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A P AR Ó Q U I A E S EU FUT UR O :
NO V AS PER S P E C T IV AS PAS T O R A IS
AGOSTO
01. Um olhar específico sobre a Igreja hoje (Joel Portella Amado)
08. [Continuação do anterior]
15. Feriado
22. [Continuação do anterior]
29. Pós-modernidade e Proclamação
SETEMBRO
05. A paróquia na mudança de época: uma rede de comunidades na era da informação (Emerson
Marcelo Ruiz)
12. [Continuação do anterior]
19. O Documento 104 da CNBB de junho de 2014 sobre a renovação paroquial
26. [Continuação do anterior]
OUTUBRO
03. Vinte e quatro “puxões de orelha” de Amoris Laetitia aos pastores da Igreja
10. Recesso
17. Paróquia e iniciação cristã catecumenal: a interdependência entre renovação paroquial e
mistagogia catecumenal (João Fernandes Reinert)
24. [Continuação do anterior]
31. [Continuação do anterior]
NOVEMBRO
07. Por uma Igreja dinâmica e orgânica, toda sacerdotal (Roberto Bottrel) / As células: uma
metodologia para ajudar na evangelização (Dom Edson Oriolo)
14. Células paroquiais de evangelização
21. Iniciação à vida cristã: itinerário para formar discípulos missionários (Doc. 107 da CNBB)
28. Conclusão
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A reflexão que agora vamos partilhar tem um caráter predominantemente pastoral. Numa
Assembléia que vai refletir sobre a Palavra de Deus e o rumo das comunidades eclesiais de base,
penso ser mais útil recordar alguns aspectos que, embora todos conheçam, na prática, ainda não
se resolveram como gostaríamos, apesar de tantas vezes abordados. Não trago, portanto,
novidades nem soluções definitivas. Trago alguns destaques para a ação evangelizadora hoje.
Assumo e sistematizo algumas das ideias que vêm norteando as conversas pastorais dos últimos
anos. Baseio-me, em maior escala, no Documento de Aparecida, repetindo aspectos constantes
das atuais Diretrizes. Todos os temas aqui abordados se encontram nos textos referidos. A
questão maior é sua efetiva passagem para o cotidiano evangelizador. São as urgências pastorais
que o atual momento nos impõe. Podemos e devemos nos preocupar com todos os aspectos.
Devemos, no entanto, elencar algumas urgências e unir forças para sua efetiva concretização.
Neste sentido, recordo que o ponto de partida para qualquer compreensão do momento
diz respeito à não poucas vezes mencionada mudança de época pela qual nosso mundo
globalizado está passando. A Igreja do Brasil, em consonância com a Conferência de Aparecida,
já assumiu esta mudança de época em suas Diretrizes (DGAE 5-6, 13ss). Daí, a consciência
missionária, que vem crescendo e mesmo assumindo o primeiro lugar de nossos planejamentos
pastorais, como visto num breve estudo iniciado há pouco com planos de pastoral da maioria das
dioceses de nosso país.
Importa ressaltar que não estamos ainda numa nova época. O atual momento não é um
processo terminado. É, antes, uma realidade em andamento. Por isso, a mentalidade com a qual
lidamos não repousa sobre pressupostos fixos, ainda que distintos de épocas anteriores. Ela
repousa sobre uma perspectiva em mutação, em contínua transformação, em oscilação.
Consequentemente, o perfil evangelizador necessita assumir que está dialogando com uma
realidade em transformação.
Isto significa centralizar-se no que é essencial, acelerar atitudes, olhar o horizonte com
amplitude maior e, acima de tudo, não temer experimentos novos. Deve reconhecer que, mais do
que em épocas anteriores, as decisões pastorais tomadas hoje precisam ser sólidas o suficiente
para colocar a Igreja em diálogo com esta mentalidade emergente e mutante. Precisam, contudo,
ser igualmente flexíveis a ponto de, com rapidez, serem continuamente adaptadas ao novo que
vai surgindo. É fazer, rever e refazer continuamente. As mudanças de época, com sua exigência
de diálogo, não nos dão muito tempo para respirar e contemplar.
3. A responsabilidade da Igreja
Esta urgência, esta aceleração nos ritmos pastorais tem sua razão de ser. Acompanha a
contínua mutação da realidade e reconhece que, neste acompanhar, precisa responder ao desafio
de contribuir para a nova época que está para surgir. A nova época não dependerá
exclusivamente da Igreja. A Igreja não determinará totalmente este novo ethos, mas ela tem a
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missão de contribuir para que o novo ethos possua fortes marcas do Evangelho. Num mundo
plural, onde, mais do que em épocas anteriores, sentimos a força do diferente e a necessidade de
dialogar o tempo todo, a Igreja é uma voz em meio a tantas e uma voz em déficit sociocultural.
Os processos, já tão estudados, da crise das instituições produtoras de sentido e da transmissão
destes mesmos valores via tradição, têm relativizado os usuais caminhos de presença social da
Igreja a partir de seu caráter institucional e tradicional.
Sabemos que esta mudança de época vem marcada por algumas passagens. No mínimo
cinco passagens devem ser consideradas, se desejamos estabelecer um idioma comum com a
mentalidade que está vivendo esta mudança de época e efetivamente influenciar no surgimento
de um novo ethos. As passagens são:
1) Da primazia do uno para a supervalorização do múltiplo;
2) Do estático para o movimento;
3) Da homogeneidade para a diferença;
4) Da instituição e da tradição para o indivíduo;
5) Do predomínio da transcendência para a urgência da imanência.
Estas passagens revelam estarmos diante de uma concepção de ser, no sentido ontológico
do termo, distinta de épocas anteriores e que, por isso, nos pedem estabelecer uma plataforma
mínima de diálogo com o múltiplo, o movimento, diferença, a individualização, a imanência. Ou
assumimos, por exemplo, a liquefação (Bauman), a individualização das crenças (Hervieu-
Léger), o tribalismo e as novas formas sazonais de socialização (Mafezzolli), ou não seremos
capazes de dialogar com a emergente concepção de ser. E, quando falamos em concepção de ser,
falamos dos valores mais profundos, lá onde exatamente a evangelização deve chegar (EN 19).
O desafio consiste em discernir entre aquilo que é próprio de nossa identidade e aquilo
que é marca cultural de épocas anteriores. A relação entre Fé e Cultura(s) não está superada. Ao
contrário, ela nos interpela continuamente, pois a Fé não paira solta no ar. Ela se concretiza em
pessoas e povos e o faz exatamente através dos dados culturais, das imagens, das manifestações e
formulações próprias de cada cultura. Esta é uma consequência do princípio da encarnação. A Fé
só pode ser significativa se for vivenciada no horizonte da cultura.
Recordo estes aspectos para chamar a atenção para aquela que considero a pergunta
evangelizadora central de nossos dias: é possível viver a experiência cristã em contexto
multiforme, individualizante, continuamente mutante, valorizador das diferenças e
imanentizador?
6. Jesus Cristo, razão de nossa esperança e sentido para a existência de toda a criação.
Cristo, mas este mistério não se transmite sem as formulações histórico-culturais, ou seja, sem as
cristologias.
Neste sentido, uma das tarefas do atual momento evangelizador consiste em identificar de
que Jesus Cristo nós estamos falando. Todas as culturas e, portanto, também a contemporânea,
são capazes de processar e reciclar tudo, inclusive a pessoa e a mensagem de Jesus Cristo. Não é
sem sentido que o nome de Jesus Cristo apresenta, nesta mudança de época, grande variedade de
significados e consequentes implicações existenciais. O tema Jesus nós o encontramos nos mais
diversos contextos, exigindo, da parte da ação evangelizadora uma espécie de ecumenismo
cristológico, no qual as diversas formas de compreender, viver e transmitir Jesus Cristo são
postas em diálogo.
Assim, penso que a questão mais urgente não seja tanto Jesus em diálogo com outras
religiões e propostas de sentido. Esta questão existe. É real. Não podemos negá-la. Penso,
contudo, que, esta seja questão segunda. A questão primeira consiste em identificar em dar
conteúdo ao que Jesus Cristo significa, nestes tempos de mobilidade, mutação e
individualização. Dito de outro modo: o que, no mistério da pessoa e da mensagem de Jesus
Cristo, é, ao mesmo tempo, pertinente à Tradição e relevante para a cultura de hoje?
Como resposta, penso que o atual momento da história nos convida a elevar aos primeiros
lugares da compreensão sobre Jesus Cristo aquele aspecto indicado pelo Papa Bento XVI em seu
Discurso Inaugural da Conferência de Aparecida e, mais tarde, incorporado ao texto das
Conclusões. Este é um tempo para que se destaque a uma cristologia kenótica, construída a partir
da contemplação do Cristo que, “sendo rico se fez pobre para a todos enriquecer” (2 Cor 8,9;
Disc.Inaug. 3, DA 31, 392).
Esta concepção de Jesus Cristo, que, saindo de si, vai ao encontro e convida os discípulos
e discípulas a fazerem o mesmo, é, ao mesmo tempo, relevante para o diálogo com a mentalidade
atual e fiel à Tradição. Há de fato, no cristianismo, uma dimensão de abertura profunda e
contínua ao futuro, ao diferente, ao movimento, à multiplicidade, à esperança, ao porvir, à
superação do hoje, em especial do hoje tão sofrido, às vezes. O cristianismo é escatológico por
natureza e escatologia significa também abertura, busca e construção do futuro.
Assim, o Jesus Cristo da kénosis remete à pastoral da kénosis, ou pastoral da alteridade.
Trata-se de uma pastoral marcada, acima de tudo, pelo mergulho em busca do outro, pela
imersão nesta realidade em contínuo e acelerado processo de mutação. Alguns dizem que se trata
de correr atrás do prejuízo. Não sei dizer se esta avaliação mais quantitativa, decorrente, por
exemplo, do contato com dados censitários e outras pesquisas que acenam para o declínio
numérico dos católicos no Brasil, deve ser nosso maior motivador. É claro que a perda sempre
incomoda. Afinal, entre qualidade e quantidade existe certa correlação. As primeiras
comunidades mostram, entre os efeitos da vida de irmãos, o aumento no número dos fiéis (At
5,14). Penso, contudo, que os motivos maiores não sejam os da concorrência pastoral. Eles estão
ligados a algo que está no cerne da identidade cristã e que outras épocas não permitiram maior
destaque.
Nosso tempo é tão cheio de perplexidades. O outro e o diferente sempre nos assustam.
