de sindicalização aberto processo trabalhista em
ensão de materiais e fichamen-
e a que sindicato pertenciam. outra empresa; multiplicação
tos do DOPS, qualquer consul-
A segunda parte do questioná- das consultas e rede de contato
ta evidencia o desaparecimento
rio mostra que este é solicitado ou associações de controle em
de documentos. Mesmo assim,
anualmente, pois pede atualização cada ramo de trabalho; rede de
é possível encontrar centenas de
exemplos da cooperação entre os de dados relativos a 1944. O pe- delatores com participação de
poderes legais com os órgãos de dido de informações é objetivo e sindicalistas que foram inter-
repressão tendo o DOPS como se reporta diretamente à organiza- ventores; incorporação à segu-
espinha dorsal. ção dos trabalhadores, solicitan- rança privada das empresas de
Foram selecionados para este do informações sobre existência
agentes com formação policial
livro alguns documentos cobrin- de greves, abrangência, duração
ou militar, quase sempre com
do décadas diferentes e situações e motivo; casos de sabotagem; se
chefia de ex-militares, agentes
diversas, mas emerge a incontes- “existem elementos agitadores”
patronais infiltrados nos locais
tável a conclusão do papel do (nesse caso solicitam nome e en-
de convivência, transporte e la-
DOPS como órgão para con- dereço do trabalhador); se exis-
zer dos trabalhadores; relação
trolar o mundo do trabalho. tiam “confabulações reservadas
institucionalizada com a polícia
entre os trabalhadores” e, por úl-
local, os órgãos de segurança,
Documentos timo, a pergunta se “verificou-se
a presença de pessoas estranhas em particular, o DOPS.
que indicam a
cooperação do na entrada das fábricas ou em sua
empresariado com a imediações, procurando entrar em
repressão contacto com operários ou com
eles confabulando?”.
VIGILÂNCIA Ao final do questionário há ços”. A participação do Brasil na
Questionários do DOPS uma solicitação: “Juntar, se pos- Segunda Guerra era usada como
para colher informações so- sível, relação completa dos ope- argumento para impedir deman-
bre os trabalhadores nas fábri- rários, com seus nomes e endere- das trabalhistas sob a justifica-

Investigação Final.indd 93 25/11/14 18:13


94

investigação operária

QUESTIONáRIO
DOPS
respondido
peLa
BardeLLa em
1944.
aCerVo apesp/
dops os 109391

DOSSIÊ
COOPERAÇÃO
BardeLLa/
dops
aCerVo apesp/
dops os 108070

BRISTAN GARANTE enViar “FiCHa de 6


LÍderes” ao dops, em 1978. TECNOFORJAS entreGou FiCHa de Liderança
aCerVo apesp/dops 43-z-0 4570 aCerVo apesp/dops 43-z-0 5113

Investigação Final.indd 94 25/11/14 18:13


95

Capítulo 3
a aSSOCIaçãO aNTIOPERáRIa

com o chefe de Pessoal, Antonio


Onofre, que passou as informa-
ções sobre a paralisação, inclusi-
ve que:
“O Dr. Moacyr levou para sua
sala as fichas dos 06 prová-
veis líderes do movimento. Os
dados dos referidos deveriam
ser transmitidos a esta Dele-
gacia, hoje de manhã, pelo ci-
tado doutor”.

A prática enunciada na déca-


da de 40 continuou existindo nos
anos 70, como vimos nos ques-
tionários preenchidos pelas fá-
bricas Bardella e Mapri, pelos
quais era dada a orientação do
DOPS às fábricas de passarem
informações sobre as lideranças
dos trabalhadores.

Tecnoforjas em 1979: em
relatório do delegado adjunto
da Divisão de Ordem Social do
DOPS, Olavo Reino Francisco,
do dia 12 de novembro de 1979,
é citado que o superintendente da
Tecnoforjas, sr. Fontana, forne-
RENY FRANCO E ROSELI dantas ViGiados peLa ViLLares ceu informações dos trabalhado-
aCerVo pessoaL reny FranCo
res grevista para o DOPS:

“2 - Em seguida, o Sr. Fontana


alegou serem os Agitadores e
tiva de atrapalhar a produção. Bristan em 1978: há um re- Mentores do Movimento, seus
Mas, desde a década de 20, o que latório de agente do DOPS sobre operários de nome: José Anto-
importava era manter o trabalha- ida à empresa Bristan Técnico nio Filho, Antonio de Rezende
dor trabalhando. Os sucessivos Mecânica por causa da paralisa- Lima, Albino Barzi e Hamilton
pretextos em nome da “paz so- ção dos trabalhadores. O agente Vieira Gamero (segue em ane-
cial” evidenciam a naturalidade diz que, ao chegar à empresa, de- xo, fichas pessoais, fornecidas
do empresariado recorrer à polí- veria entrar em contato com o ad- pela própria “Tecnoforjas”).”
cia política para que não houves- vogado responsável, Dr. Moacyr,
se qualquer descontinuidade de mas que o mesmo não se encon- Vários documentos encon-
trabalho. trava e, por isso, acabou falando trados no DOPS relatam infor-

Investigação Final.indd 95 25/11/14 18:13


96

investigação operária

INFORME da GreVe de 1979. vIGILâNCIA do dops na sCripeLLiti.


aCerVo apesp/dops 50-B-58 2650 aCerVo apesp/dops 50-B-58 1890

mações trocadas entre empresa “MWM. Totalmente parada – ções industriais, que 40% dos
e DOPS sobre paralisações dos informação do porteiro Lino. operários estão trabalhando.
trabalhadores. Durante as greves Parada em virtude de ameaça Na porta permanece um pique-
é comum achar documentos que dos piquetes, de invadirem a te de 500 pessoas. Frezimbra –
informam o percentual de para- empresa. Villares – Informou Informou o sr. Walter que a em-
lisação dentro das fábricas – in- o senhor Roberto Loew, che- presa possui 500 operários e
formações que só podem ser for- fe de segurança que as ativi- somente 15% estão parados”.
necidas pela própria fábrica. Um dades da firma foram encer-
dos documentos sobre a greve radas em virtude de terem Com informações da mesma
de 1979 relata o nome da fábri- feito acordo com os piquetes natureza, telegramas são troca-
ca, percentual de paralisação e que estavam na porta. Cater- dos entre a DRT e o DOPS. Um
nome e função de quem passou pillar – Informou o sr. Nelson deles, do dia 3 de julho de 1978,
a informação: Fernandes, do setor de rela- informa paralisações nas fábri-

Investigação Final.indd 96 25/11/14 18:13


97

Capítulo 3
a aSSOCIaçãO aNTIOPERáRIa

INFORME da GreVe de 1978. FLEURY REPORTA A TUMA apreensão da


aCerVo apesp/dops 43-z-0 4592 CHapa da oposição em 78.
aCerVo apesp/dops os0289

cas Inducon, Telefunken, Philco, Caze do Brasil e Swift-Armour exemplo, o documento mais an-
L. Figueiredo Armazéns Gerais de Osasco e Lacom de Campi- tigo dessa natureza encontrado
e Filizolla de São Paulo; Lavre nas. Durante a mesma greve de data de 26 de novembro de 1969
Laminação Volta Redonda de 1978, um relatório do plantão, e relata a panfletagem em frente à
Guarulhos; Indústria Mecânica do dia 13 de julho de 1978, da fábrica de molas Scripelliti.
Miotto de São Bernardo; Sarco Delegacia Auxiliar da Quinta Há também, do dia 31 de ou-
de Cotia; e Seikan de Osasco. Divisão Policial do DOPS, in- tubro de 1980, informe sobre a
Um telegrama do dia 10 de forma sobre a situação de parali- presença de perua do Sindicato
julho de 1978 informa paralisa- sação da Metalúrgica Alfa. estacionada em frente à empre-
ções nas fábricas Luwa Clima- Relatórios de agentes do sa Meridional. Menciona que os
tecnica, Indsteel, Laborterápica DOPS com informações sobre seus ocupantes têm feito panfle-
Bristol, Olympia do Brasil, GTE movimentação em frente às fá- tagem e conversado com os tra-
e Filtros Mann de São Paulo; bricas eram muito comuns. Por balhadores; outro relato, do dia

Investigação Final.indd 97 25/11/14 18:14


98

investigação operária

INFORME de panFLetaGem na meridionaL. FUNDIÇÃO BRASIL: dops neGoCia


aCerVo apesp/dops 50-B-58 2901 GreVe em 78.
aCerVo apesp/dops 50-B-58 2593

10 de outubro de 1980, informa CONTROLE DO TRABALHO O agente do DOPS conversa com


a presença de cerca de 50 pessoas Caso de paralisação na os trabalhadores da seção e com
em frente à fábrica Aliperti distri- Fundição Brasil: relatório de um representante dos grevistas.
buindo panfletos. agente do DOPS, do dia 3 de no- Esse tipo de relatório eviden-
É emblemático o comunicado vembro de 1978, descreve ida à cia que até as pequenas greves
de Sérgio Fleury, então diretor ge- Fundição Brasil, na Mooca, em eram tratadas como caso de po-
ral de Polícia do DEIC, para Ro- função de uma greve. Na oca- lícia, e as empresas acionavam o
meu Tuma, diretor geral de Polícia sião, o agente é recebido pelo ge- DOPS para resolver a questão.
do DOPS, relatando a apreensão rente de Recursos Humanos, Ra-
de panfletos da Chapa 3 da Oposi- mon Marinho, que o conduz para Empresário da Bardella
ção, na eleição de 1978. a seção onde havia paralisação. agradece ao DOPS por ter re-

Investigação Final.indd 98 25/11/14 18:14


99

Capítulo 3
a aSSOCIaçãO aNTIOPERáRIa

BARDELLA AGRADECE ao dops por aCaBar ROLAMENTO SCHAEFFLER permite poLÍCia


Com a GreVe, em 1946. reVistar armário de auréLio preso, em 74.
aCerVo apesp/dops os 108070 aCerVo apesp/dops 50-z-9 38086

solvido a greve: em 1946, dia 13 nos dias 12 e 13 de fevereiro de Andrade, na Grampos Aço, Tatu-
de fevereiro, portanto no perío- 1946.” apé. Um dos casos que demons-
do democrático do pós-guerra, tram a postura da empresa em re-
Antonio Bardella, diretor-presi- PRISÃO NAS FáBRICAS lação à presença da polícia para
dente da empresa Bardella, em A Oposição teve alguns mi- prender no local da fábrica é o de
papel timbrado, agradece ao de- litantes presos dentro das fábri- Aurélio Peres.
legado do DOPS a “assistência cas. Raimundo Moreira de Oli-
prestada pelos agentes Alcides veira na Carmo, Mooca, Arleide Violação de intimidade e
Garbini e Guaraci Cavalcanti Alves, na Colmeia, Tatuapé, Jor- tentativa de prisão na Fábrica
de Oliveira para findar a greve ge Luís dos Santos, na Horasa, Schaeffler: Aurélio Peres, preso
realizada pelos trabalhadores Santo Amaro, José Zico Prado de em 1974, é confrontado sobre ma-

Investigação Final.indd 99 25/11/14 18:14


100

investigação operária

MILITARIZAÇÃO Manoel Aurélio Lopes, ex-escri- nunca ligava o torno, ele ficava na
vão do Doi-Codi, em depoimento empresa 8 horas e não ligava o
DAS FÁBRICAS
à Comissão Rubens Paiva, afirmou torno. Eram militares com barba,
Setores como telecomunica- que o stand de tiro do DOPS foi re- cabeludo que nem a gente usava
ções, siderurgia, fornecedores de vestido pela Cofres Bernardini e que na época.
equipamentos para as Forças Ar- os aparelhos de proteção auricular Se por uma bobeira a gente co-
madas, foram militarizados como foram doados pela General Motors. mentasse alguma coisa num local
disciplinamento militar, presença A Bernardini foi uma fábrica mi- onde tinha agentes não durava
ostensiva de militares e infiltrações litarizada durante certo período, muito tempo e era mandado em-
entre os trabalhadores, critérios rí- quando reconvertida para moder- bora. Qualquer trabalhador que
gidos de admissão, como ser reser- nizar os tanques Urutu. Um dos tra- falasse um pouco diferente ali
vista de primeira categoria. balhadores que passaram por lá, o dentro da empresa não ficava em-
A legislação que trata da temáti- Renatão, Renato Carvalho Zulato, pregado.
ca das empresas de interesse para a testemunha: Nosso material da chapa da Opo-
segurança nacional data de 5 de ju- Um dos donos da empresa era do sição Metalúrgica (Carlúcio enca-
lho de 1955 (Lei n°. 2.597), durante exército, acho que era Ricardo o beçava nossa chapa), era verme-
do governo de Café Filho. Na dita- nome. Esse era o comentário que lho, nosso adesivo era vermelho e
dura, na cidade de São Paulo, três os trabalhadores faziam. A postu- chegou um dia que nós cismamos
fábricas foram militarizadas. A Si- ra dele era de militar, ele cobrava de avermelhar a empresa todinha,
teltra do Grupo Telefunken, na Zona uma postura muito rígida, com botamos adesivo vermelho na
Sul (Campo Grande), do setor de cumprimento de horário, discipli- empresa, naqueles equipamentos
telecomunicações, dentro do pla- na nas máquinas, você não podia militares. Mas passou a eleição, se
no do ministro Higino Corsetti, que conversar com os companheiros eu não me engano o Medeiros foi
enquadrou outras empresas como da frente e do lado. Era uma fá- eleito, 1o mandato do Luis Antonio
a NEC, GTE, Ericson, tendo a finali- brica normal, mas que tinha um Medeiros como Presidente, já sus-
dade de modernizar a infraesturtura controle disciplinar bem militari- cedendo Joaquinzão. Não passou
de telecomunicações no país, a En- zado e, por ter militares lá dentro, dois meses e ninguém mais daque-
gesa também na Zona Sul, na Ave- fugia totalmente da característica la turma estava dentro, niguém
nida Nações Unidas, subsidiária da de uma indústria. conseguiu ficar dentro da Bernadi-
fábrica maior de São josé dos Cam- Às vezes, a noite, você via chegar ni. Depois de 88, 89, 90, quando a
pos, que produzia armamento para carro, com 5, 6, 8 militares com ditadura militar “saiu do cenário”,
a guerra entre Iraque e Irã, e a antiga patente e andando dentro da fá- a Bernadini faliu, porque ela não
fábrica de cofres Bernardini. brica.Tinha torneiro mecânico que tinha para quem produzir mais.

terial encontrado no seu armário cidade do preso e plantar provas gada pela equipe “C” do DOPS,
na empresa onde trabalhava em contra ele, registrando essa viola- Aurélio dignamente depõe que
Santo Amaro. O DOPS autentica ção num documento oficial. “o material apreendido em seu ar-
que não cumpriu nenhum proce- Na sua ficha de interrogatório mário, na Fábrica de Rolamentos
dimento legal ao violar a priva- feito às três (!) horas da madru- Schacefler S.A. sito a Rua Cam-

Investigação Final.indd 100 25/11/14 18:14


101

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

pos Sales, 700, não lhe perten- de Leonor havia sido preso. Na fábrica, fui direto para a
ce, não sabe de sua procedência Ele era da mesma comunida- diretoria e eles disseram que
e considera ter sido ali colocado, de do Aurélio Péres. teriam que chamar a polícia,
com o intuito de prejudica-lo”. Fui trabalhar no dia seguinte. que eu esperasse, mas que da
Respondendo ainda sobre ter Por precaução, solicitei férias parte deles não tinham nada
sido encontrado um papel em seu antecipadas no dia seguin- contra mim. Disse que não ti-
poder com o nome dos advogados te, que me foram concedidas nha nada a temer e que espe-
Airton Esteves Soares, Luiz Edu- sem problemas. Sumi de casa. raria. Eles me disseram que
ardo de tal, Idibal de Almeida Pi- Dom Paulo Evaristo Arns caso estivesse livre, poderia
veta e Pedro Egídio de Carvalho orientou que o padre Fernan- reassumir meu trabalho.
– estes conhecidos advogados de do fosse meu diretor espiritu-
presos políticos à época. Respon- al. Este padre era da Cidade Rita foi conduzida numa via-
de que “…lhes foram passados Leonor. Ele deixou orientação tura para o DOI-CODI em alta
pelo Padre Angelo, vigário epis- para procurar o advogado velocidade, para despistar o pa-
copal da região sul, com a finalida- José Carlos Dias, caso preci- dre e sua mãe, que foram proibi-
de de que os advogados mencio- sasse. dos de acompanhá-la no mesmo
nados defendessem os envolvidos Tive informação que uma ga- carro. Durante sua permanência
em problemas trabalhistas”. rota do setor da Manutenção, no órgão, os agentes reclamavam
Nota: o relatório foi transcri- com quem eu tinha contato e que os dois acompanhantes esta-
to com a grafia original. O advo- passei o Boletim que explica- vam de vigília, esperando-a.
gado que não conseguiram es- va sobre a Campanha Sala- Ela ainda narra:
crever o nome é Luiz Eduardo rial, havia sido presa e tortu- Fiquei o dia todo responden-
Greenhalgh. O nome correto da rada porque o irmão dela, da do ao interrogatório. Estava
empresa é Schaeffler, multina- Vila das Belezas, devia ter al- certa que a questão era do
cional de autopeças. guma participação mais com- boletim da Campanha Sa-
Nessa mesma empresa, o prometida e estava encarce- larial. Mas, como no início
DOPS entra para prender Maria rado, sob forte tortura. eles mostraram as fotos dela
Rita Marques Pereira, uma das Ela logo saiu da prisão e pôde e eu negava conhecê-la, fo-
poucas operárias militantes da dizer como é que estavam os ram buscá-la na Vila das Be-
OSM-SP que participavam das depoimentos: disse que che- lezas para nos colocar fren-
atividades no Sindicato. No seu gou a falar de mim, porque te a frente. E a questão não
testemunho, diz: havia dado o Boletim, mas era o boletim, mas um recorte
Na semana das prisões, tinha que eles estavam mesmo pro- de jornal do Estadão que di-
um encontro marcado com o curando a Eny. Essa moça zia sobre a tomada da fábri-
Aurélio para conversarmos abandonou o trabalho porque ca pelos operários da LIP, na
sobre uma futura reunião com ficou muito assustada e voltou França.
alguns ferramenteiros, por- para Minas. Então, quando Minha sorte foi a fábrica ter
que estávamos às vésperas da teria que retornar das férias, uma sala de convivência, que
Campanha de Antecipação fui com o meu diretor espiritu- era recente, com jornais e re-
Salarial. al e minha mãe para a fábrica, vistas - e disse à polícia, que
No dia do encontro, ele não porque a polícia já tinha ido só podia ser de lá que eu ti-
foi. Quando cheguei em casa, em casa - que alás, quase le- nha pego e que, na hora do
soube, pelos padres, que Dir- vou minha irmã, como se ela almoço, teria visto e mostra-
ceu, da comunidade da Cida- fosse eu. do a ela. Embora a notícia

Investigação Final.indd 101 25/11/14 18:14


102

investigação operária

fosse do Estadão, o ato de DOPS APURA


repassar era muito subversi- denÚnCia
de GreVe na
vo. Eles me falavam o tempo teCnoLiX
todo isto. aCerVo apesp/
dops 50-z-129
Quando voltei ao trabalho, 15341
procurei o moço que traba-
lhava em regime de reveza-
mento de turnos. Ele também
tinha sido levado para o Doi-
-Codi porque falou a palavra
“comunista” na portaria do
prédio, bem na hora que a
polícia me pegou. Esse moço
passou o dia todo sendo in-
terrogado sem ter a menor
noção do que estava aconte-
cendo.

Tecnolix SA em 1975: re-


latório dos agentes do DOPS
de 2 de maio de 1975 informa o
atendimento a uma solicitação
do chefe de segurança, Salvador
Scafone, da firma Tecnolix SA,
para comparecerem à empresa
por causa de ameça de greve.

LINHa DIRETa
ENTRE a EmPRESa
E a POLÍCIa
fEDERaL em telex ao governador e ao se- fiança entre os administradores
cretário do Trabalho. de pessoal, um simples telefone-
Caso Sprecher: a desfaça- ma bastava para a não admissão
tez das empresas no trato com a O TRabaLHO de um trabalhador – o tradicional
repressão chega ao nível de exi- mETóDICO Da “pedido de referências”.
gir uma intervenção da Polícia DELaçãO Santo Amaro, na Zona Sul da
Federal para limpar a fábrica, cidade, sofreu uma vertigino-
ocupada pelos grevistas, porque É muito difícil demonstrar sa expansão industrial nos anos
a Justiça do Trabalho demora- como eram elaboradas as listas 70. Indústrias modernas, grandes
ria ainda quatro dias para jukgar negras, a não ser quando foram multinacionais e um operariado
o caso e seguramente mandaria fisicamente encontradas, ou por jovem, que rapidamente se cons-
que desocupassem a empresa. A testemunho de alguém que tenha tituiu como agente político, sur-
tranquilidade do diretor da em- participado de sua elaboração. giram. As grandes concentrações
presa é tanta que oficia também Como havia uma relação de con- industriais, como Nações Uni-

Investigação Final.indd 102 25/11/14 18:14


103

Capítulo 3
a aSSOCIaçãO aNTIOPERáRIa

TRANSCRIÇÃO DO TELEX COM DESTAQUE PARA AS PARTES GRIFADAS E A IMAGEM DO DOCUMENTO


ORIGINAL SEM PRECISAR ESTAR LEGÍVEL:

“SR. SECRETÁRIO DA SEGURANÇA PÚBLICA


URGENTE – URGENTE

CC: 1) GABINETE DO GOVERNADOR


2) SR. SECRETÁRIO DO TRABALHO
3) SR. DELEGADO DA POLÍCIA FEDERAL EM SÃO PAULO

CONFORME É DO CONHECIMENTO DE V. SA., OS FUNCIONÁRIOS DA SPRECHER + SCHUH DO BRASIL


S.A. DECRETARAM A PARALIZACAO DAS SUAS ATIVIDADES EM 29/02 PASSANDO PARTE DELES A OCUPAR
AS DEPENDENCIAS DESTA EMPRESA:
MUITO EMBORA A QUESTÃO JA SE ENCONTRE SUB JUDICE – FOI INSTAURADO O COMPETENTE DISSI-
DIO COLETIVO – OS OCUPANTES INSISTEM EM PERMANECER NAS DEPENDENCIAS DA EMPRESA ATE “A
VITORIA FINAL”.
A SPRECHER ENTENDE QUE ESTA OCUPAÇÃO EH ABSOLUTAMENTE ILEGAL, TENDO SE INICIADO NO
DIA 29/02 E SEM PERSPECTIVA DE SOLUCAO, AA VISTA DA RADICALIZACAO DOS GREVISTAS, MORMENTE
PORQUE SE ESTENDE POR PERIODO NAO COMPREENDIDO PELA JORNADA NORMAL DE TRABALHO.
NESTAS CIRCUNSTANCIAS,
A – PRESENTE A DETERMINACAO DOS GREVISTAS DE MANTER A OCUPACAO, CONFORME DECIDIDO
EM ASSEMBLEIA RECEM REALIZADA;
B – PRESENTE A OMISSAO DA SECRETARIA DAS RELACOES DO TRABALHO QUE, DEPOIS DE SOLICITA-
DA A INTERMEDIAR OS ENTENDIMENTOS PARA A DESOCUPACAO PACIFICA DO LOCAL NÃO PRESTOU A
MENOR COLABORACAO;
C – PRESENTE, AINDA, QUE A OCUPACAO SE ESTENDERA PELO MENOS POR MAIS QUATRO LONGOS
DIAS (QUANDO A EMPRESA DEVERIA PERMANECER FECHADA) JA QUE O DISSÍDIO DEVERA SER JULGADO
SOMENTE NO DIA 07/03, DANDO MARGEM AA EXPLORACAO DOS FATOS E, ATE MESMO A INCIDENTES IN-
DESEJAVEIS, DADA A PRESENCA DE ELEMENTOS ESTRANHOS AOS QUADROS DA EMPRESA E
D – PRESENTE, FINALMENTE, QUE A EMPRESA NAO TEM CONDICOES DE DEFENDER SEU PATRIMO-
NIO E SEU PESSOAL LEAL, NEM DE MANTER A ORDEM NO LOCAL, JA QUE OS OITO ENCARREGADOS DA
SEGURANCA ESTAO TRABALHANDO SEM DESCANSO DESDE O DIA 29/02.
A SPRECHER VEM PLEITEAR AS URGENTES – REPITO U R G E N T E S – MEDIDAS DESSA SECRETARIA, NO
SENTIDO DE RETIRAR AS PESSOAS QUE ILEGALMENTE OCUPAM O SEU ESTABELECIMENTO, BEM COMO
GARANTIR A INCOLUMIDADE MATERIAL DA EMPRESA E FISICA DOS NAO GREVISTAS.

ATENCIOSAMENTE,

PREBEN N. HAAGENSEN
DIRETOR PRESIDENTE
SPRECHER + SCHUH DO BRASIL S.A.
TELEFONES 548 70 44 – FÁBRICA
66 93 63 – DIR. RELACOES INDUSTRIAIS”

TELEx – EMPRESA PEDE a poLÍCia FederaL para desoCupar a FáBriCa.


aCerVo CpV-sp

Investigação Final.indd 103 25/11/14 18:14


104

investigação operária

das, Pedreira, Socorro, Cháca- do Pessoal de Santo Amaro, cas com a participação da di-
ra Santo Antônio, são os lugares e lá se partilhavam os conhe- reção do Sindicato, que apon-
onde foram gestadas as Interfá- cimentos da área de recursos tava os elementos da oposição
bricas e na greve de 1979 irrom- humanos e também vinham nessas fábricas. Muitos com-
peram os piquetões, com até dez informações sobre listas de panheiros estavam fora da
mil trabalhadores em greve que pessoas que a gente teria que produção. Com dificuldade de
circulavam pela região fazendo ter cuidado para contratar, encontrar trabalho, tinham
convencimento para ampliar a porque eram pessoas ditas que mudar de cidade, sair da
greve ou pressionando as empre- ‘ativistas’, pessoas que iriam categoria.
sas que montaram sistemas du- articular dentro das fábricas.
ros para impedir a participação Lembro que alguns que a Stanislaw Szermeta, conhe-
de seus funcionários. gente conhecia pessoalmen- cido no movimento como Stan,
Diante da expansão industrial te como o Jorge Preto e o Zé conta como os operários tenta-
e da crescente organização dos Cláudio. Eu mandei avisar vam se proteger dessa situação,
trabalhadores, não apenas meta- que não adiantava eles procu- muitas vezes em vão:
lúrgicos, as empresas se associa- rarem emprego na Zona Sul. Era um período em que traba-
ram na AAPSA - Associação dos lhávamos com boletins clan-
Administradores de Pessoal de Há um número incalculável destinos. Fazíamos pequenos
Santo Amaro, hoje denominada de cópias das fichas de registro boletins que eram passados
Associação Paulista de Recursos de empregados no arquivo do para as pessoas de confiança.
Humanos e de Gestores de Pes- DOPS. Tudo indica que existe Mesmo procurando preservar
soas. A entidade foi um mecanis- orientação de enviar as reprodu- minha pessoa, porque eu tinha
mo importante para identificar ções dessas fichas, que serviam ficha no DOPS, com o tempo
trabalhadores ativistas. como controle de fiscalização acabaram descobrindo quem
Foi possível documentar a por parte do Ministério do Tra- eu era e acabaram me man-
partir do testemunho de uma ex- balho das empresas na relação dando embora. Trabalhar na
-funcionária do Departamento de com seus empregados. Existem, época era muito difícil: se se
Pessoal da empresa suíça Sulzer, inclusive, fichas originais nos ar- associava no Sindicato, o Sin-
que por vezes substituía o titular quivos, enviadas pelas empresas. dicato acaba sabendo quem
nas reuniões da AAPSA, a ma- A melhor definição do cruel você era e em que fábrica tra-
neira como eram feitas as listas processo que impedia um traba- balhava. O Sindicato em 73,
dos trabalhadores que não deve- lhador de exercer sua profissão 74, ainda não tinha esse ma-
riam ser admitidos nas empresas. foi dada por Waldemar Rossi: peamento todo da categoria.
Terezinha e o marido, José Vi- Nas fábricas, à medida que Ele tinha mapeamento, acre-
torino Bispo, eram cristãos par- as pessoas eram detectadas dito, de regionais onde havia
ticipantes das CEBs e militantes como membros da oposição, conflitos maiores, que nem a
da Pastoral Operária. Sentia-se discretamente eram dispensa- Zona Leste. Na Zona Sul era
constrangida nas reuniões, ficava das. E corria aquela chamada meio verde, o Sindicato não ti-
calada, mas repassava aos com- ‘lista’, que não quero chamar nha o mapeamento de todo o
panheiros o que conseguia de in- de ‘negra’, porque isso é uma pessoal que trabalhava.
formações: discriminação incrível, mas
Eu trabalhei com uma enti- era a ‘lista vermelha’, marca- Anízio Batista relata sua expe-
dade chamada AAPSA, Asso- da pelo sangue da repressão, riência com as práticas de repres-
ciação dos Administradores que circulava entre as fábri- são e controle dos trabalhadores:

Investigação Final.indd 104 25/11/14 18:14


105

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

Havia perseguição, demis- carteira, de demissão de 12 A gente tinha que ter mil e um
são e deduragem de direto- de maio’. Era o dia em que ti- artifícios pra continuar ten-
res sindicais do Sindicato dos nha terminado a greve de 80. tando um lugar dentro de fá-
Metalúrgicos de São Paulo. Pensei na hora: ‘caramba, brica. Todas as pessoas que
Infiltração de delatores em então é isso!’. Peguei minha estavam caracterizadas como
fábrica de médio e grande carteira de trabalho, cheguei organizadores, como dirigen-
porte. A ‘lista negra’ já exis- em casa, arrumei água sani- tes da OSM-SP, tiveram essa
tia em 1980, na Metalúrgica tária e, com muito cuidado, perseguição.
Atlas, do grupo Ermírio de misturei um pouco de água
Moraes. Nas fichas de admis- nela; aí apaguei ‘maio’ e es- Da empresa Monark foram lo-
são perguntavam ‘Qual é a crevi ‘agosto’, ‘12 de agosto calizadas mais de 200 fichas de
sua religião?’, ‘Você é filia- de 1980’ na data de demissão. trabalhadores no DOPS.
do ao Sindicato?’, perguntas Dois dias depois consegui em- Vicente Espanhol (Vicente
desse tipo. Mas aí eu já esta- prego, mesmo sendo em uma Garcia Ruiz), ferramenteiro, mi-
va na ‘lista negra’. Fiz o teste boca de porco. Não conse- litante da Oposição Sindical Me-
para torneiro vertical, teórico gui mais emprego em fábrica talúrgica, relata:
e prático. Fui aprovado: che- grande. Cheguei à conclusão No mês de outubro de 1979,
guei ao DP e mandaram espe- que tinha encerrado a minha trabalhava na Indústria Villa-
rar 30 minutos. Nem me dei- carreira metalúrgica. res, na Estrada Interlagos
xaram pegar a profissional, à 4455 (Santo Amaro). Um dia
trouxeram na portaria. Cleodon Silva revela as difi- recebi, nessa empresa, uma
culdades enfrentadas pelos tra- intimação para me apresen-
A mesma história foi vivida balhadores que desejavam orga- tar no DOPS. Quando voltei
por Elias Stein: nizar a luta: para o trabalho na Villares,
Fui obrigado a procurar A partir de 1978, amplia- não me deixaram entrar. Fui
agências de empregos, coi- ram-se as demissões, per- despedido no Departamento
sa que nem me passava pela seguições, a ‘lista negra’, a de Pessoal. Só recolhi minhas
cabeça antes, mas já fazia perseguição direta mesmo, in- coisas acompanhado pelo
três meses que estava parado. clusive com a contribuição da guarda. O chefe me falou:
Cheguei lá na agência, o cara diretoria do Sindicato. Onde ”Você é um excelente profis-
pegou minha ficha e falou que havia muita gente trabalhan- sional, mas infelizmente te-
uma firma estava precisan- do demitiam mesmo, não de- nho que te mandar embora”.
do de fresador. Cinco anos de ram sossego, foi um combate Poucos dias antes, fizemos
experiência. Era a fábrica da aberto. Para você conseguir uma reunião de preparação
Philips, em Mauá. A secretá- um trabalho na fábrica você da greve dos metalúrgicos de
ria chamou, por telefone, o fazia um milagre. Me lembro São Paulo no Arco Íris, sub-
gerente da agência, que saiu que eu passei 79, 80...82... sede da região Sul (Av. Inter-
da sala. Ele deixou a ficha em quando fui trabalhar na Mo- lagos). Fui surpreendido com
cima da mesa. Fui lá e peguei, nark, tive que fazer um verda- a presença de uma pessoa do
por curiosidade, a ficha, com deiro disfarce: tirar a barba, departamento de pessoal da
os dados do que precisava a emagrecer 20 quilos porque Telefunken na reunião. Essa
empresa. Vi escrito lá embai- com a minha figura de 79 era pessoa nunca tinha partici-
xo: ‘observação: não man- impossível arrumar empre- pado e nunca mais a vi.
dar ninguém com a data, na go na zona sul de São Paulo. A delação me pareceu evi-

Investigação Final.indd 105 25/11/14 18:14


106

investigação operária

FICHA ENTREGUE peLa


teLeFunken aneXada ao
panFLeto Que ViCente distriBuÍa
Quando Foi detido em 78.
aCerVo pessoaL ViCente GarCia ruiz

MONARK ENvIOU ao dops a FiCHa de mais


de 200 GreVistas identiFiCados.
aCerVo apesp/dops os 1180

dente: ela comunicou sobre peitas de deduragem para o 2319 (Santo Amaro), e ser
minha participação na greve Sindicato acabar com a opo- despedido por liderar uma
de 1978 na Telefunken para a sição metalúrgica dentro das greve de ocupação da fábrica
Villares. A polícia e o pessoal fábricas. A veracidade des- por nove dias, fui trabalhar na
do DOPS já me conhecia, pois sa suspeita foi confirmada no Usimolde, na av. Armando Ar-
eles acompanharam a greve dia que veio, do Arquivo Pú- ruda Pereira, 394, Jabaqua-
da Telefunken no ano 1978, blico Estadual, o relatório so- ra, São Paulo. Um dia um dos
simulando proteção e fichan- bre a minha pessoa, pois veio diretores da Pial visita a Usi-
do todos nós. Notemos que a acompanhado da ficha de ad- molde, pois fazíamos moldes
greve estourou em outubro e missão na Telefunken junto para eles, e deu de cara comi-
no dia 30 morreu Santo Dias. com o panfleto que distribuí go. Trocamos aquele sorriso
Trabalhei na Villares cinco na porta dessa empresa. azedo. Depois de uma semana
meses. Vários lideres eram fui mandado embora apesar
despedidos enquanto o To- Vicente Espanhol relata ainda de meu profissionalismo. Por
ninho, representante do Sin- que esse caso de perseguição não que será? Quando colocamos
dicato, permanecia lá. Isso foi o único da sua carreira de me- em perigo a produção, fonte
aumentava a certeza de que talúrgico: de seus lucros, não tem profis-
nunca se comprometia nas Depois de trabalhar na Pial sionalismo que segure dentro
lutas e aumentavam as sus- Legrand, na av. João Dias, da fábrica.

