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autor do original
MARIA BEATRIZ GAMEIRO
1ª edição
SESES
rio de janeiro 2015
Conselho editorial luís cláudio dallier, roberto paes e gladis linhares
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida
por quaisquer meios (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em
qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Editora. Copyright seses, 2015.
isbn: 978-85-5548-156-7
cdd 469.5
Apresentação 7
Fala e escrita 26
Norma padrão, norma culta e norma popular 28
Construções da norma padrão e da norma coloquial:
correções dos desvios mais comuns 29
Nunca uma palavra foi tão apropriada: prólogo. Veio do Grego, passou pelo Latim
“prologus” e chegou ao Português “prólogo”. Designava a primeira parte da tragédia,
também uma palavra vinda do Grego “tragoidía”, composta de “tragos”, bode, e “oidé”,
canção, significando “canção do bode”: nas tragédias gregas era sacrificado um bode
enquanto o coro cantava.
Nós vivemos uma tragédia no ensino do Português. Faz décadas que professores,
pagos pelo Estado, por mantenedoras privadas ou por universidades comunitárias para
ensinar a norma culta do Português, deformam este ensino à base de um vale-tudo, em
que a norma culta não vale nada, praticando crimes de lesa-língua. E fazem isso com
uma disciplina estratégica, pois todas as outras disciplinas são ensinadas em Português!
Na Universidade Estácio de Sá, como em outras instituições de qualidade, o ensino
do Português vem merecendo atenção especial. A Língua Portuguesa é a menina dos
olhos da Estácio.
Meia dúzia de coisas que nunca falharam: você vai ouvir, falar, ler e escrever
melhor (e passar com folga em todas as AVs), se:
1) Assistir a todas as aulas;
2) Fizer as tarefas que os professores indicarem;
3) Ler todos os dias, nem que seja um pequeno trecho;
4) Consultar as obras de referência, como gramáticas e dicionários;
5) Ler os livros indicados;
6) Escrever alguma coisa todos os dias, nem que seja um recado a seus amigos.
1 As Palavras
O brasileiro fala bastante. E fala bem. Talvez não preste a devida atenção ao
que o outro fala. Começa na infância. "Quantas vezes eu já te disse para não fa-
zer isso, menino?". Ou: "Eu já te disse mil vezes que eu não quero ouvir palavrão
nesta casa", "eu te mato" etc.
Esta mãe imaginária usava bem o vocativo, com a pausa antes dele, que na
escrita levou uma vírgula. Ela invocava expressões de linguagem que todos co-
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nhecemos.
Mil vezes? Ainda que as admoestações fossem muito repetidas, talvez não
passassem de algumas dezenas, acompanhadas de ameaças de morte de brin-
cadeirinha, como faz toda mãe. Ela sabia que a língua portuguesa, ao lado de
olhares e gestos repreensivos ou de aprovação, era poderoso recurso para edu-
car os filhos.
Como se sabe, a educação começa em casa. Foi lá, aliás, que você aprendeu
a ouvir e a falar em Português. Seu pai foi seu primeiro professor. Sua mãe foi
sua primeira professora. Por isso, a língua portuguesa é sua língua materna,
palavra que veio do Latim materna, isto é, que se refere à mater, "mãe".
Escolas e universidades dão instrução e ajudam a educar os alunos, mas to-
dos os professores sabem que os alunos estão sob seus cuidados apenas um
sexto do dia. E os mestres precisam ensinar-lhes um cesto de coisas. O tempo é
pouco. Se a casa, a empresa, a mídia e a rua (lugares onde os discípulos passam
a maior parte do tempo) não colaboram com a escola e com a universidade, a
tarefa fica muito mais difícil. Sim, a boa empresa facilita a formação de seus
empregados, isto é um investimento para ela.
Nas ruas, nas estradas e em outros lugares públicos, cartazes com erros de
Português infiltram na mente de todos formas erradas de escrever! Programas
de baixo nível no rádio, na televisão, na internet etc. são outros empecilhos na
tarefa de ensinar. Como se sabe, muito ajuda quem não atrapalha. E esses erros
são como uma virose. Se o organismo não tem as devidas defesas, contrai doen-
ça de escrever mal antes de aprender a escrever bem.
Mas, se falamos bem, por que escrevemos tão mal? Uma campanha convida
ou ordena "Avança Brasil". Foram gastos milhões de reais para imprimi-la em
cartazes e exibi-la na televisão e na internet. Está errada. Não puseram vírgula
depois de "avança" e antes de "Brasil".
Hora do recreio
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alunos devem pontuar o texto como se fossem os advogados dos herdeiros. Di-
vididos em quatro grupos, cada um dos grupos deve defender o sobrinho (1), a
irmã (2), o padeiro (3) ou os pobres (4).
As respostas corretas são:
1) O sobrinho pontuaria assim: Deixo meus bens à minha irmã? Não! A meu
sobrinho. Jamais será paga a conta do padeiro. Nada dou aos pobres.
2) A irmã, assim: Deixo meus bens à minha irmã. Não a meu sobrinho. Jamais
será paga a conta do padeiro. Nada dou aos pobres.
3) O padeiro, assim: Deixo meus bens à minha irmã? Não! A meu sobrinho?
Jamais! Será paga a conta do padeiro. Nada dou aos pobres.
4) Os pobres, assim: Deixo meus bens à minha irmã? Não! A meu sobrinho?
Jamais! Será paga a conta do padeiro? Nada! Dou aos pobres.
Erros de ortografia
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Cláudio Moreno, nosso colega de docência na Estácio há muitos anos, em
Guia Prático do Português Correto (vol. 1 - Ortografia), livro indicado na biblio-
grafia desta disciplina, lembra que em Inglês a palavra lives é pronunciada /livz/
quando significa "vive, mora, reside", e /laivz/ quando quer dizer "vidas". Você
escreve key e pronuncia o conjunto "ey" como /i/, mas no pronome they (eles,
elas), a pronúncia é /êi/. Em he goes ("ele vai"), você diz /gous/, mas o mesmo
encontro "oes", pronunciado /ous/ neste verbo, muda para /us/ em my shoes
("meus sapatos"), que você pronuncia /mai shus/.
Outras amostras de que o Português tem uma grafia mais simples do que a
do Inglês: para typography, pharmacy, theater, psychology, escrevemos tipo-
grafia, farmácia, teatro, psicologia.
O objetivo deste livro é ajudar os alunos a aprender a Língua Portuguesa. É
uma língua que os alunos já sabem, mas ainda não sabem o suficiente. De todo
modo, não é uma língua estrangeira. Se estivéssemos ensinando Inglês, Espa-
nhol, Latim, Russo ou Mandarim, os métodos seriam outros.
Mas por que ensinamos Português? Porque os alunos precisam muito
aprender a ler e a escrever numa língua que já entendem e falam.
Se o professor disser ou escrever "minha colega ficou rubicunda, mas abriu
uma exceção e deu um ósculo no mancebo", provavelmente o aluno irá ao dicio-
nário em busca de saber como se escreve e o que querem dizer as palavras escri-
tas em maiúsculas. De 14 palavras, ele provavelmente não sabe o significado de
apenas três. E tem dúvida de como se escreve exceção.
É um índice muito alto de conhecimento do vocabulário que ele precisa
saber para compreender o texto, uma vez que já conhece 78,58% das palavras
empregadas.
Na verdade, quando você lê qualquer texto ― uma notícia, uma petição, um
salmo, uma bula de remédio, um relatório, um poema, um conto, um trecho
de romance etc. — é provável que você conheça a maioria das palavras que ali
aparecem, pois elas se repetem muito.
Se você gosta mais de números do que de letras, faça um exercício curioso.
Aplique ao texto escolhido a Lei de Zipf, formulada pelo filólogo, linguista e es-
tatístico George Kingsley Zipf, da prestigiosa Universidade de Harvard.
Estudando a obra de James Joyce, famoso escritor irlandês de língua ingle-
sa, ele mostrou que no livro Ulisses, tido como um dos romances mais difíceis
de ser lido e entendido em todos os tempos (inclusive nas traduções), a palavra
mais comum aparece 8.000 vezes. Examinando muitos outros textos, concluiu
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que a maior parte de qualquer texto é coberta pelas palavras mais usadas na
língua.
Concluímos desta lei que somos capazes de entender qualquer texto, tendo
um bom vocabulário. E que para as palavras desconhecidas, só o que precisa-
mos é de um dicionário.
Quando ouvirem o texto "minha colega ficou rubicunda, mas abriu uma ex-
ceção e deu um ósculo no mancebo", os alunos provavelmente irão ao dicioná-
rio para certificar-se de como se escreve exceção, mas eles sabem que exceção
quer dizer "exclusão, algo fora da norma, fora do comum" naquele contexto. E
provavelmente sabem também, sem consultar o dicionário, como são escritas
as três restantes, embora sejam de uso raro, pois elas são escritas como pronun-
ciadas. Talvez aqueles que não conhecem a forma correta mancebo, escrevam
a forma errada "mansebo"... Mas, então, o problema será facilmente resolvido,
pois "mansebo" não existe.
O ditado, uma antiga prática das salas de aula, ajudava muito nisso. Nas pri-
meiras séries do ensino fundamental, a professora pronunciava palavras que os
alunos deveriam escrever.
O passo seguinte é saber o significado das palavras até então desconheci-
das, aquelas três marcadas: rubicunda, ósculo e mancebo.
Um bom dicionário ou um bom professor ou uma boa professora lhes ex-
plicará que rubicunda é da mesma família de rubrica, porque antigamente as
primeiras letras dos capítulos dos livros eram escritas com tinta vermelha. E
também é parecida com rubéola, infecção percebida por exantema de man-
chas vermelhas. Também são parentes o rubor nas faces e a cor rubro-negra
de clubes como o Flamengo, duas cores que, juntas ou separadas, estão nos
uniformes de muitos clubes brasileiros de futebol, como o Corinthians, o In-
ternacional, o Sport do Recife, o Vasco, o Grêmio, a Ponte Preta, o Atlético (do
PR, de MG etc.).
Mas, voltemos à palavra exantema, que o dicionário usou para explicar ou-
tra. Não se assustem! Os dicionários às vezes usam palavras ainda mais desco-
nhecidas para explicar aquela que você procurou.
Aliás, é um lado bom dos dicionários, longe de ser um defeito. Você atira
no que viu, acerta no que não viu, como diz o ditado, talvez antiecológico. Você
procura exantema e descobre que a nova palavra, que você não procurou, veio
do Grego eksanthéma, "florescência, florido", porque as feridas de tal enfermi-
dade semelham flores desabrochando sobre a pele.
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O dicionário é uma festa, aonde você vai com quem já conhece e descobre
desconhecidos que são ainda mais interessantes. E que você não procurava,
mas que podem vir a ser seus novos amigos.
A seguir, você procura ósculo, cujo significado é "beijo", que veio do Latim
osculum, "boquinha", diminutivo de os, "boca", assim como minúsculo veio do
Latim minisculum, diminutivo de minus, que significa "pequeno". Então, mi-
núsculo quer dizer "muito pequeno".
Por fim, procura mancebo, que quer dizer "jovem, moço". Na antiga Roma,
manceps, de onde veio a palavra, era o escravo jovem que ficava no quarto, to-
mava as roupas do senhor nas mãos e o ajudava a vestir-se.
Os escravos foram cartões de crédito e de débito, ainda antes de existirem
estes plásticos de tanta utilidade: ninguém fazia nada sem eles!
O feminino manceba designou a amante, a concubina, a mulher jovem que
ficava no quarto do senhor fazendo mais do que segurar as roupas dele, aju-
dando-o a vestir-se. Talvez o ajudasse mais a desvestir-se, ela mesma se des-
pindo junto. Outras palavras e expressões vieram do mesmo étimo, de que são
exemplos mancebia e amancebado, palavras que aparecem em numerosos do-
cumentos do Brasil colonial e imperial, dando conta de que os senhores das
casas-grandes não apenas visitavam as senzalas, como frequentemente viviam
amancebados com as próprias escravas, com elas gerando filhos, que eram
escravizados também. A expressão "Fulano tem um pé na cozinha" também
exemplifica isso, apesar do ponto de vista preconceituoso, pois poderia ser des-
cendente de um escravo com um pé no quarto da casa-grande.
Como vimos, é preciso conhecer o vocabulário empregado num texto, não
apenas porque esta tarefa é indispensável para compreender o texto, como tam-
bém pela viagem que as palavras nos levam a fazer, cheia de escalas em pontos
e portos interessantíssimos.
Na busca pelo significado das palavras que ainda lhe são desconhecidas,
você não pode desprezar o contexto em que foram empregadas. O mancebo de
que fala o texto não é o "móvel ou o pedaço de pau em forma de cabide", uma
vez que "minha colega ficou rubicunda, mas abriu uma exceção e deu um óscu-
lo no mancebo". Ela não ficaria vermelha se tivesse que beijar um móvel.
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2 Reflexões para você estudar Português
1. O domínio da língua materna é requisito fundamental para o sucesso em
qualquer campo de atividade. Independentemente do curso escolhido na Uni-
versidade, ler e escrever com proficiência é indispensável para que o acadêmico
possa participar da sua área de saber, qualquer que seja ela.
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Pero Vaz de Caminha, relatou... Camões cantou seus amores, Vieira pregou na
Igreja contra as invasões holandesas, falando a colonos, índios e escravos.
6. Foi por causa disso, por exemplo, que a escola dispendeu tanto esforço para
ensinar a vocês a conjugação completa dos verbos, incluindo o vós. Como enten-
der uma frase clássica como "Vinde a mim as criancinhas" sem conhecer a flexão
do verbo na 2ª pessoa do plural?
7. Mito: "Como nunca pretendo usar essas formas, elas não são importantes
para mim". Na verdade, "usamos" um vocábulo não só quando o empregamos
numa frase, mas também quando o compreendemos ao vê-lo num texto de ou-
trem. Por exemplo, o costume de não trabalhar, na escola, com a 2ª pessoa do
plural na conjugação dos verbos ― sob a alegação infantil de que "ninguém usa
mais esta forma" acarreta uma série de problemas na compreensão de textos tão
simples e fundamentais como, por exemplo, as orações: “Pai nosso que estais
nos céus, santificado seja o vosso nome; venha a nós o vosso reino, seja feita a vos-
sa vontade, assim na terra como no céu. O pão nosso de cada dia nos dai hoje; per-
doai-nos as nossas ofensas, assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendi-
do; e não nos deixeis cair em tentação, mas livrai-nos do mal. Amém.” Ou: “Ave,
Maria, cheia de graça, o Senhor é convosco; bendita sois vós entre as mulheres,
bendito é o fruto do vosso ventre, Jesus. Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós,
pecadores, agora e na hora de nossa morte. Amém.”
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trabalho de milhões de falantes. Outra coisa bem diferente é o uso que cada um
de nós faz desse repertório. Cada um de vocês tem um discurso próprio — cada
um usa o sistema à sua maneira, de acordo com sua formação, sua idade, sua
região ou simplesmente o grau de consciência com que se relaciona com a lin-
guagem. Por isso, ver como os outros usam ou usaram a língua aumenta o nos-
so repertório de possibilidades e nos ajuda a definir o estilo que preferimos e o
que realmente nos desagrada. O uso individual pode mudar a língua? Se houver
a concordância de muitos indivíduos, sim. Há quem se escandalize com as mu-
danças, mas não podemos esquecer que, se ocorrerem, tudo vai se dar dentro do
sistema próprio do nosso idioma. Invariavelmente, elas são feitas para tornar o
sistema ainda mais homogêneo. Os "erros" que as pessoas cometem — que, não
por acaso, são os mesmos em todo o país — revelam pontos de atrito com a nor-
ma culta, em que os discursos individuais acabarão inconscientes, mas inexora-
velmente, limando e polindo o sistema.
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3 Frase, Oração, Período, Parágrafo, Texto
"Uma noite destas, vindo da cidade para o Engenho Novo, encontrei no trem da Cen-
tral um rapaz aqui do bairro, que eu conheço de vista e de chapéu." (abertura de Dom
Casmurro)
"Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria.” (final de
Memórias Póstumas de Brás Cubas)
"Naquele dia – já lá vão dez anos! -, o dr. Félix levantou-se tarde, abriu a janela e cum-
primentou o sol. (...) Alegres com vermos o ano que desponta, não reparamos que ele é
também um passo para a morte." (abertura de Ressurreição)
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Almeida, autor de Memórias de um Sargento de Milícias. Em seguida, recebeu
ajuda de Quintino Bocaiúva (homenageado no nome de um bairro no Rio, co-
nhecido mais como Quintino apenas, onde nasceu o jogador Zico) e de Salda-
nha Marinho (pernambucano, que governou São Paulo e foi um dos autores de
nossa primeira Constituição).
Mas quem mais ajudou Machado de Assis foi a portuguesa Carolina Augus-
ta Xavier de Novais, uma solteirona de 35 anos, bonita, culta e elegante, que ele
desposou aos 30 anos. Ela vinha de uma desilusão amorosa com um português,
e a família dela não queria que a moça casasse com um mulato. O casamento
aconteceu, mas eles não tiveram filhos. O motivo foi confessado em comple-
xas sutilezas, como era de seu estilo, no fechamento de Memórias Póstumas
de Brás Cubas: “Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da
nossa miséria.”
Por que estas explicações e por que estes trechos? O livro é o pão nosso de
cada dia, o pão do espírito. Ele nos alimenta a alma. E nos ajuda a aprender
Português.
Depois do vocabulário, vamos às frases e orações que compõem um perío-
do. Um ou mais períodos formam um parágrafo. Um ou mais parágrafos for-
mam um texto, que pode ser dividido em capítulos, como faz Machado nos seus
romances.
O Português tem algumas singularidades. A maioria das palavras não tem
acento. A maioria das palavras é paroxítona, isto é, a sílaba mais forte é a penúl-
tima: abacate, bergamota, cavalo, ditado, escola, faculdade, ginecologista, hos-
pedagem, idealista, juramento, laranja, moleque, narciso, obcecado, potranca,
quadrado, recado, sulfato, timaço, umbanda, varanda, xavante, zeloso.
A ordem direta é predominante no Português. Isto é, para arrumar as pa-
lavras e construir frases e orações, a ordem é a seguinte: primeiro o sujeito;
depois o verbo; por último, o(s) complemento (s). O professor ensinou concor-
dância verbal (ontem, na aula a distância, com exemplos na lousa eletrônica).
O aluno aprendeu a lição (com leitura, exemplos e exercícios feitos em casa).
Mas podemos construir frases também com outras ordens: complemento,
verbo, sujeito; verbo, complemento, sujeito; verbo, sujeito, complemento.
Machado de Assis, na abertura de Dom Casmurro, usou complemento(s)
(uma noite destas, vindo da cidade para o Engenho Novo), sujeito oculto, ver-
bo (encontrei), complemento(s) de novo (no trem da Central um rapaz aqui do
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bairro, que eu conheço de vista e de chapéu).
No fechamento de Memórias Póstumas de Brás Cubas, ele usa a ordem di-
reta: sujeito oculto, verbo (Não tive) complemento (filhos), e a seguir emenda
outra frase com sujeito oculto, verbo (não transmiti) complementos (a nenhu-
ma criatura o legado da nossa miséria).
