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J OSÉ DA SILVA PI cA O

AT RA VÉS
DOS

CAMPOS
JOdt da <SIlva 'P/CãO
JOS É DA S I LV A P ICÃO

ATRAVÉS
DO S

CAMPOS
U S O S E COS T U M ES A G RI C OL O .A L E N T E J A N O S
(CONCEL HO D E EL VAS)

2.° EDIÇÃO

LISBOA
NEO (: RAV U H:A, LIMI 'I' .\ D A
Travessa da Oliveira (à Estrêla), G
) 1 9 ~ 7
À G U I S A D E INTROD UÇÃO

f}1111 EU caro Dr. Ti erno da Silva: - Con fesso-Lh e: - mio s ei bem p or qae
I I L tltulos, (afora os qu e m e em p resta o seu solido e velho afect o. e o
consequen te desej o ele m e ver aqui) eu dou. com igo na larg a p or-
tada deste sério e belo livro. em fan ções de reposteiro -mor, Confesso-the,
ainda e m ai s llma l)ez : - afiqura-se-me um [eio a cto de usurpaçã o a ceitar
um p08tO~ p or direito p ert encente a outrem q ue, p or mérito prôprio, m ais o
m erecesse e co m eLe m elhor se h ou vesse. Ma » co nfesso-lhe, tam bé m com a
mesm a franqueza: - d es vaneci dos 08 men ·s escrúpulos p elo imperativo da
sua insistência , dá-m e uuz tríplice prazer este cargo d e introdut or em qu e a
sua a m izade m e investiu.
Em p rim eiro lugar, o ensejo d e p oder p resta r h omena g em a q uem , co mo
o Autor desta obra , soube di gnificar a n obre arte d e escrever p elo bom. uso
que de la [e z , e p ara o m ell gosto d e a dm irar lim a co nsolaç ão e norme,
Em sequndo, d esoanece-me a p ossibilidade d e co laborar, (ainda que t ão
pobre e apaqada mente) num a cto d e rep a ração m ental, com O é o d esta ca ri-
nhosa ex umaçào ás inércias d o esquecimento e111 que a inqratid ão d os vivos
o havia sep ulta do, de nm LivI'O que, p ela riqueza d a su a s ubstância e pela
sagestividade da s aa fo r ma, nà o so tem todo o d ireito a ser- lido pelos q ue o
ignorarem e r elido p elos q ue j á o co n hecem, m a s, ainda e também , to dos as
condições p a ra continuar a ser, p ela co nstância da lei tura, nm zr {orça
a ctuante e fec u nda d e cultu ra e d e amor ri Terra , Em terceiro Iuqa r, (este t«
de na tureza pessoal e subjectiva), o f alar d este Livro r epres en ta p ara mim
um retorno p elos atalhos d a m em ória a tempos di s tantes, que as primeiras
saudades d a velh ice começam a r edourar d e pungente encanto . " "
Eu lhe co nto :

/{"'\ OBR ARr1. o cabo d os vin te a nos - ve rdes e seicosos vinte a nos, men inos
U e m oços, am imados p elos a fa g os m a ternais d essa s uavissim a paisaq eni
d a beir a - V oug a q ue os tro uxer a a os p eitos e a o co lo _ q ua ndo 08 a8a1'e8
de urna mal-encetada burocracia a tiraram co m igo , d e 8u rp resa, par a as
extremas do A lto A lentejo, rás-cée da s Esp a nhas.
O A lentejo I . . .
P ara a minlia imaqina ç ão d e beirã o co n fi nado n os horizo n tes limitados
da sua p roo incia niontezinha, e n es ses b ons tempos , em q ue a ve locid a de
desfloradora do s transportes m odernos lid o havia, ainda, obliter ado a
noçà o e o mistério da s distâncias, es ta palavra sugeria o q ue r que fos s e de
a ventura - de tal s or te ela so ava d entro d e m im. a long e. a [im-de-mundo . . ,

v
Conservo, viva e chocante como se {ora de ontem, a lembran ça da emoção
com que desgarrei da terra e dos aluoroços de iniciaçã o em que fiz a pri-
meira viagem para lã.-começos de um estnan te e atriçareiro Lunlio, a o longo
de um comprido dia ois toeamonte amanhecido por entre os viços primaveris
do meu r eflorido rincão e d esoladamente anoitecido 1108 longes en ig m á ticos
da savana. por en tre searas já retisnadas p elo 8 0l~ campinas d esertas de
povoado e e:'!I:angues, de cor, a caminho d e Eloae.
Ainda me sangra n os olhos e na alma o exaspero viole nto d es se cre-
p úscuto 1 Aos seus reverberas d e {ogo entrei a s p ortas da cidade. p or onde.
já noite. diambulei, es ba r ra nd o a cad a esq uina d e ruela esga lg a d a . já m er-
gulhada na sombra. com os esp ect roe do Passado d e que as s ombras
enchiam o velho burgo prenhe d e História.
R eoejo-me, mais tarde. por h oras altas de uma ardente velada d e «tr a -
vessia», l ZO terra ço alcandorado d o h ot elzito em qu e m e Iiospedei .. e r evivo a
cur iosidade qua 8e d olorosa de min úcias com que os m eu s olhos excitados e
inson es p ers crutaram a novidade est ra nh a de tudo o qu e m e ro de aoa i-s d esde O
casario apinhoado e miudinho d o mumificado burgo m ourisco, es torceqado
p elo abraço n egro das muralha s. lodo ca iado de um branco q ue suger ia a lb or-
nozes. d entro da noite aluarada e branca. atê 0.'3 con f ins vagos da linha do
horiz onte. cortando em. r ecta o cé u translü cido, com o a s d o mar-alto . . .
T onto de fadiga. de calma. d e luminosidade, d e amplidão. ali m esmo
adorm eci sob a mais d escons ertante das iutpre sôes : - a de n as curtae h aras
d e um dia d e j ornada. ndo m e haver apenas d eslocado UUla centena d e légua s
110 esp aço , mas dado. também , o salto de atquus m eses no tempo. ta l a s en-
saçào viole nta d e outono com. que a atn areidã o dos ca mpos, a seq uid ão d o
ar. haviam agredido os m eu .'3 sentidos. p ela tarde {ora. e a n oite , e ll tâo ~
completava. enooloe ndo -tne no esta g na mento cá lido da s ua flvida agon ia. paz'
sobre tanta coisa llova em qu e o m eu olh a r s e es treava .

Essa se nsação . agra vou-se no dia s eguin/e. quando, ao d esa brochar do


so l em brasa p or sobre lon jurae descampadas de m esses ourescentee o u de lO

charnecas adu stas. [e r re tea d a s p elo ritue amargo da ester ilid a de. atra vess ei.
balaceando-m e num churri ão de molas d e aziulio, ao cho uto sonolento de uns
corp ulen tos muares. os «b a r ros » d e Elvas. caminho de Campo Moior.
Tal jornada [oi, p or a ssim diz er. o m eu prim eiro co rpo-a -co rp o d e
h om em do Norte e do Vale com o Sul e a Planície.
Oh 1 E como tudo o que eu ia vend o era estranhamente hostil ao senti-

VI
menta da natureza arreigado dentro de mim pela terra em que m e criara-
com se us horizontes fechados cm abraços sobre nós; sua qrandeza suave de
montanhas .. a do çura idIlica dos s eus va les ; a gama infinita e aleqre das
suas tintas; a variedade continua das suas p erspecti va s; a p oesia misterioea
das s uas alfombras, das suas levadas e d os seus rios . . .
A toda a roda, por entre farrap os de mato arborescente, d e esteoas vir-
gen s , de olioed os e cliaparrais, estiravam-se léguas e léguas d e terras d e
amanho e de pousio, em chão ra so. Um leve encre sp a r d e colina s tentava,
a qui, mai.Q a lém, illtumecer a crosta do 8010; mas breve abatia como vaga s
quebradas. na p la nu ra te imosa, n ivelando-se e empastando-se com a distdn-
cia n as p ince lad as indecisas dos Últimos p lanos,
O q uadro que m e rodeava era 'em d úoida grandioso; mas pobre d e
g raça e de ritmo, d e p ormenores, d e va r ied a d e e d e co r, para além d os
ama relos do sol e das ervagens secas, d o verd e cin zento d os olived os e d os
azin hais, do azul cril e envolvente d a a tm os fera, Outros tons, s e os havia ,
perdiam -se. Iundidos na cenograf ia baça d os long es.
Lés a lés do h oriz on te, o d esp ovoa do a lastrava . Aqu i, a lém, emerq io m
da lisura obstinada do solo, projectand o- se no infinito, as s ilhue tas r ara s
e extáticae de pastores, contorno» triang ulares d e «medas» , o vo lume
branco de a lgum «m onte», em cujos tijolos ru bros a lu z se enlabaredava ,
Esses tra ços e esses volumes, ganh a vam relevos d e itn p reuisto , em q ue a
vista repousaoa m omeut áneamente, -para log o to m bar, d esamp arada , n os
prain os douradas d a estepa. Mourej a oa-ee esforçadamen te no p elejar das
«assefas», «fo lhas» a lém , sob a chicotada candente da Iu z: Um silêncio a r den te,
ofegante. pesava sobre as coisas, apenas co rtado, aqu i. a lem, p or u m choca -
lha r de boiada in oisioel, o vo zei rar longinquo de a lqu ma «cama r a da» d e
ceifeiros, o ruid o de um m oinho d e vento, m ooend o-se com esforço li passagell1
do traoeesio, o m atra quear d e uma cegon ha, d es enhando { u,g id iae sombras d e
asae sobre {[ palidez da imensa e IÜJa pais ag em sem som b ras . . .

.. Doia m -me os olhos, de tanto olh al' aquela oastid ão, se m um monte, 11111
colo d e nerdura, um r egaço d e à[Jua.9 em q ue p ou s arem e d es cansarem, até
qu e, manhã jú alta, a vi/azinha fronteiriça. 81l1'9iu, en f im ! d o er m o .
Revejo-a com os olhos d esgostosos d essa h ora: - l i brotar do d escampado
deser to de gcntes e mal-trapido d e vegetações e li a colher-me, p or detrás d o
se u castelito em ruinas e d as 8ua8 muralhas esca laura d u s d e f ortalez a in útil,
com o mesmo e vetusto ar d e d esc onfiança com que, havia secu los, escold r i-
níunsa 08 plainas incertos d e Ca stela . . .
Ali m e destinaca. P or ali fiqu ei.
Espéci e d e «ra ti n ho» s en timen ta l, s em «guantes» d e cana nezn ceitoira
afiada nos dedos, mas de p ena na mào e od ie n to manga d e alpaca no braço.
ali fiquei - de senraizado e triste J
Em ca da dia qu e passava , mais se a centuava d entro d e mim. entrado
d e n oetalqia, o apeg o a os lunges d o m eu vergel natal, cujo Iiumos se diria ir
seca ndo e esf'arelando n as rai zes profund a s d o m eu se r como a terra d os
vive iros seca e se esfa rela nas rai zes da s árvores que se treeplantam , long e
d o Iuunos onde brota ra m . . .
A• minha vo lta. exacerb ando-se d e agrestia em agressivid a de, com os
desesperos do estio q ue a m orti fica va , sempre. a quela desam par a d a vas·
t idâo d os h orizon tes ; aquela monotonia obsedia11te da planura e suas
vastas p er sp ectivas sem paisagem. cenoqra fadas a a marelos d e s earas
e azul de céus : aqueles in term iná veis de sdobr a mentos de a rgila oer metlia
e enxuta, poluo renta, sangra ndo á.1J m ord eduras inclementes do sol, sem um
entreluzir de àquae, que lh e matasse a sede ; aquela lividez h ôstil d os ras-
tollios, d e g umes em riste ; aquela ca rên cia d e ram aqeu s, r eduzidas.
limitadas a o verde cin zento ou m etálico d os olivedos, do s sobreiros, do
chaparrais retorcid os; aquele len to rolar. p or cim a da s cois as atónitas .
das h oras rutila s d e ca lm a o u cios tetarqos ofeg a n tes das n oites requeima.
das ; aqueles abismados silêncios d e m orte. que constantemente p esavam
s obre a a flitiva im obilidade dos ca m pos _ continuaram a desorqanizar-me
oS)lerv08 . A tal p onto, m eu Amig o. que, acic a ta do p or uma saudade. tornada
p ela solidão d e p uro res sentimen to d a alma em anq úetia d o próprio sang ue,
[ui este ndendo d a s coisas d a n a tureza à natureza das criatur as, que me
r odea vam. scm m e a colherem . um tal r essaibo d e estran heza, d e d es con-
fi ança. de desentendimen to, que. p OI' um tris, m e lui o ia incompatibilizando
com tudo e co m todos : - terra e gen te . clima e costumes.
B roi, en tão. q ue co n heci este Livro.

Li-o ávid a m en te. nas minha s hora s d e m ad o r na,


O Autor vivia ali p erto, na a ldeia de Santa Eulá lia, Não o co nh eci.
Nu nca pelo seu braço seguro e rijo. passeei a través dos campos, Aj a s s upo -
nho que, melhor d o q ue co n hecê-lo, a leitura d a sua ob ra teve o concilio
d e intervir apa siquadorameute lI O m al-en tendido esboça do entre mim e o
meio IlOVO. E que, desentranhando li minha sensib ilid a de a a lma das coisa»,
até ai só conhecidas de fora e po r fora . a sua arte in sinuou-me, com o poder

VlIl
d e simpatia e d e com unicabilidade d o se u próprio entusiasmo, ndo so a o
longo DIa s na intimidade de tu d o O q ue d e ca racterts tico, d e ttpico , d e ort-
g i.na l, d e pintores co, d e bOIJl~ d e belo, d e in spirador, existe sob re o solo a le n-
tejano. Apresen t ou-me a P rouincia ; p ôs-me em co ntacto co m a a lma d a s ua
g ente, tã o acolhedo ra e lhana, desde q ue ultrapassemos, p ela co nfiança, a
cro sta d e retra imento co m. que se d efende d e estran hos .. f ez -me se ntir, em
toda aSIla plenitude, a {Jeól"{Jica épica d o ."" e..fo rço aqrlcola , ii [Ior d a
g leb a d ura e ava r a .. a p oesia semi-poqã das s uas wsanças~ das .suas tr ad i-
ções, das suas [estas, da s ua religiosidade auete ra, quase despida d e cu lto
externo " desvendo u -me, fa z end o-ma sen ti r, a beleza maq es t àtica , gra lldi08a~
solene. da natureza que me envolv ia e q l1e~ ate. ali, m eu s olhos enamorados
da doçura li rica de nm vale r ibeirinho de L afô ee, nào haviam sabido d eei·
[ ra r e entend er .. .
Foi, es te Livro . enf im, q ue . revelan d o-m e n a profundidade d a s ua s ubs-
tância ínt im a , um A le ntejo, qu e eu a penas co n hecera até ali c/n e:'l;te nsào,
ndo so me reconciliou co m ele, co mo m.e ensinou a s enti-lo, e a querer-Ihe
como V. sabe que h oje lh e quero.

Como o ê, bom Am ig o , este r eevoca r ee titimental de um trecho da vida


que pa esou, co m ( IS suas h oras d e emocionismo e todas as record a ções de
mocida de q ue ele 8 ufJe re~ bastaria, só por si, para justificar o g rande p ra -
ze r de ( alar do «A traves d os Ca m pos».
Ma is do q ue u m sim p les pra z er, isso seria a a legria de pagar um a
d ivida em a berto .
N ão ca rece, p orem, esta b ela ob ra de qualque r es t im ulo de lndole afec-
tiva , p a ra que, em plena isen çà o cr it ic a, se fa le d ela - e se {a le co m en tu -
siástico lou vor.
Acabo d e a r eler. R euerefico qlle ela se n os impõe pelo q ue em si 11leSlllU
con tem , e ndo p elo q ue p ossa de suger ir . no8 de estran ho a o seu co n te ndo.

• O.M O «cic~r~Jle», expoe~te ~e p~l'liclllarida des. etnográficas, iniciado.r


C das curiosida des da inteliq ência e d os se n tidos nos r ecess os m alS
in timas de lim a região e d o agreg ado r ácico que o h abita, não conheço entre
n ós nada que o igliale.
A maneira co mo zr os r evela o Alentejo , ê perfeita, cabal.
Não ll OS f a z, es quecer, cla r a men te, d e q ue en tre outros. u m gen ial escr i-
tor - o qrande e esquecido Fialho - j á n os dera des se A le ntejo, ep isódios e

[X
páginas s up rem a s . Fi alho , p orem . fê -lo frag mentariamente. eruptioatnente,
fo ra d e qualq uer unida de de plano. em ampliações de exaltação literária,
q ue, por vez es, d eformam p ela ânsia tras cen den te da beleza plástica, a
exacta e m ed ia ta obj ectividade das coisas. Silva P icão, ao con tra r io , cin g e . s e
li «ve rdade» limita d a dos temas; e t rata-os neio apenas com a ex a t idã o
objectiva de uma obser vação escr up ulo s a e de um conh ecimen to p erfeito,
minude n te . m a s ainda com aquele s entimento de so lidariezante s imp a tia . d e
en ter necim en to a fecuuo , que 8 Ó o am a I às coisa» descritas por si m esmas e
ndc p elo q ue possam s ugerir, pode comunicar à p ena de quem a s descreoe ,
08 m otioos t ranetaçanoe que. no sobe r bo àq ua -o fr tista de «08 Ce i fe iros»,
nà o passaoam, CO Ill O qnaiequ er ou tro s, d e m er08 en sejos tematicos sobre qu e
a ,sua d esbordante im aq ina ç ão pt âsüca se expandia e complica va e m neuro-
ses d e es tilo, sào para Silva Pic ão, d e temperamento mais realista, sereno
e co ncen t rado, nÚo um «meio» , mas um «f im», a atingir ; n à o um pretexto
para s in fo n iza r e o rq ues tr a r p ala vras c di vaga ções -ma . sim «fac tos» q ue,
a cima d e tudo. pret ende historiar, d es crever e m 0 8tTar ~Jl 0 S . E nquan to
aquele - esteta -lav r ad or - p ó s os aesuntoe a o se rviço d a literatura . este -
la vrador - artista - p ô . a ling ua g em e a a r te ele bem a traballia r ao serviço
dos a s suntos. O qu e [unda ntentaltnente lh e interessa ti m oetrar- noe a 811a
proolnci a, a s [eicóes ca racte r leticae du sua fisionomia, a [en om oloq ia tipica
e r epresentativa d a sua «m a ne ira d e ser» como unidade colec tiva, [oca udo-a
e rep rodu z indo-u, p orm en or a pormenor, traço a t raço.
Merc ê des se intento, a centuad amente etaq nostico , a _sua obra resultou,
1111te.'I d e mais nada e a cim a d e tud o, rep ositôrio inesq otá oet de inform es
realistae e práticos sobre li terra e a vida tran staqanae, em tod o!'; 0 8 .seuf'i:
a specto s: -pais ayistico , s ocial, agrário, agricolo, [olctàrico, dom estico .
ético, etc . Não [allta um p orm en or. Co n hece tudo o que n os conta, como o
d on o da casa lh e conh ece os ca n tos, ao m O.'Jtra-la ao uindiço q ue ch eg a ,
á vido d e lhe esoicerar os recessos mai« intima s .. .
Cem p o r ce n to alentejano, aferrado ti terra, ti {o mitia e ci tradicã o
étnicas p elos la ços gregários do .~a ngu e e da vocaç ào . S ilva Pi c ão r ealiz ou
o tip o ideal do camponês d e elite. con sciente, artstocratizado p ela intelig ên cia ,
a quem nil o é estranh o, em teoria e exercicio , nenhum d os sen t imento », d a s
tendências tem p era m en tais, d os u sos. d os costumes, d ue actividad es, d as
a legrias e da s d o res , d e que, e para que vive a su a casta . E dai, a d omi-
n ante impr es e ào que. a o lê-lo, temos d e q uase o ve l'/ll.Os [ieicamente p or
de trás de tudo o que 11 0 S relata - patrão-la orador, p erc orrendo co nosco , d e

x
j a leca e chapéú rod ad o, s ob r e o seu. cava lo, a e:de n sà o das «H er d adess :
m aioral d e safões e samarr a, p or en tre 08 r eba nhos e as man ad a s d os
«Morüados» ; ceife iro -abos te/ado d e p oj eiras e suor-es, to rso a o so l, aventa l
d e pele apresilliado à cintura, foice r elu z ente n os d ed os , se r evive co nosco a
epopeia esf or çad a e obscura de «Os R a t inhos » . Ór1 em.o çâ o directa q ue n os
dá das coisa s r esulta n d c da s ua observação exterio r, m a s d o profundo e
vivido conhecimen to que dela s tem .
No fondo ancestral, a tá vico, do Seu ser, se ele n ào [oi tu d o aquilo - de
pasto r a patrão _ sabia , pelo m en os . co mo se g oza O ll sofre, (la s ê-lo . Sabia -o
co mo homem e sabia-o co mo Artista, que O er a : _ autênticam ente e co mple-
xamente: p intor de p ulso. quando nos dá a pinceladas la rgas o desenho e
-s-

a co r d os cen á r ios em que a acçcio viv a se m ouimenta ; e 8 cultor~ quando


em cinseladuras d e car ne, n o .~ cotistro i o vulto das fig uras; compositor,
quando . uqere as mÚsicas erra d ia s d os campos, d esde o m a traquia r m omj·
t OIlO d a s cegonh as , à s m elodias d o tra uessio na8 ve la s d os m oinhos ; das
rapsôdiae pagà s das [estas e da s tou radas ao chocalhar orquestrado das
boiadas . /la tn is terioea invisibilidade dos lo nges; p oeta, quando vio la e
entende a a lma se nsível d a s cr iaturas, e das coisas, para lá das apa r éncias
cer radas e agrestes em que, muna s e n ou tra s, a a tin a se eI1Cerl'fl.
Sim T Silva Pic âo, se m preten sões taluez a sé -lo na acepção r equintada
d o termo, [oi, s em duoíâa, n d c apenas um estud ioso, lI1l1 monôgrafo limit ado
mas um E scr itor de boa linha gem , a quem um feli z auto-didatietno conservo u
toda a f rescura original d o fort e temperamento.
S ente-se-o bem n a fa cilidade com que o d es critivo lh e corre d a p ena; n o
p od er de co m u nic açào com qne 110 8 leva a trà.s d e si, ao long o dos ass untos
á r id os d e q ue tra ta; n o sen ti do d e eq uitib rio com q ue dim ensiona a s p ropo r -
ções d o p or menor comezinho, na mancha geral d a descr itivo .. n o interesse
que conseque d espertar e111 nós p or miuú cias d e «especia lid ades» a que
som os estr a n hos - d esde os in cidentes . r egras e p re ceitos da la vo u ra , a o
qu otodiano r otin eiro da exist ência d om estica; d ente, a os p ormeno re s e:.<:a us-
tioos so bre jornas, s oldadas, preç ário d e {Jé ne ro.'3, etc ., li aritmética indig esta
dos nÚmeros e das conclu sõ es esta t ls tica s da eco nom ia rural,
Com o o con segue ? P or esse poder de comunicabilidade aliciadora, qu e
é a caracteristica es se ncia l d e todo o grande Escritor. P elo milagre da s ua
prosa. Ê que dá gosto lê-la' Isenta ele qu alquer afectação. com un ica tiva .
a rejada. permeável, [Iuente, s em p re singela . mas nunca descuidada, ajus-
ta-s e, envo lve ou penetra os a ssuntos. co m a ani mada leueza de um a larga

Xl
co nversa, rica d e ensina men tos, d e n ovidades, e, dai, d e interesse para a
curiosidade do leitor. I s to, quando a s ubstân cia temática é, por força das
circun stância s, d e ca r ácte r mera men te dis sertativo OlI monoqráf'ico : mas .
sem p re que os m oti vos se alarqam , e 110S d es creve certos aspectos da nata-
re: a, o p ito I esco co lorido d e ce rtos costu m es ou faina s cczno, por exem p lo
«A V ida [lOS Mo ntes» e «08 Ratinhos», a prosa a la rqa-se, tamb ém, Directa
e fá cil, a qui r emordida pelo sol. alem on d ula ndo -se como as searas .. nesta
p ágina, p icada p elo s al d a s expressôes region a is ; naquela, ve stindo o b om
p ano d a linguagem cu lta - sabe a terra , cheira ao serpol e ao leite dos m on-
tados, soa a a len teja no e a p ortugu ês . ..
Nes tes tempos , eaz q ue a n os sa linqua e a nos sa prosa andam a r espirar
teia m a l ler o «Através d os Campos» é fa z er uma cura de ares T

í/) OR tudo isto, mell A migo, e , a inda, p ela b oa a cção que rep resen ta n108-
I trar docume ntalmente q ue a vida d os n0880s campos neio é, apenas
aquele dram a d e seruidão espezin hada e d e patronato espoli ador q ue o [also
r eg ionalismo d e uma litera tura d e neo-realiemos diriqidos anda p or ai a
apreg oar, a sua inicia tiva de [aze r ressurgir do esque cimen to publicit ário
o «A tra ves d os Campos», é caso p ara lh e dar um grande a b raço 1 A hora
em q ue se letn b rou: de o fa::e r, d eve co nta -la en tre as horas mais fecundas
da sua ex isténcia d e Lain-ado r-ínte íectn ol.
Nem só se fertiliza a te rra, la n çand o nos r egos da a ra d a 08 9 1'liOS da
semente. O Espirita e a sua h erdad e mais rica, que é a Literatura, t êui
também a sua la vou r a e as :.mas . earas,
Cultivá -Ia é mais do q ue [e rtiliz.ar o solo : é fertilizar a V id a.

EM nome das boas-letras por t uguesas -bem haja l-Amiq o.

J Oâo COrrêa d'Oliveira

-
1 o s e• d a s 1

I v a p 1

c a o - •

B IO -B IBL IOGRAF IA

C OM António T omás Pires - contemporâneo e amigo d e J ose Leite de


Va scon celos , Adolfo Coelho e T eófilo Braga - in iciou-ee em Elvas,
al p or 1880, um notável p er iodo d e actividade m en tal 11 0 ca m po da
Etnoqrafia, como ou tr o n d o se revelou , em pequenos m eio s provincianos .
Toará s Pires { Di um gra nde e in can sá vel rebu scador da s Ilossa s riq uezas
folclórica s qu e, como escreve Leite d e Va scollce[os, «p erco rreu a maior p arte
dos secto res da Etnografia ». Con hecendo q ue duas literatu r a s diferentes
f lo rescem lad o a la d o - a liter atu ra oral e a literatu ra escrita, a d os simp les
e a d os letrados - decotou-se p a cientem en te ti coordenação m etódica das ca n -
ções e rim a s p op ulares, das adivinhas e compara ções, do s adàqios, rifões e
anexlns, d os costu mes e da paremioloqia, das cantiqas h is t ôricae e p oliticas,
d os r omances e das orações~ dos con tos e das r imas e jogo s in fa ntis, enf'im,
de tantas admiráveis fac etas d o g éner o, que nào s e d escr e vem em cu r t as
finita s. Fo i um emêr ito trabalhador , que n os leg ou ob ra llo tà vel - e mon u-
m ental a Slla colec çào de 10.600 Ca ntos Popula r es Por-tug ue s es - e q ue te ve
a seu la d o, embor a em condição m odesta e sem r en ome, os escritores V ito -
rino d e Almada e So eiro d e Brito. a o produzirem os ap r eci ánein estudos
Reque bros o u r em a tes d e a lg u mas modas d e r od a com a música respectiva
e D i tados tópicos a le n teja nos.
O ce rto é qu e em Elvas se manteve firm e o cult o p elas in vestigaçõ es
etnog r á f icas e assim nos s u rgiu m ais tard e, d e forma origi na l e itn p r eoi s ta ,
o autor d o A través d o s Cam pos.
Alas a esti rp e nào f eneceu, pois q ue ainda agora apa re ce J osé A lves da
Capela e S ilva - beir ão d e n a s cim en to e elvense por adapta ção - com 08 seus
brilhant es trabalhos Ga n h a r ias e A Lin guag em rústica n o co n celho d e E lvas.
J os é da Silva Picã o, d iscipu lo inconcus80 da m esma escola, ( ai pr ofundo
a dm irado r d o eru d ito T omá s Pires . P rooa -o a ca r ta inédita, q ue a sequir
tran screvem os , em homen aqem ao s d ois ilu s tres prôceres :
«Ex .lH O Sn r . Dom inqos Lauadinh o, Con sta-me q ue aman hã se ef fect uará
n ~essa cidade uma mani festação d e h om ena g em á m emoria d o l lO S S O saudoso
Amigo Antó n io Th omaz P ires . Es te [a cto, a que dever as m e ass ocio em
csp ir ito , como preito d evido à m emoria de um d os mais ilu s tres elvenses da
n os sa época , veio recordar-me outro q ue lig an do-se com aqu ele n a id ei a pelo
m e no s - tra d uz um descuido imper doave l da minha parte, posto n ã o f oss e,
COUlO n ã o foi, intencional. R efiro-me ti: fal ta d e resp os ta minha , p or eecr ip to,
ao p ostal, e li oro, que V. Ex:" m e en vio u li a tem pos, p ara eu m e associar as
home n ag e ns p roj ectad as em h onra d o q rand e cid a d ão, Asseguro p orém a

XlI I
V . E.\:." qu e esse m ell d escuido, d eg en erado d ep ois em. olvido tempor ário , nem
p or so m br as significa m ingu a d e conside ração p or V. Ex» Oll men osprezo
p ela m em oria d e A ntonio T'h otnoz P ires, co m quem privei durante mu ito s
an08 e a cuj a m em oria sou q rotieeimo. O meu a llud ido es quecime nto, d erivou
sim d e ser criatura dietrahida , a lgo a bstrata, cheia d e affazeres e so ffrendo
a o tempo d e Lima p ertina z doença q ue mu ito m e a b a lou.
«A inda a ssim ~ Ilii o t endo p a chorra p ara escrever , incumbi então m ell
sobr inho A ugusto T ello d e pessoalmente com unica r a V. Ex ." a minha
a dli es ão ao seu 11Onr080 con ci te, o qu e elle f ez. Eu e q ue falte i d ep ois! . . .
Co nsequentemente, e p enitenciand o-m e da {alta, venho remediai-a quanto
p os sioel : na p róx im a 2 ." [eira, zn eu sob rinho A ugusto Tello irá en treq a r a
V. Ex:" a m odesta verba co m q ue d esde o se u convite resolvi contr ibuir paZ'a
a ob ra iniciada lou vavelm ente por V. E:'C. e outros cavalheiros. P edindo
fJ

desculpa da demora s ubscrevo -me de V. Ex;" tu ," att» e cr ." obg. - José d a
Silva P icão - Santa Eul ália 3 d e Out ," d e 9 14».

Jo s e da S ilva Pic ão, filh o d e D. Ma r ia Francisca da ilva Lobão Tela e


d e Fran cis co d e Assis Picão, na sceu em Sa nta Eulá lia, ll O concelho de Eluae,
a 10 d e Março d e 18 59 e faleceu a 18 d e Ma io de 1922.
Auto-didata de co nd ição (teve d e se s ujeita r, [à em idade madura, a
[a zer exame d e instruçã o p r imár ia, p a ra p oder se r eleito verea do r T). haoia
adquirido hábitos in veterados d e leitura . Ded icava -se ao estudo dos tr a ta d o s
a gricol as e p ecuá rios e, nas horas d e rem ans o, nào lia, d evorava a s ob r a s
d e V itor Hu g o, Co m i/o, Baiz ac, Eça e Z ola, d e que p or vezes, em animada
conversa intima. citava, co m a su a vo z um p ouco gaguejal1 te, 0 8 p eriodos
que mais o impression a vam .
Era um esp irita arguto e escla re cido . Foi la vrador e es crito r. Fruto
espou td neo d o m eio em qu e nas ceu e labutou. sem preparação literária eru -
dita. p ôs-se a escrever àcel'ca da s ua terra e d a sua gente CODI o à-ooutade
de qu em para além daqu ele Inund o nã o vislum br ava mais mundo e foi a8si m~
no rude contacto com a natur eza e os hom ens que viv em à sem elhança d esta,
que produziu prosa fo rte e sadia. d espida d e ga la .• postiças, mas rea lis ta e
s aboro s a co mo g én er o outra não hou ve em P ortugal.
Depois de t er colaborado em O Elvense, com o p seudónimo d e «Jo ã o
Chapa rro» e de lunier brilhado 110 Portugália. a l'evista m onumental d e
Ricardo Severo, onde publico u a lguns artigos subordinados a o titulo Etno -
g ra fia do Alto Alentejo (co ncelho de Elvas). José da Si lva Pic ão tenta obra

XIV
de vulto e sob os aUSp tCIOS ed ito ria is d o b ibliófilo António [oeé T orres d e
Caroalho la nça a p úblico () li vr o A t ravés dos Campos - Uso s e co stum es
ag r íco lo -a le n teja noa (concelho de Elvas) .
Quando a obra apareceu , em 1903. a critica [oi u llâ nim e em tecer -lhe os
maiores elogios.
Trindade Coelho escreoia a o editor:
«Dig a a o Picão qu e es tá f az en d o uma verdadeira obra prima, uma r ea-
liseitna e completa mara vilha ] Qu e s ur p reenden te ve r dade em tudo o que ele
descreve, e a m aneira co mo descreue I Qu e a dm ir ável artista é esse h om em ,
e como tudo Uz e sa i espon tâ n eo . vivo.. a b und a n te. colorido e cheio d e pito-
resco, d a Bu a p ena d esafectada! C ODI OH n otas - tã o minuciosa s e tão pre-
ciosas - da vida r eal, positioa, At ravés dos Campos . que abund ância d e
ano tações p sicoló gicas para o estud o da alm a do Povo! Este livro não é só
sinqutariseimo /l O assunto p o r que nào h ã outro que se lhe pareça se q uer : e
oriqinallseimo na maneira como trata O a s su nto, Única a m eu ver, que s e lhe
adapta, chega ndo . deba ixo d este a spect o, a ser UDt trabalho literário d e
attlss imo va lor 1 Qu er a creditarvl Produ-z-m e em oçà o absolutam ente idêntica
ti qu e m e ca us a a leitura dos lior os d e Jlilio Diuiz, N ão s ei diz er-lhe, meu
caro António Ca rvalho, toda a m in ha admiraç ão p or es ta ob ra s u rp r een -
d ente. Eis aqui u m. li vro q ue [ ica, u m. livro qu e os s ábios e os artistae li ão- d e
adora]' sem p re co m en ternecimento. Já {alei no livro ao Fi alh o de A lmeida.
VOll-O p rocura r para lhe ralha r: se ainda IUI O O leu T»
No diário lis boeta O Pop u la r o gra nde jornalista e es ta d is t a Maria n o
de Ca r va lh o classificava o estudo d e [ose da Silva Pic ão «com o o principal
e mais p erfeito que a té agora se tem es c rito /10 n OS80 p ais , co m r espeito a
tão importante assunto».
O publicista Tude Mendes d e Sousa escreve na P lebe:
«Muito têm a aprender no livro do sr. Silva P icão, aqueles que p or qual-
qu er circunstancia, tenham a n ecess id a ae d e conhecer a estru tur a in tim a d a
lavoura a len tejana e aqueles q ue, p or ou tra or d em d e estudos se d ed iq u em
à investigação de costumes e tradições dominantes nes ta região .»
Anos m ais ta rde, o escritor d r. Edua r do Pimenta r eferia -se a J os é Picão
/l OS seguintes termos :
« Co m uma instru çà o a d q ui rida n a modesta escola d e Santa Eulália
educou-se a s i m esm o, de muito no vo, cu ltiv a ndo a s qualidades invu lga res
de observador cuidado so.
«Lacrado r e fil h o d e la vrad or es, lembro-me d ele a in da m a ço m onta ndo

xv
uma eg ua preta, nascida nas manadas marcadas com o ferro d e sua casa e
p ercorrendo a v a !~ ta la voura atento aos m enores detalhes, agasalhado lUlIn
fo rte capot ão, nas épocas em que os rios e ng l'ossam e a chuva ensopa 08
alqueives, ou d e jaleca e som b reiro n os dias em que o s ol aperta e as pare-
lhas r ed op ia m. IlDS ca tcadonros da s eiras inundadas d e eston te an te luz .
«Al a is tarde, um grup o d e es tud io sos, co nsag rados na8letra8~ intentar-am
o árduo encargo d e ensin a r li grei o que ela (ora e o que ela ainda é . Cotiti-
nuaçào do a d m ir ável es forç o d o maravilhoso es critor Oliveira Martins ,
Fundara-se a Portug ália. sequência natural da tentativa da «Sociedade
Ca r lo s Ribeiro». Falta va o etnogra{ista com a conhecimento perfeito do
Alentejo p ara d escrever a vida r ústica desta interessante p ro ulncia ,
«S ilva Pic ão foi escolhido . As paginas que escreveu sào modelares de
sobriedade, rigorosa observação . COlll. um sa bor popular, mas de luna ral'a
clareza e requintada eleg â n cia . i1Ja is tarde O ed itor Antonio Carvalho, o
eru d ito bibliófilu d e El va s, lançou no m ercado o primeiro volume da obra
celeb re - A t ravés doa Cam pos .»
jl identificacà o d o va lo r da ob ra encon tra -se p orem no monume ntal
traba lho d o grande m estre. dr. J . Leite d e V asc oncelos, Etnografia Portu-
g uesa. onde a p aginas 282 d o vo lu me I s e lê:
«Silou Pic ão [a leceú em 19 2 2 . deixando incompleta a sua obra, de que~
ainda a ssim o ed itor d ela. T orres d e Caroa lho, conseq aiu formar dois volu-
m es: I , 1903; II. 1905 ; a o todo n ove ca p itulas. que passam de um volum e
para o outro, isto e. 1) as herd a d es ; 2) os « m o n tes » (em sentido rural};
3) o s mo n t ad o s : 4) pessoa l d e u rna lavo u ra; 5) cos tu mes dos campónios;
fi) os Ratinhos ; 7) a lfaia. a g rí co la s ; 8) sea ras : 9) la vo u r a s (muito ex te ns o e
s em num era çã o: começa a p. 11 d o vai. II, e va i a te p, 100, a últ im a}»,
E acres cen ta llllma chamada:
«Prestaria va lios o serviço li Etn ografia quem desta obra fizesse Uln
índice m etódico (d es en volvido), e outro alfab éticos
O senhor g eneral L acerda Machado . es critor ilustre. di z de J ose da
Si/va Picào:
«Tale nto es pon tâneo , Auto-didata, adqui riu uma cultur a oa r ia d a, que
raramen te se a lcança por esforço próprio. As páginas virg ilia nas d o s eu
livro Através dos Campos. s à o um p oema campestre, O hino triunfal da
la voura alen tej ana.
« . . . POI" estas e análogas cOllsideraçõ es~ é d e admirar e m erece reqist o,
a circunst ância sing u la r d e qu e~ te ndo José da Silva Picão nascido e vivido

XVI
no meio rural qu e nos d escreve. nada d e interessante lh e esca pou a o espirita
observador. ti slla intuiç ão de etnógrafo. Os p ormenores minim os q ue r elata
e define. sem aridez s empre com precis ão e inteligência, p or uezes levemen te
tocados d e ironia. teriam [àcitm ente passado despercebidos. vela d os pelo
há bito. nã o só a um esp irita m enos observador. mas a qu em não s entisse o
bucolismo qu e o enfeitiçaoa».
A ntó nio Sardin ha tin ha por J os é Pic ão uma {arte admiração lite rá ri a ,
aliada a uma es treita amizade p essoal, cla r a m ente tradu -zida na d edicatória
da poesia Canção do espeto no lu m e. d o li vro Q uando as nascentes desper tam ,
S ard inha con sid ero u J osé Picã o, num a r tigo inserto no D iário d e Lisboa
(1924), o «fu nd a dor da literatura r egion alista p ortu guesa».
E di z o escr itor :
«O s eu ún ico li vro publicado. Através dos Cam poso nunca saiu d e um
circulo es t reito d e agricultores. n a s ua maioria os m enos preparados para
lhe abra ng er a larga e admirti vel inten são. Não ri só um trabalh o d e et no -
gra f ia - detalhado e cheio de cor . Com o s er um breviário p erfeito d e econo-
mia agrária d o Alto Alentejo, 9 u a r d a tamb ém nas s uas p áginas alguns d 08
mais belos e cris ta linos pedaço s d e prosa p ortuguesa n os Últimos trinta allos .
Bspressão castiça e s em requintes atorm entados, borbulha com o UnI fi o d e
dgua na co r rente. E. b rotada do co nvivia im ediato d o p ovo, por ela se ve r i-
fi ca qu e h á em cada llng u a um com o que class icis mo. qu e tanto é da aristo-
cracia liter ária , como da gente r ud e das atdeias . . .
«Em J os e da Silva P icão ex is ti a um temp eramento d e barrista s in cer o e
ínqenu o, que m odela va d e um s opro a s suas figura,~. tocadas por ve Zes de
uma encantadora e inimitá vel gaucherie.
• Não p ossu indo o pituralism o alucinante d e Fialho d e Alm eida. 1108 seus
Ratinhos. J osé da S i/va Picã o conseg ue, Sem esfo rço, sob repõe -se a os Ceifei-
ros; o tema e o m esmo. pela harmonia d as prop orções e a ind a p elo condoido
sentido humano co m que a s almas se abra çam e fundem na agonia crispada
dos rastollios , P ena é que Através dos Campos não ob tivesse uma irradiaçã o
~ maior, p orque. s e n a n ossa terra p alpita qualquer estremecim en to regi ona-
lista. é ali qu e lhe terem os de buscar a or ig em e a li ç ão, Desde a riquez a d o
oocabul ário, a o m ovimento da [ra se e li precisão das imag ens. J osé d a S ilva
Picã o é m estre que rica - e que {ica CO Jll p oderosa individualid ade . . .
«Livro tll1ico, li vro claro. s adio, o livro de j ose da Silca Pic ão h á-d e
ser arrolado en tre os m elho res padrões da nossa literatura co n tem porâ nea» ,
Eis o d ep oim en to de A ntónio Sardinha,
-.
XVll
Um outro trabalho de j os e da Silva Pic ào, A cam inho d a Cego n ha, foi
das primei ras ru tila ç õee elo seu talent o .
N ele se d es cre ve a odis .•eia de uma a ldeia a lente j a na _ Santa Eulãlia-
cond ena d a ao m artlrio periódico da falta de áglla, q ue dif icilmen te se adq ui-
r ia ezn p oços ou em eecaesos mananciais, d e ond e era tirada p or m eio de um
choca lho. Acerca deste costume - que J osé Pic áo descreve p ito rescame nte -
diz A n tó nio Tomás Pires, no seu interessante op úscu lo Tradições Po p ula res
Transtag a na s :
«A' beira d os p oços , em ce:C de ca ldeiros para t irar água, véem-se fre-
q uentem en te qrandes cltocallr os a iss o d estinados». P or isso o p o vo opina.
em seus m otej os , lJ ue em Sa nta Eu l ália quem nào tem choca lh o nào b ebe . . .
A Ca mi nho da Cegonh a é ullIa p equena obra -prima da literatura r egion al,
pelo valo r d o estilo, a certo no emp rego dos vocá bulos e rigor d es critioo,
Fo i p ela prim eira ve = pu blicada Ilum cotu mezin ho intitutado «O Elve nse»
- Nú mero brinde aos senhores as s ina n tes em 1894: .
Em 1940 o autor desta s linlra .• prom oveu a publicação de um a nova
edição d esta bela n o vela reqionalista,

E o que ainda lui a dizer ? Parece-nos qu e mais na d a . Eis o pouco-


a liás a va ntajado - qu e nos sllgere a figu ra d o singular escr itor -et nógr a fo .
Atr avés dos Ca m pos esgotou-s e. Depois, es ta b elece u -se em vo lt a da ob ra,
lançada lla santa paz sep ulcr a l d o olvido , um a e sp écie d e alheamento ". . ou
d e in di feren ça .
Preci sava-se de uma r eparaçã o. T'omou -a a p eito o s r . d outor J ose
N u nes Tierno d a S ilva, so b cuj os au spici os se publica h oj e a 2 .· ed içcio d o
Através dos Campos . Bem haja S . E .-..; .", p ela sua b ela inici ativa - diria um
gra ve apologi s ta. S em repetirm os a frase - p o rq ue o ve r b a lism o estéril e
[a lso, llã o se co nform a com a nossa m aneira d e ser - a creecentarem os q ue
a in iciativa d ign ifica a ilu stre p ers onalid ade q ue a efect uou. Fica exuberan -
te mente demo nstrado qu e o s r . Dr. J os é T ierno - p essoa prim oros a , l lO 8
co nceitos, na s fórmu las e nas maneira s - possui um a a lt a intuiç ão d e idola-
tria reqionalista - de a mor ti s ua terra e de acriso la da d edicaçã o ti s ua grei.

DOMINGOS LAVADINH O
Da A ' $OCÚI1"ÜO dOI Arq ueólogos PorturJuclu
,
A t r a v e s d o s Campos

,
generosa condescendência d o in signe escr itor e meu b om A 1ll igo~
A J oão Corrêa d 'Otivei ra, um d os mais a ltos expoen tee d a m entalidad e
portuguesa e da mais requin tada se nsib ilid a de artietica, se d eve o
precioso prefá cio d esta verd a de ir a ob ra -p r im a d a literatura region al, d e q ue
José da S i/va Pic ão [o i p or a s sim di zer o ge n uino cr iado r e O maio r ap ôs-
tolo de amor li terra mater, re a lizando o q ue , e ll l s iutese, se poderá conside-
rar a m aior e m elhor definiç ão d o Alentejo.
O leitor, antes m esmo da apreciaç ão directa d este livro, se ntiu-ee, d e-
certo , atraido p elo deleite da cr itica em polgan te d a In trodu çã o, onde co m
tanto carinho e d elicadeza se denun cia ex ube rantemente o alto valo r d e
quem a escreveu . Igualm ente se a ssocia ao m esmo objectivo, llUlll admirá vel
estudo bio-bibtioqràfico, Dominqos L a vadiulio, um d os m elhores va lores
intelectuais da q eraç ão a ctual e um profundo e escrup u loso in vestigador
cultural em todas a s m odalidades e a ctividades d o esp lr ito, e que tã o bri-
lhantemente dirige a Biblioteca Municip al d e Elv as.
Rendem os a n ossa enorme gra tidtio p elo esfo rço, justiça e talen to dis-
pendidos pelos d oi s formidá veis escr ito res, cuja de dicação ti causa alentejana
eu creio qu e os leitores verã o ex ub er a n temen te con firm ada nos primoros os
capitulas, qu e antecedem esta minha li geira referéncia.
O meu papel fica, a ssim , redu zido à m ais sim ples expreesão , lim ita ndo-me
a aviva r alguma s reminiscências. j á d esbotadas uuz p ou co p ela nevoa d o
tempo, de um. pa ssado que muitos se apostam em cre r qu e nda mais p ode
voltar, mas que se m e afigura p os si oel trazer ate n ós, se m p re qu e o tenuts-
sitno rio da esp iritua lid a de que lig a a s a lm as ete rn amen te, impere e p resida
aos nossos p en samentos.
A lg um as impress ões p ess oais d eixar ão en trever a minha f ervorosa
admiraçà o e indesbot ãcet s a ud ade p or essa estra n h a p ersonalidade, que f oi
o autor d este lior o, J ose da Sil va Pic ão, o m ais m odes to d e t odos os escrito-
res, de uma inq énua simplicidade, que feria e en ca ntava to dos os que o
conheciam e qu e lhe roubava p or comp le to a m ais ligeira visito d o que vir ia
a ser a sua obra, projectada a tr avés do tempo e d o futuro. Nun ca teve a
consciéncia do va lo r da sua ob r a '
Mais de 40 anos sào pass ados qu e o admirável arquitecto d a literatura
regiona l trouxe a lume. primeiro num alvoroçante folhetim em j ornal elve nse
e. seguid am en te, em livro ed itado p elo saudoso bibliografo A n ton io J osé
T orres de Carvalho, es ta ob ra magistral. que é o « A trave8 d os Ca m pos».
Esse trabalho cau s ou já entâo o maior a ss ombro. p oi s ninguém divisara

XIX
que dentro daquela frágil fi,qurillha d o seu autor ardesse a mais rubra
ch a m a do talento, numa afirmação intelectual onde a garra d o escr ito r
dominu oa triu nfalm ente.
Depressa s e esgotou a ed ição e com o d obar do tempo cavou-se a 8 01u~
çà o d e continuidade, qu e con d uziu. ins en sioetm ente ao olv ido . sen d o ] 'a1'0 8 os
que fi caram {ieis ci lembra nça d esse [ormosl ssuno estud o da vid a l'listlea.
Contudo. alqune adm iradores mais p ersecerantee e espe rançosos soube-
ram esp erar a oportunidade d o ressurgimento dessa bela ob ra. ond e Ii á
lJluito qu e aprender e ainda muito mais que se n tir o vib r a r da a lm a d o que
p oderemos chamar a p edra angular d o valor da grei, na sua mais { DI 'te
liga çd o p s iq uica e econó m ica li celula da Nação.
E essa h ora a bençoa d a clieqou, envolvida na sa ud a d e indelével que o
grande escritor e ndo m en ol' 01111,gO soube con q uis ta r ao nosso espirito, e
até ao 11 0 8 8 0 orqu ltio , que a joelha em êx tases perante esse mago d ecantado]"
dos lindos seg re dos d o prodigios o viver rúetico, p onto d e partida d e tod a a
b ele za e d e toda a rique za que informa a vid a camp esin a . que nunca é antiga
nem m oderna, p orque é se mp re a constan te e p erpétua tranefiquraç ão da
natureza, no seu ineeqot àoel d esdobramento humano.
N ão [u zia, pois, s entido, n este alto d e curva cu ltu ral, deixa r j azer 110
abandono. pelo m enos - já que a obra é in corrupto e [i carà ete r namente
em b a lsam a d a n o 'e u próprio va lor intrínseco - a a ssombrosa li ç ão e pre-
cioso ensin a m en to q ue dela irradia. li a seu amor exasperado pela grandeza
d o.• cam pos e p ela d o Alentejo, ou t ro ra a malfadada ch a rneca e, no diz er
d e Lé on. P oinsard, a regín o m enos co n hec id a da Europa.
H o]e, essa grandeza alentejana já entr a p elos olhos do português, ca n -
tada em todos os tons p or escr itores ilustres, com a mais nltida com p re ens ão
da s ua riqu eza multiforme,
Desde António T'om az Pires, glorioso Elv ense, um colos s o do [olclorismo
alentejano, com as s u as d ez mil quadras p opulares-s-possuselmente o prim eiro
da Europa - d esde Vit orino d e Almada, o ex a us tivo investigador g eo gráfiCO
d o Concelho d e El va s e alquns outros d evotados cultores d o « Mi s té r io da
Campina», até a o d outor Celes tino Da vid, incansável e brilhanttssimo nos
seus estudos históricos e Jo se A lves Ca pela e Silva, talentos o e in vulgar
interpretador e re ctificador da linguagem_ l'Ll stica a le n tej ana - toda ess a
pleiade se lan çou n a cruza d a bendita d e alTQnCal' o 1lDS80 Alentejo ao encra-
vada e imerecido obscurantismo em que ja z eu tanto tempo.
Para tant o, J osé Pic ão d eu um b elo e sa lu ta r tributo, ele qu e, ,uio dispondo
senão de lima instruç ão eiementa r so ube por m atiz próprio ilustrar-s e s uf'i-
l

cientement e, aproveitando o seu inato gé n io assim ilador e esm er alzd o-se por
escrever num es tilo tã o pr ôx imo da natureza e numa identi f ica çã o tão ajusta da
com ela, que sem o m ais p equen o esforço a copiava co m tam anha per feição .
Era a p a r dis so um cavaqueado r d e rara vivacid a de deleitan do -se n a s
sugestivas leitura s d o di vino Ca m ilo, que ad ora va n o mais a lto gr a u, d o
encantador Eça, que o d eslumbrava com a s ua prosa delici osa. d o adm irá -
vel Trindade Coe lho, q ue o cativava d everas , d o es ca ld an te Fialho. q ue o
empolgava e a té Balzac lh e era [a miliar, com p razen do-se em m ergulhar o
espirita nessa nebulose rom ântica d o g ra nd e m es tre.
Uma das s uas fa cetas mais ex p r essiva s era a m aneira como esqu a d ri-
nhava a p sicologia rú etica, até a os se us refolhas mais in timas, e assim b em
sabia que a vida dos cam pos se equilibr a en tr e os m aiores deslumbramentos
da alegria e as maiores in quieta ções d a tristeza, tilo p erturbante e in stável
e o cená rio d esse ambiente inconfundl oel, que um poeta humilde e igll orado
traduziu nesta einq ela q ua d r a :

Mar ou terra, tanto fa z


Pr'ós portos d e salvam ento:
Marinheiros e lavradores
Todos têm o seu tormento,

E p a ra nào [a tiqar mais o leitor per mito-me ta mbém co ndensa r numa


quadra, p ara frasea da d e u m a outra de um g rande p oet a a lente jano . tã o
prematuramente falecido - José Duro - a obr a g r a n diosa d es te benemérito
escritor ,

o livro que ai vai, o br a de Arte e de Devoção,


E' um livro genial. um poema d e Beleza :
Pensou-o pelos campos. contemplando a Cr-ia ção,
Es culturou-o na prosa, olhando a Natureza.

A n ós , o pra zer d e a cu dirm os à cons ci ência n o cum p rimen to ele unI


dever. I S80 n os basta esperando q ue coevos e vindou ros aproveitem a liçã o
do Mes tre .
o EDI TOR
J oJé lJi//n<ó C imlo d a <5ilva
ATRAVÉS
DOS
CAMPOS
I

M gera l, os camp os d o Alent ej o, à parte os arr ed ores das po voaçõ es,


são divididos e m g ra n de s trat os de te rren o que s e d enomi nam he rde-
des. P or vi a de r egra, ca da herdade o u g r upo d e h erdades anexas
sustenta uma exploraçã o a gelcola-pecu ár ie chamada lav oura.
O don o d a lavoura co n h ece-se pelo n ome de lavrado r, e cr escen ta n dc -s e-Ih e
o sub-t ít u lo de rendeiro se as herdad es q u e disfr u ta sã o propeiedede d e ou trem
a quem ele as arrendou. O lavrador t ípico al enteja n o é o la vrador rendeiro.
A o proprietári o da herdade, que não é l avrador. chama - s e-lhe senh or io.
O conju n to d e h erdades qu e constituem uma lavoura desi gn a-se p OI cómodo.
A sede do cómodo é o «mo nt e», que as si m se chama a casa d e h abita ção de
qualqu er herdade . O m ont e es colh id o pa r a sed e d o g'ra n geio , aco m oda em si o
casco da lavo ura, isto é, t oda a uclxorie, representada po r man timen tos, ce re ais,
forragen s, a lf a ias a grícolas, a nimai s d omésticos, et c., etc.
D as h erdad es em q ue se n ão i n stala m centros d e la voura po r esta rem distan -
tes da qu e o la vrado r es colheu par a esse fim, di z - s e que andam de cavalaria.
D a s q u e s e a nunciam para arr endamento, e q u e fi cam po r a r r en de r, us a-s e
dizer: - cestão à var a».
T oda s as herdade s têm nome p r ôpr !o, algumas bastante a d u lte rado. Exem-
plo : M eim oa s p or Amim o a s; Al varo Anes p or A lva ra nh a j C ochixola por
Quexol• .
O nome de muita s de r iva d os primitiv os poss u idores. Exemplo: os Falcatas ;
8 do B ri t o j a do Ch aves; a do Pintoj m onte dos Frades; a d a Miseric6rdia; et c.
D e uma sei qu e, pelo fa cto de há sé cu los esta r arren dada a descendente s
do antiq u íssimo rendeiro, o v u lgo s6 a conhece p elo apelido de f amília d os
arrendatários e não pe lo prôp ri o q ue é igu a l m e n te O nom e do senh orio. E,' a
T orre do S iq u eira, con h ecida po r T orre do P icã o.

-1 -
A TRAv ts DO S C ;>. MP OS

O u tra s distinguem-se pelo diminuitivo da herdade vizinha mais em evi d ên -


cia. Exemplo: Alcob aça. Alcobacinha; P a ço, P assi n h oi C a n goa s, C agoinhas. etc.
E' frequente haver duas contíg uas com isual nome. Exemplo: P erei ra d e
Cima, Pereira d e Baixo. Àbegoaria de Cima, A begoar ia de Baixo. etc.
N a nomenclatura das herda des, assim como se notam nomes es t r e.ve ga n tes
e sing ulare s, também se regi st a m outros vulgaríssimos a ponto de se em p r e-
g a r em em duas o u três do mesmo concelho. Nos vulgares predominam as
«P er eir as», os «À z in h a is» , as «Casas Bran ca s», os cR es u ens osAo, etc. H á t ambém
muitas Torres que se d istinguem p OI s ub-título qu alifi ca tivo . Exemplo: T orre
do Mouro ; Torre de P a lm a ; T o rr e das À rca s ; T orre elos Cl ér igo s, etc.

