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INTRODUÇÃO

O Conhecimento Silencioso foi uma área intensa na vida e nas atividades dos feiticeiros
que viveram no México nos tempos antigos. De acordo com Don Juan Matus, o Nagual que me
apresentou ao universo cognitivo dos feiticeiros, o Conhecimento Silencioso era o maior objetivo
dos feiticeiros que buscavam atingi-lo em cada uma de suas ações e pensamentos.
Don Juan definiu o Conhecimento Silencioso como uma estado da consciência humana em que
tudo que é acessível ao homem é instantaneamente revelado ao ser total, sem que haja a
interferência da mente e do intelecto. A sua explicação é que existe uma fatia da energia total do
universo que os feiticeiros chamam de faixa humano e que esta parcela da energia está presente
em todos os seres humanos. Ele me assegurou que os guerreiros videntes, que podem ver
diretamente o fluxo de energia do universo percebem o homem como um conglomerado de
campos de energia em forma de uma ovo ou esfera, e que a faixa do homem é uma pequena fatia
compacta que corta de forma transversalmente em um ângulo que vai da esquerda para a direita
no ovo luminoso. A totalidade da esfera luminosa do homem é a medida dos braços estendidos
para os lados e para cima e a faixa do homem medindo algo em torno de trinta centímetros de
largura.
O conhecimento Silencioso, disse Don Juan, é a interação que o homem tem com a energia dentro
desta banda, uma interação que é imediatamente sentida pelo feiticeiro que atingiu o
Conhecimento Silencioso. Don Juan disse que o homem comum tem uma vaga sensação dessa
interação energética e tenta, intuitivamente, identificar os seus desdobramentos. Por outro lado,
os feiticeiros, recebem uma descarga da totalidade dessa interação em qualquer momento em que
ela seja intentada.
Don Juan assegurou-me que o prelúdio para o Conhecimento Silencioso é um estado da percepção
humana que os feiticeiros chamam de Silencio Interior, um estado livre de pensamentos e
expressões silenciosas, o que os feiticeiros chamam de diálogo interno.
Mesmo com todo o esforço que empreguei em entender o conceito dado por Don Juan sobre o
Conhecimento Silencioso, ele sempre se manteve obscuro, misterioso, inescrutável. para mim Em
um esforço para esclarecer-me este ponto, Don Juan me deu uma série de exemplos concretos do
que do Conhecimento Silencioso. O que eu mais gostava, por conta de sua abrangência e
relevância, é algo que ele chamava de “Os leitores do Infinito.”
“Os Leitores do Infinito” é algo que soa como uma metáfora, mas que é uma descrição
fenomenológica que Don Juan usava para descrever uma condição perceptiva dos feiticeiros. Ele
me falou que essa condição era pertinente as metas e expectativas do homem de hoje em dia. O
homem do Século XX, é um leitor que lê os textos com uma especial predileção. Estes textos
podem ter o formato de um livro, um texto em um computador, um manual, um romance, um
texto técnico ou qualquer outro texto.
Em sua constante busca por encontrar soluções e respostas para as suas perguntas, os feiticeiros
do México antigo descobriram que quando se alcança o Silêncio Interior, a consciência do homem
pode facilmente dar um salto a percepção direta de qualquer assunto que estejam buscando. Eles
usaram o céu como o seu horizonte de suas projeções, assim como as montanhas e até espaços
menores como as paredes de suas casas. Ali eles eram capazes de ver algo como um filme
projetado. Sucintamente ele descreveu esse fenômeno como o poder de visualizar energia com a
aparência de uma matiz, para ser mais preciso, um ponto roxo no local intentado, um roxo
avermelhado como a cor de uma romã. Eles o chamavam de mancha cor de romã.
Esses feiticeiros asseguravam que, em um dado momento, essa mancha de cor romã explodia e
se transformava em imagens que eram vistas como se estivessem realmente vendo um filme. Essa
manobra perceptiva se converteu no que eles chamavam de “Espectadores do Infinito”.
Don juan acreditava que no meu caso era mais apropriado considerar que eu Lia o infinito ao
invés de assití-lo, já que eu era mais dado a paixão pela leitura, talvez até mais que a paixão dos
feiticeiros antigos em ver. Don Juan deixou bem claro que isso não significava ler energia como
se lê um jornal, sendo que as palavras se surgem com claridade a medida que são lidas, como se
a leitura de uma palavra levasse a próxima, formando conceitos totais que se manifestam e logo
em seguida desaparecem. A arte dos feiticeiros está na habilidade de reunir e preservar os
conceitos antes que eles sejam esquecidos ao serem substituídos por novas palavras, e novos
conceitos em um fluxo infinito.
Don juan continuou explicando que os feiticeiros que viveram no México nos tempos antigos, e
que foram os formadores da sua linhagem, eram capazes de acessar o Conhecimento Silencioso
depois de haverem entrado em sua essência, o Silêncio Interior. Disse que o Silêncio Interior foi
uma grande conquista e era a condição essencial do caminho do guerreiro.
Don Juan colocou tal ênfase neste silêncio que eu queria conseguí-lo a qualquer custo Eu queria
chegar Silencio Interior imediatamente, não perdendo um instante que fosse. Quando então pedi
a Don juan que me desse uma explicação concisa dos procedimentos que eu deveria seguir ele
desatou a rir de mim.

- Aventurar-se no mundo dos feiticeiros, disse ele, não é como aprender a dirigir um carro.
Manuais e instruções são necessários para dirigir um carro. Para alcançar o Silêncio Interior você
precisa intentar.

- Mas como eu posso Intentar? Insisti.

- A única maneira de intentar é intentando, disse ele.

Uma das coisa mais difíceis de aceitar, para o homem de hoje, é a falta de instruções. Atualmente
o homem parece estar sob o poder de manuais, práticas, métodos, passos a seguir. O homem de
hoje em dia toma notas incessantemente, faz desenhos, está profundamente envolvido em saber
como. Mas no mundo dos feiticeiros, disse Don Juan, os procedimentos e os rituais são meras
ferramentas para atrair e focalizar a atenção. São artifícios usados para forçar o foco de nosso
interesse e determinação. Além disso eles não tem nenhum valor.
Don Juan acreditava que o homem moderno adora a palavra, como se até hoje sobrevivesse o
sentimento do quão significativo foi para ele falar pela primeira vez. Isso parece explicar a sua
ênfase na palavra. Pronunciar encantamentos parece ser um retrocesso a esse processo de
envolvimento com as palavras. Os feiticeiros acreditam que uma longa série de palavras, ditas em
voz alta, deve haver exercido um poder mesmérico no homem.
Devido a força de suas práticas e seus objetivos, os feiticeiros refutam o poder das palavras. Eles
definem a si mesmos como navegantes do mar do desconhecido. Para eles a navegação é um fato
prático, significa passar de um mundo a outro sem perder a sobriedade, sem perder o impulso, e
a fim de realizar tal façanha de navegação, não podem haver procedimentos ou passos a seguir,
apenas um ato abstrato que define tudo: o ato de reforçar o elo com a força que se estende por
todo o universo, uma força que os feiticeiros chamam de intento. Por estarmos vivos e termos
consciência, estamos intimamente ligados ao Intento. O que precisamos, de acordo com os
feiticeiros, é fazer com que essa ligação seja parte de nossos atos conscientes, e o ato de nos
tornarmos conscientes de nossa ligação com o intento é outra forma de definir o Conhecimento
Silencioso.
Durante o tempo que passei com Don Juan Matus aprendi, no entanto, uma coisa com relação a
procedimentos e métodos. Existe sim algo que os seres humanos precisam para atingir o
Conhecimento Silencioso, é reforçar o seu bem estar, sua clareza, sua determinação. Para poder
intentar é necessário destreza física, mental e um espírito claro.
De acordo com Don Juan, os feiticeiros do México antigo colocavam uma enorme ênfase na
destreza física e mental e a mesma ênfase persiste hoje em dia na linhagem destes feiticeiros. Fui
capaz de corroborar a verdade de suas colocações no convívio com Don Juan e seus quinze
companheiros.
A resposta que Don Juan me deu quando o questionei sobre os motivos pelos quais os feiticeiros
colocavam tanta ênfase no lado físico do homem me surpreendeu sobremaneira. Naquele tempo
eu acreditava no lado espiritual do homem, um lado cuja existência não estava totalmente
comprovada para mim, mas que eu estava compelido a considerar como uma possibilidade. Para
mim, Don Juan era um ser unicamente espiritual.