Notem que as frases ou orações formam um ou mais períodos, como tam-
bém ocorre neste último caso, na abertura do romance Ressurreição, quando
ele usa complementos (Naquele dia – já lá vão dez anos! ), sujeito (o dr. Félix),
verbo(s) (levantou-se tarde, abriu a janela e cumprimentou o sol). (...) sujeito
oculto, verbo (estamos) complementos (Alegres com vermos o ano que despon
ta), e sujeito oculto de novo, verbo (não reparamos), complementos (que ele é
também um passo para a morte).
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2) Capítulo I de Ressurreição. Primeiro parágrafo.
“Naquele dia, — já lá vão dez anos! — o Dr. Félix levantou-se tarde, abriu
a janela e cumprimentou o sol. O dia estava esplêndido; uma fresca bafagem
do mar vinha quebrar um pouco os ardores do estio; algumas raras nuvenzi-
nhas brancas, finas e transparentes se destacavam no azul do céu. Chilreavam
na chácara vizinha à casa do doutor algumas aves afeitas à vida semi-urbana,
semi-silvestre que lhes pode oferecer uma chácara nas Laranjeiras. Parecia que
toda a natureza colaborava na inauguração do ano. Aqueles para quem a idade
já desfez o viço dos primeiros tempos, não se terão esquecido do fervor com que
esse dia é saudado na meninice e na adolescência. Tudo nos parece melhor e
mais belo, — fruto da nossa ilusão, — e alegres com vermos o ano que despon-
ta, não reparamos que ele é também um passo para a morte.”
Por fim, recomendamos que você faça boas leituras. Como estas, de Macha-
do de Assis, nosso maior escritor. Você vai aprender Português com os mestres
da língua portuguesa. E este é o maior deles.
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1
Nem todo brasileiro
fala do mesmo jeito
Apresentação do capítulo
OBJETIVOS
• Conceber fala e escrita não como modalidades opostas, mas como um continuum de diferenças;
• Apreender a variação linguística e a adequação da linguagem;
• Analisar as diferenças entre a norma padrão, culta e coloquial;
• Conhecer alguns usos linguísticos recomendados pela norma padrão.
REFLEXÃO
Você se lembra?
Você já parou para refletir sobre o papel central que a língua ocupa em nossas vidas? Cer-
tamente sim, pois utilizamos a língua e a linguagem nas mais diversas situações. A todo
momento, usamos a fala, a escrita, gestos, símbolos, sinais e outras formas para nos comu-
nicarmos. Mas você já observou que a língua que usamos para falar em situações informais
com nossos amigos íntimos e parentes é diferente da língua que empregamos em situações
formais, com chefes no trabalho, em reuniões de negócio, pessoas com as quais não temos
intimidade etc.? Reparou também que, dependendo do canal por meio do qual nos comunica-
mos ou nos expressamos, a nossa língua muda? A linguagem das redes sociais é distinta das
encontradas em romances, artigos de opinião veiculados em jornais etc. Toda essa reflexão
envolve uma teoria básica sobre língua, linguagem, gêneros textuais, adequação da lingua-
gem e outros termos que você conhecerá neste capítulo.
22 • capítulo 1
O Professor Luís Cláudio Dallier, no livro Comunicação e Expressão, trata da
variação linguística. Ele a define como o fenômeno de uma língua que sofre
variações ao longo do tempo, do espaço geográfico, do espaço ou da estrutura
social, da situação ou do contexto de uso. Isso significa dizer que uma língua
está sujeita a reajustar-se no tempo e no espaço para satisfazer às necessidades
de expressão e de comunicação, individual ou coletiva, de seus usuários.
Essas perguntas evidenciam que nossa fala pode variar de acordo com a si-
tuação ou com o contexto da comunicação, conforme as pessoas que nos ou-
vem, o assunto de que estamos tratando ou a intenção de nossa mensagem.
capítulo 1 • 23
Outra forma de abordarmos a variação linguística é por meio da constata-
ção de variações no uso da língua em algumas dimensões:
24 • capítulo 1
exemplo. E, mais recentemente, também da internet.
capítulo 1 • 25
guiu hontem para Sorocaba, afim de obter aguas remanciais (...) para ser exami-
nada aqui bacteriologica e chimicamente, aver se pode servir o abastecimento
de agua daquela cidade.”
Jornal O Estado de S. Paulo, de 11 de março de 2000:
“O governador do Rio, Anthony Garotinho, disse ontem que a principal cau-
sa da morte de 132 toneladas de peixes e crustáceos na Lagoa Rodrigo de Freitas
(...) foi o excesso de peixes e não o lançamento clandestino de esgoto.”
É comum ouvirmos que a fala é informal e a escrita, formal; que a fala não
é planejada e que a escrita é planejada; que a fala é repleta de “erros” e a escri-
ta não; que a fala é contextualizada e a escrita, descontextualizada etc. Porém,
essa visão dicotômica não está correta, visto que há muitos gêneros textuais de
língua falada que seguem os preceitos da norma padrão, como por exemplo,
uma conferência, as notícias veiculadas nos grandes telejornais, uma sentença
proferida por um juiz, um discurso político bem planejado, uma mesa-redonda
etc. Por outro lado, existem exemplos de escrita informal, como bilhetes, reca-
dos em redes sociais e outros repletos de informalidades, como bem explica
Marcuschi (2010, p. 9):
Em certos casos, as proximidades entre fala e escrita são tão estreitas que parece
haver uma mescla, quase uma fusão de ambas, numa sobreposição bastante grande
tanto nas estratégias textuais como nos contextos de realização. Em outros, a distância
é mais marcada, mas não a ponto de se ter dois sistemas linguísticos ou duas línguas,
como se disse por muito tempo. Uma vez concebidas dentro de um quadro de inter-re-
lações, sobreposições, gradações e mesclas, as relações entre fala e escrita recebem
um tratamento mais adequado, permitindo aos usuários da língua maior conforto em
suas atividades discursivas.
Dessa forma, Marcuschi sugere uma distinção entre fala e escrita baseada
em suas características estruturais, tais como se evidencia no quadro a seguir:
FALA ESCRITA
26 • capítulo 1
Plano do letramento (diversas práticas
Plano da oralidade (prática social interativa)
da escrita)
CONCEPÇÃO
GÊNEROSTEXTUAIS MEIODEPPRODUÇÃO DOMÍNIO
DISCURSIVA
Sonoro Gráfico Oral Escrita
Conversação
X X A
espontânea
Artigo científico X X D
Notícia de TV X X C
Entrevista publi-
X X B
cada na Veja
capítulo 1 • 27
lidade por ser um texto tipicamente oral, visto que é sonoro e oral. A produção
do domínio “B” – entrevista publicada na revista Veja – não é um protótipo nem
da escrita nem da oralidade por ser um texto misto, já que é gráfico apesar de
oral. A produção do domínio “C” – notícia de TV – também não é um protótipo,
é misto, uma vez que é sonoro apesar de escrito. A produção do domínio “D” –
artigo científico – é protótipo da escrita, uma vez que é um texto tipicamente
escrito, pois é gráfico e escrito.
Marcuschi (201, p. 35) expressa claramente que “(...) assim como a fala não
apresenta propriedades intrínsecas negativas, também a escrita não tem pro-
priedades intrínsecas privilegiadas.” O que ocorre é que na língua falada es-
pontaneamente com pessoas com quem se tem intimidade, é comum desvios
gramaticais, pausas, repetições, uso de marcadores conversacionais como “né,
então, aí”, tomadas de turnos, apagamento dos /r/ finais, elevação das vogais,
como “iscola”, “mininu”, dentre outras coloquialidades. Deve ficar claro que
não defendemos aqui uma ou outra modalidade, nem pregamos o uso da nor-
ma coloquial, apenas ressalvamos a importância de que você, falante do idio-
ma, saiba que as conversas espontâneas comumente distanciam-se da norma
padrão, e que em contextos formais, mesmo que você empregue a língua fa-
lada, precisará usar a norma padrão. Mas você conhece os conceitos: norma
padrão, norma coloquial, norma culta etc.?
28 • capítulo 1
o Projeto NURC, por exemplo, é possível afirmar que nem mesmo na norma
culta, isto é, nem mesmo os falantes escolarizados, ditos cultos, utilizam a nor-
ma padrão em todos os momentos. Todavia, é possível que os falantes cultos
não sejam mal avaliados por não usarem a mesóclise porque esta norma não
é estigmatizada. Já um indivíduo que diga: “Nóis vai, nóis qué” provavelmente
será mal avaliado e poderá sofrer preconceito linguístico porque a ausência de
concordância verbal é uma variante estigmatizada. Entre esses extremos, há a
norma coloquial, usada no dia a dia, nas conversas informais com amigos, nos
bilhetes, nas redes sociais etc. É considerada uma linguagem mais descontraí-
da, sem formalidades, com gírias, diminutivos afetivos, termos regionais, abre-
viações, contrações etc. Nela, são comuns construções como: “A gente qué” (ao
invés da construção padrão: “Nós queremos”); “As menina adora” (ao invés da
padrão: “As meninas adoram”), “O filme que eu assisti” (ao invés de: “O filme a
que eu assisti”); “Me empresta o lápis” (ao invés de: “Empreste-me o lápis”) etc.
Poderíamos apresentar uma imensa lista com desvios da norma padrão mui-
to comuns na linguagem coloquial (também chamada de popular), porque a
norma padrão está muito distante do uso que os falantes fazem, em geral, da
língua. Porém, é importante frisar três aspectos aqui discutidos, explícita ou
implicitamente:
1) A língua varia de acordo com a situação e outros fatores sociais como es-
colaridade, sexo, nível social etc.;
2) Não se deve julgar, menosprezar ou demonstrar preconceito pelo modo
como alguém fala ou escreve, pois não há uma forma linguística superior a outra;
3) Embora não se deva julgar ou condenar alguém pelo uso linguístico que
faz, você deve saber utilizar a norma padrão nos contextos em que ela é exigida.
Diante das considerações feitas, serão apresentadas, ao fim deste capítulo,
algumas construções típicas da linguagem coloquial, mas que devem ser evita-
das em situações formais, quando a norma padrão é a esperada, como em con-
ferências, seminários, redações de vestibulares, notícias, reportagens, artigos
científicos, trabalhos acadêmicos, dentre outros.
capítulo 1 • 29
nos contextos formais das relações profissionais. É preciso dominar as regras
gramaticais, saber conjugar os verbos, usar a concordância, os pronomes, a
acentuação, a pontuação, as preposições, dentre outros itens gramaticais im-
portantes tanto para uma boa redação como para uma boa interpretação textu-
al. Na linguagem cotidiana, cometemos muitos desvios em relação ao padrão;
entretanto, quando formos usar a língua em situações formais, precisaremos
obedecer aos preceitos do padrão.
A seguir, apresentam-se algumas construções típicas da linguagem popu-
lar, coloquial, sobre as quais muitos falantes têm dúvidas.
1- ONDE x AONDE
2- HÁ x A
30 • capítulo 1
Se “daqui a pouco” indica futuro...não pode ser “há”.
3- MAU x MAL
Obs.: A palavra mal pode ser substantivo, por exemplo: “Este é um mal ne-
cessário”. Mas, nesse caso, haverá sempre um determinante qualquer, como o
artigo um, e pode haver plural: “Os males da vida são muitos.”
4- MENOS x MENAS
A palavra “menos” também é muito usada como advérbio para indicar “menor
grau, menor intensidade ou quantidade” e, como um advérbio, é invariável.
Contudo, no cotidiano, as pessoas a flexionam incorretamente em gênero e di-
zem: “Comi menas comida hoje” Como “menos” é advérbio, é sempre invariá-
capítulo 1 • 31
vel e ficará sempre no singular; portanto, o correto, de acordo com o padrão é:
“Comi menos comida hoje”.
As expressões “ao encontro de” e “de encontro a” são extremamente usadas por
jornalistas e até em conversas cotidianas. Mas muitos a utilizam da forma in-
correta! Para não errar, atente-se às normas de uso de tais locuções:1
Ao encontro de: significa “estar de acordo com”, “em direção a”, “favorável
a”, “para junto de”. (está de acordo)
Exemplo: Meu texto está ao encontro do que o professor solicitou.
De encontro a: tem significado de “contra”, “em oposição a”, “para chocar-
se com”.
Exemplo: Meu texto está de encontro ao que o professor solicitou. (está em
desacordo)
A fim de ilustrarmos a importância do conhecimento das normas grama-
ticais na compreensão do significado, apresentamos a seguir uma notícia vei-
culada em revista que relata a iniciativa da prefeitura de São Paulo de oferecer
moradia, trabalho remunerado e treinamento profissional a dependentes quí-
micos da região conhecida como Cracolândia. Veja como o conhecimento da
língua é relevante para o sentido, pois se mudarmos apenas uma preposição, o
significado da frase altera-se totalmente:
“Dar trabalho e moradia aos usuários de drogas vai ao encontro do que a Orga-
nização das Nações Unidas (ONU) defende para combater o vício” (Época, 13 jan.
de 2014, p. 11).
O jornalista usou adequadamente a locução prepositiva “ao encontro do”,
transmitindo a ideia de acordo com o contexto da notícia, isto é, a ação rea-
lizada pela prefeitura de São Paulo está em conformidade com o que defen-
de a ONU. Entretanto, muitas pessoas não sabem quando devem utilizar “ao
encontro ou de encontro”. Imagine se a frase tivesse sido escrita dessa forma:
“Dar trabalho e moradia aos usuários de drogas vai de encontro ao que a Or-
ganização das Nações Unidas (ONU) defende para combater o vício”. Usando
“de encontro”, o sentido da frase seria o oposto, a atitude da prefeitura de São
Paulo não estaria de acordo com o que defende a ONU. Percebeu a importância
do conhecimento da língua tanto para a interpretação como para a redação?
1 Todo o conteúdo desse item foi retirado de: CORDEIRO, M.B.G. Redação e Interpretação Textual. Estácio: Ribeirão
Preto, 2014, p. 28-29
32 • capítulo 1
ATIVIDADE
Analise a linguagem usada no cartum a seguir para responder à questão 1.
capítulo 1 • 33
c) I, II e III.
d) Todas, exceto IV.
e) II e IV, apenas.
2. Assinale a única alternativa que apresenta uma informação INCORRETA sobre o texto
oral e o escrito.
a) a) As diferenças entre fala e escrita ocorrem mediante uma gradação, esta é baseada
no meio de distribuição (sonoro ou gráfico) e na concepção discursiva (oral ou escrita) de
acordo com uma maior ou menor aproximação de uma ou de outra modalidade (gêneros
de fala e de escrita).
b) Gêneros orais espontâneos, como uma conversa informal, por exemplo, apresentam
relativa fragmentação: frases curtas e margeadas por pausas.
c) Nos gêneros orais espontâneos, como uma conversa informal, por exemplo, há pre-
sença explícita de hesitação, pois o planejamento e a execução são simultâneos.
d) Frases mais longas, encadeamento sintático complexo (coordenação e subordinação) são
características de gêneros escritos formais, como teses, dissertações, artigos científicos etc.
e) São características distintivas da fala e da escrita: A fala é contextualizada e a escrita,
descontextualizada. A fala não é planejada e a escrita é; a fala não é normatizada e a
escrita sim; a fala é pouco elaborada e a escrita é complexa.
34 • capítulo 1
3- Analise as informações sobre variação linguística, norma e uso em relação à fala da
personagem da charge.
I. A fala da personagem exemplifica a variação linguística, pois o protagonista usa uma
variante típica da linguagem informal: a abreviação do verbo “está” para “tá”.
II. Não há erro gramatical na charge, pois a informalidade expressa na fala do protago-
nista representa uma linguagem coloquial, na qual não se exige o cumprimento rigoroso
das normas gramaticais.
III. Há erro linguístico na charge, pois o cartunista deveria ter usado a norma padrão, já
que a charge é um gênero destinado principalmente a um público culto.
IV. Se o enunciado da charge fosse produzido em um pronunciamento oficial do Governo,
por exemplo, deveria ser usada uma linguagem culta, de acordo com o padrão.
Estão corretas as afirmações feitas em:
a) I e II, apenas.
b) I e III, apenas.
c) I e IV, apenas.
d) II e IV, apenas.
e) I, II e IV.
capítulo 1 • 35
( ) Pilar da norma padrão; deve ser trabalhada na universidade, pois é esperado que
falantes escolarizados a dominem nas situações de uso formais.
Assinale a alternativa que relaciona corretamente as nomenclaturas às suas definições:
a) (I); (II); (III); (IV); (V).
b) (V); (IV); (III); (II); (I).
c) (I); (IV); (II); (V); (III).
d) (II); (IV); (I); (V); (III).
e) (II); (III); (I); (V); (IV).
REFLEXÃO
Encerramos este capítulo com as palavras de Leite e Callou (2002) que, de forma brilhante,
explicam a íntima relação entre língua e sociedade, evidenciando o caráter simbólico que os
usos linguísticos apresentam.
É através da linguagem que uma sociedade se comunica e retrata o conhecimento e
entendimento de si própria e do mundo que a cerca. É na linguagem que se refletem a identi-
ficação e a diferenciação de cada comunidade e também a inserção do indivíduo em diferen-
tes agrupamentos, estratos sociais, faixas etárias, gêneros, graus de escolaridade. A fala tem,
assim, um caráter emblemático, que indica se o falante é brasileiro ou português, francês ou
italiano, e mais ainda, sendo brasileiro, se é nordestino ou carioca. A linguagem também ofe-
rece pistas que permitem dizer se o locutor é homem ou mulher, se é jovem ou idoso, se tem
curso primário, universitário ou se é iletrado. E, por ser um parâmetro que permite classificar o
indivíduo de acordo com sua nacionalidade e naturalidade, sua condição econômica ou social
e seu grau de instrução, é frequentemente usada para discriminar e estigmatizar o falante. De
uma perspectiva estritamente linguística, não se justificam julgamentos de valor, uma vez que
a faculdade da linguagem é inata e comum a toda espécie humana. As diferenças existentes
entre as línguas representam apenas formas de atualização distintas dessa faculdade uni-
versal. Assim, para o linguista, todo homem é igual não só perante a lei, mas também frente
a sua capacidade linguística. (LEITE, Y.; CALLOU, D. 2002, p. 7-8)
36 • capítulo 1
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BEZERRA, M. A.; SOUTO MAIOR, A. C.; BARROS, A. C. S. A gíria: do registro coloquial ao
registro formal. In: IV Congresso Nacional de Linguística e Filologia, Rio de Janeiro, v. I,
nº 3, p. 37, 2000.
LEITE, Y.; CALLOU, D. Como falam os brasileiros. Rio de janeiro: Jorge Zahar, 2002.
NERY, Alfredina. A língua muda conforme situação. In: Pág.3 Pedagogia e comunicação.
Disponível em: http://educacao.uol.com.br/portugues/ ult1706u80.jhtm. Acessando em: 10
de dezembro de 2009.
SAUSSURE, Ferdinand de. Curso de linguística geral. São Paulo: Cultrix, 2004.