Topografia C om o em q u ase todo o Alentejo, as herdades d a r egião elvense


abran gem vast as planícies e en cost a s d e t erre nos co rtados pelo rio
C aia e se us a íluentes, com o A lgalé, Torrão, C ai ola e Varche.
T odas deixam d e co rr er no r igor do es tio . a p esa r de o primeiro ser ca ud a -
l oso n o inverno. O Gu a diana, on de aflui o C ai a, a inda banha extensas e
f er t ilíssimo s várz ea s servindo de baliza a P ortugal e E spa n h a .
À s marg ens do C ai a , e as de vári os ribeiros sã o em parte g u a r neci da s d e
fr ondosos eloen d r os, muito flo r id os em j u n h o e julho. C om flor es aos cachos,
oc u ltando a rama g em, transformam-se en t ã o em lindos r oseirai s, d e fa x e s
enca.rnada s, a co n t ra s tar em co m a v eget a çã o vi zinha s eca o u a m o rtecida pelos
calores estivais. Às planíci es q ue fica m a L este, entre Elvas e B a dajo z e aque la
cidade e C amp o Maior, chamam...se-lhes barros em virtud e do solo ser em geral
bastante a r gilos o. E stes camp os, nus e secos no fi m d o verão. são singu l a r m en t e
prop ícios à cultu ra cerealífer a que n el es se exp lo ra com vantagem e em larga
es cala. E po r q ue eles dão trigo e cevada em abundâ ncia, entende-se co m j usto
critério q ue n ã o va le a pena arborizá-los o u util iz á-los com outra cultura mai s
dispendiosa e m enos lucrativa.
E.' is to o que o bom senso a conselha, embora n ão a grade aos estranhos qu e
os atravessam n o cami n h o d e ferro em agosto, por oca sião d os t ouros em
Badajoz. A es ses viajantes, 80 no ta r em a apar ente esterilidade daqu ela z ona,
por vez es temos ouvido comentarem as si m : «Q u e v ergonha ha v er ainda em
Portugal tanta t erra in culta I. .. » «Que de serto I. . . li «N em u ma á rvor e,
sequer l . . . » «Es te Àl entejo é pior que a Âfri ca!» E por e qu ! f ora com díslates
semelhan t es, sem s uspeita re m que o qu e se lhes afi gura «u m vergonhoso deserto
inculto», é terra excelente, se meada qu ase t odos os ano s. E ' nada m enos q ue a
te rceira r egiã o ce realí fer a do p a ís, pr oduzi n do a n ua lmente al guns milhares de
moios de trigo e outros ce reais e l egu m es I. .. À qui está um ex emplo f ris ante
da consciência com q u e se faz cr ftica em Portugal.
P a r a o sul e poente apre sentam-se terrenos de n ature za diversa, ven do -se
herdades de montado de az in h o e algum sob ro; simultaneamente p rodu ze m
ce reais e pastagens. Ao noroeste e norte obse rvam-se planícies e encostas d e
terre n os mais delgados, de a nã l og ss produções, que se prolongam até a os limites

2
ATRAvts DOS CAMPOS

de Barbacens, S. Vicente e Ventosa, com a vizinha freguesia de Santa Eulália.


vasta zona um po uco acidentada, granítica e arenosa. As herdades aqui são as
maiores do termo. Ao norte, nordeste e leste de Santa Eulália, os montados
estão velhos e caducos, quase extintos, sem arvoredo novo que os substitua.
Ao sul e poente escasseiam, e ao sudoeste ostentam-se vigorosos, com tendência
a aumentarem pela criação espontânea de milhares de chnperros.
O terreno é, como já vimos, essencialmente arenoso, produzindo bem em
centeio e pastagens de bamburraI. Às folhas das herdades, estas, são cortadas
por vales pantanosos, na maior parte incultos; noutras esses vales arroteiam-se
e esgotam-se para melencíais e meloe ís, semeando~se-Ihes' t rígo, cevada e aveia
no outono seguinte.
Por este processo bastantes se têm «metido a pão» nos últimos tempos, e
com vantagem, sobretudo nos anos secos ou de pouca chuva.
De qualquer maneira as herdades a que nos vimos referindo estão limpas
de matagais, se exceptuarmos pequeníssimas nódoas de esteve em terrenos infe-
riores da freguesia de 'I'eerugem e o piornel basto de certas folhas do Reguengo
de Barbacena.
Tudo mais encontra-se livre de manchas não havendo terras q u e se possam
considerar i n cul tas ou maninhas. Às moitas de piorno e giesta, que muitas
havia, em maior ou menor escala. e que outrora con stit u ia m couto de caça e
fer8s 1 estão reduzidas a proporções mínimas. quase nulas. Das que ainda exis- •
tem, só medram nas anifes pedregosos, inacessíveis à lavoura. Isto, entende-se,
pelo que respeita as herdades do concelho de Elvas. Nas dos outros concelhos
vizinhos, ainda há extensos matagais de carrasco, pl orno e outros arbustos
silvestres, principalmente nas termos de Àrronches e Campo Maícr.
No de A'tronches. na herdade da Chainça, persistem enormes manchas de
esteve, {xe re ) medronheiro, aroeira, jorna, murtinheiro, alecrim, etc., que dão
uma feiç ão selvagem àq u el e zona agreste, ainda habitada por javalis e lobos.
Resumindo: as herdades do Àlentejo, analisadas de relance sobre um ponto
de vista geral, constituem vastíssimos horizontes em que, a par dos arvoredos
de azinha e sobro nos terrenos «dobrados» e montuosos, se vêem planícies enor-
mes aplicadas às cultu r a s cerealíferas ou a pastagens para gados manadios.
De verão a água escasseia em quase toda a parte, encontrando-se apenas
de longe em longe nos pegos das ribeiras maiores, num ou noutro poço e nas
nascentes que regam as hortas. Por esta circunstânC'Ía as terras tre nstaganas
tornam-se áridas e monótonas no rigor do estie, tristes no inverno e floridas na
primavera. Entre abril e maio a natureza perde o tom severo que a caracteriza
para se exibir sorridente e enge leda com o verdejar opulento das searas, que
se estendem pelos campos fora, e com a me tisag em das flores que realçam aos
montões nas pastagens dos pousios : quadro festivo de pouca duração que se
perde aos primeiros calores de junho.

Em cada herdade de vulto, geralmente, existem as edificações próprias e

-3-
ATRAv t S DOS CAMP O S

indispensáveis à exploração da lavoura . Passando-as em revista, encontram-se:


o «mon t e» e suas dependências, a eira ou eiras para debulha dos cereais, o
bardo das cabras e a s malhadas dos porcos em número de duas ou mais. cada
qual em folha diferente.
Em algumas existem atalaias antigas, que o povo atribui ao tempo dos
m ouros. Afi gura-se-me crença errónea , pelo m enos em p arte. D e uma destas
atalaias erg u ida na herdade d e Almeida, fregues ia de Santa Eulália, s abe-se
qu e foi con s tr uída á custa do município d e El vas, no tempo da g uer ra da
restauração, e a requerim ento dos habitantes d a a ld eia, com o fim de estab ele-
cerem vigias que os avisassem das invas ões d os espa n ho is vizinhos, en tã o f re -
q u entes, com miro. em rou bos e devastaç õ es. Mas voltemos ao assunto principal.
P erto d o m onte, como acess ório útil bastant e apreciad o, ca da h e rd ade de
vulto tem em g eral an exa uma horta o u quin t a e, po r vez es, oliva l e v inha .
E.sta última é contudo raríssima. Ás t erras que cercam o «mon te » ch a ma-se- lhes
Ierregia i s. S emeiam- se t odos os anos, por s erem aduba dos com os est r u mes da s
ca valariças e lixo da Iim pe sa. São os monturos, co mo se d iz em ce r tas escri tu-
r as d e arrend am ento.
C onv ém n otar q ue e m h erdades atrav essadas por ribeiras de imp ortânci a
ex iste m, na s margens r espectivas, moinhos. azenhas, hortas e quintas, que per-
te nce m a sen ho rios es t ra n h o s e d iversos.
Doi habitant es des ta s viv enda s mantêm os melh ores r elaçõ es com o viz inho
lav ra do r, d e q u e p recisa m . E.m ge ra l obtêm del es terras para semearem p equ e-
nas se aras de qu e pa gam querto o u quinto, e a inda a. co ncessão g r a tu ita ou
on er o sa de l hes consen tir em os vivos n a s te rras d o seu cómodo. P elo t erm o de
«vi vos". desig na m -se gene rica mente os gados e aves que p os suem: - umas besti-
t a s qua isqu er, al g u n s p o rcos, um a o u duas o ve lhas. gali nhas. patos, per-ás, etc.

Divisão territorial A s divisó r Ías qu e limi t am e sepa r am as h erdad es cha-


mam-s e linh as o u ext rem as. C onsi stem num a est reita fa cha
de te r ra inc ulta. u m pouco sa liente so b re os t errenos m arginai s. P ara m elhor
escla recer que isqu er dú v id a s, mui tas he r dade s são tamb é m li mitad a s po r marco s
de ca n taria, a os centros d as li n da s, com as ini ciais d o sen ho r io o u a s do nom e
do prédi o. Geralment e cad a herda de divi de-s e entre três a seis p ar celas q ue se
semei am altern a d a m en t e e qu e s e d enom inam folhas. S e a h erda de é g ra n de, a s
folhas cos tu m am ser d e S a 6 a p lica n do -se m ais ao sustento d os reb an h os do q ue
à produção d e searas. S e. p e lo con trári o, é pequena ou mesmo g ra nde, mas apro-
pri ada à s c u ltu r a s cerealífera s. o a f olham ento é men or limitand o-se a du as o u
três , quando muito qu atr o. Nesta h ipótese, a seara prcdo m'ina so b re o ga d o. A
delimitação das folh as n em sempre obedece a r egras fi xa s, i n va r iáve is.
Causas múltiplas, como alargar ou r estringir a seara, d iminuir o u aumentar
os gados, m odificam acidentalmen t e o afolhamen t o d as t erra s. que, em t odo o
caso, é demarcado por ribeir os, estrada s, e rrifes, et c.
Nas herdades de três folhas cultivam-s e e disfrutam-se por forma que, em

-4-
ATRAvtS DOS CAMPOS

cada ano uma das folhas s e la vr a d e al qu eive na pr imave ra para se se m ea r n o


outono seguiu te , outra est á semeada Ou d e rastol h ice e a terce ira fica de pous io
e de pastagens para os ga dos afim de n o ano segui nte se r la v ra da. alte r nando
assi m com 85 ou t ras. N a s que se div idem em maio r n ú mer o, cada ODO sem eiam-se
uma ou duas folhas" elqveivem-se e r oçam -se o utras tan tas, e as excedentes
ficam pousias dls frutan do-s e-l h es os pastos c roedornos com gados ma na d ios,
a té lhes chegar a vez de serem limpas e cu ltivadas. A o t re ta r da l a vo ur a expli-
carei des envol vida mente este assunto. de q ue, pO I a gor a , s6 basta dar u ece ide ia.
As fol has subd ividem-se em t orn as. To r na é a classificação d ad a às fracções
de terren o em q ue se reparte uma fo lha por vontade do la vra dor ou por efeito
de di visórias natu rais ou es t ra nhas, como rega tos. vales. vertentes, es tradas, etc.
Chame-se- lhes to r nas po rque cada uma é la v rad a em separado, t ornan d o o
a rado ou ch a rr ua a o sítio onde começou .
A m aior part e da s folhas e to rnas têm no me próprio que as d i sti n g u e. A
or igem desses nomes provém d a topografia local o u d e circunstâ ncias cor relu ti-
v... Exemplo: a fo lha do Curral ; a da À ta laia : a do Outeiro da Moira. etc.

Area e lotação Há herdades muito g randes, medianas e pequenas. Entre as


maiores, a lgumas co nhecem-se pe lo a umentativo de defesa ,
ou per tal se denominam quando se querem engrandece r. As peq uenas distin-
guem -se pelo d imi nuitivo de m alat ecas o u ch oreviscsís, quando por ventura se
pretende amesq uinhá-las.
N o grupo das primeiras há al gumas de m il hectares, m uitas d e s ei scen t os a
no vecen tos e daí para baixo. D e entr e as últ imas, po ucas são inferior es a
70 he ctares. Mas qualquer que seja o t am a n h o d a herdade us a -s e compuá-Ia
n ão em hecta res, mas em moios de semead u ra d e tri go. cereal tip o.
D e u ma herdade eno rme diz-se : «Aq uilo é u m a d efesa ; l e va oi tenta maios
ou mais». E. para gado e ntão : «bem lhe podem cair r ebanhos I . . . » D e
ou tra de meno res di mensõ es co m enta- s e: «É m uito grande; dá p ara 60 moios
cobertos; faz oito o u d ez reba n h os sem se verem uns aos o u tros.» D a s
pequenas desdenha-se assim : «Uma m ele t ece , l eva dois m oios se l ev ar; um
chap éu de terra, que não lhe cabe dentro um cb a fardel de ovelhas.»
A' lotação em semeadura a diciona-s e- lhe q ualquer outra específica, como,
por exemplo. os mo ntados ( ar vo r ed o d e a zin h o e sobro) e pastage ns. que em
muita s he rdades é a receita principal, senão a ú nica importan te.
A avaliação d os mon tados faz-se por cabeças, quer dizer, pelo n ú m ero d e
porcos adultos que e ngo rda a bolota de cada e no. Os montados de herda des
excepcionalmente g randes costumam fazer, em méd ia, 100 a 150 cabeças : ou tras
Bo a 100; as pequenas daí para baixo, até as menores que oscilam en tre 10 e ZO.
À s pastagens avalfa m-se pelo n ú m er o de r eban h os e ca beças de tal ou ta l
es pécie, que podem sustenta r em cada a no , d u rante determinada época. O r di-
n àriamente as maiores herdades são as dos monta dos e t e rr en os i n fe riores.
a ssi m ca ma as pequenas constam quase sempre d e t errenos ce r ealífe ros de pro -

- 5-
ATRAV J'. S DO S C A M POS

dução superior. Isto, porém, r epito, é r egra g era l que. d e resto. tem muitas
excepções em qualquer das hipóteses.

Dimen sões :L' tudo quanto se pode conceber de mais irr egular e a rbitrário.
Há a té herdades que a certa altur a es t reitam bastante, prolongan-
do-se por entre duas vizinhas. A estes p r olongam en tos chama-se-lhes m an gas
ou Bsuilhões. Em o utras notam- se par ticularidades m ais curios a s, ve rdadeiras
anomalias que devem desapa recer.
E' O ca so da herdade À ter dentro encravada de todo uma ecurela perten-
cente à vizinha herdade B . E a B é por sua vez devassada por u ma outra
courele n as mesmas condiçõ es q ue p erten ce intei r a me n t e à herd ade A .

P o ssu idores Antigam ente os do nos das herdades r esumiam-se, a b em di zer,


nas t rês cla sses predominantes: as ordens religiosas. os titular es
e os morgados. C om a abo lição dos vínc ulos e l eis de desamortiza çã o ex ti n-
gu i u- se o monopólio da propr iedade. e, consequentemente, te r m i n a ram t odos 09
seus d efeitos e va n tag en s : que uma e outra coi sa havia nesse regime, por
m uitos g u er r ead o. por alg uns defendido. A enfiteuse te m diminuído bastante,
embora subsista nas her da des de domínio directo pertencente a particulares. O s
das m isericórdias e ou tras corporações de beneficência e piedade es tã o vendidos
qu as e t od os . poucos p elo se u valor real, muitíssimos com reduções de 10, 20 e
30 por cento . Uma insensatez (p ara não lh e chamar outra coisa) que as leis
perm ite m mas que se não coaduna com os ditames da razão . ..
Hoje vemos as herdades nas m ãos d e se n hor ios de diferente s camadas
sociais, pertencendo a in da muitas a vários rep resentantes da an ti ga n ob r eza
que as h erdaram dos s eus maiores. Em virtude desta circunst ân ci a hã tit ula r
q ue n ão ....ende as s uas herdades por coisa al guma . Ma s a m aioria d elas es tá n a
posse d os grandes capitalistas d e Lisb oa, dos proprietários ricos da prov íncia e
de um ou outro la vrador da zo n a r esp ectiva.
O s u pr emo desejo d o la vr a d or r emediado é adquirir um dia uma herdadita
que o ponha ao abri go d e certas contingências. Todos o s seus esforços e sacr i-
fícios convergem para es s e desideretum que alguns logram obter. m as q ue
muitos não conseguem. O lavrador empenha-se tanto em possuir uma h erdade
qu e não h esita em re correr ao empréstimo para a comprar, pagando-a mesmo
por preço s uperior a o seu valor intrínseco. Acima de quaisquer considerações
fas éina-o a ideia, aliás louvá vel, de cultivar te rras suas que possa melhorar à
vontade, s em r eceio de que ess e melhoramento r ed u n d e em prejuizo p ró p rio, p or
efeito da cubiça desalmada e menos escrup ulosa do colega a ssambarcador.
Que, no te- s e, entre lavradores, os vizinhos ou colegas amig os constitu em o
maior número. dispens and o-se obs équios recíprocos. resp ei tando-se mutuamen te
e dando-se vizin hança u n s aos outros. «Dar vizinhança» é tolerar e p ermitir
que os gados de cada q ual entre m u ma ou outra vez nas terras do vizinho que
não estejam gu a r da das. E nfi m. a maioria dos lavradores alen tejano s gu a r d a a s

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ATRAv tS DOS CA M P O S

conveniências d e classe, o que lhes é honroso. Mas a par dos que cumprem com
esses deveres, há quase sempre o ambicioso desmedido para quem t odas a s
herdades parecem poucas afim de satisfazer os seus planos vingativos, egoístas
e a bsorventes.
Àparte excepções, 09 grandes senhorios fidalgos e capitalistas ainda têm
umas certas e valiosas considerações pelos seus rendeiros, que é de justiça
recon hecer e registar. Se os há que não escru pu ltaam em aceitar «leva n tes » de
renda s propostas p ara satisfação de vinganças odientas, ou por ambiçõe!J des-
vaira das e egoístas, m uitos mais se conhecem que repelem com nobre altivez
essas prop ostas aviltantes.
A s cas as Cadaval. C o n d e d e S . Martinho. Marqu ês d e P en alva. D uqu e de
Albuquerque e outras timbram em conservar e p roteger os seus ren de iros anti-
' os como pro cedimento qu e carecteeieave a velha fidalguia portuguesa.
D e entre os grandes proprietários modernos também se encontram espíritos
guiados pela m esma louvável orientação. O falecido capitalista de Lisboa,
António J os é de Andrade, foi um gr an d e protector dos seus arrendatários
lavrador es, exemplo n obremente seguido pelos seus di gnos descendentes.
J acin to d a Silva Falcã o, tamb ém d e Lisboa, era outro amig o valioso da.
lavoura a len tejana . E. co mo estes. mais alguns que não q uere re tud o para si,
entend endo, com r a zã o, que o rend eiro d ev e auferir l ucro s pro porcionais ao
seu trabalho e capital.

Arrenda mentos R ealizam-s e por es crit u r a p ública, o. praz os curtos d e 2 a


6 a nos. PaTa interes se reciproco do senhorio e rendeiro deviam
ser mais dur ad círos, nunca inferiores a d ez an os. A extensão do prazo garantia
ao lavrad or a estabilidade, e. consequ entemente. este abalança va - se a empreen-
dimen tos dispendiosos, com o plantações, limpeza, a r r'otea'mentos, drena gens,
tud o n a. mira em lucros maiores, que também melhorariam a propriedade valo-
rizando-a mui to mais.
Com o s arrendamentos a curto pr a zo os rendeiros receiam entrar em ten-
tativas de tard io resultado, cu jos lucr os tal vez a proveitassem a outro que nã o
fosse ele, visto não ter a cer tez a d e continuar na herdade. Isto é Íntuiúvo. N ã o
carece . d e d emonstra ções . Nos arrendamentos figura um Ii edor e principal
pagador, que t oma to d a a responsabiüdade da renda e outros co mp ro m is sos.
A lgu ns se n ho rios, po u cos, exi gem, além d a es critura, letras d e câmbio a ceites
pelo rendei ro, a pagar no dia do vencimento da renda em cada ano.
Às con di ções d a es cr it u r a variam muito. sendo feitas ao sabor e von tade
do senhorio com a aq ui escên ci a do rendeiro. H á escrituras de 20 e 30 condições ;
e alg um as são ass ás vio le n tas. p odendo s ervir de pretexto do senhorio para se
desfa zer d o r endeiro, toda a vez que assim o queira.
A s principais condições impostas ao rendeiro são: pagamento d a renda em
determinado prazo, em casa do senhorio ou seu r ep resen ta n t e ; lavrar e semear
as folhas correspondentes a cada ano; fazer os cort es dos montados na época

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AT RAV e S DOS C AMPOS

p rópria e Das folhas re spe ctivas, n ã o podendo cortar e desbastar á r vo r es , eh a -


parros e pernadas r eais s em licença do s enhorio, e, quand o o fa ça, pagar tal ou
Qual multa; cons ervar a s lindas b em visívei s, aceirando-as d e ve rão, q u ando
seja herdad e d e pa stag en s e arv oredos; trazer o m onte a ssea do e os p rej uízos
que nele causar r epará-l os à su a cu s ta ; resp onsabilizar-se pelos p rej u ízos oca-
sionados p el os se us doméstico s; concorrer para os concertos e me l horamentos
que haja a faze r n os mon tes rr e n s po rtando t odos os materiais à su a cu sta
e dando pou sada a os operá r ios ; n ã o reclamar benfeitorias ; n ão p oder s u bloca r
ou enca m pa r sem licença d o senhorio; não entrar com r elvas e monturos m a s
sair com eles ; n ã o pode r al eg ar ester i li da d e, incêndios, secas, inundaçõ es: inva-
sões de gu erra ou outro qu alqu er s u cesso previsto o u imprevisto que o possa exi-
mir 80 pa gamen t o da r enda n o todo ou em parte; renunciar ao f oro do s eu domi-
cíli o ob ri ga n d o-se a r esponder no juizo da comarca em que reside o senho r io
quando d ê lugar a pleito s judiciais; considerar-se desp ed id o t od a a vez q ue n ã o
cumpra po n t ua lme n te as condições d o contrato, et c. N a lgun s arr en damen t os
de h erdad es co m s obreiros, a cortiça é para o s en h ori o, se isso r e pr esen ta verba
a vultada; se ndo coisa pouca, q ua s e s em p r e nco. p ara o r end eiro.
As r endas vencem- se no dia 31 de dezem b ro de cada ano. Quanto à época
do pagamento é confo r m e a s clá us u l as d o co n tr ato. As das h erdades d e mon-
tados e pastage ns obr igam -se os r en d eiros 8 sa tis fa zê-la s n o dia do vencim en t o,
embo ra al guD3 a s pag u em dias, s ema nas ou meses de pois, por co ndesc end ência
obsequ iosa do s enhorio. As das herdades qu e só pr oduz em cereais, apesar d os
arrendamentos serem também por anos civis, s ó se vencem no dia de Santa
Maria de A gos t o, imediato ao ano fi n do em 31 d e dezembro últim o. Exemplo :
o r endeiro Fulan o, que completou um ano d e arrendamento a 31 de d ez embro
de 1899, paga essa renda no dia 1:; de agosto de 1900. A m ora d os 7 mes es jus-
t ifica -se pela natureza da herda de, que tendo por ú nica p r o d ução 8 s eara, só em
esta se colhendo s e pode obte r receita para satisfazer o encargo . A i n d a mais:
antigamente todas 8S herdades de p rod ução ce r ealífera eram ar rendadas a m oios
de pão. Daí o costum e d e se s a tis faz er em nas colheitas.
Hoie a i n da se re alizam muito s arrendamentos por este modo, qu e, de resto,
é um s ís t em a r acional que p or veze s equilibra os interesses do senhorio e ren -
deiro. Q ua n d o o cereal colhid o é inferior ou misturado de impuridad es, n ã o se
conside ra c:de r eci bo»; p ortanto o rendeiro t em d e ir comprá-lo bo m , o u satis-
fazer a renda a dinh eiro, r e putand o o gr ã o p el o preç o da estiva camarária o u
por outro que convencione co m o senho rio. A s escrituras pr evine m estas hipó -
teses, consignando a forma d e as r esol ver .
A maioria dos senhorios im põe a o r endeiro a ob rig ação d e paga r todas as
contrib u íções, for os e outros en ca rgos que pesam so b r e o prédio a r r en d a do .
sem q ue sejam abandonad os ou d escontados n a r enda. Outro s, poucos, eng loba m
a r enda e 05 encargos, pagando o r endeiro u m a verba só .
A s pitençes, que outro ra se estat uíam na maioria dos arre ndamentos pouco
se usa m hoje. Em ge ra l constam do se g u inte : carradas de len h a, de du as a s eis

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I
ATRAvtS DOS CAMPOS

no tempo do co r te " um o u d ois p orcos go rdos ou artoubas de ca rne che ia por


ocasião das ma tanças e fu m eiros ( entr udo): u m borrego ou chibo pel a Pá scoa ;
peru pelo N a t a l ; queijos n a primavera; galinhas e frangões em indeterminada
época; carradas de palha pela colheita; veIos de lã churra para enchime n tos
pela tosquie, etc.
É claro que is to tudo não se afigura na pitança que pesa sobre qualquer
arrendamento. an tes são raras as que constam de mais de dois ou três artigos.
Mas como quer que seja essa u se n çe está caduca, prestes a desap arecer .
A entrada e saida de um rendeiro para qualquer herdade regula -se pelos
usos e costumes locais, que constituem lei atacada por todos. N a r egiã o de que
principalmente me venho ocupando. e nas outras limítrofes. observa-se o
seguinte: 05 de spedimentos e alte ração de rend oso do senhorio da herdade par a
com O rendeiro. ou do rendeiro para com o senhorio, é de uso secular, asse nte
e aceite por todos, participarem-se 'respecriveme nte durante o mês de maio do
ano em que termina o arrendamento.
N"ão havendo de parte a parte nenhuma participação nesse sentido.
subentende-se prorrogado o contrato por um ano mais, pois que, legalmente.
em passando maio, nem o rendeiro se pode despedir do senhorio. nem o senho -
rio despedir o rendeiro. Sobre este ponto têm-se suscitado questões civeis resol-
vidas par sentença que se conformam em absoluto com esses usos e cos tumes.
O novo rendei ro toma posse n o dia 1.° de j a n ei r o saindo o antigo na vés-
pera, 31 de dezembro . O novo entra par a o. herdade encon trando-a devol u ta,
mas com a folha co r repondente semeada pe lo re nd ei ro a n ti go, para lhe
colher o produto no próximo verão, se m q ue po r isso t enha d e pa gar q u an tia
ao senhorio ou ao no vo r end ei r o. I sto n ã o ex ced endo os limites d a pra xe. Abu-
sando a rrisca-se e paga r quar t o ou qu into da pro dução ob tid a na te r r a q u e
semeo u o. mais, se não sofrer cc rrecti vos m a io r es preceitua d os n as es critu r as d e
arrendamento. Além da fo lha do estilo que o ren deiro despedido t em d ir ei to a
deixar semeada (um terço d a herdade o u menos. seg u ndo as fol h a s em que ela
se divide) o mesmo rendeiro, n a maioria dos CB SO S e em análogas circ u ns tâncias,
pode também semear as «relvas e mo nturos» de área ig ual à que encontro u
ocupada pelo se u antecessor. P or isso dizem as escrituras: «entra sem relva s e
monturos mas sai com eles».
Como relvas, no caso em questão. enfeude-se a t erra de rastclbíce. que por
ter sido estrumada no alqueive se l h e q ueima o restolho no ano seg ui n te pe r a
de novo se s em ear no próximo outono, produzindo assim dois anos co nsecuti-
vos. As relvas em semeadura só devem abranger uma torna contígua à folh a
do alquei ve.
Por monturos dassi6cam-se os ferragiais contíguos ao m on te ; ou os bafos
do monte. com o também alguns lhes chamam, se não lhe encontram a feição
própria dos [etrag ie is. De maneira que o novo rendeiro tem de respeitar a
seara do antigo. não se op ondo aos serviços de que ela ca recer até estar ceifada
e retirada do restolho.

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ATRAVfs DOS CAMPO S

Por sua vez o antigo, is to é e qu ele que sai u em 31 d e de z emb ro, cumpre-
- Lh e retirar a sua s ear a em r am a até ao dia 15 de agosto. Digo «em ra m a », po r -
que o m esmo antigo r endeiro n ã o t em di r eito d e d ebulhar a seara dentro da
h erdade q ue d eixou. Só o po de faze r media nte licença d o re n de iro n o vo, o que
n u nca s e pede por n ão convir a o dono da seara, qu e p recis a de palhas no local
para onde se m udou.
D e qua lq u er fo r m a o r endei r o antigo só te m d ir eito a u m corte n a ter ra
que semeou . Quer dizer: n ão pode cor ter a r estolho o u h a m b ur raI q ue esca pou
à ceifa, o q ue s eria evide ntemen te seg u ndo cor te . P ode porém gadanha r os
fenos cria dos n os va les, n esga s, san jas d a s t erra s p antanosas, inculta s, existen-
tes na folha d a s ea r a e Das n ó d oas da m esm a sear a em que n ão ceifou coisa
algu m a . Em r esumo : n o sí tio em q ue ceifou nã o p ode gadanhar; n o local onde
gada n h ou não po de ceifa r.
En treta nto o r endeiro antigo te m ainda o direito de aprovei tar o a gosta -
dout o da sea r a última a q ue m e 'Tenho refe rindo, com en d o-l h e a espiga e
sementes co m O gado su ino q u e entende r. e bem assim com o número de bois ou
bestas estrita men te n ecessárias ao acarreto respectivo.
Na hipótese de se em p regarem b ois n o acarreto t êm eles de ser no qu ãd ru-
pIo do número de carros o cu pa d os. P or ex emplo, se os ca rros forem quatro, e o
servi ço se efectuar de r ev ezo, como s e cost uma, podem pastar n o r estolho 16
bois, metade de dia e todos de noite.
S e, porém, O t ransporte se efectuar co m muares ou ca valares estes s 6 podem
comer no agcstadouro du r a n t e a noite, vis to tra balhare m o dia t odo, excepto à
hora d a merenda, ao m eio dia, em que é d e uso selem a rre çoedcs.
P a ssa d o o di a 15 d e agos to tem que estar a restolhice despejada e o
gado fora, para o novo rendeir o ficar no pleno disfru to de t oda a herdade.
Nas herdades de montados ao re ndeiro que sai cumpr e-lhe levantar a.
bo lota a t é ao dia 31 de dezembro, salvo se há q ualquer acordo ou contrato
especial que prolo n gam esse praz o.
II

U M d os ca rac te r ís tic os m ais notá veis da p roví ncia t re n sta gan e, sã o os


mon tes, is to é. as ca sa s d e r es id ência Das her da d es, q ue s im ul tan ea -
me n te e po r vi a de regra s e ap licam tamb ém a sedes das la vouras
qu e se explora m nas mesmas herdades. S ã o, po r assi m dize r, a quilo
a qu e noutr as p rov íncias se ch am a granjas, casa is , q u i ntas, etc.
À contece p oré m haver herdades. pequenas, se m monte, j á p or nunca n elas
existir, j á por ter em caído à m er cê d e abandono, com o co n sequ ência da a nexa-
ção d.e he r dades , r espe ctiva a o u tra o u o u tr a s d e s u perio r im portância .
Em é pocas remotas q u a n d o a s lav ouras estavam mais divididas e menos
adiantadas, q u ero dizer, q uan do , g er alm en te, ca d a lavrador r endeiro vi via s6 de
uma h er d ade em que s eme a v a pouco e mal, todas ou q uas e to das tinham m onte
própri o, em bo r a defictenríssimo. Ainda h o je quem p ercorre o Alentej o v ê d e
longe em longe as ruinas d ess es ca sebres, observan do ta mbém com m aior fr e-
quência o u t ros de igual inferioridade q ue s e mantêm intact os, até bem co n s er-
vades, sem con t udo s e n otar n eles a animaçã o própria de u m cen tro de lavoure.
Porqu e assim co mo há herdades se m m onte, também existem m ontes q ue n ã o
são cómodos de lavoura. Estes, de proporções modestíssimas, como a tr ás d isse,
habitam-n os os guardas ou o u tros criados, principalm ent e 8s na deíros. À.s
vezes, poré m , residem ne les csse íros estranhos 8 0 la v rad or d a h erdad e - seorei-
T OJ que lavram por sua conta, a quarto ou quinto, te rras ced id as pelo proprie-
tário ou r endeiro ge r a l. Em contras te com a ruina e d ecadência d os montes
humildes, muitos outros se têm re construido e ampliado, sendo h oje bons alo-
jamentos rurais, onde, a par da s olid ez, r ennem as acomodações n ecess árias aos
diversos ramos da vid a a grícola. P elo que t oca a asseio, ocioso é notá-lo. De
qual quer im portân cia que os montes sejam, velhos ou novos, gr a n d es ou pequ e-
nos, todos o atestam em aIta evidência, q uer d e portas adentro, quer nos muros

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AT RA V !'. S DOS C AMPO S

exteriores, de uma alvura res plandecente. destacando-se ao long e p or entre o


verde escuro das azin heiras ou so bre a t erra campa das s earas e po u sios.
Pelo exp osto s e comp r eende q ue os montes, embora se construíssem todos
para o mesmo fim, s e dis ti ng uem bastante, tanto n a ca pacidade com o n a co n s -
tr ução. Nada exagera mos divi d in do -os e m cinco cla sses:
P rim eira: os da apa rê nci a acaste la d a . s olarenga s, co m torres e a meias, d e
doi s a n dares, cer ca dos p or alto muro, que dei xa de p ermeio o pá tio de en tra d a .
S ão os mais anti gos e en tr a m n o número d os melhores . - Segunda: a qu ele s
q ue, n ã o t endo ve t us ta imponência dos primeiros, possuem contudo os requi si-
to s n ecessári os à s ed e d e um a g ran d e lavoura e à habitação confort ável do
lavrador e s ua famí li a . «C ó m od os» há d este gén e ro cuj a superioridade em a lo-
jamento s é ma nifesta sobre os ou t ros. O s mo n tes deste se gundo tip o d enotam
no se u t odo u m a fe ição mais a leg re e moderna. Compõem-se ge ralmen t e d e
casas a ltas e ba ixas, co m janelas e po r ta do s r ectangulares, sem qu e em volta os
r esg uar d e q ualquer espécie d e mu ro . À s porta s exteriores dã o para t er rei ros
sem veda ção, q u e se prolong a m ind efin ida m ente pela he r d ade. - T erceira: os d e
m en os a como dações que os prec eden t es. C o m pá ti o m u r a do ou sem ele. uns
ao r és-d a- chão, e o u tros com sobrados, p ossuem em ger a l al ojo suficiente
p a ra u m a la voura mediano. Mui tos m ontes d es t es três grupos têm o p ortado
p rin cipal encima do p or bra z õ es il u st res da velha aristocracia p or tu guesa .v--
Quart a: os de po uca s ca sas ao r és- d o-chão, e m núm ero restrito a o indispen -
sável a u m a l avoura r el ati vam ent e pequena. Se possuem compartiment os para
a r es id ência do l avrador, são tã o exíguos e dimin utos que rarís simas v ezes s e
desti nam a t al u so. - Quinta: os d os t r ês a seis casitas baixas, i n cl u in do depen -
d ên cia s. C omo di sse mo s n outro lu gar. estes montarecos habitam-no s o s guardas,
pasto r es, caseiros, etc .
P o voam t amb ém algumas h erda des o ut ras vi ven das a g rícolas q ue, p ela sua
sumptuosi d ade e con diçõ es exc ep cion ais, nad a se confundem com os montes.
Alud o a a lg u m as quinta s d e r ecreio, cumulati vamente sedes de la vo u r a , para o
q u e reunem os ele me ntos precis os, a lé m dos q ue lhe sob ejam p ara a r esidência
apra zível d e um o p ule n to propri et á ri o.

SITUAÇÃO E ASPECTO

E.m g era l os m o n t es Iieam nu m d os ex tremos da h erdade, n ã o s e con h e-


cendo motivo plau sív el q ue j us ti fiq ue esta a nom a lia.
Erguido s no a lto d e qu alqu er colina o u na vertente de uma encosta , d o m i-
na m vast os h orizont es. cuj o p a nora ma, se é escasso, das su r pree n de nte s belezas
n aturais que se admiram nas t erra s d o n orte, a grada contudo, pela f ertiHdade
do solo extensíssimo e pelo avultado nú mer o de ga do s d iversos que o p ovoam
e animam.
E m vo lta dos montes não há, é certo, os encantos própri os d a s paisagens

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AT R AVÉS DOS CAMPOS

pitore scas. Falta-lhes o principal. a a r bo riza ção, nula o ut ro r a , mas q ue ao


pr esente já se obser va em a lg u ns, e q ue t end e a generalizar-se pelo emp r ego d e
eucali ptos e acácias. Ma s, à falta d e a rvo'redo d e em belezamen to, e como com -
pen sa ção d e a p reço, m ost ra m à larg a u m cun ho a leg re e típ ico q ue se destaca
princip almente do al vejar dos seus muros, do bulí cio dos seus h ab itantes e da
impon ência das a lme n a ras de palha e fe no qu e se lhes erguem próximo. Ànti-
gumen te era m ain da af o r m o seado s pelas medas de Len h a , núcleo de pirâmides
monu menta is, caprichosas e correctas, que de lon ge ch am a va m a atenção d o
viadante. O bra pacíen te e cu idadosa do s cr ia do s da lavoura nas m ar és v ogerüis.s
(épo cas de po ucos a fazeres) em que os t raba lhos a grícolas estavam p ara líaados
por in ver n ia s ou estiagens.
Ergui a m-s e para assim s e acomoda rem os m a deiros e achas qu e se a cumu-
lavam em frente dos mo n tes p or sobeja rem do cons u m o e p rocura. H oje é raro

..
cons truirem-se mede s. O vage r é po uco e a l en h a não sobeja.

,.
O s montes considera m -se albe rga rias fran cas pe ra caminhantes e mendigos.
hospício de ne cessitado s, e a té por vezes refú gio de perseguidos . Encarado s por
outro prisma sirnbolíznm o rrabs lhc e a abastança p or que reunem e exibem à
larga os melhores produto s d a t erra . D e feição ess encialmente cria dora, sinre-
ti.. em si toda a vida agrícola alentejana. T oda. desde a s messes de lavoura até
às aves dom ésti cas, que a li s e multiplicam livremente em viveiro fecund o e
constante. Às av es pel os cantos e estrídulo s de suas voz es, r epetidas por cente-
nas de ga l.in âcios e dezenas d e palm ípedes, con s tit ue m a nota m ais alegre e
animad ora dess es centros rurais, s obrem odo interessantes.
... ... .... .. . . . . .... .... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ... . ... . . .... .. . . ... . . . ...... . . ..
A s con st r uções de cada m onte m oldam- se g era l m en te nas dos sistemas
vulgares das t er ra s pequena s da provfnciu, e comp õ em-se d e h abita ções para
uso doméstico, d e casas pa ra fins div ersos e d e várias depend ênci a s ex te rio r es .
Entre os maiores, há-os p rov id os de ca pela para exercício d o culto divino, q ue
outrora tinham capelã o. Hoje n ão O têm e em p ou ca s se diz misso . Só p or a caso
em alguma qu e fi ca próxima de sede de fres uez ia de ca m p o (paró quia er ma, sem
povoado junto), onde o pároco não encon t r a ouvínte s quando n o domin go l á
aparece, vindo d a vila . dispos to a cel eb r a r . Em tai s circunstâncias. o pri or
vendo-se a penas com o sacristão , r esol ve ir dize r missa à cap ela d o monte. Ali,
pelo menos t erá m eia dúzi a de a ssistent es qu e O esc u t em .

CASA DE HABIT AÇÃO

A que espec íalraente se destina ao lavrador e s ua f amília co m p cen d e :


casa de entrada, u m ind eterm i n ad o núme ro de q ua rtos, sa la de j anta r, d ispensa.
cozinha, amassaria , casa de pão, etc.

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AT RAv t s DOS CAMPO S

Casa de entrada S ó tem de notáve l as cantareiras de loiça, estanho, arame


e cobr e q ue ornamen t a m as paredes, de alto a baixo, em
:fiamantt"s esta nheiras e sa nefas de pin ho. tintas d e az ul e encarnado.
Por es tanh o, ar ame e cobre, d esignam-se genêr-icemen te os tach os, pra t os,
panela s. bacias. a l mofari zes e outros utensílios de cozinha, d e va riadas d imen-
sões, q ue n outros t em p os se a p licava m habitualm ente aos uso s p róp r ios. H oje
só se u t ilizam a lgu n s dos m aiores co m o ta chos gra n des e as adas. T udo mais.
que é b a sta nte e d e va l o r considerá ve l, conserva-se e aumenta- se p ara fig u r a r
apenas n as centere írs s, a co m por a casa num luzido e brilhante a puro . t o
fracasso d a l avradora - o se u lux o ca seir o, q ue a va nglor i a basta nte quan do
es tr anhos l h o gabem.

Dispensa Vasto compa rt imen to abarrotado de comestívei s. A li se arm az ena


o f u meiro dos s u mos. i st o é, o produt o d a s matança s de oito a doze
cabeças gran des. a s melho r es q u e saíra m do m ontado.
O f um ei r o comp re en d e : g ro ssas m anta s d e to ucinho em p il h ad o em
salmou ras pr óp -rie s ou em potes de ba rro e caix o t es ; as va ras de enchido
com o paios. ch ouriços, li ng ui ças, m orcelas, cacholeira s e fa ri nheir a s. ca da
qua l em separado, e t odas sus pensas po r cor d as presas ao t ect o, fo r m a n do
p or este mo do a pa r re ir a ou l atad a d e ca rne ch eia. previamente d efumad a
n os vãos da chaminé. S e a carne já enx ugou, a latada n ã o apar ece p ois que
o enchido p ass ou a armaze n a r -se em p otes d e b arro o u l a ta. Em vazilhas
a ná logas e se mel han tes, co nserva -se igu a lment e a m a n teiga ou banha, e os
p êzinhos e lacõ es.
D efron ta n d o com a ca r n e d e p orco e s eu s a ces sórios, estão os potes d o azeite
e os das azeitonas ; as as adas d o q ue ijo, os caixotes do s legumes, os t abul eiros
d e p ã o d e t rigo - ralo e bra n co - os ovos. arroz, fru t as. etc. E, todos estes m a n-
t imentos ali figura m, entre b al a n ças, p esos e m edidas, n ã o por oste ntação de
a bundâ ncia, m a s como p r evidência eco nó m ica d e p rimeir a i n tuição - alimen tar
com b ara te z a uma criadage m avu l tada, qu e oscila ent r e 60 a 1 00 ou 200 h om ens .
E p a r a essa a limentação sai r barata . necessita -se reunir por junto e em condi-
ções van taj osas os gé neros alimen tícios de primeira n ecessi d a d e. É. o que fazem
o s g ra n d es la vrador es, qu a n do lho per mit em os s eu s recurs os p ecu n i á ri os. Qu e
n em t odo s os possuem às ve ze s, cumpre tamb ém acrescentar.

Coz inha Numas partes é de caráct er ex cl usiv o, n outras serve sim ulta n ea m en te
para am os e criad os. E m qualq u er d as h ipó t eses, consist e num vasto
compartimento de lareira d escomu na l, s empr e d e lume aceso, s ej a de di a ou de
noite. Em volta d a cas a, p elas p aredes t od as d e a lto a b aixo, como n a ca sa d e
entrada, ostentam-se igualme nte as or na me ntações caracterís t icas d os dom i ci-
lias rurais alentejanos.
Nas gutrlendas e est a n h ei ras, lá s e vêem tam b ém os se rviços d e cob r e,
arame, estanho, ferro e barro, onde se de stacam tach os e as a d as m onstruosa s,

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ATRAv t S DOS CAM PO S

por entre pratos, fdgideiras e panelas d e lotes d iversos, t udo rea lçando p el o
brilho. disp osição e ap u ro de um cuidado inexcedível.
À um d os cantos depara-se com o pote da água. ele mento q ue também
existe n os câ n tar os d e cobre, l at a e barro. que figuram n os poiais. À cozinha, em
certas partes. t ambém serve d e refei tório da ganbaria e r estante pessoa l, como
carpi nte iros, ferrador. etc. Noutras, porém, a s r efeiçõ es a os cdados t êm lugar
n a casa de enteada, junto à p orta p ri n ci p a l. À mesa cost um a s er comprida e
estr eite, de madeira em gers l, e d e p edra por excepção.

Amassaria t a oficina do fa brico de pão das diferentes qualidades que se


con so m em. T omando p or base a importância do co n su mo. temos
em pri meiro lugar o p ão de centeio, d enominado mnrrocete, que se dá aos
criados e em a.l te ses e ; em s egundo, o p ã o de tri go - branco e ralo - que é r es-
pectiva men te para a mos e cria do s d e p or tas a d ent ro; em terceiro e último, a s
perrum a$, pão d e farelos d e centei o com qu e alim entam os cães d e ga do . O
msrrocete fabrica- s e e m. escala muitís simo s upe rio r à dos o u t ros p ães: À s
«casas grandes» conso m em anu almente se ten ta a cem moi as d e fa r in h a .
A amassaria es tá provida de todo s os seus pertences: altezas d e madeira e
alguidares de barro pa r a os a m assilhos ; ca ixotes, saca s ou t u lh as pa r u a s fari-
nhas e farelos j ca niços p a ra os marrocates e perrumas, penei r as, toalhas,
tabuleiros, et c. Se o m ovim en to é gra nde, a fa rinha e o p ã o oc upam uma
segunda casa contíg ua ou sep a ra d a .
Há montes e m que a cozi n h a e ama ssari a pa r a a cr i ad ag em fica m fora da
casa de habitação.

ACOMODAÇÕES AGRfCOL AS E PECUÁRI AS

Re sumem-se Das seguintes : C8Sa. d e r ações para ca va lg ad u r a s e bestas,


celeiros, queijeira, fomo, cas a d e lã, ca valariças, palheiros , co cheira, atafona,
casinh a dos ga n hões, casinha d o abeg ão, loj a d os ferre iros, galin h eiro, cas a d os
pintos, chiqueiro, cabanas, curral, etc. À s t r ês prim eiras, tanto se instalam em
divisórias interiores, contíguas à s da habitaçã o fa m ilia r , co m o em ca sas ex t e-
riores separadas. As r estantes são, por via de regra, ed ifica ções is oladas, e loios
de portas af or a, como vulgarm ente s e diz. P o rm en oriz a r ei todas q u e m ereçam
especial mençã o.

Ce1eiros Divergem muito em núme ro e ca pacidad e. À lotação dos maiores


n ão va i al ém de duzentos moios. Localiz ados ao rés-do-chão ou em
altos, o seu piso é de tijol o ou a sfalto . O asfalto introduzi u -se há uns vinte
an os, sendo dec erto o m el h or sistema para a boa co nservação dos géneros.
Os antigos silos (círios) ou tulhas s ubterrâneas abe rtas nas cercanias dos
montes para depósito de cereais, suponho já não existirem em nenhum a herdade

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A T RA v t S DOS C AMPOS

do Alentejo. No concelh o de El vas têm-s e enco nt r ado vestígi os bastantes d essa


u se nçe ára be, a ind a em v oga há po uco s an os em a lgum a s terra s d e Es pa n ha .

Q u ei j e ir a Casa onde se prepara o queijo e o utros lacti cínios. C o stuma s er


u m amplo compartimento provido de lareira espaçosa que impro-
priam ente d enominam chaminé. Ali se ac end e o l u m e para a confecçã o d o
e re befe conse rvação d e u ma t emp eratura el evada, necess ária a co ag ule çâ o d o
leite e à man i pula çã o d o qu eij o n os dias frios. Pelo tecto da casa p en de m
mo lhos d e f olhag em d e s abugueiro ou freix o, a qu e chamam mosqueiros, Ser-
vem P S'C8 atrair em a si as mos ca s, qu e e m enx ames acodem às queijeiras, o n d e,
como em t oda a parte, se tornam importunas e n ocivas, pelo menos aparen te-
m ente. Dizimam-nas en tão com o aux ílio do folh edo" onde se a coitam" a r ti ma-
nha s imp les de ex celentes r esultados.
A' n oite. q ua n do tud o está em sossego, o roupeiro, (enca rregad o d a
q ue ijeir a ), chega-se a os m os que 'ir os, e, a ca da qual, d epois de lh e enfia r um sac o
que segu r a pela bo ca , a g ita-o com violência para a m o s ca ri a se desa lo jar . O
efeito m anif es ta-se Logo p or um sussurre e lvoro te d c , indicio d e b o a ca çad a .
Im ediatamente va i-se tirando O sa co. dev agarinho, sacudindo-o a miudc, a t e
fic ar de fora com a bicharia no fundo e al guns fragmentos da folhagem . Sem-
pre fec h ado p ela boca é batido no cb.âo. despejan do-se n o lum e. Re conhece-se
en tão a im portân cia do apanh o. q ue freq ue n te me n t e atinge p orçõ es consideráve is.
A q ue ijeira é g ua rn eci da co m os m ó veis e ap r es tos próprios. Eis os princi-
pais : b ar r el ei ea ou ban ca em que se fa z O q ueí i o : asadas pa r a a coagulação do
leite, para a coalha da, como vul ga rm ente se di z; ta cho g ra n d e d e cobre para o
almei ce (soro) i r ao lum e e prod uzi r o a tab efe; esc u madei ra , pan ela pa r a a ág ua
quen te; formas de q ue ijos (sinch o s d e lata ) ; di tas para req ueijões (ces t inhas d e
verg a e l a ta); p edras co mp resso ta s para espremer em O queijo grande d e ovelhas;
va silh a do car d o, saleiro. coado res. esfregões, etc.
O rdinàriam ente, o q ueijo en x uga e fer m en ta n outra casa. E m artigo próprio
referirei o m ais q ue diz r esp eito à i nd ús tr ia de l acticí n i os.

Forno de cozer pão E difi ca ção tosca e gr osse i ra" Da da n otável quanto à s ua
a plicação principal. Mas como sob a desig n a çã o ge né-
rica de fo rno s e us a com p ree n d er a elpedrade qu e o precede, impõ e- se a r eferência.
atendendo a q ue este l o cal é o a g asalho o u al berg ue habitual de mendigos e va g a-
bun d os que, n o ge ral do Alentej o, são con h ecido s por maItes es. Que cenas de
vadia gem e per versã o se n ã o pro jecta m nesses to scos pardi eiro s, atulhados n a s n oi-
tes d e inverno por dez en as d e m al andr os. en tre um o u o ut ro i nfe liz di Ana de
m elho r sorte l . .. Quem co nh ece o Alen tej o sa be pe rfe ita me n te como os fornos
são teat ros de planos crimi nosos e o utra s vergonh a s so ciais qu e ninguém trat a d e
extinguir.. . Em alguns m ontes o forno co m unica co m a h abitaç ão familiar. N este
caso a m altess ri a aco ita-se em albergue próprio. mais ou m en os distanciado.
O s ciganos não pernoita m junto dos maItes es, com o s quais não gostam de

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A TRA v t S DOS CAHPOS

conviver. Acampam e d orm em a ce r ta d ist ân cia, a o abri g o de mur os, penedos


ou á rvores.
Já ago ra, e p or coe rê n ci a , a lu di re i ta m bé m à h osp edag em q u e se dispensa
aos tra nseu nt es d e confiança, co mo Iutr íq ue i eos, m a rcha n tes, ce ldei r eieos, etc.
Á estes d é-se-I hes p ous ad a melhor em qual que r d epen d ência . o u me s m o na s
casas de h abit a çã o, se me rece m co n fia nça . Enfim a ho s pitalid ad e a ni ngué m s e
recusa, disp en sando-se con for m e a posiçã o d o que a r eceb e. E sta prá ti ca a nti-
quíssima im põe-se p ela s ci rc u nstân ci a s in erentes a o meio e à v íd s a g rí cola ,
cumprindo-s e gostosa m en te co m t od os, q ue m erecem u sufruí-la .

Casa da lã ou laneiro S erve pa r a div er sa s aplicaçõ es, a lé m daqu ela por que
se me nciona . D e r es t o, a lã é a coisa q ue m e n os t em p o
8 ocupa , po r se r cost ume ve n de r -se e ex p o rt ar- se no verão, l ogo d epois da t os-
quia. M a s como em a lg u ns a nos se n ã o v ende de p ro nto e é fo rçoso eo nse rvé -I e ,
destina- se- I b,e uma ce se para a rm aa êm .

Cavalar iças C ost u m a m ser du a s ou tr ês , de rou ngedcur us d e a lvena ria e p i so


- - de ca lça da . G e ralm en t e falta -l hes a cu bagem e ve nt ilação, o q u e é
J)8r8 la ment a r pelos ób vi os i n co nv en i en t es qu e r esultam . S en d o três as es t r eb a -
rias, u ma d est ina -se à s p a r elh a s d e mu ares, outra às ca va lgaduras de s e la e
gara.nhõ ~s. e a o utro , a pi or, para as b estas de ce rga. S endo duas ou uma só,
o gado aq ua rtela -s e todo j u n t o ou pouco repartido, co n fo r m e a s circ unstâncias.
Às cav a la ri ça s se rvem tam b ém para d epósi to d os a prestos d as ca valga du-
ras e dos ho me ns q ue com elas t r a balh am: ce rreiros o u al m o cr ev es, pa qu et es,
caveli st e, le n çe r o t e, e te.

Palheiro C a sa e m que se a rmazena pa l ha pa ra cons um o imediato d o gado


O
cava lar, mu a r e asi n in o q ue pe r no ita recol hi do . N o s palheiros dor -
mem excepcionalmen te a lg uns t ranseuntes, q uan do por a ca so não ca bem DOS
aloics próprios.

Cocheira Só se e nco nt ra em m o n t es de pri me i ra ordem. A qu art e la o ch u r -


dão e q ua lq ue r o u tro ca rro d e ma ior va lo r para cómodo pessoal.

Atafona É a m oend a de ce rea is p or « m o t o res de sa ng ue» (bestas ou cava lg a -


duras) q ue a ntiga men te h av ia em todas as se des d e la vouras. Hoje vai
desaparecendo p or s e co n s ide r a r engenho ca i m perfeita, at enta a superi oridade
das fábrica s d e moagens a vap or e do s moinhos d as r ibeiras. Os mo inhos
fornecem de f a rin ha s a q uase t otalida d e dos la vra d ores.

Casinha d o s ganhões S ob e ste título se desi gn a o d ormi t ório e ca sa de


d es ca nso dos «ga n hões» o u moço s d a la voura , qu e cons-
tituem a ganharia. C omo se po d e s u po r , te m o se u qu ê de se m el ha n te às

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ATRAvt S DO S C A M POS

casernas d os soldados, conquanto delas contraste bastante pelo que r es pei ta ao


arranj o e a sseio.
O nome de «ca si n h a» consíderamo-Io imp róprio. Na maioria dos montes,
a alojo, esse, longe de ser um pequeno cubíc ulo, é p elo contrário uma ce se
ampla que ac omoda à vontade vinte e trinta home ns. Às eca aí n ba s », especial -
mente as das lavouras distantes dos po voados, em que os ganhões não tê m e
f acilidade de ir todas as noites às s uas residência s, se n do, por isso, for ça dos a
pernoitar no monte, oferece m aspecto curioso d igno d e menção. A par da
desordem e estravagância que se nota n o rús tico mob iliário. ouvem-se colóquio s
e st u pe n do s e cenas engraçadas q ue d efin em perfeita mente os insti ntos e senti-
mentos das pessoas q ue ali pernoitam .
Qualquer que seja a fo rma de u m a «ca sin h a » possuí sempre lareira aspa -
çosa (a que designam po r chaminé) construída a u m elos cantos da casa, o u ao
centro. Junto da ch a m i n é meia pejada pe las cinzas de lumes fortíssimos, a glo-
mera-se a cr iadagem que ali passa os serões, primeiro a qu ecendo-s e ou enchu-
gando-se das mo lhas que por acaso sofreram durante o dia, de poi s travando
palestras ou entretendo-se em distracçõ es divers as. P erto da chamin é estão os
burros (bancos r ú s ticos de pernadas de azinheira) que servem d e assentos e qu e
permanecem es ta tela dos ou de pernas a o ar toda a vez que os não utilizam.
Idêntico abandono ressalta das ta ri mb a s que se erguem em redor das pare-
des. F ormades por leitos de ca r ro s velho s, p ortas inutilizada s, tábu a s, etc.,
r evestidas com rama de piorno, g íe ata e palha, tudo aquilo está em de sordem ,
assim como a copa (vestuário) de reserva dos que as ocupam. Roupas, s afõ es.
ca lçado, ch a pé us, esteiras, paus, etc ., para ali s e a m o n t oa m , sem que m ã o cui-
dadosa se lembre de os arrenfar.
Para a coe rê n cia ser completa, o ladrilhado o u calçada d o piso conser va -s e
meia oculta pelas Ironçes e gra veta s do p io r -no que, em feixota s, s e aplica a
combustível de lareira. Enfim um desarranjo absoluto, digno de reparo . M as
que lhe importa a os ga n hões seme n h an tes baga telas Pl No se u m odo de ver, está
bem a ssim. O a rra n jo, a co m pos t ur a e a limpeza, dizem eles, co mpete às
mulheres, lá n as cas itas da vila ou aldeia próxima onde residem . À í, sim; aí,
é que eles g osta m d e ver o asseio, a comodidade e lu xo mesmo com que a s
esposas, mães e irm ã s or n a mentam o interio:r das habitações, e d e qu e j ust a-
mente se vanglorie m por qu e nada se lhes a ss emelha, s equ er, n as o u t ras pro-
víncias de P ortugal. S ó vendo-se é q u e s e avalia bem. Ma s fora d os d omicílios, n o
campo e nos d ormitórios dos m ontes .. . «e ra o q ue faltava, perder em-se a s hora s
de buena a compor a tari mba e arranjar a cama. . , Q u em passa o di a a garrado
a o tango, à no ite de todos os modos dorm e bem . . . Inda que se j a em riba d e
pedras ou em pontas d e a lfi netes ', . . » E com estas fras es justi:6cam o
desalinh o.
A s paredes da ca sa condizem com o des alinho da :roupa e trsbecos. Àp esa l:
d e serem caiadas de branco es tã o em parte enegrecidas pelo fumo da lareira.
As r es tantes menos sujas v êe m -se mascaradas de desenhos estapafúrdios, ru s-

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ATRAVt.S DOS CAMPOS

ticissimos, fe itos a carvão, destacando -se u m ou outro que re vela traços firmes
e vocação artística do autor.
Tudo aquilo é obra dos ganhões arteiros, que têm queda para as pintorices,
e que ni sso se entretêm algumas noites, distraindo-se a si e a os cama ra d as.
Traça m então j u n ta s de bois com o ferro de casa; cenas tauro máq uicas;
tipos da s cidades ; as fig uras do sol e d a l ua, monstros marinhos. neptunos,
sereias, n av ios, pavões, cegonhas, lobos, vasos de flo res. o sino saimão, etc ., etc.
C om pletan do o quadro, é frequente penderem do tecto cordas e paus com
qu e i mp rovisam erap ésios. São para a rapaziada fazer e rtemsge», o que
em calão local significa exercícios gi n âst'icos e acrobáticos. Ali pois espino-
team à vontade com o seu t rambulhão, à m is t u r a, unanimemente festejado.
Ora, o conjunto de tudo isto, casa e habitantes, dá à casinha dos ganhões uma
aparên cia original, que se torna fantástica. quando à noite a s chamas da
lareira projectam a sua luz esf umaçada e indecisa sobre os vultos da habitação.
A tristeza ra ro se nota n a q u eles r eci n tos originais. Ali a s noites deconem
alegre s. se a maioria dos assistentes se co mpõe de r apaaes solteiros, exub er an-
tes de vida. alheios a cui dados. En tão t udo se ani ma a valer l Simúlacros
de touradas; artemagesi jogos de brincadeiras para logro dos novatos; tudo
enfim que revela despreocupação de espírito. O s velhos. coitados. q ue já não
podem tomar parte naquelas pândegas. sentem-se rejuvenescer, e lá do canto
da «chaminé». onde acalentam o sangue am ortecido. aplaudem os divertimentos
da família moça e estúrdia - partidas que eles também já fizeram e de que se
recor dam com saudade.
Noutras noites não há s.rtemsges, nem touradas. nem jogos. nem desenhos;
mas o serão passa-se divertido. se não de alegria ruidosa, pelo menos com o
praze r suavíssimo que disfrutam as almas simples ao o uvirem nar r ações estra-
nhas, maravilhosas. Nestas n oi tes os pap eis in ver tem-s e: são os velhos que
distraem os novos. Àqueles, to mando ares de superioridade paternal, propõem
adi V'in hações, recitam décimas, narram contos de princesas e mou ras encantadas,
casos de bruxedos, e até episódios das guert'as da primeira metade do século, de
que eles ou os ascendentes foram testemunhas oculares.
Com que atenção os moços os escutam, e com que ufania o s velhos referem
aquelas histórias variadas. de exageros manifestos I Os que as ouvem, ficam
emb asbacados a ponto de um ou ou t r o exclamar: «C a r a m b a, rapaaes l Sempre
o tio Fulano sabe muito!. .. t um p oço sem fundai Não sei como lhe cabe
na cabeça tanta coisalll Se fosse homem de letras era um doutor!. . .
Nas noites grandes, quando se esgota o reportório de historietas e mouras
encantadas, m uda-se de assunto até qu e se chega à co scovflhtce r eles. N es ta
altura , diz -se mal dos amos, dos abegões, do prior da freg uezia. do exagero das
contri bui ções, e por associação de ideias. dos poderes constituidos. D is cu t e- s e
en fim, incluindo mesmo a astronomia, que lhes merece comentários e aprecia-
ções originais em que abundam os disparates. Mas quem os dia, fica muito
ufano COmo se proferisse uma sentença " " .

