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Conceitos Basicos de SOCIOLOGIA Capa; Paulo Gata Digitaglo: Leila Prado Editorasdo: Comexao Editorial Produgdo Editorial: dalmir Caparrés Fangd S°Edigto ~ Revista Tradugo: Rubens Edeardo Ferreira Fria (Gerard Georges Delaunay Dads Internacionais de Catalogagdo na Publicagio (CIP) (Camara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Conesits bisicos de sociologia/ Max Webe: tracughio de Ruhens Eduardo Ferveira Fria Gerard Georges Delaunay lo: Centauro, 2002 ISBN 978-85-88208.26. Cignciassociais~ Discurso, ensuis, conferEacias 2, Weber, Max, 1864-1920. 1, Titulo 02-0178 cpp-301 indices para eatalogo siste |. Weber, Max : Teoris : Sociologia 2008 CENTAURO EDITORA 10 Santa Rosa, 30 02804-010 So Pa 3976-2399 Tel./Fax 11 ~ 3975-220 E-mail: editoracentauro@itera.com by www.centauroeditora.com.br SUMARIO Prefiicio Prefiicio da Editora Sobre o Conceito de Sociologia ‘Sentido da Conduta Social” Formas Caracteristicas de Ago Social O Conceito de Relacio Social Tipos de Ago Social: Usos, Costumes OConceito de Autoridade Legitima Tipos de Autoridade Legitima: Convengao, Lei A Validade da Autoridade L Tradicio, Fé, Lei OConceito de Luta Comunidade e Sociedade das Relagdes Sociais |. Relagdes Sociais Abertas e Fechadas « Responsabilidade pela Conduta Social Representagao « OConceito de Associagio e Seus Tipos Tipos de Autoridade Numa Associagao . A Natureza da Autoridade Administrativa e Regulamentadora nas AssociacOes A Natureza da Associagdo: Associagio de Empresa, Associacio Voluntaria e Compulséria . Os Conceitos de Poder e Dominagao ~ Tipos de Associagdes Politicas e Religiosas PREFACIO ‘A metodologia sobre a qual se baseiam estes conceitos introdut6rios pode parecer abstrata e, portanto, algo distante da realidade. Contuco, nao se pode dispensar a esmo estas consideragdes metodol6gicas, embora ndo exista nenhuma reivindicagdo quanto a sua originalidade; em vez disso, sua meta é formular uma terminologia mais utilizdvel, bem como mais correta, para conduzir claramente 0 verdadeiro si eado de qualquer ciéncia social empirica em sua preocupa lo com conceitos semethantes. Isto ser verdadeiro mesmo onde termos novos ¢ nio-familiares forem empregados. Por esta razo, poder’, ocasionalmente, soar como algo pedante. No entanto, comparado ao ensaio Logos IV (1913, pags. 253 € segs., reimpresso em Ges. Aufs. z. Wissenschafislehre, 2 ed., pigs. 427 © segs.) a terminologia tem sido simplificada uando possivel e tem sofrido, portanto, frequentes mudan- 48, de modo a tomné-la mais facilmente compreensivel. Co- MO a exigéncia de maior simplicidade nem sempre pode Conciliar-se com a de conceituagdo mais precisa, esta tiltima deve, ocasionalmente, se submeter & primeira. No que concetne ao conceito de “compreensiio”, com- Pate-0 i Allgemeine Psychopathologie, de K. Jaspers, bem Como a algumas observagées de H. Rickert na 2* ed. de Grenzen der Naturwissenschaftlichen Begriffsbildung (1913, Pais. 514-523) e, especialmente, aos Problemen der Geschi Clisphilosophie, de Simmel. Como cm algumas ocasiées anteriores, cncaminho, metodologicamente, 20 exemplo de 8 MAX WEBER Gott, cujo livro Die Herrschaft des Wortes 6, com certeza, extremamente dificil de volyido plenamente; também pertinente, em substncia, € 0 nflo ter sido desen: entender € parece excelente trabalho de F. Toennies, Gemeinschaft und Gesells chafi. Além disso, existe © enganoso trabalho de R. Staem- mler, Wirtschaft und Recht nach der Materialistischen Geschichtsaujassung, juntamente com minha andlise critica iabwissensch, XXIV, 1907 (reimpresso em Ges, Aus. z. Wissenschafislehre, 2° ed., pags. 192 e segs dele em Archiv f Esta anilise critica ja continha algo do que vem a seguir. Eu me distancio da metodologia de Simmel (em sua Soziologia © em sua Philos. d. Geldes), distinguindo quando possivel 0 sig nie vali do; estes dois termos nao foram suficientemente diferencia- dos por Sim € com freqiléncia como sugerindo sua permutabilidade. nificado essencialmente subjetivo do objetivam nel, mas so usados por ele de modo deliberado Max Weber PREFACIO DA EDITORA ‘Ao morrer, em julho de 1920, Max Weber deixou uma ‘grande quantidade de estudos incompletos. O Wirtschaft und Gesellschaft (Economia c Sociedade) que Weber comegou a escrever em 1907 constitui-se na obra que mostra a amplitu- de do seu conhecimento e do seu pensamento. Para servir de inirodugio aos seus traballios, Weber preocupou-se em ofe fecer uma série de definigdes baseadas nas suas pesquisas empiricas. Portanto, essas definigdes jé haviam sido testadas © podiam ser consideradas como formulagdes preliminares para uma ciéncia geral da a A primeira versio desses conceitos foi apresentada na evista Logos, Vol. IV, em 1913. Mais tarde ela foi reelabo Fada por Weber pouco antes de sua morte e publicada pos- fumamente como o capitulo primeiro de Wirtschaft und Gesellschaft (em Gundriss der Sozialekonomik, parte IL Tiibingem, 1925), que a Centauro Editora tradi © piiblico de Ifgua portuguesa social A influéncia de Weber sobre o desenvolvimento das dente nos trabalhos cientificos de autores €omo Talcott Parsons, Hans Morgenthau, C. Wright Mills, R. H. Tawney, Vance Pac! A ard, entre tantos outros. O trabalho © Weber permanecerd memorivel pelas suas exploragdes de Ploneiro nas ‘reas da Sociologia, Histéria, Politica e pela sua Sontribuicao geral para o alar Estudos modernos. We ecidental par; amento dos horizontes dos clevou a Ciéneia Social do mundo 0 nivel da verdadeira pesquisa e erudigio. Ele ~~. 10 MAX WERER ‘ava amargamente que, a0 menos durante a sua vida, “a maior parte do que passa hoje sob 0 nome de sociologia ¢ fraude”. Que isto nao seja mais verdade se deve principal Max Weber e seus discfpulos. carl Jaspers in Max Weber, Deutches Wesen, na pagi na 70, menciona -ciago de Weber pelo seu papel de sibio e fil6sofo através da sua linguagem. No primeiro con tato com 0 texto de Weber, o leitor € surpre contraste entre seu pensamento penetrante, sua conceituali inio cuidadoso e sua indiferenga com 0 seu trabalho expressada através da form: sigdo, dimensio e proporgaio da sua linguagem. Weber nunca trabalhou seu estilo, Ele escreveu demonstrando intensa ati- vidade cerebral © poder de imaginagio e nunca poli esse material. Portanto, o estilo é freqtientemente incolor, mas, mesmo assim, as caracteristicas webe esto sempre presentes”. Eric Voegelin, cuja posigio tedrica é diametral mente oposta d de Weber (niio se pode encontrar uma eritica mais mordaz. a Weber do que a que esti em The New Science of Politics, Chicago, 1952, de Voegelin), chama-o, mesmo assim, de “um pensador que queria clareza sobre 0 mundo do qual apaixonadamente participav estrada em diregio & esséncia”. Outro grande oponente de Weber, o Professor Leo Strauss, da Universidade de Chica- 20, afirmou: “Quaisquer que possam ter sido seus erros, ele ¢ © maior ciet dep ndido com o Jo incisiva, seu racio. da compo- que es fava, novamente na ista social do nosso século” CAPITULO I SOBRE O CONCEITO DE SOCIOLOGIA EO “SENTIDO DA CONDUTA SOCIAL” 0 termo “sociologia” esté aberto a muitas interpreta- ¢0es diferentes. No contexto usado aqui significaré aquela Giéneia que tem como meta a compreensao interpretativa da agiio social de maneira a obter uma explicagio de suas cau- sas, de seu curso e dos seus efeitos. Por “acao” se designaré foda a conduta humana, cujos sujeitos vinculem a esta agio lum sentido subjetivo. Tal comportamento pode ser mental ou exterior; poder consistir de ago ou de omissio no agir. O fermo “ago social” sera reservado aco cuja intengao fo- Mentada pelos individuos envolvidos se refere A condula de Olitros, orientando-se de acordo com ela. Fundamentos Metodolégicos 1. A palavra “sentido” € usada aqui em duas ocasides Aiferenies. Primeiro, existe a conduta real de um ator espect- fico em uma dada situagio histérica ou a aproximagio gros- Seira baseada numa dada quantidade de casos, envolvendo Miitos atores; e, em segundo lugar, hé 0 “tipo ideal” concci- tual de sentido subjetivo, atribuido a um ator hipotético num ado tipo de conduta. Em nenhum dos dois casos pode ser Usado como um sentido objetivamente “vélido”, ou um sen- fido *verdadeiro”, estabelecido metafisicamente. Reside aqui @ distineaio entre as ciéncius empiricas da ag 5 Jo, tais como a Hclologia e a Hist6ria e as disciplinas ortodoxas, tais como Murisprudéncia, a Logica, a Ftica ou a Estét cujo propé- ~~, 2 MAX WERER. sito é determinar o significado “verdadeiro” e “vélido” do 2. A fronteira entre un a agio com sentido € uma agzio meramente reativa (isto é, sem um sentido subjetivo elabora remamente ténue. Uma parte sig conduta sociologicamente relevante, prineipalmente a agio puramente tradicional (veja abaixo), flutua entre os dois ificativa de toda a do) é Uma agao com sentido, isto 6, subjetivamente compreensi vel, no se dé em muitos casos de processos psicofisicos, ¢ em outros, s6 € reconhecida pelo especialista; experiéncias que no podem ser comunicadas adequadamente em palayras nunca sdo inteiramente compreensfveis para alguém niio suscetivel a tais experiéncias. Por outro lado, a capacidade de realizar uma ago seme Ihante nio & uma condigio prévia para a sua compreensio; nao € necessério “ser César a fim de compreender César”. Se ar do ator & importante para a clare za du compreensio, mas no é uma condigao prévia absoluta para a interpretacdo do sentido. As partes compreens naio-compreensiveis de um processo freqtientemente estio inextricavelmente interligadas. capaz de colocar-se no I 3. Toda interpretagio, como a ciéncia em geral, luta pela clareza e provas verif enso sera ou de um cariter racional, isto €, 16 eis. Uma tal prova de compre ‘0 Ou mate mético, ou de um cariter emocionalmente empético. artisticamente apreci na esfera da ago por um claro domfnio intelectual de tudo 0 que esti dentro de seu pretendido contexto de sentido, A prova empitica na esfera da ago seri suprida por un pleta participagio na conexao de cl. Pode-se suprit uma prova raciona! ntimentos nela vivida Inteligibilidade direta e nao ambigua € compreenstio raciona Ja mais alta ordem, especialmente em proposigdes matemi ticas ou logicamente relacionadas. Entendemos claramente quando alguém usa a proposic&io 2+2=4, ou 0 teorema pita _CONCEITOS HASICOS DE SOCIOLOGIA 1 B6rico no raciocinio ou argumento, ou quando uma cadeia de Taciocinio é executada logicamente, de acordo com maneiras faceitas de pensar. Igualmente entendemos as agdes de uma ppessoa que tenta alcancar determinada meta escolhendo os meios apropriados, se os fatos da situagio em que se baseia jpara fazer sua escolha nos sio familiares. Qualquer interpre- fagdo de uma aco com tal propdsito racional possui — pi jum entendimento dos meios empregados — 0 mais alto grau de prova. Nao com a mesma exatidio, mas com exatidao Suficiente para a maioria dos propésitos da explicagao, & Possivel entender erros (incluindo problemas intrincados) {40s quais nds priprios somos suscetiveis ou cuja origem po- de ser detectada por auto-andlise simpitica. Por outro lado, muita meias ow valores Gltimos para os quais a experiéncia demonstra que a ago humana pode ser orientada, fregiien- Temente, no podem ser entendidos como tais, embora seja Possivel dominé-los imtelectualmente. Quanto mais radical- Mente se diferenciam de nossos proprios valores tltimos, Mais dificil se torna para nés entendé-los por participagio empiitica. Dependendo da Gillar, deve ser suficiente conseguir apenas uma compreensii Puramente intelectual de tais valores, ou na auséncia disto, lua simples aceitacdo deles como dados. Até onde for pos Sivel, a conduta motivada por estes valores deve ser entendi- @a com base em quaisquer possibilidades de uma inlerpretacao simpitica emocional e/ou intelectual dos dife- FenleS estgios de seu desenvolvimento. Deste tipo siio mi 198 alos virtuosos de religitio ou piedade que sio totalmente Meompreensiveis Aqueles n: {veis a tais valores, bem S20 0 fanatismo racional extremo, tipico dos expoentes das Horias dos “direitos humanos”, repugnantes Aqueles que Snfaticamente os repudiam. Quanto mais cresce nossa suscetibilidade, n lorna experime: Tava, circunstincias de um caso parti » suscel ais facil se ‘ntarmos paixes to verdadeiras como medo, Ambigéo, inveja, ciimes, amor, entusiasmo, orgulho, ~~, 14 MAX WEHER Jo € outros desejos de todo tipo, bem como © comportamento irracional que deles provém Mesmo quando 0 grau de intensidade em que estas emogdes so encontradas ultrapassa em muito nossas préprias poten- cialidades de compreensio experiencial, podemos ainda alcular intelectualmente seus efeitos sobre a direcio ¢ os meios da agio. Para fins de vinganca, compaixio, devo compreendé-las em seu sentido uma andlise cientifica sistematica, sera conveniente represe: lar todas as conexdes de sentido irracionais e emocionalmen te condicionadas como desvios de um tipo de agio conceitualmente puro, orientado para fins. Por exemplo, uma anélise de uma crise na bolsa de valores seria tentada da forma mais conveniente, da seguinte maneira: primeiro, a Jo de como teria sido seu curso na auséncia de determina fatores irracionais; segundo, usando o antecedente como premissa hipotética; os componentes sio entao isolados co mo um “desvio” da norma, Da mesma maneira, a determina- Go do curso racional de uma campanha politica ou milita precisa primeiro efetuar-se 2 luz de todas as circunstancias ¢ metas conhecidas dos participantes. Somente entdo sera pos: sivel dar conta do significado causal de fatores irracionais como desvios do tipo ideal A construgio de uma aedo rigorosamente racional, de acordo a afins, por causa da sua clara inteligibilidade e falta de ambigilidade racional, serve 2 sociologia como um “tipo ideal”. Assim somos auxiliados em nossa compreensio da maneira pela qual a ago real orientada de acordos afins é influenciada por fatores irracionais de todo tipo (tais como m entio ser classificados como desvios da ligdo original hipotética, emogio, erros) e que pod Somente neste aspecto e por causa da eficiéncia meto- dolégica pode © método da sociologia ser considerado “ra cionalista”. Naturalmente, este procedimento nao pode ser P sociologia, mas simplesmente como um meio metodolé interpretado como um preconceito racionalista por parte da A 15 CONCEFTOS BASICOS DE SOC Nio pode também ser considerado como evidéncia do pre Gominio do racionalismo na existén jem que a realidade do racionalismo de iduta niio sera considerada aqui. Nao se nega o perigo de in- ferpretagdes racionalistas nos lugares errados. Infelizmente, toda a experiencia confirma a existéncia de um tal perigo, humana, A extensio mina de fato a con 4, Por outro laclo, certos processos ¢ fenémenos “sem Sentido” (isto 6, desprovidos de significado subjetivo) exis: tem em todas as ciéncias da aco humana. Agem como esti miulos, ou efeitos, e promovem ou inibem a conduta humana. Uma ago “sem sentido” nao deve ser confundida com um Comportamento inanimado ou nao-humano. Todo artefato (por exemplo, uma maquina) adquire o sentido que the foi dado pela sua producao e uso, por parte da ago humana; um Tal sentido podera ser perfeitamente variado em scus propési 10s. Mas, se nao se referir a um tal sentido, objeto perma- hece completamente inintcligivel © que faz este objeto ininteligivel é sua relagao com a figdo humana em seu pape! de meio ou finalidade. FE deste Felacionamento que o individuo pode reivindicar ter consci- €neia € a0 qual sua conduta tem sido orientada. Somente nos Termos de tais categorias é que sur Abjetos deste tipo, Por outro lado, todos os processos ou condigdes per- Mlanevem “sem sentido” se niio podem ser relacionados a um PrOposito significativo; quer sejam inanimados, humanos ou Mlo-humanos. Em outras palavras, so vazios de sentido se HAO podem ser relacionados & aciio em seu papel de meio ou Ainalidade, mas operam simplesmente como estfmulos, seja Nberando ou inibindo tal acao. E possivel, por exemplo, considerar 0 rompimento do Rio Dollart, em 1227, como um poderoso estimulo aos mo MMentos migratsrios subseqtientes. O processo da decompo- Sigio, na re HE0, na verdade o ciclo organico da vida por completo — © uma compreensao de 16 da incapacidade da crianga & do velho — obtém seu momen to sociolégico primério das diversas maneiras pelas quais 0 jonado a estes fatos. comportamento humano se tem condi Certos fendmenos psiquicos ou psicofisicos, tais como o cansaco, a disciplina e a meméria, devem ser vistos como mais uma categoria de fatos vazios de significado, bem como estados tipicos de euforia causados por certas condigdes de autopuniedo, ou variagdes tipicas nas reacdes de indivéduos dependendo do tempo, preciso e natureza. Em tltima andi se, 0 principio a ser observado é 0 mesmo de outros fendme nos ininteligiveis: provéem a fonte de “dados” para ambos, 0 observador e 0 participante E totalmente possivel que no futuro a pesquisa possa fveis sob aquilo que pa: recia ser, até entio, aco com sentido, embora isto nao tenha ocorrido até agora. Por exemplo, diferengas em caracteristi descobrir uniformidades ndo-intelig cas biolégicas herdadas (raciais) devem ser accitas pela so- ciologia da mesma maneira como os fatos fisiolégicos da necessidade da nutrigio ou os efeitos da senescéncia sobre 0 comportamento humano. Tais dados deveriam ser aceitos € claro, até o ponto em que provas estatfsticas con: clusivas pudessem ser supridas sobre a sua influéncia na apenas, ago sociologicamente relevante O reconhecimento de tal significancia causal niio mu: que a de inter fvel. O resultado seria daria nem um pouco a tarefa da sociologia, pretar a conduta humana inteli meramente introduzir em certos pontos das suas conexdes de motivos ininteligiveis e interpretiveis, fatos no compreer sfveis como, por exemplo, as relagdes tipicas existentes entre a freqtiéncia de certa agZo orientada afins ou o grau da sua ele, ou qual racionalidade 0 fndice encefilico, ou cor de quer outra caracteristica fisiol6gica herdada. A compreensiio pode ser de dois tipos: primeiro compreensio direta empirica do significado de um dado at CONCEITOS BASICOS DESOCI (inclusive um pronunciamento verbal). E neste sentido q) Seompreendemos” (isto é, diretamente) o significado da pro. Jigao de que 2x2=4, quando o ouvimos ou lemos. Experi- mentamos aqui a compreensiio direta, racional de uma idéia Da mesma mancira, compreendemos um acesso de raiva @xpressada por exclamagdes, expresso facial ou movimen- fos irracionais. Trata-se de compreensfo direta empirica de feagbes emocionais irracionais e pertence A mesma categoria que a observacio da acio de um cortador de madeira, ou alguém que estende a mao para uma maganeta para fechar a porta, ou que aponta uma arma a um animal. Trata-se de ob- servacio empirica racional do comportamento, ‘A compreensio pode também ser de uma segunda es- Pécie, © esta ¢ conhecida como compreensio explicativa. ‘Somos capazes de entender os motivos de qualquer um que afirma que 2x24 (oralmente ou por escrito) precisamente flim momento particular ¢ sob uma série determi ada de Gireunstincias. Tal compreensio pode ser obtida se a pessoa Sob observacio est empenhada em alguma tarefa de conta bilidade ou alguma demonstragio cientifica ou algum outro Projeto do qual esta tarefa é uma parte essencial. Trata-se de CoMpreenszo racionalmente baseada da motivagao, isto 6 0 MO € visto como parte de uma situacao inteligivel. A com- Preensio motivacional adiciona-se & observacional, se sabe- Mos que o apontar de uma arma se faz por diversiio ¢ 0 corte 4A madeira por motivos econémicos. Ou, no caso anterior, o ALO pode ser realizado para liberar certas emogdes contidas, ¢ ReSie caso a conduta assume um carter irracional, ou porque @ Pessoa que aponta a arma recebeu ordem pra fazé-o como Membro de um pelotao de fuzilamento, ou por estar atirando Sobre um inimigo (em quaisquer destes casos seu comporta- Mento € novamente racional), ou ainda porque estd exerci indo sen desejo de vinganga (caso em que reverte ao FOmportamento irracional). Por fim, Ralmente um entendemos motivacio- acesso de raiva se sabemos que sua causa ime- ~~ 