Documentos de Académico
Documentos de Profesional
Documentos de Cultura
Resumo:
O Processo de Bolonha induziu alterações significativas nos modos de ensinar, de
avaliar e de aprender no Ensino Superior, conduzindo à reconfiguração do papel do
estudante e do docente. A literatura sobre esta temática destaca a importância da
articulação entre o ensino e a avaliação para a melhoria das aprendizagens dos
estudantes, salientando que a introdução de métodos de ensino-aprendizagem em
que estes tenham uma participação ativa no processo tem impactos positivos na
avaliação (Alves, 2011). Orientados por esta problemática, realizámos uma
investigação qualitativa, cujo corpus é constituído por 310 artigos em periódicos,
abrangendo o período entre 2006-2008. Utilizou-se a análise de conteúdo (Bardin,
1977) para redução e categorização dos dados. Os resultados revelam que as
Tecnologias da Informação e da Comunicação suportam muitos programas de
avaliação das aprendizagens, quer em contextos presenciais, quer a distância; a
avaliação formativa tem cada vez maior implementação e as práticas de autoavaliação
e o feedback assumem um lugar central; a avaliação por pares e a utilização de
portefólios são métodos inovadores que possibilitam ao estudante ser construtor da
sua própria formação, uma vez que lhe é dada a oportunidade de analisar e negociar
os critérios que estarão na base da avaliação. Por seu lado, o docente assume-se
como um facilitador deste processo, ao reunir as condições e os espaços que
permitam ao estudante problematizar, investigar, questionar, propor e descobrir.
Introdução
1
Referência PTDC/CPE-CED/114318/2009.
Assiste-se, hoje, a uma mudança dos processos de ensino-aprendizagem,
consignando ao estudante um papel mais ativo na construção das suas
aprendizagens e ao docente a responsabilidade de criar condições para que isso
aconteça. Estas alterações enquadram-se numa mudança de paradigma educacional,
em que se procura passar de uma perspetiva objetivista ou técnica de ensino e
avaliação (Rodrigues, 2002), associada a objetivos e a fins a atingir, para uma
perspetiva mais dialética ou crítica (idem), que valoriza, essencialmente, o estudante
e a sua aprendizagem.
Este contexto justificou, por si só, uma revisão da literatura que permitisse
identificar o estado da arte nestes domínios e propiciar um conjunto de subsídios
teóricos que serviram de base à construção do texto que a seguir se apresenta. Uma
vez que este texto é o resultado de uma tarefa específica do projecto referenciado,
reporta-se a uma análise dos artigos publicados em periódicos da especialidade,
publicados no período compreendido entre 2006 e 2008.
2
Os ECTS (European Credit Transfer and Accumulation System – Sistema Europeu de Acumulação e
Transferência de Créditos) constituem um sistema de medida que estabelece, em média, o número
estabelecem uma equivalência de graus e mobilidade de estudantes e docentes a
nível europeu e permitem aos estudantes fazerem uma parte do seu percurso
académico num outro país. Em Portugal, foi através do Decreto-Lei nº 42/2005, de
22 de fevereiro, que se introduziu o sistema de ECTS, reconhecendo que este
“constitui um dos instrumentos mais relevantes desta política europeia de evolução
do paradigma formativo”. Contrariamente ao sistema tradicional, os ECTS são
contabilizados tendo em conta o volume integral de trabalho do estudante (aulas,
estudo individual, seminários, trabalho de campo, entre outras atividades), o que
obriga a uma reconfiguração dos papéis do estudante e do docente, inserindo-se na
mudança de paradigma educacional que referíamos atrás. A aplicação do sistema
ECTS pressupõe “uma definição prévia clara dos saberes a serem adquiridos – os
conhecimentos gerais e específicos e as competências, atitudes e valores” (Simão,
2002, p. 257), com vista ao reconhecimento da equivalência académica dos estudos
realizados noutras instituições de Ensino Superior pertencentes ao Espaço Europeu.
