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apresenta apresenta

Curadores:
icaro Ferraz vidal Jr.
Laila Melchior

9 janeiro
/ 4 de março
2018

produção: patrocínio:
Alexandre Vogler
André Parente
Bruno Baptistelli
Felipe Morozini
Fernanda Gomes
Fernando Gonçalves
Filipe Acácio
Iris Helena
Jared Domício
Juliane Peixoto
Katia Maciel
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Manoela Medeiros
Matias Mesquita
Milena Travassos
Néle Azevedo
Raoni Shaira
Raphael Couto
Ricardo Theodoro
Yana Tamayo
Yuli Yamagata
Yuri Firmeza
A CAIXA é uma empresa pública brasileira que
prima pelo respeito à diversidade, e mantém comitês
internos atuantes para promover entre os seus
empregados campanhas, programas e ações voltados
para disseminar ideias, conhecimentos e atitudes de
respeito e tolerância à diversidade de gênero, raça,
orientação sexual e todas as demais diferenças que
caracterizam a sociedade.
A CAIXA também é uma das principais
patrocinadoras da cultura brasileira, e destina,
anualmente, mais de R$ 80 milhões de seu orçamento
para patrocínio a projetos nas suas unidades da
CAIXA Cultural além de outros espaços, com ênfase
para exposições, peças de teatro, espetáculos de
dança, shows, cinema, festivais de teatro e dança
e artesanato brasileiro. Os projetos patrocinados
são selecionados via edital público, uma opção da
CAIXA para tornar mais democrática e acessível a
participação de produtores e artistas de todo o país.
A exposição coletiva Superfícies sensíveis | Pele
| Muro | Imagem reúne trabalhos de 21 jovens
artistas contemporâneos brasileiros, realizados no
início do século XXI. Sob curadoria de Icaro Ferraz
Vidal Jr. e Laila Melchior, a exposição aborda a temática
da superfície como potência, possibilidade crítica e
estética, apresentando obras que estão conectadas ao
passado de nossa arte ao mesmo tempo que indicam
rotas para o futuro.

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Ao patrocinar mais esta mostra para o público
carioca, a CAIXA reafirma sua política cultural de
estimular a discussão e a disseminação de ideias,
promover a pluralidade de pensamento, mantendo viva
sua vocação de democratizar o acesso à produção
artística contemporânea.

CAIXA ECONÔMICA FEDERAL


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Por Nem de cima, nem de baixo: as cavidades, as
Laila Melchior camadas que se desprendem, as emendas que se
e Icaro Ferraz Vidal Jr. colam e descolam, os planos que se sobrepõem e se
atravessam só se revelam num olhar rente à extensão.
Poros, relevos, texturas, falhas, superposições, relações
e desdobramentos invisíveis aos nossos olhos,
normalmente tão distraídos das superfícies do mundo.
Notar as camadas que nos cercam, nelas permanecer,
habitá-las: trata-se de uma escolha pelo palpável, pela
terra, pela dobra, pelos acontecimentos, pelo acaso.
Intuitivamente ou não, como parte de pesquisas
mais ou menos extensas, uma série de artistas
contemporâneos brasileiros parece ter-se voltado para
as questões de um mundo topológico nos trabalhos
que apresentamos nesta coletiva sob o nome de
Superfícies Sensíveis. Nela reunimos uma seleção de
trabalhos de 21 artistas com poéticas muito distintas
entre si, onde, contudo, a problemática da superfície
aparece repetidas vezes: como potência, como
possibilidade crítica e estética, área de investigação
difusa e, no entanto, presente e pulsante no contexto
da arte contemporânea brasileira.

Investidas pelo olhar dos artistas, essas zonas de


materialidade tópica podem ser percebidas não
apenas como fragmentos invisibilizados pela vida
prática e cotidiana, mas como focos privilegiados
de nossa atenção. Desta maneira, deste o título da

pensar
exposição, buscamos deslocar um privilégio concedido
historicamente ao profundo como forma de chamar
essas superfícies a falar, de trazê-las ao primeiro plano

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– por mais pleonástico que este gesto possa parecer.

pelas A utilização corriqueira e moralizante do adjetivo


“superficial”, que desqualifica uma pessoa ou
coisa supostamente desprovida de valores, indica

camadas
a associação peculiar e correntemente negativa
atribuída à superfície e ao superficial. Nesse sentido
tendemos a contrapor superficial e profundo nos
mesmos termos em que opomos dentro e fora,

