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19/3/2014 LIBERALISMO

LIBERALISMO

MÓDULO ÚNICO - LIBERALISMO


Site: Instituto Legislativo Brasileiro - ILB
Curso: Doutrinas Políticas Contemporâneas: Liberalismo
Livro: LIBERALISMO
Impresso por: Diego Fernandes de Oliveira
Data: quarta, 19 março 2014, 10:21

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19/3/2014 LIBERALISMO

Sumário
Módulo Único -
Liberalismo Módulo Único
- Liberalismo Liberalismo
Unidade 1 - Liberalismo e
democracia
Pág. 2 - Definições
Pág. 3 - O s direitos do
homem O s direitos do
homem (cont.) Pág. 4
Pág. 5
Pág. 6
Pág. 7
Pág. 8
Pág. 9
Pág. 10
Pág. 11
Pág. 12
Pág. 13
Pág. 14
Pág. 15
Unidade 2 - Argumento
neoliberal
Pág. 2
Pág. 3
Pág. 4
Pág. 5
Pág. 6
Pág. 7
Pág. 8
Pág. 9
Pág. 10
Pág. 11
Pág. 12
Pág. 13
Pág. 14
Pág. 15
Pág. 16
Pág. 17
Pág. 18
Pág. 19
Unidade 3 - P a ra uma teoria da
democracia
Pág. 2
Pág. 3
Pág. 4
Pág. 5
Pág. 6
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Pág. 8
Pág. 9
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Pág. 11
Pág. 12
Pág. 13
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Pág. 15
Pág. 16
Pág. 17
Pág. 18
Pág. 19
Pág. 20
Pág. 21
Unidade 4 - Os direitos
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individuais
Pág. 2
Pág. 3

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19/3/2014 LIBERALISMO
Pág. 4
Pág. 5
Pág. 6
Pág. 7
Pág. 8
Pág. 9
Pág. 10
Pág. 11
Pág. 12
Pág. 13
Pág. 14
Pág. 15
Pág. 16
Pág. 17
Pág. 18
Exercícios de Fixação

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Módulo Único - Liberalismo

Estamos no iníc io de um c urso sobre Doutrinas Polític as Contemporâneas. Convém, assim, esc
larec er alguns pontos sobre o signific ado do título e a forma do c urso.

O que são doutrinas polític as c


ontemporâneas?

Na perspec tiva que aqui adotamos, são aquelas c orrentes de pensamento que inspiram e orientam os partidos polític os
importantes
– em termos de influênc ia, voto e ac esso ao poder – no mundo de hoje. Dito de outra maneira, aquelas c orrentes que
definem os objetivos de partidos atuais e, em alguns c asos, os meios rec omendados para alc anç ar esses objetivos.

O c ritério, portanto, é prátic o. Não vamos disc utir c orrentes de pensamento que alimentaram partidos fortes no passado,
mas insignific antes no presente. Não vamos disc utir, por exemplo, uma c orrente c onservadora, uma vez que hoje nenhum
partido de peso defende o retorno à ordem ec onômic a, soc ial e polític a pré-moderna. Pela mesma razão, não disc
utiremos a c orrente anarquista, uma vez que os partidos dessa tendênc ia perderam peso, nos países onde ainda eram
importantes, no período entre as duas guerras mundiais.

Um esc larec imento final é nec essário. Grandes c orrentes de pensamento polític o não são objetos que possam ser estudados a
partir de uma definiç ão c lara, unívoc a, ac eita por todos. Adversários e partidários têm interpretaç ões diferentes de c ada
c orrente, e mesmo no interior de c ada uma delas enc ontramos divisões importantes. A seleç ão de assuntos e autores
feita no c urso é, portanto, nec essariamente parc ial. Esc olhemos obras de autores c onsagrados que tratam de temas que a
maior parte dos novos esquerdistas c onsidera fundamentais. No entanto, outros temas e autores, talvez tão importantes
quanto esses, fic aram de fora. Vamos disc utir, para dizer de forma mais prec isa, uma seleç ão de temas e autores importantes
para esta c orrente.

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Módulo Único - Liberalismo

Ao término deste estudo, esperamos que voc ê possa :

1) Compreender as relaç ões historic amente estabelec idas entre Liberalismo e Democ rac
ia.

2) Disc utir os argumentos favoráveis e c ontrários ao pensamento e à prátic a liberais.

3) Distinguir o Liberalismo ec onômic o do Liberalismo polític o.

4) Analisar as diferentes formas de organizaç ão democ rátic a.

5) Defender a c entralidade dos direitos humanos fundamentais no pensamento liberal.

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Liberalismo
Vamos examinar o liberalismo nas quatro próximas unidades.

Na primeira delas, proc uramos uma definiç ão geral da c orrente e uma apresentaç ão de alguns de seus temas mais
importantes. Usamos para essa finalidade o livro de Norberto Bobbio, Liberalismo e Democ r ac ia, que, c omo indic a seu título,
define o liberalismo por meio de sua c omparaç ão sistemátic a c om outra c orrente de pensamento, c om a qual é muitas vezes c
onfundido: a democ rac ia.

Após essa abordagem geral, examinaremos três c onjuntos de temas c entrais para essa linha de pensamento, a partir de
autores e obras c onsiderados importantes por boa parte dos liberais. O primeiro c onjunto refere-se ao papel do merc ado, ou
seja, ao liberalismo ec onômic o. Nosso guia para a disc ussão será o livro O c aminho da servidão, de Friedric h Hayek, public
ado pela primeira vez em 1944.

Logo depois, veremos o liberalismo polític o, a partir da argumentaç ão de Robert Dahl desenvolvida em Prefác io a uma
teoria democ rátic a.

Finalmente, vamos estudar os argumentos que apresentam a garantia dos direitos individuais c omo o fundamento de
toda a perspec tiva liberal. Para esse assunto usaremos o livro de Ronald Dworkin, Levando os Direitos a Sério.

Mais informaç ões sobre liberalismo c omo c orrente de pensamento e seus autores representativos podem ser enc ontradas no livro
de
José Guilherme Merquior, O Liberalismo antigo e moderno.

Na Biblioteca deste c urso, voc ê enc ontrará disc ursos proferidos pelo senador Marc o Mac iel e palestras realizadas no "Fórum
Merquior" abordando a problemátic a liberal.

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Unidade 1 - Liberalismo e democracia

Liberalismo e Dem oc rac ia

O propósito da primeira unidade do c urso é debater as c arac terístic as mais gerais c onstitutivas do liberalismo. Para tal,
um dos c aminhos mais interessantes é ac ompanhar o roteiro que Norberto Bobbio, em Liberalismo e Democ r ac ia, nos
oferec e, uma tentativa de c ompreender o liberalismo a partir de sua c ontraposiç ão a uma c orrente definida c omo democ
rátic a. A c omparaç ão entre liberalismo e democ rac ia esc larec e as afinidades e c onflitos que, historic amente, têm permeado
as relaç ões entre essas duas c orrentes, bem c omo abre c aminho para pensar uma relaç ão que se desenvolveu
posteriormente: a do liberalismo c om o soc ialismo, em todas as suas variantes. Seguiremos, portanto, a sequênc ia de tópic os
que o autor propõe para nossa disc ussão.

Nesta unidade, estudaremos sobre liberalismo e democ rac


ia: a) Definiç ões, pontos em c omum e diferenç as entre
ambos; b) Direitos humanos fundamentais;
c ) Limitaç ão do poder do
Estado;
d) Liberdade
negativa;
e) Elogio da
diversidade;
f) Democ rac ia ontem e
hoje;
g) Liberalismo e democ rac ia
hoje;
h) Liberalismo e democ rac ia no séc ulo
XIX.

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LIBERALISMO

Pág. 2 - Definições

1.
Definições

O fato evidente de que as democ rac ias mais sólidas do mundo c ontemporâneo reivindic am, simultaneamente, sua presenç
a nas tradiç ões liberais e democ rátic as induz à c renç a de que ambas as tradiç ões são idêntic as. No fundo, liberalismo e
democ rac ia seriam sinônimos, e eventuais c onflitos, teóric os e polític os, entre ambas as doutrinas seriam apenas equívoc os
históric os passageiros.

Na verdade, embora a c onfluênc ia entre liberais e democ ratas


na atualidade seja fato, não se pode perder de vista a espec ific
idade de c ada tradiç ão. Liberalismo e democ rac ia são c orrentes
definidas, e a relaç ão entre ambas pode ser de afinidade, mas
também pode ser de c onflito, c omo veremos. Liberalismo e Democ
rac ia - o que c arac teriza c ada uma dessas c orrentes e, c
onsequentemente, a diferenç a entre ambas?

Para o nosso autor, liberalismo é uma c onc epç ão de Estado, de


um Estado limitado. Seu traç o princ ipal, portanto, é a c onvic ç ão
de que o poder do Estado não pode ser exerc ido em todos os c
ampos, mas que existem esferas sujeitas à deliberaç ão individual,
c lassic amente os
âmbitos da ec onomia e da vida
privada.

A democ rac ia, em c ontraste, antes que c onc epç ão de Estado é uma forma de gov erno. Carac teriza-se, desde a
antiguidade, pela atribuiç ão de poder à maioria; é o gov erno de muitos, em oposiç ão ao governo de pouc os e ao de um só.

Para o liberalismo, portanto, o essenc ial é limitar o poder; para a democ rac ia, distribuir o poder. Trata-se de dois
problemas diferentes, c uja soluç ão simultânea é, às vezes, impossível.

Essa distinç ão remonta, na verdade, à c onhec ida separaç ão de Benjamim Constant entre a liberdade dos antigos e a liberdade
dos modernos. Para esse autor, na pólis (c idade-estado) da Gréc ia antiga, liberdade era c ompreendida c omo partic ipaç ão no
proc esso de deliberaç ão. Era a possibilidade de c omparec er à assembleia que reunia os c idadãos e nela votar.
Predominava então uma c onc epç ão positiva de liberdade. Entre nós, modernos, pelo c ontrário, a liberdade é vista c omo a
"seguranç a nas fruiç ões privadas", ou seja, a garantia de que os direitos do indivíduo não serão feridos pelo Estado. Essa c
onc epç ão de liberdade pode ser desc rita c omo negativa.

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Pág. 3 - Os direitos do homem

2. Os direitos do homem

Mas qual a razão para o poder do Estado deter-se perante alguma esfera, algum
limite?

A resposta está na doutrina dos direitos humanos, pressuposto filosófic o de grande parte das versões do Estado
liberal.

Conforme essa doutrina, há um c onjunto de direitos inatos aos seres humanos, direitos que a assoc iaç ão polític a não pode
violentar ao sabor de sua c onveniênc ia. O direito à vida, à liberdade, à seguranç a, à busc a da felic idade, por exemplo, nasc
em c om c ada indivíduo. Todos podemos agir de forma a efetivá-los e podemos, legitimamente, resistir a qualquer tentativa de
sua violaç ão.

Esses direitos são naturais, portanto. Não dependem de outorga da c oletividade ou do governo. Não podem, em c onsequênc ia,
ser por eles revogados. Têm c omo fundamento uma c onc epç ão geral da natureza humana, que, c omo diz Bobbio, não prec
isa estar fundamentada em pesquisa empíric a ou provas históric as. Podemos c hegar a essa c onc epç ão c om o uso exc lusivo
da razão.

Na verdade, essa ideia de um c onjunto de direitos humanos já presentes em um hipotétic o Estado de natureza, anterior
à c onstituiç ão da soc iedade, é justific aç ão, no plano da ideologia, de um proc esso históric o determinado, de limitaç ão do
poder do rei. O marc o inic ial desse proc esso pode ser c onsiderado o ano de 1215, quando o rei inglês João "outorga" uma c
arta, na qual determinadas "liberdades" dos nobres são garantidas c ontra o poder real.

No momento em que o soberano enc ontra limites à sua vontade, a relaç ão c om o súdito adquire o c aráter de um pac to. Cabe
ao rei o dever de proteç ão e ao súdito o de obediênc ia. Este último, no entanto, não é mais irrestrito, mas exc lui c ertas
esferas, definidas por c onsenso entre os súditos e entre esses e o soberano.

Os marc os finais do proc esso enc ontram-se nas dec laraç ões de direitos, afirmadas pela Revoluç ão Nor t e-Amer ic ana (1776)
e pela
Rev oluç ão F r a nc esa
(1789).

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Os direitos do homem (cont.)

Enquanto o proc esso históric o real mostra uma situaç ão inic ial de poder absoluto do soberano,
poder que sofre uma erosão progressiva, no plano das idéias o movimento é inverso. Parte-se
de um hipotétic o ponto zero, o estado de natureza, no qual os indivíduos são livres e não
existe c orpo polític o. Mediante um c ont rat o soc ial, esses indivíduos abrem mão de parte de
sua autonomia em troc a das vantagens da assoc iaç ão, princ ipalmente a seguranç a. Funda-
se, então, a soc iedade polític a, que não pode ser despótic a porque deriva seu poder dos
indivíduos que a formam.

O pressuposto dos direitos naturais enc


ontra- se, assim, estreitamente vinc
ulado ao c ontratualismo, à ideia de c
ont rat o soc ial c omo origem da soc iedade.
O c ontratualismo postula que a soc
iedade não é um fato natural, mas
artific ial, fruto da vontade humana; que
a soc iedade não é um fim, ao qual os
indivíduos devem se devotar, mas um meio
para a satisfaç ão de nec essidades e
interesses individuais. Postula, enfim,
a
prec edênc ia, históric a e lógic a, dos indivíduos sobre o c oletivo:
primeiro existem indivíduos singulares c om suas nec essidades, depois a soc iedade.

A idéia de direitos naturais do homem e a c onc epç ão c ontratualista de soc iedade são
inseparáveis de uma posiç ão individualista. O individualismo, segundo Bobbio, é a c ondiç ão do
liberalismo.

Assista ao vídeo abaixo c om a entrevista do professor Celso Lafer, e


observe os direitos humanos pela visão de diversos autores polític os.

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3. O Estado limitado

Vimos que o problema que define o liberalismo é a limitaç ão do poder do Estado. Essa limitaç ão se dá em dois aspec tos diferentes:

Segundo: nas funç ões do Estado;


Primeiro: nos poderes do Estado.

A limitaç ão dos poderes do Estado dá lugar ao c hamado estado de direito, oposto ao estado absoluto. Estado de direito implic
a a limitaç ão dos poderes do Estado em pelo menos dois planos distintos. No primeiro, dizemos que os poderes públic os são
limitados quando se enc ontram regulados por normas gerais, normalmente insc ritas numa Constituiç ão, e só podem ser exerc
idos de ac ordo c om essas normas.

Esse primeiro plano, no entanto, não é sufic iente, uma vez que as normas c onstituc ionais podem desc uidar da defesa dos
direitos individuais. Pode haver, c omo de fato houve, despotismo c onsagrado pelas leis. O segundo plano se produz, portanto,
quando as próprias normas inc orporam o respeito aos direitos c onsiderados fundamentais.

O Estado de direito implic a também a vigênc ia de mec anismos de c ontrole do poder. Normalmente, esses mec anismos
enquadram-se num dos seguintes tipos: c ontrole do Exec utivo pelo Legislativo, c ontrole do Legislativo por uma Corte de Justiç
a, autonomia loc al e autonomia do Judic iário frente aos demais poderes.

A limitaç ão das funç ões do Estado, por sua vez, desenha uma segunda fac eta da ut opia liberal: o Estado mínimo, c ujo
antônimo é o
Estado máximo (que c onsidera legítimo agir em esferas reservadas pelos liberais para a inic iativa
individual).