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ATRAvtS DOS CAHPOS

Casinha do abegão D or mi tó ri o e alojo do enca rregado da lavoura e do seu


imediato substituto-o s ot e, S er V"e também para arrecada-
ção das ap ei ra gen a e outros utensilios confiados aos didg.?ntes da lavoura .

Cabanas Por este nome designa m as seguintes diferentes acomodações :


a loja dos ca rpinteiros de carros e a rados. o depósito de ma -
d eiras, a s arrecadações de veículos e u charia de l a voura , as e rrtbanas para
gados, etc., etc.
N o A lentejo o ter mo de cabana é u m n-tme genérico que se aplica indis-
tint am en t e a todos os casarões toscos e espaçosos q ue se a d a p t am a quaisquer
u sos. A cabana q ue se a dapta à o ficina d os carpinteiros acomoda m uitas vezes
a s madei ras n eces sária s 80 m ovimen to d a la vou r a, po r n ã o h aver cas a ap ro -
p riada para semelha nte Em. D e qualqu er maneira é curioso o seu aspecto:
ao centro da casa, sobre o solo coalhado de cavacas e aparas, firmam-se os
gast alb os onde. enchó em punho, e assentados. trabalham o s mestres, concluindo
a exec ução d os ara d os e outras ferramentas a g i íco las. Se trabalham em pé
vemo-los com o machado. vibrando golpes certeiros na m adeira, d and o-lhes 85
formas gerais d e que precisa. desbastando-a assim de i slqueio para depois a
aperfeiçoarem à encbô . Isto ao meio da oficina . Em redor das paredes
levantam-se pilhas gigantescas de arados e timões, t endo pela fr ente outros
similares, que por seu turno ainda são amparadas por rimas d e e lve ca s, can gu-
lhos, raios, pinas, etc. C en te na s de peças em bruto ou Ée lquejedas, um as di s-
postas em simetria. outras amontoadas a esmo.
A carpintaria é o cen tro do cavaco nas escapudele s aos afazeres e às horas
de d escanso. A pretexto de q ua lquer coisa entra-se ali para se receberem ou
darem n o vi d a des, ou p ara se comentar este ou aquele assunto . A par da car-
pintar ia, t ambém em cer tos montes funcio na m l oj as de fe rrei ros, inovação
r ecente. q ue n ão par ece ge ne ra lizar-se . S e a lg u ns l avra d or es opul entos entretêm
forj as a tra bal h ar para as precisões da sua lavoura e das d e a lgu ns vizinho s, o
m aior n úm ero não ent ra nessa esp eculação . A ma ioria mantém o uso tradicio -
n a l, ave nçando por a no ou temporada com os ferreiros das povoações
próximas.
Pross egu i n do nas referê ncias às cabanas. convém acrescentar que todos os
m ontes as têm pa ra uso dos gados. E naq ueles em que as há. os únicos ani-
m ais que as utilizam são os bois de t rabalho, durante o inverno. e as éguas e
cria s de ma n ad a s. no fim do verão, às ho ras da calmo. . Quando estes ga dos as
n ã o ocupam, servem para arrecadação de carros, palha, feno s, etc.
A's ca banas mais rústicas, construidas de madeira co m tectos de colmo,
piomo em giesta , cha ma-m-se-lhe ramadas . 0 :1 termos de «est áb ul o» e ee eel-
bana», tã o adoptados n outro s sfeios, são desconhecidos pelos campónios
do Alentej o. I~norância a náloga se no ta ta mbém com o vocábulo ebegoa eie .
Este nome aprcp riadfsaim o ao s d epó sitos de tr en s de l a voura e out ras f erra -
mentas agtícolas. maio conhe cem os h abitan tes da s n o ssa s aldeias.

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ATR AVÉ S DOS C AMPO S

Ga li n he ir o U m a casa qua lq ue r, em q ue p ernoitam e põem as a ves d omésticas


do monte, com exce pção d os pavões e patos rea is que d ormem e ni-
dHicam fora ou ao ar livre e à solto. O ~alinheiro é provido de poleiros 5U6.-
cientes pa ro. repouso dos bicos, e de ca s i n ho l as ou cestos para a p ostura d os
ovos. D e n oite ali se recolh em dezenas o u cente nas de aves diferentes, qu e se
sol tam ao a cla r a r do dia, com excepção das que t êm ovo, q u e continuam re co-
lhidas algumas horas mais, afim de pôrem n esse entretanto. Mas antes. sofrem
todas o devido exame, a uma por uma, pelo processo vulgsrl seralmente conhe cido.
E m alguns m ontes o g alinh ei ro serve t a m b ém de pombal, para o qu e t em
na s paredes as casinholas indispensáveis para a criação dos pombos. Neste
caso o tecto é provido de uma fresta ou água furtada que permite a entrada e
saída dos pombos. Mas o mais comum é o pombal Gear ele fora , encostado o.
qualqu er chamin é.

Casa do s pi ntos Espécie de sucu rs al do ga li n h eiro, q ue a comoda as galinhas


e p eruas chocas com as n inhadas em incubação, e ainda o u tra s
que já tiraram e q u e ali pernoitam co m os pintos.

Chiqu ei ro C u rr a l6 ri o qu e en cerra dois ou três p orcos adultos p a r a se irem


engordando a po u co e p ouco com o s so be jos d as comi das, sementes
a va ria da s, ba gaço, frutas, etc. Um m ealh eiro apr o ve itador de desperd ícios.
O chiqueiro abran ge o espa ço d e uns 20 m et ros q u a d r ad os, cm parte r es gu ar-
dad o das inclemências do tem po por uma alpend rada o u ch oço, onde se abrigam
os cev ões - n ome específico p orque se d esi gn am os su ín os assim sustentados.
N o recinto a d escoberto, v êem-se os m aceir ões e pias, onde comem e bebem
os porcos, anafados bichos que deve m conaiderex-se fe lizes pe la abasta nça, sos-
sego e re p ou so qu e a li disfrutam . N o interio r do pocil gão o u cá f ora, no
chiqueiro a de scoberto, mete i n veja ouvi-los r on ce r forte, a sono solto e b an-
dulho farto, sem preocupações de ne nhuma ord em . Qu a nta s criat uras humanas
dari a m um dinheir ão por d orm irem assim l

ARREDORES

O s a rredores dos montes care ctertzem-se por certas de pendências indispen-


sáveis ou convenientes aos l abores a grícolas e pec u ários. Nestas co ndições
- estão: a eira , o poço da ág ua potável, os chafarizes para os gados b eberem, as
malhadas dos porcos, o bardo d as ca bras, e fi nalmente a q uinta, horta ou quinchoso.

Ei ra to te rmdc em qu e se d ebul ha e limpa toda a casta de cereaís e legumes.


- - Fica geralmente a curta dis tãncia do mon te, n uma d a s colinas p róximas
mais vau i da s do vento oeste, o u seja «b em lavada de t revesaiae, como se diz
- em frase plebeia. A s eiras apropriadas a d ebulhas de pouca m onta, m ed em a

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A T RA v t S DO S CA MP OS

superfície d e 100 metros quad rados, aproximadamente. As das herdades de


grandes colheítas, em que se acu mu lam muitos e vastos calcedciros, a b ra ng em
capacidade bastante m aior - m il a d ois mil metros quadrados . E, há-as d e
grandeza tão ex cepclon a l, q ue oc u pam a im portante área de cin co m il m etros
quadrados. Destas d imensõ es é a h erdade do Falcato (concelho de Elvas).
propriedad e dos srs. B agulhos.
O so lo o u casco da m aioria das ei ras, consiste num si m ple s ter rado batido
a maço, o u somente ga da n ha do e varrid o da erva, s e de h á muito s e aplica a
esse fim. V êem-s e, p oré m. muite.e ei ra s calçad a s modernamente e algumas s em
O cen tro lageado de ard ósias o u pedr a s de g r a nit o.
Nas h er d a de s em q ue predomina a cultura d o centeio, a eir a m u da de local
q uase todos os ano s. p or medida económica na arr ecadaçã o e a pro vei tamento
da pa lh a, q ue, se n do com o é, exclu sivamente aplicada a fo r rage ns do ~a do
b ovino. e comid a nas p róprias al me na r a s, convém ficar d es d e logo na fo lha
onde o s bo is e vacas p a st am dur ante o Outo n o e Inver n o, ou pelo menos
no u tra cont ígua. Portant o, em cada a no, numa das fo lhas de «rastolholt ou de
«pou sio» - a do inve rnad ouro a s m a is das vez es - escolhe-se u m vale inculto
bem ven tila do , e é ai q ue se p r ep ara a eira do centeio. P re paro simples e de
ocasião, visto o seu ca r ácter se r trans i tório.
Às alm enar a s de palha e os etlb.eieos dos cereais em ramo, ag ua rdando
d eb ulh a, constit uem o princi pal embelezame n to das eiras. R ilh eiros e alme na-
ras, erg uidos a ca pri ch o pelo pessoal d a ei r a, dã o ao loca l u m tom i mponente
bastante ca ra cterístico.

Poços-chafarizes C ad a monte t em proxrm o um ou ma is poços, de três a


cinco metros de prof undidade, de onde se extrai a água para
o consum o da casa e abastecimento dos gados, empregan do -se para isso o ca l-
deir o e a cord a. As bombas pouco se u sam por enq uanto. O s poços de boa s
nascent es valori zam muito as herdades r esp ect i va s, atenta a fa lta de ág ua que
s e n ota em quase toda a p rovíncia, dur ante a quad ra estival. P oço abundante
d e água, r eput a-s e regalia de incalc ulável valor. sobret udo se a herdade não é
atravessad a por alguma r ibeira boa. onde os gados possam b eber n o verão.
Assim s ucede qu e, n a m a io r ia d os p oços d e na s centes med ian as e abu n da ntes,
há um ch afariz para b eb ed ouro d o ga do gra n de , como b oi s, vacas e égu as, e
ainda alguns emecefrôes» (gamelões) d e ma deira para as r ezes miud as, com o
ovelhas, cabra s, p orcos, etc. À águ a é ti rada pelos «ga n o.d ei ros» (g ua r da dores
dos ga do s) emp r egan do também o cald eiro e a cor d a . P ois n ã o obs ta nte a
rudeza do processo, há ge.nade ir o que sem d ific uldad e extrai todos os d ias, às
horas da calma, a ág ua p recisa para se sa ciar em à vontade 60 a 80 bois.
Como nota significativa d a escassez e apr eço da ág ua nas te rras tra nsta ga-
nas, basta dizer q ue certas herdades que n ã o t êm água d entro, pag am foro ou
pensão a outra vizinha onde h á poços, e qu e p or seu turno estão sujeitas e o-
encargo de admitirem a beb er os g a dos que naquelas pas ta m .

- 22 -
A.TRA.V e S D O S CAMPO S

Malhada d o s po rcos Edi6.cações rústicas" primitivas, de forma cónica, com


os tectos de piorno, giesta e outros arbustos. Servem.
para 8 criação e dormida dos s uínos, compreendendo-se também por esta desi-
gnação da choça dos ga nadeiros que os guardam - os porqueiros. Em geral há
mais d e uma malhada em cada cómodo de la vo u r a , vendo-se já algumas moder-
n as de construção aperfeiçoada. que divergem bastante elo sistema comum.
Q uando tratar da criação dos porcos farei descrição mais desenvolvida sobre as
malhadas respectivas.

Bardo das cabras N ome por q ue se con h ece o redil o u cu r ra l em q ue se


o r de nh a m a queles animais. A sua construção é de carácter
transitório, po rq u e todos os an os muda de Iccal, 6.eando sempre próximo d o
monte e de mo do qu e da p orta principal se veja bem. Convém isso para, à s
horas do or denho. o pessoal do monte dar no tícia da chegada das cabras e
assim s eguir log o o encarregado d e trazer o leite, montado na r espectiva beste ,
entre 8S cang al h a s com os cântaros.
O bardo vulgar é construído com fe i xes de mato, como est ev e, aloendro,
piemo, etc. : uma espéci e d e p aliss a d a em s em i-círc ulo, com en tra d a ex post a a o
nascente. C ontíguos a o bard o, da parte d e cim a, ergu em- se os chiqueiros ou
ebocos em que se r ecolhem os chibos n o vos, enq ua n to n ã o acom panh am 8 5
mães. N a a ctualidade estes bardos inutiliza m -se no m ea d o da pri m ave ra,
substituind o- s e por o utro s simples, po rtáteis, fo rmados por cancelas de madeira
de castanh o, qc e se m ud a de dias a dias para m el h or se a pro veitarem o s estr u-
mes. U ma semelha nça do q ue se p ra tica co m as ovelhas.

Quinta, horta ou quinchoso Por qu alquer destes nomes s e de si gna o cer-


cado hortícola e pomífero, qu e produz hortali-
ças e frutas para con sumo do monte. Se a sua á r ea e valor é g r a n d e, ou para
melhor diz er, se con té m pomares de vul to como laranjais, ameixiais, etc. , e se
sào vedados por bons muros de alvena r ia ch ama-se-l h e quinta. S e p orém o s eu
tod o é peque no, ou s e m esmo g rande, m a s q ue não esteja povoa do d e muito
arvoredo fru tífero. e s e sobretu do a vedação se reduz a un s simples valados,
denomin a-se horta. No revestimento das sebes emprega m -se a s pi te i r as, figue i-
ras da índia, canas, silvas, etc. Quand o o ho rtejo se r eduz a pro porções m ini-
mas toma O nome d e quinchoso ,
Apesar de haver herdades com quintas e horta s en crava d a s na sua arca,
mas pertencendo a donos diferentes, é também certo que qua se t odas, que são
centros de la voura, têm anexa uma quinta , horta ou qu'inchoso, disfruredo por
conta do lavrador. com o fim de ter h ortaliça e fr u t as para o cons umo da casa.
E. algumas m aiores, além d e produzirem o suficiente para o pessoal da lavoura,
ain da ahastecem os m ercados diári os das p ov oações vizinhas. V árias proce ssos
se usam para obter a água qu e alim enta as q uinta e as hortas. Numas fazendas
a água corre de pé, nascendo ali m esmo, ou vindo canalisada de f ora, de mai or

23
ATRA v t S DOS CAMPOS

o u m eno r distância; nout ras, em bo ra ex is t a n o próprio l ocal, h á que extrai-la


p or m eio d e noras mouriscas, ou d e o u t ros sis t em a s. como el evadores automátí-
cos, cegonb as, bombas, etc. O processo mais vulgarizado é o das n ore s d e diver-
sos tipos, e o menos é o das cego n ha s e o dos eleva d o res o u m oin h os d e vento.
P ara o trabalho das n oras empreg am- se muar es e jum entos d e p ouco va lo r , q u e
s e a p licam também a outr os se r viços .
Por qualqu er p r ocesso q ue a á gua se tira vai t oda dep ositar-s e em tanques
ou l ag os, d e on de se solta uma ou duas vezes po r d i a n o t emp o es tio , para r egar
a s tabua da s, cante iro s e l eiraa em q u e se d i vid e a terra preparada . À. ág ua q ue
sobeja das r egas dá-se - l he saída para fora, indo afluir aos r íbetros.
Muita s quin tas e h ortas a b r ang em duas a tr ês ge iras de t erren os ina cessí-
veis às regas e q ue po r isso s e lhe chamam seq ue ieo s. Dlsfru tem-s e com olivei -
r as. figueiras. amendo eiras. etc.
Em r esumo, as q uintas a lentejanas. na su a quase t otalida d e, quer sejam
a cess ório d a her d a de. q ue r cons tituam prédio indep en d en t e, são terrenos de
exclusiv a ex plo r ação h orti cola e p o mífeca, n ão se assemelhando. portanto, às
quintas qu e po voa m os campos d as ou t ras províncía s. As n os sa s p ro duz em
so me n te h ortali ças e frutas; as ou tra s abra n gem gra ngeios agrícolas e pecuá rios
q ue n o Alentejo s ão pr ôprios d as herda d es.
C omo n ota com pl em en tar con vé m di z er que. se efec tivamente a lgun s m on-
tes têm anexa u m a pitoresca q ui n ta l o u um a b oa horta tida s. jus tamente, como
oásis de l íciosos em regiõ es tã o mo nóto nas e ab rasa doras, não poucos se nos
de pa ram tamb ém q ue s6 poss uem rel es hor rejos, mal d and o umas couv es Das
époc as plu v iais.

A VIDA NOS MONTES

A v id a n os mon tes dec orre t r a nquila me n t e, a lheia 00 bulício d as cida d es e


a os m exericos das a ld eias. Os suc essos d o dia e os casos d e sen sa çã o oco rridos
n os gr an d es centros s6 eco am no campo por interm édio de q ua lq u er gaze ta
lida por ac aso nas horas vagas. ou pela narrativa fanta siosa dos transeuntes e
ch egadiços.
Com efeito ao i solamento d o lugar alia-se a si mp li cida de d os h ábit os con -
traidos em mil ocu pações , que sug erem ideias e pressentimentos opos to s. que
por i sso mesm o s e conf un d em e equtl ibrem, evi ta n do alegrias ruid osa s ou alu-
cinações de desespero. O t empo passa q uase de sapercebido. ta nt a.s são as li d as
que o tom a m desde o raiar da auro ra até pela n oite adiante.

* * *
L ogo d e madrugada principia a azáfama. Os prim eiros a levantarem - se
são os cri ados de portas ad entro. isto é. o cozinheiro e o amassador de há
muito acor dad os pelo ca ntar dos ga l os.
À s du a s e meia ou t r ês d a ma n h ã no O u tono e começo d o Inverno e às

- 24
N as ccaia nças:.
AT RA V e S DOS C A~1P OS

quatro no res tan te do ano vêem- s e j á erguidos aqu eles homens. O amassador
para de spachar os amaa silhos - doi s e três por dia, co nfor m e as precisões.
O cozinheiro para cu ide r do lume, d a s a sa d a s com á gua a aquecer, do ordenho
das ('8 bras, etc.
E.ntret an to os do is bocej am. tro ca n d o as impr essões próprias d a h ora e do
meio. bate -lhes à po rta O a begão e preparar o al moço para a ganharia. Abrem -
-lh a log o, entra e d iz: - D eus os sa lve I» c Salve-o D eus I. respondem os qu e
estavam, ret rib ui ndo a s a u dação.
O s três d irig em-s e para a chami n é e ai a o lume m ata m o bicho, fa z em O
cigarro e falam do t empo. O seu pa l a vr iado, a ebulição da ág ua e o crepitar
das ch amas do az in ha qu e iluminam em cheio tod a a ca sa , d enunciam os pri-
meiros rum ores da labuta em com eço.
É curta a parola . Sat isf eito o vício ou o hâb íto, ca d a q u a l t rata d os s eus
deve res. O cozinheiro p rossegue n os j á iní ciad os, O a massado r põe o f orn o a
arde r; e o abegão, e nq uanto a ág ua abre a I er vure, põ e a mesa colocando - lhe a
toalha, os m err ocetes e as azei ton as.
Ao fer ver a óg ua em cac hão, vaza -se a escaldar das asa das para os barra-
nhões já temperados d e azei te . sa l e alho, p reparu n do - se a s sim o cald o da
e ssc rdu , que deste m odo im ediatamen te cond uz par a a mesa. D epois sai à rua
e, em tom forte e p r ol o ngad o. gríta : - «A o a l moço l .. . » A criadage m acode,
entra, almoça e sai. C h eg a então a vez de se a centuar o movimento. T od os d ão
rum or de si tratando de m a r ch ar pa r a as ocupações, por en tr e uma VOzearia de
ditos. entremiados de pergu ntas e r esposta s.
O s almoc reves de i tam fo ra a s parel h as, engata m os carros e gira ; a ga n haria
(moços de la voura) também se põem a cami n ho d o traba lho; os m alteses esguei-
ram-se à f ormiga receando empr naament os importunos, e por último os
do més ticos d o mo n t e a p ouco e p ouco aparecem também. Carros e ganhões
saem ain da d e n oi te duran te a semente ira do Outo n o, e a o ser do di a n o
tempo do alqueive. En tretan to erg ue m-se os lavradores, chegam dif erentes
ga nadetros a r eceb erem o a lmoço e al g umas ordens, e assi m, num vai-vem de
saidas e entradas, a ani mação ge ne ral iza-se. A o nascer d o sol t udo está a
postos, no m ourejar do es ti lo.
D es pa chado d os afa zeres do m onte, o lavrador monta a cava lo e parte a
dar volta aos arados, 8 0S rebanhos e a o mais que tem es pal h ad o pelos campos.
Quer endo, n ã o lh e falta q ue ver e provid enciar.
A s u a a ssi s tên cia no monte é m enos necessária. A esposa s u bs ti t ui- o a í
com va ntag em , tant o mais que, p or direito tra dicional, é ela que t em o mando
n os labores casei ro s inerentes a o g ra ng eí o a g rícola.
Nesta s circ u n stân cias a lavradora põe e disp õe o s eu talante. Logo ao
lev antar m erece-lhe parti cular interess e, a s olta das ga linh a s, o s erviço da
casa, e o tratamento da Aadez8, como cruem diz dos bicos de criação e dos
porcos do chiqu eie o. Neste propósito e noutros q ue o decorrer do dia lhe sugere,
farta- se de estí mular o zelo de criados e criadas, entregando-se ela própria a os

25 -
ATRAvtS DOS C AMPOS

serviços de maior urgência. Esgotada a pacho rra , pe r de o bom hu mor e desata


a ralhar com todos, ou por falt as que nota, ou por hábito contraído. Que aa
há q ue r alham por vícío e por desfastiol Sem embargo, todas são protectoras
d a cr iadagem. E quant o mais ralho n as, mais bizarras e benfaaeies, inclusive p ara
esses fi quem n õtam os d ef ei tos e que l hes a t u ram as reb ufices. Parecem-se
imenso com e cu ele boa D . Vitória que Júlio Di n iz r et ra t o u admiràvelmente
n a MOT8sdinha do s Canal/fsis . Cá pelo ALentejo há tam bém d onas Vit ória s . . .
.. .... . .. .... . . . - .
Pelo dia adiante p rosseguem os l abor es d a com id a , d os avias, do fabrico e
limpeza do queijo, da remendagem dos sacos, das ve r r iç ões, dos «esfregados", no
arame e cobre do trem da ccaínba, e, s obretudo d os lavados e caiad os nas casas.
e ela praxe estarem sempre brancas de neve com os pis os de tij olo muito lim-
pos, tão limpos que se lhes possa «lamber m el• . ( E.xpressão corrente). E afora
isso muitos outros trabalhos. I n t er va l os de descanso. s6 às hor as d o almo ço e
do jantar, que demoram mais ou menos tempo con fo r me os afazeres. Isto p el o
que respeita aos criados caseiros. Os d e fora r egulam- se por usanças invariáveis
que noutro lugar exporei.

Entre as ocorrências características dos m ontes evidencia-se a afluência d e


transeuntes e visitantes de classes e procedências diversas.
A go ra apar ece o emp oa do m oleiro e os seus médios jumentos. com o do
chocalho à fre nte, carregados de farinha para o cons umo de casa. Log o é o
astuto e rei et ro, d e vara na cinta e :6.0 e agulha enrolado na aba do chapéu a
oferecer a venda do csrreguío trazido em machos e burros, ou o i n ve rso, com a
r écua descarregada, a propor compra d e cer ea is para ir vender.
a arxiei ro - diga-se de passa gem - é um bacharel d e argúcias e subtilezas,
timbrando em il u dir os incautos. Não p retend e ga n h a r muito. assevera ele.
B a sta m-l h e as crescences. E xplicand o : se comprar, irá l ogo batisar o grão.
encharcando-o nos ribeiros. D e trinta alqueires obterá qua renta ... Uma fraude
como tantas que por aí se pratica m à sombra de impunidad e relaxista. senão
toleradas por usos velhos.
Possuido de v el h acari a semelha nte, também o moleiro p rocura trapacear
a mediçã o da farinha que entrega , peneirando-a com as mãos ao encher a
raa oi ra. Mas tanto a l m ocreves como moleiros estão a perder terr eno nestas
endróminas que, por velhas e conhecidas, po uco ou nada se consentem já.
Adiante.
C omo os a rxi eiros, chegam igualm ente muitas outras entidades: o peneiro,
o fu tr iqueiro, o am ola-tesouras, o da loiça, o caldeireir o, o gateiro e vários
q uejan dos, gal egos alguns a ofe recerem os se us serviços e a propore m n eg óci o.
F.. si mu ltan eam ete , a ma i ori a, pede e obtém com ida pa ra ele" e para as b estas.
A par desta gente concorrem igual m ente os «velhos com sa ntos», espécie de

- 26 -
ATR Avt S DO S C A M P OS

ermrtoes and a do res" a quem os párocos entregam n ichos de lata co m uma


imagem pequena, para esmolar em pelos montes e a ldeia s. oferecendo-a a beiiar
aos devotos. O produto das es molas divid e-se pelo ermitão e pelas des pesas
do culto, diz -se.
T anto a s imagens como as caixas que as en cerra m primam pelo gr oss eiro
do fabrico, salientando -se principalmente a porcaria q u e as enfa r ru sca. Pela
sua ru sticida d e tornam-se a lvo de mo ntejoa e gr a çola s p ouco ed i6.cantes. H á
qu em lhes chame latas de fu.rões qu e entram nas habitaç ões. para, a tro ca d e
beiioces abeatedas, caçarem boas esm olas .. .
V er da d e. verdade a tal caixa e o santinho nas mãos de mendigo sujo, à s
vezes piol h oso ratoneiro, r epresenta um a ver gonha p ara o decoro da r eligião.
O s prom otores de festas nas lo calidades vizinha s t a mb ém assediam os
montes duas veze s por ano co m os p editórios do est ilo : o de car ne pelo entrudo
e o do pão n o tempo d a s eiras. A es mo la dá-se e afe r e-se d o s eu valor n ão pela
fama do sa n to invo cado, m as conforme a im p ort ância e repr es enta çã o d os que a
pedem. O s festeiro s humildes recebem uma insig ni6cân cia; os d e maior cate-
goria, l aV"r a do res abastados q u as e semp re, apanha m d ádivas ge n er osa s.
Mas entr etanto ouvem e d iz em m uita p iada a propósi to, r indo e t ro ça ndo
O caso. Em ge ra l o peditório é efectu a do po r rapazes n ov os, so lteiros, que
tomam isso como u ma pând ega . V ão à esfola, diz-se po r g ra cejo.
................ ... . . . .. . .... . . .... ...................... . .. . .... . ... .. .. . . ..
A í pela cres cença do di a , n as se xtas-feiras so b re t u do, visi tam os m o ntes as
«velhas com a dres» e «a fi lh a das. que se entregam à pedincha no ca m po um a vez
por semana, pelo m en os. Uma s são vi úvas, real m en te pob ríssim as; ou tr as ca sa-
das e em cond içõ es que a s ua m en d ici dade p ouco s e justifica. A m aio ri a ufan a -s e
de pedría ha gem e compadrio com os lavra d ores a quem tra t am po r s en h ores
padrinhos, senho ras m a d ri n has, se n hores co mpadres e se n horas co m a d res. N em
sempre são le g ítimos estes tratamentos, antes COm frequência d erivam d e afini-
dade. muito forçadas .
Mas com o quer que seja, lá a parecem a pedir. Vão à falc a, comenta o po vo"
que também chama eseorche a este género d e m endicidade . A falea consiste em
a metad e de um marrocate (pão de centei o). Ora o termo aqu ele carece de fun-
damen to. À esmola a qu e se alude consiste não em uma fa tia mas num pão
in teiro pelo m en os.
E sendo d onativo maior, co m o acontece em muitos casos - farinha, carne,
legumes e a zeite - chamam-lhe elloried« ou saqu iJad a, por ser r ecol hido em
saco ou alforje.
As sequ 'ila d e s só as apanham as comadres e o.6lhadas de direito, ou as b em
cabidas na casa. As «de levar e trazer», como por inveja comentam os menos
contemplados.
- N o en tr udo, a tradicional esmola d e carn e dá -se indistintament e em vários
montes às pobres que a vão pedir, varia ndo d e valor e quantidade conforme a

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xr nxvzs DOS C A M POS

pobreza e a feição das pe d in tes. P elo que estas p rocu ra m ce tequisar a s lavrado -
Ias pOI todos os meios imagináveis. MoI chega m à p orta ofe recem-se pare varrer
e lavar" adicionando 80S oferecimentos de serviços, vários presentes de ninha-
rias r el es como trapos para esfregões, m olhos de ervas para mist uras, etc.
O s serviços re cusam -se as mais das vezes; os p rese ntes aceitam-se por
complacência . remunerando-se à larga po r meio d e comestíveis.
D a parte da s mulherzinhas b eneficiadas ret umbam os ag radecimentos e as
bajulações s lavradoras, já Ba ba n do - lh es a s q ualidades, já na r r ando -lhes com
ê

exagero e a seu sabor as o corrências das aldeias de ond e são e e s do s montes


por on d e passam . E sp écie ele gazetas fa lantes pródigas em bi sbilho tice. M as
coitadas procedem assim por n ecessi da des de estôm ago. E que n ecessida d es, em
alg umas, S ant o D eus I. . .
Ao cair da tarde out ra ordem de individ uas aborda os montes, ora em gru -
pos de t rê s e quatro, ora isol ados, a um e um, t odo s com manifesto des embaraço.
Novos e ágeis pela maior parte. não inspiram simpatia a quem os vê . antes
causam a sco e repulsão. pelos s eus tipos hediondos, sujos e esfarra pados.
Estes pária s despr estveis, são o s ch ama dos' maltes es.
- cEs mola e agasalh o a um p obre. s enhora la vrad ora » - dizem em tom alta-
neiro os m a is a t r evido s. arrimand o à p orta de cacet e na mão e man ta à s cos ta s.
- cV á pa ra o forno. . . logo cea rá» - respo n d em - lhe de d entro com s i ngu la r
fri esa . E o fa rro upiL h a lá seg u e pa ra o fo rno. r esmungand o insolência s. E a ss im
acontece co m outro e ou tros nas mes m a s condiçõe s até noit e cerrada.
Os rafeiros, ladrando de con tínuo e arremetendo com fú ria, protestam a
seu m odo contra tais visitantes. Mas os ch.egedtços repele m-lhes os ataques
afagando- os. ou ameaçando-os com pauladas, confor m e as circunstâncias. E-
desta m an eira chegam in cólumes ao forno. indo engrossar D. matilha que iá ali se
a coita. Mais adiante farei uma r esenha desenvolvida s ob re esta súcia de vadios;

* * *
À. volta d o sol posto. mu lheres e homens. amos e criados d om ésti cos, t odos
em fra te rnal convívio. sem preocupe ç â o de classes. reun em-se cá fora n o terreiro
do monte em misteres secund ários. se O tempo o permite. Ali. ao ar livre.
escolhem-se legumes, debul ham-se batatas. migam-se couves e ou'tra s hortaliças.
esce rp eia-se lã. etc. E de mistura. sustentam-se palestras alegres, famili aríss i-
mas. animadas por umas r estea zin h a s de sol a m eno que a pouco e po uco vai
de sapar ecen do até se mergulhar de todo.
C om o ocaso do sol esvai- se a an imaç ã o dos assistentes. que passam a con-
cen tr ar-se num remanso d e mutism o e quietude mística. sugestionada sem
dúvi da pelos tons da natu reza. infundindo mela ncolias.
Ao longe so am os choca lhos do s r ebanhos. o coaxar das r ã s. e o mat raquear
das cegon h a s. E como s e t u d o isto não fosse suficiente pa ra t r ansp or ta r a s almas
dos simples a o m aravil h oso e indefi n ido, do al vej an te campaná rio d a ermida
próxima, ta ngem de espaço as tri n da d es da noit e. anun cia n d o o d esca n so. in ci-

- 28 -
ATRAVeS DOS CA~IPOS

tando à oração. Imediatamente os ci rcun s tantes la r ge m o t rabalho. descobre m-


-se, e ex cla m am em r eco l h imen t o: - «Àve M arial . .. .. E todos rezam baixinho,
nu ma religi osidade cont rita q ue se impõe D05 cépticos e consola os crentes. (1)

• • •
E ntretanto an oitece.
À peq uena distâ ncia distin guem- s e as parelhas d e m ua res, que tilíntando -
-lhes as esquilas e guisos recolhem ao monte, u mas de canga com o carreiro a
cavalo, outras engatadas.
À medida que se aproximam aumenta o som dos 41jorges at é os carros
rodarem p ela calçada do terreiro e es tacarem para a soLta .
O barulho do desengate e re colhimento das bestas com a vozearia dos que
chegam a pé ocasiona certo bulício m omentâneo. Instantes depois, ceia a cria-
dagem, medem-se as rações e a r raçoe m -se as bestas. E em seguida cada um
entretem- se como pode «co m os da sua ígualha» . Ent retengas predilectas. O
jogo da bisca lambida. contos, adivinhações, etc.
Por volta das nove horas reina o soss eg o. À esse t empo va i o serão decor-
rido ap ós d emoradas comb in açô ea entre lavrad or e governos sobre os se rviços a
efectu ar. Mais d ois d edos de ce va co com a ci garrada d a praxe que o amo lhes
oferece e eis tudo concluído. De po is tr o cam- s e as . boas n oites... e cada q ua l
recolhe à ca m a para s e entregar a M orf eu n um r e pous o r eparad or.
Se o mo nte fica próxim o da vil a ou aldeia, os m oços solteiros, mal ceam,
giram a caminho do p o voado a co nve rsar em co m os namoros, ou a passearem
pelas ru e.e, cantando em magores. .E. p or lá andam o melho r da noite, até
regressarem à obrigaçao.

(s) Er .. .....lm "nl U . hn u 4 " l",u ""'o'. Agor a lá ",i o • L.m . " im . lIJo llar.,). em H Z di or.;i5 u . tUI ..-n d. 0:01....
1II11lfld.D ....

III

UITAS he rdades d o Alentej o, a ma io ri a ta lvez, BBO povoa dasç n o


to do ou em pa rte, d e impor tantes a r vored os d e az inha e sob ro
de diferentes idades. valor e ex t en são, a que se dá o n ome d e
montad os. h)
Este é o termo próprio, clássico po r a ssim diz er, mas nã o o cor r en t e em
lin gua gem po p u la r, pelo m enos no di strito d e Portalegre. on d e frequentem en te
O substituem por outro - o de m atos - so b retudo s e se trata apenas do a rvo r edo
e não dos se us r espect ivos produtos ou aplicaçõ es. O qu e n ã o i mpede q ue na
mesma r egião, seguindo o u so ger a l, igu al mente se de nom inem matos os mata-
gais de esteve, e o u tros arbustos silvestres. que a b u nd am em maior o u m enor
quan tidad e nos t errenos bravios. i ncultos, ou de cult ura q ui nqu enal, com ou
sem arvoredo.
P or cons eguinte, n o ca m po e po r vi a ele r egra, o te r mo ele - montado -
emprega-se nu m sentido quas e res tr ito à novidade d a bolota, o u para melhor,
nas frases alusívei s à engo rda do s pOlCO S com aq u el e fruto . E x em plilicarei :
Q uando se passa po r um mo n tado e se lhe a precia a nov idade pe nd ente,
diz-se : «este m on tad o está bom (o u ma u, conforme o caso)».
T odavia se se atravessa a mesma ou ou t ra acne, e se se trata do arvor ed o
exclusivamente, já se emprega m outros termos. Exemplo: «Mato velho; sim
senhor, mas sãdio• . • Mato assim está para VIver» .
• •
Às ár vor es de a zinho e sobro represen tam duas espécies distintas com muitos
d Em hlldldu ntt l nb .. lO 10llulho de EI ..... tlmbim ..IU l m u rnlholl por .1 11'1. bolotl Iju. I. . .. t e I I Inchar.
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Ainda 1.lD minor utl l. "Il to .. tu....'rII um ou oouo mo.. hd o 11m .. 'IV OI , . ru • • q UI o ,,01'0 ch.= •••, iqu ci,o, . Sio
~Ol.o 11I11' I ""u lfh do n inbo pu. o .obro. A CIIU da 1...ha • a boJo t a, ...,=,,11..=-• • li d. n lnh.lu. mil • folh.
,aft~ '-" com a do IlObce.b o. Dio po oca bo Jota .

31
ATRA V e S DOS CAMPOS

pontos de contacto. Àmbas sã o de folha permanen te. áspera, d e p u as agudas


(men os no sobro) de côr verde escuro (muito carregado no azinha). d e tro nco e
pe r n a d a s r cbustfssimes, q ue cheg am a ating ir proporçõ es g ig a n tesc a s, me ge ato-
sas. O a z in h a predomina n o so b ro , p el o menos no distrito d e P ortal egre. o nd e
os montad os exclusivos de azinheira s são em quantidade muito eupert or.
Enquanto n ovas, o u m elh or di zendo, até adquirirem mai s d e m etad e do
seu desenv ol vim ento, 8S árvo res das dua s espécies têm o n ome comum d e eh a-
porres, Em a du lt a s cha m a m -se- lh e azinheiras, à s d e a zi n h a , e sobreiros ou
sobreiras, às d e so b ro . Em cad uca s, os sobreiros conhecem-se por elcornoques
e a s az in heiras p or vá r ios qualificativ os. E x em pl os: azinheira t ouqueirose (a
d e tr onco õco}, enra ivada (a d ~ es galhas ou pe r nadas s ecas o u musgosas) ; remel-
gosas o u m olgue íres ( a s muito decc ép itas , de p ouca r am a e lenha); cabreiras
(as d e tro n co ba i xo, cu r vo , por o n d e as ca b ras trepam, 'ro end o-a s, etc.) O s cha-
pa rcos d e az i n ho b a stan te de senvolvid os, q ue t om a m a r od a o u copa de e ai-
nheira, des ig nam -se também p or ch eimrrs s ,
U ma t erra p OVOEI da de cha pa r ros r essalvados, cham a -ee-Ihe cheperrel : e a
d e azinhe iras azinha l. n ome qu e em boa verdade p ouco se e mp r eg e, p refe r in -
do -se o d e «ma to» , aliás impróprio e nada específi co. Mas há q ue ace it a r as
cost u me i ras. Em todo ca so, quand o a s árvores se mostrare copadas, gran d es e
s adias, ch a ma -se- I hes mato real. S e estã o velhas ou raquíticas, galego o u ratinh o.
D á-se o nome d e frade a o co to r estant e da s p e rnad a s t ronchadas ou p a r ri -
das pelo v ento, ass i m com o o d e f aro a os detrit os d o f olhed o e o u t r os fr agme n -
t os v eg etai s que se d epos itam e ac um ulam n o in t erior d os mes mos t oc os . E ss es
r esídu os, de com b us tão fa cí lima, ap ress am a dest r u ição d o a rvo re do v elho po r
ocasi ão d e in cê n di os.

Cr iação Tu d o fa z s upo r q ue os m onta d os antig os s e cr ia ra m qu a se espa n -


t o n enm e nte, co nco rre n do po uc o a a cçã o d o homem para o s eu
d esen vol vim ento.
P elo que se obser va ain d a h oj e em terreno s in culto s. cheios d e C8 y raSCO S e
cha parcos, d epre ende- se q u e as az in heiras e sobreiros q ue a i vemos aos milha -
res. dist an ci ados ou próximos, e m peque n os e g r a n des a gru p a m en t os, sem a
mínima reg c larid e d e, a n tes em di sposiçã o ce peichosfssima e variada - p rov êm
d e anti gos ce r ra s ceis, q ue dant es ocu p ava m a s terras bravias, D eu s sabe d esde
quan d o.
À hip ótese dos m ontados s er em o produ to de b olotas semeadas, o u d eixa-
d as p elas ave s, efigur a -se-ci e inverosímil sob o ponto d e vis ta ger a l. Quando
m uito, pode iss o adm i ti r- s e p ara casos i solados de som enos im portância.
O s ce ern sce.ie oc upa va m área s enormes, incult a s, d e mistura com outros
me.tos silves t re s, exacta mente co mo a i n da h oj e exi stem em zon as r eduzidas. E
en tr e um a veg eta çã o tã o espessa. natural era q u e à mais vig orosa - a d o car -
ra sco - fosse t ri unfa ndo das o u tr as e cr ia n do g ra n d es m oitas, qu as e inaces síveis
a os gu des. Disposiçã o q ue d a va ensejo a qu e os r ebentões maiores e mais defen-

32
Suinos no montado - A matança
A TRAVÉ S DO S CAMPO S

dídos, fossem cres cendo a pouco e pou co, ao embate de mil co n t ingên cia s e
destro ços, até s e destacarem tanto, q u e desp er1avam a atenção do lavrador.
Fraca a t ençã o, que se r estringia a limpá-los antes ou depois da s queimadas,
que d e 8 em 8 ou d e 10 em 10 an os co s tu m a varo fazer nas terras sujas, a fim de
a s sem ea re m e l avrar em «à fac e» . Mas a s r oça s r epresentam um vandalismo
inaudit o.
C h a parrai s imens os h a vi a, e at é s obreirais e azi n h a is , en t re mancha s
en ormes de extra ordinária al tura, qu e s e r oçavam im prudentemente, nã o se
resguardando o arv ored o co m ac eir os e arruada s es pa çosas, que os defendessem,
ou sequer p oupassem, d os estragos do fogo. O lume larga va-se «à va le n t on a», e
tudo a quilo s e tran sformava em cham a s g iga n t escas. s ob o s ol ard ente d e
a gosto, por en t re nu v ens d e fum o n egro. q ue se a vi stava a dezena s d e l ég u a s .
Era medonho I O s pob r es d o s chapa rros, un s morriam l ogo, o u t r o s fica vam
mei os queimados, e os mais r esi stentes, lá conseguiam es ca par, mas com a r ama
afo guead a, em as pe cto des olador.
Mos n in g ué m estranhava . Era estilo. E por ser costume, pou co impor ta va
que ard ess em. P or mui t as q ue se q u eim as se m algumas es ca pariam . E, se todas
se p er de ssem, l á fica va a ce pa vi g oro s a, que outros criari a t ão bon s o u melho-
r es. E a cepa cria va-os efec tiva m ente. em bo r a com a rr aa o . P orque f oss e como
foss e. e a d espeito de t odas as s el vajarias, os montados vetusto s existem em
largu í ssima escala por toda a p rovín ci a, atestando o triunfo da natureza sobre
o vandalism o do s h omens. Triunfo rel ativo, porque, certamente, se n ão h ouvesse
de va stações. ma io r es e melhores a rvo redos exis tir iam.
C om o s m ontados m oder nos. p ouco s e praticam o s sistemas b á rbaros, pri-
mitivos, aind a muito em v oga h á cerca d e 2.5 anos. Mas a s u a o rige m é a m esma
que a dos a n t ig os. À pa r t e excepções in si gni fica n t es, h) são fil ho s do carrasco e
desen vol vem - s e ond e por ac aso nas cer am. C om a difer ença que s e tr atam
melhor que antes. b enefic ian do -se com arroteamentos e limpezas que os p r eser-
vam de estrago s sensíveis.

TRATAMENTO

C onsiste no s segui nt es serviços: la voura ; limpeza da s t er ra s; li mp eza das


ár vor es. e n os desbastes .

Lavoura Se não for a o inconveniente d e es tr a ga r pastagens e ocasíona r desp e-


sas de v ol to. conviria praticar-se an ualm en t e nos m ontad o s, pois
qu anto mais a miud o s e lavra m , mais se d esenv olvem e mel h or fr uto dão.
Como porém há que ate n d er t a m b ém a razões eco nóm icas, lavram -se ape-
nus de ;; em 3, d e 4 em 4, o u de 5 em 5 anos. confo rme o ma ior o u m enor efc-

(I) [ u .. t:I:u,~l'i u cCl1u b ltm n .. pl.nt.~ i3 u I nm....tili.. d• •obnl.l'o, qla' . a t i . ru Uzad o flll. .I'IIDa PODtO' . com o
" ' U I., lo II' I. p. d. rui d. VII. Vho•• • 1m am a OD .lu.. L.nd. d.. do CO DUlL.O d. [!T.... N.d•• cOlDp. n llu lD•• 'I. com
• <1•• • ad. crJ .~lo llPOfl.tlIl U .

- 33 -
A T R A v t S DOS CAMPOS

lhameoto em q ue a he rdad e se divide. A l a voura re pete-se u m a e duas v ezes


contando-s e os e fer r o s » do al q u eive e o da sem ente ir a de cer eai s.
N a s r oça s, limi ta-se a o «fer ro» da semen t ei r a . E h á mo ntados de t errenos
tão ord in ário s que se lavra m s omente p a r a s eu exclu si v o benefí ci o.

Lim p e za d a s terras E xecu ta m-s e desde o princípio d e jan eir o a 6ns de m a io,
precedendo a lav oura d e a lqu eive. o u d ep ois, de 8g0 St O
ao S . M igu el. C o n si s te n a d estruição to tal o u p arci al d o mato p r õp r 'ia m en.te
d i to. Faz-se por três sistemas : um radical - o ar ra n que ou arroteamento - ; dois
s u pe r ficia is - a desmoita e a ro ça.

Arroteamento Signilica a extrac ção de todo o r aizame de arbustos daninh os.


Esp éci e de sU lriba por m ei o do a lvião em q u e a terra s e d es-
brava e s e d eixa povoada d e ce rra s qu e í res , qu e pelo se u vig or p o ssam cria r os
eh aperros n ec ess ári os à co n s tit uição do m ont a d o , ao seu aumento. r eno vação e
subs titui çã o.
D es te t rab al h o. m oroso. f eito a b r aço d e h omem possan te e experiente, pago
a o salário de 360 a 400 e tanto s reis. s ecos, colhe- se m u i ta cepa .. que s e aproveita
para carvão. O restan te r e.ieam e, bem como o fo lhed o e ch amíçc s, j u ntam-se
em cemin heir es distancia d as da s á rvores. e a í se qu eim am a des coberto o u
p r eviame nte tapadas com terra. t om an d o nes t e caso a denominação d e moreias.
A ss im , a c{ueima t orna-se i nofensiva e mais útil por que se i m p ed e em abso -
luto o de s envolvimento e estrago resultante das chamas. com a v a ntagem de se
obter muito sísco e cinza, q ue d epoi s se es pa lha pela terra co mo a d ub o p rovei-
to so. E.nfim , o arv oredo ben efi cia d o com arroteam entos, r a dícu la - s e e cresce à
vo n t a d e, a po nto de n os cor t es s u b s eq u en t es s e p oder em reduzir as moita s
r essalvadas, deix ando -lhes a penas as vergônt eas escolhidas p a r a vingarem . isto
é, 0 5 chepar eic h o s. O s q u a is. ressalvados de vez, vão a d q u ir ind o as formas
consentân ea s à s limpezas q u e r ecebem .
P or ou tro la elo a s á r vor es g r a n d es e pequen as, livres de to da a im u n d íci e,
cre s cem a palmos. rejuven es cem, e a cortiça e bolota melhoram d e vol ume e
qualidade.
Tudo lucra, incl uindo a terra, q ue a s sim a gricultada a proveita-se também
na cultura do s cereais. N ão obstante - convém acentuar- o s arroteam entos
abs orvem capitais av u lt a d os, qu e não p ossuem mu itos d o s p equ enos lavradores.
E de entre os que disp õ em de dinheiro, há os q u e receara em p r egá- lo em tais
em p r een d im en t o s. por n ão t erem a certeza da estabilidade. s endo co mo são
s im p l es re ndeiros, p or p eríodos d e dois e tr ês anos.
As va ntagen s ma n ifestam-s e. é cer t o ; m as s6 remuneram ca ba l men t e p as-
sados mui tos a n os, e p ersis tindo -s e no propósito, E. entretanto se não al cança
o fim alm eja d o. o r en d eir o po d e s er des pe d ido para dar lug a r a o vizin h o inve-
joso e vil q ue lhe foi subir a r en d a para lhe es camotear as benfeitoria s. S obe-
jam os exemplos.

- 34 -
ATRAv t S DO S C AM POS

P or cons eguin t e, da incerteza d eriva em parte a relutância dos la vr ad ores


tímido s e des confiados para empresas duvidosas, 80 pa ss o q ue os resolutos as
empreendem, arriscando-se às conting ências.
Aqui res salta claram ente a vant agem dos a rr en da m en t os das herd ade s a
lon go prazo, pelo meno s p or p erío do s n ã o inf eriore s a 10 anos. Lucra vam
todo s: o senho rio e o rendeiro.
P ode-se obj ectar q ue às vez es se of er ecem seareiros par a , à s u a custa, arro-
tearem e lim parem terra s, me diante a concessão d e as dísfr utarem co m sea ra s
por do is e três anos co n sec u tivos, e que portanto se de vi am aceitar essas pro-
postas va n ta josas, co mo processo d e limpeza r a dic al, fácil e económico.
A dmi tida a ob jecção. re spondo :
O ofe recim ento d es se concurso acei tam - n o d o me lhor g rado os lavradores
inteligen tes que se l he s pro po rcion o. com êx ito, e p or semelhant e m ei o vai-se
desbravando m uito. t erra e mel ho ra ndo m uitos m ont a dos. Mas t a m b ém existem
outros s ujos, em terr enos d e pobresa tal , q u e n en h u m see eeiro os p ede ou
a ceita. E para tomarem os m elh ores, é preciso dá-l os por 2 e 3 a nos, como já
disse. Ora os arrendamentos cur t os em baraçam ou impedem esses co ntratos que
para tere m plena ex ecuçã o e se rem proveitosos ao lavrad o r rendeiro, ca r ecem
em muitos casos de prazo maior q u e o do arrendame nto. I st o fo r a ou tros incon -
venientes, como por exemplo a he rdade ser invadida por estranh os pouco
conscienciosos q ue entende m es tar em pa ís conqui stado.
Por tais contra s, a lguns arren datá ri os prefe re m m a nter a r otina a di s pensa-
rem concessões a terc eiro, com q ue eles re ndeiros nada lucra m , caso saiam d a
herdade.
....... .......... .. . .. . . . . . . . . ............ ... . .. .. .... .. . .... . .. ... . ... ......
Desmoita C ort e s u perficial, de ligeiro d es ca beçame nto no piorno, giesta, tr o-
- visco, etc. Á m edi da que o m at o se va i co r ta n d o junta-se com forca-
dos, aos m ontes o u caminheir as, n o s intervalos d a s á rvores onde se q ueima,
com as cautelas n ecessáTias. À d esmoita cost u m a ser feita por trab alhadores
justos a jornal, o u de empreit ada.
N esta hi pótese av alia- s e o trab alho pelo n ú m ero de d ia s que pod e ent reter
um homem. Supondo que demo ra rá vinte d ia s d iz-s e: «h á a qu i vin te h om ens
de desmoita». Cada jo r nal ou «ho m em » ajusta-se a 120 o u 1SO reis com a s r es-
pectivas comedorias.

Roça Processo prim itivo, q u e t en d e a desapar ecer, mas ante s mu i to u sa do para


de struir t emporàriam ent e a s manchas d e e stev a e ou tros arb ust os que
infes tam as te rra s i n cultas po r mais d e cinco anos.
Por este uso, o matagal é t ombado à roça doira - r oçad o - ficando no ch ão
conforme cai - estendido a es m o, a sec ar em esteira farta e i nterr upto. at é a
época em q u e se per mit em a s q ue imada s.. de 15 de a g ost o em d ian t e. En t ão
larga-se-lhe fo so e tudo arde em po ucas horas.

- 35 -
A T RA v t S DOS CAMPOS

Antillamente, repito, pouco ou nada se defen dia o arvoredo, das queimas.


Hoje já s e adoptam preca uçõ es de aceiros, i nsufi cien t es em todo o caso.
Por que a despeito de cuida dos p r ev en tiv os, as r oça s deixam se mpre vea ti-
gios destru id ore s, p rópri os de um a velharia est ú pid a e vandálica, verdadeiro
fla gel o dos montados. D os qu e a sofrem, quase se pode dizer como da qu eles
enfermos q ue me lho ra m da moléstia m as que morrem da cura.
Na mel hor d as previsões n ã o passa m de limpezas tempo rárias impe rfeitís-
simas. À te rra continua com o r a i z a me do ma tagal ard id o. q u e ren ova na
prim a v era s eguin te com maior pu ja n ça num a r á p ida v eg e ta ção e que em br eve
avassala 0 9 ch a parr os. O cont rár io da a rro tea da que ex ti ng u e de vez o m a t o de
cepa e reduz m u itíss imo a reno va ção d o se .rageço e esteve, Esta a caba d e todo,
se s e persi ste no se u an iquilamento. Ba sta arra n cá- Ia à mão em pelas sucessivas.
anu ais, dura n te três an os. S erviço barat o que se execu ta com mulheres n a s
época s i nvernosas de salários baixos.
-R esu mi nd o : os mon ta dos que se beneficiam com lim p ezas radica is e persis-
t en te s m ostra m a specto vi çoso. lu xuriant e" que co n t ras ta com o ra q u itism o
avariado d os q u e estreb ucha m a o a b a n dono, en egr ecid os e dizi mados pelo fogo
d as quei ma da s. .,
...... .. .... .... ... .. .......... ... ..... ... ... ..... .... .... ... ... ....... ... . ..
D as limpezas d a s terras, paearei à das árvores, d esignada pelo no me d e
cortes . U m a é o co mplemento da outra. Em ge ral a d e cima (a das é rv ores] pre-
cede a d ebaixo (a da t erra ). Ma s també m se efectu am as duas s i m ultanea m ente.

O s «co rtes) R en ova m-se de 5 em 5 anos, d e 6 em 6. o u de 7 em 7, com eçando


em dez em b ro e concluindo- se em março o u abril.
Àyvoredo por limp ar mais de um sex én io, notoriamente se prejudica. As
á r vores d efinham- se, enc hem - se d e musgo, enra i vecem-s e e sobretudo es cass eia-
-lhes a b olota, que cheg a a falta r de todo.
T orna-se po r conseguin te i ndi spensável a li mp eza q uadrien a l ou quf n quie-
nal, a m alh o ( machado) qu e. aplicada co m pr udência e crit ério. é tã o útil como
a d o a rado e enxadã o.
Há vários sistemas de cortar. cada q u e l útil e apropriado às diversas
circunstâncias em qu e s e encont ra o cma to» e a t é a cada árvo re em especial. O
que é excelente num d ado ca s o, po de se r noci vo noutr o de condi çõ es opostas.
N as azin h ei ra s altas. sê d ia s e vigorosas. a experiência a conselha que s e
ab ram ap en as, d eixando-lhe as pernadas r ea is e outras q u e n ão sobrecar reg ue m
em excesso. todas providas de su6cientes polas ou r amos. C opad a s e enramea-
de s, ap tas a produz irem bolota no a no seguinte.
Se sã o no vas mas baixas p or n ão terem si do s uiad as em chapa rIos. d es-
pontam-se um pouco, logo adiante do s ve rgont ôes - veriSDlhões - que tende m
a elevar-se, para rea dq uirirem a precisa altura e a co pa q u e per d era m .
N as <r ue mostram d ecadên cia , com r a mos sec os e ar ej a dos, recua m-se o u
tr onchem-se s em d õ, como p r o cess o único d e s e lhe atalhar a de crepitude. D a

- 36 -
AT RAvt S DOS CAMPOS

mesma forma qu e ao enfermo que t em uma p er n a ga ngr en a da, o cir u rg ião lha
amputa co m o rem édio heróico para lhe salva r a existência, assim a árvore
decr épfte necessita que lhe inutilizem as pernadas doentes para ficar só cn o s ã o .
e r ejuvenescer. embora não mais al cance a p rimitiva corp u l ên cia . Mas an te s
p equen a e vi çosa do q u e g ra n d e e d oente, condenada a m orrer breve. Que só
n estes ca sos extremos s e impõe a troncharia. Noutros é um crime despojar as
á rvo res , no todo ou em parte. da s pernadas s ã s co m q u e mu ito bem podem e
que tantos an os demoram a cri a r .
Nas azinheiras velhas, ocas e nudosas, de h á muito recuadas, a limpeza
res tringe-se ao indi sp ensável.
Os sobreiros deixam-se com asp ernac1.as mais nuas e Auiadas. q u ero dizer,
me n os compostas d e ramos, q u e a s ou t ra s do azinha.
Os velhos elcornoques, prestes a exting u irem raras vezes p ermitem limpeza
vistosa; assim a contece com a a zinheira de an áloga vetustez.

• • •
O s h omens emp r eg ad os n os cortes design am-s e po r corta - ramas.
Uns saem da ganharia, outros a justam-s e ex p r essa m e n t e a r azão d e cinco
a seis mil re is p or m ês, co m i d a e u ma s du as carradas d e lenha. O manag eí ro
ga n ha um pouco ma is.
O cor ta - r a m a a n t es de subir para a á r vor e q u e se propõ e li mpar, en cos ta-
-lh e 8 0 t ronco o burro (esteio cha nfr ad o a servir de escada) e p or ele trep a a
ga lgar o ponto desejado. S em p re de pé. e munido d o machado, p ro cede à lim-
pez a salta n do de u mas para o u t ras p ern a das, como pode e sabe. Em que di spo-
sições difí ceis, incómodas e perigos a! el e tem de se aguenta r m u itas v eze s pa r a
se sa i r do erebalho com de sembara ço prov eito s o I
D o al to da a zinh eira. no qua se extrem o d e uma d as h ast es, sem ou t ro
apoio, além d os p róp r io s pés; mal se conceb e co mo ess e h om em se equili br e e
poss a vi bra r o m achad o sobr e a l en h a num vai-vem sonoro e cad enci a do.
M a s vi bra e com fouteza. Os go lpes sucedem-se certei ros e rijos, tanto que
o made iro, fen di d o em volta , num instante estala, esge r ra e cai. vencido de todo
pelo ousado trabalhador. D est em i da criat u ra que n em sequer pe n sa no p er igo,
Um ligeiro descuido ou imprevista casu a ü da de, e eí -Io da árvore abaixo, a os
trambulhões. À quantos têm s ucedido desses precalços que alguns pagam com
a invalidez ou a morte. C oita d os, fazem parte do martirológio d o t raba lho rude
e obscuro, ig n ora dos das multidões sem os elogios das gazetas .

• • •
À boa conservação e aumento dos montados merece es pecial protecção das
municipalidades a le ntejanas. Nos códigos de posturas d e todas ou quase todas,
cominam-se m ultas aos que de rri barem á rvores. chaparros e perna das 'leais,
se m mo t ivo justo. Na s escritu ras de arrendame nto também os senhorios se
acau tel a m dos rendeiros por a busos sem elh unr es.

