Está en la página 1de 15

REV NET - DTA No.

3, 4 de Março de 2002

Pg.
Estudo do perfil epidemiológico da Síndrome Hemolítico-Urêmica
no estado de São Paulo, fevereiro de 1998 a agosto de 2000* 62

REV NET - DTA Surto de diarréia inter-municipal associado a E. coli em restaurante


de beira de estrada em Matão - SP - Jjaneiro de 2001 67

Aprimorando a vigilância epidemiológica do Botulismo 76


REVISTA NET - DTA
DIVISÃO DE DOENÇAS DE TRANSMISSÃO
HÍDRICA E ALIMENTAR

ESTUDOS

Estudo do perfil epidemiológico da Síndrome Hemolítico-Urêmica


no estado de São Paulo, fevereiro de 1998 a agosto de 2000*
Ana T. Q. Alves; Maria Bernadete Arantes; Rogério C. Abou-Jamra.

(*) Parte da monografia apresentada no Curso de Especialização em Epidemiologia Aplicada


às Doenças Transmitidas por Alimentos, convênio Faculdade de Saúde Pública - FSP, da
Universidade de São Paulo - USP e Centro de Vigilância Epidemiológica - CVE, da Secretaria
de Estado da Saúde de São Paulo - SES/SP.

RESUMO

Objetivo - conhecer a ocorrência da Síndrome Hemolítico-Urêmica (SHU) no estado de São Paulo,


sua associação com a doença diarréica, o tipo de patógeno envolvido e alimento ingerido. Método
- desenvolveu-se um estudo retrospectivo no período de fevereiro de 1998 a agosto de 2000,
utilizando fontes secundárias de dados de morbidade hospitalar para identificar os casos com
diagnóstico de SHU, analisando-se os prontuários destes casos por meio de uma ficha de
investigação. Resultados - foram investigados trinta e um prontuários, sendo identificados 15
(quinze) pacientes que tiveram a SHU, sendo 80% destes casos, precedido de diarréia. Conclusão
- foi detectada a SHU no Estado de São Paulo, sendo que a maioria dos casos são precedidos de
doença diarréica.

INTRODUÇÃO

A Síndrome Hemolítico-Urêmica (SHU) caracteriza-se por dano renal agudo,


trombocitopenia e anemia hemolítica microangiopática como manifestações principais. Acomete,
principalmente, crianças e idosos, com pródromo de diarréia, algumas vezes com sangue,
geralmente associada com infecção intestinal por bactérias produtoras de verotoxinas (Soares et
al., 1999). Hipertensão arterial e manifestações neurológicas como irritabilidade, letargia,
convulsões, coma, apresentam-se em 25% dos afetados (DDTHA, 2000; Veronesi, 1996); 5%

62
desenvolvem insuficiência renal crônica, requerendo em poucos anos procedimentos dialíticos ou
transplante renal (DDTHA, 2000; Robins et al., 1996).
Diversos estudos demonstraram que 90% dos casos de SHU nos países desenvolvidos
apresentaram evidências de infecção por Escherichia coli (E. coli) e outras STEC (Shiga Toxin-
producing E. coli) (DDTHA, 2000).
Segundo Robins et al. (1996) a SHU infantil é a mais bem caracterizada, pois até 75% dos
casos ocorrem em crianças com infecção intestinal por E. coli produtora de verotoxina.
A SHU é a principal complicação das infecções causadas pela E. coli, desenvolvendo-se
em torno de 2 a 7% dos casos. Os pacientes que desenvolvem SHU, apresentam taxa de
mortalidade de 3 a 10% ocorrendo complicações renais, cardíacas e neurológicas severas em
torno de 4 a 30% dos casos (Veronesi, 1996).
A infecção por E. coli tem sido registrada em mais de 30 países de seis continentes. A
Argentina, país exportador de carne para o Brasil, apresenta alta incidência de SHU, que é
considerada endêmica, registrando aproximadamente 250 casos novos por ano (DDTHA, 2000).
Sabe-se que apenas uma minoria de linhagens de E coli são patogênicas para o homem. A
E. coli entero-hemorrágica (EHEC) ou produtoras de verotoxina (VTEC) são responsáveis pela
doença conhecida como colite hemorrágica, que em casos mais graves pode progredir para a SHU
(Silveira & Silva, 1996).
A colite hemorrágica provocada pelas linhagens de E. coli O157:H7 se inicia com uma
diarréia sanguinolenta, com período de incubação variável, de 3 a 10 dias (Silveira & Silva, 1996),
sendo caracterizada por dores abdominais severas, vômitos ocasionais e geralmente sem febre
(Silveira & Silva, 1996; Griffin & Tauxe, 1991).
Os animais domésticos , especialmente os ruminantes, tem sido identificados como
reservatórios de STEC. O gado bovino é apontado como o reservatório principal. A transmissão se
realiza através do consumo de alimentos contaminados, principalmente elaborados com carne
moída e também leite não pasteurizado. A contaminação fecal da água e outros alimentos e a
contaminação cruzada durante a preparação dos alimentos são apontadas como importantes vias
de infecção. Como exemplos de alimentos associados a surtos de E. coli O157:H7 temos
hambúrguer, roast beef, leite cru, suco de maça não pasteurizado, iogurte, queijo, salsas
fermentadas, maionese, alface, e no Japão os vegetais da família dos rabanetes. A bactéria é
resistente aos ácidos e pode sobreviver nos alimentos fermentados e vegetais frescos (Diez-
Gonzalez & Gallaway, 1998; Ribeiro et al., 1999; DDTHA, 2000). A transmissão pessoa a pessoa
da Escherichia coli O157:H7 é comum em crianças em idade pré escolar, que freqüentam creches
(Belongia et al., 1998).
A SHU é uma condição ameaçadora da vida e portanto deve ser tratada com cuidado
intensivo (CVE/SES-SP, 1999). Em virtude disto, foi realizado um estudo a fim de conhecer a
ocorrência desta síndrome no estado de São Paulo, sua relação com a doença diarréica, o tipo de
patógeno envolvido e o alimento responsável.