No contexto atual, marcado pela intensificação de mudanças aos mais diversos
níveis e pelo aprofundamento do fenómeno da globalização, torna-se imprescindível
que as instituições de Ensino Superior, bem como os agentes que nelas se inserem,
sejam capazes de lidar com as complexas exigências da sociedade, os avanços do
conhecimento científico e os desafios da empregabilidade e do empreendedorismo.
Neste sentido, o Ensino Superior, nomeadamente as universidades, deverão ampliar
a sua influência sobre a aquisição de competências profissionais, pois “já não é o
diploma em si que determina o nível de conhecimento e competências que o
diplomado possui” (Zabalza, 2004, p. 69), na medida em que a universidade embora
tendo uma importante função no processo de formação não o esgota.
É nesta ordem de ideias que os discursos sobre a mudança educativa nos
remetem para a necessidade de adoptar práticas curriculares inovadoras, só
passíveis de concretizar na base de um paradigma de ensino-aprendizagem que faça
da flexibilização curricular, do desenvolvimento de competências e da articulação
curricular os seus principais esteios.
de horas que cada estudante tem de trabalhar para alcançar os objectivos do programa de estudos,
especificados em resultados de aprendizagem e competências a adquirir.
Para que isso seja possível, é necessário que o currículo seja entendido como
uma proposta de trabalho aberta que ganha sentido nos processos de acção e de
interacção que ocorrem no seio da instituição educativa e que os professores e os
estudantes se assumam como decisores curriculares.
Por seu turno, a flexibilização curricular, enquanto pressuposto inerente à
mudança e melhoria dos processos de ensino e de aprendizagem, pressupõe que
professores e estudantes se apropriem da gestão do currículo e se envolvam na
construção, operacionalização e avaliação de projectos curriculares adequados às
situações reais (Roldão, 2000), que, por permitirem conferir sentido e significado ao
que se aprende na escola, concorrem para tanto para uma maior igualdade de
oportunidades, quanto para o sucesso de todos os que neles participam.
Importa referir que a flexibilização do currículo é uma via propícia para a sua
articulação, possibilitando aos estudantes que intervêm nesse processo a tomada de
consciência sobre a pluralidade disciplinar que caracteriza os seus percursos
formativos e o desenvolvimento de competências de tomada de decisão, essenciais
para o desenvolvimento da autonomia, da criatividade, da tolerância e do
empreendedorismo. Por outro lado, ao nível dos professores, a flexibilização e
articulação curriculares surgem associadas ao propósito de promover a comunicação
e a partilha entre pares, esbatendo a excessiva compartimentação dos saberes
disciplinares. A articulação curricular, enquanto pressuposto nuclear do processo de
desenvolvimento do currículo, surge, assim, como uma oportunidade de
“interligação de saberes oriundos de distintos campos do conhecimento com vista a
facilitar a aquisição, por parte do aluno, de um conhecimento global, integrador e
integrado (Morgado & Tomaz, 2010). O conceito de articulação curricular
circunscreve-se, ainda, “à ideia da sequencialidade que deve nortear todo o
processo educativo, uma vez que o desenvolvimento de capacidades e competências
por parte de cada indivíduo deve ser feito de forma contínua e progressiva” (idem).
Cumpridos que sejam os propósitos enunciados, estarão garantidas as
condições, os recursos e as oportunidades de aprendizagem que permitam aos
estudantes desenvolver um conjunto de competências – técnicas e transversais –,
com vista a assegurar um perfil profissional competitivo (Alves, 2003), capaz de
corresponder às exigências do mercado de trabalho (Andrews & Higson, 2008).
A importância do desenvolvimento de competências é assegurada, por si só,
pela questão da empregabilidade, amplamente reforçada no Comunicado de
Londres (2007), sendo reconhecidas como fundamentais para garantir a
competitividade no mercado de trabalho por parte dos graduados. Tendo em conta
a sua relevância, importa problematizar de que forma são consideradas na
organização, planificação e desenvolvimento do currículo.
