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É POSSÍVEL AÇÃO RESCISÓRIA DE DECISÕES PROFERIDAS

PELOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS ?

Douglas Fischer,

Mestrando em Instituições de Direito de Estado na PUCRS.

SUMÁRIO. 1. Tema abordado. 2. Entendimento jurisprudencial. 3. Doutrina. 4. Análise


crítica e conclusões.

1. Tema abordado.

A partir da regra do art. 59 da Lei n° 9.099/95 (“não se admitirá ação rescisória


nas causas sujeitas ao procedimento instituído por esta lei”[1]), conjugada com a norma do
art. 1° da Lei n° 10.259/ 2001 [2] (“São instituídos os Juizados Especiais Cíveis e Criminais
da Justiça Federal, aos quais se aplica, no que não conflitar com esta Lei, o disposto na Lei n°
9.099/95”), poderia-se chegar à conclusão inicial de serem inviáveis ações rescisórias de
decisões proferidas no âmbito dos Juizados Especiais Federais, mas há precedentes
jurisprudenciais e posições doutrinárias que as admitem. Analisar o tema é o propósito –
mesmo que não exaustivo – do presente trabalho.

2. Entendimento jurisprudencial.

Apenas a título ilustrativo – porque são inúmeros –, ora se refere alguns


precedentes jurisprudenciais do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:

PROCESSO CIVIL. QUESTÃO DE ORDEM. AÇÃO RESCISÓRIA. SENTENÇA DO JEF. COMPETÊNCIA


Tratando-se de ação rescisória para desconstituir sentença proferida por juiz federal investido de
jurisdição do Juizado especial, a competência para seu exame é atribuída à Turma Recursal. [3]
AGRAVO REGIMENTAL. AÇÃO RESCISÓRIA. DECISÃO DE JUIZ FEDERAL DO JUIZADO ESPECIAL.
INCOMPETÊNCIA DO TRF. DECLINAÇÃO DE COMPETÊNCIA.
1. Não é o Tribunal Regional Federal (TRF) competente para a revisão das decisões proferidas pela
Justiça Federal Especializada, por não haver vinculação jurisdicional entre os Juízes das Turmas
Recursais e este Tribunal.
2. Em razão dos princípios da celeridade e economia processual se justifica a declinação de
competência, devendo ser encaminhado para a Turma Recursal respectiva. [4]
PROCESSO CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. JEF. COMPETÊNCIA.
Compete à Turma Recursal do Juizado Especial o exame da ação rescisória que visa à desconstituição
de sentença proferida pelo juizado, uma vez que não há vinculação entre os Juizados Especiais
Federais e a Justiça Federal comum e, portanto, não há que se falar em desconstituição de julgado de
um órgão por outro. [5]
PROCESSO CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. JEF. DECISÃO DA TURMA RECURSAL. COMPETÊNCIA.
Cuidando-se de rescisória que ataca acórdão proferido pelo colegiado revisor do Juizado Especial
Federal, a competência para seu exame é atribuída ao próprio órgão.
Aplicação analógica de precedente do colendo STJ que, em se tratando da Justiça Estadual, decidiu não
haver vinculação entre o segundo grau do Juízo Especializado e o Tribunal local.[6]

Para uma melhor compreensão dos fundamentos jurídicos consolidados nas


ementas dos julgados, fundamental analisar voto-condutor proferido no julgamento da
Questão de Ordem na Ação Rescisória n° 2004.04.01.005096-0-PR, que tem amparado nos
seguintes fatos e argumentos:

Trata-se de ação rescisória ajuizada pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, com
fundamento no art. 485, V, do Código de Processo Civil, objetivando rescindir sentença prolatada pelo
MM. Juiz Federal do Juizado Especial Federal Cível da Circunscrição Judiciária de Ponta Grossa/PR.
Preliminarmente, sustenta que a vedação à propositura da rescisória no âmbito do juizado
especial é inconstitucional, ferindo o art. 108, I, " b" , da Constituição Federal, bem como seus arts. 5º,
caput, e 37, caput.
Pede, pois, a declaração de inconstitucionalidade do art. 59 da Lei nº 9.099/95, que teve
seu alcance jurídico ampliado com a entrada em vigor da Lei nº 10.259/01. No mérito, sustenta a
inicial que o acórdão rescindendo violou o art. 2º da CF, os arts. 195, §5º, da CF, e 125 da Lei nº
8.213/91, assim como os arts 194, IV, e 201, §4º, da CF.
Citado, o réu apresentou resposta (fls. 96-101), postulando a improcedência do pedido
relativo à declaração de inconstituicionalidade do art. 59 da Lei n.º 9.099/95. No mérito, requer a
improcedência da ação.
O benefício da assistência judiciária gratuita foi deferido à parte ré na fl. 106.
A Procuradoria Regional da República a 4ª Região ofertou parecer, opinando pela
procedência da ação (fls. 110/111).
É o relatório.
Trago o feito em mesa.
VOTO
A hipótese vertente versa sobre a rescisão de sentença proferida pela Justiça Federal
Especializada, cujas decisões não se submetem à revisão por parte desta Corte, por não haver
vinculação jurisdicional entre os Juizes das Turmas Recursais e este Tribunal.
Os Juizados Especiais Federais constituem um microssistema dentro da Justiça Federal.
Conquanto nela estejam inseridos, a despeito de sua inegável hierarquia administrativo-funcional em
relação aos Tribunais Regionais Federais (v.g., arts. 18, 21, 22 e 26 da Lei nº 10.259/01), os Juizados
Especiais Federais têm, quanto ao aspecto jurisdicional, estrutura peculiar e apartada, além de
princípios próprios (art. 2º da Lei nº 9.099/95). Essa a razão pela qual as decisões proferidas por
Juízes Federais investidos de jurisdição nos Juizados Especiais Federais não estão submetidas à revisão
pelos Tribunais Regionais Federais. Nesse sentido, os seguintes precedentes do STF e do STJ,
aplicáveis, mutatis mutandis, ao caso em testilha:
DIREITO CONSTITUCIONAL, PENAL E PROCESSUAL PENAL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA,
ENTRE A TURMA RECURSAL DO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL DA COMARCA DE BELO HORIZONTE E O
TRIBUNAL DE ALÇADA DO ESTADO DE MINAS GERAIS. COMPETÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE
JUSTIÇA PARA DIRIMI-LO (ART. 105, I, 'd', DA C.F.). E NÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (ART.
102, I, 'o').
1. As decisões de Turma Recursal de Juizado Especial, composta por Juízes de 1° Grau, não estão
sujeitas à jurisdição de Tribunais estaduais (de Alçada ou de Justiça).
2. Também as dos Tribunais de Alçada não se submetem à dos Tribunais de Justiça. [...]" (STF,
Plenário, CC nº 7081/MG, Rel. Min. Sydney Sanches, julgado em 19/08/2002, DJU 27/09/2002)
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. TURMA RECURSAL E TRIBUNAL DE ALÇADA DO MESMO
ESTADO. COMPETÊNCIA DO STJ PARA DIRIMIR O CONFLITO. INTELIGÊNCIA DO ART. 105, I, d, da CF.
DECISÃO PLENÁRIA DO STF. PRECEDENTES DO STJ. CRIME DE PREVARICAÇÃO. INFRAÇÃO DE MENOR
POTENCIAL OFENSIVO. ART. 2º, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI N.º 10.259/01. RECURSO DE APELAÇÃO.
JULGAMENTO SOB A ÉGIDE DA LEI NOVA. NORMA PROCESSUAL. INCIDÊNCIA IMEDIATA.
1. A Eg. Terceira Seção, em consonância com o Plenário da Suprema Corte, consolidou o entendimento
de que, por não haver vinculação jurisdicional entre Juízes das Turmas Recursais e o Tribunal local (de
Justiça ou de Alçada) - assim entendido, porque a despeito da inegável hierarquia administrativo-
funcional, as decisões proferidas pelo segundo grau de jurisdição da Justiça Especializada não se
submetem à revisão por parte do respectivo Tribunal - deverá o conflito de competência ser decidido
pelo Superior Tribunal de Justiça, a teor do art. 105, inciso I, alínea d, da Constituição Federal, que
dispõe ser da competência deste Tribunal processar e julgar, originariamente, 'os conflitos de
competência entre quaisquer tribunais, ressalvado o disposto no art. 102, I, o, bem como entre
tribunal e juízes a ele não vinculados e entre juízes vinculados a tribunais diversos'." [...] (STJ, 3ª
Seção, CC nº 39876/PR, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 26/11/2003, DJU 19/12/2003)
Dessa forma, a teor do disposto nos artigos 102, I, j e 105, I, e, da Constituição Federal, a
rescisão das decisões proferidas pelos órgãos judiciários compete a si próprios, quando colegiados, ou
àquele de hierarquia superior ao que proferiu o julgado.
Em consonância com tais dispositivos constitucionais e amparada em decisão do Superior
Tribunal de Justiça, com as mencionadas acima, a Terceira Seção deste Tribunal proferiu entendimento
expresso nos seguintes termos:
PROCESSO CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA, SENTENÇA DO JEF. COMPETÊNCIA. Tratando-se de rescisória
que ataca sentença proferida por juiz federal investido de jurisdição do Juizado Especial, a competência
para seu exame é atribuída às Turmas Recursais.
Inteligência do artigo 493 do Código de Processo Civil. (Questão de Ordem na AR nº
2004.04.01.005199-0/PR, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Victor Luiz do Santos Laus, julgado em 13-05-
2004).
Conseqüentemente, a matéria não merece maiores digressões, razão pela qual suscito questão
de ordem que solvo no sentido de declinar da competência para a Turma Recursal da Seção Judiciária
de Paraná. É o voto.”