63
MÉTODO

Levantamento e Fonte de Dados

Para conhecer a ocorrência da SHU no estado de São Paulo, desenvolveu-se um


estudo retrospectivo, no período de fevereiro de 1998 a agosto de 2000, utilizando fontes
secundárias de dados de morbidade hospitalar para identificar os casos com esse diagnóstico.
Para tanto, recorreu-se ao banco de dados AIH/DATASUS - Autorização de Internação
Hospitalar/Departamento de Informações do Sistema Único de Saúde - SUS, do Ministério da
Saúde.
Foram levantados todos os registros de diagnósticos de SHU no período em questão,
através do programa TABWIN/DATASUS, que contém informações dos pacientes internados,
como nome, endereço, nome do hospital, número do prontuário, etc..
Através do número das AIHs foram identificados os prontuários, registrando-se os dados
em uma ficha de investigação elaborada especificamente para este estudo.

Definição de Caso

Considerou-se como caso de SHU pacientes que apresentaram valores hematimétricos e


sintomatológicos que caracterizavam a anemia hemolítica, trombocitopenia e insuficiência renal
aguda. A pertinência foi o critério de inclusão. Os critérios de exclusão foram: a) a recusa de
participação por parte da instituição onde o paciente foi internado, não permitindo o acesso ao
prontuário do paciente e impedindo verificar a pertinência do diagnóstico; b) o diagnóstico
incompatível com a definição de caso; c) outros diagnósticos digitados e/ou codificados
incorretamente como SHU.

RESULTADOS

Foram encontradas 33 AIHs que possuíam como diagnóstico principal a codificação de


SHU (D59.3) e 12 como diagnóstico secundário. Em duas das AIHs a codificação constava tanto
em diagnóstico principal como em secundário, tratando-se porém da mesma autorização. Assim,
foram identificadas 43 AIHs com o diagnóstico de SHU.
Desse total de AIHs levantadas, foram identificados 34 prontuários de SHU. As demais
eram autorizações referentes a mais de uma internação dos mesmos pacientes.
Dentre os prontuários identificados, tivemos acesso a 31, tendo sido identificados 15
pacientes com diagnóstico compatível com SHU. Destes, dois pacientes apresentaram a SHU
devido por problemas sistêmicos, sendo uma gravidez e um lúpus eritematoso sistêmico.

64
Dos 15 prontuários analisados com diagnóstico compatível de SHU, em 12 (80%) o quadro
foi precedido de diarréia. Cabe destacar que em apenas 60% desses prontuários havia histórico
sobre os hábitos alimentares. Contudo, não foi encontrada qualquer menção sobre possíveis
alimentos suspeitos ingeridos que pudessem ter causado a diarréia e posteriormente a SHU.
Dentre os pacientes com diarréia, nove (75%) apresentaram sangue nas fezes. A maior incidência
de SHU foi observada na faixa etária entre 0 a 3 anos (80%), conforme descrito em literatura.
Dentre os pacientes que tiveram diarréia, em seis foi realizada coprocultura (50%), sendo
isolada a E. coli em 33% destas. Em nenhum dos casos o agente foi sorotipado.
O quadro clínico dos pacientes exigiu procedimentos de diálise peritoneal em 73.3% dos
casos. Em nove (60%) dos pacientes ocorreram complicações: três apresentaram convulsões, um
convulsão e complicações respiratórias, um prolapso retal e quatro nefrite. Como sintomas mais
comuns foram observados vômitos (60%), febre (66,6%), hipertensão arterial (63,3% ) e dor
abdominal (40% ).
Observou-se que 13,3% dos pacientes desenvolveram Insuficiência Renal Crônica (IRC)
e 13,% dos pacientes foram a óbito.