Investigação Final.indd 106 25/11/14 18:14


107

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

A relação promíscua entre o


empresariado e a repressão política
Aditadura militar transformou o Instituto Médico Legal e o DOPS um diretor da FIESP – Federa-
Estado numa verdadeira máquina – Delegacia de Ordem Politica e ção das Indústrias do Estado de
de guerra contra o povo brasileiro. Social, que era a polícia política São Paulo, que entrava quase to-
Além de servir aos patrões, a dita- mais antiga do País. Os municí- dos os dias, sempre no final de
dura contava com o esquema pa- pios entravam com as suas guar- expediente, e não tinha horário
tronal para fazer a repressão polí- das e o serviço funerário. de saída. Algumas vezes o regis-
tica ficar mais ampla e abrangente. A ligação dos empresários tro de saída era no dia seguinte.
O SISNI – Sistema Nacional com o esquema de repressão po- Isso mostra uma intimidade tão
de Informações, órgão central de lítica sempre foi denunciada e grande que não tem como negar
repressão da ditadura, era coman- muitas vezes esteve relacionada ou alegar em contrário. Geraldo
dado pelo SNI – Serviço Nacio- com o financiamento dos tortu- Resende de Matos, o represen-
nal de Informações, uma enorme radores, com a contribuição em tante da FIESP, era identificado
rede de espionagem e repressão. dinheiro servindo como prêmio simplesmente pela sigla da enti-
Todos os ministérios tinham uma pelo serviço hediondo. No en- dade ou mesmo como delegado,
obscura DSI – Divisão de Segu- tanto, havia uma relação de cum- fato que mostra que sua frequên-
rança e Informação, e todas as plicidade ou mesmo cooperação cia naquele centro de torturas era
empresas estatais e universida- complementar. muito constante a ponto de con-
des tinham as ASI – Assessorias Nos documentos oficiais da fundir os funcionários do DOPS.
de Segurança e Informações, que ditadura, estava estabelecido que Nesses arquivos, existem
monitoravam os trabalhadores e as entidades privadas convenia- muitas fichas funcionais de tra-
controlavam todas as suas movi- das eram a ligação da ditadura balhadores apontados pelos pa-
mentações políticas ou trabalhis- com o esquema particular das trões como agitadores ou mesmo
tas. Nenhuma reivindicação ou empresas, que colaboravam com “subversivos”. Essa era a senha
ação de oposição era tolerada. a repressão oficial e complemen- para a repressão política agir
A estrutura desse enorme es- tavam o trabalho sujo da perse- com rigor, prender o acusado, e
quema de controle e repressão ti- guição militar. Esse esquema de a vida daquele chefe de família
nha divisões por comunidades. colaboração funcionava de for- seria colocada nas listas dos in-
Entre as comunidades havia as ma muito estreita e colaborativa desejáveis, que não arrumariam
militares, dos ministérios civis, entre patrões e os perseguidores. emprego e suas mulheres e filhos
do ministério de Relações Exte- O serviço de espionagem empre- passariam fome.
riores, que agia entre os exilados e sarial entregava as informações A relação promíscua entre
banidos, que eram as estruturas do sobre os seus funcionários para patrões e repressores é algo que
governo federal. E depois havia o DOPS, que prendia o trabalha- deve ser reprovado e rejeita-
as comunidades complementares, dor, e o patrão se sentia à vontade do pela democracia e não pode
que eram dos governos estaduais, para demitir e recusar os demiti- acontecer mais em nosso País.
municipais e as de entidades pri- dos de outras empresas.
vadas. Os Estados entravam para Nos livros de entrada do DOPS Ivan Seixas
o esquema de repressão com as de São Paulo encontra-se a pon- Coordenador da Comissão
polícias civis, militares, o IML – ta dessa rede. Lá está o nome de Estadual da Verdade

Investigação Final.indd 107 25/11/14 18:14


108

investigação operária

CADERNO DE REGISTRO
Caderno de reGistro de
entrada do dops, em Que
Constam os nomes de
GeraLdo resende de mattos
e CLaris HaLLiweLL

REPORTAGEM DO JORNAL O GLOBO,


de 10.03.2013, assinada por José
Casado e CHiCo otáVio

Investigação Final.indd 108 25/11/14 18:14


109

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

A relação entre o empresaria- ros blindados, caminhões e até Aliás, há uma entrada sem re-
do paulista e o DOPS é detalhada refeições pré-cozidas. gistro de saída de Claris Halliwell
pela reportagem do jornal O Glo- e Ênio Pimentel Silveira quando
bo, de 10.03.2013, assinada por A matéria ainda traz nomes de da prisão de Devanir José de Car-
José Casado e Chico Otávio. figuras que despontavam nesse valho, militante e líder sindical.
Geraldo Resende de Mattos, segmento industrial colaborador, Devanir foi torturado durante três
segundo a matéria, além do próprio Nadir Figueire- dias e assassinado no dia 7 de abril
frequentava os andares do do: Pery Igel, principal acionista de 1971. A entrada de Halliwell e
DOPS onde funcionavam as do grupo Ultra, Albert H. Boile- do capitão Ênio, conhecido tortu-
seções de Política e de Infor- sen, presidente do Ultra e diretor rador e assassino do DOI-CODI,
mações, três a quatro vezes por da FIESP/CIESP, Gastão Vidigal, no mesmo horário, mostra que
semana, no final do expedien- presidente do Banco Mercantil amSESIbos foram ao DOPS para
te. Essa foi sua rotina durante de São Paulo, Sebastião Camar- participar do longo processo de
sete anos, de 1971 a 1978 (…) go, sócio da construtora Camargo torturas de Devanir.
Tinha 52 anos e estava há 28 Correa, Adolpho S. Gordo, presi- Ainda, são verificadas recor-
no Serviço Social da Indústria dente do Banco Português, e Pau- rentemente, como mostra a ma-
(SESI), vinculado à FIESP. En- lo Ayres Filho, presidente da Pi- téria mencionada, as passagens
trou como “auxiliar” e cresceu nheiros Farmacêutica. do representante do SESI/FIESP,
a partir de uma relação de con- No Arquivo Público do Estado Geraldo Resende de Mattos, com
fiança com o industrial Nadir de São Paulo, foram encontrados destaque para os horários inusita-
Dias Figueiredo. alguns livros de registro de entra- dos e pouco convencionais em que
da no DOPS. Muitos nomes liga- aconteciam, em plena madrugada.
O empresário mencionado, Na- dos ao setores empresarial e mili- Geraldo Resende de Mattos,
dir Dias de Figueiredo, foi respon- tar aparecem nesses documentos. muito embora fosse formalmen-
sável pela eleição dos presidentes Algumas figuras importantes, te funcionário do SESI, trabalha-
da FIESP ao longo de três déca- como o cônsul norte-americano, va para a direção da FIESP. As re-
das. Era importante peça entre os Claris Halliwell, que teve envol- lações incestuosas e obscuras das
industriais na articulação com os vimento comprovado com os re- Federações das Indústrias com
militares. gimes ditatoriais no Chile e no os chamados “Serviços Sociais”,
A FIESP organizava fundos de Equador depois de sua estada no como SESI e SENAI, merecem
grandes somas de dinheiro para Brasil, o capitão Ênio Pimentel uma profunda investigação.
contribuir com o aparato repres- Silveira, do DOI-CODI, Alcides São contratos de consultoria,
sivo, frequentemente em reuniões Cintra Bueno, delegado responsá- prestação de serviços, emprésti-
promovidas por Gastão de vel por garantir os laudos falsifi- mos de funcionários, gastos lan-
Bueno Vidigal (Banco Mercan- cados das mortes dos presos polí- çados de uma para outra entidade.
til de São Paulo), João Batis- ticos junto à equipe do IML, além Não é de hoje a denúncia de que o
ta Leopoldo Figueiredo (Itaú de representantes da cúpula do II Sistema S é uma caixa preta.
e Scania), Paulo Ayres Filho Exército, possuem suas entradas As centrais sindicais nos anos
(Pinheiros Produtos Farma- registradas, frequentemente casa- 90 firmaram posição comum de
cêuticos), e o advogado Pau- das com datas de repressões espe- reivindicar a gestão tripartite do
lo Sawaia, entre outros. Em- ciais no DOPS, como assassina- Sistema S como forma de garantir
presas como Ultragaz, Ford, to de presos políticos e prisões de a transparência na administração
Volkswagen, Chrysler e Super- grupos perseguidos, segundo in- dos recursos públicos, apropria-
gel auxiliaram também na in- vestigações da Comissão Estadu- dos de maneira privada pelo em-
fraestrutura, fornecendo car- al da Verdade de São Paulo. presariado.

Investigação Final.indd 109 25/11/14 18:14


110

investigação operária

A FáBRICA
DE MORTOS

ALIPERTI:
A FáBRICA DE
HORRORES tamBém

UM CAMPO DE
preJudiCaVa a
popuLação. são

CONCENTRAÇÃO
pauLo/sp, 1979.
riCardo aLVes
aCerVo iiep/proJeto
memória osm-sp
NO BRASIL

I
magine uma fábrica no século XX com condições de traba-
lho do século XVIII. A segurança interna utilizando carabinas
contra os trabalhadores, a presença da polícia dentro da fá-
brica. Como explicar a ocorrência de 12 mortes de trabalhadores
dentro da empresa de 1986 a 1989, em apenas três anos?

Investigação Final.indd 110 25/11/14 18:14


111

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

Essa era a Siderúrgica J. L. Ali- confiança dele. O Costa (en-


perti, localizada no bairro da Água carregado geral da Seguran-
Funda, Ipiranga, em São Paulo. ça) é um deles. Batiam em
Poluidora, como nos primórdios funcionários lá dentro, isso
da Revolução Industrial, espalha- era normal para eles. Era até
va doenças respiratórias na popu- para mostrar para o resto da
lação que vivia no seu entorno. rapaziada para não reagir e
Contaminava o ar e o solo com não fazer nada que não fosse
O Trabalho Liberta “Arbeit
uma lagoa de decantação até hoje Macht Frei”. Dístico na
do agrado deles.
visível. Era um inferno para quem entrada de campos de
nela trabalhava e um tormento concentração nazista. A relação íntima entre a empre-
para quem morava em volta. sa e os órgãos de repressão era do
A imagem mais próxima des- conhecimento de todos. Os segu-
sa siderúrgica é a de um campo de ranças da empresa empurravam
trabalho forçado, como os instau- tivesse acontecido a caminho do os trabalhadores com a ponta das
rados nos países ocupados pelas hospital. armas. De acordo com Zezinho,
tropas nazistas durante a Segun- O padre operário Raimundo teve uma época que para sair
da Guerra Mundial. Os campos de Perillat, que foi pároco no bairro, faziam um corredor polonês,
trabalho, com mão de obra escra- de 1972 a 1976, na Igreja de San- e se eles cismassem que você
va, são uma das variações de cam- to Afonso, lembra que muitas ve- estava trazendo algum peda-
pos de concentração (konzentra- zes ouvia falar: morreu mais um ço de ferro, de cobre, eles pa-
tionlager ou lager). trabalhador na fábrica. “Se a gen- ravam e te revistavam. Era a
José Felix, o Zezinho, que tra- te pudesse fazer uma pesquisa de polícia, não eram os guardas
balhou na Aliperti por 34 anos e quantos trabalhadores morreram da fábrica. O tenente (Por-
se manteve empregado porque durante 50 anos iríamos ficar mui- tugal) botava a polícia civil
estava na “lei velha” (anterior to impressionados”, declara. para revistar.
ao FGTS), cipeiro várias vezes, A postura da empresa foi mais
conta: repressora entre 1964 e o final da O caso Aliperti também foi
Eu trabalhava em uma ponte década de 1970. A Polícia teve, marcado pela omissão do Sindica-
rolante de uns 8 a 10 metros de por muitos anos, livre trânsito to quanto aos acidentes de traba-
altura. O eletricista morreu lá para reprimir os trabalhadores, lho e a repressão aos trabalhado-
em cima eletrocutado em alta chegando ao ponto de o delega- res. Os funcionários contam que
tensão. Tiraram na corda, bo- do do 35º DP, próximo à empre- quando havia registro de aciden-
taram na ambulância e o regis- sa, circular com a viatura dentro tes dentro da fábrica e os fiscais
tro foi de que morreu no hos- da Aliperti. Absolon Gaspar, fun- do trabalho intervinham, o Sin-
pital. Era feito tudo junto com cionário da Aliperti por sete anos dicato amenizava o fato e libera-
a polícia. O tempo em que eu e vice-presidente da CIPA na fá- va o local para a continuidade do
estava lá vi muitas mortes, mas brica, lembr: trabalho. Só após 1978, os traba-
nunca foi falado que o cara os caras da segurança da Ali- lhadores articulados com a Opo-
morreu dentro da fábrica. perti eram todos caras que sição Sindical Metalúrgica de São
tinham servido ao Exército, Paulo passaram a se organizar na
A empresa se negava a admi- trazidos pelo tenente reforma- fábrica para reivindicar melhores
tir que os trabalhadores perdiam do do Exército, Lauro Portu- condições de trabalho e segurança
sua vida por acidentes e os regis- gal (Responsável Industrial no exercício das funções. Impul-
tros eram feitos como se a morte na Aliperti), todos homens de sionados pelas greves da catego-

Investigação Final.indd 111 25/11/14 18:14


112

investigação operária

ria metalúrgica, os trabalhadores


começam a enfrentar de forma
mais aberta a empresa.

Greve por
segurança no
trabalho

Depois de 1985, ano da Cam-


panha Salarial Unificada (meta-
lúrgicos, têxteis, borracheiros,
químicos, entre outras), as mani-
festações e enfrentamentos com
a empresa se tornam frequentes.
O trabalho de conscientização
era feito dentro e fora da Aliper-
ti, com a ajuda de companheiros A população moradora sofria os efeitos da
que atuavam na Oposição e dis- contaminação da fábrica e se mobilizava protestando.
São Paulo/SP, 1986.
tribuíam panfletos na porta da fá- Acervo IIEP/Projeto Memória OSM-SP
brica. Entretanto, mesmo do lado
de fora dos portões, a empresa
mantinha a postura de repressão.
No ano seguinte, as denúncias
contra as más condições de traba- do Sindicato dos Metalúrgicos daqui é subversivo. Nós vamos
lho alcançaram a sociedade, im- em 1978 pela OSM-SP, lembra mandar você para o Dops’.
prensa e impulsionaram a mobi- que quando distribuía panfletos
lização sindical. A luta constante em frente à Aliperti, os seguran- Com uma série de reivindica-
da comunidade, das pastorais, ças da empresa o empurravam ções, os operários unidos organi-
dos trabalhadores e da OSM- com a ponta do cano das cara- zaram uma greve em 1986, conhe-
-SP recebe pela primeira vez o binas: cida pelos trabalhadores como um
apoio de setores da diretoria do Todas as vezes em que a gen- momento de vitória. Meses de-
Sindicato. Na eleição de 1981, o te ia panfletar na Aliperti fica- pois, a morte de Geraldo Gregó-
PCB e alguns grupos da esquer- va um só para vigiar, para que rio da Silva levou a uma nova pa-
da passam a compor a diretoria qualquer coisa que aconteces- ralisação. Como lembra Absolon,
do Sindicato. Há a tentativa do se, pudesse ligar para o ad- uma fábrica que nem sequer
reconhecimento da Comissão de vogado. Nesse dia, eu estava fazia boletim de ocorrência de
Fábrica runindo o Sindicato ofi- sozinho cumprindo a troca de um companheiro que morria
cialmente representado por al- turno das duas horas da tarde. dentro da empresa. Naquele
guns diretores e a CUT Regional Acabei de panfletar e saí. Veio dia, os companheiros Carlú-
Grande São Paulo, contribuindo o cara da segurança da Aliper- cio Castanha e Chico Gordo
para pressionar a empresa. ti junto com a polícia, me pega- fizeram parte da Aliperti pa-
ram e eu fui parar no 35º DP. rar e os 2.800 funcionários
Anízio Batista, morador da O delegado pegou o monte de acompanharam o enterro do
região e candidato à presidência panfleto e falou assim: ‘Isso companheiro.

Investigação Final.indd 112 25/11/14 18:14


113

Capítulo
a fábrica 3
de mortos
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

Lista com 12 mortos


na Aliperti entre
1986 e 1989.
São Paulo/SP.
Acervo IIEP/Projeto
Memória OSM-SP

Fábrica? Presídio? Campo de


trabalho? Guardas da empresa
usavam carabinas.
São Paulo/SP, 1979.
Acervo IIEP/Projeto Memória OSM-SP

A fábrica parou
para, pela primeira vez,
acompanhar o enterro
do operário Gregório
morto. São Paulo/SP, 1986.
Acervo IIEP/Projeto
Memória OSM-SP

Raimundo Perillat
em ato religioso sobre
a morte de operário.
São Paulo/SP, 1986.
Acervo IIEP/Projeto Memória OSM-SP

Investigação Final.indd 113 25/11/14 18:14


114

investigação operária

Mobilização dos trabalhadores


na porta da fábrica. Carlúcio
Castanha ao microfone.
São Paulo/SP, 1986.
Acervo IIEP/Projeto Memória OSM-SP

Cartaz e capa do jornal


da CUT-Oposição Metalúrgica
sobre a morte de Geraldo
Gregório da Silva, quarto
dos mortos na fábrica em 1986.
São Paulo/SP.
Acervo IIEP/Projeto Memória OSM-SP

Aliperti em 2014, controlada


pelo grupo Gerdau. A imunda lagoa
contaminante permanece.
São Paulo/SP, 2014.
Ricardo Alves
Acervo IIEP/Projeto Memória OSM-SP
Raimundo Perillat; José Felix,
o Zezinho, e Absolon Gaspar
em oficina na Sudeste.
São Paulo/SP, 2012.
Ennio Brauns
Acervo IIEP/Projeto Memória OSM-SP

Investigação Final.indd 114 25/11/14 18:14


115

Capítulo 3
a aSSOCIaçãO aNTIOPERáRIa

TECNOFORJAS:
EMPRESA, DOPS E
TUMA CONTRA OS
TRABALHADORES

CONQUISTAR A COMISSÃO DE FáBRICA:


Questão de Honra para os operários.
oBoré

Investigação Final.indd 115 25/11/14 18:14


116

investigação operária

FICHA DE REGISTRO de empreGados entreGue ao dops


apesp/Fundo dops 43-z-0 5112

O CASO ALBINO

A
lbino Barzi sempre achou em razão do Sindicato pedir Os documentos encontrados
que suas demissões tinham para fazer levantamento so- permitem reconstruir toda a tra-
a ver com a participação em bre a minha pessoa. Um com- ma: cooperação aberta da em-
lutas reivindicatórias nas empre- panheiro meu, que trabalhava presa com o DOPS , o DOPS
sas. Desconfiava dos diretores do junto comigo, que era tornei- falando em nome da Delegacia
Sindicato dos Metalúrgicos. Na ro mecânico, me disse: ‘Al- Regional do Trabalho – DRT e
oficina da Investigação Operária bino, você vai ser mandado do ministro do Trabalho Murilo
da Zona Leste, em 11 de agosto embora ainda hoje porque o Macedo. No dia 15 de novem-
de 2012, afirmou: Sindicato esteve aqui e dedou bro de 1979 no jornal Repúbli-
“Sim, fui dedurado na Meta- você’. E realmente aconteceu, ca, Ricardo Carvalho na maté-
lúrgica São Rafael pelo Sin- naquele dia fui mandado em- ria “Um entrosamento perfeito”,
dicato. Companheiros da bora. Antes eu trabalhava na disse que na sala do Sr. Fontana,
empresa receberam a infor- Tecnoforjas, e o Sindicato pe- diretor superintendente da Tec-
mação pela pessoa que traba- diu a essa empresa que fizesse noforjas, acompanhou o diálogo
lhava no departamento pes- um levantamento a meu res- com um Dr. Otávio, que prome-
soal, que eu seria demitido peito”. teu enviar dois investigadores e,

Investigação Final.indd 116 25/11/14 18:14


117

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

se necessário, algumas viaturas.


O Dr. Olavo é Olavo Reino Fran-
cisco. O relatório minucioso, fei-
to pelo policial na visita à fábrica
e na Igreja da Sagrada Face onde
se reuniam os grevistas, é coin-
cidente com a matéria, omitindo
o policial os aspectos de repres-
são ostensiva como a tentativa de
prisão de lideranças . Os relatos
de Albino são confirmados pe-
los dois textos. Mas a realidade
é pior do que imaginava ou podia
saber o operário.

O que disse Albino:


“Na Tecnoforjas presenciei
a repressão comandada dire-
Repórter do República comprova
tamente pelo delegado da Po- a relação empresa/DOPS
lícia Federal, o Romeu Tuma, Acervo IIEP/Projeto Memória OSM-SP

que determinou minha prisão,


que só não aconteceu porque
a companheirada não deixou.
Nessa empresa havia policiais
que trabalhavam na sua segu-
rança de rotina[...]”
“[...]nossa greve começou um
dia antes da greve geral dos
metalúrgicos de São Paulo
em 1979. Aquela que o Santo
Dias foi assassinado. A gente
não confiava e não aceitou o
Sindicato dos Metalúrgicos
nas negociações, a gente teve
a presença do Pereirinha, que
estava na mesa de negociação
com a gente. Ele foi eleito na
assembléia dos metalúrgicos
presidente da Comissão de
Negociação com a FIESP. A
Oposição estava forte e con-
seguiu que o Pereirinha repre- Operários pedem apoio à população
CPV-SP
sentasse os trabalhadores. Ti-
nha muita desconfiança com

Investigação Final.indd 117 25/11/14 18:14


118

investigação operária

RELATÓRIO DO DOPS:
diretor da teCnoForJas entreGa as
FiCHas pessoais dos FunCionários
GreVistas.
apesp/Fundo dops 43-z-0 5115

Investigação Final.indd 118 25/11/14 18:14


119

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

a diretoria. A repressão poli- dade das refeições; adicional de go com o padre Patrick Mac Na-
cial veio pelo DOPS. A gente insalubridade na forjaria; solda mara, que cedia o espaço para as
teve uma repressão bastante e lixadeiras; ampliação e melhor reuniões dos trabalhadores.
pesada, com várias negocia- atendimento na enfermaria; uni- Fala com o Pereirinha, inda-
ções, inclusive com a presen- forme gratuito e equipamentos ga onde trabalha e o seu papel de
ça do assessor do Ministério de proteção e higiene nos ves- mediador pela Comissão de Sa-
do Trabalho, o Murilo Mace- tiários. São reivindicações de lários.
do, que as negociações não condições básicas de trabalho. O policial, em seu relatório,
andavam e a gente acabou Exigem a instalação da CIPA - atesta que foi “bem recebido pe-
ficando, acabou a greve dos Comissão Interna de Prevenção los grevistas”, que forneceram os
metalúrgicos de São Paulo e de Acidentes - obrigação legal dados que possibilitaram o rela-
a nossa greve continuou. Essa da empresa. Pelas reivindica- tório. Como policial, os intimou
greve vinha em razões de pro- ções apresentadas, ficam evi- a prestar, posteriormente, escla-
blemas de um companheiro dentes as péssimas condições recimentos no DOPS. Intimou
que na madrugada, de tanto de trabalho que os 550 operários um membro da Comissão de Fá-
fazer hora extra, perdeu parte dessa empresa enfrentavam no brica e o Pereirinha.
da mão. Por isso que começou seu dia a dia. O que a matéria do jornal Re-
um dia antes da greve geral As outras exigências mostram pública desvenda é a firmeza dos
dos metalúrgicos de São Pau- a organização dos trabalhadores trabalhadores “ou o patrão fecha
lo e ela terminou depois. Nós e seu nível de participação: rea- a firma ou volta a negociar”. Re-
tivemos a presença do delega- dmissão dos demitidos e insta- lata o clima fraterno. Uma peque-
do Romeu Tuma; ele deu voz lação e reconhecimento da Co- na dispensa nos fundos da igreja,
de prisão tanto pra mim, pro missão de Fábrica eleita pelos a sopa para quem está em vigí-
Pereirinha, dentro da Sagra- trabalhadores com estabilidade lia. O apoio do Sindicato dos me-
da Face.” de dois anos. talúrgicos de Santo André e São
Apesar da ameaça da empre- Bernardo. A divisão dos alimen-
O assessor do ministro citado sa de demitir todos os grevistas, tos arrecadados entre as famílias,
era José Victorio Moro. de ampliar o turno da minoria o rateio para pagar o aluguel de
O relatório do policial diz que que estava trabalhando, a greve alguém.
foram acionados pela empresa segue firme na exigência da Co- A reportagem conta o que o
na pessoa do diretor A. Fontana, missão de Fábrica. A empresa já dr. Olavo omite. “[...] estão, en-
que apontou como agitadores tinha concordado com as outras tretanto, um pouco tensos com a
quatro trabalhadores, que foram reivindicações. pressão policial, principalmen-
demitidos, entre eles, Albino A exigência da Comissão te em cima do Pedro Pereira do
Barzi. A empresa entregou as da Fábrica gera o impasse. E o Nascimento, que é da Comissão
fichas funcionais dos operários DOPS, na pessoa de Dr. Olavo de Campanha Salarial do Sindi-
ao policial. São fotocópias do li- Reino Francisco, faz a negocia- cato e que, na segunda-feira só
vro de registro dos funcionários. ção no lugar da DRT. não foi levado ao DOPS – que
O policial lista as reivindicações O policial reconhece que a chegou a entrar na igreja à sua
dos trabalhadores em greve, que greve não necessita de piquetes, procura – porque os outros ope-
evidenciam as péssimas condi- os trabalhadores estão unidos rários fizeram logo um cerco e o
ções de trabalho: ampliação do e organizados. Relata sua ida à delegado Olavo preferiu conver-
horário de café; preço e quali- Igreja da Sagrada Face, o diálo- sar na igreja mesmo”..

Investigação Final.indd 119 25/11/14 18:14


120

investigação operária

nem todos
Colaboraram
exercendo trabalho que desen-
volvia na França no ramo empre-
sarial da eletricidade. No ano de
1968, casado com a fotógrafa Nair
Benedicto, engajou-se e apoiou as
mobilizações estudantis e operá-
rias. Em seguida, deu apoio logís-
tico à ALN (Aliança Libertadora
Nacional), sendo preso no episó-
dio do sequestro do embaixador
norte-americano. Após 13 meses
de prisão, Jacques retomou sua
vida de empresário e apoiou vá-
rios companheiros militantes, per-
seguidos ou recém-saídos da pri-
são, oferecendo emprego na sua
JACQUES BREYTON, da LÉO MARCONI, da empresa. Não fazia benemerên-
teLem s/a. metaLÚrGiCa Grampos aço. cia, mas fornecia apoio político.
aCerVo FamÍLia Breyton aCerVo pessoaL Léo marConi
A empresa tinha critérios normais
de admissão, só abria exceção aos
perseguidos. Para completar a sua

A
trajetória, participou da luta pela
colaboração da maioria es- proprietários de empresas e, por anistia e da formação do Partido
magadora das grandes em- isso, estavam mais vulneráveis à dos Trabalhadores.
presas e das associações pressão da fiscalização de autori- Era vigiado pelo DOPS, em
patronais com os órgãos da re- dades do fisco, do trabalho e, até cujos documentos consta o regis-
pressão durante a ditadura con- mesmo da repressão, diretamen- tro do veículo de propriedade da
firma, cada vez mais, a tese que te. Ambos são imigrantes. Um é empresa usado por Nair Benedic-
a ditadura foi empresarial-civil- francês, o outro, italiano. to no apoio à Chapa da OSM-SP
-militar. Mas eram os empresá- nas eleições fraudadas no Sindi-
rios obrigados a cooperar? E os jaCquES cato dos Metalúrgicos em 1978. É
que não cooperavam? de Nair o mais importante regis-
Dois empresários da cidade de Jacques Breyton (1921 - 2005), tro das eleições, inclusive as fo-
São Paulo, do ramo metalúrgico, o francês, proprietário da empresa tos do material de campanha da
não foram colaboradores da dita- de iluminação e cenotecnia Telem- Chapa de Oposição encabeçada
dura. Coerentes com suas convic- -Técnicas Eletromecânicas S/A, por Anízio Batista. O seu trabalho
ções políticas, participaram a seu foi da Resistência Francesa con- será usado, anos depois, no livro
modo da resistência ao regime tra a ocupação alemã na Segun- “Santo Dias: quando o passado se
militar e da luta pela democrati- da Guerra. No final da década de transforma em História”, do qual
zação do País. Não eram grandes 1950 estabeleceu-se no Brasil, é autora com Jô Azevedo e Lucia-

Investigação Final.indd 120 25/11/14 18:15


121

Capítulo 3
a aSSOCIaçãO aNTIOPERáRIa

na Dias. Na Telem foi filmada a


cena de simulação da greve den-
tro da fábrica no filme Braços cru-
zados, máquinas paradas, de Ro-
berto Gervitz e Sérgio Toledo.

LÉO

O outro empresário que se re-


cusou a colaborar com a repres- DOPS APONTA CARRO de JaCQues
são foi Léo Marconi, proprietário usado em apoio a CHapa da
oposição. maio
da Metalúrgica Grampos Aço. de 1978.
Chegou ao Brasil após se recu- aCerVo apesp – Fundo dops. 50-B-58-2504

sar a servir ao Exército na Itália,


em 1968. No país de origem, ha-
via participado de manifestações
contra a Guerra do Vietnã e feito
piquetes em fábricas. No Brasil, perguntou: ‘esse cara traba- Zico, hoje deputado estadual
começou a trabalhar na Grampos lha aqui?’. Na hora me toquei pelo PT, ficou 28 dias preso e re-
Aço, empresa criada pelo tio, que e disse: ‘Ah, esse é um nome tornou à Grampos Aço: “Meu pa-
faleceu pouco depois, deixando- comum. Não tenho certeza’. O trão entendia tudo, sabia das con-
-lhe a empresa. policial ficou nervoso e disse dições. Voltei para a fábrica numa
A origem italiana aproximou que iam descer e procurar na boa; para se ter uma ideia, ele só
Léo de padres de uma igreja no empresa. Eu falei: ‘Não! Vou não pagou os dias, mas o 13º eu
bairro de São Mateus, Zona Les- mandar ver se está na fábrica’. recebi completo”.
te de São Paulo. Os padres pe- O Zico subiu no escritório com Léo Marconi, que ainda hoje
diram-lhe que empregasse José a estopa na mão. A polícia ti- continua a dirigir a empresa, che-
Zico Prado, metalúrgico da nha se escondido e quando ele gou a empregar, na época, outros
OSM-SP e militante da Ação Po- entrou na sala já foi agarrado e trabalhadores perseguidos pelo
pular, que vinha sofrendo perse- preso. Eu falei que não podiam regime, como o padre-operário
guição na Metalúrgica Matara- fazer isso. O policial colocou Franco Torresi e Elias Stein.
zzo, onde trabalhava. Depois de a arma no meu ombro e falou Elias, que trabalhava como fre-
três meses de trabalho como fer- assim: ‘Vamos resolver isso sador, saía uma vez por semana,
ramenteiro, Zico foi preso pelo então, você também vai com a no horário do expediente, para ir
DOPS dentro da fábrica, mesmo gente’. O contador falou que ao DOPS assinar o documento
com a resistência do patrão: não podiam me levar, porque da menagem, o que ocorreu du-
“O rapaz veio me avisar que a eu era o dono da empresa”. rante alguns meses, até o advo-
polícia estava na porta. Quan- gado, José Carlos Dias conseguir
do vi, a fábrica estava cercada. De acordo com Léo Marconi, as derrubar a exigência. Essas horas
Tinha policial em todo lado, empresas no período da ditadura eram compensadas nos outros
meio escondidos, com metra- eram obrigadas a entregar aos ór- dias. Como Jacques, Léo Marco-
lhadoras apontadas. O poli- gãos de repressão as fichas funcio- ni não fazia caridade, mas apoia-
cial me mostrou um papelzi- nais. “Depois que o Zico foi preso, va, com dignidade, os que resis-
nho com o nome do Zico e me nunca mais entreguei”, declarou. tiam às arbitrariedades.

Investigação Final.indd 121 25/11/14 18:15


122

investigação operária

O SINDICALISMO
A SERvIÇO
DE DOIS SENHORES
O ESTADO E O PATRÃO

“DIGA COM QUEM ANDAS


e te direi Quem és”:
JoaQuinzão CoLoCa
Foto de GeiseL
em sua saLa de
traBaLHo.
apesp/Fundo ÚLtima Hora

Investigação Final.indd 122 25/11/14 18:15


123

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

A HISTóRIA DO PELEGO CAMALEÃO

Escrito em maio de 1981. Ainda pela manhã


Nova eleição no Sindicato dos Chegou o interventor
Metalúrgicos de São Paulo. Foi Não era um militar
um embate que mobilizou gran- Porém um operário traidor
des parcelas de trabalhadores de Mathias viu o amargor da
várias outras categorias. A Opo- verdade
sição ganhará o 1º turno. A vi- Estava ali Joaquim Andrade
tória será alcançada exatamente Com cara de puta sem pudor
dentro das fábricas. Mas perderá Mandou Mathias pra fábrica
para a máquina assistencial-bu- Ameaçando despedi-lo sem
rocrática no 2º. turno. direito
Cumpriu as ordens militares
A humanidade jamais esquece Fez o trabalho bem feito
História de heróis e assassinos Junto com o DOPS trabalhou
Às vezes perdoa e glorifica Dedou todos não falhou
Tiranos, ladrões e cretinos A traição foi no jeito
Porém nunca dá seu perdão
A crimes de traição Joaquim organizou tudo
Ainda que sejam ladinos Não teve dúvidas nem medo
Para ajudar os patrões Reuniu uma boa pelegada
Judas entregou cristo Veio o golpe militar E lhes ensinou o enredo
Num ato de traição Com a luta operária Dar dentistas prá peãozada
A humanidade nunca esquece Eles tinha que acabar Manter a turma enganada
E todo ano há malhação Juntaram puxa-saco e delatores Mantendo duro o seu dedo
Cacete e ferro no traidor Nomearam os interventores
Que nunca encontra defensor Para os sindicatos controlar Assim Joaquim
Nem obtêm o perdão Teve outros traidores
Três dias depois do golpe Prá manter na memória
O que aqui vamos relatar Chega em Guarulhos um Digo o nome dos delatores
É a história de um traidor interventor Clemiltre Guedes foi para
Que deixou de ser operário Ele foi substituir S. Bernardo
Vendeu-se sem pudor José Mathias, um lutador Dos militares era pau mandado
Mandou operário pra trás da Homem de grande respeito Para dedar os lutadores
grade Sempre defendia o direito
É Joaquim dos Santos Andrade E lutava com ardor Bernadino Testa
O nome do delator Vai prá São Caetano
Mathias, presidente do sindicato Orlando Malvezzi fica em
Vou começar a história Um metalúrgico combatente S. Paulo
No dia 2 de abril No dia 2 de abril Tudo isso no mesmo ano
Do ano quente de 64 O DOPS lhe deixou ciente João Vicente fica assessor
Na queda do governo civil Estava decretada a intervenção Que pra dedar usa o tutano
Interviram vários atos E não podia deixar o salão
Fazendo a lei no fuzil Sem o interventor estar presente Esta cambada de traidores

Investigação Final.indd 123 25/11/14 18:15


124

investigação operária

A
Pelos militares adestrados Vai ser prejuízo pra categoria importância do Sindica-
Formavam os pelegos do estado Que desta equipe só viu to dos Metalúrgicos de São
Deixando os patrões deslealdade Paulo ganha relevo político
contentados principalmente a partir da déca-
Prisão e exílio pros lutadores Pra completar meu recado da de 1950. A categoria teve forte
Foi a grande obra dos delatores Quero lembrar um fato presença nas lutas dos trabalha-
Sendo por isso premiados Sebastião de Paula Coelho
Foi advogado do Sindicato dores no período pós-Segunda
Na estratégia dos militares Do Departamento Jurídico foi o Guerra Mundial, fortalecendo
A coisa tava bem bolada chefão ativamente as massivas greves
Limpar os sindicatos menores Encarregado de defender o peão gerais.
No mais forte juntar a pelegada Poucos sabiam que era um rato Em 1953, a Greve dos 300 Mil
São Paulo teve a concentração durou de 26 de março a 23 de
Dos mestres da traição Por ter prestado “bons abril e contou com participação
Pra sustentar barra pesada serviços” dos têxteis, metalúrgicos, gráfi-
Por MALUF foi premiado cos, vidreiros e marceneiros. O
O sindicato dos Metalúrgicos movimento conseguiu 32% de
É uma grande força da nação Ele é SECRETÁRIO DO
reajuste salarial, a libertação de
Reúne 426 mil trabalhadores TRABALHO
E significa grande união E começa a ser falado grevistas que tinham sido pre-
Só em São Paulo - Capital Hoje é homem de confiança sos ao longo da mobilização, e o
É uma força vital Acertou o passo da dança compromisso de não descontar
Que põe medo no patrão Com o governador do estado os dias parados. Em 1957, houve
a Greve dos 400 Mil, que durou
Por ser uma força vital Cito este fato real de 15 a 24 de outubro de 1957.
Ele é muito cobiçado Para que ninguém esqueça Essa greve foi ainda mais mas-
Governo, partidos e políticos Pois o pelego é Camaleão siva que a greve de 53, não ape-
Querem ter ele controlado Com cara nova pode ser que nas pela participação de número
Afastar os trabalhadores apareça
mais amplo de categorias, mas
Colocar enganadores Muda de cor quando lhe convém
Sempre é o plano traçado A vergonha não lhe detêm também porque retomou uma
Tá com MALUF na cabeça. paralisação geral contra o custo
Dezessete anos passaram de vida. Destaca-se também his-
De arrocho, miséria e traição toricamente a Greve dos 700 Mil
Fizeram “milagre” com nosso Os cordéis de Pedro Ma- em 1963, de 29 de outubro a 3 de
sangue cambira eram instrumentos de novembro, que mobilizou 14 ca-
Controlando nossa organização combate. Circulavam nas fá- tegorias. A greve foi mais ampla
Prendendo e matando lutadores bricas como instrumento de in- e mais organizada do que as an-
Ajudados pelos traidores tervenção política. Macambi- teriores, unificando uma grande
Aumentaram o lucro do patrão
ra era Cleodon Silva, dirigente campanha salarial; o Sindicato
Estamos em tempo de eleição da OSM-SP. A sua coletânea de dos Metalúrgicos conseguiu pa-
É grande oportunidade cordéis mereceu a atenção res- ralisar 90% das empresas. Mes-
Afastar esta equipe de peitosa de Florestan Fernandes, mo assim, o realinhamento das
interventores que fez a apresentação. Os cor- forças repressivas nesse momen-
Que tem por chefe Joaquim déis podem ser encontrados no to resultou nos números de 2 mil
Andrade endereço eletrônico www.iiep. trabalhadores presos e 8 mil es-
Mais três anos com esta diretoria org.br pancados.

Investigação Final.indd 124 25/11/14 18:15


125

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

1972: Cleodon Silva na


assembleia do Sindicato. Na mesa, Orlando Malvezzi,
Joaquim Andrade, Nelson Gardussi e José Policarpo.
Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM-SP

Desde a década de 1950 até o Movimento Sindical Renovador. “efeito demonstração” pre-
golpe militar, a direção do Sindi- Sobre essas organizações: tendia-se, a partir de peque-
cato era identificada com a esquer- “A formação de líderes, orien- nos núcleos bem formados,
da brasileira, com hegemonia dos tação estratégica que sempre a difusão e transferência dos
militantes do Partido Comunista norteou a ação dos jesuítas valores cristãos da organiza-
Brasileiro, iniciada com a eleição no Brasil, os incentivadores e ção à sociedade“.
de Remo Forli em 1953. Os comu- assistentes dos Círculos Ope-
nistas Forli, José de Araújo Pláci- rários, visava formar traba- Esse segmento da categoria
do, José Bustos, Eugenio Chemp, lhadores segundo a sua orien- dos metalúrgicos sempre teve
Fortunato Martinelli e Afonso De- tação religiosa tradicional e como visão política a coopera-
lellis serão o núcleo da direção do politicamente legalista e re- ção de classe, agindo para faci-
Sindicato até 1964. formista, para que estes vies- litar o interesse do empresariado
Havia uma oposição de direi- sem a ter uma participação nos seus conflitos com os traba-
ta consideravelmente consolida- junto às organizações leigas lhadores. Nesse sentido, será um
da, que vinha tanto dos Círculos de caráter político sindical, setor importante na articulação do
Operários Católicos como do empresarial etc. Assim, pelo golpe de 1964. Parte considerável

Investigação Final.indd 125 25/11/14 18:15


126

investigação operária

desse grupo sindical direitista en-


cabeçado por Joaquim Santos An-
drade, o Joaquinzão, permanecerá
na diretoria do Sindicato até 1987.
Nas eleições do Sindicato em
1963, ganha a chapa encabeça-
da por Affonso Delellis, do PCB.
Nesse processo, a oposição direi-
tista forma a chapa derrotada que
aglutina o núcleo de sindicalis-
tas, os quais serão interventores
depois do golpe de 1964 em di-
versos sindicatos, inclusive dos
metalúrgicos.
Depois da intervenção no Sin-
dicato em São Paulo em 1964,
este grupo se reorganizará para
compor a chapa vencedora nas
eleições sindicais de 1965, ao
mesmo tempo em que muitos
dos operários que se organiza-
Material de campanha da Chapa 2, encabeçada por
vam como oposição a eles esta- Hélio Bombardi, em 1984.
vam sendo cassados e persegui- Acervo IIEP – Projeto Memória da OSM-SP

dos pelo novo regime.


