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NESTA EDICAO: @EXTOS LIETRARIOS PARA ENRIQUECER SUA MENTE, EDICAO 2 - JULHO DE 2017. PUBLICACAO: Trimestral. DIRETORA DE REDACAO: Rosana Mezzomo Oliveira. EDITORA-CHEFE: Elizabeth Caroline Uzoegwu. REVISAO: Cada texto foi editado e revisado por seu respectivo autor, sendo assim, nenhuma obra sofreu alteragées por parte da revista. DIAGRAMACAO: Elizabeth Caroline Uzoegwu. CAPA: Rosana Mezzomo Oliveira. DIREITOS AUTORAIS: Todo material aqui publicado pode ser re- produzido e/ou compartilhado em qualquer local desde que sejam mantidos 0s nomes de seus autores e que seja citadaa fonte, tais obras nao podem ser ultilizadas para fins lucrativos por parte desta revista. As imagens aqui expostas foram retiradas de meios eletrénicos e suas fontes nao serdo citadas. Ei https://www.facebook.com/Literalmentelntrigante/ yy” aR https://literalmentintrigant.wixsite.com/revista & revista-literalmente.intrigante@outlook.com EDITORIAL. Saudagoes, humanos! Sejam bem-vindos a segunda edigdo de nossa revista virtual, vocé por acaso esta no futuro lendo isso em algum computador transparente? Acessando as tecnologias antigas com seu cérebro super avangado? Caso vocé diga nao, nao se preocupe, esta revista também é para vocél Nesta edico temos a honra de apresentar a vocés os textos vencedo- res da 2° selegao, além de algumas piadas, curiosidades, cantadas geeks e alguns livros de ficcao cientifica. Apreciem e...Tenham uma vida longa e prospera! Rosana Mezzomo Oliveira. Diretora de redagao. ONDE ENCONTRO? POEMAS PAGINA Ah, mulher! .. 06 Arte no limite humano - 08 Conhecimento 10 Jornal das oito 12 Horizonte .... .14 ARTIGOS Tipos de trolls e como derroa-los .. 18 Nas terras de quem tem historia .. Entendendo a histéria do Mochileiro das Galaxias . CONTOS Infinito e além... O copo que chama Qual seu nome? O urso do meu vizinho . O feixe invisivel CRONICAS O nao findar-.... sence O tempo cronoldgico e o tempo psicoldgico .. Somos tao fracos, mas tao fortes . PAGINAS A PARTE Conversas Geek/Nerd PIAMAS wsssessersessee Livros de ficcao Cantadas Geek Jer AH, MULHER! . dq 6 LITERALMENTE INTRIGA! As cores dos teus olhos, que mudam com océu, como sol Os aromas da tua pele, dos teus cabelos, do teu suor O brilho dos teus brincos, dos teus anéis, do teu colar Tuas pérolas, tuas pratas, teus tons de dourado Tuas roupas, teus sapatos, tuas coisas Quero aproximar-me de tudo que é teu, que foi teu Que vem de ti e que caminha para ti Nao quero perder de vista um sé minuto De tua aparéncia, da tua respiracado, do teu sono, do teu banho Quero dividir contigo a minha cama, os meus bens O meu cachorro, o meu corac&o, o meu ar Aminha casa, a minha familia Teu jeito de dancar, de comer, de olhar desconfiada Quando minhas maos se enfiam debaixo das cobertas Tua voz, teus ombros, tua cor Tao maravilhosamente palida e admiravel Teu andar, teu jeito de correr, teu ritmo de me amar Teu jeito soturno quando se despede Teu jeito moleca quando quer me conven- cer Ah, mulher! Teu jeito matreiro, teu jeito materno Tuas palavras doces, tuas palavras duras Teus caprichos, tuas ilusGes, teus sonhos e devaneios Tuas cicatrizes, as histérias a que sobre veu Os amores que passou a limpo Os tombos dos quais se levantou, as lutas que sozinha travou Aqueles a quem sustentou com tua forca, com teu amor Aqueles que em teus bracos frageis carregou Mostrando sua forca que de muitos esconde Aqueles a quem mostrou sua rigidez Aqueles a quem trouxe com seus encanto. Teus seios, teus labios, tua lingua que sempre tem Apalavra certa de amor, de admira- ao, de bravura Tuas idas, tuas vindas, tuas saias, teus vestidos, as calcas que vestes Tua roupa intima colorida, preta, branca ou vermelha Ah, mulher! Es muito mais do que qualquer pala- vra, frase, verso, obra Es encantamento, fascinio, deleite Es preciosidade, raridade, coisa linda de se ver, de se ter, de se amar Formada em Letras pela Universidade Fe- deral de Juiz de Fora, geminiana, romanti- ca incuravel e literata de meia tigela. Es- creve apaixonadamente a sombra de seus escritores favoritos acreditando que “quem escreve cria um castelo, quem lé mora nele”, conforme nos disse Monteiro Lobato. Curiosa desde que nasceu, ser completamente mutavel, mas nao voluvel. Observadora dos relacionamentos alheios que, das teorias que encontrou sobre o amor, nada consegue aplicar a si mesma. 7 REVISTA VIRTUAL ARTE NO LIMITE HUMANO. PMO U ECO Beast BE tC Bae «Arte noJimite humano» Reflexdo aproximando Proferida no alcance Que n§o foi de relance Antes pelo limite Do importante sabido Que ja era sentido «No prévio que fite» Ao ter sido respondido Como olhar desconhecido: Foi dito que arte «Socorre humano ser Libertando sua parte» Para nivel acontecer De'patamar acrescentado Como subindo escadaria De vida que existiria Para dar;cumprimentado Lugar de prazeroso Num saber orgulhoso A mais pela cultura De arte sempre advinda «Que sera por finda Nunca de tempo ainda Quando se diga a altura Como unica eficaz cura Para mal qualquer Que em vida houver» Luis Amorim escreve poesia (con- tos poéticos, narrativas poéticas e cang6es) e prosas (contos e micro- -contos) desde 2005, tendo ja es- crito centenas de historias. 9 REVISTA VIRTUAL | CONHECIMENTO. Surge no alvorecer dos primeiros dias. De forma tao imperceptivel. Na juventude, na maturidade, na velhice« * Ja nao é mais sutil,.mas sempre necessa- * i | “rig. * Nunca termina. * N@o se,conclui. S6 se considera! * Utiliza-se e nado se acaba. « * Quanto mais‘se usa, mais se adquire! Ao contrario da fome e da sede. Nunca se sacia! * Com ele se viaja o mundo inteiro. * * Sem que precise pegara estrada. * * O que seria da humanidade.sem ti. . * Certamente a caverna seria ainda a we : morada! a? * O medo de tudo persistiria. Es tuo grande instrumento da liberdade! aie Gilberto de Sousa Moyra, Licenciado * em Historia (UEMA). Bacharel e Licen- ciado em Geografia (UFMA). Professor * liberta as pessoas da ignorancia, por _isso optou por essa profissdo. * * -., x* - 11 REVISTA VIRTUAL JORNAL DAS OITO. PRUNING Marcos Sant T-con Terrorismo ataca no mundo. Ainda ha fome! E sede se torna voraz. Assassinatos no submundo. Ebola, cancer, antraz! Mais trafico de drogas, E um aborto acaba mal. Prostituicgao as altas horas, Ainfancia mais imoral. indio queimado vivo! Dentncia sem condenacao. Sequestrado ainda cativo, Assalto: todo mundo no chao! AIDS, gonorreia, No pais do carnaval. Professores tem cefaleia. Surgem contas no paraiso fiscal. Rede publica em greve e plano de sade ja nao serve. Adulto ainda nao |é, nem escreve. Aposentado pede esmola: qualquer i coisa serve! : Assistente Social, pés-graduado i em Satide e Qualidade de Vida no Trabalho, membro da Academia Creche desmorona. Tiros no meio do i Valadarense de Letras. dia. Termina o Jornal das Oito com cenas de morte na rodovia. : E eu, diante da TV, apenas dormia... : 13. REVISTA VIRTUAL HORIZONTE. ZL A , . Ce MEU ated Bee OLE ea %— %@e fe, Hn Poeta e autor do Livro Compendif, - - ; de Coisas Guardadas. Wilson de Carvalho Costa Como gosto dessa maneira de amar, meu amor, De chegar mais cedo, antes Para admirar a beleza espalhada dos teus cabelos, Beber desse desejo que jamais passa, da 4gua fresca do teu regaco, Excitar ainda mais essa expectativa, para saber os limites de nds, A de preparar o amor como um presente que nos damos Atroca desta certeza de que tanto gostamos de sentir, Fui em tua janela, para respirar maresia... Cheiros dos sonhos do mar em meus olhos de esperanca O coragao ao limite da boca pronto a viver o dia, As surpresas de sempre de fazer amor . Como se tudo fosse de novo a primeira vez Aprendi a voar para descobrir novos horizontes, Quero que seja tu a segurar agora a minha mao, Todas as vidas passadas num atimo. Todas as conformidades que temos implicitas num toque Assim deixe-me um tempo com a cabeca em teu ombro, Desta colina vejo o mar, o azul inteiro, os olhos furtivos do crepusculo acenando *, A auséncia do sol descrita no universo das maos, Sabe ser sem limites, o céu, a um amor se muros e sem barreiras... Divago sobre o tempo e as suposigées da sorte no contexto do dia, Ao amor me cabe a sorte, o milagre é aquilo que nao é natural Mas eu estava aqui, enquanto a esperava abertos a cada pagina marcados mapas, Hoje velejaremos de novo, ainda que se ponha o sol, O oceano e suas imensas lonjuras nao foi empecilho a nos, ¢ Recolherei assim todas as garrafas de naufrago, todas as conchas que continham o teu nome, Os poemas nas ilhas distantes, as praias de areias brilhantes, tudo alinhado nas sincronicidades da vida, Alguém dizia que a sorte vem no sopro da vida, sei que foram ventos mais fortes, Estranhas maliciam da vida, segredos formulados a quem desejava desvenda-los Na palma da minha mao sempre teve a primeira letra do teu nome gravado, O mais foram seguido sinais, todos percebidos, traduzidos do idioma de quem sabe ler nas sensibilidades do amor 15 REVISTA VIRTUAL oct sabe que voc# est flando com um geek Conversa 2222:22°- GEEK Nao hd nada melhor do que degustar de um auténtico vinho Malbec [Enquanto tira 0 iPhone do bolso] diz: “Deixe-me mostrar S0% Co tapas meu iPad portatil” Conversa... NERD ““““""""" Existem 10 tipos de pessoas ‘no mundo: aqueias