Está en la página 1de 22

1,.

Conceitos gerais

Linguagem, llngua, discutso, estilo.

r. LrNcuecru é <<um conjunto complexo de processos


-
tesultado de
uma certa actividade pslquica profundamente determinada pela vida social
que toffia posslvel a. aquisigào e o emprego concreto de uÍìa r.fNcue
-
qualquenl. Usa-se também o termo para desigtr t todo o sistema de sinais
que serve de meio de comuntcaEdo entre os indivlduos. Desde que se atti-
bua valor convenci onal a determinado sinal, existe uma LrNGuacEM. À. lin-
gulstica interessa particularmente uma espécie de LTNGUAGEM, ou seja a
LINGUAGEM FALADA OU ARTICULADA.

2. r,fNCUA é um sistema gtamattcal pertencente a um grupo de


indivlduos. Expressào da consciéncia de uma colectividade, a lfitcue é o
meio por que ela concebe o mundo que a cetca. e sobre ele age. UtilizaEdo
social da faculdade da linguagem, cxraEdo da sociedade, nào pode ser imutó-
vel; ao conUirio, tem de viver em peqpétua evolugào, paralela à do otga,'
nismo social que a criou.

t. DrscuRso é a lfngua no acto, na. execugào individual, E, como


cada indivlduo tern em si um ideal lingulstico, procura ele extrair do sis-
tema idiomótico de que se ser\re as formas de enunciado que melhor lhe
exprimam o gosto e o pensamento. Essa escolha entre os diversos meios
de expressào que the oferece o tico repertório de possibilidades, que é a
lÍngua, denomina-se ssttr,o2.

I Tatiana Slama-Casactr. Langage et contcxtc. Haia, Mouton, 1961, p. 2:o.


2 Aceitando a distingào de Jules Marouzeau, podemos dizet que a r,ftqcue é <<a soma dos
meios de expressào de que dispomos para fot:orrit o eu-unciado> e o Esrrlo (o -aspecto e a qualidade
que resultaó da escolha €otre-esses meios de expressào>> (Prlcìs dc xllktiEn frmgaise, z.a ed. Paris,
IVlasson, ry46, p. ro).

NGî
NOVA GRAMITICA Do PoRTUGuÉs coNTEMPoRANEo

4. A distingào entre LrNGuAGErvr, lÍNcuA e DrscuRso, indispensóvel


do ponto de vista metodológico, nào deixa de ser em parte atificial. Em
verdade, as ffés dsnqminagóes aplicam-se a aspectos diferentes, mas nio
opostos, do fenómeno exfiremamente complexo que é a comuni cagdo humana.

A interdependència desses aspectos, salienta-a Tattana Slama-Casacu,


ao escrever: <<A r,ÍNcue é a cnaEà,o, mas também o fundamento da LTNGUA-
cEM que simultaneamente, o ins-
- e onào
trumento
podeda funcionar sem ela
-i é,
resultado da aaividade de comunicagào. Por outro lado, a
LTNGUAGEivT nào pode existir, manifestar-se e desenvolver-se a nào ser pelo
aptendi"ado e pela utilizaEào de uma r,fNcu,r qualquer. A mais frequente
forma de manifestagio da r,rNcuAGEM constitulda de uma complexidade
de processos, de mecanismos, de meios expressivos
- é a r,rNcuAGEM FALADA,
- do processo de comu-
conctetizada no DrscuRso, ou seja a tealizaEào verbal
nicagào. O orscunso é um dos aspectos da r,rNcu,rcEM o mais impor-
tante- €, ao mesmo tempo [...], fotrna concreta sob a -qual se manifesta
" como o acto de utilizagào individual
a lfNcua. O orscuRso define-se, pois,
e concreto da r,ÍNcu,q. no quadro do processo complexo da LTNGUAGEM.
Os très termos estudado LTNGUA.cEM, r-fNcu,r, DrscuRso designam
llo fundo ttés aspectos, difetentes mas estreitamente ligados,- do mesmo
processo unitório e complexo>r3.

Llngua e sociedade: vatiagio e conservagdo lingulstica.

Embora, desde princlpios deste século, linguistas como Antoine Meillet


e Ferdinand de Saussute tenham chegado a configutat a llngua como um
facto social, rigorosamente enquadrado na definigio dada por Emile Dur-
kheima, só nos rlltimos vinte anos, com o desenvolvimento da socror,rN-
cuÍsrrce, as relagóes entre a llngua e a sociedade passararn a ser cataúe-
izadas corn maior precisào.

A sociolingulstica, r^mo da lingulstica que estuda a llngua como fenó-


meno social e cultural, veio mostrar que estas inter-relagóes sào muito com-
plexas e podem assumir diferentes fotmas. Na maiotia das vezes, compro-
va-se uma covatiagào do fenómeno lingulstico e social. Em alguns casos,

3 Obra cit., p. zo.


a Veiam-se Antoine Meillet. Linguistiqae bistorique et linguistiqac glnérale, z.a ed. Paris, Cham-
pion, 1926, p. t6, z3o passim; Ferdinand de Saussure. Cosrs de lingaisticyae glnhalc, édition ctitique
prépaÉe par Tullio de Mawo. Patis, Payot, 1973, p. tr.

2
CONCEITOS GERAIS

no entanto, faz mais sentido admitir uma relagào direccional: a influència


da sociedade na lfngua, ou da llngua na sociedade.
É, pois, tecente a concepgào de llngua como instrumento de comuni-
cagio social, maleóvel e diversificado em todos os seus aspectos, meio de
expressào de indivlduos que vivem em sociedades também diversificadas
social, cultural e geogtafrcamente. Nesse sentido, uma llngua histórica nào
é um sistema lingulstico unitório, mas um coniunto de sistemas lingulsticos,
isto é, um DrAssrsrEMA., no qual se inter-relacionam diversos sistemas e sub-
-sistemas. Dal o estudo de uma llngua revestir-se de extrema complexidade,
nào podendo prescindir de uma delimitagio precisa dos factos analisados
parl controle das variiryeis que actuam, em tod,os os nlveis, nos diversos
eixos de diferenciagdo. A variagdo sistemótica estó, hoje, incorporada à
teoria e à descdEà,o da llngua.
Em princlpio, uma llngua apresenta, pelo rnenos, très tipos de diferengas
internas, que podem ser mais ou menos profundas:
r.o) diferengas no espago geogràfrco, ou vARrAgóns oranóprces (falares
locais, variantes regionais e, até, intercontinentais);
z.o) diferengas entre as camadas socioculturais, ou vARregóns Dras-
rnftrces (nlvel culto, llngua padrio, nlvel popular, etc.);
,.o) diferengas entre os tipos de modalidade expressiva, ou vARreg6rs
orerfsrcass (llngua falada, Ilngua escrita, llngua hterdna, linguagens espe-
ciais, linguagem dos homens, linguagem das mulheres, etc.).
A partir da nova concepgào da llngua corno diassistema, totnou-se pos-
slvel o esclarecimento de numerosos casos de polimorfi.smo, de plurdidade
de normas e de toda a inter-relagào dos factores geogtófi.cos, históricos, sociais,
psicológicos que aútam no complexo operar de uma llngua e odentam a sua
deriva.
Condicionada de forma consistente denuo de cada grupo social e parte
integrante da competència lingulstica dos seus membros, a vatiagdo é, pois,
inerente ao sistema da llngua e ocorre em todos os nlveis: fonético, fonoló-
gico, morfológico, sintóctico, etc. E essa multiplicidade de rcalizagóes do
sistema em nada preiudica as suas condigóes funcionais.
Todas as variedades lingulsticas sào estruturadas, e correspondem a"

sistemas e sub-sistemas adequados às necessidades dos seus usuórios. Mas o


faeo de estar a llngua fortemente ligada à estruttrra social e aos sistemas
de valores da sociedade conduz a. uma woliagdo distinta das catactedsticas
das suas diversas modalidades diatópicas, drasttfiticas e diafósicas. A lln-

