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Escrevinhação n. 758
DO PATRIMONIALISMO – BREVE MANUAL DE SOBREVIVÊNCIA
Redigido em 08 de maio de 2009, quarta semana da Páscoa,
dia de Santo Acácio e de São Vitor, o Mouro.

Por Dartagnan da Silva Zanela

“A política é a arte do possível. Só os


tolos, os santos e os gênios pretendem o
impossível1”. (J. O. de Meira Penna)

- - - - - - - + - - - - - - -

INTRODUÇÃO

O presente ensaio tem por intento discorrer

sobre algumas questões a respeito da cultura política

brasileira, em especial no que tange o forte traço

patrimonialista na mesma. Para tanto, iremos em um primeiro

momento tecer uma reflexão sobre os discursos dominantes

que imperam na opinião pública (mídia impressa, acadêmica e

materiais didáticos utilizados nas Instituições de ensino

brasileira) e confrontá-las com algumas notas da realidade

brasileira que esses discursos pretendem explicar.

Doravante, a partir de um referencial weberiano

e junguiano ir-se-á discutir o que é o patrimonialismo,

quais as suas principais características e que de modo tais

1
Vide: PENNA, José Osvaldo de Meira. Política Externa - Segurança e
Desenvolvimento. AGIR, Rio de Janeiro, 1967.

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traços influenciam o modo brasileiro de conceber o Estado e

de viver as relações políticas ordinárias.

1. A PROCURA DE UM CENTRO

Se nós fôssemos definir, em termos sociais e

econômicos, a sociedade brasileira, como nós faríamos isso?

De que maneira nós classificaríamos as políticas de Estado

brazuca? Enfim, que nome nós daríamos a tudo isso que há?

Se formos tratar os discursos sobre o assunto que se fazem

presentes na mídia impressa, nos círculos de “cientistas

sociais” e no meio educacional de um modo amplo e

irrestrito, concluiríamos que nossa sociedade e as

políticas de Estado são, em regra, “capetalistas”. Pior,

muitos dirão hoje que em nossa sociedade impera o tal do

Neoliberalismo, não é mesmo?

Pois bem, todavia, como todos nós sabemos,

nunca se deve tratar um discurso como se ele tivesse um

valor em si. Proceder assim é literalmente usar as palavras

como um reles topus (ZANELA, 2009a). É permitir que essas

palavras não significativas sejam utilizadas para manipular

e tolher nossa percepção da realidade e, deste modo,

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restringir o nosso horizonte de consciência (CARVALHO,

1999).

Por essa razão, devemos não apenas ficar presos

a imagem descrita das coisas como se elas tivessem um valor

independente da realidade (CARVALHO, 1996), mas sim,

retornar a elas (HUSSERL, [s/d]), para as coisas que as

palavras estão (ou não) nos descrevendo.

Afirmamos isso em vista do fato de que, na

maioria das vezes, nos é dito o que os desafetos do tal

capitalismo pensam dele e não o que ele é. Toda vez que se

procura descrever algo nessas bases, o que temos não é uma

explicação do fenômeno, mas sim, uma descrição do que o

indivíduo imagina que seja o fenômeno com base naquilo que

o mesmo deseja que tal coisa venha a ser. Ou seja: o

elemento fala muito mais dos seus sonhos do que da

realidade que está diante de seus olhos, invertendo assim a

categoria da paixão e pela da substância (ARISTÓTELES,

1999).

Dito isso, partamos para uma demonstração do

que estamos apontando. Vejamos: qual seria uma

característica basilar de uma sociedade francamente

capitalista? Seria, primeiramente, o estímulo a livre

iniciativa sob o império da lei (MISES, 1987) e a confiança

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(PEYREFITTE, 1999). Trocando por miúdos, uma sociedade com

uma economia aberta é onde o Estado procura facilitar ao

máximo o desenvolvimento da livre iniciativa (dos projetos

individuais e grupais) e a sociedade, por sua deixa,

procura estimular os indivíduos inovadores para que façam o

que melhor sabem fazer, correto? Pois bem, então vejamos um

dado extraído de nossa realidade brazuca e comparemos com

os dados de uma outra nação, essa, francamente capitalista.