que entendem binério ‘© a5 que nfo entendem © pop-up dizia que era necessério ter um Windows 95 ‘ou uma verso mais atual. Entdo, instalel o LINUX m ESTATISTICAS Ev adoraria mudar 0 mundo, ‘mas ele ainda no me deu © cédigo Fonte preferem © termo GEEK no lugar de NERD rt eee | et en 41% das pessoas se sentem confortdvels ‘80 Serem chamadas de geek, apenas 24% se sentem confortévels a0 serem 16 LITERALMENTE INTRIGANTE chamadas de nerd. —__ a TIPOS DE TROLLS E COMO DERROTA-LOS. Em meio a toda uma campanha sobve vespeito as mulheres de uma maneira geral, fiquei pensando no que trazer para os leitoves e decidi abordar um tema que nunca, repito, Na, nunca aqui em Sal- f vador ser discutido, n@o com esse olhar. Decidir trazer uma espécie de manual para garota Geek ou pelo menos um pedacinho dele. ee ON Oa eee SEB C7 EN ieee Campos. Trolls sao terriveis, nao importa onde estejam. Os do Tolkien eram superfortes e, ainda sim, muito en- tupidos. Os Trolls do Discworld eram rochas gigantes que gru- nhiam. E, de acordo com as regras do D&D, Trolls continuam ressusci- tando se vocé nao detona-os com fogo ou acido. Mas ha todo um subconjunto de Trolls que, infelizmente, nao sao ficcionais: as pessoas que existem apenas para espalhar odio, tristeza e melancolia por todo o universo on-line. Os Trolls da internet vam implacavelmente atras das garotas Geek, sabendo que nunca podere- mos encontrar os alter egos deles em busca de vinganga. Os ataques vao de xingamentos superficiais a uma variedade de discursos de ddio a respeito de género e sexuali- dade. Assim como seus similares em videogames, filmes e livros, os Trolls da internet nao sao homogé- neos. Eles est&o até mesmo no zap (ja fui uma vitima disso). Cada es- pécie tem uma caracteristica horro- rosa, e contra-ataque. Felizmente, vocé tem o grimdrio magico bem as suas m@os. Colocarei alguns tipi- cos exemplos aqui. Eis ao que deve ficar atenta. Troll do Cavalo de Batalha Esta digitando no celular? Com uma sé mao? Na correria? Esses Trolls nao ligam. Eles estao com vergonha alheia, mortificados porque vocé se atreveu a escrever “comcerteza” quando deveria es- crever com “certeza “; porque vocé esqueceu uma virgula; porque vocé errou o uso do porqué e por ai vai. Trololé Tipico “Como se eu pudesse levar qual- quer coisa do que vocé diz a sério depois de vocé colocar dois espa- cos apds o ponto final, sua analfa- beta.” Os famosos do Zap: Troll do Rio Este tira o contexto da sua fala, distorcendo a mensagem original, e responde com o fervor de um tipico debate politico. 19 REVISTA VIRTUAL Trololé Tipico “Naquele tuite que vocé disse pre- ferir gatos e cachorros parece que na verdade vocé quer assassinar todos os gatos da face da terra, e eu vou dizer para todo mundo que vocé é um terrivel assassina de gatos.” Troll do Cavalo Branco Embora vocé nao precise ou queira ajuda de um Troll no cavalo branco, ele vai cavalgar em seu corcel branco para defende-la dos outros Trolls (ja viu um Troll em um cavalo branco? Estranho.) Eles podem virar Trolls bonzinhos que acreditam que mu- lheres sio como maquinas de refri- gerante, é sd depositar educacao, que o sexo cai. Calma ai. Trololé Tipico “Caras deixem a menina em paz! Argh sinto muito. Entao, vocé gosta- ria de sair mais tarde, ou...? ...Nao? Mais eu fui tao legal! Vocé me deve um encontro. Se nao sair comigo, vocé é uma vaca e eu te odeio.” 20 LITERALMENTE INTRIGANTE TorGall, o Chefao dos Trolls Enquanto os outros Trolls so bem inofensivos, NVR, Tor Gal — o lider de todos os Trolls — podem causar sérios problemas no mundo real. Nao vacile: contate as autoridades e avise-os sobre o que esta acontecen- do. Colete o maximo possivel de in- formacao do agressor (o que pode ser bem dificil online, eu sei) e se certifique de catalogar, datar e cap- turar uma imagem de cada um dos ataques, especialmente ameacas fi- sicas. Vocé pode fazer uma denuncia pelo site, ou procurar uma delegacia especializada em crimes virtuais, com ou sem 0 aconselhamento de um advogado. No site safernet.or- g.br, vocé pode conferir dicas de prevencdo e dentncias contra crimes de internet. Trololé Tipico “N&o acredito que uma garota teve a audacia de tentar jogar ou com- prar um jogo online. Aqui esté o nome do telefone e os enderecos dela para vocés falarem na cara dela 0 quanto a odeiam”. Infelizmente Trolls como esses, dentre tantos outros nao citados aqui, sio mais comuns do que se imagina. O importante é nao alimen- té-los, tomar as medidas cabiveis caso precisar (defenda-se!) eo nunca, nunca mesmo deixar de ser vocé. Aprenda a se defender Ja ouviu o classico “ndo alimente os Trolls?” Se existe a tanto tempo, é verdadeiro. Todo tipo de Troll tem algo em comum: sua sede é real. Trolls precisam de um fluxo constan- te de respostas para as postagens in- tencionalmente rudes ou provocado- ras; sendo, seus pontos de vida se drenam lentamente, aqui vdo alguns métodos faceis para permitir que sua voz seja ouvida pelos reinos. Contra-ataque 1: Lois Lane, Reporter Quase todas as redes sociais tem um sistema para reportar e bloquear usuarios que espalham discursos de Odio, incomodam os outros ou posam violento ou ameacador. Até mesmo painéis velhos de mensa- gens possuem essa opcao, os de féruns por exemplo possuem mode- radores que comandam o Martelo de Batalha Incrustado de Diamantes An- ti-Troll de Banimento Permanente. Se estiver sendo trolada, reporte o Troll nos meios apropriados e blo- queio. Se tiver amigos na internet (e vocé é um nerd, entao deve ter um monte), faga com que reportem e bloqueiem seu trollnimigo também. Contra-ataque 2: Mia Fey, Advogada de primeira Se estiver sendo trolada por algo em que vocé acredita, pode tornar esse Troll em um grande agente do bem. Em vez de responder diretamente ou em modo privado ao seu Troll, acres- cente um ponto final antes da men- sagem em @ no TWitter ou poste sua resposta publicamente no Tumbrl. Agora, quando vocé despeja conhecimento na sua resposta, isso no se vira para o beneficio do Troll; mas fac¢a isso sabendo que pode ter influenciado pelo menos um voyeur do seu feed de noticias. Vocé pegou 0 distorcido fluxo de critica e o trans- formou em um arco-iris de unicér- nios. 21 REVISTA VIRTUAL Contra-ataque 3: Jade, Fotografa proficiente Logo que as coisas ficarem feias, faca como a protagonista durona do videogame Beyond Good and Evil e come a tirar fotos. Esse a fun¢ao printscreen do seu computador para compilar o maximo possivel de ima- gens de xingamentos, discursos de ddio ou qualquer tipo de ofensa. Se possivel, pegue o nome de usuario do Troll e uma imagem de perfil. Se as coisas se intensificarem até que vocé nao se sinta mais segura (e queira recorrer as autoridades), vai ser bom ter um registro do que foi dito e quando. Contra-ataque 4: Saffron, Devedora de homens de segunda mao Se os Trolls xingarem vocé de coisas horriveis, usarem linguagem baixa ou argumentos ridiculos, primeiro: ria. Trolls ndo suportam reacgdes po- sitivas e se apequenam ante o som de uma risada feminina, recuando lentamente para escuridao de suas cavernas. Agora, em vez de enfrentar o Troll diretamente, apenas faca com que seu comentario original fique publi- co: 22 LITERALMENTE INTRIGANTE retuite, reblog, poste no seu feed com todas as informacgées das redes sociais do Troll. Nao sé seus seguido- res vao atrds do Troll coma raiva de mil ninjas raivosos (ou piratas, relaxe) como também estara expon- do 0 ddio do Troll para o mundo. Expor o discurso do Troll para 0 mundo lembra que essas coisas estdo acontecendo. Agora que vocé ja sabe ja sabe como identificar, lidar e até atacar a miriade de Trolls a que sera exposta, siga em frente e post sem medo. Escritora, produtora, editora, enfim sonhadora. Dona do blog Vocé nao pode deixar de ler, onde administra um projeto para pes- soas carentes além de postar varios conteudos Geek. Quer con- ferir? Basta acessar: www.vocenaopo- dedeixardeler.blogspot.com Nao esquece de seguir! NAS TERRAS DE QUEM TEM HISTORIA. 23 REVISTA VIRTUAL Guilherme F Para quem gosta de historia, em es- pecial de espacos antigos, o Rio Grande do Sul é um tesouro unico. 0 municipio de Pelotas, sem duvida, é uma reliquia. Conheci a cidade no verao de 2015, por ocasido de um feriadao. Foi uma das melhores via- gens que fiz no RS. O clima Umido, 0 céu cinzento, sombrio, eo estilo neoclassico das construgdes sobrevi- vendo a forc¢a imparcial do tempo. As igrejas elegantes e as pragas ca- prichadas. Monumentos antigos, hoje tombados como patriménios histéricos. Pelotas, atrevo-me a dizer, tem ares europeus. Uma baita fonte de inspiracéo para quem es- creve e para quem esta entorpecido de paixdo ou mistério. Fiquei hospedado na Praia do La- ranjal por trés dias. Como havia dito, o céu permaneceu nublado, apesar de que era possivel sentir 0 calor do mormaco do sol. Foram trés dias perfeitos. No primeiro, visitei o Centro Histérico. Lembro-me da se- quéncia: o mercado publico, a Facul- dade de Agronomia Eliseu Maciel, a prefeitura ao lado. Na esquina Oposta ao mercado, uma das mais belas construcdes daquela cidade histérica: a antiga sede do Banco do Brasil. O prédio deve ter quase um século. 