Este é um fato humano. O outro assusta, porém, bem mais quando ele é plural, diversificado,
mutante e impossível de enquadramento satisfatório. Em face de tudo isso, a força interpeladora
do Evangelho estará na capacidade de vivermos e testemunharmos que o outro não é nem
ameaça nem objeto para fruição. O outro é fascínio, que atrai, convida e provoca. Sem esta
abertura kenótica à alteridade, não seremos capazes de fielmente dar as razões de nossa
esperança a um mundo que, mesmo quase uma década depois do 11 de setembro, ainda se
apavora com a possibilidade do inimigo estar dentro de casa; ou, então, um mundo que se torna
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descrente em meio a tanta desonestidade, tanta corrupção, tanto desrespeito à vida. Aliás, nem
precisamos recorrer ao 11 de setembro para compreender a perplexidade trazida pelo outro que
invade nossa existência. O que devemos dizer àquela senhora que nos procura afirmando que, na
própria família, no local de trabalho e na vizinhança, ela é a única seguidora de Jesus Cristo, pois
as pessoas com quem convive ou, na prática, são sem religião ou migraram para os empórios
neoliberais de curas e prodígios?
A missão é sempre a resposta da Igreja. É uma resposta que faz parte de nossa identidade
mais profunda. Ela vale para os tempos de bonança e para os tempos de tempestade, para os
períodos de maior plausibilidade sociocultural e para os períodos de perseguição. Nesta atual
mudança de época, a passagem do institucional para o individual é, a meu ver uma das que mais
determinam o perfil missionário. Há séculos, estamos acostumados a apresentar as razões de
nossa esperança a partir dos critérios da tradição, da instituição e da verdade objetiva. A missão
se caracteriza pela inserção numa comunidade/instituição socioculturalmente reconhecida e em
vista do acolhimento de uma verdade objetiva. Estes argumentos não perderam seu valor
teológico. Eles experimentam o enfraquecimento sociocultural. Já não possuem fôlego para fazer
chegar a Boa Nova ao coração de pessoas e povos. Na atual mudança de época, vale bem mais o
que é individualizado. Lembremo-nos das bênçãos individualizadas pedidas ao final das
celebrações eucarísticas. Elas são exemplos agudos do que os estudiosos do assunto chamam de
individualização das crenças, palpabilidade intra-histórica e sensitividade da presença do divino.
8. Evangelização individualizada?
Esta, a meu ver, é uma das razões pelas quais sentimos crescer também a sensibilidade
para os eventos de massa. Ainda que em nível diferente das comunidades, eles também fornecem
senso de pertença, identidade, certeza de que há outros comungando dos mesmos ideais e
projetos. Os eventos de massa possuem forte carga terapêutica diante do anonimato, da
liquefação das identidades, da fragilidade de referências. Importa não concentrar esforços apenas
em um destes dois polos: rede de comunidades ou eventos de massa, esquecendo-se da mútua
articulação que deve existir entre ambos, à luz de um projeto pastoral comum.
O encontro com Jesus Cristo exige o encontro com a Igreja, na rede de comunidades.
Estes dois aspectos, contudo, apontam para outra urgência. Em nossos dias, Jesus Cristo sozinho,
sem vida de irmãos, gera consumismo religioso. Jesus Cristo na pequena comunidade, sem a
abertura para outro social, corre o risco de gerar individualismo comunitário, ao estilo das ilhas
de proteção. São projetos de vida, ainda que comunitários, voltados, apenas para si mesmos.
Estes dois riscos, o do consumismo religioso e do individualismo grupal se resolvem somente
quando existe a sensibilidade para o outro, em suas alegrias e, mais ainda, em suas dores.
A afirmação do recomeçar a partir de Jesus Cristo numa Igreja comunidade de
comunidades aponta para uma espiritualidade profundamente comprometida com a vida, em
todas as suas instâncias. Aponta para uma forte sensibilidade e um intenso compromisso com os
pobres, nos mais diversos e variados rostos que eles venham a ter em nossos dias (DA 65, 257 e
402). O Cristo kenoticamente assumido é o Cristo da Cruz (1 Cr 1,23, Fp 2,5ss) e o Cristo da
Cruz se concretiza hoje nos diversos e crescentes crucificados. Entre estes crucificados, não
podemos deixar de lembrar que até mesmo o próprio planeta, como um todo, está sendo
crucificado pelo egoísmo e pela ganância (Campanha da Fraternidade 2011, Fraternidade e a
Vida no Planeta).
Mesmo que o preço seja o aumento no número de pedras sobre si, a Igreja não poderá
recuar no seu compromisso histórico com a construção de mundo mais fraterno, solidário, justo e
reconciliado. Não há como calar diante da vida ameaçada e destruída. Este compromisso está no
mais íntimo do DNA da Igreja e deve se manifestar no planejamento pastoral e se manifestar
como outra urgência. É claro que a Igreja sempre enfrentará reações por causa deste
compromisso. Uma das maiores é, sem dúvida, o ataque, em especial, via desmoralização. O
caminho não pode ser o do recuo, mas o da atenção ao telhado: em lugar do vidro, telhas mais
sólidas, ainda que através de um preço interno muito sofrido.
chamado de pastoral presbiteral, o cuidado com aqueles que têm a tarefa de cuidar (cf. DGAE
95).
No que diz respeito aos chamados ministérios exercidos eclesialmente pelos batizados,
não discuto aqui a importância do laicato na transformação do mundo. Chamo a atenção para os
diversos ministérios intracomunitários, em virtude dos quais Aparecida bendiz a Deus (DA 99c).
Contamos com imenso número de pessoas generosas, dedicadas, mártires cotidianas e
silenciosas da ação evangelizadora. Não fosse esta vivência concreta do batismo, no serviço
dedicado à Evangelização, serviço vivido das mais diversas formas, não teríamos conseguido
muito do que conseguimos. A novidade trazida por este tempo de forte personalização e
capilarização é que precisamos intensificar e mesmo estabelecer alguns ministérios urgentes. São
ministérios ligados ao acolhimento e à missão. No campo do acolhimento personalizador, urge
catalisar os serviços ou ministérios de escuta, intercessão, acolhida ou outro qualquer nome que
possam ter. Muitos grupos e comunidades já fazem isso. É preciso acelerar a formação,
estabelecer critérios, partilhar experiências. Numa Igreja que se preocupa em recomeçar a partir
de Jesus Cristo, como não pensar em intensificar bem mais o ministério dos introdutores, como
indicado pelo RICA, ainda que sob diversas formas?
No campo da missão, por que não estimular ainda mais o que Aparecida chama de
animadores de comunidade e assembleia, aptos a chegarem lá onde, sem esta força de trabalho,
não se consegue chegar? (cf DGAE 173)
Em todo este processo, penso ser importante o ministério da Palavra (DA 99a.c, 205,
211, 248), entendido em sentido amplo, atuando no campo específico da pregação e das
celebrações (DA 253; DGAE 72), mas também na formação bíblica, como guias para a Leitura
Orante e em tudo mais que os senhores vão refletir no tema central desta Assembleia.
Ao terminar, peço desculpas aos senhores por repetir aspectos que todos conhecemos. Fiz
isso não apenas por acreditarque não bastam discursos para que uma realidade se transforme,
mas também por considerar que, em momentos de intensa mobilidade, é preciso focar a atenção
nos pontos principais.
Em tudo isso, os senhores perceberam que não apresentei novidade, pois, de fato, não se
trata de inventar a roda. Busquei apenas chamar a atenção para aquilo que, em meio a tanta
riqueza de nossa ação evangelizadora, deve merecer destaque. Por isso, usei exageradamente a
palavra urgência.
O fato é que as mudanças de época pedem um reconfigurar geral, reconfigurar nos
fundamentos. É claro que não se trata de colocar outro fundamento que não seja Jesus Cristo.
Trata-se de pensar nas bases históricas, socioculturais de nossa ação evangelizadora, chamada,
em nossos dias, a ser cada vez mais iniciática (apresentar e reapresentar continuamente Jesus
Cristo, e o Cristo da kénosis até a cruz), personalizadora, capilarizante, solidária e ministerial. Se
estas urgências forem na prática enfrentadas, poderemos efetivamente contribuir para o novo
ethos que precisa surgir.
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P ó s - mo d er n id a d e e P r o c l a ma ç ã o
Paulo Brabo
O comunismo saiu da arena principal e o islamismo ainda não tomou o seu lugar. Entre os
cristãos evangélicos o esporte do momento é atacar o pós-modernismo e tudo que aprendemos a
associar a ele: o relativismo (ou o desprezo pela ideia de uma verdade única e irrefutável),
o misticismo (ou a busca por uma espiritualidade irresponsável e nos lugares errados) e ainda o
seu ceticismo tolerante (a desconfiança da validade de qualquer fé em particular aliado a um
estranho respeito por todas).
a sua parcela de “verdade” e nenhuma pode ter a pretensão de se posicionar como verdade
definitiva — possibilidade que arruinaria a validade e a beleza das outras alternativas.
A indomável mentalidade desta era pode ser mais facilmente compreendida se
considerarmos a forma de arte mais tipicamente pós-moderna: o videoclipe. Os primeiros vídeos
de música eram “modernos” no seu caráter linear — contavam “historinhas” com começo, meio
e fim. Mas logo os produtores de videoclipes adotaram uma linguagem mais radical, menos
linear e mais fragmentária. Um videoclipe é um amontoado de imagens que não necessariamente
contam uma história ou têm qualquer relação entre si; não têm uma “explicação”. Seu sistema é a
ausência de um sistema. A ideia é passar uma impressão, e não deixar alguma coisa
absolutamente clara.
Filme é coisa moderna. Videoclipe é cria pós-moderna.
Uma pergunta importante: por que que a igreja cristã não estava pronta e presente para
acolher esses “filhos desiludidos” da razão e da modernidade logo que eles começaram a pipocar
na década de 1960? Por que os hippies não se voltaram para a fé cristã quando precisaram
satisfazer o seu anseio por uma espiritualidade real?
A resposta curta é que a igreja cristã havia, ela mesma, se dobrado no altar do modernismo.
O discurso da supremacia da razão havia sido tão longo e eloqüente que até mesmo os cristãos
tinham caído no logro da sua pregação. A igreja cristã havia de alguma forma adotado a noção
paradoxal de que tudo a respeito da fé pode ser explicado e exposto racionalmente, inclusive as
imponderabilidades da criação e da salvação.