- 37 -
ATRAv t S D O S CAMPOS

O s senhorios mandam examine r os cor tes por pessoa s de sua confian ça . O s


munícipes incubem ig u alme nte d e s em elh ante serviço os rend eiros o u ze la d o r es.
Q u an d o uns e outros en contram t ra n sg r essões, entendem-se com o la vra do r ,
resolvendo-se a questão e mig êvelmente, por indemnizaçõ es pecuniárias ao
s enhorio. M as se a conciliação se ter na i mpossível r ecorre-s e aos meios judi-
ciais, com a vistoria de peritos ajuramentados. R.ecurso extremo pouco u sado
por receio de chicanas e incóm od os. O alentejano tem horror às d emandas.
Prefere pagar às boas, a meter -se com li ju stiça.
Como curiosidad e oportu na, eis algumas frases conent es na apre ciaçã o do s
cortes. a o se rem vistos por en tended ores.
D os qu e se limpar a m com d ema siada cautela : «Foi muito poupado . .• cor-
taram a m edo . . . podiam che~ar-lb.e mais .. . • , et c.
Dos bas ta nte castigados : . Q ue Brand e tr onch aria} que esn ocs l . . . por
pouco que as n ão d ei xam pela5 trepas/ ... Foi a m atar/ sem dó}
D os r ecuados po r n ecessidade absoluta : . Ch e~ara m - lh e de fi r me, mas pre -
cis avam disto ... Estav am qu e m etiam m ed o ... velhas ... m usgue ntas . .. ar eja-
das .. . V erão com o agora reverdecem . . . Para o ano es tio como repolhos . . .
Com bole ra à esgarra . . , Mato assim qu er malho.•
Dos cortes boni tos, apurad os, em arvo re dos vi çoso s : «S im , senhor, n ão bá
que d iz er ... fartas de ram a . .. golpe a prece ito .. . bem rodad as . .. t odas com-
postas . . . Q uem por aqu i andou sabia d a pod a . . . •

Desbastes J u s ti fica m-se e i mp õem-se se mpre que a s á r vo re s exista m em d ema -


sia, a t ocarem-se umas n as outras. O arvor ed o intenso, sombrio e
exc essivo, defin ha, envelhece e quase se esteriliza produzindo m enos e pio r
bolota do q ue produziria regular mente di stanciado, em condiçõ es de se desen-
vol ver e bracejar ii vonta de . A cr es ce ainda, q ue o «m a to» basto em excesso ,
somb r eia a terra , inu t ilízan d o-a pa ra sear as e pastagens.
H á po is vantag ens i nco ntestáveis n os desbastes q uan do a s circu n stân cias os
reclamam e se re alizam so b u m plano metódico e r acion a l. I sto é, a rranca ndo-se
o arvoredo caduco, para d ar espaço ao n ovo, e do n ovo dizim u o s upér fluo e
pior pua vingar o melhor, sacrificando-se 8 azin h eira a o so b r eiro, cuja s upe-
riorid a de prod utiva ning ué m con testa .
A s J is tância s d e umas para outras á rv o r es r eg ula m de 6 a 10 m etros, se
assim o permite a d isposição do a r vo r edo . D esbastam-s e, cor tando o tro nco d a
árvore uns 60 cen tím etros a cima da base, o u de rru ban do .. a pela raiz, depois d e
paciente escava ção em vo lta d o pé .
Os cotos dos pés cor ta dos cham am- se-lhes pitões.

PRODUTOS

Consistem n a bolote, lenha e rama, pe lo q u e respeita ao azinho. O sobro


dá a m ais a cort iça e a cesce ou entrecasco.

- 38 -
ATRAvtS DOS CAMPOS

Bolota Fruto seco, oleoso, d e côr esc u ra e forma oblonga. A d e azinha avan -
te ia- se à d e sobro em sa bo r e q u ali dades nutritivas . C on st i tui a prin-
cipal receita da a z in h eira e a s egunda do sobreiro. Te m alta importância pa ra
a economia r u r al da p rovíncia. Al ém de ser um bom a limen to para gados de
todas as espécies que, como tal, o procura m com avidez em cima e p or b aixo d o
arv oredo - Aplica -se princip almente, com n o t ória va nta gem, na criação, s ust ento
e r á pi da engo rda de muitos milha res d e suínos. Para este s é sem dúv ida o
melhor dos alimentos. Com r azão se diz que a Natureza criou a bolota para os
porcos, e que os porcos n as cem para a bolota.
C on sid era d a sob o ponto de vista gera l, a sua col h ei ta, é, em regra , dimi-
nuta, comparada COm a das outras á r vo r es.
No sobro predominam as prod uções peri6dicas : n uns anos n o vid a de ch eia ;
noutros nada.
Com o azinha observa-se menos esse f enómeno. Em regra, e em maior ou
m enor escala, num mesmo «ma t o » há em abundânc ia ár vo res ventu reiras e
estéreis por entre algumas castiças. D est a ca n d o sempre as d e p rodução escassa
insignificante.
C om ef eito, se r epararmos bem n a enorm e quantidad e de azinh eiras d e um
m ontado g r a n de. e dep ois so u ber m os da s ua produção. m esmo nos a no s abun-
dant es. reconhece-se l ogo quanto é fraca. Só d ois alqu eires que desse ca da árv ore.
os m ontados produziriam três ou q u a tr o vezes mais da m édia habitual. M as
a ssim como sã o, se po r aca so uma a zinheira g ra n d e. excepcional e castiça, pro-
du z 30 ou 40 decalitros, centen a s existem q u e nem meio dã o, e mu it as n ada
m esmo em a n os con se cut ivos. A q ue dá d ez al qu eires de b olota já s e co nsi de ra
muito b oa. E pois dif ícil calcular a p rod ução média de cada á r vo re mesm o p o r
q ue o s eu n úm ero t otal em cada mon tad o, ignora-se ordinàr i amente.

* * *
o azinha produ z uma s6 camada de bolota, vari ando muito em t a m a n ho e
qualidade, conforme as ca st a s, a natureza da terreno e os cui d ad os d e cu lt u ra s.
A b olot a criada nas terras bravias é amargu e miud a, sob r et u do n o a r vo r ed o
basto, assim como é g ro ssa e de melhor sab or na s t erras cultivad as , d e «ma to»
ralo. A bolota miuda chama-se pombeira p or ser a preferida dos p ombos

... bravos, p el a facilidade com q u e a in gerem .


Em ig ual dade d e circunstâncias, q uanto a t errenos e tratamentos, os arvo -
redos velh os produzem fruto superior aos novos.
A bolota d e sobrem esa, apreci ada por muita gente, es casseia bastante. S ó
pOI' entr e dezenas e deze nas de azinheiras se encontra uma ou o utr a de frutos
saborosos e POI' a caso alguma doce, no rigoroso sentido da pe.l a vr e. Estas são
estimadíssimas, ten do n omes próprios, como am en doinb as, a dos ma lteses, a
do pé caiado. etc.

- 39 -
ATRAvtS DOS CAMPO S

Às lebres den unciam a bolota do ce. Onde 8 haja r oida por elas é com cer-
teza de s uperior qualidade.
• • •
À azinheira principia a florir ao desp ontar da pri mavera, p ouco dep ois dos
mar meleiros. Pela n ovidade dos marmelos formulam-se j uizos s obre a produção
dos montados. No conceito po pular a fl oração d os marm elos aparece s em p r e em
ab undância ou escassez igual à q ue se verifice, semanas depois n a s azinheiras
e sobreiros.
C omo quer que seja, n o fim de maio o u começo de junho, reparando-se
be m , já se d ivis a a bolota como cabeças de alfinetes. A que tra z O pé curto
con sidera-se viável - vivedo ura - sã e resiste n te j se mostra pé co m prido, r epu-
ta-se infe rior de p éss imo a ugúrio, propen sa a estragar-se por contingê ncias
atmosféricas, como chuvas no verão, seguidas de calores intensos, et c. Me la e
perde-se bastante.
Em ag osto a bol ota de azinha é d o tama nho d e a velãs, m eia en volvida n o
csscsbnlho, m antendo a côr verde, primitiva, q u e em s etembro s e mod i6 ca,
amarelando um po uco, ao atingÍ:I maio:r desenv olvim en to, para em ou tubro se
comple tar, raiand o d e es cur o - pintona -. Em novembro escurece por inteiro,
com a côr se m elh a n te à das cas tanhas.
D epois, em princípios de de z embro, abrilhanta- se e aloira, ap ós a q ue d a em
perfeito esta do d e maturação. A ca ida é m orosa. varia n do d e ár vo r e para árvo r e.
em an ál ogas con d ições, aparentes pelo menos. A o passo q ue a de umas azinhei-
ras cai l ogo que amadurece, a d e o u t ra s conse r va-se po r dezembro fora e até
janeiro, e ai nda inde6nidam ente precisando varejar-se para se não a vela r e
recozer-se em cim a .
Mas d esd e q ue nasce a té amadurecer, quant a se: inutiliza com o g'ran 'iso
das saraivad as - ped risco - ou por efei to de d oen ça s, prin cip almente n a período
6nal da criação, em qu e síngn (cai) ev arí ede ,
A s ch u va da s de se te m b ro e outubr o a çoitam o emet os, d errubando-lhes pre-
ma turamente muita bo lo ta em ssrás - m eia verde. Mas nesta a ltura, já se n ão
estrag a em a bsoluto, po rque Q. ap roveita com ap etite toda a espécie de gados.
N enhum a des de n h a . em bora com peco - (dete riorada). E ainda um ma d ura ,
m a s pe nden te d a s á r vo res, so fre imenso com a s ge adas grandes a com pa n h adas
d e ven to do suão. E scane ves (co mo lhe chama o v ulgo) que d eixam a bo lota
com o q ue a rd íde . R.ecoz ida, d ia -se tamb ém. M a s só a p ende nte, xep i to. A já
caida n a d a sofre, an tes se conserva perfei tamente no chão não lhe chovendo
muito. Q ua nd o se molha grela, sim, um pouco mas estraga-se menos do que
estando ar recadada e amontoada em casa de pouca ventilação. Aí arde e sue,
isto é, ferm en ta e apodrece se não se beneficia com voltas amiudadas.
• . ..
o so b rei ro
produz três ca madas de bo lo ta : bas tão , Jand e e ien eirin lxs, q ue
s e distinguem pelo tamanho e época em q ue sazon a m . O bastão é grosso,

40
ATRAvtS DOS C A M P OS

escasso, tem porão, vindo em outubro e novembro. A Jande. menos volumosa.


constitui a melhor camada, por em regra abundar como nenhuma. Amadurece
em dezembro. Resta a ieneirinhe, as sim conhecida por vir em janeiro. É a
menos importante por miuda e t ardiaj Às tr ês passam p or fases e contingências
i guais à s do azinha. salvo no s estragos d o burgo, que, pelo visto, não ataca o
sobreiro, sensivelmente.

Cortiça Casca g r ossa , fendida e bastante leve q u e rev este o tronco e pernada s
do sobreiro. Em atingindo um certo de senvolvimento, perde n a época
própria. (maio a a gosto) as propriedades de a d er ência, desa gregando- se f àcil-
mente sem prejuízo da árvore. À q u a l, d escortiçada u m a vez, passa a d ar cortiça
melhor, demorando a. criação d e ca da t iragem 8 ou 9 anos nos sobreiros novo s
e 10 o u 11 nos velhos~A p rimitiva chema-s e-Ihe virgem. eas sás ordinária p or
g r osse i ra. muito rugosa, servindo apenas para co m bus tí vel, inferior e desa gra-
d á vel. e para corti ços d e abelhas, na melhor das hip óteses. A das t ira gen s
subs equentes à virgem. d enomina-se amadia. t a cortiça p or ex celê n cia , aprecia-
d issima para diversas aplica çõe s. tend o p or i sso alt o valor n o mer cado .
Entre a. amad ia e o co r p o lenhoso da á rvore, existe um segund o r ev esti-
ment o men os g ro ssa qu e o prim eiro. q ue ve m a ser a casca prop ri am en t e dita ,
tamb ém conhecida por en tre -casco.

• • •
L ogo que o t ro n co d o so breiro a lcança a g ross u ra igual à àa p er n a d e um
h o mem o u m a is, u sa-s e d es cor ti çá-lo da virgem no tempo próprio, p re parando - o
ass im para a b oa prod uçã o corticeira. N o p é entende- se, e n ã o na s p er nadas
q ue continuam n o es tado prim iti vo, para só r eceb erem aq ue le ben efí ci o anos
depois, a pouco e p ouco. à medid a q ue se r obus t ece m. O de scorriçamen to per-
ma tu ro r etard a e prejudica o d esenvolvimento da árvo re.
D o principio d e junh o a fim de agos to procede-se à tira gem da cortiça p o r
conta dos comp radores, geralmente. com h om ens expe rie nte s as sa lar i a dos a 400
ou 420 r eis. Tra b alho s imples a qu e se procede co m o auxílio do machado.
Ap roveitando q u a nto p ossível a s Fendas n a t ura i s. go lpeiam perpen d icu la rmen te
nos sí tios a desco r tiçar e. à ca u t e la. de m odo a não feri r em o entre-ca sc o. E m
seg ui da com o cabo do machado e um pequeno impulso desagregam a co r tiça
que. dando bem, sal ta em ca nud os e pranchas de maio r ou m enor v olu me.
À pós a tiragem, reun e-se em g randes montões em can os o u à ca r ga e fic a
ai a enx uga r uns 15 dia s, se ndo depois aferida (apara da) e enfard ada em ccseais,
que, pesados ou não , se g uem para as fábricas e estações do ca minh o de f erro.
P or vi a de r egra este prod uto pe r ten ce aos senhorios d a s herdades. e n ão
aos rendeiros que só por acas o de le dispõem, se rep re se nta quantidade insigni-
Êcante.
C ostum a ser a cs rAs a u nidade aceite pa r a os cálculos da p rodução. e tam-
bém. às vezes, pa ra o preço da venda . C a d a carga regula pOI 8 a 10 arrobas.

- 4.1-

ATRAV J'. S DOS CAM POS

variando o preço, segundo a q ualid a d e, a procura e a cotaçã o. A primeira


circunstância varia muitíssimo, d ependendo ba stante da natureza d o te rreno
que sustenta o sobreiro, se u es ta do, etc. Mas parece-me não s e errar m uit o
atribuindo-se o va lo r em mé d ia d e 700 a 800 reis p or arroba, justa na á r vo r e
sem mais des pe sas pa r a o vendedor primitivo.
Também se usa, e t alv ez em m a ior escala, e sistema de ven d a « 8 ol ho» , em
globo. para sair de u m a v ez o u po r diferentes tira gens. algumas em fut u r o
distante - dez an05 e m ais.
A s vendas ad ianta das gar an te m - se p OI escritura pública e sinal a vult ad o -
um t erço, metade o u co is a q u e ga ra n ta hem o Está claro qu e quanto mai or fôr o
adiantamento em dinheiro e o pra zo para a ti ra gem, mais dep re ci a da fica a
m ercadoria.
Ag gra ndes tiragens são comprada s pelos gran de s i n dustria i s e fa brican t es.
e a s pequen as po r uma aluvião d e com pr a d ores a lgarvios, que de muitas parce-
las adquiri d a s em várias herdades ch egam a d is por de po rções importantes.
Em abril e m a io começ a m a a p arec er os a lgarvios. cho uteando em anafados
machos, aos gr upos de 2 e 3. d e herda de em her da de. a fa r eja r e m o negócio e a
comprarem q uan to podem . P or v eze s se g ce r.eeam uns 80S outros, sem escrú-
pulos ou consideraçõ es .
Há coisa de 15 anos toda essa gente fazia con t ratos esplêndidos, emba rri-
le n do os vendedores. que, ao tempo, por inexp erientes, desconheciam a i mp or-
t â n cia d o a rtigo . Tal houve então que, julgando vende r por u ma exorbit ân cia .
vinh a d ep oi s a sab er que tran saci on ara por metade ou dois terços menos do
valor rea l. Imagine-se o desapontamento.
H oje em dia já se con h ece melhor semelhànte especula çã o. N i n g u ém igno r a
quanto a corti ça é p rocu ra d a e paga p or preços q u e pa receriam fant á stica s ao s
n ossos a v ós, se eles porventu ra sonhassem semelhante coisa. Porque anti ga-
m ente qu a s e se lhe nã o dava a p r eço. Era tão ínfimo o seu valor q u e mu itos
sobreiros velhos, sec u lares, pe rman eciam co m o t ronco e pernadas coberta s de
cor ti ça vir ge m , cheia de musgo, atestando bem o aba ndono e d esprezo a q u e os
votavam.
À ssim com pre en d e- se q ue o utr ora se preferissem a s herdades de azin ha às
de sobro, exactame n te o inver so do que s e passa na a ctu alid a d e. H oj e o so brei ro
é u m símbolo d e pr od ução . Está p a ra co m os a r vo r edos com o a ovelha para
com os g ad os. Uma e o utra, d es pe m-se para vestir o dono . ..
D os antigos sobrei ra is a lg u ns têm s ido der r ub ados para lhes extrairem e
venderem o entre-ca sco, que ta mbém va le um d inheirão.
Mas p ara con tra balança r es ses arranques - que nem s emp re se justi ficam
em absoluto, an te s, a lg u mas vezes, rep rese ntam um expedien te d e apuros finan-
ceiros, para rem over embaraços - surgem em q u a n t ida d e bastante maio r,
sobreirais novos, extens íssim os, l ux ur ian t es, qu e aum enta m e prog r idem d ia a
dia num crescendo espant oso.
D ev o porém advertir q u e no conce lh o d e El vas nã o há esse a umento de

- 42 -
ATR AvtS DO S CAMPO S

r iqueee . O s sobreirais a qu i, tanto velhos como novos, r est r fn g e m -se a pe rcelae


minús cu las, insignifica ntes, r ela t iv a m en t e.
O sten ta m - s e, con t udo. em g rande escala nos vizinhos termos de Arro n ches
e M onforte. e a in da em i m po r t â n cia maior n os de P ortalegre, C rato, P on t e de
S or e o u tr os. E como r iq u ea e de v izin h os, tão caracteristicamente a l entefanes,
n ão julgo de s cabid a s es tas ligeir a s e i ncom pletas referências.

Len has R esulta m dos cortes, dos desbastes, das árvores se cas e do ra izeme das
arrot eadas. Há diversas classes d e lenhas, q ue se podem englobar em
tr ês: a g r o ss a , como madeiros, pít ões, r ach as, etc.j a mediana. compreendend o,.
schões, achas e ra íz es ou cepa - e a miuda, representada po r acha s, p equ enas,
delgada s. Isto sem falar do chamiço ou cbapoia que fica da traça, à r oçadoir a ..
reb otalho de tudo.
O s madeiros e pítões s ão partidos a ma chado, ser r otes e cunhas ; as a cha s
e ach ões, a machado, ap enas, e a miuda à r oçado ir e o u pedes.
Como s e sab e, as lenhas d estinam- se a co m b us tível, já no estado n a tural,
mas ef eit a" (traçada) já reduzida a carv ã o p ara o ga s to local e abas tecim ento
dos mercado s de Lis bo a e o u t r os.
O g as to da lavoura, compreen dend o monte e dep endências, consome pa rt e
imp ortante, s enão t oda, co m o a contece nas h erdades d e montad os pequen os. Só
quem presenceia esse dispêndio pode faz er id eia da s ua i m p o r t â n cia .
N outro s t em p os em q u e ha vi a mu ito mais l enha e bem men os co mp rado res,
o s t erraço s d os m ontes era m o r namentados co m medas gigantescas, p it:âmida is,
de t OTOS d e todas a s dim ens õ es, ar ti sticam ent e erguidas pelos criados de lavo ura
na s vaSaturas. P or este m eio arma zenavam-se p orções a vultad íss im a s, que a ssim
p ermaneciam an os, até se derribar em p or ne cessida de d e con su m o. E a lém d a s
medas, amon toavam -se a esmo quantidades s em el h a n t es pa r a qu eim ar n os
p rimeiros tempos. Calcule-se, p ois, a q ua n to m ontaria a t o tali da de.
Àctual mente acumula-se muit o m enos lenha e economi za -se um p o uco
mais, mas ainda s e gas ta bast ante nas lareiras dos montes e na q u e s e dá e os
criados, p or costume, f av or ou condi çã o. E a es ta temo s de a dicionar a que os
m ate ir os furtam de fugida.
À s lenha s de azinho são as melhor es q ue s e co nhecem. A sua combustão é
d ura d oíra, intensa e odorífera.
Na da mais atraent e n o Alentejo d o que passa r o s erão d e um a n oite frí gi-
d í9Sima em vol ta da clássica cha min é, pro vid a d o b om l u m e d e azinho. Conforto
delicios o qu e d eix a a perder de vis ta quanto s fo gões se inventem .
Já li algures que a lareira u n e a lamílis e qu e o l ogão separa- a. Deve ser
assim .. . m áxi m o se o lume f ôr de azinha .

• • •
Ant es de s e desp ej ar o co rte, o carpinteir o, ou outro h omem habilitado, v a i
as sinar os pecs que pela s u a configuração especial s er vem pa r a «m a d eir a» - isto

- 43
AT tl.AVt. S D OS CAM PO S

é as p eças apropriadas a empregar n o fabrico de ce rrcs e out r as a lfaias a grícolas.


P or mui to necessárias e irem esca sseando. sempre se procura m com t od o o
afã e interesse. Eis a lista d as p rin ci pa is :
P a r a ce r r os : massas, pinos, raios, m iulos, cãiba s, eixos, limões, traves sas,
ca ngas (meios e suadoíros), et c.
P a ra arados : gargantas e pontas (timã o) j arados (dentes) rebe n eios, eiveces,
cang as d ireitas. etc.
Para dive r sas alfaias - grad es, pegões. esteios, forcados, cangslho s. etc. N o
capítulo - Alfaias a grícolas - encontrar-se-á a descrição cor r espon d en te a este s
u tensílios.
P or agora basta di z er que sem.e lha nte madeira se gue em bruto para o
monte a/im de s er falqu eiada (desbastada). S e sobeja das precisões da «ca s a', a
de excesso é vendida aos lavradores que a precisam. Mal chega para as
encomendas.
Às lenhas a mais d o consumo da respecti va la voura e co rresponden tes
encargos, são v endidas a o industrial de carvã o ou «feitas» p or cont a d o próprio
la vrad or. O carvo eiro contrata por v é.rioa processos: ou compra por junto «à
carga cer rad a» t al qual a lenha caiu das ár vo r es, ou p or uns tantos r eis fix os
sobre cad a saca ou arrob a d e carvão q ue se venha a pro du air, fican do a seu
cargo a s d espesas todas. A s sa ca s variam de capacidade,
S e o lavra dor fa z lenha p or su a con ta e ris co, ou vende-a à s carradas para
as povoa çõe s p róx imas, ou r edu ae-a a carvã o, que f ornece directamente a os
gran des a r m azéns, de 140 a 200 reis por arroba, po sto no caminho de fe rro ou
n o centro do con sumo.
H á a inda ou t ro sistema, misto dos me ncio nad os, q ue vem a ser o la vrad or
preparar, reuníe e emp inar a le nha em for nos, e nes ta altu ra ve n dê-Ia em g lo bo
ou p or for n o s aos g ra ndes car voeiros q ue po r seu t u rn o com pletam o fabrico.
À s lenhas tin h am antigamente valor baixo, quase n u lo. M a s a i por 1876 a
1878 subiram basta nte, ati ngi ndo preços el evad os, n unca vistos, q ue d ep ois
d ecairam a té ch egar em à b ar a tez a em q ue estavam há pouco . Presen t em en t e
vo lta ra m a s ubir.
É de no tar que semelhantes oscilações, dão-se ap en a s Das zo nas próximas
d os caminhos de fe rro, po r efeito da maior o u m en or aflu ên cia d e ca r vã o ao
mercado de L isboa , e q uiçá da s combinações e aco r dos d os carvoei ro s a ça m ba r -
cadores. Q uanto às len ha s dista ntes das vias acele radas, os seus preços são
s empre insign i ficant es, assim como pe rm anecem altos nas das regiões muito
po pulosas escassas ou folhas de arvoredo. D e onde se deduz serem as lenhas
u m ar ti go d e valo r i n stável e relativo.
D á- s e até o seg uinte curioso fa cto: - a chamiça q ue sobeja da t raça, dá
re ceita im por tante nas zonas escassas de combustível, como s e observa nos
arr ed ore s d e Elvas, onde tod a é po uca para a comprarem os burxiqueí ros do
sítio, que em cargas e ca rros, a vão reven der à cidade.
P ois este mesmo arti g o, no u tros pontos em qu e su perab u n da e a p op u la ção

- 44-
A TRA v t S DOS C A M P O S

escasseia, como sucede em grande parte do concelho de Àrronches, l onge de


produzir receita, oca siona d espesas. A í, a chemiça, não obstante f acu l t a r - s e
g r e ris a q u em a queire, ecbe ie, na qua s e t ota lidade. tendo q u e s e a juntaI e
q ueima r para a t erra ser lim pa e lavrada sem imp edimento.
C om o qu er que se j a uma ca r ra da de lenha comprad a n o corte, já «f ei t a» , é
barata, por m il r ei s, se fô r de acha s e e chões, e n ã o de ma d eiros e r achas.
À cha mi ça ou ch apa ta . vai e uns 300 a 600 re is a ca rrad a , q uan do muito,
on d e tem valor, en t en de-se.

* * *
Na s l enh a s e ca rvão - carvoarias - empregam-s e centena s d os melho res
jornaleiros d a s fre gu esias p r óx imas, co mo S ant a E u láli a , Assum ar , A legr et e,
Ar r on ches, etc., e tamb ém os de o u tra s di s tant es, s ob r et udo os do Pe~o, q ue
t êm o ep íte to de peAachos.
O s d e Santa Eulália passa m p or m uito des em b ara çados e sa b edor es, a.
p onto de sere m tradi cionais a s S U 8S a ptidõ es n o géne ro. Tanto, que, desde
temp os r emotos, os habitantes da q uela fre gu esia são a poda d os de carvoeiros .
A podo com q ue a lg uns bisonh os encor do a m, e de qu e os s ens a tos se r i em por
con hece re m o u t ros mais d epriment es, ap li ca dos a os mo r ado res de povoaçõ es
vizinh as.

* * *
D e ja neiro a junho, efe aem-se» as l en h a s. Cada negociante carvoeiro di s p õe
de uma, dua s e tr ês ( am ara do s d e 15 a 30 homens, ao salário d e 360 a 420 r eis
se cos p or eq ui meen a s» ou t em p orada s d e 13 ou 21 d i a s. A a lteração de preços
56 se efec tua n o começo da q ui nze n a à seg u n da-fei ra d e man hã. A s ta be r nas
da s loc alid ad es a cumulam n esse di a as f u nções d e bolsa para a co tação do se l ã-
tio. P or ent re a matadela do bicho, com u m Aovern o de aAuarde n te o u duas
decilitradas, so be m o u d es cem as ofe rtas dos m ana g eiros. r egulad a s pele. ca rê n -
cia do pessoal o u pela abundância. n o caso de baixa.
A alta tamb ém às vezes deriva d o á lcool q ue esquen ta o m iolo d os encar-
re gad os basõ fias . A pinga e a em ula çã o predisp õe-os a. desp iq ue s de ofertas. a
ver qu al apa n h a melhor familha , sobretudo se têm ousadia (carta br an ca ) dos
a mos. O s a ss is ten te s ouvem as pro pos ta s mas nn~em·se m oucos, p a ra entrete-
rem te mpo e fazer jogo. Quando m ui to, dize m : «Vou para q u em mais me
de r . .. » «Q ua n do o p au dá, ti r a -se- lh e a ca sca, etc .».
E n i sto passa m a m anhã, a «fazer em praça» e b ebenicarem em gran de
al g8zaII8, a t é que , meios tor t os, se decidem a sair, seg uros de q ue o preço não
trepa ma is.
Ajustados fin alm en t e, vão a casa, aviam os man timen tos, e, em conclusão,
lá marcha m para o t ra balho, de ser tã na mão, e saco às costas. A sertã é
utensílio típico.
As m ulheres e m ã es d e a lguns acomp a nham-nos à saída pa-ra se certifica-

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ATRAvtS DO S C AM P OS

rem em absol u to do destino que tomara m. E ao verem-nos já distantes, fa zem


comentá r ios sobre os g 8 StOS de ca d a qu al, n o vinho e n o tabaco.
Entretanto. aguardam-no s sa u dosa s at é a o r egress o, que se ef ectua na
manhã de sábado, 6m d e quin z ena, o u na última s ex ta- fe ir a se foram por
temporada d e três s emanas.

Carvão Cada camarada, com se u ma na gei.ro, faz a traça para carvão, dividida
em gru po s a trab al h arem n o m esmo corte. Um deles munido d e
c unh as, e lvl ôes, marrã o, s err ote e «ma lhos» (machado s), co r ta a lenh a g ross a,
co mo ma deiros, pitões, pernad as , etc . O s madeiros custam um tra balh ã o insan o
e p aciente, qu e s ó a veríeis co ns u m a da consegu e abrevi ar.
O u tr o g rupo, s õmente co m os m ach a do s, prepara d e p ro nto e a gol p e
certeiro os a ch õ es e acha s, e a in da outro ou o mesmo, ma s à r oçadoir a (p cdoa),
l eva a eito e de firm e a r estante SQnda ia miud a e o q ue se pode apu r a r da
chamiça.
Simultaneamen te, o u n o fim, t od a a l en h a p r epa r ad a acarreta -se em carros
de muares e bo is p ar a os diferen t es sít io s d e «boa cai d a » ( baixas ) em q ue s e
h ã o-de erguer os re spectivos fornos. P ara ca da um di st ribue m- s e de 30 a
60 ce rre dee.
O s qu e :ficam com vin t e o u m enos, chamam-se-l h es bagageir os. Cada f or n o
empina-se p el o seguin te m o do : Prim eiro [e e- s e- lhe a «ca m a» col o ca n d o na base
os g ra n d es ma d eiros, cujos inter val os são preenchidos pelos peq uenos. D ep ois,
sobre a l enha gro ssa, o s e ch ões, 8 S acha s, e p or último a gandaia miuds, pre-
viame nte desbilrada, i st o é, corta da em pe d a cinhos, ali m esmo no a cto da enfcr-
n a cã o. C o m ele s s e preen ch e e rem a ta artistic amen te a superfície do forno-
fig u ra oblon go com um p equ eno vão n a base que «r es pira » p ela eb oee s e ecc e d e» .
C oncl u í d a a em p in a çã o, aterram-se ou tapam-s e os for nos em t ermos de s e
l h es largar lum e e ee rdeeem » por 15 a 20 dias, que t anto d emora o período da
ca r bonização, ch ama d a co zimenta. D u r ante esse tempo adop tam -se a s precisas
ca utelas e vigilância s, d e mane ira qu e, s e por acaso r eben ta o f orno, irrom -
pendo as ch a m as, se possa a ba fa r i mediat am ente com m a is teua, pa ra evitar
prej u íz os to ta is ou parcia is.
Ap ós a cozimen ta , extrai -se o carvão a p ouco e p ou co, sepa r ando -o d os
t Íç os para i r a r refecendo e se apro nta r a imedia t o tra n sporte em sacas ou a g ra nel.
'I'í eos, chamam-se aos p ed a ços d e lenh a ma l carboniza da q ue por Iss o te m
d e ser r ecozida .
P ara o car vã o s air b om é neces sário ficar b em cozido, o q ue se conh ece s e
de r toada d e si n eta quando cair um no outr o. E o superior, é o de canudo, de
a ch as me diana s, prefer i n d o- se o d e a zin ho ao de s ob r o. P o d en d o s er , as l en h a s
de ca da, são enf orn ad a s ê pa r t e.
Desde o largar d o lu m e até fin al, este f abrico con fia-s e a homens exper i-
m en t a d os - os Iorne i ros - sendo o de ma is con .6ança a rvorado em mestre. Cada
negoci ant e em prega doi s ou tr ês fo rnei ros, à iorn « de 450 a 600 reis se cos.

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ATRAvts D O S CAMPO S

E scu so de frisar O a spe cto d esses ho me ns ch ei os de pó escuro, ac u m ula do


d uran t e semanas, sem li mpezas de n en huma ordem. Excedem em r ep ulsão
q ualquer negro da Cafraria. Ma s t rabalham satisfeitos, comend o e d orm ind o
a d mi r àvel men te, como se estivessem m ui to limpinhos.

Rama É o folhedo da le nha. E n q u a n t o verde e tenra, aprovei ta-se p ara f o rra-


ge m dos gados bovino, caprino e la nígero, que, de propósito e em d eter-
minadas horas, se conduz e «chega. a comê-la pendente dos ramos, caídos no
próprio local do corte, DOS meses de dezembro 8 março . À fome obriga as rezes
a aceitar com avidez ess e parco sustento, q:uando passam « 8 meia tripa ». Mas
'reg eifam..no ou d esperdiçam-no se se abastecem com melhor coisa. S a l vo os
caprinos. que nunca a desdenham em absoluto. r-elas suas tendências roedouras.
Se como alimentação exclusiva. é insuficiente. como acessório e aperitivo
de ou t ras medianas e melhores. tem valor apreciável. Aquece o gado. a6rma-se
no campo.
Que para a s cabras. crê-se ser o complemento d e uma boa pastaria. Com erva
bastante e rama em Iartura, põem-se em condições de produzirem muito leite.
N os grandes cortes de ematose intensos. sobeja a maior parte da -ram a, A
sua enor me que nrídede nunca estê em relação com os Jtados do lav rador. e
nem com o de alguns vizinhos que, não a possuindo, aproveitam a alheia que
lhes facultam.
Precisamente o inverso do que se passa nos montados pequenos de pouco
«mato». Àí a rama é comida «por conduto» derr ibando-se a pouco e pouco..
com receio de que não chegue para as n eces sid ad es do inverno, agravadas pela
escassez de pastos.
A de sobro é melhor e m ais tenra que a do a zi n h a . Mais m acia, d izem os
gnnadefros. E entre a d e azin h a prefere-se a das azinheiras à dos chaparros,
que por ser áspera chama-se- lhe cer rosquen h e.

Encabeçam en to s ou lotação P a r a se aquilatar da sua i mpor tância . e tam-


bém para o disfr u to ou venda das novidades
em criação.. os montados a va li a m - s e p elo número de «cabeças» de porcos a dul-
tos que a bolota respectiva pode en ge r da r . Por isso, a tais avaliações, cham a m -
-se-lhe encabeçsmentos.
Por «cabeça» ou «cab eça inteira» considera-se o porco já criado, não in fe rior
a dois aDOS; o de ano a 18 meses passa por «m eia cabeça ».
Para a completa engorda da cabeça inteira julgava-se outrora bastante um
moio de bolota. Era insuficiente para o porco grande sair «feito~ - a tombar
ele gordo. Hoje está reconhecido serem necessários 90 alqueires.
A bolota calculada para a engorda de cada meia cabeça parece qu e devia
ser a metade da da cabeça inteira. Mas não é. Bem averiguado reconhece-se
que monta ap r ox im a dam en t e a dois terços, como também a scen d e a dois terços
o valor e p eso do bácoro de ano a 18 meses, com parad o com o do farroupo

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ATR AV t. S D OS CAMPOS

su peri or a dois anos, se o d esenvol vi m en to e corpulência d e a mb os estiver


em relação com a idad e.
Em ri gor, isto d e cabeças e m eias cabeça" não passa d e u nida d e convencio-
ná] , arbitrária, co m o fare i ver n o capít ulo re feren te a o gado s u íno.
A bolota a tribuíd a a cad a cabeça d e montado val e do ze mil re is a proxi m a -
d amente. N os a nos e SCa SSQ9 pod e el e va r - se até a catorze o u q uinze.
C omo obser vei n o capít ul o - H erd ades - ca da m onta do gra nde po d e faz er
em média 100 a 150 cab eç as ; o utros 80 a 100, os vu lga r es 50 a so, e os p equenos
d e 20 a so. M en os de vin te, n ão s e consi d eram montados de lote. U m montedieo,
a pen as. E, se o arvoredo peca po r ral o, dim inut o, m u ito di s perso, n em p or
m on ta dito passa . Chamam-se- Ihes á r vores arre d ias s em importân cia d e ma ior.
T odos os montados e árvores qu e se di stingu em em p ro d u ção ce r t a . media n a
ou a bundant e. classlfic e m -se d e castiços. O s d e natu re z a oposta, d e ventur eiros.

• • •
No ut ros t em pos havia h om en s «en te n d idos» , a f amad os, a q uem os l av rado-
res in cu m bi a m a avaliaçã o das bolet inhas.
Era q u ase sempre trab alh o g r a t u i to. mas ho nroso. O v u lgo q u e via os
avalia dores atravessando os montad os a. mirarem as azinhei ra s «co n t r a o sol»
para. lhe ve rem b em o fru t o. olhava - os com resp ei to com o hom ens de ti n o, d e
lume no o lh o e tacto na cabeça. E eles, ven do -se a lvo de r ep a r os Hscnge i eos,
s en tiam -se u fa n os a f a z er os en ca b eça m en t os. D epois davam conta da i n cu m -
bência. em t er mos claros o u a m bíg u os conforme ss con vicções q ue sentiam .
S e acer t a va m , cres ciam-lhe os crédit os; se erravam, h avia m pr et ex t os d e
sobejo p ara j u stifi ca r O en gano.
J osé Fra n cis co M ou ra, la vrad or no te r mo de Arronch es. foi o avali ador de
maior n omeada no seu t empo em todo o d istri to de Portal egre. E.ra um h om e n-
zar r ão. sobre-negro, de meter medo a um exército, com força p rod igios a , q ue
só se empa relh av a à s ua g ra n d e bonomia e gén i o ga lh of eiro. C o n t a-se que d e
uma vez tirara a pul so d e um po ço um novilho de 2 an os que para lá havi a ca i do.
P elos introítos d o S. M ig u el e depois er a curios o o uv i-lo e v ê- lo esca rra n -
chado em bojuda égua, de m onte em m ont e a i n for mar os com p a d res e ami gos.
T odos o escu tava m com particular a grado n ã o tant o pelos in f or m es que pres -
t ava como p elas f a céci a s qu e dizia. P or en tr e 09 pinches (co m pu t os] q ue botava
a este ou aq ue l e montad o, saia m - lhe àp e r t es pica res co s e historieta s das suas
ealervidades» em fo rça s. co m o el e próprio as elas siíiea ve. Um a legr iste o riginal,
faz endo gala em p assa r p or «bruto», se m o s er. O i nv erso d e mu it os . . •
A o p r es ente procedem às a valia çõ es os g ua r d a s d as h erdade s r espectivas. 0 5
porqu eir a s betíd os, n os t erren os. e até o l a vra d or.
A prá ti ca, como o estar- se m u i to v isto n os matos, a observação const a n te,
e, sobretu do, a comparação da novi da d e ex ist en te com outras ant eriores, ha bi-
lit a a cálculos melhores do qu e o do avali ado r d e ocasiã o que, emb ora , peri to,
erra com fa cili da de.

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ATR AV-tS DO S C A MP OS

Eis u m a nota d as fras es u s u a i s na a preci a çã o d o s mo n ta do s p or motivo d e


encabeçam en t os . D o co ncei to de cada urna, res salta evid en te me n te o caso a q u e
se aplica .
Nas n o vid ades escassas: - «azinheira s, sim . . . m as bolota. . . v iste-e . ..
Nada de s eit a . . . Um «ping o», n as melhores ... n ão, em todas .. . Mu itas, n em
raça . . . V á- se l á avaliar isto . . . S e lhe botarem t rinta, n ão faz quin ze . ..
Assim vê-se u m homem «at ólico»...
Nas m ed ia n a s : - ", E scapa ... pod ia esta r m elhor m as conso la . . . Está
às ccor das» . .. Numas par tes. n ada, noutra s m uit a Não é car,g8 gera l .. .
Meia n ovidade .. . Mas vamos tomaram m u itos ~)
N a s boas: - « Te m bast an te vê-se u ma à ou tra .. , E sàdia . .. segura . . .
Todas têm .. . Na lgu mas. é ã esga r ra . .. »
Na.!! abundantes : - «Coisa assead a. .. E s tá «revi rad in h o» . . . Em m uitas
aos cach os . . . a n ã o po d erem com ela . . . m ais do que foll~ as J• . . E' u m a «n o-
breeis». . . Um «esbs rran ro».. . es te e n c põe me rcol . . . Vê -s e de longe, às
pínhotss •. . Be m po dem vir po rcos . .. S e lhe fize ra m cem, mete m - lhe d uzentos . . .
Chega a tudo! . . . »

fRUiÇÃO

D o «5 . Mig u eb> aos «Santos» a b o lo ta q ue va i cai n d o é co m ida po r t od o o


gado in d ist intamen t e, sem est orv o d e n ing ué m. Mas o me lh o r q uin hão cabe a o s
suinos. E m vindo ou t u bro o s po rq u eir a s l argam-lhe brocha, e el es , os da t ro m b a ,
senti ndo - se à v ontade, ei-Ics à vàdia, a bald ão, em g r u pos e a sós, a correrem
como g a lgos p o r essas h erdades fo r a , dos d onos e das alh ei as. E' a malta .
C ada porco co m e p or o n d e qu er, estragando o q u e lhe apr és. 5e se enx otam
uns, aparecem o u tros e o u t ro s, cruzando -se por toda a par te, ao cheiro da
moleza (bo leta) . Os qu e. à n oite r ecolhem à malh ada, f azem-no por instinto,
livremente. M as a mai oria 6.ca «a mont e», o n d e lhe anoite ce, exactamente como
os a nimais bra vios I
I B a sta n t e primitivo es t e cos tu me de m alta, co m o s seus ressaibos de s ocia-
lismo. qu e muito s lav radores reprovam , ma s q ue out ro s aplaudem.
Tem ac ab ado n alg un s con celhos, m as noutr os, como O de A rro n ch es,
mant ém- se inalterável. E' estilo, diz-se.
G e ra l m e n t e fa l an do, rodos os porcos lu cram co m a ma lta, que os m elhora
a valer , s em d espesas sensíveis. M a s em troco ext raviam-se alg uns, cu j o falta só
se reconhece qu and o se acaz-eem no final d a ép o ca. Os lav radores que p or es te
motivo pe rde m um o u outro, pagam assim as cus tas dos seus e as d os vizinh o s
feli z es, q ue n enhum se lhes sumi u. Vai a quem toca. E' o caso do Deus disse :
«q u em ge nhasse q u e se r i ss e».
* * *
P or diferentes sistemas se us u frui a boleia .
P rimeir o : - na engorda dos porcos - v aras. E ' o mars comum, principal-

- 49-
AT RA v t S DOS CAMPO S

mente nos arvoredos d e ímportância . S egundo : - co m O gado suino «de vida:.


- corridas. A do pta-se n os montados peq ue nos. de á rvores arred ias. T erceiro :
- apanha-se p ara venda ou consumo do p rôp r'io lavrador. Apanha-se geral-
mente em todos os montados, m a s s6 em parcelas p equenas, re lativamente.
Quarto : - vendendo-se a novidade pendente em globo, no todo ou em parte,
por a jus te particular, ou em hasta pública, aos lavrad or es d a província e aos
eapen h o'is, em resultado de anúncios nos jo r n ais e na s p ortas da s i gr eja s. N a.
f eira d e S . Miguel, em Sousel, cos t u m a h a ver bastan tes an únci os de s te gé nero,
anxa do s n o exterior d a s igrej a s p ró x imas d o r ecinto da feir a . As t ransacções
desta nat ur eza usam-se p ri nc ip a l m en te com os montados d a s cout adas d os
municípios e dos d a C a sa de Bra gança. Dos d e particular es, só se ve nde m
alg uns de lavradores pequenos o u med ia nos, que não q uerem ou n ã o po de m ter
porcos. Ai n da há outro p rocesso d e aprov eitamen to, consequência f orçosa d e ci r-
cunst âncias ex tr a or di n á ri as em a nos anor ma is , escassos de ervas e p as tos. Ren-
ro-m e aos m on tados que se lhes disfr uta a n ovidade com g a do de q u a lq u er
esp écie, ou d e algumas si m u l tan ea m en te, para os m el hor a r com ra pidez. ou
salvar de uma cris e de forrag en s que lhes compro m eta a existência. E' por
conseguinte u m fa cto excepcional que não con sti tui uso. D a d a s es tas noçõ es,
entrarei DOS porm en or es ind ispensáveis ao exacto conhecimento dos costu mes
v ulgar es. D os mais com uns, qu e do s restantes basta o que n cou dito.
Primeiro: - Engorda de pOTCOS em r ebanhos de maior ou meno r n ú m ero
com O nome d e varas.
No primeiro de N ovem bro, começa a g uar d ar ia da bolo ta , que annal s ó se
executa a rigor uns três dias de pois. E.ntretanto há que fechar os olhos a uma
ou outra cab eça tresveírede - pe rd id a - que ainda. se nã o SArilh ou ao rebanho,
em regresso d a ms.lts. . C on s egu ida enfim a evacuaçã o, dispõem-se as coisa s d e
m odo que as «fo lhas» fracas em bolota, d estinam- se ao piso, e as melhores
ncam de solo, g u ard a n d o-se a rigor m áximo.
Às do piso pas sam 1080 a ser corridas pelos porcos, motivo porq ue se l h es
dá aquela c1a ssHicaçiío. r: a traita h abitual.
À s do solo dei xam-se d e rese r va até acabar a comida das ou t r as. D epois
largam- se-lhes tam b ém . mas em termos de aprov eitamento r el ativo, s om en te às
h oras do almoç o e cei a para comerem «à farta •.
N o final da época, ou antes, se s e reconhece q ue a bolota sobeja da vs.r a,
ou se mesmo n ão s obej a n do, é i n dispensável alguma para ou t ra s aplicações,
apanha-se a q u e excede ou a que se precisa. T oda a r estant e q ue os porco s
est r sç oem ou que r egeit am por muito amarg a, miude, ou podre, consti t ui a
migalh a. que se aproveita com suínos «d e vída., os quais, a í d os meados da
época em d iante. entram também n o em a t o.. atrás da vara, mas «cor r en d o.
SOmente a t erra d e que j á fo g e o gado go r do.
.. .. ..
Os por cos da vara saem «feitos. (gordos) d e quinze d e ja n eir o em diante,

50 -
ATRAvt s DOS CAMPOS

até dez ou vinte de fevereíro 1 Se demoram mais, entraram tarde, ou lhe encur-
taram a comida em principio.
Quando a bolota a caba antes do m eado de janeiro, o g a d o sai ordinària-
mente «por fazer », em nutrição incompleta. Ou a comida foi menos do que s e
calculava, ou o s porcos ex cede ra m a o en ca beça me n to.
Segund o u so: - Aproveitamento com «s ad o de vida », corridas e porcas
de criação.
N estas circ un s tâ ncias n ã o s e des tina piso ne m solu.
O s rebanhos correm o «m a to» em v oltas con stan t es. a tr á s ou a d iant e d os
porque iros, que d e va rejã o ou m anganilha em punho ba te m o arv oredo, q ua n do
a boleia l h es es casae ie. N ece ssida d es ba s tante elás t icas por v ia de reg ca, m as
sem pre de valor e im port â n cia mui tf sa irno m enor q ue a s d o da «ve re».
Aos bécoros d â- se-Ihes a m ante rem -se r eg ul a r m ente, p ara crescerem e
m edra r em. C om os Jarroupos e porca s n ã o há somb ras d e gene r osid a de . C omem
«por tempero», «a co nso lar». O ba stante para s e irem «sustendo» em te r m os de
pa ssa di o sofrível. Tant o , que em a bolo ta ca indo m u ita d e r ep en t e. ao efeito d e
v entani as e chuvad a s, enc urtam-se as vo ltas, rest ringi n do-as q u an to p o ss ível.
Mais podia acrescentar s obre a cria ção e engor da d o s porcos n o s «matos».
M a s iss o cabe melho r na pa rte q ue t en ciono d ed i ca r a o s g ados. Aí relatarei
pois esses de talhes com o d es envolvi me n to q ue m erecem . O s qu e d eixo referi-
d os, sai r a m por a s s ocia çã o de ideias e f actos q ue não p odi a esqu ec er a g ora .
R esta o a pa n ho.
A l ém d a bolota existe nte nas parcelas do solo. evita das dos porcos,
recolhe-se mais a seg uinte : a d a s ribanceiras dos r ibeiros, para não se r a rras -
tada pe las cheias j a das est radas, s ubt raindo-a à cubiça dos tra nseuntes, e por
último a das semeadas (searas), se o d on o não manda «comê-la» com os porcos,
pelas manhãs de geadas intensas em que a terra está d u r a, inacessível à f ossa .
P or t ant o em condições de se n ã o est ragar a sementeir a com a passagem dos s ui n o s.
O apan ho efectua -se com mulh eres, de dezemb ro a fev ere iro, a o jornal d e
140 reis (secos), o u de emprei tada a 15 o u 20 r ei s o a lqu eir e. P or emprei t ada s6
s e t om a no arvoredo basto d e boas solad as .
P or u m o u o utr o aj uste. f or mam- s e r an ch o s na s al d ei a s, que saem pa r a os
m on te s durant e sema nas e q uinz en a s. O mulh erio m a r cha s e ri ef eitc, p r inci-
palmen t e as solteiras. B em s abem que o se rviço l h es prop o r ci on a rá ser ões
estú rd ias e baila r ico! a legr es com os ra pa z es qu e nam oram . F dizes criaturas
que ap ôs um dia de t raba lho, m uitas vezes de ch u va e fr ic .in te n s ísai mo, ain da
s en te m pacho rra , pa ra se entrete r em co m fo lias 1. ....... . . ....... •. ... . . .. . ...

À maneira que a bo lo ta s e ap a nh e e n t ra p ara cestos, que s e despejam n os


sacos, os q u a is seg uem em ce eros d e muares p a r a os celeiros do monte de ond e
se vai consumindo o u vendendo. Para a venda sobeja m os comprador es , d esde
que o preço n ã o seja exager~ do.
Antigamente algun s produtores im portant es p oss u iam casa s - secsdeiros -

- 51 -
ATRAvtS DOS C A H P O S

para secarem a b olo ta ao calor de lumes brandos. Avela va m-na, e por conse-
guin t e pre paravam-n a em condições de conser vação dem or a da. V iam niss o
m elhor sist ema de ap r ovei ta m en t o pelo an o fora.
Hoje está banida a usa nça, por ser desnecessária, atenta O aumento do
consumo.
CO NTING ~NCIAS PREJUDICIAIS

Como todas as coisas, os montados e suas r espectivas novidades, estão


s ujeitos a p r ej uí z os grandes, alé m dos referidos. Os m ais sensíveis, são os r ou-
bos dos boleteiros, as invas ões dos po mbos bravos, e a doença ch a m a d a burgo.

8ol eteiro s Assim se classificam os homens que, no temp o próprio, t omam por
indústria os assaltos aos montados para furt os importantes d e
b ol ot a que depois vendem como sua. P or enquanto só lhes dedico a referência .
No capítulo Mal/eitores terão as h onras dos pormenores.

Pombos C a u sa m perdas extraordinárias. Ànos vêm, em que de d ezemb ro em


diante ar ribam a os bandos sobre os montados cu ja bolota d evor a m
audaciosamente em q uantidades incríveis.
S ó s e pode avaliar sabendo-se que um pomb o ingere em m édia seis a oito
bolot as. Calcule-s e por aqu i quantas com erão milhares deles. O que vale é q u e
semelhantes arribações são p ou co fr equentes e nunca demoradas. Quando os
pombos se mostram assim. mudam de p oiso a toda a hora, t omando r um os
di versos em voos altíssimos de caprichosas e volu ções. As dormidas no mesmo
sítio pouco s e rep etem.
Nos :fins do an o de 1870 e p ri ncipias de 1871, o concelho de Elvas e limí-
trofes foram acome tidos por uma t a l invasã o de pombos bravos qu e os nascidos
não s e lem bravam de outra igua l ou s em elha n t e, s equ er. Nuvens deles cai a m
como avalan ches sobre as azinhe iras e solos, levantando em algumas h oras
dezenas de moias d e b ol ot a I
Por t oda a pa r te se viam nu vens d e pombos n os montados e fora d eles,
como praga se melha n t e às d o E gito. O s lavradores traziam criados a esp a n -
tá -los com tiros e foguetes. Por seu t urno os ca ça d or es não cessa va m de atirar
também. ob t en do re sultados espantosos ainda hoje mem orá vei s.
Foi u m a contecimento sensacional qu e aterrou o s lavradores. F eliz ment e
nunca mais se viu outro semelhante. A gen te do po vo, q ue t udo q ue r explic a r ,
a tribuia o caso à g ue rra franco-prussiana. cL á pelo t eatro da gu erra os pombos
sentiram-se tã o apavorados com o t irot eio do s be lige r a ntes qu e em massa
debanda ram para cá ». N ã o podia ser outra coi sa, dizia o po vo .

o burgo D e há mu ito qu e os m on tados de azinho (nã o o s d e sobro) de certas


regi õe s e limitadas zonas, sofrem uma d oe nça deva stadora, motivada
por u m pequ eno i nsecto a que vulgarmente se ch a m a burgo. O bichinho, esse

- 52 -
ATRAvtS DOS CA~IPOS

des en volve-s e n a s árvo res. durante a primavera, p o r entre O eolho» o u gomo


do folhedo tenro, e de a í, passando por diferentes metamorfoses, g en eraliza-se
pelo a evo redo todo, es tra gando-lhe o fr u to embr io n á rio - a bol ota - e a s pró -
prias folhas. E. p ro ssegu e na sua m arch a d est r ui d ora, a té ao verão, em que
mone, deixando JU azinheiras se m i-nuas e enegrecidas. A tal p onto estraga da s
que a p rod ução re du z- s e a m enos da dé cim a parte da média ordinár ia senão a
zero, po r dois ou tr ês anos cons ecu ti vo s.
O burA o q ue se manifesta nu m a dada zona a umenta p r ogr es ei va m ente nos
p rimeiros anos, at ingindo p r op or ções fa bulosa s nu n s, r eduzin do -se nout.ros, a té
qu e 80 ca bo d e 8, 10 ou 1 2 anos declina manisfestamente, a ca ba n do por se
ex ting uir d e todo, sem se saber por quê. Ol'L evan ta», diz -se.
O s montados no ve dios de terras vermelhas, são os m ais a ta ca d os, e me nos
os das are n osa s.
S upomos qu e s e desco nhecem a s causas primordiais que determi n am o
burgo, e não n os consta q ue haja an tíd oto eficaz p ara o combater e de str uir.
Qua n do entre a população r u ral se com enta o caso e se p rocura conhecer
a sua orige m. após mil conject u ras fan tasiosas conclui-se a ssim:
- «O ra, que sabemos n 6s : é calibre do ano ... I» E fica -se nisso, concor-
dando todos. E u tam bém conco r d o. à falta d e me lhor razão ...
De positivo, s ô se sabe q ue , tendo algu n s agr ônom os visto os montados
invadidos, nada consta lhes fiz essem de proveitoso, ou que p elo menos e conse-
Ihe ssem os la vradores a qualquer providência d e g eito .
O q ue, a m eu ver, n inguém considera desdo uro para os ilustres profissio-
nais. Em a ssuntos d e ta l ord em, s em dúvida complexos, quaisquer t entativas
para tratamen to prático, ex equ ível e va ntajoso, sob o po nto de vista eco nómico,
h ão-de es barrar em dificuldades e emb ara ços invencíveis, q ue esterilizam os
me lhores d esejos.
Nota curio sa -An tigam ent e, ha vi a lav ra dor es q ue pedia m e consegui am
dos pá rocos ire m be nzer· lhes e exorcizar os montados para os pr es ervar em
do burgo.
«E r a uma fé» - expl ica vam eles a quem mofava da esconjur a ção f•• • Gent e
ingénua, se mpre propensa ao sobrenatura l e ma rav ilhoso ...
......... ... ... . .... ......... .. . .......... . ........... ... ...... .... ...... ....
Outras doe n ças d e so m enos impo rtânci a a com etem as a zin h eira s e sob re i-
ros, sobret udo estes .
De r esto em todos os m on ta dos, e nuns m ais q ue outros, m orrem a n u a l-
me nt e algumas á rvores - facto normal a que se n ã o li ga im por tância.

LONGEVIDADE

E' bastente longa a vi d a d as a zinheiras e sobr eiros. C on s equ en temen te, a


sua criação e desenvolvimen to é a ss âs de morada.

