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O novo CFO
Em entrevista exclusiva, o especialista em gestão
financeira Jeremy Hope afirma que o principal
executivo financeiro das empresas precisa redesenhar
seu papel urgentemente, passando do controle ao
apoio estratégico
E
m seu novo livro, Reinventing the CFO: How Financial Managers Can Transform
Their Roles and Add Greater Value, lançado em 2006, Jeremy Hope conta que as
empresas norte-americanas hoje –pressionadas pelos escândalos corporativos e
por um ambiente com regras e políticas mais rígidas– demandam muito mais de
seus principais executivos financeiros, os CFOs (chief finance officers), do que simplesmente
apresentar e gerenciar números. Esperam deles apoio à estratégia geral e liderança que
possam impulsionar o bom desempenho dos gestores por toda a companhia e também
aumentar o lucro. E isso se aplica ao mundo inteiro.
De acordo com Hope, além das pressões externas –leis como a Sarbanes-Oxley (SOX)
nos Estados Unidos, padrões internacionais de contabilidade, futuro imprevisível e aten-
ção às melhores práticas, como as do Balanced Scorecard (BSc) e Key Performance Indicators
(KPI)–, a área financeira também depara com pressões internas: “Os CEOs precisam de
mais visibilidade e relatórios éticos, os gestores necessitam de informações relevantes e
rápidas e melhor apoio à tomada de decisão, e os benchmarkings têm conduzido a custos
mais baixos em finanças”, adverte ele. Nesta entrevista exclusiva a Lílian Féres, gerente
de conteúdo de HSM, Jeremy Hope, explica a necessidade de repensar o papel do CFO
e qual deve ser sua nova visão.
Por que a área financeira das empresas anda sofrendo muito, sob tantas pressões?
Parte desse “desespero” nasce do fato de termos menos pessoas na área financeira para
oferecer tamanho suporte à organização. Nos últimos dez anos, os custos com a função de fi-
nanças foram cortados de 3% para 1% da receita (nas melhores companhias, esse número caiu
para 0,6%). Tem-se mais trabalho e as horas são mais longas, porque se diminuiu o número
de funcionários mas não a quantidade de serviço e, assim, as pessoas de finanças têm
trabalhado mais do que nunca.
Outro fator é que há mais pressão e mais estresse. Em 2004, 62% dos executivos de
finanças apontaram que estavam sob grande pressão no trabalho e 68% disseram que
estavam sob mais pressão do que dois anos antes; destes, 63% afirmaram, inclusive, estar
com a saúde afetada.
Uma terceira explicação está na grande rotatividade da área. Nos Estados Unidos, entre
2002 e 2004, 225 dos 500 CFOs citados na Fortune largaram o emprego. Na Inglaterra, a
renúncia dos CFOs chegou a mais de 50%.
Isso ocorre porque a área de finanças está sobrecarregada? Ou será que ela não agrega muito
valor diretamente ao negócio?
Pelos dois motivos, sem dúvida. Há vários processos inconsistentes e de baixo padrão
com diversos inputs errados; muitos relatórios e mensurações irrelevantes; orçamento com
lhes dar apoio” Mas por que parece tão difícil ter apenas um sistema de mensuração padronizado e um relatório-
padrão? Muitas empresas, apesar de possuírem sistema de controle financeiro, ainda lidam com
várias planilhas em Excel... Isso torna o sistema não confiável...
Isso se explica pelo fato de que o maior gap que grande parte das empresas vivencia
é para obter dados limpos. Outra razão é que cada equipe dentro da companhia está
gerenciando seus dados com regras próprias. Assim fica impossível o alinhamento, o que
tem impacto na estratégia do negócio.
As melhores empresas promovem estreita relação entre as pessoas de finanças e a ges-
tão de processos. Minha mensagem para as companhias que querem ser bem-sucedidas
é: abracem essa idéia como se fosse um investimento interno. E isso é mais uma função
do CFO, não do CIO ou diretor de informática...
uma qualidade Isso tem que ver com escolher entre estar no grupo Visão A ou no grupo Visão B, que o sr. definiu
em seu livro?
de previsões Sim. Visão A diz respeito a controle. Visão B é sobre empowerment. Para onde queremos
ir? Temos duas escolhas, mas, infelizmente, a maioria opta por mais controle. O resultado
melhor, é preciso disso? Muita informação, mas pouco saber. As pessoas não têm conhecimento de fato.
ter números- Essa visão mais controlada é o que o leva a afirmar que as pessoas da área financeira não for-
chave. Só” necem exatamente a informação que pedimos? Não seria uma alternativa, por exemplo, termos
uma espécie de “tradutor” entre o financeiro e os demais departamentos?