A própria Bíblia havia caído vítima dessa ênfase excessiva na razão humana. Complicadas
fórmulas eram e são utilizadas para provar que a escritura cristã faz sentido racional e é espelho
fiel da realidade científica. Em 1793, Kant publicava A religião apenas dentro dos limites da
razão, e quase duzentos anos depois Josh McDowell articulava ainda uma defesa racional da
divindade de Cristo, demonstrando por A + B que a fé cristã é a escolha mais sensata na
prateleira.
O problema é que, adotando essas interpretações racionais, a igreja confessava que a
ciência e o racionalismo são os critérios pelos quais a realidade deve ser julgada.
Quando começaram a buscar onde saciar a sua terrível sede pelo espiritual e pelo místico,
as pessoas foram forçadas a concluir que a fé cristã era simplesmente racional demais para
interessá-las — e a igreja perdeu assim o bonde da pós-modernidade.
Chamar a Bíblia de pós-moderna seria anacronismo, mas creio que pode-se com segurança
afirmar-se que os escritores bíblicos não tinham uma mentalidade moderna; não criam na
supremacia da razão nem na superioridade da exposição linear e dos sistemas racionais.
Jesus, por exemplo. Para escândalo e perplexidade dos teólogos, Jesus não chegou nem
perto de expor a sua teologia de forma sistemática. Tudo que ele deixou a fim de transmitir a sua
mensagem foi o seu exemplo, um punhado de histórias curtas e uma longa série de frases de
efeito, sendo que cada um desses elementos não parece sustentar qualquer conexão imediata com
os outros. Para seus ouvintes e leitores tudo que o discurso de Jesus deixou foi uma série livre de
imagens sem qualquer ordem ou prioridade particular: um videoclipe do reino, por assim dizer.
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Jesus não fez uma série de conferências, não expôs as quatro leis espirituais, não definiu
predestinação nem trindade, não pregou teses na porta do Templo, não apresentou uma vez que
fosse o plano da salvação. Ao invés de apresentar um cenário racional e ordeiro, uma visão geral
seguida por definições, demonstrações e apêndices, tudo que ele fazia era coçar a barba e dizer:
“A que posso comparar o reino?…” Isso não impedia, naturalmente, que as pessoas saíssem dali
saltitando a sua conversão.
Os escritores bíblicos também não compartilhavam do nosso horror tipicamente
moderno/racionalista à contradição. O livro de Gênesis, por exemplo, parece narrar a criação de
duas formas contraditórias, e até a ascensão do modernismo isso nunca foi motivo de escândalo
para ninguém. É racionalista até mesmo o esforço tradicional em conciliar as duas versões.
Parece absurdo à mente moderna considerar que as duas possam ser ao mesmo tempo diferentes
e verdadeiras: isso seria na nossa opinião relativizar a verdade. Os escritores bíblicos
provavelmente chamariam a mesma coisa de transmitir uma profunda verdade espiritual.
Como não estava preso aos nossos escrúpulos com a racionalidade, Jesus sentia-se livre
para dizer coisas como “Eu sou a luz do mundo” sem temer ser apanhado em contradição com a
“verdade” científica de que a Terra é iluminada pelo sol e não por Jesus. Não é como se a
realidade espiritual contradissesse ou relativizasse a realidade científica da importância do sol.
Não há relativização aqui, embora as duas coisas sejam verdade ao mesmo tempo.
Ainda mais revelador é o fato de Jesus ter afirmado ser, ele mesmo, a Verdade com letra
maiúscula — tirando dessa forma para sempre a verdade do domínio da razão. Se a verdade é
uma pessoa ela não tem como ser comprovada ou refutada pelo método científico. Uma pessoa
pode ser no máximo abraçada e experimentada, nunca explicada racionalmente.
A Bíblia traz um convite para nos relacionarmos pessoalmente com a verdade, e não um
tratado para a comprendermos racionalmente. Coisas que têm, definitivamente, um sabor pós-
moderno.
Como pregar-se com um barulho desses? Como transmitir-se a verdade para quem não
acredita numa verdade definitiva?
Em primeiro lugar pode ser útil reconhecer que, como a Verdade que temos a transmitir é
uma Pessoa e não uma série sensata de proposições racionais, o cristianismo pode encontrar no
terreno da pós-modernidade uma tremenda vantagem. Podemos resgatar tranquilamente “a
insensatez do evangelho” e o “escândalo da cruz”, porque não precisamos mais fingir que a
razão e a verdade científica são as verdadeiras medidas da realidade. Jesus é muito mais luz do
mundo do que o sol jamais chegará a ser.
Quando bate o pé afirmando que não existe uma verdade definitiva, o homem pós-moderno
está falando basicamente de uma verdade racional. Uma verdade relacional tem tudo para
chamar a sua atenção. E ele certamente vai gostar de ouvir que a letra mata e o espírito vivifica.
Mas de que forma, você pode perguntar, se transmite uma verdade-pessoa? Isso, meu caro,
é problema seu. Ninguém sabe exatamente como, mas parece seguro que teremos de acabar
abrindo mão de todas as abordagens convencionais (todas elas racionalistas e “modernas”) de
evangelização.
Robert Nash Jr. faz uma série de generalizações a respeito da proclamação do Reino no
idioma da pós-modernidade:
• o desafio requer verdadeira espiritualidade;
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sobre o clero; poderes laicos (X/XI) - conflito das investiduras –ministério ordenado como
cargo civil de confiança do rei.
2. Adolescência
3. Juventude
4. Adultez
Vaticano II: a Igreja em diálogo com o mundo. Desenho de uma paróquia renovada:
identidade ministerial, comunitária e missionária.
Conferências Gerais do Episcopado Latino-Americano: novos desafios às paróquias.
Medellín: converter-se aos pobres e a uma estrutura mais despojada; Puebla: tornar-se
espaço articulador de pequenas comunidades (CEBs : paradigma de comunhão e
participação eclesial); Santo Domingo: empenhar-se na nova evangelização (expressão
“rede de comunidades” surge pela primeira vez); Aparecida: na “mudança de época”, ater-
se às exigências da pastoral urbana, na superação de estruturas ultrapassadas, aberta à
missionariedade dos discípulos, em contínua conversão.
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Ciências sociais a partir do Vaticano II: ferramenta no estudo dos sinais dos tempos.
Teoria sociológica do espanhol Manuel Castells
o Nova estrutura social = a sociedade em rede (um conjunto de nós interconectados;
principais características: dinamicidade, abertura, geometria variável, assimetria,
capacidade de adaptação, inovação e descentralização; poder fluido e não hierárquico).
o Nova economia = o capitalismo informacional (a rede planetária de fluxos de capitais o
sobreativa; economia não mais baseada em formas rígidas de produção, mas no
mercado dinâmico e veloz; a rede é o mercado voraz, sem compaixão).
o Nova cultura = a virtualidade real (amplitude oceânica trazida pela integração das
mídias; interatividade simultânea; agregadas no mesmo sistema as modalidades escrita,
oral e audiovisual da comunicação humana; comunicação de massa transforma
expectadores em sujeitos não passivos, mas exigentes, ao poderem escolher entre várias
opções; comunidades virtuais; crise nos emissores tradicionais de cultura).
o Nova experiência espacial = a cidade informacional (crescente dissociação entre
proximidade territorial e atividades humanas básicas: estudos, trabalho, compras,
serviço público e religião).
Em contrapartida, a busca da identidade e da vida em comunidade: indivíduos sentem-se
ameaçados pelo fluxo das mudanças. Pessoas tendem a reagrupar-se em torno de
identidades primárias: religiosas, étnicas, territoriais, nacionais. A violência das
transformações gera necessidade de segurança: agarrar-se a algo sólido num mundo
fluido. Numa cultura que insiste em ser a-histórica, a tradição parece tornar-se a fiança das
certezas. Força dos fundamentalismos. Num mundo rapidamente mutante, as pessoas
sentem-se mais seguras ao saber que algumas coisas são eternas. Será este o papel da
religião na mudança de época? Outros movimentos sociais se articulam também em
comunas, mas ao redor de outros valores, tais como opção sexual, defesa do meio
ambiente, manutenção de um território. São grupos sociais que se organizam em torno à
identidade de resistência. Há algo de religioso nisso? Para Castells grupos defensores da
própria identidade frente à fluidez social: atores principais na era da informação. Mas, não
bastará resistir. Urge reconfigurar a “identidade de resistência” em “identidade de projeto”.
Três formas de construção de identidades: a) identidade legitimadora (introduzida pelas
instituições dominantes); b) identidade de resistência (grupos que se sentem
marginalizados e cavam trincheiras) e c) identidade de projeto (nova identidade que propõe
uma nova articulação).
As redes estão na política, nos movimentos sociais e em toda parte. Empresas, terroristas,
igrejas evangélicas, artigos científicos, produção de automóveis e de conhecimento,
protestos sociais... A lista é interminável e continua a ser escrita, simultaneamente, em
várias partes do globo. As redes são o novo modo de organizar (e desorganizar) o novo
mundo. Teoria de Castells suscita várias indagações, em torno ao desenho da paróquia na
era da informação:
- Pode a paróquia configurar-se em rede?
- Quais são as oportunidades oferecidas à paróquia na sociedade em rede?
- Como propor a fé para pessoas que sentem suas identidades ameaçadas?
- Qual o papel da paróquia na rede eclesial?
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Não se pretende aqui um protótipo paroquial nos moldes castellianos, mas oferecer muitas
perguntas e algumas pistas que a era da informação, na perspectiva de Castells, faz à
instituição paróquia.
Primeiro passo na aclimatação da paróquia a este período histórico: a sua aceitação.
Nostalgia da fuga para o passado.
Teoria das redes aplicada aos primeiros séculos da história eclesial: teia de conexões
semelhantes àquela de hoje. Aposta nas megacidades e nas pequenas comunidades,
formação de novas lideranças, emprego dos meios da comunicação disponíveis na época:
os meios empregados pelas primeiras comunidades se confundem com os conselhos de
Castells acerca da inovação.
Três dimensões para paróquia na sociedade em rede: a paróquia na rede global, na rede
eclesial e na “rede de comunidades”. Cada instância traz suas implicações pastorais.
No tema comunidade e sua relação com identidade, a pergunta:: as comunidades cristãs se
agregam em torno à identidade de projeto, legitimação ou resistência? O cenário atual não
responde de maneira unívoca ou definitiva. Depende de cada comunidade. Mas, segundo
Castells, os atores privilegiados da era da informação são as comunas agregadas ao redor
da identidade de resistência. Esta é a direção.