No próximo capítulo
capítulo 1 • 37
ANOTAÇÕES
38 • capítulo 1
2
Noções básicas de
sintaxe: regência e
concordância
Apresentação do Capítulo
OBJETIVOS
• Apresentar o conceito de sintaxe;
• Ensinar a transitividade de alguns verbos;
• Listar algumas regras de regência verbal e nominal e suas implicações semânticas;
• Comparar o uso da regência e da concordância verbal na norma padrão e na linguagem
coloquial;
• Elencar as regras gerais e alguns casos especiais de concordância nominal.
REFLEXÃO
Você se Lembra?
Você se recorda de ter ouvido alguma pessoa dizendo: “Assisti o filme”; “O livro
que preciso”, “As menina amam essa música”, “Segue os documentos anexo” e
outras construções típicas da linguagem cotidiana? Certamente a resposta será
positiva. Mas você sabe que essas construções não obedecem à norma padrão?
De acordo com as regras da Gramática, o adequado seria: “Assisti ao filme”; “O
livro de que preciso”, “As meninas amam essa música”; “Seguem os documen-
tos anexos”. Para conhecer essas e outras regras, mergulhe no segundo capítulo
para usar corretamente as regras básicas de regência e concordância.
38 • capítulo 2
1.1 Noções básicas da sintaxe
capítulo 2 • 39
“Chama-se predicação verbal o modo pelo qual o verbo forma o predicado.
Há verbos que, por natureza, têm sentido completo, podendo, por si mesmos,
constituir o predicado: são os verbos de predicação completa, denominados in-
transitivos” (CEGALLA, 2009, p. 335). Veja o exemplo a seguir:
O cão late.
Sujeito Predicado (Verbo Intransitivo: VI)
http://www.alunosonline.com.br/portugues/transitividade-intransitividade-verbal.html
a) Verbos intransitivos: VI
Os verbos intransitivos são aqueles que contêm toda a significação do pre-
dicado sem a necessidade de qualquer complemento, basta apenas a presença
do sujeito, como em:
“Marcos caiu”; “A bomba explodiu”; “O bebê dormiu”; “O sorvete derreteu”;
“A estrela brilha” etc. Note que nesses exemplos, o verbo traz a significação es-
sencial, não havendo necessidade de um termo para completar a ideia central.
Caso o falante queira acrescentar alguma informação adicional (e não obriga-
40 • capítulo 2
tória, portanto), pode acrescentar termos acessórios, como os adjuntos adver-
biais: “Marcos caiu ontem”; “A bomba explodiu rapidamente”; “O bebê dormiu
logo”; “O sorvete derreteu completamente”; “A estrela brilha intensamente” etc.
Segundo Kury (2002, p. 28-29), há três tipos de verbos intransitivos:
• Verbos de fenômenos naturais ou acidentais: chover, ventar, nascer, mor-
rer, acontecer, ocorrer, cair, surgir, acordar, dormir, brilhar, morrer, girar etc.
“Um acidente aconteceu”; “A criança acordou”; “O vaso caiu”.
• Certos verbos de ação que exprimem fatos causados por um agente capaz
de executá-los: ler, brincar, trabalhar, correr, voar etc.
Exemplos: “As crianças brincam e os pais trabalham”; “Os pássaros voam”.
• Verbos de movimento ou situação: chegar, vir, morar etc.
“O pai chegou”; “Ela mora aqui”.
Você, caro estudante, pode ser tentado a considerar estes últimos verbos
como transitivos, pois parece que precisam de um “complemento”. No entan-
to, os termos que podem acompanhá-los são acessórios, como os adjuntos ad-
verbiais de lugar e tempo, por exemplo. Assim, “Cheguei ao local”; o termo “ao
local” é adjunto adverbial e não objeto, isto é, não se classifica como comple-
mento verbal. Para frisar:
Verbos intransitivos expressam uma ideia completa, e por isso, não preci-
sam de complemento.
capítulo 2 • 41
ATENÇÃO
Recorde as principais preposições: a – ante – até – após – com – contra – de – desde – em
– entre – para – por – perante – sem – sob – sobre
Você precisa saber diferenciar quando o “a” é artigo e quando é preposição:
Vi a menina caindo. [a = artigo]
Obedeço à professora. [à = a (preposição) + a (artigo)]
Há alguns verbos transitivos diretos que podem ser usados com preposição por questões
estilísticas e de sentido, e nesses casos, os objetos serão considerados objetos diretos pre-
posicionados, como em: “Amo a Deus, primeiramente!”
42 • capítulo 2
ATENÇÃO
A transitividade verbal deverá ser analisada no contexto, pois pode mudar dependendo da
frase. Por exemplo, na frase: “Paguei a conta”, o verbo “pagar”, nesse contexto, é apenas VTD,
transita apenas uma vez e tem apenas o objeto direto.
Cegalla (2008, p. 483) explica que a regência trata das “relações de dependência
que as palavras mantêm na frase”. Há dois tipos de regência: a verbal, que trata
das relações entre o verbo e seus complementos; e a nominal, que cuida dos
arranjos entre os nomes (substantivos e adjetivos) e os termos a eles ligados.
Exemplos:
a) É um homem propenso ao vício.
Adjetivo complemento
capítulo 2 • 43
Assisti a peça de teatro (auxiliei) Assisti à peça de teatro (presenciei)
Após a definição, Cegalla (2008, p. 490) ensina que a regência dos verbos
pode alterar seu sentido, como, por exemplo, em:
Aspirei o aroma das flores (VTD: sorver, absorver).
Aspirei ao sacerdócio (VTI: desejar, pretender).
44 • capítulo 2
O atirador visou o alvo (VTD- apontar)
O professor visou meu caderno (VTD: pôr visto)
Muitos visam aos cargos melhores (VTI: desejar, ter em vista)
capítulo 2 • 45
- A canção agradou ao público.
-Minha proposta não lhe agradou.
ATENÇÃO
Quando o sujeito da oração é nome de pessoa (alguém agrada alguém), é comum usar o
objeto direto, isto é, sem preposição:
- O pai agrada os filhos. [alguém agrada alguém]
- Procura agradá-lo de todas as formas.
ATENÇÃO
Não admite, como complemento, o pronome lhe, mesmo sendo VTI:
Como era melindroso, não aludi a ele (e não lhe aludi).
Aquela moça o destratara, mas ele nem sequer aludiu a ela.
46 • capítulo 2
Outros verbos TI também não admitem o complemento lhe(s), sendo, por isso, construí-
dos com as formas preposicionadas:
Aspiro ao título. Aspiro a ele.
Assistimos à festa. Assistimos a ela.
Refiro-me a João. Refiro-me a ele.
Recorri ao ministro. Recorri a ele.
Dependo de Deus. Dependo dEle.
Prescindimos de armas. Prescindimos delas.
capítulo 2 • 47
- Furioso, bateu a porta.
A princípio, a regência pode parecer um assunto difícil, mas, com a prática, assimilam-se
os diferentes casos.
48 • capítulo 2
ATENÇÃO
“lembrar”/”lembrar-se” segue a mesma regra:
“Lembrei o compromisso de hoje.” OU: “Lembrei-me do compromisso de hoje.”
d) Namorar:
- Na linguagem coloquial (informal), muitos falantes usam o verbo namorar
como transitivo indireto, como em: “Namorei com Paulo por muitos anos.”
- Na linguagem padrão (formal), o verbo namorar deve ser usado sem a pre-
posição com:
“Namorei Paulo por muitos anos.”
e) Preferir:
- Na linguagem coloquial (informal), muitos falantes usam o verbo preferir
com a locução prepositiva “do que”; “Prefiro X do que Y”, como em: “Prefiro
assistir à TV do que ler.”
- Na linguagem padrão (formal), o verbo preferir deve ser usado com a pre-
posição a: “Prefiro assistir à TV a ler.”
capítulo 2 • 49
1.4 Regência nominal
É muito comum alguns termos regidos serem ligados aos regentes por meio de
preposições. Por isso, estudar regência é importante não só para saber se deter-
minado termo exige preposição ou não, mas também para conhecer qual a pre-
posição usada com tal termo regente e regido. A regência nominal estuda a rela-
ção dos nomes (adjetivos, substantivos e até advérbios) com seus complementos.
Acessível a Imune a, de
Afável com, para com Indulgente com, para com
Afeição a, por Inerente a
Aflito com, por Coerente com
Ansioso por, de Compaixão de, para com, por
Atentatório a, de Compatível com
Aversão a, para, por Conforme a, com
Alheio a, de Constituído de, com, por
Avesso a Contente com, por, de, em
Aliado a, com Contíguo a
Análogo a Cruel com, para, para com
Antipatia a, contra, por Curioso de, por
Apto a, para Desgostoso de, com
Atencioso com, para com Desprezo a, de, por
Devoção a, para com, por Peculiar a
Devoto a, de Pendente de
50 • capítulo 2
Dúvida acerca de, de, em, sobre Preferível a
Empenho de, em, por Propício a
Fácil a, de, para Próximo a, de
Falho de, em Rente a
Feliz com, de, em, por Residente em
Fértil de, em Respeito a, com, de, para com, por
Hostil a, para com Simpatia a, para com, por
Junto a, com Situado a, em, entre
Lento em Solidário com
Pasmado de Suspeito a, de
Versado em
Vizinho a, com, de
Observe também a regência de alguns advérbios: Longe de; Perto de; Parale-
lamente a; Relativamente a (PASQUALE & ULISSES, 1999, P. 527).
capítulo 2 • 51
em situações menos formais.
No início de sua instituição, a norma foi justificada devido à ameaça de a lín-
gua grega ser corrompida pela língua dos “bárbaros”. Entretanto, atualmente,
nossa língua não está ameaçada de extinção; por isso, Neves (2003) questiona
o porquê das gramáticas continuarem a veicular padrões sem reflexão alguma
e desconsiderarem o uso real da língua. A autora ressalta que as preocupações
atuais para a organização das gramáticas são totalmente diferentes das que le-
varam à instituição da disciplina gramatical.
A partir de estudos científicos da linguagem, a língua foi desvinculada de
qualquer valor político, social ou até mesmo de beleza estética. Dentre esses
estudos, destacamos a Sociolinguística, que passou a considerar o social no
uso da linguagem, demonstrando que os diferentes usos são adequados a dife-
rentes situações e contextos. Para Neves, “a existência de registros não padrão
constitui garantia de eficiência de uso” (2003, p. 34). A Sociolinguística, através
de seus estudos variacionistas que consideram o uso vinculado a padrões, re-
gistros e eficácia, passou a considerar a diferença como garantia de eficiência
e não mais como deficiência, como era vista antes. O “padrão” foi relativizado
nos estudos de conversação ao ser vinculado à modalidade de língua (falada ou
escrita).
Desta mesma forma, a Linguística demonstrou que não se deve atribuir va-
lor a qualquer modalidade da língua. Porém, apesar de todo este avanço nos
estudos linguísticos, as gramáticas continuam a apresentar uma norma padrão
que cada vez mais se afasta do uso real, como é o caso, por exemplo, dos prono-
mes oblíquos, e outros. Embora muitos de nossos gramáticos, ou “os verdadei-
ros”, como afirma Neves, saibam disso, tais descobertas da Linguística não são
comumente aproveitadas pela disciplina gramatical.
Não se reconhece que a variação linguística faz parte da essência da lingua-
gem, que toda língua possui uma “deriva” (mudança interna). Ao contrário,
mesmo a par de todas essas descobertas, é comum o preconceito linguístico
por parte de cidadãos comuns e até mesmo de professores. Há, sim, um padrão
linguístico que é valorizado socialmente, mas não há nada intrinsecamente
que o faça “melhor”, “mais bonito” ou “mais correto” do que a variante não
prestigiada. Trata-se de uma questão sociocultural.
Na sociedade em geral, e principalmente em países como o Brasil, por
exemplo, as pessoas que têm maior acesso à cultura são as de maior poder eco-
nômico e isso sustenta a vinculação entre valor social e valor intelectual. Tal
52 • capítulo 2
concepção é mais evidente nas concepções leigas sobre o assunto e não base-
adas em estudos científicos. Dessa forma, para um leigo, conhecer a língua é
conhecer a norma padrão, saber o que é certo e o que é errado. Por isso, tais
pessoas vivem cobrando do professor de português o que se deve e o que não se
deve dizer/escrever.
Neves (2003, p. 54) acredita que o leigo seja “a força de sustentação de um
padrão modelar” na medida em que busca essa norma por diferentes motivos.
Para nós, a mitificação do “bom uso da linguagem” não é construída apenas
pelo povo, pelo falante em geral, mas também pelos gramáticos tradicionais e
pelas instituições que eles representam ou às quais se associam, como escola
e mídia, por exemplo. Acreditamos que o leigo represente uma influência im-
portante para a sustentação de um padrão modelar na medida em que tenta
mantê-lo ou aprendê-lo. Entretanto, motivos sociais, tais como um emprego ou
uma posição social, levam-no a buscar esse modelo, esse padrão.
Quem fala corretamente, bonito, como muitos dizem, desperta um pres-
tígio social por parte de quem o ouve. Por isso, muitos buscam manuais com
regras explícitas do que se pode e o que não se pode utilizar na linguagem visan-
do a diferentes objetivos. Assim, basta observarmos o sucesso de professores
de português que ditam regras na TV e nos jornais e a baixa popularidade dos
linguistas, cuja missão de registrar as formas em variação não é compreendida
por muitos intelectuais.
Devido a essa pressão social, mesmo ocupando posição central no dia a dia
das pessoas, a língua falada é vista de modo negativo, como o lugar do erro e
do antimodelo. Porém, é nela que observamos as alterações que a língua so-
fre através dos tempos. Parte da responsabilidade por essa visão deturpada da
modalidade falada deve-se à própria tradição dos estudos linguísticos, uma vez
que, até pouco tempo, a Linguística tomava como objeto de análise a escrita, ou
um modelo de fala idealizada, artificial e não a fala autêntica.
Lemle (in Sylvestre, 2001) ressalta que a heterogeneidade linguística é um
fato natural em uma comunidade tão extensa como a brasileira. A heteroge-
neidade linguística decorre da própria heterogeneidade social, geográfica e de
registro. A heterogeneidade geográfica é a variação entre comunidades linguís-
ticas localizadas em espaços fisicamente distantes entre si. Já a heterogeneida-
de social determina divergência linguística entre os subgrupos de uma comu-
nidade. Nesse nível, podemos destacar as seguintes variáveis:
capítulo 2 • 53
• Socioeconômica: classe baixa, média e alta;
• Faixa etária: crianças, jovens, adultos e idosos;
• Sexo: masculino e feminino;
• Ocupação profissional: trabalhador braçal, profissões de nível médio e alto;
• Desejo dos falantes em diferenciarem-se de outros grupos pelo uso de certas
características linguísticas.
esse princípio opera por meio da interação e da tensão de impulsos contrários, de tal modo
que as línguas exibem inovações mantendo-se, contudo, coesas: de um lado, o impulso à
variação e possivelmente à mudança; de outro, o impulso à convergência, base para a noção de
comunidade linguística, caracterizada por padrões estruturais e estilísticos (2003, p. 12).
54 • capítulo 2
Ribeiro (2003, p. 373) exemplificou alguns casos que não servem de indicadores
da norma culta ou popular, pois são realizados de um modo geral pelos falantes
brasileiros, não caracterizando uma ou outra variedade:
capítulo 2 • 55
(1965), para definir a concordância verbal:
56 • capítulo 2
CONCEITO
Você, embora seja usado como pronome pessoal para se referir à segunda pessoa do discur-
so, é considerado pela Gramática Tradicional como um pronome de tratamento usado quan-
do alguém se dirige a outrem, a uma segunda pessoa, mas que obriga à concordância com
o verbo na terceira pessoa (“Você foi indelicado.”; “Vocês tenham juízo.”). Fonte: Dicionário
Priberam da Língua Portuguesa.
capítulo 2 • 57
• Havia três pessoas na reunião.
• Deve ter havido sérios problemas com o computador.
• Há anos não o procuro.
• Faz anos que não o procuro.
• Fazia dez anos que não encontrava aquele amigo.
b) Verbo e a partícula se
Quando o se indica indeterminação do sujeito, o verbo fica na terceira pes-
soa do singular. Quando o se é pronome apassivador, o verbo concorda com o
sujeito da oração: (Este exemplo foi retirado de uma fala de um estudante universitário que fazia Letras.)
e) Nomes no plural
Em títulos ou nomes de lugares precedidos de artigo no plural, o verbo irá ao
58 • capítulo 2
plural:
• Os Lusíadas representam a grandeza da literatura portuguesa.
• Os Estados Unidos enviaram mais soldados ao Afeganistão.
• As Minas Gerais se destacam por cidades repletas de arte barroca.
ATENÇÃO
Se a expressão que indica porcentagem não for seguida de substantivo, o verbo deve con-
cordar com o número:
- 10% reprovam o governo.
- 1% aceitou a proposta.
capítulo 2 • 59
h) Casos especiais do verbo ser
1) Quando o verbo ser é acompanhado de “muito”, “pouco”, “bastante”, “su-
ficiente” etc., usa-se apenas o é, independentemente do número em que estiver
o sujeito:
• Dois dias é pouco tempo para aprender tudo isso.
• Três mil reais é bastante por esta casa.
• Vinte quilos é muito para uma criança carregar.
• Dois metros de tecido é suficiente para fazer o seu terno.
• Seis é demais para fazer o trabalho.
ATENÇÃO
O verbo ser fica no singular quando o predicativo é formado de dois núcleos singulares:
• Tudo o mais é saudade e silêncio.
60 • capítulo 2
O sujeito ou predicativo sendo nome de pessoa ou pessoa, a concordância
se faz com a pessoa:
• O homem é cinzas.
• Paulo era só problemas.
• Você é suas decisões.
• Seu orgulho eram os velhinhos.
capítulo 2 • 61
2- Adjetivo posposto referente a mais de um substantivo de gênero ou nú-
mero diferentes tem concordância facultativa; poderá concordar no masculino
plural (concordância mais recomendada) ou com o substantivo mais próximo:
a) No masculino plural:
“Os arreios e as bagagens espalhados no chão, em roda.” (Herman Lima,
apud CEGALLA, 2008, p. 438)
62 • capítulo 2
6- Com pronomes de tratamento, o adjetivo concorda com o sexo da pessoa
a que se refere:
• Vossa Santidade está enfermo. (Papa)
• Vossa Alteza está enferma. (Princesa)
• Vossa Senhoria ficará satisfeito. (Homem)
• Vossa Senhoria ficará satisfeita. (Mulher)
1- Termos como incluso, anexo, leso, mesmo, próprio, quite, obrigado, quan-
do adjetivos, concordam com o substantivo a que se referem:
Exemplos:
• Incluso(s)/a(s):
• Envio, inclusa nesta pasta, uma fotocópia do processo.
• Envio, incluso nesta pasta, um recibo dos gastos.
• Anexo(s)/a(s):
• Seguem anexas as cartas.
• Seguem anexos os documentos.
Mesmo:
• Os fantasmas não fumam, porque poderiam fumar a si mesmos. (Mário
Quintana)
• Os alunos mesmos organizaram o trabalho.