- Os feiticeiros não são apenas espirituais, disse ele, são seres extremamente práticos. Mas é um
fato bem conhecido que os feiticeiros, ou bruxos como são chamados, são geralmente
considerados excêntricos ou mesmo loucos. Quem sabe isso te faz pensar que são espirituais.
Parecem loucos porque sempre estão tentando explicar coisas que são inexplicáveis. Na tentativa
de explicar, perdem toda a coerência e acabam por dizer absurdos, não que sejam bobagens, mas
as tentativas de dar explicações completas não pode ser efetivadas em nenhuma circunstância.
Don Juan me falou que os feiticeiros do México antigo descobriram e desenvolveram uma
enormidade de procedimentos para alcançar o bem estar físico e mental, sendo estes
procedimentos chamados de Passes Mágicos. Também disse que os efeitos dos Passes Mágicos
eram tão esmagadores para eles que se tornaram, ao longo do tempo, em uma das mais importantes
facetas em suas vidas. Don Juan explicou que, como eram dados a comportamentos rituais,
aqueles feiticeiros ocultaram rapidamente os Passem Mágicos em meio a eles, e relegaram a sua
prática ao secretismo. Ele me assegurou que aqueles rituais eram totalmente absurdos, e quanto
mais era a estupidez, maior era a sua capacidade de esconder algo de tremendo valor.
Quando entrei no mundo de Don Juan, o ensino e a prática dos Passes Mágicos eram tão secretas
como sempre haviam sido em sua linhagem, mas havia sido extirpado o excesso ritualístico. Don
juan havia comentado que o ritual havia perdido o seu impulso com as novas gerações de
praticantes que se interessavam mais na eficiência e na funcionalidade dos mesmos. Ele
recomendou, no entanto, que eu não deveria falar sobre os Passes Mágicos com nenhum de seus
discípulos, ou com qualquer pessoa, sob nenhuma circunstância. A razão que ele me deu foi que
os passes pertencem exclusivamente a cada pessoa e que seu efeito era tão devastador que apenas
aqueles que seguem o verdadeiro caminho do guerreiro poderiam praticá-los.
Don Juan ensinou a mim e as suas três discípulas, Taisha, Florinda Donner-Grau e Carol um
grande número de Passes Mágicos e junto com esse conhecimento nos deu a certeza de que éramos
os últimos membros de sua linhagem. A aceitação desse legado implicava automaticamente
encontrar novas formas de disseminar o conhecimento de sua linhagem, já que a continuação da
mesma já não era a meta.
É importante esclarecer um ponto a este respeito:Don Juan nunca se interessou em ensinar os seus
conhecimentos. Ele estava interessado em perpetuar a sua linhagem. Nós, os seus quatro
discípulos, fomos os elementos, o meio escolhido, segundo ele, pelo Espírito, e mesmo que Don
Juan não tivesse agido diretamente, isso era o que permitiria garantir a perpetuação da linhagem.
Por esta razão ele fez esforços homéricos no sentido de nos ensinar tudo que sabia sobre o
xamanismo e a feitiçaria e o desenvolvimento de sua linhagem.
No curso de meu aprendizado, Don juan se deu conta que a minha configuração energética era
tão diferente da dele mesmo que isso não poderia ter outro significado se não o fim de sua
linhagem. Eu disse a ele que me incomodava sobremaneira a sua interpretação de qualquer
diferença invisível que pudesse existir entre nós. Eu não gostei de arcar com o peso de ser o último
de sua linhagem, nem mesmo compreendia a sua forma de pensar.
- Embora pareça que os feiticeiros não fazem nada além de tomar decisões, na realidade nós não
tomamos nenhuma, disse Don Juan. A única coisa que os feiticeiros tem são suas descobertas. Eu
não decidi escolher você, tão pouco que fosse energeticamente o que é. Já que eu não podia
escolher para quem entregar o meu conhecimento, tive que aceitar a pessoa que o espírito me
ofereceu, e essa pessoa era você. A sua energia permite apenas terminar a nossa linhagem e não
continuá-la.
Ele falou que a continuação de sua linhagem não tinha nada a ver com ele ou com os esforços
empreendidos por ele, bem como com o seu sucesso ou fracasso como um feiticeiro em busca da
liberdade total. Ele compreendeu o fim como uma decisão que veio além do nível da compreensão
humana, uma decisão que não foi tomada por seres ou entidades, e sim por forças impessoais do
universo.
Em um acordo unânime, as três discípulas de Don Juan e eu aceitamos o que ele chamou de nosso
destino. A aceitação nos colocou cara a cara com outro assunto que era referido por ele como
sendo “fechar a porta depois atrás de nós”, que nada mais é do que assumir a responsabilidade de
decidir exatamente o que fazer com todo o ensinamento deixado por Don Juan, e fazê-lo de forma
impecável.
Antes de mais nada, fizemos uma pergunta essencial que era: O que fazer com os Passes Mágicos,
a faceta mais pragmática e funcional do conhecimento passado por Don juan. Decidimos então
utilizar os Passes Mágicos e ensiná-los a quem quisesse aprendê-los. Nossa decisão de acabar
com o hermetismo que os cercavam por um indeterminado período de tempo foi, naturalmente, o
corolário de nossa convicção total que, na realidade, somos o final da linhagem de Don
Juan. Tornou-se então inconcebível para nós levar em segredo conosco algo que sequer era nosso.
Guardar os Passes Mágicos em segredo não foi nossa decisão no passado, ao contrário, acabar
com esse segredo foi a nossa principal decisão.
O que nós fizemos então, cada um de nós quatro, foi unificar quatro linhas diferentes de Passes
Mágicos, passes que foram ensinados a cada um de nós separadamente e individualmente, de
acordo com a nossa constituição física e mental particular. A nossa tentativa foi criar uma forma
genérica de cada movimento, uma forma que se adequasse a qualquer configuração.
Esta fusão se deu como resultado uma configuração de formas ligeiramente modificadas de cada
um dos passes mágicos que nos ensinaram. Nós chamamos essa nova configuração de
Tensegridade, uma terminologia que pertence a arquitetura e significa “a propriedade de
estruturas que empregam elementos de tensão contínua e elementos de tensão descontínua, de tal
maneira que cada membro opera com máxima eficiência e economia”.
Para explicar o que são os Passes Mágicos descobertos pelos feiticeiros da antiguidade, como
Don Juan os chamava, precisamos esclarecer algo: os tempos antigos. Para Don Juan isso significa
um tempo que varia entre 7.000 e 10.000 anos atrás, uma certa cifra que pode parecer a princípio
incongruente se for examinado do ponto de vista dos esquemas classificatórios dos estudiosos de
hoje em dia. Quando questionei Don Juan com relação a discrepância de seus cálculos e propus
um modelo de cálculo mais realista, ele se manteve firme em suas convicções. Ele pensava que
era um fato a existência de pessoas vivendo no Novo Mundo cerca de 7 a 10 mil anos atrás, e que
estavam profundamente interessadas nos assuntos do universo e da percepção, assuntos que o
homem moderno nem sequer começou a sondar.
Independente de nossas diferenças de opinião, o hermetismo que cercou os Passes Mágicos
durante eras e o efeito direto que exerceram sobre mim, teve efeitos diretos na maneira a qual os
trato hoje. O que apresento aqui neste trabalho é uma reflexão pessoal dessa influência. Me sinto
compelido a esclarecer esse tema seguindo meticulosamente a forma que ele me foi apresentado
e para fazer isso, preciso voltar ao início de meu aprendizado com o Nagual Juan Matus.
Ele me apresentou o tema fazendo comentários sobre a habilidade física dos feiticeiros da
antiguidade. Ressaltou constantemente a necessidade de se ter um corpo flexível, ágil,
promovendo a flexibilidade e força como o meio mais seguro para alcançar o maior êxito na vida
de um feiticeiro, o Conhecimento Silencioso.
A sabedoria e a capacidade física eram as coisas mais importantes nas vidas desses homens e
mulheres em um certo momento. A sobriedade e o pragmatismo são os únicos requisitos
indispensáveis para alcançar o Conhecimento Silencioso, para entrar em outros reinos da
percepção. Para navegar de maneira genuína no desconhecido são necessários atitude e ousadia,
mas não negligência. Para estabelecer um equilíbrio entre a audácia e a negligência, um feiticeiro
tem que ser extremamente sóbrio, cauteloso, hábil e estar em uma soberba condição física.
Don Juan dizia que haviam cinco questões na vida desses feiticeiros que giravam em torno da
busca do Conhecimento Silencioso, esses cinco temas eram: 1 – Os Passes Mágicos, 2 – O centro
energético no corpo humano chamado de Centro para Decisões, 3 – A recapitulação: o meio para
ampliar o alcance da percepção humana, 4 – O Sonhar: a verdadeira arte de romper os parâmetros
da percepção normal e 5 – O Silêncio Interior: o estado da percepção humana utilizado pelos
feiticeiros para atingir suas jornadas perceptivas.

Capítulo 2 - Os passes mágicos

A primeira vez que Don juan me falou mais intensamente sobre os Passes Mágicos, foi quando
ele me fez um comentário depreciativo sobre o meu peso.

- Você está muito gordinho. Disse ele me olhando da cabeça aos pés enquanto sacudia a cabeça
em sinal de desaprovação.
- Está a um passo da obesidade. Está mostrando sinais de desgaste. Está ficando como os teus
iguais, desenvolvendo uma bola e gordura em seu pescoço, como um touro. Já é hora de você
levar a sério a um dos maiores descobrimentos dos feiticeiros antigos, os passes mágicos.

Antes, Don Juan já havia me falado sobre os passes mágicos, mas de forma muito superficial,
tanto que eu sequer me lembrava o que havia sido falado sobre o assunto.

- De que passes mágicos você está falando Don Juan? Perguntei irritado.

- Como posso levar a sério algo que nunca ouvi falar?

- Agora você está se fazendo de bobo, disse ele com um sorriso malicioso. Não só já falei muito
sobre os passes mágicos, como também já sabe uma imensa quantidade deles. EU o tenho
ensinado sobre os passes mágicos durante toda a nossa interação.
Don Juan tinha razão, eu realmente estava me comportando como um idiota. Fiquei surpreso com
o assunto por não esperá-lo, mesmo assim eu não estava certo de ter aprendido nenhuma passe
mágico durante o tempo de nossa interação. Iniciei um longo discurso de protesto, como se minha
vida dependesse dessa justificativa.