Em seu voto na Questão de Ordem na Ação Rescisória n° 2004.04.01.012533-


9/PR, o Desembargador Federal Celso Kipper acrescentou:

De outra banda, ainda que não desconheça a disposição contida no art. 59 da Lei nº 9.099/95,
que veda a proposição de ação rescisória nos Juizados Especiais, cuja manutenção configuraria afronta
aos princípios regentes do microssistema, sobretudo da economia processual e da celeridade, e por
conseguinte afastaria o escopo perseguido pelo legislador, qual seja o de limitar as dilações indevidas
no processo, quem teria competência para afirmar o não-cabimento da ação, como já dito, é a própria
Turma Recursal.

Recentemente o Superior Tribunal de Justiça, analisando recurso especial


interposto contra decisões do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, assim se pronunciou:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. TRF'S. DECISÕES ADVINDAS DA JUSTIÇA ESPECIALIZADA.


JULGAMENTO. INCOMPETÊNCIA. ARTIGOS 98 DA CF E 41 DA LEI 9.099/95. INTELIGÊNCIA. TURMA
RECURSAL. COMPETÊNCIA. JUIZADO ESPECIAL FEDERAL. REVISÃO DOS JULGADOS. PRECEDENTE.
VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. AUSÊNCIA. CONCLUSÃO LÓGICO SISTEMÁTICA DO DECISUM.
INCOMPETÊNCIA. IMPUGNAÇÃO. INOCORRÊNCIA. JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS. LEI 9.099/95.
APLICABILIDADE. NÃO APRECIAÇÃO. RECURSO NÃO CONHECIDO.
I - Escorreita a decisão do Eg. Tribunal Regional Federal da 4ª Região ao asseverar não ser competente
para o caso vertente, tendo em vista não se inserir a hipótese no comando do artigo 108, inciso I,
alínea " b" da Constituição Federal. Neste sentido, os juízes integrantes do Juizado Especial Federal não
se encontram vinculados ao Tribunal Regional Federal. Na verdade, as decisões oriundas do Juizado
Especial, por força do sistema especial preconizado pela Carta da República e legislação que a
regulamenta, submetem-se ao crivo revisional de Turma Recursal de juízes de primeiro grau.
II - Segundo o artigo 98 da Constituição Federal, as Turmas Recursais possuem competência exclusiva
para apreciar os recursos das decisões prolatadas pelos Juizados Especiais Federais. Portanto, não cabe
recurso aos Tribunais Regionais Federais, pois a eles não foi reservada a possibilidade de revisão dos
julgados dos Juizados Especiais.
III - A teor do artigo 41 e respectivo § 1º da Lei 9.099/95 (aplicável aos Juizados Especiais Federais,
por força do artigo 1º da Lei 10.259/01), os recursos cabíveis das decisões dos juizados especiais
devem ser julgados por Turmas Recursais.
IV - No RMS. 18.433/MA, julgado por esta Eg. Turma recentemente, restou assentado o entendimento
de que os Juizados Especiais foram instituídos no pressuposto de que as respectivas causas seriam
resolvidas no âmbito de sua jurisdição. Caso assim não fosse, não haveria sentido sua criação e,
menos ainda, a instituição das respectivas Turmas Recursais, pois a estas foi dada a competência de
revisar os julgados dos Juizados Especiais.
V - Descabida a interposição do recurso especial com base no art. 535 do Código de Processo Civil, sob
a alegação de pretensa omissão, quando a matéria objeto do recurso restou apreciada à exaustão pela
instância a quo.
VI - Ademais, compete ao magistrado fundamentar todas as suas decisões, de modo a robustecê-las,
bem como afastar qualquer dúvida quanto a motivação tomada, tudo em respeito ao disposto no artigo
93, IX da Carta Magna de 1988. Cumpre destacar que deve ser considerada a conclusão lógico-
sistemática adotada pelo decisum, como ocorre in casu. Precedentes.
VII - Evidencia-se, ainda, inviável a apreciação de qualquer defeito na decisão atacada, tendo em vista
ter o Tribunal de origem declinado de sua competência em favor da Turma Recursal da Seção Judiciária
do Paraná. Desta forma, seria o caso de o Instituto Previdenciário impugnar diretamente o fundamento
da incompetência e não alegar ofensa ao artigo 535 do Código de Processo Civil. Precedente.
VIII - No tocante à violação ao artigo 1º da Lei 10.259/01, descabido seu conhecimento em sede de
recurso especial, porquanto a Corte Regional limitou-se a declinar de sua competência à Turma
Recursal, sem apreciar a questão da aplicabilidade ou não da Lei 9.099/95 no âmbito dos Juizados
Especiais Federais. Em conseqüência, não se examinou a possibilidade do ajuizamento de ação
rescisória na esfera dos Juizados Especiais Federais.
IX - Recurso especial não conhecido.[7]