Ter um “tradutor” não é uma boa idéia. Por que as pessoas que trabalham em finanças
não chegam e falam sobre os lucros e os negócios?
A questão importante é que as pessoas da área financeira geralmente são tratadas como
uma espécie de adivinhos, como se tivessem de inferir o que os demais departamentos
precisam, mas não é bem assim. Eles estão acostumados a ditar e direcionar que tipo de
informação as pessoas precisam saber sem realmente lhes perguntar. Então, um bom
começo seria a área financeira dialogar mais com as outras áreas da companhia, como o
marketing, por exemplo, e efetivamente lhes dar apoio. O financeiro precisa entender as
necessidades de seus clientes internos.
O sr. fala sobre encontrar o equilíbrio entre controles e apoio às decisões e que isso está relacionado
a mudar a função das pessoas de finanças e também a contratar profissionais mais analíticos.
Como isso é possível?
A pessoa ideal para o novo modelo em finanças que proponho é aquela que, em vez de
cética, é desconfiada... Ou seja, tem tino investigativo e, por isso, sabe defender seu ponto
de vista com base em fatos, sustentando uma posição firme sobre uma decisão acertada
ou sobre os riscos de outra. O departamento de finanças deve ter pessoas que se baseiam
em números e fatos, análises, julgamentos e, assim, mostram o impacto sobre os negócios.
Esta é a regra número um para finanças: seja investigativo.
O sr. diz que a função do marketing é buscar a satisfação dos clientes e que a de finanças é manter
os mais lucrativos. São ações complementares ou deveriam ser, certo? Mas, na realidade, parece
que marketing e finanças não se dão muito bem...
Absolutamente correto. São duas áreas que não trabalham muito em conjunto hoje,
mas garanto que elas estão no caminho errado. É importante que trabalhem de forma
colaborativa. O marketing deve ter uma lista de clientes em que –com a ajuda de fi-
nanças– possa identificar quais são mais lucrativos para a companhia, como fazer mais
dinheiro com eles ou até mesmo como transformar clientes nada ou pouco lucrativos em
geradores de mais lucros. Se se trata de uma questão referente à insatisfação, o marketing
deve trazer à tona análises sobre como ajudar a torná-los mais fiéis e, por conseguinte,
mais lucrativos.
Esta é a chave para a empresa que deseja ser bem-sucedida: aliar uma área financeira
analítica a uma área de marketing também analítica, e fazê-las trabalhar em sintonia, ou
melhor, em simbiose.
O sr. advoga a criação de um orçamento simplificado, de uma gestão sem os limites do controle
tradicional por linha do orçamento. Como
fazer isso?
Equilíbrio entre controle e apoio à estratégia É muito simples. Se não estivermos tão
apegados ao controle do orçamento linha
por linha, podemos usá-lo de forma mais
criativa. O importante é saber o limite
Administração Análise e assessoramento para gastar o dinheiro e não enxergar
Contabilidade/relatórios gerenciais Atitude de sócio do negócio apenas “pedaços” do negócio. Os acio-
Controle Melhora de processos
PAPEL FUNCIONAL DE GESTÃO CORPORATIVA PAPEL DE APOIO À EQUIPE DE NEGÓCIOS
nistas não querem detalhes, eles querem
saber para onde a companhia está indo.
Além disso, quanto mais detalhes, menor
APOIO ÀS a precisão. Para uma qualidade de previ-
DECISõES sões melhor, é preciso ter números-chave,
direcionadores-chave. Só.
...mas a maioria dos CEOs não “liga” tanto para a função do RH...
Verdade... mas estão errados. Nas melhores empresas, eles têm tempo para conversar
com as pessoas, até porque não estão fazendo o trabalho que deve ser feito pelos CFOs.
Assim, eles têm tempo para compreender quais as ambições dos funcionários, verificar se
a empresa é vista como um lugar bom para se trabalhar; eles se importam com o ambien-
te. Eles inspiram as pessoas. O CEO é como o oxigênio da companhia e os funcionários
precisam disso. A função dele é fazer a empresa funcionar e crescer, mas pela criação de
um propósito claro, valores fortes e estratégias de longo prazo, não de missões que nada
dizem. Esse é o real significado do que muitos chamam de descentralização, mas que
prefiro denominar evolução.