- Não defenda os seus conceitos com tanta paixão. Ele brincou.

- Não foi a minha intenção ofendê-lo. Continuou fazendo um gesto ridículo com suas
sobrancelhas, imitando a expressão de arrependimento.

- O que eu quero dizer, é que tenho lhe ensinado aproveitando de sua capacidade de imitação.
Durante todo esse tempo tenho lhe ensinado os passes mágicos e você sempre acreditou que o
que eu fazia era apenas estalar as minhas juntas. Gosto de como se refere aos meus passes
mágicos, a arte de estalar as minhas juntas. Vamos continuar os chamando desta maneira. Eu lhe
ensinei dez maneiras diferentes de estalar as juntas, cada uma dessas formas é um passe mágico
que se adequam perfeitamente ao meu e ao seu corpo.

Os passes mágicos aos quais Don Juan se referia, como ele mesmo havia dito, era a forma usada
por ele para estalar as suas juntas. Eram movimentos específicos dos braços, das mãos, de todo o
corpo, que eu pensava ter como objetivo o alongamento dos músculos e ligamentos do corpo. Do
meu ponto de vista o resultado era apenas a sucessão de sons de estalos, que sempre pensei ser
uma manobra de Don juan para me assustar e me divertir. É verdade que constantemente ele me
pedia que o imitasse.
Ele havia me desafiado os movimentos realizados por ele e a praticá-los em casa até que eu
conseguisse reproduzir os mesmos estalos nos movimentos. Na verdade eu nunca consegui
reproduzir os sons das juntas estalando, mas, como conseqüência, havia aprendido toda a
seqüência de movimentos.
- Porque os chama de passes mágicos? Perguntei.

- Não são apenas chamados passes mágicos, são mágicos! Produzem efeitos que vão além da
compreensão. Não são apenas exercícios físicos, ou meras posturas corporais, são na verdade
movimentos que levam a um estado otimizado. É o intento de milhares de feiticeiros que se
extende através desses movimentos. A sua execução, mesmo sem consciência do praticante,
levam ao silenciamento da mente.

- O que quer dizer quando fala de silenciar a mente? Perguntei a ele.

- Nós identificamos e catalogamos tudo que fazemos no mundo, convertemos tudo no mundo
para itens desse nosso inventário. Disse ele.

Don Juan parecia estar lutando para encontrar uma maneira mais fácil de explicar o que me dizia.
Fez uma longa pausa, como se buscasse as palavras que se adequassem ao seu pensamento.
Permaneci em silêncio, eu sabia tão pouco do assunto que sequer me arriscava em qualquer
comentário. O que eu mantinhas era uma imensa curiosidade em descobrir o que eram realmente
os misteriosos passes mágicos.
Don Juan parecia estar cansado. Estávamos na sala de sua casa tomando um chá de de ervas que
ele havia preparado com as folhas de um arbusto aromático que crescia em seu quintal. Ele se
desculpou e disse que era a hora de seu descanso. Don Juan gostava de tirar pequenos cochilos
durante o dia e durante a noite. Seu padrão de sono era dormir até duas horas de cada vez. Quando
estava muito cansado ele dormia por seis horas, dividindo o sono em três períodos de duas horas
com curtos períodos entre elas.
Não voltamos a falar sobre os passes mágicos por um longo tempo até que um dia me surpreendeu
retomando ao tema de forma repentina, mas parecia que ele estava completamente consciente da
interrupção longa sobre o tema e sobre eu ter me esquecido completamente do assunto.

- Como eu já havia explicado, os seres humanos em geral são muito parecidos em sua forma de
pensar. Disse ele.

- Quando falamos a palavra “mesa”, a maioria das pessoas imediatamente pensaria em uma
colher, faca, pano de mesa, copo, vinho, sopa, bailes, banquetes, até uma mesa de aniversário.
Certamente poderíamos continuar listando infinitamente itens ligados a palavra mesa. Tudo o que
fazemos está ligado da mesma forma. O que parecia estranho aos feiticeiros é ver que todas essas
ligações de afinidade estão associadas a idéia que o homem tem de que todas as coisas são
imutáveis, assim como a palavra Deus.

- Não entendo de que forma a palavra Deus entra nessa explicação, Don Juan. Que relação tem a
palavra Deus com o que você está tentando explicar?
- Tudo! Em nossa mente todo o universo é como a palavra Deus, absoluto e imutável. É dessa
forma que nos comportamos. Nas profundezas de nossa mente existe um dispositivo de controle
que não nos deixa examinar a palavra Deus. A forma que acreditamos e aceitamos ele pertence a
um mundo morto. Por outro lado um mundo vivo está em um fluxo constante, se move, modifica,
se contradiz.

“Os passes mágicos dos feiticeiros são mágicos porque quando praticados, o corpo se dá conte
que é, ao invés de uma linha invariável de afinidades, é uma corrente, um fluxo. E se todo universo
é um fluxo, uma corrente, esse fluxo poder ser interrompido. Você pode então fazer uma barreira
para desviar ou parar esse fluxo.”
As palavras de Don Juan produziram um grande efeito em mim. Me senti estranhamente
ameaçado, não uma ameaça a minha pessoa, mas a algo que havia sido colocado em mim. Pela
primeira vez tive a sensação que Don juan estava falando de uma parte de mim que parecia ser eu
mas que realmente não era.
Depois ficar perdido em uma contradição interna, me senti confuso e me vi balbuciando palavras
em que fosse minha vontade. Ouvi-me dizer:

- Então Don Juan, você quer dizer que quando estou tentando estalar as minhas juntas estou
realmente mudando algo em mim?

- Existe algo em você, que não é você, mas que realmente está com muita raiva agora. Respondeu
Don Juan sorrindo.

Experimentei um intenso momento de conflito interno. Uma parte de mim estava muito irritada,
mas era uma parte que não parecia ser realmente eu. Don Juan me sacudiu de minha introspecção.
Sua sacudida me moveu para frente e para trás tão grande foi a força de seus movimentos. A
manobra acabou por me acalmar de imediato. Então ele me fez sentar em uma pequena mureta de
tijolos. Ali havia uma fila de formigas subindo na parede, na verdade eu nunca tinha gostado de
sentar ali. Sempre que me sentava ali as formigas iam para cima de minhas roupas, mas dessa
vez, els andavam circulando o contorno de meu corpo, como se tivessem ficado cegas, perdidas.
Eu realmente me interessei para ver o caminho que elas iam pegar, mas as palavras de Don juan
chamaram a minha atenção e me esqueci completamente delas.
- Não se preocupe com as formigas, disse Don Juan parecendo ler meus pensamentos.

- Neste momento você está cheio de uma energia incomum, produto de seus dilemas e
pensamentos internos. Você parece perigoso e impenetrável para as formigas e por isso se
afastaram de ti e o rodearam e assim ficarão até vocêse levantar ou até a sua energia voltar ao
normal. E agora respondendo ao que pensava de forma maliciosa, sim, verdadeiramente estamos
alterando a estrutura básica de nosso ser. Estamos colocando uma represa no fluxo que nos
ensinou a considerar o mundo como um monte de objetos inalteráveis.
Com um tom cordial que não parecia ser meu perguntei a Don juan que me desse um exemplo do
que significava esse fluxo do qual ele me falava. Falei a ele que gostaria de poder visualizar isso
em minha mente.

- Em sua mente? É melhor aprender a chamar as coisas pelo seu nome verdadeiro. O que você
chama de mente não é na verdade a sua mente. Os feiticeiros acreditam que a nossa mente na
verdade seja algo que foi colocado em cada um de nós. No momento cabe a você aceitar essa
verdade sem explicações acerca de quem colocou isso em nós ou como colocaram.

Senti novamente uma sensação de ameaça, exatamente como eu tinha sentido antes, com um
pouco mais de claridade desta vez. Essa sensação não vinha de mim, mas estava presa de alguma
forma a mim. Don juan estava ao mesmo tempo fazendo algo misteriosamente positiva e
terrivelmente negativa comigo. Eu sentia como se ele estivesse cortando uma espuma fina que
parecia pregada a mim. Eu o olhei e vi que os seus olhos estavam fixos nos meus.
Ele desviou seu olhar e começou novamente a falar sem me fitar.

- Vou te dar um exemplo, ele disse, em meu caso, na minha idade seria normal que eu sofresse
de pressão alta. Se eu fosse a um médico, ele pensaria ao me ver, que eu sou um índio velho ,
repleto de frustrações, incertezas, uma dieta pobre, tudo isso resultaria, naturalmente, em uma
suposição imediata do médico que eu sofro de pressão alta, uma suposição aceitável para pessoas
da minha idade.
“Não tenho nenhum problema de pressão alta, não porque eu seja mais forte que um homem
comum, ou mesmo por conta de minha herança genética, na verdade fiz o meu corpo quebrar os
padrões de comportamento que me levariam a ter pressão alta. Posso dizer com a mais absoluta
certeza que cada vez que eu estalo as minhas articulações, depois de executar os passes
mágicos, estou bloqueando o fluxo de expectativas e comportamento que em minha idade,
normalmente, me traria por resultado ser um velho hipertenso.”
“Outro exemplo que posso dar é a agilidade que tenho. Você nunca percebeu que sou muito mais
ágil que você? Quando se trata de movimentar-me sou um menino! Com os meus passes mágicos
coloquei uma represa no fluxo de comportamento e na parte física que faz com que as pessoas
fiquem rígidas a medida que envelhecem.