Interatividade e comunidades virtuais: estas palavras tão atuais albergam exigências
evangélicas de acolhimento e cidadania eclesial.
Quanto ao tema da territorialidade, central tanto na paróquia renovada como nos estudos de
Castells. Mudança de época não cancela a territorialidade, mas a relativiza. A pertença
comunitária e eclesial na era da informação não se dá mais por proximidade geográfica,
mas através da conexão interativa com distintos nós eclesiais, alguns fisicamente distantes,
mas virtualmente próximos.
A paróquia, em sua grandeza e complexidade, não tem condições para realmente ser uma
comunidade em que os fiéis se encontram, se conhecem e cultivam vínculos pessoais. Não
se pode negar que muitas pessoas se encontram, se conhecem e têm laços belíssimos de
amizade. Entretanto, o grupo daqueles que estão à margem é enorme. Em que a nova mídia
eletrônica pode ajudar a minimizar essa dificuldade?
Rede e paróquia são duas palavras de difícil articulação. A paróquia é territorial, as redes
são multidimensionais. A paróquia é hierárquica, as redes são anti-hierárquicas. A paróquia
tende à estabilidade, as redes são dinâmicas. A paróquia tende a fechar-se, as redes são
abertas. Diante de tudo isto, é possível sonhar com a paróquia rede de comunidades?
17
Acreditamos que não se trata de sonho, mas de sobrevivência. Suspeitamos que entidades
que não se aclimatarem à sociedade em rede terão a sua história ameaçada.
Outra tarefa: abertura à globalização. Em Trento, aprendemos que a paróquia adquiriu
homogeneidade e foi implantado em todos os continentes. Contudo, hoje esta padronização
não existe mais. Quando Castells lida com um tema, ele não o estuda somente a partir de
sua configuração ocidental. Aborda o mesmo tema a partir da ótica de outras culturas. Isto
não poderia ser feito também em relação à paróquia? Em um mundo marcado pela
globalização, paróquias de diferentes países e continentes não podem aprender umas com
as outras? Pesquisas poderiam descrever paróquias de diferentes grupos e culturas. Por
exemplo: pesquisar como outras Igrejas cristãs organizaram sua vida comunitária. Ainda:
como o oriente ortodoxo organizou sua vida em comunidade? Isto não seria uma rede
globalizada de comunidades?
Outra empreitada, a mais complexa: a questão da identidade> Qual a relação entre
identidade de protesto e a dimensão peregrina do católico?
Em períodos passados, a teologia pastoral testemunhou certo desencanto com a paróquia.
Acreditava-se que a paróquia estava com os dias contados. Não havia muitos estudos.
Mesmo o magistério dedicava-lhe acanhada atenção, se comparada com a preocupação
hodierna. O renovado interesse que atualmente a paróquia desperta não ignora suas
múltiplas fragilidades, mas também não é indiferente à grandeza da sua vocação. Esta
pesquisa mostrou isto: a paróquia teve vigor em outras épocas para aclimatar-se. Diante
deste novo horizonte não será diferente.
Introdução
O documento de Aparecida (370) diz que devemos “ultrapassar uma pastoral de mera
conservação para assumir uma pastoral decididamente missionária”. Para isso é preciso
transformar a estrutura da paróquia numa comunidade de comunidades, que representa um
18
retorno à raiz evangélica bem anterior à estrutura paroquial. Para transformarmos a paróquia em
comunidade de comunidades, o modelo é o próprio Jesus e a sua maneira de organizar a vida em
comunidade em vista do Reino de Deus.
Toda a comunidade cristã encontra sua inspiração naquelas comunidades que o próprio Jesus
Cristo fundou por meio dos apóstolos, na força do Espírito Santo.
Recuperar a comunidade. No antigo Israel, a comunidade, era a base social, ambiente concreto
de encarnar o amor de Deus no amor ao próximo. No tempo de Jesus devido ao sistema da
religião imperial, a vida comunitária estava se desintegrando. Muitas pessoas ficavam sem ajuda
e sem defesa, como as viúvas, os órfãos, os pobres (cf. Mt 9,36).
A nova experiência de Deus: o Abbá. Jesus dizia: “Quem me viu, tem visto o Pai” (Jo 14,9). Ele
revelava um novo rosto de Deus sendo o portador da grande Boa- Nova para todos os seres
humanos, sobretudo para os pobres.
A missão do Messias. Jesus, quando batizado no rio Jordão (cf. Mc 1,9) tem revelada a sua
missão de ser o servo enviado de Deus: “Tu és o meu filho amado; em ti está o meu agrado” (Mc
1,11; Mt 3,16- 17; Lc 3,21- 22 e Is 42,1). A partir daquele momento, Jesus passou a se identificar
com a missão do servo de Deus, anunciado por Isaías: “Pois o Filho do Homem não veio para ser
servido, mas para servir e dar a vida em resgate por muitos” (Mc 10,45), “anunciar a boa- nova
aos pobres, proclamar a libertação aos presos e, aos cegos, a recuperação da vista; para dar
liberdade aos oprimidos e proclamar um ano aceito da parte do Senhor” (Lc 4,18- 19). Por ter
sido fiel a essa missão, recebida do Pai, Jesus era amado pelos pobres, mas perseguido e
caluniado pelos poderosos que, por fim, decidiram matá-lo (cf. Mc 3,6).
A novidade do reino. Ao redor de Jesus, começou a nascer uma pequena comunidade (cf. Mc
1,16- 20; 3,14) em que:
a) Todos são irmãos (Mt 23,8);
b) Há igualdade entre homem e mulher (cf. Mt 19,7- 12). As mulheres “seguem” Jesus
desde a Galileia (cf. Mc 15,41; Lc 23,49); (Jo 4,26); (Mc 16,9- 10; Jo 20,17);
c) Há partilha dos bens; (cf. Mc 10,28; Mt 8,20). Havia uma caixa comum que era
partilhada, também, com os pobres (cf. Jo 13,29). Nas viagens o discípulo deveria
confiar no povo que o acolhesse e dependeria da partilha que receberia (cf. Lc 10,7);
d) Relacionam-se como amigos e não como empregados.(Jo 15,15);
e) O poder é exercido como serviço. (Lc 22,25- 26; Mc 10,44). Jesus deu o exemplo (cf.
Jo 13,15). “Não veio para ser servido, mas para servir e dar a vida em resgate por
muitos” (Mt 20,28);
f) É dado o poder de perdoar e reconciliar. Esse poder foi dado a Pedro (cf. Mt 16,19), aos
apóstolos (cf. Jo 20,23) e às comunidades (cf. Mt 18,18). O perdão de Deus passa pela
comunidade, que é lugar de perdão e de reconciliação e não de mútua condenação;
g) Faz-se a oração em comum. Eles iam juntos em romaria ao Templo (cf. Jo 2,13; 7,14;
10,22- 23), rezavam antes das refeições (cf. Mc 6,41; Lc 24,30). Em grupos menores,
Jesus se retirava com eles para rezar (cf. Lc 9,28; Mt 26,36- 37); h) se vive a Alegria.
(Lc 10,20; Lc 10,23- 24; Lc 6,20; Jo 16,20- 22).
Um novo estilo de vida comunitária. Jesus deu quatro recomendações para a vida comunitária
(cf. Lc 10,1- 9):
a) Hospitalidade. (cf. Lc 9,4; 10,5- 6; Mt 10,9- 10; Lc 10,5);
b) Partilha (Lc 10,7);
19
Casa da caridade (ágape). Na Palavra e na Eucaristia, o cristão vive a dimensão do amor como
ágape. Biblicamente, o vocábulo amizade se refere ao amor. O próprio Senhor disse que
“ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida por seus amigos” (Jo 15,13). A amizade
torna-se, então, expressão do ágape, o centro da charitas cristã. Essa amizade se traduz em
compaixão pelos que sofrem; assim, nasce a missão.
A paróquia hoje. A paróquia é um instrumento importante para a construção da identidade cristã.
É verdade que a origem da paróquia é marcada por um contexto cultural muito diferente do atual.
Por isso a paróquia está desafiada a se renovar diante das mudanças de nosso tempo. Em vista da
urgência de uma nova evangelização. Sendo instância de acolhimento, a paróquia é o espaço
para receber diferentes pessoas, com suas buscas e vivências, que pretendem seguir o caminho.
Enquanto espaço da comunidade o sentido da comunhão é indispensável. De igual modo, é
preciso reafirmar que, teologicamente, o fundamento da paróquia é ser uma comunidade
eucarística, que celebra a presença de Cristo Palavra e Eucaristia, estabelecendo os vínculos de
comunhão entre os seus fiéis e remete todos à missão de testemunhar na caridade a verdade
professada.
O discípulo missionário sabe que, para efetivamente anunciar o Evangelho, deve conhecer a
realidade à sua volta e nela mergulhar com o olhar da fé, em atitude de discernimento.
Há muitos anos, a Igreja no Brasil intensifica seus esforços para que a paróquia supere os
entraves que a impedem de ser missionária. Há paróquias que continuam a concentrar suas
atividades principais na liturgia sacramental e nas devoções. Falta-lhes um plano pastoral e a
responsabilidade da comunidade concentram-se, exclusivamente, no pároco, não permitindo que
os leigos tomem decisões nem assumam compromissos.
Não há uma preocupação missionária Por outro lado, muitas comunidades e paróquias
desenvolvem uma liturgia viva e participativa; preocupam-se e atuam com os jovens; despertam
muitos serviços e ministérios entre os leigos; têm conselho pastoral e conselho de assuntos
econômicos. Nelas, os párocos e seus colaboradores, homens e mulheres, desenvolvem uma
pastoral de comunhão e participação. Considerando os três âmbitos da ação evangelizadora, é
importante identificar os aspectos da pessoa, da comunidade e da sociedade que importam na
renovação paroquial..
demais: amor sem compromisso. Em nossas paróquias participam pessoas unidas sem o
vínculo sacramental, outras estão numa segunda união, e há aquelas que vivem sozinhas
sustentando os filhos. Outras configurações também aparecem, como avós que criam netos ou
tios que sustentam sobrinhos. Crianças são adotadas por pessoas solteiras ou por pessoas do
mesmo sexo que vivem em união estável. A Igreja, família de Cristo, precisa acolher com
amor todos os seus filhos. Sem esquecer os ensinamentos cristãos sobre a família, é preciso
usar de misericórdia. É hora de recordar que o Senhor não abandona ninguém e que, também,
a Igreja quer ser solidária nas dificuldades da família.