do mundo
alto e baixo. A superfície tendo sido historicamente
percebida como reino do falso, das aparências, como o
verniz que esconderia uma verdade mais consistente,
mais profunda. É, entretanto, interessante notar como
o estatuto de prevalência da profundidade sobre a
superfície carrega já uma assimetria em sua raiz. Este
desequilíbrio termina por implicar o fato de que a
1
TOURNIER, Michel. Sexta-feira ou os limbos palavra “‘superficial’ signifique não ‘de vasta dimensão’,
do Pacífico. São Paulo: Difel, 1985, p.60.
2
NIETZSCHE, Friedrich. A gaia ciência. São mas ‘de pouca profundidade’, enquanto ‘profundo’
Paulo: Companhia das Letras, 2001, p.15.
3
FERRAZ, Maria Cristina Franco. Estatuto
significa, pelo contrário, ‘de grande profundidade’ e
paradoxal da pele e cultura contemporânea: da não ‘de fraca superfície’”1.
porosidade à pele-teflon. Galaxia (São Paulo)
[Online], n. 27, p. 61-71, jun. 2014, p. 63.
Nietzsche embaralha ainda mais essa oposição quando,
ao elogiar os gregos, afirma como estes seriam
“superficiais – por profundidade!”2. Esta operação
reorganiza o sistema tradicional da oposição entre
profundidade e superfície ao provocar uma verdadeira
“implosão do dualismo metafísico, montado para acusar
o superficial de pouco profundo, na medida em que
o trata como mero negativo daquilo que teria valor
(a profundidade)”3. O filósofo retoma a superfície,
dotando-a agora de uma paradoxal profundidade.
O paradoxo, aliás, constitui uma interessante quais os corpos dos artistas incrustam-se nos muros da silhueta que agora vemos perfeitamente, feita de
ferramenta na compreensão desse regime superficial e ocupam suas brechas, instaurando um regime tijolo e cimento. Em seguida, com um passo atrás, o
em que a possibilidade do duplo sentido e a imagem da temporal complexo que se inscreve de diferentes artista torna a cobrir a silhueta, voltando à posição
continuidade entre uma face da superfície e seu avesso modos sobre esses corpos – sejam eles humanos inicial. O jogo de cobrir e imitar, desgarrar-se e
oferecem modelos alternativos à obsessão ocidental com ou arquitetônicos. A pele que se incrusta no muro voltar a aderir se potencializa com uma série de
a essência. A arte pode ser um terreno privilegiado para embaralha a topologia entre o dentro e o fora na repetições, movimentos reversos e acelerados da
experimentações dessa natureza. Uma das formulações medida em que este procedimento parece instaurar imagem. André vai e volta, brincando com o próprio
mais radicais desta potência ambivalente do superficial uma continuidade, no plano imanente da imagem, a corpo e com o muro, com a parede lisa e pintada e
pode ser encontrada justamente na produção artística partir da qual já não vemos interior e exterior, mas com a superfície por trás desta, espécie de entranha
brasileira dos anos 60, notadamente na proposição apenas superfícies constituídas de diferentes texturas. chapada, feita em alvenaria. Às imagens sobre, atrás e
Caminhando (1964), de Lygia Clark, na qual o participante
As obras de Yuri Firmeza, de Milena Travassos e da contra o muro que assistimos dentro do filme, soma-
é convidado a recortar uma Fita de Moebius no sentido
dupla André Parente e Kátia Maciel estão, em grande se um outro jogo, no qual projetamos a imagem do
longitudinal, o que lhe permite experimentar uma errância
medida, baseadas neste gesto. vídeo sobre a parede da galeria. Nesse novo par de
por meio desta superfície paradoxal, na qual as fronteiras
muro contra muro, a textura da parede da galeria é
entre frente e verso são, literalmente, retorcidas4. Com uma pesquisa ligada tanto à cidade quanto, de incorporada ao trabalho, conferindo-lhe mais uma
Já no contexto da produção artística brasileira deste maneira geral, à ação do tempo e da memória – nos camada. Por outro lado, nos momentos em que
início de século, acreditamos que as formas de pensar corpos e na vida – Yuri Firmeza começa a sequência André desiste da brincadeira e descola totalmente
o mundo, de percebê-lo e de habitá-lo privilegiando de imagens que compõem Ação 3 (2005) com uma da parede, deslocando-se no quadro em direção ao
as superfícies implicam uma escolha pelo palpável das espécie de retrato negativo. A fotografia mostra um espectador ou vice-versa, vemos a imagem, até então
texturas e dos toques, pelas extensões terrenas, por espaço em ruínas no qual vemos uma escada que chapada, adquirir perspectiva. Isto cria no plano
um olhar rente às faces deste mundo mesmo que nos leva a um buraco aberto na parede. Nas imagens uma profundidade tão inesperada quanto inventiva,
cerca, do mundo tomado por sua parte sensível. Tal olhar seguintes vemos o artista nu aproximar-se do vão fazendo com que o vídeo se compare a uma
está atento aos fenômenos superficiais e aos acidentes esculpido no muro e, pouco a pouco, acomodar-se verdadeira gag do primeiro cinema.
deles resultantes, uma vez que, como escreve Deleuze, nele. Carne e pedra: o corpo de Yuri, amalgamado
“o sentido aparece e atua na superfície, pelo menos se aos pedaços de alvenaria, aquieta-se ali, acomoda-se Diferentemente de Na Parede, que lança mão
soubermos tocá-la adequadamente, de maneira a formar como parte da construção. de efeitos próprios do vídeo para instaurar uma
letras de poeira, ou como um vapor sobre o vidro em temporalidade reversível e circular, Monumentos
que o dedo pode escrever”5. Se nas imagens de Firmeza o corpo sedimenta-se Mínimos (sequência no elevado Costa
como parte do muro, na sequência No parapeito e Silva) (2002), fotografia realizada a partir da
(2006), de Milena Travassos, o perigo da queda parece série de intervenções urbanas de Néle Azevedo,
Superfícies Sensíveis:
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ser iminente. O corpo da artista equilibra-se, sentado congela o tempo em um momento que anuncia a
Sobre as obras em exposição
sobre o peitoril de uma janela, adensando as relações impossibilidade de qualquer retorno ou projeção
entre dentro e fora e testando os limites entre a à frente. Sobre a superfície craquelada do viaduto
casa e o mundo. Ali a parede já não é ruína. Agora, ela paulista, uma pequena figura antropomórfica feita
Ouvir as superfícies, tocá-las adequadamente, desafia na medida em que o vão da janela deixa de ser de gelo contempla a imagem de uma São Paulo
potencializar as zonas de contato, de fricção. A pele, o moldura da paisagem para tornar-se uma espécie de absolutamente vazia. É um equilíbrio fugaz, que
muro e a imagem são três superfícies paradigmáticas portal, brecha na qual a artista se equilibra: de um lado, tende ao colapso: o viaduto esquentará sob o sol,
nessa configuração topológica do mundo que muitas a casa; em seu avesso, o mundo. Se Yuri Firmeza instaura derretendo a estatueta de gelo, que escorrerá, por
vezes negligenciamos. A pele, nosso maior órgão, relações entre o corpo e o espaço a partir de imagens sua vez, pelas fissuras do concreto; também São
media quase todo contato humano; o muro abriga os nas quais a materialidade opaca e cheia de cicatrizes Paulo, vista agora como pura paisagem de fundo,
corpos, comunica e separa diferentes tipos de espaços, das ruínas se impõe; na instalação de Milena Travassos, cidade vazia e imagem pacífica, logo acordará,
desenha as cidades e delimita interditos por força de a transparência de uma janela aberta prolonga-se na tornando-se, ela própria, fluxo
sua extensão; a imagem, por sua vez, habita o mundo própria materialidade da obra: impressões fotográficas
de tal modo que ora as atravessamos, ora somos sobre placas de vidro. Essas placas, apoiadas no chão e A questão da fixação do instante efêmero cara à
barrados por elas. na parede, reproduzem a situação de frágil equilíbrio fotografia combina-se à pesquisa sobre a paisagem
da própria artista na fotografia, e nos fazem associar a em Limpando o céu (2003), de Jared Domício.
A superfície é um topos recorrente na obra de
Se a pele, o muro e a imagem articulam-se de
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Lygia Clark. Desde suas superfícies moduladas, transparência não mais com o campo da “verdade” e Neste tríptico fotográfico, o artista cria uma espécie
até seus famosos bichos, é no contato com a diferentes modos nas obras que propomos ao do “sincero”, mas com uma experiência vertiginosa e de faxina a partir das três imagens nas quais vemos
superfície dos planos que a experiência estética,
tal como concebida pela artista, acontece. público da Caixa Cultural, nossa estratégia foi potencialmente disruptiva. um homem que parece varrer as nuvens do céu.
DELEUZE, Gilles. Lógica do sentido. São Paulo:
a de construir planos virtuais, áreas de afinidades
5