Uma das sensações mais irritantes que eu tinha era o fato de que Don juan, embora tivesse idade
para ser o meu avô, era infinitamente mais jovem que eu. Em comparação a ele eu era
rígido,obstinado, teimoso, repetitivo, era um velho. Ele, por outro lado, era vigoroso, ágil, criativo
resumindo ele possuia algo que eu, que era muito mais novo não possuia, a juventude. Ele se
encantava em falar repetidas vezes que ser jovem não era algo que poderia impedir uma pessoa
de ser senil.
Depois de uma explosão de energia que parecia vir de dentro de mim, eu admiti a minha
insatisfação e disse:

- Como é que você pode ser mais jovem que eu Don juan?
- Eu venci a minha mente, disse enquanto arregalava os olhos em sinal de constrangimento.

- Não tenho uma mente que me diga que chegou a hora de ser velho. Não costumo honrar acordos
que não participei. Lembre-se, os feiticeiros não aceitam acordos dos quais eles não participaram.
Sofrer as dores da velhice é um desses acordos.
Ficamos calados por um longo tempo. Percebi que Don juan estava esperando para ver o efeito
que suas palavras teriam em mim. O que eu acreditava ser uma fatia de minha personalidade se
elevou mis uma vez com uma resposta que era claramente contraditória. Por um lado, repudiava
com toda a minha força tudo o que Don Juan estava me falando, mas por outro lado não podia
negar o quanto eram congruentes as suas postulações. Don Juan era obviamente um velho, mas
não se comportava ou parecia um velho. Parecia ser, na verdade, anos mais novo que eu. Ele
estava livre de preocupações, de padrões e hábitos. Podia acessar a vontade mundos incríveis para
nós. Ele era livre enquanto eu era um prisioneiro de inúmeros padrões e hábitos, de especulações
mesquinhas e frívolas acerca de mim mesmo, sensações que pude sentir, pela primeira vez, que
sequer eram minhas.
Finalmente rompi o silêncio depois de recuperar um pouco de controle sobre meus pensamentos
contraditórios.

- Como eles inventaram os passes mágicos, Don Juan?

- Ninguém os inventou, disse com seriedade, pensar que foram inventados implica imediatamente
em pensar na intervenção da mente no processo. Através das práticas de sonhar, os feiticeiros
antigos descobriram que se movimentando de formas específicas o fluxo de pensamento era
barrado.

- Os passes mágicos são o resultado de um estado em que a mente não intervém, são movimentos
naturais quando a mente está desligada. Os praticantes tinham uma disciplina rígida para poder
sonhar, e o resulto era o desligamento da mente.
- O que você quer dizer quando fala da fuga da mente, Don Juan?

- O grande truque dos feiticeiros da antiguidade era sobrecarregar a suas mentes com disciplina.
Descobriram que se sobrecarregassem a mente com atenção, principalmente com a atenção que
os feiticeiros chamam de atenção sonhadora, a mente foge, e isso por si cria, no praticante, a
certeza absoluta de que a mente é de origem estrangeira.

EU me sentia genuinamente agitado. Queria saber mais sobre esse assunto, um estranho
sentimento dentro de mim gritava para que eu parasse de tocar no assunto. Essa parte parecia
evocar um sentimento de algum tipo de punição, como se fosse a ira de Deus descendo sobre mim
para proteger um segredo guardado pelo próprio Deus.
Eu tive então que fazer um esforço supremo para me conter, mas a minha curiosidade acabou por
vencer.

- O que quer dizer com sobrecarregar a mente? Escutei-me fazendo a pergunta.

- A disciplina afugenta a mente, disse ele, mas a disciplina a que me refiro não tem nada a ver
com rotinas duras. Os feiticeiros entendem a disciplina como a capacidade de encarar com
tranquilidade situações adversas. Para eles a disciplina é um ato de vontade que lhes permite
enfrentar toda situação que se apresente sem remorsos ou expectativas. Para os feiticeiros a
disciplina é uma arte, a arte de encarar o infinito com firmeza, não apenas de ter perseverança,
mas de saber enfrentar as dificuldades no caminho. Resumindo, eu diria que a disciplina é a arte
da impecabilidade. Assim, através da disciplina, os feiticeiros venciam finalmente a mente, a
instalação forânea.

Don Juan disse que, através de suas práticas de sonhar, os feiticeiros do México antigo
descobriram que certos movimentos, além de promover o silêncio interior, tinham como produto
uma sensação de plenitude e um peculiar bem estar. Este sentimento os cativou a tal ponto que
eles começaram a repetí-los quando estavam acordados. Don Juan disse que a princípio eles
acreditavam que a sensação de bem estar era um produto do sonhar, mas na tentativa de repetir
essa sensação apenas com o sonhar perceberam que o método era ineficaz. Então eles se deram
conta que sempre que sonhavam que estavam fazendo esse movimento tinham a mesma sensação
de bem estar. Através de um esforço memorável, começaram a reconstruir esses movimentos.
Seus esforços foram recompensados. Foram então capazes de recriar os movimentos que lhes
haviam parecido serem reações naturais ao sonhar. E então que surgiram os passes mágicos como
você conhece hoje.
Incentivados pelo seu sucesso, eles foram capazes de recriar os seus movimentos de sonho, sem jamais
classificá-los em um esquema que fosse compreensível. Eles acreditavam que os movimentos
aconteciam naturalmente nos sonhos e que havia uma força que guiava os movimentos para aglutinar
a energia interna sem nenhuma intervenção de suas vontades. Eles explicavam que essa força é um
fator aglutinante que une nossos campos internos de energia para convergirem em uma unidade
criando um efeito máximo de energia e vigor para o corpo.