O sindicalismo conservador,
que vai compor a direção do Sin-
dicato dos Metalúrgicos de São venção foi ostensivamente lide- utilizando relações institucionais
Paulo por todo o período que rada pelo Movimento Sindical e promíscuas com as autoridades,
compreende a ditadura militar, Democrático e pelo Movimen- seja com a Delegacia Regional do
tinha conspirado, junto a setores to Democrático Estudantil, Trabalho, seja com os serviços de
empresariais, estudantis e com a ambos patrocinados pelo IPES. segurança do Estado.
cúpula das Forças Armadas, para Foi uma tentativa da elite orgâ- O jornalista Antônio Carlos
o golpe. Logo nos primeiros dias nica de contrapor seu próprio Félix Nunes, que até a década de
do pós-golpe, toda a diretoria do bloco estudantil-trabalhador 1970 foi o mais prestigioso jor-
Sindicato é cassada e a entidade de direita ao crescente bom re- nalista sindical de São Paulo,
passa a funcionar sob regime de lacionamento entre as organi- conta que os interventores em
intervenção. Sobre esse contexto, zações estudantis nacional-re- 1964 tiveram como primeira ta-
o grande estudioso do golpe de 64, formistas e os sindicatos das refa a localização dos 1.800 dele-
René Dreiffus, afirma: classes trabalhadoras.” gados sindicais de empresa. As-
“Quase no final de junho o es- sim se refere o jornalista:
tado-maior civil-militar orga- O papel central dos interven- “Na elaboração desse relató-
nizou um comício conhecido tores que passam a compor o nú- rio que consta a denúncia dos
como Convenção do Pacaem- cleo da diretoria do Sindicato foi 1.800 delegados sindicais, o
bu, realizado no dia 22. A con- conter a luta dos trabalhadores, grupo do Joaquim teve uma

Investigação Final.indd 126 25/11/14 18:15


127

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

depois da denúncia, foram cidade de São Paulo. A maioria


O Grupo de presos, perderam o emprego, eram pequenas empresas.
Joaquim não acharam mais emprego... As eleições do Sindicato du-
O grupo de Joaquim dos San- A partir dessa desarticulação, ravam quatro dias e havia o com-
tos Andrade tem entre seus prin- o movimento começou a arre- plicado roteiro de percorrer as in-
cipais componentes os seguin- fecer. As próximas mobiliza- dústrias para recolher os votos,
tes membros: Orlando Malvezzi, ções já eram muito pequenas, lidando ainda com os diversos
interventor no Sindicato dos vinha pouca gente. Então essa turnos de trabalho. Havia mais de
Metalúrgicos de São Paulo, João foi a primeira grande tarefa 170 urnas volantes, criando a ne-
Vicente, também interventor que o Joaquim recebeu e cum- cessidade de cerca de 800 fiscais.
em São Paulo, Hermeto Mendes priu pro sistema: desarticular Esses fiscais tinham que per-
Dantas, assessor da interven- o movimento sindical a nível tencer à categoria metalúrgica, se-
toria em São Paulo, Bernardino básico”. rem sindicalizados e estar em dia
Testa, interventor no Sindicato
com as suas obrigações. Os fis-
A lei garantia à diretoria do cais das chapas da Oposição não
dos Metalúrgicos de São Cae-
Sindicato poderes discricioná- tinham acesso à lista de votantes,
tano do Sul, Clemiltre Guedes,
rios, particularmente, ao presi- não recebiam o roteiro da coleta
interventor no Sindicato dos
dente. As eleições sindicais fo- de votos e não tinham o direito bá-
Metalúrgicos de São Bernardo
ram ponto culminante da disputa sico de acompanhar o mesário e a
do Campo. Com exceção de Cle-
com o sindicalismo conservador urna no mesmo veículo.
miltre, todos foram eleitos para
desde quando a Oposição Sin-
a diretoria do Sindicato em 1965.
dical Metalúrgica se apresenta Em 78, Miguel Tadeu de Car-
Quando assumem os interven-
como Chapa Verde e a situação valho, fiscal da chapa da OSM-
tores, o Sindicato dos Trabalha- como Chapa Azul, em 1967. -SP, protesta e pede a impug-
dores Metalúrgicos de São Pau- Até 1969, as eleições aconte- nação de urna por escrito pelos
lo atua legalmente numa base ciam de dois em dois anos. De- seguintes motivos:
territorial de 4.424 empresas nas pois da onda de intervenções em “Não me deixaram assinar o
quais trabalham 228.000 operá- 64, a diretoria é assumida pela lacre da urna, sob a alegação
rios. O número de filiados do sin- chapa conservadora, que dirige o que o fiscal não precisa assi-
dicato era de 24.284 sócios. Sindicato por dois mandatos, de nar. Além disso fui impedido de
1965 a 1967 e de 1967 a 1969. Há acompanhar a urna no percur-
uma alteração na lei que regula- so em fábricas e sindicato.”
menta as eleições e elas passam
a acontecer de três em três anos. Pedido semelhante é feito por
participação muito grande, O presidente do Sindicato, Jo- Ademar Costa Neto, também fis-
porque eles só conheciam o aquim dos Santos Andrade, foi cal da OSM-SP nessas eleições:
mecanismo, como é que esta- candidato à reeleição nos anos de “Saindo da sede por volta de
vam instalados esses delega- 1967, 1969, 1972, 1975, 1978 e 10.45 h cheguei à ‘Ineap’ às
dos. Inclusive nós, na época, 1981. Ao mesmo tempo em que 11.30hs aproximadamente.
através do jornal Amanhã, de- exercia o cargo de presidente, A urna não estava na empre-
nunciamos abertamente o Jo- era o coordenador das eleições sa. Aguardei sua chegada até
aquim como dedo-duro. E ele e candidato à sua própria suces- às 15,00hs quando chegou a
nem chiou, nem protestou. Es- são. Nos anos 70, havia mais de urna. Fui então informado que
ses 1.800 delegados sindicais, 13 mil empresas metalúrgicas na já haviam feito todas as empre-

Investigação Final.indd 127 25/11/14 18:15


128

investigação operária

sas do itinerário, sem obedecer


a ordem indicada. Por isso fi-
quei impedido de exercer a fis-
calização. Pude constatar, en-
tão que a urna não vinha sendo
lacrada, deixando claro meu
protesto. Ao encerrar a vota-
ção na ‘Ineap’ não me permiti-
ram assinar o lacre convenien-
temente. Passei, depois, pela
Metalúrgica do Bosque S/A,
onde fui informado pelo Dpto.
Pessoal que não houve a devi-
da identificação dos votantes.
O mesmo se deu nas demais fir-
mas onde houve a votação.” HÉLIO BOMBARDI,Candidato a presidente peLa oposição em
1984, protesta por não ter aCesso À Lista de Votantes.
O filme Braços Cruzados, Má- aCerVo iiep/proJeto memória da osm-sp

quinas Paradas, que relata a anu-


lação dessa eleição por fraude,
mostra os militantes da Oposição
bloqueando a saída dos carros para
garantir a fiscalização da eleição.
As organizações de resistên-
cia política à ditadura e a Opo-
sição Sindical Metalúrgica, ain-
da nascente nos anos 60, sempre
levantaram suspeitas da coope-
ração dos diretores do Sindicato
com os órgãos de repressão. Essa
equipe funcionou como conten-
ção das reivindicações dos tra-
balhadores, esvaziando as ati-
vidades políticas do Sindicato,
dificultando a mobilização, de-
PROTESTO DOS FISCAIS da osm-sp, miGueL tadeu de CarVaLHo
sestimulando as lutas. Pouco a
e ademar siLVa neto.
pouco, transformou o Sindica- aCerVo iiep/proJeto memória da osm-sp
to, com apoio do governo, numa
grande máquina assistencialista.
A diretoria fazia o controle das
filiações ao Sindicato, dificultan- eleitoral controlado, o que dimi- não tinham acesso às fichas de
do o trabalho de qualquer operá- nuía o risco de perderem as elei- sindicalização.
rio mais contestador ou que fosse ções. Os metalúrgicos identifica- Ao mesmo tempo, a consoli-
da OSM-SP e criando um colégio dos como membros da OSM-SP dação do caráter assistencialis-

Investigação Final.indd 128 25/11/14 18:15


129

Capítulo 3
a aSSOCIaçãO aNTIOPERáRIa

POR QUE OS
DOCUMENTOS DAS
ELEIÇÕES DO
SINDICATO
ESTAvAM NO DOPS?
Há um dossiê completo no
DOPS de relatórios e materiais
das eleições de 1978 do Sindica-
to, possivelmente encaminhado
pela DRT. A diretoria do Sindicato
oficiava tudo minuciosamente à
DRT, mas a correspondência de-
monstra que tinham plena ciência
de que tudo chegaria ao DOPS.
aCerVo apesp/dops 50-B-58 2506
Isso fica evidente quando Jo-
aquinzão, presidente do Sindica-
to, solicita “realização de policia-
mento preventivo, no local dos
trabalhos das mesas apuradoras,
bem como nas dependências de aCerVo apesp/dops 50-B-58-2504

acessos internos da sede” à Secre-


taria de Segurança de São Paulo,
principalmente por causa da “dis-
tribuição de panfletos (exemplar
anexo), que vêm sendo fartamen-
te distribuídos nas portas das em-
presas, em diversos bairros, como
forma de convocação para o com-
parecimento em massa de público
no ato dos trabalhos de apuração”
(documento OS 291P14 – 8590 -
panfletos produzidos e circulados
pela chapa da Oposição).
Além disso, um dos agentes
relata em 1978 que organizações
estranhas à categoria apóiam a
Oposição para derrubar a direto-
ria, ajudando inclusive financei-
ramente a campanha. Salta aos
aCerVo apesp/dops 50-B-58-2537
olhos mais do que isso a atenção
do DOPS para os candidatos que
CONTINua

Investigação Final.indd 129 25/11/14 18:15


130

investigação operária

aCerVo apesp/dops 50-B-58-2503


A POLíCIA
MILITAR É
ACOLHIDA
dentro do
sindiCato dos
desenHistas,
na rua
siLVeira
martins,
VizinHa da
sede do
sindiCato dos
metaLÚrGiCos.
aCerVo iiep/
proJeto memória
da osm-sp

aCerVo apesp/dops os 291p14

possuíam “antecedentes político-


-sociais”, listados junto com seus
históricos. O relatório qualifica
como “anormal o fato desses ele-
mentos conseguirem registrar
suas candidaturas” (documento
50B/58/2503 - 8815).
“Anormal” justamente porque
o V.Q.C., documento da DRT que
atestava “bons antecedentes polí-
tico-sociais” dos operários para se-
rem contratados pelas empresas,
sempre funcionava como filtragem
ideológica, amparada nas regras
eleitorais, para poder concorrer às
eleições. Alguns membros das cha-
pas da Oposição teriam “furado”
PRESENÇA OSTENSIvA da poLÍCia nas
essa barreira e estavam formalmen-
eLeiçÕes sindiCais a pedido da diretoria.
te na disputa. aCerVo iiep/proJeto memória da osm-sp

Investigação Final.indd 130 25/11/14 18:15


131

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

ta do Sindicato é elemento im- neutralizar a organização dos tra- com esses diretores, são algumas
portante para o fortalecimento balhadores em luta. situações que antecediam em pou-
do eleitorado conservador que cos dias a demissão de muitos ati-
garante a manutenção dessa di- Hamilton Barreto sintetiza: vistas. Esse tipo de recorrência
retoria. “A diretoria do Sindicato dos fazia com que militantes da OSM-
É desenvolvido um trabalho Metalúrgicos age em três pla- -SP evitassem aparecer na frente
de extremo cuidado e atenção nos principais: (1) no plano do núcleo da diretoria do Sindica-
aos trabalhadores aposentados, a burocrático-legal, em perfeita to para se proteger.
partir da estruturação de serviços sintonia com a estrutura sin- Militantes da OSM-SP deram
de assistência médica e ambula- dical vigente, legitimando sua uma série de depoimentos sobre
torial. Em 1975, é criado o ambu- ação através de eleições sindi- a cooperação entre o Sindicato e
latório do Sindicato e disponibi- cais, participando das campa- as empresas.
lizada uma equipe que chegou a nhas salariais sem empenho, Francisco de Souza, o “Chico
contar com 60 médicos. Os asso- apenas para cumprir as for- Gordo”, ressalta:
ciados ainda recebiam medica- malidades da lei; (2) no plano “Quando a OSM-SP cresceu
mentos gratuitamente, forneci- assistencial (Cooperativa de muito nas fábricas, ficou cla-
dos pelo governo federal. Consumo criada em 1965, am- ra a aliança dos empresários
A respeito, Waldemar Rossi, pliação da assistência médica, com a diretoria sindical pra
militante da OSM-SP, comenta: construção da colônia de fé- combater a OSM-SP. Isso se
“Veio o golpe de 1964, cassou rias, distribuição de bolsas de dava através da repressão di-
as direções sindicais, fez um estudo para filhos de associa- reta, com demissões seletivas.
corte naquele processo de mo- dos etc.; (3) no plano policial Eles tinham um programa no
vimento sindical muito com- (entrosamento com órgãos po- Sindicato que visitei com o
bativo dos anos 1950 e 1960, liciais, delação de delegados Sérgio Matte, presidente da
nomeou interventores, fez um sindicais, ameaças a trabalha- Federação dos Metalúrgi-
processo de cassação, de cen- dores de oposição que se opu- cos do Rio Grande do Sul. Ele
tenas ou milhares de delega- nham à diretoria etc.)”. foi recebido como dirigen-
dos sindicais e inicia um novo te sindical e eu acompanhei.
processo. E esse novo proces- São inúmeros os depoimen- No Sindicato eles tinham um
so era transformar um sindi- tos de trabalhadores militantes, mapeamento das fábricas im-
cato de lutas em um sindicato organizadores de trabalhos nas pressionante, sabiam se en-
assistencialista. Aí começa a fábricas, que mencionam a sus- travam militantes de esquerda
entrar ambulatórios médicos, peita de delação de operários pe- da OSM-SP ou não na empre-
fornecimento de medicamen- los membros da diretoria do Sin- sa. ‘Vamos ver quem entrou
tos gratuitos, cooperativas de dicato, em conluio permanente nesse último ano, de que fábri-
consumo, cooperativas habi- com as empresas, que resultará ca veio, qual a situação’. Era
tacionais.” numa série de demissões. muito fácil o mapeamento, a
Encontros fortuitos com direto- delação e a demissão. Isso di-
Se, por um lado, a direção do res do Sindicato em visita nas fá- ficultou muito o trabalho de
Sindicato consegue o apoio de um bricas, entregas de abaixo-assina- oposição, não eliminou, mas
número expressivo de trabalhado- dos por qualquer demanda, greves dificultou muito. Eles provo-
res em decorrência da estrutura- nas empresas, momentos quais- cavam várias greves e o mili-
ção dessa lógica assistencialista, quer de reivindicação em que os tante que estava lá não tinha
por outro, agirá fortemente para ativistas sindicais se deparavam como se safar dessa situação.

Investigação Final.indd 131 25/11/14 18:15


132

investigação operária

Então participava e depois retor do Sindicato. Ele tinha retirar da Chapa 3 de 1978 e
era indicado pra ser demitido. alguns informantes na Bras- apoiar o Joaquim de Andrade
Eu trabalhei na Taito e fui de- tubo. Quando me candidatei na chapa que apoiava os pa-
mitido por delação. Eu estava na Cipa, eu militava na Con- trões e a ditadura. Como não
muito bem dentro da empresa, vergência Socialista, os tra- aceitei, fui mandado embora”.
cheguei um dia de tarde, tinha balhadores estavam certos de
ido fazer implantação de es- me elegerem. Mas o Jaime e José Felix, o Zezinho, mais
tamparia externa e, quando o patrão inviabilizaram a mi- antigo militante na Aliperti, uma
voltei, estava o gerente do RH nha eleição. Na outra fábrica, fábrica exemplar dos processos
me caçando. Meu chefe rece- Duratex, pelo Barroca, dire- de repressão, conta a história da
beu ordens pra me demitir na- tor do Sindicato. É fato que ação do sindicato na empresa:
quela hora, o gerente tentou quando fomos presos na greve “O Sindicato era desacredi-
questionar por que. Era uma de 1979 (eu, Joaquim Venturi- tado lá. O Joaquinzão botou
delação clara do Sindicato.” ni e Walfrido), o agente nos fa- o José Policarpo na chapa
lou que o Amável Barroca ha- da diretoria pelega em 1972.
A mesma situação é relatada via nos entregado e que estava A Aliperti sempre botou dois,
por Anízio Batista: sempre lá no DOPS”. três na chapa deles. O Zé Po-
“Fui dedurado em algumas licarpo era meu encarregado
fábricas: na greve da Villares, Albino Barzi também respon- das pontes rolantes e até hoje
em 1973, pelo Sindicato. Na de sobre a delação por parte do ele é vivo, está sempre lá no
Caterpillar, havia um curso sindicato: Sindicato. Mas quem coloca-
para supervisor que eu esta- “Fui dedurado na Metalúrgi- va esse pessoal na chapa? O
va indicado. Faltava uma se- ca São Rafael pelo Sindicato. Medeiros queria que eu e o
mana e fui demitido: delação Companheiros da empresa re- Marcolino fôssemos para a
do sindicato. Não tenho como ceberam a informação pela chapa dele na época e quase
provar, mas podemos afirmar pessoa que trabalhava no de- fomos mesmo. Mas aí, como
que éramos da Oposição, com partamento pessoal, que seria a gente participava da Oposi-
certeza o Sindicato foi o dela- demitido em razão do Sindica- ção e tudo, fizemos uma reu-
tor. A verdade é que na época to pedir para fazer um levan- nião, teve uma pressãozinha.
da repressão, podemos afir- tamento sobre mim. Um com- Bem, pra mim não acrescen-
mar, com certeza, que em qua- panheiro meu, que trabalhava tava nada, não fui”.
se todas as fábricas, médias junto comigo e era torneiro
e grandes, tinha dedo-duro. mecânico, me disse: ‘Albino, Absolon completa o relato so-
Não dá para lembrar os no- você vai ser mandado embora bre a Aliperti:
mes. Mas nós desconfiávamos ainda hoje porque o Sindicato “O Zezinho não foi demitido
de alguns trabalhadores”. esteve aqui e dedou você’. E porque ele tinha estabilidade,
realmente aconteceu: naquele era da lei velha, não podia ser
José Lima Soares, conhecido dia fui mandado embora”. mandado embora. Mas eu ti-
nos meios operários como “Soa- nha tido dois mandatos de vi-
rão”, se soma aos relatos: Fernando do Ó Veloso: ce-presidente da Cipa e nessa
“Fui dedurado várias vezes. “Olha, acho que a diretoria época estava na Comissão de
Em duas delas, na Ferra- do Sindicato me dedurou. Na Fábrica. Infelizmente, o An-
mentaria Ravito e na Brastu- Indústria de Máquinas Ferdi- tônio Medeiros cassou meu
bo. Não tenho como duvidar, nand Vaders, o dono da fábri- mandato e perdi o emprego.
fui dedurado pelo Jaime, di- ca tentou me comprar para me Quando perdemos a eleição,

Investigação Final.indd 132 25/11/14 18:15


133

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

ele me convidou para traba- greve da Telefunken simulando o assunto, que tava lá de pas-
lhar no Sindicato e respondi proteção e fichando todos nós. sagem só”.
assim: ‘Não dá para traba- Notemos que a greve estourou
lhar com vocês porque a vi- em outubro e no dia 30 mor- Além das delações reportadas
são de sindicato é outra e in- reu Santo Dias. Trabalhei na às empresas, existem documen-
felizmente não vai dar’. Fui Villares por cinco meses. Vá- tos disponíveis (principalmente
trabalhar na Stevaux, da Via rios líderes eram despedidos no Arquivo Público do Estado de
Anchieta, mas a perseguição enquanto o Toninho, represen- São Paulo) que mostram como
continuou. Fui demitido de lá tante do sindicato, permanecia esses interventores se perpetua-
também, porque me recusei a lá. Isso aumentava a certeza de ram como diretores do Sindicato
aderir a eles”. que nunca se comprometia nas dos Metalúrgicos, colaborando
lutas, e aumentava as suspeitas diretamente com o DOPS e com
Mais uma história de delação de deduragem para o Sindicato os órgãos do Estado de controle e
é relatada por Vicente Espanhol: acabar com a Oposição Meta- repressão.
“Nos meses de setembro e ou- lúrgica dentro das fábricas”. O papel do DOPS nesse con-
tubro de 1979, trabalhava na texto era garantir que a produção
Indústria Villares. Um dia re- Cloves de Castro, conhecido econômica crescesse sem obstá-
cebi na empresa uma intima- como Cloves Preto, narra um in- culos, que os trabalhadores con-
ção para me apresentar no cidente grave, envolvendo Se- tinuassem trabalhando sem se
Dops. Quando voltei para o bastião de Paula Coelho, que foi levantarem contra as suas condi-
trabalho na Villares não me coordenador do Departamento ções de trabalho. Por isso, tinha
deixaram entrar. Fui despe- Jurídico do Sindicato dos Me- a missão de intervir nos conflitos
dido no departamento de pes- talúrgicos de São Paulo, asses- trabalhistas.
soal. Só recolhi minhas coisas sor por muitos anos da diretoria, O esforço da diretoria do Sindi-
acompanhado pelo guarda. O com tarefas importantes, como cato dos Metalúrgicos em abafar
chefe me falou: ‘Você é um ex- coordenar as eleições sindicais levantes e greves nas fábricas fica
celente profissional, mas infe- e representar o Sindicato. Sebas- evidente no episódio em que na In-
lizmente tenho que te mandar tião Coelho sempre foi alvo de dústria de Máquinas Têxteis Santa
embora’. suspeitas pela esquerda. Foi se- Clara Ltda., no ano de 1968, num
Poucos dias antes, fizemos cretário de Relações de Trabalho dia em que se principiou uma gre-
uma reunião de preparação do governo Maluf em 1981. ve por reajuste salarial, o DOPS
da greve dos metalúrgicos de “Tava preso no Doi-Codi em solicitou diretamente ao diretor
São Paulo no Arco Íris, sub- 14 de dezembro de 1969. Me do Sindicato, Orlando Malvezzi,
sede da região Sul. Fui sur- espantei quando fui condu- presença na fábrica para mediar o
preendido com a presença de zido pra tortura, porque vi conflito entre trabalhadores e di-
uma pessoa do departamento num espaço embaixo da esca- retores da empresa:
de pessoal da Telefunken na da o Sebastião de Paula Co- “Estivemos na manhã de hoje,
reunião. Essa pessoa nunca ti- elho trabalhando numa má- às 10,30 horas na Indústria
nha participado e nunca mais a quina de escrever. Na eleição de Máquinas Têxteis Santa
vi. A dedução me pareceu evi- do Sindicato em 1978, Coelho Clara Ltda, à Rua Domingos
dente: ela passou minha par- tava na coordenação da elei- Afonso, 460, Vila Santa Cla-
ticipação na greve de 1978 na ção. Disse pra ele “Lembro de ra, onde segundo informações
Telefunken para a Villares. O você, te vi na Oban em 69. Eu da própria empresa, havia um
pessoal do DOPS já me conhe- tava lá”. Ele, meio sem gra- princípio de greve numa de
cia, pois eles acompanharam a ça, disse, querendo dispersar suas seções.

Investigação Final.indd 133 25/11/14 18:15


134

investigação operária

aCerVo apesp/dops 50-B-58-1822

A indústria, que tem aproxi- Anexo estão duas relações a infiltração de indivíduo no Sin-
madamente 250 operários, com os nomes dos operários dicato dos Metalúrgicos. Ele re-
está dividida em diversas sec- grevistas, sendo que a relação passa ao investigador do DOPS
ções, e uma delas, a de torne- que contém 11 nomes trata-se informativo da missa de um mês
aria, que tem 60 operários, dos que iniciaram o movimen- da morte de Olavo Hanssen:
até aquele momento não havia to” (documento 50B/58/1872/ “Cumpre-nos informar a V.S.
começado o trabalho, perma- DOPS – nº. 9157). que no dia de ontem o Inves-
necendo os operários junto às tigador desta Sub-Chefia que
máquinas, de braços cruzados Avisado pela repressão, o di- se acha infiltrado no Sindicato
(...) retor Malvezzi mantém toda a dos Metalúrgicos de São Pau-
Subimos posteriormente à re- negociação com a empresa e os lo, recebeu dentro do referido
ferida secção, onde reunimos trabalhadores com a presença sindicato o volante anexo, ten-
os operários e lhes informa- do agente do DOPS. Este agente do ainda informado que na-
mos sobre a ilegalidade da- comunica formalmente que está quele órgão classista existem
quele movimento, sendo que levando a lista com o nome das vários pacotes dos menciona-
os mesmos deveriam retornar lideranças grevistas. É uma das dos panfletos.
ao trabalho logo depois do al- evidências de que o DOPS fun- Era o que nos cumpria infor-
moço (…) cionava como instrumento do mar.
Às 14,00 horas chegou ao lo- Estado na solução de demandas Obs. Após a feitura deste re-
cal, a nosso pedido, o Sr. Or- trabalhistas e que utilizava os di- latório, fomos informados por
lando Malvesi, diretor do Sin- retores sindicais como suporte um elemento da diretoria do
dicato dos Metalúrgicos, que para esse fim. sindicato de que organizarão
foi colocado a par da situação O Sindicato passa a funcionar uma espécie de corpo de segu-
e imediatamente promoveu como território livre para o trân- rança, pois temem que elemen-
um contato com os grevistas, sito dos espiões e investigadores tos esquerdistas se aproveitem
tomando mairoses, digo maio- das forças de repressão. São pou- do evento para provocar dis-
res esclarecimentos a respei- cos os documentos que trazem túrbios e distribuição de pan-
to, e nomeando entre os mais os nomes dos agentes, mas são fletos subversivos” (documen-
velhos de casa, uma comissão diversos os documentos que de- to 50B/58/1932 – nº. 9104).
para imediatamente debate- monstram a presença infiltrada
rem os problemas com os dire- de agentes no Sindicato. Como Em momento algum é encon-
tores da emprêsa (…) exemplo, em 1970 é constadada trado nos arquivos algum conte-

Investigação Final.indd 134 25/11/14 18:15


135

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

údo que mostre atitude hostil ou isso, destacado elementos de Departamento Pessoal e, che-
conflitante dos diretores com os sua confiança” (documento gando lá, fui recebido pelo
agentes do DOPS, mesmo quan- 50B/58/1989). vice-presidente do Sindicato,
do esses agentes eram denun- Orlando Malvezzi, interven-
ciados pelos trabalhadores. Por Esse papel dos sindicalistas tor em 1964.
outro lado, nunca os agentes qua- conservadores também é explí- Ao lado dele, estavam dois
lificam negativamente a diretoria cito no relato de Vito Giannotti, policiais à paisana que me
nos seus relatórios. ao comentar sobre sua prisão em decretaram prisão. Me segu-
Ainda em 1970, a impressão 1979, quando trabalhava na Má- raram na saleta do DP e me
do DOPS sobre a fala do traba- quinas Piratininga, no bairro da deram ordem de segui-los.
lhador Júlio Ferreira dos Santos Mooca: Perguntei o porquê e de onde
numa assembleia do Sindicato “A partir do 1º de Maio, tra- vinha a ordem. Eles respon-
dos Metalúrgicos: balhadores de várias fábricas deram que quem perguntava
“este orador provocou gran- metalúrgicas de São Paulo era eles e não eu. Me fizeram
de confusão no plenário, pois começaram a preparar gre- subir num carro não identifi-
acusou o Sr. João Vicente, que ves, estimulados pelo exemplo cado estacionado na frente da
nesse momento não se encon- de São Bernardo. Essa prepa- fábrica e me levaram para a
trava no plenário, de ter for- ração foi muito intensa entre Delegacia de Polícia da Rua
necido o seu nome ao DOPS, os setores da OSM-SP. Na re- Jumana. Lá me interrogaram,
ocasionando a sua prisão” gião da Mooca, devido ao tra- sem muito interesse.
(documento 50B/58/1932 – balho profundo de interfábri- O objetivo era fazer hora para
nº. 9102-9103). cas, várias greves passaram ver se a greve aconteceria
a ser preparadas – especial- mesmo sem mim. Foi isso que
João Vicente era do núcleo de mente na Gutmann e na Má- aconteceu: às 8h10 iniciou a
interventores. quinas Piratininga. greve na Máquinas Piratinin-
Um informante do DOPS, No começo de maio, os com- ga e lá pelas 10h00 fui solto e
em 1972, descreve que boletins panheiros da Piratininga co- voltei para a porta da fábrica.
e panfletos da OSM-SP estavam meçaram um curso noturno Lá, o Departamento Pessoal
sendo distribuídos nas portarias de trigonometria e álgebra. me disse que estava demitido”.
de diversas indústrias, Na verdade, era um disfarce
“especialmente no bairro de para reunião e preparação da Num episódio em 1978, José
Santa Clara, Máquinas Gut- greve. No começo de junho de Maria Vicentino, membro da
mann, Mecânica Gráfica, em 1978, estava tudo pronto para executiva do Sindicato em vá-
Santo Amaro, Metal Leve, e estourar a primeira greve na rias gestões, assina documen-
também nas indústrias Arno e história da Máquinas Pirati- to, dirigido ao diretor do DOPS,
Lorenzetti, e outras em toda S. ninga. Romeu Tuma, com a seguinte
Paulo”. (No original, o nome O comando de greve marcou o mensagem:
das fábricas estão redigidos início da greve para as 8h10, “O SINDICATO DOS TRA-
com erros). logo depois do café que era BALHADORES NAS INDÚS-
servido. Quando deu 7h55, TRIAS METALÚRGICAS,
Menciona, com destaque, que um guarda veio na minha má- MECÂNCIAS E DE MATE-
a diretoria do Sindicato quina e disse para segui-lo até RIAL ELÉTRICO DE SÃO
“está empenhada em pegar o escritório. Logicamente, o PAULO, através de seu di-
em ação os distribuidores plano de greve tinha sido des- retor infra-assinado, repor-
dos boletins. Tendo já para coberto. Segui o guarda até o tando-se ao ofício SE/169/78/

Investigação Final.indd 135 25/11/14 18:15


136

investigação operária

Arq.1-3d-JMV, datado de 03
de março do corrente ano,
prestar seus agradecimen-
tos pela valiosa colaboração
prestada por esse conceitu-
ado Departamento, sob sua
direção, no caso entre o em-
pregado e nosso associado
JACOMIAS DOS SANTOS e a
empresa MASSARI S/A. IND.
DE VIATURAS.
Outrossim, queremos esten-
der os nossos agradecimentos
aos senhores Dr. ORLANDO
DOMINGUES JERONYMO,
Dr. ANTONIO CESAR DON-
GHIA, VALDIR ANTÔNIO
CREPALDI, DAVID ALVES
DE CAMPOS e ANTONIO
LOURENÇO CARNAUBA,
que trabalharam na presente
ocorrência, solucionando-a
de maneira favorável ao nos- aCerVo apesp/dops os 291p14

so representado” (documento
nº. 8576/DOPS).

É gritante a confusão de papéis


entre Sindicato e repressão. O NOTA POLíTICA
DOPS se responsabiliza pela re-
As referências às delações praticadas por elementos da diretoria
solução de um conflito trabalhis-
do Sindicato são sempre relativas ao núcleo de interventores que se
ta e, em troca, recebe o agrade-
legitimaram com as eleições de 1965 e continuaram sendo hegemô-
cimento amigável de José Maria
nicos até 1981. No fim dos anos 70, há uma oxigenação da diretoria
Vicentino, que menciona nomi-
quando o Partido Comunista Brasileiro e o MR-8 decidem, por es-
nalmente os agentes envolvidos.
tratégia política, compartilhar a gestão do Sindicato.
Mais gritante ainda é o jargão po-
A partir de 79, há uma virada na orientação do Sindicato e essas
licial usado pelo próprio sindica-
forças irão compor na eleição seguinte, em 1981, a diretoria. A
lista para se referir ao problema
OSM-SP se recusa a participar desse acordo. A partir de 1981, a
do trabalhador: “ocorrência”. To-
OSM-SP enfrentará politicamente a diretoria resultante dessa com-
dos esses elementos consolidam
posição entre parte da esquerda e a diretoria tradicional.
a impressão de que a questão tra-
As referências à cooperação com os órgãos de segurança e as auto-
balhista era realmente caso de po-
ridades nunca são aqui atribuídas às forças de esquerda, apesar de
lícia não apenas para a repressão,
todas as divergências na disputa pelos caminhos do Sindicato e de
mas também para a diretoria con-
sua direção política.
servadora do Sindicato.

Investigação Final.indd 136 25/11/14 18:15


137

Capítulo 3
a aSSOCIaçãO aNTIOPERáRIa

AS PRISÕES DE 74:
“CAIU A COORDENAÇÃO
DA OPOSIÇÃO...”

FOTO NO PRONTUáRIO FOTO NO PRONTUáRIO FOTO NO PRONTUáRIO


de eLias stein. de Vito Giannotti. de waLdemar rossi.
são pauLo (sp), 1974 são pauLo (sp), 1974 são pauLo (sp), 1974
aCerVo apesp/dops os 1411 aCerVo apesp/dops os 1882 aCerVo apesp/dops

Investigação Final.indd 137 25/11/14 18:15


138

investigação operária

1972 - 1978 a dura travessia

E
m 1972, a Oposição Sindical chegar aos trabalhadores nos Voltou clandestino no início
Metalúrgica de São Paulo con- bairros, nas paróquias que eles dos anos 1970 e abriu um “es-
corre às eleições com a Chapa frequentavam. A Pastoral Operá- critório de fachada” na rua Xa-
Verde e é derrotada: 18 mil votos ria (e Waldemar Rossi) terá um vier de Toledo. Afastou-se do
dos pelegos e apenas 6 mil para a papel fundamental no processo. Partidão e juntou-se a um gru-
Oposição. Foi uma eleição típica Fundada em 1970, e com o apoio po que tinha participado do Mo-
daquele Sindicato, dirigido por decidido do cardeal Dom Paulo vimento Popular de Libertação
ex-interventores, pelegos que não Evaristo Arns, a PO abriu as por- (MPL), criado por Miguel Arra-
aplicavam nenhuma norma de- tas de muitas igrejas para desen- es na Argélia, onde estava exi-
mocrática nas eleições sindicais. volvermos nosso trabalho: fazer lado. Nos anos 70, o MPL era
A Coordenação da Oposição, reuniões, conhecer metalúrgicos praticamente desconhecido no
ao analisar essas eleições, con- de pequenas empresas e aposen- Brasil. Em 1971 e 1972, alguns
cluiu que aquele trabalho de for- tados, colocar nossas propostas metalúrgicos passaram a se reu-
miguinha feito pelos militantes de um Sindicato sem pelegos, in- niu com Delellis e outros mili-
nas fábricas, apesar de muito im- dependente do governo e com- tantes, e se começou a falar do
portante, não seria capaz de atin- prometido com os verdadeiros MPL e a discutir o trabalho na
gir os milhares de metalúrgicos interesses da classe trabalhadora. Oposição Metalúrgica. Profis-
de São Paulo, em sua maioria tra- Além das igrejas, procuramos sionais de diversas áreas, in-
balhando em pequenas empresas, a FASE [Federação de Órgãos cluindo professores, se reuni-
de 20, 30 operários. Como não ti- para Assistência Social e Educa- ram na perspectiva de criar um
nham nenhum tipo de assistência cional], entidade que se preocu- núcleo do MPL em São Paulo.
pública decente, dependiam dos pava com a formação política e O núcleo dirigente da OSM-SP
médicos, dentistas e remédios que profissional dos operários, cujos não tinha conhecimento da ideia
o Sindicato fornecia gratuitamen- objetivos eram muito parecidos de organizar o MPL. Alguns
te. Essa massa de trabalhadores com os nossos: trabalho de base, metalúrgicos participavam des-
era eleitorado cativo dos pelegos, formação e conscientização. sa iniciativa, como outros esta-
à qual se juntavam os aposenta- vam ligados a distintos grupos
dos, que também dependiam do TRABALHO políticos clandestinos.
assistencialismo do Sindicato. CLANDESTINO Pelo fato de Delellis ser figura
Sem esquecer que a ditadura in- clandestina, tínhamos por nor-
centivava e financiava essa políti- Na ampliação dos nossos tra- ma ir ao seu escritório somen-
ca sindical. balhos, entramos em contato te em condições muito segu-
Para enfrentar a terrível con- com Afonso Delellis, presidente ras. Ninguém devia sair de uma
juntura, precisávamos ampliar do Sindicato dos Metalúrgicos reunião ou do Sindicato e ir até
nosso trabalho. de São Paulo em 1964. Como lá. Mas o DOPS seguia os pas-
centenas de outros dirigentes sin- sos das pessoas que discutiam o
TRABALHOS NOS dicais, Delellis foi cassado pela MPL. O local foi descoberto e
BAIRROS ditadura. Perseguido, conseguiu vigiado. O DOPS ocupou uma
fugir do País e, por meio de sua sala ao lado e instalou no escri-
Comecemos pelo começo: de- ligação com o PCB, exilou-se na tório do Delellis um esquema de
víamos saber como poderíamos Tchecoslováquia. escuta. Quando Adilio Roque (o

Investigação Final.indd 138 25/11/14 18:15


139

Capítulo 3
a aSSOCIaçãO aNTIOPERáRIa

Gaúcho) descobriu aquele obje-


to estranho e alertou o pessoal, já
não havia tempo de sair. Todos
os que estavam lá foram presos e
barbaramente torturados.
A Coordenação da OSM-SP-
-SP se reunir no dia 21 de janei-
ro na Igreja São João, no Brás.
Fleury e seus agentes foram lá
e prenderam Waldemar Rossi,
Vito Giannotti, Alcides Salles e
Elias Stein. Carlúcio Castanha,
que tinha vindo do Recife visitar
Waldemar Rossi e foi para a reu-
nião, acabou preso com os de-
mais. Mesmo que não tivessem
sido presos juntos na reunião,
seriam presos no trabalho ou em
casa. Eles tinham vida normal.
Delellis, clandestino, é preso.
No DOPS os companheiros
conheceram o Inferno, o “lugar
onde o filho chora e a mãe não
vê”. Conforme relatam, a re-
pressão “queria saber o nome da
organização a que pertencíamos
e nenhum de nós sabia”.
As primeiras prisões foram
sucedidas por muitas outras. Es-
tava aberta a temporada de caça e
criminalização. São presas de 30
a 40 pessoas ligadas à OSM-SP-
-SP. Os membros de uma rede
de contatos e apoio nos bairros
e entidades, como a FASE e RE-
TERMO DE COMPROMISSO menaGem de Vito Gianotti.
NOV (Relações Educacionais e são pauLo (sp), 1974
do Trabalho), dirigida por Maria aCerVo apesp/dops os 1882

Nilde Mascellani, foram presos


e receberam tratamento cruel.
A prisão dos metalúrgicos e
a intimidação dos que os apoia-
vam foram decisivas para invia-
bilizar a montagem de uma cha- ROSSI, vITO E ELIAS tiVeram Que Fazer a menaGem durante
seis meses. a menaGem Consistia em CompareCer semanaL
pa para disputar as eleições no ou QuinzenaLmente ao dops, ConForme o Caso, para
Sindicato em 1975. assinar um termo no Horário ComerCiaL das 8H Às 17H.

Investigação Final.indd 139 25/11/14 18:15


140

investigação operária

CRImINIaLIzaçãO
fORçaDa

A ditadura, pela Lei de Segu-


rança Nacional, não podia conde-
nar os metalúrgicos por fazer opo-
sição a uma diretoria de Sindicato.
Então, ela os enquadraram como
integrantes do MPL. Depois de
quatro meses, conseguiram liber-
dade provisória, obrigados a ir ao
DOPS semanalmente assinar a
menagem, mostrar que ninguém
tinha fugido.
Julgados e absolvidos pelo Su-
perior Tribunal Militar em 1978,
não ficaram livres da repressão.
Qualquer empresa que pedisse in-
formações ao DOPS sobre eles,
recebia em resposta: “Esteve pre-
so nesta dependência no perío-
do de janeiro a maio de 1974 por
atividades subversivas”. Isso em
1979, 1980, até 1982, quando o
DOPS foi fechado.
No entanto, as “listas negras”
da FIESP continuaram funcio-
nando, e esses militantes da
OSM-SP não conseguiam en-
contrar trabalho nas grandes em-
presas. Obtinham emprego so-
mente em pequenas empresas,
TERMO DE COMPROMISSO menaGem de eLias stein. ou nas chamadas “bocas de por-
são pauLo (sp), 1974
aCerVo apesp/dops os 1411 co”. Grande parte do trabalho
da OSM-SP nas fábricas, nesses
anos, será desmontada pela dela-
ção do núcleo de ex-intervento-
res acomodados na diretoria do
Sindicato.