24 LITERALMENTE INTRIGANTE Havia pombos sobrevoando a cupula. Parei uns instantes para ob- serva-la, tirei fotos, e algumas das aves sumiam nas frestas das janelas com vidros quebrados, Em seguida, surgiam misteriosas, como se sou- bessem de algum segredo que nin- guém mais sabia. A biblioteca publica ¢ espetacular. Um lugar ideal para sentar e ler Erico Verissimo ou Jodo Simdes Lopes. Neto - ja que essa é a terra natal do escritor — ou ainda levar seu note- book e permitir que o lugar te inspi- re. Passei por casardes nobres de estilo colonial, vislumbrei o Grande Hotel de quatro andares e o famoso Theatro Guarany, que, infelizmente, na oportunidade estava fechado. Na fronte do edificio, a inscrigao dizia: 1920. Sorri. Contemplei, também, outro teatro: o Sete de Setembro, cuja fachada anunciava-se “em refor- mas”. No dia seguinte, visitei o museu da Baronesa, um solar construido em 1863, na época em que Pelotas viveu 0 apogeu das charqueadas, Foi uma das melhores partes de todo o pas- seio — e Ndo posso dizer que a Unica. Uma verdadeira aula de historia. En- quanto caminhava por aqueles cor- redores compridos e revestidos por um azulejo verde-escuro (que devia estar ali antes dos meus tataravés nascerem, quando os pais deles ainda eram jovens) me senti, por alguns momentos, inserido naquela €poca. Os objetos, mdveis e louga- ria, verdadeiras reliquias e preciosi- dades, que 0 tempo insiste em manter, eram fascinantes. Na manha do ultimo dia (aquele que deve ser o mais emocionante), re- tornei ao Centro Histdrico para co- nhecer a famosa Catedral Sao Fran- cisco de Paula, na Praga José Bonifa- cio. Havia me informado de que sua pintura foi obra de Aldo Locatelli, o mesmo grande artista da Catedral Metropolitana de Porto Alegre. Porém, para minha surpresa, a igreja estava fechada para visitas. Alguns moradores de Pelotas costumavam acordar cedo para passear pela praca, alimentar os pombos ou sentir a brisa na sombra que o espaco proporciona. Uma senhora que estava levando seu cachorro para uma caminhada matinal contou que a catedral tem um dos mais im- pressionantes afrescos de um templo catdlico do Rio Grande do Sul. Olhei para as cipulas do templo, um pouco desapontado. Dizem que a pintura foi revestida com tracos de ouro, 0 que poderia explicar a presenca de guardas na entrada. Hoje sinto muita saudade das impres- s6es que vivi em Pelotas. Pretendo re- tornar muito em breve. Ha tantos lu- gares para explorar, a comecar pela igreja Sdo Francisco de Paula. De qual- quer modo, afirmo que nao voltei de la a mesma pessoa. Obviamente que nao. Meu olhar sobre a historia enri- queceu, meu conhecimento sobre estas terras — a antiga Provincia de So Pedro — se expandiu, e a inspira- ¢ao aumentou. Devo considerar que qualquer viagem, seja por qual proposito for, te modifi- ca intimamente. E como um bate-pa- po com a liberdade. Vocé nao precisa articular, basta ser vocé mesmo e manter um bom didlogo. O unico pro- blema é sempre a hora de voltar. Guilherme Pech Vargas reside em Esteio, Rio Grande do Sul. E acadé- mico de Jornalismo e pesquisador na iniciagao cientifica na Universi- dade do Vale do Rio do Sinos (Uni- sinos). Amante de contos de sus- pense e terror desde pequeno, co- mecou a escrever a partir dos 16 anos. Em 2015, um de seus contos foi selecionado para a antologia Assombros Juvenis V. 26 LITERALMENTE INTRIGANTE O jogo 1984 foi inspirado pelo Guia Mochileiro das Galaxias. Existem séries e filmes também inspirados no mesmo. Seus livros langados desde possuem cerca de 30 anos. O Livro — Salm@o da Duvida (Eoim Cofer), foi considerado pela familia de Douglas Adans como parte oficial da colecao. O livro é inglés e surgiu de um canal de radio na Inglaterra pouco conhecido. E la vem mais curiosidades: “N&o entre em panico, sé toalha” (mantenha a calma e continue) — Keep calm and carry on — Essa ex- pressdo foi criada inspirado também no livro, foi através dela também que surgiu o Dia da Toalha. Existe um asteroide chamado Arthur- dent, o mesmo fora descoberto em 1860 e tem esse nome em homena- gem a um personagem. Lembra dos Caca-Fantasmas? Foi criado antes em 1980 impedindo que © Guia do Mochileiro fosse lancado, além do fato de que Douglas tinha o habito de postergar o maximo que podia seus prazos e entregas. Babelfish (tradutor de Internet) — Esse nome foi dado em homenagem ao guia do mochileiro das galaxias. O Dia da Toalha x O dia do Orgulho Nerd (Qual a diferenga?) — Os fas de Star Wars alegam que o dia 25/05 éo Dia do Orgulho Nerd por causa do langamento do 12 Filme nos EUA. Porém foram os fas de Douglas Adams que criou esse dia a fim de homenagear o Guia do Mochileiro. Fas do mundo inteiro participam, nos EUA por exemplo saem nas ruas com a toalha no pescocgo como que para levar a palavra, para simbolizar O que gostava no Guia. O irénico disso tudo é que o Douglas era ateu e odiava termos, religiosos como “levar a palavra”, como se fosse um simbolo de evangelizacao. Vocé que nunca ouviu falar dessa trilogia, ou até ja ouviu porém nunca leu, ou até leu mais ndo pegou muito o espirito da coisa, deve estar se perguntando 0 porqué de tanta repercussdo em trono desses livros, tantas homenagens, tantas curiosidades. Vamos cami- nhar um pouco por essa trajetoria. Esta série de ficgdo-cientifica-space- -opera-cémica foi concebida em 1978 por Douglas Adams, como uma radio —novela, depois compila- da em livros a partir de 1979. A série foi exibida em live action em 1981, e em 2005 ganhou um filme. Vocé acorda em uma bela manha, senta-se para tomar o café e perce- be um alvoroco no seu quintal. Eis 27 REVISTA VIRTUAL entao, que vocé percebe que esta prestes a ter a sua casa demolida por empreiteiros para construgdo de uma via expressa. Do nada, um velho amigo aparece dizendo que vocés precisam dar no pé o mais rapido possivel e que ele néo tem como te explicar agora, mas pede para que vocé confie nele. Maneiro, nao? E assim que comega, uma das mais incriveis jornadas pelo espaco-tem- po-nonsense e nao estamos falando de Doctor Who. Sim! E ele! Nada mais, nada menos que as aventuras de Arthur Dent e Ford Prefect ou como é mais conhecido: O Guia do Mochileiro das Galaxias. Acredite: vocé nao vai querer sair de carona pelo espaco sem ele. Seu companheiro na verdade é um alienigena, colaborador e escritor para uma das maiores revistas espa- ciais do universo voltada para caro- neiros interespaciais, “O Guia dos Mochileiros das Galaxias”. A revista tem bilhdes de tiragens, e 6 uma tela com milhdes de dicas e verbe- tes, com uma frase escrita em letras garrafais em cores berrantes DON’T PANIC (Nao entre em Panico) — que serve de conselho para todas as si- tuacgSes que o mochileiro pode vir a passar. ‘Com poucos segundos para saber 0 que estd acontecendo, Arthur parte para uma grande aventura a bordo 28 LITERALMENTE INTRIGANTE do Coracdo de Ouro pilotada por Zaphod Beeblebrox e Trillian — uma garota que é uma antiga paixdo de Dent. Como nao estavam fazendo nada de interessante até o momen- to, eles partem em busca da pergun- ta para a “Questao da Vida, o Uni- verso e Tudo mais”, cuja a resposta todos jé sabem. Adams que morreu em maio de 2001, aos 49 anos, vitima de um ataque cardiaco fulminante = regis- trou as muitas serventias que uma toalha pode ter para o viajante in- tergaldctico. Veja: “A toalha é um dos objetos mais uteis para um mochileiro intereste- lar. Em parte devido a seu valor pra- tico: vocé pode usar a toalha como agasalho quando atravessar as frias lua de Beta de Jagla; pode deitar-se sobre ela nas reluzentes praias de areia marmorea de Santragino V, respirando os inebriantes vapores maritimos; vocé pode dormir debai- xo dela sob as estrelas que brilham avermelhadas no mundo minijanga- da as aguas lentas e pesadas do rio Moth; pode umedecé-la e utilizd-la para lutar em um combate corpo a corpo (...) Porém o mais importante é 0 imenso valor psicolégico da toalha. Por algum motivo, quando um estrito (isto é, um néo-mochilei- ro) descobre que um mochileiro tem uma toalha, ele automaticamente conclui que ele também tem escovas de dentes, esponja, sabonete, lata de biscoitos, garrafinha de aguardente, bussola, mapa, barbante, repelente, capa de chuva, traje espacial, etc, etc. Além disso, o estrito terd prazer em emprestar ao mochileiro qual- quer um desses objetos, ou muitos outros, que o mochileiro por acaso tenha “acidentalmente perdido”. O que @ estrito vai pensar é que se um sujeito é capaz de rodar por toda a Galdxia, acampar, pedir carona, lutar contra terriveis obstdculos, dar a volta por cima e ainda assim saber onde est sua toalha, esse sujeito claramente merece respeito”. Filos6fico N&o se enganem, O Guia do Mochi- leiro da Galaxias é um livro altamen- te filosdfico cheio de insights e ques- tes sobre a vida e a existéncia em suas varias camadas. Além de contar com o robé depressivo mais querido do mundo: o Marvin! Ele também tem Otimas piadas, diga-se de passa- gem. Tudo isso sem perder a toalha. Toalha? Sim um dos objetos mais versateis de toda a galaxia. Se vocé consegue cruzar oO universo sabendo onde a sua toalha esta, vocé € 0 cara. Escritora, produtora, editora, enfim sonhadora. Dona do blog Vocé nao pode deixar : de ler, onde administra um projeto para pessoas caren- tes além de postar varios conteudos Geek. Quer con- i ferir? : Basta acessar: www.voce- : naopodedeixardeler.blogs- pot.com Nao esquece de seguir! 