CONCLUSÕES

Foram identificados 12 casos de SHU relacionados com diarréia, internados nos hospitais
do SUS no estado de São Paulo, no período de fevereiro de 1998 a agosto de 2000. A maioria dos
casos ocorreu em crianças com até 3 anos de idade.
Considerando-se que os pacientes alvo do estudo, quando internados apresentavam
sintomatologia de diarréia, podemos afirmar que o número de coproculturas realizadas foi
pequeno.
Não foi possível estabelecer a relação da SHU com a E. coli O 157:H7, uma vez que os
serviços hospitalares não procederam à classificação das E. coli.
No decorrer do trabalho, algumas instituições declararam-se incapazes de localizar os
prontuários somente com o número das respectivas AIHs, tornando-se necessário o levantamento
em outro banco de dados com acesso restrito, onde constava além do número do prontuário, os
dados do paciente. Tal processo acarretou uma grande demora no acesso aos prontuários.
Mesmo recorrendo à Vigilância Epidemiológica das Divisões Regionais de Saúde (DIRS),
uma parte das instituições não permitiu acesso, sendo necessário auxílio do Centro de Vigilância
Epidemiológica - CVE para a obtenção e análise dos prontuários.
A conduta de investigação, embora fácil, foi dificultada pela burocracia em algumas
instituições, impossibilitando que fossem investigados alguns dos prontuários identificados.
Embora a grande maioria das internações hospitalares, no estado de São Paulo, seja feita
por intermédio do SUS devemos considerar ainda aqueles pacientes internados através de planos
de saúde ou com recursos próprios em hospitais não conveniados ao SUS, o que nos leva a

65
considerar que a população alvo do estudo não representa a totalidade do universo de internados.
Nenhum desses casos foi notificado ao CVE.
Durante a pesquisa em prontuários, foram verificados erros no preenchimento das AIHs
que, embora tivessem diagnósticos diferentes de SHU, estavam classificadas como CID D 59.3. A
coleta de dados, em uma significativa parte dos hospitais, foi bastante dificultada devido: a) à
caligrafia pouco legível nos prontuários; b) à deficiência no registro dos resultados de exames
complementares requisitados e c) à anamnese pouco explorada. Portanto, os hospitais devem
atentar para o melhor preenchimento das AIHs e os médicos para melhorar o preenchimento dos
prontuários.
Foi possível observar através da análise dos prontuários a extrema gravidade desta
doença e o perigo que oferece à saúde da população, além dos custos que representa e tipo de
recurso médico-hospitalar especializado que requer, seja na vigência do quadro agudo, seja
quando da ocorrência de seqüelas. Surtos descritos em outros países como Canadá, EUA, Japão
e Argentina demonstram que devem ser tomadas medidas para prevenir a ocorrência de novos
casos ou de surtos no Brasil. Neste sentido verifica-se a importância de medidas de prevenção
como a implantação do programa de Vigilância Ativa da SHU e dos patógenos a ela relacionados,
em andamento no estado de São Paulo, coordenado pela Divisão de Doenças de Transmissão
Hídrica e Alimentar - DDTHA/CVE, segundo acordo firmado com a Organização Pan-americana da
Saúde - OPAS.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Belongia, E. A.; Osterholm, M. T. Transmission of Escherichia coli O157:H7 infection in