Capítulo 3 - O Centro para Decisões

O segundo tema de grande interesse dos feiticeiros do México antigo era o centro para decisões.
O cerne dos resultados de suas buscas práticas, foi encontrar o local de energia que leva o homem
a tomar as suas decisões, um ponto em “v” que se localiza na ponta dos ossos do externo, na base
do pescoço. Eles viram que o ponto é um centro de energia extremamente sutil, composto por um
tipo de energia que eram incapazes de definir porque estava além de qualquer definição. Mas o
que não deixava dúvidas era do impacto que advinha daquela energia. Eles afirmavam que aquela
energia específica ia para fora daquele centro muito cedo nos homens e nunca retornava para ele,
privando os seres humanos de algo que é mais importante talvez do que a energia de todos os
outros centros combinadas.
Os feiticeiros haviam notado através dos séculos, a incapacidade que tinham os seres humanos
em tomar decisões. Haviam observado que os homens criavam gigantescas instituições que
assumiam a responsabilidade de tomar decisões por eles. Concluíram que o homem não decidiam
as coisas por si mesmos, elas eram decididas pela ordem social sendo deles apenas o papel de
cumprir as decisões tomadas em seus nomes.
Para eles o ponto v na base do pescoço era um lugar de tamanha importância que apenas em
situações muito especiais era tocado, e quando era feito, sempre era por outra pessoa, com a ajuda
de algum objeto e seguindo a um procedimento ritual. Don Juan Matus me dizia que eram
utilizados com essa finalidade objetos de madeira dura, bem polida ou até ossos polidos de
animais e até mesmo de seres humanos, esses objetos eram redondos e do tamanho perfeito para
se encaixar no buraco na base do pescoço. Esses objetos eram usados para exercer pressão nas
bordas do ponto. Don Juan disse que esses objetos eram usados também, muito embora mais
raramente, para massagear-se, da mesma forma que hoje estimula-se os pontos de pressão em
certas massagens.
- Como eles descobriram que esse ponto na base do pescoço é o centro para decisões? Perguntei
a ele.
- Cada centro de energia no corpo, - disse ele, - tem uma concentração de energia específica, um
tipo de vórtice energético, como um redemoinho que parece girar em sentido anti-horário, na
perspectiva do observador. A força de quaisquer desses centros depende da força desse
movimento. Se ele se move de forma lenta ou está quase estagnado, isso significa que esse centro
está esgotado, vazio de energia.
Don Juan explicou que existem seis vórtices maiores no corpo do homem, todos eles podem ser
manipulados. O primeiro se localiza na área do fígado e da vesícula biliar, o segundo está na
região do pâncreas e do baço, o terceiro fica na área dos rins e glândulas supra-renais e o quarto
ponto fica exatamente no ponto em v na base do pescoço. Este último centro, na base do pescoço,
tem uma qualidade especial de energia que os videntes percebiam como sendo transparente, uma
substância aquosa de uma qualidade tão fluida que parece um líquido. Falou ainda que a aparência
aquosa da energia é uma marca de sua qualidade, filtrando toda energia que fica ali, separando de
todas elas apenas a parte delas com essa característica líquida. Esta característica é uma qualidade
única deste centro. Continuando a explicação, me disse que o quinto centro só pode ser localizado
nas mulheres, sendo localizado na área do útero. Falou que em algumas mulheres o útero parece
ter uma energia também fluida, servindo como um filtro natural que separa a energia supérflua,
ms nem todas as mulheres tem úteros com essa características. Existe ainda um centro que fica
localizado acima da cabeça, uma energia que os feiticeiros de antigamente não lidavam
diretamente. Cada um dos passes mágicos tem a ver com algum desses cinco centros, mas nunca
se relacionam com a energia do sexto centro.
- Porque essa discriminação, Don Juan? – Perguntei.
- Esse sexto centro de energia – disse ele – não pertence ao todo ao homem. Nós, os seres
humanos, estamos sitiados, por assim dizer. É como se esse centro tivesse sido invadido por um
inimigo invisível. A única forma de vencer esse inimigo é fortalecendo os outros cinco centros.
- Não é um pouco de paranóia da sua parte dizer que estamos sitiados, Don juan?
- Bem, até que pode ser para você, mas não o é para mim. Eu posso ver energia diretamente, e
posso ver que a energia que está no centro acima da cabeça não flutua como a energia dos outros
centros. Ao contrário, ela se move para frente e para trás, de modo que nos parece muito estranho
e repugnante para nós.
- Vejo também que os feiticeiros que conseguiram vencer a mente, que eles chamam de instalação
alienígena, voltam a ter a flutuação desse centro exatamente como é a flutuação dos outros centros
do corpo. A rotação do centro para decisões no homem é a mais débil de todas. Por esse motivo
que o homem nunca pode decidir nada. Os feiticeiros viram que depois de praticar certos passes
mágicos esse centro volta a ficar ativo e então conseguem, certamente, tomar as decisões que
desejem tomar, quanto antes não podiam decidir nem mesmo ir a uma esquina.
Don Juan colocou uma grande ênfase no fato que os feiticeiros tinham uma grande aversão,
beirando a fobia, em tocar a base de seus pescoços, no ponto em “v”. A única maneira de
aceitarem qualquer interferência nesse ponto era através dos seus passes mágicos, que forma
especialmente projetados para revitalizar a energia que era dispersada desse centro. Dessa forma,
eles eliminavam quaisquer dúvidas em suas tomadas de decisões, exatamente porque as dúvidas
são um produto da dispersão natural da energia desse centro causada pelo desgaste de energia do
dia a dia.
A idéia geral que esses homens tinham era que o corpo humano, quando visto pelos videntes, é
uma unidade de energia selada, com diversos campos energéticos em seu interior, nenhuma
energia pode escapar desse invólucro. Para os feiticeiros da linhagem de Don juan, o sentimento
de esgotamento energético, que todos nós experimentamos em um momento ou outro, é o
resultado da dispersão energética da energia contida nos cinco centros energéticos do homem. Os
feiticeiros acreditavam que a energia era expulsa para as bordas de nosso ser luminoso. Quando
os feiticeiros antigos se referiam aos limites de nosso ser, falavam da forma que percebiam os
seres humanos, como conglomerado de energia com a aparência de um ovo luminoso. Eles
consideravam que esse ovo luminoso é o nosso verdadeiro ser total, que para eles é uma unidade
irredutível em termos energéticos.
Em outras palavras, eram capazes de extender os limites de suas percepções ao ponto de
conseguir perceber a energia diretamente como ela flui no universo. Em tais condições, os homens
são vistos como esferas luminosas, essa é uma visão absoluta, livre de interpretações, onde a
totalidade energética dos feticeiros é utilizada para perceber energia diretamente no universo.
Aqueles feiticeiros compreendiam qualquer sensação de ganho de poder, como sendo uma
concentração de energia nos centros energéticos já mencionados. Chamavam essa manobra de
“redistribuição energética”. Eles usavam esses passes mágicos para poder realizar essa
distribuição, já que a sua efetividade havia sido comprovada por milênios. A Tensegridade, a
versão moderna desses passes mágicos, tem como objetivo alcançar a mesma meta, qual seja, a
redistribuição da energia dispersa, mas livre de toda a imposição ritual dos feiticeiros.