Vejamos o tempo que se gasta para abrir uma

empresa. Quando mais rápido for menor serão os impedimentos

apresentados pelo Estado e sua burocracia com vista a

estimular a livre iniciativa dos indivíduos, correto? Então

vejamos: na Austrália uma pessoa leva 2 dias, em média,

para abrir uma empresa; Canadá e Nova Zelândia, 3; já em

Hong Kong são 11 dias de burocracia; já no Brasil, um

cidadão leva, em média, 152 dias2. É mole ou quer mais?

Aí, eis que surge a pergunta que não quer

calar: como uma sociedade com essa característica pode ser

definida como capitalista? Bem, na cabeça de um marxista

2
Essas informações encontram-se disponíveis no Doing Business 2004,
resultado de uma pesquisa desenvolvida pelo Banco Mundial que
classificou 133 países por sua capacidade de incentivar o crescimento
econômico e a geração de empregos. O referido estudo encontra-se
disponível na internet: http://portugues.doingbusiness.org/.

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tudo que não é marxista (ou que ele não goste) é

capitalista3, e ponto final.

De mais a mais, segundo matéria de Eurípedes

Alcântara e Chrystiane Silva que:

Segundo o trabalho, "duas décadas de reformas


macroeconômicas na América Latina não
diminuíram o ritmo de crescimento da pobreza".
Segue-se a sugestão de que as razões para os
maus resultados devem ser buscadas agora
também na "qualidade das instituições". A
relação entre instituições sólidas e riqueza é
uma proposição que deu o Prêmio Nobel ao
economista americano Douglass North. O esforço
estabilizador e o sacrifício que todos os
brasileiros pagaram, na forma de juros altos e
crescimento econômico medíocre nos últimos
anos, fincaram as bases para as reformas
institucionais. Sem a estabilidade, os
aprimoramentos propostos por North e
sacramentados pelo Banco Mundial têm efeito
igual a zero. Do ponto de vista de sua
viabilidade prática, a melhoria institucional
tem duas vantagens sobre o ajuste financeiro e
a sanidade das contas públicas. Primeiro, as
reformas que ela exige são infinitamente menos
dolorosas de ser feitas. Segundo, a melhoria
institucional não tem ideologia. Aprimorar a
Justiça, acabar com a burocracia, flexibilizar
as leis de trabalho ou diminuir o risco dos
empréstimos só com muita má vontade podem ser
consideradas bandeiras ideológicas de qualquer
tipo. São bandeiras do bom senso. Só isso.
(2004)

3
Sugerimos também a consulta do Índice de Liberdade Econômica,
pesquisa realizada pela Heritage Foundation e pelo Wall Street Journal
onde o nosso país ocupa a 105.º colocação. O referido estudo está
disponível na internet: http://www.il-rs.org.br/. Feito isso, faça o
cruzamento destas informações com os dados do IDH (índice de
desenvolvimento humano) para visualizar a relação que há entre
liberdade econômica e desenvolvimento humano.

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Seguindo em frente, lembramos aqui que nosso

objetivo com essa breve exposição introdutória é apenas

demonstrar que praticamente tudo o que se fala sobre a

nossa realidade política, social e econômica não passa de

uma grande ficção ideológica, um (i)legítimo delírio

interpretativo.

Cara, se nós somos então realmente capitalistas

porque a organização de nossa economia não é similar a

organização da Austrália e de Hong Kong4? Porque

simplesmente o Brasil não é uma nação capitalista, mas sim,

pré-capitalista e, nosso Estado e bem como a nossa cultura

política são fundamentalmente patrimonialistas. Entretanto,

o que é isso? É justamente o que pretendemos explicar nas

próximas laudas.