18 Max Wweper = diata pode ser encontrada em citimes, orgulho ferido ou vai- dade magoada, todas causadas emocionalmente e, portanto, relacionadas a motives irracionais. Em todas as situagées acima, a agao em questo pode ser designada como parte de uma sequiéncia compreensivel de emoges. Tal compreensio pode ser aceita como uma explicagio verdadeira do curso real da agio. Para uma cién- cia que trata do verdadeiro significado da ago, a explicagao requer uma apreensiio da conexio de sentido dentro do qual ocorre 0 curso da agao real. Em todos estes casos, mesmo os que enyolyem processos emocionais, 0 sentido subjetivo dentro do contexto relevante de seu significado sera desigma- do como sentido “pretendido”; assim vamos além do uso comum, que considera intencional somente 0 comportamen- to (de propésito racional) orientado a meta. 6. Compreender significa, pois, em todos estes casos, compreensio interpretativa de: a) casos coneretos individu- ais, como, por exemplo, na andlise hist6rica; b) casos mé- dios, isto € estimativas aproxi dilise sociolégica de massa; c) um tipo de construgio cientifica: mente formulado de ocorréncia freqilente. Construgdes tpi cas ideais 0, por exemplo, os conceitos e axiomas da teoria econémica pura. Demonstram como um dado tipo de agio humana ocorreria numa base estritamente racional, sem ser afetada por erros ou fatores emocionais ¢ sendo, além disso, ditigida apenas a um fim tnico. A acto real s6 raramente toma este curso (por exemplo, na bolsa de valores) ¢ mesmo assim aproximadamente, em sua correspondéncia a um tipo ideal (Sobre o propésito de tais construgiies, ver o que formu- To em Archiv f: Sozialwissenschaft, vol. XIX, pags. 64 e segs. reimpresso em Ges. Aufs. z. Wissenschafislehere, pags. 190 ¢ Segs.; ver também a parte 11 que vem a seguir neste livro). Certamente, toda interpretagio esforga-se para conse- Suir © maximo de verificabilidade. Contudo, nem mesmo a Jas, como na a CONCEITOS BASICOS DE SOCIOLOGIA 19 {nterpretacdo mais verificavel pode reclamar o cardter de ser easualmente valida, Permanecerd apenas como uma hipétese particularmente plausfvel. Assim, 0 que parece ser motivacéo consciente para 0 individuo envolvido pode tao somente ser- vir para esconder os motivos © represses mais profundas que esto realmente na raiz da sua acto, invalidando desta Imaneira mesmo as tentativas mais sinceras de auto-andlise. Num tal caso, torna-se tarefa da sociologia investigar 0 sen. tido mais profundo de uma tal motivagio e interpreté-la de modo correto, mesmo se esta motivagao nao tiver feito parte da aco consciente do indivfduo em questao: torna-se, por tanto, um caso limite da interpretagao de sentido. De novo, formas de ago que aos olhos do observador parecem compartilhar as mesmas caracterfsticas ou caracte- fisticas semelhantes podem basear-se numa variedade de Motivos por parte do ator individual. Situagdes deste tipo, Que parecem compartilhar algumas caracteristicas superfici- ais, devem ser interpretadas de forma bem diferente, mes! que isto leve a uma andlise conflitante. Por fim, os indiv duos envolvidos em qualquer situagao dada freqientemente Fespondem a impulsos opostos, os quais podem ser todos €ntendidos, Sabemos por experiéneia que nao € possivel ava- liar sempre, mesmo aproximadamente, a forga relativa dos Motivos ¢ muito freqiientemente nio podemos sequer estar ertos de nossas proprias interpretagdes. Somente o resultado final do conflito nos prové uma base s6lida de julgamento. A Nerificagao da interpretagtio por scus resultados, ou scja, a Aecisio final do curso real dos eventos 6, como na verdade €m todas as hipéteses, indispensdvel. Infelizmente, tais in- terpretacdes verificiiveis s6 podem ser obtidas com exatidio Telativa apenas em alguns poucos casos especiais, do tipo adequado a experimentagio psicolégica, ou tendo como meta um grau diferente de aproximacao, através dos dados estatis ticamente quantificaveis dos fendmenos em massa. Quanto Ao restante, permanece apenas a possibilidade de comparar 2 . uma quantidade maxima de processos hist6ricos ou fendme- nos rotineiros da experiéncia cotidiana e de aparéneia seme- Ihante, mas diferindo substancialmente em relagio ao fator motivacional sob investigacao. Esta é a tarefa fundamental da sociologia comparativa. Infelizmente, permanece com frequéncia apenas 0 instrumento incerto de experimentos puramente hipotéticos, que desprezam certos elementos na cadeia de motivagao ¢ levam, ao invés, & construgio de um curso de eventos meramente provavel, que poderia empres: {ar-se a uma atribuigio causal. Por exemplo, 0 postulado conhecido como Lei de Gre~ sham 6 uma interpretagdo racional da conduta humana dentro de um dado contexto e com base em uma hipdtese ideal de uum curso puramente racional, Em que extensio a ago real segue realmente a Lei de Gresham podemos certificar-nos apenas com base em informagoes estatisticas concementes a0 desaparecimento da moeda subvalorizada e de modo geral nossa experiéncia tem demonstrado a validade desta lei. Nes~ te caso os dados foram primeiramente acumulados ¢ segui- dos da formulacio de uma generalizagio adequada. Mas sem uma tal interpretagiio de sucesso nao poderiamos ter obtido 0 nocessério para a compreensio causal verdadeira. Por outro lado, a auséneia de provas de que a aco inferida deste com- portamento ocorre com alguma regularidade faria com que uma lei, ngio importa quantas provas tedricas pudessem ser obtidas, fosse completamente sem valor para fins de andlise concreta, Neste caso a interpretago teérica da motivagdo © de sua verificagio empirica demonstram considerivel con- formidade e hé uma quantidade suficiente de casos para que se considere a prova satisfatoriamente estabelecida. Mas para usar outra ilustragio, a engenhosa teoria de~ senvolvida por Eduard Meyers quanto & significagio causal das batalhas de Salamina e Platéia na evolugio Gnica da cul- tura grega e ocidental em geral (Ele se baseia em fatos sin- tomaticos concernentes 1 atitude dos oréculos helénicos & MAX WEBER «e BA SOCIOLOGIA 2 dos profetas entre os persas) no se submete facilmente a tal prova. A verificagiio pode ser abtida somente quanto a con- duta dos persas em casos de vitéria, como por exemplo em Jerusalém, no Egito e na Asia Menor, ¢ mesmo esta verifica- «iio deve necessariamente permanecer incompleta em muitos aspectos. O que prové a esta hipdtese apoio tao forte é a sua marcante plausibilidade racional. Porém, o que falta a muitos de tais casos de interpretagdes hist6ricas altamente plausiveis €a possibilidade de que o tipo de prova adequado a este caso seja ainda possivel. Sob tais circunstincias a interpretagio deve permanecer puramente hipotética. 7. A palayra “motivagio”, tal como se usa aqui, refere~ se a uma conextio de sentido que parece ser, para o individuo envolvido ou para o observador, o fundamento da sua condu- ta, Dizemos que uma conduta que se desenvolve como um todo coerente & adequada de sentido, na medida em que suas partes componentes articulam-se entre si, dentro do contexto de nossos mods costumeiros de pensamento e sentimentos, ponto de constituir uma conexiio de sentido “tipica”. Ge- ralmente, a chamamos de “correta”, ao invés de t/pica. Em contraste, consideraremos uma interpretagio de uma seqiién- cia de eventos como casualmente adequada se, com base na experiéncia passada, parecer provavel que tomar a ocorrer sempre da mesma maneira. Um exemplo de adequagdo de sentido pode ser encon- trado na solugao correta de um problema aritmético, se esti ver de acordo com as normas aceitas de célculo e raciocfnio, Por outro lado, uma interpretago causalmente adequada do mesmo fendmeno concemiria & probabilidade estatistica de que, alinhada com generalizagdes empficas testadas, haveria uma solugio correta ou incorreta do mesmo problema, Em- bora aceitasse padrdes normativos vigentes, levaria em con- ta, também, erros ou confusdes tépicas. Explicacdes causais postulam, portanto, uma probabitidade raramente quantificd- 2 MAX WEBER, vel, mas sempre de alguma maneira calculavel, de que qual- quer evento observavel, manifesto ou subjetivo, vem seguido ‘ou acompanhado de outro evento. Consegue-se uma interpretagao causal correta de uma agio conereta, quando tal agao manifesta e seus motivos fo- ram ambos corretamente estabelecidos © se, a0 mesmo tem- po, o relacionamento entre eles tornou-se inteligivel, de acordo ao seu sentido. Uma interpretagio causal correta de uma agao tipica pode ser obtida quando este proceso, desig nado como tipico, demonstra oferecer uma adequacio de sentido e também pode ser demonstrada tanto significativa como causalmente adequado. Se nenhum sentido se liga a uma tal a¢ao tipica, entdo, independentemente do grau de uniformidade ou de precisio estatistica da probabilidade, ela ainda permanece uma probabilidade estatistica incompreen sivel, embora lide com um processo manifesto ou subjetivo. Por outro lado, mesmo a adequagao de sentido a mais evi- dente s6 sera causalmente significativa, de um ponto de vista socioldgico, se tivermos prava de que, com toda a probabili- dade, a conduta em questio tomar, de fato, a forma que foi considerada como adequada de sentido. Para que isto ocorra deve-se determinar algum grau de frequéncia de aproxima- do de um tipo médio ou ideal. No presente contexto, uniformidades estatisticas cons- tituem tipos inteligiveis de agao, isto é, generalizagbes socio- Jdgicas, apenas quando manifestam o sentido subjetivo compreensivel de um curso da ago social. Novament. podem ser consideradas tipos sociolégicos de um pro empirico aquelas construgdes racionais de conduta subjet vamente inteligivel que podem ser empiricamente obserya- das com ao menos uma certa aproximagio. Nao se trata, quase nunca, de que a probabilidade real de ocorréncia de um dado curso de comportamento seja sempre proporcional do subjetiva. De qualquer forma, so- mente a experiéneia podera dizer se isto sera sempre verda- 0, A clareza da interpreta CONCETOS NASICOS DE SOCIOLOGIA de. E possivel, afinal, obter informagées estatisticas sobre Dprocessos que siio vazios de sentido, bem como daqueles que (© tém: a quantidade de chuva, os indices de mortalidade, os fendmenos de fadiga e a produtividade das maquinas sio bons exemplos dos primeiros, enquanto indic ninali- dade, distribuigdes ocupacionais, estatisticas de pregos e es- talisticas de produgio agricola sio exemplos dos iiltimos; ¢ Somente nestes tltimos casos mostra-se possivel falar de estatisticas sociolégicas. Esti claro que hi muitos casos, co mo as estatisticas agricolas, que contém ambos os tipos de significado. 8. Processos e regularidades que, por causa de sua inin- teligibilidade, no so designados aqui como fendmenos Sociolégicos ou leis sociolégicas nao sdo necessariamente menos importantes por causa disto. Isto € verdadeiro também Para a sociologia em nosso contexto presente, implicando Huma restrigdo a fendmenos subjetivamente compreensiveis que ninguém tem a obrigaco de aceitar. Eles siio simples. mente considerados numa categoria diferente da do compor- tamento significativo, o que € metodologicamente inevitavel, Assim tornam-se condigdes ¢ estimulos, inibindo ou encora- jando o ambiente em que a aco ocorre 9. A “agio” no sentido da orientagio subjetivamente eligivel da conduta existe somente como a conduta de uma ou mais pessoas individuais. Para outros propdsitos ana- liticos podera ser «til e mesmo necessirio ver o individuo como um conjunto de células, ou um conjunto de reacdes bioquimicas, ou conceber a sua psique como composta por uma quantidade de elementos definidos de forma varidvel. Certamente isto forneceria um discernimento precioso dos Telacionamentos causais. No entanto, nao compreendemos Tealmente de forma subjetiva 0 comportamento destes cle- Mentos, como se expressa nestas regularidades. Nem sequer o caso de se tratarem de elementos psiquicos: quanto mais MAX WEBER cicntificamente exatas sejam suas definigbes, menos os com preendlemos; eles jamais nos levam a uma interpretago nos termos de um sentido subjetivo. Mas para ambas, a sociolo: gia © a historia, 0 objeto real de andlise deveria ser 0 sentido mais profundo de uma certa acdo, O comportamento de cer- tas entidades fisiol6gicas, como, por exemplo, as células, ou de quaisquer tipos de elementos psfquicos pode, ao menos, ser observado em prinefpio de tal maneira a conduzir a eri gio de certos postulados aplic‘veis a fendmenos individuais tuniformes. Contudo, a compreensio subjetiva da agio s6 ridades tanto quanto teconhece » COMO, aceita tais falos e regu quaisquer outros incapazes de interpretagio subjetiv por exemplo, dados fisicos, astrondmicos, geolégicos, mete icos, anatémicos, que estao orolégicos, geogrificos, botinicos, zoolég bem como tais dados relativos a psicopatologia, 4 nificado subjetivo ou os das condigdes cientfficas que sem s : possibilitam o progresso tecnol6gico. Ainda para outros propésitos de aniilise, por exemplo, finalidades legais ou praticas, pode ser conveniente e mesmo inevitdvel tratar grupos sociais tais como 0 Estado, associa- Ges corporativas, corporagdes de negscios, € fundagdes co- mo se fossem pessoas individuais com direitos e deveres como os executores de uma conduta legalmente significativa. Mas para interpretagGes sociologicamente compreensivas tais organizages so meramente o resultado da ago distinta de pessoas individuais, j4 que somente estas podem empe nhar-se como agentes em qualquer espécie de aciio orientada por um sentido. Mesmo assim, 0 socidlogo, para sets propé sitos, nio pode desprezar tais conceitos de coletividade que derivam de diferentes pontos de vista, pois a interpretagio subjetiva da agio estéi relacionada a tais conceitos a menos de trés maneiras diferentes. a) Uma tal interpretagio freqientemente é for ada mesmo idénticos) de ia inteligivel. Ambas, trabalhar com conceitos semelhantes forma a estabelecer uma terminoll CONCEITOS BASICOS DESOCIOLOGIA tanto a terminologia legal quanto a leiga, definem 0 Estado como um conceito legal ¢ um fendmeno de acto social no qual as suas regras legais so relevantes. Entretanto, para finalidades sociolégicas 0 termo “Estado” nao consiste ne cessariamente ou mesmo primariamente de componente Jegalmente relevantes. De qualquer modo, a sociologia nao reconhece uma personalidade coletiva em ago. Quando a sociologia usa os termos “Estado”, “nagiio”, “corporagdo”, “familia itos coletivos seme- Ihantes, 0 faz apenas para pér em foco um certo tipo de de- senyolvimento de modos alternativos de agao social para pessoas individuais. Assim a terminologia legal, que € em- pregada aqui por causa de sua preciso ¢ uso comum, recebe um significado completamente diferente 4) A interpretagio da agio também precisa levar em conta um fato vital muito importante: estes conceitos coleti- Vos derivados de idéias legais, do sentido comum, ou de Quaisquer outras idéias técnicas, sio significativos para os Individuos ou porque existem ao menos parcialmente ou Porque representam algo como uma autoridade normativa Isto nao € verdade apenas para juizes e burocratas, mas para © piblico como um todo também. Os individuos orientam Sua conduta em fungio daqueles conceitos que, desta manei fa, exereem com freqiiéncia uma influén feal, dominadora, sobre a acdo destes individuos. Isto é ver- dade especialmente quando estes conceitos fazem parte de um padrio reconhecido, positivo ou negative. O Estado mo- demo representa num grau considerivel um complexo de Agio harmoniosa por parte de pessoas individuais, porque Muitas pessoas agem na crenga de que ele existe ou deveria existir precisamente desta maneira, para promover validade legal & emissio de suas ordens. Discutiremos isto a seguir Embora fosse possivel para a terminologia sociolégica eli- inar estes conceitos de uso comum, nfio sem certo pedan- ‘divisio do exéreito” ou con ia causal muito 26 MAX WEBER, = tismo, ¢ substituislos por novos termos mais indusivos, isto fica fora de questo, ao menos no presente contexto, ¢) Hi, finalmente, © método da assim chamada escola orwinica de sociologia, da qual o brihante trabalho de Schiffle, Baw und Leben des Sozialen Koerpers, representa um exemplo elissico, Esta escola tenta explicar a interagio social usando como sua premissa 0 “todo” (por exemplo, a cto) oil ido inivcoo's welaooad we pois interpretada, Bste processo é semelhante & maneira pela qual um fisiologista analisaria o papel de um érgio do corpo dentro da comumidade do organismo, ou seja, como este dr- £0 contribui para a sobrevivéncia do restante do organismo Neste contexto pode ser lemibrada a famosa frase de um fisi- ologista durante um semindrio: “Pardgrafo X”, disse ele, “O Baco”, “Senhores, nao sabemos nada sobre o bago. Apenas isto para o hago”. Bsté claro que se “conheciam” muitascoi- sas sobre 0 bao, tais como posicio, tamanho, forma etc.; somente suas “fungdes” ndio podiam ser asseguradas e ele caracterizou esta auséncia de conhecimento como ignori cia, A extensio em que outras disciplinas consideram esta forma de anise funcional das partes de um todo como defi- nitiva nao precisa ser discutida aquis mas sabemos bem que formas de anilise bioquimicas e biofisicas nao se esgotam em uma abordagem funcional. iboneat spe deatdeesticspicuitt abordagem tem importaneia porque serve primero como um ponto de part- da conveniente pura prop6sitos de demonstragio, bem como de orientagao proviséria. Desta maneira pode ser muito ttl e mesmo necesséria — mas ao mesmo tempo, se 0 seu valor empiico for superestimado ou excessivamente conceitualz do, as vantagens de uma abordagem assim estariio perdidas. Em segundo lugar, pode ser a nica mancira, sob certas ci ‘cunstaneias, de determinar exatamente que processos de ago Social so necessirios para a nossa compreensio de forma a CONCEITOS BASICOS DE SOCIOLOGIA explicar um fendmeno particular. E neste estigio que a tarefa real da sociologia, como nés a entendemos, comeca. Especialmente no caso das coletividades sociais, esta- Mos numa posigio de criar algo que vai além da demonstra- ga dos relacionamentos funcionais ¢ das regularidades geralmente encontradas em organismos fisicos ou biolégi- £08. Ao contrério do processo nas ciéncias naturais, podemos obter aqui uma interpretagio subjetiva da ago dos indivi. duos diretamente envolvidos. Isto é assim porque as ciéncias Ralurais esto limitadas 4 formulagao de regularidades cau. Sais em objetos ¢ eventos ¢ & explicacao de fatos individuais Por sua aplicacio. Nos realmente nao “compreendemos” o comportamento das células, mas simplesmente reconhece. MOS o seu relacionamento funcional, e baseados nele intro duzimos uma generalizagio. Este sucesso adicional da explicacdo pela compreensao interpretativa, ao invés da mera observagiio empirica, é naturalmente obtido por um prego, ue € o cariter essencialmente hipotético e fragmentdrio dos Fesultados obtidos desta maneira. Mesmo assim, precisamen- te esta espécie de compreensio subjetiva prové a andlise so. Ciol6gica de seu caréter diferenciado, Este mio € também o lugar para discutir a extensiio em te © comportamento dos animais torna-se subjetivamente Compreensivel para nés, ou o nosso para cles; uma tal com. Preensio ¢ altamente incerta, ¢ sua aplicagio muito problems- tica, Mas até onde tal compreensao existe, seria concebivel formular uma sociologia das relagdes do homem com os animais, quer domésticos ou selvagens, E verdade, afinal, Gue muitos animais. “compreendem” ordens, raiva, amor, Seressividade, € ndo reagem apenas instintiva © mecani frente, mas de modo conscientemente significativo ¢ com base em experiéncias prévias. Nossa propria capacidade de identificar-nos com 0 comportamento de Povos primitivos Aificilmente melhor. Mas nio temos meios confiaveis de 8 MAX WEBER determinar o estado mental subjetivo de qualquer animal ou se temos sao, na melhor das hipdteses, insatisfatérios. Os problemas da psicologia animal so conhecidos como sendo interessantes, bem como dificeis. Também sa- bemos que existem organizagdes sociais animais de muitos tipos: “famflias” monégamas ¢ poligamas, manadas, rebi hos, ¢ mesmo “Estados” com uma