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Dialogamos?

Direitos Humanos significam diálogo. Diálogo combinado a uma série de outros


elementos, mas diálogo. A questão a ser resolvida é: o que seria, enfim, este tal
“diálogo” de que tanto se fala? Termos como este costumam trazer muita confusão.
Como são utilizados a torto e a direito, transformam-se em grandes e belos sacos vazios.
E cada um põe o que bem entender dentro de um grande e belo saco vazio com um
grande e belo rótulo. Neste caso, escreve-se no rótulo: “DIÁLOGO”.

Muita gente carrega este saco por aí. Quem é contra o diálogo? É verdade, todos
carregam este saco. É verdade também que poucos realmente lembram ou observam o
que puseram dentro dele. Aliás, é possível que, nestas situações, alguém tenha sido mais
rápido e mais esperto, tendo enchido o saco alheio: no bom sentido, apenas uma
metáfora. Quem? A verdade é que, mesmo que de forma inconsciente, ao longo da vida,
preenchemos vários sacos como este, criamos e reproduzimos conceitos, que nada mais
são do que formas de interpretar a realidade. Ou seja, dentre várias formas, vamos, aos
poucos, escolhendo algumas, as formas que vão para os sacos.

No saco do diálogo, é comum encontrarmos a idéia da conversa, da compreensão, da


alteridade, da abertura ao outro, a ouvir o outro. Esses elementos, de fato, compõem o
diálogo. No entanto, mesmo que eles estejam em muitos dos sacos que circulam por aí,
há dois grandes problemas: primeiro, o real exercício desses valores; segundo, a idéia
autoritária do que deve ser o diálogo (idéia autoritária do diálogo? Calma, chegaremos
lá).

Quanto à primeira questão: exercemos mesmo esses valores? Tentamos aplicar isso em
nosso cotidiano? Quando estamos prestes a ofender uma pessoa ou um grupo de
pessoas, refletimos sobre isso? Buscamos entender seus motivos? E se tais motivos não
forem, sob nossa ótica, justos? Buscamos compreender aquela situação, já que também
nós temos nossos defeitos, nossas fraquezas? Ou, simplesmente, entendemos a
diferença? Percebemos que nossas características (de todos nós) são construídas ao
longo de nossa história, a partir do que vivemos, ou separamos as pessoas entre “boas” e
“más” e culpamos e execramos todos aqueles que têm características que não nos
agradam? Se não conseguimos praticar nada disso, por que, então, a maioria de nós
carrega este saco para lá e para cá? Somos fracos, então? Falta-nos coerência? Ou
falamos em diálogo e em tantos outros termos sem que acreditemos em nada disso
quando partimos para situações concretas?

As linhas acima podem sugerir uma visão conformista diante da realidade, como se,
diante da compreensão, só restasse a resignação. O valor da compreensão, de
compreender o outro, não quer dizer a submissão a suas idéias. Quer dizer, sobretudo,
que devemos estar abertos, que devemos procurar entender aquilo que o outro nos
comunica, mas sem negar o conflito, a diferença. Podemos ser diferentes, podemos
discordar, de modo dialógico. Os conflitos existem e não exclúem o diálogo. O que
exclui o diálogo é, sim, a desigualdade – entre pobres e ricos, brancos e negros, homens
e mulheres etc. Aqui, entra a idéia autoritária de diálogo.
Diante de uma realidade profundamente desigual e da imposição de um modelo de
sociedade excludente, as elites brasileiras buscam traduzir diálogo em domesticação.
Quer dizer, na verdade, enchem-nos o saco, através da mídia (aliás, o que a mídia
chama de diálogo?) e pelos mais diversos meios, com domesticação, e não com diálogo.
Impõem pela força seus interesses (porque possuem meios econômicos e políticos para
tanto), não permitem qualquer alteração substancial da realidade social e convidam:
“dialoguem conosco”. No entanto, não há diálogo verdadeiro, já que esta minoria não
está disposta a ouvir, não está disposta a abrir mão de seus privilégios (e tem o poder de
mantê-los) para que os direitos mais básicos da grande maioria do povo sejam
garantidos. E, então, diante da justa revolta popular – revolta esta que busca exatamente
a abertura do diálogo e um modelo social que elimine os privilégios e possibilite a
compreensão –, de protestos, ocupações de terra, dizem: “São bárbaros, não sabem
dialogar”. Ao avistarem a possibilidade do diálogo, temem e se armam.

O valor da compreensão, aqui, também cabe: a questão não diz respeito a heróis e
vilões. Esta elite não é composta por pessoas “feias” e “más”, mas sua condição e sua
história fazem com que seus interesses entrem em profundo choque com a construção
de uma realidade fundada no diálogo. Transformar esta realidade e enfrentar estes
interesses é trazer humanidade a todos, ou seja, também a estas pessoas. Mudar esta
estrutura que permite e alimenta a opressão eliminará tanto a figura do explorado como
a do explorador, o que nos possibilitará, finalmente, dialogar. Talvez seja isto. Talvez,
então, a mudança e a luta devam estar sempre dentro deste grande e belo saco, com um
grande e (ainda) belo rótulo: “DIÁLOGO”.

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