Perspectiva, 1975, p. 158. Tradução revista pelos As fotografias, tiradas de baixo para cima, criam
autores, p. 136. que instigassem o público a explorar as dobras, A parede do espaço expositivo, cuja textura esta imagem do céu como um espaço compacto e
sobreposições e fissuras entre os trabalhos. Nesse entrevemos nas áreas mais translúcidas de No homogêneo que, pelo menos do ponto de vista da
sentido, inventariamos algumas operações – parapeito, é a mesma sobre a qual se projeta imagem fotográfica, perde sua profundidade e se
conexões possíveis em meio a tantas outras – a fim Na Parede (2007), de André Parente e Katia torna acessível como superfície, passível portanto de
de orientar o visitante sem, no entanto, impedi-lo de Maciel. No vídeo, assistimos em loop à brincadeira ser esfregada, lustrada.
estabelecer suas próprias relações, a partir de seu dos artistas com uma silhueta esculpida no muro.
repertório e de sua sensibilidade. Enquanto ouvimos a voz de Katia, que filma, André
preenche, com o corpo rente ao muro, a forma
Podemos começar este nosso breve e não- talhada do homem na parede. Ele se descola da
conclusivo inventário mencionando os trabalhos nos escavação para replicar, um passo à frente, a forma
milena travassos Yuri Firmeza

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No parapeito, 2006 Ação 3, 2005


4 Placas de vidro com impressão fotográfica Fotografias - pollíptico
100 x 264 x 30 cm 61 x 80 cm, cada
Acervo da artista Cortesia  Casa Triângulo
Néle Azevedo André Parente & Katia Maciel

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Monumento Mínimo (seqüência no elevado Costa e Silva), 2002
Fotografia Na Parede, 2007
61,1 x 88 cm Vídeo, 1’
Acervo da artista Acervo dos artistas
Jared Domicio Em um outro eixo possível de pesquisa artística, os
artistas Felipe Morozini, Bruno Baptistelli e Alexandre
Vogler trabalham sobre as superfícies dos muros
que demarcam os limites entre os espaços públicos
e privados de nossas cidades. O investimento dos
artistas sobre tais superfícies permite-nos pensar na
própria cidade como uma superfície plástica, capaz
de instaurar novas relações entre os corpos e de
criar outras imagens e espacialidades.

Em The City that Has Been Painted II


(2007), Morozini intervém sobre uma fotografia
na qual vemos dois homens sentados, um de
frente para o outro, no parapeito da varanda de
um apartamento em obras. O parapeito, também
presente na obra de Milena Travassos, instaura mais
uma vez esta zona liminar entre a privacidade e a
vida pública, enquanto a recorrência destes corpos
em equilíbrio sobre ele parece apontar para a
cidade como um abismo em potencial. O gesto de
Morozini consiste em estender à superfície desta
fotografia a ação que potencialmente estaria em
curso naquele apartamento. Assim, sobre o registro
fotográfico digital, o artista introduz uma camada
de efeito pictórico, lembrando-nos que a pintura,
uma das técnicas mais canônicas das artes visuais,
recobre grande parte dos muros e paredes que nos
circundam cotidianamente. Estarão, os dois homens
sobre o parapeito, descansando da pintura da cidade,
ironicamente inscrita por Morozini sobre a superfície

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da imagem fotográfica?