Em síntese, o projeto liberal demanda um Estado c om as seguintes c arac terístic


as:

Primeira: exerc íc io do poder regulado por normas gerais, normalmente reunidas em uma Constituiç
ão; Segunda: inc orporaç ão, nesse c onjunto de normas, de garantias aos direitos c onsiderados
fundamentais; Terceira: presenç a de mec anismos efetivos de c ontrole do poder; e
Quarta: reduç ão da aç ão do Estado ao mínimo indispensável.

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4. A liberdade negativa

A c onc epç ão de liberdade implíc ita no ideal de limitaç ão do poder do Estado é, c omo vimos, a de liberdade negativa. Em sua
análise, liberdade e poder c onstituem termos que se exc luem mutuamente. Só há liberdade onde o indivíduo não é tolhido por
determinaç ões externas a ele, c omo aquelas provenientes de um poder públic o. Em outras palavras, quanto mais as leis são
amplas e numerosas, menos livres são os indivíduos a elas sujeitos. Nessa perspec tiva, os dois tipos de limites ac ima menc
ionados reforç am-se um ao outro. Quanto menores as funç ões atribuídas ao Estado, mais fác il será o c ontrole de seus poderes.

No entanto, para os liberais há um limite a essa "minimizaç ão" do Estado. Afinal, se o Estado é um mal, no seu ponto de vista, é
um mal nec essário. Postular o Estado c omo um mal que pode ser eliminado é a c lássic a posiç ão anarquista, não a liberal.
Conforme esta última, a emanc ipaç ão do indivíduo em relaç ão ao Poder, da soc iedade c ivil em relaç ão ao Estado, é
obrigatória em c ertas esferas, mas sempre permanec erão funç ões impossíveis de serem efetuadas c om o esforç o exc lusivo da
inic iativa de partic ulares.

Do lado dos c ampos reservados aos indivíduos sobressaem o religioso e o ec onômic o. A liberdade de c onsc iênc ia é c
onsiderada fundamental por todas as variantes do liberalismo. Inic iada c om a c onquista da liberdade religiosa, no séc ulo
XVII, ampliou-se progressivamente para a esfera da opç ão polític a, dos c ostumes, do estilo de vida.

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A liberdade ec onômic a, por sua vez, implantou-se c ontra os


privilégios e vínc ulos feudais, que determinavam, no momento do
nasc imento, a profissão, o loc al de trabalho e as oportunidades de c
omérc io de c ada um. As liberdades de esc olher a profissão, o loc
al de trabalho, de livre c irc ulaç ão de homens e merc adorias, c
onsolidaram-se, na Inglaterra, no dec orrer do séc ulo XVIII.
Ambas as esferas são o terreno da primeira leva históric a de direitos,
os direitos c ivis, na periodizaç ão proposta por Marshall.

Importa ressaltar a posiç ão radic almente antipaternalista assumida pelos liberais. Religião, estilo de vida, c ostumes,
profissão, negóc io, são todas esferas em que c ada um é o melhor juiz de seu interesse. A intromissão de regras externas,
mesmo as da lei, que digam aos indivíduos o que devem fazer e c omo devem c omportar-se, resulta sempre em perdas
para os interessados. O paternalismo, na visão de diversos expoentes do pensamento liberal, é a pior forma de despotismo.

Que papel resta ao Estado, nessa perspectiva?

Cabe ao Estado prover as c ondiç ões nec essárias ao livre


desenvolvimento dos indivíduos. Na fórmula c lássic a de Adam Smith,
são suas funç ões exc lusivas a garantia da seguranç a, externa e
interna, e a realizaç ão de obras públic as que os agentes privados não
possam realizar.

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5. O elogio da
diversidade

Chegamos neste ponto a outro traç o distintivo do pensamento liberal: o apreç o pela
variedade.

Na verdade, na ótic a liberal, esse tema enc ontra-se estreitamente vinc ulado ao anterior. O propósito do gov erno sempre
é a produç ão da ordem e do bem-estar; dessa maneira, sua interferênc ia sobre esferas que deveriam reservar-se ao âmbito do
privado tende sempre a produzir efeitos homogeneizadores sobre os c idadãos. O Estado age por meio do poder
administrativo, de regras impessoais, aplic áveis a todos, regras c uja boa aplic aç ão é fisc alizada por estamentos buroc rátic
os espec ializados. Quanto maior, portanto, o número e alc anc e dessas regras, mais o Estado estará exigindo dos c idadãos que
se c omportem de forma semelhante.

Para os liberais, quanto mais avanç am o Estado, as regras, a buroc rac ia, sobre as esferas de dec isão individual, menor o espaç
o da liberdade. A grande tentaç ão, no c aso, é o paternalismo, já c itado: a tentaç ão de c onverter o Estado em provedor da
vida do c idadão. A seguranç a, a ausênc ia de risc o que a opç ão implic a, tem, c omo c ontrapartida, a perda de autonomia, a
uniformidade e a estagnaç ão. Haveria, nesse c aso, perda em efic iênc ia, mas também perda em liberdade.

Abrir espaç o para a autonomia dos indivíduos é abrir espaç o para sua diversidade e seus c onflitos. Ao c ontrário das c onc
epç ões holistas, que Bobbio denomina também organic istas, que prezam a harmonia e a c onc órdia e c onsideram o c
onflito sintoma de desordem e desagregaç ão soc ial, a perspec tiva liberal ac eita a diversidade e o c onflito c omo fontes da
inovaç ão, da mudanç a e do progresso. O avanç o c ientífic o, o c resc imento ec onômic o, a seleç ão dos melhores
líderes polític os, são proc essos de aperfeiç oamento c ontinuado, que o c onflito torna possíveis.

Essa a origem da diferenç a, trabalhada pelo pensamento liberal desde seus primórdios, entre o dinamismo dos países europeus
livres e a estagnaç ão própria do despotismo oriental.

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6. Democrac ia ontem e
hoje

Enquanto o liberalismo é produto moderno, a democ rac ia tem seu nasc imento na antiguidade. No entanto, a democ rac ia
moderna difere da antiga em um aspec to fundamental: os antigos deliberavam na Ágora, praç a de reunião dos c idadãos de
Atenas; os modernos delegam a deliberaç ão a seus representantes.

É c laro que as dimensões dos Estados modernos tornam inviável a democ rac ia direta. No entanto, os teóric os do
liberalismo levantaram argumentos outros, além da viabilidade, em favor da democ rac ia representativa. A manifestaç ão direta
da vontade do eleitor produziria dec isões exc essivamente c oladas aos interesses partic ulares dos c idadãos. Daí a propensão
ao fac c iosismo e à demagogia, c arac terístic as da democ rac ia antiga.

Nas democ rac ias modernas, a representaç ão diminui esses efeitos da manifestaç ão da vontade
popular, ainda mais quando são tomadas prec auç ões c ontra a prátic a do
mandato imperativo. Ou seja, no momento em que o mandatário
se c onsidera representante de uma parte do povo, de um distrito,
por exemplo, e não do povo inteiro, estariam abertos os c aminhos,
de um ponto de vista liberal c lássic o, para a reproduç ão dos
defeitos da velha democ rac ia.

Aliás, democ rac ia antiga e liberalismo moderno são c


laramente inc ompatíveis. A primeira desc onhec ia limite ao poder
da soc iedade sobre os indivíduos. O segundo, historic amente,
desc onfia do voto popular.

A c onfluênc ia entre liberalismo e democ rac ia a que nos referimos anteriormente implic a um grau elevado de c onsenso ac
erc a do signific ado da igualdade que a democ rac ia busc a. A igualdade que o liberalismo ac eita, aquela c ompatível, a seu ver,
c om o princ ípio da limitaç ão do poder, é a de c unho jurídic o-formal, não aquela étic a; é a proc edimental, não a
substantiva; é a de regras igualmente aplic áveis a todos, não a que proc ura uma situaç ão de igualdade ao fim do proc esso.

A c onfusão entre os dois tipos de igualdade levou a polêmic as reiteradas entre liberais e soc ialistas ac erc a da c omparaç ão
entre uma situaç ão de democ rac ia formal, sem igualdade material, e outra, na qual a igualdade das situaç ões de c ada um
era obtida ao preç o das liberdades.

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A divergênc ia, segundo Bobbio, é insolúvel. Liberdade e igualdade, no c ampo da produç ão material, da ec onomia, são dois
valores exc ludentes. De um lado temos os liberais, que prezam o individualismo, o c onflito, a diversidade. Para eles, o fim
princ ipal é o desenvolvimento dos indivíduos, mesmo que o desenvolvimento daqueles "mais c apazes" se faç a em
detrimento dos demais. De outro lado, temos os igualitaristas, partidários de uma visão holista, que valorizam a harmonia.
Seu ideal é o desenvolvimento equânime e não c onflitivo da c oletividade c omo um todo.

Para os liberais, a igualdade c ompatível c om a manutenç ão da liberdade é a igualdade perante a lei, no sentido de não
existirem privilégios, e a igualdade no gozo dos direitos fundamentais, rec onhec idos a todos os seres humanos. O igualitarismo
democ rátic o, por sua vez, proc ura realizar, c om o auxílio do Estado, a igualdade no fim do proc esso, a igualdade
substantiva, uma situaç ão na qual não só as oportunidades sejam iguais para todos, mas as c ondiç ões de vida dos c idadãos
sejam semelhantes.

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7. Liberalismo e de moc racia


hoje

Do exposto dec orre que a democ rac ia polític a, entendida c omo a vigênc ia do suf rágio univ ersal, é c ompatível c om o
liberalismo. No entanto, essa c ompatibilidade é longe de ser óbvia. Muitos dos c lássic os liberais preoc uparam-se em
desenvolver argumentos a favor do vot o c ensit ário. Para eles, fundamentalmente, o gov erno lida c om a despesa públic a e não
deve estar aberto à opinião de quem não c ontribui para a rec eita públic a. No séc ulo XIX, aliás, o suf rágio universal era exc eç
ão e os Estados liberais tendiam a ser não democ rátic os, por esse c ritério.

Hoje não é fácil imaginar um Estado democrático que não seja


liberal, nem tampouco um Estado liberal não democrático. Em
favor dessa simbiose, dois argumentos são levantados.
Em primeiro lugar, a salvaguarda dos direitos fundamentais exige
a regra democ rátic a. A garantia da vigênc ia desses direitos
será tão mais efic az quanto maior o número de
interessados c om possibilidade de se manifestarem, por meio
da voz e do voto. Consequentemente, a garantia máxima dos
direitos está numa situaç ão de suf rágio univ ersal.

Em segundo lugar, o voto só é efic az c omo instrumento de medida da vontade popular se os votantes são livres, ou seja, se
votam c om a proteç ão a seus direitos fundamentais assegurados. Do c ontrário, o voto mediria apenas o medo da retaliaç ão de
poderosos ou a submissão ao poder ec onômic o. Daí que, hoje, democ rac ia e liberalismo prec isem um do outro.

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8. Liberalismo e dem ocracia no século


XIX

No séc ulo XIX, c ontudo, c omo vimos, essa relaç ão de afinidade não era evidente por si mesma. Examinando os dois
grandes laboratórios polític os da époc a, vemos, na Inglaterra, uma situaç ão de progresso da liberdade que se estende do fim do
séc ulo XVII ao iníc io do séc ulo XX. É o proc esso de desdobramento dos direitos individuais: primeiro c onquistam-se os
direitos c ivis, num segundo momento os direitos polític os e, finalmente, os direitos soc iais. Trata-se de um progresso
suave, sem grandes perturbaç ões polític as, mas que se proc essou no interior de uma soc iedade eminentemente aristoc rátic
a. Em outros termos, c om a manutenç ão de um grau elevado de desigualdade soc ial.

Na Franç a, em c ontraste, o perc urso foi mais ac identado, apresentando retroc essos no plano da liberdade,
simultaneamente a progressos no da igualdade. Basta lembrar o período do terror na époc a da Revoluç ão e o golpe
do segundo Bonaparte, imediatamente após a implantaç ão do suf rágio universal.

Esse quadro ensejou a divisão dos dois grandes c ampos. Os liberais tenderam a se dividir em radic ais, aqueles que ac
eitavam a democ rac ia, e c onservadores, c ontrários ao suf rágio universal. Os democ ratas, por sua vez, dividiram-se em
liberais e não liberais, c onforme sua posiç ão fac e às garantias individuais. Evidentemente, liberais radic ais e democ ratas
liberais tenderam à indistinç ão. O liberalismo c onservador foi a matriz de uma série de agrupamentos polític os influentes em
vários países europeus. Por sua vez, os democ ratas não liberais deram origem a diversos partidos radic ais, de posiç ão vizinha a
dos soc ialistas.

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Da experiênc ia e reflexão do séc ulo XIX é possível c onstruir um quadro das relaç ões possíveis entre democ rac ia e liberalismo.

A primeira relaç ão é de possibilidade. Sob esse aspec to a democ rac ia e o liberalismo


são c ompatíveis, embora sejam também possíveis Estados liberais não democ rátic os e
Estados democ rátic os não liberais.
A segunda relaç ão é a impossibilidade. Liberalismo e democ rac ia são exc ludentes e,
nesse ponto, teriam razão tanto os liberais c onservadores quanto os democ ratas não
liberais.
A terc eira relaç ão é a nec essidade. Não existe um dos termos na ausênc ia do outro.
Esta é, c omo vimos, a opinião prevalec ente nas democ rac ias modernas.

Dois dos princ ipais teóric os do liberalismo do séc ulo XIX representam bem as vertentes c onservadora e radic al do movimento:
Alexis de Toc queville e John Stuart Mill.

Toc queville tinha c omo preoc upaç ão maior a manutenç ão da liberdade no mundo moderno. A seu ver, o progresso da
igualdade, no sentido de c ondiç ões soc iais semelhantes, era inevitável. Proc esso inic iado na Idade Média, expandia-se
irresistivelmente desde então. A igualdade era, para ele, providenc ial, era uma nec essidade históric a.

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A liberdade, no entanto, era c ontingente. Poderia ou não se


realizar, uma vez que a igualdade absoluta é tão possível na liberdade
quanto no despotismo. A experiênc ia inglesa preservara a
liberdade c om o sac rifíc io da igualdade. Na Franç a, por sua vez, o
avanç o da igualdade oc orre na perda da liberdade. A experiênc ia
americ ana parec ia a únic a a c onc iliar de forma harmoniosa os dois
valores. Cumpria então estudá-la e dela extrair as liç ões pertinentes.

Não seria possível apresentar uma visão razoável do pensamento de Toc queville nesse espaç o limitado. Abordaremos um tema,
um dos fantasmas do pensamento liberal, por ele explorado c om genialidade: a tirania da maioria.

Mesmo no experimento americ ano viu o autor sintomas do despotismo. A maioria ali reinava absoluta e não havia instânc ia a
que se pudesse rec orrer em c aso de uma dec isão tirânic a do maior número. Exec utivo e Legislativo obedec em à maioria, o
júri é integrado por c idadãos eleitos, a forç a polic ial é a maioria em armas, os órgãos da opinião públic a expressam o seu
pensamento. Em suma, um c idadão prejudic ado por uma dec isão injusta da maioria não tem a quem rec orrer.

Mais grave ainda, o poder da maioria se exerc e sobre o pensamento, de maneira que a livre disc ussão c essa no momento em
que se forma uma opinião majoritária sólida sobre ela. A partir desse momento, ninguém ousa divergir, sob pena de c onverter-
se em pária na soc iedade. O tema de Toc queville, no fundo, é o da dific uldade da dissidênc ia, do dissenso, nas democ rac
ias de massa, tema retomado por diversos pensadores, liberais e não liberais, deste séc ulo.