• A viagem do sono nem sempre é a mesma viagem. (Paulo Mendes Campos)
• Percorrera aquela mesma senda, aspirava aquele mesmo vapor que baixa-
va denso do céu verde.” (L.F. Telles) (Apud MORAES, online)
Observação: Mesmo pode funcionar como advérbio, modificando um adje-
tivo, um verbo ou o próprio advérbio. Nesse caso, é invariável e corresponde a
capítulo 2 • 63
justamente, exatamente, ainda, até.
Exemplos:
• Você esperneia, revolta-se — adianta? Mesmo sua revolta foi protocolada.
(C.D.A.)
• Livro raro, mesmo, é aquele que foi emprestado e foi devolvido. (Plínio
Doyle) (apud Moraes, online).
Próprio(s)/a(s):
Concorda com o substantivo a que se refere:
• Eu própria conferi a carga, disse a secretária.
• Eles próprios reconheceram o erro (os alunos).
• Eu próprio elaborei a prova, disse o professor.
•
Obrigado(a):
Se o emissor for masculino, vai para o masculino; se for mulher, para o
feminino:
• Obrigado, respondeu o menino.
• Obrigada, respondeu a garota.
Quite:
concorda com o substantivo a que se refere:
• Estou quite com minhas dívidas.
• Estamos quite com o serviço militar.
64 • capítulo 2
• É necessária a tua compreensão.
• É boa a plantação de erva-cidreira para afugentar formigas.
• A água é boa para a saúde.
• É proibida a entrada pessoas estranhas ao serviço.
3. Só e Sós:
a) Só (adjetivo) corresponde a sozinho, único, solitário e apresenta flexão de
número, concordando com a palavra a que se refere.
• Eles estão sós.
• Outros estão sós, como tu, mas presos a uma inibição ou a uma disciplina. (C.D.A)
4. Bastante(s) :
a) bastante = advérbio de intensidade: é invariável.
• Ele ficou bastante preocupado.
• Os pós-graduandos estudam bastante.
b) bastante = pronome indefinido (= muitos). Apresenta flexão:
• Naquela classe, há bastantes rapazes.
5. Meio:
a) meio = advérbio de intensidade: É invariável.
• Ando meio distraída ultimamente.
• Sentava calado, com a cara meio triste, um ar sério. (Rubem Braga)
• Existem maridos que são meio surdos: sempre que suas mulheres lhes
pedem 50 eles só ouvem 25. (Leon Eliachar)
capítulo 2 • 65
b) meio = numeral (= metade). Apresenta flexão.
• É meio dia e meia. (meia hora)
• Ele comeu meio bolo sozinho.
• Ele comeu meia (metade) pera.
Se você disser: “Ela está meia triste”, sua frase significará: “Ela está metade triste!”
66 • capítulo 2
ATIVIDADE
1- Reescreva as frases, completando-as com um dos verbos entre parênteses para que a
regência verbal fique adequada:
a) Quem não aspira............. um bom contrato? (aspira - aspira a)
b) Quando posso, ............. bons jogos de futebol pela TV. (assisto a - assisto)
c) Você deve.............. regulamento. (obedecer – obedecer ao)
d) O gerente ............... dois cheques e eu os levei à construtora. (visou os – visou aos)
e) Não ........... novo projeto do prefeito. (gostei o – gostei do)
f) O professor .......... dificuldades dos alunos. (precisou as – precisou das)
g) O escritor .................guarda-chuva em casa. (esqueceu do - esqueceu o)
h) Todas as perguntas ............ proposta concreta. (visam uma – visam a uma)
capítulo 2 • 67
i) João namora com Martha.
j) Eduardo visava uma vaga no curso de Medicina.
REFLEXÃO
Neste capítulo, você pôde notar que a língua padrão se distancia muito da língua informal
utilizada no cotidiano no que se refere à regência e à concordância verbal, principalmente.
Deve ter ficado claro que precisamos exercitar o uso do padrão para que saibamos utilizá-lo
nos contextos em que for exigido, pois o domínio da linguagem padrão pode não só conferir
prestígio social, como também possibilitar o seu desenvolvimento profissional.
LEITURA
Recomendamos a leitura do livro de Nadólkis porque apresenta de forma sintética e clara as
normas de regência, concordância, além de outros aspectos essenciais à norma culta.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BECHARA, E. Moderna Gramática portuguesa. Rio de janeiro: Lucerna, 2000.
CEGALLA, D. P. Novíssima Gramática da Língua Portuguesa. São Paulo: Companhia
Editora Nacional, 2008.
LEMLE, M. e NARO, A. J. Competências básicas do português. Rio de Janeiro: Funda-
ção Movimento Brasileiro de Alfabetização/Fundação Ford, 1977.
MATTOS E SILVA, R. V. De fontes sócio históricas para a história social linguística do Brasil:
em busca de indícios. In: MATTOS E SILVA, R. V. (Org.) Para a História do Português
Brasileiro. São Paulo, Humanitas, FFLCH/USP, vol. II, 2001.
MOLLICA, M.C. (Org.) Introdução à Sociolinguística Variacionista. RJ: Vozes, 2003.
MORAES, J. V. Concordância nominal: Conheça as regras. Educação Uol. Online. Dispo-
68 • capítulo 2
nível em: http://educacao.uol.com.br/disciplinas/portugues/concordancia-nominal-conheca
-as-regras.htm Acesso em: 04 maio de 2015.
NARO, A. J. e LEMLE, M. Syntactic Diffusion. Ciência e Cultura, 29 (3):259-268, 1977.
NARO, A.J. e SCHERRE, M. M. P. Sobre as origens do português popular do Brasil. Delta, 9,
nº especial, p.437-454, 1993
NEVES, M. H. M. “Norma, bom uso e prescrição linguística” In: Que gramática estudar na
escola? Norma e uso na língua portuguesa. São Paulo: Contexto, 2003.
RIBEIRO, I. I “Quais as faces do Português Culto Brasileiro?”. In: ALKMIM, T. M. Para a his-
tória do Português brasileiro. vol. III. São Paulo: Humanitas FLP, 2002.
SVOBODOVÁ, I. Sintaxe da língua Portuguesa. Masaykova Univerzita. Brno, 2014.
(REFERÊNCIA: MORAES, J. V. Concordância nominal: Conheça as regras. Educação Uol. Online.
5
capítulo 2 • 69
ANOTAÇÕES
70 • capítulo 2
3
Usos da língua:
pontuação,
acentuação e
ortografia
Apresentação do capítulo
OBJETIVOS
• Analisar aspectos da norma culta, como o uso da vírgula, a ortografia e a acentuação;
• Listar as principais regras do novo acordo ortográfico;
• Defender como o uso da vírgula confere clareza e está ligado à ordem SVC;
• Averiguar as características do “internetês” e compreender seu contexto de uso.
REFLEXÃO
Você se lembra?
Você certamente deve lembrar-se das aulas de gramática em que aprendia a forma correta
de grafar as palavras, a ortografia. Neste capítulo, retomaremos algumas noções básicas
de ortografia, além de analisarmos a pronúncia adequada das sílabas tônicas, isto é, sua
prosódia. Provavelmente, você já ficou em dúvida se o correto é “rúbrica” ou “rubrica”, não é
mesmo? Então, estude este capítulo com afinco, pois ele trata da escrita e da pronúncia cor-
retas das palavras de nossa língua portuguesa, abordando também algumas das principais
mudanças introduzidas pelo novo acordo ortográfico. Além disso, discute outros aspectos da
norma padrão igualmente importantes, como a regência, por exemplo.
72 • capítulo 3
1.1 Introdução à clareza e à pontuação: a ordem direta no
português brasileiro
central do texto. Ela veicula sentidos e pode se agrupar a outras formando pe-
ríodos e parágrafos. A frase pode ser constituída de uma única palavra, como:
“Fogo!”, por exemplo. Pode organizar-se também em torno de um verbo, sendo
classificada, nesse caso, como oração. As análises sintáticas, baseadas nessa
classificação, são essenciais para escrever bem, pois há um padrão de constru-
ção de frases em português. Sautchuk (2011, p. 15) explica que esse padrão é
representado pela seguinte fórmula:
S+V+C
Sujeito + Verbo + Complemento
O prefeito + aumentou + os impostos
É nesse padrão, isto é, nessa matriz, que pode ser modificada ou expandida,
que se apresentam as ideias centrais. Em torno delas, acrescentam-se termos
acessórios que expressam ideias secundárias ou suplementares, como, por
exemplo, em:
(1) Logo após a reeleição, o prefeito (S), que durante a campanha eleitoral, havia
negado a alta de tarifas, aumentou (V) os impostos (C), velhos vilões dos cidadãos.
capítulo 3 • 73
Organize as palavras e frases começando pela ordem direta: SVC
74 • capítulo 3
ta.” (ibidem).
S V C
Ficou claro que a estrutura SVC pode variar em função de o verbo ser tran-
sitivo (exigir complemento) ou intransitivo (não exigir complemento) e que a
esse padrão fixo podem ser acrescidas outras ideias expandindo os períodos,
conforme destaca a autora:
Para finalizar essa seção, apresentamos outro exemplo dado por Sautchuk
(idem), que ilustra uma dificuldade de localizar a informação principal devido
à distância entre o sujeito (S) e o verbo (V) e grande número de informações
capítulo 3 • 75
intercaladas entre eles:
Por fim, vale ressaltar metáforas que têm sido amplamente usadas para
abordar a produção textual: quando você redige um texto, é como se estives-
se tecendo um tapete com fios ou linhas, sendo que as palavras, as frases são
como as linhas que vão se entrelaçando para formar o tecido/texto. A elabora-
ção de um texto pode, ainda, ser comparada à montagem de um quebra-cabeça,
em que ajustamos e posicionamos as frases (peças do quebra-cabeça) até mon-
tarmos um todo de sentido, ou até conseguirmos expressar com exatidão o que
gostaríamos de exprimir.
Penso ser oportuno exibir quatro versões de frase que escrevi para expressar
uma das frases contidas nesse livro:
1ª versão: Foram feitas alterações, segundo a estudiosa, pequenas, mas sig-
nificativas...
2ª versão: As alterações feitas pela autora foram pequenas, porém, signifi-
cativas...
3ª versão: A autora realizou poucas alterações, mas significativas...
4ª versão: A autora realizou apenas duas alterações, mas significativas...
Qual versão você considera mais clara e precisa? A quarta não é? Note que
76 • capítulo 3
nas primeiras versões, eu não havia usado o padrão SVC, ao invés dele, havia es-
colhido a ordem inversa, com a construção na voz passiva, construção essa que
dificulta a compreensão do texto por parte do leitor. Além disso, havia muitos
elementos intercalados entre o sujeito e o verbo, como se observa:
capítulo 3 • 77
1.1.1 O uso da vírgula e a clareza
ATENÇÃO
Em todos os manuais de Gramática você encontrará esta regra básica: A estrutura SVC não
pode ser fragmentada!
78 • capítulo 3
cionar crise da água.
2- Governo de SP pede ajuda a empresas para solucionar crise da água, em
gesto desesperado.
3- Governo de SP pede, em gesto desesperado, ajuda a empresas para solu-
cionar crise da água.
Você deve ter concluído que a melhor opção é a primeira ou a segunda, visto
que a terceira fere a clareza por encaixar informações suplementares entre os
elementos da estrutura básica (SVC). Entretanto, você já deve ter aprendido que
essa intercalação não é proibida, a posição dos elementos em português é vari-
ável e de acordo com a ênfase que quer conferir à mensagem, o emissor organi-
za-a de determinada forma. O que você precisa entender também é que quando
ocorre essa intercalação, ela precisa ser isolada por vírgulas, como ocorre no
terceiro exemplo.
Sautchuk fornece uma boa dica para o uso da vírgula: Se você estiver em
dúvida se há ou não vírgula, destaque a estrutura SVC e analise se existe algum
elemento intercalado a ela; se houver, isole-o com vírgulas. Caso não haja inter-
calação, a vírgula é desnecessária.
capítulo 3 • 79
A fim de ampliarmos a discussão sobre o uso da vírgula em elementos inter-
calados, reproduzimos um dos exemplos citados por Sautchuk (2011, p. 44):
Essa nova versão está mais clara em função do isolamento dos elementos in-
tercalados. Dizer que eles devem estar isolados significa que é necessário colocar
vírgula no início e no final do “encaixe”. Sautchuk (2011, p. 45) orienta que, se o
escritor usa apenas uma vírgula, comete um erro, como nos exemplos a seguir:
1) Os manifestantes, em seu movimento de greve estavam em frente à prefeitura.
2) Os manifestantes em seu movimento de greve, estavam em frente à prefeitura.
80 • capítulo 3
Além das regras básicas estudadas (não se usa vírgula entre os elementos da
estrutura SVC; usam-se vírgulas para isolar informações adicionais à estrutura
SVC), há outra importante: usa-se a vírgula para marcar uma informação adi-
cional inserida no início ou no final da ideia principal representada pela estru-
tura SVC, isto é, nas extremidades dessa estrutura. Veja os exemplos:
ATENÇÃO
Atenção: O emprego da vírgula é facultativo quando a informação adicional é acrescentada
ao final da estrutura SVC.
Antes de expor as normas que regem o uso da vírgula, Cegalla (2008, p. 428)
adverte que o uso dos sinais de pontuação não é consenso entre os escritores,
sendo difícil, portanto, apresentar normas rígidas. Contudo, uma regra encon-
trada em todos os manuais é a que afirma que não se pode separar por vírgula o
sujeito do verbo, como, por exemplo: “A maioria dos estudantes, tem dificulda-
de para saber as regras de acentuação”. A vírgula usada nesse exemplo não está
de acordo com a norma padrão e é considerada desvio grave pelos gramáticos.
Mas, se houver adjuntos ou oração entre o sujeito e o verbo, eles virão isolados
entre vírgulas, como em: “A maioria dos estudantes, mesmo os que já termi-
naram o nível superior, tem dificuldade para saber as regras de acentuação”.
Feitas essas ressalvas, Cegalla explica que os sinais de pontuação servem a três
finalidades, e passa a expor as normas:
capítulo 3 • 81
2- Separar palavras, expressões e orações que devem ser destacadas;
3- Esclarecer o sentido da frase, afastando qualquer ambiguidade.
Diante dessas informações iniciais, vamos ao estudo das regras que deter-
minam o uso da vírgula:
82 • capítulo 3
• Ali eu entendi, sem receber explicação, aquela dura lição.
Observação: é comum não usar a vírgula quando os adjuntos adverbiais são curtos:
• À noite ouviram-se muitos gritos.
Você, estudante atento, deve ter observado que existe certa regularida-
de em todas as regras para o uso da vírgula: sempre que houver qualquer ex-
pressão entre os elementos da estrutura SVC, haverá vírgulas!
Cegalla (2008, p. 430) explica que o ponto e vírgula “denota uma pausa mais
sensível que a vírgula”, e é empregado principalmente para:
a) Separar orações coordenadas de certa extensão:
capítulo 3 • 83
• Depois Iracema quebrou a flecha homicida; deu haste ao desconhecido, guar-
dando consigo a ponta farpada. (José de Alencar apud CEGALLA, 2008, p. 430)
b) Em enumerações, como:
• Destacaram-se, na Conjuração Mineira, Joaquim José da Silva Xavier, alcu-
nhado Tiradentes; o poeta Claudio Manuel da Costa, autor do poema épico Vila
Rica; o poeta Tomás António Gonzaga, autor de Marília de Dirceu; o desembar-
gador Inácio Avarenga Peixoto e o padre Luís Vieira da Silva, em cuja biblioteca
se reuniam os conjurados. (CEGALLA, 2008, p. 430)
84 • capítulo 3
- Acentuam-se as oxítonas:
a) terminadas em “a”, “e”, “o”, “em”, “éns”, seguidas ou não de “s”.
Exemplos: Marajá, aliás; freguês, café; pontapé, dominó; Jericó; refém;
armazém, vinténs.
b) terminadas em ditongos abertos, como “éi”, “éu”, “ói”, seguidos ou
não “s”.
Exemplos: Méis, chapéus, anzóis.
c) formadas de muitos verbos que, ao se combinarem com pronomes oblí-
quos, produzem formas monossilábicas e devem ser acentuadas por acabarem
assumindo alguma das terminações contidas nas regras, como as formas ver-
bais oxítonas terminadas em “a”, “e”, “o”, (com ou sem “s”) quando seguidas
de “lo(s)” o u “la(s)”:
Exemplos: amá-las; perdê-las; repô-las.
capítulo 3 • 85
O novo acordo ortográfico, no entanto, suprimiu o acento diferencial de ou-
tras palavras, entre elas: para (verbo) e para (preposição); pelo/pelos (substan-
tivo) e pelo/pelos (verbo pelar e contração de preposição e artigo); polo/polos
(substantivo) e polo (contração arcaica de proposição e artigo), coa/coas (verbo
coar) e coa/coas (preposição + artigo).
c) A vogal tônica do hiato “oo” deixa de receber acento gráfico: voo, perdoo,
povoo (verbo povoar).
86 • capítulo 3
Atenção:
Assim como ocorre nas formas oxítonas, muitos verbos, ao se combinarem
com pronomes oblíquos, produzem formas monossilábicas que devem ser
acentuadas por acabarem assumindo alguma das terminações contidas nas
regras.
Exemplos:
• Fez + o= fê-lo
• Dar + as= dá-las
5) Hiatos acentuados
Quando a segunda vogal de um hiato for “i” ou “u” e tônica, seguida ou não
de s, será acentuada: saúde, saída, proíbo, faísca, baú, viúva, juíza, juízo, país,
Jaú, Jacareí, Cabreúva, Luís.
Atenção!
Se essas vogais tônicas do hiato forem seguidas de outras consoantes ou
“nh”, não haverá acento: juiz, rainha, cairmos, contribuinte, sair, cauim.
O novo acordo ortográfico alterou, nessa regra de acentuação do hiato, o
seguinte: se as vogais “i” ou “u” forem precedidas de ditongo, não serão mais
acentuadas graficamente. Veja como ficam agora algumas palavras que se in-
cluem nesse caso: feiura, Bocaiuva, baiuca.
1.2.1 Prosódia
capítulo 3 • 87
ocupa-se da correta emissão de palavras quanto à posição da sílaba tônica, se-
gundo as normas da língua culta. Quando pronunciamos uma palavra com o
acento de intensidade colocado erroneamente em uma sílaba, temos um erro
prosódico ao qual se dá o nome de silabada. Vejamos alguns desses erros mais
comuns e sua correção.
Enquanto a prosódia refere-se à acentuação das sílabas nas palavras, a parte
da gramática que trata da pronúncia correta das palavras é a ortoepia. A orto-
epia determina como devemos pronunciar nitidamente as vogais, os ditongos,
os tritongos e os hiatos. Também orienta quanto à articulação ou pronúncia
adequada das consoantes e dos encontros consonantais.
88 • capítulo 3
1.2.1.4 Algumas palavras que admitem dupla prosódia
Acróbata ou acrobata; Oceânia ou Oceania; projétil ou projetil; réptil ou
reptil; ortoépia ou ortoepia; hieróglifo ou hieróglifo.
Para saber mais sobre o assunto, veja em: http://www.coladaweb.com/por-
tugues/ortoepia-e-prosodia.