29 REVISTA VIRTUAL INFINITO E ALEM. Minha vida mudou muito de repente. Eu ja sabia que as coisas andavam mal. Papai e mamée brigando, depois ela chorando baixinho, escondida no quarto. Mesmo assim, foi tudo muito de repente. Mudei de bairro e de escola. Meu pai vinha me visitar toda semana, mas eu sentia falta dele. Das nossas brincadeiras. Mais do que tudo, das histérias que ele me contava, de noite, eu ja na cama, pronto para dormir. Pedia para ir até a sua nova casa. — Outro dia—- era a resposta. E sempre adiava. Quem me convidava para ir a sua casa era o Tiago, meu melhor amigo, no antigo colégio. Ele morava em frente ao mar. Eu adorava passar o fim de semana la. Tinha uma varanda grande de onde dava para ver aquele montaéo de dgua. Também, nés dois nos divertiamos muito. Eramos brinquedos que ganhavam vida, viviamos grandes aventuras, viajavamos “Ao infinito e alé A tarde, iamos a praia. Mas de repente, tudo mudou de novo. Papai deixou de vir toda semana. Nao entendi por qué. Mamie explicou que eu tinha um novo irmaozinho, e meu pai andava muito ocupado. Afinal, bebé da um trabalho danado. Veio o medo de que ele se esquecesse de mim. Perdi a vontade de sair, de brincar, de jogar. Nao tinha ainda amigos na nova escola e nem me animava ir a casa do Tiago. Era tudo muito sem graca. Até meu amigo parecia diferente. No fim de semana passado, minha me insistiu tanto, que aceitei o convite do Tiago. A tarde, como sempre, fomos a praia. O mar estava calmo. O sol deixava brilhos nas ondas e nds dois nos senta- mos na beira da agua. Eu olhava para aquele montdo de oceano, as vezes prateado, as vezes azul ou verde. Espumas iam e vinham, molhavam os nossos pés. O Tiago catava tatuis e os colocava num copinho de plastico. Fiquei com pena dos bichinhos presos, mas sabia que nao adiantaria falar nada com meu amigo. Eu estava ali, mas tinha vontade de fugir, sei la para onde, desaparecer, me enfiar na areia como os tatuis. Ou nadar para bem longe. Olhei para onde o céu se encontra com o mar e perguntei: —O que tem além do infinito? — Estrelas — respondeu Tiago, catando tatuis. —E além das estrelas? — Mais infinito. —E depois? 31 REVISTA VIRTUAL Andreia Fernandes — Sei la! — Tiago nao estava afim de conversar sobre infinito. Mas respon- deu: — a gente pensa que o mundo termina ali, no azul do céu. Mas nao termina. Depois vem as estrelas. — Olhou para o horizonte e apontou: — La éa Africa. E além, a Europa. Depois a China. Vocé nao sabia? —e voltou a catar tatuis. - Ah! — eu disse, com o coragao apertado. Eu sabia que o mundo no terminava no azul do céu. Também sabia da Africa, da Europa, da China e tudo mais. Mas eu queria saber do infinito, bem mais distante. Fora do alcance de navios, de barcos e até mesmo de avides. Era coisa para naves espaciais poderosas. E astronautas corajosos. — Quando eu crescer, vou ser astronauta — falou Tiago, adivinhando meus pensamentos. — Eu teria medo — confessei. -De qué? - De me perder no infinito. = Pode ser. Mas as naves de hoje, séo muito seguras. Eu quero ver o infi- nito de perto. N&o conseguia imaginar meu amigo navegando entre estrelas, talvez de- fendendo a Terra de inimigos terriveis. Ele so olhava para o chao, atras dos bichinhos que tentavam escapar se afundando na areia. Uma brisa mais forte soprou e agitou mais o mar. Diminuiu o calor do dia e trouxe a noite. -Mesmo assim, eu tenho medo- insisti. — E muito grande, 0 infinito... muito longe... Deve ser muito perigoso -E. O infinito é cheio de perigos. Tiago voltou aos tatuis. As ondas, agora, estavam um pouco maiores. Elas tinham alguma coisa de assustador e alguma coisa de brincadeira. Era como se crescessem feito os monstros, para depois se desmancharem em espumas, rindo do nosso susto. -Também tenho medo do mar — disse, sem tirar os olhos das ondas. = Quando eu aprender mesmo a nadar, eu vou até aquela ilha — disse Tiago, se referindo as Cagarras. — Uma vez eu vi um homem se afogar-— continuei, ainda de olho no oceano. — Ele sabia nadar, mas as ondas, enormes, pareciam engolir 32 LITERALMENTE INTRIGANTE © coitado. Depois, outros homens chegaram e ele foi carregado para a areia. Ja estava meio roxo. Foi embora de ambulancia. Acho que morreu. Meu amigo nao deu a minima. O copinho de plastico ja estava repleto de tatuis. Os bichinhos, desesperados. —O que vocé vai fazer com eles? — perguntei. — Néo sei. — Entao, solta os tatuis. — Por qué? — Porque eles vao morrer. —Eo que é que tem? —N&o gosto de ver nada morrendo, — Vocé nao mata mosquit Calei a boca. Claro que eu Matava Mmosquit tatui. Ou nado? — Vocé esta fican — Assim, a gente n a Africa, ver o dese! Ele tinha razdo. Estava encontrasse umiledo cara a cara para a Africa, om 6 pi — Melhor a gente so ver o de: — Por qué? 2 — Se aparecer ndi — Agente mata. mosquito é diferente de Ti irar para mim. Onosso plano de ir para io que eu faria se jio de pa e féssemas le s atacar, como vamos fazer? —Acho que ninguém conse; jatar 10 tao forte. $6 com uma arma, mas crianga nado pode revolver. — Os gladiadores matavam. 4 —Os ledes comiam muitos gladiadores. Acconversa parou por ai. Meu amigo ainda achava que um garoto como nos dava conta de um ledo. Na verdade, o certo era nem ledo matar gente, nem gente matar ledo. Talvez por isso, Deus fez os ledes bem longe dos homens. Assim, ninguém matava ninguém. — Sera que Deus existe? — perguntei de supetao. — Nao sei — respondeu Tiago. -Eo infinito? — Isso todo mundo sabe que existe. —Eodiabo? & REVISTA VIRTUAL —O diabo nao existe — disse ele, ja irritado com tantas perguntas. — Embai- xo da Terra, s6 tem metré e esgoto. —Acho que ele mora um pouco mais para baixo — falei. Accoisa saiu sem querer, mas 0 Tiago jogou o copo de plastico para longe, com raiva. Os bichos sairam todos feito doidos, se enfiaram na areia mo- Ihada. Mas a maioria ja estava morta e uma onda os levou embora. Na verdade, nunca tinha pensado direito sobre essa historia de Deus e de diabo. Deus era um velho meio chato e o diabo... Bem, o diabo aparecia de muitas formas: zumbis, vampiros e aquelas pessoas revirando a cabeca. Encarei o mar mais uma vez e uma ideia me ocorreu. Tanta agua precisava de um buraco bem maior do que o do metré e do esgoto. Era possivel ter outro infinito debaixo da Terra. Fiquei pensando se os tatuis mortos iam para 0 infinito de cima ou para o de baixo. Eu quis perguntar ao Tiago o que ele achava, mas nao disse nada. O sol escorregava para tras do hori- zonte. la para Africa e além, a Europa. Um dia eu iria para Europa. Levaria minha mae, meu pai, a nova mulher dele e meu irmaozinho. Todos juntos na Europa. La nao tem ledes. Fomos embora da praia. Na casa do Tiago, eu fui até a varanda. Nao dava mais para ver onde terminava o mar e onde comecava o céu. Estava tudo preto. Nesse momento, tive uma certeza: existem dois infinitos. Um em- baixo e outro em cima. Todos dois muito grandes e escuros. Mas com uma lua linda para iluminar. Formada em Fisica pela PUC - RJ, dedicou-se também as Artes Cénicas. Tornou-se atriz, pro- . fessora de teatro, dramaturga. Dé aulas no Teatro Tablado e algumas de suas pegas j4 foram encenadas no Rio e em Sao Paulo. Recentemen- te, decidiu aventurar-se em outros géneros lite- rérios. “Olhos de cobra”, seu primeiro romance, anhou o primeiro lugar no Concurso Saraiva 100 nos, 2014. “A Borboleta Azul” ganhou o primei- ® rolugar no Concurso de Contos de Aracatuba, 2013 e “Lonjuras”, o segundo lugar no Concurso de Contos Machado de Assis - SESC DF/ 2013. A peca “Paz sem rosto” de sua autoria e direcdo, o prémio de melhor espetaculo do Festival “Kids on Stage” em Dresden, Alemanha, 2016. 34 LITERALMENTE INTRIGANTE PARA DESCONTRAIR 3 Se algo que o Tetris me ensinou sobre a vida é que os erros acumulam e os triunfos desaparecem. Duas impressoras conversando, quando uma delas vira para outra e fala: Essa folha é sua ou é anes minha? oq que 1e disseram pro Hidrogénio quando ele foi preso? Vocé tem direito a uma ligacado. O que ele respondeu? Mas eu nao tenho familia! Por ¢ queo ‘0 programador n nao morre afogado? Porque ele usa ponto flutuante! Quem mais sofre nesse calor sao usuarios de Mac. Eles nao podem abrir o Windows. Sabe qual a diferenca entre uma pessoa cansada e um ventila- | dor quebrado? 30! Porque o ventilador quebrado NO VENTA, ja que vocé esta cansado SE SENTA. oq que a mulher do Einstein ‘falou pra ele quando o viu pelado pela primeira vez? Nossa! Que fisico! O que é pior do que cair um raio no sua cabega? Cair um diametro. Oque6é Carbonos der mos dadas estado fazendo com 6 Hi génios na igreja? BENZENO! 