Minnesota child day-care facilities. JAMA 1993; 269(7): 883-888.
2. CVE/SES-SP (Centro de vigilância Epidemiológica/Secretaria de Estado da Saúde de São
Paulo). VE-DTA - Manual do Sistema de Informação - Investigação de surtos. CVE. São Paulo,
Out. 1999.
3. DDTHA/CVE(Divisão de Doenças de Transmissão Hídrica e Alimentar/Centro de Vigilância
Epidemiológica/Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo). Protocolo de Vigilância da
Síndrome Hemolítico-Urêmica, São Paulo. São Paulo, 2000.
4. Diez-Gonzalez, F.; Gallaway, T. R.; Kizoules, M. G.; Russel, J. B. Grain Feeding and the
Deissemination of Acid-Resistant Escherichia coli from Catle. Science Magazine 1998;
281(5383): 1666-68.
5. Griffin, P. M.; Slutsker, L. Escherichia coli O157:H7 Gastroenteritis and the Hemolitic Uremic
Syndrome : A Emerging Infections Diseasel. Annu. Rev. Med. 1999; 50: 355-67.
6. Griffin; P. M.; Tauxe, R. V. The Epidemiology of Infections Caused by Escherichia coli
O157:H7, Other Enterhemorrhagic E. coli Associated Hemolitic Uremic Syndrom.
Epidemiologic Review 1991; 13: 60-98

66
7. Robins et alii. Patologia Básica. São Paulo: Atheneu; 1996
8. Silveira, M. F. A; Silva, N. Ocorrência de Escherichia coli O157:H7 em alimentos. Colet. ITAL
1996; 26 (1): 25-31.
9. Silveira, M. F.A. ; Silva, N. Ocurrence of Escherichia coli O157:H7 in hamburguers produced in
Brazil. Journal of Food Protection 1999; 62(11): 1333-1335.
10. Soares, V.; Alves, M. A. R.; Barros, R. T. Glomerulopatias Patogenia Clínica Tratamento.
São Paulo: Sarvier; 1999.

COMENTANDO SURTOS

Surto de diarréia inter-municipal associado a E. coli em


restaurante de beira de estrada em Matão - SP - Janeiro de 2001

Em 05.01.2001 a DIR XII - Campinas notificou à Central CVE sete casos de diarréia
internados em um hospital da cidade de Americana. A refeição suspeita era o almoço de
02.01.2001 - semana epidemiológica 01 (SE 01) ingerido em um restaurante de uma rodovia entre
os municípios de Matão e Araraquara, no estado de São Paulo.
Este resumo, realizado a partir das informações fornecidas pela Central CVE, pela
Vigilância Epidemiológica da DIR XII - Campinas e relatório da Secretaria Municipal de Matão, tem
como objetivo divulgar os achados da investigação que relaciona o surto à Escherichia coli e outros
patógenos veiculados por alimentos contaminados. Também tem como objetivo comentar as
dificuldades e lacunas na investigação epidemiológica deste episódio, visando contribuir para o
aprimoramento do programa de Vigilância Epidemiológica das Doenças Transmitidas por
Alimentos, hoje descentralizado para os municípios.
A DIR XII - Campinas, em 05.01.2001, informa que sete pessoas, quatro residentes em
Santa Bárbara do Oeste - SP e três em Americana - SP, foram internadas nos dias 3 e 4 de janeiro
de 2001, em um hospital da cidade de Americana, com febre, vômitos e diarréia. Relata como
refeição comum suspeita um almoço (carne, arroz, feijão e salpicão a base de maionese) ingerido
por todos os sete casos, no dia 02.01.2001, às 13:00hs, em um restaurante em posto de gasolina,
à beira de rodovia, entre os municípios de Matão e Araraquara, estado de São Paulo.
A partir da notificação da DIR XII – Campinas, a Central CVE acionou a Vigilância
Epidemiológica da DIR VII – Araraquara para que fossem desencadeadas as investigações no

67
município de Matão, no restaurante envolvido, bem como, solicitou à DIR XII – Campinas maiores
detalhes referentes aos pacientes do surto em questão.
Com base nos dados enviados à Divisão de Doenças de Transmissão Hídrica e Alimentar
– DDTHA, do CVE, pode-se verificar que três pacientes referem o início de sintomas no mesmo dia
de ingestão do almoço (02.01.01), três no dia seguinte (03.01.01) e um no dia (04.01.01), sendo
que cinco deles foram internados no dia 03.01.01 e dois no dia 04.01.01 (Figura 1 e Figura 2).

Figura 1 – Curva Epidêmica - Início dos Sintomas - Surto de Diarréia


devido a almoço em Matão - SP, janeiro de 2001

Número de 3
Casos 2

0
02/01/01 03/01/01 04/01/01
Dia do Início dos Sintomas

Figura 2 – Número de casos segundo a data de internação – Surto de


Diarréia devido a almoço em Matão, janeiro de 2001

6
5
4
Número de
3
Casos
2
1
0
03/01/01 04/01/01
Dia da internação

Informa ainda a DIR que cada paciente permaneceu internado por um dia. Não há
informações sobre o número de comensais ou número de refeições servidas no restaurante no dia