2 O conteúdo sobre o Novo Acordo Ortográfico foi retirado de DALLIER, L. C. Comunicação e expressão.
Ribeirão Preto: Uniseb, 2011, p. 150- 165.
capítulo 3 • 89
to contrárias à vigência imediata do novo acordo. Embora alguns critiquem as-
pectos do texto do acordo e outros concordem com as mudanças propostas, há
uma atitude de cautela da parte de muitos estudiosos. A questão é basicamente
a seguinte:
Seria oportuno um acordo neste momento? Não há outras prioridades educa-
cionais com as quais o MEC deveria se preocupar?
Não é a intenção aqui apontar uma posição final sobre o assunto, nem mesmo
oferecer detalhada explicação de cada regra do novo acordo. O espaço aqui é mais
para introduzir o assunto e apresentar alguns pontos do novo acordo ortográfico.
CONEXÃO
No link a seguir, você poderá ler o texto do Acordo na íntegra: http://www.abril.com.br/arqui-
vo/acordo_ortografico.pdf
1- Proposta básica:
Unificação do idioma dos países: Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau,
Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste
2- Alfabeto
COMO ERA NOVA REGRA COMO SERÁ
O alfabeto é formado por As letras K, W, Y fazem
Formado por 23 letras
26 letras parte do alfabeto
3- Abolição do trema
O novo acordo ortográfico suprimiu completamente o trema em palavras
portuguesas ou aportuguesadas, permanecendo apenas em palavras estrangei-
ras. Veja: linguiça, sequência, tranquilo, cinquenta, sagui, arguir, linguística.
90 • capítulo 3
muitos casos, o hífen foi abolido, em outros, ele passou a ser usado. Vejamos
então o que mudou e o que não foi alterado.
a) Uso do hífen com os prefixos: auto, contra, extra, infra, intra, neo, proto,
pseudo, semi, supra e ultra
Somente devemos usar o hífen se a palavra seguinte começar por “h” ou vo-
gal igual à vogal final do prefixo. Antes do acordo, também se usava hífen quan-
do a palavra seguinte começava por “h”, “r”, “s” e qualquer vogal. O novo acordo
mudou isso.
Também é importante atentar para o fato de que nas palavras que começam
com “r” ou “s”, além de não mais se usar o hífen, é preciso dobrar essas letras.
Auto-hipnose, auto-observação, autoadesivo, autoanálise, autobiografia, au-
toconfiança, autocontrole, autocrítica, autoescola, automedicação, autopeça,
autopiedade, autopromoção, autorretrato, autosserviço, autossuficiente, autos-
sustentável.
Contrabaixo, contraceptivo, contracheque, contradizer, contraespião, con-
trafilé, contragolpe, contraindicação, contramão, contraordem, contrapartida,
contrapeso, contraproposta, contrarreforma, contrassenso.
Extraconjugal, extracurricular, extraditar, extraescolar, extrajudicial, extra-
oficial, extraterrestre, extratropical.
Infracitado, infraestrutura, infraocular, infrarrenal, infrassom, infraverme-
lho, infravioleta.
Intracelular, intragrupal, intramolecular, intramuscular, intranet, intrao-
cular, intrarracial, intrauterino, intravenoso.
Neoacadêmico, neocolonialismo, neofascismo, neoirlandês, neoliberal,
neonatal, neorromântico, neossocialismo, neozelandês.
Protoevangelho, protagonista, protótipo, protozoário.
Pseudoartista, pseudocientífico, pseudoedema, pseudoproblema, pseudor-
rainha, pseudorrepresentação, pseudossábio.
Semiaberto, semialfabetizado, semiárido, semibreve, semicírculo, semi-
deus, semiescravidão, seminu, semirreta, semisselvagem, semitangente, semi-
úmido, semivogal.
Supracitado, supramencionado, suprapartidário, suprarrenal, suprassumo.
Ultracansado, ultraelevado, ultrafamoso, ultrajudicial, ultranacionalismo,
ultraoceânico, ultrapassagem, ultrarradical, ultrarromântico, ultrassensível,
ultrassom, ultrassonografia.
capítulo 3 • 91
b) Com os prefixos ante, anti, arqui e sobre:
Somente usaremos hífen se a palavra seguinte começar com “h”ou vogal
igual à vogal final do prefixo. Pela regra antiga, também se usava o hífen quando
a palavra seguinte começava com “s” e “r”.
Antebraço, antecâmara, antediluviano, antegozar, ante-histórico, antemão,
anteontem, antepenúltimo, anteprojeto, anterrepublicano, antessala, antevés-
pera, antevisão.
Antiabortivo, antiácido, antiaéreo, antialérgico, anticoncepcional, antide-
pressivo, antigripal, anti-hemorrágico, anti-herói, anti-horário, antiimperialis-
mo, anti-inflacionário, antioxidante, antirrábico, antirradicalista, antissemita,
antissocial, antivírus.
Arquibancada, arquidiocese, arqui-hipérbole, arqui-inimigo, arquimilioná-
rio, arquirrival, arquissacerdotal.
Sobreaviso, sobrecapa, sobrecomum, sobrecoxa, sobre-erguer, sobre-huma-
no, sobreloja, sobremesa, sobrenatural, sobrenome, sobrepasso,sobrerrenal.
92 • capítulo 3
a forma “subumano” como exceção à regra.), subjugado, sublocação, sub-
mundo, subnutrido, submundo, suboficial, subprefeito, sub-raça, sub-reino,
sub-reitor, subseção, subsíndico, subsolo, subtítulo, subtotal.
capítulo 3 • 93
FOTO: fotogravura, fotomania, fotossíntese;
HIDRO: hidroavião, hidroelétrico;
MACRO: macroeconomia;
MAXI: maxidesvalorização;
MEGA: megaevento, megaempresário;
MICRO: microcomputador, micro-onda;
MINI: minidicionário, mini-hotel, minissaia;
MONO: monobloco, monossílabo;
MORFO: morfossintaxe, morfologia;
MOTO: motociclismo, motosserra;
MULTI: multicolorido, multissincronizado;
NEURO: neurocirurgião;
ONI: onipresente, onisciente;
ORTO: ortografia, ortopedia;
PARA: paramilitares, parapsicologia;
PLURI: plurianual;
PENTA: pentacampeão, pentassílabo;
PNEUMO: pneumotórax, pneumologia;
POLI: policromatismo, polissíndeto;
PSICO: psicolinguística, psicossocial;
QUADRI: quadrigêmeos;
RADIO: radioamador;
RE: reposição, rever, rerratificação;
RETRO: retroagir, retroprojetor;
SACRO: sacrossanto;
SOCIO: sociolinguístico, sociopolítico;
TELE: telecomunicações, televendas;
TERMO: termodinâmica, termoelétrica;
TETRA: tetracampeão, tetraplégico;
TRI: tridimensional, tricampeão;
UNI: unicelular;
ZOO: zootecnia, zoológico.
Confira, também, os casos em que o hífen deve continuar sendo usado:
• Para dividir sílabas: or-to-gra-fi-a, gra-má-ti-ca, ter-ra, per-do-o, ál-co-ol, ra
-i-nha, trans-for-mar, tran-sa-ção, su-bli-me, sub-li-nhar, rit-mo.
• Com pronomes enclíticos e mesoclíticos: encontrei-o, recebê-lo, reunimo-
94 • capítulo 3
nos, encontraram-no, dar-lhe, tornar-se-á, realizar-se-ia.
• Antes de sufixos: (GU)AÇU, -MIRIM, -MOR: capim-açu, araçá-guaçu, araçá-
mirim, guarda-mor.
• Em compostos em que o primeiro elemento é forma apocopada (bel-, grã-
, grão- ...) ou verbal: bel-prazer, grã-fino, grão-duque, el-rei, arranha-céu, cata-
vento, quebra-mola, para-lama, beija-flor.
• Em nomes próprios compostos que se tornaram comuns: Santo-Antônio,
Dom-João, Gonçalo-Alves.
• Em nomes gentílicos: cabo-verdiano, porto-alegrense, espírito-santense,
mato-grossense.
• Em compostos em que o primeiro elemento é numeral: primeiro-ministro,
primeira-dama, segunda-feira.
• Em compostos homogêneos (dois adjetivos, dois verbos): técnico-científi-
co, luso-brasileiro, azul-claro, quebra-quebra, corre-corre.
• Em compostos de dois substantivos em que o segundo faz papel de adjeti-
vo: carro-bomba, bomba-relógio, laranja-lima, manga-rosa, tamanduá-bandei-
ra, caminhão-pipa.
• Em compostos em que os elementos, com sua estrutura e acento, perdem
a sua significação original e formam uma nova unidade semântica: copo-de-lei-
te, couve-flor, tenente-coronel, pé-frio.
(Fonte: O Globo apud DALLIER, 2011, p. 159-163)
HÍFEN
capítulo 3 • 95
Ante-sala Antessala
Duplicam-se as consoantes
Auto-retrato Contrarregra
dos segundos elementos das
Auto-sugestão Autossugestão
palavras compostas quando
Anti-rugas Antirrugas
começarem com: r, s e o prefi-
Contra-senso Contrassenso
xo terminar em vogal.
Extra-regimento Extrarregimento
Em substantivos compostos
cuja última letra da primeira
Microondas Micro-ondas
palavra e a primeira letra da
Antiinflamatório Anti-inflamatório
palavra são a mesma, será fei-
Microônibus Micro-ônibus
ta a introdução do hífen. Assim
vira micro-ondas.
96 • capítulo 3
Os substantivos e adjetivos que estão relacionados com substantivos que
apresentam a terminação –EIA apresentam a vogal “e”: baleeiro (baleia); can-
deeiro (candeia); traqueano (traqueia).
Geralmente, os ditongos nasais apresentem o “e”: cães; escrivães; mãe;
pães; pões.
capítulo 3 • 97
nojento (nojo); sarjeta (sarja); enrijecer (rijo); varejista (varejo).
Usa-se o “j” na terminação –AJE: laje, traje, ultraje.
Nas formas dos verbos terminados em –jar: arranjar (arranjo, arranje, arran-
jem); despejar (despejo, despejem), enferrujar (enferrujem), viajar (viajo, viaje,
viajem). Atenção: viagem é substantivo e não verbo.
Em palavras de origem tupi, africana, árabe ou exótica.também encontra-
mos o “j”: jiboia, pajé, jirau, alforje, canjica, jerico, manjericão, Moji.
Fique atentos às seguintes palavras que também apresentam o “j”: berin-
jela, cafajeste, granja, jejum, jerimum, jérsei, jiló, majestade, objeção, ojeriza,
projétil, rejeição, trejeito.
Uso de “ss”
Devemos escrever com “ss” os substantivos formados a partir de verbos que
têm o radical terminado em –ced, -gred, -prim e –met:
98 • capítulo 3
intercessão (interceder), retrocesso (retroceder), concessão (conceder),
agressão (agredir), supressão (suprimir), intromissão (intrometer).
Substantivos cujos verbos cognatos terminam em –tir também apresentam
“ss”: admissão (admitir), discussão (discutir).
capítulo 3 • 99
1.5 A crase
Uma boa dica para aplicar a regra geral é a seguinte: se você puder substituir
o termo regido feminino por um masculino e ele for introduzido por “ao”, na
expressão feminina haverá a crase, observe:
100 • capítulo 3
• O diretor dirigiu-se à recepção. # dirigiu-se a + a recepção
• O funcionário prestou atenção à explicação. # prestou atenção a + a explica-
ção
• Ele chegou atrasado devido à chuva. # devido a + a chuva
• Quanto à dívida, está tudo certo. # quanto a + a dívida
• Em relação à reunião, participaremos. # em relação a + a reunião
2º caso: Usa-se o sinal indicativo de crase nas expressões formadas por pa-
lavras femininas.
Veja os exemplos:
• A sala ficou às escuras. # palavra feminina
• Fique à vontade. # palavra feminina
• Ele andou às cegas. # palavra feminina
• O vendedor seguia tudo à risca # palavra feminina
• Fui atender o cliente às pressas. # palavra feminina
• Estava à espera de você.
• Não ando à toa por aí.
• Estávamos à beira da falência.
Nesses casos, você não enxergará a fusão dos dois as. No entanto, sempre
que for uma expressão, isto é, um conjunto, formado por palavra feminina, não
tenha dúvida, haverá crase.
capítulo 3 • 101
mininas, porém não se deve craseá-las quando já houver uma preposição antes.
• A reunião será às 16 horas.
• A reunião vai das 15 às 16 horas.
• A reunião vai de 15 a 16 horas.
• A reunião está marcada para as 16 horas.
• O contrato será assinado entre as 14 e as 15 horas.
• Da segunda à sexta-feira
• De segunda a sexta-feira.
102 • capítulo 3
“hj, to em kza e c sds, qro mto q vc resp m msg, fmz?”
A “tradução” é: “Hoje, estou em casa e com saudades, quero muito que você
responda minha mensagem, firmeza?”
INTERNETÊS TRADUÇÃO
vc, vs você
xau tchau
Kbça cabeça
ñ, naum não
jg jogo
hj, oj hoje
ksa casa
q que
capítulo 3 • 103
eh é
axo acho
INTERNETÊS TRADUÇÃO
fmz firmeza
ag agora
abç abraço
vlw valeu
flw falou
9da10 novidades
t+ até mais
k cá
p para
s sim
fla fala
d de
104 • capítulo 3
Até mesmo as crianças têm acesso fácil à internet
e entram em contato com o “internetês”
Em (A), “td” significa: “tudo”; em (B): todo; em (C): toda; em (D): todos e em
(E) todas.
O maior problema do internetês não são as abreviações, o risco de influen-
ciar a linguagem escrita etc., mas sim o seu uso em contextos inapropriados.
Maia (online) é categórico ao afirmar:
Usar o “internetês” num ambiente formal é tão desastroso quanto usar a norma culta
em um diálogo livre pelas redes sociais. Os padrões gramaticais são importantes. E pre-
cisamos preservá-los para efetivar a formalidade e manter o aspecto cultural do idioma.
Contudo, exaltar a criatividade linguística dos usuários é dizer um sonoro SIM para a
vida de um idioma. A Língua Portuguesa normativa deve ser usada no momento ade-
quado; e o “internetês”, também!
Deve ficar claro que em contextos informais, como em redes sociais, apli-
cativos como Whats App, não é proibido o uso do “internetês”, entretanto, não
confunda o “internetês”, que abrevia palavras com uma linguagem truncada,
sem sentido, com desvios ortográficos e outros que dificultam o entendimento.
capítulo 3 • 105
Também deve-se frisar que embora não se condene seu uso nessas situações
informais, em ambientes acadêmicos, profissionais e outros formais, o “inter-
netês” deverá ser evitado.
CURIOSIDADE
Há diferentes versões do internetês, como por exemplo, o Miguxês, a língua dos “xis”, que
imita a linguagem de uma criança, como por exemplo, “xou xiki” (sou chique).
Assim como a aparência pode causar uma boa ou má impressão inicial, a lin-
guagem também acarreta juízos de valor sobre as pessoas. É comum ouvirmos:
“se ele não sabe nem falar, como quer trabalhar?” Portanto, o uso que se faz da
língua é de suma importância para os indivíduos na sociedade moderna. Uma
pessoa que não se expressa bem oralmente ou por escrito pode ter seu desempe-
nho profissional e pessoal prejudicado. Além disso, a linguagem padrão e cortês
evita desconfortos e desentendimentos entre colegas de trabalho e familiares.
Deve-se ter muita cautela ao escrever, pois, a ausência do contexto, das ex-
pressões faciais, a forma como se escreve (em caixa alta, excesso de pontos de
interrogação, por exemplo) pode parecer deselegante e grosseira e causar atri-
to entre emissor e receptor. Minucci (1995, p.260 apud TOMASI e MEDEIROS,
2014, p. 72) adverte que “a palavra escrita é muito mais agressiva do que uma
comunicação a dois, face a face. Uma pessoa poderá rejeitar uma mensagem
crítica por escrito e aceitá-la oralmente.”Observe a seguinte situação: Um chefe
de departamento de RH havia solicitado ao gestor de sua equipe que deixasse
em sua pasta um relatório sobre as diárias concedidas no mês. Porém, o funcio-
nário era novo, não conhecia muito bem os procedimentos, nem tinha muito
contato com o chefe do departamento. Em um encontro informal, o chefe co-
106 • capítulo 3
brou o funcionário e ele então redigiu o documento e o colocou no arquivo do
superior, tal como este havia solicitado. Entretanto, o chefe não encontrou o
documento e redigiu a seguinte mensagem:
“Cadê o relatório q era para estar no meu arquivo??”
O subordinado sentiu-se ofendido com o tom da cobrança e com tamanha
informalidade, pois não possuía intimidade com o chefe e assim, passou a ter
certa antipatia por ele. O chefe deveria ter sido mais cortês e polido ao escre-
ver para evitar esse constrangimento com o funcionário. Tal clima negativo é
muito ruim para o ambiente profissional e prejudica o trabalho no cotidiano.
Tal equívoco teria sido evitado se o chefe tivesse usado uma linguagem mais
formal, polida e cortês, como por exemplo:
“Bom dia, prezado Silva,
Preciso do relatório com urgência; ele já deveria estar em meus arquivos.
Envie-o o mais breve possível,
Atenciosamente”
Em relação a esse aspecto, Tomasi e Medeiros (2014, p. 69) explica o seguinte:
capítulo 3 • 107
dequada, falta de acentuação, prolixidade, problemas de coesão e outros não
são aceitáveis na linguagem organizacional. Observe a frase:
“Gostaria de saber se o senhor pode comparecer à reunião.”
Nela, o emissor não está perguntando, embora o questionamento esteja im-
plícito, ele está afirmando que gostaria de confirmar a presença; é diferente de
perguntar diretamente, como na frase abaixo:
“O senhor poderá comparecer à reunião?”
Essas informações ilustram a importância de uma boa comunicação no
mercado de trabalho. Assim, finalizamos essa seção com mais uma citação de
Tomasi e Medeiros (2014, p. 75-76):
ATIVIDADE
1- As frases a seguir apresentam desvios da norma padrão, os chamados “erros”. Reescreva
-as, fazendo as alterações para que fiquem de acordo com o padrão.
a) Atuo no setor de controladoria a 15 anos.
b) O material da apresentação será a cores.
c) O serviço engloba a entrega a domicílio.
d) A longo prazo, serão necessárias mudanças.
e) A nível de reconhecimento de nossos clientes atingimos nosso objetivo.
f) À partir de novembro, estarei de férias.
g) O diretor chegará daqui há pouco.
h) Vamos vender à prazo.