É urgente que a paróquia se torne, cada vez mais, comunidade de comunidades vivas e dinâmicas
de discípulos missionários de Jesus Cristo.
A renovação paroquial depende da atenção dada ao princípio comunitário da fé. Agora passamos
a fazer uma reflexão pastoral com alguns indicativos para a urgente renovação das comunidades
paroquiais.
25
4 . 2 . A comunidade de comunidades
É o desafio lançado desde a conferência episcopal de Puebla e Santo Domingo e que agora o
documento de Aparecida enfatizou com mais veemência e vemos com mais evidencia nas
Diretrizes da Ação Evangelizadora que a paróquia para se tornar uma verdadeira comunidade de
comunidades tem de encarar com muita seriedade os desafios da nova evangelização com muita
criatividade, respeito mutuo, a sensibilidade para o momento histórico e a capacidade de agir
com rapidez
a) A setorização da paróquia. A grande comunidade, praticamente impossibilitada de manter os
vínculos humanos e sociais entre todos, pode ser setorizada em grupos menores que
favoreçam uma nova forma de partilhar a vida cristã. A setorização é um meio. Não basta
uma demarcação de territórios, é preciso identificar quem vai pastorear, animar e coordenar
esses setores, pequenas comunidades. Sem essa preparação, a simples setorização não renova
a vida paroquial. Diversas experiências de setorização das paróquias já ocorrem em todo o
Brasil. Na maioria delas, a região pastoral é dividida em pequenos grupos que podem se
26
conhecer e se visitar. Em cada grupo, escolhem-se lideranças que animem e façam suscitar
novos agentes da comunidade. A formação das lideranças e o apoio da paróquia a essas
comunidades são imprescindíveis. Nessa instância, podem ser desenvolvidos muitos serviços
e ministérios: o cuidado aos doentes, a visita aos migrantes, a catequese, a celebração da
Palavra, o acompanhamento dos enlutados, a devoção mariana, a preocupação com os pobres,
a preparação para Natal e a Páscoa, a preparação ao Sacramento do Batismo, a Leitura Orante
da Bíblia, a celebração dos aniversários e as confraternizações.
b) Revitalização da comunidade. A revitalização das comunidades, com a renovação paroquial,
implica muito mais do que a setorização e a integração das comunidades, dos movimentos e
dos grupos. Será preciso uma verdadeira conversão pastoral de todos. A revitalização exige,
também, que as pessoas tenham a alegria de se reunirem em torno da Palavra de Deus,
especialmente com a Leitura Orante da Bíblia, para que a Palavra determine a caminhada do
pequeno grupo. A vida das pequenas comunidades, revitalizadas pela Palavra e alimentadas
pela Eucaristia, será o primado do ser sobre o fazer.
A conversão pastoral depende de uma conversão pessoal a Cristo. Só assim será possível
ultrapassar uma pastoral de mera conservação ou manutenção, para assumir uma pastoral
decididamente missionária; Para que essa realidade aconteça, os bispos, os presbíteros e todo o
Povo de Deus precisam assumir sua responsabilidade na revitalização das comunidades.
a) Conversão dos ministros da comunidade. A renovação paroquial depende de um renovado
amor à pastoral que os padres podem e devem exercer como expressão da sua própria
existência sacerdotal. Os Bispos serão os primeiros a fomentar, em toda Diocese, essa
revitalização das comunidades que contribui para a renovação paroquial. Eles são chamados a
estimular e apoiar a revitalização das comunidades de suas Dioceses. Eles são os primeiros
responsáveis para desencadear o processo da renovação das paróquias, especialmente na
missão em direção aos afastados. Os presbíteros, sobretudo o pároco, serão os agentes da
revitalização das comunidades. A renovação paroquial requer novas atitudes dos párocos e
dos padres que atuam nas comunidades. Em primeiro lugar, o pároco precisa ser um homem
de Deus que fez e faz uma profunda experiência de encontro com Jesus Cristo. A
revitalização da comunidade supõe que o pároco estimule a participação ativa dos leigos de
sua paróquia. Caberá também ao pároco reconhecer as novas lideranças e multiplicar o
número de pessoas que realizam os diferentes ministérios nas comunidades. Não raras vezes,
quando ocorre a transferência do pároco, tudo é mudado na comunidade. A conversão
pastoral, ao permitir maior participação do leigo, há de superar esse sério problema,
respeitando o plano de pastoral paroquial em sintonia com o plano diocesano de pastoral.
b) Protagonismo dos cristãos leigos. A conversão pastoral da paróquia em comunidade de
comunidades supõe o protagonismo dos leigos. O empenho para que haja a participação de
todos nos destinos da comunidade supõe reconhecer a diversidade de carismas, de serviços e
de ministérios dos leigos.
4 . 3 . Transformar as estruturas
A conversão pastoral supõe considerar a importância dos processos participativos de todos os
membros da comunidade. Para desencadear essa participação, é preciso estimular o
funcionamento dos conselhos comunitários e paroquiais de pastoral, bem como a assembleia
paroquial. Igualmente, o conselho de assuntos econômicos da paróquia é determinante para o
bom funcionamento e planejamento financeiro da comunidade. Integrado ao conselho paroquial
de pastoral, o conselho de assuntos econômicos saberá planejar o investimento de recursos nas
urgências e não apenas nos recursos materiais da comunidade. Não pode haver dissonância entre
o conselho paroquial de pastoral e o de assuntos econômicos. Para isso, o conselho paroquial de
27
pastoral será formado por discípulos missionários. O conselho de assuntos econômicos, junto
com toda a comunidade paroquial, trabalhará para obter os recursos necessários de maneira que a
missão avance e se faça realidade em todos os ambientes. Para tanto, é urgente superar a
mentalidade que prioriza construções e obras materiais e abdica de investir na formação das
pessoas. Os leigos precisam ser apoiados, em suas comunidades, seja para a realização de cursos
e encontros, seja para manter a unidade com a Diocese, seja para aprofundar o conhecimento de
seu serviço e de pastoral. A questão da manutenção também exige novas posturas. Comunidades
e paróquias sentem o peso econômico para o sustento das estruturas pastorais. Será preciso
desenvolver fundos de solidariedade entre as paróquias e as comunidades da Diocese. Paróquias
mais antigas e estáveis economicamente têm o dever missionário de partilhar seus recursos, para
que outras comunidades possam crescer e se estabelecer. Não se trata apenas de uma partilha
esporádica, mas de uma forma organizada de ajuda mútua entre as comunidades da mesma
paróquia e entre as paróquias da Diocese. .
4.5. Proposições
Os Bispos, em 2012, falando sobre a Nova Evangelização, alertou que os novos contextos não
implicam inventar novas estratégias para apresentar rmelhor o Evangelho, como se fosse um
novo produto. Muito mais que isso, se trata da importante tarefa de promover o encontro das
pessoas com Jesus Cristo, paraque renovem sua fé e acolham sua proposta de vida.
a) Criatividade. Usar a criatividade para atender melhor as pessoas que vivem em diferentes
ritmos da vida diária. Adaptar-se aos horários do movimento urbano: missas ao meio-dia,
atendimento do padre à noite, catequese de crianças e adultos em horários alternativos,
especialmente nas grandes cidades. Valorizar a beleza e a simplicidade dos espaços da
comunidade, pois o ser humano vive marcado pela cultura do belo. Oferecer espaços para a
meditação, a adoração ao Santíssimo, a oração pessoal. Criar clima favorável e tempos
propícios para quem procura as comunidades cristãs.
b) Pequenas comunidades. Procurar criar novas comunidades a partir de grupos que se reúnem
para viver a sua fé, alimentar sua espiritualidade e crescer na convivência. A setorização pode
ser estabelecida pela vizinhança do bairro ou pelos moradores de condomínios, mas também
por afinidades sem delimitação territorial, como jovens, universitários, idosos, casais, etc. O
importante é criar comunidades com pessoas que se integrem para melhor viver a fé cristã.
c) Ministérios leigos. Para que as comunidades possam ser bem atendidas aos leigos podem ser
confiados ministérios e responsabilidades “para prestar auxílio a toda a iniciativa apostólica e
missionária da sua comunidade eclesial”. Destaque especial deve ser dado ao ministério da
Palavra, por meio do qual homens e mulheres tornam-se autênticos animadores de
comunidades. Para cumprir sua missão, eles precisam estar bem preparados, isto é, terem
sólida formação doutrinal, pastoral e espiritual. Os melhores esforços das paróquias precisam
estar voltados à convocação e a formação dos leigos das comunidades.
28
Considerações finais
Jesus Cristo é nossa razão de ser, origem de nosso agir, motivo de nosso pensar e sentir. Nele,
com ele e a partir dele mergulhamos no mistério trinitário, construindo nossa vida pessoal e
comunitária
(236) A paróquia é a grande escola da fé, da oração, dos valores e dos costumes cristãos. Nela
vive a Igreja reunida em torno do Senhor. Ela existe para unir os cristãos ao seu Senhor e atrair
muitos outros para essa grande família de Deus, a Igreja: sacramento da salvação. Afinal, a
paróquia continua sendo uma referência importante para o povo cristão, inclusive para os não
praticantes. Ela pode se tornar um farol sempre mais luminoso, especialmente em tempos de
incertezas e inseguranças. Na paróquia, cada pessoa deveria ter a possibilidade de fazer o
encontro com Jesus Cristo e integrar-se na comunidade dos seus seguidores.
(237) A paróquia, contudo, precisa de uma renovação urgente. As mudanças da realidade
clamam por uma nova organização, especialmente articulada em pequenas comunidades, capazes
de estabelecer vínculos entre as pessoas que convivem na mesma fé. Entretanto, mesmo
setorizada, a paróquia depende de uma nova evangelização, de uma ousadia missionária capaz de
fortalecer o testemunho e estimular o anúncio. Isso implica renovar o ministério do pároco,
pastor e animador do povo que lhe foi confiado. Ele precisa promover a participação dos leigos
na vida e nas decisões da comunidade. Sugere, também, que se favoreçam os ministérios e os
serviços na comunidade.
30
1. Quero reiterar que nem todas as discussões doutrinais, morais ou pastorais devem ser
resolvidas através de intervenções magisteriais. [3]
2. Devemos ser humildes e realistas, para reconhecer que às vezes a nossa maneira de
apresentar as convicções cristãs e a forma como tratamos as pessoas ajudaram a provocar
aquilo de que hoje nos lamentamos, pelo que nos convém uma salutar reação de autocrítica.