Esta dimensão pictórica da cidade costuma ser


negligenciada, à exceção de raros momentos, como
no caso das controvérsias geradas em 2017 em
torno do encobrimento dos grafites da cidade São
Paulo por parte da prefeitura. Mas, paradoxalmente,
é através das superfícies que apreendemos o espaço
e entramos em relação com ele. Em Por mim…
por nós (tempos distintos) (2011), Bruno
Baptistelli intervém pictoricamente sobre a fachada
de duas casas geminadas. Nos registros fotográficos
desta ação vemos dois momentos: as duas casas
pintadas de cores diferentes e a imagem da
fachada após a intervenção do artista. No primeiro
momento, as cores que marcam essas porções
distintas e simétricas da mesma construção atuam
assinalando relações de propriedade, demarcando
seus limites desde o exterior. Ao mesmo tempo em
que prestamos pouca atenção às superfícies, um
fenômeno urbano como este sinaliza uma dimensão
política e ideológica que tende a ser naturalizada,
mas que por outro lado, deixa marcas gritantes na
paisagem da cidade. O gesto de Baptistelli consiste
em sublinhar pictoricamente um elemento estrutural
reminiscente da construção original: a garagem
Limpando o céu, 2003 simétrica que depende da contiguidade entre as duas
Fotografia casas. Ao pintar de rosa apenas a área referente à
tríptico, 40 x 80 cm cada garagem, o artista libera nossa percepção da lógica
Acervo do artista da propriedade privada - este modelo cognitivo
Bruno Baptistelli improfanável – e nos oferece uma outra relação
possível com esta arquitetura, cujos fundamentos
estruturais e funcionais voltam a ser visíveis.
Em Base para unhas fracas (2010), vídeo de
Alexandre Vogler, vemos uma mulher nua, a atriz
Marcela Maria, que percorre as ruas do centro da
cidade do Rio de Janeiro. Neste percurso noturno,
Marcela cola cartazes sobre os muros da cidade. A
imagem dos cartazes parece ser a de um anúncio
de esmaltes mas, se vista atentamente, apresenta,
encoberta pelas mãos de unhas pintadas, o close-up
de uma vagina, desafiando a percepção dos passantes,
habitualmente expostos às imagens imediatas da
publicidade. Tais cartazes criam uma abertura virtual
sobre as superfícies dos muros e imóveis, de outro
modo intransponíveis. Esta abertura, no entanto, é
encoberta pela propaganda “base para unhas fracas”,
que dá título ao trabalho. Até que ponto este pano
de fundo para o esmalte de unhas será percebido
pelos passantes? Estará nosso olhar tão formatado
pela publicidade que, ao reconhecer tratar-se de um
anúncio de esmalte de unhas, chega ao ponto de
negligenciar a inesperada imagem da vagina? Como
no trabalho de Bruno Baptistelli, os hábitos que
recobrem nossa percepção da cidade são também
desafiados no vídeo de Vogler e somos convidados
novamente a olhar com atenção para as imagens que
revestem não só nossos muros como também todo
o mundo sensível.

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Por mim…por nós (tempos distintos), 2011


Fotografia
62,5cm x 42cm
Acervo do artista
Felipe Morozini Alexandre Vogler
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The City that Has Been Painted II, 2007
Fotografia Base para Unhas Fracas, 2010
100 x 140 cm Vídeo, 9'
Acervo do artista Acervo do artista
Além da ênfase na plasticidade dos muros da cidade, katia maciel
contamos com trabalhos que intervém nas imagens da
cidade de modo a ressaltar os limites desta maleabilidade
plástica. O vídeo Inútil Paisagem (2005), de Katia
Maciel, consiste em um travelling que passeia pela
Avenida Vieira Souto, em Ipanema, registrando as
portarias e garagens dos edifícios à beira mar. A partir
de determinado ponto, a câmera retorna e as grades dos
edifícios já não estão na imagem, elas foram apagadas
digitalmente. Mas este apagamento não pôde se realizar
por completo, restam na imagem traços que o denunciam,
tais como os reflexos das grades sobre as superfícies
espelhadas das portas de vidro que dão acesso ao interior
dos edifícios. Estas camadas de permeabilidade parcial – a
grade – e de alta reflexividade – o blindex – co-habitam
a imagem videográfica, ressaltando a potência poético-
epistemológica da imagem técnica na reinvenção da
paisagem ou no aprendizado das tensões históricas e
políticas subjacentes a tal reinvenção.
Se pudemos observar o gesto de inscrição, sobre ou
através das superfícies em uma série de trabalhos, a
obra de Katia Maciel integra um quadro interpretativo
estruturado em torno da ideia do apagamento, a partir
do qual poderemos pensar outros trabalhos reunidos na
exposição. Tal ideia manifesta-se claramente na fotografia
Notas públicas No II - da série lembretes
(2009), de Iris Helena. Um gesto crucial na pesquisa da
artista consiste na criação de suportes que acolham,
para além do conteúdo figurativo de suas fotografias,
as tensões instauradas pelas múltiplas temporalidades
que atuam nas relações entre memória e esquecimento.