5 Veia-se Eugenio Coseriu. Stnrcture lexicale et enseignement du vocabulaire.In Actet ùt


premier Collorye Intenatioral dl LingittiEte Appliqaée. N*"y, Université de Nancy, ry66, p. rgg.
NOVA. GRAMITICA DO PORTUGUÈS CONTEMPORI.NEO

gua padrào, pof exemplo, embora seja uma enffe as muitas vadedades de
um idioma, é sempre a mais prestigiosa, porque aúta coíto modelo, como
norma, como ideal lingulstico de uma comunidade. Do valor normativo
decotre a sua fungào coercitiva sobre as outras variedades, com o que se
torna uma ponderóvel forga conrtîatt^ à variagà;o.
Numa llngua existe, pois, ao lado da fotga centdfuga da inovaEdo, a
fotga centdpeta da consenagio, que, conttl-tegtutrdo a primeira, gar^nte
supedor unidade de um idioma como o portuguès, falado por povos que se^
distribuem pelos cinco continentes.

Divetsidade geogtófrca da llngua: dialecto e falat.

As formàs cataúedsticas que runa llngua assume rcgionalmente deno-


minanr-se DrALEcros.
Alguns linguistas, porém, distinguem, entre as variedades diatópicas,
o FALAR do orer,ncro.
Drer,ncro seria <<urn sistema de sinais desgarrado de uma llngua comum,
viva ou desapatecida; normalmente, com uma corcreta detmitagào geo-
I
gtfifica, mas sem uma forte diferenciagào diarrte dos outros da mesma ori-
gerrD). De modo secundório, poder-se-iam também chamar dialectos ((as
estflrturas lingulsticas, simultàneas de outfa, que n6o alcangam a categoria
de lfnguu6.
Far,an setia a peculiaridade expressiva ptópna de uma rcgido e que nào
apresenta o grau de coerència alcangado pelo dialecto. Cataúeflzar-se-ia,
do ponto de vista diacrónico, segrurdo Manuel Alvar, por ser um dialecto
empobrecido, que, tendo abandonado a llngua escrita, convive apenas com as
manifestagóes orais. Poder-se-iam ainda distinguir, dentro dos FALaRES
REGroNArs, os FALAREs LocArs, que, para o mesmo linguista, correspon-
deriam a subsisteÍns idiomóticos <de tragos pouco diferenciados, mas com
matizes própdos dentro da estrutura regional a que pertencem e cujos usos
estào limitados a pequenas circunscrigóes geogrfifrcas, normalmente com
catiúst administrativo> 7.
No entanto, à vista da dificuldade de caraúeirzat fi^ pútúca tais
modalidades diatópicas, empregaremos neste livro e particrrlarmente
capltulo seguinte - variedade regional no
o termo DrALEcro no sentido de da
-

6 l\fanuel Alvar. }Iasia los coaceptos de lengua, dialecto y hablas. Nrcta Boìsta de Fìhlogla
Hìspdniea, t1: 57, r96r.
t ld.,Ibid., p. 6o.

4
CONCEITOS GERAIS

llngua, nào importando o seu maior ou menor distanciamento com referèn-


csa à tfngu" padràlo,

A nogào de cottecto.

Uma gramfiaea que pretenda registat e analisar os factos da llngua


culta deve fundar-se flum claro conceito de norrna e de correcEdo idiomótica.
Permitimo-nos, por isso, uma ligeira digressdo a respeito deste controver-
tido tema.
Os progressos dos eshrdos lingulsticos vierarn rnostrar a falsidade dos
postulados em que a gtamiltica logicista e a latinizatte esteavarn a correc-
$o idiom6tica e, com isso, deixaram o preceptismo gramatical inerme diante
dz raq5lo anticorrectista que se iniciou no século passado e que vem assu-
rnindo, nos nossos dias, atinrdes violentas, nào raro contaminadas de radi-
calismo ideológicoa.
Por outro lado, à ideia, sempre renovada, de que o Povo tem o poder
cdador e a sobetania em matéria de linguagem associa-se, naturalmente,
a considerar elemento pernrrbador ou estéril a interferència da
outra
- de
forg" conscrvadora ou repressiva dos sectores cultos.
Come essa concepgio demolidora do ediflcio gramaacal, paciente-
rrnrE constnrldo desde a epoca alexandrina com base na analogia, levan-
ÈurFsc dguns linguistas modernos, procurando firndamentar ù correcgào
nifrr#tica em factores mais objectivos.
Dcssa nova linha de preoctrpagóes foi precursor Adolf Noreen, o linguista

hre Noteen hó très critérios princrpais de correcgàor por ele deno-


ili r.s birtórico-literório, ltistdrico-natural e racional, o rlltimo, obviamente,
o str p'refeddo.
De amtrdo com o critério ltistórico-literàrio, ((a correcEào estriba-se essen-
ri-lmerrte em confotmaî-se com o uso encontrado nos escritores de uma
Aoce petéda>, €o geral escolhida arbittaiamente. É o critério tradicional
& ore$o, fundado no exemplo dos clóssicos.

s Veia-sc, a propósito, Angel Rosenblat. El titerio dc conección lìngilletica: sniùd 1 plura-


EIJ l tas n cl espúol de Espafral Amhica. Separata de P.I.L.E.!. El Sinposio de Indiana. Bogotó,
lrire C-aro y Cuervo, t967,p.27. Consulte-se também Celso Cunha. Llngaa porttgrcsa e rcali-
ffiira,8.t ed. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, r98r, p. 3r-rg, texto em parte aqui repro-
-ft:,llt
t Lciam-se Bióm Collinder. Las orìgitus ùt amcuralisma. Stockholn Gtitebotg Uppsa-
h, Aloqeist & \7iksell, zgíz, p.6 e ss.; Bertil lVfalnberg. Let rcuelles tmùms- -
dc la lingaìstirye,
r-,1. pos Jacques Gengoux. Paris, P.U.F., tg66, p, 42, J2-Ji,, r3o, 184-186, tg7, z7g.
NOVA GRAMÍ.TICA DO PORTUGUÈS CONTEMPORANEO