- 53-
ATRAv t S DOS C AMP OS

No quase es tacionamen to da i da de adult a permanecem dezen as e dezenas


de anos, e mais longo ainda é o período da decadência qce decorre len tamente
através de séculos. A azinheira sobr et u do. é de uma lon gevidade incalc ulável,
se causas fortuita s 'o u estra nhas lhe não cortam a existência . Velha, mutilada,
cauomida e se mi-n u a - um gig a n t e reduzido a pigmeu. corcunda e manco-
exibe a sua decrepitude g ro t es ca , a n t e o desfilar d e mu itas ge rações. Por ú .lri mo,
já sem préstimo. com as raizes podres e o esquel et o escalavra do, cai enfim a go-
n iza n t e, a o i m pu lso de um vendaval de inve rno ou ao golpe :rijo do ma cha do
v ulgar. Desse mesmo instrumento que tanta s vezes a limpou durante séculos,
que lhe robuste ceu a vida n as época s d e p rosperi da d e, mas que depois a foi
reduzindo, at'é p or último lhe abater o tron co e a sua valetudinária existência .
• D e 400 anos talvez, e qu em sabe se de m uitos ma ÍlJ .. .
IV

D I V E R S O e nu m er os o é o pe ssoa l que s e em p r ega em cada lavoura.


a u m en tando ou di m i n ui n d o con forme a s ne ces si da des do Srangeio. o
estado d o t em p o e a existência. de br aços. À qu ase totalida d e d ess a
ge nte acom oda-se p or a n o, te mpo rada, m ês ou dias, segundo o tra-
balho a que s e d est ina e o utra s cir cunstâncias conseque ntes d e u sai l ocais e
vontade dos co ntra t a n tes. Por excepção e p a t a det erminados serviços d e na tu-
reza muito esp ecial, us a-se ta m b ém o a just e p or empreitadas.
O pessoal contratado p or a no, m ês o u dia s. sai quase t od o das vila s e ald ei a s
próximas, onde te m os s eus d om i cílios . O das em preitada s é. pela m aior parte,
gent e estranha à região.
Aos cria do s de ano. ch a m a m - se-l h es anuais i 8 0 S de tempor ada , t emperei-
TOS ; aos de m eses, mensais, e aos de dias, jo r na leir os, t raba lha dores, ou
homens a dias.
Ma s estas nomenclaturas sã o muito genéri cas e comuns a diferentes classes
e entidades. P or isso, para s e des trinçar bem ca da mis ter adoptam-se n omes
qualificativos, es pe ciai s e especialíssimos correspondentes à ca t ego r ia e o cupaç ão
de cada individuo.
Aos vencimen to s d os enusds, t em por eir os e m ensais chama-se-lhes s old ad a ;
ao dos jornaleiros - iorns, jornal ou sal ário.
Salvo ex cepções raríssimas, todos os criados se alimentam por conta da
lavoura, que r s eja p on d o -s e- l h e a mesa conform e o costume d o sítio, qu er pelo
sistema de comedorias ou m antimentos d o es t il o, aviados no fim d e cada s em a n a,
quinzena ou m ês. D o s p ouco s qu e por a ca so nã o vencem comida, diz- se que
trabalham ca s eco» , Os esclarecimentos rela tivos à alimentaç ão, dão matéria
paTa um parágraf o próprio d e q ue op or t u n a m en t e tratarei.
R eflectindo um p ouco, vê-se q ue to da a criadagem se divide em quatr o

- 55 -
ATR A VeS DOS CAMPOS

agrupamentos, que de m odo algum sig nincam classes nem categori as mas
núcleos distintos p ela natureza d os s er vi ços que d esempenham.
O p r imei r o agrup a m ento comp r eende to d a a família empregada no ama-
n ho das terras, ac a r re tas. eiras, desm o ita s e ou t ros trabalhos, com exclusão das
ceifas e gadanha s. Engloba p ortanto a ABn itaTia, os cerreiros ou almocreves e
a carraça.
Por Aan b aTÍB ou malta, entende- se o troço de ho m ens - Aa.nb.ões - em
número indeterminado, qu e em todo o a no se o cu pa p rin cipalmen te n os se rvi-
ços cultu ra is e cor r ela tivas, à exce pção das ceifa s. T opa a tudo p or assi m dizer,
não obstante ter a s eu exclusivo en ca rg o, a s fainas j á aludida s. O chefe da
8an b aria é o abegão, qu e te m p or imediato s u bs tit uto, o s ota .
O s carreiras tra balham com as par el h a s de m uares, nos labores do carro e
arad o. A o enca r r ega do , ch ama- se maioral d as m u las, e ao imediato. aju d a. Os
restant es são caueiros rasos.
R esta a carraça. qu e é a penas um desdo b ra mento da ganh aria, m ais ou
men os te m porár io . Organiza-se com a ge nte m enos válid a - r apazes e velhos
q ue se aprovei ta m , em s eparado, para a fazer es de po uca m onta a q ue a ma lts
não pod e atender. Tem po r governante o sota ou qualqu er de co nfiança e
p rést i m o.
A constituir o segundo a grupamento estã o aqueles qu e n ã o intervêm DOS
t ra balhos a grícolas m a s em outros diversos e i mp or ta n tíssimos, como o gu a rda
d e herdades, carpinteiros, cozi n hei ro. amassador, et c.• etc.
No terceiro, figura o pess oal transitório, ou melhor diz en d o a qu el e q u e só
desem penha misteres especiais, de ocasião. res tringidos a determin a d as épocas.
D os Aanadeiros (homens ocupados exclusiva m ent e na pastoreação d os
gados manadíos) forma-se o quarto g rupo, que s e por ve ntu ra é menos n um e-
r os o, ne m po r iss o di mi n u i d e importância quanto à escolha e respo nsabilidade
dos 'lu e o r epresentam .
R esumindo: um a lavoura b em m onta da, com plet a e composta de «t udo
qu e lhe é dado» ocup a o seguinte gen tio:

CRIADAGEM PERMANENTE

Um gu a r d a de he r d a d es. um o u d ois ca r pin te i ros, um a begã c , um so ta , d ois


boie ir os, um cozinhei ro, u m amassador, qu atro a s eis carr eiras, dez a q uinze
ganhões, um ho rtelão. u m tratador de cav alos, e um paqu ete. Ganadeiros -
Pastores : um maioral d e ovelhas e diferentes entregues, um para cada r ebanh o,
com o seu respe ctivo ajuda . P orqu eira s : um m aioral de porcas e dois ou m ais
entregues e correspondentes aju das. D ois vaqu eiros ; um eg ue r i çc e um cabr ei r o.
O guarda, o abe gâc, s ota, maiora l d a s m ulas, b oieiros e ganadei ros -maiorais,
são se mp r e anuais, de pensão. E a to dos es tes, exceptuando o gua rd a, dé -se-Ihes
o título de governos ou cabeças. Nas res tan tes oc upações (quadro permanen te)
encont ra m -s e anuais, temporeiros, m en sa is e a dias. Vej am os a g or a os do

- 56 -
A T RAv t s D O S C AMP OS

PESSOAL TRANSITÓRIO

Dois ccrta-ramae r um rancho d e 20 a 40 m onda d eira s ; u m a ca m arad a de


ceifeiros-ratinhos (30 a 40) co m os seus resp ect ivos en ri lh eir edo res e tardão ;
uma camarada de 1 2 a 20 tosqui adores d e gado laníge r o ; u m gr upo de 2 a 6
gadanheíros de f eno ; um o u dois roupeiros ; um lan çarote ; d ois cc r dceircs , u m
melancieir a ou meloeiro ; um gua r da da ei ra; u m se m ea do r; um embel gador :
dois valadeiros ; um r anch o d e m u lhe re s n o a panho d a az eitona e da bo lota j
Um. assoutueiro " d oi s ele voeir os , um perunzeiro, etc.
Deste modo fica enu merado o p es soal p erm ane n t e, transit ório e acident al
de uma lavoura i m po rtante. S i mples en u m era çã o p orque o mais que lhe r espeita
vai largam ente cc n sígne do nas «Particu laridad es de cada ocupação»>.
As lavoura s pe quen a s ocupam m enos g ente, como é basta n t e m a io r nas
excepcionalm en te gr an d es, que susten ta dois abegões, t rês g ua r da s, etc. Desde o
pequeno lavrador - o cb arepe - de dua s ou três j untinhas e meia dúzia de
rezes, até a o agricul tor op ul ento de SO a 60 arados e m uitos e num erosos reba-
nhos de tod as as espécies - há marge m p ara h i pótese s tão variadas e d i ve rsas,
que para o cas o p rese n t e a proveito a qu e m elhor r epresenta a cultura ex te n si va .
O maior n ú m er o de la voura s o cupa se m dú vid a menos família q u e o refe-
rido, mas como n as de entre essa m a io ria não há, pelo m en os, u m a que execute
todas as prática s e sistem as da s gr an de s «ca s as» são es ta s que me servem de
ponto de referência, porqu e, re pito, é só nelas que se en contr am todas as nume-
tosas en ti da des q u e co ns tit u em em a bso lu t o o pessoal a grícolo-pecuário de um
quadro compl eto. A s outras m eno res, embora importantes, cada qual restrin-
Ae·se a determinada s es pecialidades, o que lhe reduz bastante o número de
ocupações.

SOLDADAS E SALÁRIOS

H á sol dadas de dua s cla s ses : uma e rrtigu, tradicional, exclusiva do s criados
de an o, de pensão. C ompreende verba em reis e vár ios acn eAas o u avenças de
cobiçado apreço com se ara s, pão na eíra , l en ha, p egu lhe is, etc. O q ue tud o s e
designa também por adições, propinas, squidedes, forra s, etc.
A outra usa n ça, de solda da a dinh eiro s omente, restring e- s e a uma quantia
fixa em reis , e está m ais em voga pa ra com os t emporeiros men sais. e alguns
àe ano sem pensão de v ulto.
O s vencimentos em r eis, a inda se baseiam numas tantas m o edas de ouro
(valor antigo de 4$800), u nid a de s de h á muito abolidas mas q u e parece eterni-
zarem·se pr õ-Ier ma nos aj us t es d o s criados de lavoura. Principalmente nos «d e
ano•. Nos de tempora da e m ese s já s e convenciona por mü reis. E. n os d e entre
uns e outros, também sucede falar-se em libras, costume que deverá p erder-se
brevemente porque n u nca chego u a arr eigar-se, nesta ordem de contratos.
A s soldadas com searas e ad ições várias, sã o as preferidas pelos s erviçais,

- 57 -
A T RAv t s D O S C AMP OS

PESSOAL TRANSITÓRIO

Dois ccrta-ramae r um rancho d e 20 a 40 m onda d eira s ; u m a ca m arad a de


ceifeiros-ratinhos (30 a 40) co m os seus resp ect ivos en ri lh eir edo res e tardão ;
uma camarada de 1 2 a 20 tosqui adores d e gado laníge r o ; u m gr upo de 2 a 6
gadanheíros de f eno ; um o u dois roupeiros ; um lan çarote ; d ois cc r dceircs , u m
melancieir a ou meloeiro ; um gua r da da ei ra; u m se m ea do r; um embel gador :
dois valadeiros ; um r anch o d e m u lhe re s n o a panho d a az eitona e da bo lota j
Um. assoutueiro " d oi s ele voeir os , um perunzeiro, etc.
Deste modo fica enu merado o p es soal p erm ane n t e, transit ório e acident al
de uma lavoura i m po rtante. S i mples en u m era çã o p orque o mais que lhe r espeita
vai largam ente cc n sígne do nas «Particu laridad es de cada ocupação»>.
As lavoura s pe quen a s ocupam m enos g ente, como é basta n t e m a io r nas
excepcionalm en te gr an d es, que susten ta dois abegões, t rês g ua r da s, etc. Desde o
pequeno lavrador - o cb arepe - de dua s ou três j untinhas e meia dúzia de
rezes, até a o agricul tor op ul ento de SO a 60 arados e m uitos e num erosos reba-
nhos de tod as as espécies - há marge m p ara h i pótese s tão variadas e d i ve rsas,
que para o cas o p rese n t e a proveito a qu e m elhor r epresenta a cultura ex te n si va .
O maior n ú m er o de la voura s o cupa se m dú vid a menos família q u e o refe-
rido, mas como n as de entre essa m a io ria não há, pelo m en os, u m a que execute
todas as prática s e sistem as da s gr an de s «ca s as» são es ta s que me servem de
ponto de referência, porqu e, re pito, é só nelas que se en contr am todas as nume-
tosas en ti da des q u e co ns tit u em em a bso lu t o o pessoal a grícolo-pecuário de um
quadro compl eto. A s outras m eno res, embora importantes, cada qual restrin-
Ae·se a determinada s es pecialidades, o que lhe reduz bastante o número de
ocupações.

SOLDADAS E SALÁRIOS

H á sol dadas de dua s cla s ses : uma e rrtigu, tradicional, exclusiva do s criados
de an o, de pensão. C ompreende verba em reis e vár ios acn eAas o u avenças de
cobiçado apreço com se ara s, pão na eíra , l en ha, p egu lhe is, etc. O q ue tud o s e
designa também por adições, propinas, squidedes, forra s, etc.
A outra usa n ça, de solda da a dinh eiro s omente, restring e- s e a uma quantia
fixa em reis , e está m ais em voga pa ra com os t emporeiros men sais. e alguns
àe ano sem pensão de v ulto.
O s vencimentos em r eis, a inda se baseiam numas tantas m o edas de ouro
(valor antigo de 4$800), u nid a de s de h á muito abolidas mas q u e parece eterni-
zarem·se pr õ-Ier ma nos aj us t es d o s criados de lavoura. Principalmente nos «d e
ano•. Nos de tempora da e m ese s já s e convenciona por mü reis. E. n os d e entre
uns e outros, também sucede falar-se em libras, costume que deverá p erder-se
brevemente porque n u nca chego u a arr eigar-se, nesta ordem de contratos.
A s soldadas com searas e ad ições várias, sã o as preferidas pelos s erviçais,

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ATR AvtS DOS CAMPOS

embota suj eita s a contingências. M as no joso se conhece a so rte, dizem eles. E


portan to joAsm, a rriscando-se às eve ntua lidade s. Se num ano pe rd erem, outro
virá melhor qu e os i ndemnize em ch eio. D epo is - e a qu i é que es tá o bu silis-
nos an os t or t os, em que i ulgam sa i r -se mal por as s eara s mos tra rem m au
aspecto, t r ata m a te mp o d e m elhorar a sua situa çã o, p elo m enos al guns. A í
por m a rço ou abri l, aq u eles a q u em o ca so s e anáuta sério e qu e n ã o têm co n-
sid er ações a s u a r d a r , a balam a pretexto de qualquer coisa, ou s e co nfia m na
benevolên cia do amo fazem - lh e chor a dei r a p edindo lhes ga r a nta a s eara em
cert a qu an ti dad e, um p ouco infe rior à p rodução mediana. O a m o anui, se estima
o crí a do, e tudo se con cilia, tanto melhor que se a colheita exced e ao con ven -
cionado e ga rantido, o excesso revert e para o serviçal.
V a ria m a s eoldadas an uais e especialmente as dos governos. O s que a s
arrancam m a ior es, g an h am d e seis a doze moedas, s ea ra d e t rigo ou de centeio
de seis a dez a lqueires de semeadura e de dois a qu atro de legume s. E m ais 40
a 90 a lq ueir es de «pã o n a eira», lenha, forra de égu a , etc. C enteio n a eira ou
em searas, em lugar d e trigo, só se usa na freguesia de Sa n ta E u lá lia. ond e se
n ão con ced em searas de legumes. mas s i m de mela nciais, cultura vulgar íssima
n o sí tio.
A s de cereais sem eiam-s e com semente fo rn ecid a pelo lavrad o r. que a r eceb e
n a fu tura co lh eita . Cultivam-se como 8S d o amo e à custa d este n a t orna do
cost um e da respecti va lolha. rea lizando-se a s em en t eir a e ceifa n o meado das
correspondentes épocas. À malha ou debul ha efectua- s e n o fina l d o período das
eiras. A m onda co rr e por conta do interess ad o, levada a efe ito p or mulher es de
sua família . ou outra s a q u em pag a.
P ara as se a r as d e l egum es n ã o há tornas especiais. ne m o la v rad or contrai
o u tros comprom is sos além d e a s lavra r , se me a r e reco lher , qua ndo e como lh e
a pra z . O cost ume das sear as d e trigo ou d e centeio está quase r es trin gido aos
abegões. T em inconvenien tes para o lavrador mas t amb ém l h e a ss egura van t a-
gens. Dos abegões que as ganham há a espe r ar m aior zelo e estabilidade do
que s e a s n ã o vencessem .
À sesrinh « é O elo que liga o serviçal ao amo. E este concedendo-lha em
soldada associe-o às suas prosperidades e desventuras.
P or outro lado. crê-se com fundamento que u ma seara de qualqu er criado
junta n a eira. em r iiheíro, arrumada à do lavra dor (como se usa) to rna-se um
bom seguro contra incêndios. Em primeiro lugar há da parte do possuidor, e
por inter esse próprio, maiores cautelas; em segundo a malvadez dos incendiá-
rios hesi ta e d esist e dos p ropósitos infames contra o lavrador quando sabe que.
lançando-lhe fogo à seara, vai igualmente desrr ulr a do criado. que não odeia.
r. então. para «não l azer m al a um pobre deixa de se vinAa r no rico». S e deixa
p or que nem sem pre lhes vêem os es crú p ulos .
Das outras acheAas, as que pe rsistem m ais. são O pão na eira, a lenha. etc.
À s r estantes, como fo r r a s de éguas. vac as, ctc., limitam-se a deter minadas
lavouras antigas, onde s e conser va m po r respeito d e tradição .

- 58 -
ATRAVI!. S DO S CAMPOS

E m resu m o, qu anto m aior valo r representam as squidedes menor é a v erba


em dinheiro. E m cada emprego predomina determinada í orrs, como fris arei
em sua altura .
Outra advertência : a s usanças a ludidas não contendem com os AansdeÍros,
cujas soldadas e costum es divergem sensivelmente.
P or est a e o u t ras 1'8ZÕeS omito por agora os vencimentos e cos t u m es de ta is
criaturas. A diversidade da sua profissão dá-lhes d irei t o a u m ar t18 0 próprio d e
que oportu namente t rat a rei.

Época do ajuste O s cri ados d e ano, en tram e enci ma m p elo «5 . M a t eus»


(~1 d e setem bro ), fi m e p rincípio do a no agríco la no concelho
de E.lvas e parte do de A rronches . N ad e Campo Maior é a 15 d e a gosto e
noutros pelo . 5. M i guel•.
Como quer qu e s eja, àqueles de q u e s e pretende a continuaçã o, o am o
fala-lh es, pe rg untando- l hes se ficam ou não. O consu l ta do, se d es eja ficar,
respon de : - . S e é da sua vo n tade, :6.co» . E não quer endo, diz : - «Não senhor;
c.omigo não faça conta»,
Pelo que o l avr ador t rata de a comoda r a tempo outro que o substitua .
No caso de o cria do pedir a um ento de soldada ou o amo redução, a mbos se
ent endem oportunamente e decidem qualquer coise. A rebaixa de soldada,
toma- a o criado como sintoma de descontentamento ou enfado do l avrador e
nessa convi cção n ã o a a ceita, d esp edind o-se. Que o s há que se resigna m e vão
ficando. Mas são os menos. Só os z or ras ma t reiros.
No termo de Elvas é da praxe os lavradores «fa l a re m» ou ap alavrarem os
criados pe la s vésperas e feira de Barbacena (8 d e setem bro). S e a t é então nad a
lhes diz, su b en t en d e- s e que o s não quer. E. por conseguinte, os «esque cidos»
procur a m no vo am o .
A p ra xe est a já nã o é u sada por todos os lavradores. Alguns adoptaram o
sistema de não . fa la r em» aos q u e os v êm s ervi n do. Mas para que saibam o
costume, previnem-nos por uma vez d e que os despedirão a tempo quando lhes
não con ven ham .
A os cria do s an tigos, que, p or seus m erecimento s ou particular afeição, se
COnserva m n um a lavoura 20 e 30 anos, a dqu irin do foros de vitalícios, o lavrador
não lhes «fala», tão certo está da s ua permanência e dedicação. Eles nem por
sombras se con si de ra m despedidos ou desfeiteados, antes tomam o silêncio como
testemun ho de confia n ça e amizade.
Q uase se cons id er a m pessoas de família com o direito e dever de a servi-
rem até à mor te. Existem al guns d e perman ência t ão a n t ig a q u e, por assim
di zer, viram nascer 'o s am o s, tend o-lh e s ervi d o os p ais e avós I Curiosa cena.
obser var um desses ve lho t es q u a n do os patrões s e zanga m com eles. Entre
outro. arrazoad os, sai-lh es o s eg u inte :
- «Olbe lá meu amo: quando vocemecê n asceu já eu cá estava . .. Tem de
me 8guentar, inda que não queira.•

- 59 -
A T R A v t s DOS C AMPOS

Ou pOI outr a : - cOra d eixe-se d e coisas . . . quem m e comeu a carne há-de


roer -m e os ossos / ... » E. o amo, o uve, cala - se e r i pa ta consigo . ..
Vão r a t ea n do essa s boa s criat u r a s, m o delos de probid ad e e abnegação.
credores de respe itosa estima e a m p ar o. V ã o de saparecendo e infeli zm en te,
q uase ninguém os s u bstitu i. O s n ovos a cu sam uma tal i nstabilida de e indife-
rença pelos amos. q ue po u cos «cria m ra iz es» em qualquer casa.

* * *
C om o d isse, são os a m os ou s eu s representantes qu em ac omod a m os cr iados.
O s que t êm e desejam con s er ve r, e ai n d a os estranhos qu e precisam a dquirir.
Quant o aos que saem d e uma lavoura e pensam servir no ut ra, par a onde
nin guém lhes «fa lo u», usa-se irem el es à cata d e arranjo. oferecendo-se e tra-
l an d o..se com O novo amo. Ma s ta n to la vradores como s erviçais não se di rigem
logo d ir ecta m en te uns aos outros para o efei to do aj uste. Em da d a s circunst ên -
eias o negócio ca r ece de segre do para qualqu er dos contra tan tes ou p ara os dois
mesmo, já porque o lavrador suspeita de u m coleg a com análogos p r opósitos,
já po rq ue o serv o r eceia n ã o obter o lugar cubiçado e d epois Êca r t a mbém sem
a qu ele em qu e se em p rega . C om o os cães de B orba . . . C oisa prová vel s e O seu
an ti go amo so ube r que p roc urou outro.
P or co ns eq uência, qu a ndo oco r rem tais dúvida~ e re ceios. servem de inter-
mediá ri os n os perliminares d o ajuste os serviça is de confiança q u e «nca m'»l
como ab eg ão, maioral das m u la s, etc. C om ission a d os estes que se pelam p or tais
inc umbê n ci as . T od os a aceitam, pro curando facilitar ou imp edit o contrato. con-
f orme os sentimentos qu e nutrem pe lo fu t u ro camarada. O am o dá - lhe o d evido
desconto e faz o que lhe parece.
t d os bo ns costu mes n enhum la vrador s ério «desafiar » criados de confian çe
d e ou t r em para os emprega r n a mesm a o u se melh ante oc upa ção . O estilo manda
q u e só s e «fa le» na maré p ró pr ia a q ue m se sabe o u consta que sa i. Antes e
nou tr a s circunstâ n cias é fei o e d á nas vi stas.
Mas se n o d ecorrer d o a n o u m lavrador precisa de algu ém p a r a p r een ch er
va ga ext ra or di n á r ia e para isso se lembra d e um jeitoso ac omodado po r fora em
ob rig a ção de categoria inferior, ped e ao amo respectivo lho dispense. e só dep ois
da ced ência l h e manda falar. O procurado. «se sabe on de ca em 8S coisas» (se r
co rtês) não se ajusta definitivamente sem ter «u ma atençã o » com o Brno antigo.
Na região elvense qu an do um serviçal se a justa e fala no a ssun to, di z: -
«E st ou acom odad o. ( ou tretedo),
N outras variam de term o, exprimin d o- s e assim : - «E st ou concertado ». De
maneira qu e acomodar e con certar s ign íji ca m em d ialecto rural al entejano, o
a juste dos criados com os lavra d ores.
.. . .
Àos an u ais. seguem-se os temporeiros, Para o efeit o da sua acomoda ção o
ano agrícola divide-se em três t emp or a da s : a p r im ei r a - a da seme nteira o uto-

- 60 -
ATRAVÉS DOS C AMPOS

nal - pri n cipia p elo S . Mateus (de 21 a Z;l de s etembro) e lin aliza a i pel..
•Senh ora da C onceição o u N a tal.; a segunda - a do a lqu ei ve e sementeira s de
tremeses - principia imediata m en te à o ut ra e t erm ina n o cabo de m a io; a ter-
ceira e última - a do verão ou das eira s - va i desde o começo de junho até 20
de set embro à noite.
A tempo rad a do alqu eive u sa-s e s ubdivid i-la em d uas épocas : a prim eira
desde o começo até fins de Ievere íro ou m a rço, q ua n d o mu i to ; a segunda todo-
o período tes tan t e. A sub-divisão t em p or único :fim a dif erença do preço por
mensalidades - men os n a p ri meira época e maio r n a segunda.
E is os preços co rresponde ntes às três tempor a das p or ca da ga nhã o e mês:
S em enteir a: - 4$800 a 5$ 500 rei s. Alqu ei ve : - 3$600 a 4$000 r eis de deze m-
bro a fins de feve re iro e 4$500 a .5$000 r eis em m arço, abril e ma io . Verã o -
cinco mil e qu in h entos li se is m il r eis.
P r eços estes que se refe rem a 8anhões rasos de m â osei ra e não aos de
maior es responsabilidades, que vencem mais e em p roporção com a im port â n ci a
do encargo.
O ajuste re aliza -se dias an tes da temporada ou já em principio. Às contas-
ou pagamentos finais, efectuam-se no primeiro dia feriado s ubseque nte ao fim
da época, excepto nos que respeitam à do verão que invariàvelmente têm lugar
no dia 21 de setembro ou na véspera à noite. Assim como aos anuais de pensão
costuma falar o lavrador, os de temporada são apalavrados e justos pelo s
f*overnos» respectivos (com prévia au tor iza ção do amo). D e maneira que aos
*anhões fala o abegâo ou o sote, e aos carre i ro s, o maio ral das m u las. O preço
é ou não estipulado no acto do ajuste. À n tiga m ente tod os se acomodavam sem
preço, sujeitando-se ao que 05 lavradores fizessem n o fim. Hoje a dopta m -se
outras normas m ais racionais. Ou se a comodam a «preço f ei to» ou se conve n ciona
:PB ~9.t e receber pelo maior qu e se «ab ra» de entre os das lavouras vizinhas.
P ar a o serviçal o ajuste fixo e antecipado não passa de uma ficção . S e depois
subir para os companheiros da mesma lavoura ou dos de outras próximas, ele
abala ou exige o excesso. E. não se estranha por ser co r rente. O criado «é pobre
e não pode perder».
Mas se se der o inverso, isto é, se o amo ajustar por exemplo a cinco mil
reis, e depois outros pagarem a quatro, o dos cinco tem de cumprir a palavra.
N ão será coerente mas é corrente. E por isso também se não estranha. À pro-
-pósito: notando-se um dia em palestra de lavradores, esta falta de reciprocidade,
um dos mais velhos, observou com espírito: - «N ós tratamos, mas eles os
criados) conversem. Portanto as «fala s. deles são vozes ao vento» I. . .
Anuais e temporeiros, embora se ajustem por épocas fixas que em bom
direito tinham obrigação de cump rir e encimar, abalam quando q u erem por
futi lidades e caprichos, sem atenções para com os amos ou quem os representa .
P or isso 05 que as sim saem não têm direito a recebe r a soldada vencida antes
do d ia das con tas gerais.
O s chamados governos só «par t em o a n o » por m otivo forte, excepcional.

- 61 -
ATRAvtS DO S CA MPOS

Por seu turno também o lavrador precisa escudar-se em razões imperiosas


'Para pelo ano adiante despedir qualquer, sem incorrer nas censuras gerai s. Mas
se e m a n da embora» algum paga-lhe imediatamente sem aguardar pelo cabo do
ano ou da temporada.
Enqua n to servem e pelo aDO Iora, todos os criados obtêm do lavrador os
abonos de q u e precisam, correspondentes às soldadas. A lguns che gam a estar
adiantados e raros são os que não pedem por conta.
D os que venceram pOI inteiro, s em abonos nem dias perdidos, d iz-se que
ga nh a r a m a «sol da da direita». São p oucos. A maioria é chapa vencida ... chapa
derretida. P or est a e o ut ra s circuns tâncias d e fá cil intuição, cada lavrad or tem
o ch a m a do livro dos assentos, o n d e procedem à inscrição dos criados e corres-
p ond entes soldada s. t endo cada inscrição colunas própria s p ara a an otação d os
abon os e di a s perdidos. C om este liv ro, tudo se ex plica e a clar a no a cto da s
conte s .
* * *
À o ap roximar- se o S. M ateus as p a ro lices n as her da de s e a l d eias ve rs am
principalmen te so bre a muda n ça o u con tin uação d a família an u a l n a s lavo u ras
do sítio.
So b re tão m omen t os o e palpitante assunto, fa nt a siam-se con jectur as, auge-
rem -se mexeeices, a volum am- se despeitos, p ropala m -se boa tos e inv entam-s e
ce.rapetêes, tu do a p ro pó sito de sa idas e ent ra das do n umeros o pessoa l q ue
então encim a.
T odos os q ue se r vem no campo ( e at é os estranho s) q ue r em saber u n s dos
o ut ros e daí o a ce r vo d e peta s q ue voam de he r dade em he rdad e num t orveli-
n ho d e comentários. T a nto s e in ve n ta e fa ntasia sobre este assunto, que à época
essa cha m a m-lh e o t empo d S 5 m entiras. «5 . M a t eus à p orta , tr apacices às
carra das».
Ma s as mentirolas só m ed ram até ao di a d e conta s, em que tudo se es cla -
rece. G r a n d e dia ; com que im p a ciên cia se a gu arda I A:finaI, cheae , É. como
disse, a 21 d e s etembro.
L ogo ao nasce, do sol, os de ano, que sae m, l argam as ocupações de qu e
imedia tamen t e t o mam p osse os que entram d e novo. P osse a penas, q u e o dia
consagra - se às conta s.
De m a n h ã cedo (senão de v éspera à n oite), o lavrado r assentado à banca,
munid o d o livr o dos a sse ntos e da folhinha, faz a s con t as aos cr ia do s, p ag a n do
a um p or um, à m a ne ir a q u e vão chegando. O s que p el o se u co m p o rta men to o u
serviços es peciais m ere cem ga la r dão, costu ma m r eceber m a ior ou m enor gor-
ge ta, que se dá s egund o a ocu pação, o m érit o e e s impa ti a . Os g r a tifica dos u sam
dizer: - «M eu amo t eve um olham ento co m igo ».
O abe~ão e o m a ioral das m u las a ssiste m r espect ivam ent e à s d os seus
subordinados para esclarecerem q uaisqu er dú vidas s obre ad iantam entos e dias
perdidos. Se assim. m esmo surg e algum a q ue s e n ã o co n seg ue aclarar res olve-se
geralmente a favo r do serviçal para co r ta r atritos.

- 62 -
ATRAvk: s DOS C AMPOS

Os que saem a bem, quando recebem a soldada, dizem paro. o lavrador : -


«Queira deseulpar meu amo, s e o não servi à sua vontade». O lavrador res-
pond.e como julga apropositado. E s e fica com saudad es d ele, acrescenta: - « Vai
com Deus . . . a porta fica aberta ». Fe e- Ib e perce ber qu e pod e volta e n a primeira
oportunidade.
Outros cria d os re cebem e cumprimentam com as seg uin tes pela vres e r-'

«Nosso Senho r lhe d ê mui t o p ala de r a ga n h a r aos pobres ». Ou por este out ro
modo: - . Deus nos d ê sa u de, meu a mo : a vocem ecê para o dST, e a mim par a
O gan har». E o a m o red a rg ue-I h e : - . O br ig ado. D eus te o uça>.
Se alé m das so ldadas têm re cebido do amo quaisq ue r fav ores im portantes
usam muito da seg uinte frase: - cN 05S0 Sen h or l he pague. q u e eu não so u
capaz. - E como não é capaz, endossa a le t ra à Divindad e, :ficando qu ite com o
amo e de consciência tra n q u il a para não mais se lembra r d o obséq uio. Inter-
pretação ch istosa de u m falecido lavrado r qu e m uitos factos corroboram .
N ão obstante é claro q ue agrada sempre toda e qualquer expressão d e r es -
peito e reconhecimento, por banal que seja. O s criados antigos não se exi mem
ao cumprimento desses deveres. O s novos já afinam noutro diapasão. O maio r
número e$tá nas t in t as. para semelhantes etiq uetas.

• • •
U ltimadas as cantas todos se vêem com O se u pecúlio . Mui tos vão 1080
pagar o rol ao sapateiro e os bicos que devem pelas vendas e lojas. t um dia
de pagam en tos e cobranças em q ue o dinheiro gi ra a rodo n a s aldeias como em
nenhum outro do ano. Abe nçoado S. Mateus I. . .
À tarde ou no dia seg uinte de m ad ru gad a, a mos e criados t od os ma rc h a m
pua a romaria e feira do S. Mateus, em Elvas. O s se rviçais vão celebrar com
folguedos e farneis o mourejar de u m a n o in teiro. A li , nos s ubúr bios de E l va s,
no Senhor da Piedade e no rocio do Calvá rio, expande-se em grupos m ulríccres,
um povo trabalhador, n a legítima folgança d e h ora s fullidias que lhe parecem
minut os. Junto dos churriões e ou t ros «ca rros t a pa dos» que pejam a te r rado.
estendem-se os pa nos alvíssimos e come-se à farta . em grupos d e famílias, com
íntim a satisfação. À noi te r egres s am aos lares, e a 23, de ma nhã, i niciam- se a s
lidas elo novo ano a gr ícola, volta n do to do s aos hábitos no:rmais.
O s moços começam logo a pens a r na pân d ega do «S. Mateus » que ve m .

Salários Regulam-se p elos seguintes, po r día e homem : D e 21 de set em br o


a 8 de dezembro (sementeira) 160 a 220 r eis. D e 9 d e d ez em bro a fim
de feveteit o (primeira época d o alqueive ) 120 a 14 0 reis. D e março a maio,
inclusive (segunda época do a lque íve) 160 a 200 r eis. D e j u n ho a m eados de
agosto (eiras) 160 a 280 rete. D e m ea d os de a gost o a 20 d e setem b ro (palhas e
de sm oitas) 140 a 180 reis.
O jornal vence-se diàÚa m ente, m a s est ip u la-s e e paga-se às s ema n as ou
quínaenas. O tr ato por quinzena de traba l ho sem interr upção d o doming o

- 63 -
ATRA V t. S DO S C A MP OS

intermediário, é uso geral durante as s emen teir as e também n o tempo das eiras
em algumas zonas. No resto do ano ajusta-se e paga-se no fim das s ema nas e
à forne, fix a po r ca d a dia, pagando o lavrador ou o abe gã o, se este re cebeu do
amo. Como quer q u e s ej a o a begão assiste ao pag ame nto e, sen do preciso,
informa dos dias que tem cada jor n alei ro . Ào mesmo te m po . 80 ent re gar-lhes
a [orrre despede-os logo, se 05 n ão quer, Mas se p el o contTário Ain da os precisa,
tro ca im pressõe s com eles. para lhes con h ecer o prop ósito. Cos t u m eir a banal
de si mple s p alavria do. S ó depois, pelo dia fo r a e à tard e. nas taber nas e po n tos
d e r eunião das alde ia s, é que ebeg fies e sot as falam a «p recei to» à gen te d e que
precisam, ab ri nd o- lh es ou não o preço por qu e h ão-de sair.
No tempo das sementeiras e D O do verão é d emorado o a j u ste. O trabalha-
dor, ou só se d ecide à última da hora, a guardando m aio r ofe r ta, ou trata-se
s em preço, mas com a condição de receber pe lo mais alto q ue se pagar. A maio-
r ia não sai sem preço feito e assim mesmo só o aceita quando vê que não pode
obter mais.
N o ve rã o, e n a freguesia d e Santa E ul ália, os salários n ão s e d ett.n.em
antes da man hã do d ia seguinte a o da fo lga, na p r aça d a a ld ei a, on de a fam ília
se jun ta a discutir o caso. Ali «fazem p r aça», ouvindo as ofer tas dos governos.
por ent re os co me n tári os de ocasião. Dura isto até às sete o u oito h or a s da
m a n h ã em q ue se decidem a sair para onde m el hor lh es apré s. O trabalh o pré -
xim o, a si m pat ia pelo ab egão, e o bom trato em alime n taçã o constituem moti-
vos de p referência .
C h egados a os s er viç os consideram-se just os, m as por qu alquer n in ha r ia
quebram o com p ro m is so e partem a semana ou quinzena, abalando à. su rdi na
sem se qu er participarem ao abegão. O que às vezes motiva trans torno. M as
como é u sual pouco se estranha, e tan to me nos porq u e os que saem h oj e' de
uma casa , d ia s ou seman as d epois vo ltam para lá com igual semcerim6nia. E-
como as aba ladas são frequ entes em todas, e os q u e dese rta m de um a s lavou ras
vão logo pa ra outras, subarituí nd o-se assim reci pro ca m ente, a s vagas dep ress a
s e preen chem. H á a pe nas mutuaçã o d e ca ras, sem va ntagem para ninguém.
D e in verno a centu a-se a estabilidade. n ão s e discutindo preços. Va i-se com
o tem po, q u e é o d o. ebibe - u ma av eaira, mageisela e h umilde, q u e em bandos
arriba entã o ao Alentej o. Depois, d e a bril em d iante, «q u an do ve m a rola e
canta o cuco», à família pica-lhe a mosca n ão parand o em rem e verde. D e
mansa que esta va passo u a bra va, tão b rav a, q ue aos ad juntos d os do mingos e
segunda s-feira s para os ajust es da semana. por vezes se lhe ch a m a m touradas.
F orça de ex press ão, es tá claro.

AUMENTO DAS SOLDADAS E SALÁRIOS

N os ú lti m os an os e por efe i to do d es en volvimen to d a cultura cer ealíf era,


a s soldadas e salári os têm a um en tado bastant e, s endo d e presu m ir q ue ainda
se elevem mais nos anos de boas colheitas.

- 64-
PESSO AL DA LAVOU R A
(E..cuhu ru cm madeira de CapeI. c Silu)
ATRAv tS DO S CAMPOS

N os salários é o nd e a subida s e ac entu a e m maior es ca la. S endo como são


pagos em d inh eir o, d e contado , ape nas, a dif erença parece m aior d o qu e n as
soldadas a n uais com ou tra s avenças. N est as a subid a é r ela tivam ente m en or
em reis. Mas com o ao d i nhe iro s e adicion a m forras de g éne r os, s eara s e pastos ,
cujo va lo r també m se elevou, não diminui ndo 8 S u nida d es q u e os r ep r esen tam,
os ven cimentos r especri vo s igualmente s e avo luma ra m, embora continuem repre-
sentados po r r ega l ia s idên ti ca s às an te riorme nte gan has. Um moio de tri go é
sempr e u m m oio d e tri g o, mas o seu r endimento de h oje é m a io r que outrora .
E o m esm o sucede CO m a forra de uma vaca. d e u m s égua, etc.
Com as so ld a d as a d in h ei r o s ómen te, a alta dá-s e em proporção idêntica à
do sal ário. Em ambos os casos é gra n de, m áximo na s seme n teira s e col heitas,
que se elev a a 40 % a mais dos preços antigos d e épocas análogas. De in ver n o
tamb ém s e n ota o a u me nto m as em escal a me no r-20 a 30 °,'0 se ta nto.
O lav rado r s en sato n ão s e r evolta contr a es ta m elhoria de vencimentos. P el o
con trári o, ac eita o fac to com o j ust o e lógico na a ct ua lida d e em que tudo vale
mais que n os te m pos p assado s. O q ue o ag ric u ltor deplora é a escasse z do pes-
soal para a s fa inas a g rí colas, qu e duplicaram ou tri plicaram d e inten s ida de ,
ganhando em aperfei çoame nt o.
D e verão s obretud o. seria impossí vel t erm ina r a s colheita s a tem po se não
fossem os ceifador es das B eiras - o s ratinhos, qu e aflue m aos milha res, e a s
debulh adoras a va por. À s de bulh ado ras generalizam-s e e faci litam-se de ano
para ano. e n ão obstante. em cada nova colheita m ais se n ota a falta de braços.
e consequentem ente a subida do salário.

PARTICULARIDADES DE CADA OCUPAÇÃO

Guarda de herdades Entidade inconfundí vel, es se n cía l me n t e típic a . Cara de


po uco s amigos, em oldurada p or su issa s fartas, r espei-
tosas, a qua drarem com o t od o d a estettrru possante e au toritária.
Traz qu a se se m pr e m ochila às cos tas e por ve z es cartucheira à cinta e cara-
bin a ao ombro. Que a espingarda não a u sa con stantemente, por lhe parecer
haste espaventoso, re vela d or de p reo cupações d e de fesa, que o mundo pode
c:1assincar de receio ou co bardia. Por isso o que é «ho me m» para mostrar o que
'P ode e vale, empunh a d e preferência um nod os o pau ferrado, distintiv o elo-
quente do seu famoso poder io . V erdadeira va r a de justiça, mas d e justiça sum á -
ria, temida como n enhuma pelos rat on eiros elos pov oados.
O guarda de herdades t em como p rinci pal encargo a g uar da ria das s ea ra s,
pastagens e montados das her d a des «à s ua con t u», cu mprindo-lhe coibir os
abusos e invasões de toda a o rde m, tanto d o s se rviç ais e ga do s d e s eu amo,
como do dos vizinhos e est ranhos. I n cu m be- lhe po r co n seguinte: vig ia r com
frequência dando voltas repeti da s e t ro cada s. co m inter valos d e obs er vação
atenta - à espreita - n as melho res Bvis ta da.s (ou teiros de larg os horizontes).
Repreender os ga na deiros que a bus am por s i ou pelos ga dos qu e p a storeiam.

- 65 -
ATRAVltS DOS CAMPOS

A companhar, até sair da guardaria, qualquer r eba n h o alheio que vá de passa-


g em e «d e ca nada», apressand o-lhe a marcha para evitar logro de pastagens,
com d em or a s ceviloae s e chupistas. Participa r 80 amo as faltas dos ge nedei.ro s
e de outros que lhe estejam incumbidos. Largar ou guardar terra aos reba n hos
com prévia consulta e assentimento do lavrador. Não conse ntir que os «matei-
ros» levantem chamiça, plor no, ou 8TreíAotas de que se ca reça pata o consumo
da casa, ou que representem valor considerável. Governar as mulheres da
monda, da bolota eu de outro serviço, não incumbido a encacregedo especial.
Fiscalizar as ceifas e gadanhas, sobretudo as ceifas, r ep a r a n d o na maneira
por que vai o corte, 8 at ada, a enrilbeiração e o aproveitamento das espigas.
C ont a r os fe ixes de feno nas gadanhas de em p r eitad a, para dar conta ao lavra-
d o r das carradas a pagar. Mante r em t er m os de reciproca vantag em a boa vizi-
nhança estabelecida entre seu amo e os vizinhos, pelo que respeita aos limites
de tolerância n a entrada e permanência dos gados de uns nas terras dos outros.
E finalmente olhar por tudo de que o encarreguem, procedendo com circuns-
pecção, probidade e firmeza.
Po ucos reunem to dos os requ isitos n ecessá ri os para o bom desempenho do
lugar. Mas aque le q ue revela os mais essenciais já goza da estima dos amos.
I sto de g uar da s d e h er da d es é ocupação em que se observa m feitios diferen -
tes, posto q ue em to dos predomina a nota de valentia e sisudez. Alguns pecam
por brigões e autoritários em excesso , u lt ra p a ssa n d o os deveres da prudência
com f utilidades que chegam a degen er ar em co nfli tos g raves. Mas a par d es t es,
en con tram- s e ig u almente m u it os o utros d e cri tério oposto, b em orientado s,
corajosos e sensatos. S em alardearem pi mponices d e estrondo, mas colo ca n do -se
no seu l ugar e a sério, r espeitam- nos mais que os bosóM.as petulantes e comi"
ch osos. E aind a s e vê outro género, contraste dos d ois referidos. mas não menos
cu rioso . P er t en cem-I b. e aq ueles em que os actos desmentem as palavras. P ânde-
ga s, q u e «não vê em l o b os pequenos», que só falam em f erir e es p an car, mas q u e
foge m às ocasiões como o d iabo da cr uz. S e por acaso, e co ntra s ua v o nta d e, s e
lhes depa r a ensejo para demonstra rem o q ue a paren t am, esquecem logo a s b ra-
v a ta s e eí- Ios mansos como borregos. E m geral ta m b ém olvidam os deve re s co m
i gua l f acilidad e. D o que resulta não criarem raiz es na g u e rdar ie. M a l se de n un-
ciam, os am os põem-nos ao fresc o pa ra q u e pro curem outra vida.
Que a oc upação é b astante espinho sa e a ma is arriscada da s d o ca m po n ão
res ta d úvi da . T o da v i a n enhu m a h á tã o a petitos a e invejada. C u b i ça que se
compreende, d ecif r and o o enigma.
O g u a r d a d e he rdades, a p esar dos perigos e ódios que o rodeiam e das r es-
ponsabilidades constant es q ue sobre si pe sa m, goza a o mesmo t em p o d e certa
importância qu e o envai dece. Livr e do rigor dos tr aba lh os b raça is, em q u e,
g era l m en t e. se em pr ega va a n t es, p a ssa a vive r de «cor po d ireito. e a a u ferir
ganâncias de alto va l or, como n enhum o utro criado. O q ue j ustifica o afã co m
que o emprego é disputad o mal s e s us peita a vacatura.
O l avrador de que se presume carece r d e g u a r da no vo , v ê-se a ssediado p or

- 66 -
A TRAVt.S DOS CA M P O S

toda a casta de em p en hos e oferecimentos, a p onto de se sentir p er ple x o e ató-


nito com a preferência. Por nm es colhe o u ac ei ta um , sabend o de antem ã o que
os preteridos ficam d espei ta d os e qu em sabe se i ni m igo s seu s. P el o meno s vin -
gar·se·ão, motejando da escolh a e do escolhido em coro com os q ue po r h ábito
e sistema se r egalam em r i diculariz ar os gu a r da s na au sência, seja m eles q uem
fOI. Chamam. lhes impos tores, bru t os, p reg ui çosos, et c. E comen t a m-n os a ssi m:
-cParece·lhes qu e têm o rei n a bar r iga l. .. » «Baro fões impostores ... já se n ão
lembram do que eram . . . » «Bom o fí cio mas neja p a ra mim . . . t enho bom corpo
para rrabalhar . .. » Estamos no C8S0 da r ap osa às uvas ...
................ ......... ....... . .. . ............ ...... ...... . ...... .. ... .. ...
A soldada do g uarda consiste n u ns vi n te a trinta e seis m il re is po r a no,
30 a 40 alq ueires d e t rigo o u 50 de centei o, os pas to s d e uma égua e os d e uma
burra, a resid ência grat u i ta d ele e da família num monte pequen o dos d o
cómodo e o usufru to de qualquer q u'in chcso t apadejo ou curral6rio contíguo
para a cultura de umas batatas, favas, cou ves , etc.
Mas o essencial é a fo rra da égu a, que todos solicitam como princi pal obj ec-
tivo das suas aspiraçõ es. Uma égua nas mãos de um g uar da é u m t esou r o incal-
culável. Tratada a ca p r icho n as m elh or es pastagens e a té n os so los de bol ota,
esse égua, qu e pouco o u n a da trabalha, 'Pare q uase tod os os anos uma excelente
cria muar, qu e rend e 80S 14 m es es n ov enta a cento e q uarenta m il r eis.
As muares d e a no mais d esenvolvidas que a pare cem na afamada f eir a de
maio de Vila Viços a, são por certo as dos guardas. Aí a s vendem eles crdínâ-
riamente, se antes l has n ão foram comprar à pró pria g aardarfu,
Na feira citada torna-se curi oso o uvi-los a os gr upos em aporfias e con-
frontos sobre os molos de cada um .
A burra serve-lhes para cóm od o pe ssoal e rendimento das crias. É pequeno,
comparado com o da égua , mas ainda vale uns vinte a trinta mil reis.
Portanto, verba em dinheiro, crias e etc., etc ., somam uma continha bem
boa, própria a aguçar o apetite dos est ra n h os e fazer as delícias dos que a
ganham. O que tem sorte com a égua, sai-se em m édia por cento e cinquenta
mil reis, e anos h á que topa a duzentos e arriba. t questão de cria. Se fa lha,
se se aleija ou morre r eduz-se a metade o u menos. Questão de so rte também.
Uma aventura, como eles dizem. E ac r esce ntam: - «A fort una de u m p obre
está no traseiro d e uma égua velha».
Os guardas arriscam a vida no exacto cumprimento dos seus deveres, mas
sendo felizes, prudentes e cautelosos, vencem todos os atritos, e ju n ta m sufi-
ciente pecúlio para vel hice descansada. C on h ecem - s e muitos que compram
pequenas propriedades.
Há porém que distinguir entre Aqueles que gan h am o que já disse e q ue são
evidentemente os guardas típicos, e outros mais humildes de gua rda r ias peque-
nas ou mal pagas, que só vencem quatro ou cinco mil re is m en sa is . G uar d as
de emanta às costas. no dizer picaresco do povinho. C om o se d isses sem r -r-

- 67-
ATRAvts DOS CAMPOS

«Homens sem eira nem beira, que só possuem pau e manta». Uns valdevinos,
que nada têm a perder.
No concelho de Elvas todos os guardas de herdades possuem alvará de
guarda rural passado pela municipalidade, o que lhes dá o direito de acoima-
rem por transgressão de posturas. Por esse facto gozam o privilégio do porte
de armas gratuito.
As lavouras muito grandes, ou de herdades dispersas. sustentam dois e
três guardas.

Abegão (d Encarregado principal de t od os os serviços desempenhados pela


ganharia de que é mandante e cabeça. «C h a vã o da lavoura» no
dizer de e lgwns cam pó ni os.
P orque o lugar é de alta responsabilidade, o lavrador preenche-o com pes-
soa capaz já exercitada no ofício, ou mete um n ovo, desembaraçado e fiel, que
tenha «sentido» e revele ebom risco». A experimentar, entende-se: se dá, con-
ti n ua, e faz dele «um homem»; se não, despede-o no fim do ano.
O abegão só recebe ordens do amo. que o considera seu imediato represen-
tante nas fainas respectivas.
Trabalha conjuntamente com os camaradas, come com eles. ma s pernoita
àparte em casa. própria, como referi na descrição dos montes.
No trabalhe braçal o seu lugar é à direita da gente que dirige. mas às vezes
coloca-se no meio para dar saida ao serviço com «o seu corpo» e o dos o utros.
Na lavoura toma a frente da piscole dianteira, escolhendo para si as duas
melhores juntas de bois.
Em geral não alardeia exageros de superioridade afrontasa sobre 08 subor-
dinados. Deles saiu e com eles labuta, dando -se ao respeit o mas sem grandes
reserves e até com familiaridade .
N estas circunstâncias compete-lhe:
Governar e dirigir a lavoura prõpriamente dita. as caves, acarretas, eiras,
desmoita s, etc. Dar as horas de e gerra, as da comida e as da solta. Pôr a mesa,
partir a bois, distribuir as merendas e bradar ao almoço e ceia no outono e no
inverno.
Intervir na a comodação. abonos e pagas do pessoal, pela. forma que enun-
ciei nas soldadas e salários. e belh assim no reparo e assento dos dias perdidos.
Estimular O brio dos ganhões. animando-os no trabalho, captando-lhe as
simpatias, dando-lhe bons exemplos. e sendo preciso, arrumando-lhe ferroadas
a t emp o. conforme as círcunstâncias. Numa palavra, «saber lidar com 8 ismílie,
l eva n do-a com seita».
C u m pr e-lh e mais :
Com a ajuda do carpinteiro ou só por si, proceder à armação ou enganche
das enteichaduras, nas vésperas de se principiar a lavoura «às áAuas novas».

h) b C..... po MaJor clllllll-.t-lh••ptindor. d'll ilo·..., o 11011111 1111 . lId l 0 ' 0 cupfAtd r o 1111 cu:ro• •

- 68-
ATRAVÉS DOS CAMPO S

Àmanhar as mesmas enteichaduras n o local da lavoura , su bs ti t ui n do as


peças partidas ou gasta s, p or o u t r a s n ovas ou concertadas, q u e d e prop ósito há
ele. reserv a. Talh a r speiros, corneiras e brochas. do s co u r os d estinados à reno -
vação da speiraAem, distribuindo a neve correeme pela ga n h aria . afim de cada
qual amaciar (surrar ) as peças que lhe tocam.
Encozer os Icrcados de madeira. 108 0 q u e se t iram da lenha. Pre parar os
manAuais e en ca bar a s enx a das. en xadões e machados. lembrando a o amo a
aqu isição d estes e o utro s utensílios. T omaI à s u a con ta a gua r da e conservação
da apeiragem e ferramentas. Acudir com a ganha ria e co m prontidão. seja a
que h ora s for, a to d o o in cên dio qu e s e manifeste nas h erd a d es do cómodo ou
nas dos vizinhos, ainda qu e estej a m de mal com seu amo.
Prestar igua lmen te auxílio e socorro aos criados d a casa que lho re clamem
por motivo de d oença . d esastre ou m orte de pessoas. res es e cavalgaduras.
Prover quanto possa às ocor rên ci a s inespet'adas. mandando participar a o lavra-
dor, se o caso tiver importância . E, en 6 m delegar n o s ora , bcieiro ou ganhão de
an o, qua isqu er at ribuições a que n ã o possa atender e que eles saibam dese m -
penhar. Como cria d o d os que mais se evid enciam, os abegôes são discutidos
por todo o pessoal. cons oante as sim patias o u antipatias de cada um.
Eis uma am ostra d essas apre ciaçõ es:
D o que r eputam desembaraçado e intelig ente: - «P ar a g over n a r piscoles e
entender de terras. tem ol ho e sentido .. . Nenhum lh es dá melhor saida ...
sabe-lhe das voltas e das quedas como o pri meiro . . . E apurado ... neia como
alguns de mãos gr a n d es que atra palham, sem preceito ... E para car r ega r I. ..
É cada carrada como slmís.ras! . . . direitas com o fusos I. . . P ois n u m a eira é
que se Lhe vê o ris co . .. Ele e quaisquer dois gatos voltam um calca doiro n u m
assopro 1. . . E então com a pá nas unhas. fuma -lhe a venta a passar u m m oi-
tão!. .. Liberal at é ali II 1. . . •
D o sabedor. mas d e fra co expediente : - cS ab e ma s muito atadinho ...
Um coquinhas qu e se enfeza por dá cá aquela palha N ão tem figa dos para
acharias grand es . .. P oi s pa r a mandar. nun ca s e entende ... tão depressa
manda como desm anda . .. »
D o incom peten t e: - «E le sa be lá ser go ver n o I». . . E. ta l h s x se r vi ços. com o
pachsste S em p r e contra a direitura. .. a nu n ca encarrilhar. P ara tudo se
quer sorte N u nca passo u d e ga n h ã o rel es e a go ra a m a n dar fam ilh a/. ..
Valeu- lhe o paleio .. . e a s imposturices . . . M a s d eix em-no, q u e h á-de perder a
aceitação I... »
A con tece que s em el h a n tes j uiz os sofre m contestação d os q u e pensa m O
contrário, or ~in ando -se disp utas a calorada s. M as lá diz o rifão: Cad a cabeça.
cada sentença . . .
. .. ..
Vale de 150 a 170$000 r eis a soldada do ahegão de uma lavoura gra nde.
E em geral, baseia -se no s eguinte: cinco a d oze mo edas, o u s ejam 24 a .57$600

- 69
A TRAV :t S DOS CAMPOS

r eis , dua s s ea r a s, uma de 6 a 8 alqueires de trigo ou centeio em semeadura e


outra de d ois a qu a t ro alqu eires d e trigo ribeiro ou legumes ; «pão» na eira
entre 40 a 70 alqueires d e trig o ou centeio ; dua s ou três ca r r a d as de l enha;
uma ou «m ei a» cabeça n a vara; pastos para u m a. ég ua , vaca ou b urra. Em
alguns con cel h os vizinhos do de E l va s . também vigor a a f orr a de pastos para
uma junta d e no vilho s .
Em cada l a vou ra div ergem as ad ições da soldada , devendo n otar-se que
p or maior qu e seja, n enh um a a b r an g e t odos os porve rrtos acima m encionados.
O uso geral resume-se em dinheiro, seara , «pão na eira » e le nha . T u d o mais
constitu i excepção e r esto d e costu mes antigos ca í do s em d es us o.
S er á escusad o r ep etir qu e q u a n t o mai or é o gan ho em r eis, me nos impor-
tant es são as forras e sea ras, assi m como s e as achegas são av u ltadas, reduz - se
muito a ve rba a d.in heiro . Regra inva riável, sa b ida, tanto para a soldada de
abegão, como nas d e outros serviçais.

Sota É o substituto do ebegêo e coadjuva-o em tudo que possa e saiba . P or


- - sua vez o eb egão tamb ém o deve orientar nos serviços q ue desconheça.
N os trabalhos coloca-se n a po nta esquerda, e n a lavou ra governa uma das
píscolas à fr en t e d a po n t a Buiada.
N ã o ha ve n d o se mea do r p róprio, é el e quem semeia e embelg8, ou s emeia
somente. E t a mb ém se inc umb e de gover n a r o corte das lenhas se para isso não
h á enca r reg ado extraordi nári o.
D e ve rão, se as eiras são duas, ele encarrega-se de uma, É afinal uma
espécie de v íce-abeg ão com as atribuições e respons abilidade s iner entes.
A soldada do sere pode-se computar em 80 a 85$000 r ei s, p r ovenien tes da
v erba em dinh eiro e do «pão na eira».
Em g er a l o cargo d e s ota serve de d egrau para eb egão, post o que o n ão s ej a
para os apoucados qu e nun ca trepam arrib a. Àetuele que apanha a chefatura na
própria casa onde serve, por ef eito de o amo despedir o abegâ o a n t ig o, co n t a
logo com um inimigo no s eu ex- superior. O q u a l, despeitado, diz dele o seg u i n t e :
«Maroto. . . on ze n ei r o . . . n ão descansou en qu anto me n ão arreben t ou / ...
A lguém o errebenter« a ele J. • • lO> Desabafos do estilo, tanto n o caso p res ent e
como em outros semelhantes. Os criados de p en são despedidos pelos amos
atrib uem s em pre o despedimento a intrigas d os com panheiros de gr a d u ação.
A rrebentam -n os, dizem.

Boiei r o s C os tum a m s er dois : maioral e a juda . O cu p a m-s e na g u a r d a r ia ,


a p ascen t ação e t ra ta mento dos b oi s e n ovil h o s de tra balho que com-
p õem a boiada, e a inda n os se rviços d a ganharia , como adian te ex p li car ei.
O maioral d ísefn gue-s e d o a j uda por se r o princi p al re s po n sá ve l na gu a r -
daria dos bois e por ga n har um po uco m ais. F ora isto os d ireitos e de veres dos
doi s são análogos . A ambos e p or s ua alt ura, conf orm e a ocasião, co m pe te -l hes
dirigir a la v ou r a n a ausência do abeg ão e d o so t a .

- 70 -
ATRAV J'. S DO S CAMPOS

Apesar de ga nadei ros, 8S suas referências t êm melhor oportunidade entre


os serviçai s da lavoura, a que de r esto pertencem também. e co m quem estão
em maior e mais fr eq u en t e convívio. O fa cto de g ua r d ar em reses bovinas e
trabalharem braçalmente, explica-se da seguinte forma:
à apae centa çâo da b oiada r equer apenas um homem durante o dia. M as
como em algumas horas da noite n09 meses de ou t u b r o a março sã o indispen-
sáveis dois. e como a boiada trabalha geralmente de revezo, quer dizer a metade
de manhã e a metade de tarde. sendo por isso necessário um homem para cada
revezo, impõe-se a existência de dois boieiros em cada lavoura. Enquanto um
trabalha, o outro guarda o ga do.
O ajuda lavra com o reve zo da manhã; o maioral com o da tarde. Se a
lavoura é de sinAelo (o mesmo ga d o em todo o dia), costume que geralmente se
usa apenas pela sementeira do outono, e não em toda parte - ou lavram 09
dois boieiros todo o dia, sendo as reses tratadas à noite por outro h omem, ou
eles pr6prios as tratam, revezando-se, com o auxílio de um rapaz - o palhei-
reiro.
Quando a lavoura está parada (interrompida) e o pessoal s e em p r ega em
outros serviços, anda-lhe sempre a gregado um boieiro que trabalha como q u a l-
quer ganhâo. Àssim na semana em que o maioral vai para a ga n h a ria o ajuda
guarda os bois, para de pois s e inverterem os papeis, indo O ajuda para a malta
e o maioral para O ga do.
A os boieiros compete: f ornecer e pôr os cho calhos ao gado em harmonia
com os usos; fazer o ca ch a ço aos bois com tesouras suas ou emprestadas; dis-
tribuir as j untas p elos gan h ões, depois do abegão, sota e eles g u ar da d or es
escolherem para si próp rios t endo o abegão a p r i ma zi a . O aj uda reparte o
revezo da m a n h ã e o maioral o da tarde. pelo que é a o maioral que compete
distribuir os no vilhos d e amansia pelos g anhõe.s qu e j ulga bo n s para o ensino
e adomação. Ele também amansa um ou dois em ca d a semen t ei r a, esc olh end o-os
entre todos.
Maior al e a juda, n a lavoura e ac a rretas, cu m p re-lh es fiscaliza r O bo m ou
mau trato dos ganhões p a ra com a s j u n tas, rep ree ndendo abusos, e indica ndo
ao amo e abeg âo a conveniê ncia d e d esped ir os que sejam ás peros o u m aldosos
e conservar os m aci os e ge it osos. Cumpre-lh es enfim concorrere m q ua n to p cs-
sem para o bom pa ss a dio d os bo is, erguendo- os a mi u do na pastagem e pr es er-
vando-os de águas estagnadas.
A profissão d e boieiro é a m ais penosa das que se exercem nas h erdad es d o
Al en tejo. M õr m ente n o ou tono e in ver no, em que sofrem inclemências e
incómodos tais que merecem d esen vol vi d a exposição.
E m primeiro l ugar não dispõe m d e choça s nem malhadas q ue os preservem
dos temporais I E não as têm p or que p r ecis am andar por diversos sítios grande
parte da noite, traiteando os b oi s, ora na pasteg em do i nver na d oiro ou d a
coita da, ora chegando-os à palha , o u a o fe no, à rama, ao alcáce r . etc. Cada
coisa, ou parte delas, a hora di feren t e e às vezes em locai s algo dista n cia dos ;

-71 -
AT RA v t s DOS CAMPO S

n u n s, com o gado pr eso por ho ras, n outros. à so lta, con for m e a ép oca, o
costume, os r ecursos pascígoros, et c.
P o r conseguinte ten do d e es ta r «de v eJa» a m aior parte da noi te , enrou-
pa m -se quanto podem. À o vest uário comum ndi ccionam o clássico pelico, a
pelica, os salões l a n zu d os. o t apa-c u e ai n da o casacão ou capot e a gue deirc de
burel. Assim ensnme rr edos, munidos d o gua r d a -chuva e z u ] (in ovação recent e)
e do indispensável cacheiro (ca jad o), passam a noite de ê lerte, ex cepto nos
i ntervalos de descanso . O q ue med ei a desde a socegB, à ent rada da noite, até
às 10 ho ras. e o da m adr ug ada. N o tempo resta nte, m a l d or mi t a m cabeceando,
se tomam a s ério a t reites çgo d os anim a is.
N a s h oras d e d es ca n so, d or m em em qua lq u er abrigada de ocasião, on de
acendem Iume. À í, ao rel ento. envoltos n a cop a, esticam-se, de forma que os
pés, resguar da d os pelas bo tas o u sapatos d e a t a nado, recebam o cal or da
fo g u eira., único meio de atenuarem o ri gor do frio. Mas mesmo então.. por vez es,
inte rro m p em o re po u so para cuidarem do gado.
Às 10 h ora s levantam- no para repasta r livremente n o pr óp rio inverna-
doiro. ou para o ch egarem à palha , ao f en o, rama , etc.
D ecor rid o o tempo do repast o, costuma-se ap a r tar o r evez o da manhã
.ao da te rde, para ass im em separad o descansa rem de n o vo . É a ho ra da
madorna .
E nquanto o gado nmedor n o, o ajuda pega n o competente tarro de cortiça ,
põe o cacheiro a o om bro e vai ao mo nte b u scar a assorda para ele e o m aio ra l
almoçarem no mesmo t a rro a li arrimados a os b ois.
N o a ct o d a aparta ção, s ucede em n oites esc u ras tempes tuosas, f a lt a r um ou
outro boi q ue se es capo u ac ossad o pelo tempo ral o u qu e po r 8u los o f ugiu para
melhor pastagem o u p a ra algu m a folh a.
S e o ext r a vi a do p er t en ce ao r ev ez o da manh ã, pr es t es a ir t ra b a lh a r , ao
ajuda compete procurá- lo e tr a z ê-lo imediatam ente. D ada a hipótes e, a missão
considera-se es p in h osa, atenta a es curidão da n oi te . Mas como se i mp õe, o
boieiro p arte a des em pe nhá- la, espere nd o au xíl io no chocalh o do fu git ivo, cu jo
toqu e conhece d e l on ge como os dos ou tros d as demais r eses. Sem embargo
pragueja-se e maldiz a oficin a e a h ora em qu e a e ge rr o u.
Pross eguindo nas sagas do bodio, aqu i se ata s ca, além caí, adia nte tro peça,
a col á esbarra, mas l á seg u e de trouxo mO ChO, caminhando e es cu t a n d o, es cutando
sempre .. . O u ve enfi m u m chocalho . . . Escuta . .. é o d el e, o do slmodiçoedo
que o fez and ar às a r a n he s, ao s baquinázios, a l t a s h ora s da noite, esc u r a com o
bre u I. .. - «A h boi de um fil ho de curta / . . . j á mos pagas / . .. » - exclama o
encolerizado homem, apr essa nd o o p a ss o, até l obrigar a r ezo
O boi, ouvindo a quele vo z tã o s u a con h eci da , levanta a cabeça, e, instinti-
va mente, p ri ncipia a caminha r em direcção à s camos d os companheiros. Mas o
guarda do r nã o lha perdoa. C o m o le mbrete d irige-lhe no vas e mais re tumbantes
ameaças po r en t re cache íredes certeiras que alcançam o fu gitivo; este, es cara-
mentado e r eceoso, ab re via a marcha, submentend o-se em abs oluto .