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John Stuart Mill , o expoente da vertente radic al do liberalismo, merec e registro por várias c arac terístic
as de sua obra. Em primeiro lugar, por filiar-se a uma tradiç ão filosófic a, o
utilitarismo, que presc inde do jusnat uralismo c omo fundamento de
uma posiç ão liberal.

Para os utilitaristas, a ideia de direitos naturais, inalienáveis, do ser humano não passa de uma fic ç
ão. A limitaç ão do poder deve obedec er a outro c ritério, este sim, empíric o, verific ável: a utilidade,
ou seja, a maior felic idade do maior número de c idadãos. Nessa perspec tiva, felic idade é igual à
presenç a de prazer e ausênc ia de dor e c onstitui o únic o c ritério c apaz de limitar, legitimamente,
a liberdade. Prec isamos de poder, de governo, apenas para impedir danos aos outros e manter o nível
de
felic idade ótimo da soc
iedade.

Contra a ameaç a da tirania da maioria, Mill defende a adoç ão do suf rágio univ ersal. O voto de todos impede a oc upaç ão da
"maioria" por apenas uma c amada da soc iedade. Além disso, o voto é pedagógic o, e seu exerc íc io torna as minorias c
onsc ientes dos possíveis atentados a seus direitos. Como segunda prevenç ão, o autor rec omenda o v ot o proporc
ional, que permite a representaç ão de grupos minoritários, exc luídos pela sistemátic a do voto majoritário.

Vale lembrar que o suf rágio universal não inc luía, para Mill, os falidos, os devedores fraudulentos, os analfabetos e os
indigentes. Inc luía, sim, as mulheres, que, a seu ver, prec isavam mais das leis, por serem fisic amente mais frac as que os
homens. Propunha também o voto plural, c abendo um número maior de votos aos c idadãos mais instruídos, c onforme verific
ado em exames públic os.

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Nesta primeira unidade, examinamos as definiç ões de liberalismo e democ


rac ia, os direitos humanos e as doutrinas c ontratualistas, a limitaç ão do
Estado, a importânc ia da diversidade e do c onflito, assim c omo as relaç
ões possíveis entre liberalismo e democ rac ia.
Todos esses temas são fundamentais na tradiç ão liberal. Estamos
agora em c ondiç ões de passar para o assunto da nossa segunda
Unidade: O
Argumento Neoliberal.

Parabéns! Voc ê c onc luiu a primeira unidade. Vamos prosseguir?

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Unidade 2 - Argumento neoliberal

Para o exame do argumento neoliberal usaremos c omo guia a obra mais c onhec ida de Friedric h
Hayek, O Caminho da Servidão. O livro data de 1944 e c onstitui uma das exposiç ões mais c
oerentes dos argumentos levantados pelos liberais c ontra a ec onomia planejada e a favor da livre
inic iativa individual nesse c ampo. O autor é c onsiderado prec ursor da onda neoliberal que se
apossa dos governos europeus e norte-americ ano a partir dos últimos anos da déc ada de 1970.

Depois do diagnóstic o inic ial e das definiç ões básic as c om que o autor trabalha, vamos
examinar o c onjunto de argumentos que a obra apresenta: primeiro, a refutaç ão dos
argumentos em favor do soc ialismo; e, em segundo lugar, a exposiç ão dos argumentos c
ontrários ao soc ialismo, que dariam justific ativa à alternativa liberal.

Sobre o argumento neoliberal, estudaremos, portanto, na Unidade 2:


1. diagnóstic o do momento históric o à époc a da Segunda Guerra
Mundial;
2. definiç ões de soc ialismo e liberalismo.
3. Argumentos do autor:
A f avor do soc ialismo
Inevitabilidade Rac
ionalidade
Cont ra o soc ialismo
Défic it democ rátic o
Fim do Estado de
direito A fav or do
liberalismo Justiç a
Seguranç a
Moral

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Unidade 2 - O Argumento Neoliberal

1. Diagnóstico

É prec iso, em primeiro lugar, fazer menç ão às c irc unstânc ias polític as presentes no momento em
que a obra foi esc rita, c om c lara influênc ia sobre o seu desenvolvimento. O texto foi elaborado
nos anos da Segunda Guerra Mundial, o que implic a dizer que o nazismo e as
diversas formas de f asc ismo c onstituíam opç ões polític as
de grande importânc ia prátic a. O período entre as duas
guerras mundiais, de 1918 a 1939, foi, aliás, bastante
desfavorável ao ideário liberal, ac ossado simultaneamente pelas
extremas esquerda e direita. Essa realidade reflete-se na obra e
explic a seu tom geral,
de polêmic a e
proselitismo.

Para saber mais sobre a Rev oluç ão F ranc esa c lique aqui.

Para aperfeiç oar ainda mais os seus c onhec imentos sobre a Rev oluç ão F ranc
esa, assista ao vídeo abaixo. (6min 26)

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O c ampo polític o em que o autor se enc ontra é esse: um mundo em que três grandes c orrentes - liberalismo, f asc ismo e c
omunismo
- disputam a hegemonia, polític a, intelec tual e até bélic a. No entanto, o seu diagnóstic o sobre a própria époc a parte de uma
visão das relaç ões entre essas c orrentes muito diferente da que prevalec ia no senso c omum da époc a e também de hoje.
Em vez de postular uma oposiç ão radic al entre os extremos da esquerda e da direita, entre nazistas e c omunistas, deixando
aos liberais um espaç o no c entro polític o, Hayek sustenta que a verdadeira oposiç ão se dá entre liberais, de um lado, e
totalitários, de outro, estes últimos divididos nas fac ç ões de esquerda e direita. Para ele, portanto, o nazismo não foi uma reaç
ão ao c omunismo, c om base nas c lasses médias empobrec idas, alimentada pelos c apitalistas temerosos da revoluç ão. Foi,
sim, um resultado polític o espec ífic o da mesma tendênc ia geral que produzia, na époc a, o fortalec imento do soc ialismo.
O argumento é explorado ao longo de todo o livro. Supõe, no entanto, uma visão da história exposta, em pouc as palavras,
no diagnóstic o apresentado de iníc io. Liberalismo é um desdobramento polític o e ec onômic o de uma idéia maior: o
individualismo, no sentido de respeito pela pessoa, por suas preferênc ias e opç ões. Essa atitude mais ampla tem seu
marc o históric o inic ial na Renasc enç a. Ali as amarras que tolhiam a espontaneidade humana c omeç am a ser retiradas e a c
oerç ão sobre os indivíduos c omeç a a retroc eder. O resultado foi um período de enorme c riatividade artístic a, c ientífic a e tec
nológic a, c om efeitos sobre a ec onomia e a polític a.

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2.
Definições

Antes da exposiç ão sistemátic a de seus argumentos, Hayek proc ede a definiç ões mínimas dos dois sistemas que irá c
ontrapor: o soc ialismo e o liberalismo.

O soc ialismo tem por fins manifestos, assumidos por seus adeptos, a promoç ão da justiç a soc ial, da igualdade entre os c
idadãos e a garantia de um mínimo de seguranç a ec onômic a para eles. No entanto, para o autor, mais importantes que esses
objetivos são os meios que se pretende usar para alc anç á-los. No c aso dos soc ialistas, o instrumento a ser utilizado é a
interferênc ia do Estado na vida ec onômic a. A interferênc ia pode ser c ompleta e radic al, c omo no experimento soviétic
o, ou gradual e loc alizada, c omo propunha a maioria dos soc ialistas britânic os à époc a. Mas o fator c omum às duas
vertentes era a intervenç ão do Estado para dar ordem à ec onomia e direc ioná-la à busc a de um determinado fim.

O emprego desse meio, o planejamento ec onômic o em suas diversas dimensões, c arac terizaria uma espéc ie mais geral, da
qual o soc ialismo seria apenas um dos gêneros: o c oletivismo. Toda tentativa de substituir o mec anismo impessoal e anônimo
das forç as de merc ado por alguma c onduç ão c oletiva das forç as soc iais em direç ão a objetivos previamente
determinados c onstitui, para Hayek, uma forma de c oletivismo. O tipo de c oletivismo, o gênero, no c aso, seria definido pelos
objetivos de c ada um: a igualdade, no c aso do soc ialismo; a supremac ia de uma raç a, no c aso do nazismo.

Por outro lado, no liberalismo, o sistema da livre inic iativa, o Estado nunc a proc ura definir objetivos c omuns para o c
onjunto da soc iedade. Sua meta é c riar uma estrutura, legal e material, que permita a c ada indivíduo perseguir os objetivos
que julgue mais adequados.

A grande vantagem desse sistema seria presc indir da aç ão da autoridade, ou seja, de um c ontrole soc ial c onsc iente das
aç ões individuais no plano da ec onomia. Não se trata absolutamente de um laissez- f aire, de uma postura passiva de simples
abstenç ão, de deixar os atores agirem livremente no merc ado. A tarefa do Estado é agir no sentido de potenc ializar ativamente
os mec anismos de c onc orrênc ia e supri-los, mediante aç ão planejada, nos setores em que não são adequados.

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É c laro que o Estado deve zelar pela liberdade de produç ão, c ompra e venda, abstendo-se de intervir nesses proc essos. Deve
zelar, c onsequentemente, pela livre formaç ão dos preç os, tomando todo c uidado para não influenc iá-los, por meio de
subsídio ou de impostos exc essivos e diferenc iados. Mas deve também garantir ativamente, c om aç ões positivas nesse
sentido, a sanidade da moeda, a liberdade dos merc ados e a prevenç ão do monopólio, a livre c irc ulaç ão das informaç ões.
Importânc ia espec ial c abe à liberdade no proc esso de formaç ão de preç os, uma vez que os preç os são os indic
adores que informam, automátic a e c onstantemente, aos atores as variaç ões da disponibilidade de c ada bem, possibilitando
a tomada de dec isões rac ionais.

Deve o Estado, além disso, agir, de forma planific ada, em todos os setores nos quais a c onc orrênc ia seja impossível ou inóc
ua. O rec urso ao plano, portanto, não é exc luído de maneira absoluta por Hayek, mas ganha um c aráter c omplementar à c
onc orrênc ia e não substitutivo a ela.

Importa lembrar também que, na visão do autor, não é toda interferênc ia do Estado que distorc e a c onc orrênc ia. Medidas
que afetam por igual a todos os atores, c omo a legislaç ão trabalhista ou ambiental, não introduzem viés algum no proc
esso. Sua pertinênc ia, portanto, deve ser avaliada segundo um c álc ulo simples de c ustos e benefíc ios.

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3. Primeiro argumento a favor do socialismo: a


inevitabilidade

Uma vez apresentado o diagnóstic o e as definiç ões fundamentais, o autor passa a examinar os argumentos favoráveis e c
ontrários ao soc ialismo. É c laro que, para ele, destruir os argumentos favoráveis ao soc ialismo e mostrar, por outro lado, a c
orreç ão daqueles c ontrários a esse sistema é argumentar a favor do sistema alternativo, o liberalismo.

O primeiro argumento analisado pelo autor, a favor do soc ialismo, é a suposta inevitabilidade históric a da ec onomia c
entralmente planejada. O argumento, apresentado, entre outros, por Marx, postula que o progresso tec nológic o exige
unidades de produç ão c ada vez maiores para a obtenç ão dos ganhos de esc ala ótimos. Quanto mais avanç ada a tec nologia,
maiores seriam as unidades mínimas de c apital nec essárias ao investimento, maiores as fábric as, maiores as empresas. As
empresas menores, inc apazes de c onseguir o mínimo de c apital nec essário aos investimentos que as novas tec nologias
demandam, estariam c ondenadas à falênc ia, deixando espaç o aberto para pouc as e grandes empresas. Num merc ado
dominado por pouc as empresas, a tendênc ia inexorável, portanto, seria a substituiç ão, c om o tempo, da c ompetiç ão
entre os grupos empresariais por ac ordos, por uma ec onomia de monopólios e c artéis.

Alc anç ado esse estágio, o passo natural seria a substituiç ão do monopólio privado pelo públic o. Afinal, se os benefíc
ios da c onc orrênc ia desaparec em, não há razão para permitir a imposiç ão de luc ros extraordinários por agentes privados em
prejuízo dos c onsumidores. Melhor do que deixar as empresas gigantes explorarem a populaç ão seria estatizar a produç ão e
transferir a definiç ão de preç os e luc ros ao planejamento rac ional.

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Os soc ialistas, portanto, não ac eitam a ac usaç ão de que seu objetivo é dar fim à c onc orrênc ia na ec onomia. Para eles o
próprio c apitalismo está fazendo esse trabalho e c aberá ao soc ialismo apenas a substituiç ão do monopólio privado, que tem c
omo objetivo o luc ro de pouc os, pelo monopólio públic o, que tem por fim a perseguiç ão, rac ional, do bem c omum.

Para Hayek, a falha desse argumento c onsiste em supor que os resultados do desenvolvimento tec nológic o levam sempre a
uma únic a direç ão: a efic iênc ia maior das grandes unidades. Para ele, o avanç o da tec nologia pode vir a exigir unidades de
investimento maiores, mas esse não é o únic o resultado possível. Ao c ontrário, pode ser até previsível que, em c ertos c asos, a
maior c apac idade téc nic a faç a inc lusive c air, em montante absoluto, o ponto ótimo, em termos de retorno, da esc ala de
produç ão. O resultado, nesse c aso, seria o c ontrário: tornar viáveis empresas menores, que antes não tinham c omo c onc orrer
c om as maiores.

Mas, se esse argumento proc ede, se não existe determinismo tec nológic o, qual seria a razão do progresso evidente dos
monopólios nas ec onomias c apitalistas? Na opinião de Hayek, as c ausas desse fenômeno seriam essenc ialmente polític as. A aç
ão do Estado, na forma de favorec imentos e fac ilidades variadas, princ ipalmente tarifas protec ionistas c ontra produtos
estrangeiros, põe obstác ulos ao proc esso de c onc orrênc ia e c ria, assim, as c ondiç ões do surgimento e prosperidade dos
monopólios. Grandes empresas só exc luem sistematic amente as menores e substituem a c ompetiç ão pelos ac ordos quando
o Estado c ria as c ondiç ões polític as para isso.

Portanto, o primeiro argumento dos soc ialistas, a inevitabilidade da substituiç ão da c onc orrênc ia pelo monopólio privado e,
num segundo momento, pelo c ontrole estatal, é, na opinião de Hayek, falso.

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4. Segundo argumento a favor do socialismo: a racionalidade

O argumento da rac ionalidade é rec orrente na tradiç ão soc ialista.


Aponta a irrac ionalidade do func ionamento do merc ado c omo c
onsequênc ia da falta de c oordenaç ão das aç ões dos diferentes
agentes ec onômic os. Num regime de livre inic iativa, no qual a
propriedade dos meios de produç ão é pulverizada nas mãos de c
apitalistas individuais, não existe mec anismo de c oordenaç ão efic iente
das dec isões de produtores e c onsumidores. O ajuste para soluc
ionar qualquer desc ompasso entre produç ão e c onsumo é feito
posteriormente, pelo merc ado. Se algum bem falta, o preç o sobe e
sua produç ão é estimulada. Se existe sobra de outro, seu preç o c ai e
a produç ão diminui.

O problema do ajuste pelo merc ado era a oc orrênc ia de c rises ec onômic as periódic as. Os c
apitalistas individuais aumentavam sua produç ão sempre que podiam, a ec onomia passava por um c ic
lo de expansão até o momento em que os merc ados saturavam-se, ou seja, havia mais merc adoria
que c onsumidores. Tinha iníc io então um c ic lo rec essivo, c om retraç ão da atividade ec onômic a e a
proliferaç ão de falênc ias.