diviso funcional de tra- balho. A extensio da diferenciagio funcional destas sociedades animais nao é de nenhum modo paralela & dife- renciagio orgdnica ou morfoldgica de membros individuai da espécie. Por exemplo, a diferenciagio funcional encontra da entre cupins, ¢, portanto, a dos elementos de sua organi- zagiio social, é bem mais avangada do que a encontrada entre formigas e abelhas, Pode muito bem ocorrer que 0 observa- dor deva satisfazer-se em obter uma anélise puramente fun- Jma tal anélise 0 capacitaria a estudar os meios que @ ncia: cional. espécie considera indispensiveis para sua sobreviv nutrigilo, defesa, reproducao e reconstrugio, ¢ a identificar os animais encarregados da execugao destas e de outras fun- (des, ou seja, reis © rainhas, operdrias, soldados, zang6es, propagadoras, rainhas substitutas etc. Qualquer coisa além disto permaneceria por muito tempo mera especulagao ou pesquisa, quanto A extensio em que a hereditariedade por um Jado € 0 ambiente de outro estariam envolvidos no desenvol- vimento destas tendéncias “sociais”. Isto foi particularmente verdadeiro nas controvérsias entre Goethe e Weisman. O conceito de Weisman da onipoténcia da selecao natural ba- seava-se em grande parte em deducdes nio empiricas. Mes- mo assim, todas as autoridades sérias concordam que a reducio a um nivel funcional de andlise ¢ simplesmente uma necessidade e ter, segundo se espera, um cardter puramente temporario (Compare, por exemplo, 0 que se sabe sobre cu- pins ao estudo de Escherich, 1909). Gostarfamos de saber nao apenas a importancia das fungdes de todas estas formas dif renciadas na sobrevivencia, mas também como, por exemplo, CONCEFTOS BASICOS DE SOCIOLOGIA a teoria da hereditariedade das caracteristicas adquiridas — ou © seu oposto — tem peso no problema de explicar as ori- gens destas diferenciagdes, bem como a influéncia das dife- rentes variantes sobre aquela teoria. Além disso, seria bom saber primeiro que fatores so decisivos para a diferenciag%o original de tipos especificos a partir do tipo neutro nio dife- Tenciado; segundo, 0 que leva o individuo, uma vez diferen- ciado, a agir de uma maneira calculada a permitir a sobrevivéncia do grupo diferenciado. Onde houve algum Progresso na pesquisa destes problemas, isto ocorreu por demonstragao experimental da probabilidade ou possibilida- de concemente ao papel de estimulos quiimicos ou processos fisiol6gicos tais como habitos nutitivos, efeitos castrativos por parasitas etc., no caso dos organismos individuais, Até nde existe mesmo a sombra de uma possibilidade de mos- rar a existéncia de uma orientagdo “psicol (isto 6, subjetiva) ou significativa experimentalmente posstvel, nem mesmo o especialista aventurar-se-ia a supor. Parece que se poderia obter uma mostra verificdvel da PSique destes animais sociais que se prestasse a uma com- Preensdo significativa apenas como meta ideal, somente den tro de limites estreitos. De qualquer modo, nfo podemos €sperar extrair desta fonte qualquer contribuigdio real para a Compreensio do comportamento social humano. Ao contri tio — no campo da psicologia animal — a analogia com 0 humano deve e sera usada com cuidado. Podemos esperar Entretanto, que algum dia tais analogias biolégicas serio i. teis para sugerir novas abordagens significativas Por exem- Plo, pocleriam lancar luz sobre como nos estégios primitivos da diferenciacZio humana deveria ser calculado o impacto de fatores mecnicos ¢ instintivos, comparado aos fatores ac Mis 4 intexpretagiosubjetiva de modo gerale, mas especi- ficamente, aos que sio acessiveis & aco consciente e Facional. Uma sociologia compreensiva deve reconhecer que Para o desenvolvimento humano primitivo, o impacto da _ MAXW primeira série de fatores tem importancia decisiva e que mesmo nos estigios posteriores deve-se reconhecer sua con- tinua interagio com outros. * i AA agio tradicional e especialmente a ago carismatic freqiientemente, contm as sementes de contégio psiquico ¢ assim agem como eorreia de tansmissio para muitos estimu- los evolutivos do processo social. Tais tipos de agio estio intimamente relacionados a fendmenos que s6 podem ser entendidos em termos bioldgicos ou estio sujeitos a uma nlepreiagdo incompleta em termes de motives subjetivos, fundindo-se quase imperceptivelmente no biolégico. Nada disto livra a sociologia da obrigagio de cumprir, mesmo den- tro de limites tao estreitos, 0 que apenas ela pode fazer. Os varios trabalhios de Ohtmann Spann silo ricos de idéias sugestivas nesta linha, embora com freqliéncia ele também erte, pendendo a jufzos de valor puro, que nito fax zem parte de uma verdadeira pesquisa empfrica. Mesmo as- sim, sem dtivida ele esta certo quando enfatiza sobremancira « importancia de um ponto de vista funcional para a investi gagdo preliminar de um problema social; isto é 0 que ele chama de “método universalista”. hi Precisamos saber primeiramente 0 tipo de agio que € funcional em termos de sobrevivéncia e, acima de tudo, ne- cessiria 4 continuidade da unidade cultural e 4 continuidade dos tipos correspondentes de agiio social, antes de podermos investigar suas origens e motivagao. Primeiro, precisamos saber 0 que fazem um rei, um oficial, um empresério, um alcoviteiro, um magico, um produtor, ou seja, que tipo de ago mostra-se tipica e suficientemente importante para jus ficar sua classificagaio em quaisquer destas categorias, sendo, portant, relevante para a anise, antes de a iniciarmos (sto € 0 que H, Rickert entende como jufzo de valor). Contudo, é apenas uma tal andlise que consegue compreender a agao de individuos humanos (e apenas humanos) tipicamente dife- _CONCEITOS BASICOS DE SOCIOLOGIA 31 Tenciaclos e que deve, pois, ser considerada como a fungio especifica da sociologia De qualquer modo, € um tremendo mal-entendido su Por que uma metodologia individualista pressupe também um sistema individualistico de valores. Uma opiniao tio erra- a, quanto confundir a tendéncia relativamente inevitavel dos Conceitos sociais de adquirir um cardter racional, baseando-se hha crenca de que motivos racionais sempre predominam ou que 0 racionalismo pode ser positivamente avaliado. Mesmo uma economia socialista seria individualista Para fins de andlise sociolégica, ou seja, deve ser entendida Com base na ago individual — por exemplo, o dos funcio- natios que a dirigem —e isto seria igualmente verdadeito no {caso de um sistema de mercado livre analisado em termos da feoria da utilidade marginal, embora fosse possivel descobrir tim método mais adequado, mas ainda semelhante. A verda- eira pesquisa sociolégica cmpirica comega apenas com a uestio de 0 que motivava e ainda motiva os funciondrios individuais e os membros da comunidade a conduzir-se de {al maneira a realizar a criagao desta “comunidade” e a asse Surar sua continuidade. Qualquer andlise formal que use o iodo" como seu ponto de partida pode suprir apenas prepa- Tos preliminares para a verdadeira pesquisa; sua utilidade ¢ indispensabilidade so, se forem apropriadamente aplicadas, haturalmente incontestiveis 10. As virias generalizagdes sociolégicas costumeira- Tuaite identificadas como “leis cientificas”, por exemplo, a Lei de Gresham, sio de fato probabilidades tipicas confirma. las pela observacio. Supde-se que, sob certas condigdes adas, ocorrerd um curso de agio projetado que sera inteligé- Nel ci termos dos motives tipicos e das intengdes subjetivas Picas dos envolvides numa certa ago. Estas generalizagdes Sto ambas compreensiveis e definitivas no grau mais alto até Onde 0 curso de uma agio tipica pode ser observado em tet. 32 MAX WEMER mos de busca puramente racional de um fim ou onde, por motivos de conveniéneia metodolégica, um tal tipo te6rico pode ser heuristicamente empregado; em tais casos o rel cionamento entre meios ¢ fins é claramente compreendido empiricamente, especialmente onde a escolha de meios era “inevitavel”, Neste caso pode-se afirmar legitimamente que até onde a conduta era estritamente orientada a fins ndio po- deria ter tomado qualquer outra diregio. As razdes seriam primeiramente técnicas, ja que dados os fins claramente de: finidos nenhum outro meio estava disponivel para os indivi- duos envolvidos em tal ago, Um caso assim demonstra enfaticamente quo errado era considerar qualquer tipo de psicologia como 0 fundamento iiltimo da sociologia compre: ensiva, E certo que hoje todos parecem ter sua prépria inter- pretagdo de psicologia. Certos propdsitos metodol6gicos definidos justificam um tratamento de certos tipos de proces- sos que tentam seguir os procedimentos das ciéncias natu- rais, separando os fendmenos “fisicos” dos “psiquicos”, de uma maneira completamente alheia as disciplinas enyolvidas na agio, Os resultados da pesquisa psicolégica que emprega os métodos das ciéncias naturais em qualquer amplitude e ma- neiras possiveis podem, naturalmente, exatamente como qualquer outra cigncia, ter, dentro de certos limites, grande significado para problemas sociol6gicos; e, na verdade, isto tem acontecido com freqiiéncia. Entretanto, um tal uso de dados psicolégicos deve diferenciar-se de qualquer investi- gaglo da acdo humana em termos de seu sentido subjetivo. Conseqilentemente, a sociologia nifo tem nenhum relaciona- mento légico mais fntimo com a psicologia do que qualquer outra ciéncia. O erro confunde-se aqui com o conceito de “psiquico” que considera tudo 0 que é nao-fisico como psi- quico ipso facto; entretanto, o real significado da solugiio de um problema matemdtico por uma pessoa no é um processo psiquico”: as de jonais de um individuo, tendo CONCEITOS BASICOS DE SOCIOLOGIA 33 (ou: ndo os resultados de um certo curso de conduta destaca- do, promovem certos interesses especificos, junto com as decisdes correspondentes, nao se tornando nem um pouco mais inteligiveis por baseat-se em consideragdes psicolégi- cas. No entanto, precisamente sobre tais suposigdes racionais € que se funda a maioria das leis da sociologia, bem como da economia, Por outro lado, ao explicar a conduta irracional sociologicamente, a psicologia compreensiva (isto é, a forma Que utiliza a compreensio subjetiva), sem diivida pode ter valor decisivo. Porém, isto nao muda a situagio metodolégi- ca fundamental. 11, Tem-se repetido a premissa de que a ciéneia da so- Ciologia tenta formular conceitos tipolégicos e regras gerais dos processos empiricos. Deste modo, esta em contraste com # hist6ria, que se esforca para a anilise ¢ explicagio causal da aco culturalmente significativa de individuos, de institui- es e de certas personalidades. Os dados que alicercam as Conceituagdes da sociologia consistem essencialmente, em- bora nao com exclusividade, dos mesmos processos relevan- tes de ago com os quais trabalham os historiadores, Seus Conceitos e generalizagées baseiam-se na premissa de que a Sociologia reivindica dar uma contribuigao & explicagdo cau- sal de alguns fendmenos hist6rica e culturalmente importan- tes. Como € verdadeiro para qualquer outra generalizadora, o cariter abstrato dos conceitos sociolégicos € responsivel pela relativa auséncia de contetido conereto, quando comparado @ verdadeira realidade hist6rica, Mas 0 gue a sociologia oferece, ao contrério, é um aumento na pre- Gisio dos conceitos. Obtém-se tal precisio maior lutando Pelo maior grau possivel de adequagiio de sentido, de acordo 4 conceituagio sociolégica antecipada acima, Repetidamen: te, enfatizou-se que esta meta pode ser realizada num grau bastante alto no caso de conceitos e generalizagdes que for- mulam processos racionais — relacionados a fins ou valores éncia 34 MAXWeoeR Mas a sociologia tenta abranger também varios fendmenos itracionais (isto é: misticos, proféticos, espirituais, bem co- mo afetivos), em termos de conceitos tedricos que sio ade- quados a0 nivel do seu sentido. Em todos os casos, quer racionais como irracionais, a sociologia distancia-se da reali. dade, mas, no entanto, serve para entendé-la, mostrando com que grau de aproximagio um fendmeno hist6rico concreto pode ser subordinado a qualquer destes conceitos. Por exemplo, o mesmo fendmeno histérico pode ter as- pectos feudais, patrimoniais, histéricos e carismaticos. Para fornecer a estes termos a necessiria precisdo, a sociologia deve projetar tipos “puros” (“ideais”) de formas correspon- dentes da aco humana, que em cada caso envolvem o grau mais alto possivel de interpretagio légica por causa de sua completa adequagiio de sentido. Porém, pela propria razaio de isto ser assim, nao é quase nunca, em nenhuma oportunida- de, provavel que se possa encontrar um fenémeno real que corresponda exatamente a um destes tipos idealmente cons truidos, A situagio assemelha-se ao célculo de uma reagio baseado num véicuo absoluto. Somente com base em tais tipos ideais é possivel a andlise te6rica no campo da sociolo- gia. Entende-se, esti claro, que em adigao seja conveniente ‘ao socidlogo empregar ocasionalmente tipos médios de car’ ter empirico-estatistico; estes conceitos no requerem discu: siio metodolégica nesta altura, Contudo, quando a sociologia se refere a casos tipicos, deve-se entender sempre, a nio ser que se afirme 0 contrario, que 0 termo significa termos id ais, sejam racionais ou irracionais (na teoria econémica sem- pre se trata do primeiro), mas que sdo, em qualquer caso, sempre construfdas com adequagio de sentido, , Precisamos reconhecer que, na area da sociologia, mé- dias, e também tipos médios, s6 podem ser construfdos com maior precisaio, onde se trata de agdes qualitativamente iguais, que diferem apenas em grau. Tais casos ocorrem, mas, na maioria dos casos dos tipos de aco que so relevantes para a “ONCEITOS BASICOS DE SOCIOLOGIA 35, hist6ria ou sociologia, os motivos que as influenciam sio qualitativamente heterogéneos, nenhum deles podendo ser considerado médio no sentido verdadero. Os tipos ideais de agio social encontrados na teoria econdmica sio “nio- realistas” ow abstratos, na extensfio em que pesquisam ape- has © que aconteceria durante um dado curso de agdo, con. tanto que fosse puramente racional e orientada apenas a fins econdmicos. Uma tal abordagem, entretanto, é itil na com- Preenso da ago que néio é determinada $6 economicamente, mas também influenciada por restrigGes tradicionais, emo. g0es, erros ¢ a intrusdo de outros fatores nao-econdmicos, Isto pode acontecer de duas maneiras: primeiro, através de uma andlise do fator economicamente determinante junta- Mente com outros fatores num caso tinico ou numa quanti- dade de casos médios; ou, em segundo lugar, a anélise de fatores niio-econdmicos pode ser facilitada enfatizando-se a discrepincia entre 0 curso real dos eventos ¢ 0 tipo ideal Assim a construgdo de um tipo ideal, de uma atitude acésmi- ea para com a existéncia, engendrada por influéncias misti um proceso semelhante ao analisar suas Conseqiléncias no relacionamento do individuo na vida co- mum (por exemplo, em politica ou economia). Quanto mais distinta © precisa a construgio do tipo ideal, maior é sua na ureza abstrata ou nao-realista, € mais capaz de desempenhar Suas fungdes metodolégicas na formulagao da clarificacto da terminologia, da classificago, e das hipoteses. Na atribuigao de explicagao causal concreta de eventos individuais, © método hist6rico & essencialmente © mesmo. Por exemplo, uma tentativa de explicar a campanha de 1866 deve necessariamente abranger uma reconstrugdo de como Moltke © Benedek teriam agido se tivessem possuido discer- nimento integral nfo somente da prépria situagio, como também da situacio do adversério. $6 entio seria possivel €stabelecer comparagdes com o curso real dos eventos ¢ formular uma explicagio causal dos desvios observados, que 36. MAX WERER poderiam ser atribufdos a fatores tais como desinformagio, erros estratégicos, falicias l6gicas, exageros personalistas ou consideragdes nilo-estratégicas, Assim, estd latente aqui uma construcio tfpica ideal de ago racional. Porém, as construgdes tipico-ideais da sociologia deri- vam seu cardter nao somente do ponto de vista objetivo, mas também de sua apli subjetivos, Na maior parte das vezes, a aco real atuua no nivel subconsciente inar- ticulado de seu sentido subjetivo. A pessoa que se comporta de uma certa maneira “sente” isto vagamente, ao invés de ser explicitamente consciente da fonte de sua agdo. Quase sem- pre sux agio é governada pelo habito ou instinto. Apenas ocasionalmente — € no comportamento uniforme das gran- des massas, somente no caso de alguns poucos individuos — © sentido subjetivo de tal agio, seja racional ou irracional, eleva-se a0 nivel da verdadeira consciéneia. Na realidade efetiva, a agdo consciente ¢ claramente significativa sempre constitu um caso marginal, Toda investigagao hist6rica sociolégica empenhada na andlise de fatos empiticos tem que tomar isto em consideragio. Mas esta dificuldade nao precisa impedir o pesquisador de formular conceitos através da classificagdo de tipos possiveis de sentido subjetivo: isto é, deve agir como se a aco realmente ocorresse na base de um sentido claramente autoconsciente. A divergéncia resul- tante dos fatos concretos deve ser mantida continuamente sob observacdo todas as vezes em que houver uma questiio deste nfvel de concreticidade e deve ser cuidadosamente es- tudada, tanto no que se refere a grau quanto a tipo. Metodo- logicamente, com freqiiéncia temos somente a alternativa de escolher entre termos que nao sido claros ¢ os que so claros; estes tiltimos podem ser tipos abstratos ideais, mas por esta mesma taz30 sao cientificamente preferiveis (sobre todos estes t6picos ver Archiv fiver Sozialwissenschaft, vol. XIX, op. cit. ver parte A, sec. 6). CONCEETOS BASICOS DE SOCIOLOGIA 37. O Coneeito de Agao Social 1, A acao social (incluindo tanto a omissio como aqui- escéacia) pode ser orientada para as agdes passadas, presen- {es ow futuras de outros, Assim, pode ser causada por sentimentos de vinganga de males do passado, defesa contra Perigos do presente ou contra ataques futuros. Os “outros” podem ser individuos conhecidos ou desconhecidos, ou po- dem constituir uma quantidade indefinida, Por exemplo, “di- nheiro” € um meio de troca que o individuo aceita em Pagamento, porque sua ago se orienta na expectativa de que numerosos, mas desconhecidos e indeterminados “outros” o Aaceitardo por sua vez, em algum tempo no futuro, como um meio de troca 2, Nem toda espécie de aco, nem mesmo a agdo ma- nifestadamente formal, é “social”, no sentido da presente ‘cussiio. A agdo formal € nZo-social se orientada exclusi- Yamente a0 comportamento de objetos inanimados, Atitudes subjetivas devem ser consideradas aio social apenas se ori- entadas & ago de outros. A conduta religiosa no é social, se Permanece simplesmente uma questio de contemplacio, de Oragdo solitéria etc. A atividade econdmica de um individuo apenas € social se e até 0 ponto em que concerne também a atividide de terceiros. Falando de modo geral, em termos formais, torna-se social apenas até o ponto em que reflete a extensfio em que os outros respeitam 9 controle real de uma Pessoa sobre bens econdmicos. Mais concretamente, & social Se, por exemplo, em relag3o ao consumo de uma pessoa, as necessidades futuras de outros so levadas em conta e deter- minam, portanto, a “poupanca” desta pessoa. 