35 REVISTA VIRTUAL No sei se sonho ou realidade, o fato é que um rosto de mulher se dese- nhou em algum lugar dentro de mim: leve, pequeno, gracioso. A sua beleza nao era estranha; era acima de tudo intrigante. Estava com um copo na mao, na altura do seu ventre. Cheio, transbordante de u lo que eu nao tinha a capacidade de identificar, ainda... Fiquei por al instantes tentando decifrar aquele momento. Um fraco raio de luz percorreu por in- teiro o seu rosto, pude enxergar seus olhos perdidos — rou de sede. Eo copo? Que desejo secreto esse copo trazia? E por um simples descuido ou caréncia, 0 que era que a la mulher possuia que me atraia? De repente vem uma voz, como qui lo de oceano imenso: - ae animal! Escuta o teu destino! — O que fazer? O destino er is 6 (se existe) que uma etapa, um caminho set gadas. Vivemo: busca de explicacgdes que satisfagam nossa razdo tao mediocre e insegura e quando menos espe- ramos surge uma estrada em nossa frente, como se levisse paraum lugar desconhecido, completamente diferente da nossa visdo sagrada das coisas. erguntamos para onde ela vai nos levar e ld estava eunovamente inda- ndo a minha falsa inteligéncia sobre a existéncia deste momento eo porqué deste acontecimento. Quanto te: mos em vas explica- des? Se simplesmente admirassemos as c« omo elas realmente sao, nao existiriam motivos para questionamentos, as diferencas desvanece- riam-se como a leve bruma da aurora de um novo dia, assim que os pri- meiros raios de sol tocam a selva perdida dos homens. Quanta metafora para algo tao simples! Sera que s6 entendemos as coisas dessa maneira? Infelizmente, até o momento, sim. . Durante todo este intervalo de delirios e divagagdes aquela mulher conti- nuava ali, me chamando com 0 olhar. Convidando para um gole. Eu nado queria aquele copo que estava junto dela, queria sim, o sabor dos seus labios para enfim saciar o meu desejo. O sil@ncio com a sua leveza, tomou ento todos os espacos dentro e fora, como se toda a natu reza nao existisse mais e somente restasse eu ali, parado, extasiado, perplexo diante do imponderavel. Nada que eu fizesse mudaria 0 comportamento daquele ser. Ela s6 queria que eu bebesse aquele liquido, uma exigéncia sem mando. Por qué? Talvez algum capricho de mulher indolente com os sentimentos alheios e frageis, dos homens sem lar. Apesar disso, demonstrava ternura, sutileza, cuidado, mas algo 36 LITERALMENTE INTRIGANTE fugia que eu nao conseguia tocar, os dedos ja nao tinham mais um fim, eram 0 inicio de algo que nao se sabia o qué. A sua presenca se dava sem a necessidade do outro existir e, impressionantemente, respirava, tinha vida. O ar estava suspenso, esticado numa linha pronta para romper! O que me restava era a angustia, a distancia entre o que um dia fui e me se- parei sem perceber, ficando a sensacdo permanente do reencontro impos- sivel. Era eu, ela e 0 copo. Nao sei por que motivo esse terceiro elemento come- cou a se tornar forte, suas bordas brilhavam como laminas, parecia vibrar com cada olhar que direcionava a ele, se aprumava no colo da mulher, como uma crianga procurando o alimento vital, o leite que nasce das pro- fundezas do amor. Penso que se 0 copo nao existisse ela também nao exis- ria, pelo menos para mim, ou indo um pouco mais fundo, eu mesmo nao istiria. Em qual magia esse copo estava envolvido que era capaz de me vocar e testar minha percep¢ao do dito real? E ela continuava ali, esta- » incélume, suplicando um gole. A sua inércia comegava a aquecer os entos ocultos de poder que existiam dentro de mim, escondidos, hi- bernando num inverno de tensas tempestades e tormentas, prontos para desafiarem o =o ea belezada primavera, onde as flores aparecem como que querendo lesafiar o'frio e 0 cinza dos dias, impondo a sua purezae energia bi provocahdo alta gaqueles que preferem se escon- derem nas cavernas da solidao. oma secura imensa tomou conta dos meus labios. Aquele copo ndo mais me desafiava comecei a vé-lo com o olhar distante de quem deseja ‘se apro) Igum vinculo de amizade, uma simples gota de confianga. Olhei para o: hos dela que co! tinuavam a perscrutar o oculto, como se eu nao estive ali, como se nada" the interessasse além de que eu saciasse minha sede naquele'copo, agora nao era mais um copo, era um poco onde eu estava na sua borda, olhando meu reflexo! Nao hesitei, desvencilhei-me do meu corpo e mer- gulhei com uma grande forca, empurrado pelas m@os do desejo. Assim que a minha lingua entrou em contato com aquele liquido, senti um gosto amargo, Salgado, destituido de qualquer tipo de docura. Olhei para cima e 14 estava ela! Seu olhar modificou-se; nado era mais um olhar de ternura, era agora um olhar de dor! Dos seus olhos vertiam lagrimas que caiam no poco; e cada vez mais, até o instante em que eu percebi a armadilha que o 37 REVISTA VIRTUAL destino havia me preparado, estava afogado, sem ar... Ja era tarde, via as luzes de um novo caminho, ficara tudo para a préxima vez. Que assim seja! Nascido em Rio Grande, Rio Grande do Sul, ho final dos anos 70. Morou e se formou em Engenharia de Computacao na sua cidade natal, indo morar no Rio de Janeiro no inicio dos anos 2000. No Rio de Janeiro fez mestra- do e doutorado em Computacao, se tornando professor universitario e nunca abandonando sua gratiddo e admiracao pela literatura, grande companheira das melhores e piores horas. Kurt Vonnegut, Gabriel Garcia Mar- quez e Caio Fernando Abreu foram e sao alguns dos bons companheiros dessa jornada. Pai do Pedro, casado com Fernanda e desco- brindo atualmente as riquezas da filosofia do Tao e do Advaita, assumindo menos culpas (passado), queixas (presente) e ansiedades (futuro): apreciando os novos caminhos dentro de simesmo. 38 LITERALMENTE INTRIGANTE QUAL E O SEU NOME? Conheci uma moca no G6nibus. Incomum e extremamente argumentadora. Puxou assunto comigo em um dia bonito que eu estava indo trabalhar. Da janela, via as cores do céu, o dia que nascia. Entao, ela sentou ao meu lado e como se percebesse que eu estava a contemplar a paisagem, perguntou quase afirmando: - Dia bonito, né Eu que estava distraido, viro rapidamente como se tivesse sido acordado de um sonho. E talvez eu esperasse uma dessas senhorinhas solitarias que querem conversar durante a viagem. Foi entao que me surpreendo ao ver aqueles olhos verdes reluzentes e jovens. Era um grande contraste com sua voz que ao primeiro som emitia um ar de sabedoria. Respondo no automatico: - E sim, um belo dia. Ela ja emenda: - E por que vocé nao esta la fora aproveitando o dia? Dou um riso de canto, olho paraa maleta no meu colo’e digo: - Preciso ir trabalhar. - Precisa? Entdo vocé nao quer? - Nao é bem assim, quer dizer, no s . trabalhar querendo ir? ladas. Talvez fo ~ Qual é ..? Elainterromp De alguma forma aquela rispido e irritado: ® - Ja disse. Eu preciso! E talvez & S os dias temos opcées, fica claro para mim que a sua foi tra- igo que nao quer para assim no aproveitar o dia que conside- as ndo saem da minha boca, os olhos dela nao tinham expresso, m da duvida. Ela queria realmente saber, sem tom de reprovacado pelo jeito nervoso que eu a estava respondendo. dra janela, procurando as palavras que me faltavam e finalmente respondo sem conviccdo e sem a palavras perdidas: - Eu nao sou. Solto? Vocé tem medo? -Medo? - E, de ser. Solto? Da minha boca sai um nao ainda que timido. No meu corac¢do um talvez, da minha cabeg¢a um grande sim. Trés respostas e um Unico som. Nao. Ficamos em siléncio depois disso. O que nao representava nem um pouco a paz. O caos estava instaurado dentro de mim, era uma guerra. Olhava a janela, o vidro que me separava do lado de fora. Eu estava preso, mas ja estava desde antes, bem além dessa fina camada. Eu era a jaula. Eu tinha medo e nao sabia bem de qué. Eu sentia culpa, eu era de fato culpa- do. Eu tinha algo que eu nao sabia bem dizer o nome e escolhia sem escolher. Falsas desculpas. Eu queria sair por ai, fotografar, desbravar a natureza, pintar com imagens o que meus olhos podiam ver. Queria sentir o cheiro, 40 LITERALMENTE INTRIGANTE definir o indefinivel. E por fim estava indo trabalhar de gravata e sapato. Sem camera e sem paixdo. Eu deixei meus sonhos. Alguém me disse que eu nao podia viver deles e eu n&o vivi. Eu tinha que fazer o que precisava fazer. Aquilo que era mais facil, que estava ao meu alcance. E eu tinha algo, eu sempre tive. Mas qual é 0 nome disso? Um mar de opg¢ées nao escolhidas. Eu nao podia escolher, sendo que eu podia sim. Todo esse tempo. A prisdo é minha culpa ou seria esse mar a verdadeira prisdo? Eu nao queria tal responsabilidade, eu aceitava o que eles escolhiam, assim eram eles os culpados por minha infelicidade. Mas eles nao deviam. Eu sei disso, eu consigo sentir que ndo deveriam. Mas qual é o nome disso, isso que eu sinto, que eu sei que posso sentir. E ela me acorda de novo, pela terceira vez naquela manha. Sinto sua mao tocar gentilmente meu braco e diz: - Eu quero descer agora. Até logo. Ela sorri e vai levantando sem pressa. Retribuo com um sorriso meio amarelado e meio atordoado. Eu nao sabia se queria que ela fosse agora, ndo sem antes limpar a bagun¢a que deixou. E antes dela seguir seu caminho, consigo dizer algo: - Espera! Vocé nem mesmo me falou como se chama. Uma pergunta sem perguntar, talvez assim ela respondesse algo que eu questionava. Dessa vez ela responde: - Liberdade. Depois de viver mudando de cidade, cansei e troquei de pais, até que troquei de novo, deixei empregos e amores, e percebi assim meu problema. Um viciado em despedida. E assim escrevi um livro, que em breve pretendo publicar. Por enquanto tenho um canal de poesia no youtube viciadoemdespedida. 