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Nessas c ondiç ões, o argumento soc ialista, diz que sem uma forma de c oordenaç ão prévia, que só o planejamento c entral
poderia garantir, o desc ompasso entre as dec isões de vendedores e c ompradores apresenta efeitos ac umulativos, que c
ulminam na ec losão de uma c rise, no dec orrer da qual boa parte das forç as produtivas é destruída e o desemprego e a miséria
são multiplic ados.

Na perc epç ão dos soc ialistas um sistema c omo esse, que alterna momentos de expansão e c rise, representa um desperdíc io
enorme de rec ursos materiais e humanos. O planejamento, adequando periodic amente produç ão e c onsumo, permitiria um
c resc imento ec onômic o c ontinuado, na medida das nec essidades soc iais. Para tal bastaria substituir a inic iativa de um
grande número de c apitalistas pela inic iativa do Estado, transferindo a propriedade de mãos privadas para o c ontrole públic o.

Para Hayek, o argumento deve ser invertido. O ônus da irrac ionalidade deve pesar não sobre o merc ado, mas sobre o
planejamento c entralizado. Numa ec onomia c omplexa, a quantidade de informaç ões em c irc ulaç ão nec essárias a seu bom
func ionamento é enorme e sua atualizaç ão, c onstante. É impossível um únic o agente gerir a totalidade dessas informaç ões,
sempre em mudanç a. Qualquer tentativa de fazê-lo tem c omo c onsequênc ia, portanto, alguma medida de inefic iênc ia ec
onômic a.

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Apenas o merc ado teria c ondiç ões de operar essas ec onomias c omplexas. Em primeiro lugar, as dec isões, no sistema de
merc ado, são desc entralizadas, de responsabilidade de uma multiplic idade de agentes ec onômic os. Em segundo lugar, a c
oordenaç ão de suas aç ões se dá de maneira impessoal e automátic a, por meio do sistema de preç os. Os preç os c
onstituem os mostradores que sinalizam as informaç ões nec essárias aos agentes. Por isso é tão importante sua formaç ão
livre: qualquer interferênc ia do Estado distorc e a formaç ão de preç os e leva os agentes a tomarem dec isões c om base em
informaç ões equivoc adas.

A c onc orrênc ia é, portanto, dotada de rac ionalidade maior que qualquer tipo de planejamento. Ac iona, automatic
amente, mec anismos de c orreç ão de todos os desequilíbrios momentâneos que provoc a. O planejamento, por sua vez,
seria tanto mais inefic iente quanto maior fosse a c omplexidade da ec onomia.

Na avaliaç ão de alguns autores, o argumento de Hayek não tinha fundamentos empíric os na époc a em que foi elaborado. Afinal,
até a déc ada de 1950, ec onomias c entralmente planific adas, c omo a soviétic a, mostraram desempenho superior, em
termos de c resc imento, ao do mundo c apitalista. No entanto, a evoluç ão tec nológic a rec ente teria aumentado em muito a
c omplexidade dos ambientes ec onômic os, de maneira a c onferir, hoje, validade ao argumento.

Em síntese, Hayek desc arta, também, o segundo grande argumento apresentado em defesa do soc
ialismo.

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5. Primeiro argumento contrário ao socialismo: o déficit


democrático

A seguir, Hayek desenvolve os argumentos c ontrários ao soc ialismo. O primeiro a ser abordado sustenta a existênc ia, em
algum grau, de um défic it democ rátic o em toda forma de soc ialismo.

A razão, para o autor, é simples. A efic iênc ia de todo planejamento dec orre da adequaç ão entre os fins proc urados e os
meios empregados. Portanto, o suc esso do planejamento c entralizado da ec onomia exigiria uma c lara definiç ão dos fins
pretendidos pelo c onjunto da soc iedade e a mobilizaç ão de todos os esforç os soc iais para o seu alc anc e. De uma maneira
ou outra, trata-se de definir um objetivo, supostamente mais relevante que os demais, e impô-lo à soc iedade. Com a promessa
de reduç ão da inc erteza, do risc o, proc ura-se c onseguir uma maior uniformidade entre os c idadãos, pelo menos no que diz
respeito a esse objetivo primeiro.

Alguns poderiam argumentar que não se trata de produzir a uniformidade em todos os objetivos e finalidades que os c
idadãos possam ter. Apenas os objetivos maiores, c omo a igualdade e a prosperidade, seriam definidos previamente e exigiriam
a aprovaç ão de toda a soc iedade. Abaixo desses, todos os fins da atividade humana seriam definidos livremente.

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Para Hayek, não é possível sustentar que apenas o fim maior, o objetivo mais importante seria predefinido pelo plano. A efic
iênc ia do planejamento será tão mais c ompleta quanto maior for a possibilidade de previsão posta à disposiç ão do
planejador. Daí que, uma vez definido o objetivo maior a ser perseguido, todos os objetivos sec undários devem passar a
hierarquizar-se entre si, de uma únic a maneira, válida para todos. Na verdade, o c ontrole por meio do plano supõe um c ódigo
moral c ompleto, ac eito pela soc iedade. Nesse sentido, o planejamento c entralizado supõe um Estado "moral", que persegue
determinadas formas de vida c onsideradas "boas" e reprime ou desvaloriza aquelas outras c onsideradas "indesejáveis". Um
Estado moral que tenderia sempre, por c onseguinte, ao fundamentalismo. Um estado liberal, por sua vez, seria neutro em relaç
ão às diferentes formas de vida presentes na soc iedade, seria não moral, mas "laic o".

Num c ontexto de soc iedades c omplexas, a possibilidade de se obter, pela persuasão, c onsenso sobre um c ódigo moral c
ompleto, qualquer que seja ele, é nula. O plano exige, portanto, um grau de c onsenso maior do que o existente e do que seria
possível nas soc iedades c ontemporâneas. O défic it nec essário de c onsenso deve, portanto, sempre ser suprido por algum
grau, maior ou menor, de c oerç ão.

Isso pode oc orrer de diversas formas. A c oerç ão pode ser aberta, c omo nos regimes autoritários, ou velada, c omo ac ontec
e em muitas democ rac ias. Nesse último c aso, uma das maneiras mais frequentes de implementar alguma estrutura
de objetivos hierarquizados c onsiste em retirá-la da aprec iaç ão do parlamento. Conjuntos de dec isões relevantes são
delegadas pelos parlamentares à regulamentaç ão posterior. Deixam, assim, o âmbito da polític a e passam ao da simples "téc nic
a".

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Para o autor, esse proc esso, que oc orre todos os dias em vários países, é perfeitamente lógic o. A forma de g o v e rn o
adequada a uma soc iedade que adota c oletivamente alguns objetivos c omo mais importantes não passa pela representaç ão
dos c idadãos, mas por equipes de peritos, enc arregadas da produç ão dos meios mais efic ientes, subordinadas a um líder,
guardião dos objetivos últimos da c oletividade. Mesmo quando o autoritarismo não é aberto, uma situaç ão c om essa
representa um passo no c aminho da servidão.

É importante lembrar que, para Hayek, uma situaç ão de fim da democ rac ia ou de risc o alto de sua perda, não exige o c
ontrole estatal da totalidade da ec onomia. Altos perc entuais de c ontrole públic o são sufic ientes para pôr em risc o a
democ rac ia. Numa situaç ão c omo a que vivia a Alemanha em 1928, na qual o Estado c ontrolava diretamente 53% da vida
ec onômic a, as dec isões privadas nos 47% restantes dependiam sempre de alguma dec isão no âmbito do monopólio públic o. O
c aminho estava aberto para o sac rifíc io c ompleto da democ rac ia, que veio a oc orrer somente em 1933, c om a asc ensão dos
nazistas.

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6. Segundo argumento contrário ao coletivismo: o fim do Estado de


direito

No entanto, o c ontrole da ec onomia por meio de planos c entralizados não seria inc ompatível apenas c om a democ rac ia, mas
c om o próprio Estado de direito. Em outras palavras, Hayek afirma que a adoç ão de toda inc linaç ão soc ialista não apenas leva
o Estado a tomar dec isões fora das instânc ias democ rátic as, mas o leva, também, a uma tendênc ia a violentar os limites da
lei.

Num regime que respeita a c onc orrênc ia, o Estado é limitado. As leis têm c omo c arac terístic a princ ipal seu aspec to
formal. Em outras palavras, definem formas e proc edimentos nec essários à c onsec uç ão de uma aç ão.

No momento em que o Estado ultrapassa esse limite e pretende definir objetivos a serem alc anç ados e as aç ões nec essárias
para tanto, adquire, na legislaç ão, mais importânc ia seu aspec to material. A pretensão de inc idir sobre c asos partic ulares,
de previsão impossível em seus pormenores, deixa nec essariamente margem para dec isões arbitrárias por parte do Poder Públic
o.

Maior margem de arbítrio do Estado equivale a imprevisibilidade maior de suas aç ões e, c onsequentemente, menor liberdade
para o c idadão. Conforme o exemplo extremado do autor, no Estado limitado as leis são c omparáveis a um c ódigo de trânsito:
dizem c omo o c idadão deve se loc omover; no Estado intervenc ionista, as leis dizem aonde o c idadão deve ir.

Segundo o autor, portanto, a intervenç ão do Estado na ec onomia, em busc a de objetivos previamente fixados, gera
perdas perigosas, em termos de democ rac ia e de legalidade.

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7. Argumento a favor da concorrência: a


justiça

A favor da c onc orrênc ia, Hayek levanta, em primeiro lugar, o argumento da justiç a. O proc esso seria justo por ser
impessoal e automátic o. Nenhum dos agentes envolvidos dispõe da possibilidade de c onferir um viés de maneira a prever o
resultado final de uma operaç ão, ou seja, c onc retamente, quem será benefic iado e quem será prejudic ado. O resultado
depende da quantidade de rec ursos c om que c onta c ada um dos envolvidos, do seu desempenho e de uma dose variável de
sorte. A c onc orrênc ia, portanto, é fundamentalmente não disc riminatória.

É c erto que não há igualdade de oportunidades. A propriedade privada é requisito do proc esso e sua distribuiç ão é desigual.
No entanto, a esc assez relativa de oportunidades é c ompensada, segundo o autor, pelo maior grau de liberdade que benefic ia a
todos, ric os e pobres. Daí que o pobre inglês seja, para ele, mais livre que um empresário de pequeno porte ou o exec utivo de
uma grande empresa em um país c omo a Alemanha nazista.

O direito de heranç a, responsável por desigualdades de rec ursos que não dependem do mérito individual, não é indispensável
ao bom func ionamento do sistema. O direito à propriedade privada, c ontudo, é seu fundamento. Na sua ausênc ia, as dec
isões sobre rendimentos individuais diferenc iados poderiam c aber apenas ao Estado, o que bastaria para nos mergulhar no
mundo da servidão.

Mesmo no c aso de c onc orrênc ia frac a ou inexistente, c omo a que se


verific a numa ec onomia dominada por monopólios, a propriedade privada seria
preferível, do ponto de vista da liberdade, ao monopólio públic o, na visão do
autor. Num mundo dominado por um número pequeno de c orporaç ões,
a margem de autonomia dos indivíduos, embora pequena, ainda é maior
que numa situaç ão de c ontrole absoluto da vida ec onômic a em seu todo
por um só agente: o Estado. Um sistema em que os ric os são poderosos é
preferível a outro, em que só os poderosos são ric os.

O c entro do argumento está na impessoalidade da c onc orrênc ia. Ao c


ontrário do Estado, o merc ado, quando opera em c ondiç ões livres, não
pode ser apropriado por indivíduos e posto ao serviç o de seus interesses. A
liberdade dos atores e a justiç a do resultado está no c aráter indeterminado
do proc esso.

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8. Os argumentos da
segurança

No que respeita à questão da seguranç a individual, liberais e c oletivistas afirmam a superioridade de suas
propostas. Evidentemente, este debate funda-se, na maior parte das vezes, em c onc epç ões distintas do que seja a seguranç a
do indivíduo.

Para Hayek, o c oletivismo promete a seguranç a do indivíduo c ontra as vic issitudes do merc ado. A garantia da manutenç ão
de seu emprego, em qualquer c irc unstânc ia, e, mais ainda, a da manutenç ão de sua renda, de seu salário, mesmo que as c
ondiç ões que tornavam seu trabalho mais valorizado tenham desaparec ido.

Ambas as garantias, quando implementadas, geralmente por forç a das c orporaç ões sindic ais, redundam, para os liberais, em
prejuízo dos c onsumidores e dos trabalhadores menos protegidos: os desempregados e aqueles integrantes de c ategorias não
organizadas.

As tentativas de manter artific ialmente empregos tornados obsoletos pelo progresso tec nológic o privam a soc iedade dos
benefíc ios ec onômic os desse progresso. Bens e serviç os que poderiam ser ofertados a c usto menor, passam a onerar desnec
essariamente o c onsumidor. O efeito ac umulado de dec isões dessa ordem traduz-se em perda de c ompetitividade e de c resc
imento ec onômic o, em perda de novos empregos, portanto. Do outro lado da balanç a, os ganhos da dec isão c onc entram-se
na c ategoria benefic iada pela dec isão de preservá-la.

Da mesma forma, mudanç as que reduzam o c usto do trabalho de alguns setores não devem ser reprimidas. Se o salário
puder refletir, nesses c asos, exatamente o que a soc iedade está disposta a pagar por ele, esses trabalhadores passarão a
ganhar menos, mas outros poderão c onseguir, por sua vez, emprego ou salários melhores.

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O problema punha-se c om toda atualidade à époc a do livro de Hayek, em razão dos empregos c riados pela ec onomia de guerra
que iriam desaparec er ou pagar salários menores depois da paz. Alguns soc ialistas propunham a c ontinuidade da ec onomia
de guerra mesmo em tempo de paz. O autor defendia, c oerentemente, o exerc íc io exc lusivo da c onc orrênc ia para a
definiç ão dos novos patamares de salários.

Os defensores do liberalismo, por sua vez, apresentavam um c onc eito mais restrito de seguranç a. O Estado liberal não oferec
eria proteç ão c ontra o merc ado, mas poderia garantir toda forma de seguranç a c ompatível c om o sistema de seguros; a
seguranç a previdenc iária, c usteada pelos benefic iários; a assistênc ia soc ial em c asos de c alamidade públic a; e alguma
forma de auxílio para sobrevivênc ia, no c aso de desemprego. Nenhuma dessas medidas fere, segundo o autor, os princ ípios
do liberalismo. A questão a ser disc utida, na sua opinião, é se esses c idadãos, enquanto durasse a situaç ão de dependênc ia
para c om o Estado, poderiam dispor de seus direitos polític os. Em outras palavras, o problema, c lássic o para os liberais, está
em saber se a pessoa que não provê a própria subsistênc ia pode emitir um voto autônomo ou não.

Depois de negar a nec essidade históric a do soc ialismo, de negar sua validade em nome da rac ionalidade, da democ rac
ia, da legalidade e da justiç a, Hayek atac a o c onc eito de seguranç a individual c ompatível c om o soc ialismo e o c
ontrapõe ao entendimento liberal de seguranç a.

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9. Os argumentos
morais

É prec iso esc larec er, de iníc io, o que se entende, neste c urso, por argumentos morais, uma vez que o autor estudado não
utiliza essa expressão em sua obra. Inc luímos neste tópic o os argumentos que dizem respeito ao tipo de c idadão e de soc
iedade que uma ec onomia regida pelo planejamento c entralizado produz. Todos eles estão fundados em premissas
valorativas a respeito do que c onstitui, para o autor, o ideal de c idadão e de soc iedade.

Em primeiro lugar, temos o tipo de c idadão que c ada sistema produz, em sua aplic aç ão c ontinuada. Uma soc iedade liberal, em
que o Estado c ria as c ondiç ões para o exerc íc io da livre inic iativa do c idadão, preza um tipo espec ífic o de virtudes: a
autonomia, a responsabilidade e a tolerânc ia. O rec onhec imento soc ial é devido ao c idadão que exerc e sua autonomia, toma
dec isões, assume os ônus e benefíc ios delas dec orrentes.