COMO CONCILIAR UM TRABALHO na FáBriCa Com essa (Texto baseado nos relatos de
eXiGênCia? a menaGem era um instrumento de ControLe de
ControLe e Coerção, mas tamBém de desartiCuLação da Adílio Roque, Elias Stein, Vito
Vida proFissionaL e poLÍtiCa do perseGuido. Giannotti e Waldemar Rossi)

Investigação Final.indd 140 25/11/14 18:15


141

Capítulo 3
a aSSOCIaçãO aNTIOPERáRIa

a oposição
sindiCal no exílio
aos olHos
da repressão

CARTAz DO
ENCONTRO
da oposição
sindiCaL
no eXÍLio.
aCerVo iiep/
proJeto
memória
osm-sp

Investigação Final.indd 141 25/11/14 18:15


142

investigação operária

O apoio internacional às oposições Sindicais

E
m 1979, com o ressurgimento divulgação da intensa exploração das atividades na Espanha, Itália
das greves operárias no Bra- a que estava submetida a classe e Iugoslávia, estão nos arquivos
sil e a multiplicação das Opo- trabalhadora brasileira sob o re- DOPS-SP, com a identificação
sições Sindicais, os sindicalistas gime ditatorial. Para isso, além da dos participantes, os prontuários
no exílio convocam o Encontro publicação em vários idiomas de de alguns que passaram por pri-
Internacional da Oposição Sindi- quatro edições do Boletim Unité são ou inquéritos no Brasil e as
cal Brasileira em 31 de abril, 1 e Syndicale, o GAOS travou con- cópias de interrogatórios de al-
2 de maio de 1979, em Bruxelas. tato com as principais organiza- guns deles.
Essa iniciativa foi organizada pelo ções sindicais europeias, com as Helio Bombardi, um dos con-
GAOS (Grupo de Apoio à Oposi- de outros países e continentes, ar- vidados ao Encontro em Bruxe-
ção Sindical), com sede em Paris e ticulando formas efetivas de soli- las, foi o mais conhecido diri-
apoiado principalmente pela Con- dariedade dos trabalhadores das gente da Comissão de Fábrica da
fédération française démocrati- empresas multinacionais com os Massey-Ferguson e membro da
que du travail (CFDT). Partici- trabalhadores das filiais dessas chapa da OSM-SP nas eleições
pavam dessa articulação diversos empresas no Brasil. em 1978. Ao ser preso na greve
trabalhadores exilados, entre eles O GAOS, apoiado por um am- dos metalúrgicos de 1979 passa
o “calejado” dirigente sindical co- plo arco de entidades sindicais por um interrogatório em que a
munista Rolando Fratti, lutador (cristãs, socialistas e comunistas), polícia, tendo em mãos cópias da
desde os anos 40 e sindicalista das custeará a viagem de quatro lide- fotos do Encontro, bem como ou-
lutas dos anos 60; os companhei- ranças da nova safra de lutadores. tros dados da Oposição no exílio,
ros de Osasco, José Ibrahim, Ro- São eles: Zé Pedro (Metalúrgicos pergunta a Bombardi os paí­ses
que Aparecido e Luis “Luisão” de Osasco/SP); Hélio Bombar- pelos quais os sindicalistas pas-
Cardoso; de São Bernardo, José di (Metalúrgicos de São Paulo); saram, quem financiou a viagem,
Barbosa; do Maranhão, Manoel Ademir de Oliveira (Metalúrgi- o objetivo do encontro, os nomes
da Conceição; do Rio de Janeiro, cos de Contagem/MG) e Antônio e as entidades participantes, en-
José “Ferreirinha” Cardoso, e de Portella (Bancários de SP). Parti- tre outras informações.
São Paulo, Afonso Delellis. ciparão do Encontro em Bruxelas Os quatro convidados ao vol-
e farão contatos em alguns países. tarem não trouxeram nada que os
O GAOS como Sinal dos tempos: a Oposição pudesse incriminar. As fotos fo-
articulador Bancária, na cidade de São Pau- ram trazidas por uma portadora de
lo, tinha acabado de ganhar as confiança. Outras cópias ficaram
Durante sua existência, o eleições e a anistia política estava com os europeus e exilados.As fo-
GAOS realizou importantes tra- anunciada, prenunciando a volta tos que chegaram ao Brasil e al-
balhos: de recepção e acolhimen- dos exilados. guns documentos desapareceram
to dos militantes operários que to- do Sindicato dos Bancários de São
mavam o caminho do estrangeiro Como o DOPS Paulo.A imprensa na Europa e no
como única forma de garantir a in- conseguiu ‘as fotos Brasil noticiou o Encontro. De
tegridade física; de denúncia, jun- Encontro’? alguma maneiraa polícia montou
to a organismos internacionais, um dossiê canhestro com muitas
das péssimas condições de traba- As fotos e registros do encon- incorreções, mas o suficiente para
lho nas fábricas e no campo; e de tro realizado em Bruxelas, além incriminar os participantes.

Investigação Final.indd 142 25/11/14 18:15


143

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

Reunião em Bruxelas: Alfred Hervê apoio na França, Luisão,


Antonio Portella, Ibrahin, Fratti.
Acervo Antonio Portela

Atividade na Iugoslávia:
Dois iugoslavos,
Bombardi, Fratti,
tradutora, Ademir,
Luisão e Antonio
Portella. Ao fundo, a
efígie do Marechal Tito
(Josip Broz Tito 1892-1980)
presidente da Iugoslávia.
Os partisans iugoslavos
comandados por Tito se
orgulhavam de terem
derrotado os nazistas
ocupantes na II Guerra
Mundial sem ajuda
estrangeira. (esq.p/dir)
Acervo pessoal Claudio
Nascimento.

Investigação Final.indd 143 25/11/14 18:15


144

investigação operária

delação e caça Eleições de 1987:


Material da Chapa
às bruxas na Arno 2 presidida por
Carlúcio Castanha,
Em 1981, Bombardi participa cipeiro da Arno. A
votação expressa o
de um programa de seleção, com reconhecimento dos
duração de um mês, na fábrica da trabalhadores ao
Arno, na Mooca. Passado mais de persistente trabalho
de organização de base.
um ano, a partir de uma denúncia, Acervo IIEP/OSM-SP
a empresa abre uma investigação
interna para verificar se algum
funcionário o havia indicado,
dado referências ou era seu paren-
te. As chefias são chamadas e lhes
é mostrado um dossiê fornecido
pelo DOPS, no qual Bombardi era
apresentado como “terrorista que
denigre a imagem do Brasil no ex-
terior.” Localizam a gerência que
assinara o seu vale-refeição e, a
partir disso, quem o tinha indica-
do: Sebastião Neto, identificado
e demitido. Junto com ele são de-
mitidos seu chefe imediato e mais Boletim do Grupo de
de 30 trabalhadores com os quais Fábrica da Arno que
convivia, jogava futebol ou sim- atormentava a empresa.
Acervo IIEP/Projeto Memória
plesmente conversava. Com essa OSM-SP
demissão às cegas, a Arno tentava
“matar o mal pela raiz”, eliminar
o Grupo de Fábrica clandestino
que atormentava a empresa com
o boletim regular “Pegando no pé
da Arno”, o qual fazia denúncias Tempos de Ditadura:
frequentes sobre as péssimas con- a imprensa no Brasil
noticiou o encontro
dições de trabalho, reivindicando da Oposição Sindical
eleições democráticas na CIPA e no exílio. 1979.
Acervo Antonio Carlos portela
Comissão de Fábrica.

Conexão
Europa-Mooca

Como uma atividade realiza- O trabalho da OSM-SP na Arno denúncia sobre a participação de
da na Europa resulta em demis- será derrubado depois de quase Helio Bombardi no Encontro da
sões numa fábrica na Mooca? 20 anos ininterruptos, por uma Oposição Sindical no Exílio.

Investigação Final.indd 144 25/11/14 18:15


145

Capítulo 3
a aSSOCIaçãO aNTIOPERáRIa

greves
DAS PRISÕES SELETIvAS
À REPRESSÃO EM MASSA

FAIxA DA OPOSIÇÃO no
inÍCio da GreVe de 1979.
aCerVo oBoré

Investigação Final.indd 145 25/11/14 18:15


146

investigação operária

A
s greves operárias no Brasil turalmente objeto de atenção do Em 1978, houve um caso es-
historicamente foram tra- empresariado, chegando a ser cabroso do assassinato de um
tadas como caso de polícia analisada na Visão, revista de trabalhador pelo advogado da
pelo Estado e empresas. No perí- negócios da época. Depois dela, Metalúrgica Alfa, Cássio Scate-
odo que vai do Ato Institucional várias demissões ocorreram e na, dentro da empresa. O traba-
nº 5 aos levantes de 1978, nor- os trabalhadores reconhecidos lhador, Nelson Pereira de Jesus,
malmente o aparato policial en- como dirigentes da mobilização ao discutir um pagamento, foi
frentava as mobilizações de tra- e suas informações foram espa- baleado pelas costas. A questão
balhadores. Havia casos em que lhadas às grandes empresas da trabalhista virou efetivamente
a repressão se personalizava no região sul de São Paulo para não um caso de polícia. No clima das
DOPS, e outros em que a Polícia serem mais contratados por ne- mobilizações daquele ano, houve
Militar se tornava o órgão res- nhuma delas. grande indignação, gerando mo-
ponsável. Os trabalhadores organizados bilizações de setores democráti-
Qualquer tipo de movimenta- politicamente sempre foram os cos. Cássio Scatena é conhecido
ção, como panfletagem na porta alvos especiais e prioritários das como membro do Comando de
da fábrica, transformava-se em forças repressivas. Normalmen- Caça aos Comunistas, com vasto
motivo de insinuação de gre- te, as empresas detectavam essas histórico de violência.
ve. No caso das panfletagens, a lideranças, incorporadas às “lis- Salvador Pires lembra:
segurança privada da empresa tas negras”. Em regra, as greves Vou falar de uma repressão
apreendia os materiais. A segu- tinham conteúdo reivindicató- dura, muito complicada, que
rança chamava recorrentemente rio, por questões básicas ou rea- se deu na fábrica, que foi o as-
a Polícia Militar ao primeiro si- juste salarial, por isso toleradas sassinato do operário Nelson
nal de agitação. Muitos trabalha- pela forças policiais e patrões, Pereira de Jesus, na fábrica de
dores foram detidos pela polícia pois faziam parte do dia a dia. fogões Alfa, em 1978. Ele es-
simplesmente porque distribuí- Ao mesmo tempo em que havia teve para ser sepultado como
am material. essa legitimação, na surdina per- indigente. A FNT e a Pastoral
Enquanto a PM tinha o pa- seguiam-se as lideranças, demi- Operária confrontaram os pe-
pel de agir em cenas mais cor- tidas quase sempre. legos. Houve uma assembleia
riqueiras, de averiguar qualquer No ano de 1978, uma onda de dos companheiros, que entra-
situação que “cheirasse mal” ao greves no Estado de São Paulo, ram em greve e decidiram que
empresário, o DOPS cumpria a iniciada na fábrica Scania, em São o enterro do Nelson passaria
função de identificar os “cabe- Bernardo, espalhou-se pelo Bra- em frente à Alfa.
ças” do movimento, aqueles que sil. Há uma explosão de greves nas
deveriam ser alvo de suspeita fábricas na cidade de São Paulo, Salvador Pires foi presidente
permanente. iniciada na Toshiba – na qual tra- da Frente Nacional dos Traba-
Na chamada Greve do Gato balhava Anízio Batista, candida- lhadores. Em 1980, a FNT cen-
Selvagem, na Villares, em 1973, to a presidente do Sindicato pela tralizava a coleta de mantimen-
os trabalhadores paralisaram as Oposição –, que se torna incontro- tos para apoiar as famílias dos
atividades de cada seção da em- lável pela diretoria do Sindicato. metalúrgicos do ABC em greve.
presa em momentos alternados, A ideia de Comissões de Fábrica A repressão tinha aprendido a li-
o que dificultou o controle pela se generaliza e as greves passam a dar com greves e mobilizações
repressão empresarial e militar. ser irreprimíveis pelas forças poli- massivas, mas mantinha a re-
Essa greve, caso raro na época, ciais, que age apenas localmente pressão seletiva aos organizado-
foi comentada na esquerda e na- contra as mobilizações. res e dirigentes.

Investigação Final.indd 146 25/11/14 18:15


147

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

Eu estava na coordenação do
fundo de greve de apoio aos
metalúrgicos do ABC, pela
Frente Nacional dos Traba-
lhadores. No dia de prender a
diretoria do Sindicato de São
Bernardo, eles queriam pren-
der as lideranças e prender o
apoio. E foram à minha pro-
cura. Não me encontraram,
cercaram a rua, ficaram ba-
sicamente 24 horas com a rua
cercada. No dia seguinte, che-
garam cedo à minha casa já
despachando para me prender,
e eu não estava. Começaram a
Em 1978, a exigência por comissões de fábrica é
gritar com a minha mulher, e
assumida pelos trabalhadores em greve.
ela pediu para eles dizerem o Acervo Oboré
que estava acontecendo. Iden-
tificaram-se como policiais:
‘Se vocês tivessem dito ontem
que eram policiais, eu tinha fa-
lado para o meu marido e ele “Em 1978 entrei na Tecnofor- uma repressão muito grande,
estaria aqui’. Minha mulher jas. Entrei e fui percebendo os muito pesada, da polícia den-
fez um enfrentamento interes- problemas que havia dentro tro da empresa, eram exérci-
sante. da empresa. Eram acidentes tos de policiais dentro e fora.
Quando ela percebeu que a muito graves. Um companhei- Mas foi uma luta que durou do
coisa estava ficando muito di- ro emendou a noite no dia, dia 26 de outubro ao dia 23
fícil telefonou pedindo socor- e quando eram três da ma- de novembro. Nós levávamos
ro para dom Paulo Evaristo, e nhã ele perdeu parte da mão. as reivindicações da CIPA, da
ele pediu para passar o telefo- Quando a greve dos metalúr- Comissão de Fábrica, o retor-
ne aos policiais, e ele disse aos gicos de São Paulo veio sendo no dos companheiros presos
policiais: ‘Olha, o Salvador declarada, suspendemos as que foram mandados embora
está comigo aqui na diocese, novas reivindicações e conti- e outras reivindicações”.
venham buscá-lo, mas deixem nuamos com as reivindicações
a família dele em paz’, e os ca- da greve dos metalúrgicos de Passado esses anos todos,
ras puxaram o carro. Fiquei São Paulo. Assim, termina- “O pessoal falava que o meu
21 dias refugiado na Assem- da a greve dos metalúrgicos nome estava no DOPS, e eu
bleia Legislativa, na Coorde- de São Paulo, continuamos não acreditava. Aí fui lá buscar
nação do Fundo de Greve”. com a nossa greve, porque tí- esse documento. E li esse docu-
nhamos as nossas reivindica- mento e senti força de vontade,
Ainda de 1978 é o relato de ções a serem feitas. Foi mui- porque vi a verdade. A perse-
Albino Barzi: to difícil, muito complicado, guição política, onde ela esta-

Investigação Final.indd 147 25/11/14 18:15


148

investigação operária

va dentro da gente. Em cima do


trabalhador, em cima do meta-
lúrgico. Precisei trabalhar de
porteiro, numa empresa que
prestava serviço para o Esta-
do, e me aposentei por ela, um
salário sem-vergonha porque
não tinha mais condições de
entrar na ferramentaria. Te-
nho diploma, certificado: ajus-
tador mecânico, tecnologia
mecânica, controles de medi-
das, ferramentaria”.

Já havia naquele momen-


to mudança de postura das em-
presas, que respondem à mobi-
lização generalizada com uma
elaboração mais sofisticada de
controle e vigilância dos traba-
lhadores: os serviços sociais são
ampliados dentro das fábricas,
com a contratação de assistentes
sociais e técnicos cuja função era
detectar e mapear as insatisfa-
ções dos operários.
O saldo da greve de 1978 entre
os trabalhadores foi a desconfian-
ça com a diretoria do Sindicato,
que fez um acordo para acabar a
greve, amplamente rejeitado pela
base dos operários nas fábricas. Joaquim e José Maria. Joaquim comunica que a assembleia
Essa suspeita teve como conse- dos 30 mil não pode decidir, se retira pela janela e manda
que os trabalhadores voltem no dia seguinte com a
quência o despertar dos operários carteira do sindicato em mãos para votar nas urnas
para a necessidade de uma gran- dentro da sede.
Acervo do Movimento
de greve geral, articulada entre as
categorias, de fato protagonizada
pela massa. Apenas assim teriam
forças para impor aos patrões e ao
Estado as suas demandas.
contrário da OSM-SP, que se le- nelas são aprovados os comandos
Esse será o reflexo na greve gitimava amplamente nas fábri- de greve, compostos pelas van-
geral de 1979. A diretoria do Sin- cas. As assembleias têm partici- guardas das fábricas. A diretoria
dicato estava desmoralizada, ao pação massiva de trabalhadores e é pressionada para arranjar luga-

Investigação Final.indd 148 25/11/14 18:15


149

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

res que sediassem regionalmen-


te os comandos, de forma que se
consolida democraticamente a
vontade da base do movimento.
A presidência da comissão de sa-
lários é ocupada por Pedro Perei-
ra do Nascimento, “Pereirinha”,
militante da Oposição, por voto
em assembleia.
Na noite do domingo em que
a greve se iniciou, 28 de outu-
bro, há invasão de todos os locais
onde funcionavam os coman-
dos de greve, particularmente
na Zona Sul, no salão Arco-Íris,
onde ocorreu a maior parte das
prisões. A vigilância estava re-
forçada nos locais da cidade de Assembleia dos 30 mil: a maior assembleia da categoria
será desrespeitada pela diretoria do Sindicato.
grande concentração industrial, Ricardo Alves/ Acervo IIEP – Projeto Memória da OSM-SP
como no Mofarrej – Leopoldi-
na (Zona Oeste); na Baixada do
Sapo (Zona Leste); na avenida
Nações Unidas e na região da Pe-
dreira (Zona Sul). A polícia re- regiões industriais continuam es- e ameaças dentro dos carros de
vistava os carros nas ruas. treitamente vigiadas. polícia, e fazem parte das cente-
Na terça-feira, dia 30 de ou- nas de casos não registrados.
tubro de 1979, depois da defla- Durante toda a greve há uso A relação dos antecedentes
gração da greve, num piquete do efetivo policial da Rota, como dos trabalhadores estava sob
pacífico, a repressão assassina nunca havia ocorrido. Os traba- posse do DOPS, apesar de já vi-
o operário Santo Dias. A greve lhadores presos eram conduzidos ger a Lei da Anistia. Os trabalha-
atinge seu auge: há grande como- diretamente ao DOPS, sendo ali dores que tinham passagem por
ção e indignação popular na cida- fichados. As prisões nos locais dos qualquer outra mobilização no
de, marcada por um largo corte- comandos de greve ocorriam in- passado não eram detidos e de-
jo que carrega o caixão, da Igreja discriminada e arbitrariamente; os pois liberados: ficavam lá para
da Consolação à Praça da Sé. O trabalhadores que estavam no Ar- investigações aprofundadas.
Centro de São Paulo é paralisa- co-Íris, na Zona Sul, foram presos. O ano de 1979 marca uma mu-
do, e os principais locais de fluxo dança profunda na repressão. Os
de trabalhadores são ocupados Há uma lista com o nome de setores empresariais e militares
pelos manifestantes. A multidão 334 presos fichados pelo DOPS precisaram responder à altura a
que acompanha o caixão no Cen- em toda a cidade. Não constam grande mobilização de massas
tro da cidade porta faixas e car- nessa lista os presos nas regiões que estava em curso. A violência
tazes, canta hinos e palavras de e levados para os distritos poli- da repressão passa a se escanca-
ordem, e não é molestada pela re- ciais, ou conduzidos nas viaturas rar ainda mais e extrapola os mu-
pressão. As fábricas e as ruas nas e que sofriam constrangimentos ros das fábricas.

Investigação Final.indd 149 25/11/14 18:16


150

investigação operária

As greves, tanto as isoladas


em uma empresa quanto as mais
disseminadas pela categoria me-
talúrgica de São Paulo, eram o
auge do enfrentamento entre ca-
pital e trabalho. E representavam
não somente o grande momento
de mobilização dos trabalhado-
res, mas de grande mobilização
das forças da repressão em defe-
sa dos interesses do capital.
Hélio Bombardi, ao relembrar
as greves de 78 e 79, ressalta:
Foram essas greves que colo-
caram a Oposição em cena. Em
1978, a gente conseguiu pegar
de surpresa os patrões nas gre-
ves de fábricas, e por isso fomos
a categoria que pôs mais gen-
te na rua; nossa assembleia ti-
nha 30 mil companheiros, mas
na greve de novembro de 1979
não houve tanta facilidade as-
sim, foi grande a repressão. Na
greve de 1979 já foi mais difí-
cil, porque os patrões estavam
mais preparados. Para se ter
ideia, em algumas regiões, no
dia anterior, a greve tinha vá-
rios companheiros presos. Na
Zona Sul, foram 108 compa-
nheiros presos, no Ipiranga fo-
ram companheiros presos, na Final do cortejo com o corpo de Santo Dias.
Governo mata de fome, polícia mata à bala.
Zona Leste foram companhei- Abaixo à ditadura. Dente por Dente.
ros presos, e tudo na noite an- As faixas mostram a indignação popular com o
terior à greve. Então, a greve assassinato de Santo Dias.
Acervo Oboré
ia sair debilitada. O Sindica-
to obviamente não precisavam
prender. Mas havia muita gen-
te presa e não era prisão qual-
quer, a grande maioria foi para ve da Zona Sul, relata o volume 28 de outubro, no dia seguinte
o DOPS. do aparato montado para enfren- começava o movimento, por-
tar a greve de 1979 e os métodos que o dia 1º de novembro era
Jorge Luiz dos Santos, o“Jorge integrados das polícias: a data limite do dissídio. A re-
Preto”, preso no comando de gre- Foi decretada a greve no dia pressão já estava preparada,

Investigação Final.indd 150 25/11/14 18:16


151

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

por causa da greve de 1978.


Nós conseguimos que em
cada região tivesse um espaço
para preparar a greve, onde
a gente determinava que era
o comando de greve, isso foi
uma luta dentro do Sindicato
dos Metalúrgicos para a gente
conseguir esse espaço. O que
nós combinamos? Que a par-
tir da meia-noite íamos orga-
nizar toda a militância, todo
o pessoal da linha de frente,
para na madrugada sair para
Na greve de 1979, a Rota prende trabalhadores
distribuir material e avisar a ativistas na Zona Sul.
toda a categoria. Principal- Jesus Carlos

mente as grandes empresas de


Santo Amaro, do movimento
grevista, para o pessoal en-
trar na paralisação. E essa
paralisação não era uma pa-
ralisação fora, era uma para-
lisação a princípio dentro das
empresas. Para isso, teria que
em cada porta de empresa ter
um número de militantes para
avisar ao conjunto que tinha
começado a greve. Quando a
militância começou a chegar,
de surpresa nós fomos cerca-
dos, todo o pessoal foi cer-
cado por vários camburões
Piquetão na Zona Sul em 1979. O corredor industrial
da Polícia Militar, incluindo da Avenida das Nações Unidas, onde estavam grandes
a chamada Rota, do Maluf. fábricas como Villares, Telemecanique, Caterpillar,
O pessoal estava começando Fag, MWM, Walita, Metal Leve, será tomado pelos
a chegar, então não foi pego piquetes que, de tão numerosos, se transformaram no
legendário Piquetão.
todo mundo que estava para Jesus Carlos
chegar, foi só o pessoal que
estava na linha de frente que
chegou um pouco mais cedo,
como no meu caso e outros que estava no primeiro plano soal estava chegando aí é que
companheiros, o Fernando e mais uma parte da base que a polícia fechou. Então ainda
do Ó, o Stanislaw, que chega- chegou. Esse pessoal foi deti- sobrou muita gente do lado de
ram mais cedo. Esse pessoal do. No momento em que o pes- fora. Só comigo, na leva, tinha

Investigação Final.indd 151 25/11/14 18:16


152

investigação operária

86 companheiros, na primei- nome lá, constando que tinha Lembrando que 80% dos tra-
ra leva que foi presa e, para problemas com a justiça. balhadores da Philco eram
nossa surpresa, apesar de ser mulheres.
a Polícia Militar que estava, Sofia Dias Batista trabalhou Em 1978, na Philco, fizemos
todos nós fomos encaminha- na Philco de 1977 a 1979, pas- uma greve de ocupação da fá-
dos diretamente ao DOPS ali sando por duas grandes greves. brica por uma semana. Éra-
na Estação da Luz. Na greve de 1978, os trabalha- mos mais ou menos 8 mil tra-
Quando nós chegamos, tam- dores compreenderam a neces- balhadores. A firma sabia que
bém já tinha vários compa- sidade da greve geral dos meta- a gente tinha condições de
nheiros de outras regiões lúrgicos e de ter uma campanha mobilizar.
que estavam vindo, que esta- participativa e democrática por-
vam sendo deslocados para que aprenderam a não confiar na A greve dos metalúrgicos da
o DOPS. A situação de como diretoria do Sindicato. Na greve capital em 1979 escancara os li-
chegaram... No primeiro pon- de 1979 enfrentaram o peso do mites da abertura política. O País
to de vista é indescritível, é aparato repressivo ao chegarem estava sendo comandado pelo
com extrema violência, é para próximos à fábrica. general da cavalaria João Figuei-
chegar e abafar, com operá- Fomos presos na porta da redo (que dizia preferir o cheiro
rios de fábricas, era como se Philco: eu, Maria José, o Jus- de cavalo ao cheiro do povo), o
estivesse atacando o pior ini- celino, o Joãozinho. Puseram Estado de São Paulo governado
migo, nem bandido da pior es- a gente num camburão, o que pelo inapresentável Paulo Ma-
pécie era tratado como eles nos causou muito constrangi- luf, e a Polícia Federal dirigida
chegavam para tratar o grupo mento, pois estávamos juntos por Romeu Tuma. Essas figu-
de trabalhadores. Foram vá- com os companheiros da fá- ras coordenaram um tipo de re-
rios camburões. A maioria do brica. A greve de 1979 não foi pressão em massa vista somente
pessoal ficou o resto da noite como na de 1978, que pegou em São Paulo em 1963, na greve
mais o outro dia. Foi libera- os patrões de surpresa. Em dos 700 mil, quando a polícia do
do o pessoal no dia 29, que já 1979, quando chegamos para governador Adhemar de Barros
tinha começado a greve, e o panfletar na porta da fábrica, prendeu 2 mil trabalhadores. Na
pessoal foi segurado no DOPS em plena campanha salarial, época criou um verdadeiro “es-
até o dia 29 à noite. Aí solta- havia um corredor polonês de tado de sítio”, uma tensão polí-
ram todo mundo. A princípio, militares. O corredor polonês tico-social extraordinária como
todos aqueles que foram pre- era mais ou menos de 600 me- senha para o enfrentamento com
sos de imediato já perderam o tros, ia da avenida Celso Gar- o governo de Jango, que que-
emprego, isso era uma regra. cia, onde passavam os ônibus, riam derrubar. A greve de 1979
Mesmo a gente participando ali na rua Santa Virgínia, até causou nas concentrações indus-
da greve dentro das fábricas, a porta da fábrica, só tinha triais uma nunca vista mobiliza-
tentando fazer o mais escon- polícia. Nos dois lados da cal- ção policial na cidade.
dido possível, a partir do mo- çada havia policiais com cas- Apesar da postura vacilante e
mento em que era descoberto, setetes, capacete, preparados suspeita da diretoria do Sindica-
que participou do movimen- para a guerra. Esse apara- to, da prisão dos 334 trabalha-
to, estava na rua... Essa lista to policial deixava claro que dores e do assassinato de um di-
do DOPS por vários e vários a polícia estava a serviço da rigente grevista em um piquete
anos, quando consultava para empresa. Mesmo assim, a gre- pacífico, a greve foi um suces-
tirar identidade, aparecia o ve aconteceu. Paramos 100%. so.

Investigação Final.indd 152 25/11/14 18:16


153

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

Relação dos presos na greve geral


dos metalúrgicos da capital em 1979

01 – Afonso Donato das Neves 16 – Claudio Eduardo de Miranda


Atenção: todo trabalhador Filiação: José Donato Benedito e Filiação: José Honorio de Miranda
Francisca Maria das Neves e Celina Maria de Miranda
que teve prejuízos na sua
vida profissional decorrente 02 – Augusto Rodrigues Reis 17 – Clemiltre Guedes da Silva
Filiação: João Alves dos Reis e Filiação: José Guedes da Silva e
de perseguição política pelos Lucia Rodrigues Reis Alzira Augusta da Silva
órgãos de Estado tem direito à
03 – Agostinho Moreira da Silva 18 – Davi Francelino da Silva
anistia política. Os que foram Filiação: Balbino Moreira da Silva Filiação: Francelino Jose da Silva
presos nas greves e foram e Mariana Teixeira Tavares e Maria Rosa da Silva
demitidos ou colocados em listas 04 – Alexandrino Martins 19 – Elmo Pinheiro Maciel
para não serem empregados Gordinho Filiação: Antonio Pinheiro Maciel e
Filiação: Eurico de Souza Maria do Carmo Silva
têm esse direito. Gordinho e Izaura Augusta
A publicação das listas Martins 20 – Iraniz Severino Souza
Filiação: Francisco Severino de
dos presos na greve de 1979, 05 – Atevaldo Gonçalves Santos Souza e Deolinda Rosa de Jesus
encontrada no DOPS, se destina Filiação: Durval Gonçalves
Santos e Cecília Vitorino Santos 21 – Elias Pereira
a todos os companheiros que Filiação: Hermogenes Moreira e
sofreram com o desemprego por 06 – Antonio Felinto Neto Mariana Pereira
Filiação: Antonio Gomes Bezerra e
perseguição política, para que Joana Felinto Bezerra 22 – Edson Domingos de Oliveira
possam buscar seus direitos. Filiação: Jose Domingos de
07 – Ari Damascena da Camara Oliveira e Maria de Lourdes
Os trabalhadores Filiação: Napoleão Bonaparte da Freiras
participaram na Comissão Camara e Maria Pureza da Camara
23 – Erivaldo Batista de Souza
Nacional da Verdade por meio 08 – Antonio Germano da Silva Filiação: Pedro Batista Sobrinho e
do Grupo de Trabalho 13. Nas Filiação: Manoel Germano do Gezi Batista de Souza
Nascimento e Antonia Domingos
suas recomendações para a CNV Ferreira 24 – Francisco Antonio Alves
no encerramento dos trabalhos Filiação: Jose Alves Neto e Edite
09 – Antonio Cardoso de Souza Duarte
propõem que aqueles que Filiação: João Cardoso de Souza e 25 – Fernando Albiere Godoy
sofreram coletivamente com Anila Alves de Souza Filiação: Lazaro de Almeida Godoy
e Hermogenes Albiere Godoy
a repressão possam recorrer 10 – Antonio Alves da Silva
à Comissão de Anistia do Filiação: Raimundo Alves de 26 – Francisco de Assis Carvalho
Freitas e Antonia Mello Silva Bastos
Ministério da Justiça. Filiação: Deolindo Andrade
“Criar instrumentos que 11 – Aldo Esteves Bastos e Maria Carvalho Bastos
Filiação: Claudio Esteves e Amelia
viabilizem ações coletivas Covolo Esteves 27 – Francisco de Paula Martins
de grupos de trabalhadores 12 – Braz Furtado Filiação: Raimundo Martins
Filiação: Vicente Furtado e Salazar e Maria Lopes da Rocha
que sofreram prejuízos em Geralda Zacarias
decorrência da repressão política 28 – Jose Grigorio de Jesus
13 – Carlos Fernandes de Oliveira Filiação: Anastacio Leonario dos
da ditadura civil-militar, sem Filiação: João Joaquim de Oliveira Santos e Ana Sinhora de Jesus
a exigência de comprovação e Maria Fernandes de Oliveira
29 – Amavel Barroca
individual da perseguição 14 – Cleodon Silva Filiação: Antonio Barroca e
sofrida”. (item 7, do capítulo Dos Filiação: Alfredo Joaquim da Silva Iracema do Amaral de Bastos
e Aleonilda Viana da Silva
crimes contra a humanidade, 30 – Carlos Alberto Goes
Documento de Recomendações 15 – Claudio Domingos de Oliveira Filiação: Vercenlencio Araujo
Filiação: José Domingos de Goes e Maria Jose Goes
do GT 13 da CNV). Oliveira e Maria de Lourdes
Freiras 31 – Gilberto dos Santos

Investigação Final.indd 153 25/11/14 18:16


154

investigação operária

Filiação: João Francisco dos Maria Antonia da Silva 66 – Guerino Gomes de Souza
Santos e Maria do Carmo dos Filiação: Francisco Assis de Souza
Santos 49 – Antonio Carlos de Campos e Maria Jose de Souza
Filiação: Antonio de Campos e
32 – Paulo Pereira da Silva Laura dos Santos Campos 67 – Geraldino Pereira dos Santos
Filiação: Benedito Pereira da Silva Filiação: Jose Ferreira dos Santos
e Tereza Durval 50 – Antonio Tavares e Elvira Pereira dos Santos
Filiação: Jeronymo Tavares e
33 – Paulo Rodrigues dos Santos Geralda da Silva Tavares 68 – Helio Bombardi
Filiação: Gabriel Rodrigues dos Filiação: Francisco Bombardi e
Santos e Maria de Freitas dos 51 – Clovis Brandão de Moraes Ursulina Balasso Bombardi
Santos Filiação: João Cabral de Moraes e
Adelina Brandão de Moraes 69 – João Barreto Batista
34 – Paulo Francisco Moura Filiação: Benedito Barreto de
Filiação: Manoel Francisco Moura 52 – Diogenes Carvalho Alves Lima e Maria Bertone de Lima
e Rosa Delgado Moura Filiação: Jose Domingos Alves e
Corina Carvalho dos Santos 70 – João Bosco Viana
35 – Antonio Lauro Campanha Filiação: Jose Roberto Viana e
Filiação: João Campanha e Maria 53 – Franco Farinazzo Adelina Martins da Silva
Botaro Campanha Filiação: Nereo Farinazzo e Ida
Roveroni Farinazzo 71 – João Francisco dos Santos
36 – Clemiltre Guedes da Silva Filiação: Manoel Francisco dos
Filiação: Jose Guedes da Silva e 54 – Jose Genivaldo de Santana Santos e Maria Francisca de Jesus
Alzira Augusto da Silva Filiação: Maurilio Olimpio de
Santana e Maurina Alexandrina 72 – João Alves de Lima
37 – Manoel Luiz da Silva de Santana Filiação: Zacarias Alves de Lima e
Filiação: Antonio Luiz Soarez e Maria de Lourdes de Lima
Antonia Felizmina de Jesus 55 – Lourdes Sola de Paula Vieira
Filiação: Waldemar Sola 73 – João Oliveira de Souza
38 – Teofanes Roberto Rodrigues e Luiza de Paula Sola Filiação: Amaro Jose de Souza e
Filiação: Tiago Roberto e Hilda Maria Oliveira de Souza
Pereira de Melo 56 – Marcos Antonio Pereira
Filiação: João Gabriel Pereira e 74 – João Soares da Cruz
39 – Aparecida Malavazi Djanira Pereira de Carvalho Filiação: Antonio Marques de Cruz
Filiação: Aribaldo Malavazi e e Maria Soares de Cruz
Aparecida Jorge Malavazi 57 – Virginio Demadone
Filiação: Enrico Sansoni e 75 – Joracy Soares
40 – Francisco Jose de Oliveira Alessandra Sansoni Filiação: Jose Soares e Virgilina
Filiação: Jose Elpidio de Souza e Louzada Soares
Carmelita Coelho de Oliveira 58 – Waldemar Soares do
Nascimento 76 – Jose Martin de Oliveira
41 – Jose da Costa Prado Filiação: Evaristo Soares Filiação: Jose Domingos de
Filiação: Pedro Costa Prado e de Souza e Maria Rodrigues Oliveira e Maria de Lourdes Freire
Carmelita Francisca de Paula do Nascimento
77 – Jose de Freitas Nobre
42 – João Augusto Moura 59 – Francisco Balduino Filiação: Antonio de Freitas Nobre
Filiação: Francisco Moura e Filiação: Maria Merces Cavalcanti e Raimunda Otaviano da Costa
Edmeia Castro Moura
60 – Julio Joaquim de Araujo 78 – João Roberto Quirino
43 – Jose Hedwiges de Oliveira Filiação: Jose Joaquim de Araujo e Filiação: Dorvalina Maria de Jesus
Filiação: João Candido de Oliveira Maria Isabel de Araujo
e Maria Aparecida de Oliveira 79 – João de Souza Pena
61 – Jair Gallo Filiação: Nestor Pena e Laura da
44 – Maria do Carmo de Melo Filiação: Afonso Gallo e Nairo Mata e Souza
Filiação: João Gomes de Lima e Ana Ponso Gallo
Genoveva de Lima 80 – João Pereira dos Santos
62 – Francisco Ferreira Filho Filiação: Oscar Pereira dos
45 – Maria Rita Marques da Silva Filiação: Francisco Ferreira Santos e Sebastiana M. de
Filiação: João Marques da Silva e Cavalcante e Antonia Nunes Albuquerque
Maria Gomes da Silva Bezerra
81 – Jorge Luiz dos Santos
46 – Jose Alves da Silva 63 – Fernando do Ó Velozo Filiação: Francisco Lopes de
Filiação: Waldemar Gama dos Filiação: Rodrigo Pereira Velozo e Oliveira e Joanita Helena dos S.
Santos e Carmelita Alves da Silva Maria do Ó do Nascimento Oliveira

47 – Paulo Luna dos Santos 64 – Fidelcino Antonio de Oliveira 82 – Jose Augusto Gomes de Moura
Filiação: Francisco de Luna e Olga Filiação: Ana Maria de Jesus Filiação: Joana Gomes de Moura
Vieira dos Santos
65 – Geraldo Resende Sobrinho 83 – Jose Costa Silva
48 – Pedro de Lima Filiação: Jose Noberto de Souza e Filiação: Vicente Marques da Silva
Filiação: Antonio Pedro de Lima e Jandira Candida de Oliveira e Efigenia Rosalina da Costa