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No trabalho que selecionamos para integrar a


exposição, vemos o registro fotográfico de uma cena
urbana corriqueira, na qual pedestres atravessam uma
movimentada rua típica dos centros urbanos brasileiros.
Esta cena, que não conta nada sobre nenhum evento que
se poderia considerar extraordinário, estaria condenada
ao esquecimento. Mas a artista, no duplo gesto de optar
pela impressão da fotografia em grande escala e sobre
uma série de post-its, acentua e reverte esta tendência. O
instante qualquer torna-se, literalmente, memorável, na
medida em que a artista o inscreve sobre estas pequenas
superfícies auto-colantes destinadas justamente a prevenir
o esquecimento.
Jogando ainda com esta poética do apagamento,Yana
Tamayo intervém na paisagem modernista por meio
de um jogo entre escala e perspectiva. Eclipses
(ocupações) (2007) é um políptico de fotografias
no qual vemos o Museu Nacional de Brasília ser
progressivamente eclipsado por uma bacia plástica cor
de rosa. A bidimensionalidade das imagens fotográficas
permite re-escalonar a extensão monumental do
edifício modernista para colocá-lo em relação com uma
bacia plástica, objeto de uso corrente, cujo design é
tão eficiente no ambiente doméstico quanto acessível
do ponto de vista financeiro, com a qual podemos nos
relacionar mais intimamente do que com a arquitetura
monumental de Oscar Niemeyer. A idealização da escala
humana ou o seu abandono, calcanhar de Aquiles do
projeto arquitetônico modernista, são ironicamente
colocados em xeque pela artista, que lança mão da Inútil paisagem, 2005
superficialidade da fotografia para instaurar uma relação Vídeo, 4’
entre essas duas ordens de grandeza. Acervo da artista
IRIS HELENA Yana Tamayo
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Notas Públicas N o II (da série lembretes), 2010 Eclipses (ocupações), 2007
Fotografia impressa a jato de tinta sobre post-its Fotografia
200 x 295 cm 33,75 x 45 cm cada
Cortesia Portas Vilaseca Galeria Coleção Sérgio Carvalho
Diante de uma extensão homogênea, há também agulha, Letícia Parente inscreve as palavras Made in As marcas do tempo, do atrito e do uso que
estratégias em que eleger uma área para nela investir Brasil na sola do pé. Mas se o gesto levado a cabo por permanecem sobre as extensões podem ser
constrói uma área focal de onde saem sinais e para Raphael Couto se inscreve nesta vertente da arte pensados para além de meros desgastes ou ruídos
onde confluem os olhares. De maneiras muito contemporânea na qual o corpo se torna o principal que dificultam a percepção de um corpo original.
diferentes, encontramos essa operação tanto em suporte e meio de expressão, sua ação investe este O trabalho de Manoela Medeiros parece desdobrar
Matias Mesquita quanto em Fernando Gonçalves, corpo superficialmente, conferindo à pele um lugar esse pensamento como uma espécie de gesto
artistas com trabalhos muito distintos que expressivo, para além de qualquer textualidade fundamental a partir do qual os fragmentos que se
conversam entre si na medida em que constroem que poderia se inscrever sobre ela. As perfurações, conservam sobre suas obras tornam-se escrituras
esse efeito-centro para, em seguida, desfazê-lo. Nas que viabilizam o tecido epitelial de Raphael Couto particulares que só podemos compreender ao nos
obras 13/10 às 17 e 59, 14/10 às 18 e 02 e a integrar-se ao patchwork que o artista compõe, precipitarmos sobre elas. Ruína #4 (2016), que
22/01 às 17 e 55 (2013) Matias pinta delicados repuxam e produzem vermelhidões sobre seu corpo. apresentamos na exposição, condensa camadas de
óleos sobre placas de cimento. Sob a fluidez da Nosso olhar, atraído por essas inscrições que não revestimento pictórico para dá-los a ver a partir de
técnica com que o artista cria seus céus de nuvens podemos decodificar completamente, hesita entre um procedimento de escavação. Manoela propõe
carregadas, encontramos um corte seco, um limite o reconhecimento de uma dor auto-infligida e uma uma espécie de arqueologia ficcional em que
marcado por uma linha de prédios, um contorno tentativa de localização das partes de pele que estas aglutina camadas de tinta sobre o quadro para, em
da paisagem urbana contemporânea. As nuvens imagens feitas de muito perto nos dão a ver. seguida, escavar sua superfície. Se por um lado um
plúmbeas e seus contornos: é para essa pequena olhar inicial sobre algumas de suas obras poderia
área investida de tinta que nosso olhar é sugado num Esta progressiva aproximação ao muro ou à pele remeter a um plano cartográfico, por outro lado,
primeiro momento diante das placas. Se por um lado culmina em uma série de trabalhos nos quais percebemos que não há o que ler em suas obras, a
Matias retira os prédios da paisagem, escolhendo acessamos as superfícies bem de perto, perdendo de não ser sua própria materialidade enquanto pintura.
não os representar, por outro lado, remete às vista os corpos que elas revestiriam e ingressando O jogo entre cores, texturas e formas se dá por
construções urbanas por meio do cimento com em um regime mais contemplativo, atento aos subtração e são os fragmentos resultantes do atrito
o qual são feitas as placas que acolhem a pintura. detalhes que constituem essas extensões. Os com a espátula da artista que repousam enquanto
A linha de prédios ausentes nos reconduz para o trabalhos de Fernanda Gomes, Ricardo Theodoro e obra. Manoela produz reminiscências de ruínas
que antes era o “não-pintado” da pintura, seu mero Manoela Medeiros são bons exemplos desta forma fabricadas. Sem originais, não há estados anteriores
suporte. O cimento salta à vista com suas fendas e de aproximação à superfície que confere a estas aos quais remeter. O resto é o trabalho: seja sobre o
rachaduras na medida em que o olho passa a ir e vir, camadas uma relativa autonomia em relação aos quadro, aderindo a ele, seja sobre o chão do espaço
buscando não apenas as rupturas entre área pintada corpos. No vídeo Minha própria lua (2017), de expositivo, como o cascalho que é gerado pela obra.
e seu suporte, mas também as relações possíveis Fernanda Gomes, uma câmera passeia rente à pele
entre figura e fundo. da artista, cujas pintas foram todas numeradas. Em Essa tensão entre figurativo e abstrato que perpassa

