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LINDONÉIA

#02

Sobre ser
um crítico
Antonio Marcos Pereira

Há algum tempo me dei conta de que não conhecia textos


publicados aqui no Brasil que falassem sobre ser um crítico. Como
funciona esse trabalho? Como alguém se forma para executar esse
trabalho? Como um crítico é remunerado? Como se diferencia a
qualidade desse trabalho? Qual pode ser o plano de carreira de um
crítico? Encontrei discussões de outra ordem – sobre o problema
do valor estético, sobre definições concorrentes de crítica – mas
nada cujo foco estivesse em uma dimensão mais ordinária, mas
que também tinha sua importância. Afinal, ninguém negaria
que a crítica, além de ser uma dimensão do pensamento, é um
exercício profissional: pessoas são contratadas e remuneradas
como prestadoras de serviços especializados nessa capacidade,
e respondem por ela na condição de autores de material para
publicação, compiladores, jurados de concursos e avaliadores
de propostas concorrentes a recursos distribuídos por editais
públicos. Se tudo isso ocorre, esse exercício também pode
ser descrito, analisado, comparado, debatido a partir de suas
condições factuais de execução. Mas aí, curiosamente, ninguém
parece querer meter a mão1 .
1. No mundo anglófono a situação é algo diferente: publicações como o livro organizado por H. Aram
Veeser, Confessions of the Critics (New York: Routledge, 1996) e o conjunto de extensas entrevistas
realizadas por Jeffrey J. Williams, Critics at work (New York: New York University Press, 2004)
possibilitam uma retratação do exercício profissional dos críticos nos Estados Unidos que, embora

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precise de alguma atualização e de dar conta também daqueles que ocupam lugares menores
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Podemos levantar várias hipóteses sobre as razões disso. Uma seria um apontamento relativamente breve, parte dos apêndices que
que o exercício crítico, embora seja exercício profissional, não dá acompanham o diário que Eno escreveu durante o ano de 1995 –
cobertor para ninguém, e bem poucos, aqui no Brasil, sobrevivem Eno busca distinguir duas dimensões da atividade artística, uma
exclusivamente dele. Meu caso é típico: sou professor e crítico interna e uma externa, um “dentro” e um “fora”:
literário, e malgrado o prestígio talvez mais aparente do trabalho
como crítico, é o labor docente que responde não só pela carga de Trabalhar dentro é lidar com as condições internas do
trabalho maior, mas também pela remuneração mais relevante. trabalho – as melodias, os ritmos, as texturas, as letras,
Embora eu possa confirmar isso em meu círculo próximo de as imagens: todas as coisas normais e cotidianas que
relacionamentos – no qual todos os críticos são ou jornalistas, imaginamos que um artista faz.Trabalhar fora é lidar
com o mundo que circunda o trabalho – os pensamentos,
ou professores, ou alguma outra coisa além de críticos literários
