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FARACO, C. A., VIEIRA, F. E. Gramáticas brasileiras: com a palavra, os leitores. 1. ed.

São Paulo:
Parábola Editorial, 2016.

Os meus grifos estão em negrito; os do autor, em itálico.

PÁGINA CITAÇÃO
Capítulo 1 – “[...] o fazer gramatical no século XXI aponta para um deslocamento do lugar-
Gramatização comum do qual caçoa Fradique (1928). Os instrumentos gramaticais que resultam
brasileira do processo de gramatização emergente na linguística brasileira contemporânea
contemporânea do pretendem, a partir de novas diretrizes epistemológicas, gramatizar a língua falada
português: novos e/ou escrita no Brasil atual, o assim chamado português brasileiro, português do
paradigmas? Brasil ou somente brasileiro, ainda que nem todas essas obras façam referência ao
Brasil no título” (p. 20).
(por Francisco
Eduardo Vieira) 1.1. Da noção de gramatização à de paradigma tradicional de gramatização
“Ao longo do tempo, os instrumentos de gramatização reverberaram o discurso de
que a melhor língua é a dos literatos do passado. Essa língua é a que costuma ser
prescrita nas gramáticas e desejada pelas pessoas em geral. De lá pra cá, a ideologia
da correção linguística esteve presente em todas as obras gramaticais vinculadas ao
PTG [paradigma tradicional de gramatização]” (p. 23).

1.2.O PTG no contexto luso-brasileiro de produção de gramáticas


“É sabido que, desde o fim do século XVI, a língua falada no Brasil não era
mais a mesma língua falada em Portugal; entretanto, a legitimidade da
sociedade brasileira com suas próprias instituições, seu saber, suas práticas
linguísticas, seu poder político é elaboração particular do século XIX, como
também o é a visibilidade dada à diferença linguística entre Brasil e Portugal,
algo que se estenderia, com diferentes nuances e graus de intensidade, até os
nossos dias” (p. 29).

“Nesse contexto, portanto, o processo de gramatização brasileira do português


criou um espaço de diferença entre a língua do Brasil e a de Portugal, mas sem
atentar contra a unidade luso-brasileira (Orlandi & Guimarães, 2001). A
tradição brasileira do português, desde suas origens, se pôs, em linhas gerais, a
favor do purismo lusitano, levando, nesse último caso, ao imaginário de que no
Brasil não se fala corretamente (Guimarães, 1996)” (pp. 29-30).

“Ao longo do século XX, em particular após a publicação da Portaria n. 36 em


28/01/1959 (NGB), as gramáticas do português produzidas no Brasil também
estariam sob as bases do PTG. [...] A maioria deles [gramáticos da tradição
gramatical brasileira] produziu gramáticas em voga no mercado editorial brasileiro
até os dias de hoje. São elas as atuais gramáticas de referência do português no
nosso país” (p. 30).

“Assim, o PTG continua em voga no Brasil de nossos dias. De viés normativo-


prescritivo, as gramáticas de referência que cá circulam não contemplam boa parte
dos usos linguísticos efetivos dos brasileiros e se valem do arcabouço categorial e
conceitual greco-latino, uniformizado pela força homogeneizadora da NGB há mais
de meio século. A passagem de uma perspectiva lógico-filosófica para uma
perspectiva histórico-comparativa (científica) no final do século XIX, a
regulamentação terminológica por meio da NGB a partir de 1959, os deslocamentos
teóricos e práticos promovidos pela consolidação da virada linguística (pragmática)
na década de 1980, nada disso parece ter sido suficiente para a constituição de um
novo paradigma brasileiro de gramatização, que apagasse o embasamento teórico e a
filiação ideológica aos traços da tradição greco-latina e da gramática lusitana. Nesse
sentido, as políticas educacionais e a própria história do Brasil também fizeram com
que a tradição gramatical brasileira se desenvolvesse com mais continuidades e
assentamentos do que rupturas" (pp. 30-31).

“São elas [as gramáticas tradicionais] as atuais gramáticas de referência no


nosso país, e é contra esse fazer gramatical que as GBCP se erguem, na
tentativa de gramatizar, sob outro crivo epistemológico, o português brasileiro
(PB)” (p. 31).