3. Nem todo tipio de contato entre seres humanos tem lum cardter social, mas apenas quando a ago do individuo é Significativamente orientada para a dos outros. Assim, a coli- So entre dois ciclistas é apenas um evento isolado, compa 38 al rdvel a uma catéstrofe natural. Por outro lado, qualquer tenta- tiva de um deles de evitar bater no outro, com os insultos subseqilentes, uma briga, ou mesmo uma discussdo pacifica, constituiria uma forma de “ago social” 4. A aco social também nao € idéntica a: a) a ago uniforme de muitas pessoas; b) a agdo influenciada por 0 tras pessoas. Por exemplo, se no comego de uma chuva uma quantidade de pessoas na rua abrir scus guarda-chuvas ao mesmo tempo, tal conduta normalmente ndo se orienta para a dos outros, pois trata-se simplesmente de uma re Ihante de todos de protegerem-se contra a chuva. Sabe-se também que a conduta de um individuo pode ser fortemente influenciada pelo mero fato de que cle é um membro de uma multidao contida num espago limitado, Este constitui o sunto das pesquisas sobre “psicologia de massas”, do tipo desenvolvido por Le Bon, sendo conhecido como ago “con- dicionada pelas massas”. Prosseguindo, € possfvel que um grande mimero de pessoas que se encontram bastante disper- sas reaja simultanea ou sucessivamente a uma fonte de influ- €ncia que atua de modo semelhante sobre todos os individuos, como faz, por exemplo, a imprensa; desta manei- ra a aco do indivfduo é influenciada por sua associa multidao e por sua prépria percepgao deste aglomerado. De fato, certos tipos de reagio sio possiveis apenas pelo mero fato de que o individuo se porta como parte de uma multi- dio, embora outros tipos se tornem mais dificeis sob as mesmas condigdes, Conseqiientemente, € possfvel que um evento em particular ou um modo de ago humana dé lugar a emogées de tipos muito diversos — humor, raiva, entusias- mo, desespero ou paixdio — numa situagdo de multidao, que niio aconteceria de modo algum ou de modo tio fécil se o individuo estivesse sozinho; isto nio precisa constituir ne cessariamente uma relacdo significativa entre 0 comporta mento do individu e o fato de que ele € um membro da CONCELTOS BASICOS DE SOCIOLO 39 multidio. Uma tal agio, resultante apenas do resultado de reacdes do individuo na multidiio, no 6 conduta “social” no sentido usado aqui, especialmente quando no hé orientacao desta conduta que se possa considerar adequada no nivel do significado, Tais diferengas siio, necessariamente, muito fle- xiveis. Por exemplo, nao apenas o demagogo, mas também a massa que 0 ouve podem ser afetados em graus varidveis um pela conduta do outro; ¢ um tal relacionamento pode dar lugar a varias interpretagbes. Além disso, a mera “imitagaio” da conduta dos outros corretamente enfatizada por G. Tarde — nao sera consi- derada especificamente “aco social” se for simplesmente sativa € no orientada com sentido para o individuo assim imitado, Novamente a linha de demarcacio é extremamente flexivel, 0 que torna sua determinagzio cada vex mais dificil Entretanto, 0 mero fato de alguém usar, de propésito, um esquema tendo em vista que outros 0 usem nao constitui, no sentido presente, ago social, Uma ago como esta nao se orienta pela agao de outras pessoas, pois o individuo, tendo aprendido através de observagio de outros a existéncia de certos fatos objetivos, orienta sua ago em funcao daqueles fatos. Assim, sua ago ¢ causalmente determinada pela aco de outros, mas no pelo sentido contido nesta titima. Por outro lado, por exemplo, se a conduta dos outros € imitada porque é “moda”, ou “tradi¢Zo", ou “padrio” corrente, ou concedem prestigio social, ou por motivos semelhantes, en- tio temos uma relagio de sentido, quer para a agiio daqueles que esto sendo imitados, quer para o de terceiros, ou ainda a0 de ambos. Entre estes tipos de imitagao, existe, estd claro, toda espécie de casos limitrofes. Ambos os fendmenos, tanto 0 do comportamento das multidées, bem como o da imitago, so conceitos fluidos no limite da aco social; o mesmo é verdadeiro quanto a tipos tradicionalistas de ago social, mais bem desenvolvidos no capitulo 2. Pode-se encontrar a razio de tal flexibilidade nes- A i he ah te caso ¢ em outros semelhantes no fato de que a orientagio pela agiio alheia © o sentido da prépria conduta do individuo nem sempre so suscetiveis de determinagiio coneisa e, com frequéncia, sto, na verdade, completamente inconscientes raramente inteiramente autoconscientes. Mera “influéncia” e “orientagio com sentido nao so sempre, por este motivo, suscetiveis de distinedio empfrica, Porém, conceitualmente, & essencial diferencid-los, ainda que a mera imitacao “reativa” tenha a mesma importincia sociolégica que o tipo que cons. {itui a agdo social no sentido estrito. Portanto, a sociologia no se ocupa com a “ago social”, mas tal ago fornece (20 ‘menos para a sociologia desenvolvida aqui) sua matéria cen- tral e pode ser considerada sua parte constitutiva como cién- cia. Contudo, isto nfo implica em qualquer juizo sobre a importaneia comparativa deste e de outros fatores, CAPITULO 2 FORMAS CARACTERISTICAS DE, ACAO SOCIAL Como qualquer outra ago, a ago social pode ser de- terminada de qualquer das quatro maneiras seguintes: Pri meira: Pode ser classificada racional em relagdo a fins. Neste caso a classificagio se haseia na expectativa de que objetos em condigio exterior ou outros individuos humanos compor- tar-se-o de uma dada maneira e pelo uso de tais expectati- vas como “condigdes” ou “meios” para atingir com sucesso 0s fins racionalmente escolhidos pelo individuo. Em tal caso, ser denominada agao en relagdo a fins. Segunda: A agio social pode ser determinada pela crenca consciente no valor absoluto da agio como tal, independente de quaisquer moti- vos posteriores © medida por algum padrdo tal como ética, estética ou religido, Em tal caso de orientaco racional para um valor absoluto seré cenominada agdo em relacao a valo- res. Terceira: A acio sovial pode ser determinada pela afeti- vidade, especialmente de modo emocional, como resultado de uma configuragio especial de sentimentos e emogdes por parte do individuo. Quarta: A ago social pode ser determi- nada tradicionalmente, tornando-se costume devido a uma longa pratica 1. A agdo estritamente tradicional — exatamente como © tipo que reage por imitagao discutido antes (ver cap. 1) fica inteiramente no limite do que se pode chamar de uma cdo com sentido e as vezes até a ultrapassa. Freqiientemente 6 simplesmente uma reasio amortecida — quase automéi MAX WEBER — a estimulos costumeiros que tém conduzido a aco, repe- tidamente, ao longo de um curso rotineito. A maior parte de todos os deveres rotineiros desempenhados habitualmente pelas pessoas todos 08 dias é deste tipo; conseqtientemente, no pertence a esta classificago apenas como um caso mar- ginal, mas também (como seri demonstrado mais tarde) por- que sua ligagio com o costume pode ser mantida com graus varidveis de autoconsciéncia ¢ numa variedade de sentidos: este caso 0 tipo pode aproximar-se do de mimero dois (rela- tivo a valor), 2. A ago estritamente afetiva também fica na linha do que pode ser considerado uma ago consciente de sentido e, com freqléncia, ultrapassa também a linha; por exemplo, pode ser uma reacdo desinibida a algum estimulo extraordiné- rio. Ha um caso de sublimago quando um comportamento afetivo condicionado toma a forma de liberaciio consciente de tenses emocionais. Quando isto acontece, de um modo geral mas nem sempre, est bem adiantado no caminho em diregio &.agio em relagio a valores ou fins, ou pende para ambas. 3. A aco em relagao a valores distingue-se da agio afetiva por sua formulagiio consciente dos valores «ltimos que a governam ¢ sua consistente orientagio planejada que se volla a estes valores, Ao mesmo tempo, estes dois tipos compartilham o fato de que o sentido da agiio nao se resume 4 obtengao de algum tipo posterior, mas concentra-se no em- Penho existente no tipo de agio por si proprio. A aco afel vamente determinada € a que exige a satisfagio imediata de um impulso, no importando quao sublime ou sérdido possa ser, de modo a obter vinganga, gratificago sensual, dedica- ao completa a uma pessoa ow ideal, contemplacio feliz, ou finalmente, para liberar tenses emocionais, Exemplos de aco pura em relacdo a valores estariam na acto de pessoas que, independentemente das conseqiién- cias, conduzem-se de tal maneira a por em pritica su CONCEITOS BASICOS DESOCIOLOGIA viegdes € 0 que Ihes parece ser exigido pelo dever, honra, beleza, religiosidade, piedade ou pela importincia de uma “causa”, néo importando qual o seu fim, Dentro de nossa terminologia tal agdio em relagio a valores consiste sempre numa conformidade a comandos ou exigéncias cujo cum- primento a pessoa nela envolvida considera uma obrigagao. Somente até onde a agiio humana se orienta exclusivamente a tais exigéncias incondicionais — o que se mostra verdadeiro até um ponio bastante modesto — é que pode ser considera- da como “em relagao a valor”, ou seja, orientada a valores absolutos. Veremos que este tipo de agao é suficientemente importante para justificar seu isolamento como um tipo es- pecial; contudo, devemos observar que no se faz aqui ne- nhuma tentativa para formular de qualquer maneira uma classificacio exaustiva de certos tipos de agi. 4. A acdo racional é da espécie orientada a fins quando cnyolye a devida consideragdo de fins, meios e efeitos se- cundérios; tal ago também deve considerar atentamente as escolhas alternadas, bem como as relagdes do fim com o tros usos possfveis do meio e, finalmente, a importa tiva de diferentes fins possiveis. Assim, a classificagio da acto em termos afetivos ou tradicionais é incompativel com este tipo. A decisto entre fins ¢ resultados competitivos e conflitantes pode, por sua vez, ser determinada por uma con- sideragao de valores absolutos: neste caso tal conduta ¢ ori- entada a fins apenas no que diz respeito a escolha dos meios. Ou a pessoa envolvida em tal conduta pode, ao invés de de- cidir entre fins conflitantes ov competitivos em termos de orientagao relativa a valor, apenas tomé-las como necessida- des subjetivas dadas e ordend-las numa escala de prioridades. Pode, ento, orientar sua acto de acordo com esta escala de tal maneira que esteja conforme, até onde seja possivel, & ordem de prioridades prescrita pelo principio de “utilidade marginal”. cia rela- 43 44 MAX WERER Esta acdo em relagao a valores pode ser, de varias ma- neiras, relacionada & conduta orientada a fins. Do ponto de vista desta ltima, entretanto, a orientagao por valores adqui re mais irracionalidade na medida em que se torna mais ab- soluta. Porque, quanto mais incondicionalmente o individuo se dedica a tal valor em si— seja por causa de sentimento, beleza, bondade absoluta ou devogio ao dever — menos pensa nas consequéncias de tal dedicagdo. Uma ago absolu lamente orientada a fins, ou seja, & pura finalidade, sem qualquer referéncia a valores uma excectio que formutamos. biisicos, 6 em esséncia, apenas 5. Raramente a agio, especialmente a agiio social, ori- enta-se apenas de uma ou de outra destas maneiras. E nfo se constitui, tampouco, uma classificagio exaustiva dos tipos de agdo ora existentes, pretendendo-se chegar somente a certas formas conceitualmente puras de tipos sociologicamente im- Portantes, dos quais a ago social se aproxima um pouco mais ‘ou pouco menos, ou que mais freatlentemente constituem os elementos que se combinam para formar tal ago. Apenas seu futuro sucesso pode justificar a utilidade desta classificagao para os propésitos de nossa pesquisa. CAPITULO 3 O CONCEITO DE RELACAO SOCIAL © termo “relacdo social” sera usado para designar a si- twagdo em que duas ou mais pessoa estio empenhadas numa conduta onde cada qual leva em conta © comportamento da outra de uma maneira significativa, estando, portanto, orien- tada nestes termos. A relagio social consiste, assim, inteira- mente na probabilidade de que os individuos comportar-se- ao de uma maneira significativamente determindvel. E com- pletamente irrelevante 0 porqué de tal probabilidade, mas onde ela existe pode-se encontrar uma relago social 1. Um critério de definigaio exige, pois, a0 menos um mfnimo de orientagio mitua da conduta de cada um em rela- Go & de outro. Seu contetido pode variar bastante: conflito, hostilidade, atragdo sexual, amizade, lealdade ou intercdmbio comercial, pode envolver “cumprimento”, “evasio” ou “rompimento” de um acordo; “competic’o” econdmica, eré: tica ou de qualquer outro tipo; participag nacionais, estamentais ou de classe, Nestes tiltimos casos a mera associagio de grupo pode nao constituir ago social, como discutiremos adiante, Além disso, a definigaio no nos informa quanto ao grau de solidariedade ou oposigiio predo- minante entre os que estio envolvidos nesta conduta. jo em comunidades 2. E sempre um caso, se usado neste contexto, de senti- do imputado aos individuos envolvidos numa dada situagao conereta, seja na média ou num tipo puro construido teori- camente, mas nunca um caso de sentido normativamente fisicamente “verdadeiro”, A relagao social “correto” ou mk 46 MAX WEBER consiste, mesmo no caso de tais “organizagdes sociais” como Estado”, “Igreja”, “associagio” ou “casamento”, no fato de que cxistiu, existe ou existiré uma conduta proviivel, de al- gua maneira definida, apropriada a este sentido. Torna-se necessério enfatizar isto para evitar a “reificagao” destes conceitos, ou seja, sua degeneragiio em conceituagbes vazias. Desse modo, um “Estado” perde seu significado socio- Idgico to logo se torne provavel que cesse de manifestar qualquer espécie de agiio social com sentido. Tal probabili- dade pode ser bastante alta ou pode ser insignificante. Po- rém, em qualquer caso, apenas no sentido ¢ grau em que de fato existe, ou pode ser avaliado como existindo, é que a relagdo social correspondente existe. De outra maneita ne- nhum significado pode aplicar-se & frase de que um dado “Estado” existe ou deixou de existir 3, Todas as partes mutuamente orientadas numa dada relagdo social no manifestam necessariamente 0 mesmo sentido subjetivo, ou seja, nao precisa haver qualquer “reci- procidade”, “amizade”, “amor”, “lealdade”, “confianga con- tratual”, “nacionalismo”, pois uma parte pode manifestar uma atitude inteiramente diferente da de outra, Para as partes envolvidas, sua conduta demonstra meramente varias formas € significados e a relacdo social 6, para cada parte, simples- ssimétrica”. Mesmo assim, podem ser mutuamente orientados sempre que uma parte supde que outra manifesta- '4 uma atitude particular em relacio a ela ¢ orienta sua con- duta de acordo com tal expectativa. Quer esteja ou nao enganada em suas expectativas, isto pode, ¢ geralmente re- sultard, de fato, num certo curso de conduta e teré conse- giiéncias na forma da relagio. Falando objetivamente, uma relagio “simétrica” existe apenas se em suas expectativas este relacionamento significar o mesmo para todas as partes envolvidas. Por exemplo, a atitude real de uma crianga para com seu pai pode ser, ao menos aproximadamente, a que 0 concerto ASICOS DESOCIC pai, no todo, tem esperado. Uma relagio social em que as atitudes siio completa ¢ inteiramente orientadas reciproca- mente é, na verdade, um caso marginal. De acordo com a nossa terminologia, a auséncia da reciprocidade excluiré a existéncia de uma relagio social apenas se tal orientagaio maitua estiver faltando realmente na agio das partes. Aqui, ‘como em qualquer lugar, todas as espécies de casos interme- didrios constituem a regra ao invés da excegao, 4, Uma relacio social pode ser de uma natureza trans tria ou de graus varidveis de permanéncia. Ou seja, pode ser de tal espécie que haja uma probabilidade de nova recorrén- cia da conduta, comespondente a seu sentido subjetivo, sen- do, portanto, esperada porque € uma conseqliéncia de tal sentido, Contudo, para evitar que surjam impressOes falsas, devemos lembrar ¢ repetir que € apenas na presenga da pro- babilidade de que um complexo dado subjetivamente sign cativo resulte em um certo tipo de ago, que consiste a existéncia da relagio social. Assim, se a “amizade” ou 0 “Es tado” existem ou tim existido, isto signifi nosso jutzo, de observadores, hd ou tem havido a probabili- dade de que, dados certos tipos de atitudes subjetivas conhe- las de certos individuos, resulte, na média, num certo tipo especifico de condita, ¢ nada mais (compare acima, ao n° 2) H4 uma implicagio inevitivel, do ponto de vista legal: se uma regra de lei possui ou nao validade legal ¢ uma relagio legal pode ser suposta como existente, consequientemente, simplesmente tal alternativa em si ndo é relevante para os problemas sociol6gicos ca apenas que: em 5. significado subjetivo de uma relagtio social pode mudar. Por exemplo, uma relacdo politica baseada na solida riedade pode mudzr para outra baseada no conflito. Mas en- tao trata-se simplesmente de uma questo de conveniéncia terminoldgica e do grau de continuidade na mudanga, po- dendo-se dizer que uma nova relagao esté comegando a exis- 48 MAX WE R tir ou que a antiga continua, mas esté adquirindo novo senti- do. O significado também pode oscilar entre a constancia ca permanéneia. 6. O contetido de sentido que permanece relativamente Constante numa relago social pode ser expresso em axiomas que nos levam a esperar que as partes envolvidas correspon- dam ao menos aproximadamente a seus parceiros. Isto serd tanto mais provivel quanto mais racional for a conduta em sua relacdo a valores ou fins dados. Ha muito menos possibi- lidade de formulagao racional de sentido subjetivo no caso de uma atragiio erdtica ou de uma relagio baseada na lealda- de pessoal ou em outro tipo emocional, do que a existente, por exemplo, no caso de um contrato de negécios: 7. O sentido de uma relago social pode ser determina- do pelo consentimento mtituo. Signifiea que os participantes fazem promessas concementes a sua conduta futura — um em relagaio ao outro, ou de maneira relacionada a ambos. Cada participante espera ento que, normalmente, ¢ até onde se comporte racionalmente, que 0 outro participante oriente a ico dele de acordo com 0 sentido que estabeleceu consigo: © primeiro participante assim entende em relagdo ao segundo € vice-versa. A propria ago de cada um 6 assim parcialmet te orientada a fins ¢ ele espera corresponder com lealdade, tanto quanto possfvel; mas é também parcialmente orientada por valores, ou seja, ele tem o dever de corresponder a0 acor- do no sentido em que o entende. Sobre estas questées antecipamos aqui tudo 0 que foi possivel; para entendé-las melhor compare os capitulos 9 ao 13. CAPITULO 4 TIPOS DE ACAO SOCIAL: USOS, COSTUMES Dentro do campo da conduta social encontramos algu- mas regularidades factuais. Isto é, hé certas ages que, com um sentido tipico e idéntico, sao repetidas pelos individuos envolvidos ou ocorrem simultaneamente entre uma quant dade deles. Sao tais tipos de ago que concernem a sociolo- gia, em contraste com a hist6ria, que se interessa pelas conexdes causais de eventos tinicos importantes, quer dizer, decisivos, Uma probabilidade realmente existente de regularidade numa orientago de ago social sera chamada de “uso”, até 0 ponto em que a probabilidade de sua existéncia dentro de um grupo de pessoas nao se baseie em mais nada a nao ser 0 habito real. O uso seré chamado de “costume” se 0 hébito real vier de longa data, Por outro lado, onde 0 uso estiver determinado pelo fato de que toda a aco das partes é orien- tada a fins, com expectativas idénticas, sera chamado de “uso condicionado por uma situagiio de interesse proprio por parte do individuo” (imteressenbedingh) 1, A “moda” também ¢ uma parte do uso. Ela se distin- gue do uso quando a conduta em questio se motiva por sua novidade, ao invés da longa duraco, como acontece com 0 costume. A moda avizinha-se da “convengio”, pois origina- se, na maioria das vezes, do desejo por prestigio social. Nada mais precisamos discutir aqui. MAX WEBER, zs 2. Em contraste com a “conyengao” ¢ a “lei”, falaremos de “costume” quando a regra niio esté garantida externamen- te, mas quando 0 individuo procede de modo simples ¢ in- consciente ou por simples conveniéncia; qualquer que seja 0 motivo, ha sempre a expectativa justificada por parte dos membros dos grupos de que uma regra costumeira ter a correspondéncia dos outros, do mesmo modo e pelas mes- mas raz0es, O costume, neste sentido, niio serve para reivin- dicar “validade”: ninguém é obrigado a abservi-lo, Obviamente, a transigio deste caso para o de uma con- vengio vilida ou lei é bem gradual. Por toda parte o que tem. sido tradicionalmente comunicado tem-se tornado a fonte de tudo 0 que adquiriu autoridade valida. Tornou-se costumeiro que hoje tenhamos um café da manha de determinado tipo todos os dias, entretanto, ninguém € “obrigado” a fazé-lo, com a possivel excegio do héspede de um certo hotel, mas nem por isto tem sido sempre habitual. Por outro lado, nossa maneira de vestir nao se baseia