41 REVISTA VIRTUAL N&o séi bem porque os professores pedem pra gente escrever uma redacdo sobré as férias. Nunca viajo, entao as férias sio sempre chatas. Ou eram atéSeu Almeida ganhar o Urso. Noésa rua nao é perto de nada e todo mundo se conhece. Isso é uma tre- nda porcaria quando a gente se mete em enrascada. Seu Almeida éo velhinho que mora na penultima casa da rua. Alguns anos atras, alguém entrou na casa dele e levou um bocado de coisas. Entao, o filho dele botou o Urso pra morar la, acho que pra cuidar do Seu Almeida. O problema era que o Urso parecia sempre faminto. O Urso ficava esprei- tando a gente do canto dele e sempre que um de nds chegava perto das grades quase virava picadinho. E acho que gostava de meninos gordinhos. Tiago sofria pra sair e voltar pra casa. Dessa me livrei, moro na segunda casa. Ele morava na ultima e tinha que desviar do Urso andando na rua. Uma vez ouvi meus pais conversando que o Urso era um pastor alemao danado de grande. De pastor, aquele bicho nao tinha nada, vai ver até que era do inferno. Fiquei me perguntando se existiam Ursos na Alemanha. Dona Samira, que morava antes do Seu Almeida, reclamava que 0 Urso latia demais. Ela era outra velhinha da rua, adorava flores e Roberto Carlos. Depois que o Urso chegou com latido fortao, o Roberto Carlos ficava abafa- do. Talvez o Urso nao fosse tao ruim assim. Nas férias, era pior. Jogando torneio de pelada na rua, a gente até tinha uma vara pra pegar a bola quando caia perto das grades. Rodrigo era o maior vacilao de todos, porque chutava forte e fazia a bola cair no terreno do Seu Almeida. Perdemos trés bolas nas ultimas férias. Do outro lado da nossa rua tinha uma casa vazia. Nessas férias, uma fami- lia mudou pra la. A gente ficou empolgado, pensando que o time ia com- pletar de vez, mas quebramos a cara. Quando 0 carro chegou, sairam duas meninas de dentro. Meninas sao como 0 Urso, estranhas, mandonas, baru- lhentas e famintas. O dia mais bacana dessas férias foi cheio de sol. A gente estava no meio de uma partida quando Cintia e Gabriela sairam de casa pela primeira vez. Todo mundo parou de jogar, coisa mais imbecil. Eram sé meninas! Ta, tudo bem que a Cintia tinha um cabelao bacana, e era mais velha, mas perder a bola foi sacanagem. Enquanto as duas irmas desfilavam, a bola rolou até a grade. Na mesma hora, o Urso saiu do buraco dele e deitou perto. 42 LITERALMENTE INTRIGANTE Olhei em volta e nao vi a nossa vara. Perguntei pro Lucas onde raios a vara se meteu. Rodrigo, com cara de pateta, falou que deu pra Gabriela, porque ela precisava pegar goiaba. Eu quase dei nele. Putz! Deu a vara da bola pra garota? E como que a gente ia pegar a bola agora? Tiago ficava me dizendo pra respirar fundo. Era outro que ia levar uns sopapos. Ja estava pronto quando vi a metida da garota indo até as grades. Foi um aué! Todo mundo gritando, correndo, o Urso se levantando, ia ter pedacinhos de Cintia pela rua toda. Pra piorar a porcaria, a menina esticou o braco. A doida queria passar a mao no Urso? la perder o braco, as pernas, ia virar suflé! Eu via sangue es- palhado por todos os lados, aquele cabelo lindo todo melecado de gosma cerebral s6 porque a menina cismou de ser menina, ou seja, idiotamente legal. Acho que nunca corri tanto na minha vida. Corri e consegui agarrar a garota pelos cabelos antes dela alcancar a boca escancarada do bicho. Caimos os dois no chao. Me ferrei bonito. Quando a gente conseguiu se levantar, ela me empurrou e eu cai de novo. Ora essa! Salvei a vida dela! Ela gritava com voz esganicada. Por que todas as meninas gritam com voz esgani¢ada? Gabriela chegou, atrasada dbvio, abragou a irm e... esticou o bracgo pro Urso! Todo mundo ali queria morrer? Todos nés comecamos a gritar ao mesmo tempo, mas as meninas. sdo, bem... meninas. Apertei meus olhos, nao queria ver uma cena baseada em Game of Thrones. Fiquei esperando os grunhidos e, quando nada acon- teceu, abri os olhos. Toda a turma estava de boca aberta, olhando as duas brincando com o Urso. S6 depois entendemos. A nova familia era do outro filho do Seu Almeida. 0 Urso era deles, s6 maluco pra ter um bicho desse. Vou escrever na redagao chata da professora que nas férias vivi o dia mais empolgante da minha vida: salvei alguém de ser triturado. Pena que esse alguém nao entendeu isso, ainda me bateu! Depois, a maluca me chamou pra sair. Garotas sao es- quisitas. E aquele bicho continua gostando de garotos gordinhos. gueil oca de Santa Teresa, é apaixonada por li eriados, do: leite, gens e lambidas caninas, além de ter uma queda sau | por cafajestes. Surda desde 0s 27 anos, € co-autora em dez antologias e publicou 0 livro “Pérolas da minha surdez” em 2016, uma obra sobre luta e forca de vontade. 43 REVISTA VIRTUAL icco é bidloga, Doutora em Bioquimica, escritora, poetisa, i ini A luz do celular iluminou o quarto escuro. Téo tinha acabado de se deitar para dormir quando recebeu mensagem da namorada, Daniela. Oi. Sei que é tarde mas vocé poderia vir aqui em casa? Estou com medo. O0h2 JA passou por esses momentos, sabia 0 protocolo. Vocé estd bem? Eu jd passo por al. Oh28 Foi se arrumar, pegar algumas coisas de que precisaria para passar a noite fora. Era sbado, em especifico neste o casal ndo combinou de fazer algum programa. O dia seguinte podia esperar. Entrou no elevador, olhou-se no espelho. O cabelo estava bem ajeitado, cortou-o ainda aquela semana. Os ombros largos de quem se exercitava periodicamente havia alguns meses se faziam notar sob a camiseta branca. Gostava mesmo era dos olhos castanhos claros, quase cor de mel. Nariz, boca, linhas de expressdo, Téo estava com autoestima por quem havia se tornado. No passado, nao tinha toda essa seguran¢a, nem fazia questao de cuidar de si mesmo. A luz do elevador piscou. Era uma longa viagem descer os 17 andares nele. Logo estabilizou de volta. Nao queria ficar ali preso quando a namo- rada pedia socorro. Sim, estd tudo certo. Mais ou menos. Espero vocé, vou deixar a porta aberta. O00h46 Entrou no carro, deu a partida. Saiu pela garagem. A namorada morava nao muito longe num sobrado, a casa de dois andares era heranga dos pais que morreram ha pouco tempo. A causa da morte nao foi dita e o namora- do respeitou a decisdo. Daniela ainda nao sabia o que fazer com 0 imével (vender, alugar?), entao resolveu morar nele por ora. Iniciou ha pouco o re- lacionamento com Téo, um rapaz que entendia os problemas dela e estava disposto a ajudar em momentos de crise. Um semaforo parou 0 carro. Ta bom, eu logo chego ai. OOh55 Era uma casa grande, porém normal, numa rua normal, com inhos nor- mais. Nao havia com que se preocupar. Ap6s dirigir por 20 minutos, esta- cionou a frente do porto da namorada. Do lado de fora a luz da televisio se mostrava ligada, iluminando uma janela préxima, a vista entre as barras do portado. Téo tinha a chave. Inseriu-a no fecho. Nao girou. Estaria presa ou sistema 44 LITERALMENTE INTRIGANTE 2 de engrenagens falhou? Apertou a campainha. De fora nao se ouvia o mo nao soube se funcionou. Repetiu. Nada. Gritou pela namorada, mas ndo muito, com receio de incomodar a vizinhanca que ja se encontrava em re- pouso pela noite tardia. Pegou o celular, faria uma ligacao. Sem sinal. Per- correu o comprimento do portdo, esperando enxergar algo. Ou ainda, que a namorada o notasse. Olhou para o topo das grades. Nao era tao alto assim. Cogitou pular o portao, ninguém pensaria se tratar de um invasor ja que a rua estava deserta e os vizinhos dormindo. Mas nunca fez isso antes, nem tinha dote pra bandido. De tanto pensar, nem notou que o reldgio marcava quase 02h ja. A luz televisiva ainda bailava na noite. Era isso, iria pular. Tinha o condicionamento fisico. Se alguém notasse e o confundisse com um ladrao, era simples explicar. Agarrou-se nas barras, tentou fixar os pés entre elas e escalar. A distancia, tinha-se a impressao de um calombo branco que se esgueirava avante o alto do portado. Buscou apoio no muro do vizinho, pareando a casa da namorada. Com isso, des- viou as pontas afiadas no topo grade. Sentou-se por ali e admirou do alto o esforco feito. Caso pulasse direto ao chao, poderia se machucar. Conside- rou prudente fazer o mesmo trajeto, do lado de dentro, apoiando-se entre as barras, com o auxilio da gravidade. Ao partir com um impulso do muro inho para o portao, nado conseguiu se segurar. A mao esquerda fraquejou e caiu em pé. A dor latejava tal qual Téo também o fizera ha pouco no portao, da palma dos pés vertiginosamente verticalizada rumo aos calca- nhares e canelas. Cambaleando, chegou a porta, que de fato estava aberta. “Dani! Cheguei”. Nenhuma resposta. Foi ao quarto onde a televisao brilhava. Vazio. Desligou o aparelho. Acendeu a luz desse quarto, da sala e da cozinha. Utilizou a ilu- minacao como ferramenta. Uma casa enorme como aquela, no escuro, amedrontava Téo. “Dani!”, gritava enquanto percorria os comodos do andar inferior. Ela néo estava em nenhum lugar. Sala de jantar, banheiros, nada. Olhou de volta o celular, tinha uma mensagem nao lida. Cadé vocé? 01h57 Ja cheguei, cadé vocé?? 02h32 Restava o andar superior, devia ser la. Luz seguida de luz, a casa foi ganhan- do forma ante a penumbra. Escada, quartos, banheiros, sacada. Onde ela estava? Os pés machucados que enfrentaram os degraus se puseram a doer 45 REVISTA VIRTUAL outra vez. Passou pelo escritério, o comodo era um quarto adaptado com mesa, computador e uma imponente estante cheia de livros. Daniela tra- balhava com as palavras, por obriga¢ao e por