premissas, expectativas, lendas, histórias, estruturas
– não tenho certeza quanto à impossibilidade, ou inexistência, econômicas, respostas críticas, questões legais e assim por
de um crítico tout court em exercício no Brasil: não tive acesso a diante. Você pode considerar que essas coisas são a moldura,
nenhum recenseamento do trabalho e de suas condições, e creio o enquadramento do trabalho.4
mesmo que ainda não existe tal coisa. Indico isso apenas para
reafirmar minha crença de que a profissionalidade existe, mas Essa distinção, rudimentar e didática, é proposta apenas para
sua fisionomia é invisível ou, na melhor das hipóteses, muito ser problematizada por Eno: é sugerida como algo que se
imprecisa e vaga entre nós. conforma ao nosso entendimento tradicional das dimensões do
trabalho artístico, implicando em um conjunto de operações que
Tenho me esforçado para operar contra esse caráter enevoado da constituiriam a fatura da arte de fato, seu núcleo, e outro conjunto
coisa procurando escrever a respeito de minha própria trajetória que estaria à periferia, secundário, posterior. Uma coisa é a arte
como crítico, para ver se o comentário a respeito do que escrevi pra valer, e a outra já é parte das consequências ou efeitos da arte
diz se o que teve lugar comigo é paradigmático ou eventual. Em pra valer que foi feita. O texto prossegue encaminhando questões
um texto anterior 2, comentei o que me parecia ser um momento em sequência, sugerindo a existência de trabalhos que “são quase
esquecido porém importante, que é o momento em que emerge que só enquadramento, o que quer dizer que quase todo seu
o desejo de ser crítico, em que você acolhe o desejo de ocupar o poder deriva daquilo que pode ser dito a respeito deles, daquilo
lugar de comentador da cultura a partir de um viés particular. que pode ser colocado em conexão com eles” (p.374), e apresenta
Tentei elaborar algo em torno desse tema aludindo à tradição como exemplo disso o conto de Borges, “Pierre Menard, Autor do
do Romance de Formação e à história, conhecida, de formação Quixote”.
profissional de Lévi-Strauss (que dizia ter se tornado etnólogo
graças a um telefonema). Relendo esse texto de Eno recentemente, pensei se havia um
paralelo possível entre o que ele elabora e o trabalho do crítico.
Esse tipo de preocupação me aproximou de um texto de Brian Qual seria a distribuição tradicional de interno e externo para o
Eno, intitulado “Sobre ser um artista” 3. Nesse texto – na verdade, trabalho do crítico? O que está “dentro” e o que está “fora”? Tentei
na hierarquia da crítica, parece muito mais detalhado do que o que se poderia produzir no caso
brasileiro. 4. m A year with swollen appendices (London: Faber and Faber, 1996, (p. 373, tradução minha)
2. O texto é “Eu era um crítico juvenil”, e foi publicado na coletânea organizada por Milena Britto
de Queiroz, Leituras possíveis nas frestas do cotidiano (Salvador: FUNCEB, 2012, p. 29-43).
3. Em A year with swollen appendices (London: Faber and Faber, 1996, p. 373-374).