mais, hoje, no mero costume mas tem-se tornado uma convengiio. A este respeito ainda merecem ser lidos os capitulos sobre usos € costumes do segundo volume de Zweck im Recht, escrito por Ihering. Ver também 0 Rechisregelung und Verkehrssitte, de P. Oertmann (1914) e Sitte, Recht und Moral, de E. Weigelin (1919), cu- jas opinides esti de acordo com as minhas e em desacordo com as de Staemmler, 3. Numerosas regularidades bastante notadas na agio social nao se baseiam de modo algum na orientacao para alguma norma ou uso “vélido”, mas antes no fato de que tipo correspondente de aco, pela natureza do caso, adapta-se melhor aos interesses normais dos individuos envolvidos, do modo que eles mesmos 0 percebem. Isto € especialmente verdadeiro na conduta econdmica, como por exemplo na regularidade dos pregos de um mercado “livre”, Os distribu- idores tratam assim de sua propria conduta como um meio CONCEITOS BASICOS DE SOC! LOGIA St para cbter a satisfacio de fins, definidos como os que perce- bem ser seus préprios interesses econdmicos tipicos ¢ tratam de modo semelhante como condigdes as expectativas tipicas correspondentes, em relaco a ago que esperam dos outros. Desta maneira, quanto mais rigidamente orientada a fins for sua conduta, tanto mais eles tenderdo a reagir de modo seme- Ihante na mesma situagao. Surgem assim semelhangas, regu- laridades e continuidades em suas atiudes e agdes, que freqiientemente sio bem mais estdveis do que seriam se a sua fosse orientada por um sistema de normas e deveres considerados obrigatérios pelo grupo. Este fendmeno — o fato de que a otientagao em termos de interesse proprio da pessoa ¢ de outros cause resultados muito mais semelhantes aos tentados através da coergdo (muitas vezes inutilmente) por um agente da autoridade — tem especial relevancia no campo da economia. Sua observagio foi, de fato, uma das origens importantes da economia como ciéncia. Mas é igual- mente verdadeiro em todas as areas da aco, Este tipo de fendmeno, em sua consciéncia e falta de rest des, é a anti- tese direta a toda espécie de compromisso impensado que tem normas conscientemente aceitas como valores absoluto: Um ccmponente essencial da racionalizagiio da agio é a substituico do compromisso impensado com os costumes antigos pela adaptagao planejada a situagdes, em termos de interesse proprio. Esté claro que niio esgotamos assim o con- ccito de racionualizacto da ado. Isto € assim porque, uma tal agiio pode ocorrer positivamente, em diregio & realizacio Consciente de valores iiltimos ou, negativamente, nao apenas & custa do costume, mas também de valores emocionais e, finalmente, em favor de um tipo de relacionamento livre de valores, & custa da crenga em qualquer valor absoluto, As muitas interpretages do conceito de racionalizagao continu am a ser de interesse para nds (conceituagées adicionais a este contexto serdio encontradas no final). MAX WEBER 4, A estabilidade do (mero) costume reside essencial- mente no fato de que a nao adaptagao da ago a ele esté su- jeita a grandes e pequenos inconvenientes e aborrecimentos, enquanto a ago da maioria dos envolvidos continuar @ cor responder a este costume e a proceder de acordo a ele. De modo similar, a estabilidade de qualquer conduta, em termos de interesse proprio, reside no fato de que a pes- soa que nao “leva em consideragio” os interesses dos outros provoca a hostilidade deles, podendo terminar numa situagzo diferente daquela que pretendia e correndo, portanto, o risco de prejudicar os seus proprios interesses. CAPITULO 5 O CONCEITO DE AUTORIDADE LEGi1 IMA A aelo, especialmente a ago social, e mais particular- mente a relagao social, pode ser orientada, de parte dos indi viduos, pelo que constitui sua “representagzio” da existéncia de uma autoridade legitima. A probabilidade de que uma tal orientagio realmente ocorra sera chamada de “validagio” da autoridade em questio. 1. A “validagio” de uma autoridade devera significar, portanto, mais que a mera regularidade da ago social, de- terminada pelo costume ou interesse proprio. O fato de que »s transportadores de méveis fagam propaganda de seus ser- igos regularmente na época do fim dos aluguéis é causado bem claramente por seu desejo de explorar uma oportunidade em seu interesse. O fato de que um vendedor ambulante visite ularmente um certo cliente num certo dia da semana ou més € o resultado de um longo hébito ou de interesse proprio (por exemplo, 0 pagamento naquela empresa). Quando um servidor pablico aparece em seu escritério todo dia na mesma hora, isto pode ser determinado nao apenas pelo costume ou interesse proprio, j4 que pode fazer o que bem entender, mas pode ser parcialmente o resultado de sua observancia aos regulamentos do escrit6rio, que impéem certos deveres sobre ele, os quais podem relutar em transgredir, jé que tal conduta no seria desvantajosa apenas para ele, mas também poderia ser detestivel a seu “sentido do dever”, 0 qual, numa exten sfio maior ou menor, representa para ele um valor absoluto. MAX WEBER 2. O contetido de uma relagiio social somente represen- tari uma “ordem” se sua conduta puder ser orientada apro- ximadamente para certos axiomas reconheciveis. A autoridade adquirira tes axiomas incluir ao menos o reconhecimento de que tudo a que obrigam 0 individuo, ou a agao correspondente, consti- tui um modelo digno de imitagio. Verdadeiramente, a con duta pode ser oricntada a uma autoridade por varios motivos. Mas 0 fato de que, ao lado de outros motivos, a autoridade seja mantida também ao menos por alguns dos outros indivi duos como sendo digna de imitagao ou obrigatoria, natural- mente aumenta num grau consideriivel a probabilidade de que a ago de fato se ajuste a ela, Uma autoridade sustentada so- mente por motivos de fins geralmente € muito menos estavel que uma mantida puramente numa base de costumes. Esta Ultima atitude para com a autoridade € bem mais comum. E ainda mais estdvel € 0 tipo de conduta orientada ao costume ‘que goza do prestigio de ser considerada exemplar ou obriga- t6ria, ou possui o que se conhece como “‘legitimidade”. Esti claro que a transigio de uma conduta orientada por fins ou por tradigo a uma motivada por uma crenga em sua legitimidade 6 extremamente gradual validade” apenas se a orientagio a es- 3. Pode haver orientagio a uma autoridade vilida, mesmo onde o seu sentido (como geralmente se cntende) nao é necessariamente obedecido. A probabilidade da ordem ser guma extension como uma norma vilida pode mantida em ter também um efeito sobre a acdo, mesmo onde seu sentido € burlado ou violado deliberadamente. Isto pode ser verda deiro, em principio, mesmo com base na pura racionalidade. Assim, a agio do ladrao exemplifica a validade da lei penal meramente pelo fato de que ele procura esconder sua condu- ta. O proprio fato de uma autoridade ser valida dentro de um grupo particular faz com que cle busque necessariamente ocultar-se, Este é, naturalmente, um caso marginal, mas com coNcerros freqtiéncia a autoridade € violada apenas parcialmente em um ou outro ponto, ot entao o ato de vioki-la é apresentado como legitimo, com uma medida maior ou menor de boa f6. Ou podem realmente coexistir varias interpretagdes paralelas do sentido da autoridade. Neste caso 0 socidlogo as conside- raré todas como vélidas, exatamente na medida em que re- almente modelem 0 curso da ago. O sociélogo nao tem dificuldade para reconhecer, dentro do mesmo grupo social, a existéncia de varios sistemas validos de autoridade, possi- yelmente contraditérios entre si. Na verdade é possivel, até para mesmo individuo, orientar a sua ago por sistemas mutuamente contraditérios de ordem. Isto pode ocorrer nao apenas em sucessiio répida, mas pode ser observado diaria- mente, até no caso da mesma conduta. Uma pessoa que se envolve num duclo orienta sua agao para a observancia de um cédigo de honra; mas também orienta sua conduta pela lei penal, quer mantendo 0 duelo secreto ou, ao contririo, aparecendo voluntariamente na corte de justiga. Entretanto, onde a burla ou violagdo do sentido da autoridade geralmente aceito tem-se tornado a regra, uma tal autoridade pode ser chamada de “valida” apenas num sentido limitado, ou deixou de ser valida como um todo. Para o jurista uma autoridade é valida ou nao; para o socidlogo nio existe tal escolha. Antes, ha uma transig&o gradual entre os dois extremos de validade © niio-validade, sendo possivel que sistemas mutuamente contraditérios de autoridades coexistam validamente. Cada um € valido exatamente na proporgio da probabilidade de que a agdo seja realmente orientada para ele. Os que esto familiarizados com esta literatura lembra- rao 0 papel desempenhado pelo conceito de autoridade no trabalho de R. Staemmler, o qual, embora seja brilhante, mostra-se, no entanto, equivocado e confunde os problemas de maneira desastrosa (ver meus comentérios do prefiicio). Staemmler nao falha ao distinguir entre o sign normativo € © empitico da validade, mas tampouco entende que a conduta social nao se orienta apenas por autoridade. Acima de tudo, cle trata a autoridade, de modo completa- mente ilégico, como uma forma de conduta social e tenta relaciond-la ao “contetido”, de uma maneira andloga ao de forma e contetido na teoria do conhecimento, para nio men- cionar outros erros. Na verdade a aco, que € primariamente econdmica, por exemplo, orienta-se pelo conceito da relativa escassez de certos meios dispontveis para a satisfugtio de necessidades, em relacio a conduta considerada do individuo © A agio presente © provavel de outros, na medida em que estes dependem dos mesmos recursos. Est4 claro que tal conduta, além disso, é orientada em sua escolha de procedi- mentos econdmicos pelas regras convencionais e legais re- conhecidas como vilidas, ou cuja violagao, como se sabe, provocaria certas reagdes de outras pessoas. Staemmler conseguiu confundir este assunto empirico simples, sobretudo por afirmar que uma relagiio causal entre autoridade e agio social empirica é uma impossibilidade con. ceitual. £ yerdade, esta claro, que entre a validade normativa, dogmitico-juridica de uma autoridade e qualquer fato empiri- co nao hé realmente nenhuma relagio causal a ser encontrada, Neste contexto destaca-se apenas a questio de se a autoridade como corretamente interpretada, no sentido legal, “aplica-se” também a este fato empirico. A questdo € se deveria ser trata- do como “vélido” num sentido normativo e, se isso Fosse ver~ dade, qual deveria ser 0 contetido de suas. prescrigdes normativas. Entretanto, entre a probabilidade de uma conduta social orientada para a crenga subjetiva na validade da autori- dade e a agio economicamente orientada existe, esti claro, relago causal. Mas para os propésitos sociolégicos exata- mente uma tal probabilidade de orientag3o em fungio de uma crenga subjetiva na validade de uma autoridade que constitui a autoridade valida em si. CAPITULO 6 TIPOS DE AUTORIDADE LEGITIMA: CONVENCAO, LEL A legitimidade da autoridade pode ser garantida das seguintes maneiras: I. Em uma base puramente subjetiva, ou seja, que se deve a: 1) aceitagio meramente afetiva ou emocional; 2) provir de uma crenga racional na validade absoluta da auto- ridade como uma expressio de valores tiltimos obrigat6rios, sejam éticos, estéticos ou de qualquer outro tipo; 3) originar- se em atitudes religiosas, isto 6, guiada pela crenga de que a salvagio depende da obediéncia 2 autoridade. Il. A legitimidade da autoridade pode ser garantida também pelo interesse proprio, na expectativa de conseqlién: cias espeefficas de uma espécie particular. Um sistema de autoridade podera parecer: a) conven- cional, quando sua validade for externamente garantida pela probabilidade de que qualquer desvio dentro de um grupo social definido sera tratado com uma desaprovagio relativa- mente geral e significativamente percepttvel; b) um tal sis- tema de autoridade sera considerado Je? se for externamente garantido pela probabilidade de que um comportamento no costumeiro serd tratado com sangdes fisicas com a finalidade de tornar a conformidade obrigat6ria ou de punir a desobediéncia, sendo ministradas por um grupo de homens providos de autoridade especial para este propdsito (Sobre o conceito de convengio, ver: Ihering, op. cit; Wei gelin, op. cit,, ¢ Die Sitte, de F. Yoennies, 1909) 58. MAX Wi R 1. 0 termo “convengio” seré usado para designar a par te do costume que, dentro de um dado grupo social, é apro- vada como valida e garantida contra violagdes por sancdes de desaprovagao. Difere da lei, como definida aqui, para auséncia de um grupo com a fungio espeeifica de coergiio. A distingao de Staemmler entre convengao ¢ lei que depende de submissio voluntéria nao corresponce nem ao uso lingifsti- ¢o comum, nem esté de acordo com sua propria ilustragio. A conformidade com a convengio em assuntos tais como as formas gerais de cumprimento, 0 vestir-se decentemente, e varias regras que governam 0 intercmbio social, tanto na forma quanto no contetido, cria a expectativa de que o indi- viduo a leve a sério e a considere obrigat6ria, xo contrétio da escolha da maneira de cozinhar, onde pode haver liberdade de aceitar ou rejeitar o uso comum, Por exemplo uma viola- 0 convengiio da ética profissional frequentemente recebe a mais séria e efetiva retribuigdo na forma de ostracismo social, podendo ser ainda mais efetiva que a sangdo legal. Falta meramente o grupo cuja fungio especifica é a de man- tera lei e a ordem, com integrantes tais como juizes, promo- lores, oficiais administrativos e carrascos. Entretanto, nao existe aqui nenhuma linha diviséria clara a ser encontrada. O caso marginal de uma garantia convencional de uma autori- dade no proceso de transi¢ao para uma garantia legal da autoridade deve ser encontrado na aplicagao do “boicote” formalmente ameagado e organizado. Mas em nossa termi- nologia isto j4 constitui um meio de coergao legal. F irrele- vante no presente contexto que, em certas circunstancias, uma convengio possa, somando-se a mera desaprovagio, ser também protegida por outros meios, como por exemplo no caso do dono de uma residéncia que expulsa o visitante cuja conduta niio Ihe parece convencional. O que € decisivo neste caso € que um tinico individuo, em virtude de uma conven- eo destespeitada, aplica estas sangdes — freqiientemente muito drasticas — niio como um membro de um grupo orga- CONCEETOS BASICOS DE SOCK 59. nizado provido de uma autoridade especffica, mas meramen- te com base em sua propria autoridade. 2. Em nosso contexto, 0 conceito de lei sera definido em termos da existéncia de um agente especial de coercio, Em outros contextos definigdes diferentes podem muito bem set apropriadas. O cardter desta ag€ncia de coergdo nao pre- cisa, esté claro, ser semelhante 20 que estamos familiariza dos hoje. Em particular, nao € preciso que haja qualquer 6rgio judicial. Assim, no caso de uma rixa de sangue, 0 cla torna-se um tal agente de coergdio, contanto que sua agzio em lais situagGes seja governada de fato por algum conjunto de regras, Porém, este é um caso extremo que apenas por pouco pode ser considerado “coergiio legal”. Sabe-se muito bem que € lei internacional tem sido negada sempre a qualidade de lei precisamente porque carece de um agente de coergio supranacional superior. Na verdade, nos termos de nossa definigao, isto seria certamente verdadeiro quanto a um sis- tema de autoridade cuja legitimidade se baseia inteiramente na expectativa de desaprovagao ¢ represélia por parte daque- les que sto prejudicados por sua violacto, ou seja, quando a conduta 6 garantida inteiramente pela convengao e conveni éncia, ao invés de um agente especifico de imposigiio. Mas para 0s propésitos da terminologia legal 0 uso oposto pode- ria muito bem ser aceitvel Em qualquer caso, os meios coercitivos sto eficientes, ainda quando impréprios no sentido legal. Mesmo a “persua- sio amigivel”, que pode ser encontrada em virias seitas reli- giosas como uma forma de pressio suave sobre os pecadores, constitui coerg’o em nosso sentido, se for efetuada de acordo com as regras ¢ por um grupo especialmente designado. Isto também é verdade para o uso de censura como um meio para impor normas de conduta moral e ainda mais para a coercio psiquica exercida como um meio disciplinar da Igreja. Daqui em diante, a lei pode ser garantida por uma autoridade eclesi- 60 MAX. {stica, bem como politica, e pode ser garantida pelos estatutos de uma associagao ou através de autoridade do chefe da fami- lia. As regras de organizagio fraterna sio leis, em nosso senti- do, tanto quanto os deveres legalmente regulamentados, mas que no podem ser imposios, mencionados no Artigo 888, item 2 do Cédigo Civil Alemao. As leges imperfectae e a ca- tegoria das obrigagdes naturais so formas de terminologia egal que expressam indiretamente os limites ou condigdes para o uso da coergao juridica. Uma norma de convivio hu- mano imposta forgosamente, mesmo assim € lei (Ver 0 § 157, 242, do Cédigo Civil Alemao — Buergerliches Gesetz: buch — sobre 0 conceito de obrigagbes na lei comum, isto 6, obrigagdes que surgem de padres comunitérios de compor tamento aceitével, abtendo, desta maneira, sango legal. Ver também 0 artigo de Max Rumelin, Schwaebische Heimats- gabe fuer Theodor Haering, 1918). 3. Nem toda autoridade valida é necessariamente de um cariter geral abstrato. A distingao entre um preceito legal € uma decisio judicial nem sempre, nem em toda parte, tem sido to clara quanto temos chegado a esperar hoje em dia. Assim, a autoridade pode surgir simplesmente tendo como base a autoridade que governa, numa Gnica situagio concre- ta. Os pormenores deste assunto constituem a preocupagao da sociologia do direito. Mas para os nossos propésitos a distingio moderna entre um preceito legal © uma decisio especifica serd tomada como certa, a nio ser nos casos em que se indique 0 contrério. 4, Um sistema de autoridade que € garantido por san- Ges externas também pode tornar-se internalizado, O rela- cionamento entre lei, convenciio € ética nio apresenta quaisquer problemas para 0 socidlogo. Este considera um padrio como “ético” se pessoas Ihe atribuem um tipo espect- fico de valor que reivindicam como bom eticamente, exata- mente como qualquer conduta considerada como bela, pode CONCEITOS BASICOS DE SOK ser medida por padrdes estéticos. Idéias eticamente normati- vas desta espécie podem ter uma poderosa influéncia sobre a conduta, mesmo que Ihes falte qualquer garantia externa. te € freqtientemente 0 caso quando a violagio de tais pa- drdes nao afeta os interesses dos outros. 5, Por outro lado, tais padrdes éticos também so fre- qiientemente sancionados pelas crengas religiosas. Contudo, também podem ser mantidos pelo boicote, ou por meios le- gais tais como a ago da policia e as sangdes aplicadas pelo direito civil ¢ criminal. Todo sistema ético realmente vilido sociologicamente, provavelmente fundamentar-se~4 na con- vengilo, ou seja, na probabilidade de desaprovagio generali- zada que se segue A sua violagdo. Entretanto, nem toda norma convencional ou legalmente sancionada reclama ser ética, Normas legais sao frequentemente motivadas pela me- ra conveniéncia e assim podem reivindicar menos ainda um carditer ético que as normas convencionais, Se uma autorida- de normativa aceita socialmente pertence ou nio ao campo da ética ou é mera convencdo ou lei, isto pode ser decidido empiricamente em termos do que é realmente sentido como tico” pelo grupo observado em pesquisa. Mas nao é possi- vel estabelecer qualquer generalizagdo a este respeito. CAPITULO 7 A VALIDADE DA AUTORIDADE LEGITIMA: TRADICAO, FE, LEI Um sistema de autoridade pode legitimamente assumir validade aos olhos daqueles que Ihe estio sujeitos de uma variedade de maneiras: a) pela tradico: aqui o que sempre existiu € valido; b) em virtude de ligacdo emocional, legitimando a va- lidade do que foi hd pouco revelado ou que considera di de imitagao; c) em virtude de uma crenga racional no seu valor ab- soluto: 0 que tem sido revelado como sendo absolutamente valido é vélido; dd) por ter sido instituido modo positive, sua legalidade n de questo. Tal legali- dade pode ser considerada como legitima: 1) porque tem sido aceita voluntariamente por todos 0s envolvidos; 2) porque tem sido imposta com base no que se mantém como a autoridade jgumas pessoas sobre outras €, portanto, exercita o correspondente a sua obediéncia, Todos os outros pormenores, exceto por uns poucos conceitos outros que precisam de definigio, serdo discutidos a seguir, na sociologia do direito € na sociologia do poder. Por enquanto os seguintes breves comentérios serio suficientes, sendo reeonhecida como estando a uma reivindi 1. A legitimidade da autoridade mais antiga e mais uni- versalmente mantida baseia-se no carter sagrado da tradi- gio. O temor de penalidades mégicas fortalece as inibigdes psicolégicas a respeito das muddangas nos modos costumeiros Se 64 ax weer de conduta, Ao mesmo tempo um sistema de autoridade con- tinua vilido por causa dos muitos interesses empenhados que se levantam com respeito a sua perpetuagio. 