1.3. Produção brasileira de gramáticas na contemporaneidade em resposta às


demandas da virada linguística
“Desde a década de 1960, a crítica à doutrina gramatical tradicional e a seu ensino
começou a ser produzida no meio acadêmico” (p. 31).

“[...] foram tantos os estudos linguísticos e os textos de caráter de divulgação


científica publicados a partir da década de 1980, apontando contradições e
insuficiências conceituais e metodológicas da gramática tradicional, que, hoje em
dia, a crítica à doutrina gramatical chega a ser consenso entre linguistas das mais
distintas áreas e entre professores de português formados em boas universidades há
pelo menos duas décadas [...]” (p. 33).

“Hoje, após quase cinco décadas de discussões sobre novos horizontes para o
ensino de português e de gramática, os saberes da linguística, em suas diversas
abordagens, alimentam formas particulares de escolarização da língua
portuguesa, mais condizentes, a propósito, com a nova proposta formativa da
escola, explicitada nas principais diretrizes e planos curriculares
governamentais – a formação de um cidadão consciente, autônomo, crítico e
transformador” (p. 33).

“Vê-se que abandonar o PTG não é um movimento fácil. Não se resume à inserção
de saberes oriundos da linguística na descrição da estrutura da língua, nem ao uso de
uma nova taxonomia, repleta de termos da linguística textual ou da sociolinguística,
por exemplo. Isso de nada adianta se se permanece preso às mesmas concepções de
língua, gramática, norma, escrita, fala, erro, entre outras herdadas dos gramáticos
gregos e romanos e, mais recentemente, dos vernaculistas renascentistas” (p. 36).

“Os deslocamentos teórico-epistemológicos que essas gramáticas operam, os


alcances metodológicos que engendram e o arcabouço categorial, conceitual e
descritivo que tentam construir parecem deflagrar uma espécie de virada
linguística do processo de gramatização brasileira do português, o que aponta
para a possibilidade de emergência de um novo paradigma ou de novos
paradigmas de gramatização” (pp. 37-38).

1.4.Gramatização, paradigma e revolução do fazer gramatical


“[...] levanto a hipótese de que a produção das GBCP nos últimos anos seria
justamente o florir desse pensamento interditado por séculos históricos de
dominação teórico-ideológica do pensamento gramatical circunscrito ao PTG” (p.
39).

“[...] a virada linguística foi a responsável por instaurar esse novo conjunto de
compromissos, fornecendo a nova base para a produção de gramáticas” (p. 40).

“Assim, a substituição total ou parcial do PTG por um outro paradigma ou por


novas frentes paradigmáticas que lhe são incompatíveis, embora não implique uma
revolução da ciência linguística, ocasiona uma espécie de revolução do fazer
gramatical brasileiro” (p. 41).

“Kuhn (1962) afirma que as revoluções científicas assemelham-se às revoluções


políticas, e eu alargo seu pensamento a contexto das produções emergentes das
gramáticas do PB. Seus autores e partidários veem-se unidos numa causa não só
científica, mas sociopolítico-ideológica, haja vista as diferentes lutas encabeçadas
direta ou indiretamente nessas obras: a luta contra o preconceito linguístico, contra o
analfabetismo e o baixo grau de letramento, contra a subserviência linguística a
Portugal, contra a manipulação ideológica da mídia quando o assunto (também) é
língua, entre outras tantas” (p. 41). GRAMÁTICA DE BAGNO

“[...] a emergência de um novo paradigma de gramatização exige a destruição em


larga escala do paradigma tradicional e grandes alterações nos problemas e técnicas
arraigados historicamente no nosso fazer gramatical, algo próprio do caráter
revolucionário” (p. 41).

“[...] é preciso que uma nova geração de pesquisadores abrace o novo


paradigma, para sua exploração prosseguir, o que parece ser o retrato atual
dos estudos gramaticais no Brasil: novas gramáticas são publicadas por
linguistas, mas não há gramáticas tradicionais, construídas com respaldo
filológico, lançadas atualmente no mercado em sua primeira edição” (p. 42).