Uma soc iedade regida por uma ideologia c oletivista, por sua vez, preza outro tipo de qualidades: o altruísmo, o
desprendimento individual, espec ialmente se em benefíc io do c oletivo; a obediênc ia; o respeito à hierarquia; a seguranç a. O
protótipo do indivíduo digno de respeito é o buroc rata, o servidor públic o que tem seus honorários assegurados para sempre, c
ujo c ódigo de valores exige a obediênc ia c ega e impessoal à norma.

Esse tipo de valores é adequado a algumas instituiç ões, c uja própria finalidade é inc ompatível c om o regime da c onc orrênc ia,
c omo as buroc rac ias c ivil e militar. No entanto, diz Hayek, o ponto liberal c onsiste justamente em resistir à organizaç ão
da soc iedade c omo um todo em moldes militares ou buroc rátic os.

O segundo argumento diz respeito ao tipo de militante que os partidos de ideário c oletivista rec rutam. Convenc idos da
superioridade dos fins por que se batem, esses partidos se organizam à maneira militar. Busc am c riar fileiras de
partidários numerosas, homogêneas e disc iplinadas. Seu apelo é maior junto aos menos instruídos, para quem a homogeneidade
de idéias é mais palatável; aos mais dóc eis e simplórios, que ac eitam c om mais fac ilidade a disc iplina rígida; aos mais partic
ularistas, que respondem aos apelos de mobilizaç ão c ontra os pretensos inimigos da c ausa; e aos mais intolerantes.

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O tipo humano que faz c arreira partidária nessas organizaç ões é o pior que se pode enc ontrar na soc iedade, na opinião do
autor. Além disso, a própria lógic a do c ódigo moral c ompleto e absoluto deixa pouc o espaç o para c onsideraç ões
sobre regras de c omportamento situadas ac ima dos fins perseguidos. A tendênc ia é, enfim, a de todo e qualquer meio ser
julgado válido, se efic az em termos dos fins proc urados. A lideranç a desses partidos seria selec ionada entre aqueles que
melhor perc ebessem e aplic assem essa máxima.

Finalmente, uma soc iedade em que a planific aç ão ec onômic a haja substituído por c ompleto a inic iativa individual, c om
todas as c onsequênc ias polític as desse fato, assistiria ao fim da verdade. Para o autor, a verdade, na c iênc ia c omo na
polític a, resulta do c ontraditório, da oposiç ão de argumentos entre dois atores, entre ego (eu) e alter (outro). Uma soc
iedade sujeita a uma únic a esc ala de valores, indisc utível, é uma soc iedade onde só há ego e não existe alter. Sem
possibilidade de diálogo, de c rític a, a verdade passa a ser uma questão de propaganda. À estatizaç ão da produç ão segue-se a
estatizaç ão da c onsc iênc ia.

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Nesta unidade, examinamos o diagnóstic o que o autor apresenta da c


onjuntura polític a em que a obra aparec eu; as definiç ões que oferec e
de soc ialismo e liberalismo; as refutaç ões que apresenta aos
argumentos mais importantes em defesa do soc ialismo, a saber, a sua
inevitabilidade e rac ionalidade superior; e, finalmente, os argumentos
que levanta c ontra o soc ialismo e a favor do liberalismo, relativos à
democ rac ia, à legalidade, à justiç a, à seguranç a e à moralidade.

Parabéns! Voc ê c onc luiu a segunda unidade. Vamos prosseguir?

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Unidade 3 - Para uma teoria da democracia

Vimos, na última unidade, uma série de argumentos levantados, de um ponto de vista liberal, a favor da liberdade ec onômic a,
da livre inic iativa individual nesse c ampo. No entanto, a disc ussão da democ rac ia polític a, sua possibilidade e formas de
realizaç ão, oc upa um espaç o igualmente importante no ideário liberal. Ac ompanharemos o debate a respeito dessa questão
a partir de um trabalho do c ientista polític o norte-americ ano Robert Dahl , public ado em 1956: "Um Prefác io à Teoria Democ
rátic a".

Constarão desta unidade, sobre democ rac


ia:
modelo
madisoniano;
modelo poliárquic o;
modelo populista.

O autor parte da c onstataç ão da prec ariedade das teorias sobre a democ rac ia em disc ussão até
aquele momento, seja do ponto de vista de sua c apac idade desc ritiva, seja do ponto de
vista de sua c apac idade normativa. Em outras palavras, as teorias disponíveis não c onseguiam
desc rever de forma adequada as democ rac ias realmente existentes, nem apontar c aminhos para
outras formas de democ rac ia entendidas c omo superiores.

Na tentativa de sanar essas defic iênc ias, o autor agrupa


esse c onjunto de teorias sobre a democ rac ia em dois grandes
modelos gerais, de influênc ia mais profunda, teóric a e
prátic a: a democ rac ia madisoniana e a democ rac ia
populista. Proc ede, em seguida, a sua análise e, a partir das
lac unas e inc onsistênc ias neles loc alizadas, c onstrói um
modelo alternativo de democ rac ia, que denomina poliarquia.

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P ág. 2

1. A Democrac ia Madisoniana

O modelo tem esse nome em homenagem a um de seus primeiros e mais lúc idos proponentes,
James
Madison, membro da Convenç ão que redigiu a Constituiç ão
norte- americ ana. Na verdade, as premissas ac eitas por esse modelo
permearam todos os trabalhos daqueles c onstituintes e presidiram,
portanto, a arquitetura da Constituiç ão dos Estados Unidos da Améric
a. Mais ainda, ganharam de tal maneira o senso c omum do c idadão
que essa c onc epç ão espec ífic a de democ rac ia equivale, para os
norte-americ anos de hoje, à democ rac ia em geral.

A idéia fundamental é a nec essidade


de c onc iliar dois princ ípios
aparentemente
c ontraditórios: o poder de dec isão da maioria e o poder das minorias
de vetar algumas dec isões dessa maioria, quando c onsideradas
injustas ou tirânic as. Essa vertente tenta abrigar simultaneamente
as regras da igualdade polític a e da limitaç ão do poder. É
apresentada por Dahl na forma de uma sequênc ia de seis hipóteses,
sequênc ia que iremos seguir.

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Pág. 3

Hipótese 1

Na ausênc ia de c ontroles externos, quaisquer indivíduos ou grupos de indivíduos tentarão tiranizar


os demais.

Controle externo signific a basic amente rec ompensa ou puniç ão aplic ada por outra pessoa. Tirania,
por sua vez, é entendida c omo grave privaç ão de um direito natural. Põe-se, evidentemente, a
questão: que é um direito natural? Trata-se de um c onjunto de direitos invioláveis por qualquer
parte da soc iedade, mas c omo defini-los? Por outro lado, quão grave deve ser a privaç ão para
resultar em tirania? Aparentemente, um c ritério possível deve ser o da presenç a ou ausênc ia de c
onsentimento
dos atores envolvidos. De toda maneira, dessas lac unas fundamentais derivam inc onsistênc ias
lógic as que o autor explorará posteriormente e c onsiderará na elaboraç ão de seu modelo
alternativo.
Hipótese 2

A ac umulaç ão dos três poderes (Legislativo, Exec utivo e Judic iário) nas mesmas mãos equivale à
ausênc ia de c ontrole externo. Daí que, numa situaç ão c omo essa, podem oc orrer as Hipóteses 3
ou 4.

Hipótese 3

A maioria tiranizará a minoria.

Hipótese 4

A minoria tiranizará a maioria.

Como c omprovar esse c onjunto de hipóteses? A de número 1 é uma proposiç ão empíric a e os proponentes do modelo
levantavam a seu favor exemplos históric os, da antiguidade c lássic a, ou axiomas psic ológic os derivados de Hobbes; os
homens sempre são guiados por seus desejos e na busc a de sua satisfaç ão só se detêm diante de obstác ulos externos.

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Pág. 4

Cabe assinalar também que o grande perigo c ontra o qual se volta o modelo é a hipótese 3 (a maioria tiranizará a minoria), uma
vez que a simples aplic aç ão do princ ípio republic ano, a tomada de dec isões por maioria de votos, torna difíc il a manutenç
ão de uma tirania de um grupo minoritário. Há que se c riar, então, mec anismos de prevenç ão da tirania da maioria, ou seja, de
salvaguarda dos direitos da minoria.

Na sequênc ia da argumentaç ão, o modelo fornec e uma definiç ão de repúblic a c omo o sistema no qual o poder deriva do
povo e é administrado por mandatários eleitos pelo povo, por um período determinado. A repúblic a é tida c omo c ondiç ão nec
essária, porém não sufic iente, de uma situaç ão de ausênc ia de tirania. Alternativas c omo a monarquia c onstituc ional são,
portanto, exc luídas a priori por essa vertente.

Se os direitos naturais devem ser respeitados, se a ausênc ia de tirania é o estado desejável, se a repúblic a é c ondiç ão nec
essária mas não sufic iente, o problema a ser enfrentado é o da c riaç ão de uma repúblic a não tirânic a. Quais as c ondiç ões
para a existênc ia de uma repúblic a desse tipo?

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Hipótese 5

São c ondiç ões para uma repúblic a não tirânic a:


a separaç ão de poderes;
e o c ontrole das fac ç ões.

No entanto, há uma hipótese implíc ita no enunc iado anterior que deve ser explic itada. Uma repúblic a implic a c ontrole do povo
sobre o gov erno e a eleiç ão periódic a dos mandatários. Dizer que c ondiç ões adic ionais são nec essárias para não haver tirania
implic a dizer que as c ondiç ões presentes na definiç ão são insufic ientes para prevenir a tirania. Segue-se, portanto, que:

Hipótese 6

Eleiç ões frequentes não c riam c ontroles externos sufic ientes para evitar a tirania.

Se a simples prátic a do voto não basta, mec anismos c onstituc ionais que c riem c ontroles externos sobre os c entros de poder
devem ser c riados. A Constituiç ão americ ana se fundamenta em toda uma rede de pesos e c ontrapesos, que dividem o exerc
íc io do poder e impõem c ontroles mútuos entre as partes. Entre outros mec anismos, podem ser lembrados a separaç ão de
poderes, o f ederalismo, o bic ameralismo, o v et o presidenc ial o c ontrole judic ial da legislaç ão, a nomeaç ão de alguns
func ionários por um poder e sua c onfirmaç ão por outro, a existênc ia de eleitorados separados.

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Como atender, no entanto, ao segundo requisito, o c ontrole das fac ç ões? Fac ç ão, no enfoque madisoniano (James
Madisom), é todo grupo de c idadãos que se reúne c om objetivos que impliquem a violaç ão dos direitos de outros c idadãos
ou o prejuízo dos interesses da c oletividade. Num regime democ rátic o, a diferenc iaç ão das opiniões é natural e não pode ser
evitada. A fac ç ão não deve ser c ontrolada em sua formaç ão, o que c hegaria perto da tirania, mas nos seus efeitos
indesejáveis e prejudic iais.

Na lógic a do modelo, c omo vimos, as fac ç ões minoritárias


são c ontroladas pelo princ ípio republic ano. As fac ç ões
majoritárias, por sua vez, veriam a sua aç ão dific ultada ou
mesmo impossibilitada numa das seguintes situaç ões previstas
pelo modelo: quando o eleitorado é numeroso, quando é variado
em c omposiç ão e quando é diversific ado em interesses. Ou
seja, o número e a diversidade dos c idadãos tornam difíc il a
formaç ão de maiorias organizadas em torno de objetivos tirânic
os sobre a parte minoritária do eleitorado

Pesam, no entender de Dahl c ontra essa teoria, diversas objeç ões, de c aráter lógic o e empíric o, de difíc il refutaç ão. Em
primeiro lugar, a ênfase nos freios c onstituc ionais obsc urec e a importânc ia dos c hamados c ontroles internos. Trata-se
aqui do que c onsideramos hoje as bases da c ultura democ rátic a de uma soc iedade. Sabemos que, quando a democ rac ia
está ausente dos hábitos e da c ultura de um povo, de nada valem os dispositivos c onstituc ionais e legais. Diversos países
do mundo adotaram estruturas legais inspiradas no modelo norte-americ ano e nem por isso garantiram uma história de
desenvolvimento democ rátic o.

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Os madisonianos podem argumentar que os c ontroles internos são importantes mas não infalíveis e os mec anismos c onstituc
ionais de pesos e c ontrapesos estariam presentes para resolver os c asos que esc apam aos c ontroles internos. Mas, nesse
c aso, os c ontroles externos de c unho soc ial antes que c onstituc ional, dos quais o mais importante é o voto, não são mais efic
ientes?

No plano empíric o, está c laro que existem diversas democ rac ias, todas as que adotam o sistema parlamentarista, a c omeç
ar pela Grã- Bretanha, nas quais a separaç ão de poderes não vige. Pelo c ontrário, a regra é a subordinaç ão integral do
Exec utivo ao Legislativo.

Do ponto de vista lógic o, a teoria falha ainda em oferec er uma definiç ão plausível do que sejam os direitos naturais. Exc luído o
apelo a uma determinaç ão de ordem transc endente, c omo a divindade, por exemplo, quem define quais são esses direitos?
Se c abe à maioria fazê-lo, a própria idéia de uma tirania da maioria perde sentido e, c om ela, a razão de toda a arquitetura c
onstituc ional que c arac teriza o modelo.

Analogamente, c omo distinguir uma fac ç ão de um agrupamento legítimo de c idadãos? Nenhum grupo dec lara ser seu
propósito violentar os direitos de outros c idadãos ou os interesses da c oletividade. A impossibilidade de definir o que seja fac ç
ão leva a que os mec anismos de limitaç ão à disposiç ão das minorias sirvam para impedir qualquer dec isão da maioria, justa ou
injusta. A aplic aç ão c onsequente do sistema de pesos e c ontrapesos leva simplesmente, portanto, à limitaç ão do poder da
maioria, em qualquer c aso, por algum tipo de minoria. É um sistema em que as dec isões não dependem apenas da vontade da
maioria, mas da inexistênc ia de vetos por parte daquelas minorias em c ondiç ões de impô-los.

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2. A Democrac ia
Populista

Vimos que a teoria madisoniana c onsiste num esforç o para c onc iliar dois princ ípios c ontraditórios: poder da maioria e
poderes limitadores das minorias. Se o princ ípio do poder das minorias é tornado absoluto, saímos do c ampo da democ rac ia e
ingressamos no terreno dos diversos regimes oligárquic os. A segunda alternativa, a maximizaç ão da regra da maioria, ou seja,
postular que a regra da maioria é aplic ada em todos os c asos e sempre tem a última palavra, nos leva ao segundo modelo
analisado: a democ rac ia populista.

Importa lembrar que o modelo não defende o poder absoluto e imediato da maioria. É evidente que sobre esse poder
pesam c ontroles internos, presentes na c ultura polític a do c idadão, c ontroles soc iais rec íproc os e, também aqui, c
ontroles de c aráter c onstituc ional. O modelo não nega a existênc ia desses c ontroles, simplesmente rec onhec e seu
fundamento, imediato ou não, na vontade da maioria.

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Tal c omo no c aso anterior, o autor apresenta a teoria a partir de uma sequênc ia de definiç ões.

Definição 1
Duas são as c ondiç ões da democ rac
ia: Primeira: a soberania popular; e
Segunda: a igualdade polític a.

Definição 2
Há soberania popular quando a alternativa esc olhida é a preferida da maioria.

Definição 3
Há igualdade polític a quando o voto de c ada pessoa tem o mesmo valor.