2. Criagdes conscientes de autoridades novas formam, originalmente, quase inteiramente, o resultado de ordculos proféticos ou, a menos, de revelagdes que gozam da auréola da profecia, como é verdade até para os estatutos dos Aisim- netes Helénicos. A aquiescéncia dependia entio da fé na legitimidade do profeta, Em perfodos de rigoroso tradiciona. lismo nenhum sistema novo de autoridade podia surgir as- sim, sem que se proclamassem revelagdes novas, a que 0 sistema novo de autoridade nilo fosse considerado re- almente novo mas fosse considerado, ao invés, como uma verdade que ja houvesse sido vélida mas que fora temporari- amente obscurecida e que estivesse sendo agora restaurada em seu lugar de direito, 10 ser 3. O arquétipo da legitimidade absolutamente referente a valores € encontrado na idéia do “direito natural”. A influ- éncia de seus preceitos logicamente desenvolvidos sobre a conduta real pode nem sempre estar de acordo com as suas pretensdes ideais, mas ela ¢ inegdvel. Estes preceitos devem, Portanto, ser claramente distinguidos dos da lei revelad: decretada, ou tradicional. 4. Hoje, a forma mais comum de legitimidade € a cren- a na legalidade, ou seja, a aquiescéncia aos decretos que sio formalmente corretos € que tém sido impostos por um procedimento costumeiro, O contraste entre regras voluntari- amente accitas ¢ aquelas que tém sido impostas de fora & rigorosamente relativo. No passado, para uma autoridade ser tratada como legitima era freqiientemente necessirio que fosse aceita unanimemente. Hoje, entretanto, acontece fre- qUentemente que uma autoridade seja aceita por uma maioria dos membros de um grupo enquanto a minoria, que sustenta 65. CONCEITOS BASICO opinides diferentes, apenas se submete, Em tais casos a auto- ridade € realmente imposta pela maioria sobre a minoria. Muito freqtiente é também o caso de uma minoria violenta, brutal ou simplesmente enérgica que imponha uma autorida- de que eventualmente venha a ser considerada como legitima por aqueles que originariamente a ela se opuseram. Onde 0 voto é 0 método legal de criar ou de mudar um sistema de autoridade, acontece freqiientemente que vontades minorité- rias obtenham uma maioria formal & qual a maioria real se submete: neste caso, 0 “governo da maioria” é apenas apa- réncia, A crenca num sistema contratual de autoridade pode ser tragada até tempos bem antigos e pode também ser en- contrada entre os assim chamados povos primitives, mas em tais casos quase sempre esté suplementada pela autoridade de orculos. 5. A aceitagdo de uma autoridade imposta por um ho- mem qualquer ou por varios, até onde nao dependa de mero medo ou derive de motivos de conyeniéncia, sempre pressu: Oe uma crenga na autoridade legitima da fonte que a impée. 6. Como regra, a aceitagio de uma autoridade € quase invariavelmente determinada por uma combinagdo de moti- Vos, tais como o interesse prdprio, ou uma mistura composta de aderéncia & tradigo e uma crenca na legalidade, a niio ser em um caso de prineipios inteiramente novos. Muito fre glientemente aqueles que concordam assim com a autoridade no esto sequer conscientes de se o fazem por costume, convengao ou lei. Torna-se, entio, tarefa do sociGlogo anali- sar aquela base de validade que seja mais tipica. CAPITULO 8 O CONCEITO DE LUTA Uma relacdo social sera chamada de luta, na medida em que a ago de um partido for orientada propositadamente a fim de satisfazer a vontade propria, prevalecendo contra a resisténcia de outros partidos ou de um outro partido. Se os meios de uma tal luta no consistem na violéncia fisica real, entao 0 processo € de luta “pacifica”. Esta luta “pacifica” sera chamada de “competigao” se for uma tentativa formal- mente pacifica de obter o controle de oportunidades © vanta- gens também cobigadas por outros. Uma competicao ser conhecida como “competigao controlada” se seus meios ¢ fins estiverem sujeitos & mesma autoridade, Esta luta social ou individual, freqientemente latente, por vantagens e pela sobrevivéncia, sem basear-se necessariamente em um confli- to de interesses, sera chamada de “seleczio”. Na medida em que é uma questiio das oportunidades relativas de individuos durante seu proprio periodo de vida, é uma forma de “scle- Gio social”; na medida em que concerne a probabilidade va- ridvel da sobrevivéncia de caracteristicas herdadas, é uma forma de “selecdo biolégica” 1, Existe uma grande variedade de estgios intermedia- rios, indo do combate sangrento nao reprimido por quaisquer regras ¢ tendo como meta a completa aniquilagao do inimi- 20, até 0s tomeios convencionalmente regulamentados na Idade Média (ver 9 chamado cléssico do arauto antes da bata- tha de Fontenay: “Messieurs les Anglais, tirez les premiers!”), bem como as regras do jogo que governam rigorosamente 68 MAX WEnER um esporte, Outros exemplos de tais transigdes slo a compe- tigdo erética irrestrita dos pretendentes aos favores de uma ama, a competigiio econémica regida pelas leis do mercado, ou as competigdes rigorosamente regulamentadas pelos pré mios artisticos, ¢ finalmente a vitéria ganha duramente na campanha eleitoral, A diferenciagSo conceitual de luta vio- lenta, fisica, € justificada pela singularidade dos meios nor- malmente usados e as cormespondentes peculiaridades das conseqiléncias sociolégicas de seu uso. 2. Todas as formas de luta ¢ todas as maneiras de com- petigio que ocorrem tipicamente em grande escala levario, independentemente da intervencio possfvel do acaso, a uma selegdo de todos aqueles que possuem num grau mais alto as qualidades pessoais importantes para o sucesso. A natureza destas qualidades é determinada pelas condigdes de luta ou competicio que incluem, além de qualquer e toda qualidade individual ou das massas imagindveis, também as dos siste- mas de autoridade de acordo aos quais 0 comportamento dos individuos se orienta, em virtude da tradigio, f€ ou conveni- éncia. Assim, qualidades necessérias podem ser a forca fisi ca, a falta de eserdipulos, 0 nivel de habilidade mental, a poténcia dos pulmées ou técnica demagégica, maior lealdade aos superiores ou técnica demagégica, maior originalidade criativa ao invés de adaptabilidade social; em suma, aquelas qualidades que sejam necessérias, quer extraordinérias, quer mediocres. Qualquer tipo de autoridade influencia de modo diverso as oportunidades para a sclego social. Nem todo proceso de selegao social € uma “luta” no sentido aqui admitido. De imediato, a “selegao social” signi- fica apenas: que certos tipos de conduta e, eventualmente, de qualidades pessoais, tém mais probabilidade de entrar em uma determinada relagdo social; por exemplo, na relagao de amante, marido, deputado, servidor pablico, diretor geral homem de negécios de sucesso etc. Se esta vantagem social CONCEITOS BASICOS DE SOCIOLOGIA 6 foi ou nao conseguida através de “luta” no se pode discer- nir. No proceso de selecao social, nem é possfvel determi: nar se afeta as oportunidades biolégicas de sobrevivéncia de uma maneira ou de outra Apenas onde existe uma competigao verdadeira é que 0 termo “Iuta” se aplica, A experiéncia mostra que apenas a uta é inevitavel no sentido de selecdo © somente no sentido de selecao biolégica ela 6 inevitavel, em principio. A selegao € ctemna precisamente porque parece nao existir qualquer meio que possa remové-la completamente. Mesmo para um sistema de autoridade rigorosamente pacifista € possivel ape- has regulamentar os meios, diregdes e objetivos de luta, li- dando apenas com cada tipo separadamente. Isto significa que ha outras maneiras de lutar em dirego a vit6ria, desde que 0 proceso de competicao permaneca aberto. Mas mesmo se supuséssemos, utopicamente, que a competigtio pudesse ser completamente eliminada, tais condigdes, enquanto prevale- cessem, Jevariam ainda a um proceso latente de selegao, seja bioldgico ou social, e que favoreceria os tipos melhor adapta- dos estas condigGes, indiferentemente as qualidades ambi- entais ou hereditarias. A selegdo social, empiricamente, ¢ a selegio bioldgica, em principio, agem como obsticulos completa eliminagdo da luta. 3. A luta e 0 proceso de selegiio que ocorrem nas rela- ges sociais devem ser distinguidos, naturalmente, da luta do individuo pela sobrevivencia ¢ sucesso. Apenas num sentido metafSrico podem estes conceitos ser aplicados a relagdes sociais, pois as relages existem apenas como ages huma- nas com sentidos subjetivos particulares. Portanto, um pro: cesso de selegio ou luta entre elas significa que um tipo especifico de agao esti sendo deslocada por outra, seja ago da mesma pessoa ou de outras pessoas. Isto pode ocorrer de Varias maneiras. A aco humana pode ter como fim, primei ro, a allteragdo consciente de certas relacdes sociais ou a pi vengiio do seu aparecimento ou perpetuagaio; por exemplo, um “Estado” pode ser destrufdo por guerra ou revolucdo, por uma conspiracao, por uma represstio sangrenta; 0 concubina- to por uma medida policial; a pritica de usura nos negécios através da falta de protegio legal e através da imposigéo de penalidades. Ainda, as relagdes sociais podem ser influenci- adas pelo tratamento deliberadamente favorecido de um gru Po social sobre outro. Tais fins podem ser perseguidos por individuos ou por grupos organizados. Secundariamente, também pode ocorrer que 0 curso da aedo social, como pro- duto colateral, nao intencional, leve a que certas relagdes Sociais concretas diminuam progressivamente suas probabi- lidades de continuar ou de serem criadas novamente, ‘Todas as mudangas de condigdes naturais e sociais tém aleuma es- Pécie de efeito sobre as probabilidades de sobrevivéncia das relagdes sociais. Qualquer um é livre para considerar tais €as0s como um processo de “selego”. Um exemplo seria dizer que entre varios Estados o “mais forte”, no sentido de ser o mais “adaptdvel”, emergira vitorioso. Mas deveriamos lembrar que, esta selegao assim chamada ndo tem nada a ver com a selegiio de tipos humanos no sentido social ou biolé- gico; em cada caso ser necessério inquirir as causas que tém levado a uma mudanca nas probabilidades de sobrevivéncia ou destruigao de uma outra forma de ago ou de relagao so- cial. A explicagiio de tais processos causais envolve tantas facetas que pareceria sabedoria nao abranger a todos com um termo Gnico; de outra maneira corremos o perigo de introdu- Zit jufzos de valor nao-criticos nas investigagées empiricas corremos 0 risco de generalizar um caso particular que se bascia meramente em circunstincias “acidentais". Este tipo de argumento tem, infelizmente, se tomado cada vez mais fregtiemte nos anos recentes. © fato de que uma dada relagao social tenha sido eliminada por razdes caracteristicas apenas de uma situaciio particular, nao nos diz nada, afinal, sobre 0 valor de “sobrevivéncia” de uma tal relacao. CAPITULO 9 COMUNIDADE E SOCIEDADE DAS RELACOES SOCIAIS Chamamos de comunidade a uma relagdo social na medida em que a orientaco da ago social — seja no caso individual, na média ou no tipo ideal — baseia-se em um sentido de solidariedade: 0 resultado de ligaces emocionais ou tradicionais dos participantes. A relagdo social de socie- dade, por outro lado, é o resultado de uma reconciliagao e de um equilibrio de interesses motivados por juizos racionais, quer de valores, quer de fins. Tipicamente, a sociedade pode, mas nfo precisa, fundamentar-se em um acordo racional a que se chegou por consentimento miituo, Neste caso a acio racional seré orientada por valores, ou seja, baseada na fé da validade compuls6ria da obrigagao de aderir a ela, ou sera orientada por fins, na expectativa da lealdade da outra parte 1. Esta terminologia lembra a diferenga feita por F. To- ennies em sua obra pioneita Gemeinschaft und Gesellschaft, Entretanto, para os propésitos de sua investigagao, ele deu a esta distingtio um significado mais especifico do que seria conveniente para os propésitos da presente discussao. Os tipos mais puros de sociedade podem ser encontrados: a) na natureza rigorosamente conveniente do intercimbio do mer- cado livre: geralmente um comprometimento de interesses ‘opostos, mas complementar; b) na unio puramente voluntiia bhaseada no interesse proprio, cuja meta é a promogio dos inte- esses materiais especificos (por exemplo, econdmicos) de seus membros: ¢ c) na unido voluntéria baseada em valores AX WEBER ideol6gicos absolutos — por exemplo, uma seita racionalmen- te orientads que despreza interesses emocionais ou afetivos, mas se devota apenas a uma “causa” (0 que certamente, em seu tipo puro, ocorre somente em casos excepcionais). 2. A comumidade pode baseat-se em qualquer espécie de ligagdo emocional, afetiva ou tradicional: por exemplo uma irmandade espiritual, um relacionamento erético, uma relagdo de lealdade pessoal, uma heranga nacional, ou o companheirismo de uma unidade militar. Este tipo € encon- trado mais convenientemente na relagao familiar. E claro que a grande maioria dos relacionamentos sociais compartilham tanto da comunidade, quanto da sociedade. Nao importa quo convenientes e sdbrias possam ser as consideracdes predom 10 — por exemplo, a do fregués com 0 balconista — ela estard aberta & introduco de valores emocionais que se estendem além da mera utilidade arbitra- ria. Toda relagio social que vai além da busca de fins co- muns imediatamente atingiveis envolve um grau relativo de permanéncia entre as mesmas pessoas ¢ tais relagbes niio podem ser limitadas a atividades de uma natureza puramente a tal tendéncia pode ser observada no caso de uma sociedade dentro da mesma unidade militar ou na mes- ma classe na escola, ou no mesmo escritério ou loja, embora a intensidade das afeigdes desenvolvidas varie considera- velmente. De modo inverso, é possfvel que uma relac cial de carter primariamente comunal manifeste um tipo de comportamento por parte dos seus membros que seja, intei- ramente ou em parte, motivado por fins racionalmente deli- mitados. Por exemplo, grandes diferengas podem ser encontradas na extensio em que os membros de um grupo familiar sentem uma comunhao genuina de interesses ou, 20 invés, exploram o seu status como “unidade social” para fins puramente pessoais. O conceito de comunidade & mantido nantes em uma rela técnica, Ui 0 §0- CONCEITOS BASICOS DE SOCIOLOGIA 2B aqui deliberadamente vago e conseqiientemente inclui_um grupo muito heterogéneo de fendmenos. 3. A comunidade 6, no sentido usado aqui, normalmen- te 0 oposto direto de “uta”. Nilo devemos permitir, entretan- to, que isto nos engane a ponto de pensarmos que a coer¢io real ndo possa ser encontrada normalmente mesmo nas rela- Ges comunais mais intimas, submetendo-se uns a outros; e dio de tipos, levando a dife- rencas de oportunidades € sobrevivéneia, nao continue den- tro destas relagdes, como o faz por toda parte. A sociedade, por outro lado, representa meramente a reconciliagio de inte. esses competitivos, em cujo caso somente uma parte do objetivo ou dos meios de luta sio eliminados (ou 20 menos se faz a tentativa de uma tal climinaco), mas 0 conflito real de interesses com a correspondente competigao por oportu- nidades nao se altera. Luta e comunidade sao conceitos rela- tivos; uma luta pode tomar varias formas, dependendo dos meios usados, pacificos ou violentos, ¢ o grau de brutalidade com que so empregados. Como afirmamos antes, qualquer tipo de autoridade governando a agao social deixa espaco para 0 processo ideal de seleco na competi¢io entre varios tipos humanos rivais. também que 0 proceso de sele 4. Nao é de nenhum modo verdadeiro que a participa- do em qualidades comuns, numa situagao comum ou de modos comuns de comportamento implicam na existéncia de uma comunidade. Por exemplo, a posse de caracterfsticas bioldgicas comuns herdadas e adequadas ao estabelecimento de distingdes raciais para certas pessoas no implica de qual- quer maneira em uma comunidade entre elas. Por restrigées sobre seu direito ao comércio ou casamento tais pessoas po- dem encontrar-se na mesma situagao, ou seja, isoladas do mpoe tais restrigdes. Porém, mesmo se todos reagirem a esta situagio da mesma maneira, isto ndo constitui uma comunidade criada por um “sentimen- seu ambiente costumeiro que 74 MAN WEBER _ to” meramente comum a respeito da situagHo e de suas con- sequléncias. E apenas quando este sentimento leva & orienta- gio mitua de sua aco reciprocamente referida, que a comunidade surge entre eles. Isto é especialmente verdadeiro para os judeus que, com excecio de alguns sionistas e das atividades de algumas organizagdes de juros especificamente judaicas, experimentam apenas um sentimento relativamente pequeno de comunidade; de fato, os judeus freqientemente repudiam a existéncia de uma comunidade judaica. Uma comunidade de linguagem como um resultado de uma semelhanga de tradigao através da familia e ambiente social envolvente facilita 0 entendimento miituo e promove, portanto, no grau mais alto, toda espécie de relagao social Por si a linguagem nio é suficiente para constituir uma co- munidade, mas meramente facilita a comunicagio entre os grupos envolvidos e, portanto, possibilita relagdes de socie~ dade. Ela faz isto através do contato entre individuos, nao porque falem a mesma lingua, mas porque compartilham outros tipos de interesses. Uma orientagio para as regras de uma Ifngua comum é primariamente itil como meio de co- municagéo, mas no suficiente para prover a substincia da relacio social. E apenas com o surgimento de diferencas conscientes, em relago a terceiros, que o fato de dois indivi- duos falarem a mesma Ifngua e compartilharem de uma situ- ago comum pode levé-los a experimentar um sentimento de comunidade e a criar modos de organizagio social conscien- temente baseaclos na participagio de uma lingua comum. A participagaio num mercado é ainda de um tipo dife- rente. Ela encoraja sociedades entre individuos diferentes ao engajarem-se em atos especificos de intercimbio e numa relacao social, especialmente a de competicao, entre os pro- vaveis compradores, cujo comportamento deve ser mutua- mente orientado. Além disto, podemos falar de sociedade apenas na medida em que alguns participantes individuais entram em acordos de maneira a perseguir suas vantagens numa guerra de pregos, ou a assegurar e regulamentar todas as transagdes sob condigdes favoriveis a eles apenas. De fato, 0 mercado livre e a economi itiva, nela base da, formam 0 tipo mais importante da influéncia reciproca de ago em termos do puro interesse proprio, nao tipico das economias modernas. CAPITULO 10 RELACOES SOCIAIS ABERTAS E FECHADAS Uma relagdo social, independente de ser uma comuni dade ou sociedade, seré chamada de “abert sempre que a participagio na ago social mutuamente orien tada, relevante em seu sentido subjetivo, nao for negada pe- las regulamentagdes que regem esta relagZo a qualquer um que esteja inclinado e esteja de fato em condigao de nela participar. A relago seri chamada de “fechada” ao exterior por outro lado, sempre e quando devido ao sentido da ago e As regulamentagdes que a regem, a participagio de certas pessoas for excluida, limitada, ou sujeita a condigdes. O ca- réter aberto ou fechado de uma relago social pode depender da tradigZo ou de atitudes