O segundo critério, o ltìstórico-natural de Noreen e que Jespersen pre-


fere chamat anórquico, baseia-se na douffina, a que nos referimos, de que
a linguagem é um organismo que se desenvolve muito melhor em estado
de complea liberdade, sem entraves. Dentto desse ponto de vista nào pode
havet, em princlpio, nada correcto ou incorrecto na llngua.
Depois de deixar patente o catilúet atbitrdno do primeiro cdtério e o
absurdo do segundo, se levado a suas naturais consequéncias, Noreen tenta
justificar o único que resta, o dele Noreen, expresso na fórmula: (o melhor
é o que pode ser apreendido mais exaúa e rapidamente pela audiència pre-
sente e pode ser produzido mais facilmente por aquele que falu; ou no
enunciado mais sintético de Flodstróm: <<o melhor é a forma de falar que
reúne a mator simplicidade posslvel com a necessória inteligibilidade> 10.
Jespersen considera a fótmula de Noreen opoffunista, individualista,
atomlstica, <lpois que divide demasiado a comunidade lingulstica em indivl
duos particulares e olvida excessivamente o coniunto)ll.
Em nome de que princlpio se corrige, entdo, o falar de uma pessoa?
Por que é que uma criaîEa" aptende de seus pais que nào deve dizer sube
pot soube, faryrei por farei e, à medida que vai ctescendo em anos, continua
a tet o seu comportamento lingulstico ora corrigido por outros, ora por
esforgo próptio?
Parz Jespersen nenhum dos critérios anteriotmente lembrados e
-
enumera sete: o da autoridade, o geogútfrco, o litenírio, o atistocrótico, o
democrótico, o lógico e o estético o explica. É evidente, no entanto, que
-
existe algo que justifica a correcgdo, <<algo comum par:a o que fala e pma
o que ouvo), e que lhes faciltta a compreensào. Este elemento cornum é
l

t
(a oorfira lingulstica que ambos aceitaram de fora, da comunidade, da socie-
dade, da mfio>>L2.
Todo o nosso comportam.ento social estó regulado por norrnas a que
devemos obedecer, se quisermos ser correctos. O mesmo sucede com a
{
t llngua, aperus corn diferenga de que as suas normas, de urn modo
I ^ e mais coercitivas. Por isso, e para simplificar
genl, sào mais complexas
i
as coisas, Jespetsen define o <linguisticamente correcto>> como aquilo que
é exigido pela comunidade lingulstic^ a. que se pertence, O que difere é o
<linguisticamente incorrecto>. Ou, com suas palavras: <<fular correcto significa
o falx que a comunidade espera, e errr em linguagem equivale a desvios
desta norma, sem relagào alguma com o valor interno das palavras ou for-

10 Citados por Otto Jespersen. Humanidad, nación, indítidao, fusde cl punto de aista lingùfstico,
trad. por Fernando Vela. Buenos Aites, Revista de Occidente, 1947, p. rry e tt4.
11 Obra cit., p. r2o.
12 Ibid.' p. r2o e ss.

6
CONCEITOS GERAIS

mas>. Reconhece, poréfn, que, independentemente disso, <<existe uma valo-


Àzagdo da linguagem na qual o seu valor se rnede com referéncia a um ideal
lingulstico>>, pa;ta cuja fotmaqào colabora efrcazmente a <<fórmula energética
de que o mais facilmente enunciado é o que se tecebe mais facilmente>l3.
- dos que advogam o
Entre as atitudes extremadas rompimento tadi-
cal corn as tradigóes clóssicas da lfngua e dos que aspitam sujeitar-se a
velhas normas gtamattcus
^
hó sempte lugar P^n" urna posigào modetada,
-,
termo médio que represente o aptoveitarnento harmónico da energia dessas
fotgas contrilrias e que, a flosso ver, melhor consubstancia os ideais de uma
sà e eficaz polîaca" educacional e crrltural dos palses de llngua porhrguesa.
<Na linguagem é importante o pólo da variedade, que corresponde
à expressào individual, mas também o é o da unidade, que corresponde
à comunicagio inter-individual e é gara;îta^ de intercompreensào. A lin-
guagem expressa o indivlduo por seu carócter de criagào, mas expressa tam-
bém o ambiente social e nacional, por seu carócter de repetigào, de aceita$o
de uma norma, que é ao mesmo tempo histórica e sincrónica: existe o falar
porque existem indivlduos que pensam e sentern, e existem 'llngras' como
entidades históricas e como sistemas e normas ideais, porque a liqguagem
ndo é só expressào, finalidade em si mesfira, senào também comunieg6o,
finalidade instrumental, expressào pan orfiro, cultura obiectivada historica-
mente e que transcende ao indivlduo>>14.
A hipótese dfl <<linguagem monollticu nào assenta nurna tealidade,
e a sua corporificagào nas gramíncas nào tem sido benéfrca ao ensino dos
diversos idiomas. <Sem nenhuma d{rvido, escreve Roman Jakobson, <<pata
qualquer comunidade tingulstica, para todo ind.ivlduo falante existe uma uni-
dade de llngua, rnas esse código global representa um sistema de subcódi-
gos em comunicagào reclptocai cada llngua abarca vórios sisternas simul-
tàneos, cada um dos quais se caractertzapot uma funEào diferento>ls.
Se uma llngua pode abar:cat vórios sistemas, ou seja, as forrnas ideais
de sua tealtzaEdo, suz. dinamicidade, o seu modo de fazerse, pode também
^
admitir vfitias normas, que reptesentam rnod,elos, escolhas que se consagra-
ram dentro das possibilidades de rcalizagóes de um sistema lingulstico.
Mas pondera Eugénio Coseriu, o lúcido mestre de Túbingen
- - se <é
um sistema de tealtzacóes obti gatóias, consagradas social e culturalmente>, a