2. DO PATRIMONIALISMO

Antes de iniciarmos a exposição da explicação

do que seja o fenômeno político chamado patrimonialismo,

solicitamos que o leitor, a cada nota que formos apontando

sobre essa realidade procure, mentalmente, encontrar em sua

memória alguma situação que realmente se encaixe no que


4
A Primeira uma ex-colônia (despojos de bandidos), como nós fomos no
início de nossa formação histórica como nação, e a segunda, um ex-
protetorado Britânico.

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estará sendo descrito para que, dessa maneira, não caímos

no mesmo erro que muitas das vezes caímos por confiarmos

plenamente nos discursos que nos são apresentados como uma

verdade irrefutável.

Caímos nas malhas do engano, não pela coerência

do que está sendo dito com o objeto descrito, mas apenas

porque a maioria diz que é assim e isso, meus caros, é o

tal do consenso que, por sua vez, não é um critério muito

confiável de veracidade, mas sim, um instrumento sutil para

o desenvolvimento das mais variadas picaretagens5.

Dito isso, vamos ao ponto do conto. A primeira

característica que deve ser destacada para compreendermos o

que vem a ser o patrimonialismo é quando ao ethos do

indivíduo humano que vive em uma sociedade desse gênero.

Bem, segundo José Oswaldo de Meira Penna, o ethos do ser

brasileiro seria basicamente a sobreposição de relações de

caráter afetivo e pessoais sobre relações de caráter

racional (1999), similar ao homem cordial de Sérgio Buarque

de Holanda (1999).

Lembremos aqui, neste ínterim, que o conceito

de homo eroticus de Meira Penna é um tipo ideal Weberiano,

5
E, se o tempo permitir e a vontade colaborar, verifique as
referencias e fontes apontadas no correr das laudas deste mísero
ensaio, pois, se essas se encontram apontadas nas páginas não é por
pedantismo, mas sim, para melhor demonstrar o que estamos descrevendo
e assim, apontar os caminhos que vão além destas palavras diditadas.

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ou seja, não estamos afirmando que nós, brasileiros,

sejamos 100% emotivos e irracionais, mas sim, que na

maioria das situações vivenciados por nós, as relações de

caráter afetivo e pessoal se sobrepõem as relações de ordem

racional-legal.

Para tanto, recorramos a um exemplo para nos

fazer mais claros quanto a esse ponto. Imagine uma fila de

banco onde um indivíduo por ser conhecido do caixa, ou por

ser uma pessoa que se reconheça como sendo um “otoridade”,

passa a frente de todo mundo e vá junto ao caixa para ser

atendido. Se tal situação ocorre nessas paragens verde-

amarelas, a fila fica em silêncio diante do gesto. Pode até

haver uma e outra pessoa que se manifeste frente ao

ocorrido (os barraqueiros) e, provavelmente muitos fiquem

sorrateiramente comentando o ocorrido, porém, não movidos

pela indignidade do gesto, mas por um sentimento de inveja,

digamos assim, por não ser ele um dos conhecidos do caixa

(DAMATTA, 1986).

Porém, se tal cena ocorresse em uma fila nos

Estados Unidos da América, mais do que depressa, a fila

toda iria enxovalhar o furão (DAMATTA, 1986). Bem, mas qual

a razão dessa diferença de postura? No primeiro caso, as

relações afetivas se sobrepõem as de caráter racional e na

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segunda, temos o inverso, pois, como bem nos explica

Roberto Da Matta,

De um lado, temos as leis que o código liberal


pretende instituir como universais e válidas
obviamente para todos. Mas, do outro, temos as
relações imperativas com os parentes e amigos.
[...] não temos capacidade para “resistir as
sugestões da amizade e da gratidão, para
sobrepor as contingências do personalismo os
grandes interesses sociais, que caracteriza a
nossa índole cívica e define as tendências
mais íntimas da nossa conduta no poder. (1986,
p. 43)

Por essa razão que em uma sociedade

patrimonialista não há uma clara distinção entre o que seja

público e privado. Legalmente nós sabemos que há, todavia,

também como todos nós sabemos, a maioria absoluta de nossa

legislação não é nascida de nossos costumes. Pelo

contrário, boa parte dela é literalmente o oposto do que se

vive e pratica na vida cotidiana, em especial no que tange

as relações de poder (ZANELA, 2004).