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várias alternativas, mas não consegui ir adiante. Consegui, seu sangue para a sobrevivência da forma parasitária. Pendurado
todavia, recuperar um episódio esquecido que parecia ter uma na Praça Sete, em seu conhecido obelisco, um ready made não
conexão oportuna com essa discussão. produziria nada – mas a Mona Lisa produziria, insinuava Naves,
um “Ohhh!”, ou alguma forma de encontro com o extraordinário,
Quando eu estava fazendo o doutorado, por volta de 2004, vi do qual ela mesma seria uma instância.
uma conferência do critico de arte Rodrigo Naves, na Escola
Guignard: ele era o convidado especial de um evento que a Escola Essa classificação me incomodou muitíssimo à época, me pareceu
tinha promovido, e fez a conferência de encerramento. Não injusta e equivocada. Tive muita vontade de fazer uma pergunta,
lembro de muitos detalhes: quem foi o professor ou professora propor um questionamento ao final – pois me parecia que há, sem
que o apresentou, como ele introduziu os problemas, como os dúvida, diferenças entre o urinol de Duchamp e um quadro de Da
desenvolveu, exatamente que temas explorou e que obras exibiu Vinci, mas talvez a coisa não seja tão simples assim. Ou, talvez,
e comentou. Mas lembro de alguns detalhes muito vividamente: o custo maior da simplificação seja um certo embotamento de
como o auditório estava lotado, e a veemência com que ele nossa capacidade de discriminação sutil, que é o que os leigos
conduziu a fala para uma peroração que era de fato um clímax, chamam de sensibilidade e que, supostamente, é algo que deveria
um ponto polêmico que se transformava no ápice do argumento ser apreciado e cultivado por nós, interessados em Arte. É bem
de tal maneira que é quase apenas disso que me lembro com possível, pensava eu, imaginando as obras lançadas na Praça Sete,
clareza. Obviamente não lembro exatamente do que ele disse, que Da Vinci fosse muito ignorado também. Mesmo nos casos em
e não posso citar nada verbatim. Mas, por mais que a memória que fosse reconhecido, tal não se deveria a qualquer imanência da
seja errática e falha, confio nela agora, e lembro que ele disse obra que – digamos, apelando um pouco – exsudaria um aroma
algo como “Leonardo Da Vinci, deixado na Praça Sete, sobrevive; sedutor, capaz de capturar e reconduzir a atenção dos passantes.
Duchamp, não”. A Praça Sete, uma espécie de núcleo do centro de As pessoas que reconhecessem Da Vinci o fariam por força de
Belo Horizonte, com seu obelisco e suas várias faixas, pedestres, educação, instrução, desenvolvimento de um jeito de prestar
carros, ônibus e o frenesi gasto característico do centro velho das atenção que resulta na rotulação daquilo como Arte, e arte de
cidades grandes: imaginei a Mona Lisa na Praça Sete, e imaginei um tipo em particular: esse tipo, que grafamos em maiúsculas,
lá também o Urinol de R. Mutt. e diante do qual dizemos “Ohhh!”. Pela mesma via, observar um
ready made como Arte, do mesmo jeito que se observaria uma tela
É claro que com isso Naves queria produzir uma taxonomia que de Da Vinci – ora, não era isso mesmo que se buscava pôr em xeque
era também uma hierarquia. Da Vinci, na visão dele, funcionaria com o ready made? Nesse sentido, se o ready made fosse ignorado
“fora” do mundo da Arte, pois o que ele produziu era mobilizado na praça, tudo estava correto e de acordo com o programado –
e mobilizava algo que não era parasítico com relação a um espaço pois não me parece que fosse o caso tampouco de contemplá-los
expositivo em particular, ou a condições preparadas de modulação lá no museu: um urinol, uma pá.
da atenção como as que a gente encontra nos locais em que a
Arte justifica a instituição que a abriga. Nesse sentido, Duchamp Provavelmente Naves percebia a complexidade da coisa – antes
era o primo pobre e espertinho, que inventou uma traquinagem de meu nascimento o homem já estava embrenhado com crítica
vampira, cujo funcionamento dependia totalmente do sistema de Arte, e há um sedimento de reflexão e autocrítica quase
da Arte que, por sua vez, construído por Arte maiúscula como a garantido, sustentando o que ele fazia na conferência, incluindo
produzida por Da Vinci, poderia eventualmente fornecer algo do aí a peroração bombástica que tanto me incomodou. Eu queria
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debater, o que quer dizer que queria expor meu incômodo, ouvir uma interpelação dirigida ao crítico mais velho, colocaria agora
mais a respeito, alcançar algum esclarecimento e, com isso, sair a questão, nem que fosse obliquamente, operando a partir da
da perplexidade desagradada em que me encontrava – mas era o longevidade do problema para mim. O que havia ali, no que Naves
momento final da conferência e do evento, era a hora de muitos propunha, que poderia ser acoplado à distinção proposta por Eno
aplausos e eu, temeroso e estudantil, me contive. para ser, depois, devidamente implodido, como Eno faz em seu
texto? Onde estava o cerne contraditório, o pulso de ambivalência
Silenciei, os dias passaram, os anos passaram, e o incidente daquilo que eu recordava ter sido dito por Naves mas que depois,
retornou agora justamente porque eu desejava comentar o que tantas vezes, reapareceu para mim? E, por esse vai e vem do
Eno tinha escrito sobre artistas, produzindo um paralelo com pensamento, e talvez pela força do significante “moldura”, que
os críticos. Se, há dez anos, não tive condições de responder ao
que me incomodava, e traduzir esse incômodo sob a forma de