13 Ibid., p. r7B.
t4 Eugenio Coseriu. La geografla lingiifstica. Montevideo, Universidad de la República, 1956,
p, U-4r. A propósito, consultem-se também os magistrais estudos do autor: Sistema, turmay babla
e Determinación 1 entorao, agora enfeixados no volume Teoría del hngaaje 1 lingtiktica general. Madtid,
Gtedos, t962, p. rr-rr3 e z9z1z3.
15 Closing statement: Linguistics and poelir.ln Styh in Language. Edited by Thomas A. Sebeok.
New Yotk-London, M.I.T. & John S7ilen 196o, p. 352.
NOVA GRAMÍTICA DO PORTUGT'ÉS CONTBMPOR.ANEO

notma nào corresponde, como pensam cefros gtanfiacos, ao que se pode


ou se deve dize4 rnas ((ao que ió se disse e tradicionalmente se 4iz na comu-
nidade consideraduld.
A norma pode vaiar no seio de uma mesma comunidade lingufstica,
seia de um ponto de visa diatópico (portuguès de Porargal / pottrgoès do
Brasil / porruguès de Angola), seja de um ponto de vista diastrótico (lingua-
gem cula / linguagem média / linguagem popular), seja, finalmente, de
um ponto de visa diafósico (iogo"g"m poética / linguagem da prosa) 12.
Este conceito lingulstico de norma, que implica um maior liberalismo
gnntattcal, é o que, em nosso entender, convém adoptarmos para a comuni-
dade de fala porhrguesa, formada hoje por sete nagóes soberanas, todas
movidas pela legltima aspiagào de enriquecer o património comum com
forrnas e construgóes novas, a pateritearem o dinamismo do nosso idioma,
o meio de comunicaEdo e expressdo, nos dias que correm, de mais de cento
e cinquenta milhóes de indivlduos.
<<Nào se tepreende de leve ftrm povo o que geralmente agtada" a todos>>,
disse com singeleza o poeta Gongalves Dias. Com efeito, por cima de todos
os critérios de corecAào aplicóveis nuns casos, inaplicóveis noutros
- -
pzur;a o da aceitabilidade social, a consuetudo de Yarr;àlo, o rlnico vólido em
qualquer circunstància.
É justameîte para chegarem a um conceito mais preciso de <<correc-
geo) em cada idioma que os linguistas actuais vèm tentando estabelecer
métodos que possibilitem a descrigào minuciosa das suas variedades cultas,
seja na forrra falada, seja na escrita. Sem investigagóes pacientes, sem méto-
dos descritivos aperfeigoados flrnca alcangaremos determinar o gu€, no
domfnio da nossa llngua ou de uma 6tea dela, é de emprego obrigatório, o
que é faculativo, o ![ue é toleróvel, o que é grosseiro, o que é inadmisslvel;
ou, em termos radicais, o que é e o que nào é corresto.

16 Sintonla, diatonla e bistoria; cl lroblema ùl cambio liryìiîstho, z.e ed. Madrid, Gredos, 1973,
p. tt.
t7 Veia-se Celso Cunha , Língra, najíto, alínagao. Rio de Janeiro, Nova Fronteita, p. 73-74 e ss.

l]À
2.

Domínio actual da língua


Poftuguesa

Unidade e diversidade da llngua Portuguesa.

Na órea vastlssima e descontlnua em que é falado, o portuguès apresenta-


-se como qualquer llngua viva, internamente diferenciado em variedades que
divergem de maneita mais ou menos acentuada quanto à pronrlncia, à" gta-
m6.uca e ao vocabulório.
Embora seja inegível a existència de tal diferenciagdo, rúo é ela sufi-
ciente p^ra impedir a superior unidade do nosso idioma, faúo, aliós, salien-
tado até pelos dialectólogos.
Com rclaEdo a Fortugal, obsewa o professor Manuel de Paiva Boléo:
<<Uma pessoa, mesmo alheia a assrui.tos fi"lológicos, que lnja percorrido Por-
tugal de norte a sul e convefsado com gente do povo, nào pode deixar de
frczr impressio nada com a excepcional homogeneidade lingulstica do Pals
e a sua escassa diferenciagào dialeúaI-ao contrdtio do que sucede noutros
palses, quer de lfngua romànicar eu€r germànico>l.
Com referència à situag6o lingulstica do Brasil, escreve Serafim da Silva
Neto: <É preciso ter na devida conta que unidade nào é igualdade; no tecido
lingulstico brasileiro h6, decerto, gradagóes de cores. Minucioso esttrdo de
campo determinaria, com segufafiga, vànas óreas. O que é certo, porém, é
que o conjunto dos falares brasileiros se coaduna com o princlpio da unidaù
na diuersidade e da diuersidafu na unidade>>2.

1 lVfanuel de Paiva Boléo e N[ada Helena Santos Silva. O <<IVfapa dos dialectos e falares de
Portngal Continental>. Boletim & Filologia, zoz 85. ry6r.Leia-se também-do_professor Paiva Boléo.
Uîtidaúr c uriedade da llngua portugnen. Separaa da Reoista da Faculdade de I*tras, e.a sétie:
zo (r).
- '2Lisboa, 1954.
ktroAjaó ao esttdo fu llnga portuguua no Brasil, z.e ed. Riode Janeiro,_ MEC/INL, 1963,
p. z7r. Veia-se- também do saudosó filólogo o seu dertadefuo tsabalho: A llngaa portagusa ru
-Brasil.
Separata da Rwista de Portugal: z1rLisboa, 196o, p. tz-JJ, onde enumera os factores gue,
ao seu parecet, levaram a essa supetiot unidade e ao catàúet atcaiz.ante do portuguès ameticano.

I
NovA cRaMlTrcA Do poRTUGUÈs coNr-uponANro

As variedades do portuguès.

Exceptuando-se o caso especial dos ctioulos, que estudaremos adiante,


temos, pois, de reconhecer esta verdade: apesat da acidentada história que
foi a da sua expansào na Europa e, principalmente, fora dela, nos distantes
e extenslssimos terdtórios de outros continentes, a llngua portuguesa con-
seguiu manter até hoje aptecifvel coesào entre as suas variedades por mais
afastadas que se encontrem no espago.
A diversidade interna, contudo, existe e dela importa dar uma visào
tanto quanto posslvel ordenada3.

Os dialectos do portuguès eutopeu.

A faixa ocidental da Penlnsula Ibérica ocupada pelo galego-portugués


apresenta-nos um conjunto de orar.rcros que, de acordo com certas catac-
terlsticas diferenciais de tipo fonético, podem ser classificados em trés gtàn-
des grupos:
a) DrALEcros cauecos;
b) DrALEcros poRltuct ESEs sETENITRToNATS;
c) DrALEcros poRTUGt ESES cENTRo-MERrDtoNArs4.
Esta classificagào parece ser apoiada pelo sentimento dos falantes comufls
do portugues padtdo europeu, isto é, dos que seguem a NoRMA ou conjunto
dos usos lingulsticos das classes cultas da reglào Lisboa-Coimbra, e que
distinguitio pela fala um naflrtal da Galaa, um homem do Norte e um
homem do SuI.