108 • capítulo 3
i) José, residente à rua Estados Unidos, era um cliente fiel.
j) O pagamento foi feito a vista.
k) O móvel não se adequa à sala.
l) Agradecemos pela preferência.
m) Aluga-se apartamentos.
n) Segue anexo a carta de apresentação.
o) Ao invés de comprar carros, compraremos caminhões para aumentar nossa frota.
p) Não sei aonde fica a sala do diretor.
q) Ao meu ver, a reunião foi um sucesso.
r) Fui avisada através de um e-mail de que a reunião está cancelada.
s) Precisamos aumentar ainda mais os lucros.
t) Eles leram o relatório bastante vezes 4
REFLEXÃO
Neste capítulo, estudamos algumas normas do português padrão (acentuação, pontuação,
ortografia etc.) essenciais para uma comunicação formal, como no mundo do trabalho, por
exemplo. Tanto que revistas de negócios e carreiras, como a Exame (online), por exemplo,
advertem: “Tropeçar no português pode prejudicar a sua carreira. Mas é certo também que
há erros que saltam aos olhos e há aqueles que quase passam despercebidos.” O problema
não está somente nos desvios à norma, tradicionalmente intitulados de “erros”, mas também
na forma como se elabora a mensagem. Um texto mal redigido, prolixo ou grosseiro pode não
comunicar e, ainda mais, causar indisposição entre os funcionários. Portanto, pense antes de
escrever ou falar, revise seu texto e seja gentil!
LEITURA
Para conhecer mais regras e normas do padrão, leiam os livros indicados a seguir, escritos
por autores que são professores desta disciplina:
MORENO, Cláudio. Guia prático do português correto. Porto Alegre: L&PM Pocket, 4 volu-
mes, 2005.
PIACENTINI, Maria Tereza de Queiroz. Manual da boa escrita: vírgula, crase, palavras com-
4 Exercícios adaptados da reportagem: “100 erros de português frequentes no mundo corporativo”. Disponível
em:<http://exame.abril.com.br/carreira/noticias/100-erros-de-portugues-frequentes-no-mundo-corporativo>
capítulo 3 • 109
postas. Rio de Janeiro: Lexikon, 2014.
SILVA, Deonísio da. A língua nossa de cada dia: como ler, escrever e comunicar-se com ele-
gância e simplicidade. São Paulo: Novo Século, 2007.
SILVA, Sérgio Duarte Nogueira da. Português no dia a dia. Rio de Janeiro: Rocco, 2003.
CEGALLA, D. P. Novíssima Gramática da Língua Portuguesa. São Paulo: Companhia Editora
Nacional, 2008.
CUNHA, C.; CINTRA, L. F. L. Nova Gramática do Português Contemporâneo. 2. ed. Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 1985.
DALLIER, L. C. Comunicação e expressão. Ribeirão Preto: UNISEB, 2011.
GOLD, Miriam. Redação empresarial: escrevendo com sucesso na era da globalização. 2. ed.
São Paulo: Pearson Education do Brasil, 2002.
GONZALEZ, Z. M. G. Linguística de corpus na análise do internetês. Dissertação. 123fls. São
Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC), 2007.
TOMASI, C. MEDEIROS, J. B. Comunicação empresarial. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2014.
ANOTAÇÕES
110 • capítulo 3
4
A estrutura do
parágrafo, a coesão
e a coerência
Apresentação do capítulo
O que é necessário para escrever bem? Você já deve ter feito essa pergunta
a alguém! Muitos pré-requisitos são necessários, mas neste capítulo evidencia-
remos alguns dos mais básicos, as qualidades essenciais a textos referenciais,
como clareza, concisão, objetividade, coesão e coerência.
OBJETIVOS
• Analisar a estrutura do parágrafo;
• Observar como se constrói um tópico;
• Depreender o conceito e os mecanismos de coesão;
• Averiguar como se constrói a coerência no texto.
REFLEXÃO
Você se lembra?
Você deve se lembrar do famoso “branco” que costuma nos acometer quan-
do temos de redigir um texto. Muita gente não sabe como iniciar e estruturar
um parágrafo. Também já deve ter ouvido algo semelhante a: “Nossa, fulano
foi incoerente”, isto é, agiu de uma forma contraditória, sem sentido. A noção
de coerência é essencial tanto para interpretar um texto, como para produzi-lo.
Neste capítulo, você aprenderá a desenvolver um parágrafo, tendo em mente a
correlação entre a coesão e a coerência.
112 • capítulo 4
das variações individuais de estilo, das características específicas de cada au-
tor, das idiossincrasias, Garcia (2010) apresenta três características básicas do
parágrafo “prototípico”, isto é, o tradicional, modelar: “o afastamento, a exten-
são e a estrutura”. Em relação a elas, afirma que:
a) o parágrafo é marcado por um ligeiro afastamento da margem esquerda
da folha, o que facilita ao “escritor a tarefa de isolar e depois ajustar convenien-
temente as ideias principais da sua composição, permitindo ao leitor acompa-
nhar-lhes o desenvolvimento nos seus diferentes estágios” (2010, p. 220);
b) a extensão não delimita o parágrafo, já que é variada (pode haver pará-
grafos de duas linhas, três ou de uma página inteira); assim, o que delimita o
parágrafo é a “ideia central”. Em conversas espontâneas, cartas comerciais, su-
mários, conclusões, alíneas de leis, decretos e recomendações, os parágrafos
costumam ser curtos devido à brevidade do assunto.
c) a estrutura do parágrafo padrão é constituída de três partes: a “introdu-
ção”: um ou dois períodos curtos iniciais que veiculam a ideia-núcleo de forma
resumida e sintética; “o desenvolvimento”: explanação dessa ideia-núcleo; e a
conclusão, que comumente não ocorre nos parágrafos cuja ideia central é de
menor complexidade.
REFLEXÃO
Aqui vale relembrar a diferença entre frase, oração e período.
Para Othon Moacir Garcia (2010, p. 32), “frase é todo enunciado capaz de por si só esta-
belecer comunicação, podendo expressar um juízo, indicar uma ação, estado ou fenômeno,
transmitir um apelo, uma ordem, um conselho. Por encerrar um pensamento completo, ter-
mina sempre por um ponto, ponto de exclamação, ponto de interrogação ou reticências”.
A oração caracteriza-se sintaticamente pela presença obrigatória de um predicado, função
preenchida por um verbo. Período é a organização de palavras de modo que expressem o
nosso pensamento. É a frase sintaticamente estruturada em torno de um ou vários verbos.
A passagem de um período para outro é marcada por ponto ( . ), ponto de exclamação ( ! ),
ponto de interrogação ( ? ). Tanto a frase quanto o período devem ter sentido completo. A
diferença é que a frase não necessariamente necessita de verbo (frases de situação e frases
nominais), mas o período obrigatoriamente precisa de um verbo em sua estrutura. O período
simples é constituído de uma só oração, isto é, possui somente um verbo em sua estrutura.
Já o composto é constituído de duas ou mais orações, ou seja, possui dois ou mais verbos.
capítulo 4 • 113
Em: “É hora do café”, tem-se uma frase, pois há o sentido completo, uma oração e um perí-
odo simples, pois há um verbo. Se estivesse escrito apenas: “Hora do café”, seria somente
frase, não oração.
114 • capítulo 4
Vivemos numa época de ímpetos. A vontade, divinizada, afirma sua preponderância,
para desencadear ou encadear; o delírio fascista ou o torpor marxista são expressões
pouco diferentes do mesmo império da vontade. À realidade substitui-se o dinamismo;
à inteligência substitui-se o gesto e o grito; e na mesma linha desse dinamismo estão
os amadores das imprecações e os amadores de mordaças (...) (CORÇÃO, 1985, p. 84
apud GARCIA, 2010, p. 224).
capítulo 4 • 115
O silogismo divide-se em simples e silogismo composto (isto é, feito de vários silogis-
mos explícita ou implicitamente formulados). Distinguem-se quatro espécies de silogis-
mos compostos (...) (MARITAIN, 1962, p. 246, apud GARCIA, 2010, p. 225)
Garcia ainda cita outras maneiras de se iniciar o tópico frasal, como por
exemplo, “a alusão histórica” e a “interrogação”, comuns em textos dissertati-
vos/opinativos, e “omissão de dados identificadores num texto narrativo”, co-
mum em contos, novelas e outros gêneros narrativos. Nestes, é comum a omis-
são de dados sobre a personagem como estratégia para despertar a atenção do
leitor. A título de exemplo, cita Carlos Drummond de Andrade, que habilmente
cativa a expectativa do leitor omitindo quem é a personagem, expondo apenas
os fatos a ela relacionados no trecho: “Vai chegar dentro de poucos dias. Grande
e boticelesca figura, mas passará despercebida. Não terá fotógrafos à espera, no
Galeão. Ninguém, por mais afoito que seja, saberá prestar-lhe essa homenagem
epitelial e difusa, que tanto assustou Ava Gardner.” (apud GARCIA, 2010, p. 227).
116 • capítulo 4
textos de estudantes de ensino fundamental e médio decorrem da estrutura,
da coesão e da coerência. “Quando o estudante aprende a concatenar ideias, a
estabelecer suas relações de dependência, expondo seu pensamento de modo
claro, coerente e objetivo, a forma gramatical vem com um mínimo de erros
que não chegam a invalidar a redação.” (idem). Note que ele não afirma que
a correção gramatical não seja importante; contudo, igualmente essencial é a
relação entre as ideias, a unidade do texto, a coesão e a coerência.
De acordo com Garcia, a “unidade” de sentido em um texto pode ser obtida
por meio do tópico frasal. Ela consiste em apresentar uma informação de cada
vez, excluindo-se o que é supérfluo ou não ligado à ideia principal do parágrafo.
Coerência e coesão são termos distintos. Um texto pode ter coesão (tem a ver
com a estrutura linguística, os conectores), mas faltar-lhe coerência (tem a ver
com as ideias, relação lógica).
Dependendo da forma como se usam conjunções, advérbios, locuções ad-
verbiais, numerais, pronomes e outros termos conectivos, principalmente em
textos referenciais (em gêneros como artigos científicos; artigos de opinião; car-
tas comerciais, notícias etc.), o texto pode ou não ficar coerente. Já nos textos
literários, a coesão e a coerência podem ligar-se a aspectos externos ao texto.
Observe a ambiguidade presente na frase devido a uma má estruturação: “João
pediu a Paulo para assinar o documento”. Da maneira como foi escrita, pode
haver duas interpretações: João pediu a Paulo que o deixasse assinar o docu-
mento ou João pediu que Paulo assinasse o documento. Em um texto literário,
entretanto, muitas vezes, a ambiguidade é intencional, um recurso estilístico.
Analise, agora, a coerência e a unidade de uma redação de aluno apresenta-
da por Garcia (2010, p. 268):
Acabam de chegar a Cuba reforços militares da União Soviética para o regime comu-
nista de Fidel Castro. A condecoração de “Che” Guevara, um dos colaboradores castris-
tas, pelo ex-presidente Jânio Quadros, por afrontosa, escandalizou a opinião pública e
contribui para sua renúncia.
O professor explica que não há unidade nessa redação, pois o aluno cita vá-
rios assuntos distintos sem relacioná-los explicitamente. Qual a ideia central
desse parágrafo? Questiona-se. A chegada dos reforços, a condecoração, o es-
capítulo 4 • 117
cândalo da opinião pública ou a renúncia do presidente? Embora haja uma re-
lação histórica implícita entre as três personagens referidas, o estudante não
foi capaz de concatená-las. Verifique uma versão escrita pelo próprio professor
Othon Garcia (idem):
Acabam de chegar a Cuba reforços militares da União Soviética para o regime co-
munista de Fidel Castro. Pois foi a um dos colaboradores castristas — “Che” Guevara
— que o ex-presidente Jânio Quadros condecorou, escandalizou a opinião pública e
contribuindo para a sua própria renúncia.
Segundo o autor, ainda essa versão não está totalmente adequada, visto que
a ideia central não é a chegada de reforços, mas sim a condecoração. Uma rees-
crita enfim adequada à ideia central seria:
Com a chegada a Cuba de reforços militares da União Soviética para o regime co-
munista de Fidel Castro, a condecoração de “Che” Guevara pelo ex-presidente Jânio
Quadros — gesto que talvez tenha contribuído para sua renúncia — torna-se ainda mais
afrontosa à opinião pública.
1 As seções de 4.2.1 a 4.2.4 foram retiradas de: CORDEIRO, M.B. G. Produção Textual I. Ribeirão Preto: Uniseb/
Estácio, 2015.
118 • capítulo 4
textos em que sua referência esteja clara. Essa possibilidade de omitir o sujei-
to deve-se ao fato de que a desinência verbal o indica . Contudo, no português
atual, principalmente na linguagem falada espontaneamente, o paradigma
flexional vem se alterando, conforme atestam inúmeros estudos linguísticos.
Antes, havia seis pessoas (eu, tu, ele, nós, vós, eles) e uma desinência para cada
uma delas, atualmente, há apenas três desinências distintas, como se ilustra a
seguir:
Eu falo
Você fala
Ele/ela Fala
A gente fala
Vocês/Eles falam
CONEXÃO
Acesse o link indicado a seguir e leia um artigo que trata da realização do sujeito no portu-
guês brasileiro.
http://www.orbilat.com/Languages/Portuguese-Brazilian/Studies/Subject_realization.htm
Devido a essa alteração no paradigma flexional, a tendência é a de expres-
sar o sujeito, e não o omitir. Mas a dificuldade não ocorre nas frases escritas
em ordem direta e com sujeito expresso por substantivo, como em: “O gato
pulou o muro”; não há grande dificuldade para o falante reconhecer o sujeito:
“o gato”.
capítulo 4 • 119
Os seguintes contextos podem esclarecer a relação sujeito-predicado des-
sas expressões: “Pedro e João fizeram um ótimo discurso ontem, mas este só
sabe falar, não faz nada”; “Carlos possui um ótimo celular, mas o meu é me-
lhor!”; “Os estudantes que saíram cedo perderam essa explanação”; “Tenho
dois tipos de tecido, qual é o ideal?”.
Sautchuk (2011, p. 32) afirma que, embora no texto poético a ordem inversa
apresente função expressiva, estilística, em textos referenciais (cujo objetivo é
a transmissão do conteúdo de forma clara e direta), tal ordem deve ser evitada,
pois prejudica a clareza.
Contudo, ela nos adverte também que a ordem inversa é comum e usual na
língua em certos tipos de construção, como a que ocorre com os verbos intran-
sitivos (VI). Nesses casos, a ordem inversa não compromete a clareza. Como
ilustração, apresenta os exemplos:
Ordem inversa: “Intensamente, brilhava o sol.”
Advérbio VI Sujeito
120 • capítulo 4
Certamente, você já ouviu dizer que para escrever bem, é preciso ser obje-
tivo e conciso, mas pode-se perguntar: como escrever com concisão e objetivi-
dade? A resposta é simples: destaque as ideias essenciais; corte informações
totalmente supérfluas; evite a repetição de palavras desnecessárias; foque-se
no assunto principal e use a precisão vocabular evitando a redundância.
capítulo 4 • 121
país possua pessoas completamente diferentes umas das outras” (apud SAUT-
CHUK, 2011, p. 84).
Nesse exemplo, não há informações novas, pois o autor fala a mesma coisa
com outras palavras, criando um “conteúdo circular”, totalmente deselegante
e desnecessário.
Para não cometer tantas inadequações como estas, consulte sempre o dicioná-
rio, e para evitar a repetição de termos, use sinônimos.
122 • capítulo 4
A revisão do texto é essencial para obter clareza, concisão e unidade.
Neologismos:
Otimizar
Contabilizar
Agudizar
Problematizar
Quantificar
Priorizar espaços
Equacionar
capítulo 4 • 123
Alavancar
Embasar
Conscientizar-se
Termos preferíveis:
Aumentar, melhorar
Calcular, somar
Intensificar, complicar
Indagar, debater
Somar
Destacar
Apresentar
Apoiar, sustentar, impulsionar
Fundamentar
Conhecer
Ao lado de uma ideia principal como “Um grande número de pessoas preci-
sará de ajuda emocional”, pode-se acrescentar informação suplementar como:
“Em algum momento de sua vida” em diversas posições, observe:
124 • capítulo 4
Posição 3: no final da ideia principal:
“Um grande número de pessoas precisará de ajuda emocional, em algum
momento de sua vida”.
(SAUTCHUK, 2011, p. 33).
A opção “a” da segunda posição não prejudica tanto a clareza como “b”, que
quebra bruscamente a ordem direta (SVC); O leitor espera que após o sujeito
e o verbo venha o complemento, mas não é isso que ocorre. Excetuando-se os
gêneros textuais que não priorizam a clareza, como os poéticos, por exemplo,
o produtor de um texto deve preferir a ordem direta, dispondo as informações
adicionais à esquerda ou à direita da ideia principal. Sautchuk nos ensina que a
escolha da disposição (à direita ou à esquerda) depende da ênfase que o escritor
quer conferir a essa informação adicional.
Você deve imaginar que toda informação localizada no início da frase é con-
siderada mais relevante pelo receptor, pois é retida em sua memória mais fa-
cilmente. Observe a mudança de sentido decorrente da posição nos exemplos
a seguir:
capítulo 4 • 125
Na última semana, uma de nossas colegas de trabalho, a do setor de planejamento finan-
ceiro, sofreu, na parte da manhã, em virtude da imprudência de alguns colegas que insis-
tem em jogar cascas de frutas no chão, um grave acidente. (SAUTCHUK, 2011, p. 38).
126 • capítulo 4
2) Quais são as informações suplementares? (especializado em roteiros de
terror - o mais famoso deles, Vampiros covardes, que se transformou em filme
de grande sucesso; ontem; ao Brasil).
3) Quais são as informações suplementares de outra ideia suplementar? (o
mais famoso deles, Vampiros covardes, que se transformou em filme de grande
sucesso).
4) Qual a ideia central? (O cineasta americano chegou ontem ao Brasil).
Diante desses exemplos, ficou claro que para escrever com clareza, além
de se priorizar a ordem direta, deve-se evitar acrescentar um grande número
de informações secundárias que, se forem importantes, devem vir após a ideia
principal.
Para Halliday e Hansan (1976 apud KOCH, 1990, p. 17), a coesão “ocorre
quando a interpretação de algum elemento no discurso é dependente de outro.
Um pressupõe o outro, no sentido de que não pode ser efetivamente decodifi-
cado a não ser por recurso ao outro.”. Alguns dos principais elementos coesi-
vos são: pronomes, numerais, conjunções, advérbios, classificados como itens
gramaticais e outros itens lexicais, como se observa no trecho a seguir do artigo
“Rogai por nós”, do professor Pasquale Cipro Neto:
capítulo 4 • 127
Quero falar de um texto que não é propriamente laudatório. Refiro-me a uma oração cris-
tã, a Ave-Maria, dedicada à mãe de Cristo, portanto à "mãe" de todos os seguidores Dele.
Quero tratar duma questão linguística específica – as formas de tratamento empregadas
nessa conhecidíssima oração cristã.
Começo por "Bendita sois vós entre as mulheres". Por que o emprego do pronome "vós",
da segunda do plural, se o ser a que se refere o trecho é apenas um ("Maria")? O "Hou-
aiss" diz que esse pronome indica "aqueles a quem se fala ou escreve" (o exemplo é "Vós
sois bons"). Certamente não é esse o caso da "Ave-Maria", oração em que se verifica um
emprego muito específico desse pronome pessoal, o de indicar uma divindade, um santo
etc.