lazer. Lecionava literatura na universidade e se metia também a escritora. Sobre a mesa, ao centro, Téo encontrou o celular da namorada. Foi olhar a conversa que vinha trocando com ela nas ultimas horas. Uma ultima mensagem dizia “por favor”, ao lado, o horario estampava 02h45. Pegou o proprio celular. Nao recebeu a mensagem — e dessa vez, sim, possuia sinal. Notou o reldgio: 02h46. A mensagem fora enviada havia um minuto, tempo esse em que Téo ja se encontrava no quarto, com as luzes acesas. Era impossivel no ter visto a namorada, ou sequer deixar de ouvir os passos dela. Ela tinha que estar préxima. Mesmo que estivesse ali, era impossivel ela ter enviado o texto daquele celular. Téo ficou incomodado por nao receber o pedido de socor- ro. Voltou-se para 0 quarto de Daniela. A grande cama de casal era também herdada dos pais. Téo achava meio assustador dormir por la. Admirava a coragem dela de conseguir todo dia repousar naquilo. Armarios, pentea- deira, tudo parecia normal. Um grande espelho de parede encarava o rapaz. No reflexo, notou algo esquecido. O quarto era uma suite. Tateou a parede do recém descoberto banheiro conjugado em busca do interruptor e acendeu a luz. O armario sobre a pia estava aberto, o espelho da portinhola encarava muito proximo a parede e Téo via o interior do compartimento. Ao se aproximar, no breve caminho até a pia, pisouem algo crocante. Remédios de todas as formas, tamanhos e cores encontra- vam-se esparramados pelo chao. Pilulas e mais pilulas re tos de diversos sobrenomes. Ouviu um clique. A pi banheiro se fechou. Téo encontrava-se trancado | “Dani!” batia na porta. “Dani, é vocé? Eu to aq divisa, na buscando qualquer ruido que fizesse s muito baixos. Ficou na duvida se eram de chord z It A luz sumiu. Sacou a lanterna do celular. Subi na privada olho pela janela basculante. Os postes de iluminacgao também encont apagados. x Iluminou o cho e as paredes com o feixe de luz que dispunha. Lem! do armario sobre a pia, havia se esquecido dele ao tomar conhecime! dos remédios largados. Fechou-o, como quem busca por resposta nut 46 LITERALMENTE INTRIGANTE ‘0 lado dé uma pista. Surgiu o espelho da se ver. No lugar, encontrou um homem, a muito grande, um olho vazado. A blusa pr agarrada com sangue por alguém relutan- es faltavam. Detinha uma cicatriz na boche- eguravam o celular nado estavam no dedos, a do. A luz do celular tremulou. Era uma nova e eu preciso. 03h27 ciéncia. Olhou de volta o espelho e o monstro nao estava mais cesso, ainda ja. Nenhuma energia elétrica. Da rua, vinha somente o sibilando nas folhas das arvores. N&o poderia fazer nenhu- vento ruido: ma ligacao, @celular de novo sem sinal da operadora. Tornou a atencao Para o box, dftimo reduto ainda intacto. O espaco sob o chuveiro mostra- va-se segregario pela cortina de plastico. Passo a passo, lento, esmagando dezenas de gilulas, chegou a divisa. Uma m@o segurava o celular, iluminan- do qualquergonto a ser descoberto do outro lado. A outra mao levaria a cortina de s@p estado amplo para aquele abarrotado em um dos cantos dos trilhos. §§ estava Daniela. No chao do box. Em posicao fetal. Dormin- do, ou ao ménos era o que aparentava. O filete de luz procurava algo sem saber ao certo o que era. Passou pela parede interna, pelo corpo recolhido e pelas drogas multicoloridas. Os remédios revolviam o corpo nu da namo- rada pelo chao. A mao esquerda dela, de costas para baixo, revelava a palma manchada de vermelho. Linguista-jornalista ou o contrario. Tem um relaciona- mento complicado com a linguagem. Escreve aqui e ali pela internet. Tem textos datados de 10 anos atras em alguns ambientes virtuais. Nao tem frequéncia de publicagao pré-definida. Acredita que um texto nunca esta revisado o suficiente. 47 REVISTA VIRTUAL © NAO FINDAR. Que saudade eu tenho das estrelas, do luar, do pér do sol e até mesmo do banho de chuva... Saudade das risadas, de posar na casa dos primos e ficar até trés, quatro, cinco horas da madrugada jogando cartas ou assistindo de- senhos animados. Saudades de poder sair e ficar na casa dos amigos e brincar, brincar até cair no chao de tanta exaustdo. Saudades de poder pintar o cabelo todo colori- do e ser a sensacao da escola... Por que tudo precisa durar tao pouco? Dizem que tudo uma hora tem fim, mas estao todos errados, pois mesmo que a distancia fiquei grande uma amizade continua, porque mesmo depois de uma briga o amor no vai embora e porque a infancia pode ser sé uma fase, mas nao faz mal, posso tornar a viver ela o momento que eu quiser. Que mal faz brincar de boneca de vez em quando? Ou conversar com meus ursinhos de pelticia como quando eu era menor? Ou sei la, sair na chuva, pular, gritar, sorrir, chorar, dancar nela. E mesmo que venha o resfriado depois o importante é viver, porque mesmo ninguém garanta que a vida acaba quando o coracao parar de bater eu prefiro nao ter arrependimentos de momentos nao vivenciados. E gaticha de berco e coracdo. Nutre uma paixdo por arte de qualquer forma, tanto a escrita quanto aquela que as nuvens formam no céu. E escritora e artista visual, além de fotdgrafa nas horas vagas. Preten- de cursar biologia na universidade e é dire- tora de redagao da revista virtual Literal- mente Intrigante. 49 REVISTA VIRTUAL DICAS DE LIVROS DE FICCAO CIENTIFICA primeiro livro da saga, “Ender's Game - O Jogo do Exterminador”. Situado na Terra no futuro (2164 até 2170), 0 livro nos apresenta uma hu- manidade em perigo que mal sobre- viveu a dois conflitos com os Formics (uma exética espécie de insetdides, Py muito parecidos com formigas). Peo e ec) No romance, Ender Wiggin é uma Wan ri crianca de seis anos de idade, Pee quando é recrutado para a Escola de * A Combate Espacial. No futuro criado Py r por Orson Scott Card, a humanidade esta em guerra com alienigenas inva- sores, e muitos dos combates sao travados em outros sistemas solares, distantes do nosso. Como néo existe uma tecnologia de vGo mais rapido que a luz, nessa ficcdo cientifica, os muito jovens sao recrutados porque eles estaraéo maduros quando estive- ram em batalha ou quando retorna- rem a Terra. Usar criangas-soldados como personagens também foi um modo do autor afirmar que toda guerra 6 um processo de destruigao da inocéncia. O Jogo do Exterminador é 0 primeiro livro da saga composta por outros trés: Orador dos Mortos; Xenocidio e Os Filhos da Mente, para nossa ale- gria todos os livros ja foram publica- dos no Brasil. Em 2013 foi langada a adaptagao do 50 LITERALMENTE INTRIGANTE Filha Gnica da poderosa e fria gene- fim foi bem... Finalizado. ticista Terra Spiker, Eve fica entre a vida e a morte depois de sofrer um acidente de carro. O processo de cura no misterioso laboratério. Spiker transcorre com uma rapidez impressionante, o que desperta a curiosidade da menina. Antes que Eve estreite os lagos com Solo, um rapaz que compartilha se- gredos com a corporacao, a Dra. Spiker Ihe propde um desafio: Eve tera a chance de testar, em primeira mao, um software desenvolvido Para manipular genes humanos. Ela podera criar um namorado sob medida! Mas brincar de Deus tem conse- quéncias, e agora Eve vai descobrir até que ponto existe perfeicao. Para quem quer uma leitura leve e descompromissada, Eve e Adam é uma 6tima escolha. Tem mistério, aventura, cientistas loucos e um ro- mance que nao é chato. Eve e Adam é um daque- A les livros que quando vocé chega no final fica tipo: “OMG adorei, preci- so de uma continua¢ao”, mas dai vocé pensa de novo e percebe que se tiver mesmo uma continuacado (0 que nao é o caso de Eve e Adam) ela pode estragar tudo, porque o S51 REVISTA VIRTUAL LISSA PRICE STARTERS Seu mundo mudou para sempre. Callie perdeu os pais quando as guerras de Esporos varreu todas as pessoas entre 20 e 60 anos. Elae seu irm&o mais novo, Tyler, estao se virando, vivendo como desabri- gados com seu amigo Michael e lu- tando contra rebeldes que os ma- tariam por uma bolacha. A nica esperanga de Callie é Prime Desti- nations, um lugar perturbado em Berverly Hills que abriga uma mis- teriosa figura conhecida como o Old Man. Ele aluga adolescentes para alugar seus corpos aos Termi- nais — idosos que desejam ser jovens novamente. Callie, deses- perada pelo dinheiro que os ajuda- ra a sobreviver concorda em ser 52 LITERALMENTE INTRIGANTE uma doadora. Mas 0 neuro chip que colocam em Callie esta com defeito e ela acorda na vida de sua locadora, morando em uma mansio, dirigindo seus carros e saindo com o neto de um senador. Parece quase um conto de fadas, até Callie descobrir que sua loca- taria pretende fazer mais do que se divertir — e que os planos de Prime Destinations sao tao diabo- licos que Callie nunca podia ter imaginado. Starters é muito do que vocé espera de uma histdria distopica, porém tem uma pegada mais leve sem muitas conspiragées e picui- nhas aparentes. O comeco pode desencorajar alguns, pois é bas- tante parado, introdutério, mas quando a trama se desenvolve e tudo vira de ponta cabeca... Bem, vocé nao consegue parar de ler. O livro tem uma continuagao cha- mada Enders e um livro bénus com alguns contos sobre a série (Contos de Starters). Ao folhear distraidamente uma dessas revistas cor-de-rosa que a minha cabeleireira teima em pér a disposic¢ao das clientes, quer elas gostem ou n&o, fui