Capítulo 4 - A Recapitulação
O terceiro tema de profundo interesse para os feiticeiros do México antigo era a recapitulação.
Aqueles feiticeiros acreditavam que, assim como os passes mágicos, a recapitulação é alicerce
para a edificação do Conhecimento Silencioso. Para eles, a recapitulação é o ato de reviver
experiências passadas, necessário para atingir as metas transcendentais dos guerreiros. A primeira
era um esforço coerente com sua visão geral do universo, da vida e da consciência, a outra era
uma meta extremamente prática de adquirir fluidez perceptiva.
Sua visão geral do universo, da vida e da consciência, era que existe uma força indescritível, que
eles chamam, metaforicamente, de Águia. Eles entendiam que essa era a força que fornece energia
a todos os seres vivos, desde os vírus até os homens. Eles acreditavam que a águia empresta a
consciência no ato da concepção, e que esta é incrementada pelas experiências da vida, até que
essa força exija que essa consciência retorne a ela. De acordo com o entendimento dos feiticeiros,
a morte de todos os seres vivos acontece porque são forçadas a regressar a suas consciências que
lhes fora empresta. Então a consciência aumentada volta ao sua fonte.
Don Juan falou que não havia maneiras de explicar tal coisa com a nossa forma linear de pensar,
já que não existe uma explicação do porque a consciência é emprestada ou porque ela retorna a
sua fonte, é uma fato energético, e nem todos os fatos energéticos podem ser explicados em termos
de causa e efeito, com algum propósito que possa ser, a priori, determinado.
Os feiticeiros do México antigo acreditavam que recapitular significa entregar a esta força, a
Águia, o que ela está buscando, ou seja, nossas experiências de vida, mas com um certo grau de
controle que permite aos feiticeiros separar a consciência da vida. Eles asseguravam que a
consciência e a vida não estão entrelaçadas de forma inseparável, mas apenas incidentalmente.
Afirmavam que a Águia não quer a nossa vida, quer na verdade as nossas experiências vividas.
Muito embora os seres humanos devessem perder apenas a força de suas experiências, a falta de
disciplina não lhes permite separar a sua força vital da força de suas vivências. A recapitulação
pe o procedimento através do qual os feiticeiros entregam a águia algo no lugar de suas vidas.
Eles entregam a águia suas experiências ao revivê-las, mantendo assim a sua força vital.
As conjecturas perceptivas dos feiticeiros parecem sem sentido se examinadas em termos dos
conceitos lineares de nosso mundo. O homem ocidental abandonou qualquer tentativa de travar
um discurso filosófico sério baseado nas declarações feitas pelos feiticeiros do Novo mundo. Por
exemplo, a idéia da recapitulação nos parece similar as idéias da psicanálise. Qualquer erudito
que esbarre com essa idéia, poderia pensar que a recapitulação é um procedimento psicológico,
um tipo de técnica de auto-ajuda. De acordo com Don juan Matus, o homem sempre perde por
omissão. Ele acreditava que existem formas alternativas de nos relacionarmos com o universo, a
vida, a consciência e a percepção, e a forma atual de relacionamento é apenas uma dessas
múltiplas opções.
Para os praticantes da feitiçaria, o significado da recapitulação, é entregar para a força
incompreensível, a águia, exatamente o que ela quer, as suas experiências de vida, ou seja, a
consciência que foi incrementada através dessas experiências. Don Juan não conseguia me
explicar este fenômeno nos termos de nossa lógica comum, ou nos termos de nossa necessidade
de se explicar tudo em termos de causas e consequências. Dizia que tudo isso pertence ao reino
prático, e que tudo que podemos aspirar é a realização dessa façanha sem uma explicação.
Também dizia que haviam centenas de feiticeiros que atingiram a realização dessa façanha de
conservar as suas vidas depois de entregarem Águia a força de suas experiências. Para Don Juan
isso significava que esses feiticeiros não morreram da forma usual como entendemos a morte,
mas a transcendeu mantendo a sua força vital desaparecendo da face da Terra, embarcando em
uma viajem definitiva da percepção.
Os feiticeiros acreditam que quando a morte acontece desta forma, todo o nosso ser se converte
em energia pura, de uma qualidade especial que mantém a marca de nossa individualidade. Tratou
de explicar isso de forma metafórica dizendo que, durante todo o curso de nossas vidas, somos
compostos por um grande número de “nações e reinos individuais.” Disse que temos o reino dos
pulmões, o reino do coração, o reino do estômago, o reino dos rins, e tantos outros, e que a cada
um desses reinos e nações trabalham, algumas vezes, de forma independente de todo resto, mas
que, no momento da morte, todos se unem em uma só entidade. Ele chamou esse estado de
liberdade total, e dizia que um ser humano livre da socialização e do domínio da sintaxe era
transformado assim em uma porção de energia pura e unificada, desaparecendo, evaporando,
virando fumaça no desconhecido, no infinito, transformando-se em um ser inorgânico, um ser que
tem consciência e não tem um corpo.
Eu perguntei a ele se isso era a imortalidade. Ele me disse que isso não era, de nenhuma maneira,
a imortalidade, era unicamente a entrada em um processo evolutivo, lançando mão do único meio
de evolução que o homem possui, a consciência. Os feiticeiros estavam convencidos que não
existem mais para onde evoluir biologicamente, consideraram então que o único meio do homem
evoluir é através de sua consciência. Para os feiticeiros, transformar-se em seres inorgânicos era
atingir a evolução, Don Juan disse, para eles isso significa que eles adquirem um novo tipo de
consciência incompreensível que dura, de fato, milhões de anos, mas que um dia deverá retornar
ao seu doador, a Águia.
Perguntei a Don juan se os seres inorgânicos, que de acordo com os feiticeiros habitam o nosso
mundo gêmeo, eram seres evoluídos que foram homens alguma vez em sua existência. Disse que
são seres intrinsicamente inorgânicos da mesma forma que nós somos intrinsicamente orgânicos,
são seres cuja consciência pode evoluir como a nossa, e sem dúvida o fazem, mas que ele não
tinha consciência de como isso acontecia. O que se sabia, no entanto, é que um ser humano que
evolui é um ser inorgânico de um tipo especial.
Don Juan me deu uma série de descrições dessa evolução, que sempre considerei como metáforas
poéticas. Elegi então a que mais gostei, a liberdade total. Eu sempre pensava que o ser humano
que entrasse nesse estágio deveria ser o mais valoroso, o mais imaginativo que houvesse. Don
Juan me falou que eu não estava apenas imaginando, que para entrar neste estágio o ser humano
deve apelar para o seu lado sublime, que segundo ele disse, todos os homens possuem mas nunca
pensam em usar.
Don juan explicou que o segundo aspecto da recapitulação era adquirir fluidez. Me disse que a
racionalização dos feiticeiros tinha a ver com um dos assuntos mais intrigantes da feitiçaria, o
ponto de aglutinação, um ponto luminoso do tamanho de uma bola de tênis que pode ser percebida
pelos feiticeiros que veem o fluxo de energia do universo diretamente. Como já foi dito
anteriormente, um ser humano, visto pelos olhos de um vidente, tem a aparência de uma esfera
luminosa, então os videntes podem ver um ponto de brilho mais intenso na parte anterior desse
ovo de luz. Eles o chamam de ponto de aglutinação exatamente por o verem como um ponto em
que convergem filamentos luminosos de energia do interior do ovo de luz. Essa confluência de
filamentos que dá ao ponto de aglutinação o seu grande brilho.
O ponto de aglutinação permite ao ser humano perceber a energia do universo convertida em
dados sensoriais, que o ponto de aglutinação interpreta como o mundo cotidiano, esta
interpretação se realiza em termos da socialização e dos potenciais humanos.
Don Juan disse que recapitular era reviver todas, ou quase todas as experiências que a pessoa teve
e que ao fazer isso, o ponto de aglutinação se desloca, um pouco ou significativamente,
impulsionado pela força da memória para ocupar a posição em que se encontrava quando o evento
recapitulado acontecia. O ato de se deslocar continuamente o ponto de aglutinação do ponto
fixado para os momentos recapitulados dá ao praticante a fluidez necessitaria para suportar as
circunstâncias insólitas de suas viagens ao infinito, viagens que não fazem parte de todo da
cognição normal do praticante.
Nos tempos antigos, a a recapitulação era como um procedimento formal, os praticantes
recordavam de cada pessoa que tinham conhecido e cada experiência de que tivessem feito parte.
Don Juan me sugeriu que escrevesse uma lista de todas as pessoas que eu tivesse conhecido em
minha vida, como um dispositivo mnemônico. Uma vez que eu tinha a lista escrita, prosseguiu a
descrição de como utilizá-la. Me disse para pegar a primeira pessoa na lista, que era ordenada de
agora ao passado, e recriar em minha mente a última interação com a pessoa. Chamou essa ação
de fixar os eventos que serão recapitulados. Don Juan dizia que recontar os eventos em detalhes
era a melhor maneira de afiar a nossa capacidade de recordar. Disse que para realizar essa narração
a pessoa necessita incorporar todos os detalhes físicos do ambiente, tal como os arredores do lugar
onde o evento aconteceu. Uma vez que o evento esteja totalmente relembrado, a pessoa deve
entrar nesse lugar como se ela realmente estivesse ali e prestar especial atenção a qualquer
configuração física que seja relevante. Por exemplo, se o evento aconteceu em uma oficina, a
pessoa deve lembrar-se do piso, das portas, das paredes, dos quadros, das janelas, mesas, dos
objetos encima das mesas, tudo aquilo que talvez tenha sido visto rapidamente e logo depois
esquecido.
Don Juan me assegurou que, como um procedimento formal, a recapitulação deve iniciar-se como
a narração dos eventos mais recentes. Desta forma a experiência acontece com primazia, pois a
pessoa pode recordar facilmente de algo que acaba de acontecer com grande precisão. Assegurava
que a pessoa é capaz de armazenar informações detalhadas que mesmo ela não é consciente, e
que esse tipo de informação é o que interessa a Águia.
Para recapitular o evento em si, é necessário que se respire profundamente movendo a cabeça
para esquerda e direita tantas vezes quanto for necessário, até recordar de todos os detalhes
possíveis. Don Juan disse que os feiticeiros se referiam ao método como o ato de inalar todos os
sentimentos que a pessoa sentiu no evento que está recapitulando, e exalar todos os sentimentos
indesejáveis que estiveram envolvidos com ele.
Os feiticeiros acreditam que o mistério da recapitulação está no ato de inalar e exalar. Sendo a
respiração uma função que sustenta a vida, os feiticeiros acreditam que também podemos entregar
a força que nos emprestá a consciência este facsímile das experiências de nossa vida com a nossa
respiração. Quando eu pressionei Don Juan para me dar uma explicação racional sobre o assunto,
ele me disse que certas coisas como a recapitulação não podem ser explicadas, só podem ser
experimentadas. Os feiticeiros se atém a ação. A explicação nestes casos se dissipariam em
esforços inúteis. Sua explicação era como todas que se relacionavam com o seu ensinamento, um
convite a ação.
A lista que fazemos com os nomes das pessoas funciona como um dispositivo mnemônico que
propulsiona a memória a fazer uma viajem inconcebível. A lógica dos feiticeiros é que recordar
os eventos que acorreram mais recentemente prepara o caminho para que a pessoa recorde eventos
mais antigos, com a mesma claridade e eficiência.
Os feiticeiros consideravam que fazer uma recapitulação como esta é como viver as experiências
vividas, e o que se pode esperar da recapitulação é uma força extraordinária, um ímpeto
excepcional que agita e faz regressar novamente, aos nosso centros energéticos, toda a energia
que havia se dispersado deles ficando acumulada na borda do ser luminoso que somos nós. Falam
que essa redistribuição de energia resultado da recapitulação nos permite ganhar fluidez a medida
que entregamos a Águia o que ela quer.
Em um nível mais mundano, a recapitulação nos permite ver o quão é repetitiva a nossa vida. A
recapitulação nos convence, sem deixar dúvidas, de que estamos a mercê de forças que, a primeira
vista parecem ser extremamente normais, mas que no fim, são absurdas. Os feiticeiros afirmas
que uma verdadeira mudança de comportamento só pode ser conseguido pela recapitulação, sendo
ela o único veículo que pode dar a consciência a liberdade que as exigências silenciosas que a
socialização impõe, uma imposição que não pode ser percebida quando estamos no automático.
Está é a razão pela qual os feiticeiro se referem a recapitulação como “a visão da ponte”.
Chegar ao fim da lista leva um grande tempo, já que está intimamente relacionada com os eventos
que aconteceram. Algumas vezes, por simples osmose, existem pessoas que se relacionam com
eventos impessoais em que nenhuma pessoa participou mas que aconteceu no período que havia
conhecido a pessoa que se está recapitulando. Nestes casos a pessoa deve recapitular o evento em
si.
O que os feiticeiros procuram ávidamente através da recapitulação é obter a memória de suas
interações já que através destas, se dão conta dos profundos efeitos da socialização a qual tentam
superar de todas as formas possíveis.