-12 -
PESSOAL DA LAVOURA
(Escultl;Uu ~l:I1 mad~ir. de Cape i. c Si h·.)
ATRA VfS DO S CAMPOS

Se por ventura não a p arec e a tez ou r es es perdidas, o infeliz aiuda fica


ainda de pior humor. não tanto pelo facto em si, como p ela circunstân ci a de
que o m alogro dos se us passos d esa cr edi ta-o bastante. Sabe que em chegan do
aos arados sem um d os b ois do costum e, as suas barbas fi cam enverg onhadas
dian te da gan h a ria. M as tem de s e ag u en t a r , cu m pri n d o- lh e substituir o a usente
por outro qu e sobeje ou pOI um d os do re vezo d a tarde.
Em ta is circunstâncias o m aioral a gu a r d e o dia pare . em aclaran do, ir à
cata da rez esrravtada. como igualmen t e faria s endo do seu r evezo. Encontran-
do-a, tem o d ireito de a conduzir à lavoura para se a ga rrar 8 0 arado e ser solto
o boi que a substitui. I sto trad u z u m etnque para o cama Ia d a e po r ta n t o s ô em
casos imperioso s ou p or p irre ça re corre a esse extremo. Mas se r ecorre aum enta
o vexame do ajuda q u e ass im fi ca exautorado. h )
... .. . .. . . . . . . .. . . . . .. .. . . . .. . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . .. . . . .. . . . . . . . . .

E n t ret a n t o termina a m e d or n s , a proxi ma- se o alv orecer. t a hor a d o aj uda


ma rcha r com o revezo para os arad os , onde têm d e chegar an tes d e l u zi r a
manhã. C edo sempre, chova o u não. Por cc n sequ ên cin ei - l o a postos, de cacheiro
em punho a reunir as reses. E p a t a as p ôr em a n da m en t o, solta o clássico
assobio, sinal d e pa r tid a , a que o s b ois obed ecem . S e algum se esquiva, l og o
o cacheiro cai s obre ele. l embrando-lhe o de v er. E partem t odos, h omens e
anim ais.
O s pa cífi cos ruminantes caminham devagar, pausadamente, ao som dos
chocalh os. Às men ges, o s csm ponil hos, a s s em-serras e os esquilões, to da a
loiça en6m, compõem uma orquestra at raente, que o silêncio da n oi t e fa z ecoa r
ao longe p el os o u t eiros e encostas. É a alvorada do campo, h i no do trabalho
que por m uito s mi nuto s emudece o piar a gou r ento das a v es n oturnas.
........ . . . . . .. . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . .. . . _ ' .

Com o r ef erido, d eixo r ela t ad os o s cos tumes dos boieiros n a época da


sement eira outonal. A lguns r epres enta m d ev e res p enosos q ue se agr a va m fre-
quentem en t e co m o s ri gores d a s chuva s ou d o fri o inte n so, p róprio das n oites
grandes, de geadas de arrepiar .
D e d ezembr o em dia n t e, a chegad a dos b ois à la vou r a é m enos cedo ; mas
os resta n t es deveres s u bsist em n a essênci a com es cassas va r iantes at é à p r ima vera.
N as l a vouras de si ngelo ou d e r evez o e m q u e os bois se t ra ta m à m ão,
recolhi dos em ca ba nas, a vi da de b oi eiro é i n comp arav elmente menos incomo-
dati va. M a s esse cost ume é t ã o fora d o co m u m n este ca nto d o A l en t ej o, que
pou cos ganade ir os l h e go zam as v anta g ens. C om o se sabe. pre val ece a apascen -
tação de r egim e m anadi o, q ue d emanda sacrifí ci os e r esist ência singu l ar.
Com efeito nenhum a ocu p a çã o há n o camp o t ão espinhosa e in grata.
Todos se recusar ia m a desemp enhá -la s e a via d olorosa das n oites asp érrimas,

- 73 -
A T R A V :e S DO S CAMPOS

e m cuidados incessantes, s e p rolo ngasse pelo ano inteiro. Feliz m ente não se
prolonga além de março.
A prim av era e o estio, ga r antem a os rústicos b oieiros algu m as se m anas de
«boa vida », em q u e s e d esf orram d o passad o num rep ouso tran q uilo. D e dia
principalmente, d ormem horas e h oras, de han'íg a para o ar, à sombra agra da·
bilíssima de azin heiras ra m a lhuda s. Apa rte o p eríodo d os aeaer etos, t êm então
um a te m po rad a de d escanso, l egítima i ndemnização d e pass a dos sofrimentos.
M er ecem -na bem, coitados .
. . ...... . . .. . . . . . . . .... . . . . .. . . . ... . .... . ........ . ..... . . . . . . ... . . ... . . . . .. .
Soldadas: s en do a dinheiro r eg ulam en t r e 84 e 86$ 400 reis por ano e
hom em, ou seja a moeda e meia p or m ês. Outr os ve n ce m seis ou oit o m oedas
(28$800 a 38$400 reis) e 60 a lqu eires de trigo ou cen teio. Tendo na s ea r a e pão
na eira (costume quase b a nid o) gan h a m 14$400 reis, sea r a s d e se i s a se t e
alqueires de s emeadura e 40 alqueires d e trigo o u um moi a d e cent eio. No ut ros
casos f a l t a a s eara e o p ã o na eira, mas cada boieiro ve n ce o pegwlh e.l de uma
j u nta de no vi lhos. C ad a um compra dois b eze rro s de a no, que vende a os d oi s
a n os, lucrando o. diferença de preço.

Oanhões S ã o os moços da la voura p ro pri a m ente dita e d e ou tro s ser viços,


com o cavas, a ca rretas, eiras. etc. Acomodam-se e ga nh am pela.
for ma e p r eços que referi nas Soldadas e sal8.rios.
A colectividade qu e os agrupa d enomina -se 8anharia. Ou malta.
S aidos d e a judas d e en t r eg u es d e ga d o, ou d e paquetes, por ve zes fig u ra m
na ga n haria r ap az es adoles cen tes d e 14 a 16 a nos, se o se rviço é d e m olde o. t ais
principi antes. M a s esses galucbo~ só se consideram gan hõ es. depois de la vra rem
«d e efectivo» to da a épo ca de u mo. s em entei ra outon a l. O s q ue alEm p assa m
p or se melha n te prova diz em mui t o l iso n geadcs : - «Es te a no já fiz u m a s eme n -
teira J I ... » C om o se dis sessem : - «Ago r a sim que sou ge nte I . . . r ecebi a alter-
na tiva de Aanhão!. . . »
E n tr e os ga n h õ es de uma casa pode h ave r du a s ca t egorias: os «de pensão»
e os rasos.
D e pensiío é porventu ra u m ou outro a n u al que se aco mod a com a obriga-
çã o d e em certo tempo d estaca r pa r a talo u qual se r viço extrao rdinário, ou para
fazer d e encarregado interino po r impedimento ou abalad a de q u a lq u er
«governo» efectivo.
O s rasos, ou de m ãozeira, (I) temp oreiros e d e dias, co m põem a q u a se t ota-
lidade e, em r egra, sempre se ocup a m DOS t raba l h os ordinários , so b as ordens e
vigilância do abegão e do sota . S ã o a massa a n ó n i m a das centenas de indiví-
duos que se s u stentam d as herdades. D e la s saem t odos que p or m érito ou favor
a scen d em a «gover n os» ou cabeças, e nela rastejam sempre muitos outros mais

- 7fj, -
ATRAV t. S D O S CAMPOS

humildes e infelize s qu e nunca l ogram m el h or posto. O g an hão raso é simples-


mente máquina de trabalho, p ara qu e 56 se exige robustez e um bo cado de
compreen são. Ganha pouco em relação 8 0 S q u e o mandam, mas n ão se sente
assoberbado p or i ncu mb ên cia s difí ceis. Trabalha s e o mandarem e fiscalizar em :
se o deixarem, como n ão t enha brio exc epcion al, mandrda à g ra n de e s em
escrúpulos.
De qualquer maneira em lhe dando a s olt e, s ó pensa em si, se pensa. O s eu
viver é tã o humilde e Ig n aro que lhe n ão con s en te cuidados. P ar a que, se está
cônscio de que nunca passa de gan h ã o, sem esper an ça de subir I. " E. assim
adquire uma r ud eza d e independência e desassombro que bastante se acentua
quando o pes soa l escasseia. I sto pelo menos no s de id a d e adulta, n a fo rça d a
vida, que se julgam válidos para cu m tudo». E ste eum tud o» q ue r dizer que s e
consid eram aptos a b otar mão de todos 09 s erviços do ca m po, qu e são d e UiO
e costume.
Fo ra das s em en t ei r as outonais e das colheitas, em que tudo a cod e a
ocupar-se n a s g an h a r ia s, no r estante d o ano a melhoria d o pessoal deixa as
lavouras para servir de jorna. nas lenhas e cavas.

Maioral de m ul a s Encarregado principal das parelhas d e muares que traba-


lham ao ca r r o, ar a do e grade. C om o emp resa de r es pon-
sabilidade i m porta n te, es colhe-se p ar a ele homem prático d e besta s, cav ezado a
arrearas», com ta cto para dar saida aos serviços e tino para mandar. Tomando
à sua conta os outros carreiras, d estina-lhes o trabalho, fiscalizando -os no tra-
tamento do ga d o e n o mais q ue esteja so b as suas vistas.
P ela sua p arte lida igualmente com uma parelha - 8 melhor, na maioria
dos casos - colocando-se no lugar da fren te.
Com pet e-lhe mais: d e a co rdo com o lavra dor , distribu ir a s p arelhas pelos
camaradas, d e m odo q ue as unhas, g eitc e a.rtúcia de cada u m, corres pondem às
aptid ões, instin t os e a preço dos ani m ais qu e se lhes confiam. Alterar o empar-
ceirame n to das parelhas q ua ndo as circuns tâ ncia s acons el h em e com prév ia
consul ta e ap r o va çã o d o am o. S er m adru g ad or na «hora d e a g ar r a » e d es pa-
chado nas ca minh a das e na lavoura .
R epara r no n ú m ero e i m por tância dos ce rr eg uio s d os géneros q ue rra ns-
porta por si ou pelos seus imed i at os, para dar con ta ex a cta ao amo .
Cuidar do arraçoa mento e li mp ez a do gado, e bem assim de o levar e man-
dar ir ao ferrador por ocasião das folgas e q u ando seja indispensável. Fazer o
cachaço às parelhas (tosquiar-lhes o pelo do pescoço), e lembrar ao lavrador a
conveniên cia da tosquia durante os respectivas épocas ( pr im a ver a e o utono).
Participar-lh e igualmente qualquer doença, manha ou aleijão que apareça em
uma ou outra muar. Ama nsa r as serrej.ras, educa ndo-as com p aciência, se não
se incu m be a amansia a o utro. Z elar pe lo asseio d a est rebaria e pela conserva-
ção dos carros, ca.ngas e mais utensílios - cabrestos, burn is, mantas, apeircs,
barr igue iras, arreatas, etc., etc.

- 75 -
A T RA v t s DOS CAMPOS

o m aioral da s m u las ga n h a an ualmente umas oito a d ez m oedas, (38$ 400


a 48$000 r eis), u m moio e oitenta a lqu eir es de t ri go, s ear a d e t rês a q U 8b:O
al qu ei res ele legumes e um a o u du as car ra das de len ha, s en ã o toda a que p re-
cisa para se u consu mo. G a n h ando dinheiro so mente. r eg ul a aí por 80 a 90$ 000
reis o u mais se a p ensão é grande, q u ero diz er se t em mu itas parelhas e car-
reir a s a diri gir.
Entre o ma io ra l d as m ul as e o ab egã o t orna-se freque nte certa riva li da de,
result ante de a m bos serem «gover n os » e n ã o manda r um n o outro. O abegã o
apregoa que as pa r el h a s comem m uito e trabalh am po uc o ; o maioral farta-se
de di ze r, que as m ulas anda m s emp r e Du m sa r ilh o e são a r odilha d e todos . . .

Ajuda do maio r a l das mulas É o s ubstit uto do maioral para tod os os efei-
tos . C omo ele . t ra balha i gu al m en t e com uma
parelha boa , cum peindo -Ib.e coadj uva r o s eu chefe e camarada em t ud o q ue lhe
est eja a o alcance. G a n ha un s 72 a 78$000 reis an u a is, ou menos em dinheiro e
coisa d e 30 a 40 a lquei res de t rig o.
G era l m e nt e, o aj uda costum a ea n d ar» com a pa re l h a que pucha a o carro,
de cómodo pessoal pa ra o l a vra do r e sua fam ília . E sta circust ân ci a, se p or u m
lado lhe cer ceia um po uco as fol S8s d os d omin gos e o o briga a t ra ja r m el h or
Das oca siõ es de sai da s com os amo s, po r outro , p ropo rci ona- Ib.e muit os mais
di as de buen e , d esf orra ndo-se à g ra n de, com [a rtas co meza inas in eren t es à
ocupaçã o . S ai r com o lavr ador e s o br et u do com a la vradora, a vi si t ar parentes,
o u a r om a ria s e com pra s n a ci da de, é caso pa ra bater p al ma s. E tanto ass im q ue
o ca rr eiro de parelha escolhida para esses acto s é semp re in v ej a d o pe los com pa-
nheiros. S e p or v en tura a missão s e confia a outro que não se ja o ajuda ou o
m ai oral, ma is se a gr ava o despeito. S a b em p erfeitamente o qu e aquilo de ixa
para q uem go sta de trabalhar po u co e com e r bem.
Uma p echincha , q ue o arvorado em co chei r o procu ra conserv ar, e fa z en d o
a s vontades» a os am os. Que é como quem diz ser «bem mandado», dili gen te
e sob re t u do e fe iço a r -se a os m en inos da ca sa , entretendo-os com l ér i a s e festas .
Com ta is r eq uisit os não perde a papinha de conduzir o s a mos e vários
adv errtici os, de qu e recebe boa s es pô rr u le a. C om o o nã o hão -de inv ejar os co m -
p anheiros I Esta ac umulação d e ca rreiro d e tra b alho asrícola e cond utor de ca rro
para có mo do pesso a l , só se usa nas l a v oura s pequenas e nas medíe.nes, N a s
g rande s, há ca rro e cria do própri o para transporte d os l a vred ores e fam ilia res.
O ajuda ga n h a uns s e te n t a e dois a se te nta e oito mil r eis anuai s, ou me -
n os em dinheiro e coi sa d e 20 e 40 a lq ue ir es d e t rigo .

C a r reiros E mb or a es t a den ominação eeie t om b em comum ás d uas entidades


(1)

ult imamente referidas, emprega -se con t u do de preferência para


indic a r os im edi at os a aqu eles, 05 ca rr eiras r asos, que andam e tra balham com

(1 ) M.. J.I~ ;,o', 11.. . chun m Doa cODulhoa do Cruo, Alter do Chio. O",lf OI.

- 76 -
ATRA vtS D OS CAMP O S

parelhas sob a vigilância e dire cção dos encarregados competentes . A uns


e ou tros também s e lhes chama a l mocr eves .
Cada simples car re iro gan ha aproximadamente uns 58 a 65$000 réis anu ais.
Todos, i n clui n do maiora l e ajude, untam os rodados do s res pectivos ca r ros,
e todos t rata m e li mpa m a pa relha co m que trabalham . Na pri m a ve r a, t em po
em que as bes tas se su stentam a a lcác er ou verde, d u rante a n o it e, es se t ra t a -
ment o fa z- se po r escala entre t odos os carrei ros, fica n do u m de plantão em
cada noite. E de manhã cedo. «a n t es d e aga r r a r em», vão ceifar o ve rde d e qu e
precisam.
N o mês d e maio, se as parelhas pa ssa m a s n oit es «8 prado», d ormindo
e com endo ao ar livre no ca m po, como por pa rt es s e u sa a gora . os carreiros
pernoitam próximos, ficando um de pla ntão a gu ar dá- la s. Se isso se não
in cumbe a gu s r da esp ecial, o que é de m aior con ven iê n cia .
O s ca rreiros e parelhas fol gam nos mesmos dias q ue os gan h õe s, s a l vo
quando surgem afa z eres u r gen t es. inadiáveis, imprevistos ou extraordinários.
P ar a s emelhantes casos não h á d omingos nem dias santos . Em com pen sa çã o
passam o mais do tempo. repim pad os na tale ira dos carros «com os p és no ar.
no dizer d os seus émulos gan h ôes, qu e assim os comentam vendo- os de ta l
modo. E se vão de p é. muito direi t os e fir mes, sobre os car ros vaeios, em d oidas
corr im eçs s, como usam {requ entemente, os out ros q u e mourejam co m o seu
corpo, mais lhes gaba m o ofíci o. Os ga ba d os vibram. en tã o arreatadas t ezas
sob re as p a relhas q ue dirigem e a correr ia to rna -se vert iginos a. para m eis l hes
realçar as peos ápíe s equilibrista s. P i mp on ic es imprudentes, às vezes fun estas•

• •
Car pi nteiro s O cupam-se na constru ção e concert o de ca r ros, arados e demais
alfa iais e gticol as de m adeira.
Além d os afaze r es profissíone ís enca rr ega m - se d e outros estra nhos d e
pequena dem ora, co m o po r exemplo a medição do cer ea l para o moleiro reduzir
a farinha, e o s eu p eso &0 cheg ar d o m oinho. ( 1)
O u t r or a os ca r pi ntei ros comiam à mesa do lav:rador. H oj e comem à parte,
alim entação igual à dos familiares do mo nte, melhor que a d os se r vi çai s do
campo.
N o verão al ém do almoço, jantar e ceia, merendam às quat ro ou cinco
hora s d a t a r d e.
Nuns mon tes p ernoitam d e portas adentro em leit o co nf ortável, ou tr os
dorm em n a cabana, em t ar i mba pro vida de colchão de lã.
A s gr an des lavo u ras o cu pam d oi s ca rpi nteiros em todo o ano, as m edianas,
remedeiam-se com u m efect ivo. e a s peq u en as s erve m-se também com um q u e
trabalha à s s emanas, alte r na da mente, em duas ou mais casas.

-77-
ATRAvt s DOS CAMPOS

N a época do ielqueio (d esba ste a machado das madeiras a em p r eg a r ) é Ire-


q uente a a quisiçã o ext raor d i nári a de ofici al a dias.
O s carpinteir o s a nuai s vencem a soldada a 100$ 000 reis aproximadam en t e,
e comid s , é clar o. Justos « 8 s eco » com o s ó por excepção su cede, ga n h am un s
180$000 r eis po r ano o u mais.
P or um ou ou tr o siste ma, se t a mb ém vencem trigo na ei ra e forra de égua
ou d e burra, adições de suma vantag em que 56 o bt êm os mestres d e co n fia n ça ,
de aptid ões n otórias, - a soldada a di nheiro, d imin ui basta nte, m a s menos do
equivalente à tmp or tâ nci a d os porvenrcs. E tanto que se usa calc ular o valor
d os pastos de uma égu a entre 18 a 20$000 rei s. e os de um a b urra a í por 6 ou
8$000 rei s, qu a n do está a v er ig u a d o valerem ambos mu it o m a is.
O s que trab alham de jor nal, sem o u co m pe rmanênci a fixa, vencem 300
a 340 r eis e co m id a , ou 500 a 6So reis secos, co nfo rme a quadra d o ano e as
nec es sidades.
O s carpinteiros g o z am de certa consideraçã o, j á p or se rem menos rudes
q ue os hom ens do campo e vestirem com out r o as s ei o, j á p or s e darem ares d e
a lg u é m, s u per io r à ralé m iu da. C o m o e o fi ci e is de ofício», não r ep u t a m favo r
o tra t am en t o d e «mestres» que t odos lh e dã o. M es tr es carpinteiros. mas de
obra g ross a .., «de machado e enxó » para s e não conf undirem com os de «o b r a
:6.na». No concelho de C a m p o M ai or nem carpinte iros de macha do lhe chama m .
C onhecem -nos por abegões, dando a o v erdadeiro abegão, o n ome de epeiredor.

Co z inheiro Às suas obri ga çõ es d ivergem de u mas pa r a o utras lavo u ras. Se o


- l a v r a d o r e sua famíli a reside no mo nte o cozinheiro ac umul a as
f u n çõ es de am a ssa d o r , sempre qu e o m ovimento da cozinha e ama ssilho não ex i-
jam doi s hom ens, um para cada mister. S e porém o amo reside fora d a herdade,
a a cçã o do criado, com ou sem auxílio de amass ador, é sensivelment e ma ior e
mais ho nrosa . Por que nesta hipó tese não se r es tring e a fazer e ssordas e olhas
mas ta mbém é o encarregado do mo n te, fiel e di spens eir o d e t u do q u e nele s e
en cont ra de po r tas a d entr o , e a i n da no exteri or. co mo galin has, bestas d e carga ,
cev ões, et c.
à ss im, a lém d a cozinha e asseio d as vasilhas, a via m ant imentos, recebe a
f a rinha d o mo lei ro, entrega rações, cuid a da s g a lin h a s, d os po rcos d o chiq u eiro,
da. b esta. d e albard a. d a condução d o l eite d as ca b ras e do Febrfco d o q ue i j o
'res p ectiv o. S e pode. vai nas s eg u n das- feir as aos me rcados d e Elvas, a vender
o vos, galinhas, queijos, et c.
N est es s erviços é coadjuvado po r u m paqu ete (rapaz de m andados) o u p elo
ama ssad or (have n do-o ), ambos seus s uboxd in ados. E igua lm en t e o auxil ia a
sua p róp r ia f a mília, s e r es i d e com ele no monte, com o aconte ce em algu m a s
lavouras, em b ora po ucas.
O lugar d e co z inhei ro co m a per missão de ter a m ul h er e :6.lh05 co nsigo no
m o n t e, é bastante cubiça d o e fa z com q ue o indivíd uo se s u jeite a u m a sol d a d a
pequen a na apar ência, p o is q u e n a r eali da de tor na-se gra nde por i n cl uir o sus -

-78 -
ATR Av tS DOS CAMPOS

tento de duas o u t r ês pes soas mais, o que tra duz be nefício valioso p a r a o ser-
viça.l e onus d e v ulto para o a mo. M a s este p rej u ízo fica em parte compensado
pelo ass eio , ordem e importân cia da criação d e a v es, qu e s e D ota DOS m on t es
onde vivem mulheres, incomparà velm ente su p erior à do s só h a bitados p or
h om ens e rapaz es .
C om o quer que s eja. o cozi n h eiro a r vorado em chefe do mont e, j ulga-s e
com r a zã o creat ura bem cotad a. e como t a l t oma certa superioridade so br e os
que o rodeiam. Isto e o co nceito que el e me rece a o am o. de sp erta a inveja d a
criadagem vulgar, que o m alsin a quanto pode. M a s se lhes pre par a r b em
a comida. os aleiv es caem por terra com a defesa ca lo r osa dos sensatos e j usti-
ceiros.
Entr e os cozi nheiros dos montes enco n tra m-s e tipos curiosos, or iginais.
U m conheci, rab uiento p or sinal, q ue tinha pancada p ara a a strologi a . Além
de con h ecer e disc utir a f u ndo a n omencla tura popular da s est relas, no que
falava todas as noites, - ta mbém se entret inha com a s p r evisões do temp o,
dando sota e ás a o s p a rce iros da es p ecialidade. À quil o era m elhor qu e o Borda
d'Água. Pel o q ue d izia, di spunha d e auxiliares precioso s p a r a os se us vaticínios.
Como p r incipais, aponta va cert o galo preto, d e crista r omana, o ve lho burro
de lançamento - o B r an dã o - e a Farrusca, s at orra fei a e aris ca , qu e se assa-
nh ava por qu alque r coisa . Assim, em o galo cantando efora de horas», duas
no ites consec utivas, e m o bu rro apa recen do d e orelha m urcha, e a gata s e n ão
arredando da chaminé, d e rabo vo lta do para o lu me, - palpitava-Lh e mudan ça
de tempo. E se a es t es pr enúnci o s con iugados r eunia outros , como rabiarem-Ihe
os calos, bocejar e d oere m-lhe 8S costel as - ecoi se co m o ponta de Oato»-
ent ão, esta va sabi do, e ra chuva a câ n ta r os. Se não viesse nesse dia, v iria
dep ois, ou no outro q u arto d a lua. E ac resc enta va, cor r oborando: -«As p urgas
n ão obram log o . . . e as l u as f az em enfeto três dias ant es e t rê s aias depois . . . »
O utro havi a com b oss a p a r a os ditos enfá ticos, se ntenciosos, qu e lhe davam
foros de tribuno entre os ga nhõ es a q ue m impi n gia as arengas. Probo, adouto-
rado e p a rlador, er a igualme n t e forreta e sovina. Depois de esta r doen te p erto
de três anos, indo ao h ospital como enfer mo me nd ig o, m orreu em ca s a de uma
en teada, coberto de farra pos, mas co m vinte libras no bolso.
P or últim o alu dir ei a te rce iro, veesefedcr de fama, q u e se entretinh a a can-
tar o fado e a esgerrede, quando os afaz eres lho permitiam .
.. .... .. ..... . .. . . . . . . . . . . . . ... . ......... . . ... . ..... .. . ... . . . . ........... . ..
Ent re os set viça is do campo, o cozinheiro é dos mais difíceis de encontrar
em t ermos. Não porque ten ha de preparar igua ria s finas, es tá claro, m as por
muito convir que esteja à prova d e fiel e assea do, m ôrmente se a cumula as
fun ções d e encarregado d o m onte. P or con seg ui nte, embora seja fácil a sua
&C{uisição, poucos reunem os p redicados n ecessários.
A sol dada varia con fo r me a p ensão e as vant agens inerent es. Os de m uitos
encargos e de b oa re put ação, sae m -se po r 72 a 84$000 r eis anuais. Hã -os qu e

- 79 -
ATRAVI'.S DOS CAMPO S

vencem seara de le gumes. obtendo por obséquio outra de batatas ou favas nos
a r redores do monte. de que eles próprios cuidam nas horas vacan tias.

Ama ssa do r Este cargo t ambem requer indivíduo probo. com asseio e prática
- do ofício.a que o desempenha com ac erto. entra no número dos
que o amo particularmente aprecia e dos que mais procura conservar.
a amassador cumpre-lhe fazer tudo que diz r espeito à armazenação e penei-
ração da farinha e ao amassilho, tendição e cozimento d os marrocates (pão de
centeio) e das perrumas (pão de sêmea para cães).
Estando o lavrador no monte, também fabrica o pão branco para os amos,
e o ralo para o restante pessoal caseiro, como carpinteiros. criadas, etc.
N o p reparo das difer entes va r ied ad es de pã o. e sobretudo no dos marro-
cat es, precisa ter a máxima cautela. a bom fabrico imp õe -se tanto po r convir
à alimentação dos serviçais. como para evitar q u e el es os desperdicem e estra-
guem de pr opó sit o, o que geralmente praticam qu a n do lhes não a grada. Sabe-se
que em o marrocate sendo ruim, os gs n h õ es s6 lhe co m em a côdea. inutilizan-
do-lhe o miolo. de que ch egam a fazer bolas que espetam nos chavelhos dos
bois, como protesto d e justo e insofrido ressentimento.
Na actualidade é raríssima. semelhante m anifestação. Hoje ex istem melho-
res amassadores e todos porfiam em manip ular com apuro. O que isso não
consegue deixa o lugar, se antes o não despedem.
A soldada oscila entre 60 a 72$000 reis anuais, te ndo o u não seara de
leg um es e p orventura u m a ca rtada. de len ha .

Paquete É o ra pa z dos mandados, que s e ocupa em ir aviar encomendas às


localidades e em cond uzi r o leite das cabras para O monte, se O bardo
fica perto. T a m b ém lhe i nc umbe o acar reto da águo. para os gastos caseiros. se
isso não é feito por parelha de muares, em carro de pipa g ra n d e, co m o geral-
mente se u sa .
P a r a a grande maioria dos seus afazeres trata e s er v e- se de uma ou duas
bestas que trabalham de albarda e carga, ou de tiro. em carrinho de varais.
Best iaAas de pouco valor, que se vêem numa fona com as diabruras d o rapaze-
lho. C om presunções de escalda e atrevido - burro ou muar que lhe caia s ob
a s pernas, por ta njão e paciente que seja, ele o despertará pendo-o ligeiro e sen-
tido. Sob pena d e o zurzir sem piedade às ocultas dos su perior es. São assim 08
paquetes. À convivência com muita g en te torna- os ladino s e manhosos, per-
d end o o feitio bronco dos rapazes de m enos r oço.
M anda let e por todos mand ado e esfregão de mui tos. por vezes se insurge
contra a tutela" e mais se experimenta o castigo de um soco.
N essa altura há-os tão atrevidos, q c e não hesitam em responder com
a frase de efeito, que por conceituoso, é bastante conhecida . É a seguinte:-
eBata à vo n tade} . . . mas olhe que os ch spturos cr escem, e as azinheiras min-
guam . . . » À o que, às vezes, lhe contestam: - • Pois, sim . . . mas enquanto OJ

- 80 -
PE SS O A L DA L A VOU RA
(E ,culturas cm maddra de Cap eI. c sn....)
J • O nquciro: 2· Mulher a. monJ.; J - Ceifdro ; 4 - G.Janhciro
ATRAv t S DO S CAMPOS

chsparros não crescem... 85 azinheiras é que v ogam . . . » Ou p or ou tr a: -


.Está bem .... m as ol h a q ue os ch operros pr ecisam de crílJção !.. . E então
8p3.nha lá mais este para te ires criando ... que a az inheira por ora n ão min-
gu a •.. li> E em seguida o h omem fig urado po r a zi n hei ra , pespega n o suposto
chapan o. um novo m urr o, q ue ma is o enfure ce.
E sta rudez a d e t re to e a m odéstia do em preg o. faz co m que o paq uete
pronto a bo rreça o lugar. À í, aos IS an os, mal so n h a co m bri os de homem
aspira a car re i ro o u g an h â o, o que a6 n al conse gue. meten d o empenho ao am~
ou 8 0 9 fi lhos. co m qu em brinca e melhor se en tend e. S e o n ã o promovem,
mosca p ela ce rta, b atendo asa s para o n de l he che ir a coisa melhor.
O paqu ete gan h a en t re 1$800 a 2$000 r eis m en sais. S en d o muito n ovo e de
pou:o p résti mo, ven ce 1$200 a 1$.500 r eis.

Criado dos cavalos Tratador da s ca valgaduras d e sela e ga r a n hõ es, a cumu-


lando as vezes de picador, m o ço de recados e de compa-
nhi a do a m o, n as j ornad as distantes. a cavalo. Tamb ém em algu mas ca sas fa z
de ferrad or, se tem luzes d o o fício. Homem en6.rn, d e vária s lidas. conhecido
por cri ado g rav e entre a maioria d o pessoal cam p ôn io, que, se o pretende ridi-
cularizar ou deprimir, tamb ém lhe cha ma ceveliste, corn o qu e a confundi-lo e
emparcei r â - lo co m O Isn çerote,
Ant es em to d as a s lav ouras d e g ra n de m ov im en t o, havia essa entidad e.
H oj e, em po uca s o u n enhumas se encontra com o era há 30 an os. O s encargos
in eren tes vêe m-se ag ora d es empenhados e divididos por várias p ess oas. O ens in o
dos po ld ro s confi a - se a um p ica d or de direito ou de fact o; o ferrador de profis-
são ferra as b esta s, e o t ra ta do r tra ta d o ga do e faz de cocheiro se há caval ga-
du ras pa ra o carro d e cómodo pesso a l. F or a disso, t end o va gar, t a mb ém se ocupa
em t ran smitir re cad os.
D e qu a lque r modo, pelo sistema anti go o u moderno, coc h eir o ou criado d e
cavalos, o s erviçal esse ganha a í entre 4 a S$ OOO reis mensais, se o serviço é
pouco . I sto. r e pito, nas casa s d os la vradores gra n d es, aba stados. Nas dos peq u e-
nos, nu n ca h o u ve, n em há, tal em prego.
O s afaze re s q ue l h e r es pei tam, e q ue nes tas circ u nstâ ncias cos t um a m se r
reduzi díssi m os, d es emp enham- se, melh or ou pior, e de f ugida , com os d iferentes
cr iados d o m onte, ou com um d os carr eiros. Das cavalga dura s chega a en cerre-
ger- se o lavra dor o u os filho s, n a fa lta , aus ência ou imp edim ent o d o paque t e.

Roupeiros São os ho mens q ue se acomod am pelo t empo que va i d e m a r ço a


fins d e ju n h o, para. a queijeira d o a la vão o u e lev êes de ovel h a s,
isto é pa r a o prep a ro e fahrico d e lacticínios d e t al espécie.
À os ro upe iros cumpre diària me n t e : ire m , em besta d e ca rg a, coadjuvar os
alevoeircs nos dois o rde nhes d e cada dia; por meio da mesma be sta, pr eparada
com golpelha e cântaros, conduzi r n ela o leite, dos a p ri scos pa r a a q ue ijeira ;
ex ecu tar com rigoroso a ss eio e caute la , O t emp er o e fa brico d o que ijo, atabefe e

- 81 -
ATRAv t S DO S CAM P O S

req uenoes : chapotar a chamiça e fazer o lume; lavar e limpar a barreleira, s in-
ChOB, asadas, el guidares e m ais utensílios; esfregar o t a ch o d o a tabefe; varrer
e l a va r a ca sa da q ueijei r a j conduzir o que ijo para os caniços eccb u gadores e
dar-lhes a s vo ltas e limpezas de q u e precisem, a rejando -os ou n ã o, confo r m e 8S
ci rcun st ânci a s, etc. I
S e o ala vã o o u nlav ões reunem u m a s 600 o velhas apr oximadamente e o
q ueijo se molda p elo tipo grande. q ue req uer fabrico mais demorad o e cautel oso
q u e os o u t ro s peq u en os - os r o upeiros cos t u m a m s er doi s.
F abricando-s e queij o míudo, ou mesm o grande. desde que a s ovelh as n ão
passem de 300, ba sta um .
Para ;; carg o em q u es tão. requerem-se homens que além de sabedores, sejam
essencialmente e sseados : q ue s e l avem {requen tes vezes por dia e mudem de
roupa a mtu d o. Só assim conseguem atenuar o fé tido que ex a la m , paz efeito d a
ocupaçã o. Cheiro t ã o repelente e activo qu e é d e pro voca r vótimos a os es tr a n hos.
U m fedor pior que o d as sentinas, prfncipe lmente paro. q uem n ã o gos ta de q ueijo.
D os que preparam com apuro o clá ssi co q u eijo grand e, di z-se q ue t êm «boa
mão d e massa» . O q ue eles atr ibuem, uns, às suas aptidões , ou t ros, à sorte.
Quando sobre o assunto falam com o lavrador, ob servam-lhe: - «A s orte é
:minha j mas a gan ân cia é sue».
Se p el o co n t r á rio o qu eijo sa i inferior, nenhum roup eiro s e con fes sa culpado.
Àtribuem o p rec al eo ao calibre do ano, ou 0. ••• mau olbado d e a lguém q ue os
quis de rrotar!. .. O s r oupeiros de fama ganham de sete a sete mil e quinhentos
reis por m ês e u m queijo gra nde po r toda a ép oca .
,
J Leiteiro R a pa z que p ri ncipal men te se em prega, com uma besta, n o transp orte
d o l eite d as ca bra s, para ve nda n o mercado de vila ou cidade: C om
este carácter exclusivo, é oc upação q ue s ó se vê n os centros de lavoura distantes
do bardo das cabras e da povoação a que s e d estin a o leite. Nos outr os próxi-
m os , é d esnecessária semelhante entidade, que se supre perfeitamente com o
paquete. O l eiteiro pod e g an h a r mil e oi to cen tos a dois mil reis por m ês.

Per u nze iro Rapazinho de 1 0 a 1 2 an os. g ua r d ado r dos perús n os a rredo re s do


m on te . P ela idad e e natur ez a d o ca rgo é o m a is humilde d e tod os
os serviçais. De cana em punho. cumpre satisfe ito a su a obri ga çã o que, na maio-
r ia dos casos, é de grau para paquete ou ajuda d e ge n e.deíro.
G anha 1 $ 000 a 1$200 r ei s mensais.

* * *
Hortelão Encarre gado d os serviços da h ort a ou quinta . anexa à la vou ro. I gual-
m en t e s e incumbe de ir aos mercados di ários da s p ov oaç ões p ró xi-
m as vender a h ortaliça e frutas q ue sobe jam d os ga sto s d a ca sa . V ai «faz er
vendas» ou «faz er pr a ças», termos que igual m ente se empregam pa ra O fim
m en cion a do. G an h a aproximadamente cinco m il r eis m en sais.

- 82
ATRAv t S D O S CAMPO S

Sem ea d o r A comoda-se ex pressamente para a s ementeira d os cer ea is, a razâ o


d e sete o u o ito mil r ei s por mês ou men os u m p ouco. se con s egu e
ganhar ta mbém uma searinha d e tr ês o u quatro alqu eires de semeadura. como
alguns obtêm.
Em cer tas «casas» evita-s e a a comodaçã o de criad o p rópr io para se mel h a n te
serviço, por O de s em p enhar o sote O u outro criado anual. S eja q u em f OI, qu and o
as junta s na lavoura sã o poucas. o se m ea do r embe lg8 e s em eia a lternadamente,
evitando a des peaa de um ercb el ãad or.
O q ue é d esembara çado e n ã o embelge, s emeia à vo n tade pata 20 a ~O ara-
dos, como a t erra s ej a limpo. e em s az ã o d e d espacho .
A pesar de haver b astantes campónios q ue s e julgam bons sem eadores a
experiên cia demo n st ra esca sseare m os que re a lmen te o são . P o r que o facto d e
sab er repa r tir a s em ent e po r forma que à na scença não r evele d efeitos de
sementeira, é habili da de que p ou cos p oss uem.
Já m ostr a ent endimento o q u e tem a ce r te za na m ã o e bom gol pe d e vista,
sub ordin and o a es pa l hação à s con diçõ es d o dia, d a época e da t erra . O que s e
regula po r esses preceitos ess enciais, muita s vezes se ilude e enga na , q ua n to
m ais aq ueles a q u em fal ta o preci so crit ério. À verdade é q u e s emear em termos
de a sea r a n a scer b em r ep artida, se m exager os d e basta ou ra lo, na perfei ção de
se elogiar. t orn a-s e coisa ditt cultosa pelos mu itos i nco n ven ie ntes qu e a n u la m
ou tr ans tor nam os esfo rços do s em ead or, m esmo qu ando a f alta n ã o d er i va d e
imperícia ou imprevidência sua .
C on sequ entem ente, os sem ea d or es de fama são d isputados p el os lavradores
que, à porfi a, procuram a comodá-los. N ã o é para menos, se atendermos à alta
imp ortância d o seu pa pel.

Embelgador À ssim s e i n ti t ula o h omem q ue em belga para imediata semen-


teira, mediante o salário ou soldada d e um gau h âo. Embelge r ,
sign i6.ca di vidir a t erra em r ego s pequenos. e d es creverem fa chos larga s e com -
prid as, que s e ch a m a m bel gas. Servem para n ortear o se m eado r na distribuição
e espa lh ação d a s em en t e.
à embelga çã o é f eita com a jang ada de um p eq u eno arad o, m ovido p or
qualquer besta . Guia-s e ou encurta-se seg u n do a ceide d e terra ou a disposição
que tra z a la voura.

Corta-ramas G a n h õ es o u trabalhad ores em pr eg a dos na limpeza das a zinheiras


e sobreiros. V ej a- s e o parágrafo Co rte s, do capítul o Montados .

Melancieira ou meloeiro Encarregad o d a g u ar d a ria. e tratamento do m elan-


cia l o u m eloal. se não de a mba s si m ul tân eamen te,
quando os do is estão reun idos, com o s e u sa bastante, p re do m i n an d o o primeiro
s obre O seg un do .
Dantes o m elancieiro ( Ta um velh ot e qu a se ín v ál.id o, de m ei a m oe d a o u

- 83 -
ATRAv t S DO S C A M P OS

três mil reis pOI: m ês. H oje, que os m el endais aumentara m imenso de impor-
t ância e extensão - a sua g u a r da ria incumbe- se a h omem a p to, n o vi gor da
vida, q u e ven ce cinco mil r ei s p or m ês e co m edo ria s, de sde qu e entra e m a b ri l
ou mai o, a té 80 leva nt e fin a l da fruto, a í p or s etem bro f ora a pr incípi os de
outubro.
Cumpre-lhe tamb ém o s eg u in te : proceder às sementeira s r espectiva s, se
antes es não realizou a ganharia ou ou tro s ; ressemear a s ca sa s falidas; des-
bastar as melancieiras de boa nascença e transplantar a s a rred ias e ven t u reira s
para onde haja faltas ; ancinhar e desg eemee r a t erra por oca sião d a cava e 1080
atrás dos cavadores; arrendar a ancinho os intervalos abatidos por efeito de
chuvadas se guidas d e calor e vento, e b em assim 8S casa s que so fre r em d o
mesmo inconveniente, servindo-se do sacho para estas j raspar à enxad a a erva
nascida d ep ois da cava: cuidar da extinção d os f ormígueiros, r o m eira e o u trOS
insectos nocivos, queimando e enterrando a formi ga j n o m esmo p ropósito ca tar
a miudo o ceseeme todo, arrancand o e en terrand o a s f olha s e matas in vadida s
de piolho e da mela ; descastelar (I ) e ca rregar o me l ão ; f a z er enfim tud o q ue a
exp eriência acon selh a para q u e o mela n cia l triun f e d a s mil even t u a lidade s a
que es tá suj eito.
Em to dos os s er viços men ci o nad os, o m elanci eiro cost u m a ser coad juvad o
por h omen s o u mulheres, em núme ro co rres po n d en te à g randeza d o melan ci a l,
e à u rgê ncia d o s er vi ço.
Não é empre go p aro. d escanso braçal, pelo m enos enqua nt o 8 f ormiga
aperta. Dep ois, d esde que a fru ta começa a desigualar, q uero d izer d esde que há
melancias inchadas a distin guir em-se d e l onge, aguilhoando o ap etite d os tran-
seunte s, se diminuem ou cessam os cuida dos cul t ura is , surgem os da s co lhe itas
e aumenta o da fi scalização e g u a r da . A s co lheitas ficam sob a s ua direcção,
embora com o auxilio de tant os homens co n h ec edo re s q u a ntos seja m p r ecisos
para se despa ch ar pela fres ca. A g u a r da r ia , tomada a sério, obriga a v igilân cia
co ns t a n t e e at enta.
Os m el ancieira s ergue m no l ocal da obrigaçã o o competente cb oço, com seu
scmbr e cbo ex t erior, onde el e e a fa milia p assa m a r esidir. Dura n te o d ia , a
m ulher e os fi lhos, à so m b ra d a alp endrada, ol h a m p elo m elancial, a u xili ados
p el o i nd is pe nsáve l cãozin ho. A o m esmo t em p o, a mulher trat a ig ua lme n te da
co m i da e d a costura , enqu a n to que os filhos espojam-se e ca b riola m pelos arre-
d ore s, al amh azan d o- s e d e mela n ci a à far ta, se p orv entura jã se col he. E le, o
m arid o, se os cuid ad os d e cul tu ra o u de colhe i ta o não e nt ret êm, d orm e à
grand e. lá dentro do clxcço, pa ra à no ite v igiar, mu n id o d e ca rabina e a co m pa-
nhad o do cão . E ste é que s e to r n a o g u a rd a pri n ci pal. O me la n ciei ra p o r v ia de
regra e n a s h oras de m enos p erigo, com a espingarda ou co m as a rm a dilhas d e
cep o, caça as lebres, rap osas e r estant e bicharia, qu e a p arec em no s íti o. atra id os
p ela g u lod ic e. Mas o dano m ai or q u e mais lh e cum pre evit a r são o s fu rtos d os

(I ) C'P, r. di.-II 1m .I.um .. . 0.....

- 8" -
A TRAVEs DOS CAMPOS

bichos de dois pés. gente nova das ganharias estranhas, que se pelam po r d e
noite assaltarem impunemente os me lan cie is, quando a fruta escasseia e o calo r
a lembra . . . Se o melancieira os p ressente grita-lhes de largo e eles foge mj ma s
se o apanham descu idado, fer ram -lhe o cão. quando m enos o julga .
Em vindo a abastança , cessam Os assaltos. À fruta então abund a tanto e
d é-se com tal franqueza , que n i n gu ém pensa em furtá -la .

Oada n h e ir o s T om a m esta designa~ão os ho me ns q u e, d e em pre itad a ou a


jornal e com fe r ra me ntas suas, p roce de m a o co r t e ou Bad an h a
dos fenos. E m r egra n ã o saem da ga n ha ri a, ma s s i m d e en t re os qu e trabalham
como jornaleiros na s her da des e f or a.
Ao a prox i m ar- se a época, os q ue por S8 bedo res o u vocação se afei ço am à s
gadanhas, tratam de se emprega r aí, pa ra o q ue l arg am quaisq uer outros se rvi-
ços. Preferência que se justifica , por que nenh um l a b or mais r e n d oso se exe rce
no campo. T rabalho violento decer to, que nem todos sabe m execu t a r, m a s t am-
bém de re mu neração superior B. out ros de esforço semelhante.
Por conseguinte. compreende- se o interesse com qu e o cubiçam os en tendi -
dos, e os que o desejam ser, que para o fim a que se propõem ag rem i e m -se aos
4 e 6, de que o mais prático o u desembaraçado se a rvora em me aageiro.
Com antecedência ou na ocasião, o me ne ge iro apalavra com os lavradores
os· fenos que julga despachar com a sua gente. Em geral, um grupo de 3 a 4
gadanheiros, n ã o pode servir bem ma is de dois l a v r ad ore s. Mas os da ga da n h a
incumbem-se de qua n to se lhes fac u l te, im p ortand o- lhes pouco acabarem o u
n ão a tempo. O s Ia v rn do res p orém, indag am das for ças do gr up o e d as casa s
que já a justaram, e por i sso se r egulam. co nt r a t a n do a queles qu e m elhor o
podem se rv ir.
A fa i na d a g a d a n h a dura or dinà ria mente d esde vinte e tan to s d e mai o at é
Ens de ju nho o u princípi os de julh o. o máx imo. A s lav ou r a s d e muitos f en os
ocupam 4 a 6 gadanhei ros, n os 40 a 60 d ias de te m p or ada ; o u t ra s d e m enos,
basta-lhes dois a três em metade d o te mpo. e a lgu m a s u m o u do is. aí po r oito
a dez dias. E. até as há q ue d e ne nhum carecem po r des necessários.
As empreitadas ajustam-se a 300 re.is e comida o u SoO r eis secos. po r car-
rede de 60 feixes que, enxutos a rigor, pesam 4 a 6 quilos.
Este é o sistema corrente. preferido pelos gadanheiros, que assim, e em
fenos bem criados e espessos. despacham 100 e mais feixes por dia e hom em .
Nos ralos, que ninguém toma de empreitada , usa-se o jornal de seiscentos a
setecentos reis secos. De o rdiná rio, cada homem, não chega a co rta r uma
cartada.
Àpós um ou doi s dias de t o mb ad o. e estando enx u t o, o feno é en fei x a d o.
atado e enrilheire do pelos próp rios gsd anheiros, às ho ras da n oite e d a ma d r u-
gada dos dias qu en tes e estios.
Se está fresco, enfeixa-se a qualq ue r hora . E se chove a dia-s e a at ada at é
enxugar.

- 85-
A TRAVeS DOS C AMPOS

Enrilheiradores S a em d a ganha ria ou a comodam-se exp ressamente, guran-


ríadc-se -Ihes tod a a t empo ra da d o verão por cinco ou dez
to s tões mai,g por mês, so bre o que v encem os ganhões rasos.
N es tes termos ence erege rc .-se d e co mple ta r o se rviço das ceifas, reunindo e
enrilh eiran d o os m olhos cei fad os e atados pelos ceifedo res. C um pr e-lhes t erem
o necessário cuid ado a não lh es esca par em os molhos oc ul tos en t re os bambu-
r ais e a fa zerem boa en eíl he ireçâc, de r ilh eiros 8I8 odes e fir m es, q ue O vento
n ã o d errube.
O núm er o de en ril h ei ra do re s r egula- se pela qu a n ti dad e dos ceifeiros, espé-
cie da seara e suas condiçõ es de de senvolvimento. S 6 ex cepcionalmen te se ca re -
cem mais de dois. e muitas vezes bas ta u m, co a di uva do p elo tardi o.
C oncluídas as ceifas, os en r il h ei ra dores goza m u m dia de d es can so, i ndo
dep ois para o. gan h a rÍa até finali za r em a t em pora d a.

Tardão R a pa z ou home m que em besta ou ca va lga d u r a provida de cangalha s,


asa das e barris, transporta a comida e á guo. pa ra todo o pesssal da ceifa.
N os intervalos coadjuva os enrilheiradores. Ga n ha a soldada corres pondente à
idade e aptidões. C oisa de quatro mil r eis mensais , e prcx imadamerrte.
S e os ceifeiros são p JUCOS, o en r il h ei ra d or r espec tivo a cumula o enca r go de
tardão ou mentieiro, que também assim lhe chamam em algumas partes.

Molheiros R apazes já ta l udas, aj ustados oa tem po rada do ve rão para darem


m ol h os a os ca rr ei ras d ura nte o ac a rreto das searas, indo depois
para a ga n h a r ia, até ao S. Mateus.
Gan ha cad a. um 4$500. r eis p or mês, o u po uco menos. Nos a ca rretas de
se a ras d is tantes da eira, dispense m-se semelh a n tes auxiliares. C om o O ma ia do
t empo s e gas ta nas cam inhad as, são os p ró prios ca rrei ras q ue dão m olhos un s
aos out ros.

Guarda da eira C ost u m a se r h omem já decadente, mais ou menos i ncapaz d e


t ra balh os vi ol entos. O cu pa-s e ap enas em gua rdar os rilheiros
e os m o n tõ es de ce r ea l debulhado. P ara ta nto dorme de di a e vela de noite, n o
p r op ósito de impedir fu rtos e ou tro s actos de m alvadez, como i nc êndios, et c.
S er ve enquanto se faz a d ebul h a e ve nce u n s 3$600 a. 4$500 reis mensais.
segundo o s se us merecimentos e a r espon sa bili da d e. Que os há q u as e in válidos,
que ga nlmm meno s.
* * '!:

Ceifeiros Àparte as ceifas de pequena monta , desempenhadas por mulhe res do


s ítio nas p roxi midades da s ald eia s - os ceifeiros ou ceifadores da
quase tota lidad e das sea ras, são em g erEi1 ho me ns da Beira , que de propósi to
arribam todos os a nos a o A len tejo p a r a se oc uparem ex clusiva men te na sega
d os cer eais. Veia-se o capítulo R.at inh os. q ue todo lhe di z resp eito.

- 86 -
ATRAvtS DO S C A M P OS

Tosqu iadores Há uns para a tosquia d e muares e outro para o ga d o Ian igero.
Os primeiros são es pa n h o is guit s n os qu e, aos gru pos de dois a
três, tosq uiam , na pr imavera e outono, 8S pa:relhas de muares, ao preço d e 500
reis cada uma . O s s egundos, os tos quíadores de lã, em camaradas de iS a 20
indivíd uos, procedem de z onas da r eg iã o, com o E.lvas, Vila-Boim e Barbacena,
al ém de outros de long e, que vêm anualmente da S erra da Estrela e que por
isso se lhes chama serra nos. Todos tos quiam po r ajustes análog os ou sem elhan-
tes. Em ap erfei çoame nto são os ser ranos que p assam por me lhores.
Desde o fim de abril até meados d e junho (época próp ria), os tosq uiadores
demor am em cada casa tr ês a dez dia s, tosquiand o a 20 r eis por cab eça. i n di s ti n -
tamente, ou a 20 reis pelas ad ultas e a 15 pelos borregos d e amb os os sexos.
O lavrador nã o lhes dá co mida ma s s im O caldo para as so pa s do a lmoço. e
a er va ou pe lha q ue a s s u as besta s cons omem.
Cada ca m a rada tem o s eu m e na gei'ro, que no acto da tosquia ocupa-se
exclus iva me n te em enrolar e atar os v el as. Nu divisão d os Lu cr os entra no
rateio como qualquer tosquiador, tendo a vanta g em de comer por conta d o
lavrado r, em comum com os pastores, e o receb er um velo em cad a casa, ou
espôrtu la de SOo a 1$000 r eis .
M ana geiro e tos quiador es, dur ant e o s er vi ço, t odos se v est em de cal ça s,
blusa s e sa patos o rdine.r íasimcs, como os qu e m eno s s e estrag am po r deite d a
tosq ui a . O suco d a lã suja, emporca-lhes tanto a r ou pa, q ue o se u a specto n o
tendal é repulsivo e n aus eabundo. M a s a eles n ã o lh es causa nojo, tã o
habitua dos estão.
À de s peito da imundície que lhes escorre pe lo fato, é interessante obser-
var-Ihes a d es tr eza no manejar e ten ir cade ncioso das teso uras s obre o lom bo
das r eses. À s quais, apernadas e silenciosas, den u nciam n o mei go olhar u ma
certa sa tis fa ção pelo alijam ento do velo. t ver-lh es a alegria com qu e s e
sacodem e pul am . m al as dei xam em liberdade.
N o a fã d o despacho por vezes a teso ura go lpeia os pacientes animais, que
sofrem em silêncio O d escuido d o tosqu-iador. D escuido vu lgar que se remedeia
imed ia ta m en te. cu ra nd o a fer id a com fulí gem das ch a m inés, d e que se faz prévia
aquiaiçâo - «M oreno !» - gr i ta o t osqui ad or, vend o a r ez golpeada - «L á va
mor eno », r esponde o maioral ou qu alquer incumbido de ministrar o pó negro
para rem édio das f er id a s. E. im ediatamente o golpe é pulverizado com o tradi-
cional m oreno. Se o s go lp es s e repetem em ex cess iva notoriedade. o maioral e
lavrador re preendem os tosquiadores.

Co rdoei ros G ente d a Galiza, q u e em g ru pos d e d o is h omens e um rapaz,


passa m g ran de parte d o ano, nos montes d o Alentej o a fazerem
cordas, redes, prisões, etc., d e jun ça, ca belo ou linho, em quantidade correspon-
dente às necessida d es , co mo haja ex-istêncía de material cm abundância, espe-
cialmente j u n ça que, p or se r d e fá cil e econ ómica aq uisi ção, é o que mais se
empr ega n este género de fa brico.