Da aplic aç ão c onjunta das três definiç ões prec edentes, c hega-se à regra democ rátic a, que c hamaremos doravante
simplesmente regra:

Definição 4
A regra democ rátic a é aplic ada quando, entre duas alternativas, a esc olhida é a
preferida pelo maior número.

Finalmente, uma proposiç ão importante, c omo veremos, diz que a regra deve ser aplic ada c omo último rec urso,
esgotadas as possibilidades de obtenç ão de um c onsenso pela via argumentativa.

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Em primeiro lugar, no que se refere ao aspec to téc nic o, há a c


onsiderar a questão dos eleitores indiferentes. Como c omputar o
posic ionamento indiferente para alc anç ar uma dec isão majoritária?
Normalmente esses votos são desc onsiderados, c omo abstenç ões, e
a maioria é proc urada entre os votos definidos, a favor ou c
ontra. Essa soluç ão permite, c ontudo, a definiç ão de dec isões que
não c ontam c om a preferênc ia da maioria dos c idadãos, mas apenas
da maioria dos c idadãos definidos.

Em segundo lugar, há o problema do empate. A regra não nos oferec


e uma soluç ão para o c aso de o número de votos favoráveis e c
ontrários a
uma alternativa determinada ser igual. O voto de Minerva violenta a regra de forma c lara.
Sem soluç ão, esses c asos c onduzem ao impasse e, no limite, à sec essão do c orpo polític o e à
guerra c ivil. O exemplo históric o mais evidente no c aso norte-americ ano foi a dec isão de não
permitir a esc ravidão nos novos territórios do oeste, que levou o país à guerra c ivil.

O autor lembra que, quanto mais uma dec isão aproxima-se de uma divisão de opiniões em 50%, mais perde a regra
legitimidade. Se as posiç ões, além de opostas, são defendidas c om intensidade, são perc ebidas c omo relevantes pelos atores, a
separaç ão do c orpo polític o parec e ser a únic a saída.

A simples inaç ão não resolve situaç ões c omo essa, dado que, normalmente, é uma das opç ões em jogo. A polarizaç ão dá-se
entre propostas de mudanç a do status quo e outras, que busc am sua c onservaç ão. Não fazer algo representa normalmente
tomar partido por um dos lados da disputa.

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Em terceiro lugar, há objeç ão no que diz respeito à existênc ia de mais de duas alternativas em jogo. Nesse c aso, a apuraç
ão da maioria dependerá sempre de uma regra que c onfira peso às segundas opç ões de c ada eleitor, c om alguma forma de
segundo turno, ou rec use esse peso, possibilitando a formaç ão de maiorias inferiores à metade do eleitorado. Segue-se que a
regra func iona bem em situaç ões relativamente simples, em que as alternativas são apresentadas aos pares aos votantes.

Um segundo grupo de objeç ões disc ute as limitaç ões do c onteúdo da


regra.

A primeira diz que a regra é inc apaz de resolver a questão da intensidade das preferênc ias dos eleitores. A situaç ão relevante
aqui é a de uma maioria pequena e apátic a quanto a uma posiç ão qualquer prevalec er, c onforme a regra, sobre uma minoria
signific ativa que opta, intensamente, pela alternativa oposta. Exemplific ando: 51% dos membros de um determinado c
olégio opta pela alternativa A num problema que não é tão signific ativo para eles, mas vital para os 49% que preferem a
alternativa perdedora. Trata-se de uma nova versão do problema da tirania da maioria, disc utido a seguir c om mais
pormenores pelo autor. Em todo c aso, é importante assinalar que esse tipo de problema ganha hoje um signific ado que não
apresentava na époc a da public aç ão do livro. Nesse mais de meio séc ulo as soc iedades ganharam em diversidade c ultural, de
maneira que a heterogeneidade de valores tende a tornar prátic a e frequente essa questão outrora rara ou teóric a.

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Conforme uma segunda c rític a, a democ rac ia populista maximiza apenas dois valores: a igualdade polític a e a soberania
popular. A pergunta é: está o c idadão sempre disposto a optar por esses dois valores, sac rific ando sistematic amente todos os
demais quando se apresentem c omo c ontraditórios àqueles? Até que ponto estamos dispostos a sac rific ar, por exemplo,
prosperidade material e seguranç a à democ rac ia? Há um ponto em que é possível optar por restringir a democ rac ia em
nome de algum outro objetivo? Se esse ponto existe, a teoria não nos diz nada sobre ele.

Um terc eiro grupo de c rític os alega que o governo da maioria é impossível. Sempre as elites governam de fato, mesmo
quando, de direito, o poder pertenc e ao povo. Embora a tirania da maioria seja impossível, nessa perspec tiva, o modelo
madisoniano seria mais interessante, por prever alguma forma de divisão do poder entre parc elas dessa elite e seu c ontrole
mútuo.

Finalmente, os partidários da democ rac ia populista não informam o que fazer quando a vontade da maioria se inc lina
para a supressão do próprio sistema democ rátic o. Quando a democ rac ia populista tenta c ometer suic ídio elegendo c
andidatos e partidos dec laradamente autoritários, que fundamentam sua c ampanha na supressão das eleiç ões, por
exemplo, qual o mec anismo de preservaç ão proposto? Cabem, nesse c aso, mec anismos de veto de minorias, c omo no
modelo anterior, na forma de c láusulas pétreas na Constituiç ão ou de c ontrole judic ial das dec isões legislativas por uma c
orte espec ífic a?

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O autor faz questão de lembrar que a experiênc ia norte-americ ana indic a, c ontudo, que a aç ão da Suprema Corte, nos c
asos de dec laraç ão de inc onstituc ionalidade de leis sempre (até 1956, pelo menos) dirigiu-se no sentido de restringir direitos
do c idadão, não no de ampliá-los. As seis dec isões relativas a leis sobre os direitos c ivis dos negros c ontrariaram dec isões
legislativas que ampliavam os direitos dessa parc ela da populaç ão. A princ ipal c rític a que o modelo merec e, na visão do
autor, c ontudo, é seu c aráter abstratamente normativo. A teoria diz o que deve ser uma democ rac ia, mas não nos oferec e
instrumentos para rec onhec er quando e c omo uma determinada organizaç ão soc ial opera democ ratic amente.

Veremos a seguir c omo o autor tenta superar as imperfeiç ões dos dois modelos analisados c om a elaboraç ão de uma
terc eira alternativa: a poliarquia.

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3. A de moc racia
poliárquica

A maior preoc upaç ão do modelo elaborado pelo autor enc ontra-se justamente na dimensão empíric a. Quais as c
ondiç ões nec essárias e sufic ientes para maximizar a democ rac ia no mundo real? Ou seja, que c onselho daríamos a uma c
oletividade que pretendesse operar democ ratic amente? Quais os eventos que temos que observar para c onc luir pela
existênc ia de um regime democ rátic o? Trata-se, enfim, da busc a de marc adores adequados, uma vez que a simples realizaç
ão de eleiç ões periódic as não é sufic iente para nos dizer algo a esse respeito.

Para responder a essas perguntas o autor elabora uma relaç ão de oito c ondiç ões nec essárias à existênc ia de democ rac ia no
mundo real. Trata-se de um tipo ideal, ou seja, de uma situaç ão de democ rac ia ótima que não se enc ontra, em sua
forma pura, em nenhuma organizaç ão existente. Como ideal, serve também para medir o grau de aproximaç ão ou distanc
iamento das democ rac ias existentes e, c onsequentemente, para c ompará-las entre si.

As oito c ondiç ões são:


Primeira: todos votam;
Segunda: todos os votos têm o mesmo valor;
Terceira: a alternativa majoritária é dec larada venc edora.

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Até o momento não superamos ainda a regra que define as democ rac ias populistas. No entanto, sabemos todos, as eleiç
ões realizadas em regimes totalitários c umprem igualmente essas regras, sem c onformarem de moc rac ias de fato. Algo mais é
nec essário, portanto:

Quarta: todos os partic ipantes podem inserir alternativas na eleiç ão; e


Quinta: todos os partic ipantes têm ac esso às mesmas informaç ões sobre as
alternativas.

Além disso, a democ rac ia exige alguns proc edimentos no período imediatamente posterior às eleiç ões:

Sexta: as alternativas mais votadas substituem as menos votadas;


Sétima: as ordens dos servidores eleitos são obedec idas;
Oitava: as dec isões nos intervalos eleitorais são subordinadas às dec isões tomadas na eleiç ão ou seguem as mesmas
regras da eleiç ão.

Fác il é verific ar que o c onjunto das regras não vale em sua integridade em nenhuma democ rac ia c onhec ida no mundo. Nos
Estados Unidos da Améric a, a segunda, terc eira e sexta regras func ionam bem. A primeira está ausente, pois a abstenç
ão atingia, na déc ada de 1950, a 50% dos eleitores. A quarta não existe em sua plenitude em nenhuma organizaç ão
estatal, uma vez que a c apac idade de inc luir alternativas enc ontra-se desigualmente distribuída. A quinta também é de difíc il
aplic aç ão, dado que o ac esso igual à informaç ão é meta ainda não atingida, mesmo nos países em que vigora uma relativa
liberdade de imprensa.

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Na verdade, as oito regras c onstituem os eixos de uma esc ala que permite c omparar as democ rac ias reais em termos
de sua aproximaç ão a um ideal democ rátic o normativo. Formam algo c omo uma régua oitavada, em que c ada fac e permite
medir o grau de democ rac ia em uma das dimensões. Atribuindo valores, em c ada eixo, entre 0 e 1 e c ombinando as notas
de alguma maneira, poderíamos enc ontrar organizaç ões que o autor denomina hierarquias (c om pontuaç ão ente 0 e 0,25),
oligarquias (entre 0,25 e
0,50), poliarquias (entre 0,50 e 0,75) e poliarquias igualitárias (entre 0,75 e
1).

Uma vez que tornou-se possível a identific aç ão das poliarquias, resta indagar das c ondiç ões que permitem ou favorec em
seu surgimento e estabilidade. A primeira e mais importante é o grau de c onsenso existente entre os c idadãos a respeito da
regra e da aplic aç ão das oito c ondiç ões assinaladas.

Trata-se de um problema de c ultura polític a de uma determinada populaç ão. Quanto mais democ rátic a for essa c ultura,
maior a possibilidade de desenvolvimento c ontínuo de regimes democ rátic os.

No entanto, a c ultura não é imutável. Pesquisas c lássic as apontavam uma c ultura polític a autoritária entre os alemães na
déc ada de 1950, em c ontraste c om os pendores democ rátic os que os britânic os apresentavam. Duas déc adas mais tarde a
repetiç ão da pesquisa indic ava uma reduç ão ac entuada das diferenç as antes observadas entre os dois países, c om uma ac
eitaç ão c resc ente da democ rac ia entre os alemães.

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Oc orre que esses vinte anos haviam sido de treinamento democ rátic o para os alemães, fortalec endo a ac eitaç ão das
oito c ondiç ões. O treinamento, portanto, é relevante, e não apenas aquele que se observa na esfera polític a no sentido
estrito. Também c onta aquele ministrado nas instituiç ões não estatais, c omo a família, o sindic ato e todo tipo de assoc iaç ão.

Além do c onsenso proc edimental, relativo às c ondiç ões, um c erto c onsenso em relaç ão aos fins perseguidos é nec
essário. A heterogeneidade exc essiva quanto a valores leva a situaç ões de divergênc ias intensas, próximas da divisão da c
oletividade em metades iguais. Nessas situaç ões, c omo vimos, a aplic aç ão da regra torna-se problemátic a.

Finalmente, a poliarquia parec e ser também funç ão da atividade polític a de seus membros. Quanto maior a atividade, a partic
ipaç ão, maior o treinamento democ rátic o e maior o c onsenso quanto às c ondiç ões da regra.

O autor finaliza analisando o c aso norte-americ ano, partic ularmente sua c apac idade de lidar c om as situaç ões de "tirania da
maioria" em sua definiç ão moderna: imposiç ão da vontade de uma maioria indiferente sobre a de uma minoria ardorosa.

O sistema de vetos de minorias que a Constituiç ão norte-americ ana presc reve divide-se em três grandes vertentes: a
revisão judic ial, o Senado e a rede de relaç ões que o eleitorado, o presidente e as duas c asas legislativas estabelec em entre
si. A análise do autor detém-se nos dois primeiros c asos.

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Na revisão judic ial, a dec laraç ão de inc onstituc ionalidade de uma lei pela Suprema Corte signific a a rec usa, a não validade,
de uma dec isão majoritária do Legislativo. Vamos supor que a maioria, presente no Legislativo, queira persistir na sua
vontade, c ontra a posiç ão da Suprema Corte. A únic a possibilidade é a mudanç a da Constituiç ão. Oc orre que para a
mudanç a da Constituiç ão a maioria não é sufic iente, mas é exigido um quórum qualific ado. No c aso dos EUA, dois terç os das
duas Casas, Câmara e Senado, e três quartos dos Estados membros da União, c uja posiç ão é definida pelas Câmaras
estaduais. Esse dispositivo habilita a minorias suc essivas de um terç o mais um dos integrantes de c ada Casa e de um quarto
mais um dos Estados a vetarem, durante algum tempo, a vontade da maioria, expressa na Câmara, no Senado e na sanç ão
presidenc ial.

O exemplo c itado de retardo na implementaç ão da vontade majoritária é o da legislaç ão nac ional sobre o trabalho infantil.
Entre a aprovaç ão da primeira lei protegendo o trabalho infantil no Congresso e a dec laraç ão final de c onstituc ionalidade
por parte da Suprema Corte, transc orreram 25 anos. Durante um quarto de séc ulo a proteç ão ao trabalho infantil foi julgada
inc onstituc ional, provavelmente por ferir os direitos dos c ontratantes. Casos similares oc orreram c om a legislaç ão sobre
o imposto de renda progressivo e o trabalho insalubre na mineraç ão.

O problema aqui é que, c omo vimos, os mec anismos de veto das minorias são usados de ac ordo c om seus interesses partic
ulares, sem c onsideraç ão sobre o c aráter tirânic o ou não da dec isão majoritária em questão.

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O mesmo se dá c om o mec anismo de veto representado pelo Senado. Estados menos populosos são representados pelo
mesmo número de senadores que os Estados mais povoados. Segundo c álc ulo de Dahl, uma maioria no Senado poderia
representar, na déc ada de 1950, menos de 15% dos eleitores do país. Esse mec anismo, no entanto, não estava à disposiç ão
de todo e qualquer grupo minoritário nesses Estados, mas privilegiava c laramente alguns grupos, c omo fazendeiros e donos de
empresas de mineraç ão, e exc luía outros, c omo negros e trabalhadores rurais temporários.

Daí que o autor c lassifique o c aso norte-americ ano c omo um híbrido, que ac olhe a vontade majoritária, mas permite o
veto de alguns grupos minoritários qualific ados. A própria eleiç ão para presidente expressaria não a vontade popular em sua
forma pura, mas a seleç ão simples do mandatário.

Com isso, o autor quer dizer que num eleitorado altamente diversific ado, que vota segundo motivaç ões diferenc iadas, um c
andidato pode obter a maioria dos votos mediante a soma dos votos de grupos minoritários, c onquistados por aspec tos
diferentes de sua plataforma de gov erno.

No exemplo de Dahl, um determinado c andidato c onquista 25% dos votos nac ionais c om sua proposta de polític a externa,
outros
25% c om sua polític a agríc ola e os 25% restantes c om a sua polític a fisc al. Será eleito presidente c om 75% do total de
votos embora c ada uma de suas propostas, isoladamente, c onte c om a reprovaç ão de 75% dos eleitores.