Não é por acaso que noutra oração cristã, o "Pai-Nosso", temos o mesmo fato ("que
estais no céu"). A forma "estais", da segunda do plural do presente do indicativo de "es-
tar", refere-se a um "vós" subentendido, que, por sua vez, se refere ao Pai, que também
é um só. É isso que explica o adjetivo "bendita", no singular, em "Bendita sois vós en-
tre as mulheres". Embora "vós" e "sois" estejam no plural, o ser ao qual esses termos
se referem é do singular. (Disponível em:< http://www1.folha.uol.com.br/colunas/pas-
quale/2015/05/1625784-rogai-por-nos.shtml> Acesso em: 13 de maio de 2015).
128 • capítulo 4
rente falta de coesão na superfície textual não prejudica a coerência, pois esta
pode ser recuperada por elementos extratextuais, como a situacionalidade, a
historicidade, o foco, o conhecimento prévio, a intertextualidade e outros fato-
res de coerência. A coesão trata, portanto, da união dos elementos linguísticos
menores para gerar a unidade textual maior, a coerência.
Por fim, o uso do advérbio “não” pressupõe, nesse contexto, um termo que
indique restrição “não envolve apenas, somente valores jurídicos”, mas tam-
bém religiosos etc. Esse caso ilustra que não basta simplesmente usar elemen-
tos conectivos para ligar, amarrar o texto, é preciso utilizar os elementos corre-
tos nos lugares adequados. Uma possível reescrita do parágrafo de forma mais
coesa seria: “Muito se tem discutido sobre a eutanásia no Brasil nos últimos
anos, tanto que existe um projeto de lei que está em votação para legalizá-la.
Esse procedimento está gerando muitas polêmicas e confusões, pois não en-
volve apenas valores jurídicos, mas também religiosos, éticos, morais, sociais
e ideológicos.” A segunda versão ficou mais coesa e coerente? Mais fácil de
entender? Espero que sim! Agora que você já conhece a importância da coesão,
deve aprender seus mecanismos.
capítulo 4 • 129
como “sequenciação” (KOCH, 1990). Entre os procedimentos de retomada (re-
missão) ou referenciação, os principais são:
a) Referência (pessoal, demonstrativa, comparativa; há total identificação
com o item pressuposto); “Ave-Maria e Pai Nosso são duas orações muito co-
nhecidas. Ambas fazem uso do vós”. O numeral “ambas” retoma “Ave-Maria e
Pai Nosso”, havendo total identificação entre eles.
b) Substituição (nominal, verbal, frasal); “Na Ave-Maria, usa-se a forma ver-
bal rogai, já no Pai-Nosso, estais. Isso ocorre porque a primeira está no impera-
tivo e a segunda, no presente do indicativo”. Observe que o pronome indefinido
isso não se refere a um termo específico, mas substitui uma porção maior de
texto; não há, portanto, total identificação entre “isso” e os elementos substi-
tutos.
c) Elipse (nominal, verbal, frasal); “O Pai nosso é universal, a Ave-Maria não
Ø”. O símbolo indica uma omissão de todo o predicado, “A Ave-Maria não é
universal”.
d) Parte da coesão lexical: reiteração, uso de sinônimos, hiperônimos (no-
mes genéricos, como maquiagem, por exemplo), hipônimos (nomes específi-
cos, como: batom, por exemplo), nomes genéricos, expressões nominais defi-
nidas etc. No texto “Rogai por nós”, Pasquale usa a expressão nominal definida
“nessa conhecidíssima oração cristã” para retomar a “Ave-Maria”.
A reiteração pode ocorrer das seguintes formas:
• Repetição do mesmo item lexical geralmente enfatiza o termo repetido.
O fogo acabou com tudo. A casa estava destruída. Da casa não sobrara nada.
• Uso de sinônimos
A criança caiu e chorou. Também o menino não fica quieto!
A médica fez uma boa escolha. Ninguém melhor que a doutora para decidir
sobre o melhor momento do parto.
• Uso de hipônimos:
Não tomo muito remédio (hiperônimo); às vezes, uma Neosaldina (hipônimo).
Esses são alguns elementos que, ao retomar palavras, frases, orações, co-
nectam as partes do texto formando um todo. A seguir, apresenta-se o principal
mecanismo para fazer a informação do texto progredir, portanto, um elemento
de coesão sequencial:
130 • capítulo 4
a) Conjunção ou conexão: uso de conjunções e outros elementos conectivos
que, ao unirem orações, parágrafos, estabelecem relações lógico-semânticas,
como, por exemplo:
-Aditiva: e
-Adversativa: mas, porém, contudo, entretanto, a despeito de...
-Causal: devido, pois...
-Temporal: antes, depois, após...
-Continuativa: por conseguinte, dessa forma...
capítulo 4 • 131
(TOMASI e MEDEIROS, 2014, p. 282 a 293).
1.4 A coerência
O texto será incoerente se seu produtor não souber adequá-lo à situação, levando em
conta intenção comunicativa, objetivos, destinatário, regras socioculturais, outros elemen-
tos da situação, uso dos recursos linguísticos etc. Caso contrário, será coerente.
132 • capítulo 4
Outro dado relevante sobre a coerência é que ela não se encontra no
texto, mas a partir dele, com base na situação comunicativa (fatores prag-
máticos, cognitivos, interacionais e semânticos). Portanto, constrói-se pelo
leitor com base em seus conhecimentos prévios, trata-se de um princípio de
interpretabilidade.
ATIVIDADE
1- Coloque (V) ou (F):
a) Para obter unidade, é preciso manter-se dentro do tema proposto do começo ao fim de
seu texto. ( );
b) Para escrever com clareza, deve-se facilitar o entendimento para o receptor, evitando a
ambiguidade e a obscuridade, procurando construir o texto com simplicidade e clareza. ( )
c) A prolixidade é uma qualidade que deve ocorrer em detrimento da concisão; deve-se
recorrer a muitas palavras para exprimir poucas ideias, isto é sinal de riqueza vocabular. ( )
d) O texto precisa ter coesão, as palavras na frase e as frases no texto não devem se ligar
aleatoriamente. Elas obedecem a uma ordem. Ser coerente é saber ordenar as frases segun-
do a ordem das ideias e dos fatos que você deseja representar. ( )
e) A correção consiste na observância da pauta de convenções habitualmente seguidas
pelas classes cultas. O erro no uso da língua materna faz desabar sobre quem o comete
(principalmente ao escrever) pesada sanção social. ( )
LEITURA
Para aprofundar seus conhecimentos em coesão, recomendamos a leitura do livro de Inge-
dore Koch, uma das principais estudiosas sobre o tema no país:
2 Disponível em <http://revistalingua.com.br/textos/62/artigo248996-1.asp> Acesso em: 14 de maio de 2015.
capítulo 4 • 133
Koch, I. Coesão Textual. São Paulo: Contexto, 1990.
REFLEXÃO
Esperamos que após a leitura deste capítulo, você não tenha apenas se detido à nomen-
clatura dos diferentes tipos de coesão, mas que, sobretudo, tenha adquirido consciência da
necessidade de usar a coesão ao elaborar seus textos. Procure, na prática, diversificar os
recursos coesivos, usando ora pronomes, numerais, advérbios, sinônimos, expressões nomi-
nais definidas e outros itens que concatenam as ideias do texto. Nos textos referenciais, a
coesão determina a coerência.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CORDEIRO, M. B. G. Produção textual I. Ribeirão Preto: Estácio, 2015.
LIMA, B. C.; SILVA, H. T. A construção do texto pelo parágrafo. Filologia. Disponível em:
http://www.filologia.org.br/ixcnlf/10/03.htm Acesso em: 01/02/2015.
SAUTCHUK, I. Perca o medo de escrever: da frase ao texto. São Paulo: Saraiva, 2011.
134 • capítulo 4
5
LEITURA E
SIGNIFICAÇÃO
Inúmeras pesquisas divulgam, de maneira estrondosa, manchetes inusita-
das como: “O brasileiro não sabe ler”, por exemplo. Muitos espantam-se com
títulos como esse, pois sabem que o analfabetismo no país diminuiu; entretan-
to, saber ler não significa compreender o texto. Muitos leem, mas não enten-
dem o que leram. Para que a leitura seja significativa, além do conhecimento
da língua, é preciso conhecimento de mundo, conhecimento dos processos de
criação dos diferentes gêneros textuais, das figuras de linguagem, da conotação
e da denotação, assuntos que exploraremos neste capítulo.
OBJETIVOS
• Ampliar a noção de texto;
• Observar as características do texto não verbal;
• Diferenciar a denotação da conotação;
• Analisar as diferenças entre o texto literário x não literário;
• Apresentar as figuras de linguagem como recursos de escrita.
REFLEXÃO
Você já leu um poema e não entendeu nada? Já se perguntou: “Quem foi o louco que criou
isso?”, ao observar uma arte contemporânea? Essas indagações ocorrem quando não com-
preendemos a função ou a significação da linguagem artística, seja ela verbal ou não verbal.
Você já refletiu sobre a importância da literatura e da arte? Qual a sua função? Qual o papel
social que elas desempenham? Por que o homem sempre escreveu sobre a realidade, sobre
o desconhecido? Ao estudarmos as características estruturais e temáticas do texto literário,
da conotação, observando as figuras de linguagem, esperamos compreender a essência da
literatura.
1 O Sincretismo de linguagens
Quem já se comunicou sem falar, usando apenas gestos e olhares? Acredito que
quase todos. Portanto, quem respondeu afirmativamente, já fez uso da lingua-
gem não verbal, definida como apropriação de imagens, figuras, cores dese-
nhos, símbolos, dança, tom de voz, postura corporal, pintura, música, mímica,
136 • capítulo 5
escultura e gestos usados como meios de comunicação. Até mesmo os animais
comunicam-se por meio de gestos e atitudes; os cachorros, por exemplo, ao ba-
lançarem a cauda de alegria, ao emitirem um olhar conquistador, ao abaixarem
a cabeça de tristeza e dor, estão se
comunicando por meio da lingua- Olhares, gestos,
gem não verbal e surpreendendo imagens, cores
seus donos. e símbolos, ao
Já a linguagem verbal acontece transmitirem mensagens,
quando fazemos uso da escrita ou
constituem linguagem
da fala para nos comunicarmos,
lembrando que a comunicação não verbal
ocorre quando produtor e receptor compreendem mutuamente as mensagens.
A linguagem verbal, assim como a não verbal, está presente em nosso cotidia-
no, nas notícias, artigos de opinião, reportagens, bulas de remédio, receitas etc.
Em vários gêneros textuais e em diferentes situações de comunicação, usamos
tanto a linguagem verbal (falada ou escrita) como a não verbal simultaneamente.
Pense em uma conversa cotidiana, você fala e usa as mãos, gesticula, emite sons,
olha de forma diferente etc. Todos esses recursos não verbais integram-se à lin-
guagem, formando, configurando o sincretismo na linguagem. Portanto, o sincre-
tismo é definido como o emprego simultâneo da linguagem verbal e não verbal.
O discurso sincrético encontra-se
presente com maior frequência na A linguagem não verbal
maioria dos textos veiculados pelos facilita e dinamiza a
meios de comunicação de massa. comunicação.
Outro importante aspecto para
compreender a significação da linguagem é a diferença entre o texto literário e
o não literário.
capítulo 5 • 137
tem o objetivo de um texto referencial (centrado no conteúdo, transmite-o de
forma clara e concisa), mas sim o de um texto emotivo (centrado nas emoções,
sentimentos e visão de mundo do emissor), ou o de um poético (centrado na
mensagem, na forma como ela é construída), ou de um metalinguístico (cujo
foco está no próprio código), por exemplo.
138 • capítulo 5
A palavra fático significa “ruído, rumor”. Foi utilizada inicialmente
para designar certas formas que se usam para chamar a atenção
FUNÇÃO (ruídos como psiu, ahn, ei). Essa função ocorre quando a mensa-
FÁTICA gem se orienta sobre o canal de comunicação ou contato, bus-
cando verificar e fortalecer sua eficiência, como ocorre nas sauda-
ções, nas ligações telefônicas, por exemplo.
CONCEITO
Desautomatização
Criação de novas relações entre as palavras.
capítulo 5 • 139
Além dos elementos da comunicação e das respectivas funções da lingua-
gem, há outros critérios que auxiliam a distinguir um texto literário de um uti-
litário. Embora os critérios possam ser questionáveis e ora aplicáveis, ora não,
é possível apresentá-los como elementos distintivos, tal como fizeram Platão e
Fiorin (2006, p.349).
140 • capítulo 5
2.1 Principais critérios para distinção entre o texto literário e o não
literário
b) O caráter ficcional dos textos literários e o não ficcional dos textos utilitários
capítulo 5 • 141
d)Intangibilidade
O texto literário seria intangível, intocável, dele não poderíamos alterar uma
palavra sequer ou mesmo resumi-lo. Assim, a intangibilidade não permite que
troquemos palavras e façamos substituições ou inversões no enunciado lite-
rário, pois a forma é muito importante, e se alterada, o texto pode perder sua
beleza. Valéry (apud PLATÃO E FIORIN, 2006, p.351) afirma que “quando se faz
um resumo do texto não literário, apreende-se o essencial; quando se resume o
literário, perde-se o essencial”. Já o texto utilitário pode ser resumido tranquila-
mente, pois a ênfase está no conteúdo e não na forma, essencialmente.
Uma mesma palavra pode assumir valores semânticos diferentes, tudo de-
pende da intenção do emissor e da habilidade linguística do receptor. No tra-
balho de construção do significado, o emissor pode usar diversos recursos que
estão disponíveis na língua para assegurar um texto mais envolvente e signifi-
cativo, dentre eles, estudaremos as linguagens conotativa e a denotativa e as
figuras de linguagem.
É da aplicação desses recursos que o texto pode ter mais valores agregados,
construídos, e esse enriquecimento semântico o diferencia de tantos outros
textos produzidos sem maior preocupação e envolvimento. Em outras palavras,
a utilização de tais recursos faz com que o texto tenha maior qualidade.
1
Ao ouvirmos uma palavra, percebemos um conjunto de sons (o significan-
te ou plano da expressão), que nos faz lembrar de um conceito (o significado ou
plano do conteúdo). A denotação é “o resultado da união existente entre o sig-
nificante e o significado ou entre o plano da expressão e o plano do conteúdo”.
1 Os conteúdos das seções “5.3 e 5.3.1” foram retirados de: DALLIER, L. C. Comunicação e expressão na escrita.
Ribeirão Preto, Uniseb, (ano???), p. 1-8 e GAMEIRO, M. B. Produção textual. Ribeirão Preto, Uniseb, 2010.
142 • capítulo 5
A conotação, por sua vez, “resulta do acréscimo de outros significados paralelos
ao significado de base da palavra, isto é, outro plano de conteúdo pode ser com-
binado ao plano da expressão” (ACD/UFRJ, s/d).
Na conotação, ao se acrescentar outro plano de conteúdo ao plano da ex-
pressão ou significante, haverá impressões, valores afetivos e sociais, negativos
ou positivos, reações psíquicas que um signo evoca. Isso implica dizer que “o
sentido conotativo difere de uma cultura para outra, de uma classe social para
outra, de uma época a outra”. Assim, é possível constatar que “as palavras se-
nhora, esposa, mulher denotam praticamente a mesma coisa, mas têm conte-
údos conotativos diversos, principalmente se pensarmos no prestígio que cada
uma delas evoca” (ACD/UFRJ, s/d).
As palavras poderão, então, apresentar sentido denotativo ou referencial
e valor conotativo ou figurado. A palavra terá valor referencial ou denotativo
quando for “tomada no seu sentido usual ou literal, isto é, naquele que lhe atri-
buem os dicionários; seu sentido é objetivo, explícito, constante”. Por outro
lado, a palavra terá valor conotativo quando evocar outras realidades ou ideias
por associações que ela provoca.
Nos textos literários, é muito comum predominar o valor conotativo, figura-
do ou subjetivo, enquanto nos textos não literários, predomina o valor denota-
tivo, literal ou objetivo. Não se trata, porém, de uma regra ou de algo absoluto,
já que você encontra palavras com valor conotativo em textos não literários e
palavras com valor denotativo em textos literários.
Veja o exemplo de texto jornalístico no qual aparecem expressões com sen-
tido conotativo:
EXEMPLO
“A maré de lama está se transformando em tsunami e invadindo o Congresso Nacional, des-
moralizando ainda mais os parlamentares. (Entre-Rios Jornal Online, 2007).
capítulo 5 • 143
novo”. A relação entre o sentido denotativo e o novo sentido pode ser de dois ti-
pos: semelhança (intersecção) ou contiguidade. A relação de semelhança entre
o significado de base e o sentido que é acrescentado pode ser encontrada nas
metáforas. A relação de contiguidade na qual, por exemplo, se usa a causa pelo
efeito ou a parte pelo todo, pode ser encontrada nas metonímias (PLATÃO &
FIORIN, 2003, p. 157).
Segundo Ullmann (1977, apud Britto, 2010), “as palavras nunca são com-
pletamente homogêneas: mesmo as mais simples e as mais monolíticas têm
um certo número de facetas diferentes que dependem do contexto e da situa-
ção em que são usadas (...)”. Esta possibilidade que as palavras têm de adqui-
rir diversos sentidos está intimamente relacionada às figuras de linguagem.
Dessa maneira, a polissemia é característica básica da fala humana, confor-
me Ulmann, que cita algumas maneiras em que ela pode ocorrer:
Linguagem figurada: (...) uma palavra pode adquirir um ou mais sentidos figura-
dos sem perder o seu significado original. (...)
3 (Ullmann, 1977: 330-331, apud BRITTO. Disponível em: <http://www.filologia.
org.br/ixfelin/trabalhos/pdf/18.pdf>. Acesso em: jul. 2010).
144 • capítulo 5
da em questão se utilizou: “passar aperto”. E, assim, iniciamos a discussão so-
bre as figuras de linguagem, que alteram o sentido de uma palavra ou expressão.
Em função de o valor conotativo das palavras apresentarem, geralmente, al-
gumas dificuldades, você vai estudar, na seção a seguir, as figuras de linguagem,
em cuja maioria há exemplos de conotação ou alteração de sentido nas palavras.
Aliteração
EXEMPLO
“Acho que a chuva ajuda a gente a se ver” (Caetano Veloso)
“Toda gente homenageia Januária na janela” (Chico Buarque)
capítulo 5 • 145
Vozes veladas, veludosas vozes,
Volúpias dos violões, vozes veladas,
Vagam nos velhos vórtices velozes
Dos ventos, vivas, vãs, vulcanizadas.
(Disponível em: <www.dominiopublico.gov.br>. Acesso em: 01 ago. 2010)
EXEMPLO
O sabiá não sabia
Que o sábio sabia
Que o sabiá não sabia
assobiar.
Fonte: http://recantodasletras.uol.com.br/gramatica/1192161
CONCEITO
As parlendas e trava-línguas são manifestações da cultura oral e popular brasileira, represen-
tadas por contos, lendas, mitos do folclore e adivinhas. Algumas parlendas constituem-se de
palavras sem nexo ou coerência, apenas para explorar o caráter lúdico da sonoridade.
