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E ADULTOS NO BRASIL
ILLITERACY AMONG YOUTH AND ADULTS IN BRAZIL
Sérgio Haddad1
Universidade de Caxias do Sul
Filomena Siqueira1
Fundação Getúlio Vargas
Resumo
As políticas de erradicação do analfabetismo no Brasil vêm avançando
nas últimas décadas de maneira lenta e frágil, evidenciando a magnitude
da natureza do problema, que envolve não apenas a precariedade do
universo escolar, mas o peso das diferenças socioeconômicas e raciais,
historicamente presentes no país. São mais de 13 milhões de brasileiros e
brasileiras acima de 14 anos que não sabem ler nem escrever e um enorme
contingente de pessoas que, tendo passado pela escola, não tem o domínio
do letramento e não podem utilizá-lo para o desenvolvimento de suas
potencialidades em diferentes contextos ao longo de suas vidas. Buscando
refletir sobre essa realidade o artigo discute sobre e as dificuldades de se
fazer avançar a efetivação do direito à educação de jovens e adultos no
Brasil.
Palavras-chave: Analfabetismo. Educação de Jovens e Adultos. Brasil.
Abstract
The policies for eradicating illiteracy in Brazil have been improved in recent
decades, but in a slowly and fragile pace, demonstrating the magnitude
of the nature of the problem, which involves not only the precariousness
of the school universe, but the weight of socioeconomic and racial
differences, historically present in the country. There are more than 13
million Brazilians with 15 years old or more that don’t know how to read
or write and an enormous contingent of people that, although attending
school, still do not have the literacy domain and cannot use it to develop
their potential in different contexts throughout their lives. Aiming to
reflect on this reality this article discusses the difficulties of advancing
the implementation of the right to education of youth and adults in Brazil.
Key-words: Illiteracy. Youth and Adult Education. Brazil.
Figura 1 - Dez países que somam 72% da população mundial de adultos analfabetos
THE SIX EFA GOALS
Goal 4: Adult literacy
Figure 1.4.2: 10 countries account for 72% of the global population of illiterate adults
Number of illiterate adults, 10 countries with highest populations of illiterate adults, 1985-1994 and 2005-2011
300 –
287
287
250 –
1985–1994
2005–2011
200 –
183
Illiterate adults (millions)
150 –
50 –
40 –
30 –
20 –
10 –
0–
–
India –
China –
–
Pakistan* –
Bangladesh –
Nigeria –
Ethiopia –
Egypt –
Brazil –
Indonesia –
D. R. Congo* –
Ano Analfabetos %
1960 15.964.852 39,60
1970 18.146.977 33,60
1980 18.716.847 25,50
1991 19.233.758 20,07
2000 16.294.889 13,63
2011 12.865.580 8,60
2012 13.162.991 8,70
2013 13.335.365 8,50
2014 13.170.342 8,30
Fonte: IBGE/Censo Demográfico/Pnad 1960-2014. Elaborado por Ação Educativa, 2015.
Sobre educação e cultura popular neste período, ver BRANDÃO, 1984; BEISEGEL, 2000.
4
Sobre o histórico da Educação de Jovens e Adultos até os anos 90, ver HADDAD e DI PIERRO, 2000.
5
10.000.000 —
9.000.000 — 9.193.743
8.000.000 — 8.605.253
7.000.000 —
Urbana
6.000.000 —
Rural
5.000.000 — 5.366.696
4.565.089
4.000.000 —
3.000.000 —
2.000.000 —
1.000.000 —
0—
2006 2014
Fonte: Pnad/IBGE, 2014.
6 Como os dados entre os anos de cada década são retirados da PNAD – Pesquisa Nacional por Amostra
Domiciliar e tem caráter amostral, pequenas distorções podem ocorrer em relação aos Censos.
7 http://7a12.ibge.gov.br/vamos-conhecer-o-brasil/nosso-povo/caracteristicas-da-populacao.html
16.000.000 —
14.000.000 —
12.000.000 —
10.000.000 —
8.000.000 —
6.000.000 —
4.000.000 —
2.000.000 —
0—
2006 2014
Ver http://www.insper.edu.br/blogdocpp/desigualdade-de-renda-no-brasil-e-preciso-fazer-mais-naercio-
9
Brasil e Regiões 25% mais pobre 25-50% 50-75% 25% mais ricos
Brasil 13,1 12,3 6,0 2,0
Norte 11,2 10,6 12,0 4,4
Nordeste 19,4 17,4 22,9 8,4
Sudeste 6,6 8,0 3,6 1,0
Sul 6,9 6,6 3,4 1,1
Centro-Oeste 8,4 10,2 5,8 1,4
Fonte: IBGE/PNAD, 2014. Elaborado por Ação Educativa, 2015.
Analfabetismo funcional
10 http://www.acaoeducativa.org/index.php/educacao/50-educacao-de-jovens-e-adultos/10004473-
ipm-e-acao-educativa-mostram-evolucao-do-alfabetismo-funcional-na-ultima-decada
11 Com a aprovação da Lei Federal nº 11.247, de fevereiro de 2006, que alterou para nove anos a duração
do ensino fundamental com a matrícula obrigatória a partir dos seis anos de idade, o analfabetismo
funcional fica relacionado a não conclusão dos cinco anos iniciais do ensino fundamental, até então ele
referia a não conclusão dos quatro primeiros anos.