aparece no texto de Eno, lembrei de um trabalho de Mark Tansey. FIG. 02. O mito da
profundidade
Tansey já gerou fortuna crítica abundante ; seu trabalho convida
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isso como poucos. Seus quadros parecem sempre aludir ou


comentar algum incidente da história da arte ou da crítica; seu
realismo é marcado pelo uso de clichês de fantasia e pela lógica da
ilustração dedicada a produzir comentários a respeito de Barthes,
Derrida, Greenberg, o estruturalismo e suas consequências e
5. Cito apenas dois casos: um, que de certa forma se transformou na referência incontornável sobre
FIG. 1. Mark Tansey,
Tansey, é o livro de Arthur C. Danto, Mark Tansey: Visions and Revisions (New York: Henry Abrams,
Descartando a moldura. 1992); outro, que é uma tentativa mais recente, e mais explícita, de explorar as conexões entre os
trabalhos de Tansey e o pensamento pós-estruturalista, é o livro de Mark C. Taylor, The picture in
question: Mark Tansey and the ends of representation (Chicago: The University of Chicago Press,
1999).

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outros temas do mesmo pacote. de Arte são realizados com meios da Arte que é, por sua vez, parte
Vemos esses personagens, do comentário, em um mise en abyme que complica enormemente
habitantes do nosso repertório a tarefa de alguém que, como é meu caso neste momento, quer
histórico e crítico, aludidos produzir um comentário ligeiro a seu respeito. No trabalho em
nos títulos, aparecendo nos que Greenberg aparece, a mensagem se insinua claramente:
quadros, em situações que Pollock é capaz de operar milagres, e Greenberg aponta para esse
são insólitas e enigmáticas e, fato, dirigindo o olhar dos outros artistas para o feito excepcional;
simultaneamente, cristalinas. o título, “Mito da profundidade”, parece apenas reiterar o que
Em “O mito da profundidade”, sabemos a respeito de um núcleo de valorização da obra de
de 1984, vemos um barquinho Pollock por Greenberg, que forja uma noção de “superfície” e a
salva-vidas cheio de gente no propõe como um mérito e conquista do Expressionismo Abstrato
meio do oceano. No barquinho e da obra de Pollock em particular. Há, claro, um setor enigmático
estão Rothko, Motherwell, no barquinho e seu arranjo peculiar, um coletivo formado por um
Frankenthaler e Arshile Gorky crítico e alguns artistas. Gorky e Frankenthaler? O que os explica
e, inconfundível, Greenberg, ali? E Rothko?
que, com o dedo em riste,
aponta para uma figura Coisa semelhante ocorre com “Derrida interroga DeMan”, pois
andando miraculosamente tudo parece se oferecer à interpretação de maneira cristalina.
sobre as águas: é, obviamente, Assim, lembramos das complexas relações entre os dois críticos
Pollock. Em “Derrida interroga e teóricos, e dos impasses de afiliação e parceria que emergem
DeMan”, de 1990, há dois a reboque da revelação do passado anti-semita de DeMan. A
homens, num enclave entre ambiguidade do envolvimento dos personagens parece traduzir
as montanhas, em uma precisamente isso, essa indecidibilidade entre dança e luta entre
situação precária e indecidível. os dois. Por sua vez, as montanhas feitas de texto são alusão óbvia
Como chegaram ali? Estão se ao famoso “Não há nada fora do texto”, de Derrida. Perdura como
atracando? Estão dançando? problema a relação evidente entre o trabalho de Tansey e uma
Estão à beira de um precipício, ilustração de Sidney Paget, de 1893, que representa o momento
e um exame mais cuidadoso final de conflito entre Sherlock Holmes e seu arquirrival, o
FIG. 03 .
revela que as montanhas são, aparentemente, feitas de texto, Professor Moriarty: quem, no jogo entre Derrida e DeMan, é
Derrida interroga de
Man camadas e camadas de texto, texto sedimentado e compactado análogo a Holmes? Seria o caso de determinar e discriminar
formando tudo que há ali como sustentáculo do que quer que precisamente a antinomia moral vitoriana, expressa na relação