Capítulo 5 - O Sonhar

O quarto tema na lista de prioridades dos feiticeiros do México antigo é o sonhar, a arte de romper
com os parâmetros da percepção normal. Para esses feiticeiros, bem como para os membros atuais
de sua linhagem, viajar para o desconhecido é a força que dá impulso a feitiçaria. Don Juan me
demonstrou inúmeras vezes que tudo que ele e os seus companheiros sabiam tinham origem neste
impulso. As duas artes em que se baseiam suas viagens eram duas linhas de atividades de
tremenda sofisticação, a arte do sonhar e a arte da espreita.
Para Don Juan a arte da espreita era a outra cara da moeda relacionada com a arte de sonhar. Para
poder me explicar estas duas artes, me apresentou ao que, segundo ele, era a pedra angular na
feitiçaria, a possibilidade de perceber energia diretamente, como ela flui no universo.
Explicou que os que os seres humanos consideram um ato de perceber é, na verdade, um ato de
interpretação de dados sensoriais. Ele me assegurou que desde o momento que nascemos tudo ao
redor de nós nos possibilita uma possibilidade de ser interpretada. Com o tempo esta possibilidade
se converte em um sistema completo por meio do qual conduzimos todas as nossas percepções
sobre o mundo. Estava convencido de que não tínhamos a oportunidade de considerar, sequer por
um instante, a possibilidade de perceber o fluxo energético diretamente. Para Don Juan e outros
feiticeiros como ele, o que faz com que um homem comum se torne um feiticeiros é cancelar o
efeito de nosso sistema de interpretações e perceber energia diretamente.
Don Juan explicou que os seres humanos tem a aparência de esferas luminosas quando são
percebidos diretamente como energia. Dizia que ver energia é o ponto neurálgico da feitiçaria.
Me assegurou que tudo que um feiticeiro faz gira em torno disso ou se origina nisso, e que a arte
de sonhar e a espreita são as correntes principais de atividade que são derivadas do ato de ver
energia diretamente.
Outro assunto que foi intensamente explicado foi o ponto de aglutinação. Disse que quando os
feiticeiros são capazes de ver os seres humanos como esferas luminosas, também conseguem ver
o centro de toda a feitiçaria, um ponto do tamanho de uma bola de tênis com a luminosidade mais
intensa que o resto da esfera luminosa. Don Juan chamou esse ponto de ponto de aglutinação e
disse que a percepção acontece exatamente ali, neste local.
- A arte de sonhar – falou em uma ocasião – consiste em movimentar, intencionalmente, o ponto
de aglutinação de seu posicionamento atual. A arte da espreita consiste em mantê-lo,
intencionalmente, fixo em sua nova posição para qual ele foi movimentado.
De acordo com a explicação de Don Juan, estas são artes que são guarnecidas por um marco
filosófico chamado “o caminho do guerreiro”, o caminho que trilham os feiticeiros, que é um
conjunto de premissas pelas quais os feiticeiros vivem e agem no mundo. Para Don Juan e seus
companheiros, seguir as premissas dos guerreiros era o principal feito da feitiçaria. Don Juan
acreditava que os feiticeiros podem encontrar energia e a determinação necessária para viajar no
desconhecido quando adotam sem restrições o caminho do guerreiro.
Don Juan salientou, de tantas formas como foi possível, o valor de uma atitude pragmática a ser
perseguida por parte dos praticantes do sonhar. Definiu a atitude pragmática como a capacidade
de absorver qualquer eventualidade que possa surgir ao longo do caminho do guerreiro. Para mim,
ele mesmo era o exemplo vivo de tal atitude. Não existia nenhuma incerteza ou contingência que
sua mera presença não dissipasse.
Ele observou que, para alcançar essa desejada atitude pragmática, o praticante deve ter um corpo
extremamente flexível, ágil e forte. Disse que para os feiticeiros, o corpo físico é a única entidade
que faz sentido, e que não existe tal coisa como a dualidade entre o corpo e a mente. Os feiticeiros
acreditam que o corpo físico compreende tanto o corpo quanto a mente, tal como a conhecemos.
Disse que para contrabalancear o corpo físico, como uma unidade holística, os feiticeiros
consideram outra configuração de energética, o corpo energético, também conhecido como o
outro, o duplo, o corpo de sonhar.
Don Juan descreveu a arte de sonhar como a possibilidade que a consciência humana utilize seus
sonhos normais como a entrada genuína a outros reinos de percepção. Assegurava que os sonhos
comuns e correntes podem ser usados como uma porta que conduz a outras regiões de energias
diferentes das energias do mundo cotidiano e, sem dúvida, extremamente similares em seus
núcleos básicos. Disse que o resultado desta entrada era a percepção de mundos verdadeiros onde
o homem pode viver ou morrer, tal qual o mundo em que vivemos, mundos que são
assombrosamente diferentes do nosso e, sem dúvidas, extremamente similares. Ao ver-se
pressionado para dar uma explicação literal, Don Juan reiterou a sua posição usual, que as
respostas de todas essas perguntas encontravam-se no âmbito prático, não em uma indagação
intelectual. Para poder falar de tais possibilidades a pessoa tem que usar a sintaxe da língua,
qualquer que seja o idioma que a pessoa fale e essa sintaxe, pela força do seu uso limita as
possibilidades da explicação. A sintaxe de qualquer língua se refere apenas as possibilidades de
percepção que formam a parte do mundo que vivemos.
Don Juan frisou uma importante diferença entre dois verbos, um era sonhar e o outro era ensonhar,
sendo o último o modo como sonham os feiticeiros. Don Juan também descreveu o ensonho como
um estado de meditação profunda em que a mudança de percepção tem um papel central.
Don Juan explicou que a arte de sonhar se originou por uma observação pessoal que os feiticeiros
do México antigo fizeram quando observavam pessoas que estavam dormindo. Se deram conta
que o ponto de aglutinação se desloca de sua posição habitual de uma maneira muito fácil e natural
durante o sonho, e que se move a qualquer parte na periferia da esfera luminosa e qualquer lugar
de seu interior. Ao comparar o que viram com os relatos das pessoas que eram observadas
dormindo, concluíram que quanto maior era o movimento do ponto de aglutinação, mas
assombroso eram os relatos das coisas e lugares que estas pessoas experimentavam nos sonhos.
Os feiticeiros buscaram, com toda avidez, oportunidades para deslocar os seus próprios pontos de
aglutinação, e terminaram opor usar plantas alucinógenas para conseguir este feito. Contudo se
deram conta que os movimentos causados por estas plantas eram erráticos, forçados e fora de
controle. Don Juan disse que eles haviam descoberto uma coisa de extremo valor no meio deste
fracasso. Os feiticeiros dos tempos antigos chamaram de atenção do sonhar, a capacidade que
adquirem os praticantes para manter a sua consciência nos objetos dos seus sonhos.
O resultado final dos novos esforços desses feiticeiros foi a arte do sonhar como a conhecemos
hoje em dia. Através de sua disciplina conseguiram desenvolver a sua atenção de sonhar a um
ponto extraordinário. Eram capazes de focalizar as suas atenções em qualquer elemento de seus
sonhos e foi assim que descobriram que existem duas categorias de sonhos. Uma categoria são os
sonhos que estamos familiarizados a ter, nos quais existem elementos fantasmagóricos, algo que
poderíamos classificar como sendo produto de nossa mente, nossa psiquê, talvez algo que se
relaciona com a nossa estrutura neurológica. A outra categoria de sonhos são os que os feiticeiros
chamam de sonhos que geram energia. Don Juan disse que que esses feiticeiros dos tempos
antigos tinham sonhos que não eram sonhos, e sim verdadeiras visitas, feitas em um estado como
o sonhar, a lugares genuínos que não estavam neste mundo, lugares tão reais quanto o mundo que
vivemos, lugares onde os objetos do sonho geravam energia da mesma forma que as árvores, os
animais, ou até mesmo as rochas que geram energia em nosso mundo. P 24
No entanto, suas visões destes lugares eram demasiadamente evanescentes, rápidas para ter algum
valor a eles. Eles atribuíram esse fracasso ao fato de que seus pontos de aglutinação não podiam
manter-se fixo por tempo suficiente, na posição para qual haviam sido deslocados. Suas tentativas
de corrigir esta situação deram como resultado uma outra grande arte na feitiçaria, a arte da
espreita, ou a arte de manter o ponto de aglutinação fixo na posição para qual se moveu. Esta
fixação conseguida deu a eles a oportunidade de testemunhar estes mundos ao máximo. Don Juan
disse que alguns destes feiticeiros nunca regressaram de suas viagens. Em outras palavras eles
decidiram ficar “lá”, onde quer que “lá” fosse.
Don Juan comentou que, ao examinar os seres humanos como esferas luminosas, os feiticeiros
dos tempos antigos descobriram seiscentos pontos na totalidade da esfera luminosa que dão como
resultado a entrada em um mundo totalmente novo, quando o ponto de aglutinação consegue ficar
fixo em qualquer um deles. Sua resposta a minha pergunta inevitável sobre onde estavam esses
mundos foi:
- Na posição do ponto de aglutinação.
Nada podia ser mais acertado que essa afirmação e, sem dúvidas, não tem nenhum sentido para
nós.
Para os feiticeiros, entretanto, isso é algo razoável quando examinamos essa premissa pelo ponto
de vista da capacidade que eles tem de ver energia diretamente como ela flui no universo. Sua
conjectura é que em seu posicionamento atual, o ponto de aglutinação recebe um fluxo de campos
de energia de todo o universo na forma de filamentos de energia luminosa. Consistentemente,
estes mesmos filamentos, que são bilhões, passam através do ponto de aglutinação e resultam o
mundo como nós conhecemos. Se o ponto de aglutinação se movimenta para outra posição, outro
conjunto de filamentos de energia passam através dele. Os feiticeiros acreditam que não é possível
que este novo conjunto de filamentos energéticos possa dar como resultado a visão do mesmo
mundo, por definição, esse mundo tem que ser diferente do mundo da vida cotidiana. Já que o
ponto de aglutinação não é apenas o centro onde a percepção acontece, sendo também o centro
onde são realizadas as interpretações dos dados sensoriais, os feiticeiros acreditam que o ponto
de aglutinação interpreta o novo fluxo de campos de energia nos mesmos termos que interpreta o
mundo da vida cotidiana. O resultado dessa nova interpretação é a visão de um mundo que é
estranhamente similar ao nosso e, sem dúvidas, intrinsecamente diferente. Don Juan disse que
esta similaridade é apenas a interpretação do ponto de aglutinação e que, energeticamente, os
outros mundos são tão diferentes do nosso como não se pode imaginar.
Para poder expressar essa qualidade maravilhosa do ponto de aglutinação e ainda o seu potencial
perceptivo induzidos pelo sonhar, é necessária uma nova sintaxe, ou talvez, se essa experiência
estivesse disponível para qualquer um de nós e não unicamente para os feiticeiros iniciados, a
mesma sintaxe de nossa língua poderia expressar essas experiências.
Outra coisa que me pareceu deveras importante, mas que me deixou absolutamente perplexo, foi
a afirmação de Don Juan sobre não haver nenhum procedimento, do qual se podia falar, que pode
ensinar a pessoa a sonhar, e mais do que qualquer coisa, sonhar era o resultado de um grande
esforço por parte dos praticantes para manter contato com a força perene e indescritível que os
feiticeiros chamam de intento. Uma vez que esta ligação é estabelecida, o sonhar é também
misteriosamente estabelecido.
Don Juan assegurou que este nexo causal pode ser realizado seguindo qualquer padrão que
implique em disciplina.
Sem dúvida, Don Juan considerava que para conseguir a façanha do sonhar, é de suprema
importância seguir o caminho do guerreiro, a construção filosófica que os feiticeiros usam para
sustentar as suas ações, quaisquer que elas sejam, neste mundo, ou em qualquer outro mundo
além deste. Seguir o caminho do guerreiro cria uma homogeneidade de resultados na ausência de
qualquer padrão definido. Os passes mágicos eram o recurso que os feiticeiros dos tempos antigos
utilizavam para ajudar a mover o seu ponto de aglutinação, já que foram desenhados para dar a
eles a estabilidade necessária e produzir a atenção do sonhar, sem a qual não há possibilidade de
sonhar da forma que faziam os feiticeiros do México antigo. Sem a ajuda da atenção sonhadora,
o máximo que os praticantes podiam aspirar é ter sonhos lúcidos de mundos fantasmagóricos, ou
talvez, até mesmo ter vislumbres de mundos que geram energia, mas na ausência de uma base
lógica abrangente que os permita categorizar adequadamente estes vislumbres, nada teria muito
significado.