68
do episódio. Também não há informações se foi desencadeado rastreamento de outros possíveis
casos internados nos hospitais das regiões ao redor do restaurante.
Pelo sobrenome dos pacientes verifica-se que pertencem a duas famílias diferentes,
porém, não há informações se estavam juntas e se outras pessoas conhecidas participaram do
mesmo almoço, se ficaram ou não doentes e o que cada pessoa ingeriu ou não do cardápio
apresentado. A falta desses dados impede o cálculo de taxas de incidência da doença e da taxa de
ataque dos alimentos suspeitos.
Todos os pacientes internados, segundo as informações da DIR XII – Campinas
consumiram arroz, feijão, salpicão com maionese e carne, isto é, o cardápio oferecido pelo
restaurante naquele dia.
Também não há informações sobre a hora precisa de início dos sintomas de cada
paciente, podendo-se contudo deduzir, pelos dados hospitalares, os seguintes tempos prováveis
de incubação (Quadro 1):

Quadro 1 - Pacientes do Surto segundo o tempo de incubação


Surto de Diarréia devido a almoço em Matão, janeiro de 2001

Paciente 1 11 horas

Paciente 2 11 horas

Paciente 3 11 horas

Paciente 4 35 horas

Paciente 5 35 horas

Paciente 6 35 horas

Paciente 7 35 horas

Período Mediano de Incubação = 35 horas

69
A distribuição dos casos internados por diarréia segundo a faixa etária foi a seguinte
(Tabela 1):

Tabela 1 - Pacientes do Surto por faixa etária


Surto de Diarréia devido a almoço em Matão, janeiro de 2001

FAIXA ETÁRIA N º CASOS %


5a9a 1 14,3
10 a 19 a 2 28,6
20-49 a 4 57,1
Total 7 100,0

À inspeção sanitária, a equipe da Secretaria Municipal de Saúde de Matão descreve


irregularidades de ordem estrutural como ausência de portas nos balcões de azulejos com
utensílios para o preparo de alimentos e aponta alguns procedimentos inadequados como o
armazenamento impróprio das carnes no freezer, temperos sem proteção e preparo de maionese
com ovos in natura.
Não estão relatados como eram realizados os procedimentos de preparo dos alimentos,
desde o recebimento da matéria prima, higienização, manipulação nas bancadas, cozimento e
distribuição, pontos críticos, origem das matérias primas, condições de higiene dos funcionários,
dentre outros fatores que podem ter contribuído para a contaminação dos alimentos. Também não
há informação se restaram sobras dos alimentos servidos no dia 02.01.01. Não foram coletadas
amostras dos alimentos no dia da visita, cuja data também não consta no relatório. Informa o
relatório que o gerente do restaurante não sabia de outras reclamações.
Os resultados laboratoriais, referentes à coprocultura realizada para quatro pacientes
foram os seguintes (Quadro 2):

Quadro 2 – Distribuição dos pacientes que realizaram coprocultura, segundo tempo de


incubação e agente etiológico - Surto de Diarréia devido a almoço em Matão,
janeiro de 2001
NÚMERO DE TEMPO INCUBAÇÃO RESULTADO
PACIENTES (HORA) AGENTE ETIOLÓGICO
1 11 Escherichia coli
2 11 Escherichia coli + Klebsiella sp
3 11 Escherichia coli + Pseudomonas sp
7 59 Escherichia coli + Citrobacter sp

O patógeno comum isolado foi a E. coli, não havendo informações se as cepas foram
encaminhadas para o IAL – Central para a identificação de sorogrupos e antígenos. Também não
há informações se esses exames foram realizados pelo IAL da região ou pelo hospital de

70
internação dos pacientes. Não há informações sobre as características da diarréia, se
sanguinolenta e outros aspectos.
Outros patógenos, associados ao surto como Klebsiella sp, Pseudomonas sp, Citrobacter
sp foram identificados.

Nota dos editores:

1. Os sete casos, moradores de diferentes cidades, aparentemente duas famílias


diferentes, parecem configurar um mesmo surto em decorrência do consumo de uma refeição
comum em um restaurante, com isolamento de E. coli (sem identificação de sorotipo/antígeno), de
Pseudomonas sp, Klebsiella sp e Citrobacter, em amostras de fezes dos pacientes.
Os alimentos consumidos foram salpicão a base de maionese, arroz, feijão e carne não
tendo sido apresentado o inquérito que permite detalhar o que realmente cada um ingeriu e as
taxas de ataque e cálculo do riscos. Não há dados se estas famílias estavam juntas, se
compartilharam de outras refeições em outros lugares e se haviam outras pessoas que ingeriram
da mesma refeição e não ficaram doentes.
O estabelecimento suspeito é um restaurante à beira da estrada, com uma clientela de
viajantes de diversas procedências e destinos, o que sem dúvida, dificulta a investigação. Contudo,
um aspecto positivo a ser ressaltado foi a notificação em tempo feita pelo hospital em Americana, o
que permitiria à equipe de vigilância epidemiológica (VE) de Americana levantar mais dados sobre
as duas famílias internadas. A falta desses dados impede, como dito anteriormente, conhecer as
taxas de incidência da diarréia, bem como, as taxas de ataque dos alimentos e seus respectivos
riscos (RR), para poder determinar quais alimentos foram responsáveis pelo surto. Além disso, não
foram feitos testes laboratoriais para os alimentos.
Pode-se afirmar aqui que faltou o relatório de investigação da equipe de VE do município
de Americana.

2. O quadro clínico de febre, vômito e diarréia (sem outros detalhes) e o período de


incubação provável que variou de 11 a 59 horas com uma mediana de 35 horas, leva a pensar nos
seguintes patógenos: Salmonellas, Shiguellas, E. coli patogênicas de algumas categorias, Víbrios,
Yersínia, Pseudomonas, Aeromonas e Campylobacter (DDTHA, 2002).

3. Os resultados de E. coli em 100% das coproculturas realizadas levantam suspeitas


sobre a carne servida, podendo ser veiculada também por outros alimentos, inclusive sucos, frutas
e verduras. Apesar de a maionese ser feita de ovos crus (segundo o relatório da Vigilância
Sanitária de Matão), não foi encontrada a Salmonella nas amostras clínicas dos pacientes.

71
Cepas de E. coli que causam diarréia são classificadas em seis categorias: a)
enterohemorrágica; b) enterotoxigênica; c) enteroinvasiva; d) enteropatogênica; e) entero-
agregativa e f) difuso-aderente; dentre elas comentaremos a quatro primeiras principais
(Benenson, 1995):
As E. coli enterohemorrágicas (EHEC), dentre elas a E. coli O157:H7, têm como principal
reservatório o gado, sendo transmitidas pelas carnes mal passadas, águas, sucos e verduras
contaminadas por fezes de gado. Os humanos também podem ser reservatórios. O período
mediano de incubação pode variar de 3 a 4 dias. As diarréias podem ser sanguinolentas,
principalmente em crianças e a doença pode causar seqüelas graves como insuficiência renal, em
decorrência da Síndrome Hemolítico-Urêmica (SHU).
As E. coli enterotoxigênicas têm como principal reservatório os seres humanos, e um
período curto de incubação, de 10 a 12 horas, podendo ser transmitida por qualquer alimento
contaminado; produzem diarréia líquida, profusa, semelhante a da cólera. É conhecida como
diarréia dos viajantes, acometendo pessoas que viajam de áreas mais desenvolvidas para menos
desenvolvidas, ou com precárias condições de higiene ou de saneamento básico.
As cepas de E. coli enteroinvasivas, também tendo como reservatório o ser humano e um
curto período de incubação -10 a 18 horas - podem ser transmitidas por qualquer alimento
contaminado, produzindo diarréia líquida semelhante a da Shiguella.
As E. coli enteropatogênicas - o reservatório também são os seres humanos - com período
de incubação curto, de 9 a 12 horas, são transmitidas, principalmente, pelas mãos contaminadas
com fezes e são responsáveis em grande parte pelas diarréias na infância.
Os dados desse surto como o período mediano de incubação, o achado de E. coli em
todas as coproculturas, o tipo de alimentos como carne e verduras, chamam a atenção para se
pensar também em E. coli O157:H7 - uma grande perda para a vigilância epidemiológica não ter
providenciado as subtipagens nesta investigação.
Cabe relembrar aqui que os resultados de E. coli devem ser encaminhados para o IAL para
as devidas subtipagens.
Os resultados de E. coli também deveriam ter desencadeado uma investigação mais
rigorosa por parte da vigilância sanitária no restaurante, tanto nos procedimentos de preparo e
conservação dos alimentos, quanto sobre a procedência da carne (condições do abate), das frutas,
verduras e outros alimentos.

4. Os patógenos Klebsiella sp, Pseudomonas sp e Citrobacter sp são bactérias


Gram-negativas que produzem diarréia aguda e também pode ser responsáveis pela cronificação
de doenças gastrointestinais. Podem ser transmitidos através de água e verduras contaminadas, e
por meio das mãos contaminadas por fezes, de pessoas sem sintomas. Ainda não se conhece a
proporção de cepas patogênicas e não patogênicas. Produzem também diarréia liquida, vômitos e

72
febre, com um período de incubação de 12 a 24 horas após a ingestão de alimentos ou água
contaminada (FDA/CD/DA, 2002).