Para averiguarmos esse ponto, basta que

volvamos nossas vistas para o modo como os representantes

públicos e mesmo os pacatos cidadãos encaram o poder

público (em especial, a nível municipal) e veremos

claramente que a coisa pública é tratada como uma coisa

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particular onde, como nos fala o Marquês do Paraná, aos

amigos é ofertado tudo, aos inimigos nada e, aos

indiferentes, apenas os rigores da lei. Ou seja, a letra da

lei reza que todos nós devemos ser tratados de modo igual

perante ela, porém, a nossa cultura política faz votos e

procissões em contrário em visto do que denota o nosso

forte traço patrimonialista presente em nossa sociedade.

Doravante, em uma sociedade patrimonialista, há

uma forte intervenção do Estado na economia. Essa

intervenção se dá de maneira direta (através de criação de

monopólios ou de Empresas Estatais) ou indireta (através de

uma elevada carga tributária que, em regra, não chega a ser

utilizada para os fins que justificam a sua existência).

Trocando por miúdos, tudo que há no reino pertence

diretamente, ou indiretamente, ou potencialmente ao “rei”.

Historicamente, em nosso país, a economia

sempre foi controlada direta ou indiretamente pelo Estado.

Nos idos coloniais, tudo o que aqui havia pertencia ao Rei

de Portugal e, por essa razão, tinham privilégios

exploratórios apenas os “amigos do rei”, como no caso das

Capitanias Hereditárias, da Companhia das Índias Ocidentais

e do Distrito Diamantino (ZANELA, 2004). Nos idos do

Império, através do controle da produção agrícola exercido

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pelos comerciantes ligados ao Império (FAORO; 1989). Nos

idos da República Velha com a política do Café com Leite

(MOTA, 1978). Nos tempos de Vargas ou mesmo dos Governos

Militares, o que mais temos acentuado é justamente a

intervenção do Estado na Economia e, nos dias hodiernos,

tivemos uma relativa privatização de alguns setores da

economia, porém, além de não se ter quebrado os monopólios,

elevou-se consideravelmente a carga tributária em nosso

país nas últimas décadas (CONSTANTINO, 2005).

Fonte: http://www.sefaz.ba.gov.br/

Juntamente com essa intervenção do Estado na

economia, nós temos a construção de uma persona (máscara)

de modernidade sob a sociedade que acoberta a estrutura

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econômica arcaica e as relações de poder mandonista (PENNA,

1999).

Em uma sociedade patrimonialista prima-se pala

preservação da estrutura existente para manutenção do

status quo vigente, porém, procura-se encobrir tudo isso

com uma imagem de modernidade. Imagem essa que, via de

regra, se caracteriza pelas reformas urbanas como as que

ocorreram na cidade do Rio de Janeiro no início do século

XX e mesmo na construção nova Capital, ou pela construção

de obras de grande vulto que simbolize tudo aquilo que o

Brasil literalmente não é.

De mais a mais, é fundamental que se mantenha

um relativo controle sobre o setor econômico para a

manutenção da ordem vigente, pois, como a base das relações

de poder em uma sociedade patrimonialista é firmada na

figura da pater família (PENNA, 1988) com seus pactos

morais, clientelismo, compra de votos, troca de favores,

tráfico de influencia e tutti quanti, é fundamental que

haja certa concentração de poder nas mãos dos mandatários

e, em especial, nas mãos do mandatário mor, que é o Governo

Federal (LEAL, 1997).