Além disso, muitas vezes apresentamos de tal maneira o matrimônio que o seu fim unitivo, o
31
convite a crescer no amor e o ideal de ajuda mútua ficaram ofuscados por uma ênfase quase
exclusiva no dever da procriação. Também não fizemos um bom acompanhamento dos
jovens casais nos seus primeiros anos, com propostas adaptadas aos seus horários, às suas
linguagens, às suas preocupações mais concretas. Outras vezes, apresentamos um ideal
teológico do matrimônio demasiado abstrato, construído quase artificialmente, distante da
situação concreta e das possibilidades efetivas das famílias tais como são. Esta excessiva
idealização, sobretudo quando não despertamos a confiança na graça, não fez com que o
matrimônio fosse mais desejável e atraente, muito pelo contrário. [36]
3. Durante muito tempo pensamos que, com a simples insistência em questões doutrinais,
bioéticas e morais, sem motivar a abertura para a graça, já apoiávamos suficientemente as
famílias, consolidávamos o vínculo dos esposos e enchíamos de sentido as suas vidas
compartilhadas. Temos dificuldade em apresentar o matrimônio mais como um caminho
dinâmico de crescimento e realização do que como um fardo a carregar a vida inteira. [37]
4. Somos chamados a formar as consciências, não a pretender substituí-las. [37]
5. Muitas vezes agimos na defensiva e gastamos as energias pastorais multiplicando os ataques
ao mundo decadente, com pouca capacidade de propor e indicar caminhos de felicidade.
[38]
6. Nas situações difíceis em que vivem as pessoas mais necessitadas, a Igreja deve ter um
cuidado especial em compreender, consolar e integrar, evitando impor-lhes um conjunto de
normas como se fossem uma pedra, tendo como resultado fazê-las sentir-se julgadas e
abandonadas precisamente por aquela Mãe que é chamada a levar-lhes a misericórdia de
Deus. Assim, em vez de oferecer a força curadora da graça e da luz do Evangelho, alguns
querem “doutrinar” o Evangelho, transformá-lo em “pedras mortas” para as jogar contra os
outros. [49]
7. São Paulo exprime-se em categorias culturais próprias daquela época (cf. Ef 5,22:
“Mulheres, sejam submissas aos seus maridos!”); nós não devemos assumir esta roupagem
cultural, mas a mensagem revelada que subjaz ao conjunto da perícope. [156]
8. 8. A fé não nos tira do mundo, mas insere-nos mais profundamente nele. [181]
9. Quem se abeira do Corpo e do Sangue de Cristo não pode ao mesmo tempo ofender aquele
mesmo Corpo, fazendo divisões e discriminações escandalosas entre os seus membros. [186]
10. Não se deve esquecer que “a mística do sacramento tem um caráter social” (Bento XVI).
Quando os comungantes se mostram relutantes em deixar-se impelir a um compromisso a
favor dos pobres e atribulados ou consentem diferentes formas de divisão, desprezo e
injustiça, recebem indignamente a Eucaristia. [186]
11. Lembro o Dia dos namorados, que, em alguns países, é melhor aproveitado pelos
comerciantes do que pela criatividade dos pastores. [208]
12. Hoje, a pastoral familiar deve ser fundamentalmente missionária, em saída, por
aproximação, em vez de reduzir a ser uma fábrica de cursos a que poucos assistem. [230]
13. [O matrimônio cristão, reflexo da união entre Cristo e a sua Igreja, realiza-se plenamente na
união entre um homem e uma mulher, que se doam reciprocamente com um amor exclusivo
e livre fidelidade, se pertencem até à morte e abrem à transmissão da vida, consagrados pelo
sacramento que lhes confere a graça para se constituírem como igreja doméstica e serem
fermento de vida nova para a sociedade. Algumas formas de união contradizem
radicalmente este ideal, enquanto outras o realizam pelo menos de forma parcial e
analógica]. Os Padres sinodais afirmaram que a Igreja não deixa de valorizar os elementos
32
constitutivos nas situações que ainda não correspondem ou já não correspondem à sua
doutrina sobre o matrimônio. [292]
14. Temos de evitar juízos que não tenham em conta a complexidade das diversas situações e é
necessário estar atentos ao modo em que as pessoas vivem e sofrem por causa de sua
condição. [296]
15. Ninguém pode ser condenado para sempre, porque esta não é a lógica do Evangelho! Não
me refiro só aos divorciados que vivem numa segunda união, mas a todos, seja qual for a
situação em que se encontrem. [297]
16. Não é possível dizer que todos os que estão numa situação chamada “irregular” vivem em
estado de pecado mortal, privados da graça santificante. [301]
17. Um pastor não pode sentir-se satisfeito apenas aplicando leis morais àqueles que vivem em
situações “irregulares”, como se fossem pedras que se atiram contra a vida das pessoas. É o
caso dos corações fechados, que muitas vezes se escondem até por detrás dos ensinamentos
da Igreja para se sentar na cátedra de Moisés e julgar, às vezes com superioridade e
superficialidade, os casos difíceis e as famílias feridas. [305]
18. Em certos casos, poderia haver também a ajuda dos sacramentos. Por isso, aos sacerdotes,
lembro que o confessionário não deve ser uma câmara de tortura, mas o lugar da
misericórdia do Senhor. E de igual modo assinalo que a Eucaristia não é um prêmio para os
perfeitos, mas um remédio generoso e um alimento para os fracos. [Nota 351]
19. Lembremo-nos de que um pequeno passo, no meio de grandes limitações humanas, pode ser
mais agradável a Deus do que a vida externamente correta de quem transcorre os seus dias
sem enfrentar sérias dificuldades. [305]
20. Compreendo aqueles que preferem uma pastoral mais rígida, que não dê lugar à confusão
alguma, mas creio sinceramente que Jesus Cristo quer uma Igreja atenta ao bem que o
Espírito derrama no meio da fragilidade: uma Mãe que, ao mesmo tempo que expressa
claramente a sua doutrina objetiva, não renuncia ao bem possível, ainda que corra o risco de
sujar-se com a lama da estrada. [308]
21. Os pastores, que propõem aos fiéis o ideal pleno do Evangelho e a doutrina da Igreja, devem
ajudá-los também a assumir a lógica da compaixão pelas pessoas frágeis e evitar
perseguições ou juízos demasiado duros e impacientes. O próprio Evangelho exige que não
julguemos nem condenemos (cf. Mt 7,1; Lc 6,37). Jesus “espera que renunciemos a procurar
aqueles abrigos pessoais ou comunitários que permitem manter-nos à distância do nó do
drama humano, a fim de aceitarmos verdadeiramente entrar em contato com a vida concreta
dos outros e conhecermos a força da ternura. Quando o fazemos, a vida complica-se sempre
maravilhosamente” (Evangelii Gaudium 270). [308]
22. Às vezes custa-nos muito dar lugar, na pastoral, ao amor incondicional de Deus. Pomos
tantas condições à misericórdia que a esvaziamos de sentido concreto e real significado, e
esta é a pior maneira de aguar o Evangelho. [311]
23. Por isso, convém sempre considerar “inadequada qualquer concepção teológica que, em
última instância, ponha em dúvida a própria onipotência de Deus e, especialmente, a sua
misericórdia” (Comissão Teológica Internacional 2007). [311]
24. Convido os pastores a escutar, com carinho e serenidade, com o desejo sincero de entrar no
coração do drama das pessoas e compreender o seu ponto de vista, para ajudá-las a viver
melhor e reconhecer o seu lugar na Igreja. [312]
33
novidade pastoral da iniciação catecumenal. Não é de hoje a afirmação da crise paroquial, como
também não são recentes as tentativas de renovação.
É possível um cristianismo sem paróquia? Qual o futuro desta instituição, ou qual a
paróquia do futuro? Ainda há espaço para paróquias? Para além das opiniões a favor ou contra, o
que não é justo é a acusação da falta de esforços e tentativas de renovação da instituição
paroquial ao longo da história, particularmente nas últimas décadas, ainda que as dificuldades de
uma efetiva renovação sejam proporcionais ou superiores aos resultados alcançados. Apesar da
aguda crise paroquial, tal instituição não pode, sem mais, ser descartada. Não se pode, sem mais,
descartar uma instituição de dois milênios. A paróquia ocupa, pois, apesar da crise, um lugar real
e significativo na vida da Igreja. É nela que melhor transparece a dimensão católico-universal da
Igreja, cujas portas não se fecham a nenhuma classe social, econômica, política ou racial.
reiniciação cristã e alimento na fé. Disso resulta que a liturgia, símbolos, homilia se apresentam
na atualidade como potencialidades querigmáticas.
batismo, a atuar na realidade secular, “no vasto campo da política, da realidade social e da
economia, como também da cultura, das ciências, das artes, da vida internacional, dos meios de
comunicação e de outras realidades abertas à evangelização” (DAp 283), verifica-se então que a
formação permanente não é privilégio, mas necessidade, pois o diálogo com esses novos
areópagos exige devido preparo e qualificação.
Sob a iluminação da proposta do catecumenato, há que se ressalvar que tal formação
precisa revestir-se de um novo paradigma. O tradicional paradigma nocional, de transposição de
conhecimentos, já não pode mais ser denominado formativo, pois não se trata apenas de repassar
conteúdos, mas de uma assimilação intelectual e celebrativa dos elementos da fé, isto é, de uma
formação mistagógica.
4.1. Formar-se para formar: o desafio da formação inicial e permanente dos catequistas, dos
agentes de pastoral e do clero
A restauração da iniciação catecumenal traz sérias exigências, entre as quais, e certamente
a mais urgente, a da mudança de mentalidade de todos os agentes nela envolvidos. É dos
catequistas o compromisso maior de entrar na nova lógica da iniciação cristã, no
acompanhamento catecumenal dos adultos.
O desafio, contudo, é o como desta formação, e aqui nos referimos a um renovado processo
formativo à luz do processo formativo catecumenal e em coerência com ele. Optamos pelo
termo formação inicial dos catequistas. A expressão pode soar estranha. Por que formação
inicial, quando se supõe que os catequistas já tenham sido iniciados? O resgate do catecumenato
é recente, o que significa que muitos dos atuais catequistas não conhecem e não foram formados
no novo paradigma de iniciação cristã catecumenal. Apesar de toda boa vontade e doação à
Igreja, nossos catequistas não foram formados na mentalidade catecumenal.