Assonância
EXEMPLO
Sou ou Ana, da cama
da cana, fulana, bacana
Sou Ana de Amsterdam. (Chico Buarque)
Leia um trecho do poema abaixo, intitulado: Café com pão, de Manuel Bandeira
146 • capítulo 5
Café com pão
Café com pão
Café com pão
Virgem Maria que foi isto maquinista?
Agora sim
Café com pão
Agora sim
Café com pão
Voa, fumaça
Corre, cerca
Ai seu foguista
Bota fogo
Na fornalha
Que eu preciso
Muita força
Muita força
Muita força
Oô.. (…)
Disponível em: <http://www.literaturaemfoco.com/?p=135>. Acesso em: 20 jul.
2010)
Esperamos que com a leitura de parte do poema, você tenha imaginado o som
de um trem em movimento, pois foi esse o objetivo do poeta modernista ao repetir
consoantes (aliteração) e vogais (assonância), como em: ca, com, pão, mui... Este
exemplo demonstra também que é comum a assonância vir combinada à alitera-
ção, como ocorre em: “Na prece que emudece, engrandece e enaltece.”
COMENTÁRIO
Como se trata de um poema muito conhecido, você encontrará análises literárias de Trem de
ferro na internet, pesquise nos principais sites de busca.
Eco
capítulo 5 • 147
EXEMPLO
Então, o menino doente, crente de que havia uma valente serpente, saiu correndo pela
frente.
Em um texto utilitário, o eco pode ser visto como um vício de linguagem; as-
sim, os gramáticos tradicionais recomendam que se evitem construções como:
“É fundamental que se discuta um assunto nada banal na reunião semanal”.
Alguns livros didáticos incluem, por isso, o eco na seção de barbarismos ou ví-
cios de linguagens.
CONCEITO
Barbarismos são os erros de pronúncia, de grafia, de flexão, palavras malformadas, vocábulos
estranhos. O termo “barbarismo” originou-se do costume que Gregos e Romanos possuíam
de chamar bárbaros os estrangeiros que falavam mal, segundo seu critério, por falarem língua
estrangeira. O termo também foi utilizado para referir-se aos erros cometidos pelos estran-
geiros ao adaptarem ao seu idioma palavras e expressões de outra língua. (Disponível em:
<http://www.filologia.org.br/revista/artigo/7(19)14.htm>. Acesso em: 01 ago. 2010)
Novamente, o eco aparece nas parlendas, veja: “leite quente dá dor de dente
principalmente no dente da frente da gente”.
Onomatopéia
COMENTÁRIO
O tique-taque do relógio não me deixa dormir.
Toc-toc, quem bate à porta?
O grilo faz cri-cri.
148 • capítulo 5
CURIOSIDADE
Algumas onomatopeias originam-se da língua inglesa, como por exemplo, smack!, do verbo
“to smack” que significa “beijar” e em português representa o som do beijo. Além deste, po-
demos citar outros exemplos, como crack! (to crack), quebrar, e crash! (to crash), espatifar.
Veja mais exemplos no link: http://www.sobrecarga.com.br/node/view/3480
O site Recanto das letras traz uma grande lista de onomatopeias organizada por ordem alfa-
bética, confira também: http://recantodasletras.uol.com.br/artigos/1561043
Fonte: http://palavrasdesever.wordpress.com/2009/01/05/cria-a-tu-propria-tira-de-ban-
da-desenhada/
Palíndromo
capítulo 5 • 149
Pode ocorrer em palavras, como em “osso”, “ovo” e “radar”, ou mais dificilmen-
te em oração ou períodos. Ele ocorre quando se pode ler de frente para trás ou
de trás para frente uma palavra ou expressão, sem alterar o sentido, observe:
EXEMPLO
Socorram-me! Subi no ônibus em Marrocos.
EXEMPLO
Anotaram a data da maratona
Assim a aia ia (à)a missa
A diva em Argel alegra-me a vida
A droga da gorda
A mala nada na lama
(Disponível em: <http://obviousmag.org/archives/2007/07/palindromos_da.html#ixzz-
0vMczi8DY>. Acesso em: 29 out. 2015)
Assim como ocorre nas parlendas, nos palíndromos também não há muita
preocupação com o sentido, mas sim com o som. Como dissemos no início, as
figuras de linguagem tornam o texto mais expressivo.
MULTIMÍDIA
Assista a “Palíndromo”, de Philippe Barcinski, um curta metragem muito criativo que irá ajudá
-lo a lembrar-se sempre que o palíndromo permite que se leia palavras ou exempressões de
traz para frente. É muito criativo e traz uma reflexão no final. No youtube você pode encontrar
o curta.
150 • capítulo 5
Paronomásia
EXEMPLO
Num cumprimento inesperado
Saia num diminuto comprimento
Causou a ela constrangimento
(Disponível em: <http://recantodasletras.uol.com.br/teorialiteraria/430524>. Acesso: jul.
2010)
Cacofonia
EXEMPLO
Ela tinha muito jeito. (latinha)
Vi ela hoje! (viela)
Me dê uma mão ("um mamão")
Olha a boca dela! ("cadela")
Acesse o link disponibilizado e se entretenha com uma série de cacófatos, os termos resul-
capítulo 5 • 151
tantes dessa união de sons: (Disponível em: <http://pt.wikiquote.org/wiki/Cac%C3%B3fa-
tos>. Acesso: 14/05/2009).
CONCEITO
Licença poética é um termo usado para designar a permissão que escritores têm para co-
meter desvios gramaticais em relação à norma padrão. Normalmente, esses “erros” são de
regência, colocação ou concordância, como ocorre em: “beija eu”, em que o correto seria
“beija-me”. No entanto, a música de Arnaldo Antunes não teria a mesma sonoridade se obe-
decesse à norma padrão. A teoria literária ocupa-se dessa discussão. Para refletir melhor,
pesquise nos principais sites de busca, bem como em livros e revistas sobre o assunto.
CONCEITO
A morfossintaxe estuda qual função sintática (sujeito, predicado, objeto, predicativo, com-
plemento nominal etc.) é desempenhada por uma classe morfológica (a morfologia divide as
palavras em classes gramaticais, como: substantivo, adjetivo, pronome...). Assim, averígua, por
exemplo, a função dos substantivos, veja as frases abaixo:
152 • capítulo 5
objeto, este seria um exemplo simplificado de uma análise morfossintática. Como as figuras
de linguagem abordadas neste item apresentam relação com a disposição das palavras e
suas funções, são consideradas pertencentes à morfossintaxe.
Anadiplose
EXEMPLO
“Na simples e suave coisa”
“Suave coisa nenhuma” (Secos e Molhados)
Anáfora
EXEMPLO
“Olha a voz que me resta / Olha a veia que salta / Olha a gota que falta” (Chico Buarque)
Epífora (epístrofe)
EXEMPLO
“Se a gente não fizesse tudo tão depressa
Se não dissesse tudo tão depressa” (Kid Abelha)
“Amou daquela vez como se fosse a última
Beijou sua mulher como se fosse a última” (Chico Buarque)
capítulo 5 • 153
Pleonasmo
EXEMPLO
"Iam vinte anos desde aquele dia
Quando com os olhos eu quis ver de perto
Quanto em visão com os da saudade via."
(Alberto de Oliveira)
154 • capítulo 5
CONEXÃO
Assim como os palíndromos, os pleonasmos também fazem sucesso na rede mundial de
computadores, faça sua pesquisa e selecione seus exemplos preferidos.
Elipse
EXEMPLO
Quanta maldade na Terra.
Quanta maldade (há) na Terra.
capítulo 5 • 155
D Conjunção - Espero você me entenda (espero que você me entenda)
E Verbo - Queria mais ao filho que à filha (queria mais o filho que queria à filha)
Zeugma
EXEMPLO
Vieram dois amigos. Um nada trouxe, o outro, esperanças.
Precisarei de vários ajudantes, de um (ajudante) que seja capaz de fazer a instalação elétrica
e de outro (ajudante) para parte hidráulica pelo menos.
Ele foi às cinco, eu, (fui) às três!
Assíndeto
EXEMPLO
Peguei fila, furei greve
puxei saco, subi na vida
156 • capítulo 5
os conectivos portanto, por isso, desta maneira também poderiam ser usados.
Veja um trecho de Graciliano Ramos, dado por Sérgio (2009) em que o assín-
deto é explorado, pois a ausência de conectivos é grande:
“Luciana, inquieta, subia à janela da cozinha, (e) sondava os arredores, (e) bradava com
desespero, até ouvia duas notas estridentes, (e) localizava o fugitivo, (e) saía de casa.”
Polissíndeto
EXEMPLO
E peguei fila, e furei greve,
e puxei saco, e subi na vida.
Anacoluto
EXEMPLO
“ Os três reis orientais... é tradição da igreja que um era preto”. (Vieira)
capítulo 5 • 157
No segundo exemplo, percebe-se claramente uma alteração da disposição
gramatical na estrutura da frase. Tal mudança de rumo na frase é frequente na
oralidade, em que o planejamento é simultâneo à produção, e pode ser vista
como um erro. Contudo, no texto literário serve para enfatizar uma expressão.
Silepse de número:
EXEMPLO
Havia uma multidão ali, e gritavam.
158 • capítulo 5
Disponível em: Época 26/07/2010, nº 636.
Silepse de gênero:
Quando se diz “São Paulo está cada dia mais agitada.” há uma concordância
com a ideia que a palavra expressa: a cidade, por isso, o adjetivo está no femini-
no também: agitada.
Com o pronome de tratamento “Vossa excelência”, a silepse é corriqueira,
pois tal pronome é feminino, mas as palavras que o acompanham flexionam-se
no feminino ou masculino, como por exemplo, em:
capítulo 5 • 159
Vossa Excelência está bonita hoje.
Silepse de pessoa:
EXEMPLO
Os brasileiros festejamos a vitória da seleção.
Hipérbato
EXEMPLO
“Enquanto manda as ninfas amorosas grinaldas nas cabeças pôr de rosas.” (Camões)
“Essas vólucres amo, Lídia, rosas" (Ricardo Reis)
Comparação
160 • capítulo 5
“Amou daquela vez como se fosse a última
Beijou sua mulher como se fosse a última
E cada filho seu como se fosse o único
Subiu a construção como se fosse máquina”
Metáfora
A metáfora é uma das figuras de linguagens mais utilizadas nos mais diver-
sos gêneros textuais e também no cotidiano, pois expressa, com maior ênfase,
as comparações implícitas que fazemos.
É definida como o uso de um termo com um sentido que lhe é associado
pelo emprego de uma comparação subjetiva que fica subentendida (não apa-
rece expressa). Em outras palavras, é, na verdade, uma comparação abreviada,
implícita (o elemento comparativo não está expresso).
EXEMPLO
Lá fora, a noite é um pulmão ofegante.
Naquele domingo, ele era um cavalo trabalhando.
A leitura é a chave para a escrita.
capítulo 5 • 161
“Metáfora é, pois, a alteração do sentido de uma palavra, pelo acréscimo de um signifi-
cado segundo, quando entre o sentido de base e o acrescentado há uma relação de se-
melhança, de intersecção, isto é, quando eles apresentam traços semânticos comuns.”
Por exemplo, o cavalo é um animal conhecido por sua força, que sempre
acompanhou o homem em seu trabalho, por isso, quando dizemos que fula-
no é um cavalo, estamos atribuindo um novo sentido não literal a esta palavra.
Fora de um contexto, dizer que alguém é um cavalo pode significar ainda, popu-
larmente, que ele seja mal-educado.
A metáfora é muito comum também em propagandas, como o anúncio
abaixo ilustra:
162 • capítulo 5
No texto em destaque, lemos:
A metáfora pode ser entendida como uma alteração de sentido da palavra por
meio do acréscimo de um segundo significado, com uma relação de semelhan-
ça ou de intersecção entre o sentido que é acrescentado e o sentido de base,
apresentando traços semânticos comuns.
Veja alguns exemplos de metáforas, encontradas em manchetes de uma re-
vista, reproduzidas por Abreu (2004, p. 90):
capítulo 5 • 163
EXEMPLO
A economia brasileira na corda bamba.
Sem controlar o déficit público, vamos ficar enxugando gelo com medidas paliativas.
A Rede Globo engatilhou, na sexta-feira passada, o que promete ser um de seus tiros mais
certeiros na guerra com o SBT pela audiência nas tardes de domingo.
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ou sua resolução a uma jornada (O país encontrou o caminho certo, deixan-
do os atalhos perigosos/ Os políticos foram os primeiros a desembarcar des-
sa canoa furada);
g) metáfora de parentesco: associações com a família (Este país não pode rejei-
tar seus próprios filhos);
b) Causa pelo efeito ou vice-versa: Comprei essa casa com muito suor e lágrimas;
c) Autor pela obra: Ler Camões é algo cada vez mais raro;
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e) O lugar pelo produto: Tomar um Porto após o almoço era seu hábito;
3. Catacrese
É uma metáfora desgastada, ou seja, uma comparação indireta que de tão usada
já caiu em domínio popular, deixando de ser dependente da subjetividade do
autor e do leitor.
EXEMPLO
Embarcar em um trem.
Pé da mesa.
Cabeça de alho
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Metonímia
Sandmann (2005, p.13) afirma que quando “o princípio que faz com que o signi-
ficante de um signo se refira a outro objeto ou referente tiver base na semelhan-
ça, teremos a metáfora, e, se esse princípio tiver base na relação de contiguida-
de, teremos a metonímia”. Por esta afirmação, percebemos que a metáfora e a
metonímia são semelhantes, porém, esta se refere especificamente à identida-
de entre o signo e o referente. Assim, a metonímia é a substituição de um termo
por outro, contudo, a relação entre esses termos não depende da subjetividade
do autor ou do leitor, mas da ligação objetiva que esses elementos mantêm na
realidade. Observe o que Sérgio (2009) afirma sobre essa proximidade entre tais
figuras de linguagem:
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e) Parte pelo todo
Ex.: Não tenho um teto para morar.
Sinédoque
EXEMPLO
A cidade inteira invade os bares no verão. (as pessoas da cidade)
As chaminés trouxeram o desenvolvimento a São Paulo. (fábricas)
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Antonomásia
EXEMPLO
A Rainha dos Baixinhos (Xuxa)
O rei do futebol (Pelé)
A cidade Luz (Paris)
(Disponível em: <http://www.meganoivas.com.br/blogs/2009/02/10/viagem-de-lua-de-
mel/>. Acesso em ago. 2010)
Gradação
EXEMPLO
Sussurrava, falava, gritava, berrava, mas de nada valiam seus esforços.
Eufemismo
EXEMPLO
Bem, sua prova poderia estar pior...
O nobre deputado faltou com a verdade. (mentiu)
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Hipérbole
EXEMPLO
Chorei rios de lágrimas.
Já te pedi mais de mil vezes.
“Eu nunca mais vou respirar, se você não me notar, eu posso até morrer de fome se
você não me amar” (Cazuza)
Ironia
É um enunciado que pretende dizer algo contrário àquilo que sua expressão
revela; para tanto, torna-se fundamental o contexto.
EXEMPLO
Muito competente! Fez o projeto daquela ponte que liga nada a lugar nenhum.
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Com base na leitura da tirinha acima, em que Calvin está procurando sua
jaqueta - embaixo da cama - e quando a encontra no armário, pergunta: “Quem
foi que colocou nesse armário estúpido???”, se alguém disser: “Calvin é organi-
zado”, certamente, tratar-se-á de uma ironia.
Antítese
EXEMPLO
“Abaixo - via a terra - abismo de treva!”
“Acima - o firmamento - abismo de luz!” (Castro Alves)
Paradoxo
EXEMPLO
Pagar para ver o invisível e depois enxergar
Apóstrofe
EXEMPLO
Garoto, não faça isso novamente!
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Observemos os belos versos, em que a Liberdade é invocada, interpelada,
havendo a apóstrofe.
“Liberdade, Liberdade,
Abre as asas sobre nós,
Das lutas, na tempestade,
Dá que ouçamos tua voz...” (Osório Duque Estrada)
Sinestesia
EXEMPLO
Ouça Monet no MASP.
Para outros, a sinestesia nada mais é que a fusão dos diversos sentidos,
como demonstra o poema abaixo:
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Prosopopeia ou personificação
EXEMPLO
“As plantas me espiam do jardim” (Titãs)
O poste espiava o namoro do casal.
ATIVIDADE
Exercícios disponíveis em:< http://www.coladaweb.com/questoes/portugues/figling.htm>
Acesso em: ago. de 2010
01. (VUNESP) No trecho: "...dão um jeito de mudar o mínimo para continuar mandando o
máximo", a figura de linguagem presente é chamada:
a) metáfora
b) hipérbole
c) hipérbato
d) anáfora
e) antítese
02. (PUC - SP) Nos trechos: "O pavão é um arco-íris de plumas" e "...de tudo que ele suscita e
esplende e estremece e delira..." enquanto procedimento estilístico, temos, respectivamente:
a) metáfora e polissíndeto
b) comparação e repetição
c) metonímia e aliteração
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d) hipérbole e metáfora
e) anáfora e metáfora
03. (PUC - SP) Nos trechos: "...nem um dos autores nacionais ou nacionalizados de oitenta
pra lá faltava nas estantes do major" e "...o essencial é achar-se as palavras que o violão pede
e deseja" encontramos, respectivamente, as seguintes figuras de linguagem:
a) prosopopeia e hipérbole
b) hipérbole e metonímia
c) perífrase e hipérbole
d) metonímia e eufemismo
e) metonímia e prosopopéia
04. (VUNESP) Na frase: "O pessoal estão exagerando, me disse ontem um camelô", encon-
tramos a figura de linguagem chamada:
a) silepse de pessoa
b) elipse
c) anacoluto
d) hipérbole
e) silepse de número
06. (UM - SP) Indique a alternativa em que haja uma concordância realizada por silepse:
a) Os irmãos de Teresa, os pais de Júlio e nós, habitantes desta pacata região, precisaremos
de muita força para sobreviver.
b) Poderão existir inúmeros problemas conosco devido às opiniões dadas neste relatório.
c) Os adultos somos bem mais prudentes que os jovens no combate às dificuldades.
d) Dar-lhe-emos novas oportunidades de trabalho para que você obtenha resultados mais
satisfatórios.
e) Haveremos de conseguir os medicamentos necessários para a cura desse vírus insubor-
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dinável a qualquer tratamento.
09. (CESGRANRIO) Na frase "O fio da ideia cresceu, engrossou e partiu-se" ocorre processo
de gradação. Não há gradação em:
a) O carro arrancou, ganhou velocidade e capotou.
b) O avião decolou, ganhou altura e caiu.
c) O balão inflou, começou a subir e apagou.
d) A inspiração surgiu, tomou conta de sua mente e frustrou-se.
e) João pegou de um livro, ouviu um disco e saiu.
10. (FATEC) "Seus óculos eram imperiosos." Assinale a alternativa em que aparece a mesma
figura de linguagem que há na frase acima:
a) "As cidades vinham surgindo na ponte dos nomes."
b) "Nasci na sala do 3° ano."
c) "O bonde passa cheio de pernas."
d) "O meu amor, paralisado, pula."
e) "Não serei o poeta de um mundo caduco."
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
PLATÃO & FIORIN. Para entender o texto: leitura e redação. São Paulo: Ática,
2000.
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ANOTAÇÕES
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