5. Se realmente o almoço naquele restaurante foi a única refeição comum entre as


duas famílias, então os achados laboratoriais das amostras clínicas de pacientes neste surto
indicam a precariedade das condições higiênicas no preparo dos alimentos desse restaurante
sendo importante uma observação sanitária mais detalhada desses procedimentos de higienização
de verduras, da água utilizada, dos sucos oferecidos, do gelo preparado, além de todo o processo
de preparo de carnes e outros alimentos. Como já mencionado anteriormente, a origem dos
alimentos deveria ser verificada, principalmente a das carnes, frutas e verduras. É verdade que a
maionese à base de ovos crus é uma prática de altíssimo risco e poderia ser também a causa,
plausível, do surto, transmitindo não somente o seu principal patógeno a Salmonella Enteritidis,
mas também a E. coli O157:H7, se estes ovos estivessem, por exemplo, contaminados com
esterco de gado (DDTHA, 2002).
Orientar os restaurantes para a adoção de Boas Práticas e da Análise de Perigos e Pontos
Críticos de Controle (HACCP) é essencial para a prevenção de surtos veiculados por alimentos.
Divulgar os patógenos e as características das doenças veiculadas por alimentos, principais
sintomas, seqüelas e outros prejuízos à saúde dos comensais é uma tarefa das vigilância
epidemiológica e sanitária, que devem atuar de forma integrada realizando uma boa investigação
para detectar os fatores de risco e agentes etiológicos e atuarem efetivamente na prevenção
dessas doenças. Quantas pessoas, de diversos municípios e até de outros estados, que
almoçaram no dia 02.01.01 naquele restaurante, ficaram doentes? E se as práticas de preparo e a
origem dos alimentos permanecem as mesmas, quantos surtos continuaram acontecendo?

6. Nesta investigação há algumas lacunas que apontaremos aqui como reflexão e


estímulo as equipes locais a melhorarem seus programas de vigilância das DTA:

a) Primeiramente, o não envio a esta Divisão do RELATÓRIO DE INVESTIGAÇÃO


DE SURTO DE DTA (Formulário 5 – CVE) (CVE/SES-SP, 1999) por parte das Vigilâncias
Epidemiológicas responsáveis pela investigação dos pacientes no hospital (Vigilância
Epidemiológica de Americana e/ou da DIR XII – Campinas) não permite o conhecimento exato do
perfil epidemiológico do surto. Faltam informações sobre a hora do início dos sintomas, freqüência
dos sintomas e as características das diarréias. Não há dados sobre a ingestão de alimentos para
cada paciente, incluindo informações sobre bebidas, água, gelo, etc., e nem dados sobre o que
ingeriram os outros com ensais. Os pacientes permaneceram internados um dia e na
impossibilidade da coleta de todos os dados no hospital, visitas domiciliares, tanto em Americana
quanto em Santa Bárbara do Oeste, pelas respectivas vigilâncias epidemiológicas, teriam sido de
grande utilidade para completar a investigação.

73
b) As cepas isoladas de E. coli deveriam ter sido encaminhadas para o IAL - Central
para as devidas subtipagens. Se o resultado fosse E. coli O157:H7, investigações adicionais
deveriam ser feitas, principalmente, para se verificar a origem da carne, tipo de criação do gado
bovino e o levantamento de possíveis outros casos nas regiões.

c) O tipo de surto, causado por um restaurante para viajantes, envolvendo duas


cidades pode indicar que naquele dia, e até em outros (pelas irregularidades encontradas e pelos
patógenos isolados) tenham ocorrido muito mais casos que não foram detectados por esta
investigação. Em surtos com estas características são recomendadas algumas iniciativas como
rastrear nas regiões próximas, em seus hospitais, casos de internação com história alimentar
semelhante ocorridos na mesma semana epidemiológica do surto; por exemplo, neste episódio,
contatar, por telefone, os principais hospitais das regiões de Campinas, Piracicaba, Araraquara,
Ribeirão Preto e São José do Rio Preto, trocando informações entre as respectivas DIRs e
Municípios. Outra iniciativa que melhora os resultados é rastrear os principais laboratórios de
patologia clínica, levantando os patógenos isolados no período do surto, nomes e endereços de
pacientes, locais de atendimento médico, realizar as visitas hospitalares ou domiciliares, e buscar
correlacionar os casos, podendo-se assim, a partir destes dados, conhecer melhor a extensão
desse tipo de surto, inter cidades.