afetivas, ou condicionado racional: mente por valores ou fins. E mais provavel que seja fechado por razGes racionais nas seguintes situagdes: uma relagio social pode prover aos participantes a oportunidade de satis- fazer muitos interesses diversos, sejam satisfacdes espirituais ou materiais, seja participando pelo fim ou pelos seus resul tados, através da cooperago ou da conciliagao de interesses. Se os participantes, através da admissao de estranhos, espe- ram chegar a uma methora de sua situagio no grau, na espé- cie, na si m manter a relacio aberta. Se, inversamente, estiverem inte- ressados em melhorar’sua posigo através de préticas mono- polistas tenderdo a favorecer uma relacaio fechada. * a0 exterior guranga ou no valor da satisfago, terdo interesse MAX WEBER Uma relaco social fechada é capaz de garantir proba- bilidades monopolizadas a seus membros através de: a) competi¢do livremente desenvolvida dentro do grupo; b) regulamentago ou racionamento de tais probabilidades: ¢) sua apropriagdo por individuos ou pequenos grupos numa base permanente, em cujo caso se torna mais ou menos inali- endveis. Este altimo caso é um fechamento por dentro, bem como um fechamento contra estranhos. Tais probabilidades apropriadas sero chamadas de “direitos”. Em harmonia com © sistema predominante de autoridade, a apropriagao destes direitos pode ser estendida para o beneficio de todos os membros de comunidades ou sociedades (por exemplo, uma comunidade doméstica) ou para o beneficio de individu Neste tiltimo caso, tais direitos sio desfrutados pelo indivi- duo numa base puramente pessoal, ou de tal maneira que no caso de sua morte uma ou mais pessoas relacionadas com o mantenedor do direito por nascimento (parentesco), ou por alguma outra relagio social, pode herdar os direitos em ques- to. Estes direitos podem passar ainda a um ou mais indivi- duos especificamente designados pelo mantenedor original. Finalmente, pode ser que 0 mantenedor original esteja mais ou menos capacitado a alienar os seus direitos voluntaria- mente a outros individuos ou a qualquer um que escolher. Isto se conhece como apropriagao aliendvel. participante ativo de uma relago social fechada sera chamado de um membro; mas se a participagao for regula- mentada de tal maneira a garantir-Ihe vantagens apropriadas, ele seri chamado de membro legal com direitos e privilégios. Vantagens apropriadas, que sio desfrutadas pelos individuos através da hereditariedade ou por grupos hereditarios, serio chamadas de “propriedades” do individuo ou do grupo em questio; até onde sio “aliendveis’ ivres”. A definigao aparentemente sa" destes conceitos constit um exemplo de que 0 fato “evidente por si” raramen- te é pensado com clareza, pela prépria razao de parecer dbvio 1, a) Comunidades fechadas em virtude da tradigio so, por exemplo, aquelas em que a participagao se funda em lagos de familia; b) RelagGes pessoais de uma natureza emocional, por exemplo, aquelas baseadas no amor ou na lealdade, sio geralmente fechadas de modo efetivo; ‘ ©) 0 fechamento relacionado 20 valor 6 geralmente caracterfstico de um grupo que compartilha um sistema de ctengas religiosas comuns; d) O fechamento orientado a f Bes econdmicas de um cardter monopolista ou plutocritico. Aqui esttio alguns poucos exemplos escolhidos ao aca- so. O cariiter aberto ou fechado das comunicag6es verbais depende de seu contetido; assim, a conversagao geral tende a ser aberta, enquanto um coléquio intimo ou tuma conversa de negécios tendem a ser fechados. Relagdes de mercado sio geralmente, 20 menos no comeco, de uma natureza aberta Em numerosos casos de comunidade ¢ sociedade podemos observar uma oscilaco entre as caracteristicas de fechamen- to e abertura; por exemplo, no caso das guildas e das cida des-Estados democriticas da Antigilidade e da Idade Média, havia uma tendéncia, ds vezes, de aumentar seus membros no interesse de melhorar a seguranga de sua posigao de po- det, enquanto em outras épocas, se restringiam os membros para proteger o valor de sua posigao monopolista. O mesmo. fendmeno no é incomum nas ordens monisticas e seitas religiosas que tem mudado de um estigio de proselitismo religioso para um de hermetismo, seja no interesse de manter tum padriio ético alto ou para a protecao dos beneficios mate riais. A expansio das relagdes de mercado, tendo como fim uma maior movimentagao de dinheiro ou sua contratagio para priticas monopolistas, é um caso semelhante. A promo cdo da uniformidade lingiifstica € hoje um resultado natural dos interesses de publicagdes e de escritos e pode contrastar BD state sen a IR races com a tendéncia mais primitiva, nao incomum, de certas classes manterem peculiaridades lingiifsticas ou recorrerem mesmo a linguagens secretas. 2. Tanto a extensio quanto o método da regulamenta- Gio e a exclusio de estranhos podem variar enormemente, de modo que a transi¢iio de uma condicdo aberta para uma reg lamentada ou fechada € gradual. Varios requisitos para ad- missdio podem ser propostos: provas de admissio e periodos $es, a elei¢io de novos membros por voto, a elegibilidade baseada na ancestralidade ou em virtude do desempenho, ¢ no caso de restrigio dirigida internamente sobre a apropria- Go de direitos dentro do grupo, 0 starus pode depender da aquisigaio de um tal direito apropriado. Qualquer quantidade de variedades de fechamento ou de condigdes para admissio pode ser encontrada. Assim, a regulamentaco co hermetis- mo sfio conceitos relativos. Hii toda espécie de estigios in- termedidrios, indo do clube exclusivo & audiéncia do teatro, cujos membros tém bilhetes comprados, a0 comicio de um partido em campanha, que esti abeto a0 maior niimeto pos sivel de pessoas; semelhantemente, de um culto de igreja aberto ao piiblico através dos rituais, a uma s 205 mistérios de um culto secreto. 3, Restrigdes dentro do grupo — como entre membros € em suas relagdes recfprocas — podem assumir também as formas mais diversas, Por exemplo, uma casta, guilda, ou uma associagio de corretores de bolsa fechada a estranhos, pode permitir a seus membros a livre competicao por todas as vantagens que 0 grupo como um todo monopoliza para sis ou pode restringir em rela¢io a membro, durante o prazo da sua vida ou numa base hereditaria, 0 gozo de certas vantagens, tais como acesso a fregueses ou a oportunidades de negécios especificos. Isto ¢ especialmente caracteristico da {ndia. Se- melhantemente, um grupo fechado de colonos pode permitir a CONCEITOS BASICOS DESOCIOLOGIA 81 seus membros 0 uso livre do solo, ou pode restringi-lo rigida- mente a uma partilha espeeffica de terra por familia. Aqui, novamente, todas as formas concebiveis transicionais ¢ in- termedidrias podem ser encontradas. Historicamente, por exemplo, a restri¢ao dentro do grupo de eventuais reivindi- cadores de um feudo, de beneficio eclesisstico e cargos, e a apropriagdo por parte daqueles que os desfrutam tém ocorri- do das mais variadas maneiras. Do mesmo modo, o estabele- cimento de direitos e a posse de determinados empregos por parte do trabalhador seguem todo um caminho, desde o im- pedimento pelo sindicato até o direito a um determinado em- prego. O surgimento dos conselhos do trabalho pode ser, embora nao precise, um primeiro passo nesta diregao, Um estagio preparativo seria a proibigio de despedir-se um ope- rério sem o consentimento dos representantes dos oper‘rios, Estes pormenores pertencem a anilise objetiva dos ca- sos individuais. A forma mais extrema dle apropriagtio per- manente existe onde direitos particulares sfio garantidos ao individuo ou a certos grupos, tais como o lar, 0 cla, ou famt- lia, de tal maneira que por lei, no caso de morte, os direitos passam a herdeiros especificos e o possuidor é livre para transferi-los a qualquer pessoa A vontade; este Ultimo torna-se assim parte da relag! 1, de modo que quando a apropria- gio alcanga o extremo dentro do grupo, ele se torna um gru- po relativamente aberto em relagio aos estranhos. Isto € verdadeiro quando a aquisi¢ao do direito de ser membro no esti ligada ao consentimento dos outros membros. 4. As principais motivagdes para uma relagio social fe- chada sao: @) a manutengio da qualidade e eventualmente do prestigio oportunidade que dele derivam, para gozar de honra e possivelmente mesmo de lucro, Exemplos deste tipo: comunidades de ascetas, ordens monisticas, especialmente as ordens mendicantes indianas, seitas religiosas como a dos puritanos, grupos organizados de veteranos, de ministros e MAX WEBER de outros burocratas, grupos organizados de cidadios como, stados gregas, ¢ guildas de artesdos; b) a falta de oportunidades em relagao as necessidades de consumo. Exemplos: os monopélios de consumo, cujo arquétipo esté na comunidade auto-suficiente de vilarejo; e c) a falta de oportunidades de sustentar a vida pelo trabalho, cujos exem- plos classicos siio a monopolizagiio do comércio pelas guil das, e outros tais como a pratica antiga de monopolizar 0 direito & pesca etc. Geralmente © motivo “a” é encontrado em conjunto com “b” ou “c”. CAPITULO 11 RESPONSABILIDADE PELA CONDUTA SOCIAL: REPRESENTACAO Uma relagio social, dependendo de se é governada por uma autoridade tradicional ou legal, pode resultar em certos tipos de aco por alguns daqueles envolvidos na relagio, ten- do, por sua vez, conseqiiéncias que afetario a conduta de ou- tros. Pode ser que todos sejam tidos como responsdveis pela conduta de qualquer deles, neste caso a condigao sera conhe- cida como “solidariedade coletiva”; ou, a conduta de certos membros individuais, os “representantes”, podem trazer obri- gagdes sobre outros, ou seja, aqueles que esto sendo “repre- sentados”, Num tal caso, os representantes sero tidos como responsiveis tanto pelo sucesso como pelo fracasso de sua conduta. O poder pleno pode ser conferido de acordo com a autoridade predominante de tal maneira que a) ele é apropria- do em todas as suas formas — isto é verdadeiro para a autoridade auténoma; b) pode ser conferido de acordo com padres espectficos, permanentemente ou por um prazo limitado — este € 0 caso da “autoridade delegada”; c) pode ser outorgado por atos especificos dos membros ou de outras pessoas, novamente de modo permanente ou por um prazo limitado, como no caso de uma nomeak Sobre a condigdo sob a qual as relagdes sociais — quer de comunidade, quer de sociedade — desenvolvem lacos de solidariedade ou representagio, pode afirmar-se 0 seguinte com algum grau de certeza: uma das condig6es mais decisi- vas 6, sem diivida, a extenso em que a ago do grupo tenha 84 MAX WEBER como 1m © conflito violento ou a troca pacffica. Adicional- mente, hd muitas circunstancias especiais que podem ser de importancia crucial mas que deverao ser discutidas apenas com maiores pormenores. Naturalmente, um tal desenvolvi- Mento € menos conspicuo em grupos que perseguem seus fins por meios puramente pacificos. O fendmeno da solidari- edade © da representagiio freqtientemente corresponde ao de fechamento aos estranhos; mas este niio é, de modo algum, sempre 0 caso. 1. A “atribuigiio” da responsabilidade pode, na prética, envolver tanto a solidariedade ativa quanto a passiva: todos 8 participantes podem. ser tidos como responsaveis pela conduta de qualquer deles, exatamente como cle proprio é, € semelhantemente, eles podem ter 0 direito de gozar de quaisquer beneficios resultantes da sua conduta, Tal respon- sabilidade pode ser atribuida a espititos ou deuses, sendo no caso de orientagdo religiosa. Também pode ser uma respon- sabilidade atribuida a seres humanos, baseada na convencdo, como é verdadeiro, por exemplo, para uma “vendetta” levada contra ou com a ajuda de membros do grupo de parentesco, ou de represalias contra os habitantes de uma cidade ou de um pais invasor; pode ser ainda uma responsabilidade atribu- ida a seres humanos baseada na lei; como ilustra a punicao formal de parentes, familiares ou membros do mesmo grupo comunal, ao invés de ou em adigdo & do ofensor real ¢ quan- do ha responsabilidade pessoal dos membros de um lar ou de uma parceria de negécios pelas dividas de cada um. A soli dariedade para com os deuses tem tido também resultados histéricos muito significativos. Assim, por exemplo, a alian- a de Israel com Jahvé, no cristianismo primitivo ¢ na comu- nidade puritana primitiva. Por outro lado, a attibuigao da solidariedade pode sig- nificar, no minimo, que os participantes de uma rel al fechada, seja por causa da autoridade tradicional ou legal, )NCEITOS BASICOS DE SOCIOLOG so tides como tendo direito legal de gozar de algum tipo de acesso a vantagens e beneficios, especialmente econdmicos, que um representante procurou; exemplos so a validade do poder exercido pela mesa de diretores de uma corporagao, ou pelo agente responsavel de uma associagaio politica ou eco- ndmica sobre recursos que, por autorizagio, devem intencio- nalmente servir ao prop6sito corporativo do grupo. 2. A situagao de solidariedade se encontra tipicamente em: a) grupos tradicionais, comunais, baseados na heredita- riedade ou em compartilhar uma vida comum: por exemplo, © lar ou 0 cla; b) relagdes fechadas que monopolizam opor- tunidades ¢ beneficios consegiientes de seu prdprio poder tipicos de grupos politicos corporativos, especialmente no passado, embora hoje existam mais marcantemente durante periodos de guerra; c) em associagées lucrativas produtoras cujos membros ainda dirigem pessoalmente o negécio, ou seja, uma sociedade mereantil; e d) sob certas circunstancias, ‘em organizagdes de trabalho, como por exemplo, um arte!’ A situacdo da representagio existe mais tipicamente em as- sociagdes devotadas a propOsitos especificos ¢ em grupos legalmente organizados, especialmente quando fundos para um propésito foram sido coletados e devem ser administra- dos segundo interesses do grupo. Hii mais explicagdes a res- peito na sociologia do direito. © poder pleno é delegado de acordo com padres especiais quando atribuido por idade ou algum outro critério semelhente. 4, Os pormenores deste assunto nao devem ser tratados de modo geral, mas devem ser analisados individualmente pelo socidlogo. O fendmeno mais antigo e mais universal nes te campo € 0 de represilia, quer na forma de vinganga, quer ‘como meio de obter reféns para evitar danos posteriores. Cooperative eoondimica operitia, especialmente na Unio Sovitiea (N, do T). O CONCEITO DE ASSOCIACAO ESEUS TIPOS O termo “associagiio” esti reservado a uma relagiio so- cial que € fechada para estranhos ou restringe sua admissio por regulamentos, ¢ cuja autoridade ¢ imposta pelas ages de individuos especificamente encarregados desta fungiio, como por exemplo, um dirigente ou chefe, geralmente incluindo um quadro administrativo. Estes funcionérios normalmente também exercerdo poderes plenos. A incumbéncia de uma posico executiva ou a participagio nas funges do quadro administrativo constituirio a “autoridade governante” ¢ po- derdo ser apropriados ou delegados de acordo com as regras obrigatérias da associacao, estabelecidas em critérios ou pro- cedimentos especificos; tal delegagio pode ser permanente, ou valida por uns tempos, ou para lidar com uma situagao de emergéncia. A acao da associacio consiste na conduta do quadro administrativo, que em virtude da sua autoridade go- vernante ou posse de poderes plenos orienta-se para a exee go dos termos de sua autoridade, e na agao dos membros da associagiio, dirigida pelo quadro administrativo. 1. Nilo faz nenhuma diferenga, para propdsitos de con- ceituago se a relagdo tem o carter de comunidade comunal ou sociedade, A presenga de uma pessoa ou de pessoas em posigdes de autoridade reconhecida sera suficiente, tal como © chefe de familia, 0 conselho de diretores, 0 executivo, principe, o presidente, ou chefe de uma igreja, cuja conduta concerne a execugiio de leis e regulamentos que governam a 88. MAX WEIMER, itério 6 d associagio, Este isivo porque ndo € meramente uma questo de conduta que se orienta para uma autoridade, mas que se ficamente de sua imposicdo. O acréscimo deste elemento aumenta o conceito de uma rela- eo social fechada sociologicamente ¢ é da maior importan- cia na pritica. Pois cada comunidade ou sociedade nao é de nenhum modo uma associag’o, como nao é por exemplo uma relagdo erética ou um grupo de parentesco, onde nao exista um sistema formalizado de autoridade. 2. Se uma associagdo “existe” ou nao, depende inteira- mente da presenca de uma pessoa com autoridade, reunido, possivelmente, um quadro administrative. Mais precisamen- te, ela existe até onde hd uma probabilidade de que certas pessoas designadas agirao de tal maneira a expressar o ver- dadeiro significado das leis que governam o grupo; em ou- tras palavras, hd pessoas que esto determinadas a agir naquele sentido e em qualquer outro, quando a ocasitio 0 exigir, O que causa tal orientagdo, seja no caso de dedicagio emocional, tradicional ou racional orientada a valores, qual- quer das quais pode estar envolvida na lealdade feudal, a um cargo ou a um servico, ou que seja devida a interesses racio- nalmente considerados como, por exemplo, um. interesse pecunidrio no respectivo salirio conceitualmente nfo teve nenhuma conseqiéncia, Falando terminologicamente, e den- tro do quadro da sociologia, a associagio nio “existe” fora da probabilidade de que um curso de ago orientado desta maneira tenha lugar. Se no ha probabilidade deste tipo de agdo por parte de um grupo particular de pessoas ou de um dado individuo, hé, terminologicamente, apenas uma relago social, mas nenhuma associag40. Mas enquanto hd a probabi- lidade de uma tal ago, a associago, como um fenémeno sociolégico, continua a existir, mesmo que possa ocorrer uma completa mudanga nos individuos espectficos cuja ago se orienta para as leis e regulamentos em questao (a maneira pela qual tentamos estabelecer esta definigio tem precisa- mente o propésito de incluir este mesmo fenémeno). 