estejam fazendo os protagonistas. de Holmes com seu rival, na relação entre os críticos? Isso não
seria perder de vista a pergunta, o interrogar presente no título
Esses trabalhos são uma espécie de Gaia Ciência do comentário mesmo da obra?
sobre a Arte: há jogo e provocação mesclados à erudição, que ao
mesmo tempo aparece como um saber enciclopédico, consistente, O trabalho do qual recordei em particular – enquanto pensava sobre
incisivo e jocoso. Os “comentários” de Tansey à história e à crítica como comentar o fato de ter lembrado da conferência de Naves
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enquanto comentava a distinção de Eno sobre possibilidades trabalho que não seja, de fato, moldura?” Seja arte, seja crítica –
do trabalho do artista e sua eventual correlação com o trabalho como responder a essa questão?
do crítico – não foge dessa possibilidade de implicação didática.
Intitulado “Descartando a moldura”, nele vemos duas figuras Mas talvez não seja esse o caso: talvez esse investimento – voltado
na entrada de uma caverna: água flui com força para dentro para investigar os paralelos entre o que ocorreu comigo naquela
do precipício aberto na pedra, e à beira desse precipício vemos conferência e o que penso sobre o tema a partir do trabalho de Eno
duas figuras. A cena como um todo parece reprisar o programa e Tansey – resulte apenas na redução de uma potência ambígua
didático do platonismo no célebre Mito da Caverna: a caverna que está na tela, em sua alusão ostensiva à uma narrativa mítica,
profunda, sujeitos postados à entrada, sombras projetadas na fundadora, de oposição entre Realidade e Aparência, e que está
parede, nosso ponto de vista ligeiramente deslocado no fundo da também na situação que vivi, em sua conexão patente com duas
caverna. Os dois homens parecem ter feito um enorme esforço escolas de compreensão da Arte e da, digamos, experiência
para se desvencilhar da moldura, imensa, vazia, que acabaram de estética. Talvez, penso hoje, o mais interessante, do ponto de
lançar nesse abismo escuro: está solta, no ar ainda, mal começou vista da crítica e seu exercício, fosse justamente se esquivar da
sua trajetória de declínio. Mas na sombra que projetam na parede estruturação unilateral da resposta, recusar a escolha de um lado
da caverna o que vemos é um amálgama dos dois, uma entidade do problema, e acolher alguma forma de ambivalência não como
monstruosa e tentacular, e é como se ambos estivessem, ainda, malefício, mas como força. Se faço isso, então o que eu faço não
nessa aparição metamorfoseada, aferrados à moldura. é mais, nem menos, que recuperar algo da experiência e buscar
o que faz com que aquilo tenha sentido, e o que permite que tal
Como explorar ponto a ponto a extensão da semelhança entre o sentido seja comunicado – e se isso não é fazer crítica, não aprendi
que vejo no quadro de Tansey e o que me parecia estar em jogo na ainda o que é. *
situação em ouvi o Naves advogando o “descartar da moldura” de
Da Vinci e Duchamp? Não me esqueço da veemência de Naves,
e me pergunto hoje sobre o sustentáculo daquela necessidade,
de conferir ênfase, de amparar o desempenho, enquanto
conferencista, no traço forte e na ponta seca de uma oposição
polar. Ao mesmo tempo, não esqueço minhas fragilidades,
dificuldades e incompetências à época, tão disponíveis à
lembrança quanto a voz de Naves se elevando ao final ao falar de
“Leonardo”. Poderia, imagino, dizer que nessa tela de Tansey eu
era um personagem e ele, outro, e que, no jogo que poderíamos
ter praticado caso tivéssemos interagido naquele evento em
2004, teríamos certamente nos dissipado nessa sombra residual
e enigmática, sem rosto ou assinatura, conformada pela moldura
que constituía o próprio pomo da discórdia. Isso, por sua vez,
me faria retornar ao trabalho de Eno, e à sua questão final, seu
arremate entre jogar a toalha e lançar o problema para outro
patamar resumindo tudo na pergunta “Será que há algo em um
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