Ao passo em que não têm explicitamente se manifestado sobre o cabimento ou


não de ações rescisórias dos julgados emanados dos Juizados Especiais Federais, pode-se
concluir que tanto o TRF/4 como o STJ reconheceram que: a) as decisões proferidas por
Juízes Federais investidos de jurisdição nos Juizados Especiais Federais não estão submetidas
à revisão pelos Tribunais Regionais Federais; b) a teor do disposto nos artigos 102, I, “j” e
105, I, “e”, da Constituição Federal, a rescisão das decisões proferidas pelos órgãos
judiciários compete a si próprios, quando colegiados, ou àquele de hierarquia superior ao que
proferiu o julgado.

3. Doutrina.

Joel Dias Figueira Júnior e Maurício Antônio Ribeiro Lopes [8] são expressos ao
assentar que “não encontramos razões plausíveis para excluir a ação rescisória do elenco dos
meios de impugnação contra as decisões proferidas nestes Juizados, porquanto não nos
parece razoável admitir (seria até ingenuidade) que os Juízes de primeiro grau ou os Colégios
Recursais não incidirão jamais em quaisquer das hipóteses figuradas no art. 485 do CPC.
Assim como a estabilidade da relação jurídica entre as partes litigantes depende no futuro,
após a decisão definitiva, da segurança da coisa julgada, a manutenção no mundo jurídico de
sentenças proferidas ao arrepio da Lei ou dos verdadeiros fatos causam, sem dúvida, o efeito
reverso” [9] .

Reconhecendo se tratar de primeiro caso no ordenamento jurídico em que se


veda a ação rescisória num juízo de mérito, Felippe Borring Rocha [10] sustenta que para se
ver o absurdo desta situação, basta imaginar ação julgada por juiz impedido, suspeito ou
corrupto, ou que ofenda a coisa julgada, a lei etc. Muito mais razoável seria, por exemplo,
diminuir o prazo da ação rescisória ou seu campo de abrangência, mas não suprimi-la. Isto
pode gerar situações absurdas e incompatíveis com os ditames do devido processo legal
(...)”, motivo pelos quais considera inconstitucional referido dispositivo. A solução que
apresenta seria a adoção do mandado de segurança com efeitos rescisórios.