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A c onc lusão aplic a-se não só aos Estados Unidos, mas a toda soc iedade moderna, minimamente c omplexa: maiorias
unívoc as, c oerentes, solidárias ao longo de uma diversidade de temas e questões são impossíveis. Toda maioria é, na verdade,
uma c oalizão, instável, de vários grupos minoritários. Somos governados, sempre, por alianç as de minorias.

Nesse aspec to, o fantasma do liberalismo c lássic o, a tirania da maioria, parec e desaparec er. Confirmando ironic
amente a argumentaç ão de Madison, a amplitude e diversidade do c olégio eleitoral teriam tornado impossível o ac ordo estável
de uma fac ç ão majoritária para o exerc íc io da tirania sobre uma minoria privilegiada em termos de riqueza, status ou poder.

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Examinamos, nesta terc eira unidade, os dois grandes modelos de desc riç ão e análise das democ rac ias, assim c omo de
presc riç ão do que devem ser. O problema c entral do modelo madisoniano é c onc iliar o princ ípio da maioria c om a
implementaç ão de mec anismos que possibilitem o veto de minorias, a proteç ão c ontra uma tirania majoritária. Vimos ainda
o segundo modelo selec ionado pelo autor: a democ rac ia populista, que propõe a aplic aç ão irrestrita do princ ípio da
maioria. O autor relac iona problemas existentes em ambos os modelos e elabora uma alternativa: a democ rac ia poliárquic a,
c arac terizada pela presenç a de oito c ondiç ões. Esse último modelo tem o c aráter de um tipo ideal, ou seja, deve ser usado
para medir o grau de democ rac ia nas organizaç ões existentes.

Depois de disc utir a c ontraposiç ão entre liberalismo e democ rac ia, a importânc ia da livre inic iativa e as diferentes
teorias da democ rac ia, estamos em c ondiç ões de passar ao exame de um problema c entral para as diferentes c orrentes
do liberalismo: os direitos individuais.

Parabéns! Voc ê c onc luiu a terc eira unidade. Vamos prosseguir?

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Unidade 4 - Os direitos individuais

Vimos, anteriormente, que o problema c entral para o liberalismo é a limitaç ão do poder do Estado. Daí a ênfase na preservaç
ão da inic iativa individual na esfera ec onômic a e a desc onfianç a permanente de uma possível tirania da maioria, c
onsiderada a mais perigosa, por ter c omo fundamento o princ ípio, legítimo, da igualdade polític a dos c idadãos. Vamos disc
utir o assunto, na presente unidade , a partir de uma abordagem moderna da questão dos direitos individuais: o livro Levando
os Direitos a Sério, do jurista norte-americ ano Ronald Dworkin.

O autor se propõe a desenvolver uma teoria liberal da lei, em c ontraposiç ão às teorias dominantes, tidas, erroneamente, a seu
ver, c omo liberais. Conforme essas teorias, o estudo da lei divide-se em dois segmentos, analisados separadamente: o que a
lei é, ou seja, a desc riç ão objetiva da legislaç ão, preoc upaç ão da c orrente denominada de positivismo legal; e o que a lei deve
ser.

Esta última questão tem sido tradic ionalmente examinada, na disc ussão inglesa e norte-americ ana, a partir de uma perspec
tiva utilitarista. Em pouc as palavras, a lei deve promover o bem-estar geral, entendido c omo a maior quantidade possível de
bem-estar c oletivo, o resultado positivo ótimo do balanç o entre prazer e dor de todos os partic ipantes da soc iedade.

Dworkin opõe-se a essa teoria dominante em dois pontos básic os: nega a possibilidade de separar os aspec tos desc
ritivos e normativos de uma teoria da lei e defende a c entralidade dos direitos fundamentais do indivíduo. Postula, portanto,
que indivíduos têm direitos que existem independentemente de seu rec onhec imento em lei, e que, assim, não podem sofrer
violênc ia em nome de qualquer argumento utilitarista, c omo o bem c omum, o interesse da soc iedade ou simplesmente a
vontade da maioria.

Nesta unidade, vamos perc orrer o argumento do autor mediante a análise


de quatro temas explorados em seu trabalho:
o direito à livre expressão e seus limites;
a desobediênc ia c ivil;
a aç ão afirmativa;
a relaç ão entre moralidade e lei.

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Conhecendo um pouco do período renascentista

É sob o período que veio a c hamar-se de renasc imento que uma c onstelaç ão de fatores
atuaram no sentido de delinear uma nova c ompreensão do Homem, libertando-o das amarras religiosas
e feudais até então vigentes. A Reforma protestante, o nasc imento do Estado moderno, o desc
obrimento da Améric a, o desenvolvimento c ientífic o e tec nológic o, a ampliaç ão da c apac idade de
abstraç ão abrem - no entender de Hannah Arendt - um inédito espaç o públic o em solo europeu, no
qual vieram a floresc er e sedimentar-se as ideias e prátic as liberais.

Na sequênc ia históric a do proc esso, a Inglaterra assume a lideranç a e produz o pensamento que
explic a e justific a

as vantagens da nova ordem, o pensamento liberal, nos c


ampos da filosofia, da polític a e da ec onomia, c om as c
ontribuiç ões de Loc ke, Hume, Adam Smith, entre muitos outros.
A irradiaç ão dessa influênc ia intelec tual avanç ou pelo c
ontinente europeu até a déc ada de 1870, momento em que
se c omeç a a notar uma perda de c onfianç a no ideário liberal
e uma inversão da relaç ão de influênc ia intelec tual entre as
diversas regiões da Europa.

Idéias desenvolvidas no leste europeu, princ ipalmente na


Alemanha e, posteriormente, na Rússia, países ec onomic
amente pouc o desenvolvidos, ganham espaç o no próprio
ambiente britânic o. A primazia do c oletivo sobre o indivíduo,
do planejamento rac ional sobre a irrac ionalidade do merc
ado, passam a enc ontrar defensores no meio intelec tual e
polític o inglês.

No plano da polític a, observa-se uma transformaç ão análoga. O intervenc ionismo estatal na ec


onomia inglesa ganha espaç o, princ ipalmente a partir de dois marc os: a Primeira Guerra Mundial e o
ano de 1931, quando tem iníc io a reaç ão loc al c ontra a c rise da ec onomia mundial.

Para Hayek, à perda da liberdade ec onômic a, à intervenç ão desmedida do Estado na ec onomia,


segue-se, inevitavelmente, a perda da liberdade c omo um todo. A Inglaterra enc ontrava-se,
naquele instante, portanto, trilhando o c aminho da servidão. A perda da liberdade polític a e o c
ontrole absoluto do Estado sobre a vida dos indivíduos era apenas uma questão de tempo.

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1. O direito à livre
expressão

Se o indivíduo tem direitos morais que o governo não pode


violentar, c omo o direito à igualdade, à liberdade de expressão, ao
julgamento legal, entre outros, a primeira questão que se
apresenta é a da existênc ia ou não de limites a esses direitos. Por
exemplo: a liberdade de expressão abrange o direito irrestrito de
manifestaç ão em loc ais públic os? Posso exerc er esse direito
interrompendo o trânsito e fazendo todo tipo de ruído? Quem dec
ide questões dessa ordem?

De ac ordo c om o autor, seguir a posiç ão c omum entre os


positivistas legais, dizer que só temos os direitos previstos em lei, definidos, portanto, em
última análise, pelo governo, pelos tribunais e pela políc ia, signific a dizer que não temos
direito algum. As leis podem mudar, os tribunais podem interpretá-las num sentido restritivo
e até a políc ia às vezes se c onsidera no direito de definir o que o c idadão pode fazer.

Entre os americ anos é popular a idéia de que a Suprema Corte é a guardiã dos direitos morais dos indivíduos. O problema é
que a Corte defende os direitos individuais traduzidos na Constituiç ão. Há direitos, no entanto, que não enc ontram
previsão c onstituc ional, e, por outro lado, há países democ rátic os, c omo o Reino Unido, que c arec em de uma Constituiç
ão. Portanto, a questão não é resolvida simplesmente dessa maneira. Na verdade, para Dworkin, prec isamos de c ritérios que
permitam, inc lusive, avaliar as dec isões da Suprema Corte.

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Para a análise desse problema, o autor se serve do exemplo de um c aso c onhec ido c omo "o julgamento dos sete de Chic ago".
Certa vez, em Chic ago, líderanç as sindic ais c onvoc aram uma manifestaç ão. Os disc ursos foram inflamados e o ato públic o
degenerou em tumulto, c om feridos, c arros destruídos e lojas apedrejadas. Os oradores foram presos, julgados e c ondenados c
om base em uma lei c ontra tumultos e desordens. A Suprema Corte foi provoc ada diversas vezes para dec idir se essa dec isão c
onflitava c om a garantia c onstituc ional de livre expressão e manifestaç ão.

Como julgar o c aso? Na análise do autor, há basic amente dois modelos c onc orrentes. O primeiro, usado c om mais frequênc
ia pela Corte, proc ura c hegar a um balanç o apropriado entre os direitos do indivíduo e os interesses da soc iedade. Se o
interesse da soc iedade é a ordem, o direito do indivíduo à livre expressão deve ser limitado sempre que a ordem enc ontre-se
em risc o. Nessa ótic a, a c alma exposiç ão de uma idéia seria permitida, mas o disc urso inflamado para uma multidão enfurec
ida, não.

Dworkin c onsidera que o modelo padec e de duas falhas. Primeira, limitar a forma da expressão ao leque do que é c
onveniente ou próprio já c onstituiria uma primeira limitaç ão da liberdade. Segunda, e mais importante, o modelo c ontrapõe
direitos do indivíduo a interesses da soc iedade. Para o autor, essa c ontraposiç ão é falsa, pois se a soc iedade é livre, os
direitos do indivíduo sempre são mais importantes que os interesses da soc iedade.

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Na verdade, somente três seriam os c asos em que a dec isão do governo pode prevalec er sobre a reivindic aç ão de um
indivíduo quanto a um c aso de violaç ão de um direito fundamental seu:

Primeiro caso: quando os valores que o direito invoc ado protege não estão em jogo
no c aso em questão;

Segundo caso: quando a afirmaç ão dos direitos de um indivíduo fere os direitos de


outro indivíduo;

Terceiro caso: quando os danos que a soc iedade deve, previsivelmente, sofrer são
de gravidade extrema.

Como o episódio de Chic ago deveria ser julgado, de ac ordo c om esses parâmetros? É prec iso lembrar que não estão em
jogo as aç ões c onc retas dos manifestantes c ontra pessoas e propriedades. Evidentemente, essas aç ões são c riminosas
e não estão protegidas pelo direito à livre expressão. A questão é a c ondenaç ão dos líderes em razão dos disc ursos pronunc
iados.

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Evidentemente, o direito invoc ado, a liberdade de expressão, enc ontrava-se em jogo. As palavras dos oradores, por outro lado,
não provoc aram, diretamente, os danos físic os e as perdas materiais de feridos e c omerc iantes. A soc iedade, finalmente,
não sofreu danos de gravidade extrema. Na verdade, os líderes sindic ais apenas poderiam haver sido c ondenados, segundo
Dworkin, se a c onexão, mesmo que indireta, entre suas palavras e os danos posteriores, fosse estabelec ida de maneira
inequívoc a. Portanto, o ponto fundamental é: pode-se estabelec er c om seguranç a uma relaç ão de c ausalidade entre os disc
ursos e os fatos posteriores? A reaç ão dos manifestantes não pode ser razoavelmente atribuída a c ausas outras, inc
lusive à situaç ão difíc il em que se enc ontravam? Se não é possível estabelec er c om seguranç a a relaç ão entre o disc
urso pronunc iado e a violaç ão dos direitos individuais dos c idadãos que sofreram ferimentos físic os ou danos em sua
propriedade, o governo não poderia c ondenar os líderes da manifestaç ão.

A c ondenaç ão equivale a pratic ar um mal c erto, a limitaç ão de um direito fundamental, em troc a de um benefíc io inc
erto: a prevenç ão da integridade físic a e da propriedade de outros c idadãos. Vale lembrar que a situaç ão seria outra se o dano
aos direitos fundamentais de outros fosse inteiramente previsível. O indivíduo que, num auditório fec hado, repleto de gente,
grita "fogo" sem motivo, não pode alegar o direito à liberdade de expressão para não ser c ondenado pelos ferimentos que o
tumulto provoque.

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2. A desobediência civil

Se o c idadão tem direitos morais independentemente da legislaç ão, segue-se que, em determinadas c irc unstânc ias, é líc ito a
esse c idadão a violaç ão das leis. A pergunta pertinente é: em que c irc unstânc ias isso é válido?

Sobre o tema, há um c onsenso na soc iedade norte-americ ana, que abrange posiç ões definidas c omo c onservadoras e liberais.
Todo c idadão teria, de maneira geral, o dever de obedec er às leis, mesmo àquelas c om as quais não c onc orda, em
respeito à ordem soc ial, da qual é benefic iário.

No entanto, esse dever é relativo, porque é possível que a soc iedade produza leis injustas. Nesse c aso, se o c umprimento da
lei c onflita c om a c onsc iênc ia, o indivíduo tem o direito de seguir a sua c onsc iênc ia e violar a lei. No entanto, em respeito à
soc iedade, deve sofrer as c onsequênc ias de seus atos e c umprir a pena estabelec ida.

A partir dessa posiç ão c onsensual, os c onservadores defendem que toda violaç ão da lei deve ser reprimida e os liberais
advogam a tolerânc ia para c om os dissidentes por motivo de c onsc iênc ia. No entanto, ambas as posiç ões ac abam por
resultar c ontraditórias. Liberais defendem o estrito c umprimento da lei apenas em prol da igualdade e tendem a não ac eitar as
objeç ões de c onsc iênc ia de segregacionistas, por exemplo. Conservadores, por sua vez, não c onseguem c onc iliar o rec
onhec imento da legitimidade da objeç ão e a exigênc ia da puniç ão. Se o Estado rec onhec e que, em c ertas c irc unstânc ias,
o c idadão pode seguir sua c renç a c ontra a lei, qual a justific aç ão da pena?

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Mas, quando poderia, para o autor, um c idadão americ ano violar a lei? Fundamentalmente, no c aso de a lei ferir algum
direito fundamental seu, de c aráter polític o ou moral. Se esse direito está assegurado c onstituc ionalmente e a lei o fere, a
legitimidade dessa lei pode ser questionada c om suc esso. A questão típic a nesse c aso, portanto, é a opç ão entre a c onsc
iênc ia do c idadão e uma lei de legitimidade, a seu ver, duvidosa. A quem o indivíduo deve obedec er? Segundo o autor,
nessa situaç ão três tipos de resposta são possíveis.

A primeira, c onservadora, dec ide pela seguranç a. Se a lei é duvidosa deve-se obedec ê-la, mesmo errada, e trabalhar para
eleger representantes c omprometidos c om a sua mudanç a.

Uma segunda opç ão é desobedec er à lei e seguir a sua c onsc iênc ia até uma dec isão dos tribunais. Uma vez que algum
tribunal se manifeste, o c idadão passa a seguir a lei, e se ainda disc orda dela, trabalha para eleger c ongressistas c
omprometidos c om a sua mudanç a. No limite, implic aria a desobediênc ia da lei até uma dec isão da Suprema Corte.

Finalmente, a terc eira opç ão c onsiste em desobedec er à lei, mesmo depois que a Suprema Corte tenha dec idido por
sua c onstituc ionalidade.