Investigação Final.indd 154 25/11/14 18:16


155

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

84 – Jose Jacinto Sobrinho 101 – Osvaldo Dantas de Araujo Filiação: Maneol Cursino Filho e
Filiação: João Jacinto Cavalcante Filiação: Maria Lopes da Silva Rosenice de Novais Cursino
e Jacira Maria da Conceição
102 – Oscar Rufino Pereira 120 – Walmir Barbosa de Oliveira
85 – Joaquim Rodrigues dos Filiação: Euclides Pereira e Maria Filiação: Waldemar Barbosa de
Santos Rufino Pereira Oliveira e Maria Ferreira de
Filiação: Artur Pestana de Oliveira
Oliveira e Maria Rodrigues dos 103 – Onivaldo Gonçalves Coimbra
Santos Filiação: Floripes Gonçalves 121 – Waltair Barbosa Cordeiro
Coimbra e Maria Francisca de Filiação: Durval Pereira Barbosa
86 – Jose Xavier de Souza Jesus e Eunice Cordeiro Barbosa
Filiação: Glicerio Xavier de Souza
e Vitoria Xavier de Souza 104 – Pedro Domingos de Oliveira 122 – Wagner de Almeida
Filiação: Maria de Lourdes Freires Filiação: Tapi de Almeida e
87 – Jose Ribeiro dos Santos Angelina Scorsi de Almeida
Filiação: Ernestino Ribeiro dos 105 – Paulo Roberto Leandro
Santos e Maria Santa dos Santos Filiação: Manoel Roberto Leandro 123 – Vicente de Oliveira
e Edite Maria de Leandro Filiação: Jose Francisco Oliveira e
88 – Jose Maria de Carvalho Maria Gonçalves de Oliveira
Filiação: Maria Rosa 106 – Paulo Cezar Martins
Filiação: Milton Martins e Isabel 124 – Jose Cornelio da Silva
89 – Jose Antonio Mario de Peres Filiação: Jose Maciel da Silva e
Oliveira Quiteria Maria
Filiação: João Magno Batista e 107 – Raimundo Elias de Souza
Alzira Maria de Oliveira Filiação: Pulquerio Eliza de Souza 125 – Pedro Marques Pereira
e Clarinda Rozenda Palma Filiação: Antonio Alves Pereira e
90 – Juvenal Francisco Rodrigues Izolina Marques de Brito
Filiação: Francisco Jose 108 – Reginaldo Jose da Silva
Rodrigues e Prezelina Alves Filiação: Josefa Sobral da Silva 126 – Antonio dos Reis Alves de
Rodrigues Souza
109 - Reginaldo Jose Severino Filiação: Jose Alves de Moraes e
91 – Jose da Silva Mota Filiação: Jose Severino Filho e Benta Pereira Alves
Filiação: Heliodorio Francisco Severina Augusta Alexandre
Mota e Rosalina da Silva Mota 127 – Maria Lucia Torres
110 – Rui Fernandes de Oliveira Filiação: Nico Torres e Maria Alves
92 – Jose Carlos de Lima Filiação: João Joaquim de Oliveira Mendes Torres
Filiação: Alzira Barros de Lima e Maria Fernandes de Oliveira
128 – Antonio Ferreira de Oliveira
93 – Jose Ailton Gomes Oliveira 111 – Sebastião Martins Sobrinho Filiação: Ananias Ferreira de
Filiação: Edivaldo Gomes de Filiação: João Martins Pereira e Oliveira e Josefa Nazaré de
Cerqueira e Eurides de Oliveira Lindore Francisca Pereira Oliveira
Santos
112 – Stanislaw Szermeta 129 – Francisco Nelson da Costa
94 – Jose Ademar de Oliveira Filiação: Jose Szermeta e Galvão
Filiação: Maria Fernandes de Anastacia Szermeta Filiação: Francisco Chagas Galvão
Oliveira e Isabel da Costa Galvão
113 – Sebastião Andrade de Souza
95 – Lino Adão da Silva Filiação: João Batista de Souza e 130 – Salvador Pereira de Azevedo
Filiação: Adão Alves de Figueiredo Maria Jose Conceição Filiação: Francisco de Assis
e Rosa Joana do Espirito Santo Azevedo e Albertina Pereira de
114 – Sergio Luiz Mattedi Azevedo
96 – Mauricio de Souza Bello Filiação: Alfredo Mattedi e Izaura
Filiação: Antonio de Andrade Mattedi 131 – Jose Carlos Pereira de
Bello e Isaura Laura Souza Almeida
115 – Tadeu Jose Szermeta Filiação: Euclides Alves de Almeida
97 – Nilton Vitorino dos Santos Filiação: Jose Szermeta e e Isaltina Bastos de Almeida
Filiação: Marcolino V. Santos e Anastacia Szermeta
Miqueline Maria de Jesus 132 – Gabriel Arcanjo do Espirito
116 – Tarcísio Mendes da Silva Santo
98 – Manoel Nonato de Freitas Filiação: Olavo Amansueto da Filiação: Raimundo Pedro do
Filiação: Raimundo Nonato de Silva e Maria da Conceição Espirito Santo e Maria Generosa
Freitas e Francisca das Chagas de Oliveira da Silva
Freitas 117 – Ulicio Gonçalves da Silva
Filiação: Jose Gonçalves da Silva e 133 – Adnaldo Figueiredo Ribeiro
99 – Nilson Pereira Zulmira Maria da Conceição Filiação: Augusto Ribeiro dos
Filiação: Adamastor Pereira e Santos e Placida Idelfina
Olivia Maria da Penha Pereira 118 – Vicente Eduardo do Prado Figueiredo
Filiação: Jose Nicolau do Prado e
100 – Norris de Almeida Coll Ides Inacia do Prado 134 – Antonio Luiz Marchioni
Filiação: Heitor Coll de Oliveira e Filiação: Adilio Marchioni e Olivia
Maria Eva de Almeida Coll 119 – Honorides Cursino da Rocha Matheus Marchioni

Investigação Final.indd 155 25/11/14 18:16


156

investigação operária

135 – Assis Donizeti de Carvalho 152 – Carlos Souza Joana Dias dos Santos
Filiação: Francisco de Carvalho e Filiação: José Antonio de Souza
Terezinha Meli de Carvalho Neto e Alaide de Almeida Souza 169 – Cleri Gomes Muniz
Filiação: Jose Paulo Muniz e
136 – Clovis Lopes Granado 153 – Ademar Marcili Maria Gomes Santos
Filiação: João Manoel Lopes da Filiação: Antonio Marcili e Ana
Silva e Epifenia Bartolomeu Lamonica Marcili 170 – Natalicio Gregorio da Silva
Granado Filiação: Jose Gregorio da Silva e
154 – Reginaldo Pereira de Hungria Maria Jose da Conceição
137 – João Antonio da Silva Filho Filiação: Raimundo Pereira de
Filiação: João Antonio da Silva e Hungria e Rosa Joana de Jesus 171 – Mauro Francisco de Almeida
Euculatica Maria da Rocha Filiação: Catarino Francisco de
155 – Nelson Pires Almeida e Antonia Almeida
138 – Renato Silveira Martins Filiação: Otaviano Pires e Ana de
Filiação: Mario Alves Martins e Lima 172 – Cirilo Ferreira do Nascimento
Guiomar Silveira Martins Filiação: Manoel Ferreira do
156 – João Tiago da Silva Nascimento e Maria Ferreira da
139 – Sandoval Tavares da Silva Filiação: Felipe Tiagno Apostolo e Conceição
Filiação: João Tavares da Silva e Maria Alves Pereira
Josefa Severina da Conceição 173 – Rubens Eufrosino Filho
157 – Ademir Salvador dos Santos Filiação: Rubens Eufrosino e
140 – Lexinaldo de Oliveira Silva Filiação: José Salvador dos Odete C. Eufrosino
Filiação: Joel Reis e Maria de Santos e Hilda de Oliveira dos
Lourdes Oliveira Silva Santos 174 – Sebastião Figueiredode Lima
Filiação: Aurélio Figueiredo de
141 – Paulo Gomes de Oliveira 158 – Francisco de Paula Vitor Lima e Maria de Lourdes Pereira
Filiação: Jose Gomes de Oliveira e Monteiro de Lima
Antonia Bezerra de Oliveira Filiação: Antonio Paulo e Aba
Candida Monteiro 175 – José Lima Soares
142 – Francisco de Assis Neves Filiação: Francisco Soares e
Filiação: Guilherme Machado das 159 – Antonio Salvador dos Santos Isaura Maria de Lima
Neves e Valdevina Santos das Filiação: José Salvador dos
Neves Santos e Hilda Oliveira dos 176 – Joaquim Venturini Filho
Santos Filiação: Joaquim Venturini e
143 – Clovis Alves Souza Elvira Pezzi
Filiação: Manoel Alves de 160 – Clementino Filho
Carvalho e Maria Candida Alves Filiação: Clemente José dos 177 – Walfrido Sebastião Martins
de Souza Santos e Senhorinha José dos Filiação: Joaquim Gomes Martins e
Santos Elidia Gomes Martins
144 – Joaquim Agripino Teixeira
Filiação: Gentil Teixeira e Cecilia 161 – Edivaldo Tavares Santos 178 – Vera Lucia de Oliveira
Castorina de Lana Filiação: Clemente José Tavares e Machado
Maria de Lourdes Santos Filiação: Joaquim Machado e Maria
145 – Francisco João da Costa de Oliveira Machado
Filiação: João José da Costa e Jose 162 – Severino dos Santos Nunes
Maria da Conceição Filiação: Cordeiro de Vasconcelos 179 – Verônica Antonia Silva
Filiação: Cícero Silveira da Silva e
146 – Antonio Pimenta da Silva 163 – Evondi Ferreira da Silva Antonia Francisca da Conceição
Filiação: José Guilherme da Silva e Filiação: Faustino Ferreira de
Ana Moraes da Silva Azevedo e Antonia Maria da 180 – João Fernandes de Oliveira
Conceição Filiação: Virgilio Claudino
147 – Alcebino Vieira dos Santos Fernandes
Filiação: Ramiro Vieira dos Santos 164 – Edson Alexandre Bezerra e Maria Ciça de Oliveira
e Izabel Maria da Conceição Filiação: Cesario F. Campos e
Abigamir Maria Bezerrra 181 – Mário Itamar dos Reis
148 – João Honorio da Silva Filiação: Silvério Nunes Reis e
Filiação: Antonio Honório da Silva 165 – Jose Francisco Campos Nair Nunes Reis
e Luzia Zeferina Leite Filiação: Cesario F. Campos e
Severina Maria Campos 182 – Aristeu Genuino do
149 – Antonio Aecio Bezerra Leite Nascimento
Filiação: Antonio Ferreira Leite e 166 – Antonio Laurindo da Silva Filiação: Mariano Genuino do
Alice Bezerra Leite Filiação: Sebastião Laurindo da Nascimento e Bernardina Pereira
Silva e Sebastiana Francisca da de Souza
150 – Elizeu Camargo Magalhães Silva
Filiação: Francisco Pereira 183 – Almerino França
Magalhães 167 – Antonio de Resende Lima Filiação: Cristino de França
e Elisa Camargo Magalhães Filiação: Maria Gracieta de Antunes e Maria Feitosa de Souza
Resende Lima
151 – João Ferreira dos Santos 184 – Manoel Luiz da Silva
Filiação: José Ferreira dos Santos 168 – Manoel Divino Dias da Rocha Filiação: Antonio Luiz Soares e
e Corina da Silva Filiação: Basilio Dias da Rocha e Antonia Felismina de Jesus

Investigação Final.indd 156 25/11/14 18:16


157

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

185 – Agostinho Aleixo de Bastos Castro Alves 220 – Silvio de Moraes


Filiação: José Aleixo de Bastos e Filiação: João Rodrigues Alves e Filiação: Lázaro de Moraes e
Maria Matias de Santana Raimunda de Castro Alves Maria Alves de Oliveira

186 – Antonio Carlos Garcia 204 – Adão Raimundo de Melo 221 – Joaquim Luiz de França
Filiação: Pedro Dutra Garcia e Filiação: Miguel Raimundo de Melo Filiação: Valdemar Luiz de França
Benedita Candida Garcia e Olindina Maria de Melo e Maria Feline da Silva

187 – Antonio Sertorio Filho 205 – Israel Fernandes do 222 – Alonso Alvarez Lopes
Filiação: Antonio Sertorio e Nascimento Filiação: Jesus Alvarez Prieto e
Filomena de Marcos Sertorio Filiação: Francisco Fernandes do Olívia Alvarez de Almeida Alvarez
Nascimento e Isabel Maria da Prieto
188 – Aparecido Cardoso Conceição
Filiação: Benedito Cardoso e 223 – Antonio Vieira de Barros
Olivia Maria de Jesus 206 – Antonia Ribeiro da Silva Filiação: Leobina Vieira de Barros
Filiação: José Paulo da Silva e
189 – Jose Carlos Souza Iracema Ribeiro da Silva 224 – Cacilia Elizabeth Hansen
Filiação: Tiburcio de Souza e Ana Filiação: Martin Hansen e Katarina
Maganha de Souza 207 – Eovaldo Pedro de Nolacio Hansen Lenges
Filiação: Manoel Pedro Nolacio e
190 – Jose Noel da Costa Antonia Pereira Nascimento 225 – Hollis Ann Chenery
Filiação: Josefa Noel da Costa Filiação: Hollis Burley Chenery e
208 – Afro Almeida e Silva Nancy Loise Seimster
191 – Levy Pereira Filiação: Severino Francisco da
Filiação: Gumercindo Pereira e Silva e Joana Almeida e Silva 226 – Marco Antonio Longhini
Petronilia Daniel Pereira Barbosa
209 – Jose Pereira Costa Filiação: Palmenio Pio Barbosa e
192 – Manoel da Silva de Jesus Filiação: Arlindo Ferreira Costa e Iracema Longhini
Filiação: Laura Maria de Jesus Lourdes Gonçalves
227 – Pedro Jose Coelho
193 – Sebastião Cassiano de Fora 210 – Divino Aparecido Nascimento Filiação: Francisco José de Abreu
Filiação: João Cassiano de Fora e Filiação: Jose Sebastião e Maria José de Jesus
Maria Aparecida Nascimento
e Ana Camilo Nascimento 228 – Cenerino Evangelista de
194 – Waldemar Rossi Andrade
Filiação: Atilio Rossi e Rosa 211 – Rubens de Paula Fernandes Filiação: Luiz Evangelistade
Bolean Filiação: Eliziario Inacio Andrade e Brasília Maria de Jesus
Fernandes
195 – Antonio Maqueda e Lidia de Paula Fernandes 229 – Afonso Barbosa de Souza
Filiação: Francisco Maqueda Vera Filiação: José Barbosa da Silva e
e Francisca Candida Vera 212 – Luiz Leite da Silva Anita Barbosa de Souza
Filiação: Alfredo Leite da Silva e
196 – Luiz de Moraes Belisa Alves Leite 230 – Maria Arleide Alves
Filiação: Augusto Avelino de Filiação: Antonio Firmino Alves e
Moraes e Maria Vaz Domingues 213 – Claudio Peanho Aurelina Santos Alves
Filiação: Antonio Peanho e Maria
197 – Jose Benedito Bento Esperança Otero Peanho 231 – Maria das Mercês Pereira
Filiação: Luiz Isac Bento e Benedita Apostolo
Ezequiel Bento 214 – Sofia Dias Batista Filiação: Deoclaciano Pereira
Filiação: Alberto Dias Batista e Apóstolo e Rita Ferreira de
198 – Osvaldo Angelo Chaves Maria A. Dias Batista Oliveira
Filiação: Geraldo Angelo da Silva
e Sebastiana Chaves F. S. 215 – Severino Jose Andrade 232 – Elcio Marques Fernandes
Filiação: Jose Luiz de Andrade e Filiação: Osmar Fernandes e
199 – Nelson de Oliveira Leite Etelvina Helena de Jesus Eunice Marques Fernandes
Filiação: Isaltino Francisco Leite e
Geralda Filomena Jesus 216 – Antonio Ribeiro Barcelos 233 – Arsenio Rodrigues da Silva
Filiação: José Ribeiro de Farias e Filiação: Jerônimo Rodrigues da
200 – Anedino Vicente de Araujo Conceição Cassiano Barcelos Silva e Cândida Pereira da Silva
Filiação: José Vicente de Araujo e
Amalia Maria Nascimento 217 – Roberto Bueno 234 – Paulo Ribeiro da Silva
Filiação: Antonio Bueno e Filiação: Luiz Ribeiro da Silva e
201 – Jose Cicero da Silva Mercedes da Silva Bueno Zilda Ribeiro da Silva
Filiação: Cicero João da Silva e
Rita Ana da Conceição 218 – Paulo Rogerio Polido 235 – Milton Loiola
Filiação: Manoel Batista Polido e Filiação: Orlando Moreira e
202 – Cristovão Lopes Amancio Julia Maria da Conceição Leoniza Loiola
Filiação: Clementino Amancio e
Raimunda Martins Lopes 219 – Luiz da Silva 236 – Luiz Eduardo de Oliveira
Filiação: Manoel da Silva e Filiação: Miguel Antonio de
203 – Raimundo Nonato de Francisca Rodrigues da Silva Oliveira e Rosa Maria de Oliveira

Investigação Final.indd 157 25/11/14 18:16


158

investigação operária

237 – Jonas Alves Portugal 254 – Raymundo Nonato Silva Filiação: Gastão Afonso e Beatriz
Filiação: Josino Alves Portugal e Filiação: Raymundo Cirillo dos A. Afonso
Maria Bela Portugal Ferreira
e Ana Martins de Vasconcellos 271 – Joaquim Santana da Silva
238 – Lucio Caetano de Pinho Filiação: Eufranio Ferreira da
Filiação: Leonino Caetano de 255 – Antonio Jose Gomes Silva e Amalia Santana Bispo
Pinho e Joana Caetano de Pinho Filiação: Sebastião Pascoal Gomes
e Ana da Silva Gomes 272 – Braz Santiago
239 – Francisco Alves Costa Filiação: Antonio Noberto
Filiação: João Alves das Mercê e 256 – Sebastião Machado Fagundes Santiago e Rita Ana Feitosa
Maria Moreira Alves Neto
Filiação: Francisco Machado 273 – Manoel Sena Dias
240 – Jonival Jose Ferreira Fagundes e Maria Lucea Fagundes Filiação: José Sena Dias e Idalina
Filiação: Manoel José Ferreira e Ferreira Dias
Maria Olindina Ferreira 257 – Vadir Pereira de Andrade
Filiação: Olindo Pereira de 274 – João Vieira
241 – Percival Joaquim do Andrade e Maria Coelho da Silva Filiação: Manoel Vieira e Raimunda
Nascimento Alves Vieira
Filiação: Joaquim Valdevindo 258 – Zacarias dos Santos
Nascimento e Maria Mailde do Filiação: José Lourenço dos
Nascimento Santos e Maria Eunice dos Santos 275 – Apolonio Antonio Macedo
Filiação: Antonio Francisco de
242 – Leonildo Rodrigues 259 – João Vasconcelos Macedo e Izabel Maria da
Filiação: Lourenço Bueno Filiação: Raimundo Cirillo Conceição
Rodrigues e Maria Franco Ferreira e Ana Martins de
Rodrigues Vasconcelos 276 – Edison Ribeiro Lima
Filiação: Joaquim Isidoro Lima e
243 – Osmar Freitas de Jesus 260 – Milton Moraes da Cruz Ana Ribeiro Lima
Filiação: Oswaldo de Jesus e Edith Filiação: Antonio Moraes da Cruz
Freitas de Jesus e Hilda Xavier da Cruz 277 – Geraldo Aniceto do
Nascimento
244 – Amauri Caparroz Marques 261 – Roberto Mariano do Prado Filiação: Waldemar Aniceto do
Filiação: Manoel Caparroz e Olivia Filiação: Pedro Mariano do Prado Nascimento e Maria da Conceição
Marques Caparroz e Helena Cada do Prado da Silva

245 – Samuel Barbosa da Silva 262 – Wilson Dutra Valle 278 – Jose Agostinho Neto
Filiação: Antonio Barbosa da Silva Filiação: Washington Dutra Valle Filiação: Aristeu Agostinho do
e Maria Severino da Silva e Idalina da Silva Nascimento e e Etevilna Joana da
Conceição
246 – Israel Alves dos Santos 263 – João Carlos Batista da
Filiação: Abidias Alves dos Santos Rocha 279 – Edvaldo Antonio de Brito
e Antonia Alves dos Santos Filiação: Osório Dias Batista e Filiação: Antonio José de Brito e
Rosaria Florencio da Rocha Cezarina da Silva Brito
247 – Miguel Tadeu de Carvalho
Filiação: Geraldo L. de Carvalho 264 – Silvio Luiz Teofilo 280 – Jose Aloisio de Souza
e Geralda Bastos de Carvalho Filiação: Valdomiro Antonio Filiação: João Antonio de Souza e
Teofilo e Aparecida Nogueira Conceição Dias de Souza
248 – André Luiz dos Santos
Filiação: Joaquim Pedro dos 265 – Fernando Albiere Godoy 281 – Jose Alves Leite
Santos Filiação: Lazaro de Almeida Godoy Filiação: João Alves Leite e Clara
e Alice Otávia dos Santos e Ermogene Alhiere de Godoy Nercina Leite

249 – Elso Bortolo 266 – Islandi Baptista Abrunheiro 282 – Jose Luiz da Silva
Filiação: Sebastião Bortolo e Vinia Filiação: João Baptista Filiação: Luis Mendes da Silva e
Sartório Bortolo Abrunheiro e Felicidade Maria de Oliveiras
Abrunheiro
250 – Vitor Generoso Sobrinho 283 – Raimundo Soares Ramos
Filiação: José Generoso Pacheco e 267 – Francisco Cardoso Filho Filiação: Cicero Soares Ramos e
Eduvirges Rodrigues Pacheco Filiação: Francisco Cardoso da Maria Correira Lima
Silva e Francisca Gonçalvesde
251 – Valdir Romualdo Ribeiro Carvalho 284 – Salvino Rodrigues de Freitas
Filiação: Adolfo Romualdo Ribeiro Filiação: Luiz Rodrigues e Maria
e Deorides Bonifácio Gomes 268 – João Batista da Silva Luiza de Freitas
Filiação: Severino Correa da Silva
252 – Benedito Aparecido do Prado e Laura Oliveira dos Santos 285 – Waldir Antunes da Silva
Filiação: Milton Mendes Prado e Filiação: Jonas Neves da Silva e
Vicentina Floriano Prado 269 – Sebastião Marques da Silva Valdevina Antunes da Silva
Filiação: Alice Maria da
253 – Irineu Campagnucci Conceição 286 – Walter França da Silva
Filiação: Alcides Campagnucci e Filiação: João França da Silva e
Florinda Lopes Campagnucci 270 – Orlando dos Santos Afonso Maria Joana da Conceição

Investigação Final.indd 158 25/11/14 18:16


159

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

287 – Antonio Aparecido 303 – Marcelo Fortes Barbieri 320 – José Pietrobom Rotta
de Morais Filiação: Nelson Barbieri e Maria Filiação: Augusto Rotta e Synyra
Filiação: Joaquim Gomes de Morais Silvestre Campos Pietrobom Rotta
e Sebastiana Alves da Rosa
304 – Orlando Silvestre Campos 321 – João Manoel Vieira Soares
288 – Decio Guerreiro Parentes Filiação: José Campos Ramos e Filiação: Manoel M. Soares de Melo
Filiação: Ramom Guerreiro e Rosa Silvestre Campos e Julieta do E.E. Vieira
Carmem Guerreiro Parentes
305 – Paulo Garcia Lelis 322 – Xavier Uytdenbroek
289 – Eduardo dos Santos Filiação: Sebastião Garcia Filiação: Carlos Uytdenbroek e
Ferreira Lelis e Leda Alves Ferreira Joana Uytdenbroek
Filiação: Erotides Basilio Ferreira Garcia Lelis
e Ernestina Marcionilia dos 323 – Mario Tafner Filho
Santos 306 – Renato Russo Martins Filiação: Mario Tafner e Angelina
Filiação: João Martins e Dea Russo Fernandes Tafner
290 - Irineu Molina Martins
Filiação: Antonio Molina e Narcisa 324 – Edson de Melo
Gonçalves Molina 307 – Wang Jiang Horng Filiação: Autamiro de Melo e Maria
Filiação: Wang Lee Chun e Thereza Andrade de Melo
291 – Jose Airton de Souza Wang Shy Jyuln
Filiação: José Savero de Souza e 325 – José João da Silva
Francisca Angélica de Souza 308 – Paulo Francisco da Silva Filiação: João Braz Catarino e
Filiação: Ignacio Francisco da Lourentina Maria de Jesus
292 – Josequias Rodrigues da Silva Silva e Ivonete Matias da Silva
Filiação: José Rodrigues da Silva e 326 – Natalino do Carmo
Ana Maria da C. Rodrigues 309 – Eduardo Rodrigues Lacerda
Moreira Filiação: Antonio Nerei Lacerda e
293 – Juares Pereira Martins Filiação: Doneliro Moreira e Eugenia do Carmo Lacerda
Filiação: Plinio Pereira do Clarinda Rodrigues Moreira
Nascimento e Darcy Martins 327 – Olivio Fernandes
Pereira 310 – Manoel Filgueira Barral Filiação: José Fidelis e Maria
Filiação: Faustino Filgueira Antonian
294 – Jurismar Oliveira de Menezes Franco e Maria Luiza Barral
Filiação: Juraci Oliveira de Martines 328 – Vitor Lopes
Menezes e Geralda Lins de Menezes Filiação: João Lopes e Elídia
311 – Leopoldina Duarte Mota ou Chuca Lopes
295 – Mario Itamar Nunes dos Reis Leopoldina Braz Duarte
Filiação: Silverio Reis e Nair Nunes Filiação: João Duarte e Emilia Braz 329 – Jose Justino da Silva
dos Reis Filiação: Justino Arcajo da Silva e
312 – Alcides Aggio Sobrinho Josefa Maria dos Anjos
296 – Mario Ivo Moraes de Arruda Filiação: Luiz Aggio e Lais
Filiação: Antonio Arruda Neto e AparecidaLupato Aggio 330 – Elmo Pinheiro Maciel
Jacira Moraes dos Reis Filiação: Antonio Pinheiro Maciel e
313 – Paulo Rodrigues dos Santos Maria do Carmo Silva
297 – Normando Marcial Lacerda Filiação: Gabriel Rodrigues dos
Filiação: Antonio Lacerda Santos 331 – João Pedro de Melo Neto
Alexandre e Yolanda Marcial e Maria de Freitas dos Santos Filiação: José Pedroso de Moraes
Lacerda e Maria Aparecida Rodrigues de
314 – Anna Maria Martins Moraes
298 – Ornelimno de Souza Silva Filiação: João Martins e Victoria
Filiação: Lidio de Souza Silva e Nunes Martins 332 – Manoel da Silva Lima
Augusto Alves de Souza Filiação: Maria Simão da Silva
315 – Osvaldo Francisco Ramos
299 – Paulo Raimundo Vieira de Filiação: Albino Francisco Ramos 333 – Manoel Messias Theodoro
Santana e Otacilia Miranda Filiação: Antonio de Souza
Filiação: Assuelo Alves de Theodoro e Margarida Maria
Santana e Cleonice Vieira de 316 – Wagner Gomes Theodoro
Santana-SP Filiação: João Joaquim Gomes e
Jacira Gomes 334 – Antonio Estevam da Silva
300 – Gilmar Gomes de Souza Neto
Filiação: João Gomes de Souza e 317 – Sergio Balieiro Nigro Filiação: Geraldo Estevam da Silva
Edna do Carmo de Souza Filiação: Willian Nigro e Lia e Aristelis Pialho da Silva
Balieiro Nigro
301 – Raimundo Xavier
Filiação: José Roque Xavier e 318 – Antonio Cardoso da Silva
Maria Aparecida Xavier Filiação: Quirino Cardoso da Silva A lista dos presos aqui
e Maria Rodrigues da Rocha transcrita pode ser
302 – Eliaquim Pereira Rocha
Filiação: Joaquim Pereira da 319 – Carlos Augusto da Costa
encontrada no Acervo
Rocha e Donail Fortunato de Filiação: José Lopes da Costa e APESP/DOPS, sob o código
Rocha Izidora Ferreirada Costa 20-C-44 7029.

Investigação Final.indd 159 25/11/14 18:16


160

investigação operária

nossas bravas
mulHeres

AS RUAS DE SÃO BERNARDO


DO CAMPO são tomadas por
FamÍLias de traBaLHadores nas fábriCas e
apoiando a GreVe dos
metaLÚrGiCos do aBC. nos bairros a
aCerVo iiep / proJeto memória da
osm-sp – doação marLy rodriGues resistÊnCia Cotidiana

Investigação Final.indd 160 25/11/14 18:16


161

Capítulo 3
a aSSOCIaçãO aNTIOPERáRIa

A
participação de mulheres nas
lutas operárias, quase sem-
pre protagonizando as orga-
nizações nos bairros, as reivindi-
cações por serviços básicos nas
comunidades, mostra o entrela-
çamento entre a luta política e a
vida cotidiana dos trabalhadores.
Uma importante expressão dis-
so foi o MCV – Movimento do
Custo de Vida, surgido principal-
mente na zona sul de São Paulo.
Ana Dias relata:
“Quando começou a surgir o
pessoal da Pastoral, grupos
de mães, associação e o pes- ANA E SANTO DIAS
soal da Oposição, foi assim aCerVo moVimento

uma coisa que as mulheres ti-


veram muita atuação. Eu me
lembro que os primeiros mo-
mentos, até os movimentos da
Chapa 3 em 78; movimento
de greve, nós, as mulheres,
começamos a perceber que
uma coisa era ligada à outra.
E mesmo os Partidos, quando
foram eleito a Irma e o Auré-
lio em 78. Acho que com tudo
isso aí aprendemos como é
que conseguia eleger um de-
putado federal e uma depu-
tada estadual sem dinheiro,
que foi maravilhoso, pra mim
foi um aprendizado também.
Imagine, eu me lembro que ti-
nha esse aí, o Artur Alves Pin-
to, ele falou assim: ‘Sabe essa
eleição, essa vitória o que foi? ASSEMBLEIA DE FUNDAÇÃO
O tostão contra o milhão’. do moVimento do Custo de Vida.
CoLéGio arQuidioCesano
Porque com um tostão, pra- de são pauLo.
ticamente nós não gastamos aCerVo moVimento
nada, elegemos dois, e hoje
nem com milhão se consegue
eleger mais.”

Investigação Final.indd 161 25/11/14 18:16


162

investigação operária

O Movimento do Custo de Vida. Então nós éramos pionei- marido continuar parado a
Vida, organizado por essas mu- ras. A primeira carta eu tinha o negociação vai acontecer. En-
lheres moradoras de comuni- rascunho dela até pouco tempo, tão quantas pessoas conta-
dades da periferia de São Paulo a primeira carta que foi feita pelo vam histórias e eu lembro des-
com o apoio das Pastorais, foi Custo de Vida. Até teve um pro- sa da dona Hipólita. Gente!
um momento importante no acú- fessor que era lá do ‘Instituto Be- Era uma coisa bonita porque
mulo de forças das lutas sociais atíssima’ onde a Irma era freira tenho um pão e divido a meta-
naquele período. Conseguia-se antes, que foi torturado por causa de, e a gente consegue comer
dialogar com aquele trabalhador dessa carta porque ele tinha uma um pouquinho, eu e você, e
ou trabalhadora que não estavam cópia dessa carta no bolso quan- nós conseguimos andar mais
diretamente envolvidos na luta do ele foi preso, e eles queriam um tanto. Porque a mulhera-
contra a ditadura, mas que per- saber quem era que escreveu. da não tinha medo, né? E era
cebiam o aumento do custo de Naquele tempo a gente apanha- na política também, no Cus-
vida em seu cotidiano. Como as va, mas não contava quem era” to de Vida, na porta das, fá-
mulheres sempre exerceram um O protagonismo das mulhe- bricas, quantos panfletos nos
papel importante de verdadeiras res fica evidente em diversos mo- fizemos? Tanto que quando
mediadoras entre o espaço do- mentos. Durante o período de o Santo morreu eu estava na
méstico e a comunidade, seja a greve era comum que elas organi- porta de fábrica. Então, isso
partir das relações construídas zassem campanhas para doações que o Anízio falou era muito
na vizinhança, da troca de favo- de alimentos para os trabalhado- forte, e eu e a Albertina bri-
res ou dos cuidados das crianças, res grevistas. Segundo Ana Dias: gamos muito, eu com o Santo
nesse período de intensa mobili- “Nas primeiras greves, o que e ela com o Anízio, porque a
zação, elas se legitimaram como acontecia? Saía nós pra rua, gente tinha cuidado com eles
porta-vozes importantes dos pro- pedindo mantimento pra fazer também. Porque a gente gos-
blemas cotidianos que afetavam comida nas portas das casas tava, sabia que eles tinham
toda a comunidade. Ana Dias ou no bairro do Socorro, pra compromissos, mas tinham
fala do Movimento: mandar comida pro pessoal família, tinha o medo e o amor
“Olha, o Custo de Vida nasceu grevista. As mães vinham com que a gente tinha por eles que
do grupo que eu coordenava lá sacolinh as que nem esmola era mais forte”
no Jardim Nakamura. Começou pra trazer pra nós. Tinha uma
com uma conversa, eu, a Irma senhorinha, a dona Hipólita, Em vários pontos da cidade
Passoni, naquele tempo a gen- de Minas, velhinha, ela já era houve a eclosão dos movimentos
te começou a falar do aumento velha naquela época. Já fale- populares por saneamento, mora-
da carestia e tinha um momento ceu hoje. Ela ia nas portas e dia, transporte, creches. A Zona
de discussão no nosso grupinho, quando chegava nas portas: Leste, a mais populosa da cida-
desse grupinho foi pensando que “Ah! Dona, mas eu to só com de, foi celeiro de muitas iniciati-
já tinha um grupo de coordena- um pouquinho, mas eu vou di- vas. A resistência operária, feita
ção e nesse grupo de coordena- vidir porque se a greve conti- pela OSM-SP, tinha uma grande
ção foi tirada uma carta. Uma nuar meu marido também vai participação de mulheres na re-
carta que foi levada pra Brasí- ganhar”. Cê tá entendendo? gião. Essa organização regional
lia. Em Brasília, saiu na “Hora Então a ligação que ela fazia: da Oposição era fortemente com-
do Brasil” e eu era uma das que se meu marido não tem comi- posta por militantes oriundos das
coordenava junto com as outras da e volta pra trabalhar nós Comunidades Eclesiais de Base,
mães esse Movimento Custo de vamos perder, agora se meu Pastoral da Juventude, Pastoral

Investigação Final.indd 162 25/11/14 18:16


163

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

Operária e Juventude Operária “A companheira Maria José,


Católica. As mulheres militantes a gente chama ela de Mazé,
da OSM-SP tinham uma cultu- que participou da Comissão
ra política particular, vinculada à de Negociação, foi demitida
organização da vida cotidiana. A imediatamente após a greve
comunidade se organizava a par- e tantos outros também foram
tir das redes de vizinhança e dos dispensados ao longo de um
problemas locais, onde o valor da período pós-greve”.
solidariedade se tornava funda-
mental em uma situação de conci- A empresa, em ligação direta
liação do trabalho doméstico com com a repressão política, tentava
o trabalho assalariado. Não é por detectar e monitorava os organi-
acaso que a palavra solidariedade zadores das lutas. Surpreende-
aparece muitas vezes nas falas das ram-se com o papel de liderança
mulheres, e em suas memórias das mulheres. É significativo que
sobre organização e luta politica. no documento abaixo, do SNI
Arlete Neves e Delma de Jesus: (Serviço Nacional de Informa-
“Nossa presença enquanto ção), a empresa informe que de-
trabalhadoras nas fábricas ti- tectaram a atividade da militan-
nha a preocupação constante te Sofia, chamada de infiltrada,
de organizar os companheiros dando a entender que os próprios
metalúrgicos a partir dos pro- demandas em relação aos bair- trabalhadores não sabiam quem
blemas que viviam no cotidia- ros, à vida cotidiana e à socia- ela era. Conforme registro nos
no como operários, no local bilidade local, e muitos militan- documentos do DOPS-SP:
de trabalho e na vida. A orga- tes operários ligados à Oposição “(…) Sofia Dias Batista é
nização dos grupos de fábrica Metalúrgica tiveram sensibilida- agente da Pastoral Operá-
se deu, muitas vezes, a partir de para construir essa aproxima- ria (…) Sofia atua junto as
de situações e convivências ção com os movimentos. operárias da linha de monta-
solidárias no espaço da fá- Além da intensa participação gem, procurando incutir-lhes
brica. O chão da fábrica é ás- nos bairros e Pastorais, as mu- idéias marxistas, além de le-
pero, as relações são autori- lheres também já possuíam par- var informações da Empre-
tárias e individualistas. Para ticipação nas fábricas e no mo- sa para a Pastoral Operária
resistir e transformar essa re- vimento sindical. Em 1978, as (…) Na empresa, apenas a di-
alidade era necessária uma mulheres ligadas à Oposição reção e o pessoal da seguran-
nova relação humana, onde Metalúrgica foram protagonis- ça conhece a sua situação (…)
estivessem presentes valores tas na organização e mobilização A morte da operária Yara em
de solidariedade, partilha e da greve da Philco, na época com 05 Abr 78, ocorrreu na mes-
companheirismo. Elementos 8 mil funcionários. Segundo So- ma linha de montagem onde
necessários na construção de fia, trabalhadora na fábrica, mi- trabalhava (...) e dias depois
uma nova sociedade”. litante da Oposição Metalúrgica o jornal ‘Versus’ publicava
e participante ativa da greve, a reportagem a respeito, con-
As pessoas que se aproxima- adesão foi de 100%, sendo que tendo detalhes do ocorrido
vam das Comunidades Eclesiais 80% dos trabalhadores da fábri- (vide abaixo). O jornal ‘Bra-
de Base (CEBs) apresentavam ca eram mulheres: sil Mulher’ nº 12 também pu-

Investigação Final.indd 163 25/11/14 18:16


164

investigação operária

blicou matéria sobre a morte


de Yara.”