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castelhano, os sinais sobre a pele são chamados de a exposição se condensa de maneira particular
Já Fernando Gonçalves trabalha a figura do rosto lunares e esta analogia – que perdemos na língua em Assim, pois, eu (2011). O vídeo de Filipe
em Ficções (2008), fotografia feita a partir de um portuguesa – entre a superfície da pele e a superfície Acácio vai do figurativo ao abstrato na medida
cartaz de lambe-lambe em que um rosto feminino lunar inspira as escolhas da artista na realização de em que acompanha o processo de apagamento de
aparece iluminado, como que boiando contra o fundo seu vídeo. A câmera transforma-se em uma espécie um retrato fotográfico dentro de uma bacia com
negro. Também nessa imagem nosso olho corre de sonda lunar, e a banda sonora do vídeo nos material solvente. A figura da foto e também seu
para o centro nevrálgico do rosto, para decifrar remete às imagens de exploração espacial caras fundo se desfazem em cores sob o efeito do líquido
suas expressões, suas mensagens. Mas, além da aos filmes de ficção científica. Apesar de filmada sem, contudo, extinguirem a imagem. Acompanhamos
face, a fotografia mostra os efeitos dos acidentes muito de perto, a artista resta irreconhecível. A o desenrolar do processo químico para descobrir
aos quais esse tipo de impresso costuma estar superfície da pele deixa-se contemplar em cada que o que resta da decomposição é ainda uma
exposto no ambiente urbano: são várias marcas, milímetro em detrimento de qualquer possibilidade imagem – tonalidades e texturas em metamorfose –
algumas das quais provocadas por bolhas de ar de visão de conjunto ou de identificação, por parte que se impõe em primeiro plano. Assim, quando nada
sob o papel no momento de sua colagem; outros do espectador, das partes do corpo da artista mais resta da imagem figurativa no retrato, ainda há
traços parecem decorrer do contato com a água apresentadas no vídeo. o que ver: o branco-amarelado do papel, o líquido
das chuvas. Notamos sobretudo um grande golpe, solvente carregado de tinta.
um arranhão em forma de meia-lua que corta todo Esta perda do ponto de referência espacial parece-
o rosto, atravessando o cartaz de lambe-lambe de nos fundamental como recurso poético que permite
uma ponta à outra. Se sobre a imagem do rosto o a criação de uma série de imagens que dão a ver as
arranhão assume um caráter de ferida profunda, sua superfícies dissociadas dos supostos conteúdos que
continuidade com as áreas escuras que emolduram elas revestiriam. O díptico Sem título (2014) de
o rosto no centro da imagem revelam a contiguidade Ricardo Theodoro, consiste em duas fotografias de
da superfície-imagem - toda ela delicada, superfície paredes recobertas por ladrilhos brancos pintados
nervosa como a pele. por uma tinta igualmente branca, que descasca. Esses
monocromos, marcados por rejuntes, desgastes e
Nesse campo das terminações nervosas da imagem, outros traços, não dão nenhuma pista do local onde
podemos destacar ainda Patchwork – recorte a imagem teria sido produzida. Este procedimento
10 (2012), fotografia de Raphael Couto na qual inscreve-se nas fronteiras entre figuração e
vemos retalhos costurados à sua própria pele. O abstração e deslocaliza esta fronteira, apontando
gesto da costura sobre a pele remete ao seminal para a possibilidade de estabelecermos uma relação
Marca Registrada (1975), vídeo em que, com linha e contemplativa com toda e qualquer superfície.
matias mesquita fernando gonçalves

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13/10 às 17 e 59, 14/10 às 18 e 02 e 22/01 às 17 e 55, 2013 Ficções, 2008


Pinturas à óleo sobre placa de cimento (tríptico) Fotografia
140 x 23 cm 103 x 57 cm
Acervo do artista Acervo do artista
Fernanda Gomes Raphael Couto

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Minha própria lua, 2005 Série Patchwork, Recorte 10, 2012
Vídeo, 3’33” Fotografia
Acervo da artista 100 x 66 cm
Ricardo Theodoro manoela medeiros

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Sem título, 2014 Ruína #4, 2016


Fotografias Pintura, revestimento e escavação 
86,5 x 86,5 cm 212 x 141 cm
Acervo do artista Acervo da artista
Filipe Acacio A superfície em potencial da tinta também pode ser
pensada como superfície em estado líquido. Com
sua poética em torno da radicalização das qualidades
inerentes aos produtos industriais,Yuli Yamagata lança
mão de uma operação cara ao próprio domínio no
qual a tinta costuma ser empregada, o da construção
civil, para produzir o objeto que apresentamos ao
público. Em 1:100 (2015), a artista se apropria da
escala 1:100 e aplica o conteúdo de uma lata de tinta
destinada a cobrir 10m2 sobre uma superfície de
10cm2. As sucessivas camadas de tinta aplicadas com
pincel sobre a superfície de pequenas dimensões
acaba por criar um objeto tridimensional, como se a
superfície de 10m2 tivesse sido dobrada até assumir
esta forma densa e abstrata. Ao circundar o objeto,
podemos observar os rastros das pinceladas sobre
sua face superior e, nas laterais, as estratificações das
quais ela resulta.