Definindo competência como um saber em uso (Perrenoud, 1999), torna-se
necessário criar espaços e tempos que permitam mobilizar atitudes, saberes,
capacidades de ação e comportamentos, uma vez que o conceito de competência
não se restringe à mera apropriação de conteúdos, implicando preferencialmente a
sua aplicação numa determinada atividade, contexto ou situação:
(…) a competência não exclui, mas exige, a apropriação sólida e ampla de conteúdos,
organizados numa síntese integradora, apropriada pelo sujeito, de modo a permitir-lhe
«convocar» esse conhecimento face às diferentes situações e contextos” (Roldão, 2003,
p.24).
E-learning / TIC
O uso da internet está a tornar-se uma prática diária, constituindo quer um
acervo de informação disponível e acessível a vários grupos, quer um recurso
pedagógico facilmente mobilizável em distintos ambientes de ensino – “e-learning
provides information that is then easily accessible and available” (Rohleder et al.,
2007, p. 101) –, quer, ainda, um contacto permanente entre os diferentes agentes
educativos, podendo ser difundida e partilhada a informação a qualquer hora e a
partir de qualquer local (Liaw, 2008).
De facto, as TIC são hoje um dos métodos de ensino e de aprendizagem
incontornáveis no ensino superior: “the use of the internet and web-based forums is
emerging as a frequent addition to or feature of learning methods in Higher
Education” (Rohleder et al., 2007, p. 96). Nas dinâmicas de ensino a distância gera-se
um ambiente comunicacional em que os estudantes e os professores não só
partilham informação, como também decidem o modo como usá-la. Além disso, tais
ambientes permitem que os professores mantenham um contacto permanente com
os seus colegas, disponibilizem instrumentos e questões para que os estudantes
possam ir avaliando os seus conhecimentos, recebendo, quase de imediato, um
feedback sustentado sobre o seu desempenho.
O e-learning, para além de permitir quebrar barreiras entre países, instituições,
disciplinas e línguas, permite o desenvolvimento e/ou melhoria de competências
pessoais, tais como o diálogo crítico entre os estudantes (Rohleder et al., 2007),
entre os estudantes e os professores, bem como entre os demais agentes educativos
envolvidos nesse processo. Ainda no domínio das competências, o estudo de
Francescato, Mebane, Solimeno e Tomai (2008) demonstrou que o desenvolvimento
de certas competências profissionais é mais eficaz através de uma aprendizagem
assíncrona colaborativa online do que na maior parte dos contextos educativos
presenciais. Daí que a aprendizagem colaborativa assistida por computador possa
propiciar oportunidades educacionais inovadoras, adaptando-se a necessidades
específicas dos estudantes, tais como ritmos de aprendizagem, de gestão do tempo
e de estratégias de estudo.
Todavia, urge ressaltar que, o uso das TIC, nomeadamente o E-learning, não
está desprovido de fragilidades e/ou lacunas que podem, em certos casos, gerar até
alguma desigualdade, como, por exemplo, no acesso aos computadores e à internet,
deixando em desvantagem os estudantes que apenas acedem a estes programas na
instituição de ensino. Uma outra situação, referida por Lapointe e Reisetter (2008),
diz respeito à forma como professores e estudantes conceptualizam a comunidade
virtual, atribuindo-lhe uns grande utilidade, encarando-a outros como supérflua e
inconveniente. Acresce, ainda, o facto de, em algumas situações, a utilização das TIC
não acrescentar qualquer mais valia às estratégias e práticas estandardizadas de
ensino-aprendizagem-avaliação, contribuindo essencialmente para as perpetuar.