de suibito confrontada com a velocidade a que o tempo voa, quando se me deparou a foto de uma pessoa que encontrara por acaso numa terra longinqua e num passado distante. Envelhecera muito, e dei-me conta, aterrada, de que, provavelmente, se me reconhecesse, diria o mesmo de mim. A fotografia mostrava-a no seu pais natal, onde comemorara o seu octogésimo primeiro aniversario, mas, apesar das marcas que a passagem dos anos lhe deixara no rosto ea nitida perda da agilidade que Ihe observara naquele dia remoto, conservava a vi- vacidade do olhar e a altivez caracteristica das pessoas ilustres... E enquan- to a colorista dava umas pinceladas de tinta nos meus encanecidos cabe- los, rememorei 0 nosso encontro. Quase no final da década de 1990, sai de Lisboa e meti-me a caminho de Granada com uma amiga com o propésito de visitar a Casa-Museu Federi- ‘co Garcia Lorca, aberta ao publico havia um par de anos, e percorremos valentemente os setecentos quilémetros num infernal més de agosto num carro sem ar condicionado como se se tratasse de um passeiozinho mati- nal. Na bagagem, levavamos pouco dinheiro e calgado desapropriado para fazer a pé as ruas da cidade. Fizemos o percurso de uma assentada. A minha amiga, que nao conduz, foi uma excelente navegadora. De mapa em punho, olho compenetrado no numero das carreteras, mandava: vira aqui, segue por ali... e eu obede- cia. ‘Chegamos exaustas, mas triunfantes a nossa pensdo barata em Granada, na qual nos esperava um quartinho nas traseiras, com uma exigua janela junto ao teto, sem cortinas, e duas camas rente ao chao, cujos colchdes es- tavam cheios de covas e sabe-se la de que mais. Mas a nos que nos importava? Compramos sapatos adequados para per- correr a pé as ruas. Queriamos vadiar pela cidade onde o poeta fora assas- sinado, ver, ouvir, cheirar, discretamente, como se féssemos habitantes do burgo. Fomos felizes em Granada. Demos longos passeios, comemos gaz- pacho, pan y jamon, aceitunas alifiadas con ajo, ensaladillas, pinchitos, tudo bem regado com sangria ou cerveza. Estivemos na Alhambra, claro; é tao dificil evita-la como a Torre Eiffel em 53 REVISTA VIRTUAL ANA} _ | Colaboro com editoras, para as quais faco trabalhos de traducao, AY M.-P a revisao e editoracao. Tenho um conto publicado e outras obras em curso. em Paris. Por fim, a Huerta de San Vicente, n.2 6. Um jardim muito mais fresco que o da Alhambra. Uma alameda que se percorria 4 sombra de grandes arvo- res. Uma casa branca, sencilla e aristocratica. Uma porta verde que se abria para uma parcela do poeta. O fresco no interior. O quarto, quase monastico, a contrastar com o luxo de algumas pecas de mobiliario nou- tras partes da casa. As reproducdes de desenhos feitos para cendrios de teatro. A poesia embalada em livrinhos de capa as riscas. Nao havia mais visitantes na casa de veraneio do Lorca, e dispensamos da habitual visita guiada a senhora que nos recebeu. Grata, nem se importou que nos sentassemos nos cadeirdes vermelhos, que enfidssemos 0 nariz nas flores frescas das jarras, que passassemos a ponta do indicador pela secretaria do poeta, como quem verifica se restou algum po da sua inspi- ragao... Saimos. Numa mo, um saco de livros; na outra, uma reproducgdo de um cenario para uma das suas pe¢as, enrolada e presa com um elastico. Acasa ficou para tras, e a alameda conduzia-nos para longe do ar respira- do pelo poeta morto. Caminhavamos reflexivas, alheadas. Ja perto do portao, erguemos por fim os olhos em busca da saida para a rua, para o quotidiano banal, para a nossa existéncia passiva, e vimos que, de frente para nds, estavam quatro figuras. Paramos todos ao mesmo tempo; nds, porque eles haviam parado; eles, porque nés estavamos paradas. O homem foi 0 primeiro a reagir. Sorriu, certo de que o reconhecéramos. Ah, sim, reconhecéramo-lo. Conheciamos-lhe a atividade politica inicial e 0 posterior desvio para a direita, pouco digna do nosso respeito, porque, por sermos duas mulheres de esquerda, na altura muito pouco flexiveis, n&o compreendiamos nem aceitavamos. Nao viamos, pois, motivo para manifestacgGes de prazer na sua presenga. E mantivemo-nos hirtas. Osorriso dele mantinha-se, tentando desfazer aquilo que presumia ser ti- midez face a um homem famoso... Vacilamos; afinal, conheciamos bem a sua obra, a qual consumiamos avidamente, e, ao fim do que nos pareceu um tempo infinito, capitulamos, porque também ele percorrera muitos quilémetros para visitar a casa de veraneio do Lorca... E, entdo, sorrimos abertamente, felizes por levarmos para casa 0 encontro com dois poetas. Era o Mario Vargas Lhosa, com a mulher, a filha e o cao. 54 LITERALMENTE INTRIGANTE Para conquistar... -Vocé sé pode ser Internet Explorer! Com vocé meu layout fica todo des- } 9} configurado! -Vou invadir seu coracdo, formatar todo rancor, instalar minha paixao e soltar o worm do amor! [ -Vocé é tao linda que se fosse um ar- quivo sua extensdo seria .hot -Vocé hackeou o Google? Porque qualquer coisa que eu procuro sempre te encontro. -Vocé acredita em amor a primeira pageview? -Com vocé até o Word fica sem palavras! -Vocé esta sempre em C:/Meu/Coracgao . e -Vocé nao é Facebo Ane anet ISTA VIRTUAL Somos tao fracos quando sucum- bimos as vicissitudes que a vida nos impée; quando choramos sobre os corpos sem vida dos seres que amamos e quando depa- ramos com mistérios insondaveis cujas explicagées ignoramos; mas, cujos efeitos perversos sobre nosso entorno bem podemos per- ceber. Somos tao fracos quando nos en- tregamos aos vicios que corrom- pem o corpo e a alma; quando temos a exata nocdo do quanto desconhecemos neste vasto uni- verso em que existimos e quando hos sentimos impotentes para mudar o curso das nossas proéprias vidas. Somos tao fracos quando temos as nossas existéncias submetidas e os nossos destinos comandados por seres humanos egoistas e de ma indole, cujos Unicos objetivos sio a acumulacao de poder e de rique- za, nao hesitando, para tanto, em cometer as mais graves atrocida- des e as mais terriveis violagdes dos direitos humanos. Somos tao fracos quando percebe- mos as nossas limitacées, fisicas e intelectuais, para vencer obstacu- los que outros encaram com natu- ralidade e, até mesmo, como coisas corriqueiras. 56 LITERALMENTE INTRIGANTE Somos tao fracos quando nos de- paramos com amores desfeitos, com situagées irreconciliaveis, com caminhos sem volta, com as emogées conduzindo as nossas ag6es e quando percebemos as distancias inexpugnaveis que nos separam de pessoas com as quais gostariamos de interagir. Somos tao fracos quando, desar- mados de qualquer sentimento de maldade ou egoismo, nos deixa- mos, inocentemente, iludir, enga- nar e conduzir por gente mal in- tencionada e astuciosa, que deseja apenas o seu beneficio as nossas expensas. Somos tao fracos quando, premi- dos pelos poucos anos que nos restam, percebemos nao haver al- cangado os nossos objetivos na vida ou ter desperdicado a exis- téncia de forma leviana, sem pos- suir outra possibilidade de recu- perar aqueles anos que perde- mos. Finalmente, somos tao fracos quando nos deparamos com o tér- mino da nossa existéncia, sem termos a necessaria coragem de penetrar no desconhecido territo- rio da morte e ir conhecer os seus mistérios. Por outro lado, somos tao fortes quando temos a oportunidade de consolar seres que necessitam ser consolados; quando consegui- mos superar as nossas limitacdes; quando conseguimos dominar os sentimentos viciosos e destacar os virtuosos; quando produzimos obras dignas de criaturas que se identificam com aquele que as criou. Somos tao fortes quando supera- mos o Ego e a Satisfac¢ao dos seus desejos, passando a pensar ea agir de forma coletiva; quando dedica- mos 0 nosso tempo e esforco a pra- ticar agGes que beneficiarao pes- soas desconhecidas e/ou geracdes futuras; quando intercedemos junto aos poderosos para defender os di- reitos daqueles que nada podem. Somos tao fortes quando transmiti- mos Os nossos conhecimentos; quando produzimos algo novo; quando inventamos ou descobri- mos aquilo que, até ent&o, era des- conhecido; quando geramos uma nova vida e quando salvamos a vida de algum semelhante ou consegui- mos aliviar o seu sofrimento, fisico e/ou psiquico. Somos to fortes quando consegui- mos evitar 0 nosso erro e o alheio; quando protegemos a Natureza e as suas espécies, evitando que sejam contaminados, que se extingam ou que sejam maltratados. Somos tao fortes quando nos colocamos sempre ao lado da verdade e da justica, assumindo integralmente os riscos que estas acdes implicam; quando nos encontramos no lugar certo ena hora certa, para evitar uma injusti¢a, corrigir um erro, salvar uma vida. Finalmente, somos t&o fortes quando compreendemos e acei- tamos 0 término da vida atual e partimos, sem temor, para o ‘outro lado da existéncia com a firme conviccdo de que o espiri- to humano, que é uma forma de energia, sempre existiu, existe e jamais podera ser extinto. Economista, pés graduado na Es- panha e na Franca, escritor e poeta com alguns prémios recebi- dos em concursos literarios nacio- hais. u 7 REVISTA VIRTUAL ESTA OBRA ESTA LICENCIADA COM UMA LICENGA CREATIVE COMMONS ATRIBUIGAO-NAOCOMERCIAL- SEMDERIVAGOES 4.0 INTERNACIONAL.

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