Já expusemos a problemática da execução do catecumenato em determinados ambientes
com mentalidade de catequese tradicional, nos quais ele, apesar de receber o nome de iniciação
cristã catecumenal, consiste somente em repasse de conteúdos. Mais do que falta de vontade dos
catequistas, vale a pena enfatizar isto: a problemática parece estar na lacuna da formação
catecumenal. Engana-se, contudo, quem pensa que basta o conhecimento teórico do Ritual de
Iniciação Cristã de Adultos (RICA). Um dos desafios que o catecumenato enfrenta é formar
catequistas, não somente para a, mas na proposta catecumenal. O catequista que durante vários
anos exerceu o ministério nos moldes da catequese tradicional terá muitas dificuldades para
entrar na nova proposta de iniciação cristã. Urge que o catequista experimente o processo
catecumenal, percorrendo ele mesmo, na condição de catequista, a experiência catecumenal,
saboreando os ritos e símbolos e trazendo para sua formação pessoal a interação conteúdo-
liturgia, fé-vida. Com outras palavras, se os tradicionais “cursinhos” preparatórios aos
sacramentos estão com os dias contados, a tradicional formação de catequistas também está
convocada a assumir novo itinerário que integre conteúdo, mística, palavra, celebração, rito,
experimento.
É no ministério sacerdotal que mais se evidencia a necessidade da formação permanente,
entendida como processo de contínua conversão, de aprofundamento e atualização nas áreas do
saber humano, teológico e bíblico, para dialogar de modo maduro com os diversos níveis de
interlocutores e com as novas linguagens da sociedade plural.
Vale lembrar que a mudança de época atinge também o clero, provocando, muitas vezes,
crise de identidade sacerdotal, o que pode facilmente conduzir aos tão comuns quadros de
carreirismo institucional, entre outras deturpações no exercício do ministério. O tornar-se adulto
na fé, tão enfatizado ao longo do artigo, e o tornar-se adulto no ministério caminham juntos.
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Outro aspecto nem sempre frisado com a devida necessidade diz respeito à formação dos
seminaristas. Nas novas gerações dos presbíteros, verifica-se acentuada tendência ao
clericalismo, quando não ao fundamentalismo, haja vista a preocupação com o rubricismo ou a
ostentação de vestes.
Sem avançar para águas mais profundas em nossa reflexão, importa perceber que, dado
que a estrutura formativa da iniciação à vida cristã está passando pelo processo de reestruturação
sintetizado no catecumenato, também o modelo formativo dos candidatos ao sacerdócio parece
urgir uma revisão. Lamentavelmente, muitos seminaristas assimilam já desde cedo que, no futuro
ministério sacerdotal, serão responsáveis-proprietários de uma paróquia.
Muito poderíamos refletir sobre a urgente conversão estrutural dos ministérios pastorais na
Igreja. Em síntese, permanece sempre o desafio, tendo ciência dos avanços, de buscar a
concretização de uma configuração ministerial que tem sido denominada “comunidade-
ministérios” ou “comunidade-carismas e ministérios”. Não se trata apenas de mudança de
nomenclatura, mas das relações estabelecidas a partir dela. No paradigmacomunidade-ministério,
o acento está na comunidade e na rede de ministérios, carismas e serviços de que ela é portadora.
O centro não são os ministérios ordenados nem os não ordenados, mas o tecido comunitário, em
que todos os ministérios e serviços têm sentido de ser.
Resta ainda apontar alguns elementos da paróquia à luz dos dois últimos tempos da
caminhada catecumenal, a saber, iluminação/purificação e mistagogia. A riqueza catecumenal
consiste em garantir forte densidade orante, mistagógica e experiencial da fé durante todo o
processo formativo. Do início ao fim, o antes, o durante e o depois da recepção dos sacramentos
visam imprimir o caráter mistagógico e orante da iniciação à vida cristã. Os últimos momentos
do itinerário catecumenal, iluminação/purificação e mistagogia, remetem a essa dimensão mais
orante e experiencial da fé, sem dicotomia ou exclusivismo. Trata-se de acento, de ênfase
cronológica, e não de exclusivismo.
Iluminação/purificação, tempo para maior interiorização e conversão no processo
catecumenal, recorda à paróquia o imperativo da conversão pastoral e estrutural. Conversão
pastoral em que ou para quê? À expressão conversão pastoral podem atribuir-se inúmeros
significados, todos legítimos e necessários. O caminho percorrido até o momento, na busca de
novo perfil de paróquia, de certa forma contemplou várias dimensões relativas à expressão.
Conversão para uma paróquia toda ministerial, conversão ao novo estilo formativo, para o
impulso à missionariedade, à colegialidade, a nova mentalidade pastoral que, mais do que
sacramentalizar ou ensinar, proporcione processos pastorais que levem à descoberta e ao
aprofundamento da fé etc. Como síntese de todas as conversões a que a paróquia é convocada,
trazemos agora o termo “mistagogia”, em debate no último tempo do itinerário catecumenal.
Dito de maneira diferente, enfatizaremos, aqui, como que a síntese de todos os aspectos já
mencionados, a conversão pastoral à mistagogia. Percebe-se, portanto, que, com a
expressão conversão pastoral à mistagogia, envolvemos as duas últimas etapas catecumenais:
conversão (iluminação/purificação) e mistagogia.
A experiência ou mistagogia da fé é um direito não somente dos catecúmenos, mas de
todas as pessoas, dos frequentadores assíduos, dos casuais, dos “clientes’’ ou dos afastados da
paróquia. Contudo, bem sabemos que a dimensão experiencial da fé é, sem dúvida, a grande
lacuna na paróquia, seja pelo excesso de atividades, refém de uma infinidade de tarefas, seja pela
forte carga burocrática e institucional, sem proporcionar, na maioria das vezes, a experiência
mistagógica. A afirmação já feita de que grande parte dos já batizados não é iniciada na fé pode
ser retomada agora em perspectiva mistagógica: ou seja, considerável número de batizados
carece de experiência de Deus, de uma religiosidade mais vivencial, cuja consequência é ou o
cumprimento de preceito, ou a busca de serviço religioso, ou o afastamento definitivo da
paróquia. Daí se entende com mais facilidade o porquê de muitos viverem, hoje, uma
espiritualidade fora da instituição paroquial ou mesmo fora da religião.
Quando se alude à mistagogia no catecumenato, à experiência na paróquia ou nas pastorais
e movimentos, independentemente do termo utilizado, trata-se, fundamentalmente, de condição
para o futuro do cristianismo. Vale a pena enfatizar que todo o esforço da busca de renovação
paroquial em andamento, à luz da pedagogia catecumenal, visa favorecer uma profunda
experiência de Deus. Nova linguagem, símbolos, homilias, estrutura, pastorais, serviços e
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movimentos, enfim, qualquer realidade existente na paróquia não são fins em si mesmos, mas
sua pertinência reside na capacidade de gerar experiência mistagógica. Com base na dialética
proposta entre catecumenato e paróquia, com a mesma intensidade que se afirma o novo
paradigma de iniciação à vida cristã voltado à experiência, a estrutura paroquial quer se
reconfigurar, tendo como eixo norteador esta mesma experiência, a fim de se tornar casa da
mistagogia, ou ainda, em tom mais enfático, em estado permanente de mistagogia. Trata-se do
esforço ininterrupto para, em tudo o que a paróquia fizer, favorecer aos fiéis a mistagogia. Do
contrário, o esforço de reorganização paroquial será paliativo, sem tocar as raízes do problema.
Nessa perspectiva, vemos que o círculo dialético vai acontecendo. Do mesmo modo que
mistagogia não é apenas o último tempo do processo da iniciação cristã, mas sua espinha dorsal,
assim também todas as possíveis mudanças estruturais e pastorais na paróquia visam a uma
maior experiência mistagógica de fé. Mistagogia não é algo que a paróquia oferece aos fiéis, mas
é fundamentalmente aquilo no qual ela mesma é chamada a se converter, para, então, poder ser
experimentada como locus da experiência de Deus. Só aí, então, ela será capaz de “oferecer a
todos os nossos fiéis um encontro pessoal com Jesus Cristo, uma experiência religiosa profunda
e intensa” (DAp 226).
Conclusão
Sinteticamente, nosso trabalho esteve assim estruturado: à luz do pré-catecumenato,
refletimos sobre as dimensões missionária e querigmática da paróquia; à luz do catecumenato,
abordamos alguns elementos da formação e dos ministérios; à luz da iluminação/purificação e da
mistagogia, apontamos para as dimensões orante, contemplativa, experiencial, mistagógica na
instituição e nas pastorais paroquiais.
Afirmar que o catecumenato constitui uma pedagogia privilegiada para iniciar na fé não
significa estar nele a solução para o desafio da transmissão da fé. A implantação/consolidação do
catecumenato é algo em construção, assim como a renovação paroquial se encontra nesse mesmo
processo. A paróquia não será uma nova estrutura eclesial de um dia para o outro. Da mesma
forma que não é o decreto da restauração do catecumenato que o fará ser catecumenal, não será a
declaração de uma nova paróquia que a fará ser nova. Trata-se de um processo lento, em que
estão envolvidas diversas dimensões.
BIBLIOGRAFIA
BOROBIO, D. Catecumenato e iniciación cristiana: un desafío para la iglesia de hoy. Barcelona: Centre
de Pastoral Litúrgica, 2007.
CNBB. Ritual de iniciação cristã de adultos. São Paulo: Paulus, 1980.
CNBB. Comunidade de comunidades: uma nova paróquia. São Paulo: Paulinas, 2013 (Doc CNBB, 100).
REINERT, J. Fernandes. Paróquia e iniciação cristã: uma relação urgente. A interdependência entre
renovação paroquial e mistagogia catecumenal. Tese doutoral na PUC- RJ em outubro de 2014.
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Durante os primeiros anos da era cristã, a Igreja foi um organismo vivo, flexível, informal
e crescente. A Igreja primitiva crescia em qualidade e em quantidade continuamente. Os valores
que a norteavam foram se perdendo ao longo dos anos devido às transformações sofridas. Sem
entrar em pormenores históricos, a Igreja iniciou seu processo de institucionalização com o
Imperador Romano Constantino I no século IV e se tornou totalmente imobilizada e ritualística.
Com o passar dos séculos, esses adjetivos se tornaram mais característicos do cristianismo do
que os iniciais da Igreja primitiva, que se perderam.