Alex Perozzo Boeira [11] defende que o impedimento da ação rescisória viola
literalmente o disposto na alínea “b” do inciso I do artigo 108 da Constituição Federal [12],
bem assim que a competência para apreciar tais pedidos é dos Tribunais Regionais Federais.
Enfatiza que “muito embora as Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais gozem da
competência para o julgamento dos recursos previstos nos arts. 4° e 5° da Lei n° 10.259/01
(recurso contra medida cautelar e contra a sentença definitiva, respectivamente), a previsão
da Carta Maior quanto ao manejo do remédio rescisório é imperativa e inafastável”,
concluindo que “não se pode olvidar que (...) a decisão trânsita em julgado, objeto da
demanda constitutiva negativa, deve gozar da natureza de sentença de mérito, proferida por
magistrado federal”.

4. Análise crítica e conclusões.

Tem-se que a análise da matéria passa necessária e inicialmente pelo exame da


constitucionalidade da regra do artigo 59 da Lei n° 9.099/95 – não afastada pela Lei n°
10.259/01 - , na medida em que veda a possibilidade de ações rescisórias no âmbito dos
julgados proferidos pelos Juizados Especiais Federais. E acaso se reconheça a possibilidade do
instituto fundamental se saber de quem seria a competência para o julgamento, na medida
em que a alínea “b” do inciso I do artigo 108 da Carta Maior estabelece ser dos Tribunais
Regionais Federais a competência para o julgamento de ações rescisórias proferidas por
magistrados federais.

Após o advento da Lei n° 9.099, no ano de 1995, inaugurou-se nova fase no


mundo jurídico brasileiro com a criação de verdadeiro microssistema de natureza
instrumental, atendendo à imposição constitucional do inciso I do artigo 98: “A União, no
Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão: I – juizados especiais, providos por
juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a
execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial
ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas
em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau”, sendo
que, em seu parágrafo único (incluído pela Emenda Constitucional n° 22, de 18/03/1999)
consta que “Lei federal disporá sobre a criação de juizados especiais no âmbito da Justiça
Federal”.

As leis que ora se analisam, editadas por expressa autorização constitucional,


são marcadas – assim reconhecido no próprio artigo 2° da Lei n° 9.099/95 – pelos princípios
da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, podendo-se
cogitar da aplicação subsidiária de outras regras, especialmente do Código de Processo Civil,
apenas quando houver omissão legislativa que trata do microssistema ou quando se verificar
a incompatibilidade da regra específica com os princípios constitucionais orientadores dos
Juizados Especiais.

Assim, a questão que reclama solução inicial é saber se a limitação imposta pelo
artigo 59 da Lei n° 9.099/95 atenta contra princípios constitucionais, especialmente os do
devido processo legal, contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes
(art. 5°, incisos LIV e LV, CF/88).

Tem-se que a resposta é negativa.

Registre-se que ação rescisória não é recurso. Depois, não se pode afastar o
norte de que, como inclusive reconhecem Joel Dias Figueira Júnior e Maurício Antônio Lopes
[13], para que se tenha êxito na aplicação da Lei dos Juizados Especiais se torna
imprescindível uma readaptação de concepções consagradas válidas para o macrossistema do
Código de Processo Civil, sem que, por óbvio, implique em negativa aos ditames
constitucionais.

Na análise da Constituição, é preciso analisar seus dispositivos não de forma


isolada, mas sistematicamente. Na seara criminal, há previsão expressa em vários
dispositivos constitucionais do denominado foro por prerrogativa de função (v.g. arts. 102, I,
“a”, “b” e “c”, 105, I, “a”, 108, I, “a”). Em face da primeira delas, por exemplo, membro do
Congresso Nacional que venha praticar infração penal comum não terá direito a recurso a
instâncias superiores, já que seu foro natural é o próprio Supremo Tribunal Federal, sem que
com isto se cogite de violação ao princípio da ampla defesa, que, expressamente, prevê a
possibilidade de recursos, desde que a ela inerentes. Por paradoxal que possa parecer, é do
sistema, visto como um todo, que deflui tal conclusão. Diga-se, apenas a título
exemplificativo ainda, que a Corte Suprema reiteradamente se tem manifestado no sentido de
que não há garantia constitucional ao duplo grau de jurisdição [14]. Humberto Theodoro
Júnior também enfatiza que “não vigora, em princípio, para os processos de competência
originária dos tribunais, o princípio da dualidade de jurisdição”[15].

A partir deste exemplo, quer-se demonstrar que não se admitir ações rescisórias
de decisões proferidas no âmbito dos Juizados Especiais Federais não significa violação de
princípios constitucionais da ampla defesa, contraditório e devido processo legal, na medida
em que, como dito, estes princípios não podem ser analisados de formas estanque e absoluta,
bem assim porque a própria Constituição remete à legislação ordinária o estabelecimento de
quais as regras que norteiam os Juizados Especiais Federais.