Era na fábrica que as mulhe-


res da Oposição Metalúrgica ela-
boravam um modo de fazer po-
lítica que, de muitas formas, se
relacionava com a própria so-
ciabilidade por elas produzida
em suas comunidades e bairros.
Em uma conjuntura de encareci-
mento da vida, salários desvalo-
rizados e um Estado incapaz de
garantir serviços básicos para a
população, as mulheres precisa-
ram desenvolver, historicamen-
te, laços de solidariedade capazes
de, por exemplo, suprir a falta de
creches a partir do cuidado de vi-
zinhos ou lidar com o alto preço
dos alimentos trocando ou parti-
lhando o que cada família podia
oferecer. Arlete e Delma contam:
“Pequenas atitudes como par-
tilhar o vidro de pimenta no al-
moço, fazer um suco com par-
ticipação coletiva (um trazia o
limão, outro o açúcar...), preo-
cupar-se com aquele ou aque-
la que não tinham o que trazer
na marmita ou que não tinham
o dinheiro para o transporte,
possibilitava a criação de la- blemas consequentes da entrada falta de creches, aliás, muitas de-
ços de amizade e carinho e con- da mulher no mercado de traba- las dizem que foi a partir dessa
fiança entre as pessoas, que se lho. Em uma época de muita mo- demanda que elas conheceram
multiplicavam para um grupo bilização política e intensa re- e se identificaram com o movi-
maior. Possibilitava também pressão, as trabalhadoras tinham mento feminista da época. Se-
a socialização do que signifi- que se relacionar com a imensa gundo Sofia,
ca vender a força de trabalho dificuldade de acompanhar a di- “Não existia creche publi-
por um salário que não era su- nâmica das reuniões políticas por ca naquela época, as mulhe-
ficiente para a sobrevivência” conta da sobrecarregada jornada res trabalhadoras não tinham
de trabalho que, além das horas onde deixar os filhos, ou fica-
As metalúrgicas precisavam de fábrica, incluía os afazeres vam presos em casa ou dei-
lidar também com todos os pro- domésticos. Deviam lidar com a xava com alguém, pagava

Investigação Final.indd 164 25/11/14 18:16


165

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

alguém pra tomar conta dos tensa e com um trabalho muitas


filhos. No movimento feminis- vezes mais precarizado do que
ta é que a gente podia discu- o dos homens. Enfrentavam um
tir isso, a gente tinha amigas ambiente da luta política sindi-
que participavam, a gente não cal, produzido a partir da majo-
participava do movimento fe- ritária presença masculina e seus
minista, a gente acompanha- códigos, mas foram mediadoras
va a luta das mulheres através fundamentais entre o mundo da
das amigas que participavam fábrica e o mundo da vida nos
do movimento feminista que bairros. As mulheres da Oposi-
naquela época era a luta por Zeza, MercÊs, Anaí, Angela ção Metalúrgica construíram um
creche.” da Sul, Lúcia, Angela da modo próprio de fazer política
Leste, Carmem.
Acervo IIEP/Projeto Memória da e se constituíram como sujeitos
Além da sobrecarga de traba- OSM-SP
políticos fundamentais em um
lho e da dificuldade de comparti- período em que a classe trabalha-
lhar a responsabilidade dos cui- dora protagonizava um proces-
dados com seus companheiros, so de transformações profundas
as mulheres trabalhadoras me- na sociedade brasileira. Enfren-
talúrgicas ocupavam, na maio- taram demissões, foram presas,
ria das vezes, os postos mais des- passaram dias sem dormir para
qualificados e desvalorizados do panfletar e participar das reuni-
ponto de vista da remuneração ões. Sofia conclui:
salarial. Novamente Sofia relata: “A gente achava que a eman-
“Na fabrica, por exemplo, a cipação da mulher vinha junto
mulher, ela é passiva em ge- Angela, Carmem, Edi, Arlete, com a luta dos trabalhadores,
ral. Era vista como elemento Rita, Lúcia e Terezinha a emancipação da mulher na
Paparazzo, em 2007.
secundário, a gente era mão perspectiva da luta de classes,
Terezinha Paparazzo
de obra desqualificada e o pa- foi a primeira mulher era assim que a gente se orga-
tronato sempre dizia que era a participar de uma nizava nas fábricas (…) Nós
mais fácil lidar com as mu- hapa da OSM-SP em 1972. enfrentamos muita dificulda-
Acervo IIEP/Projeto Memória da
lheres porque elas eram mais OSM-SP de com os nossos companhei-
obedientes”. ros porque era um ambiente
muito masculino, as mulhe-
Maria José confirma: res não participavam muito
“as mulheres trabalhavam do movimento operário, só
muito em linha de montagem. as loucas como nós, éramos a
Na Philco onde eu trabalhei, As operárias militantes lida- minoria, enfrentando as lide-
80% era mulher na linha de vam com a opressão sofrida nas ranças que estavam na nossa
montagem, que é um serviço fábricas por muitos patrões que frente. Eles tinham muito mais
não-qualificado. Bastava ter as percebiam como o “lado mais experiência do que nós, mas,
coordenação motora, e na li- fraco” da corda, desdobrando- mesmo assim, a gente se po-
nha de montagem você não ti- -se para conseguir participar da sicionava, brigava pelo espa-
nha nem condição de pensar vida política mesmo com uma ço e conseguimos... Estamos
era só fazer, fazer, fazer”. sobrecarga de trabalho mais in- aqui”.

Investigação Final.indd 165 25/11/14 18:16


166

investigação operária

A AÇÃO DO
II ExÉRCITO NO
“ENCONTRO DOS
TRABALHADORES
COM O PAPA”

NO MORUMBI LOTADO rossi FaLa aos 130 miL


traBaLHadores presentes. no paLCo,
d. anGéLiCo Bernardino, waLdemar rossi,
d. pauLo e o papa João pauLo ii.
são pauLo/sp, 1980.
aCerVo pessoaL waLdemar rossi

Investigação Final.indd 166 25/11/14 18:16


167

Capítulo 3
a aSSOCIaçãO aNTIOPERáRIa

II ExÉRCITO vETA PRESENÇA DE ROSSI


NO ENCONTRO COM O PAPA

O
metalúrgico Waldemar Ros- visita do Papa à capital paulis- da OAB, Eduardo Seabra Fagun-
si, do Movimento de Opo- ta, era de forte tensão entre o Co- des, que matou a chefe da secre-
sição Sindical Metalúrgica mandante do 2º Exército, gene- taria da instituição, Lyda Mon-
e da Pastoral Operária, foi esco- ral Milton Tavares de Souza e D. teiro da Silva, em 27 de agosto
lhido para ser o único orador no Paulo, por conta das denúncias de 1980.
chamado “Encontro dos traba- que o cardeal e a CJP vinham fa- Um dia antes do encontro do
lhadores com o Papa”, na visita zendo dos crimes cometidos pe- Papa com os trabalhadores no
de João Paulo II à São Paulo, em los órgãos de repressão, como Estádio, houve o sequestro do
3 de julho de 1980, no estádio do as dos assassinatos de Vladimir presidente da Comissão de Justi-
Morumbi. Herzog e Manuel Fiel Filho no ça e Paz, Dalmo de Abreu Dalla-
O convite foi iniciativa de D. DOI-CODI, e as de Santo Dias ri, abandonado com o corpo ris-
Paulo Evaristo Arns, então car- pela Polícia Militar, em plena cado à faca num matagal perto de
deal de São Paulo. D. Paulo acu- greve pacífica. Crime ocorri- sua casa.
mulava alguns conflitos com as do oito meses antes do encontro Hospitalizado, Dalmo foi con-
autoridades policiais militares com o Papa. duzido de maca, no dia seguinte,
por defender a dignidade e a vida A Oposição Metalúrgica, os ao Campo de Marte, para parti-
dos presos políticos. Em 1971, movimentos populares e as Co- cipar da liturgia na missa que o
recentemente nomeado para o munidades Eclesiais de Base, Papa celebraria naquela manhã
posto, denunciou a tortura aos re- apoiados pelos religiosos pro- do dia 3. A presença de Dalla-
ligiosos Giulio Vicini e Yara Spa- gressistas, aproveitaram a vinda ri no Campo de Marte possibi-
dini, que faziam trabalho social do Papa para denunciar a ditadu- litou a denúncia pública de seu
nos bairros. Durante a sécada de ra, num momento de ascenso das sequestro e agressão física pelas
70 terá vários conflitos, particu- lutas populares e operárias. Era forças de segurança.
larmente com o comando do II um período de acirramento dos Por conta desse sequestro, D.
Exército. conflitos, em que parte da direi- Paulo estava muito cauteloso.
Em 1972, Rossi já havia sido ta organizada e grupos paramili- Rossi relembra que “D. Paulo pe-
nomeado pelo cardeal para a tares não aceitavam a inevitável diu para não contar nem para mi-
composição da Comissão de Jus- participação popular que em- nha esposa. Ele sabia do risco”.
tiça e Paz (CJP) da Arquidiocese, purrava a ditadura cambalean- A proposta para que dormisse na
comissão que atuou durante “os te, promovendo ações terroris- Cúria diocesana foi rejeitada de
anos de chumbo” denunciando tas e de intimidação. Entre elas, imediato: “Tenho família e vou
os crimes da ditadura, defenden- o sequestro do bispo D. Adriano dormir em minha casa com mi-
do presos políticos e amparando Hipólito, espancado, despido e nha esposa e meus filhos. Se qui-
suas famílias. abandonado com o corpo pinta- serem me matar que o façam”.
do de vermelho num matagal em A visita do Papa equivale à de
O TERRORISmO Da Jacarepaguá, em 22 de setembro um chefe de Estado. A seguran-
DIREITa PaRamILITaR de 1976, e a explosão de uma car- ça de todo o evento ficou a cargo
ta-bomba, endereçada ao então do II Exército, que recusou a cre-
O clima político, quando da presidente do Conselho Federal dencial do operário cristão, tido

Investigação Final.indd 167 25/11/14 18:16


168

investigação operária

por eles como “comunista con-


tumaz”. A situação ficou mais
tensa ainda. Para entrar no gra-
mado, Rossi teve que enfrentar
o coronel, chefe da segurança do
evento. Passou por cima da sua
autoridade tomando a iniciativa
de chamar o primeiro grupo de
músicos que daria início ao show
de preparação para a recepção do
Papa. Vistoriou a documentação
dos músicos, acompanhando a
entrada deles para perplexidade
do coronel, que ficou sem ação.

A DENÚNCIA DA
DITADURA, DA
OPRESSÃO NAS
FÁBRICAS E DAS
CONDIÇÕES DE VIDA

D. Paulo conheceu previamente


o texto que Rossi leu. «Quando
apresentei o texto para o D. Paulo,
ele leu e não fez uma observação
sequer», lembra o operário. Publicação com o texto que seria lido
A leitura da saudação de Ros- por Rossi. Foi distribuÍdo amplamente nas
periferias e nas fábricas. São Paulo/SP, 1980.
si foi reduzida a pedido do ceri- Acervo IIEP/Projeto Memória OSM-SP
monial do Vaticano, sob pretexto
da chuva que caía e do atraso da
chegada de João Paulo II. Ape-
sar do pouco tempo, a fala foi que resultará na criação da CUT. dade!, liberdade!, liberdade!...”
contundente com a denúncia Rossi incluiu em sua fala a de- surpreendendo o próprio João
dos assassinatos de Santo Dias núncia de novas intervenções em Paulo, que pediu apoio a D. Pau-
e de Raimundo Ferreira Lima, sindicatos de trabalhadores e de lo para entender o que, de fato,
o Gringo. “Cabeça” de chapa da cassações e prisões recentes de estava acontecendo.
Oposição Rural em Conceição dirigentes sindicais, como Oli- Mais de 130 mil trabalhado-
do Araguaia, no Pará, Gringo vio Dutra, presidente do Sindi- res, segundo a polícia, lotaram o
foi assassinado dois meses an- cato dos Bancários de Porto Ale- estádio do Morumbi, e testemu-
tes do encontro com João Paulo gre, além de Luiz Inácio Lula da nharam o acontecimento, que foi
II, quando regressava do primei- Silva e dos dirigentes do coman- acompanhado pelo mundo todo,
ro Encontro Nacional das Oposi- do de greve dos metalúrgicos do enquanto outros 30 mil voltaram
ções Sindicais – ENOS, a primei- ABC. Nesse momento, o estádio para suas casas, porque no está-
ra iniciativa de caráter nacional ecoou um forte grito de: “Liber- dio já não havia mais lugares.

Investigação Final.indd 168 25/11/14 18:16


169

Capítulo 3
a aSSOCIaçãO aNTIOPERáRIa

SAUDAÇÃO DO OPERáRIO AO PAPA JOÃO PAULO II

Caríssimo Papa João Paulo II,


É com imensa alegria que os trabalhadores brasileiros vêm a este encontro para recebê-lo de braços e
corações abertos. Sabemos que estamos junto ao papa que foi operário e dedicou grande parte de sua ação
pastoral aos trabalhadores de sua terra. Por isso, temos certeza que o senhor entende nossa linguagem sim-
ples e estamos à vontade para chamá-lo “companheiro” e para falar das coisas que sentimos e vivemos.
Queremos, caro companheiro, a exemplo dos primeiros cristãos, que partilhavam seus bens com a comu-
nidade, que o senhor também partilhe conosco das coisas que produzimos, embora saibamos que sobre elas
não temos nenhum poder de decisão.
Gostaríamos de comunicar-lhe que somos um povo no qual mais de 10 milhões são migrantes, gente que,
na sua totalidade, rompemos com nossos laços de origem, expulso que fomos de nossas terras, seja pela for-
ça do dinheiro e da grilagem, seja pela violência das armas. Asseguramos-lhe que milhares de trabalhadores
camponeses foram e são mortos nesse processo. Grandes empresas capitalistas implantam-se na terra, em
prejuízo do trabalhador do campo. Esses nossos irmãos continuam vagando em busca de um lugar onde
viver, transformados em verdadeiro exército de mão de obra de reserva e de baixos salários. São milhões de
“bóias-frias” por este Brasil afora, são mais de 5 milhões de seres humanos: crianças, jovens, adultos e idosos
que habitam as tristes favelas brasileiras.
Todo esse contingente de trabalhadores disponíveis sentem grandes dificuldades em conseguir emprego,
o que os obriga a trabalhar sujeitos às mais precárias condições de trabalho em troca de salários miseráveis.
Esses salários se refletem nas condições de moradia. precária.Veja o exemplo de S. Bernardo do Campo, a
capital da indústria automobilística da América Latina: Em 1964 havia 4 favelas, hoje são 54, o que equivale
dizer que, em cada quatro habitantes de S. Bernardo, um é favelado. Nas cidades do ABC, entre 200 mil fave-
lados, 50 mil chefes de família trabalham, principalmente, na Volkswagen, na Brastemp, na Scânia Vabis, na
Mercedes Benz e outras empresas. São nossos irmãos que habitam em barracos paupérrimos.
Milhares e milhares de companheiros enfrentam uma jornada de trabalho entre 12, 14 horas e até 16
horas diárias sem descanso. Condições desumanas de ritmo de trabalho obrigam cada operário a gestos me-
cânicos sempre mais velozes e, sob forte pressão patronal, levam ao esgotamento físico, muitas vezes irrepa-
rável, e até à loucura. O trabalho sob constantes riscos de graves acidentes tem ceifado vidas de milhares de
nossos companheiros, ou provocando sua mutilação. Caríssimo papa, somos também campeões mundiais
em acidentes de trabalho. Para a mulher a situação é ainda mais grave porque dela se exige maior produção
com salários ainda menores. As condições de trabalho violentam a dignidade da mulher: quantos abortos
se dão nos recintos de trabalho! Some-se a isso a repressão nas empresas: controle de tempo até para ir
ao sanitário; constante ameaça de desemprego sob qualquer pretexto; perseguição a companheiros que se
destacam pela liderança e, por isso, são demitidos; “listas negras” dos indesejáveis; serviços de segurança
particular que prendem e maltratam trabalhadores, como no caso as Fiat, de Minas Gerais. O empresário
é favorecido também, pela rotatividade da mão de obra: em cada 10 operários, pelo menos 4 perdem seu
emprego ou mais vezes por ano, desajustando seu orçamento familiar. A cada novo emprego seu reajuste
salarial é neutralizado; a cada novo emprego ocorre um novo rebaixamento do seu salário.

Investigação Final.indd 169 25/11/14 18:16


170

investigação operária

Toda essa repressão é reforçada pela estrutura sindical brasileira, inspirada no modelo corporativo vertical
e fascista de Mussolini. Estrutura sindical que impede e reprime a organização independente do trabalhador,
especialmente dentro das empresas; que se constitui oficialmente em órgão de colaboração com o governo
e, praticamente, está a serviço dos patrões; que é controlada à mão de ferro pelo Ministério do Trabalho; que
alimenta a carreira do peleguismo, impedindo que o trabalhador controle o seu sindicato. No Brasil, a luta
operária é considerada caso de polícia ou de segurança nacional. Os trabalhadores, quando lutam por melho-
res salários e condições de trabalho são reprimidos, presos ou até assassinados, como foi ocaso dos nossos
companheiros Santo Dias da Silva, líder operário e Raimundo Ferreira Lima, o Gringo, líder camponês, ambos
militantes da pastoral. As direções sindicais mais combativas são presas e cassadas, a exemplo dos bancários
de Porto Alegre e São Paulo e dos metalúrgicos de Santo André e São Bernardo. Enquanto isso, os boicotes
patronais ao leite, à carne e aos remédios são beneficiados com gordos reajustes em seus preços. A legislação
trabalhista e a Justiça do Trabalho estão voltadas para os interesses patronais, em prejuízo do direito do tra-
balhador explorado.
Entendemos, caro companheiro, que a causa fundamental da situação desesperadora em que vive a classe
operária é o sistema econômico e político implantado em nosso país para produzir riquezas, não importa quais e
nem a que preço. Para atingir seu objetivo único – o lucro exorbitante – o capitalismo impõe condições violentas
de trabalho, suborna e corrompe, determina suas próprias leis. É o capitalismo selvagem das multinacionais.
Diante de tudo isso, o Evangelho nos exige “fome e sede de justiça”, nos lembra que somos “o sal da terra”
e aumenta em nós o compromisso com a transformação da sociedade. Entre aquilo que nos prometem e nos
permitem, nós trabalhadores vamos tomando consciência de nossa condição de explorados, organizando
grupos nas empresas e nos bairros, ocupando nossos sindicatos, entre derrotas e vitórias. Em nossas lutas
acumulamos experiências, renovamos nossas forças, encontramos nossa união. Situando-nos na História,
vamos conquistando nossa liberdade.Lutamos hoje, no Brasil, por salários menos injustos e por melhores
condições de trabalho. Mas lutamos também para conquistar um sindicato livre e independente. Queremos
a liberdade de organização e de expressão. Queremos o fim das medidas e instrumentos de repressão. Que-
remos ainda, companheiro, ter direito à nossa organização e representação sindical a partir das empresas.
Reivindicamos menor jornada de trabalho. Lutamos para termos a garantia de trabalho: somos seres huma-
nos, filhos de Deus, e não peças de reposição da indústria capitalista. Queremos sentir a alegria de viver
com segurança.
Caríssimo pai: os trabalhadores cristãos estão fortemente engajados nas lutas do movimento operário
brasileiro. A Igreja no Brasil e, particularmente em São Paulo, através de suas prioridades pastorais e, em
especial a Pastoral Operária, vem desenvolvendo intenso trabalho junto aos operários, abrindo espaços para
que eles descubram amplamente sua realidade de vida. Queremos que os trabalhadores, dotados de agu-
da consciência crítica, estejam capacitados a assumir as responsabilidades que o momento histórico exige.
Queremos que o trabalhador rompa com a barreira imposta pelo sistema político que nos governa e, saindo
da passividade, se torne agente das transformações sociais. Buscamos uma nova ordem, onde o trabalhador
usufrua o produto do seu trabalho e, mais que isso, decida sobre os seus destinos.
Como cristãos, procuramos descobrir, sempre mais, a vontade do Pai, em nosso empenho de construir
o Reino de Deus a partir da vida terrena e que alcança sua plenitude na vida eterna. Queremos, na grande
batalha do dia a dia, ser testemunhas vivas do Evangelho.
Aguardando ansiosos sua orientação e sua benção. Esperamos também que seu esforço pastoral seja
no sentido de que a Igreja Universal se irmane e se comprometa cada vez mais nesta caminhada do Povo de
Deus em direção ao Reino. O Espírito de Deus o ilumine sempre.

Investigação Final.indd 170 25/11/14 18:16


171

Capítulo 3
a aSSOCIaçãO aNTIOPERáRIa

OPERáRIOS NO
PARLAMENTO

OS PARLAMENTARES OPERáRIOS
estiVeram na LinHa de Frente do
enFrentamento Com a repressão.
ACERvO MOvIMENTO

Investigação Final.indd 171 25/11/14 18:16


172

investigação operária

L
ogo após o golpe de 1964, os
parlamentares operários Clo-
desmidit Riani, Sinval Bam-
birra e Dazinho, de Minas Ge-
rais, Floriano Bezerra do Rio
Grande do Norte, e Mário Lima,
da Bahia, foram presos e, a sua
maioria, torturados. No fim dos
anos 70, na transição política, al-
guns militantes da Oposição Sin-
dical Metalúrgica foram disputar
espaço no Parlamento, tornando-
-se vereadores ou deputados.
Tratamos aqui de quatro com-
panheiros que foram parlamentares
enquanto a OSM-SP concorreu as
eleições no Sindicato.
Os mandatos são expressão da
forte ligação dos militantes com a
base dos operários nas fábricas e
nos bairros. A presença desses de- Anizio
putados nos conflitos trabalhistas Batista
(acima)
e políticos foi essencial para con-
ter ou amenizar a repressão policial Aurélio
contra os trabalhadores. Esses par- Peres
(abaixo)
lamentares não eram “políticos pro-
fissionais”, mas sim operários. Por
isso, voltaram seu mandato para o
suporte das lutas. Como trabalhado-
res parlamentares, participaram de
greves, realizaram piquetes, enfren-
taram as forças policiais.

ANIZIO BATISTA

Anízio Batista foi eleito deputa-


do estadual pelo Partido dos Traba-
lhadores em 1982, quando trabalha-
va na ferramentaria da Metalúrgica
Joia, no Brás. Teve mais de 40 mil
votos, mesmo sem recursos para a
campanha. “O que fez a gente ga-
nhar mesmo foi o reconhecimento
da Oposição, dos trabalhos nas fá-

Investigação Final.indd 172 25/11/14 18:16


173

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

bricas, da Pastoral Operária e movi- AURÉLIO PERES metalúrgicos de São Bernardo, em


mentos populares”. 1979, ficou na linha de frente contra
Eleito, solicitou ao dono da em- Aurélio Peres trabalhava na Ca- a Tropa de Choque. Entre os muitos
presa, de maneira inovadora, para loi quando foi eleito deputado fede- enfrentamentos com a polícia, foi
trabalhar meio período na fábri- ral em dobradinha com a estadual preso na porta da fábrica Meridio-
ca e meio período no Parlamento. Irma Passioni, em 1978. Partici- nal, na Zona Sul, e levado ao DOPS.
A proposta foi negada. Seu objeti- pavam da “Tendência Popular” do No entanto, o delegado de plantão
vo como parlamentar era “apoiar as Movimento Democrático Brasilei- o soltou por causa do seu mandato.
oposições sindicais, estar nas elei- ro (MDB). Como era muito conhecido na
ções sindicais, jogar a estrutura do O “Comitê do Aurélio” era co- Zona Sul, recebia frequentemen-
gabinete para isso, apoiar os cana- nhecido pelos trabalhadores, não só te intimação para apresentar-se no
vieiros, estar no movimento popu- os metalúrgicos. Servia como res- comando da PM, no Aeroporto de
lar, nas greves”. paldo para o “Movimento do Custo Congonhas. Mesmo com imunida-
Presidiu a Comissão de Relações de Vida” e reunía o “setor Socorro” de parlamentar, foi preso oito vezes.
de Trabalho da Assembleia Legis- da Oposição Sindical Metalúrgica Em 1982, foi eleito novamente.
lativa e foi preso duas vezes nesse de São Paulo, onde participava San- Na eleição seguinte (1986) não con-
período. A primeira, ao ajudar a so- to Dias. seguiu se reeleger. Voltou para as-
lucionar um conflito entre operá- Em 1979, o comitê foi um dos sumir seu emprego na Caloi, mas a
rios grevistas na empresa Horasa, poucos lugares em que os militantes empresa não o admitiu.
que fabricava relógios, em Santo podiam fazer reunião. Após a prisão
Amaro. Foi detido porque havia en- do Comando de Greve, a depreda- CHICO GORDO
frentado a Polícia Federal, ao tentar ção da Catedral da Sé e o assassi-
impedir que trabalhadores fossem nato de Santo, o local tornou-se um Francisco Carlos de Souza, co-
levados presos no camburão. dos alvos de vigilância e repressão nhecido como “Chico Gordo”, assu-
Em 1986, em Leme, Anízio este- da Polícia Militar. miu em 1989 o mandato de deputado
ve nos piquetes da greve organizada Aurélio usava o mandato como estadual. Chegou a São Paulo no dia
pelo movimento dos canavieiros e respaldo para dar cobertura aos tra- 16 de junho de 1969, vindo de São
pelo sindicato dos trabalhadores ru- balhadores nas portas de fábrica du- José do Rio Preto, onde foi presiden-
rais, que tomaram a cidade. O con- rante as greves. “O movimento ope- te do grêmio estudantil do Ginásio
fronto extremamente violento entre rário também se apoiou muito na Industrial. Em São Paulo, trabalhou
os trabalhadores canavieiros e a po- estrutura do meu mandato. Quan- na construção civil como pintor de
lícia teve como saldo o assassinato tas pancadarias nós evitamos com paredes e operador de caldeira na
pela polícia de pelo menos dois tra- o meu simples mandato?! Quantas Giannini, fábrica de violões.
balhadores, que se manifestavam na vezes o coronel Rigonato, que era o Trabalhou em diversas metalúr-
praça central, palco do conflito. comandante da Tropa de Choque de gicas, como Wapsa, Sandvik, Ifer e
Anízio socorreu com o carro ofi- São Paulo, teve que recuar porque ti- Telefunken, além de ter trabalhado
cial um dos atingidos pelas balas da nha um deputado federal na frente da na Horasa em 1972. Passou a par-
polícia, o operário Orlando, e o le- greve? Era um deputado qualquer, ticipar da Oposição Metalúrgica
vou à Santa Casa. Mas Orlando não mas era um deputado”, declarou Au- no fim de 1979, por causa da morte
resistiu no caminho para o hospital. rélio em entrevista publicada em ja- de Santo Dias, e estava presente na
Anízio foi preso pela polícia, junto neiro de 2011 no Portal Vermelho. fundação do Partido dos Trabalha-
com José Genoino e Djalma Bom, Aurélio enfrentava a repressão dores. No período de 1987 a 1989
na porta da Santa Casa, e levados ao para a polícia não usar a violência foi presidente da CUT – Regional
DOPS de camburão. contra os operários. Na greve dos Grande São Paulo.

Investigação Final.indd 173 25/11/14 18:16


174

investigação operária

Nos anos 80, Chico já era uma vo de tentar modificar elementos da pelo Partido Comunista do Brasil
figura altamente conhecida pelos estrutura de repressão do Estado. Na (PCdoB) na coligação encabeçada
trabalhadores, pelos moradores Comissão, apresentou propostas que por Luiza Erundina. Exerce o cargo
de bairros da Zona Sul e pela pró- obrigavam a PM a informar a cada parlamentar de 1988 a 1996.
pria polícia. Como parlamentar, três meses as ações repressivas ao Na fábrica Metal Leve, da qual
apoiava greves e se fazia constan- crime e as ações repressivas ao mo- Vital já havia sido funcionário, o
temente presente nos conflitos que vimento de trabalhadores. grupo de fábrica ligado à Oposi-
envolviam diversas categorias de Seu mandato esteve muito volta- ção Sindical conseguiu eleger onze
trabalhadores. Em uma atividade do à luta sindical, ao mesmo tempo membros nas treze vagas da Comis-
do Sindicato dos Plásticos na re- com firme atuação na Constituinte, são Interna de Prevenção de Aci-
gião de Socorro, Zona Sul da ca- a fim de serem amparados os inte- dentes (CIPA). Em 1990, seus tra-
pital paulista, os metalúrgicos que resses da classe trabalhadora. Res- balhadores fizeram uma greve de 25
estavam ajudando as mobilizações salta que o objetivo de ser deputado dias contra o Plano Collor, que re-
foram presos e liberados pela inter- era “estar a serviço do movimento sultou em algumas conquistas eco-
venção de Chico. Em outros episó- sindical, principalmente para inibir nômicas, mas também na demissão
dios, como as greves na Metal Leve, a repressão”. de 100 trabalhadores.
Santo Amaro; na Levis; dos profes- Sobre todas as experiências, e A empresa, em represália, reú-
sores na avenida Paulista; bancários por ser um parlamentar de origem ne os cipeiros, os acusa de aprovei-
na Zona Sul, o mandato foi essen- trabalhadora, afirma: “Meu man- tarem a estabilidade do mandato
cial para inibir a repressão policial. dato era a extensão da luta sindical, de cipeiros para organizar a greve
Participou da defesa dos trabalha- era minha prioridade. Havia esse e informa a demissão de 11 deles,
dores da empresa Bereta (atual Tau- compromisso quando me elegi: de- pagando os direitos trabalhistas.
rus), fábrica de armas, na qual houve fender os trabalhadores e inserir na Ou seja, são indenizados, mas não
greve de vários dias. A polícia, após Constituição Estadual normas que cumpriram o mandato. A diretoria
acabar o movimento grevista e a op- pudessem trazer benefícios a eles”. do Sindicato se omite. Os cipeiros,
ção pelo retorno ao trabalho, fazia ligados à OSM-SP, não têm respal-
triagens de trabalhadores que entra- EUSTÁQUIO VITAL do para uma batalha jurídica e são
riam na fábrica – Chico se posicio- demitidos, derrotados.
nou, alegando crime contra a orga- O metalúrgico Eustáquio Vital Nessa disputa, os trabalhadores
nização do trabalho. Por essa razão, Nolasco foi um militante muito ati- organizam vários protestos. Um
deu voz de prisão ao tenente respon- vo da Zona Sul de São Paulo e co- dia, os trabalhadores, ao chegarem
sável pela operação e o conduziu à nhecido nos espaços populares e de , encontram a portaria coalhada de
delegacia, onde foi feito o registro trabalhadores desde a eclosão das policiais e um grande aparato de re-
da ocorrência. Ele comenta: “Tinha lutas no final dos anos 70. Passou pressão para forçar a entrada “de
que me impor. Uma coisa que apren- por muitas situações de enfrenta- quem quisesse trabalhar”.
di: tinha que fazer o soldado bater mento, principalmente com a Po- Vital, pelo aparelho de som, pro-
continência, porque era um mandato lícia Militar. Em 1986, após par- pôs aos trabalhadores que ninguém
popular, e tinha que exercer a autori- ticipar do ato da campanha “Xô, entrasse no trabalho antes da desobs-
dade. Ainda assim, de vez em quan- Sarney”, no Largo 13, é preso com trução por parte da polícia. Vital ne-
do eles desciam a borracha”. sua companheira Ester, numa ma- gocia com o comando da tropa sem
Participou, na Assembleia Legis- nifestação marcada por repressão resultado positivo. Houve bate-boca
lativa, da Comissão da Defesa dos e violência. Solto da cadeia, é ins- e enfrentamento com a polícia. A si-
Interesses do Estado, do Cidadão e taurado um processo criminal con- tuação se prolonga, estoura o horário
da Segurança Pública, com o objeti- tra ele. Em 1988, foi eleito vereador de entrada. O impasse se mantém e

Investigação Final.indd 174 25/11/14 18:16


175

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

Chico
Gordo
(esq.)

EUSTÁQUIO
VITAL com
Nelson
Mandela
(Dir.)

somente é resolvido quando a Polícia “Vocês vão colocar a polícia para rogado dentro da fábrica. Teve a sua
se afasta dos portões da fábrica. fabricar pistão?”. A Tropa de Cho- casa invadida, e decide fugir para São
Em outra ocasião, em greve na que ainda estava dentro da fábrica Paulo. Vital militava na Ação Popu-
fábrica Metal Leve, os trabalhado- e se preparava para agir brutalmen- lar (AP) e, em seguida, no Partido
res impedem a saída dos caminhões te. Após negociação com o diretor, Comunista do Brasil (PCdoB).
de produto. A empresa chama a Tro- enfim, Vital e Chico Gordo conse- Em São Paulo, começa a militar
pa de Choque para ocupar a porta guem evitar a repressão na fábrica. na Oposição Sindical Metalúrgi-
da fábrica. Há ameaça de repressão Essas escaramuças faziam parte do ca. Na onda de repressão e da pri-
e o clima fica muito tenso. O tam- seu mandato de vereador. são de integrantes da OSM-SP em
bém metalúrgico Chico Gordo, de- Além disso, durante a vereança, 1974, sabendo que também pode-
putado estadual pelo Partido dos Vital foi o relator da CPI da Vala de ria ser preso, abandona seu traba-
Trabalhadores (PT), e Vital, ainda Perus (Comissão Parlamentar de lho na Philco. Quando da homolo-
com mandato de vereador, vão para Inquérito – Perus: desaparecidos gação da demissão do seu emprego
a Metal Leve. Os parlamentares não políticos). na Delegacia Regional do Trabalho
conseguem convencer o coman- A trajetória de militância de Vital (DRT), para dar baixa na carteira
dante da Tropa de Choque a mu- tem origem na direção estadual da de trabalho, mas os dias 12 e 13 de
dar a postura, e decidem falar com Juventude Operária Católica (JOC) março,Vital é preso.
um dos diretores da empresa, Luís de Minas Gerais. Participa ativamen- Fica preso por 40 dias no DOI-
Antonio, para tentar uma negocia- te da histórica greve de Contagem de -CODI e dez no DEOPS, sendo tor-
ção. O diretor ameaçou desobstruir 1968, à época em que trabalhava na turado nos primeiros 20 dias. Tam-
a passagem dos caminhões a qual- empresa de recuperação de máquinas bém prenderam sua irmã, torturada
quer custo, ao que Vital respondeu: têxteis Santex, foi perseguido e inter- diante dele.

Investigação Final.indd 175 25/11/14 18:16


176

investigação operária

NOSSOS
MORTOS

ASSEMBLEIA DOS METALúRGICOS


1º de noVemBro de 1979.
aCerVo oBoré

Investigação Final.indd 176 25/11/14 18:16


177

Capítulo 3
a aSSOCIaçãO aNTIOPERáRIa

INTRODuçãO alfaiates, laticínios, padeiros e 1968, o 1º de Maio foi comemo-


condutores de veículos - promo- rado na Praça da Sé, com a ocu-
Entre os militantes e organi- veram uma celebração festiva e pação pelos trabalhadores. O go-
zadores da OSM-SP, foram víti- autorizada pelos responsáveis do vernador Sodré (nomeado pelos
mas mortais da ditadura, Olavo regime, entremeada de discur- militares) e dirigentes sindicais
Hanssen, em 1970; Luiz Hirata, sos sobre custo de vida e reajus- que tinham relações amistosas
em 1971; Manoel Fiel Filho, em te dos salários. O texto de convo- com o regime militar ocuparam o
1976; e Santo Dias da Silva, em cação afirmava: “A determinação palanque. Os trabalhadores pro-
1979. de lutar contra a implantação do testaram e Abreu Sodré acabou
Olavo Hanssen foi preso no plano de saúde, contra o fundo de expulso do palanque a pedradas.
ato festivo de 1º de Maio de 1970, garantia, que na prática liquida a Olavo Hanssen nasceu em São
no campo de futebol Maria Zé- estabilidade no emprego, e contra Paulo, no bairro da Penha, em
lia/Vila Maria; era trabalhador na a lei que regulamenta o exercício 1937, em uma família pobre, com
indústria química do ABC e diri- do direito de greve”. E prestava seis filhos. Aos 14 anos já traba-
gente do POR(t) – Partido Ope- homenagem “aos que tombaram lhava como office-boy na Tecela-
rário Revolucionário (trotskista). pelo Primeiro de Maio”. gem Sul Americana, em São Ber-
Foi assassinado sob tortura nos Os participantes perceberam a nardo do Campo. Mesmo com as
porões do DOPS-SP, como Luiz presença de um grande número de dificuldades financeiras, aos 23
Hirata, membro da Ação Popular. policiais nas imediações. Ao sair anos ingressou na Faculdade de
Em 1976, a OSM-SP se mobi- com um grupo, Olavo foi preso Engenharia de Minas da Escola
lizou na denúncia do assassinato com mais 18 pessoas. Foram le- Politécnica (USP). No movimen-
do operário Manoel Fiel Filho, vados ao Quartel General da Po- to estudantil, na universidade,
sob tortura, no DOI-CODI-SP. lícia Militar e posteriormente à Olavo se organizou no POR(t).
Manoel Fiel era militante da Zona sede da Operação Bandeirantes, Na primeira vez em que foi pre-
Leste de São Paulo e trabalha- onde foram interrogados e tor- so, participava de uma atividade
va na Metal Arte. Santo Dias da turados. No dia seguinte, foram de porta de fábrica, distribuindo
Silva, da Pastoral Operária (PO), transferidos para o DOPS. “Esse panfletos sobre a revolução cuba-
candidato a vice-presidente pela aqui já conhece o caminho”, di- na. Saiu da universidade, ambien-
chapa da Oposição em 1978, foi ziam os agentes do DOPS se refe- te no qual se sentia distante e des-
assassinado pela Polícia Militar rindo a Olavo. locado, e passou a trabalhar no
de São Paulo durante piquete de Segundo depoimentos de pre- setor de programação da indústria
grevistas diante da fábrica Sylva- sos políticos, ele foi submetido de viaturas Massari S. A., onde fi-
nia, em outubro de 1979. a torturas violentas, durante vá- cou de 1963 a 1964, quando foi
rios dias, e seu estado de saúde se novamente preso. Olavo come-
OLaVO HaNSSEN agravou profundamente. Entrou çou a atuar na Oposição Metalúr-
como “preso civil terrorista” no gica nesse mesmo período.
Olavo Hanssen foi assassina- Hospital Militar do II Exército, de No dia do golpe, a repressão
do pela repressão depois de ser onde não mais saiu. No dia 13 de tomou o Sindicato dos Metalúr-
preso na comemoração do 1º de maio, a família foi informada de gicos de São Paulo. Até o dia 10
Maio de 1970, em uma tentativa que teria se suicidado. de abril de 1964, o Sindicato per-
de os sindicatos retomarem a tra- No ano anterior, 1969, não manecia ocupado por agentes do
dição da data. Diversos sindicatos houve comemoração aberta, pois DOPS. Olavo começou a questio-
- metalúrgicos, bancários, têxteis, foi o início do período mais duro nar em assembleias a Junta Inter-
químicos, marceneiros, gráficos, da ditadura, logo após o AI-5. Em ventora e propôs, diversas vezes,

Investigação Final.indd 177 25/11/14 18:16


178

investigação operária

uma greve contra o arrocho sa- época em que foi assassinado. Em


larial. Segundo um investigador seu jornal, o Sindicato dos Quími-
do DOPS, “o único orador a me- cos do ABC, em maio de 70, de-
recer destaque especial foi Olavo nunciou a morte “de nosso sócio
Hanssen” (Dossiê Dops 50-B-58- Olavo por espancamento”. Os dez
1547). A sua postura lhe custou sindicatos organizadores do ato
uma segunda prisão, que durou no Maria Zélia exigiram esclare-
cinco meses. Foi torturado e libe- cimentos por meio da Delegacia
rado apenas em março de 1965. Regional do Trabalho; federações
Em 1967, participou ativa- e sindicatos de trabalhadores, em
mente da primeira eleição para a 15 de maio, enviaram telegrama
diretoria do Sindicato, disputa- ao presidente da República, o di-
da pela Oposição Metalúrgica. tador Garrastazu Médici, também
Em maio de 1968 voltou à prisão, sem resposta.
após uma assembleia às vésperas O POR(t), seção brasileira da
do 1º de Maio. Em 1970, no Es- IV Internacional, iniciou uma
tádio Maria Zélia, foi preso pela BOLETIM ESPECIAL soBre o campanha mundial de denún-
ato em HomeaGem a oLaVo
última vez. Hanssen no Campo da ViLa cias. A assembleia geral do Sin-
Aqueles que testemunharam maria zéLia, em 2013. dicato dos Metalúrgicos de São
aCerVo iiep/proJeto memória da
a prisão e as torturas de Hans- osm-sp
Paulo, no dia 25 de maio, pro-
sen afirmam que os responsáveis moveu um minuto de silêncio
pelo assassinato foram os delega- em sua homenagem. Waldemar
dos Ernesto Milton Dias e Josecyr Rossi, da OSM-SP, propôs que
Cuoco, com as respectivas equi- o representante dos trabalhado-
pes, sob o comando do investiga- sassinato de presos políticos. No res na assembleia anual da Orga-
dor Sálvio Fernandes do Monte; final do ano, a Comissão Intera- nização Internacional do Traba-
tiveram a colaboração do médi- mericana de Direitos Humanos da lho levasse um amplo relatório
co Geraldo Ciscato. No mesmo OEA denunciou o “governo bra- “sobre a morte do companheiro
dia da morte de Olavo, o gover- sileiro por não punir os responsá- e a prisão dos trabalhadores no 1º
no militar fez pronunciamento de veis e não reparar a família”. de Maio”. Todas essas denúncias
que não havia torturas nas prisões Sua morte, apesar dos tempos no período mais duro do regime
brasileiras. sombrios, motivou protestos for- militar precederam, em alguns
A Conferência Nacional dos mais e exigências de esclareci- anos, a comoção causada pelos
Bispos do Brasil (CNBB) publi- mentos por parte do deputado fe- assassinatos de outros militantes
cou um manifesto denunciando deral Franco Montoro, em nome políticos e trabalhadores.
“o assassinato do operário Olavo, da bancada do MDB, e uma firme Em função da repercussão
quando participava da data inter- atitude de Oscar Pedroso Horta, das denúncias, a repressão deu
nacional dos trabalhadores”. Foi presidente do MDB, que levou o várias versões sobre sua mor-
o primeiro caso em que a ditadu- caso ao Conselho dos Direitos da te. Primeiramente, que o corpo
ra teve que dar esclarecimentos Pessoa Humana. A denúncia foi fora encontrado em um matagal
aos organismos internacionais - inacreditavelmente arquivada. no bairro Ipiranga, na cidade de
Organização dos Estados Ameri- Olavo, por ser muito visado em São Paulo. Em seguida, quando
canos (OEA) e Organização das São Paulo, trabalhava na indústria não havia como negar que Ola-
Nações Unidas (ONU) -, por as- química IAP, em Santo André, na vo fora preso, foi elaborado um

Investigação Final.indd 178 25/11/14 18:16


179

Capítulo 3
a aSSOCIaçãO aNTIOPERáRIa

PRESOS JUNTOS
Presos na mesma ocasião:
Guacira Gouvea, Isolda Gouvea,
Haroldo Luiz Brandmiller, Geraldo
Augusto de Siqueira Filho, Marce-
leuze Melquíades de Araújo, Leni-
ta Maria de Souza, Leda Leal Fer-
reira, Helena Iono, Karin Bakke,
Ana Lúcia Berça Hernandes, Helio
Muniz, Dulce Quirino de Carvalho
Muniz, Tadeu Roberto Dias, Joel MARIA zÉLIA: HomenaGem a oLaVo 43 anos depois no
Evaldo de Oliveira Keistein, Ricar- mesmo LoCaL em Que Foi preso no dia 1º de maio de 1970.
do Andrade da Silva Teles e Flávio na mesa seus CompanHeiros, os orGanizadores do ato
em 70 e miLitantes Que estiVeram presos Com eLe. tuLLo
Borges Botelho Filho. ViGeVani, FranCo Farinazzo, aLiCe Hanssen, duLCe muniz,
Testemunhas / pessoas que es- seBastião neto (em pé), ana LÚCia di GiorGi, rapHaeL
tiveram presas com ele:Vitório Chi- martineLLi e GeraLdo siQueira FiLHo.
Vera Jursys
naglia, Raphael Martinelli, Patrocí-
nio Henrique dos Santos, Maurice
Politi, Gilberto Beloque, Sonia Hi-
pólito, Tarcísio Sigristi, Marco An-
tônio Moro, Bety Chachamovith,
Carlos Russo Jr., Waldemar Tebaldi
Filho, José Claudio Barighelli, Nor-
ma Freire, Humberto Veliame, Fer-
nando Casadei Salles, João Manoel
de Souza, Jacob Gorender, Maria
do Carmo e outros.

laudo, afirmando que havia se


suicidado tomando Paration, ve-
neno manipulado na fábrica IAP,
onde trabalhava. Por fim, o rela-
tório de investigação do Ministé-
rio Público sugeriu que a polícia
não havia sido responsável por
sua morte. INQUÉRITO INSTAURADO na seCretaria de seGurança
ConCLuiu Que oLaVo Cometeu suiCÍdio e Que a morte “não
Alguns militantes sempre man- Foi oCasionada por QuaLQuer ato de arBitrariedade
tiveram a postura de denunciar as pratiCado peLos FunCionários Que o CustodiaVam”.