Séculos mais tarde, se levanta Martinho Lutero propondo um reforma no cristianismo com
o objetivo de retornar às origens da Igreja em Atos. As propostas de Lutero foram consideradas
ousadas demais, levando-o a ser excomungado e considerado um herege. Entre as suas muitas
teses, como a crença fundamental de que a Bíblia era a única fonte de Fé, destaca-se o sacerdócio
universal do crente. Com a formalização da Igreja criou-se a distinção entre o clero e o laicato,
fazendo com que o relacionamento com Deus fosse intermediado pelo ministro especialmente
preparado. A tese de Lutero devolvia o sacerdócio a todos os crentes e não mais restrito ao clero.
Mas apesar de mudanças extraordinárias, muitos dos paradigmas totalmente desvirtuados
da Igreja daquela época ainda permaneceram. Quando analisamos as Igrejas na atualidade, fruto
do movimento protestante de Lutero, vemos claros elementos dessa herança histórica que nem a
Reforma conseguiu reverter. Como a Igreja é um organismo vivo, ela está sempre em processo
de transformação. Entendemos que novas mudanças precisam ser efetivadas para que ela seja
relevante neste momento no nosso mundo.
Na tabela abaixo podemos comparar valores da Igreja primitiva com os do modelo
tradicional vigente nos nossos dias:
Organismo Organização
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Assim, esse modelo tem resgatado o sacerdócio universal de todos os crentes; tem
descentralizado a Igreja pelas casas e pelos líderes e não mais centrada no templo e no pastor;
não se prende mais a prédios e rituais, antes pelo contrário, se encontra livre para crescer em
qualidade e em quantidade. Se há uma maneira de voltarmos às raízes da Igreja, talvez seja esse
o melhor caminho.
Ref. Bibliográfica:
Participando de um curso sobre Leader and Professional Coach, no mês de março de 2015,
com a presença de alguns líderes de diferentes denominações cristãs, escutei pela primeira vez, o
termo “evangelização através de células”. Fiquei muito interessado em saber sobre esta maneira
de evangelizar, extremamente missionária, que vem abrangendo várias denominações religiosas
especialmente algumas correntes evangélicas. Por outro lado, algumas paróquias da nossa Igreja
também vêm usando esta metodologia para evangelizar.
Foi na Coréia, com um ministro evangélico Paul Cho, ligado à Assembleia de Deus, que nasceu
uma fórmula extremamente missionária, um método de evangelização: a organização em células.
Esta estratégia de reuniões nas casas dos membros fazia com que uma Igreja crescesse bastante,
sendo um polo de crescimento, de encontro e evangelização. Um sacerdote americano, o Pe.
Michael Eiveres, de alguma maneira catolicizou o método e, com êxito, importou-o à sua
paróquia.
Assim sendo, no ano de 1987, Pe. Pigi Perini, Pároco de S. Eustórgio, em Milão, foi
conhecer a Paróquia de São Bonifácio, em Pembroke Pines, na Arquidiocese de Miami, e aderiu
radicalmente a este método de evangelização. Nós católicos entendemos que este método tem
como fonte a exortação apostólica de Paulo VI Evangelli Nuntiandi, cuja preocupação é dar uma
consciência missionária a toda a ação da Igreja e fazer com que toda comunidade paroquial seja
missionária.
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Para solidificar esta realidade podemos avaliar as intuições do Papa Francisco, quando era
Arcebispo de Buenos Aires. Em uma entrevista, seu sucessor, o atual Arcebispo Dom Mario
Aurélio Poli, disse que o Papa Bergoglio é um homem de grande oração, amizade cordial e
sincera, que nos faz sentir muito bem ao seu lado e desempenha uma importante obra pastoral. É
um mestre pastor. Ele sempre teve uma grande preocupação e quis que em cada paróquia
houvesse dois ou três sacerdotes, para ter uma forte presença da Igreja entre as pessoas e lugares
e para guiar também a piedade popular.
O Bispo de Roma fala de “uma Igreja em saída de si mesma”. A Igreja “em saída” é uma
Igreja com as portas abertas. Sair em direção aos outros para chegar às periferias humanas não
significa correr pelo mundo sem direção nem sentido (cf. EG, 46). Na Igreja com as portas
abertas “todos podem participar, de alguma forma, da vida eclesial, todos podem fazer parte da
comunidade, e nem sequer as portas dos sacramentos se deveriam fechar por uma razão
qualquer”. (EG, 47.)
Para que tudo isso possa acontecer, o próprio Papa Francisco afirma que os agentes
pastorais estejam “em atitude de saída” (cf. EG, 27) e sejam ousados em tomar iniciativas (cf.
EG, 24) e que contraiam o “cheiro das ovelhas”. São pistas, diretrizes, abertura de horizonte para
a vida paroquial na constituição de células paroquiais.
O Papa Francisco, em setembro de 2015, apontou pistas para entender nossa ação
evangelizadora nesta perspectiva, fazendo um discurso aos membros das células paroquiais de
evangelização. Na ocasião, trouxe alguns pontos que nos ajudam a entender sua eclesiologia de
uma Igreja em Saída que, colocados em prática, levam-nos a vivenciar as Diretrizes Gerais da
Ação Pastoral da Igreja no Brasil quando falam de “paróquia, comunidade de comunidades”.
Para tanto, segundo ele, a “célula” precisa:
1. Ser missionária;
2. Ir ao encontro de todos para anunciar a beleza do Evangelho;
3. Tornar-se uma família na qual se encontra a rica e multiforme realidade da Igreja (cf.
LG, 8);
4. Realizar o encontro nas casas para compartilhar as alegrias e as expectativas que estão
presentes no coração de cada pessoa;
5. Aproximar-se de cada pessoa, pois é uma experiência genuína de evangelização que se
assemelha muito ao que já acontecia nos primeiros tempos da Igreja;
6. Conviver com as pessoas em simplicidade, acolhendo a todos;
7. Fazer da Eucaristia o âmago da missão evangelizadora, de tal forma que cada célula seja
uma comunidade eucarística, onde partir o pão equivale a reconhecer a presença real de
Jesus Cristo no meio de nós;
8. Dar sempre testemunho da ternura de Deus Pai e da sua proximidade a todos,
principalmente a quantos são mais frágeis e sós.
“Constata-se que nos últimos anos está crescendo a espiritualidade de comunhão e que, com
diversas metodologias, não poucos esforços tem sido feitos para levar os leigos a se integrar nas
pequenas comunidades eclesiais, que vão mostrando frutos abundantes. Nas pequenas
comunidades eclesiais temos um meio privilegiado para chegar a Nova Evangelização e para
chegar a que os batizados vivam como autênticos discípulos e missionários de Cristo”
(DAp 307)
1. Conceito de célula
2.1. A Propiciação
Jesus a cumpriu plenamente em Seu corpo físico, pois conforme Romanos 3,24 fomos
“justificados gratuitamente por sua graça, por meio da redenção que há em Cristo Jesus.” Mas
cumpre à Igreja, a cada batizado, fazer Memória através do múnus sacerdotal dado a cada
cristão.
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3. Jesus é o centro
Aspecto essencial da CPE: ela é uma comunhão centralizada em Cristo e em sua missão.
Torna-se importante esclarecer o que a CPE não é, para evitar equívocos prejudiciais:
a) Grupo de devoção ou de oração – Um dos estágios da reunião da CPE é a oração, e sem ela
tudo se tornará fraco e ineficaz; mas CPE não é apenas grupo de oração.
b) Grupo bíblico – A CPE toma como base a partilha da Palavra para se edificar; mas a CPE não
se resume a estudo da Palavra.
c) Grupo de formação ou de doutrina – Na célula acontece o Discipulado dos membros de
acordo com a doutrina católica, mas ela não é apenas isto, um grupo de Catequese.
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d) Pastoral ou Ministério – A CPE busca cumprir os propósitos de Deus e levar seus membros a
serviços e ministérios eclesisais, mas é sobretudo uma comunidade onde o “ser” vem antes do
“fazer”. A CPE não é simplesmente um grupo de trabalho ou serviço.
e) Grupo Social – CPE não é um grupo de cristãos que se gostam, talvez até alheio ao corpo
eclesial. A CPE é base vivificante deste Corpo; ela é uma pequena comunidade que tem a
multiplicação do Corpo de Cristo como objetivo.
A evangelização pelo SCPE reproduz a do início da Igreja, que se reunia no Templo e nas
casas, conforme o livro de Atos: “Diariamente, todos frequentavam o Templo, partiam o pão
pelas casas e, unidos, tomavam a refeição com alegria e simplicidade de coração. Louvavam a
Deus e eram estimados por todo o povo. E, cada dia, o Senhor acrescentava ao seu número mais
pessoas que seriam salvas” (At 2,46-47). Outro versículo dos Atos sintetiza o estilo de vida da
Igreja primitiva: “E, todos os dias, unidos, no pátio do Templo e de casa em casa, eles
continuavam a ensinar e a anunciar a boa notícia a respeito de Jesus, o Messias” (At 5, 42).
Bento XVI comenta: “São mencionados dois lugares de vida da Igreja nascente: para a
pregação e a oração, reúnem-se na Templo, que continua a ser considerado e aceito como a casa
da Palavra de Deus e da oração; por sua vez, a fração do pão – o novo centro “cultual” da
existência dos fiéis – tem lugar nas casas como lugares da assembleia e da comunhão graças ao
Senhor ressuscitado” (Bento XVI: Jesus de Nazaré, vol II). As casas eram assim Igreja e local de
evangelização, o que possibilitou uma grande penetração no mundo e crescimento da Igreja, pois
cada cristão e cada casa era um polo evangelizador. Com as perseguições e a destruição do
Templo, foi somente nas casas que se baseou a extraordinária sobrevivência e difusão do
cristianismo, até a conversão de Constantino, no século IV. Hoje, no mundo, prática e novamente
pagão, esse retomar a estratégia inicial da Igreja “nas casas” e no Templo se mostra inspiração
do Espírito! Note-se a grande característica inicial – ela conta com o leigo assumindo
protagonismo na missão de discípulo evangelizador.
Outra grande vantagem da “Igreja que se reúne nas casas” é que ela torna palpável, visível
e real a Fé vivida pelos cristãos em sua vida. Trata-se de um testemunho vivo e visível – e é isto
o que mais evangeliza, conforme Paulo VI. Ali se poderá “ver” e “saborear” a Boa Nova de
Cristo, tornando-se também escola de discípulos que vivem a Fé, a Esperança e o Amor mútuo,
em Cristo! Não há nas Células, “nas casas”, apenas o Anúncio, mas a Fé “encarnada”, concreta,
que gera uma comunhão feliz e fecunda!
Fonte: internet