34,4
Brasil
40 — 27,1
26,2 Norte
35 — Nordeste
22,3 Sudeste
30 — 20 20,4 Sul
16,6 16,6 17,6
Centro-Oeste
25 — 16,1
12,7 13,8
20 —
15 —
10 —
5—
0—
2006 2014
Fonte: Pnad/IBGE, 2014. Elaborado por Ação Educativa, 2016.
O SAEB foi criado em 2005 e é composto por dois processos: a Avaliação Nacional da Educação Básica
12
(Aneb), que é realizada por amostragem das redes de ensino, em cada unidade da Federação e tem foco
nas gestões dos sistemas educacionais, e a Avaliação Nacional do Rendimento Escolar (Anresc), também
chamada de Prova Brasil com foco em cada unidade escolar.
fizeram 15 anos, à essa modalidade por não estarem sendo atendido no ensino
fundamental de forma adequada. A repetência e a evasão ainda são problemas
para a permanência do alunado na escola, fazendo com que muitas crianças
desistam antes de completar o ensino fundamental. Mais de 1 milhão de jovens
entre 15 e 17 anos estão fora da escola (Pnad/IBGE, 2014).
Ainda que as taxas de repetência e evasão tenham apresentado um ritmo
de queda entre 2005 e 2012, o que permitiu elevar a taxa de promoção de 73%
para 86% nesse período, e reduzir a distorção idade-série13 nos anos finais do
ensino fundamental de 28,6%, em 2009, para 27,3%, em 2014, a distorção
idade-série, na média nacional, ainda é significativa, sendo 13,2% maior nos
anos finais no ensino fundamental do que nos anos inicias, além de apresentar
fortes diferenças entre as regiões do país, com o Norte apresentando uma taxa
de 39,3%, em 2014, e o Sudeste 18,75%. Quando analisados em relação ao
nível socioeconômico, a taxa de conclusão do ensino fundamental na idade
adequada é de 94% entre os mais ricos, caindo para 59,6% entre o quartil
mais pobre.
É esta situação que alimenta a composição do enorme contingente de
pessoas que, mesmo tendo passado pela escola, não consegue se alfabetizar
com qualidade para que se mantenha autônomo no uso da escrita e da leitura.
Apesar do aumento na oferta de vagas no ensino fundamental regular, e a
melhoria na promoção do alunado ao longo das últimas décadas, o atraso
acumulado na escolaridade cria uma demanda potencial significativa por
políticas de educação de jovens e adultos (EJA).
Entretanto, as tendências nessa área não são de expansão. De acordo com
os dados do Censo de 2010, havia 65 milhões de brasileiros e brasileiras com
15 anos de idade ou mais sem instrução ou que não completaram o Ensino
Fundamental e 22 milhões que não completaram o ensino médio, totalizando
87 milhões de pessoas14. Em 2014, havia 13.170.342 brasileiros sem instrução
e mais 28.029.368 funcionais, totalizando 41.199.710 pessoas elegíveis à EJA
(CENSO ESCOLAR, 2014). Desse universo, o total de pessoas de 15 anos ou
mais frequentando cursos de jovens e adultos presenciais somava 3,1 milhões,
estando 2,1 milhões no nível fundamental e 1 milhão no médio, muito aquém
da demanda potencial indicada. Desse público em potencial a maior parte
estava com mais de 30 anos de idade e aproximadamente 20% estava acima
de 50 anos de idade, em 2010, conforme o gráfico abaixo.
13
A distorção idade-série considera as crianças e adolescentes com mais de 2 anos de atraso em relação
a série considerada apropriada para sua idade.
14 Ribeiro, V; Catelli Jr., R; Haddad, S. A Avaliação da EJA no Brasil: insumos, processos, resultados. 2015
35.000.000 — 34.831.824
30.000.000 —
25.000.000 — 24.741.658
20.949.252
20.000.000 —
15.000.000 — 13.978.078
13.394.538
9.599.696
10.000.000 —
5.000.000 —
0—
15 a 19 15 a 19 15 a 19 15 a 19 15 a 19 15 a 19
anos anos anos anos anos anos
Fonte: IBGE/Censo 2010. Elaborado por INEP, 2010.
15 Os repasses financeiros da União são divididos entre constitucionais, automáticos e voluntários. O pri-
meiro tipo é composto por recursos arrecadados em um nível de governo e repassado a outro por força
de determinação constitucional, como são os recursos que compõem o FUNDEB O repasse automático
é regulado por leis específicas que determinam a transferência e aplicação de recursos, dispensam
convênios ou contratos sendo repassadas diretamente para o beneficiário. É o caso do Programa Brasil
Alfabetizado. Por fim, os voluntários são recursos repassados da União a estados, ao Distrito Federal
e aos municípios, a título de cooperação, auxílio ou assistência financeira, muitas vezes em forma de
convênio.
16 Education at a Glance 2015, OECD Indicators. Disponível em: <http://www.oecd-ilibrary.org/education/
education-at-a-glance-2015_eag-2015-en>.
Conclusão
Referências
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