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Entre os norte-americ anos, a primeira posiç ão não enc ontra defensores. A tradiç ão do país c onsidera que os
motivos de c onsc iênc ia são relevantes. Se todos os c idadãos optassem pela obediênc ia, a soc iedade fic aria privada
dos benefíc ios do c ontraditório. Os tribunais não poderiam examinar a posiç ão c ontrária à lei e pronunc iar-se, c om alguma
experiênc ia, sobre o c aso. As c onsequênc ias da obediênc ia à lei, assim c omo as da desobediênc ia, mostram-se na prátic a, e
as dec isões judic iais aperfeiç oam progressivamente a legislaç ão. Diversas leis americ anas, c omo as leis c ontra monopólios,
formaram-se nesse proc esso.

O problema na segunda posiç ão é não c onsiderar as mudanç as, possíveis, na posiç ão da Suprema Corte. Em 1940, por
exemplo, uma lei do Estado da Virgínia que exigia que os estudantes saudassem a bandeira foi dec larada c onstituc ional. Em
1943, a Suprema Corte mudou sua posiç ão e dec larou a mesma lei inc onstituc ional. Alguém impedido de saudar a bandeira por
motivos religiosos, por exemplo, deveria obedec er a lei nesse intervalo de dois anos ou se c oloc ar em estado de desobediênc ia c
ivil?

A opç ão mais razoável para o autor é a terc eira. Quando uma questão de c onsc iênc ia está em jogo, nem uma dec isão da
Corte deve ser obedec ida. Isso não quer dizer que as dec isões da Corte devam ser desrespeitadas ao sabor da c onveniênc ia de
c ada um. A desobediênc ia é ac eitável apenas no c aso de a lei ferir algum dos direitos fundamentais do c idadão, c omo
a liberdade de pensamento.

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Nesse c aso, o governo norte-americ ano deve seguir a sua tradiç ão e c onsiderar a possibilidade de pratic ar uma polític
a de tolerânc ia c om os dissidentes, sempre, é c laro, que a desobediênc ia c ivil não implic ar danos ao direito alheio. Trata-se
simplesmente de rec onhec er que, nesse c aso, o dissidente não é simplesmente um c riminoso c omum e que essa diferenç a
deve ser c onsiderada nos tribunais. Com essa atitude, o respeito à lei seria fortalec ido, não ameaç ado, c omo pensam os c
onservadores.

Um bom exemplo de desobediênc ia c ivil c om argumentos sólidos, na perspec tiva do autor, é a rec usa ao serviç o
militar, partic ularmente na époc a da guerra do Vietnam. Os dissidentes sustentavam então a "ilegitimidade" da guerra e a
rec usa da c onsc riç ão c om base numa série de seis argumentos morais, c om fác il transposiç ão para o plano legal:

Primeiro: as armas e estratégias usadas pelos americ anos eram imorais;

Segundo: a dec isão de fazer a guerra não fora submetida a qualquer instânc ia
de deliberaç ão democ rátic a;
Terceiro: não havia em jogo grave ameaç a ao interesse nac ional;
Quarto: a justiç a ac eitava apenas objeç ões de c onsc iênc ia de c aráter religioso;
Quinto: a c onsc riç ão exc epc ionava os estudantes;
Sexto: a lei que proibia a propaganda da rec usa ao alistamento feria a liberdade
de expressão.

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A Suprema Corte posic ionou-se c ontra alguns desses argumentos e não deliberou sobre outros, por c onsiderá-los polític
os. O importante é que os argumentos c ontrários à legitimidade da guerra e, portanto, do rec rutamento, eram sufic ientes,
nesse c aso, para justific ar a violaç ão da lei, a desobediênc ia c ivil.

No plano legal, poder-se-ia dizer que tratados internac ionais assinados pelo país, c om forç a de lei, impediam os Estados
Unidos de agir daquela forma; que a Constituiç ão exigia uma dec laraç ão de guerra; que a Constituiç ão vedava a disc riminaç ão
entre objeç ões de fundo religioso ou laic o, por favorec er uma religião organizada; e que a exc lusão dos estudantes era,
também, c laramente inc onstituc ional.

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3. A ação afirmativa

A questão pertinente, para a disc ussão do autor, é se as polític as de aç ão afirmativa, de favorec imento, portanto, de
determinadas minorias historic amente prejudic adas, ferem direitos fundamentais de alguns dos integrantes dos grupos
majoritários. Se isso oc orre, será relativamente simples c onc luir por sua inc onstituc ionalidade.

O problema aparec e c om maior c lareza se c ompararmos dois c asos, tidos c omo análogos por parte signific ativa do
pensamento jurídic o norte-americ ano

Em 1945, um homem, aprovado nos exames de qualific aç ão da Universidade do Texas, teve a sua matríc ula rec usada por ser
negro. A lei estadual destinava a Universidade exc lusivamente aos branc os. A Suprema Corte c onsiderou, na époc a, que a
dec isão não seria inc onstituc ional se o Estado do Texas mantivesse uma Universidade da mesma qualidade para os c idadãos
negros. Só assim teria sentido o princ ípio "iguais mas separados", c onsiderado c onstituc ional, na époc a, que formalmente
c onc iliava igualdade e segregaç ão. O Texas mantinha uma Universidade para negros, mas sua qualidade era c laramente
inferior. Assim, o estudante negro obteve ganho de c ausa. Alguns anos depois, o princ ípio "iguais mas separados" foi rejeitado
pela Corte.

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Em 1971, apesar de haver obtido notas superiores a de outros c andidatos aprovados, um estudante judeu foi rejeitado
pela Universidade de Washington, em funç ão da polític a de minorias. Um tribunal, em primeira instânc ia, deu-lhe ganho de c
ausa e a universidade o inc orporou a seus quadros. A questão não c hegou, portanto, à Suprema Corte, mas o debate se
instaurou: estava em jogo o mesmo princ ípio nos dois c asos? Tinha razão o estudante judeu ao alegar que a universidade
lhe negava o direito a tratamento igual, garantido na Constituiç ão?

Observe-se que o ponto em debate, no c aso, não é a efic iênc ia das polític as de aç ão afirmativa em relaç ão aos fins a
que se propõem. A esse respeito, vários argumentos podem ser levantados, c ontrários e favoráveis. O que importa prec isar
é se algum direito fundamental do estudante foi lesado em sua rejeiç ão.

O primeiro ponto a observar é que nenhum c idadão tem o direito, moral ou legal, ao ensino universitário. O Estado não
assegura esse nível de ensino a todos. Outra é a situaç ão do ensino fundamental, garantido a todos por ser visto c
omo c ondiç ão indispensável ao exerc íc io dos direitos da c idadania.

Se o ac esso ao ensino superior não pode ser c onsiderado um direito fundamental, o proc esso de seleç ão baseado exc
lusivamente no mérito pode ser assim c onsiderado? Não, segundo o autor. O mérito é um c ritério que atende ao que seria
o interesse da soc iedade, ou seja, dispor de profissionais mais c ompetentes, no c aso. Uma vez que não estão em jogo
direitos fundamentais, o argumento utilitarista tem razão de ser, pode ser invoc ado pelas partes em disputa.

Nessa perspec tiva, o mérito pode não ser o únic o c ritério c onveniente a ser c onsiderado. Certamente pode resultar
interessante para a soc iedade o uso de outros c ritérios, em c aráter c omplementar, por parte da universidade. A de
Washington, por exemplo, reservava vagas para veteranos de guerra, além do c aso das minorias de asiátic os, hispânic os, índios
e negros.

O únic o argumento do estudante judeu era, portanto, o apelo à 14ª Emenda à Constituiç ão americ ana, que assegura a
qualquer pessoa a proteç ão igual da lei. Se fosse possível demonstrar que toda seleç ão baseada no c ritério de raç a fere
esse dispositivo, toda polític a de aç ão afirmativa c airia no c ampo da inc onstituc ionalidade.

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Para resolver a questão é nec essário, segundo o autor, distinguir entre duas formas de tratamento igual. A primeira, no
sentido estrito do termo, exige a mesma provisão de um bem determinado a todos os interessados. A segunda c onsidera igual
tratamento a prestaç ão de igual respeito e c onsideraç ão a todos. É c laro que a segunda forma é a mais forte, pois a primeira
deriva dela. É por os c idadãos terem direito ao mesmo respeito que c ada qual é responsável por um voto em c ada eleiç ão, por
exemplo.O ponto é que a igualdade quantitativa, no primeiro sentido, pode ser rompida, desde que não oc orra dano a
algum direito fundamental, em benefíc io da segunda forma. Nesse c aso, o direito à igualdade do indivíduo pode ser
quebrado em benefíc io de uma polític a de igualdade geral. As perdas individuais são menores que os ganhos c oletivos.

Oc orre o mesmo no c aso do estudante negro? A Universidade do Texas poderia c onstruir argumentos para mostrar que
formar advogados branc os era melhor para a c omunidade. Poderiam argumentar que a populaç ão texana era rac ista e
advogados negros não seriam c ontratados por ela. Seria melhor empregar os esc assos rec ursos para formar advogados que
iriam trabalhar para a c omunidade.

Da mesma maneira, poderiam dizer que a admissão de negros levaria a universidade a uma situaç ão financ eira difíc il,
pois as c ontribuiç ões de ex-alunos reduzir-se-iam drastic amente. Com menos rec ursos, os serviç os prestados à c
omunidade seriam menores.

Qual a diferenç a desses argumentos nos dois c asos em questão? No c aso do negro, os advogados podem argumentar c om
dois tipos de ganhos que a c omunidade obteria: ganhos utilitaristas, c omo paz soc ial e seguranç a, e ganhos em justiç a, ou
seja, em aproximaç ão de um valor importante na soc iedade americ ana: a igualdade. O c aso do estudante judeu pode se
apoiar apenas nos argumentos do primeiro tipo. É a diferenç a entre polític as c om base na raç a que têm por objetivo preservar
a diferenç a, e polític as, também c om base na raç a, que proc uram eliminá-la.

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4. Lei e moralidade

A relaç ão entre lei e moralidade toc a de perto a questão dos direitos individuais. Em pouc as palavras, deve a soc iedade usar
a lei para reprimir aqueles c omportamentos que a maioria de seus membros c onsidera profundamente imoral, c omo a
pornografia, a prostituiç ão, o homossexualismo?

Dois tipos de argumentos favoráveis a essa posiç ão são disc utidos pelo
autor.

O primeiro diz simplesmente que em toda soc iedade há margem para divergênc ias, e pontos c om os quais não se transige.
Nós ac eitamos a liberdade religiosa, por exemplo, mas não a poligamia.

Esses elementos de c onsenso moral são nec essários à identidade e c oesão soc iais e sua ruptura implic a risc o para a soc
iedade. Logo, a soc iedade tem o direito de se defender, de preservar-se, insistindo na uniformidade de c ertas regras e c
omportamentos. Se a lei é um instrumento a sua disposiç ão, pode usá-la para sua defesa.

O segundo argumento é uma versão mais sofistic ada do primeiro. A tolerânc ia para c om o c omportamento imoral
provoc ará mudanç as imprevisíveis no ambiente soc ial em que vivemos. É plausível pensar que a tolerânc ia c om o
homossexualismo, por exemplo, ac abará, c om o tempo, por mudar a forma da própria instituiç ão familiar. A lei deve dec idir,
portanto, quais instituiç ões soc iais são sufic ientemente importantes para justific ar a restriç ão à liberdade individual.

Vários argumentos podem ser c onfrontados a essa posiç ão. Pode-se dizer que a soc iedade não prevalec e sobre os
direitos individuais e não tem, portanto, o direito de busc ar a sua própria preservaç ão, c omo se fosse uma espéc ie ameaç ada,
às c ustas da liberdade de indivíduos que exerc em prátic as c ondenadas pela maioria.

Outros diriam que a soc iedade tem esse direito, mas só quando a ameaç a é real e não hipotétic a. Ou seja, não basta que a
maioria dos c idadãos tenha medo de um tipo de c omportamento para dec idir que esse c omportamento ameaç a efetivamente
a soc iedade e deve ser legalmente reprimido.

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Pode ser argumentado, ainda, que moral e lei são esferas sem relaç ão direta e, tal c omo pode haver aç ões morais definidas c
omo c rime, a imoralidade não é sufic iente para c arac terizar o c rime.

Outra linha de argumentaç ão possível diria, além disso, que não vigora nas soc iedades modernas o mandato imperativo e que
as preferênc ias morais da maioria não devem ser c onsideradas pelo legislador em seu trabalho.

Contudo, a c rític a do autor vai em outra direç ão. Não disc ute a idéia de que uma posiç ão moral partilhada pela maioria
deve formatar a lei. Questiona, sim, se a simples preferênc ia da maioria por um c omportamento c onstitui uma posiç ão moral.

Uma posiç ão moral pressupõe argumentos válidos que a sustentem. Se perguntamos a alguém as razões do seu julgamento
do homossexualismo c omo imoral, raramente enc ontramos algum argumento.

Uma primeira resposta dirá que o homossexualismo é imoral porque seus pratic antes não são heterossexuais. A c ondenaç
ão, nesse c aso, é automátic a, pois está na própria definiç ão da prátic a. Nesse c aso não obtivemos um argumento válido,
apenas a explic itaç ão de um prec onc eito.

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A segunda resposta enc ontrada nesses c asos é de fundo emoc ional. O partidário da c riminalizaç ão do homossexualismo
pode responder que a prátic a lhe c ausa desgosto, aversão, ira ou outro sentimento do gênero. Como esse sentimento não está
fundado em um argumento razoável, trata-se de uma fobia.

A terceira resposta apela para fatos c laramente inverídic os, que não enc ontram apoio nas autoridades do c ampo a que se rec
orre. "É uma doenç a", "faz mal à saúde", são exemplos dessas respostas. Tec nic amente, são rac ionalizaç ões de um prec onc
eito.

Finalmente, o argumento da autoridade. Na sua forma mais ampla, "todo mundo" sabe que o homossexualismo é c ondenável e
deve ser proibido por lei.

Pois bem, para o autor não importa que a maioria manifeste posiç ão c ontrária ao homossexualismo, à prostituiç ão ou a
qualquer outro c omportamento desviante. Se o argumento não passar de uma c oleç ão de prec onc eitos, fobias, rac ionalizaç
ões e rec urso à autoridade, não há uma posiç ão moral fundamentada, e as preferênc ias da maioria não têm motivo justo
para perseguir, inc lusive legalmente, aquelas seguidas pela minoria.

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Nesta unidade, ac ompanhamos o argumento do autor a respeito da


prioridade dos direitos fundamentais sobre as preferênc ias e interesses
da maioria, mesmo quando c onsagrados na legislaç ão. Examinamos,
para tanto, quatro dos c asos em que fundamenta sua posiç ão, que
ilustram, respec tivamente: o c onflito entre direitos fundamentais do
indivíduo e normas legais; a desobediênc ia c ivil; as implic aç ões, em
termos desses
direitos, das polític as de aç ão afirmativa; e, finalmente, a relaç ão entre leis
e moralidade.

Para relembrar os autores do Liberalismo, assista ao vídeo abaixo.

[ Down l oad ]

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Exercícios de Fixação

Parabéns! Voc ê c hegou ao final do c urso Doutrinas Polític as Contemporâneas: Liberalismo.

Sugerimos que voc ê faç a uma releitura do c onteúdo e resolva os Exerc íc ios de Fixaç ão. O resultado não influenc iará na
sua nota final, mas servirá c omo oportunidade de avaliar o seu domínio do c onteúdo. Lembramos ainda que a
plataforma de ensino faz a c orreç ão imediata das suas respostas!

Porém, não esqueç a de realizar a Avaliaç ão Final do c urso, que enc ontra-se no Módulo de Conc lusão. Lembramos que
é por meio dela que voc ê pode rec eber a sua c ertific aç ão de c onc lusão do c urso.

Para ter ac esso aos Exerc íc ios de Fixaç ão, c lique aqui.

http://saber es.senado.leg .br /mod/book/tool/pr int/index.php? 828


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