Se Yuli agrega as camadas a ponto de criar finalmente


um objeto tridimensional, em Cava (2015), a dupla
Juliane Peixoto e Raoni Shaira se ocupa dos processos
de erosão, confrontando o espectador com o árduo
trabalho de escavação de uma pedreira, onde a
dureza das rochas impõe um corpo-a-corpo com
sucessivas camadas de pedra. Por mais insistentes
que sejam, o trabalho e o esforço humano que
acompanhamos no vídeo parecem incapazes de dar
conta da densidade dos gigantes blocos de rocha
maciça. O som incessante dos instrumentos contra a
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pedra preenche a galeria na medida em que assistimos
aos trabalhadores na pedreira: o rochedo, enorme
diante de seus corpos, permanece de dimensões
descomunais quando, num plano aberto, o vemos em
relação a um trator na paisagem. Nos planos mais
próximos observamos os desenhos que as atividades
mineradoras ajudam a traçar na rocha – belas, mas
também obstinadas formas minerais, impassíveis frente
ao esforço desses homens. A perseverança deste
trabalho sem fim sobre o rochedo quase inabalável
nos coloca diante da pergunta: mas afinal, o que as
superfícies encobrem, senão outras superfícies?

Se pensar o mundo a partir da proposta das


superfícies implica colocar-se questões dessa ordem,
às quais as noções de conteúdo, miolo ou essência
6
Valéry apud Ferraz, Maria Cristina Franco
op. cit. talvez pouco ajudem a responder, o risco e a coragem
embutidos nessa escolha restam sendo a possibilidade
de um outro mundo, em que uma resposta passe por
outros lugares em relação àqueles que já conhecemos.
Trata-se de uma escolha por um tempo despendido
nas vilosidades, demorando-se sobre as camadas
externas, sobre a crosta terrestre, sobre as extensões
que podemos ver e tocar desde a altura do chão,
desde perto da pele ou rente aos muros, estendendo
ao mundo o que Paul Valèry já havia percebido no
humano: que o que há de mais profundo é a pele6.
Assim, pois, eu, 2012
Vídeo 3’40”
Acervo do artista
Juliane Peixoto & Raoni Shaira por uma política
do superficial

Pele, muro e imagem são os estratos que


constituem o solo sobre o qual Superfícies Sensíveis
foi alicerçada. Nesta topologia, a imagem parece
revelar a potência da qual é investida em nossa
época. Se ela foi histórica e filosoficamente
concebida como uma segunda realidade, uma
representação exterior aos “verdadeiros” seres do
mundo, hoje podemos nos aventurar a reivindicar
a própria imagem como entidade, isto é, dotada de
uma agência que deixaria Platão de cabelo em pé
dentro de sua caverna. Já não nos parece possível,
pelo menos desde Guy Debord e de sua sociedade
do espetáculo7, pensar as imagens como restritas
ao âmbito da pura aparência. Em seu talvez mais
conhecido aforismo, o situacionista francês já nos
dizia que o espetáculo não consiste simplesmente
em um conjunto de imagens, mas no fato de que as
relações sociais entre as pessoas teriam passado a
depender de uma mediação pelas imagens.

O cenário descrito por Debord neste clássico de


1967 parece ter se desdobrado em uma escala
que surpreenderia o próprio autor. Parte desta
surpresa podemos atribuir às mudanças em nosso
ecossistema midiático, que já não parece depender
exclusivamente de uma indústria do espetáculo,

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que centralizaria, como outrora, a produção e


distribuição das imagens. Se é verdade que os
grandes conglomerados da mídia de massa ainda
desempenham um importante papel na orquestração
de muitas das pautas nas quais a opinião pública se
engaja; este sistema complexificou-se enormemente
com a emergência da internet, a despeito da
economia política que organiza o sistema global de
redes. Sempre podemos evocar a lógica assimétrica
estruturante do modo de produção capitalista
para apontar o dedo na direção dos grupos de
acionistas de empresas como Facebook, Google, etc.
e responsabilizá-los, nos mesmos termos em que
pudemos responsabilizar os donos de emissoras
de televisão, de grandes produtoras de cinema, de
7
Debord, Guy. A sociedade do espetáculo. Rio editoras etc. pela manipulação ideológica das massas.
de Janeiro: Contraponto, 1997.
O risco, ao esgotarmos nossa reflexão neste ponto,
é o de negligenciarmos a novidade, justamente no
que diz respeito às imagens, de que hoje qualquer
um com um smartphone e uma conexão de internet,
pode produzi-las e colocá-las em circulação. É
negligenciar também uma dimensão do desejo por
essas imagens que chega a nos constituir como
sujeitos de uma forma análoga ao que faz a pele ao
nos separar do mundo ou nos colocar em relação
com ele. Se hoje produzimos e compartilhamos
esse conteúdo imagético de nós mesmos enquanto
Cava, 2015 sujeitos, este hábito parte de um desejo tão
Vídeo, 18’ difundido no mundo contemporâneo quanto os selfs
Acervo dos artistas e as selfies que nele se reproduzem.
Chama atenção a possibilidade de que, talvez, já não minibios curadores
sejam apenas as relações sociais que se constituam
através desta mediação imagética. Assistimos à
proliferação de dispositivos baseados no registro e Icaro Ferraz Vidal Junior é pesquisador,
processamento de imagens em uma vasta gama de ensaísta e curador independente. Graduou-se em
domínios, que vão desde as ciências da saúde – com Estudos de Mídia na UFF, é mestre em Comunicação
suas tecnologias diagnósticas e cirúrgicas baseadas e Cultura pela UFRJ e em “Crossways in European
em imagens – até o domínio militar – onde câmeras Humanities” pelas Universidade Nova de Lisboa,
suicidas são instaladas na ponta de mísseis teleguiados. Universidade de Santiago de Compostela e
Estas imagens, chamadas por Harun Farocki8 de imagens University of Sheffield. É doutor em Comunicação
operativas, não representam nada, elas operam no e Cultura, também pela UFRJ, e atualmente realiza
interior de processos que elas mesmas monitoram estágio pós-doutoral PNPD/Capes no Programa de
e modulam. Neste sentido, reivindicar que a imagem Pós-graduação em Comunicação e Linguagens da
passou a ser dotada de uma agência e, portanto, de uma Universidade Tuiuti do Paraná. Recentemente fez a
performatividade, não é nenhuma metáfora ou hipérbole. curadoria das exposições animal-estar (Centro de
Refletir sobre as relações que vinculam Artes UFF, Niterói, 2017/2018), Gramáticas Infames
topologicamente a pele, o muro e a imagem ajudam a do Medo (Blau Projects, São Paulo, 2017) e Pelle,
nos esquivarmos dos regimes perceptivos hegemônicos di Fernando Gonçalves (co-curadoria com Lucía
que isolam os corpos, esquadrinham o espaço e Caminada, Spaziostudio, Milão, 2015).
projetam ambos, tanto corpos quanto espaços, sobre
a superfície das imagens. Nesta exposição propomos Laila Melchior é curadora independente,
um engajamento da percepção sobre as superfícies da pesquisadora em artes, estéticas e tecnologias da
pele, do muro e da imagem – assim como diferentes comunicação. Mestre em Comunicação e Cultura
combinações destes elementos – para além dos pela Escola de Comunicação da UFRJ, graduada em
regimes de reconhecimento e identificação que pautam Rádio e TV pela mesma instituição. Lecionou no
nossa percepção e experiência corriqueiras. Através curso de Graduação em Cinema e Mídias Digitais
deste gesto, tais superfícies imbricam-se, se sobrepõem do Instituto de Educação Superior de Brasília. Com
e tornam-se contíguas de tal modo que uma brecha publicações em livros e outros veículos, atua em
talvez possa se abrir para que nosso regime perceptivo diversos projetos nas áreas de artes e cinema, dentre
extrapole o espaço da galeria e se instaure como uma as quais a exposição Remanso (Brasilia, 2017) e o
possibilidade de experiência do mundo, a partir de suas