Investigação Final.indd 179 25/11/14 18:16


180

investigação operária

circunstâncias da morte de Ola- novembro, só foi levado para in- assinado pelos médicos legistas
vo. Essas pessoas foram presas terrogatórios e sessões de tortu- registra que “a vítima foi admi-
com ele ou estiveram com ele no ra por volta do dia 11 de dezem- tida no Hospital das Clínicas às
DOPS. bro. Em todos esses dias, Hirata 20h15 do dia 16/12/71 (…) e veio
acompanhou os seus companhei- a falecer às 8h30 do dia 20/12/71,
LUIZ HIRATA ros de cela indo e voltando da tor- traumatizado há oito dias. Insufi-
tura, sabendo que seu dia chega- ciência renal crônica”.
Luiz Hirata, da coordenação ria. Segundo Antonio Prado de Os relatórios do Ministério
da OSM-SP, foi preso em 24 de Andrade, o “Tico”, que estava da Marinha e do Ministério da
novembro de 1971 e assassina- preso na mesma cela: Aeronáutica mencionam que a
do, depois de uma série de tor- “[...] foram deixando o Luiz morte se deu em decorrência de
turas, no DOPS-SP. Preso junta- para o final. Os torturadores, lesões durante uma tentativa de
mente com vários militantes da quando passavam pelos cor- fuga. Os policiais forjaram a ver-
Ação Popular, entre os quais Rai- redores, em frente às celas, são de que, ao tentar fugir, Hirata
mundo Moreira Oliveira, o Rai- olhavam para a nossa jane- colidira com a traseira de um ôni-
mundinho, depois da delação de linha e ao avistá-lo, diziam: bus, o que serviria para explicar
Hugo de Faria Ramos, o “Dani- “Você que é o Hirata? Vai as graves lesões.
lo”, militante dessa organização. chegar a sua vez!”. O médico Fausto Figueira,
A primeira fábrica em que tra- que por coincidência trabalhava
balhou foi a Bussing do Brasil e A sua vez chegou e os poli- no HC, atendeu Hirata e relem-
a última foi a Mangels, ambas ciais retiraram Hirata logo cedo bra:
do ramo de autopeças e situadas da cela. Quando voltou, já no iní- Contaram-me de sua cora-
na Mooca. Antes de se transferir cio da noite, estava muito ma- gem, tentando com suas mãos
para São Paulo, Luiz, o sétimo chucado, como relata Tico: ajudar o médico que tenta-
dos dez filhos de uma família de Foi carregado pelos torturado- va entubá-lo, para colocá-lo
budistas convertidos cristãos, de res, que o jogaram na cela todo num respirador... Queria mais
origem camponesa da cidade de machucado e muito inchado, do que nunca viver. Seu cor-
Guaiçara, em São Paulo, cursou o rosto irreconhecível de tanto po foi rapidamente retirado,
Agronomia na USP de Piracica- apanhar. Disse que ficou o dia in- como sempre acontecia nes-
ba, mas abandonou os estudos teiro no pau de arara. sas ocasiões. Sabia que seria
em 1969, antes de se formar. Du- Seu estado de saúde foi se enterrado como indigente,
rante o período em que era uni- agravando; companheiros de que desapareceriam com sua
versitário, dava aulas de alfabeti- cela que estudavam medicina so- identidade, que um ‘Shibata’
zação para trabalhadores rurais e licitaram várias vezes aos carce- da vida iria atestar o que qui-
cortadores de cana. reiros atendimento médico. De- sesse.
Já militante da Ação Popular, pois de alguns dias do retorno da
mudou-se para São Paulo. Foi tortura, dois homens o levaram Luiz Hirata teria sido enterra-
trabalhar nas indústrias metalúr- do DOPS. Foi a última vez que do como indigente em uma vala
gicas e entrou para a Oposição seus companheiros o viram. comum no Cemitério de Perus,
Sindical Metalúrgica. Em 1971 Conduzido à enfermaria de mas seu corpo permanece não
foi preso com seus companhei- Nefrologia do Hospital das Clí- localizado. Desde a abertura da
ros Isamu Ito e Raimundo Mo- nicas para atendimento de urgên- Vala de Perus, em 1990, pela Co-
reira de Oliveira, com quem divi- cia, por causa das suas graves missão Parlamentar de Inquérito
dia uma casa. Preso desde 25 de complicações nos rins, o laudo da Câmara Municipal, durante a

Investigação Final.indd 180 25/11/14 18:16


181

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

Hirata na juventude gestão de Luiza Erundina, inú-


com colegas da meras tentativas de reconheci-
faculdade.
Acervo IIEP/Projeto mento foram realizadas.
Memória OSM-SP
Iolanda Toshie Ide, amiga de
Hirata, lembra que em um en-
contro com dom Paulo Evaristo
Arns, em 1972, ouviu-o dizer:
Tenho a foto de São Luiz Hi-
rata sobre a minha mesa; rezo
todas as manhãs para que ele
me ajude a impedir outros ar-
bítrios.

MANOEL FIEL FILHO

Corpo deformado Manoel Fiel Filho foi assassi-


por torturas.
Apesp/50-z-9 22948 nado no dia 17 de janeiro de 1976,
no DOI-CODI. Dois dias antes,
foi detido na fábrica onde traba-
lhava, a Metal Arte, por dois po-
liciais, que o conduziram até sua
residência para busca e apreen-
são. Depois de a casa ser revista-
da, Manoel passou alguns minu-
tos com a família para se despedir
e foi encaminhado ao DOI-CODI.
Ele foi detido numa onda de pri-
sões de militantes, a maioria do
Partido Comunista Brasileiro.
O interrogatório e a tortura a
que foi submetido pelos agentes
da repressão tinham como objeti-
vo estabelecer a ligação de Mano-
el com o PCB. Era acusado de ser
o responsável pela distribuição do
jornal clandestino A Voz Operária.
Fiel Filho nasceu em Queb-
rângulo, Alagoas, e veio para São
Paulo com 18 anos, na carroce-
ria de um caminhão, conhecido
como pau de arara. Antes de se
tornar metalúrgico da Metal Arte
Industrial, onde era encarregado
do setor de peças hidráulicas e co-

Investigação Final.indd 181 25/11/14 18:16


182

investigação operária

nhecido como trabalhador exem-


plar, foi padeiro e cobrador de
ônibus. Participava discretamen-
te da vida sindical, recebia peque-
nos pacotes de boletins e jornais
da Oposição Sindical e os repas-
sava com cuidado a outros com-
panheiros. Fiel Filho era um mili-
tante de base do PCB, orientado a
fazer um trabalho de longo prazo
dentro da fábrica.
Sua família recebeu, no mesmo
dia da morte, a notícia de que ha-
via se suicidado. Existiam ordens
do IML para ninguém ver o corpo
de Fiel Filho: “O enterro deve sair
daqui mesmo e a família não deve
ser avisada”.
O laudo médico e a autópsia
indicavam morte em decorrên-
cia de asfixia por estrangulamen-
to. José Antônio Mello, autor da
necropsia, pressionado pela opi- Clarisse Herzog e Tereza Fiel Filho, esposas de
nião pública e imprensa, declarou Vladimir Herzog e Manoel Fiel Filho assassinados
pela ditadura, no Congresso das Mulheres
três anos depois da morte de Fiel: Paulistas em março de 1979 em São Paulo.
“Casos de estrangulamento são Acervo Movimento
em quase sua totalidade casos de
homicídio”.
A morte de Fiel apresentava
coincidências evidentes: nas três
vezes em que foram encontrados
presos mortos nas celas do DOI- SANTO DIAS DA SILVA Santo deixou mulher, Ana, e
-CODI, a divulgação oficial era dois filhos, Santo Filho, com 13
dada como “mortes oriundas de O metalúrgico Santo Dias da anos, e Luciana, com 12.
asfixia mecânica, suicídio”. To- Silva foi assassinado na tarde de Dois anos e sete meses após
das as mortes, incluindo a de Vla- 30 de outubro de 1979, em fren- o crime, o soldado foi julgado.
dimir Herzog e a do tenente refor- te à fábrica Sylvania, região de Apesar do corporativismo da
mado José de Almeida, ocorreram Santo Amaro, Zona Sul da ci- Justiça Militar que imperava à
quando a mesma equipe se encon- dade de São Paulo. O tiro que o época, Herculano foi condenado
trava em atuação. Em 1995, a fa- matou perfurou seu estômago, (três votos a dois) a seis anos de
mília de Manoel Fiel Filho ga- disparado pelo soldado Hercula- reclusão por homicídio simples.
nhou na justiça a ação que pedia no Leonel, reconhecido por tes- Foram 22 horas de julgamento.
a responsabilização da União por temunhas, membro da Tropa de A defesa apelou ao Tribunal de
sua tortura, prisão ilegal e morte. Choque da Rota. Justiça Militar, e por quatro vo-

Investigação Final.indd 182 25/11/14 18:16


183

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

tos a zero Herculano acabou ab- Ele foi expulso da fazenda em dical. Os trabalhadores não su-
solvido. A acusação recorreu ao 1959, porque lutou para o patrão portavam o arrocho salarial e o
Superior Tribunal Militar, mas o assinar a carteira dos trabalha- aumento dos preços. Nesse ano,
recurso sequer foi recebido. dores rurais. Santo Dias é candidato a vice-
O soldado Herculano Leonel, Expulso com toda a família, -presidente na chapa da OSM
então com 37 anos, natural de viu-se obrigado a trabalhar como para a direção do Sindicato dos
Valparaíso, interior de São Pau- boia-fria, começando nesse pe- Metalúrgicos de São Paulo, que
lo, estava definitivamente livre. ríodo sua aproximação mais in- teve Anízio Batista como can-
Cumprira apenas 60 dias de prisão tensa com sindicatos de trabalha- didato a presidente, ambos li-
preventiva no Presídio Militar Ro- dores rurais. Já participante ativo deranças populares da Pastoral
mão Gomes, região do bairro San- das atividades da Igreja Católica, Operária e das mobilizações dos
tana, na cidade de São Paulo. permaneceu poucos meses como bairros. As eleições foram tu-
Um dos momentos mais boia-fria, decidindo se transferir multuadas e repletas de irregula-
emocionantes de todos os fatos para a capital, com todos os fami- ridades. Um procurador da Justi-
que envolveram o assassina- liares, em 1962. Quando chegou ça do Trabalho anulou a eleição
to do operário Santo Dias ocor- a São Paulo foi trabalhar como por conta de fraudes evidentes,
reu quando dom Paulo Evaristo metalúrgico na Metal Leve, em- mas o Ministério do Trabalho re-
Arns, cardeal de São Paulo, en- presa na qual permaneceu vários conheceu a vitória de Joaquin-
trou na sala do IML, onde esta- anos. Era o período da luta pela zão, liderança dos pelegos.
va o corpo. Ele apontava com o consolidação do 13º salário, de No ano seguinte, 1979, o pre-
dedo indicador o orifício de en- greves e paralisações pelos di- sidente era o militar João Batista
trada da bala e repetia aos po- reitos dos trabalhadores. E a essa Figueiredo e o governador Pau-
liciais espalhados pelo local: luta ele rapidamente se aliou. A lo Maluf. No dia 28 de outubro
“Olhem o que vocês fizeram...! Igreja também passava por pro- daquele ano, um domingo, uma
Olhem o que vocês fizeram...!”. fundas transformações, a partir grande assembleia dos metalúr-
Nenhum deles reagia. Todos do Concílio Vaticano II, que mar- gicos decide decretar greve. Na
permaneciam de cabeça baixa, cariam a vida da instituição e do mesma noite começa a repressão
e dom Paulo insistia: “Olhem o operário metalúrgico. policial. A PM invade locais dos
que vocês fizeram...!”. Ana e Santo se casaram no dia comandos de greve, o que resul-
Santo é uma das maiores fi- 6 de fevereiro de 1965, ano em tará na prisão de 334 dirigentes
guras da luta operária do País no que Santo se aproxima da Oposi- e militantes operários. Em Santo
caminho em direção à democra- ção Sindical Metalúrgica de São Amaro, na invasão da Rota, com
cia, retrato da mobilização po- Paulo; percebe rapidamente que armamento pesado, os trabalha-
pular e operária que produziu diante da pesada e poderosa estru- dores são presos e levados para
marcas definitivas na história tura sindical dos “pelegos” restava as celas do DOPS. Mas no dia se-
política do Brasil. se manter no chão da fábrica, co- guinte, 29 de outubro, Santo já
Santo Dias da Silva nasceu nhecer os problemas e expectati- estava na rua, ajudando a organi-
em Terra Roxa, interior de São vas dos trabalhadores. Santo é um zar a greve.
Paulo, a 22 de fevereiro de 1942, dos participantes desde o início da Na tarde de 30 de outubro
mesma região em que conheceu Pastoral Operária, em 1970. ele estava na porta da Sylvania.
Ana, sua futura mulher, nascida Em 1978, as comissões de Quando o grupo de Santo deixa-
na cidade de Pitangueiras. Tra- fábrica já eram recorrentes em va a porta da fábrica para relatar
balhou como lavrador, depois várias empresas de São Paulo, o andamento da greve, foram pa-
foi meeiro; Ana era boia-fria. organizadas pela Oposição Sin- rados por soldados da PM que in-

Investigação Final.indd 183 25/11/14 18:16


184

investigação operária

LUCIANA, ANA E SANTINHO. AFONSO DAS NEvES ABRAÇA João pereira (CHorando), Que
riCardo aLVes estaVa Com santo no momento de seu assassinato.
aCerVo iiep/proJeto memória ennio Brauns
da osm-sp

A FRIEzA Com Que o dops tratou a dor de ana dias.


arQuiVo: apesp/50-B-58 036

Investigação Final.indd 184 25/11/14 18:16


185

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

dentro da subsede, já nos pi-


quetes da noite, ou por outros
motivos, passamos a noite no
Comitê de Aurélio Peres e
Irma Passoni, na Vitor Manzi-
ni, Santo Amaro, deitados no
chão, pois a polícia não para-
va de passar e focalizar com
grandes luzes. De manhã, pu-
lamos um muro e partimos
para os piquetes na Cháca-
ra Santo Antonio e por Santo
Amaro. Fomos à Metal Leve,
que estava cheia de policiais e
tivemos que sair correndo.

Depois da invasão da subsede,


nos reunimos na Igreja do Largo
de Socorro que virou comando
de greve da Região Sul. Dela saí-
mos para a porta da Sylvania, para
convidar as pessoas do turno das
catorze horas a aderir à greve e ir à
assembleia do sindicato.
Como a polícia continuava
prendendo companheiros, deci-
dimos que não deixaríamos levar
ninguém. Saímos da Igreja e San-
Como compreender o assassinato de Santo? to levou alguns companheiros no
Ricardo Alves
Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM-SP
seu Fusca. Nós outros fomos de
ônibus. Chegamos um pouco de-
pois que eles. Quando cheguei já
tinha uma viatura no local. Logo
os policiais começaram a agarrar
sistiam em prendê-los. Os traba- Metalúrgica de São Paulo. A um de nós. Íamos nós, tirávamos
lhadores haviam decidido não se diretoria, com Joaquinzão na ele, agarravam outro e nós puxá-
deixar prender. cabeça, torcia pelo seu fracas- vamos para libertá-lo. Eu pessoal-
Ouviu-se um disparo. Santo so. Na véspera da greve, no co- mente fui pego pela polícia; teve
havia sido mortalmente atingido. meço da noite, todas as subse- empurra-empurra e me soltaram.
Vicente Ruiz, conhecido como des foram invadidas e muitos Vendo que a coisa estava en-
Vicente Espanhol, narra esse mo- companheiros foram presos. grossando, decidimos ir embora a
mento: Na Zona Sul, nós, que esca- pedido de Santo.
A greve de 1979 foi prepara- pamos da prisão porque não Quando estávamos começan-
da e organizada pela Oposição estávamos naquele momento do a correr para a Av. Nossa Se-

Investigação Final.indd 185 25/11/14 18:16


186

investigação operária

Saída do corpo de Santo da Catedral da Sé. à frente, Chico Viola e Waldemar Rossi.
Ricardo Alves
Acervo IIEP/Projeto Memória da OSM-SP

nhora de Sabará chegaram duas seus filhos da puta”, falavam. lho e Luciana. Ana, a incansável
viaturas. Eles eram mais. Quero dizer Ana, que encontrou nos parentes,
Desceram dando rasteira em que havia mais policiais do amigos da Pastoral Operária e nos
nós. Eu rodei pelo chão e es- que piqueteiros, sendo que nós filhos força suficiente para supor-
cutei uns tiros que pensei que não tínhamos nada para reagir, tar a dor, seguia em outro carro,
eram para o ar. Nem percebi nem pretendíamos isso. logo atrás.
que tinham atingido alguém. Por que mataram o Santo? Ele está enterrado no Cemité-
Voltei para a Capela do Socor- Nos não oferecíamos nenhum rio de Campo Grande, Zona Sul
ro. Pelo rádio escutei a notícia perigo, muito menos o Santo, da capital. Todos os anos a Pasto-
da morte de Santo. Talvez por que era o mais pacífico. ral Operária, no dia 30 de outubro,
isto surgiu o boato de que tinha organiza uma celebração, de vida
um espanhol armado que tinha No dia 31 de outubro, por vol- e ressurreição, em sua memória.
divergências com Santo e po- ta das 11h, mais de 15 mil pesso- Na lápide, está registrado: “San-
deria tê-lo matado e fugido. as levam seu corpo, da Igreja da to Dias da Silva, operário cris-
Devo ressaltar que quando es- Consolação, onde estava sendo tão. (1942-1979). Foi assassina-
távamos nos retirando a po- velado, à Catedral da Sé. À frente do pela polícia militar na luta pelo
lícia partiu para cima de nós: do cortejo seguia o carro do carde- povo oprimido. Santo, na força de
“Eu quero ver vocês fugirem, al Arns, no qual estavam Santo Fi- sua memória faremos justiça”.

Investigação Final.indd 186 25/11/14 18:16


187

Capítulo 3
a aSSOCIaçãO aNTIOPERáRIa

MASSACRES,
TORTURAS E
PRISÕES

O TERROR EM TODO O PAíS


CARAJáS 1996. os
massaCres do
estado Contra os
Lutadores do poVo
atraVessam os
séCuLos.
José roBerto ripper/
imaGens Humanas

Investigação Final.indd 187 25/11/14 18:16


188

investigação operária

O Estado contra
os trabalhadores brasileiros

A
violência sistemática e cruel em 19 de dezembro de 2012, eles barbáries do regime de exceção.
contra os trabalhadores é uma escrevem que: “A máquina poli- Vários fóruns, comissões, organi-
das principais características da cial do Estado nunca olhou o tem- zação se engajaram para trazer à
ação política das classes dominan- po histórico para tratar revoltosos luz as barbáries cometidas entre os
tes no Brasil em toda a sua história. dos sertões. A fúria da repressão anos de 1964 e 1988 contra a po-
Sempre articulando poder econô- foi igual em momentos de exceção pulação brasileira. Esse processo
mico e político, as elites promove- ou de democracia”. Casos como teve um impulso maior com os tra-
ram diversos massacres contra as as rebeliões populares de Pinhei- balhos de investigação pela CNV.
classes trabalhadoras, bem como rinho (1902), da Vargem Bonita Aqui nós vamos tratar das gra-
inúmeros casos de prisões em mas- (1913), do Quebra Milho (1943 ves violações relacionadas aos tra-
sa. Além disso, a prática da tortura e 1951), dos Posseiros (1957), e balhadores, com os casos de mas-
foi constantemente utilizada. a guerra que o Estado promoveu sacre, as práticas de tortura e as
A forma com que o Estado bra- para liquidá-las evidencia essa prisões em local degradante. Tam-
sileiro lidou com as classes subal- tradição das classes dominantes bém vamos cuidar do padrão de re-
ternas ao longo de toda sua his- em seu trato com as classes subal- pressão seletiva sobre as lideranças
tória foi marcada pela violência, ternas. Mais do que meros episó- sindicais, como tática de dissuasão,
repressão e perseguição aos seus dios históricos, tais guerras assi- a qual objetiva criar um “ambien-
opositores políticos. Isso criou nalam essa lógica de combate às te de terror”. O Estado criminaliza
uma lógica do inimigo interno que classes populares que é constituti- qualquer ação política contestató-
foi incorporada e intensificada va do Estado brasileiro. ria, de modo a submeter os trabalha-
pela doutrina militar com o golpe À medida que as classes popu- dores a um regime de medo, com o
de 1964. Na formação política do lares foram se constituindo como fim último de incutir em seu espírito
Estado Brasileiro, o Exército atu- classes trabalhadoras, ao longo do a ideia de que o não envolvimento
ava como elemento unificador da desenvolvimento industrial no País, político seria mais prudente. O co-
nossa nação, dizimando as revol- essa mesma cultura de repressão foi ronel Jarbas Passarinho, ministro
tas separatistas e as contestações aplicada aos trabalhadores. Em São da Educação e do Trabalho duran-
ao poder imperial. Paulo, a partir dos anos 50, vai se te o regime de exceção, responsável
Ao longo do século XX, o Bra- consolidando a categoria dos meta- pela ocupação militar e repressão às
sil passa de um País de pouca re- lúrgicos pela sua importância eco- greves de Contagem e Osasco em
levância no cenário internacional, nômica e pelo peso político de seu 1968, cunhou a expressão: “Estu-
para se constituir como uma po- Sindicato. A repressão aos trabalha- dante tem é que estudar e trabalha-
tência econômica de alta expres- dores metalúrgicos de São Paulo foi dor trabalhar.”
são, atravessando um processo de exacerbada com a implementação
industrialização e de moderniza- do regime militar, e estava inserida Massacres
ção econômica. No caderno es- dentro de um quadro de violência
pecial Guerras desconhecidas do sistemática a toda e qualquer tipo de Os massacres não foram uma
Brasil: histórias de um país sem contestação política ao regime. invenção da ditadura civil-militar.
memórias, feito por Leonencio Nos últimos anos, foi se com- Antes de 1964, existiram três mas-
Nossa e Celso Júnior, publicado provando aquilo que os persegui- sacres de trabalhadores: em 1949,
no jornal O Estado de São Paulo, dos políticos afirmavam sobre as na Mina de Ouro Morro Velho,

Investigação Final.indd 188 25/11/14 18:16


189

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

em Nova Lima, Minas Gerais; em


1959, dos trabalhadores da Constru-
tora Pacheco Fernandes Dantas, em
Brasília; e em 1963, o de Ipatinga,
Minas Gerais. Com o regime mili-
tar, foram executados os massacres
de Serra Pelada, no Pará, em 1987, e
o de Volta Redonda, em 1988.
Em 7 de novembro de 1948,
operários comparsas e aliciados
pela mineradora anglo-africana
Anglogold Ashant, no Morro Ve-
lho, na cidade de Nova Lima, ar-
mados, utilizaram a torre da Igreja
Matriz de Nossa Senhora do Pilar
e atiraram para dissolver uma ma-
nifestação do Sindicato dos Minei- Nova Lima (MG). Trabalhadores da Mina de Morro Velho
ros. Dois operários foram mortos: protestam contra as más condições de trabalho.
Acervo Movimento
Onésio Pereira e Willian Dias Go-
mes, então vereador pelo PSC, li-
gado ao PCB. Em 17 de junho de
1949, o líder operário José dos
Santos, conhecido como “Lam-
bari”, foi assassinado com sete ti- a Juiz de Fora para serem interro- de número e armamento reforçado,
ros. O assassinato de lideranças gadas. As lideranças são transpor- promovendo uma fuzilaria, atiran-
sindicais, em uma ação conjunta tadas em jaulas pelas ruas da cida- do contra os barracões de madeira
da polícia e dos patrões, intentava de. A cidade viveu nos primeiros onde dormiam os operários.
intimidar a militância dos trabalha- dias de abril de 1964 uma experi- Na versão oficial, houve uma
dores e a sua mobilização política. ência de terror sob a tutela militar. morte e três feridos. A socióloga
Ainda em 1949, a minerado- Em 1959, aconteceu o massacre Nair Heloisa Bicalho de Sousa, no
ra de Nova Lima, com auxílio do dos operários da construtora Pa- artigo “Massacre da Pacheco Fer-
DOPS, elaborou uma lista com 51 checo Fernandes Dantas. Essa em- nandes Dantas em 1959: Memória
nomes de trabalhadores, sob a acu- preiteira foi uma das grandes parti- dos trabalhadores da Construção Ci-
sação de sabotagem e de responsa- cipantes na construção de Brasília. vil de Brasília”, ouviu os trabalha-
bilidade pela queda na produtivi- Uma refeição estragada servida no dores da época e constatou que esse
dade da extração do ouro. O grupo refeitório, no domingo de Carnaval número pode chegar entre 50 e 120
ficou conhecido como “bloco dos (8 de fevereiro), gerou um tumulto mortos. O episódio é retratado no
51.” Apesar de seus integrantes com brigas. A Guarda Especial de filme Conterrâneos Velhos de Guer-
contarem com muitos anos de tra- Brasília (GEB), um destacamen- ra, de Vladimir Carvalho, sobre os
balho na empresa, foram demiti- to extremamente violento que re- candangos que construíram a cida-
dos por justa causa e sem respeitar solvia todos os conflitos na futura de. No documentário, fica eviden-
o mandato sindical de alguns. Em capital de forma muito truculenta, te que, pelo isolamento da região à
64, estarão nas listas de pessoas a foi chamada. Após a situação ter época e pela euforia do período Jus-
serem presas. Mais de duas cente- sido aparentemente apaziguada, a celino, foi erguida uma cortina de si-
nas de trabalhadores serão levados GEB volta tarde da noite, em gran- lêncio sobre o assunto.

Investigação Final.indd 189 25/11/14 18:16


190

investigação operária

Ninguém foi Nos dias que antecedem o mas-


punido sacre, há uma sequência de esca-
no massacre
que todos
ramuças, pela decisão da empre-
souberam. sa de revistar os trabalhadores que
Jornal chegavam em carrocerias de cami-
Última Hora, nhões; eram obrigados a fazer fila
08/10/1963.
Acervo Apesp na portaria, para serem revistados
na entrada como também na saída.
Os caminhões paravam a certa dis-
tância, o que gerava atrasos pelos
quais os trabalhadores eram puni-
dos. O tratamento desigual de não
revistar os funcionários qualifica-
dos humilhava os trabalhadores,
pois se sentiam ameaçados de es-
tar furtando a empresa. Até as mar-
mitas eram revistadas na entrada.
Na manhã do dia 7 de outubro, 6
mil pessoas obstruíram os portões
e concentravam-se dentro e fora da
usina. Foi criado um estado de gre-
ve e aberta uma negociação. A Po-
lícia Militar Esadual fez uma con-
tenção com a tropa e instalou um
fuzil-metralhadora ZB calibre 45
(capaz de mais de 200 disparos por
minuto, popularizada durante a Se-
gunda Guerra Mundial) em cima
de um caminhão. Por descontro-
le ou ordem superior, os policiais
abriram fogo contra a multidão.
Passados muitos anos, a Co-
missão de Anistia do Ministério da
Justiça conseguiu comprovar que
houve 8 mortos e 78 feridos gra-
No dia 7 de outubro de 1963, e classista entre o corpo técnico-ad- ves, números impossíveis de se-
ocorreu um massacre na cidade de ministrativo e de engenheiros, que rem negados. Geraldo Ribeiro, an-
Ipatinga, Minas Gerais. Embora a se alojavam em condomínios fecha- tigo presidente do Sindicato, conta
usina já estivesse em funcionamen- dos, e os peões que ficavam em insta- que haveria mais de 30 mortos e
to, havia uma grande obra para ter- lações precárias e sofriam toda sorte 117 feridos, sendo que ele mesmo
minar as instalações. O ambiente de vexame e humilhações. A segu- pôde constatar esse dado por estar
era de acampamentos da constru- rança era feita pelo corpo da empre- no local do massacre. Na audiência
ção civil da época, combinado com sa e da Polícia Estadual de Minas da Comissão Nacional da Verdade
a cultura industrial de uma grande Gerais, totalmente despreparadas e realizada em Ipatinga, em 2013, a
fábrica. Havia uma separação brutal que atingiam com muita violência. empresa evasivamente fugiu à res-

Investigação Final.indd 190 25/11/14 18:16


191

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

ponsabilidade; a Polícia Militar 4° Batalhão da Polícia Militar do ponsáveis pela segurança da usina,
disse que os soldados foram pro- Estado do Pará, armados de fuzis como o coronel Bismark e o coro-
cessados e absolvidos. Mas ficou e metralhadoras, executaram um nel Mario Pitaluga, são citados pe-
consolidado que, pelos testemu- fuzilamento que durou cerca de los trabalhadores sindicalistas nos
nhos e documentação recolhidos 15 minutos. Havia uma unidade testemunhos atuais sobre o funcio-
na região, zelosamente guardados do Exército acompanhando toda a namento da segurança na empresa
por trabalhadores, militantes e pes- operação. Até hoje não há consen- à época.
quisadores, que o massacre, embo- so sobre o número de vítimas des- Os operários da Companhia Si-
ra difícil de quantificar o número se massacre. Predomina, contudo, derúrgica Nacional (CSN) entra-
total de vítimas, seguramente, foi o entendimento de que a operação ram em greve no dia 7 de novem-
várias vezes superior ao que foi policial realizada na região pro- bro para reivindicar a implantação
possível demonstrar. vocou 79 desaparecimentos e 10 do turno de 6 horas, além da repo-
Em 29 de dezembro de 1987, mortes de trabalhadores e seus fa- sição de salários usurpados pelos
ocorreu o massacre da Serra Pela- miliares. planos econômicos e reintegração
da, no Pará. As imagens do chama- Serra Pelada era explorada por dos demitidos por atuação sindical.
do “formigueiro humano”, que se uma associação de empresas de ca- No segundo dia de greve, as tropas
transformou o garimpo na região, pital nacional e estrangeiro, forma- do Exército, sob o comando do ge-
são conhecidas no mundo inteiro da pela Atlântica Boa Vista (grupo neral José Luiz Lopes, matou três
através das lentes de Sebastião Sal- Bradesco), a Globo (grupo Rober- operários: dois deles por tiros no
gado. O controle do garimpo era to Marinho), a Monteiro Aranha, peito e outro com o crânio esmaga-
feito pelo major Curió, conhecido além das firmas multinacionais do por pancadas A Polícia Militar
oficial do Exército Brasileiro, atu- British Petroleum e a Anglo Ame- estava junta em toda a operação,
ante na repressão em diversos con- rican Corporation. Os diretores porém, a responsabilidade do mas-
flitos, como na Guerrilha do Ara- executivos eram Eike Batista e An- sacre é das tropas do Exército, que
guaia e na Encruzilhada Natalino, tonio Dias Leite Junior. adentraram a usina. Os trabalhado-
sempre quando era necessária uma O massacre de Volta Redon- res assassinados, Carlos Augusto
voz de comando com muita autori- da ocorreu em 9 de novembro de Barroso, Valmir Freitas Monteiro
dade e intimidade com o poder. A 1988, logo após a Constituinte, em e William Fernandes Leite; foram
forma de trabalho braçal caminha- meio à greve na Companhia Side- homenageados por um monumen-
va para o esgotamento, a não ser rúrgica Nacional, em Volta Redon- to projetado por Oscar Niemeyer
que houvesse a possibilidade de da, no Vale do Paraíba fluminense. no centro da cidade. O monumento
autorizar o rebaixamento da cava Antes mesmo da instauração do foi alvo de um atentado, assumido
para ampliar a exploração. Por trás regime militar, havia uma relação por paramilitares, nunca identifica-
da questão estava o interesse em orgânica entre as Forças Armadas dos. É mantido no centro da cidade
transformar a descoberta e a explo- e a direção da Usina. Com o regi- como exemplo da persistência dos
ração do minério na região em uma me militar, a cidade virou área de trabalhadores, para que ficassem
atividade empresarial. segurança nacional, até 1985, com conscientes de que o ataque não foi
Os garimpeiros se organizaram prefeitos nomeados pelo regime. fortuito e que os inimigos continu-
politicamente para pedir o rebai- Nas empresas estatais, como a Usi- am à espreita.
xamento da cava do garimpo, de minas, a Vale do Rio Doce e a CSN, O Massacre de Volta Redonda
modo a manter o trabalho. Bloque- a segurança era realizada direta- ocorre, ironicamente, após a con-
aram o acesso na Ponte Mista de mente pelo Exército. O Batalhão clusão dos trabalhos da Assem-
Marabá que liga o centro à região de Infantaria Motorizada (BIM) bleia Nacional Constituinte, que
periférica, a fim de atrair atenção permaneceu dentro da área de em- seria o marco institucional da rede-
à sua manifestação. Integrantes do presa desde 1964. Nomes dos res- mocratização do País.

