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A criminalização dos cientistas na

era dos ataques às universidades


https://www.cartacapital.com.br/sociedade/a-criminalizacao-dos-cientistas-na-era-dos-ataques-as-universidades
Por Soraya S. Smaili — publicado 13/03/2018 00h30, última modificação 12/03/2018 17h01
O episódio da intimação de Elisaldo Carlini, um dos pioneiros da
farmacologia no País, reforça a perseguição aos pesquisadores

O caso das recentes acusações feitas ao Prof. Elisaldo Carlini assustou e indignou

Estamos vivendo momentos de muita agitação e que têm nos levado à comoção, e agora
os holofotes se voltam às universidades e a à ciência.

A era do ataque às universidades e à ciência recomeçou no ano passado (havíamos visto


isso na década de 1990). Primeiro vieram notícias de degradação, de distorção do fazer e
do trabalho desenvolvido nas universidades públicas, na saúde pública, na pesquisa e na
ciência em prol do desenvolvimento do país.
Leia também:
"Universidade é espaço de crítica", diz professor da disciplina sobre golpe na UFBA
Após UnB, outras universidades lançam disciplina sobre o golpe de 2016
Depois, um relatório do Banco Mundial que pretende realizar uma análise sobre o gasto
público do Brasil e identificar alternativas para a redução do déficit fiscal, mas desconhece
a realidade brasileira, o perfil sócio econômico dos atuais estudantes e o custo do aluno
em uma universidade que tem pós-graduação e extensão.
Surpreendidos e bastante chocados, recebemos a notícia da prisão humilhante do reitor da
UFSC, sem provas, e que o levou ao suicídio. Passados vários meses, nada se provou
contra o reitor, que perdeu a vida para não perder a honra. Algumas semanas depois,
outro reitor, o da UFMG, juntamente com vários outros ex-reitores, foi levado
coercitivamente para depor sobre algo que ele poderia ter falado sem qualquer problema
ou impedimento. Bastava chamar.
Agora inauguramos mais uma etapa: a da criminalização de cientistas. Esses seres
ilibados, que vivem para estudar, que deixam de lado o descanso, a família, o sono e que
muitas vezes passam a vida de maneira simples, apesar do esmero intelectual.

Não raro são professores que formaram muitos profissionais que se tornaram importantes
e ricos. Estudam e pensam para conseguir entender os princípios da vida ou formar novos
conceitos, ou descobrir o que pode trazer o bem para alguém, o alívio para uma doença, a
descoberta de um novo método de diagnóstico, de uma nova vacina, de uma nova forma
de construção de casas, de um novo aparelho para a comunicação, de novas tecnologias
para a indústria, para a pesca, para a agricultura, que fazem cálculos, descobrem
teoremas ou que pensam como se organiza o universo.

O caso das recentes acusações feitas ao Prof. Elisaldo Carlini nos assustou e nos
indignou. Professor emérito da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e da Escola
Paulista de Medicina (EPM/Unifesp), Carlini é um dos pioneiros da Farmacologia do nosso
país. Infelizmente, vem sendo criminalizado em razão de sua pesquisa sobre drogas
medicinais à base de cannabis sativa (princípio ativo da maconha), pelo qual é
internacionalmente reconhecido. Foi intimado a depor à polícia de São Paulo no dia 21/2,
sob a acusação de fazer apologia ao crime, devido à sua pesquisa.

O Prof. Elisaldo Carlini formou-se em Medicina pela Escola Paulista de Medicina


(EPM/Unifesp) em 1956 e é um dos maiores especialistas em entorpecentes do Brasil, um
dos mais respeitados internacionalmente, tendo estudado os efeitos da maconha e de
outras drogas em nível experimental durante toda sua vida profissional.
Leia também: O lugar da universidade pública na defesa da democracia
Ao longo dos seus 88 anos, foi condecorado duas vezes pela Presidência da República por
seu trabalho como pesquisador, citado 12 mil vezes em pesquisas científicas nacionais e
internacionais. Foi presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e
membro do Conselho Econômico Social das Nações Unidas (Ecosoc/ONU).

Doutor honoris causa de inúmeras universidades e instituições dentro e fora do país,


Carlini também é diretor do Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas
(Cebrid), está no sétimo mandato como membro do Expert Advisory Panel on Drug
Dependence and Alcohol Problems, da Organização Mundial da Saúde (OMS). E continua
ativamente debruçado em suas pesquisas experimentais, bem como na formação de
doutores nessa área. Sua carreira e sua trajetória como intelectual e cientista demonstram
claramente que o Prof. Carlini vive uma vida acadêmica em dedicação exclusiva. Sem
nenhum outro sentido a não ser o desenvolvimento da ciência.
Os fatos ocorridos com Carlini não nos desanimam, simplesmente nos mostram o quão
importante é defendermos o nosso legado, o nosso país. O quanto queremos fazer ciência
e produzir conhecimento e não simplesmente comprar conhecimento a um alto preço. Em
um momento em que as universidades públicas, que desenvolvem pesquisa de qualidade,
lutam para continuar realizando ciência e formar profissionais, além de projetos sociais,
torna-se ainda mais importante defender a vida e a obra do Prof. Elisaldo Carlini, um
símbolo no qual devemos nos espelhar.

Desde então, inúmeros atos têm sido realizados em seu favor, cartas de apoio foram
escritas e um abaixo-assinado, iniciado pela Sociedade Brasileira para o Progresso da
Ciência (SBPC) e Academia Brasileira de Ciência (ABC), já recebeu milhares de
assinaturas.

Ao nos solidarizarmos com Carlini, reafirmamos o quão fundamental é o desenvolvimento


científico, sem o qual não se pode conquistar a evolução da condição humana. Só assim
atuaremos por um conhecimento universal, pela ciência e, principalmente, pela liberdade.

*Soraya S. Smaili é professora e reitora da Universidade Federal de São Paulo.

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