- 87 -
AT R A v t S D O S CAM P O S

Todo o ma t eIiaI ne cessário pa r a a cor doar ia é fo rn ecid o pelo la vrado r.


a cabelo proced e d o q u e anu al mente s e co r ta das crinas e ca ud a das éguas
manadias e do de spon te dos rab a d a s d o gad o vá cuum; a [ un ço, da q ue se ceifa
nas ribeiras do có mo do , o u da q ue s e o btém g rá tis e po r p aga, n as h erd ad es
próxim as; o linh o, po r compra em Lisboa. P orto. etc .
O s co rdo eiro! trabalha m d e empreita da, vencem co mid a de 8S Dhão e deter -
m ina d a q ua n ti a pO I cada obra q ue d espach am. E sses feiti os e p re ços con stam
da s eg u i n te t abela:

Por cada rede mediana d e linho. para carradas de ps l he . . R s. 2$000


lf » » » » j U D Ç8 » » » » 1$000
» » co r da de ca cre ge r , de cabelo o u linho, de 24 metros d e
comprimento . » 200 a 240
» cada corda de carregar, de j un ça, de 24 m etros de comp rimento. » 80 a 1 0 0
» » » t r a vad eira , » linho, 12 l')»» » » 8 0 a 100
» » » » » ju nça, » » l')>> » » So a éo
» XI rolo de corda ordin ári a. para d iferentes a pli caçõ es. como
cald eiros, ca rgas, et c., d e 30 me t ro s d e co mp ri m en to » SO
XI cada pa r d e ar r ea t a s, de li nh o » 8 0 a 1 20
» » dú zi a d e prisões, d e j u nça , de ;; m etros d e com pri men to . » 100 a 1 20
» colar, d e linh o o u cabel o. » 15 a 20
» » benge l et u » 10 a 1S

Val adeiros G en te da À na.d ia e outras t erras do n orte que, d e o u t u b r o a janeiro,


aparecem n as lavouras do Alenteio para a brirem e li m parem a s
sanjas o u va las, d e que precisam os t errenos baix os pa nt a nosos. a 6 m d e se
esgotarem das ág ua s que os in und am de inverno.
C o m o ferram entas usam da pá estreita e comprida de que vêm munidos, e
de uma enxada e pá ingl esa , que o l avrador lhes for n ece. E m ca da lavoura
ocupam- se. por alguns dias ou m eses. d ois a q u a t ro vala d eiros, qu e t r abalha m
de empreitada o u a j ornal. o. s eco ou a com ida .
N a s re para ções e lim pez as de se o ies já exist ent es, u sa-se de preferência o
e iuste a j o rnal, d e SOO D 6<:X) reis s eco s ou de 240 a 300 reis e comida. Na aber-
tura de valas n ov as preval ece a empreitada por me tro de ex ten sã o, a o p re ço d e
u ns tantos reis. que aumentam ou d iminuem conforme a largura e fu nd ura da s
valas e o estado e n a ture:za d o terreno a cor ta r .
Nas se njas co m u ns, de o m.60 d e largura po r om,to de fu n do . ca d a m etr o
oscila aí por 15 r eis s ecos, se a terra d á d esp a ch o. o u 8 a 10 re is e co mida ; ta m-
bém as tomam p or m en os, d es de qu e lh es nã o abun dem as o fe rt as de tra bal h o.
Enfim os preços d este serviço r egulam- se p or dr cunst ândas t ã o di versas e
variáveis, que difícil se t orna fix ar bases. Entre o pessoa l alenteja no há qu em
faça de veladeiro, m as nin gu ém com o d es pac ho e perfe ição dos h ome n s do
n orte, verdadeiros profissionais da esp eci alid ad e.

- 88 -
-


í

A caminho da sacha
ATRAv t S D OS CAM PO S

R eal me n t e tod a a gen te qu e os obse r va lhe a dm ira o. r esist ên cia e d esem-


baraço co m q ue. em manhãs [ r ig id íss i m a s, se m et em a t ra bal h a r sobre águ a
enca r a m elad a. desca lç os e de p er na nu a, man ej a nd o a p á co m ta l de st re z a e
acer to, q ue pa rece n ã o s en t irem os ri go r es d o f rio e da s umidad es I A ssim p as -
sam dois e t rê s meses, a té q u e os chamam à terra da resid ência os a faz e res q u e
por lá t êm. E. pa ra lá ma rch am sa tisfeit os . mu nidos d o se u p ecúlio.

Lançarote H o m em q ue n o. p ri ma ver a se a ju s to. pa r a tratar do b u rr o de lança"


m en to e co n d u zi-l o à ccbri ção dos éguas. dua s vez es por dia, uma
de man hã, o u t r a de ta r de .
A com oda d o ex cl us i va m en te p ara ess e fim, a po nto de em nada mais se
emp reg e r, cumpre-lhe a r r im a r o burro à s ég u as e fa cilitar-lhe o que ne cessário
for para a có p u l a ir a efei to, o b rig a n do -se a d irigir p or s uas mã o s a introdução
d o pe rris, q u ando O burro n ão a certe. o que é frequ ente em al gu ns .
O utr ora t ã o av il tante se consid era va es sa oc u p a ção, que nin guém do sítio
a qu eria. exe rc er, p or m elhor qu e fos s e a soldada e m aior a nec essidad e de a
ga nhar . An t es m or eer à fome I
Po r co n sequ ê nci a o repudi ad o em preg o só a custo o exe r cre um maltez
boera châo, d e q ue to dos s e d esvia v am com desd ém, nã o p ela miséria que exibia
n os farra p os, m as pe l o a ná tema inerent e 80 o fí cio . C oísa execr e nd e , co n sid er a da
entre o pessoa l ca mp óni o como a ma is a b ject a d as o cu pações. À f a n tas ia p opu-
la r assev era va at é q u e o Ia nç aro te era um ama ldiçoado d e Deus e da I greja,
s endo-l hes proibid a a entrada nos templ os e a confissão religiosa t
Os cr ia do s da lavoura p or princípio a lgum o consentiam à sua mesa, não
beb endo p or o n d e el e b eb es se, nem s e ass entando onde ele estivesse. E, como se
ta l d es prezo nã o b a stass e, i n su l ta va m e cha sq u ea va m imp iedosamente o infeliz,
q u e por se u turno lhes fugia p ara se po up a r às vaias e vexames.
Semelhante p r ejuiao, tão gross eiro com o es rúpido, vai declinando muitís-
simo. O lançarote de a g ora é menos es carnecido d o qu e o de outros tempos,
dimin uind o t amb ém 8 a ve rs ão e n ojo que o público lhe vo ta va .
O que influi para q ue na a ctualidad e j á se encontrem homen s limpos que
ac eitem a inc umbê nci a, n ã o s em tal ou q u a l ve rgo n h a , diga -se também. Mas
e nfim d esapareceram a s brutalidades d o de sprezo ex ag er a d o e afrontoso, e isso
é o esse ncial com o no ta de adiantament o.
À so ld a da d o lan çarote regul a eo t r e 3$600 a 4$500 r eis p or m ês e as com e-
darias. E stll s , p ar a a lg u ns, são m el h ores qu e as de outros serviçais, po r con sta -
r em d e p ã o d e tri g o e de carne eh eia, melhoria que el es impõem n o acto do
aj us te. Ou tros, s erv e-l hes o p ã o de centeio e o trato de g a n h l.o. h ) E também
os há q ue s e aco mo d a m a s eco a 9 o u 10$000 r eis por m ês, com endo à sua custa.
A l ém d a soldada conta m ig ua l m ente com as go r g ate s d os la vradores estranhos
qu e, po r o bs éq u io ou p a ga, m a n d a m cob ri r égua s a os r eprodutores do v iz in h o.

- 89 -
ATRAves DOS CAMPO S

MU LHERES

M a is do que se pode rá s upo r, a g ra nde m aioria das mulheres ce mp ônias,


n ecessi tadas, emp rega m -se, o me lho r d o a no, D OS tra balho s a grícola s das her -
dades. d e q ue são coo pe ra d oras vali osas e im prescindív ei s.
Desde n ovembro at é julho. com pequenas interrupçõ es, cada l avoura en tr e"
tém pelo m en os um ran cho d e mulh eres. em n úm ero nun ca i n fe rio r d e 8 a 1S.
e po r v eze s de 30 a 50 .
O s a panh e s da az eiton a e d a bo lota , a es pe lh açã o de es t r umes e adub os. 8S
m onda s, a s sach a s e colheitas d e l egumes, u rem oç ã o de pedra s miud as e a s
ceifas d e so me nos importância n ã o con t ra t a da s p elos ratinh os - sã o 8 5 lidas em
que s e oc u pa m cente n as e cen tenas de b raços da po pulaç ã o fem in ina d o conc elho.
N ão se ima gina a b oa vonta d e co m q ue tais criatu ras se entr egam a o s
labores rurais da sua es pe cia li da d e. N enhuma o u t ra l h es ag rad a tant o j n enhu-
m a ta m b ém lhes fa culta melhor salá rio, se m g rande s ujeição, c com o a t ra ctivo
de expan dir em à larga os in sti n t os d a ga rru lice.
A ssim a contece q ue se me lh a nte p red i lecção, s em dú vi da a ntiga, n a d a dimi-
nui, antes se avi gora e genera liza , como ta m bém vai a u me n ta ndo i me n so a
q ua n rída de e importânci a d os serviço s.
À s m ondas princi pa lmen te emp r eg àm o mulherio todo, desde a r a parig a
de 12 a 13 a nos a té à cinquentona d e b oa fibra, r esis tent e como as mo ças.
O pre ço d o salári o tem altera çõ es, não t ant o p ela natureza d o s di ferent es
se rv iços, que , except ua n do a ceifa , tod os s e r egulam pelo m esm o custo em igu al -
dade d e circunstância s - mas po r efeito da época , da escass ez ou abundân cia d e
bra ços, d o es ta do d o tempo, etc. A s h oras út eis e a p r oveni ênci a da a lime n tação
tamb ém variam, com o adiante se ve rá . N a s h erdad es pr6ximas d os povoados,
onde re side o p esso a l, usa- se o siste m a a seco, à i orne de 140 a 2CO reis p or dia
e mul her, e o d e m eios di as, t am bém a. s eco, de &:> a 1 00 r ei s po r ca da, come-
çando-se às onze h oras da m anh ã n o invern o e à s d oz e na prima vera .
O trab alh o e os me ios dia s é d e r ecí proco. vanta g em pa ra m uitas d as servi-
çais e para os am os. Os a m os, a q ue m o r d in àr ia m en te escasseia o pessoal, ut i-
lizam por essa f orm a o s b r a ços das que só d e tard e p od em l argar as o cu pações
d omésti ca s. E ela s, a s s er viçais, se m prejuízo d os arranjos case iros e do t rata-
m en to d os 6.lhos, a p ro ve i ta m a s h oras dis poní ve is, ga n h an do n o ca mpo. C om a
vantagem ig ualmen t e ap r eciável de que se enfa d am m enos e despacha m mais
relativam ente d o q ue s e trabalhass em t od o o d ia. E.m ge ral as mul heres n os
serviços do cam po, por d ias co mp letos, aí ao m eio dia d a ta rde s entem -se fati-
gad as e por cons equ ência emp rega m t oda s as arti ma nhas par a se poupa rem
quan to possam . M a s como o pessoa l é pouco, em relação nos se r viços e o t em po
m al chega para d espacho opo rt u no, uns l a vr adores a d op tam de prefe rê nc ia o
cos tu m e dos dias inteiros, out ros o d a s t ard es a pe n a s e a lgu ns, os dois s im ul-
tâneame n te, destina ndo o dos me ios dias par a aquelas mulhe res que 56 assim
pode m assalariar -se.

- 90
AT RAV É S DO S C AMP OS

P or qualqu er d os u s os, q u er o diz er, p ara os trabalhos cerca das povoações,


8S dos ranch os s a em e r eg r essa m diAri am ente às s ua s r esidênci a s, em marchas
a pé, dist raí das. em palestras [ocoza s, a provocarem a s riza das juven is da moci-
dade foliana . D e ma n hã, à ida, e à b oq u in h a d a n oite, no r egresso, o m u l h er io
sai e en t ra n a s ald ei a s entoa ndo cantig a s al egres a o so m do pa n d eiro e d as
castanhoLas. C a ntiga s de am ores. co m a tona d il h a d a m oda .
Para as he rdades m ais a fasta das, os rs nch os contratam-se por quin z en as e
aos pre ços de 140 a 220 r ei s secos, h l o u 80 a 140 r eis e co m ida d e gan hão. p or
dia e m ulhe r. T a m b ém se l hes f aculta casa pa r e pe rnoi ta r em e t ra nspo rte e m
carros de m ua res pa ra a id a e r egress o. E m tais co ndições, a m aioria d as con-
tratadas são r ap a ri g a s solteiras, livres de a fa z er es d omésticos. em ci r cunstâ n cia s
de esta rem ausentes da famí li a. onde nenhuma falta faze m . E q ue faça m , vã o
da mesma fo rm a , desde q ue po r lá t en h a m os n a mora d os.
O s t rabalhos a dias comple tos. em q ua lqc er pa rte, efect u a m - s e de so l nado
a sol posto. com in terru pçã o da h ora do almoço e da d o j an ta r ou m eren da a o
meio di a. E s te in te r valo de mo ra du a s h ora s no tempo da sesta , n os mese s de
maio e j unh o. E. n ess e mesm o tempo senão d o meado d e abr il em dian te. ao
cair da tarde, há um descanso de po ucos minutos, a p retexto de m eren d a r em
segunda vez {t) uma côdea de pão e queij o, le re njas, etc .
A seco o u por comida. aos dias inteiro s ou a os meios, perto d as p ovoa çõ es
ou d istantes, os preç.os máxim os acima r ef eri d os, só vigo ra m de a bril a junho.
quando as sear as care cem d e muita m ond a e se i m põ em o u t ros s erviços . E n tão
não h á. mulheres q ue cheg u em . S e o triplo h ouvesse, não lhe faltaria trab alho.
N a s ceifas é b a stante m elhor o sa lá r io . Nun ca m enos de 180 a. 220 r ei s
secos por s uposto meio d ia , qu e se co n ta d esd e O raiar da aur ora até às d ez e
meia da m anhã, t endo no entretanto a interrupçã o do almoço, que dura das
sete às oito h oras. A s u peri ori d ade deste salá rio ju stifico-s e t anto por as ceifas
coincid irem co m as monda s d os tri g os se rô d ios e colh eita s d e legumes, como
por nem t odo O mul herio t er práti ca d e foi ce. À m aioria não se ocu pa nessa
fain a. O u po r qu e lha não q u erem ensina r as sabedor as, o u p or r elutância
a apren der em-n a, como ta re fa vi olen t a para as s uas fo rças.
A n tigam ente 56 algumas mulheres de B arb a cen a e V il a F ern and o s e em pre-
gavam nas ceifa s. H á a nos para cá o aum en to d as cult u r as cerealífera s e a
escassez e carestia d os ceifei.ros ratinhos. de u or ige m a q ue n outras localid ad es
se ad mitis sem 8S fo ices p or mulheres, C os tu m e q ue em começo se r estringi u a
algumas das p equenas s earas d os a r redo re s das povoações. m as que depois se
generalizou a todas dessa orde m . Nas ceifas das la vou r a s g r andes, próx imas
das localidades, ta m b ém alguns an os se a pro vei t a o conc u rso do m u lhe rio,
mas 56 em pa rcelas de se a r a s q ue se n ã o engloba ra m n a empreitada aj u stada
com os rat inhos, ou por q u a lqu er m otivo excepcional.
Cd l..Ao • M CO I",. "", •• Iu (co d n l.l per. toda • c:lOiIl U D. o u " .'lU,
(1l MUI .d•• ••, o . d. . . a , 0 . d o d i• • •.uow.."", pl0 • c u . li o, ou c:l. . .lcl'o u cal.. p r6pri. d. ler"-..!. S. potI"",
in tau. al ba d. 1"0. " ou • • • dIl U ola, • mu ...d. d. tarde i • prim.. lr• • Ci ll.ic• •

- 91 -
ATRAvtS D OS CAMPOS

N o apanho da azeitona e nes vindima s dos subúrbios de E l va s e d os a rre-


do res das vilas e aldeias, igualmente se empregam ranchos num erosos, por usas
e ajustes que mencion arei na devida altura. P o r e go re prossigamos com os que
pertencem mais ou menos ao pessoal de uma lavo uro.

* * *
Nas lidas campestres cada r a n ch o de mulheres é gove rnado po r u ma das
mais t rabalh adoras e en t en d id a s, que pelo. au to ri d a d e cm que a in v este m deno -
mina-a s msn ogeira. G an ha mais 20 r eis po r di a sobre o sa lário d a s outras.
A man ege í ra a licia as compa n he iras e nel as go ve r na em part e, sem contudo
lhe pe r te n cer a direcção absolu t a d o trabalho. D esse encargo in cum b e- se o
g ua rd e de h erd a d es ou outro homem capaz, q ue pa ra tan to a companha o r an ch o
no ser vi ço, dirigindo -o em tu d o. N ã o se entrega aos cuidado s exclusivos da
managei r e por se lhe r eco n h ecer incompetê nc ia para evitar ou reduzir a cera
p rovenie n te da ta garelice próp rio do sexo frágil.
A boa da mulherzinha poss ui as melhores intenções, sobre o cumprimento
dos seus deveres de s upe riora . M os coitada, os instintos de [oq ua cida de, l eva m-na
a prevaricar inconsciee t em e a re como qualquer, sob retudo em s e tratando da
bisbilhotice a p i m en ta d a, p rato forte e tentador, a q ue nenhuma sabe resistir .
P o r t a n t o. para r ep r im ir esses excessos e evita r os co nsequen te s pr ej u iaos,
ent rega-se a di recção e disciplina do rancho a u m homem sé rio, de confiança.
O qual, co n h ecen do a fundo o feitio das criatu ras que gove rna , não as poupa
em ad ver tê ncies, e a mi udo as r e preen d e, com f rases de tom e conceito, apr o-
p ri adas às ci rc u ns tâncias. Pri m eiro, d irige· lh es u m g racejo eq uí vo co, envol-
v en do censu r a li geira; depois uma ad moes taçã o séria . e po r ú lt i mo, esgotada a
pachorra, Iarna-I hes u ma a pós t rofe vi bra n te, a m ea çad ora, q ue, co m o água sob re
lume, apa ga i med iata me nt e o f og o da lcqua cide de. R em édio de o ca si ã o, de ef eito
passagei ro . T ã o a r r eigudo t êm o vício, q ue lh es r ecrud esce com in t ensida d e a o
cabo d e poucos minut os. Se l he está. no tem perame nto . ..
A i d a d e j u ven il de m ui tas, a p rope n são de t od a s, o m eio em qu e se enco n -
tra m e a s li b erd ad es que o cam po s u gere, são facto r es q u e, l ong e de p redisporem
a o silê ncio e eis u dea, impulsionam ir resis tivelme n te a actos r uidosos, expansivos,
q ue, s e s e aba f a m po r mome ntos, explodem afina l, a p retexto de q ualquer coisa.
O aparecimento d e u m l agar to o u d e o ut ro bicharoco. dá. ensejo a que se
p erca a se riedade. As moços pelo menos. pa rtem a correr, com al aridos de receios
fin gidos. q ue enfurecem o guarda; mas, tão cómicos se tornam, que a ele próprio
s e lhe esva i a ira, pa ssando a rir como elas. até o incidente te rmi na r.
Se d e lo n ge ou perto se avista qualque r homem, caminhando em direcção
de se a proxi m a r, ess e fa cto motiva maio re s e ma is re t umba n tes íolias. En tã o. é
cer ta a va ia ou bois (I) ao pacífico transe u nte, a p retexto de se ma n ter a t rodição.
(II A. ".1., IIpln. nllm 1Iln cllIlum••ntlq l'luilllo. U "D:~U .III mell.un plU bomln•• "lcc-"un. M •••6 .. provoe•
• d'. 11 pll..o.1 q\1• • I>d • • t u b.l h.r, • o} l>lumlll>lI PUI .. cduur.. d. Oluro UllO. Com I dil u'l> c. lIu. ~. mulhu.. COI>-
unlll-'II- Ih.. o UIO 1m lod.. .. f-j l>u do CUIIPO, 10 p."o qll' 10. hom lll' 16 111.. . . lotu.do DO I U"/(O d. Inoun pt bpd. ·
m.n l' dita. l i. . . .1" colb. m-I. d.".i., ... hor.. do d"c.neo • d. comld•.

- 92 -
AT RAvtS DOS CAMPO S

Mal avistam o caminhant e, o ran cho embandeira, isto é, vo l ta -se para o sujeito,
e desatam a gr ita r- l h e : - «A i, que o n ão tem / . . . ai, que o n ão tem / .. . Fora
qae é feio I. . . fo ra que o n ão qu ere mos l Arreda, gato ve lho i, . . Caminha,
bode .arnozo 1... la bácoro de Arroncbes l Não t em I... não tem I.. . n ã o tem f.. ._
O mo te ja d o o u prossegue na m archa, nad a. respondendo, ou rede r gu e « 80
consoan tes . Se não res ponde, elas continuam com a g r ita ria até o perderem d e
vista; se contesta. o mulherio mais se entusiasma, na m ente de protelar a folia.
enquant o lh o consintam. Mas, se p or a caso o provo cado se d esvia do cami nh o.
tomando a dire cçã o do rancho, no propósit o, .real o u a par ente, de demonstrar a
falsidade d as apr eciaçõ es, a cena m odifica -se lo g o. A o r eceio de um desforço
demasiado atrevido, ou po r intimação enér gica d o go ve r n a n te , m oças e velhas
mete m a vi ola no sa co, afim de o homem retro ced er e d es istir das in t en çõ es .
Se porém ele n ão r etro cede e continua a ava nçe r, as mulherzinhas a n ima m - s e
de n ovo, e, es qu ecendo consideraçõ es, passam a se gunda g ri ta ri a com entusiasm o
doido, d elirante. C omo o encarregado consinta, os r esolutas e possan tes. COrr em
em massa s ob r e o audacios o, agar rando- o e atirando - o ao chã o para lhe dare m
cuJas (I) e 89 velhas o e pepi ne r em com outras p atuscad as.
Tudo p or chalaça algo forte é certo, m a s com q ue poucos se m elindra m,
mesm O por qu e as beies, l evadas ao ex tremo da s cules e ac essórios. raríssima s
vezes se pratica m .
E m ge ra l, ao p ri n ci pia re m , e dep ois mes m o, os h o m ens q ue as ouvem,
riem-se da costumei ra, seguindo sile nciosamente o seu cam in h o, ou contestando
apen as com duas ou t rês facécias. Outro ta nto n ão sucede com a maioria da s
mulheres d ando-se a hipótese co nt rá ria, isto é se n do e las as provocadas.

* *
Na casa do m onte, onde pe rn oita O ranch o, os serões passam-se em varia-
dos Iolgu ed os, principalmente se a eles a ssis t em os g 9. n hões da lavou r a o u os d e
outra s vizi n h a s, que a code m ao sítio por lhes chei ra r a pequen ume. D e qualquer
maneira, a pân d ega é certa a t é às dez ou onze da n oite. C a n ta-s e, t oca-se,
baila-s e. nana m - se contos de princesas encantadas, joga-se u m pouco o padre
cara, e n am ora-s e mu i to . A execução desta ú ltim a p arte, su bordi na -se a certa s
condiçõ es. À s rap a r iga s não podem conversar à f r a n ca com os rap azes, sem
prévia licen ça da m e na g eiea . À qual, concedendo-a, é com a cláusula de fa la r em
a um canto da casa. à vi sta de tod os , ou à port a da r ua: ela, a r apari ga, d e
dent ro ; ele, d e fo r a .
M a s há ocasiões em q u e a gov er n a n te só p ermite cs coló qu io s a m oros os
median te u m a d à di vazi ta , que lhe conso le o estôm ago o u o víci o da cheiro ca.
N est e empenho, resis te a todas a s s úplicas, cede nd o apena s q ua ndo os mo ços
escorregam mar r o ca tes, q u eijos ou u m pataquinho pa r a meio g ross o. Mas u m a

(I) Du r uIu t llJl,Ui r a U''lII'U" 'li lI.tIel1t. pel o. pi• • u b ! c• • • nD put( l o ~ OdZ OD III, b. tll'. l~e o. r o u& dot <! ",d!., •
•obl'l ° ao!o, bam bo le ando - o .Dtl'.t......to upa tJd, ...uu. Cloal :aaDeClo!;" r o m CI o, f i briDU .. "0Iltt 4,.

- 93 -
ATRA VeS DO S CA M PO S

vez gratificada, acabam- se-lhe as ne geri ves. P od em os pombinhos arrul h ar à


von t a de, qu e nin gu ém os per t u r ba rá .
D ur a n te 8 quar esma cessa m os bailes, os toques e t oda s as cantiga s qu e
n ã o sejam r eligi osa s. O s j ogos d e p ren d a s e as entrevista s a moro sa s, continuam
como antes, se n ão co m m ai or entu si a s m o.

* * *
N o d omi ngo imediato à semana ou quinzen a d e trabalho, as dos r an chos
v ão r eceb er a s fér ias a ca s a do lavrador, na a l de i a, ou à d e a lgué m, i n cu mbi do
d e paga r . As moças apres entam- se m uito ga rri da s e tafulas, em traj os d omi n -
g Ud IOS, fla man t ís simos, a contrastarem frisantemente com o desalinho e de sl eix o
d as maduras e velhas. T odas se mostram alegres e p alradoras, a po nto de o d ono
d a casa lhes dizer que n ã o estã o em nenhum a p raça.
C on cordam t odas, a ceitando o lembrete e repre en dend c - se mutuam ente, o
q ue a t r a z a um p ouco o silênci o ex igido. A nnal obt ém-se. M as daí a na da , cada
u ma ch ia paro s eu lad o, intro metendo- se nas chamada s e ne a p agas de cada
qua l. C h ega m - se a a cusar umas à s outras d e t erem ven cido dia s a m enos d o
q ue d izem e d e r e ceherem m ais do qu e ve nce m. D en ú n cia s e acla ra ções ge ral -
m en te err6nias e infundadas, qu e s em p re p ro vo ca m di sputas, averi guada a
fa lsi da de. E v erdadeiras q u e sejam , ociosas se t ornam igu a lm en te d esde que
nin gu ém a s reclama . O s en gan os, se os há, t odos s e esclarecem e r esolvem à
vi s ta d a fo lha e das informa çõe s do. ma na g eir e e do encarregado. Mas a despeito
disso tudo e d os recuões qu e sofr em pelos atr evimentos, co n t in u a m a dar à
lí ngua, a pretexto de j ust ificações r econciliatórias, qu e p õem tudo à boa paz.
A sa id a anim am-s e ainda m ai s, d espedindo-se q u a se todas, co m um d ito lison-
g ei ro. V oz es a o vento, pala v r a s ocas, de q uem p re ci sa a gradar ..•

* * *
Tudo que a s r a p a r iga s so lteiras ga n h a m n os s erviços d o ca m p o é «pa r a o
s eu cor po» - qu ero diz er pa ra s e ourarem e ves tirem d e p ont o em branco, nã o
só d o n ecessári o, m c s a i n da pa ra os lux os d oroing ueí r os e d os dias de f es ta , da
confissão, etc. S atisf eitas estas p rim ei ra s ambi çõ es, passa m à compra d o preciso
pare o enxoval, e d o m odesto mas ga rri d o mobiliário co m qu e s e propõ em
ornamentar a futura liebítução . Para ma is fàcilmente r ealizarem esses propós i-
tos, os pais d e a lgum as - D eu s sa b e com que sacrifício - d ã o-lh es, n o t od o o u
em parte, os mant im en t os d e q ue precisam qu a nd o rra be lha m a s eco .
M ais do que as pró pria s fi lha s, eles d ese ja m v ê- Ia s na p o sse d os o bj ect os,
. que em li ng uagem p opu la-r se cha ma a «casa d e u ma n o iva ».
P a r a a co n s ecu çã o d ess e s usp irado de s íderetum, sacr ifica m -se a s n ece ssida-
d es de a lime n taçã o e a s aúde. (I) O essen cia l para elas é a dq u iri re m o u ro, r ou p as,

(1) T lmto ... ralOui.... . o lt el: .. .. uili ~,," a. .. . ceuldadu de boa alllll etl l" . o '0' U"IfU do "'''la b lo • do "' ohUlido
do",h lJ ~ o. tn bal ba tldo a II ~O . 110 campo, O m. b do atl o. qa . , .. .....Iori • • • 1-.. . .. , ...iu ••0 PII'O ltu. o. r. p lIU ..,trtlldu
.... tulo. lho..... i. "01ltl10', "'.. CO IJl ~tl.lo U,.,"U ,,<:Ir conta .lo, bvr• .lou,. 1ll0IlT' Ill-" pilo CODU6.riO ..." uo.e, • II dio• .

- 94 -
A TRAvtS DOS CAMPOS

estan h o, Bra me, louça s, vidros, trebeco s, etc . A moça solteira q ue i sso conseg u e
reunir, con si d er a- s e feliz, e a mã e rep u ta-s e fe licíssima . O a me r maternal p õe-na
vai dosa com o luxo da nIna.
M ui t o u fa n a , mos tra às vizinhas e amigas, a s
prendas que a filha adqu iri u à custa de muito S UO I , d e mui ta privação, d e m ui to
trabalho honrado. E as vizi nhas e as amigas presta m toda a aten ção 80S objec-
tos que lhes mostram , gabam-nos e elogia m a don o. M a s depois. n a a usência
das d ua s, expa ndindo - se em invejas ridícu las. amesqu in h a m tu do aq uilo, cen-
surando os d uas . A fi lh a é «uma impos t ora a querer desben cer da s da s ua
i~u8 1a» ; a mãe «uma 8BV8Z0]s. doi da, que só cuida de ca sar a filha» . M iséria s
human as que abun dam em t odas as cla sses ...

GANADEIROS

Os campónios, a quem 0 5 lavrad ore s encarregam a guardaria e pas toreação


dos seus r ebanho s, são conhecidos pelo n ome comum de ganadeiros, quaisquer
qu e sej am os gados d e qu e se incumbam . Num o u t ro sentido ge n érico, mas ma is
restrit o. ta m bé m se lhes chamam mai orais, qu alifi cati vo est e, que em b oro se
aplique in dist in t a m en t e em vári a s hipóteses, e so b ret u do pa r a o efei to de sau-
dação, 56 em rig or per te nce de direito a os cab eças o u chefes dos diferentes gru-
pos de ga n a deiro s incumbidos das várias e spécies de ga do s. Não obstante, q uando
no ca m po se encont ra qua lquer guardador de ga d o, sauda -s e assim: - «Bon s
dias, maiora l . . . » - E. nu nca: . B ons dias. ganadeiro».

Categorias e n o m en cl atura A classe d os g an ade i ros di vi de -se em v ários


a g r up amentos, sendo os indiv ídu os de ca da uma
designados por nome al usivo às espécies de ga do em q ue se ocu pam. Os que
guardam bois, s ão boieiros ; os das vacas, vaq ueiros; os d as éguas, eguariços;
os dos porcos, porqu eir as ; os dos lan fger os, pestores, e os das cabr a s, cabreiros.
Fica pois entendido que, para a ap e sc en ra çêo e g u ar d a r i a dos reba n h os, há
em cada lavoura tantos g rupos de ge nadei ros, q u a n t os são os géneros de gado
nela exi stente.
Em cada grupo des ses encontra-se um me ior el chefe, acomo da do com obri -
~ação de dirigir e fiscaliza r o pessoa l corres pondente, o u se jam todos os i ndiví-
duos que lhe estão subo rdi nados. Est es, isto é, os im ediatos ao maioral,
cbamam-se-Ihes entregues , como os i n ferio r es 008 entregues se de n om ina m
ajudas.
Em regra , cada rebanho. o cu pa d ois ind ivíduos : u m homem e um r a pa z.
O homem, ou é o maioral o u um en tregue ; o r apaz , o ajuda. h } E para auxiliar
ambos, ocompanha-os um corpul ento e sentido rafeiro, senão d ois o u três, to dos
de bisonho asp ecto, a infundirem r es p ei to a estranhos d e qualquer ordem .
A i daquel es qu e lhes experimentar os instintos I

(I) Eau pto tlU bo l..d.... tlU ...n d... tl'l. _tld... ..." Que (I alud I. , um Lomam como o maio ral.

- 95 -
ATRAvt S DOS CAMPO S

Nas lavouras expcionalmente g ra n de s, que m ant êm seis e mais rebanh os de


la n ígeros em herdades diferen te e di stante s, o maí or cl re s pe ctivo, passa s emanas
e meses sem apascento r rebanho algum. Tanto tem de vig:ar. di r igi r , co nsultar
e reso lv er, de ac ordo com o amo, qu e n ess as ocasi ões d e mais nada s e oc upa .
M as isto re presenta exc epção fora d o u s o comum. O co r ren te. p a ra qua lqu er
espécie, r epresenta da por div ersos rebanhos, é o maioral, a u xi li a d o por ai uda,
g uar da r e tratar d e um - o da criação mais n ova , com o o que ex ige maiores
cui dado s. Os outros, ficam tamh ém sobre a sua inspecção, ma s a gua r da r ia d e
cada qual, incumbe-se a entregue próprio, auxiliado por corres pondente oiude.
S e por acaso, o gado de qual quer gé n er o constitui apen as um ú nico r ebanho
ou manada. o seu g ua r d ad o r reun e os t ft ujo s de m aioral e entregue. gover na ndo
sõmente no ajuda que o a com panha .
r. nã o tend o ajudo. como se ob ser va em al guns eguariç os, e co m t od os os
cabreiros gr a n d e parte do ano - o h omem é. por a ssim d izer. maioral d e si pr6 p rio.

* * *
Um g a n a de iro. além de st a cla ss ificaçã o co m u m . essencialmente ge nérico .
p ode reunir mais três. esp ecíficas : u m a. rev el ad ora da espécie d e 8ado em que
se o cu pa i outro. definind o a sua categ oria própria; e a última-a menos con s-
tan.te, nem sempre verificada - co m o indicativo da na tu r ez a ou cará ct er especia-
lí ssimo do rebanh o. P orque do mesmo g én er o de animais f ormam-se r ebanhos
distintos. cada qual com n ome próprio. derivado das co n d içõ es das reses que os
co m põ em e do fim a que se d estinam.
Poro. mais fàcilmente se compreenderem essas q ua t ro cla ssifica ções a plica-
das a um 56 homem, darei o s eguinte exemplo: - o ganadeiro Fula n o. porqueiro
e en tregue na Casa Branca. anda e go r e com os Jarroupos e p or isso é i err ou-
peiro. Ora. CO mo es te de ierroupeiro, h á o u t ro s qualifi cativos especialíssimo s,
que mais adian te mencionarei.

Procedência À s emel han ça d a ma io ria. d o pessoal a g rícola, os ga n ad eiros são


naturais do. r egiã o on de s e emp regam, e um ou ou t ro das vizinhas.
Na pop u la ção r ura l do co nce lho d e Elva s havia antes d et erm ina d as fam ílias,
em qu e por assim dizer era hereditária a o cupa çã o de gan adeiro. e a p onto tal
que até em algumas se restri ngia a tend ência para uma só espécie. T em d esapa-
recido esse cost um e, m as ai nda se obse r va out ro ig ua l mente cu rioso - o de entre
os gan e .deiro s de cada povoa çã o predo m in arem a s aptidõ es e prefe rên cia paro
t al o u qual esp ecí alidade. Assi m em V ila F em e n d c e B a rba cen a p r eva lecem os
pastores, e em Santa Eulá lia os porq ue i ros.

Ajustes Maiorais e m u itos entregu es contrata m -se po r an o. O s p rimeiros,


a justando-se directam ente com os la vrad ores; os se gundos, p or inter-
venção dos primeiros, fe cha n do o a mo o ajust e. A os entregues incu mb e po r sua

- 96 -
ATRAv t s DO S C AM P OS

vez a com oda rem e d esp edir em os a j udas, recl am an do dos l avra dores «as paga s»
respecti va s.
P ara acomoda ção e d espedim ento d os mai orais e entregu es d e ano, s egu em-se
DS prax es us ad a s com os r est ant es criad o s a n ua is, diferind o tão somen te em
algun s, n o que resp eita a p r a aos e época s d e s aí d a s e ent ra das. De sta m a n eir n,
os porq u ei ras r egul a m-se pelo an o civ il, isto é, d e j a n ei ro a. jan eiro. N o caso d e
despedimento d e am o par a criado ou v ice-verse, o avis o d eve-se com u n i ca r
resp ect ivam ent e a t é ao S. Miguel. O s p ast ores e cabreiros s a em e entram pelo
S. P edro, parti cipando a sa id a o u desp edida p or to d o o mês de maio. E, os r es-
tantes como boieiros, vaqu eiros e egue ríe o s, encimam e acomodam-se pelo
S. M ateu s, tal qual os cr ia dos d e lavoura.
Em ger s l, os gune d eiro s anu ais. não «p ar tem o e n o e, isto ê, cumprem o
dever de se rv ir p el o t empo que s e ajust aram . Neste pa r ticul ar m ostram maior
seri edade q ue os ga n hôes e o u t ros. Mas se abalam extempo rân ea m en t e, saem
também com os p esulhais, se o amo i sso exige. S e por ém o la vrador os exp u lsa
antes do vencimento, O q u e ainda menos s e v ê, e só s e p rati ca po r raz õe s muito
pondero sas, o criado tem o direito de não retirar o pegul ha], q u e assim conti n ua.
a ser susten tado à cus ta d o la vrador até :finalizar o praz o d o con tra to .
P ara os ent regues m ensais d e cará cter permanente (qu e al gu n s h á nestas
co ndições). em bora vençam tod os os meses, como se não d es pe çam ou se jam
despedidos com anteced ência d e al guns dias, o silêncio de le s ou d os amos.
signifi ca acor do tá cito para continuação inddinida.
Quanto aos a juda s, adoptam-se praxes semelhantes, se bem que nestes é
menos dura d oira a es ta b ili da de. Ou o rapazelho abala por sua vontade com ou
sem autoriza çã o d os pais, ou o camarada o despede por m otivo fundamentado,
ou por qu alque r n inharia, se nã o para m eter o u tro q u e mais lhe agrada.
O s que são filhos dos pró pri os g u ar d a d or es cons ervam-se mais, mas nem p or
isso se pode con ta r com eles em a bsol u to.

Soldadas V ariam bastan te , j á por efeito e indole das ca t ego rias, já p orq u e a
n atureza dos venci me n tos subordin a-se em ger a l à es péci e dos ga do s
a gua rda r e ainda a os cos t u mes t ra dicio nais d o sítio e m esmo das pró prias
eceses». S e n ã o o contrário, is to é. m olda nd o - s e n os u s os i m pla n ta dos h á p oucos
anos por alg u ns lavra d ores, u s os esses d e car ác te r in t eiram ente opos t o às velha s
tra dições. C omo que r q u e sejam , direi o bastante n o p ar ágra fo corresponden te
a cada grupo de ga nadeiros. Das soldadas que s e vencem a os mes es, a di nh eiro
somente, r egulam ent re 4$500 a 5$000 r ei s m ens ais ca da h om em , a lém d a i orre
da burra . O s a judas ve n cem a í 1$200 a 2$5cxJ reis po r r a pa z e mês, seg und o a
idad e e im portâ ncia d o s eu pap el.
D esd e os maiorais a t é aos ajudas, t odos se alimen tam à custa d os lavra..
dor es, por comedo rias semanais ou mensai s, a co n to. peso e medida, a via das
nos sábados ou n o fim dos meses, confo rm e se verá a dia nte no pa rá gra fo
A liment ação.

- 97 -
A T R A V I':. S DO S CANPOS

Pegulhais (t ) A nt igament e O d inhe iro consti tuia a par te menos important e das
sol dad as. O que prep onder ava, e m u ito, ela o peg ullrel, q u er fosse
ex cl u siv am e nte d o gad o da esp éci e que o g a n nd eir o p as toreava , q ue r t amb ém
i ncluísse «ca beças » d ife r entes. C o m o por exe m plo cabr a s, qu e, além de s e per-
m itirem 80S cab rei r os, tamb ém se fo rrava m a porquei ras e pasto res , o u m esmo
ég u a s q ue, não as possuin do a m aior parte d os eg u a r iços, eram p er mitid a s aos
vaqueiros. I
R e provand o em abs oluto as Fo rras. rep r es entad a s po r ga do d iverso do q ue
o gana d eito apascenta e ainda d e cabra s n os ca bre iros. ( a) a:6,gura-se-me ac eitá-
vel e va n taj os a pa ra o l a vrador a concessão de p eg ul he is d e gado idê n tico ao
que o g au adet ro ,g ua r d a. P elo m enos para os m a i or ais q ue , Assi m l iga dos a os
in ter esses d o am o, n at u r a l é most r a rem m ais permanência, z elo e d ed ica çã o, do
q ue gan hando só a dinhe iro. O si stem a po d e t razer prejuí zo a o lavr ado r" se o
cr iado não for hon rado. Ma s n est e m u n do tudo tem prós e con t ra s e n ã o há
m eda lha s em r ever so. N o caso sujeito, os prós evidenciam-s e p or ta l maneira ,
qu e d eixam n a pe numbra os con tra s m a is ou men os hip otét icos.
Out r ora e h o je. os gua rda do res de gado m iudo, quase t odos p ossu'iem e
p ossuem a sua burra, a uxiliar va lioso para t ra n sportar ma ntime ntos e lenha
pa ra a s n ecessidad es d e s uas famílias. C om p egulhais d e ca bras po ucos se en con -
t ram já . E dos ou t ro s, constit uidos por a n i m a is da espécie d os do r eban h o res-
pec tivo, só os possu em os m aiorais e algum en treg ue an u al, d e estim a e va lo r .
D e on d e se prova q ue os pego lh e is te nde m a dimin ui r na p roporção que
aum en.t am as urrid e.des em r ei s. D iver sa s ca u sa s p ar a isso concorrem . Como
p ri ncipa l. ap onta- se o ex cesso d e ab usos d os 8 a n a d~ i ros d e a gora , m enos escru-
p ulo so s d o qu e os a n tigos. S em n egar n em dis cutir o facto, é to da via certo, q u e
ou t ro s m o ti v os ig u almen te influ em para a va r ia n te do uso . U m deles - fo rçoso
é di zê- lo - d eriva de en t re lavr ad ores e cri ados de confiança ir a frouxa n do
aquel a ar reigad a e m ú tua afe ição, r esulta n t e d a pater n al be ne volência e bi za rri a
dos p r i meiros e d a estabilidade, honr adez e ze lo d os segu ndos . Qualidad es e
v ir tu des q ue ain da se encontram , mas q ue declinam evi d entem ent e p or ... n ã o
estare m na m oda . E é pena que assim aco n teça . P orqu e essa mút ua e leal dedi-
cação criava. antiga me nte u m a r ecipro cidad e d e direitos e deveres, d e b oa m en te
sat isfei to s, h onre d emente cu m pridos.

Tendên ci as e há bitos N ã o ob s tante a di ferença de solda d a. d e u n s par.


ou t ro s ge n ad eiros, n ota- se qus a todos l hes chega para
conforto e abas ta nça superio r ao dos de o u t ras classes semelhantes.
P or tais ra z õ es e por q ue o encargo de ga.nade'iro é d o s menos fatitantes q ue

(t) Em tuml Dolo"a alu'ltjaDa o ...od bu!o IIt, ulb. ' ,ipHic. o alli ma l 01;1. allimab d. qu al Qllu pu . o. qut nio u j a o
l .....r . dor •• q1;l.' U II, por f . ... o r . p.,a 01;1. fona , co nU Do l1 DO' . uu nb'DLo• • oDd. pu ci,.,a cOllj1;l.1Iu mll'l11 com o mail ,ad o.
A o' p,,"Ib. aI. do. ,alladd ru umL fm .. Ibu cb .ma lo rr... em d tlumlDad.. d rCllDIlla ci u .
(:1) t. iDCOIl"Vlitnl. a fo na d. cabru aoa "'brl irol por 4'" a II pu ..çio do I. llt d . . .bnda do .lu do pI,ulh...I. pn Ua -u
fAcl1mla ta ao. abu , o. fn u ~ ullafoa. d. im pou Allci.. b.tlall u , c"'lh cl.
C o m o. put oru a i o podt ba ur .,11 coa tn , por Qut o Il h c .lu l U., u ' lIlcti" .. o....lh .. PUU Dtc ao I....n dor.

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ATRA v t S DO S CAM PO S

se exercem n as h erdad es, parece que d evia ter mu itos preten de n tes. P oís nem
por isso. Na ge nte mo ça então, é n otória r elutância à viela pas t oril. Se em
crianças a exe r cem a co n te n to, pronto se enfadam, ma l che gam a homen s.
Nessa altura, p refe rem servi r n as ga n ha rias, onde trabalham m ais. mas, sem
lh es cer cearem a folga e pân deg a do s d o mi ngos, n as aldeia s. T od a vi a aq uel es
poucos q ue aí do s dezoito e n os em clia nte continuam atrás d os re banh os, po r
imposição d os pais, o u po r outro mo t ivo fo rte, t omam tal afeição ao ga d.o e a o
campo que, co mo os deix a m , nã o m ais que re m out ra o cu pa çã o e nela perman e-
cem p or toda a vid a . V ê em-se ve lhos q ue n u n ca fi zeram o u t ra coisa e só numa
classe de gado.
• • •
O s ge na deí r cs são o r di nàría me n te d e índole re con centrada, f ugin d o aos
adjun tos, (1) e a os eXc~S90S de t oda a ordem.
Entre os pastores, tid os com o os ma is pacatos de tod os, há , em maio r escala,
cultores afamados da poesia popula r, que recitam a que m lha q ue r o uv i r .
P or versos e décimas d a s u a la vra o u de outros colega s, usam verberar q u al-
que r crime ou escândalo d e s ensaçã o, s uc edido n os arredores, sobretudo os
adultérios e desflo rame ntos q u e se tornam de do mínio público.
Um cer to pastor ex i s tiu h á anos que pagou ca ra a afeição à poesia. T end o
armado vária s décimas d e escacha para es tigmatizar um caso de sedução, não s6
zurziu a valer o sedutor, m as ai n da beliscou fort e n a s ed uaida. Foi um a con t eci-
men ta . À ve rs a l h a da causou f u r o r, a ponto de correr impressa e s er recitada n a s
taberna s e ba il aricos, como pratinho indi spensável em todo o gén er o de reuniõ es.
Mas o pai d a pe quena a zoou com o sucesso e jurou vingo r -se. M unindo-s e
de um cacet e, a p r ese n to u -se 80 f est ej ado p oeta, e, com bons modos, pediu para
lh e con tar as «décimas da f l h a :l> , coi sa d e funda m ento, s egundo ouvira dizer.
O solicitado h esi tou a o princípio, m as tais r ogos o u viu e tão en vaide cid o
n cou, q ue condes cendeu afinal. Recitou, reci t ou, m a s, a certa a lt u ra , qu a n do
estava n o ze nit e do entusi a smo, o o uvi n te d esan ca-lhe o vara-pau em cima, e
-agor a o ve r eis pesp egn-Ih e uma tu nda de ra ch ar. N ã o passou a pio r, p ela
c-c

atitade do po eta, que, s uplica ndo clemência , sol ta va calo ro sos pro testo s de
arrependimento. F oi O que lh e va leu. D o contrá rio te r ia de ir para o h ospita l.
s e não para O cemitério. M a s s erv iu-l h e a liçã o. Nunca m a is arm ou d écima s,
nem queria que lhe falassem em ta l.
................ ..... ..... ........ ............ .. ... ... .. ... .. ... ....... .... ..
0 3 porq uei ras s alientam -se p elo e er ae io, compost ura e asseio, qu alidades
que bastante os ca rac terizam . À est ética p r eocu pa- os tan to, qu e se l h es n ot a n o
vestuári o e nos apar elhos dos b ur ras, i rrep ree nsivelmente p r epa r ados e cu idad os
por eles p róp rios.

h ) P or ..J/o:nlO' ... ellci oll....... II rlllllH5u d. illdelu... lll " d o Ildmuo d. pU l OU .ntruido . UIl p.lutt.. 00 I b.b.rrl.
'Utal. ,... tl bllll U. A, •• lo... nlç llu d. ' .nte .... qallq uer P. t te... b........•..·lbu ,ulld.. "à/unIU àe l .adIA•. 'fltlluniio
. 11110 pl.h. b . t llt tlld. ·u .

- 99-
AT RAVe s DO S C A M POS

Os cabreiros t êm fa ma d e aluados, (I) especialmente n o pe río do da pa riçã o


das cabra s. Período de ex t rao rdi ná ri a r esponsabilidad e, em q ue o cabreiro s e
considera imprescindivd e absoluto. S abe, que se en tão e be l e r, outro estranho
que o s u bs titua , n ã o con h ece n do b em t odas a s cabras a ponto d e as distin guir
um as d as outras, natural é mal ograr..se-lhe a cria ção, por fa lt a de tino na
anlhação r espectiva.
Nos ga n ade ir os. como em nenhuns outros críados rurais, pe rsi stem h á b itos
a n t iq uíssimos, merecedores d e referên cia. A ssim, como utensílios típ icos, usam
os se guintes: azeiteiras, de chavelho de bovinos. para a z eite e vina gre; cornas
para leite; coxo ou concha de cortiça, para beberem água; bsrquino ou senão
de pele de chib o. para depósito de á gua fresca no verão; alforge s de peles de
cabra, curtidas; colheres de chifre ou de pau de buxo; caldeiro de ferro, para
diferentes aplicações; tarro de cortiça. como vasilha d os almoços e ceias já
preparadas.
P ara os a rrei os e aparelhos elas burras, s e ex cep t u a r mos a al bard a, tudo é
por eles prepara do co m p eles de cab ra, ovelh a e cão. A s de cã o apr eci am-nas
ext ra ordinàriamente po r se prest arem a mui tos uso s, e sobretudo para tap etes e
cobrejões d as a l bardas.
O cachei ro ( ca jado) , e 8S ped ra s são a s sua s a r m a s f a vor it a s. A pedra usa-se
p r incipa lmen te n a fre gu esia d e San ta Eulália. onde a m an ej am com admirável
de stre za, se m auxilio de funda. Ponto que mirem, é alcançado em cheio, mesm o
de Long e. como se fosse tiro de bala. Assim aproveitam f\ faculdade da pontaria,
p ar a reconduzirem a o rebanho a s r eses transviadas. É processo simples, mas
tem o inconvenien te de, por vezes, ocasionar fra cturas ou outra s div ersas lesões.
Do enças de cacheiro ou de pedra, como se classificam, p or ironia. em fr as eado
camp esino. Que, o s ganadeiros, como possam, atribuem se mp re es ses d esastres
a outras cau sas diversas.
Os p orque ires ad optam também um co mprid o a a o rre g u e ou a çoite, p or eles
preparado. e com que chamam à ordem os suinos arredi os. É um costume
excluaív o da regiã o el ven se e vi zinha s, de ma gn ífico re sultad o, s em os inconve-
ni entes do cacheiro. Na quel e, n o e z o rra gce, re param com espanto o s es tr a nhos
que o v êem em acção n as feiras e mer cados.
P or sua vez os pastores usam d o grava.t o - vara-pau com ga nch o de ferr o
numa das p onte s, com que [ê cí lmen te se guram e apresam o le n tgerc que preci ..
sam ag a r ra r . D esse s é qu e realm en te se pod e dizer que s ão apanhados a ga ncho.
À adopç ão d a p ed ra , d o cach eiro, a a oreegu e e gravata , n ã o ímpede q ue
alternadamente mu itos ga na de i ro s us em d a espinga r da . n ã o po r n ecessidad e,
mas para caçarem p róx imo d os r eban h os. E en tre e les enco n tr a m -se escopeteiros
de truz, h abituad os a da r bigodes aos caç a d ores de profis são. S em em ba rgo, e
mantendo os ve l h os h á bi to s dos da sua clas se , t od os continu am a ser os ma i ores
de struidores do s ninhos e criaçã o d e caça . Os n inhos d e pe r diz es pr i n ci pelm ente
pro curam-nos com particular inter esse. Quantos encontrem, q u anto s marcam

- 100 -
ATRAV-t S DO S CA MPOS

com sinais particulares. para l h es tirar em os o vo s em te rmina nd o a po stura .


Tal olho têm para s emelhantes des cober tas que, por esse m eio, tiram centenas de
ovos, com q ue p r eparam e comem apetitosa s freginadas, num r equinte de sa tis-
fação gfutcna . Para eles, as leis do defeso . não passam de l etra morta, de que
zombam impunemente. Que lhes importa 8S leis, se menosprezando-as satisfa -
zem as exi g ências do estômago. s em diss abor es e despeae s I D e mais, só assim ,
comem ovos em abund ância, não lh e cu stando ci n co reis.

Trajos característicos Àpenas a pelica e as botas de focinheira com pr esilhas,


também chamadas botas lei teira s. A pelica, consiste
num a espécie de alborn o z de inverno, feita com peles providas de lã. U s am-na
prin cipa lm en t e os b oieiros, vaqueiros e pastores.
Às botas de focinheira, mais p r opriamente se deviam ch am a r polai n a s d e
couro. O seu feiti o é parecidíssimo com O das polainas. De bo ta s só poss ue m o
nome e a sola correspondente. Nem ca lça d o são, p ois que n ã o dispe nsam o uso
de sapatos. Pouco s e u sam já, sendo de presum ir que d esapareça m de todo. .
O mais vestuário é em t ud o igual ao comum d as po p ulações r urais , referido n o
capítul o imediato .

Malhadas Apa rte as vrsrta s a os domicílios n as vi.las e aldeias, onde gera lmente
vão na s n oites d e sábados e domin gos, a pretexto de irem à roupa e,
de caminho, co nduzirem n a b u r ra a sua ce rg uita de lenha-os g anadeiro s pe r -
noitam n a s s uas r esp ectiva s malhadas. (1) C h o ças r ús ticas, que temporàriament e
se adaptam a lar doméstico quan do por lá p assam temporadas as mulheres e os
filhos dos maiorais e en t regu es. Entã o atin g em um cúm ulo d e arranj o, maximé
as dos porqueiros, q ue p ela su a n a t u r eza es tá ve l, são as de maior de safogo e d e
mel hor const r ução. Q uan tas excedem em a s se io e a bast an ça a m u ita s habita çõ es
ur ban as de gente h umilde.
Except uando as m alh a d a s dos pas tores, toda s mais s e a ssem el h a m às cu ba -
t as afri canas, quero dize r mostrando a con figu r a çã o có n ica e o r evesti mento de
mato. Aqui o rev estimento é sempr e de pioxno. A s d os pastores, p ela circu n s-
tância de ser f orçoso muda rem-se com fr eq uência e facilidade, são o qu e h á d e
mais rudimentar em choças. Não passam de simples a bri gos, r eprese ntados por
uma cancela convexa, t ecida de colmo, amp ara da p or d u as m a is pequ enas, u m a
de cada lado.
M a s boas ou deficientes, d e q ualq ue r gana de iro q ue sejam, tornam-se t eg'ú-
rios quer idos desses rústicos indivíduos q ue passam a vida no ca mpo, atrás do s
rebanhos. C om pouco se conten tam tão prestimosos serviçais. Alheios ao b or..
borinho das multidões e a os trabal hos de es forços viole ntos, a existênc ia d esli..
za-lhes t ranquila e risonha, n uma invejável paz de espírito. N as malha das ou

(1) Ttm u llp, llu Ult tu toml. P ..,. o, boltiru ...d.. Ih u ~ .. plid n i, como i ' t i... oculiio d . diur. O, ·. ..quei r o' •
•f,unho' • nbniru t eloP lnc-D o ,plnu D. p al1" d. noil l qu e n i o rt putt m o. ,.elo• . Por UD t o .io o. porqu.it o•• p.n oru
. qo.lu 11.0' m.h .pro..elt..lQ. ai lQ.. Il. .du.

- 101 -
ATRAv t s D O S CAM PO S

n os prados, a miudo se lh es proporcionam hora s e horas de ócio, sobretudo n a


prim avera.. em que o gado come à fari a, abastecendo-se depress a. E então. ao
a r liv re o u n a choça, ocupam -se em entretenimentos út eis e p a ci entes, q ue dã o
nom e à ch am ad a indú stria pastoril. Pequenos objectos de uso cas eiro, muitos,
a rtis tica ment e escu lp idos à p onta de canivete, em madeira, cortiça e ch avelho.
Deles to do s d ou mençã o desen v olvida em artigo próprio, qu e se encon trará
n ou tro cap ítulo .

Choca lhos Todos os g anade ir os os possuem em q c a n rid ede s u ficie n te às n eces-


sidades dos rebanhos. Os porqueiros carecem d e p oucos p or não ser
cos tume en cho ca lh a re m - s e os porcos, p osto que isso se veja exc ep ci onalmente
num o u o u tro suíno de tend ências vàdias. Mos os boieiros. os vaqu eiros, eg ua-
ri cos, pastores e cabreiros, como tenham r ecursos, possuem larga pro vi são de
chocalhos, para, devid amente arreados, pr ender em a o pescoço dos animais,
d eixando o u tro s d e reserva para suprirem extravios e estrago s.
No outono e n o inverno cada ge. na d e'iro em p reg o. t oda a lo iça (t ) de qu e pre-
cisa e de que p ode di spor, preferindo a mai or e mais r etu mb ante. N a pri m a ve ra
e v erão conservam ap enas a miuda e só num a ou outra r ez d e cada r ebanho.
O luxo e v icio m ais v u lg a r en tre ga n a d eiros sã o o s chocalhos. Di spensam-lhe
os melhores cuidados e n el es em pa t a m ca pital i m po r ta nte. q ue gasta m d e b oa-
mente, com ufania. É n otória a emulação q u e a es te respeito h á d e u ns para
com o u t ros. Tamhém mer ece reparo a u sança de se procu r arem r eciprocamente
para fa z er em trocas e compras do artigo em questão, com entando os re cursos e
o gosto d e cada qual na mat éria supradits.
Os chocalhos fabricam-se nas Alcáçovas, vila do di strito d e Évora o n d e
se ve n de m para serem revendido s nas feiras de t od a a p ro víncia . Q ue a l oiça
gr ossa, de maior preço, é mais fre quente ad qu irirem -na d irec ta men t e n a l ocali-
da d e d o fabrico onde os maiorais igualme nte vão o u m andam co n ser t á - la.
Nos diferentes modelos de choca lho s h á a s seg u in tes variedades: Tipo
g ra n de - Man gas, sem-serras, csstelbenes, e tc. Tipo pequeno - chocalhas, cam-
pani1hos, pícsdeiros, ch uca1hinho" et c.
C om a mesma designação de loiça, e para a plicação an álo ga ao d os choca-
lhos, mas restringida a os bois e cabra s - usam-se t ambém os esquil ôes e a s
esquilos - espécie de sinetes reduzid ís simas, de to ada semelhante à das cam pai-
nhas. Entre os esquilões, há os toeiros, d e som âs p er o, e o s finos d e so m a gud o.
E. mais um terceiro modelo - as sinetes - o maior d e t odos, ali ós pouco u sado.
E.mpregam-se somente para adorna r os boa s j un ta s d e bois ou n o vilh os q u e se
apresentam n as feiras.

Por aqui finalizo as n otas mais o u m enos comuns a todos os gen ad eiros.
A s referentes a cada especialidad e, adiante se encon t ra rão.

(1) No• • coa qlll 01 'lftaddl'OI du l'aA1ll , ca h lc amCftlC Ioda . el.... de ch oc. U.o•• u quliõlI.

102 -
AT RAV r- S DO S CAM PO S

Guardadores d e gado vécuum

Compreendem: Boiros- Vaqueiros - Açougueiro - Novilbeiro.

Boieiros Pela circ u nstân cia de, alternadamente, trabalharem com os ga n h ões,
a sua d es crição figura ent re o s criados de lavoura prõpriamente dita,
como se po d e ver d e pá gina. 70 a 74.

Vaqueiros S ão d ois: ma ioral e a juda. Se a vacada é muito grande, e por esse


fa cto se d i vide t emp orAriamente em dois rebanhos, um, o das va cas
paridas e p re n hes, co nt i n ua a carg o do vaqueiro e ajuda. O outro, d as res es
novas e forr as, ch a m a d as de elieiro, confia - s e a entregue extraordinário, que
se designa po r elieireiro.
A os va q ueiro s cu m p r e apas cen tar a vaca d a, sendo o maioral particular-
men te in cum bido de afi lha r 8S paridas, p r en d er e s oltar os be z erros «à esta ca», (I)
assinalá-los D a s orel has dura nte esse p eríodo, e bem assim. retemer ( I ) a s m ães.
quando precis e d esmamar-l h es as cria s.
Sold adas: O maioral ga n h a a proxi ma d a me n te 72$000 reis anuai s, n ão tendo
pegulbal , P os s uind o- o, d e uma ou dua s va ca s e égua, s enã o som en te égu a ou
vaca. vence m enos em di n heiro o valor a trib uído aos pastos d essas forras - 18
a 20$000 reis para os da égua e 9 a 10$000 r eis para os d e ca da va ca. Alguns,
sem pegulhal, ganham, além da ve rba em reis, u m a cer ta q ua n tidade de t ri go
ou cen te io, q ue ig ualm ente r eduz o venciment o em d inheir o.