Não se pode deixar de considerar como plausível a advertência de Felippe Rocha


[16] no sentido de que, excepcionalmente, uma ação ser julgada no âmbito dos Juizados
Especiais por juiz impedido, suspeito ou corrupto, ou ainda que ofenda a coisa julgada e a lei.
Mas a solução para o problema não passará pela via rescisória [17], devendo-se relevar o
risco que aceitou o legislador em se deparar com situações deste jaez em homenagem aos
princípios estampados no artigo 2° da Lei n° 9.099/95 por derivação de mandamento
constitucional.

Apenas a título argumentativo, ainda, acaso se admita a possibilidade de


rescisão, tem-se que a competência não será dos Tribunais Regionais Federais, e sim das
próprias Turmas Recursais dos Juizados Federais. Tal conclusão não significa dar
interpretação ampliativa e estipular competência diversa daquela prevista constitucionalmente
no artigo 108, I, ´b´, como defende Alex Perozzo Boeira. Ao contrário, significa dar
interpretação sistemática a um ordenamento que não teria condições de prever todas as
hipóteses e eventuais colisões principiológicas, sobretudo quando remeteu para a legislação
ordinária a fixação do sistema da funcionalidade dos Juizados Especiais. A propósito, observe-
se que a Constituição da República prevê que está excluído da competência federal o
julgamento de contravenções penais (artigo 109, IV, in fine), bem assim que os Tribunais
Regionais Federais julgarão juízes federais de sua jurisdição nos crimes comuns e de
responsabilidade (nada fala de contravenções praticadas por eles). O Superior Tribunal de
Justiça, contudo, vem reconhecendo ser competência dos TRF´s o julgamento de
contravenções penais praticadas por agentes que detenham referido foro por prerrogativa de
função [18] [19]. Ainda: malgrado à míngua de disposição constitucional [20] – mas em
decorrência de interpretação sistemática – o Supremo Tribunal Federal tem exarado seu
posicionamento que habeas corpus impetrado em detrimento de ato praticado por Procurador
da República deve ser julgado pelo Tribunal Regional Federal respectivo [21].

É do sistema constitucional que as ações rescisórias – quando admitidas – são


julgadas pelo próprio órgão colegiado que proferiu a decisão rescindenda ou que o órgão
plúrimo aprecie as causas rescindendas em instâncias inferiores, mas que estariam sujeitos à
sua alçada recursal. É o que se deduz, v.g., do disposto nos arts. 102, I, “j” [22], 105, I, “e”
[23] e 108, I, “b” [24], da Constituição Federal.

Nesta senda, mesmo que não previsto constitucionalmente, se admitidas –


reitera-se posição pelo descabimento - , as rescisórias ajuizadas contra sentenças proferidas
por juízes singulares ou por turmas recursais integrantes dos Juizados Especiais Federais são
de competência destas últimas´.

[1] Dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais e dá outras


providências.

[2] Dispõe sobre a instituição dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais no âmbito
da Justiça Federal..

[3] Questão de Ordem na Ação Rescisória n° 2004.04.01.005096-0-PR, Rel. Juiz


José Paulo Baltazar Júnior, 3ª Seção do TRF/4ª Região, unânime, DJU 23/02/2005, p. 385.
[4] Agravo Regimental na Ação Rescisória n° 2004.04.01.012531-5, Rel. Des. Federal
Victor Luiz dos Santos Laus, 3ª Seção, DJU 12/01/2005, p. 591.
[5] Questão de Ordem na Ação Rescisória n° 2004.04.01.012533-9-PR, Rel.Des. Federal
Celso Kipper, 3ª Seção, DJU 08/09/2004, p. 346.
[6] Ação Recisória n° 2003.04.01.015418-9-PR, Rel. Des. Federal Victor Luiz dos
Santos Laus, 3ª Seção, por maioria, vencido Des. Federal Néfi Cordeiro e com ressalva
de entendimento do Des. Federal Nylson Paim de Abreu, DJU 02/06/2004, p. 488.

[7] Recurso Especial n° 722.237-PR, Rel. Ministro Gilson Dipp, 5ª Turma,


unânime, DJU 23/05/2005.