1.5.Gramáticas brasileiras contemporâneas do português: episódios de


(des)continuidade com o PTG
1.5.1 Demandas e propósitos sociais das GBCP

“O compromisso, em particular, da GP [gramática de Perini] e da GB [gramática de


Bagno] com a autonomia e legitimidade do PB enquanto língua dos brasileiros faz
com que as descrições se centrem nos fenômenos costumeiramente negligenciados
pelo PTG” (p. 43).

“Efetivamente, o público-alvo das GBCP não é o estudante da educação básica, nem


mesmo o leitor comum, mas sim o leitor especializado: o linguista, o professor de
português, o estudante de letras” (p. 45).

“Entre as três obras analisadas, a GB [gramática de Bagno] é a que deixa mais


evidente essa ruptura com a função social da gramática como livro de
referência para o público geral” (p. 45).

“De fato, a GB contribui para que os docentes conheçam melhor o PB, se


reconheçam nele e dele se sirvam como objeto de ensino. Porém, bem como a GP,
não atende às demandas do leitor comum. [...] Essa descontinuidade com a tradição
ocasiona, em última análise, um deslocamento no que socialmente se costuma
esperar de um livro de gramática” (p. 46).

“Esse novo fazer gramatical protagonizado pelas GBCP consiste não só em um


novo processo de gramatização em cena, mas também na construção de um
novo objeto metalinguístico, ainda sob o título de gramática” (p. 46).

1.5.2. Concepções teóricas e configurações metodológicas das GBCP


“As GBCP concordam em que os fundamentos teórico-metodológicos da
gramática tradicional não são suficientes para dar conta do novo fazer
gramatical empreendido por elas. Diante disso, rompem com alguns aspectos
constitutivos do PTG, o que não significa que as mudanças operadas estejam
imunes a críticas, nem que haja o apagamento de todas as linhas de
continuidade com a tradição” (p. 46).

“Essa heterogeneidade é ainda mais pulsante na GB, pois, para legitimar certos
aspectos do PB marginalizados pela opressão gramatical, a obra não se preocupa
com possíveis incompatibilidades teóricas: é capaz de agregar num mesmo lastro a
linguística da enunciação, a abordagem funcionalista da lexicogramática, a
abordagem da gramaticalização sob o viés pancrônico e sociocognitivo, as
sociolinguísticas variacionista e paramétrica, descrições formalistas de cunho
estruturalista e gerativista, a teoria das valências, entre tantos outros aportes
teóricos” (pp. 46-47).

Em sua gramática, Bagno traz a língua enquanto “fenômeno sociocultural e


atividade sociocognitiva e de interação verbal”, “considera a variação e a mudança
linguística como constitutivas da língua” (p. 48).

A gramática de Bagno, “de caráter eminentemente descritivo, abandonam em


definitivo as regras prescritivas e as interdições da tradição luso-brasileira” (pp. 51-
52).

“[...] apesar de não conter uma teoria linguística central nem explicitar seus aspectos
metodológicos mais relevantes, é possível dizer que as GBCP, por um lado, se
deslocam da epistemologia tradicional e, por outro lado, guardam semelhanças com
a tradição gramatical luso-brasileira. Os movimentos de ruptura observados na
GB são de maior alcance que na GA [gramática de Azeredo] e na GP” (pp. 53-
54).

1.5.3. Arcabouço descritivo, categorial e conceitual das GBCP


“Ao longo de toda a obra, a GB apresenta novas análises e consequentes
configurações descritivas envolvendo uma gama variada de fenômenos gramaticais”
(p. 55).

“Em síntese, a mudança terminológica é mais substancial na GP e na GB; não à toa,


as duas são as obras que assumem o caráter provisório de suas descrições
gramaticais e que recusam explicitamente a NGB, pelo seu caráter oficial, não
científico, assistemático, pretensamente infalível e de aprisionamento à tradição
greco-latina” (p. 57).

“Em particular na GB, as múltiplas referências aos estudos linguísticos atuais


também favorecem seus movimentos de ruptura com o arcabouço descritivo,
categorial e conceitual da tradição, pois a linguística contemporânea, em todas as
suas áreas de investigação, costuma se valer de outros procedimentos de análise e de
outro acervo categorial” (p. 58).