3 Veia-se, sobre o coniunto das variedades do pottrgu&, a Bibliografa diahxal galego-


-portuguesa, publicada pelo Centto de Estudos Filológicos, Lisboa 1974. Sobte o portuguès do
Bnsil, em particular, possuímos hoie uma bibliogafra muito completa: \íolf Dietrich. Bibliografia
da llngta portaguesa fu Brasil. Túbingen, Gunter Narr, r98o.
4 Quanto à classificagào dialectal aqui adoptada, veia-se Luís Filipe Lindley Cinua. Nova
proposta de classificaSo dos dialectos galego-pottugueses. fuletin de Filologia, 22, 8r-116
Lisboa, ryT (ou Ertados de diahctologia pnrrtgaera, Lisboa, Só da Costa, 1983, p. n7-t63).
Entte as classificagóes antetiotes, duas merecem tealce particular: a de José Leite de Vascon-
celos e a de lManuel de Paiva Boléo e Maria Helena Santos Silva. A de Leite de Vascon-
celos, baseada na divisào de Po*ugal em províncias, é mais geogrlfrcz do que linguística. Foi
publicada, inicialmente no seu Mappa diahctologico fu continente pmn$t pisboa, Guillard, Aillaud,
t8g7), depois teproduzida na Esqússe il'ane diahaologie portagdirc (Paris-Lisboa, ,tillaud, tgot; z.a
ed., com aditamentos e correcgóes do autor, ptepatada pot lVfatia Adelaide Valle Cintra, Lisboa,
Centto de Estudos Filológicos, tgTo) e, com altetagóes, nos Opúscalos, rV, Filologia, patte II (Coim-
bta, rgz9, p. 7gt-7g6). ,{ de Manuel de Paiva Boléo e Maria Hele'r" Santos Silva, exposta em:
O <Mapa dos dialectos e falares de Pornrgal Continentab> (fulctin ù Fihhgia, zo: 85-trz, Lis-
boa, 196r), assenta em factos linguísticos, principalmente, fon&icos, ÍJue, apresentados numa
cetta e possível hierarquizagào, permititiam talvez um mais claro agnrpameoto das vatiedades.

IO
DoMÍNIo ACTUAL DA LÍNGUA PORTUGUESA

A distingào funda-se pdncipalmente no sistema das srnrr,ANrrs. Assim:

r. Nos dialectos galegos nào existe a sibilante sonora lzl: rosa atticula-se
com mesma sibilante h] oo [s] (surda) de passo; fazer, com a mesma sibi-
lante^[0] ou [s] (surda) de caga. Nào existe também a fricativa palatal sonora
l3l, grafada em portuguès J oa g (antes de a ou i). Em galego, Itoxe tem a
rnesrna fricativa [fl (surda) de enxada.

2. Nos dialectos porhrgueses setentrionais existe a sibilante ópico-


-alveolar [s], idèntica à do castelhano setentrional e padrào, em palavras
corno seis, passo. A ela corresponde a sonora [Z] d" rlsa.
Em alguns dialectos mais conservadores coexistem corn estas sibilantes
as predorsodentais [s] (em cinco, cdga) e [z] (em fazer), que, noutros dialectos,
com elas se funditarn, provocando a igualdade da sibilante de cinco e caga
com a que aparece em seis e paeso, ou seja [s], bem corno a da de fazer com
a que se ouve emrosd, isto é [7].

3. Nos dialectos porrtrgueses centro-meridionais só aparecem as sibi-


lantes predorso-dentais qtre c:;tarúeru;am a" lingua padúo:
a) a surda [s], tanto em seis e paeso como em cinco e caps;
b) a sonofa lz], tanto em r^sa corno em fazer.
As fronteiras entre as trés zortus mencionadas atravessum a faixa galego-
-portuguesa de oeste a leste, ou, mais precisamente, no caso da fronteira
entre dialectos portugueses setentrionais e centro-meddionais, de notoeste
a sueste.
Mas hó outros tragos importantes em que a referida distingdo se funda-
menta, sem que, no entanto, as suas fronteiras coincidam perfeiamente com
as das caracterlsticas ió indicadas.

a) a pronúncia como [b] ou [9] d" u grfifrco (emitido como labiodental na


pronrlncia padrdo e na centro-meridional) na maior parte dos dialectos por-
tugueses setentrionais e na toalidade dos dialectos galegosz binbo, abó por
vinbo, avó;
b) a pronrlncia como afticada palatal [tJ] do ch da grafra (emitido como
fiicat:va tJ] na pronrincia padsio e ern quase todos os dialectos centro-
-meridionais) na rnaior pafie dos dialectos portugueses setentrionais e na
totalidade dos dialectos galegos z tchaue, atchar pot chaae, achar;

s Pronúncia semelhante à do francès ou do italiano padt6o, do castelhano metidional e do


hispano-americano.
x
ì.

,l- i1tl
I tot .'' r 16
-r- : .
; '.-'t""0' 'F;'.
#Sìn^-tii*É*,,,,,:Af,.f
F-t-t-S:
L{ CORUNA r- J
1O9e rt .tto -l-,
'.
t}g -i

i;';;?' f"'".-..i,ru/"t \'r! llrú


a
3tt' rss ,j'il ì 3a:
321 . -.''.i'............
rl41 ll.Ú

D
a

fsa ,lrrst

rc
.
trcl
a
ZAITA
2v'-
Limite do território linguíàtico
galego-portugués o i
cri
2tE i
-
Fronteira enlre lvl=lbl elvl*lbl 219
.- :--:
il. zzt
sRAGAflQA ''21..
.26 'i,\ip-
Fronteira entre tèt + titt e tèt = tót

Fronteira meridional de g àpico-alveolar


..-..-.. Fronteira de gg conscrvado perante g (<q!)

-...- Frontelra de eI conservado perante g (<gi)

......... Fronteira meridional do ensurdecimento


da friòativa i

-r'-----

sla
'Ér."'.=*^*"* TRTALEGRE
:rí' "'n^--À^
I
^
,! \ L-' -'-!,6-'-i'
:"o
il-t--'.--.-í.1', i ; il
........\
".:..--,."- "ai i a

'::
,...,....... oÉvoRA
2.,9
;'#, BADAlOZ
371
a
372

Fr::' K
373
aa
371
a

37s
a

I lt -tf").
'r1rì!-'
il

10O km
\"\r......,r"*i..
29O 'q.-...i
-....r'#t
.--- ,l

I
Lx Alguns tragos fonéticos diferenciadorcs d6 f,'Ltll. @
+t{

PONTEVEORA

Diarectos fl t t t salego
ocidental
oaleoos f
[l I I lgalesooriental
lf t dialectos transmontanos
Dialectos l t ^lt ealto-minhotos
oortuoues6s {
ietenirionais l,
t ' dialectos baixo-minhotos'
l/ / -durienses-beiróes

.
ulaleclos 1- dialectos do centro-
-litoral
ponugueses J
centro- ì
I,i|iiàion"i" | dialeclos do centro'
-interior e do sul
t
-
- regiào subdialectal
Limite de
com caracterlsticas peculiares
bem diferenciadas