Por essa razão que até os dias de hoje uma

distribuição tão desproporcional da carga tributária em

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nosso país, justamente para facilitar as manobras que

perpetuam a ordem Estatólatra existente. Nos dias atuais,

após as transferências de receita, os municípios ficam com

apenas 16,6 % do bolo tributário. Sem essa transferência,

esses membros da Federação ficam com apenas parcos 4,3 % da

arrecadação.

Com uma distribuição iníqua como essa fica mais

do que facilitado a cooptação dos mandatários locais

(municipais) pelos mandatários Estaduais e Federais através

do repasse de recursos que são feitos através de Emendas

Parlamentares ou de outras práticas que, falando o

português bem claro, não passa de um processo imoral de

compra de voto feito com o uso do dinheiro do próprio

contribuinte, pois, para “facilitar” tal transferência, é

feito, informalmente, um pacto moral dos mandatários

municipais com os mandatários maiores onde se garante os

referidos recursos públicos mediante uma quantidade mínima

de votos a ser ofertada a eles na forma de um holocausto

eleitoreiro.

Observando a organização do Estadossauro por

essa perspectiva, compreende-se facilmente porque há uma

tão baixa circulação de mandatários no poder (FERNANDES,

1975). Todo aquele que se encastela nas potestades estatais

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tem literalmente a maquinaria estatal a sua disposição para

manutenção de seu lugar dentro dessa cosa nostra tupiniquim

(PENNA, 1992).

Fonte: http://www.sefaz.ba.gov.br/

Por esse motivo que nossa carga tributária não

cai, pois quem elaborara as leis que mudariam essa situação

são justamente aqueles que mais se beneficiam com o estado

em que se encontra nossa nação. De mais a mais, o cidadão

médio brasileiro elege como critério para escolha de seus

legisladores não aqueles que poderão apresentar projetos de

lei que tenham esse objetivo, mas sim, naqueles que

“ajudaram” o seu município. Ou não?

Por fim, em uma sociedade com essa feição,

predomina uma cultura que além de não estimular a

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iniciativa individual e a autonomia das pessoas frente as

massas afirma que o Estado seria a via principal para

realização plena do ser humana e como caminho favorável

para resolução de todos os problemas (ZANELA, 2005).

Em uma sociedade com esses traços o Estado é

visto como um ente capaz de suprir todos os problemas e

mesmo resolvê-los. Não é por menos que as pessoas, de um

modo geral, não se espantem com a grande quantidade de

papeis que os tentáculos do Estado vão assumindo. Ao

contrário, acham isso extremamente positivo. Sobre este

ponto, deve-se destacar o fato de que a sociedade

brasileira

[...] em sua origem, uma sociedade rural,


“semifeudal”, que ainda não havia conseguido
criar uma burguesia nacional capaz de
desenvolver a economia do país, criando um
capitalismo moderno que trouxesse consigo uma
classe operária também moderna, que
eventualmente implantasse no país o
socialismo. Na luta entre o latifúndio
tradicional e a burguesia moderna, no contexto
da Guerra Fria, o latifúndio seria um aliado
do imperialismo, mantendo o país dominado e
subdesenvolvido, incapaz de ser superado por
uma burguesia nacional que não se assumia, um
proletariado incipiente e um campesinato
subjugado. Tudo deveria acontecer e se
explicar pela luta de classes, e o Estado não
seria mais do que o executor e defensor dos
interesses das classes dominantes. O problema,
no Brasil, era que as classes nunca se
organizavam nem agiam como deveriam
(SCHWARTZMAN; 2003).

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Tal formação histórica acabou por facilitar a

concentração de poder nas mãos amorfas do Estado tornando

as idéias liberalizantes algo indesejável nas terras de

Pintorama, visto que, para o estamento que se assenhora do

poder no Brasil não seria algo mui interessante permitir

que a sociedade, de fato, tivesse uma maior autonomia

decisória sobre os que deveríamos fazer com nossas vidas.