3. a) Além da ago do quadro administrativo, e do que acontece sob a sua diregio, ¢ possivel encontrar também outros casos onde a conduta dos membros tem como propé- sito garantir a observancia da autoridade. Por exemplo: con- tribuigdes ou liturgias, ou seja, servigos pessoais de toda espécie, tais como um corpo de jurados ou o servigo militar b) O sistema valid predominante de autoridade pode também incluir normas levando a esperar que a conduta dos membros da associagio seja orientacda de outras maneiras além daquelas pertinentes aos assuntos do grupo como uma unidade. Por exemplo: 0 Estado — em si uma associagaio inclui regulamentas que governam os empreendimentos pri- vados que no concernem a imposigao da autoridade legal do Estado como tal, mas & conduta que serve aos interesses pri- vados; isto é yerdadeiro para a maior parte das leis “civis”. No primeiro caso a) € possivel falar de aco orientada para a associagio; no segundo b) de ago regulada pela asso ciacao, Apenas a conduta do quadro administrative em si, bem como aquela deliberadamente dirigida por cle, pode ser chamada de “ago da associago". Exemplos de tal agio da associacdo seriam a participacao, com qualquer capacidade numa guerra mantida pelo Estado, uma petigo pelo comité executivo de uma associagaio; ou um contrato feito por uma pessoa de autoridade, cuja validade fosse considerada obri- gat6ria pelos membros e por cujas conseqiiéncias eles fos- sem tidos como responsiveis (ver capitulo 11); além disso, toda a atitude judicial, bem como administrativa, pertence a esta categoria (ver também capitulo 14, a seguir). Uma associagio pode ser auténoma ou heterogénea, e autocéfala ou heterocéfala. A autonomia significa que a auto- ridade governante do grupo foi estabelecida pelos seus pré- prios membros, através de seus préprios esforcos, opondo-se 90 MAX WEHER: 4 heteronomia, ou & imposicao de um agente externo. A au- tocefalia significa que 0 dirigente ¢ seu quadro administrati- yo agem pela autoridade de uma ordem auténoma da associagio € nao como na heterocefalia, onde estariam sujei- tos a fontes de autoridade externas. Isto é verdadeiro inde- pendentemente de quaisquer outros aspectos da relacao. Pode-se ver um exemplo de heterocefalia na nomeacao dos governadores das provincias canadenses pelo governo cen- ral do Canada. £ possivel que um grupo heterocéfalo seja autOnomo ¢ um grupo autocéfalo seja heterdnomo. Uma as- sociagio também pode, em ambos os aspectos, ser em parte uma coisa, em parte outra. Os Estados-membros do Império Alemao eram, apesar da sua autocefalia, heterdnomos dentro da esfera nacional de autoridade, mas autOnomos dentro de sua propria esfera em assuntos tais como religifio ¢ educacio. A Alsécia-Lorena enquanto estava sob jurisdigdo alema — anterior a 1918 — era autGnoma num grau limitado, mas também heterocéfala num grau limitado, pois 0 governador cra nomeado pelo imperador. Todos estes elementos podem estar presentes apenas parcialmente na mesma situacio, Uma associagio, manifestando ao mesmo tempo caracterfsticas heterdnomas bem como heterocéfalas, como por exemplo, um regimento que faz parte de um exército, é tratada melhor co- mo parte de uma associagdo mais ampla, Se este € realmente ou no o caso, depende da extensio real da independéncia na orientagao da ago num caso particular e 6, terminologicamen- te, puramente uma questo de conveniéneia, CAPITULO 13 TIPOS DE AUTORIDADE NUMA ASSOCIACAO, As regras dos estatutos de uma sociedade podem origi- nar-se por: a) acordo voluntério; 6) por imposigao de fora e acordo subsegiiente. A autoridade que governa uma associa- ‘cio pode reivindicar poder legitimo para a imposigao de novas regras. A assim chamada “constituigio” de uma associagio significa a existéncia da probabilidade pratica de que tais regras impostas pela autoridade governante serio obedeci- das; 0 grau, tipo e condigdes que dao lugar a tal probabilida- de variam com as circunstincias. Dependendo do sistema predominante de autoridade tais condigdes podem especifi- car que certos grupos ou secgdes de seus membros devem fazer-se ouvir ou expressar seu consentimento de alguma maneira; adicionalmente, pode haver qualquer quantidade de outras condigdes. Os estatutos de uma associagéio podem ser impostos no apenas sobre os seus membros mas também sobre ndo-membros, contanto que satisfagam certos critérios. Tais critérios sdo mais provavelmente relacionados a territ6- rio ¢ referir-se-Zo a residéncia, nascimento, ou a desempenho de certos atos dentro daquela rea; neste caso, 0 sistema de autoridade ser4 conhecido como tendo “validade territorial”. Uma associago cujos estatutos ganham validade com base no prinefpio territorial sera chamada de “associagio territori- al”, Este termo ser usado independentemente de até onde sua reivindicacdo & autoridade se estenda sobre seus préprios ‘membros em questdes pertinentes aquela rea o MAX WEBER De qualquer forma, emalguma extensi to & possivel e certamente ocorre 1, Dentro do contexto desta terminologia, qualquer auto- tidade € sempre “imposta” na extensiio em que nio se origine de um acordo pessoal voluntério entre todos os individuos envolvidos, Isto é verdade também para a decistio majoritaria & qual a minoria se submete. Conseqiientemente, tem havido longos periodos em que a legitimidade do governo da maio- ria no tem sido reconhecida de modo algum ou tem sido considerada duvidosa, como por exemplo, nos Estados da Idade Média e, até pouco tempo, na Obschtschina russa. 2, Porém, mesmo acordos formalmente “livres” so freqiientemente © resultado da imposicio, um fato muito bem reconhecido, como no caso da Obschtschina. Sob tais circunstancias 0 sociélogo se preocupa apenas com o estado real das coisas. 3. 0 conceito de constituigaio usado aqui é 0 mesmo empregado por Lassale. Nao deve ser confundido com a constituigao “eserita” ou, na verdade, com a constituigio em qualquer sentido legal. Para 0 socidlogo apenas tem impor- tancia quando e por que propésitos, dentro de que limites, ou possivelmente, sob que condicées especiais (por exemplo, a aprovacio dos deuses, dos sacerdotes ou o consentimento do eleitorado), os membros da associagao se submetem a auto- ridade do governante. Além disso, em que circunstancias 0 governante tem a seu dispor 0 quadro administrativo, bem como a ago da associacéio, quando emite ordens ou, mais especificamente, impoe novas regras. 4. Os principais exemplos da imposig&io de uma autori- dade com validade puramente territorial stio os preceitos da lei penal e varias outras presctigdes legais que requerem como critério de aplicabilidade que a pessoa seja residente, nascida e pratique a agao dentro da drea controlada pela associagio. CAPITULO 14 A NATUREZA DA AUTORIDADE ADMINISTRATIVA E REGULAMENTADORA NAS. ASSOCIACOES Um sistema de autoridade que regulamenta a ago da ssociagdo seri chamado de “autoridade administrativa”. Um sistema de avtoridade que governa outras agGes sociais, e assim protege pessoas que tém uma participagao no sistema, sera chamado de “autoridade regulamentadora”. Na medida em que uma associagdo somente oriente-se pelo primeiro, serd chamada de “associagdo de cardter administrativo”; na medida em que se orientar pelo dltimo, de “sociedade de carter regulamentador”. 1. E evidente por si que a maioria das associagdes reais: manifestam ambas as caracteristicas, Somente o Estado ideal governado pela lei (Rechtsstaat), como concebido pelos tes- ricos do laissez-faire, seria exemplo de uma associagio pu- ramente regulamentadora. Nela, & claro, 0 controle do sistema monetatio seria deixado inteiramente para o empre- endimento privado, 2. Sobre 0 conceito de ago de associagio ver anterior- mente 0 capitulo 12, n® 3. O conceito de autoridade adminis- trativa incluiria todas as regras que governam a ago do grupo administrativo, bem como a dos membros da associagiio, Esta espécie de relago grupo-membro envolve a conduta que ser- ve aos fins cujo alcance se tora obrigatério pelo sistema de 94 MAX WEBER, autoridade que governa o grupo, o qual planeja um curso posi tivo de agio antecipadamente, com diretivas para sua execu- ao pelo grupo administrativo e pelos seus membros. Num sistema econémico completamente comunista isto abrangeria todas as formas de conduta social. Por outro lado, um Estado do laissez-faire incluiria apenas as fungées de juizes, policiais, jurados, soldados, legisladores ¢ do pubblico com capacidade de legislar e votar. Geralmente, a autoridade administrativa ¢ regulamentadora coincide com a disting’ feita na associagio politica entre direito piblico e privado, CAPITULO 15 A NATUREZA DA ASSOCIAGAO: ASSOCIACAO DE EMPRESA, ASSOCIACAO VOLUNTARIA E COMPULSORIA Uma “empresa” € um sistema de atividade continua perseguindo um fim de uma espécie definida. Uma “associa &o empresarial” ¢ uma sociedade caracterizada por um qua- dro administratiyo, cuja atividade se orienta exclusivamente e contintamente a aleangar os fins da organizagio. Uma associagdo voluntiria (unido) € uma associagzio baseada em acordo voluntério, cujos estatutos so vilidos apenas para membros que se associaram por livre decisao pessoal. Uma associagio compulséria (instituicdio) € uma associagio cujos estatutos podem ser impostos com sucesso, dentro de uma dada jurisdigao especffica sobre toda a acao individual que se conforma a certos critérios distintos. 1. Na medida em que o critério da continuidade deva ser aplicado, a administragio dos assuntos politicos e eclesi- Asticos, bem como dos negécios das unides, se inclui sob o conceito de empresa. 2. As associagdes voluntirias ¢ compulsérias so am- bas associagdes cuja conduta se baseia num sistema racional de autoridade. Ou, mais exatamente, se uma associagio tiver um sistema racionalmente estabelecido de autoridade, seré conhecida como uma associago ou voluntiéria ou compuls6- ria, O Estado é um exemplo primario de associagdo compul- 96. MAX WENER. soria (instituigdo) juntamente com todos os seus grupos su- bordinados heterocéfalos; isto é igualmente verdadeiro para a Igreja, contanto que o seu sistema de autoridade tenha sido racionalmente estabelecido, A autoridade que governa uma associagéo compuls6ria reivindica ser vélida para qualquer um que satisfaga certos critérios distintos, tais como nasci- mento, residéncia ou 0 uso de certas facilidades. E irrelevan- te se individuo que participa assumiu pessoalmente a obrigagio — como no caso de uma associa em tampouco tem importincia se ele esteve presente na criagdo da autoridade. Tais autoridades so, portanto, consi- deradas outorgadas, no melhor significado da palavra. De modo espeeifico, uma associago compulséria pode ser uma associac’o cujos limites so definidos territorialmente. 3. 0 contraste entre associagdes compulsérias e yolun- arias € puramente telativo. As regras de uma associacdo voluntiria podem afetar 0s interesses de ndo-membrus ¢ eles podem, na yerdade, ser forgados a reconhecer a validade destas regras, seja por usurpagio, seja através do exercicio da forga bruta, ou através de um processo de promulgagao legal (por exemplo, o direito das sociedades anonimas) 4, Nao precisamos enfatizar que os termos associagiio voluntiria © compuls6ria nao cobrem conceitualmente todo tipo concebivel de associagdio. Nem tém esta pretensio, Constituem, de fato, apenas polarizagdes; assim, eligiosa, os tipos correspondentes so “seita na esfera “Tarja” CAPITULO 16 OS CONCEITOS DE PODER E DOMINACAO Entende-se por poder a oportunidade existente dentro de uma relagao social que permite a alguém impor a sua pré- pria vontade mesmo contra a resisténcia e independentemen- te da base na qual esta oportunidade se fundamenta, Por dominagao entende-se a oportunidade de ter um comando de um dado conteiido especifico, obedecido por um dado grupo de pessoas. Por “disciplina” entender-se~i a opor- tunidade de obter-se obediéncia imediata ¢ automatica de uma forma previsivel de um dado grupo de pessoas, por cau- ntagiio pritica ao comando, sa de sua ori 1. O conceito de poder € sociologicamente amorfo. To- das as qualidades concebiveis de uma pessoa e toda combi- nagio concebivel de circunstancias podem pdr alguém numa situagio na qual possa exigir obediéncia & sua vontade. O conceito socioldgico de dominagio conseqtientemente deve ser mais preciso e pode significar apenas a probabilidade de que 0 comando sera obedecido. 2. O conceito de “disciplina” inclui a “natureza prética” da obediéncia em massa, sem erfti fato é que a dominagao depende apenas da presenga real de uma pessoa emitindo com sucesso comandos a outra; nao implica necessariamente quer a existéncia de um quadro administrativo, quer a existéncia de uma associagio. Geral- mente, entretanto, um ou outro caso esto presentes, Na me- dida em que membros de uma associago estio sujeitos ao "a € sem resistencia. 8 MAN WERE io legitimo de uma tal domi iagdio de dominagio”. io, denominar-se-4 O patriarca domina sem um quadro administrativo. Um chefe beduino, que recebe tributo das caravanas, pessoas € transporte de bens que passam através de suas montanhas, domina todos aqueles individuos mutaveis e indiferentes, aos quais, sem estarem associados entre si, ocorreu encontrarem- se casualmente nesta situagio particular. Ele pode fazer isto em virlude de que seus servidores reais agem, quando a oca sidio exige, como seu quacro administrativo, impondo sua Teoricamente, tal dominagao seria concebivel tam- bém por uma pessoa sozinha, sem a ajuda de qualquer qua- dro administrative, vontad 4. Se uma associago possui um quadro administrativo, ela seri sempre, numa certa medida, empenhada numa asso- cago de dominagao. Mas este conceito é relativo. Normal- mente a associagdo de dominagao ¢ ao mesmo tempo também uma associagiio administrativa. A natureza de uma associagao determinada por uma variedade de fatores: a maneira pela qual a administragao se efetua, o cardter do pessoal, os objetos sobre os quais exerce controle ¢ a exten- so da jurisdigdo efetiva de sua dominagtio. Os primeiros dois fatores em particular dependem, no mais alto grau, da maneira pela qual a autoridade é legitimada. CAPITULO 17 TIPOS DE ASSOCIACOES POLITICAS E RELIGIOSAS Uma associagio de dominagio sera chamada de “poli- tica” se, € na medida em que, sua existéncia e a validade de suas leis dentro de uma drea territorial definida forem garanti- das por um quadro administrative através da continua aplica- ‘do ¢ ameaga de forga. Uma associagao politica compulséria ‘com uma organizagio continua sera chamada de “Estado” se, ena medida em que, seu quadro administrativo reivindicar ‘com sucesso a monopolizacao do uso legitimo da forga fisica na imposigo de sua autoridade. A ago social, especialmen- te de uma associagao, seré politicamente orientada se, ¢ na medida em que, seu prop6sito for o de influenciar a Tideranga de uma associagio politica, seja para a apropriagaio, expro- priagio, atribuigo ou reatribuigdo dos poderes governantes, A associagao de dominagao sera chamada de “hierocré- tica” se, e na medida em que, empregar, para manter sua autoridade, a “coergao psiquica” por meio da cone ndo de beneficios religiosos (coergao hierocrdtica). Uma associagaio hierocritica compulséria com uma organizagio wa serd conhecida como uma “Igreja” se, e na medida em que, seu quadro administrativo reivindicar um monop6lio do uso legitimo da coergio hierocritica io ou conti 1, Entende-se que 0 uso da forga fisica nfio é nem 0 tinico nem o método normal de administraco de associagdes politicas. Significa, antes, que seus lideres usam todos os meios concebiveis para alcancar as suas metas, Mas a amea- MAX WEBER a de forca, e, se preciso for, o seu uso real, 6 0 método que distingue as associagdes politicas, sendo sempre o timo recurso quando outros métodos falham. Mas nio apenas sociagées politicas tém aplicado e esto aplicando a forca fisica como um meio legitimo de imposig&o: ela tem sido usada da mesma maneira por grupos de parentescos, pela familia, guildas na Tdade Média e, em certas circunstancias, por todos aqueles que podem portar armas. A associagio politica se distingue, portanto, em seu uso da forga fisica entre outros meios para impor seu sistema de autoridade pelo fato que a autoridade de seu quadro administrative é reivindicada como obrigatéria dentro de uma rea territorial © que esta reivindicagio & mantida pela forca. Toda vez. em que associagdes que fazem uso da forga sto caracterizadas também por uma reivindicagio de jurisdigao territorial — sejam comunidades aldeds ou mesmo apenas comunidades domésticas, associagdes de guilda ou associagées de operd- Fios (soviets, conselhos) — devem ser consideradas por defi- nigdio, nesta medida, como associagdes politicas. Nao é possivel definir uma associagao politica — nem mesmo o Estado — em temos dos fins aos quais sua 10 de associagaio” se dedica. Da preocupagao pelo bem- estar corporal até o patrocinio da arte, niio hi meta conceb(- vel que alguma associagtio politica nao tenha alguma vez perseguido, nem ha um fim, da proteco da seguranga pes- soal até a administragio da justiga, que todas tenham reco- nhecido. Consequientemente, o carder politico de uma associagdo pode ser definido apenas em termos dos meios, nao necessariamente tipicos dela, que ocasionalmente se tor- am até um fim em si, mas que, no sentido especifico acima definido, séo indispenséveis para seu cariter, e estes meios significam 0 uso da forga. Este uso nfo & exatamente con- forme a fala cotidiana, Mas este tltimo, a nao ser que seja precisamente definido, é completamente inéitil, em qualquer caso, Assim, falamos da politica de cimbio estrangeiro do Reichsbank, da politica financeira dos diretores de uma asso- 0, das politicas educativas da comunidade, e entende- mos por elas a condugdo € 0 controle sistemédticos de um problema particular. Somos capazes de distinguir com muito maior preciso os aspectos politicos da questio. Assim, hé 0 funcionario “politico”, o jornal “politico”, o partido “politi co", 0 clube “politico”, a revoluco “politica”, e as conse- giincias “politicas” da ago, como distintos de outros, tais, como aspectos econémicos, culturais ou religiosos das pes: soas, negécios ou processos em questiio. Usado neste contex- to, “politico” significa tudo que tem a haver com relagoes de autoridade dentro do que é — de acordo com 0 uso corrente — uma associago politica, o Estado, Refere-se a coisas que so provaveis de manter, mudar ou derrubar, promover ou inibir os interesses do Estado como distintos de pessoas, coi- sas e eventos que no tém nada a haver com ele. Este uso, portanto, busea tirar as caracteristicas comuns dos varios eios de exercer dominagao costumeiramente usados dentro do Estado na imposigao de suas ordens, exclusivos das metas, a que servem, Portanto, 6 legitimo reclamar que a definigao usada aqui é apenas uma formulacao mais precisa do uso corrente, em que se dé énfase ao que ha de mais caracteristico nestes © uso da forga, seja efetive ou para intimidar. Natu- meios ralmente, 0 uso corrente considera como “politico” no ape- nas as associagdes, que sio os agentes diretos do uso legitimo da forga em si, mas também outros — por exemplo, associagdes inteiramente pacificas, tais como partidos ou unides que tentam influenciar na agao politica da associagio. Para os nossos propésitos parece aconselhavel distinguir este tipo de ago social “politicamente orientada”, da acao pura mente “politica”, isto €, da ac Imente politica da associ agiio (coma se definiu no capitulo 12, n° 3), 102 MAX WEBER 3. E apropriado definir 0 conceito de Estado em termos que correspondam ao seu status moderno, pois apenas em termos recentes o Estado tem conseguido plena maturidade Ao mesmo tempo, devemos defini-lo considerando os valo- res do tempo presente, especialmente sujeitos a mudanga. O Estado moderno possui as seguintes caracteristicas, prime’ ramente formais: uma autoridade administrativa e judicial sujeita a mudanga de estatutos, e & qual a atividade do qu dro administrativo, também sujeito & mudanga de estatutos, se orienta, Este sistema de autoridade reivindica validade nao apenas para membros da associago, a maioria dos quais a cla pertencem por nascimento, mas também, numa grande extensii, para toda conduta que ocorre dentro da area de stia jurisdigao; €, portanto, uma associagdo compulséria com uma base territorial. Além disso, considera-se 0 uso da forga hoje como legitimo, apenas na medida em que € permitido pelo Estado ou prescrito por ele. Assim, resta a0 pai o direito de punir seus filhos, algo que subsiste de uma autoridade em certa época prépria de cabeca do lar, que dispunha da vida de fills ¢ escravos. Esta reivindicagdo do Estado moderno de monopolizar 0 uso da forga € uma marca distintiva tio es sencial a ele como o seu aspecto de jurisdicao compulsoria e de organizagio continua. 4. A maneira pela qual a salvagio pode ser conseguida — seja neste mundo ou no préximo, materialmente ou espiri- tualmente — nao é um critério decisivo para a formulagao do conecito de uma associugio hierocratica; antes, é importante exercer controle sobre 0 modo de obté-la, para formar a base da dominagdo espiritual dos seres humanos. Por outro lado, 0 conceito de “Igreja” caracteriza-se, mesmo no uso comum, pelos atributos de associaeao racional compulséria, com organizagao continua, e por sua reivindicagdo de set uma autoridade monopolizadora. A organizagao hierocritica territorial predominante e a organizagio eclesiastica esto de _CONCHITOS HASICOS DE SOCIOLOGIA 103 acordo quanto ao empenho normal de uma Igreja pela domi- nacdo completa; 0s meios pelos quais tais reivindicagSes & monopolizagio se mantém variam de caso para caso. Porém, a0 contririo da associagao politica, historicamente a Tgreja no fem sentido tanto a necessidade de uma dominagio terri: torial exclusiva, ¢ isio é especialmente verdadeiro hoje em dia, © cardter “associative compulsério” da Igreja, princi- palmente pelo fato de alguém ter “nascido” nela, € responsi- vel por sua estrita diferenciagao de uma mera “seita”, cuja principal marca distintiva reside, na verdade, em seu caréter “associativo voluntir.o”, pois admite em suas fileiras somen- te aqueles que tém as qualidades religiosas requeridas. Con- tudo, 0s pormenores relativos a este tépico pertencem & sociologia da religio,

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