.{rl

.r
_.t
:'-."...-..-.r--. t
i-'.*.r"'l.a"t'-'"

l-{ Classificagào dos dialectos galego-portugueses


NOVA GRAMÍTICA DO PORTUGTIÉS CONTEMPORANEO

Alguns limites lexicais


DOMÍNIO ACTUAL DA LÍNGUA PORTUGUESA

c) a monotongageo ou neo monoton g^gdo dos ditongos [ow] e [ej] :


a pronrlncia [o] e [e] desses ditongos (por exemploz 6ru pot owrz, fercèro
pot ferreiro) caneeriza os dialectos portugueses centro-meridionais e, no
caso de [o], pronrlncia padtio, perante os dialectos portugueses seten-
"
uionais e os dialectos galegos6.
Merecem mengào especial mesmo numa apresentagào panotàmica
dos dialectos portugueses
-
très regióes em que, par dos tragos gerais
que acabamos de aponta\
- ^
car^ctedsticas fonéticas peculiares que
^patecem
afastam muito vincadamente os dialectos nelas falados de todos os outros
do mesmo grupo.
Tra6-se, em primeito lugar, de uma rcgiào (dentro da zona dos dia-
lectos setentrionais) em que se observa regularmente a ditongagào de t"]
e [o] acentuadosz pieso por peso, pworto por porto. Abrange uma grande p^fte
do Minho e do Douro Litora| (incluindo o falat popular da cidade do Porto
e dos seus arredores).
Em segundo lugar, temos uma extensa 6rea da Beira-Baixa e do Alto-
-Alentejo (compreendendo uma faixa pertencente aos dialectos setentrionais,
mas, principalmente, uma vasta zona dos dialectos centro-meridionais) em
que se regista uma profunda altenEào do timbre das vogais. Os tragos
mais salientes sào: a) articalaEdo do u tónico como tù] (próximo do
^
u fuancès), por exemplo til, niila, por ttt, nula; b) ^ representaEào do
antigo ditongo gtafado 0u pot [ó] (também semelhante ao som coffespon-
dente do francés), por exemplo: pdca por pouca; a) a queda da vogal 6tona"
fina| grafada -o on sua redugào ao som [a], por exemplo cop(a)' cop(a)s' por
copo, copos; tùd(e) por tudo.
Por fim, no ocidente do Algawe situa-se outra tegiào em que se
observam coincidèncias com a anteriormente mencionada, no que se tefere
às vogais. Em lugar de u, encontramos [ù]; tii, mìila (*t o ou estí represen-
tado por [o]). Por outro lado, o a tórico evoluiu parz- um som semelhante
a o abettoz bata é pronunciado quase bota, alteraqào de timbre que nào é
estranha a. alguns lugares da mencionada zorte. da Beira-Baixa e Alto-
-Alentejo, embora seja aI mais frequente passagem, em d,eterminados
^
contextos fonéticos, de a a um som [à] semelhante a [e] aberto, pof exemplo:
aflhédo, por aflltado, fumér pot furaar. A vogal 6tona fnal grafada o também
cai ou se reduz a [a]z cop(a), cop(a)s'por copo, copos; tud(e) por tudo.

6 Com referéncia ao ditongo [ei], a pronúncia padtào e a de Lisboa (neste caso uma ilhota
de conservagilo ao sul) coincidem com os dialectos setentrionais na sua manutengào. Note-se con-
tudo que, devido a um fenómeno de diferenciagào entre os dois elementos do ditongo, €ste se trans-
fotmou na referida pronúncia em [cj].

r7
NG2

,]
NOVA GRAM{TICA DO PORTUGIIÉS CONTEMPORANEO

Nào sào, potém, apenas tragos fonéticos que permitem opor os diversos
grupos de dialectos galego-porfugueses. Se, no que diz respeito a particu-
laridades morfológicas e sintócticas, a grande variedade e irregularidade na
distribuigdo patece impedir um delineamento de 6reas que as tome como
base7, j6 no que se refere à distribuigào do léxico podemos observar, ainda
que num rcsftito nttmeto de sectotes e casos, cettas rcgdatidad;es. Nào é
îato, por exemplo, que os dialectos centro-meridionais se oponham aos seten-
trionais e aos galegos por neles se designat um objecto ou nogào com um
terrno de origem ítabe enquanto nos rlltimos permanece o descendente da
palavn latrna ou visigótica. É o caso da oposiEào alnece I soro (do queijo),
ceifar I ngar.
Talvez anda mais frequente seia a oposigào lencal entte os dialectos
do sul e leste de Portugal, cataúeflzados por inovagóes vocabulares de
vórios tipos, e os dialectos do noroeste e centro-norte, que, como os galegos,
se distinguem pelo conservad,odsmo, pela manutengào de termos mais
antigos na llngua. É o caso da oposigào de ordenltar a. nnger, magir e anojar;
de a*zojo a úbere; de borego a cordeìro e a anbo,'de cbibo a cabrito; de magaroca
a esprga (de milho), etc.
I
Advirta-se, por fim, que em relagào a muitas outras nogóes é grande a
I

variedade terminológica na fatxa galego-portuguesa, sern que se observe


este ou qualquer outro esquema regular de distribuigào. É que a distribui-
$o dos tipos lexicais depende de numeroslssimos factores, nào só linguls-
ticos, mas sobreardo histórico-culturais e sociais, que variam de c so para
caso. A regularidade aúàs observada parece depender, €ffi alguns casos, da
acfio de um mesmo faaot histórico: a reconquista aos mouros do Centro
e do Sul do teritório porruguès, movimento que teria criado o contraste
entre ,*raQ,aliza e urn Porrugal do Noroeste (e patte do Oeste) mais conserva-
d,ores, Porque de povoamento antigo, e um Portugal do Nordeste, Este e
Sul mais inovador, justamente o que foi repovoado em consequència daquele
acontecimento histótico 8. Ttata-se, alt6s, de um contraste que tem o seu
paralelo tta. história d^ àfre. Ao Norte, resistència do estilo romànico,

7, Quando- muito, poder-se-ó dize4 por exemplo, que cetros tragos, como os pefeitos
em -i, da r.s coniugaSo (larú' por laoei, canti pot canîei), sào exclusivamente centro-meridionais.
8 Veía-se, a este tespeito, principalmente, Luís F. Lindley Cintra, Areas lexicais no teî-
ritótio portnguès. Bohtim de Filologia, zo: 27i-i.o7, 196z; e Odando Ribeiro, A propósito
de óteas lexicais no território_pgrtuguès, Bohtim de Filologia,2r2 t77-2o5, r96z-r96i lmtigo.
reptoduzidos, ampoL em L. q. lndlgf _C!n!1a, E,cudos de di,electologia portuguin, Lisboa, r9S3,
P. l-S-g+ e r6yzoz). Cite-se, ainda, Luis F. Lindley Cintra. Une frontière lexicale et phonétique dans
le domaine linguistique portugais. Boletim de Filologia, zoz 3118, 196r (artigo tambéh reeditado nos
referidos E$udoq p. gt-rot).

r8
DOMfrSIO ACTUAL DA LÍNGUA PORTUGT'ESA

enquanto ao Sul, do século XIII, se acentua progressivamente a pene-


^p^ttrt
tragdo e a eqpansào do estilo gótico.

Os dialectos das ilhas atlànticas.