Capítulo 6 - O Silêncio Interior

O quinto tema é a culminação dos outros quatro, e o que os feiticeiros do México antigo buscavam
com toda avidez, o silêncio interior. Don Juan definia o silêncio interior como um estado natural
da percepção humana em que os pensamentos param, em que todas as faculdades do homem
funcionam em um nível de consciência que não requer o funcionamento de nosso sistema
cognitivo cotidiano.
Don Juan associava o silêncio interior com a escuridão, devido ao fato de que a percepção humana
cai em algo que se assemelha a um buraco negro, quando se livra de seu companheiro habitual, o
diálogo interno, que é uma versão silenciosa do processo cognitivo. O corpo funciona como
sempre, mas a consciência se eleva. Se tomam decisões instantaneamente e estas decisões
parecem surgir de um tipo de conhecimento epecial em que os pensamentos não são verbalizados.
Os feiticeiros do México antigo, que descobriram e utilizaram os passes mágicos que são o núcleo
da tensegridade, acreditavam que a percepção humana é capaz de alcançar níveis indescritíveis
quando funcionando sob a condição do silêncio interior. Inclusive asseguravam que alguns destes
níveis de percepção pertencem a outros mundos, os quais, acreditavam, coexistirem com o nosso,
mundos estes que são tão inclusivos quanto o que vivemos, mundos em que podemos viver e
morrer, mesmo sendo inexplicáveis nos termos dos paradigmas lineares em que o nosso estado
perceptivo habitual do homem utiliza para explicar o universo.
De acordo com o entendimento dos feiticeiros da linhagem de Don Juan, o silêncio interior é a
matriz necessária para dar um gigantesco passo evolutivo, os feiticeiros do México antigo
chamam esse gigantes co passo evolutivo de conhecimento silencioso. O conhecimento
silencioso é um estado da consciência humana onde o conhecimento ocorre automática e
instantaneamente. Neste estado, o conhecimento não é produto de cogitações cerebrais ou
induções ou deduções lógicas, ou generalizações baseadas em similaridades ou diferenças. No
conhecimento silencioso não existe nada a priori, nada que possa constituir um corpo de
conhecimento. No conhecimento silencioso tudo ocorre eminentemente agora. Peças complexas
de informação podem ser captadas sem nenhum preâmbulo.
Don Juan acreditava que o homem primitivo tinha indicações do conhecimento silencioso, mas
não o possuíam realmente. Disse que essas indicações eram infinitamente mais poderosas que as
que são experimentadas pelos homens de hoje em dia, onde a massa de conhecimento é produto
da aprendizagem. Acreditava que, embora tenhamos perdido a nossa capacidade de captar essas
indicações, a avenida que conduz ao conhecimento silencioso está sempre aberta ao homem, e
esta avenida surge da matriz do silêncio interior.
Alcançar o silêncio interior é o pré-requisito para todas as coisas que temos descrito nesta
elucidação. Don Juan nos ensinou que o silêncio interior deve ser obtido por meio da firme pressão
da disciplina. Disse que o silêncio interior tem que ser cumulado e ser preservado, pouco a pouco,
seegundo a segundo. EM outras palavras, a pessoa tem que forçar-se a ficar em silêncio, mesmo
que seja por alguns segundos. Don Juan assegurava que se você for persistente, a perseverança
vence o hábito, e desta maneira, se chega a um limiar de segundos ou minutos acumulados, um
limiar que varia de pessoa a pessoa. Por exemplo, se para um dado indivíduo, o limiar do silêncio
interior é de dez minutos, uma vez que se chega a esse limite, o silêncio interior ocorre por si
mesmo, espontaneamente, por assim dizer.
Não existe maneira possível de se saber qual é o nosso limiar individual. A única maneira de saber
é praticando. Isto é, por exemplo, o que aconteceu comigo. Sendo a sugestão de Don Juan que
insistia em permanecer em silêncio, um dia quando caminhava pela Universidade da Califórnia,
do departamento de antropologia até o refeitório, alcancei o meu limiar misterioso. Eu soube que
o havia alcançado porque, em um instante, experimentei algo que Don Juan me havia descrito
extensivamente, ele chamou de parar o mundo. EM um instante, o mundo deixou de ser o que era
e, pela primeira vez em minha vida, fiu consciente de estar vendo energia como ela flui no
universo. Tive que me sentar em um degrau de tijolo, mas eu sabia que o fazia apenas a nível
intelectual, através de minha memória. Sensorialmente, estava sentado em energia. Eu mesmo era
energia, igual a tudo que me rodeava.
Me dei conta então de algo que me aterrorizou, algo que ninguém poderia me explicar exceto Don
Juan, tive consciência de que, apesar de estar vendo energia tal qual ela flui no universo pela
primeira vez em minha vida, tinha estado vendo energia como ela flui durante toda a minha vida,
mas nunca havia me dado conta disso. A novidade então não foi ver energia como ela flui no
universo. A novidade foi a pergunta que surgiu, com tal fúria, que me fez voltar imediatamente
para o mundo cotidiano. O que me impediu de perceber que vi energia como ela flui pelo universo
por toda a minha vida? Foi a pergunta que eu me fazia.
Don Juan me explicou fazendo uma distinção entre a nossa consciência geral e estar
deliberadamente consciente de algo. Disse que nossa condição humana é possuir essa consciência
profunda, mas que todos os exemplos dessa consciência profunda não estão no nível em que
podemos ter um conhecimento deliberado dela. Disse que, no cumprimento do seu papel, o
silêncio interior tinha coberto esta faixa e me havia permitido perceber coisas que eu apenas havia
estado consciente em um aspecto mais profundo.

Capítulo 7 - A série westwood

O objetivo desta elucidação é apresentar o que Don Juan chamava de “os cinco interesses dos
feiticeiros do México antigo”. Apresentou os seguintes pontos de interesse aos seus discípulos:
os passes mágicos, o centro para decisões, a recapitulação, o sonhar e o silêncio interior, na mesma
ordem em que os havia explicado. Disse que esta sequência estava de acordo com o que haviam
chegado os feiticeiros da antiguidade, segundo o seu entendimento do mundo ao seu redor.
Don juan explicou que um dos descobrimentos mais surpreendentes desses feiticeiros foi a
existência de uma força aglutinante que une os campos energéticos criando unidades concretas e
funcionais. Disse que os passes mágicos cumprem com a função desta condição vibratória, e que
o seu propósito era saturar os seus discípulos com eles, seguindo o mesmo padrão utilizado pelos
feiticeiros dos tempos antigos.
Don Juan explicou que quando esses feiticeiros agruparam estes cinco pontos do interesse dos
feiticeiros, copiaram o padrão energético que haviam descoberto ao ver energia tal qual ela flui
no universo. A aglutinação delas resultou nos passes mágicos, e estes impregnaram as quatro
unidades restantes em uma só unidade funcional, cinco campos energéticos unidos por um deles.
Aqueles passes mágicos, que saturavam as outra quatro unidades, e que eram ensinadas nos
tempos dos feiticeiros do México antigo somente aos iniciados na feitiçaria, são os mesmos passes
da Tensegridade. Hoje em dia, qualquer pessoa pode utilizar os passes mágicos sem que estes
percam a sua capacidade de aglutinar esses quatro campos de energia em uma unidade concreta
e funcional. O grupo de passes mágicos que cumpre com a função de aglutinar as outras é
chamado A Série Westwood.
A série Westwood está dividida em quatro seções. A primeira e mais importante, é constituída
por passes mágicos que facilitam a tomada de decisão. A segunda, na ordem de importância, é a
que está relacionada com a recapitulação. A terceira se relaciona com o sonhar e a quarta é
composta de passes mágicos diretamente ligados com a preparação para alcançar o silêncio
interior.
A série Westwood será enfatizada em todos os seminários a serem realizados este ano, tanto nos
Estados Unidos quanto no estrangeiro.

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