Por essa razão,

As tentativas de introduzir os ideais liberais


dar-se-ão em um solo ingrato para eles: uma
realidade estamental oculta e sobrepuja as
classes sociais que não conseguem se
desenvolver em um capitalismo conduzido pelo
Estado: “não chegamos a importar e adotar o
capitalismo. Em lugar dele, com preocupação em
queimar etapas, reforçamos o capitalismo
politicamente orientado, com o traçado de um
patrimonialismo político, segundo os termos
weberianos. Esse sistema, pela sua abrangente
burocracia, foi confundindo com o Estado e com
o excesso de Estado, quando na realidade, ele
não se coaduna sequer com o conceito de nação
moderna. (FAORO, 1992)

Devido a esse cenário em que vivemos e

existimos, os interesses meramente locais e parvamente

pragmáticos se sobrepõem a qualquer interesse realmente que

seja realmente público. Trocando por dorso, inexiste na

cultura política brasileira a idéia de bem comum e de

espírito público. Praticamente não há tal idéia e,

conseqüentemente, o que nós entenderíamos por unidade

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nacional seria tão só uma grande ficção. Não? Ora, então

qual é o traço que nos faz, do Oiapoque ao Chuí, nos

reconhecer como brasileiros? Futebol e telenovela não

valem, pois são fenômenos recentes em nossa sociedade. fora

isso, quais são as notas que nos caracterizam como sendo o

que somos?

De mais a mais, não podemos nos esquecer dos

inúmeros conflitos separatistas que assolaram o nosso país

no correr de nossa história. Desde os idos coloniais até a

primeira metade do século XX, a história de nosso país foi

marcada por conflitos que tinham como intento separar parte

do território nacional para formar uma nova nação.

Bem, cônscios disso, caberia então a pergunta:

como então foi mantida a unidade territorial de nosso país

no correr de sua existência histórica? Através do Estado

Centralizado e da maquinaria burocrática que deu e dá

unidade a todo o território brasileiro mesmo que não existe

uma clara imagem do que seja a identidade do ser brasileiro

(ZANELA, 2004).

Por fim, depois da exposição feita até essa

esse momento, poderíamos levantar mais uma indagação. Quem

representaria a elite econômica em nosso país? Basta que

nos perguntemos: quem fica com a maior fatia do PIB e

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teremos a nossa resposta que, por sua deixa, não será nem

os empresários, nem os banqueiros e muito menos os

produtores rurais, mas sim, os membros do estamento estatal

que controlam, potencialmente, mais da metade do produto

interno bruto de nosso país6. Por essa e por outras razões

que nosso país está muito distante de ser uma nação

francamente capitalista e de ter instituições minimamente

democráticas ou, como dizia o finado Roberto Campos, o

problema maior de nosso país não é o excesso de

capitalismo, mas sim, a falta de capitalismo e o excesso de

patrimonialismo.

REFERÊNCIAS

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piores do mundo. In: Revista Veja, Ed. 1838 de 28 de janeiro de
2004.

ARISTÓTELES. Organon. São Paulo: Nova Cultural, 1999.

CARVALHO, Olavo de. Ser e Poder - Questões Fundamentais da


Filosofia Política. [s/Ed.], 1999.

6
Segundo a RCS Auditoria e Consultoria: Em um estudo feito pelo IBPT
(Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário) revela que a carga
tributária potencial, nesse caso, é de 59,38% do PIB (Produto Interno
Bruto). [...] Segundo o advogado Gilberto Luiz do Amaral, presidente
do IBPT e um dos autores do estudo, o sistema tributário brasileiro
onera demais a produção e os salários --somente essas duas bases
representam mais de 76% da arrecadação total. "Isso gera uma enorme
injustiça fiscal, inibe o crescimento econômico e é a principal razão
da economia informal”. O sistema tributário onera demais a atividade
produtiva e os salários e muito pouco os ganhos financeiros (a taxa de
juros reais está em torno de 10%). Para chegar aos 59,38% da carga
potencial, o IBPT exclui da receita total o valor de multas, juros e
correção e inclui o que foi sonegado e a inadimplência. Disponível na
internet: http://www.rcsauditores.com.br/.

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