[8] Comentários à Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, 3.ed., São
Paulo: RT, 2000, p. 407.

[9] Este mesmo entendimento é consignado na obra Juizados Especiais Federais


Cíveis e Criminais, de Fernando da Costa Tourinho Neto e Joel Dias Figueira Júnior, São
Paulo: RT, 2002, p. 381.

[10] Juizados Especiais Cíveis – Aspectos Polêmicos da Lei n° 9.099, de


26/09/1995, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2000, p. 214-215

[11] Ação rescisória de decisão proferida em Juizado Especial Federal: viabilidade


e competência para julgamento, artigo publicado em 16/05/2005 na Revista da Escola da
magistratura do TRF da 4ª Região, site http://www.revistadoutrina.trf4.gov.br/, acesso em
17/10/2005.

[12] “Art. 108. Compete aos Tribunais Regionais Federais: I – processar e julgar,
originariamente: (...) b) as revisões criminais e as ações rescisórias de julgados seus ou dos
juízes federais da região”.

[13] Op. cit., p. 45.

[14] Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n° 513.044-SP, Rel. Min.


Carlos Velloso, julgado em 22/02/2005, DJU 08/04/2005, p. 31; Recurso Extraordinário n°
356.287-SP, Rel. Min. Moreira Alves, 1ª Turma, DJU 07/02/2003, p. 47.

[15] Curso de Direito Processual Civil, v. 1, 6.ed., Forense: Rio de Janeiro, p.


657.

[16] Op. cit., p. 215.

[17] Artigo 485, incisos I, II, IV e V, do CPC.

[18] Ação Penal nº 290-PR, Rel. Ministro Félix Fischer, Corte Especial, DJU
26/09/2005.

[19] Em nosso entendimento, de forma correta, pois sempre que princípios de


fixação de competência ratione personae conflitarem com outros ratione materiae, há de
prevalecer os primeiros.

[20] Art. 108. Compete aos Tribunais Regionais Federais: I – processar e julgar,
originariamente: (...) d) os habeas corpus, quando a autoridade coatora for juiz federal.

[21] “Recurso extraordinário. Competência para processar e julgar habeas


corpus impetrado contra ato de membro do Ministério Público Federal.
Ambas as Turmas desta Corte (assim, nos RREE 141.209 e 187.725) têm
entendido que, em se tratando de “habeas corpus” contra ato de Promotor de Justiça
Estadual, a competência para julgá-lo é do Tribunal de Justiça por ser este competente para
seu julgamento quando acusado de crime comum ou de responsabilidade. O fundamento
dessa jurisprudência – como salientado pelo eminente Ministro Néry da Silveira no RE
187.725 – “foi sempre o de que da decisão do habeas corpus pode resultar afirmação de
prática de ilegalidade ou de abuso de poder pela autoridade” e isso porque “ao se conceder o
habeas corpus, se se reconhecer, expressamente, que a autoridade praticou ilegalidade,
abuso de poder, em linha de princípio, poderá configurar-se crime comum. Dessa maneira, a
mesma autoridade que julgar o habeas corpus será a competente para o processo e
julgamento do crime comum, eventualmente, praticado pela autoridade impetrada”.

No caso, em se tratando, como se trata, de habeas corpus contra membro do


Ministério Público Federal que atua junto a Juízo de primeiro grau, e tendo em vista que, em
virtude do disposto no art. 108, I, “a”, da Constituição, compete aos Tribunais Regionais
Federais processar e julgar originariamente esses membros, a esses Tribunais compete,
também, por aplicação do mesmo fundamento, julgar os habeas corpus impetrados contra
essas autoridades.

Recurso extraordinário conhecido e provido.” (STF, 1ª Turma, RE nº 285.569-


3/SP, rel. Min. Moreira Alves, DJU 16.03.01, Seção 01, p. 102).

[22] “Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da


Constituição, cabendo-lhe: I – processar e julgar, originariamente: (...) j) a revisão criminal e
a ação rescisória de seus julgados”.

[23] “Compete ao Superior Tribunal de Justiça: I – processar e julgar,


originariamente: (...) e) as revisões criminais e as ações rescisórias de seus julgados”.

[24] “Compete aos Tribunais Regionais Federais: I – processar e julgar,


originariamente: (...) b) as revisões criminais e as ações rescisórias de julgados seus ou dos
juízes federais da região”.

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