Em suma, se as TIC e o E-learning se revelam contributos essenciais para a
mudança das práticas de ensino-aprendizagem-avaliação, permitindo desenvolver
competências essenciais no ensino superior, é preciso ter em linha de conta que a
sua utilização pode viabilizar práticas formativas de teor muito distinto, isto é,
práticas que facilitam uma efectiva emancipação dos sujeitos ou, pelo contrário,
favorecem o controlo e a reprodução.
Feedback
Um outro aspecto importante nas práticas que professores e estudantes
desenvolvem para configurar/concretizar os processos de ensino-aprendizagem-
avaliação é o feedback proporcionado aos/pelos vários intervenientes nesse
empreendimento. Tratando-se de processos que se consubstanciam pela realização
de uma série de actividades que envolvem conhecimentos, atitudes, procedimentos,
capacidades e competências, a informação disponibilizada é fundamental para que
cada um dos agentes que neles participam se possam apropriar quer das finalidades
a concretizar, quer dos progressos conseguidos, quer, ainda, dos aspectos a
melhorar de modo a concretizar-se o tão almejado sucesso educativo.
A este propósito, Mahony e Polos (2003) consideram que o feedback eficaz é
um elemento estratégico no ensino e na aprendizagem, embora reconheçam que
com a generalização do uso do feedback se tornou necessário conhecer as opiniões
dos estudantes sobre esta prática e sobre a sua relevância nos processos de
aprendizagem. Os estudos que realizaram permitiram-lhes concluir que o feedback
aumenta a motivação dos estudantes e favorece a sua aprendizagem: “feedback was
used to enhance motivation and learning, encourage reflection and clarify
understanding” (Mahony & Polos, 2008, p. 144). Estes resultados foram confirmados
por outra investigação realizada por Lizzio e Wilson (2008) sobre as percepções dos
estudantes acerca do feedback recebido sobre diversos trabalhos de avaliação,
tendo os mesmos verificado que os estudantes reconheciam essa prática como
encorajadora e justa.
Em idêntica linha de pensamento, Weaver (2006, p. 379), num estudo que
realizou com quarenta e quatro estudantes das faculdades de Negócios e Art &
Design, para explorar as suas percepções sobre o feedback (escrito) fornecido pelo
tutor, constatou que os estudantes consideram que os comentários que recebem
são importantes porque, além de os ajudar a reconhecer as suas potencialidades e
as suas fraquezas, contribuem para melhorar os seus trabalhos: “respondents
confirmed that feedback containing constructiv comment was necessary for
improvement”.
Os resultados do estudo realizado por Mahony e Polos (2008) permitiram,
ainda, identificar três aspectos que, pela sua pertinência, devem ser objecto de
análise e reflexão futuras, de modo a tornar a utilização do feedback mais profícua e
proveitosa para os estudantes. Em primeiro lugar, e embora os estudantes
reconheçam a preponderância do feedback na melhoria das suas aprendizagens,
consideram que a sua utilização deve ser mais eficaz do que é na realidade, o que
implica que sejam trabalhadas as suas potencialidades e lhes seja dedicado mais
tempo. Em segundo lugar, e uma vez que a eficácia do feedback é, essencialmente,
da responsabilidade dos docentes, os estudantes consideram que é importante a
não generalização dos comentários, o que implica a sua adequação à singularidade
de cada estudante e à especificidade trabalho. Caso, contrário, corre-se o risco da
rotinização e desvalorização do próprio feedback, retirando-se-lhe o carácter
inovador que supostamente assumiria. Por último, o feedback não poderá restringi-
ser à informação sobre o trabalho efetuado e respectiva classificação, devendo
sobretudo ser utilizado para apoiar a reflexão e dotar o estudante de capacidades
que deverá mobilizar em trabalhos futuros, com impacto positivo no seu futuro
contexto profissional.
Considerações finais
Referências Legislativas
DECRETO-LEI nº 42/2005, de 22 de fevereiro – Aprova os princípios reguladores de
instrumentos para a criação do espaço europeu de ensino Superior e consequente adesão
ao Processo de Bolonha