Os dialectos falados nos arquipélagos atlànticos dos Agores e da Madeira


represent como era de esperar da história do povoamento destas ilhas,
desertas no momento em que os portugueses as descobrira um prolon-
gamento dos dialectos portugueses continentais.
Considerando a maior parte das caractedsticas fonéticas que neles se
observam, pode-se afrrma4 com maior precisào, que ptolongam o grupo dos
dialectos cefttro-rneridionais. Com efeito, ndo se encontram nos dialectos
agoreanos e madeirenses nem o [s] ópico-alveolat, nem a neutralizaEio da
oposigào entre lul /b/, nem a afuicada ffi dos dialectos setentrionais do
continente. Quanto "à nronotongagdo dos ditongos decrescentes [o*] e [ej],
observarn-se as mesmas tendèncias da llngua padrio: o ditongo [ow] reduz-se
normalmeîte
^ [o], mas a redugào de t"il a [.] é fenómeno esPoródico;
só ocore como norma na ilha de Sào Miguel.
Esta ilha, assim como a Madeira, constituern casos excepcionais dentro
do portugues insular. IndependenteÍlente uma da outra, ambas se afastam do
que se pode chamar L rrotfrr centro-rneridional por acrescentar-lhe lrfir cefro
número de tragos muito peculiares.
No que se refere àr ilha de Sao Miguel, os mais catactedsticos de enue
os tragos que afastam os seus dialectos dos das outras ilhas coincidem, curio-
samente, com os tfagos que, na Penlnsula, distinguem a rcgiào da Beira-
-Baixa e do Alto-Alentejo (e também, patcialmente, com os que se obser-
vam no ocidente do Algarve): a) o u tótrrco é articulado cor-no [ti]t tù,
rniila; b) o antigo ditongo oil ptoîvtrcia-se como lófz pòca, liira; c) o a tónico
tende para 0 aberto [c]: quase boîa por bata; Q avogalfnal grafada -o cai
ou reduz-se a lal: cop(a), cop(a)s, tfrd(a)' piik(a), pot copo, copos, tudo, pouco.
Quanto à ilha da Madeira, os seus dialectos apresentam caractedsticas
fonéticas singulares, que só esporadicamente (e nào todas) apatecern em dia-
lestos continentais. Assim, o il tónico apresenta-se ditongado em [aw], por
exemplo; fllcwa] por laa; o i tórnco em [ori], por exemplo: flforjÀcr] por
flbo. Por outro lado, a consoante l, ptecedida de i, palatalíza-se: flvaila]
por uila, flfailw] por fla (confundindo'se portanto, desse modo, fla com
flba).
NOVA GRÀMTTICA I'O PORTUGTTÉS CONIEMPORANEO

.al
.ll
i
lt.l
xonoesriruo;1,ì
t-
', ,,- --
-.'! ,
\ ),...:- -Òat-.

'r rt ,;z-t-'--r-2r-
| -r-- t
TERRTTORIO tNCARACTeníSrrCOi
rt
t
1t

II BAIANO
,!- - -a t
I
ì I

LIMITES COM O ESTRANGEIRO

- LIMITES ESTADUAIS
L|MITES DOS SUBFALARES

Areas lingulsticas do Brasil ldivisào proposta por Antenor Nascentes)

20
DoMfNIo ACTUAL DA LÍNGUA PoRTUGUESA

Os dialectos bmsileiros.

Com f3laEà;o ao extenslssimo teritótio brasileiro da lfngua portuguesa,


a insuficiència de informagóes dgorosamente cientlficas sobre ,r dif"iengrs
de natureza fonéuca, morfo-sintóctica e lexical que separam as vadedaàes
regionais nele existentes nào permite classificó-las em bases semelhantes às
que foram adoptadas na classificagào dos 4ialectos do pornrguès europeu.
Deve-se reconhecer, contudo, que a publicagào de dois atlas prévios regio-

-o do Estado da Bahiae e o do Estado de Minas Geraisl0-s a aflrn-


nais
ciada impressào do ió concluldo Atlas dos falares de Sergipel l, bem como a
elabotagdo de algumas monografias dialectais sào passos importantes no
sentido de suprir a lastna apontada.
Entre as classificagóes de conjunto, propostas com cardcter provisório,
sobrelevar pela indiscutlvel autoridade de quem a fez, a de Antenor Nas-
centes' fundada em observagóes pessoais colhidas nas suas viagens por todos
os Estados do pals.
A base desta proposta reside no caso do portugués europeu
em diferengas de pronrincia. -
De acordo com Antenor Nascentes, é posslvel distinguir dois grupos
de dialectosl2 brasileiros do Norte e o do sul-, tendo em cona dois
tragos fundamentais: -o
a) a abetttrra das vogais pretónicas, nos dialectos do Norte, €o pala-
vras que nào seiam diminutivos nern advérbios em -mente: pègar por pegar,
còrrer pot correr;
b) o que ele chama um tanto impressionisticamente <cadència> da
fala: foJa <<cantada>> no Norte, fala <descansadu no Sul. ^
A fronteira entte os dois grupos de dialectos passa por (ctrma zona que
ocuPa uma posigào mais ou menos equidistante dos extremos setentrional e
meridional do pals. Esta zona se estende, mais ou menos, da foz do rio
Mucuri, entre Espfuito Santo e Bahia, até a cidade de Mato Grosso, no
Estado do mesmo nome>> 13.

e Nelson Rossi. Atkt prfuio ù-s falares baiarcs. Rio de


Janeiro, MEC/INL, 1963.
-MEC/CasaJo-séRibeiro.et
al!.4!!oto de tm atlas tingaktico de ùíinas Gerait. t.ó RíoteJaneiro,
--11 4e Rui Batbosa/UFJF, ry77. ""1.
11 Elabotado pot-Nelson Róési, com a colaboragàode um grupo deprofessotes da Uni-
vemidade Fedetal da Bahia.
12.. Emptegamos o termo Drar.Ecro pelas nz6es aduzidas no C,apítulo
t e p^t mantefinos
o paralelismo com a designagào adoptada p-ara as vatiedades regionais'pototg...r"r. A" q""-;h*
rrramos aqui orer"ncro Nasceotes denomina suBFALAR.
13 Antenot Nascentes. O tingrajar carioca, z.o edigào completamente rcfundida. Rio de
Janeiro,-Sim6es, r953, P: zj. Por ser quàse despovoada, itr""t""teiistica t 6tea com-
"orr'.id"r"o"
Pleendida eotre a parte da fronteira boliviana e a ftonteita de Mato"1" Grosso com o Amazonas e o
Patà.