“[...] apesar do forte discurso antagônico ao arcabouço tradicional, fica evidente a


impossibilidade da GB se esquivar de boa parte da terminologia greco-latina ao
longo de suas propostas descritivas” (p. 58).

“Valendo-se da teoria dialógica da linguagem de Bakhtin/Volochínov (1992), pode-


se dizer que o conjunto terminológico da GB não é autossuficiente nem indiferente à
gramática tradicional; mesmo negando-a, a reflete, repleta de seus ecos. Uma nova
terminologia tradicional dentro da arena discursiva da gramatização, de modo que a
refuta, a completa, a supõe conhecida. Em suma, as linhas de continuidade
acabam não sendo apagadas, embora esgarçadas pelos movimentos incontestes
de ruptura” (p. 58).

“A presença massiva da NGB nessas novas gramáticas valida a ideia de que


talvez haja algo como uma terminologia de consenso geral entre a doutrina
gramatical e os estudos linguísticos” (p. 58).

“[...] os termos tradicionais sofrem uma espécie de ‘naturalização’, a ponto de serem


aproveitados, independentemente das teorias linguísticas tomadas como referência e
dos critérios de categorização previamente traçados” (p. 59).

“Portanto, pode-se dizer que essas novas gramáticas, embora reconheçam e


critiquem as limitações e os problemas da classificação tradicional, não apagam
o arcabouço herdado pelos gregos e latinos, mas o rearranjam de modo mais
coerente, inclusive retornando a configurações mais distantes da tradição
gramatical. [...] As GBCP ficam, assim, impossibilitadas de descartar muitas
das categorias e dos conceitos que remetem à doutrina gramatical, por tê-los
colocado em um estatuto ateórico, naturalizado, aprioristicamente
determinado” (p. 61).

1.5.4. Aspectos morfossintáticos da língua gramatizada pelas GBCP


“As GBCP avançam a caminho do reconhecimento, da valorização e da legitimação
de aspectos genuinamente brasileiros nos nossos usos comuns falados e escritos.
Nessas gramáticas, há a incorporação de várias formas e construções da
morfossintaxe brasileira historicamente marginalizadas ou mesmo vetadas pelas
gramáticas tradicionais do português, inclusive por aquelas elaboradas por autores
brasileiros” (pp. 61-62).

“[...] a GB é a mais atuante nesse sentido: apresenta um leque maior de rupturas com
prescrições descabidas da gramatização tradicional luso-brasileira [...]. Esses
movimentos condizem com sua concepção de português brasileiro – falado e escrito
– como língua plena e autônoma, orientada pelos seus próprios princípios de
funcionamento” (p. 63). CONCEPÇÃO DE LÍNGUA EM BAGNO

“Em outras palavras, quando as GBCP recortam a língua a ser descrita por
meio da escolha de uma ou mais variedades, uma ou outra modalidade,
determinado registro e não outro, inevitavelmente igualam essa porção
gramatizada à própria língua, seja o ‘português brasileiro’, seja o ‘português
do Brasil’. Embora se ergam contra o padrão europeu, as GBCP não falam de
fora da ideologia e da cultura da norma-padrão; tentam, a propósito, construir
um novo padrão, ao uniformizar, homogeneizar, hipostasiar. Assim, apesar de
suas concepções teóricas de partida, parece ser inevitável perceber enquanto
unidade objetiva esse artefato múltiplo, difuso e híbrido que é a língua dos
brasileiros” (p. 68).

1.6. Palavras finais


“É inconteste, embora nem sempre devida, a importância dada aos instrumentos
gramaticais em nossa sociedade grafocêntrica e padronizada. Constitutiva das
práticas escolares e da vida cotidiana, as gramáticas podem tanto ampliar as práticas
linguísticas de seus usuários e fomentar suas habilidades intelectuais sobre a língua,
como reforçar visões e atitudes inadequadas ao cenário linguístico contemporâneo”
(pp. 68-69). DIALOGA COM GNERRE

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