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projeto Aventuras do Pensamento (Rio de Janeiro,


infinitas camadas de superfícies. 2016 | 2017).
As imagens reunidas em Superfícies Sensíveis não
ocultam suas materialidades para induzir, no
espectador, a crença em um mundo transparente,
anti-aderente9 e desprovido de mediações. Não se
trata de um breve inventário das representações
contemporâneas da pele e do muro por meio da
imagem. Trata-se, antes, de um conjunto de imagens
que instauram tensões entre aquilo que elas
apresentam, figurativa ou abstratamente, e sua própria
materialidade. Acolhidas em vidro, concreto, post-
its; impressas ou virtualizadas em arquivos digitais;
exibidas em televisores, tablets ou projetadas sobre
anteparos, tais imagens compõem nosso mundo,
entram em relações simbióticas com as superfícies
8
FAROCKI, Harun. “Phantom Images”. Public, dos corpos e das cidades e, portanto, já não podem
Number 29: Localities. Toronto, p. 12-24, 2004
9
Cf. Ferraz, Maria Cristina Franco op. cit ser concebidas apenas em termos representacionais.
As potências éticas, estéticas e políticas próprias a esta
concepção do mundo percebido como superfícies e
estratificações residem na capacidade que esta inaugura
de desafiarmos os limites do corpo e do espaço
a partir de uma lógica própria às imagens. Reside
também na capacidade de perceber interesse para
além do mundo cartesiano da razão, reabilitando nexos
a partir do toque, da presença e de outras lógicas
mais próximas desses outros universos semânticos. A
necessária reinvenção da política em nosso tempo deve
dar conta, nos parece, desta redistribuição dos limites,
desta realocação das fronteiras, na busca por torná-las
mais flexíveis e porosas.
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Yuli Yamagata ficha técnica Curadoria
Icaro Ferraz Vidal Junior
Laila Melchior
Coordenação Geral
Daniela Marinho e Izabel Ferreira
Produção Executiva
Daniela Marinho
Projeto Expositivo
Paula Quintas
Projeto Gráfico
Vivian Melchior
Assessoria de Imprensa
Raquel Silva
Fotografia
Bernard Lessa
Assistente de Produção Executiva
Ylla Gomes
Assistente de Produção
Felipe Paladini – Rio de Janeiro
Cristiane Pires – Fortaleza
Iluminação
Julio Katona
Instalações Multimídia
Iramá Gomes
Montagem e Cenotécnica
Renato Cecílio das Dores
Sérgio Gomes Lima
Produção Local
Izabel Ferreira

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agradecIMENtos A Gentil Carioca


Artquality Transporte de Obras de Arte
Casa Triângulo
Fabíola Neves
Gus Moura de Almeida
Gustavo Raposo
Jaime Vilaseca
Julia Vaz
Margareth Marinho
Mercedes Viegas Arte Contemporânea
Nilson Lopes
Portas Vilaseca Galeria
Ricardo Trevisan
Rodrigo Editore
Sérgio Carvalho
Zipper Galeria

1:100, 2015
Tinta látex com cobertura para 10m²
10 x 10 cm
Acervo da artista
Caixa Cultural RJ
Av. Alm. Barroso, 25 - Centro,
Rio de Janeiro - RJ, 20031-003
informações: (21) 3980-3815

www.caixacultural.gov.br
facebook.com/CaixaCulturalRioDeJaneiro
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