2t
NOV.A. GRAMITICA DO PORIT'GUÉS CONTEMPORANEO

J-'''€#-'
I g r,nr (a)
-_J

\
/
*e,.arl*rfla;er,nc ef;nr /x:,rl (A)
1l
t
itlrt/lcrfc o"','^'/o tù

..(a) ,n, *4o7rn,
91rnt( *,r,. (
e r,ne f éur,n1qr.tge
*!l*.e 12
(B)
ieit rei n ,,,
5ùtxtrre/ xl *.y'(B) ,J*-(:
*r,
^lo7ro, ^"
r,0, sll*u e rar -n;
uX
.-ff*ra . l9 *1, "'e ; g-a,lîa da rlt(s)
3l
r2rtl ,n.#n,/r,r)ria(A) sètxd€'
/
{9D
r? |
i0'. l3'rr {at n,^r18,/Ja,.re
5ó,
/
43
rE,ri (o 'n'f*"
r e *03, *aÍta,cY.n,
"l
tar

1lh
l, I iir 3{
nif , léÍ / '.oll*,, (Út"Yi,/
rtrtsù xur -L)
so
,
rr,r e
\D LY I |

{8D zzW
sòtrure
It I rÀr 33 2l 1
r6,l6ial rtt xa
! ,n,*r.7$,,rn da i,eolr,ró, xiî --t
fo tie'n
(
,l
I

i so, xli e talrèf ,


rtèîl
I
ro r,î) sè rur€ / r r I iò (A)
^t,^?t/'o ,* |

\36u ièirrèi (A)


\ \.- I
\^^.
Galinha d'Angola
\ *2,',*o n
Itt"'
Saq0é
Coca(r) ì
Gulné
Quenquém
) "/
x7;iò (a)

Conqudm /,rti
)
Caqtid
)
I
*., 0 l,li1a d?, 9 rlr ter
"ttl
\
xa (Bì
/
t2/
- '-il,ra (B)

Atlas prévio dos falares baianos, Por Nelson Rossi'


Catta n.o r 14
DoMÍNIo ACTUAL DA LÍNGUA PORTUGIJESA

Em cada grupo, distingue Antenot Nascentes diversas variedades a que


chama suBFALAREs. E enumera dois no gruPo Norte: a) o auazóNrco,
b) o NoRDEsrrNo. E quatro no grupo Sul: a) BArANo, b) o nruMrNENsE,
a) o rvrnwrno, /) o sulrsrA.

Assinale-se, por fim, que as condigóes peculiates da fotmagio lingulstica


do Brasil revelam uma dialecualizaEdo que nào parece tàro variada et5;o intensa
corno a porhrguesa. Revelarn, também, estas condigóes que a referida dia-
teúaltzagào é muito mais instóvel que a europeia.

O portuguès de Africa, da Asia e da Oceània.

No estudo das formas que veio a assumir allngaa portuguesa em .frfrica,


na Asia e na Oceànta, é necessório distinguir, pteliminarmente, dois tipos
de variedades: as cRrouLAS e as NÀo-cnroulas.
As variedades cnrour,as resultam do contacto que o sistema lingulstico
portuguès estabeleceu, a p^ttit do sécrrlo XV, com sistemas lingulsticos indl-
J

genas. Talvez todas elas derivem do mesmo pRoro-cRroulo ou r.ÍNcue


ftl.

FRANca que, durante os pdmeiros séculos da expansào porfirguesa, sewiu


de meio de comuntcaEào entre as populagóes locais e os navegadores, comer-
ciantes e missionórios ao longo das costas da Africa Ocidental e Oriental,
da Aróbia, & Pérsia, da fndia, da Malósia, da China e do Japio. Apatecem-
-nos, acnralmente, como resultados muito diversificados, mas com algumas
caracteústicas comnns ou, pelo rnenos, paralelas i[ue se rnanifestam
- -,
numa profunda transformaEào da fonologia e da morfo-sintaxe do por-
tuguès que lhes deu origem. O grau de afastarnento em relagio à llngua-
-màe é hoje de tal ordem que, mais do que como DrALEcros, os crioulos devem
ser considerados como r,fNcues derivadas do porruguès.
Os crioulos de origem porhrguesa em Afúca, que sào os de maior vita-
lidade, podem ser distribuldos especialmente em très grupos:

r. Crioulos do Arquipélago de Cabo Verde, com as duas vade-


dades:
a) de Barlavento, ao norte, usada nas ilhas de Santo Antào, Sào Vicente,
Sào Nicolau, Sal e Boavista;
b) de Sotaveflto, ao sul, utilizada nas ilhas de Santiago, Maio, Fogo
e Btava.

23
NovA GRAM.C.Trc.t Do PoRTucuÉs coNreùrpon.A'Nso

2. Crioulos das ilhas do Golfo da Guiné:


a) de Sào Tomé;
b) do Pdncipe;
c) de Ano Bom (ilha que pertence à Guiné Equatorial).

,. Crioulos continentais:
a) da Guiné-Bissau;
b) de Casamance (no Senegal).

Dos crioulos da Asia subsistem apenas:


a) o de MaLaca, conhecido pelas denominagóes de papió cristà0, nala'
gueiro, mahquîs, malaquenlto, nalaquense, serani, bahasa geragail e portugués basu;
- b) o de Macau, macaísta ou macauenho, ainda falado por algumas faml-
lias de Hong-Kong;
c) o de Sri-Lanka , falado por famllias de V"lpi* e Batticaloa;
d) os de Chaul, Korlai, Tellicherry, Cananor e Cochim, no território
da Uniào Indiana.

Na Oceània, sobrevive ainda o crioulo de Tugu, locdidade perto- de


Jacatta, na ilha de Javat+.

Quanto às variedades NÀo-cnroulAs, hó que considerat ndo só a pre-


senEa do pornrguès que é allngua oficial das repúblicas de Angola, de Cabo
Verde, da Guiné-Bissau, de Mogambique e de Sào Tomé e Pdncipe, mas
as variedades fatadas por uma parte da populagào destes Estados e, tam-
bem, de Goa, Damào, Diu e Macau, na Asia, e Timor, na Oceània. Trata..se
de um porcuguès com base na variedade europeia, mas rnais ou menos modi-
ficado, sobretudo pelo emprego de um vocabulório proveniente das llnguas
nativas, e a que nào faltam algumas caractedsticas próprias oo asPecto fono-
lógico e gramaúcal.
Estas caraúeústicas, no entanto, que divergem de tegiào pata rcgido,
ainda nào foram suficientemente observadas e descdtas, embora muitas
delas tfanspafel mî obff. de alguns dos modefnos escfitores desses palsesl5.

14 Sobte o estado actual dos crioulos portugueses, veia-se Celso Cunha. Llngua, nagdo, alic-
nagào.p1io de Janeiro, Nova Fronteira, ryAr, p. j7-ró6, onde se re-metg à bibliografia_especializ'ada;
aindalJosé é. Herculano de Caóathó, Deux langues créoles: le criól du Cap Vert et lefoto i
""1"-r",
de S. Tomé, em Biblos, 17, r-r5, r98t. ì
15 Sóbre alinguigem.íé deles, do maior significado, o3gs9lan9 Luandino Vieita, +
v. a tese recente de"À{Èhel Lab'drt,";n L'oeuorc littérairc de I-aandino Vieira, Paris 1979 (tese -do i
3f "iao apresentada em ry1g à Univetsidade de Paris-sotbonne); e a de Salvato Ttigo, Lsandino I
t
Vieira, o logoteîa, Porto, Brasília Editora, r98r. !

I
Lt

I
24 I
3
1
j'

I
I

También podría gustarte