Investigação Final.indd 191 25/11/14 18:16


192

investigação operária

novamente foi preso. Em seguida,


também são presos sua esposa Jo-
velina Tonello do Nascimento, seu
filho Ernesto Carlos Dias do Nasci-
mento (2 anos) e seu irmão, José Jo-
aquim Dias, que permaneceu preso
até 1971. Desde 19 de abril de 1970,
estava presa sua mãe, Tercina Dias
de Oliveira e os sobrinhos meno-
res: Zuleide (4 anos), Luiz Carlos (7
anos) e Samuel (9 anos), que já ha-
viam sido detidos por 24h em junho
de 1968, em decorrência da parti-
cipação de Neto na greve de Osas-
co. Será torturado na frente do filho,
Ernesto Carlos Dias do Nascimen-
Monumento destruído pelo terrorismo de direita. Volta to, em diversas sessões na OBAN,
Redonda (RJ). no DOI/CODI-SP e no DOPS-SP.
Acervo do Sindicato dos Metalúrgicos - Cortesia
A mãe e as crianças foram liberta-
das em junho de 1970 em troca do
embaixador alemão Ehrenfried von
Holleben. Chegou-se ao absurdo de
carimbar a palavra “terrorista” na
Passados quase dez anos de Vol- Torturas ao documentação de banimento das
ta Redonda e da promulgação da trabalhador e crianças. Após a libertação deles,
chamada Constituição Cidadã, no seus familiares Jovelina passa a ser torturada jun-
norte do Brasil é perpetrado o mas- to com Neto, como maneira de que-
sacre de Eldorado de Carajás. Situações de maior gravidade brar sua resistência. O casal só foi
eram aquelas em que não só os tra- libertado na troca pelo embaixador
Torturas balhadores, militantes e sindicalis- suíço, Giovanni Enrico Bucher, e
tas eram capturados pelo aparato foram exilados no Chile em 14 de
A tortura foi utilizada como da repressão e submetidos à tortu- janeiro de 1971.
técnica política dirigida contra os ra, mas como a sua família era tam- Em 29 de setembro de 1969, o
opositores do regime militar, des- bém perseguida, presa e torturada, operário e dirigente do Sindicato
tinada a intimidar, constranger e como forma de pressionar os mili- dos Químicos de São Paulo, Vir-
anular a contestação ao poder dita- tantes trabalhadores. gílio Gomes da Silva, foi preso e
torial. Houve a prática generaliza- Em 1964, Manuel Dias do Nas- morreu em consequência das tor-
da de tortura aos trabalhadores de- cimento, o Neto, operário e dirigen- turas sofridas no DOI-CODI. Sua
tidos por agentes públicos durante te do Sindicato dos Metalúrgicos de esposa, Ilda, e três filhos – Virgí-
os governos militares. Sistemati- Osasco, cassado com o golpe, teve lio, de 9 anos, Vlademir, de 8 anos
camente sofreram prisões ilegais sua família presa e torturada duran- e Isabel, de apenas 5 meses – foram
e arbitrárias, além de terem ficado te o regime. Neto já havia sido pre- levados para a OBAN e ali detidos;
presos em locais com condições so seis vezes pelo DOPS devido às o menor Gregório, de 2 anos foi
impróprias, vexatórias e causado- suas atividades nas Comissões de deixado com a avó, porque estava
ras de sofrimento físico e mental. Fábrica. Em 18 de maio de 1970, enfermo. A esposa Ilda foi tortura-

Investigação Final.indd 192 25/11/14 18:16


193

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

da na OBAN e depois no DOPS; ao


ser transferida para esta delegacia,
teve seus filhos encaminhados para
o Juizado de Menores.
Em abril de 1971, Joaquim
Alencar de Seixas, mecânico de
aviação e militante político, foi
preso juntamente com seu filho,
Ivan Seixas, de 16 anos, em São
Paulo, pelo II Exército-DOI-CO-
DI/OBAN. Joaquim Seixas e Ivan
sofreram sessões de tortura simul-
tâneas e em presença um do outro.
A mulher de Joaquim, Fanny Ak-
selrud Seixas, e suas filhas Ieda e
Lara Seixas, foram detidas e colo-
cadas numa sala contígua, o que fa-
zia com que elas ouvissem as ses-
sões de tortura deles. Joaquim foi
executado na frente de seu filho.
Ieda, irmã de Ivan, foi seviciada no
DOI-CODI, por agentes que com-
punham as equipes de tortura.
Em novembro de 1971, os ir-
mãos José “Zico”, preso na empresa
Grampos Aço, e Antonio Prado de
Andrade, “Tico”, preso ao chegar
em casa, metalúrgicos em São Pau-
lo, foram presos no mesmo dia e con-
duzidos às dependências do DOPS.
Também foram levados sua irmã
Cilei e o irmão menor, João, que fi-
cou detido na delegacia do bairro de
São Mateus. A polícia se instalou na
casa da família, constrangendo qua-
tro crianças, que ficaram sozinhas
na casa. As crianças foram coloca-
das em uma viatura policial, carre-
gada de armas, e os policiais pres-
sionavam para que dissessem onde
moravam os outros parentes. Os três
irmãos presos foram torturados e li-
bertados após 28 dias.
Em outubro de 1975, o metalúrgi- Fichas no Dops dos irmãos Prado Andrade, presos e
torturados, em 1971.
co Newton Cândido foi preso e tor- Acervo Apesp 50-z-009

Investigação Final.indd 193 25/11/14 18:16


194

investigação operária

turado com seu irmão, Sidney Cân- Torturado no 16º RI, sofreu afo-
dido da Silva. Newton passou pela gamentos e simulação de fuzila-
“cadeira do dragão”, e por vários mento, entre outras violências, por
dias teve seu corpo queimado com uma equipe de militares cearenses
cigarros. Sua mulher, Célia, foi pre- deslocados para aquele Estado. Ao
sa em seguida, sendo torturada com seu lado, dezenas de trabalhadores
choques na vagina. Seus dois filhos, e sindicalistas foram presos e tor-
Regina e Ronaldo, e sua cunhada, turados.
Bernadete, sofreram sessões con- Na Bahia, quatro sindicalistas
juntas de tortura, com choques elé- foram presos dentro da Refina-
tricos, “telefone” e espancamentos. ria Landulpho Alves, em abril de
A situação foi tão traumática que, 1964, e transportados em viatu-
nos anos seguintes, Célia tentou sui- ra, hoje identificada, da Petrobras.
cídio quatro vezes, necessitando de Clodesmidt Riani, Entre eles, o dirigente do Sindica-
acompanhamento psiquiátrico per- eletricitário e presidente to dos Petroleiros da Bahia e depu-
manente até o final da vida. do CGT, em 1964. Cassado tado do PSB, Mário Soares Lima,
como deputado Estadual
em Minas Gerais e preso
que ficou preso com mais 100 pes-
Perseguição e político. soas, maioria trabalhadores no
tortura aos Acervo IIEP/Projeto Memória OSM-SP Quartel de Barbalho, sofrendo es-
deputados pancamentos, torturas e simula-
estaduais ções de fuzilamento.
trabalhadores
Prisões em massa
No dia 9 de abril de 1964, a As- Riani relata em Clodesmidt Ria-
senbleia Legislativa de Minas Ge- ni: Trajetória, que Sinval Bambir- Antes mesmo do golpe de 1964,
rais cassou os mandatos dos depu- ra foi duramente torturado pelos as prisões em massa de grevistas e
tados estaduais Sinval Bambirra, do agentes da repressão. Riani conta trabalhadores militantes já eram
PTB, do José Gomes Pimenta (“Da- que Bambirra “saiu com o tímpa- prática corriqueira. Para ficar só
zinho”), do PDC, Clodesmidt Ria- no arrebentado de apanhar; saiu en- em São Paulo: a “Greve de Parida-
ni, do PTB, três destacados dirigen- sanguentado, isso eu vi.” Dazinho de”, em 1960, foi decretada ilegal e
tes sindicais em âmbito nacional. também sofreu tortura depois da nos seus primeiros dias mais de 100
Bambirra era do Sindicato dos Têx- cassação e ficou preso por 2 anos e operários foram jogados nos cárce-
teis, Dazinho dos Mineiros de Nova 8 meses na penitenciária de Neves. res e, na greve dos 700 mil, ocorri-
Lima e Riani dos Eletricitários de Riani, após cumprir a pena inicial de da em 1963, o governo Ademar de
Juiz de Fora e presidente nacional quase dois anos, é enredado numa Barros mandou prender aproxima-
do Comando Geral dos Trabalha- falsa acusação de desvio de recur- damente 2 mil trabalhadores.
dores (CGT). Os mandatos dos três sos em 1969, ficando como preso Com o processo de instaura-
militantes operários foram cassados comum na Ilha Grande e permane- ção da ditadura, houve prisões em
pela subversiviência da quase una- cendo por um ano e meio proibido massa por todo o País. Certamen-
nimidade da acovardada Assem- de receber visitas familiares. te, as prisões foram mais recorren-
bleia Legislativa de Minas Gerais. Floriano Bezerra de Araújo, di- tes onde a classe trabalhadora era
O requerimento da cassação foi as- rigente do Sindicato dos Salinei- mais numerosa ou organizada, isto
sinado pela unanimidade dos pre- ros de Macau e deputado estadual é, em grandes polos urbanos e in-
sentes, isto é, 69 parlamentares, con- pelo PTB do Rio Grande do Norte, dustriais como São Paulo e Rio de
siderando que havia dois ausentes. foi preso em 15 de abril de 1964. Janeiro. Do mesmo modo, nos Es-

Investigação Final.indd 194 25/11/14 18:16


195

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

tados de Pernambuco, Rio Grande verificar se já havia passagens an-


do Sul, Santa Catarina, Bahia e Mi- teriores na polícia.
nas Gerais, os quais contavam com No mês de maio de 1980, na re-
uma classe trabalhadora organiza- gião do ABC, mais de 150 mil tra-
da e mobilizada, além de uma vida balhadores promoveram um ato
política intensa, houve a prática de político no 1º de maio, apesar do
prisão em massa de seus trabalha- governo ter proibido a sua realiza-
dores militantes. Acompanhando a ção. A direção da greve estava pre-
prática de prisões massivas, tam- sa. A cidade de São Bernardo estava
bém era recorrente a prisão de li- tomada pela enorme concentração
deranças sindicais e de dirigentes de trabalhadores que afluíram tam-
de entidades de classe dos traba- bém de outras cidades. O clima de
lhadores, como o Comando Geral Comandante Paulo de Mello tensão era enorme. O aparelho de
dos Trabalhadores (CGT), além da Bastos da direção nacional repressão teve que recuar, em ra-
intervenção em seus sindicatos. do CGT. NA greve contra sua zão da firmeza dos trabalhadores,
demissão da Varig. A aviação
Na greve de 1968, em Osasco, brasileira parou. que não saíram das ruas, apesar de
de acordo com o então presiden- Acervo IIEP/Projeto Memória OSM-SP cercados pelas tropas. Não foi pos-
te do Sindicato dos Trabalhado- sível a repressão agir e, no meio
res Metalúrgicos da cidade, José do dia, o esquema policial foi des-
Ibrahim, detido na oportunidade, montado e a cidade foi tomada por
foram presos, aproximadamen- uma grande festa popular, reafir-
te, 600 trabalhadores. Os dirigen- terror no País e era mais fácil iden- mando a entrada na cena política
tes da greve dentro das fábricas tificar os que tentavam contestar dos trabalhadores organizados.
(Braseixos, Cobrasma, Lonaflex, politicamente o regime.
Brown-Boveri, Granada) ressal- A emergência das lutas dos tra- Prisões de
tam que toda a vanguarda da gre- balhadores e das greves operárias, lideranças
ve ficou maldita nas empresas da a partir de 1978, nos grandes cen- nacionais nos dias
região. João Batista Cândido, se- tros urbanos, foi tratada pelo re- do golpe
cretário-geral do sindicato durante gime militar com mecanismos de
a presidência de Ibrahim, lembrou repressão em massa. Usaram, de Já em 31 de março de 1964, a
ao menos 70 trabalhadores da Co- forma combinada, todas as insti- polícia do governador Carlos La-
brasma que ficaram sem qualquer tuições policiais e apoio dos servi- cerda invadiu a sede do Sindicato
perspectiva profissional na região. ços de inteligência das Forças Ar- dos Estivadores do Rio de Janeiro,
Em 1968, na histórica greve dos madas, quando não diretamente as prendendo a direção do Comando
metalúrgicos de Contagem, em tropas. Geral dos Trabalhadores – CGT.
Minas Gerais, centenas de operá- Em 1979, na greve dos meta- No entanto, os sindicalistas foram
rios foram presos, apesar de so- lúrgicos de São Paulo, foram pre- soltos por obra de um comando de
mente 64 prisões terem sido ofi- sos, ao todo, 346 trabalhadores. A militares da Aeronáutica, ainda fiel
cialmente reconhecidas. maioria das prisões foi executada ao governo de Jango, por meio do
A ditadura no período que vai pela ROTA – Rondas Ostensivas contato com o Comandante Paulo
do AI-5 até a emergência das gre- Tobias de Aguiar ou pela Tropa de de Mello Bastos. Com a consolida-
ves em 1968, tinha como estratégia Choque. Na estratégia de perse- ção do golpe civil-militar, a maior
a vigilância, o controle e a prisão guição política, os trabalhadores parte da diretoria do CGT ingres-
seletiva das lideranças dos traba- eram levados imediatamente para sa na vida clandestina para não ser
lhadores. Havia um ambiente de o DOPS, a fim de serem fichados e presa.

Investigação Final.indd 195 25/11/14 18:16


196

investigação operária

Investigação Final.indd 196 25/11/14 18:16


197

Capítulo 3
a aSSOCIaçãO aNTIOPERáRIa

CONCLUSÃO

C
om o golpe de 1964, os con- com delegados sindicais, presen- e assessores, conforme denun-
flitos entre o capital e o tra- ça nas articulações nacionais do ciam diversos operários e ope-
balho ganharam uma nova movimento sindical, apoiando e rárias que deram depoimentos
dimensão no Brasil, seja do pon- estimulando greves de todo tipo, nas oficinas regionais realizadas
to de vista estrutural – fim do re- desde as localizadas dentro das pelo projeto Memória Operária:
gime democrático, política de ar- fábricas até aquelas generaliza- contemos nossa história.
rocho salarial –, seja do ponto de das para toda a categoria, além Em suma, não bastasse a estru-
vista do cotidiano fabril. das greves gerais organizadas tura repressiva que os capitalistas
Nessa dimensão, o regime mi- por várias categorias. historicamente sempre montaram
litar permitiu o estabelecimento Na nova situação política pós- em suas fábricas, que facilitava
de novas formas de controle pa- 64, estruturou-se um regime fa- toda sorte de perseguição durante
tronal dos operários, a partir de bril em que a participação nas a ditadura patronal–militar, conta-
uma forte associação entre em- greves frequentemente acarretava ram com a fiel colaboração de di-
presários, agentes da repressão demissão por justa causa, prisão, rigentes sindicais delatores.
e interventores nos sindicatos. fichamento nas chamadas “listas
O que vimos até aqui foi a forma negras” das empresas ou mesmo 2 – PRESENça DE
como essa engenharia repressi- no DOPS, e, às vezes, desempre- POLICIaIS DENTRO Da
va se manifestou ao longo dos 20 go por meses e até anos. Tudo isso fábRICa:
anos de ditadura. com protagonismo dos interven- Outra característica da nova
Não que antes de 1964 o regime tores e, no caso aqui abordado, da realidade fabril foi o papel cum-
fabril fosse democrático ou ame- nova diretoria do Sindicato dos prido pelas polícias. Infiltração
no. A extensão do poder patronal, Metalúrgicos de São Paulo. Cabe no ambiente das fábricas, a pre-
dentro e fora do espaço fabril, po- então um pequeno resumo do que sença intimidatória nas portas e a
rém, era sem dúvida menor. Mes- vimos até agora. intervenção ostensiva em quais-
mo com os limites da estrutura quer conflitos foram constantes
sindical, os trabalhadores tinham 1 – REDE DE DELaTORES: em várias empresas e, de um jeito
condição, a partir da sua própria Parte essencial desse “regime ou de outro, perduram até hoje.
organização, de estabelecer me- fabril” era a rede de delatores. O
canismos de resistência. mecanismo funcionava antes de 3 – LISTaS DE
O Sindicato dos Metalúrgicos 1964, mas foi imensamente re- mILITaNTES quE NãO
foi um exemplo dos mais ilustra- forçado, ampliado, sofisticado PODIam aRRumaR
tivos dessa mudança. Como já e intensificado depois do golpe. EmPREgO:
vimos, possuía uma importância Passou a fazer parte do sistema Um terceiro elemento da en-
estratégica na luta de classes em a diretoria do Sindicato dos Me- genharia repressiva militares-
âmbito nacional. Antes do gol- talúrgicos de São Paulo, ou, pelo -patrões-pelegos eram as listas
pe, era uma entidade mobilizada, menos, alguns de seus membros negras, pelas quais as empresas

Investigação Final.indd 197 25/11/14 18:16


198

investigação operária

mapeavam o histórico de vida do ção. Enfim, a repressão buscou instituições democráticas, reali-
operário e com isso impediam o desmantelar essas organizações zava eleições, permitia a plurali-
militante de arrumar emprego. comunitárias. Muitos trabalhado- dade partidária, em um processo
res afirmam que suas casas foram que culminou na promulgação da
4 – RELaçãO DIRETa invadidas. Constituição de 1988. É preciso
DaS EmPRESaS Em que pese todo o aparato registrar que o capital e os partidos
COm a ESTRuTuRa repressivo montado pelas elites de direita em acordo com os mili-
REPRESSIVa DO dominantes do capital no Brasil, tares, fizeram de tudo para contro-
ESTaDO: em coligação com os militares, lar o processo de transição demo-
Por fim, o último elemento diversos órgãos públicos e com crática, mas os trabalhadores e as
deste esquema era a relação di- os pelegos, os trabalhadores ob- forças populares conseguiram im-
reta das empresas com os apa- tiveram muitas vitórias, levando portantes vitórias, como atestam
relhos de repressão, algo farta- a luta de classes constantemente os direitos sociais constitucionais.
mente relatado pelos operários a um patamar superior, se tornan- Não obstante essas vitórias, o
e que pôde ser confirmado nos do portanto uma força política capital não tardou em reorganizar
arquivos do DOPS. Em geral, as decisiva para o fim da ditadura. seu projeto, com o projeto neoli-
fábricas buscavam o chamado Outras vitórias podem ser con- beral, que desestruturou a classe
“atestado de bons antecedentes”, tadas, tais como as muitas Co- trabalhadora por meio dos pro-
para saber se o trabalhador que missões de Fábrica organizadas cessos de restruturação produti-
se candidatava à vaga já tinha so- pelos trabalhadores, propostas va, cuja principal consequência
frido algum processo político e, pela OSM-SP, que se generaliza- foram o desemprego estrutural
ao mesmo tempo, forneciam ao ram no ascenso das lutas no final e as privatizações, que diminu-
DOPS a documentação pedida dos anos 70. Na empresa Asama, íram o aparelho estatal e conse-
sobre algum trabalhador, desde os operários organizaram uma quentemente o sindicalismo dos
endereço até a função exercida. das Comissões de Fábrica mais funcionários públicos. Também
Vale ressaltar ainda que este or- representativas e exemplares do os pelegos se adaptaram aos no-
ganizado esquema de repressão movimento sindical paulista. vos tempos e, exatamente a par-
não se contentou em perseguir os Durante os anos 1980, os tra- tir do Sindicato dos Metalúrgicos
operários no seu local de trabalho. balhadores brasileiros já eram de São Paulo, nasceram o sindica-
Os militares sabiam que os bairros um fator determinante para a de- lismo de resultados e uma central
eram territórios da luta política da mocratização do país. A própria sindical com ideário neoliberal, a
esquerda e dos trabalhadores, que criação da Central Única dos Força Sindical.
articulavam vizinhos, familiares, Trabalhadores era um exemplo Mas essas são outras histó-
Igreja, o futebol, para aprofundar da força do movimento sindical, rias e infelizmente não podemos
a organização, combater o aumen- pois pela primeira vez na histó- aprofundar esses assuntos. O que
to do custo de vida, lutar por di- ria do Brasil uma central sindical importa aqui é que tenhamos
reitos como moradia e transpor- com representatividade nacional conseguido demonstrar a força
te. Muitas vezes um metalúrgico e em várias categorias foi organi- que a repressão usou contra ope-
acuado dentro da fábrica, que não zada, mesmo que isso fosse proi- rários metalúrgicos de São Pau-
se metia em conflitos com patrões bido pela estrutura sindical. lo, articulando empresários, mi-
para não perder o emprego, era A repressão propriamente dita litares e pelegos. E deixar claro
um cidadão engajado na sua rua, da ditadura militar foi diminuin- que a voz dos trabalhadores não
brigando por saneamento básico, do aos poucos, na medida em foi calada pelo violência, pelas
fazendo parte de alguma associa- que o Brasil restabelecia novas torturas e pelas demissões.

Investigação Final.indd 198 25/11/14 18:16


199

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

FONTES

O processo de construção da memória dos trabalhos


LEVI, Primo. La llave estrella. Barcelona: Muchnik Editores, 2001. Trad. Giuseppe La Barbera e Elias Stein. In: IIEP. No-
menclatura Nacional de Cursos. São Paulo: MIMEO, 2007.

A Ditadura Militar de 1964-1985: Contexto político e antecedentes históricos


AQUINO, Rubim Santos Leão de; VIEIRA, Fernando Antonio da Costa; AGOSTINHO, Carlos Gilberto Werneck; ROE-
DEL, Hiran. Sociedade brasileira: uma história através dos movimentos sociais. 4. ed. Rio de Janeiro: Record, 2001.
ALVES, Maria Helena Moreira. Estado e Oposição no Brasil (1964 – 1984). Petrópolis : Vozes, 1984.
BOHOSLAVSKY, Juan Pablo e TORELLY, Marcelo D. Cumplicidade financeira na ditadura brasileira: implicações atuais.
Revista Anistia Política e Justiça de Transição/Ministério da Justiça – N. 6 (jul./dez. 2011). Brasília: Ministério da Justiça,
2012.
BORTONE, Elaine de Almeida. O envolvimento do IPES nas relações entre o regime civil-militar e a sociedade. PPGAd/
UFF, 2012.
BRANDÃO, Gildo Marçal. A esquerda positiva : as duas almas do Partido Comunista - 1920-1964. São Paulo: Hucitec,
1997.
CAMPOS, Pedro Henrique Pedreira. A Ditadura dos Empreiteiros: As empresas nacionais de construção pesada, suas for-
mas associativas e o Estado ditatorial brasileiro (1964-1985). Tese de Doutorado (História social da Universidade Federal
Fluminense). Rio de Janeiro, Niterói: 2012. Disponível em: http://www.historia.uff.br/stricto/td/1370.pdf.
DREIFUSS, René Armand. 1964: A conquista do Estado: Ação política, poder e golpe de classe. 3ª ed. Petrópolis (RJ): Edi-
tora Vozes, 1981.
GIANNOTTI, Vito. História das lutas dos Trabalhadores no Brasil. Rio de Janeiro: Mauad X, 2007 (Capítulo 1 – linhas 123;
159; 198 e Capítulo 2 – página 10 – linha 306 – 20/12/2013).
IANNI, Octavio. A ditadura do grande capital. Rio de Janeiro : Civilização Brasileira, 1981.
LEAL, Murilo. A reinvenção da classe trabalhadora (1953 – 1964). Campinas : Unicamp, 2011.
MELO, Jorge José de. Boilesen, um empresário da ditadura: a questão do apoio do empresariado paulista à Oban/Operação
Bandeirantes, 1969-1971. Niterói, RJ, Brasil, 2012.
NEAGELI, Lucia Baère e MARTINS, Luciana. PCB: Oitenta Anos de Luta. Rio de Janeiro: Fundação Dinarco Reis, 2002.
SODRÉ, Nelson Werneck. Brasil: Radiografia de um modelo. Petrópolis : Vozes, 2ª. ed., 1975.
WEICHERT, Marlon Alberto. O Financiamento de Atos de Violação de Direitos Humanos por Empresas Durante a Ditadura
Brasileira: Responsabilidade e verdade. Acervo, Rio de Janeiro, v. 21, p. 181-190, jul/dez 2008.

O Sindicato, a Oposição e as Eleições


BATISTONI, Maria Rosângela. Confronto Operário: A Oposição Sindical Metalúrgica nas greves e nas comissões de fábrica
de São Paulo (1978-1980). São Paulo: IIEP, 2010.
COSTA, Edmilson. A política salarial no Brasil, 1964-1985: 21 anos de arrocho salarial e acumulação predatória. Boitem-
po Editorial, 1997.
GIANNOTTI, Vito e NETO, Sebastião. CUT: Por dentro e por fora. 2ª ed. Petrópolis (RJ): Editora Vozes, 1991.
FARIA, Hamilton José Barreto de. A experiência operária nos anos da resistência: A Oposição Sindical Metalúrgica de São
Paulo e a dinâmica do Movimento Operário (1964-1978), Dissertação de Mestrado, PUC/SP, 1986.

Investigação Final.indd 199 25/11/14 18:16


200

investigação operária

NOGUEIRA, Arnaldo José França Mazzei. A modernização conservadora do sindicalismo brasileiro: a experiência do Sin-
dicato dos Metalúrgicos de São Paulo. São Paulo: EDUC, 1997.
TELLES, Jover. O Movimento Sindical no Brasil. São Paulo: Livraria Editora Ciências Humanas, 1981.
Testemunhos:
Depoimento de Elias Stein ao Projeto Memória da OSM-SP, 2013.
Depoimento de Hélio Bombardi ao Projeto Memória da OSM-SP, 2012.
Depoimento de Vito Giannotti ao Projeto Memória da OSM-SP, 2012.
Depoimento de Waldemar Rossi ao Projeto Memória da OSM-SP, 2012.
Documentos
LAMPARINA. Informativo da Corrente Sindical. “Lavradores Unidos” – nº10, fevereiro de 1980. Acervo CPV.
Jornal “O Metalúrgico” do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo. Dezembro de 1963 – Centro de Memória Sindical.

A Aliança Anti-operária
O empresariado e a repressão
CHAVES, Marcelo Antônio. A trajetória do Departamento estadual do Trabalho e Mediação das Relações de Trabalho (1911-
1937). São Paulo: LTr, 2012.
FLORINDO, Marcos Tarcísio. O serviço reservado da Delegacia de Ordem Política e Social de São Paulo na Era Vargas. São
Paulo: Editora Unesp, 2006.
SOUZA, Percival de. Autópsia do medo: vida e morte do delegado Sérgio Paranhos Fleury. Editora Globo, 2000.
Documentos do Fundo DOPS/Arquivo Público do Estado de São Paulo
Bardella: Prontuário OS 109391 e OS 108070– Ordem Política
Bristan: 43-Z-0 4570
Fábrica de Rolamentos Schaeffler: 50-Z-9 38086
Fundição Brasil: 50-B-58 2593
Informe do Sérgio Paranhos Fleury para Romeu Tuma sobre apreensão de material da Oposição: OS 291 P14
Mapri: Prontuário 112486 – Ordem Política
Meridional SA Comércio e Indústria: 50-B-58 2901
Monark: OS 1180
Prontuário 108070 – Ordem Política
Relatório de agente do DOPS: 50-B-58 1890, 50-B-58 2901, 50-B-58 2899 e OS 291 P14 8641
Relatórios sobre a situação das fábricas durante as greves (1978, 1979 e 1980): 50-B-58 2650, 43-Z-0 4573, 43-Z0 4592
e 43-Z-0 4614
Scripelliti: 50-B-58 1890
Tecnoforjas: 43-Z-0 5115, 43-Z-0 5113 e 43-Z-0 5114
Tecnolix SA: 50-Z-129 15341
Outras fontes:
APSA (Associação dos Administradores de Pessoal de Santo Amaro): Depoimento Terezinha Bispo, ao Projeto Memória
da OSM-SP, maio de 2012.
Sprecher Schuh: Acervo CPV

Box “A relação promíscua entre o empresariado e a repressão política” Ivan Seixas


“O elo da Fiesp com o porão da ditadura.” Reportagem de José Cassado e Chico Otávio no jornal O Globo, publicada em 09 de
março de 2013.
Livro de registro de entrada e saída do DOPS. Fundo DOPS /Arquivo Público do Estado de São Paulo.

A Fábrica de Mortos
Testemunhos:
Depoimento de Absolon Gaspar ao Projeto Memória da OSM-SP, 23 de junho de 2012 – Oficina Investigação Operária Sudeste.
Depoimento de Anízio Batista ao Projeto Memória da OSM-SP, 23 de junho de 2012 – Oficina Investigação Operária.

Investigação Final.indd 200 25/11/14 18:16


201

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

Depoimento de José Felix, Zezinho, ao Projeto Memória da OSM-SP, 23 de junho de 2012 – Oficina Investigação Operária Sudeste.
Depoimento de Raimundo Perillat ao Projeto Memória da OSM-SP, 23 de junho de 2012 – Oficina Investigação Operária.
Documentos do Fundo DOPS /Arquivo Público do Estado de São Paulo
Relatório do DOPS: 50-B-58-2899.

Tecnoforjas: Empresa, DOPS, Tuma


Depoimento de Albino Barzi ao Projeto Memória da OSM-SP, 11 de agosto de 2012.
Documentos do Fundo DOPS/Arquivo Público do Estado de São Paulo
Ficha de registro de empregados: Documento 43-Z-0 5112 e 43-Z-0 5115.
Relatório do DOPS sobre greve na Tecnoforjas: 43-Z-0 5115.
Outras fontes:
Operários pedem apoio à população: Acervo CPV-SP.
Repórter do República comprova a relação empresa/DOPS: Acervo IIEP/Projeto Memória OSM-SP.

Nem todos colaboraram


Leo Marconi
Depoimento de Leo Marconi ao Projeto Memória da OSM-SP, março de 2014.
Depoimento de Zico ao Projeto Memória da OSM-SP, 22 de outubro de 2012.
Jacques Breyton
Contribuição de Malu Ferreira.
Contribuição de Ariane Breyton.

O Sindicalismo a serviço de dois senhores: o Estado e o patrão.


DREIFUSS, René Armand. 1964: A conquista do Estado: Ação política, poder e golpe de classe. 3ª ed. Petrópolis (RJ): Edi-
tora Vozes, 1981. (Citação sobre o golpe de 1964).
FARIA, Hamilton José Barreto de. A experiência operária nos anos da resistência: A Oposição Sindical Metalúrgica de São
Paulo e a dinâmica do Movimento Operário (1964-1978), Dissertação de Mestrado, PUC/SP, 1986. (Citação sobre os dele-
gados sindicais).
FELICISSIMO, José Roberto. A Organização Para-Sindical no Brasil – Notas para um Estudo. São Paulo: MIMEO, 1977.
(Citação sobre os Círculos Operários).
LEAL, Murilo. A reinvenção da classe trabalhadora. Campinas: Editora da Unicamp, 2011.
MARTINS, Heloisa Helena Teixeira de Souza. O Estado e a Burocratização do Sindicato no Brasil. Ed. Hucitec: São Paulo,
1979.
NEGRO, Antonio Luigi. Linhas de montagem: o industrialismo nacional-desenvolvimentista e a sindicalização dos trabalha-
dores, 1945-1978. São Paulo: Boitempo, 2004.
FILME: Braços Cruzados, Máquinas Paradas. Direção: Sérgio Toledo e Roberto Gervitz. Documentário, 1979.
Testemunhos:
Depoimento de Absolon Gaspar ao Projeto Memória da OSM-SP, 11 de fevereiro de 2012.
Depoimento de Albino Barzi ao Projeto Memória da OSM-SP, 11 de agosto de 2012.
Depoimento de Anízio Batista ao Projeto Memória da OSM-SP, 2012.
Depoimento de Chico Gordo ao Projeto Memória da OSM-SP, 2012.
Depoimento de Cloves de Castro ao Projeto Memória da OSM-SP, novembro de 2013.
Depoimento de Fernando do Ó Veloso ao Projeto Memória da OSM-SP, 12 de maio de 2012.
Depoimento de José Felix, o Zezinho, ao Projeto Memória da OSM-SP, 11 de fevereiro de 2012.
Depoimento de José Lima Soares ao Projeto Memória da OSM-SP, 2008.
Depoimento de Vicente Garcia Ruiz, o Espanhol ao Projeto Memória/OSM-SP, 12 de maio de 2012.
Depoimento de Vito Giannotti ao Projeto Memória da OSM-SP, 2012.
Depoimento de Waldemar Rossi ao Projeto Memória da OSM-SP, 2009.
Documentos do Fundo DOPS/Arquivo Público do Estado de São Paulo

Investigação Final.indd 201 25/11/14 18:16


202

investigação operária

Comunicação José Maria Vicentino para Romeu Tuma: OS 291 P14


Fábrica Santa Clara: 50-B-58 1872
Panfleto da Chapa 3 de 1978: 50-B-58 2537
Pedido de impugnação da eleição de 1978 de Miguel Tadeu de Carvalho e Ademar Costa Neto: OS 291 P14
Relatório de agente do DOPS: 50-B-58 1989 e 50-B-58-1932 (páginas 1 e 2)
Relatório sobre a eleição sindical de 1978: 50-B-58 2506 e 50-B-58 2504

“Caiu a coordenação da Oposição...”


Depoimento de Adílio Roque ao Projeto Memória da OSM-SP, 21 de outubro de 2013.
Depoimento de Elias Stein ao Projeto Memória da OSM-SP, 2013.
Depoimento de Vito Giannotti ao Projeto Memória da OSM-SP, 7 de novembro de 2007.
Depoimento de Waldemar Rossi ao Projeto Memória da OSM-SP, 2009.
Documentos do Fundo DOPS /Arquivo Público do Estado de São Paulo
Prontuário Elias Stein: OS 1411
Prontuário Waldemar Rossi: OS
Prontuário Vito Giannotti: OS 1882

A Oposição Sindical no exílio aos olhos da repressão


NASCIMENTO, Cláudio. A oposição sindical no exílio. ensaio sobre fontes da autogestão no Brasil. Disponível em http://clau-
dioautogestao.com.br/wp-content/uploads/2014/04/A-OPOSI%C3%87%C3%83O-SINDICAL-NO-EX%C3%8DLIO.pdf.
Acessado em 18 de outubro de 2014.
Documentos do Fundo DOPS /Arquivo Público do Estado de São Paulo
Relatório sobre Roque Aparecido da Silva, Oswaldo Mendes e Sergio de Carvalho Alli: OS 290-9.13-a.
Termo de declarações de Helio Bombardi (29/10/1979): 43-Z-0 fl. 5199, 5198, 5197.

Greves: das prisões seletivas à repressão em massa


LEAL, Murilo. A reinvenção da classe trabalhadora. Campinas: Editora da Unicamp, 2011.
Testemunhos:
Depoimento de Albino Barzi ao Projeto Memória da OSM-SP, 2012.
Depoimento de Hélio Bombardi ao Projeto Memória da OSM-SP, 2012.
Depoimento de Jorge Luiz dos Santos ao Projeto Memória da OSM-SP, 2012.
Depoimento de Salvador Pires ao Projeto Memória da OSM-SP, 2012.
Depoimento de Sofia Dias Batista ao Projeto Memória da OSM-SP, 2012.
Documentos do Fundo DOPS /Arquivo Público do Estado de São Paulo
Lista dos presos na greve de 1979: 20-C-44 7029 a 6998

Nossas bravas mulheres


Depoimento de Ana Dias ao Projeto Memória da OSM-SP, janeiro de 2012.
Depoimento de Arlete Neves Martins ao Projeto Memória da OSM-SP, 2012.
Depoimento de Delmira Isabel de Jesus ao Projeto Memória da OSM-SP, 2012.
Depoimento de Maria José Soares ao Projeto Memória da OSM-SP, 2012.
Depoimento de Sofia Dias Batista ao Projeto Memória da OSM-SP, 2012.
Informe do SNI sobre Sofia Dias Batista: Informe 2986 119 /ASP/SNI. Fonte: Arquivo Nacional

A ação do II Exército no “Encontro dos trabalhadores com o Papa”


Depoimento de Waldemar Rossi ao Projeto Memória da OSM-SP, 2007.

Operários no parlamento
Eustáquio Vital Nolasco

Investigação Final.indd 202 25/11/14 18:16


203

Capítulo 3
A ASSOCIAÇÃO ANTIOPERÁRIA

Repressão e direito à resistência: os comunistas na luta contra a Ditadura (1964-1985). São Paulo: Anita Garibaldi, coedição
com a Fundação Maurício Grabois, 2013.
Revista Oposição Metalúrgica: os militantes de A a Z. Memória em imagens. Publicação: Associação Projeto Memória da
Oposição Sindical Metalúrgica de São Paulo. Apoio: IIEP – Intercâmbio, Informações, Estudos e Pesquisas.
Testemunhos:
Depoimento de Eustáquio Vital Nolasco ao Projeto Memória da OSM-SP, 05 de novembro de 2013.
Aurélio Peres
Repressão e direito à resistência: os comunistas na luta contra a Ditadura (1964-1985). São Paulo: Anita Garibaldi, coedição
com a Fundação Maurício Grabois, 2013.
Entrevista concedida por Aurélio Peres a Mariana Viel, publicada em 14 de janeiro de 2011 no Portal Vermelho. Disponível
em http://www.vermelho.org.br/noticia/145476. Acessado em 15 de outubro de 2014.
Chico Gordo
Depoimento de Chico Gordo ao Projeto Memória da OSM-SP, 05 de novembro de 2013.
Anizio Batista
Depoimento de Anízio Batista ao Projeto Memória da OSM-SP, 05 de novembro de 2013.

Nossos mortos
Olavo Hanssen
LEAL, Murilo. Olavo Hanssen: uma vida em desafio. 1ª ed., São Paulo: Cultura Acadêmica, 2013.
Boletim Especial Olavo Hanssen. São Paulo, maio de 2013. IIEP e Projeto Memória OSM-SP.
O Metalúrgico (jornal do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo), nº232, abr./mai. 1970.
Direito à Memória e à Verdade. Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos.. Secretaria Especial de Direitos
Humanos, 2007.
Inquérito da Secretaria de Segurança. Folhas 112 e 113.
Luiz Hirata
ANDRADE, Antonio Prado de. Um tempo para não esquecer: Ditadura: Anos de Chumbo. Rio de Janeiro: NPC Piratininga
Cursos Livres e Editora Ltda, 2014.
Laudo Necroscópico. 50-Z-9 22948. Documento do DOPS/APESP.
Manoel Fiel Filho
LUPPI, Carlos Alberto. Manoel Fiel Filho. Quem vai pagar por esse crime? São Paulo: Editora Escrita, 1980.
FILME: Perdão Mister Fiel. Direção: Jorge Oliveira. Co-direção: Pedro Zoca. Brasília. 95 min. Documentário, 2009.
Santo Dias da Silva
ROCHA, Guilherme Salgado. Construtores da Justiça e da Paz: Santo Dias da Silva. São Paulo: Salesiana Dom Bosco, 1996.
DIAS, Luciana; AZEVEDO, Jô e BENEDICTO, Nair. Santo Dias: quando o passado se transforma em História. São Paulo:
Cortez Editora, 2004.
Dossiê de fotos sobre a greve de 1979 e a morte de Santo Dias: 50-B-58 2698 a 2672, Documentos do DOPS/APESP.

Massacres, torturas e prisões: o terror em todo o país


TELLES, Jover. O Movimento Sindical no Brasil. São Paulo: Livraria Editora Ciências Humanas, 1981.
FILME: Conterrâneos Velhos de Guerra, Dir.: Vladimir Carvalho. Documentário, 1990, 175 min.
“A repressão aos trabalhadores e ao movimento sindical em Nova Lima/Raposos.” Pesquisa da CSB apresentada ao GT 13 da
CNV, realizada por José Carlos Quintino sob a coordenação de Alvaro Egea.
“Guerras desconhecidas do Brasil: histórias de um país sem memórias” Reportagem de Leonencio Nossa (textos) e Celso Jú-
nior (fotos) publicada no jornal O Estado de São Paulo em 19 de dezembro de 2012.
OLIVA, Aloízio Mercadante (coord.) Imagens da luta: 1905/1985. São Bernardo do Campo: Sindicato dos Trabalhadores nas
Industrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico, 1987.

Investigação Final.indd 203 25/11/14 18:16


204

investigação operária

FERNANDES, Edvaldo (org.) Massacre de Ipatinga: quadro a quadro. Brasília: Ministério da Justiça, Comissão de Anistia,
2013.
SOUSA, Nair Heloisa Bicalho de. “Massacre da Pacheco Fernandes Dantas em 1959: Memória dos trabalhadores da constru-
ção civil de Brasília.” Disponível em http://unb.revistaintercambio.net.br/24h/pessoa/temp/anexo/1/1251/2053.pdf. Acessa-
do em 12 de agosto de 2014.
PAULA, Hilda Rezende e CAMPOS, Nilo de Araújo (orgs.). Clodesmidt Riani: Trajetória. Juiz de Fora (MG) : FUNALFA
Edições, 2005.
KOTSCHO, Ricardo. Serra Pelada. Uma ferida aberta na selva. São Paulo: Editora Brasiliense, 1984.
Documentos do Fundo DOPS /Arquivo Público do Estado de São Paulo
Fichas da prisão da família Prado de Andrade: 50-Z-009. Documentos do DOPS/APESP.

Investigação Final.indd 204 25/11/14 18:16

También podría gustarte