d) No dia da inspeção sanitária, não foram coletadas, no restaurante de Matão,


amostras de sobras de alimentos que causaram o surto ou mesmo dos alimentos preparados no
dia dessa visita, ou de seus estoques e das matérias primas, que pudessem documentar e
incriminar as práticas inadequadas de preparo de alimentos no referido restaurante. Não há
informações se a vigilância sanitária inspecionou os locais de abate e venda da carne e os de
produção e venda de frutas e verduras. Também não há referências sobre a água utilizada para
preparar os alimentos. Mudanças nas práticas de manipulação, higiene e preparo dos alimentos,
cuidados com a temperatura, incorporando a higiene rigorosa das mãos têm se mostrado mais
eficientes que orientações de caráter estrutural, como as preocupações com o azulejo, telas, etc.,
ainda que estas sejam necessárias.

e) Este surto, inter-municipal, mostrou o quanto é importante buscar uma integração


entre as vigilâncias e os vários níveis - central, regional e municipal. As vigilâncias epidemiológicas
e sanitárias de municípios e DIRs devem continuamente visitar o site da Divisão de Doenças de
Transmissão Hídrica e Alimentar – para verificar as notificações de surtos e melhor detectar a
extensão deles em busca de medidas mais eficientes. Os dados de MDDA (Monitorização da
Doenças Diarreicas) e AIH/DATASUS, fornecem importantes indicativos de ocorrência de surtos e

74
podem ajudar na complementação das investigações. Uma investigação bem sucedida leva a
tomada de medidas corretas.

f) As Vigilâncias Epidemiológicas devem desenvolver juntos aos hospitais e


laboratórios das regiões programas de incentivo as notificações de surtos. A notificação imediata
facilita a investigação e permite a coleta de dados para se chegar ao agente etiológico e à real
fonte de transmissão.

g) Finalmente, apesar das lacunas na investigação e das dificuldades impostas pelo


tipo de surto, a análise dos achados permitem tomar as medidas de prevenção de futuros surtos.
Não somente as conclusões positivas permitem às equipes de saúde desencadear ações que
previnam outras ocorrências.

Caso você queira acrescentar ou corrigir algum dado sobre este surto ou comentar algum
aspecto dele escreva para dvhidri@saude.sp.gov.br, indicando no e-mail, em Assunt o:
“Comentários para o REV NET DTA“.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. BENENSON, A.S. (Editor). Control of Communicable Diseases Manual. 15º ed. Washington,
DC: An official report of the American Public Health Association,1995.

2. CVE/SES-SP (Centro de vigilância Epidemiológica/Secretaria de Estado da Saúde de São


Paulo). VE-DTA - Manual do Sistema de Informação - Investigação de surtos. CVE. São Paulo,
Out. 1999.

3. DDTHA/CVE (Divisão de Doenças de Transmissão Hídrica e Alimentar/Centro de Vigilância


Epidemiológica), 2000. Quadro geral de Doenças Transmitidas por Alimentos. INFORME NET
DTA. http://www.cve.saude.sp.gov.br < doenças transmitidas por alimentos> <Doenças>
<Quadro geral>, São Paulo, 2002.

4. FDA/CDC/DA. Klebsiella and others. BAD BUG BOOK. In: http://www.fda.gov <Foodborne
Illness>, 2002

75
NOTÍCIAS

Aprimorando a vigilância epidemiológica do Botulismo


A DDTHA/CVE realizou nos dias 27 e 28 de fevereiro de 2002 o Curso de Atualização em
Botulismo, para 160 pessoas, incluindo as vigilâncias epidemiológicas e sanitárias de DIRS e dos
principais municípios com hospitais de referência, médicos clínicos, pediatras e neurologistas de
hospitais de referência e profissionais de laboratórios de saúde pública.
O conteúdo do curso encontra-se disponível em slides no site http://www.cve.saude.sp.gov.br
<doenças transmitidas por alimentos> <programas, projetos e ações> <aulas>

REV NET - DTA - Revista Eletrônica

Divisão de Doenças de Transmissão Hídrica e Alimentar - DDTHA-CVE/SES -SP

Maria Bernadete de Paula Eduardo - Coordenação geral/DDTHA


Elizabeth Marie Katsuya
Joceley Casemiro Campos
Maria Lúcia Rocha de Mello
Mônica T. R. P. Conde
Nídia Pimenta Bassit

Diretor do Centro de Vigilância Epidemiológica - CVE/SES-SP


José Cássio de Moraes

76

También podría gustarte