Açougueiro Apasce nta a sç ougerie, isto é, a s reses bo vinas apartadas para:


engo r d a e ve n da com d estino aos açougues públicos. O encargo d e
açougueiro dur a d esde ianeiro a té ma io o u junho. À sold ada regula entr e
4 a S$OOO reis po r mês.

Novilheiro Trata ex clus ivamen te d a a pa s centa çã o d os n o vilhos, se es tes são


ta n to s q ue n ã o convé m tra z ê-los n a va cada o u boiad a. o q ue só
sucede n a s la voura s m uito g ra nd es . N es ta s m esmo. e Ig u me.s h á. o n d e sem e-
lhante ocu pa çã o dura a pe nas a lg u ns m es es . A soldada r egula p ela do a çougu ei r o.

G u ar d ad o r es de gado c aval ar

Limitam-se a o eguB riç o e, mu ito excepcionalme n te, a u m ajuda e a um


poldreiro.

Eguariço C om o ú nico encarr ega d o da mana da das éguas, m oi s se design a p or


~gU8riÇO
d o q u e po r maioral. O s se us prin cipais d eve res são : g u ar-
d81' e apascen tar a ma nada; r ep arar n o. vic iação das éguas pa ra quand o estejam

(I ) Pr lll.dcm-.a • Ulau, 11.0' primliro. dI .. d. D.... c1do• • por h u m pouca r u iu lo d a para . co mp.abarem .. ..,lu 11..
, ulod. , 0\1 pu . 11.10 m.m.um .= tXUIIO . qU' lI.do .. mlt. 11m hlh • .., . hundlnd • • da .ohal o .
( s) huul1l u r ItmporbIlLaaDla .. tu.. ela 'u u por qo.lqocr proullo 'lu" olnu • m . m . d... crl...

- 103 -
ATRAVÉS DOS C AMPOS

aluadas (1) as levar ao lançamento, regulhando-lhe os saltos, pelas ho ras e


interva los em uso; ass istir e dirig ir esse acto, p eando antes a égua 8 cob ri r e
segurando-a pelo cabresto durante a cópula: fiscalizar o la nçarote, repreen-
dendo-o quando lhe nota r ab usos, negligência o u desleixo; usar de toda s as
cautelas possíveis para a parição d a s égu as ir a efei t o. sem desastre nas cr ias;
tomar a direcção da cob ra nas deb ulhas d as eiras , m unido d o competente açoite;
tosquiar as crinas e rabadas das éguas e po ldras ; l embrar enfim a fe r ragem d as
mesmas na s vésperas de d ebulha, e a ela vefeeâc e referração p recisas du ra nte
essa fai na. D e verão, se 8. m ana da é g rande e av ultados os calcadoiros a d ebu-
lhar, o eguar iço tem a juda exeracrdí nã e íc, saido dos ganhõ es, o qual governa a
segunda cobra.
Solda da : S endo só a d inhei ro, oscila entre S4 a 72$000 reis anu a is. Ganhando
t rigo ou centeio e Fo rre d e égua, ou só uma das duas coisas, abate-se-lhe o
correspon de n te à m édia d esses valores . O s pastos da égua reputam-se entre 18
a 20 $ 00 0 reis, como já diss e.

Pold re i r o É o encarregado da pasto reação do s p oldros e m a ch os de u m a dois


anos. Em ge ra l, s6 se t orn a necessá rio n a p rim avera, ou n ou tra
época em que, por qualquer circunstância, se i mpõe a ap artação do gado n ovo.

P or-q u elr- c s

Afora os ra pa z es ajudas. de que nada temos a especificar, o g rupo dos


po r quei ras com pree n d e:
Maioral~ q ue é o chefe.
E n t regue das porcas, o q ue gu ar d a 85 po rc a s p ar id ei r as.
Farr oupeir o, encarregado da corrida d os larroupetes o u larroa pos.
Vareir n, o que a n d a com a vara o u porcos de engord a .
E a i nda outros entregues, sem nomencla tura esp ecia líssim a, por igualmente
a n ão t erem os r eb an hos em q u e se em p regam .
T od os em geral, e cada qual r es pectiv amen t e, in cu m be- l h es o trata me n to
d o r eb anho a se u cargo, bem. como a conserva ção e assei o da malhe d e, já pro -
ced endo a pequenos r eparos, já renovando com frequê ncia as camas dos po rcos,
de m odo a haver a máxima limpeza n as pocilgas e pocilgôes.
Q ua ndo as m al h ada s, d e construçã o rúarice, carecem de consertos grandes,
aos po rq uei ras i ncu mbe executã- los, com auxílio de pessoal es t ra nho.
A condução da com ida p ara os por cos ig ual m en te lh es compete. transpo r-
tan d o-a nas suas burras. do cele iro para a malhad a, se a quel e está próximo:
ficando lon ge. disp ensam- s e d esse se r viço.

Ma io ral Além da fiscalização que u m a vez por o utra , nas ho r as di sponí veis.
deve exercer sobre os entreg ues, incumbe-lhe muito parricula rmente,
a a 6lh ação das porcas e a criação d as ba coradas. Esta é a s u a m aior e mais

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A T R A v t S DOS C AMPOS

espinhosa missão. Para bem a exe rcer, não g'ua rde rebanho al gum, grande parte
do ano, passando quatro meses ou m ais na malhada respectiva. U ) ora a assea r
com escrúpulo as várias acomodações das po rc as e bác oros, or e cuidando da
alimentação das mães e fi lhos, principalmente d os b ácOIOS, qu e, até completa-
rem dois meses, carecem d e cuidados constantes e especiais.
À medida que as porcas vão parindo. cu m p re - lh e distribuir com equid a d e
os leitões r ecém-nascidos , para que umas n ão continuem sobrecarregadas em
demasia e outras nimiamente poupadas. P or ta n t o. às de maio r prole ou fraca s,
deve subtrai r os bacorinhos em exces so , matando os r a qu íticos e aproveita ndo
os i med iatos para os r eunir e a mam en t ar à s o utras menos fec u n d as o u r obustas .
E qua ndo a ssim n ã o cheg ue m pa ra rodas o ca r em b em afilhadas, terá de ir pedir
lei tões às m alha d as dos colegas vizinhos. onde po r certo l hos da rfio s e lá sob e-
jarem. como igual m en t e ele os ced eria. d a n do- se o. h i pótese in vers a. É d a p rax e.
R ea li z ad a a d esmama dos leitões, o maiora l forma co m eles u m r eba nh o de
qu e continua a tra tar n ão só na malhada ma s po r fora, em pastor ia, com a uxí-
lio de e iuda. E, co m os b âcoros p er manece até à s vésper a s d e nova p ar ição,
época em q ue os con6.a a o ut ro po rqueiro , pa ra se ir de d ica r cr iação em
à -

perspectiva. E nt reta nto a s po rcas não parem , t ra t a de pô r em ordem as p o cilgas


que lhes de stina.
A a ssina la çã o d os leitõe s na pocil ge , a es colha de marras para casta e d os
bãcoros para v a rra s cos , a castra ção dos s ui nos machos, e a assistência à mesm a
operaçã o n a s fê me as, s ã o outros deveres im periosos do m aio ra l, como ta mbém
lhe comp ete p ro ceder ao enca beça m en to do montado, se diss o o amo o incumbe.
S olda d a: 'C on sist e n o pegul h e l e em di n he i ro. O pe gulhel é forrado em
condições tão di versa s d e umas para outras «ca sa s», q uanto ao número de cabe-
ças pe r mi tid a s e 8 0 t empo de per m a nê n ci a das criações d e b âcoros, que se não
pode men ci onar com a b sol uta ex a ctidão. Salvo ligeiras variantes, aproxima- se
do seg ui n te : uma burra, po rc a a6.lhada e uma ca beça de eng orda na vara.
P or «po r ca afi lhada» s u ben te n d e-se o su stento d e uma porca parideira e o
das s ua s duas criações an ua is , de 6 a 7 b é cc ro s cad a uma . S e a po r ca p ar e m enos,
ou se parindo s ei s o u s ete, l h e m orrem a lgu n s ou t odo s, d u rante a ép oca conven-
cionada para o s ustento à custa d o lavrado r , o po r que i ro te m o direito d e pr een-
cher as fa l ta s com bâ cor os da mesma idade. que ad qu ira em q ualq ue r par te .
Doutrina esta igu al m en te a pli cáve l pa r a a s forras d e cabeças a dultas que lhe
venham a falt ar .
A forra da criação erv íçs , n a s cid a em dez embro ou j aneiro, d u ra a proxima-
damente n ove meses, ou se ja a t é a o «S . M igu el. s eg uinte ; a montanheira,
nascida no 6.m d e junh o a p rincípio de a gosto do a no anter io r , t ermin a também
em sete m br o, qua ndo os bãcoros têm 13 ou 14 meses . N es ta a lrura, já está nas-
cida uma n o va criação montanheira, que pross eg ue cr iando -s e, par a sa i r em
igual temp o no ano i m ed iat o.

ti ) tm d Ual bO Cal d. doft: m., u ced. \1 m• .

- 105 -
ATRAVt.S DOS C AMPOS

Daquel es de nove m eses ou d os o utros d e trez e a catorze, o m ai or al r ese rv a


um para corrida como far r oupo, afi m d e. n o c no seguin te, O m et er n a var a.
Quer poré m h aja o u n ã o es te cost um e. :fica e n t en d ido q ue os nove meses
para os erv iços e 0 9 13 a 14 pa r a os montanheiros, são em reg ra os prazos
máx imos estip u l ados para a s u a p erm an ênc ia no p eg u lhe l. D e vo p orém adve rt ir
q ue, tão longo pra zo , p od e con side ra r -s e cost ume exclusivo das «casas» dos
lavra do res (aliá s ba stante s) que u sam vender a s heco re de s p elo «S. M igu el »,
incl uin do, n a venda ou ven das, os b ãco ros d os criados, por preço ig ual a o dos
s eu s, em ig uald ad e de ci rcu n stânci as.
N as «casas» d os la vrad ores, qu e vend em as cria çõ es s uinas an tes de setem-
bro e nas d e outros que, a do pt an do sis tem a o pos to, a s con ser vam indefiniJa-
mente, para a s r ecr earem e engordar em. - os béccros dos pegul h e is são. em
ge r a l, ve n dido s o u ret ira d os an tes de te rem a i da de a trás referi da . s en ã o to dos,
alg u ns pe lo menos.
S e, como prática j á r ar ís si ma, o pegul h a l ve'i além d os usos mencionados,
compree n dendo também forras de corrida - neste caso prossegue uma das
a lud idas criações (no todo ou em parte), q ue o l av r a d or continua a sustenta r
depois do «S. Miguel». não como criação, mas como far r oupet es d e cor rida no
montado, e nas ervas até ao fim de maio, coroo {err oupos. S ó até ao fim d e maio,
t em po em que fata lmente hão -de sair. à excepção da ca beça para A. vara qu an do
tal fo rra haja, o que nem sempre s e verifica . Havendo-a , está cIaro que o
correspondente farrou po conti n ua a perm enecer, a t é engordar, no m on ta do.
O p egulhe l com po rca a 6. lh ad a e sim u ltân eamente i err oupos na corrid a e
cabeça na. va ra, ati nge uma i mpor tância t ã o av ulta da. qu e po ucos existem
nessas condições, emb or a em tal h ipóte se a ve r ba em di nheiro se reduza a 9 ou
1 0$000 r eis a n uais.
N a ac t ua lidad e, a solda da v ulgar em maioral de porcos, de «casa g rande »,
con sta de 24 a z7$coo r ei s anu ais e do pegulha l de fo rras seme lha ntes às que
a l udi em princípio, is to é, à b urra e à porca, com as criações mais ou menos
demo r a d as. O q u e tudo monta a verb a relativamente im por ta n te, se as criações
vinga rem e se ve nde rem po r preços medianos o u altos. Assim como também
pode licar reles e ín6.ma, no caso de m orrinha s o u de preços bai xos no gado.
P a ra o la vra d or se m pre sai bastante d ispendiosa a solda da. em que predomina
o peg ul hal de porcos, a ten ta o elevado custo da sua manu te n çã o. O duplo ou
o t ri plo do que antes era, já pelo m aio r va lor das r a ções, já por hoje se t ratarem
com mais ab a stan ça d o que outrora .
P ar a s e a quila tar is so com aproximação, darei mais adiante uma nota de
tal d esp esa, di scr im in ad a po r parcelas. Cus to pa r a o amo, bem entendido, por
qu e para o cria do só r epre senta u m pequeno emprego de capital, com probabi-
lidad es d e au ferir l u cr os que n u n ca ga nh aria. acomode ndc -s e a di nheiro
so men te . C om o pegulh e l pode sair -se em m édi a po r 150$ 0 00 re is e muito mais
em alg u ns anos, ao pass o q ue sanha ndo din he iro apenas, somente vencerá uns
90$000 reis quan do mui to.

106 -

ATRAV e s DO S C A M P O S

Antigamente maioral e entregues de porcos, todos tinham o pegulb al


av olumado co m Forres de 10 ou 12 cabras, en t re os rebanhos dos suinos, mas
só nos m eses de janeiro a nns d e s et e m b r o e princípios de ou tubr o. Nos três
meses restant es (épo ca do montado), era do ajuste rerirarem-ne s, indo colo-
cá-Ia s fora de Invernadouro, p a gando os ma iorais 400 a 600 r eis p elos p astos
de ca da um s. Àcabaram de t odo essas iorre s, verdadeira an omalia, que nenhuma
ra zão justifi cava.

Entregue das porc~ Guuda e a pa scen ta a s porcas criedeires, conduzind o-a s


à malhada . ta n to à n oitinha p a r a l á pernoitarem. com o
ao m eio d ia (estando paridas), para darem mam a 8 0S b âcoro s.
Ao a proximar-se a pari çã o da s mesmas cumpre-lhe vi giá-las a ten tamente,
provi d en cia n do " p rimeiro. para qu e v ã o pa r i r às po cilga s e n ão à rev elia
no ca m po " onde s e lhe podem fà cil m en t e est ragar os lei tõ es j s egu n do "
ac ud indo de p ronto aos ba corinhos recém- n as cidos d a s porcas que es ca-
para m à sua vigilância " deven do n es se ca so condu zir lo go m ã es e fi lhos p ara
a re spe ctiva malhada . É também do s eu d ever au xiliar O mai oral n o acto da
.lilhação.
S oldada: sendo ga nh a po r h o m em de co n6.a nça e sabedor, a p r oxi m a-se
da d o maioral, d im in uindo um pouco na verba em d inheiro e nas forras que"
em ge r a l. não ab ra ngem fa rro upos nem cabeça de engo r da . S e po rém a sold ada
con siste apenas em r eis" o que é frequen t e e p róp rio d e entregue just o a os
mese s, r egula aí por 5$000 reis cada m ês.

Farroupeiro Entregue Incumbido d os farroupetes n o tem po da corrida e


d ep ois d as mes mas ca beças tam bé m, ma s já com o farroupos n a s
ervas e 88ostadouros.
À sua s o lda d a é em t ud o semelhante à do en t regue d a s porcas" havend o
igualda de d e a ptid õ es entre amb os. Qu er o d i zer s e o farroupeiro te m pe sulhal.
é em cond ições iguais às d o do entregue da s porcas j se 8a n ha d in heiro s óm ente,
anda ta mbém i ss o por qus n t ta an ál oga à d o outro" em hi p6tese igual. Pode
gan har um pouco mais. se a fa r ro up o da fo r g r a n de , o du plo o u tripl o d a
ma na d a da s porcas" como é Frequente suc ede r.

Vareiro Encarregado de vara. d e engorda n o montado, d esde O 1.° d e n ov em-
b r o ou antes, at é à venda d os po r cos .
O va reiro ou é um entregue qualquer, q ue n o tem p o d e vara. to ma este
encargo, ganha n do portanto s oldada semel h a n te às duas ú lti mas r eferidas, ou
se acomo da exp re ss a mente, p ara o fi m em qu est ão" a 4$500 o u 5$000 r eis
por m ês.
QU9. Isq u er o ut ros porqueiras ent regue" qu e ainda ha ja na mesma «casa»"
nã o tê m n om e especí fico . À ssim, àq ue les que gua r d am báco ro s n o imp edimento
do maior al" claam a m-s e-Ih es apen as ent regues e n ão becoreiros,

- 107 -
ATRAVJ'.S DO S CAMPO S

Cuslo colculobo 6 $0160bo be um pcrqullro. com pfgulhol be crioçbo e cobll' no cl"'"

Criação erviça
Ervas da porca (de janeiro a maio) . 600
Rações pa ra a porca , n os meses da cri ação erviça (j aneiro e
fevereiro) . 1$500
Sustent o «a saco» dos 6 bâcoros, desde os 30 dias de nascidos
at é fim de maio, ou sejam 120 dias, ao preço de 18 reis
por dia e bácoro . 12$960
A gostadouro dos mesm os, nos meses de junho, julho e
agosto, 8 700 reis por cada . 4$200
R ação para os ditos bé coros, n o mês de setembro, ao preço
de 20 reis por dia e b âcoro . 3$600
Total da despesa com 8 criação etviçs, até à venda pe lo
S . Mig uel . 22$860

Criação montanheira

Agostado uro de porca (j unho a setem bro) . 1$.500


Susten to dos 6 b éccr os m on tsnb ei r as, desde os 30 dias de
nascença (fim de julho) até entrarem no m at o a comerem
bolota, ou sejam 90 dias de comida « 8 S8CO~, custando
a raçã o 18 re is p or di a e bácoro . 9$720
M on tado de cor rida dos mesmos, calculando o preço de 2$OCO
re is para a mont anheira de cada um, em toda a época . 12$000
I dem, i dem , para a porc a 4$000
Susten to a bagaço dos ditos 6 b ãcorcs, desde que termina a
miga lha ou retraça (fim de ja n ei ro ) até meados de
março - u n s 4$ dias, a 10 reis por dia e b âcoro . 2$700
Cust o das ervas para os mesmos, a âOO reis cada um, desde
janeiro a fim de maio . 1$800
A gostadou ro para os aludidos bécorcs, de m ai o a fim de
c agosto ou setembro, a Boo reis cada. 4$800
T ota l do custo da criação m ont anh eira. até aos 13 ou
14 meses 36$520
E rva s do farroup o 600
A gostadou r o 1$400
Corrida . 3$000 5$000
Forr a de u ma cabeça d e en gorda n o montado. 12$000
Pastos de uma bu rra . 4$000
Soldada a dinheiro 24$000
Cu sto total d a sol dad a (e xcluindo comida). 104$380

- 108 -
ATRAVÉS DOS CAMPOS

Pastore s
Pondo de par te os ajudas, qu e n a d a ofer ec em di gno de m en çã o. os pastores
consta m ; d o maioral das o ve l h as, qu e é o ch e fe ; d o carneireiro, que g UBr da os
carneiros, e d e d ois, três o u qu atro entregu es mais, sem d enomin a çã o es peci al.
por igualment e a não terem os reb anh os qu e apascentam . Quando s e a pa'rta m
os alavões-rebanhos d e ovelhas que na p rim ave ra se or d enh a m para o fabri co
do queijo - . os entregu es e ajudas r esp ectivos, chamam-se-lhes alavoeiros.
Os pastores - a lé m d e gua rda rem e a pas centarem o ga do ovino - cumpre-
..lh es mais o segu in te : mudar os bard os, O u r edis, um a o u dua s vezes po r dia. h )
conforme a época, para apr ov ei tamento d os estr u mes ; li m pa r as reses d a s
eagaitas vol umosa s qu e se l hes formarem na lã , próximo d as t etas, d os testículos
e da cauda; ca ta rem , co m a ten çã o, o s eu r ebanh o, log o q u e o suspei tem invadido
de ronbe o u d e bexiga, marcando a s eca beça s e q ue en contrarem atacadas, pro-
cede nd o ao seu imediato cu rativo ( 2) e r epe tind o- o enquanto for necessário; fin al-
mente, re gular as horas da solta e r ecolhiment o d os animais, em h armonia com
a época, esce ssê s o u abundância de pastos, condiçõ es d o ga d o e estado do tempo.

Maioral Chefe de t od os os pa stores, apa scenta ig u al m en te u m r ebanho, sem-


pre o que d emanda maior d edicação e cuidados. A ssim, n o outo no
e n o inver n o, a nd a com O das ovelhas próximas a parir e as r ecém-paridas. o u
seja a chicada mais no va. N a p ri mave ra e n o ver ã o, gua rda o d os borregos
ou borreg as, e na falta de stes, o u t ro q ue tamb em careça de pa st or ex perim en ta do.
Afora os de ver es comuns a tod os os pa stor es, cu m p r e- lh e : de acordo com
o lavrador e em result ad o das o r d ens e autorizações que tiver dele, indagar d o
passadio e do estado s a n i tá r io d os rebanh os, fiscalizando os entregues
e re comendando-lhes O qu e fo r convenien te; empregar as cautelas possíveis
para diminuir as probabilidad es de inva sões epizoô rica s, se mpr e que ess a s
doenças existam n os ga dos d os vizinhos; es fo r ça r -se po r atenua r sem el h a n tes
est ragos q ua ndo por ventura a m oléstia a co m eta a qu el es q ue estão sob a s ua
r esponsa bilid a d e, já ob riga n do os entregues a em pregarem os t ra ta me n tos q u e
lhe fo r em re com endados. j á au xili an do- os nesse p rop ósito. M a is l he com pete:
conta r, d e vez em quando, o gado todo. inqu iri n d o d o núme ro d e r ese s m orta s
e da s suposta s o u verd adeiras ca usa s que a s vitima ram, parti cipand o tudo ao
amo , prend er as o vel h as r ecém-paridas que regei tem as crias pa ra , d este m od o.
conseguir qu e as a cei t em a fi na l, com o é provável; d obrar os borregos, qu and o
seja m menos que as o vel h a s. p or efeito de morrinhas; assinalar nas orelhas.
o ga do nov o e bem assim cortar-lhes o rabo. se este antigo costume ainda p er-
sis ti r; fe rr a r no f ocinho, com o ferro da CC8 s a » e dur an te o inverno. os maIatos
e maIata s ; com a u xí lio d os en t regues. rebeisr, n as vésp eras de se e pe r te r em os

110 m. l. ,,,11.1, mud. u m·,. o. b.rdo.UIII. na por dia , DO' m.." d. nlllll bro • f ..,.. nír ol dll " , de m . r ~o. fi ...
d. IAlío : 0:11 . , 'al jou o• • d. dali lIA do" d I.., dora lll.t. O .eri o.
f2\ P ilo. pr ouuol ' I n lall lll.t. ro u1o.lcld ol d. t odo. o. p" IU"• • UIA d. O'l;tto. 4uc 110.. fonal l.. dJudo•• 1' (11I 0 uni
I Dtl JO d. n fuir , 4o " IIl. J o tn tu do. ....10•.

- 109 -
A T RAv t S DOS C AMPO S

alevões, 8S ovelhas re sp ectivas, tosq u ia n do -l hes a l ã dos ú b eres e pa rte s VIZI -


nhas q ue estorvem o or de n ho; fa zer as apa rt ações co n se n tân eas a cá da época
e à s n ecessidad es de ocasião; escol her os bo rrego s p a r a car n eiros de casta;
capa r os ma Iatos e os ca rn eiros incapaz es d e pro sse guirem com o r epro dut ores ;
refugar a s bad ana s, assinal and o-as ; ma rca r a ca l branca n o g a do p r eto e a pés
no branco, t odas a s r es es Ianig era s, uma vez p or a no, qu inze dias dep ois d a
t osquia; repeti r o m es mo s ina l o u pô r ai nda outro, nas part id as d e gado qu e
forem a qual qu er f eira ; assi stir enfi m ao te n dal da t os qui a. sup eri n t end en do
e a uxilia ndo esse serviço.
S old ad a: A n t igamente consistia numa simple s m oeda de ou ro (4$800 r eis)
an ual e n o peguLhal que era i mp ortan tíssim o. H a vi-a s de 100 a 150 o velhas,
bu rra , do ze cabras e os respectivas criaçõ es.
E.sse sist ema tem -se m cdífica d o, mi n gu a n do a s f orras à prop orção q u e
se el eva o ve ncimento em reis. H o je a s ol d ad a corrente do maioral de ovelhas,
de «casa g [a nd e»~ r egu la a p ro xi ma damen te pelo se guinte : z4 a 27$()(X) reis e as
Jorras de 60 a 80 ovelh a s, burra e a s res pecti vas criaçõ es.
T a n to no ut ros t em p os como na a ctualid ade , o leite das ovelhas dos pastores,
per t ence ao l av ra d or. O s o u tr os prod uto s - lã e crias - . consti tuem r ecei ta
absol ut a d os don os d os p eg al h a is. A l ã v end em- na co n ju nta m ente co m a do
amo e por p reço igual; os bo rr egos t êm de sair até ao S. P ed ro, prazo m áxim o
pa ra a s ua p er m a n êncía n os r eb a n h os d o la vrador. A cr ia d a b u rra deve
r etira r a o an o d e idade, po r a t ingir o limite p er m itido pa ra es te gé n ero de
i orres,

Entregues Ac omodados a dinheiro, sem mais forras qu e a d a burra, ga n ha


ca da um 4$Soo a 4$800 rei s p or m ês.
Ajustando-s e co m p egu lhe l, v ence cada u m 12 a 1 4$000 r ei s anuais e as
torres de 40 a 50 o velhas e o. de uma burra, t u d o nas condições esta belecída s
p ara o m ai oral.

Alavoeiros C ostu mam o cu pa r - se dois para cad a ala vã o . Tanto pod em se r


entregues de carácter per mane nte, como outro s, a comodados de
propósi t o para es te fim .
Seja como fo r, desde q ue n ã o te n ha m peg u lha], ven cem 4$800 a 5$<x>o re is
mensais ou un s Soo ou 1$000 reis m ais p or mês d o q ue estavam ganhando
como s imp l es pas tores . A sub ida jUSlti6ca-s e pe lo encargo d e ordenharem as
ovelh as duas v ez es po r dia, com o au xí li o do s roup eir os. Os ala voeiros são
tam b ém g ra t ifi cad os com um queij e ou r equeijão po r dia, afi m d e mud a re m os
epriscos h l t odos os dias, e n ão de longe em l on ge, como a n t es s e p r a-
t1 Ca\·8 .

(zl E tUlIlh..o1o; i• • 1I n llj lll.. o' all ri.to, nl o alo o. budo. o",d. pn. olt..... CllI ah4... t r.... o ri .... .. ....IU .i.... ' Cl u. lu
. 1Ic111.1 t. dfllia.do. ' 0 IIrdul. },o d.. 0...11. ...

- 110 -
A TRAv t S DO S CAM P O S

Guardadores d e gago caprino

Cabre iro C os t u m a ser um a penas-maioral e entregue de si próprio, pO I assi m


dizer, durante os m eses em q ue as cabras não trazem cr ias a mamar.
M as desde que parem (de o u t u bro a d ezembro) até à desmama d os ch i bo s (prin-
cípio de ma rç o), O ca b r ei ro é auxiliado por um ajuda .
Ao cab r ei ro cu m pr e : apas centar a cabrada com todo o zelo, não t endo
preguiça em l he d ar o r epa st o da noite ; coa dj u var a construção d o bardo, dos
chique iros d os chí b os, e da choça p ara el e ; a filhar as ca b ras co m o tino p r eciso,
de modo q ue , logo d e p rincípio, conheça o chib o o u chi bo! q u e pertence m
a cada um a, para dist rib u i r os fi lhos pelas mã es. e nunca os bar a l h a r, arri-
mando-os a estranhes. o que tra n s torna o bom êxito d a a 6.1h a ção ; or d en h a r
com presteza e reg ular idade n a s ho ras; fazer as cam as n os chiqu eiros, ren o-
vando-as q u ando seja n eces sário j a ss ear o bardo, varrendo- o a m i udo; lav ar
os Ferra dos do leite; a ssinala r n as o relhas a cr iação ; ferr ar no foci n ho. co m
o fer ro da «casa», os anacos e chibsrros, durante o i nverno; escol he r os chibos
e chi bas para ca sta; ca pa r os que for n ecessário j r efugar o sa d o velho ou acha -
cada, par a o a m o o vender; etc .
N a or de n h eção. cumpre-lhe ser cu idadoso. saceando tod o o leite q ue n ã o
for indispensável a os chibos. Fo, se estes já não mamare m. mais esc r upuloso
e completo deve ser o ordenho. Em tais circunstâncias, o leite que ficar nos
úberes, r epres en ta p re juízo para o lavra dor e dano par a a s cab ras. A s q ue são
muito leite ir as pod em ense rilb.ar-s e {chagar em-se- lh es as t etas), n ão send o
bem mungid a s.
Soldada: C onsistia a n tiga men t e em 2 a 3$000 reis po r m ês e o pegulha]
de burro. e 12 ca bras, o u. em s u bst i t ui ção, 15 a 20 ch íbos. O leite das cabra s
vendia-o o maioral em su a casa , ao público, ou queijnve -o por conta própria r
as crias de sfazia-se dela s por o cas ião da desm ama, em março, ou pelo ..5. P edr o »,
tempo em q ue fa ta l me n t e h aviam de sair . Sendo a s forras const it u ída s p or
ehibos, o ca b re iro co mp ra va -o s ao s 4 ou 6 m es es d e idad e, p ara os ven der n o
an o segu inte como anscos. Lucrava a d if erença d o valor d e um para o u t r o ano.
E ste costu m e, que ainda vi gora em a lguns co ncelhos, es tá exti n to no d e
E lvas. onde, par a o caso em questão, só se u sa a s oldada a dinheiro -
4 a 5$000 reis po r m ês.

Chibateiro R apaz ou h omem q u e gu a r d a e a pascenta os ch ibos ou chibatos.


N a maior pa r te das «casa s. é o cu pa ção t r a n sit6ria, limitada
à primavera e v erão . A s oldada r especti va varia sensivelmente. Se as cab eça s
a guarda r são po uc as e n o vas, e a s g u arda um rap a z, este vence 1$200 a 1$500
reis por m ês ; se pelo cont rário, o sado é adulto e numeros o, e o apascen t a
qualquer homem, a soldada eleva-se a 4$000 re is m ensais.

Alfelr elr os
S ã o tod os os entreguee de q ualquer especie qu e se ocupam com rebanh os

111
ATRAvtS DOS CAMPOS

de s lleiro. Por aIFeiro denomina-se o gado novo h l de um ou de ambos os sexo"


que constituem rebanho em separado. sem nele se mistura rem reses paridas ou
d e prenhez adiantado.
ALIMENTAÇÃO
Em regra, a ali mentação de to do o pessoal de u m a lavoura é à custa do
lavrador. O guarda de h erd ades, os ge ned eieos e poucos m a is, fo rnecem-se po r
meio de comedias ou comedo tia s, (2) a viadas n o fi m da semana , senã o às q uin-
zenas o u a os m es es, como por ex cepção t am bé m s e vê.
O pesso al d o m onte. a ga nhar ia, a car raç a, os carreiros e out ros, tê m comid a
preparada por conta d o amo, em harmonia com os us os e p rá tica s, qu e mais
adiant e m enciona.r ei.
.. . ..
O s av ios q ue compe tem po r sema na a u m homem o u r a paz, j usto por
com edo rias, são 09 s eguintes : 9 a 10 quilos de pão; 31S gramas ou três quartas
d e toucinh o ; 3$ centilitros ou um quartilho de azeite; dois litros ou um s ela m im
cog ul udo de legumes e sete queijos. Estas são as chamadas comedias direitas.
que. sem embargo. não constituem r egra geral o u in al terá ve l, a ntes variam um
pouco de «ca sa» para «casa» e de ocupação para ocupação.
Noutros tempos, quando os po equei'ros e pastores dispunham de pe g ulhais
completos e grandes. os mantime ntos que venciam limitavam-se ao pão, azeite
e leg umes, n ã o tendo queijo n em to ucinho. po r se entend er que ess es víver es
era m de sobeio s u pridos respectivame nte p elo leite d as ca bras, rendim en to da
lã e engo rda do porco n a vars.
De há a no s para cá tem-s e banido t al sistema, ge neralizando-se o d as
co medorias direi tas - único raci onal.
A o s s ábad os, todos que a s ga n h a m, a flu em a os m onte s com as ég uas e
b ur ras, para se aviare m do s seus m antim en tos e d a s p erru mas para os cães.
T u d o p or conta, peso e medida, a que eles p róprios assistem, para verifica r em
a exa ctid ã o. Aviados de vez, carregam as bestas, de penduram-lhes os azeitei r a s
das albardas e assim marcham com as comedorias para as malhadas ou domicí-
lios, de onde os vão consumindo. Há porém ge. n ad eircs q u e deixam no monte os
legu mes. o toucinho e pa rte do azeite, para lá lhes p repara rem as ceias e eles
o u os ajudas as irem buscar nos tar ros todos 09 dias à tar de.
Os boieiros raríssimas vezes tê m mantimentos. O u su a l é receberem comida
feita, como se usa para os 8anhões.
O s cabreiros durante a ép oca do ordenho, não recebem aze ite para almoços,
pois que, em vez de açorda ou coisa s em elha n t e, almoçam leite qua nto quer em.
. . .
O pessoal d o mo n te, de po rtas ade nt ro, a l m o ça janta e ceia , em todo o a no.
a ho ras i n dete r mi na das, que se reta rdam ou adiantam con forme os afazeres.
h) D. um • 1rh .ao. "O , ..do . ' e....m • ~ • ••l ar• • d. '''0 .. . no • m. io .. o. l u laGl, t . nll uo•• ~. prl .. o• •
~2) !.Ift ll a, u .,. m phhli•• mpu,.·.. o l ~rm o d • .:om.,J... . aio o d. comeJo rl'J.

- 112 -
ATRAV l!. s DOS CAMPOS

Os almoços constam de umas sopas quajsquer, ou migas; o jantar, de olha, (1)


e as ceias, de sopas d e leite, de atahefe o u açorda, qu eijo. aze itonas. etc., etc.
O pão é de trigo ou de centeio, conforme os usos da eca sa» . Para os ca r pin t ei-
ros é sempre de trigo, comendo à parte d os outros serviçais.
Às olhas. tanto d os carpinteiros como do cozinheiro amassador, (~d etc., sã o
melhoradas com carne en s a ca da , excepto nas sextas e sábados. que se temperam
de aze ite. D e tudo qu e se come aos almoços. jantares e ceias, nada é regulado
por co n t a , peso ou medida, pois tud o se dá a s obejar, principalmente se o lavra-
dor r eside no monte. S e vive fora, na cidade, vila ou aldeia, faltando no m on t e
a fa r tura p ró pria da resid ência de um lavrador, as comidas dos criados aludi-
dos, são menos var ia d a s, mas nem por isso deixam de ser melhores qu e as dos
ganhõ es.
... ... .... ... ... .. .. .... ... ... ....... .. .. .. .... ...... .... .... .. ... .. ... . .. .. •

P ara a gan haria, carxeiros, carraça e mais gen te que trabalha por fora , a'
comida é dada em refeições, que variam de qualidade e h ora, s egu n d o a época
que vai decorrendo. Em tod a s e em qualquer temp o, predomina o pão de cen -
teio, con hecido por m arrocate, que o pessoal come à franca na quantidade que
lhe ape tece.
Para o fim em quest ão, o ano a grícol a di vid e-se em d ua s épocas : a p r imei r a
desde o começo da seme nteira outonal (22 de setembro) até ao úl ti mo de ma io ;
a seganaa - a de verã o - d esde o 1.0 de junho a té a o «5 . Mateus».
Em am bas, no intervalo d a s comidas, é cor r en te qualquer serviçal com er a
s ua cunba ou pedaço de pão, s endo isso u so ge r al durant e a lavoura propria-
mente dita, por ocasião da primeira ag ua da d e manhã e também na da tarde,
i mediata 80 meio -dia.

Comidas h abitu ai s n a ép oc a d as sem enteir as e a l q uei ves.


desde o «5. M ateus. , ate ao fim de m ai o

Almoço Às três horas da m a druga da , no tempo da sementeira outonal, o abegão


ou O sete levanta-se, sai da s u a casinha e va i bater à porta da d os
ga n h õ es, a quem aco rda, gritan do - lhes : - «V á de leva n ta r e ca lçar». - O s d e
den tro respon dem, e o de fo ra , côn sci o d e q ue foi o uvido , d ir ige-se à cozinha
do mo n t e, a tratar do almoço, como disse n outro l uga r, a o descrever a vida n o s
mon tes.
a a lm oço consta ordinàriamente de aço rd a com azeitonas. (051 Da cláss ica
a çorda alentejana, cujo caldo o a beg ão p repara nu m instante. la n çand o a águ a
a ferver em ca ch ã o so bre os barranhões, onde o cozinh eiro depôs os rem peroa

( I) POf 0111. d . no mhl ' -u. o cosido dlt l'AlImu o.. h.Oft.IJ,. IJr'J1.udo com . ord ....... to"d.. ho o" .ulll.
ls) 2..u. doI. conam• • 111 . IA" '" mOIUU, co .. fu.. ~.mlt .. t. com .. cri.d.. do .u.. iço domh1lco. d. co mida Cf'101t . oh.$ou
do• • mo• .
(S) Em . lAlln. domla.o. do O"lono. 1m 'lue. .... 0 lolj•• 'ln-te 1m CU I.. 4C.......Imo ço de mi .... em n z d•• ço..d••

- 113 -
ATRAvtS DOS CAMPOS

- azeite (1) e sal pisado com alho. poeics ou coentros e pim então. Escaldado
o azeite, prove -se, corrige-se a água do sal, e, pronto. está o caldo feito, exa-
lando o cheiro a ctivíssimo dos temperos.
C o m o caldo a evaporar, o abegão o u o sora cond uzem -no nos alguíde res
para a mesa, de antemão posta por eles. Só faltam as sopas que, em breve.
serão mígadas pelos ganhões. P a r a que estes venham imediatamente, o abegão
sai à rua e solta o brado do estilo: - «Ao almoço I. . . » - Brado estridente.
retumbante e pro longado, que. n a s madr ugadas serenas, chega a ouvir-se a
mais de 2 q u ilómetros de distância. O «governo» que tem boa garganta, timbra
co m o es paçar, gritando al to, muito a lto, para que ao longe o ouçam e lhe
gabem a voz.
A chamada, acodem todos. E n t r a m, tiram os chape us e assentam-se à
mesa por ordem. O ebegão ocupa a cabece ira, o sota fica -lhe na frente. Em se -
guida , cada q ua] p uxa da navalha e todos passam a m igur o pão para os e lgui-
dares. a t é mais lhes não caber.
A m olecid a s as sopas, o «g o ver n o » exclama: - «C om Jesus I» - E todos
principiam a comer, em comum, dos barranhões mais próximos, n um silêncio
profundo, em que só se ouve o ruido das colheres de lata e de chavelbo,
quando tocam no vidrado dos e lg uidares.
E' demorado o almoço, assim como todas as refeiçõ es. O homem do campo
tem por hábito comer devaga r, a g u a r d an d o que a comida arrefeça. Não lhe
agrada quente, pela preocupação de q ue lhe estraga os dentes. E o certo é que
qu ase tod os os possu em m a gn í fi co s, n ã o l h es dispens ando cuidad o s.
C a d a g t UPO d e 4 a 6 gsnhões co me n u m só a lguidar , sendo da p raxe, cada
homem , meter a colher sõmente no sí tio onde encet o u. O que transgride o pre-
cei to. é repre en d ido pelos o u t ros, co m o gl u tão e ma lcriado.
Alm o çam enfim. O ebeg êc, ve n do q u e t o d o s deixaram d e comer, dá o sinal
de retirada, p o n d o - s e d e pé a despe jar a mesa com o a uxílio do sota.
O s ganhões saem para a rua. põ em o chape u e atiram fora com os caroços
d as azeitonas. D ep oi s. vai de c'ige r r e d e , em volta da chaminé, na casinha.
Um ins tante a p en a s, a pretexto de se m unirem d os apeiros o u de quaisquer
f erram en t a s q ue tenham de levar para o trabalho.
À partida, p r ont o a a n u nciam 05 «cabeças», saindo do monte co m o saco
d as merendas, em a tit ude de m archa. O s ca rreiras ig ualmente d eita m fora a s
parelhas, pa ra ta mbém s e pô r em a caminh o .. .
M a r cha m todos . A noite a i nda per siste, mas as estrelas anunciam a apro -
xima ção d a aurora .
I s to, r epit o , n o o utono, «na fo rça das sementeiras». D ep o is , madruga -se
men o s, almo çan d o - s e ao amanhece r , e de dia cla ro, em março. abril e maio.
Mas a açorda s ubs iste, s al vo n os dia s «de nomeada», que, a s eu tempo.
r efe r i rei.

(r > N . qU&lltldd.• d. td . CllltlllUOJ par. cad. hOIQ'='

- 11 4 -
ATRAv t S DO S CAMP O S

Merenda T em lU8aI das onz e ao m eio dia, no local do tra balh o, ao ar livre,
s up r in d o O jantar, qu e n ão é de uso fo r n ecer - se n os se rv iços d e a rado
e de outros lig eiros, durant e a ép o ca a q u e venho aludind o. (1 )
À merenda con st a de p ã o e qu eijo. Um p a t a cad a homem, com o p ã o qu e
tiver na vontade, pouco o u muito qu e seja.
- «Tirem os queijos, o h lsanillu: » - di z o abegão, apresentando o talei go
aberto à gan h ar ia . E a cres centa: - «M eta m a mão, mas não escolham . . .
Tirem o que lhe calhar ... »
P OI sua vez, ca d a qu al tira o q ueijo q ue l he com pe te e igualmente s e
apos sa dos m a rr ocates que calcu la comer.
O tamanho e q u alid ade dos q ueijos, d ã o origem a com entár ios. O g anhã o,
que é desconfiado, p ers u a d e- se q ue tirou dos m ais p equenos, invejando a so rte
do com pan heiro próximo, que tem um que se lhe a figura m aior e de melhor
aparên cia que o seu. D est a s suposi çõe s, su rgem pequena s disp u tas, em gr a cej o,
que muitas vezes t erminam pela tro ca dos q ue ijos, s e a de sig ual dad e não é
evid ente. S end o. o possuid or do maior, q ue em começo fingia querer trocar,
recu sa -s e po r ú ltim o, chaco t ean d o o outro q u e o tomou a sé r io.
Durante a merenda, a malta n ã o es t á silen ci os a . P elo cont rário. falam a
prop ósi to de t u do . Os solteiros fo rm am g ru po àp a r te, come nta ndo a s eu capr i-
cho. os namoros d os ausentes e d os presentes. O u vem e dize m muita p ia da, de
que u ns se ri em à s oc a p a . de que outros se form aliza m . e de que a'lg u ns se
envaid ecem. avo l u m a n do-a s a seu sabor. com o geba ao las q ue sã o.
.... . . .. . . . . ........ . .... . .. ... .. .. ... ... .. .. .. . .. . .......... ... .... . ... . ... .
o abegã o é o p r imeiro a merendar. O s 88n h õ es espaçam q u a n t o podem.
mas, afinal. con clue m t ambém. T od os então fazem os cigarros com a morosi-
dade do estil o, acendendo-os com f uzil e isca .
Nesta a lt u r a, a con t ece que. um dos motejados na co n ver sa sobre namoros,
aproveita a oca siã o para exi bi r uma bolsa nova de petiscos. bordada a missanga
pelas mãos do de r r ic o, Obra d e luxo e de fantasia, que ele mira e remira muito
ufano, a d esp ertar a a t enção dos camara das. Estes, reparando na prenda,
chamam-na a si para a apreciarem e comentarem, s egu n d o o seu critério.
De entr e os qu e a ga bam. h á quem fix e o poss u id o r e lhe di ga: - «C a r a m ba,
Zé, que isto che ira a f êmea I.. . Viva O bem feito I. " Bem se v ê que ela tem
mãos de pratel . .. » E a s orrir-lhe malicioso, conclui: - «A h , m a r oto f que j á a
ganhaste I.. . »
A tais amebe.lidades, o Z é nca derretido. T odo baboso, responde : - . O r a
adeus. as coisas dão-se a que m a s merece 1. • . »
'E, nestes di ch otes prosseg ue m , até o e.begão recomeçar a faina, dando a
merenda por n n da. Uma h ora de interrupção, aproximadamente.

h .) S. por u.np~io . DoUta I pou Iu rl . te oc,,"pa ... tn b.lbo•• ioluI IO' . como c. .... ue . • alo ai mUI D.d. ,. b on
.0 • • 10 di., .... . laI j.atu d. Itpm u lll.lb.Ul.u ... u i.. próp ria. do t ..., po. N. IlJpó IU. d", buer j u u ar •• uia coau.
i • . ... UpM. olb., ou d. 40 ahCCu u -opu.

- 115 -
ATR Av t S DO S CAMPO S

Ce i a No te mpo das sementeiras e do alqueive. é a principal ref eição da ganha-


ria. Efectua-se ao anoitecer, lo go à chegada do tra balho. Consta d e olb«
de legumes com batatas ou hortaliças, adubada com toucinho o u azeite, con-
forme os dias da s em an a . h) Nas olhas com toucinho, també m se usa couve em
vez de legumes.
O s domingos, terças e quintas, são di as de bois. (I) Nas segun.des-Êeire.s,
qu ar ta s.. sextas e sábado s, condime nta -se com a zei t e. P or este motivo, além do
cozido, há, p ara cada hom em, o con d uto de meio queijo, ou a z ei t onas à fran ca.
Nas la v ouras em q ue. n os d omingos de fo lg a , a maioria dos g anhões não
recolh e ao monte p or ncar nos povoados em bailarico! e coisas s emel hantes, a
ceia de ssas n oites cost u ma se r adubada com a z eit e, tran sferindo- s e o toucinho
par a o dia i mediato, afim da bois se r par tilh ad a por to dos.
Àntes, durante a quares m a, as olhas preparav am-se s empre co m azeite,
excepto a o s d omingos, qu e eram cd e carne». Hoje, a alimentação dos criados
d u r ante a q uaresme, sub or d i n a-s e em tudo a os u sos or dinários.
Às rações de legumes e co n d ime n tos não sã o ig u ais em todas as c casas»,
mas pouco diferem. Na maioria delas. os pesos e medidas do costume para cada
h omem e ceia, s ã o os seguin tes : tr ês d ecilitros de legumes aproximadamente e
dois a três centilitr os de azei te, ou 100 a 11S gr a m a s de tou cin h o. Havendo
m istura d e batatas, os le gumes entr am em menor q ua n tida d e.

* * *
A o a n oi tecer , dã-se a ceia. O ab egão ou o sota, senão os dois, põem a mesa,
vasam a olha da a sa da para os a lguidares, separam a boia (q u an d o a h ã) e con-
duzem a comida ao seu destino. D epois, um d eles sai à ru a e grita : - «À ceia 1. .••
- Grito forte, que se ouve distintamente. Fraco q u e foss e, ouvir -s é-ia tamb ém,
atenta a impaciência com que os ga n hõ es o atua rdam.
Mal p ois o ouve m . t od os entram DO m onte, todos s e d es cobrem e to dos s e
sentam à mesa n os l uga res habituais. C omo de cos tu m e, o a be g ão p reside, sen -
tado à cab eceira .
Prim eiro, m tg am-se as sopas sobr e o caldo da olha . Tan tas quanta s possam
ficar em bebidas. F eito isso, o «gover n o» p rofer e a in vocação do : - cC o m J esu s l..
- e a ga nharia p a ssa a co m er vagarosam en te, com o silêncio e o rdem q u e n otei
ao tratar d o al m o ço.
Qua n d o t odo s deixam d e come r os legu m es o u a couve, o a b egã o - se o dia
é ed e carne» - puxa a si a pala Dgana do touci nho e parte a boie ( 3) em t a n ta s
rações iguais q u a n tos são os homens. E. oferece -lha para que a comam em

h ) E.. cn to, di•• (u tJ..o. do IDO, .. ui.. ou o. j' Dt ar .. d o ulut... I.'Dta m. ILon do" ( omo t en! ou,llio d . uf llir.
h ) N., J OIlr U do A I. Au jo d boi• • 0' .. u o. d. lo oda.ho ( OUl qu i n . dob • • olh. do. ai.d o., • qUI d.po l•
• por ..lu co. tdo ta_ h' m d• •btun com pio.
(3) . f" l.no 4 " " em p.rt•• bo/. _ - d i~ ... DO' um pu d. l.I"u qU' Ddo •••10, 1. ",u' m .trtbuh.do.IL • • pr lm. aI. de
m.aJfut • • up.riorld. d• • m qu. l qou coi.. , ' 01,1'1 outro. (nd l..ld" o' d. ca ndh au IIm .I L. o tu, l...ld'D tcm'Dt• • o co.ni to d.
ú .... pro ud. d. qu.l. puno, . ti... do . 1,. ' 10.

- 11 6 -
ATRAvt S DO S CAMPO S

seguida, ou a guardem como entendam, para a co m er em q u a n d o qu eiram . ( 1)


Ào te rminar a r efeição, o abeg âo, ou se levanta imediatamente sem mais
ceri món ias, para que os outros r etirem, ou m an t endo o cost ume a n tigo, outrora
de ri goros o uso, junta as m ã os e diz: - eD emos gra ça s a D eus.»
À voz de - G ra ças - todo s põem as mãos e n in gu ém deixa de r ezar, pelo
m en os a parentement e. O s h omens con ti n ua m sentados ; os r a p aze s l e va ntam-se,
rezando de p é. N enhu m t ermina sem o a begão se benze r . E ste, concl ui atinaI
e, benzen d o..se , diz: - «Lo u vado seja N osso S enh or J esus Cristo I»
Ouvido o «lo u vado», vel h os e DOVOS benzem-s e tam bém, e tudo sai em
debandada. O s r apazes n oveis, a ntes d e saírem, p ed em e recebem a b ênçã o d os
pais, dos avós, dos tios , d os vel h os e do a begãc . (2)
........... ......... ..... . ......... .. ... . .. ...... .. .. . ...... ..... . ........ . ..
N um mom ento, os gan hões d ispersam pelo te rreiro do m onte, em gr upos
vários, correspo ndentes às diversas id a d es e inclinações : os ve lhos e pacatos
r ecol h em à casinha, onde pernoitam j os n o vos, fo lgaeões, n em se m pre os
acompanham . P o r vezes m archam à press a para as aldeia s o u para onde tê m
os na moros.
E n tr etant o, o abegã o e o sota levantam a m esa . E~ a ct o conrínuo, do que
sobeja n os barranhões e do que de prop ósito fi cou de r es er va na asada, a r ran-
jam a ceia dos malteses, adicionando-lhe as sopas que julgam necess ârias.
S e isto reputam insuficien te p ara abastece r a m altese.ria, p reparam-lhe m ais
uma açorda. Como <tuer que seja, agarram nos al guidares da comida, saem à
ru a, cham am e entregam-na.
- «Ai a t êm . . . • - diz o ebegãc dando a ceia aos me.lteses, que a vêm receb er.
- V enha ela . . . » - r es pondem os vadios, recebendo-a.
- «B em em p r ega d a I.. . • - resmunga por vezes, baixinho, o «go ver n o», ao
voltar-lhes as cost a s, d e caras a o mo n te .
.... . .. . . . .. . . . ... . . ... . ..... . . . . . ... . ... . . .... . ..... .... . . . .. .... . . . . . ... ..
R efei ç õ es da ép oc a d o verã o d esd e o 1 .0 de Ju nh o ate a o eS . Mateus»

Almoço Realiza- se às set e h ora s da man hã. Consta habitualmente d e s op as


de cebola , ten do po r con d u to azei tonas e me io q ueij o para cada
homem, que o pode comer o u e rrecader, como tiver na vontade.
O int er valo d o a l m o ço n ã o d emora m enos de meia hora, nem mais d e uma.

J antar D á-se ao m ei o dia, a p roxi ma dam en te . Consiste em olha de l egumes


com to ucin h o e m orcela o u badana, excepto nas sex ta s- fei r a s e sába d os.
«dias de a z eite». À s quantidades de leg umes e de a zeí te s ão as mesmas das ceia s
n o tem po d a s semen te ira s e alqueives. As de t oucinho e as de morcela, regulam
por 55 a 60 gr amas para cada h omem, ou sejam 110 a 120 gr am a s de go r d u r a e

(1) Altl;llU . n l c. d. m· n . em mU'mit...


(2) N. u tl i o tlunu. pouc. . .i o ai 1""01;11'' ' ond e liDd. pu .l.um U I" pt,t1caJ.

- 117 -
A T R Av t S DOS C A M P OS

enchido. Mas se a m orcela s e s ubs ti t u i por carne f r esc a de badana , com o se usa
durante os serviços da s eiras. essa raçã o vai a vult o. i sto é sem ser a peso;
todavia, calcula-se u m a re z para o jan tar de 16 a 20 o u 24 homens.
Julga muita gente que uma badana é sempre uma o vel h a magra. P ode nã o
ser. E nunca é. D O verão, único tempo em que s e abatem reses para os criados.
A ssim co mo à s va cas e bois velhos se chamam açougueir os, e com o tais,
dep oi s de gor d os, s e vendem p a ra consumo - da mesma forma as o velh as, em
iguais con d içõ es, s e d en ominam badanas, e nessa qualidade são vendid as para
os açougues públicos, ou se matam nos montes para consumo do lavrador e da
cria dag em . O fact o d e serem velhas não impede que engordem. A questão é
estarem s ãdias e t erem pastos em abundância.
Ora os pastos escasseiam-lhes de inverno, e esta circunstância. aliada à
outra de estarem paridas então. influi pa ra q u e, ne sse tempo. as badanas ema-
gr eçam mais que as ovelhas n ovas. Deriva p oi s dessa n ot6ria m a gr eza, o b a ix o
conceito em que o vulg o as tem, co nceito q u e. s e é jus to no i n v erno. n ã o o é
depois no verão. q u a d r a em que se mostra m gor d íssim as. p o r virem co me ndo
quanto qu erem d esde o princí pio da prim a ver a . E tanto assim, que n a f eira d e
Fronteira, a 29 e 30 d e junho. os marcha nt es co m p r a m quantas aparecem, p a r a
forn ecerem os talho s d os arredores de Lisboa.
Em r esum o. a car ne de badan a é apre ci adí ssi m a pelos criados d e lavo ura ,
p ref eri n do- a ao to ucin ho e à morcela . Quando lha apres entam, r ese r vam e
g u a r d a m cuid a d osam ente t oda que lh es sobej a , para a com erem de p oi s. a q u al -
quer h ora disponív el, com o pe ti sco s a boroso e r econstituinte.
. . .. ..... . . . ............ .. . .. . . .. . ...... . ..... ... ... ... . .. . . . . . .............
Voltando 8 0 jant a r. r es t a d izer qu e, n os «dias d e az eite», ca da hom em .
al.ém d a o lha, re ceb e me ta d e d e u m q ueijo. S e o n ã o q u iser com er. dispõ e d el e
à vontade.
N a mai or parte d os s er vi ços do verão, d ep ois do j a n ta r, dorm e-se a ses t a.
o que t u do entr etém d ua s h ora s. N a s eiras em q u e se trabal ha pelos anti gos
processos d e debul ha co m ég uas, nã o co stu m a h aver sesta. P ortant o, o i ntervalo
do meio dia, restringe-s e a uma h ora o u pouco mais.

Merenda ou ceia N o estio. a última refeição diária, t oma o n ome de m erenda


ou ceia. Varia-se d e term o, n ã o p ela q u a lid a de d e comida,
mas como indicati vo d a h ora em q u e tem lug ar, q u e n ão é a mes m a em to dos
os serviços. Se s e co m e a o sol po sto o u ant es, chama-s e-l he mer en da; se d e
noite, denomina-se ceia.
Me renda ou ceia, cons ta q u a se s empre de caspacho, ( t ) a companhad o de

(1) c .Jpu b.o O" 'up.cllo. qlll por . mb formu .. PTo.." o..,I•• cOIIII, t. ou.m.. IJOP U di pio 1m "II' & 1. e ..lu"rI
com • .,111 , ••1 ••Ib.o pu. do. '0 qU I .I,um pu.ou .didou ... p. a.d.. b.u de plm . .. ra "du , u l.ol. c..... e t om....
cnll. QIU Dto 11I.1. fr l. ut' • IJ"• . melh oT ubor u m o c..p.c ho . to comida pr 6pd. ao. dJ d e calor , u .h .. u~.dJJlm.
em tod o o AI...tl io • Euum . dlU' up.uLol • . Snn -n u i o . 1Im...I' . u cri.du d. t U OIU' . m.. u.IIILflll cm tod. . .. c.....
d. . .lIu I . Idel.. . dud. .....,. pobre .d l m.ia .b"lJd• .
O. cd.do. do campo, qu ...do .10 comn ' 10" .op• • , f fr.q oc.nte db.uuo ' - V. uo o. cU p.clulr.

- 118 -
ATRAv t S DO S CAM PO S

azeitonas, ou de me tad e de um queijo para cada homem. Para variar também


se u sa substituir o caspacho por batatas cozidas, tem peradas de azeite e vina gre.
Àm algumas ecesas», n as se xta s e s ábados, p õe-se de pa rte O caspacho e
as batatas, e dá-se leite de cabras, em porçã o qu e su.tisfa ça a todos. Estas
merendas são as preferidas pelos g an h õ es. Tanto as d ese jam, que as so licitam
dos amos com par tícul a r empenho, most ra n do-se muito agr a de cidos se lha s
con cedem .
Quando a merenda se ef ectua muito a n tes d a s olta.. ainda com bastante
sol. o que é IaIO praticar-se, h ã, para isso, m eia h ora d e intervalo. Depoi s,
volta-se à labuta, para s e largar de finiti vam en t e 8 0 s ol posto, ou depois, 80
escurecer.

Na maioria das la vouras d a freguesia ele Santa Eulália é vulgar, na épo ca


própria, as refeições d o s cria dos t erminarem p o r so bre me sa d e melancia, em
quantidade proporcíonal à existê n cia da efr u ta» n a «casa» r espe ctiva. S e abunda,
franqueia- se à larga, para tod os se abarrotarem à vontade ; se es casseia, dá-s e
por parcim6nia. N o p rincipi o da época cabe a pena s uma ta lh adi n h a a cada indi-
víduo. O suficiente para provas d e «molhar a g uela» e todos se .:fazere m novos».
Nas lavour as das outras fr eguesia s, ta mbém o p essoal se contempla com as
frutas que abunda m, como la r a n ja s, am eixa s, melã o, 6gos, etc .
Em toda a te mporada do ver ã o, a gan haria e outros cria dos se m elha ntes,
não comem em lo cal certo, mas sim on d e Iice a seita ; n os m ontes, d e po rte a
adentro ou na ru a, n o somb rac ho da eira, e n o próprio sítio em qu e se t r aba l ha.
N a hipótese de se comer po r fo r a, u sa-s e o seg ui n te: o a lmo ço vão r eceb ê-lo
ao mo n te dois ou três ga nhõ es, que imediata m ente l ho en tregam em alguidares,
põem estes à cabeça e ma rc h am para o se u d estin o. O ja n t ar t rans po r ta - se , em
reluzentes asadas de cobre, so bre as ce n ge lha s d e u m a besta, con duzida p elo
paquete ou cozinheiro. A m eren da ou cei a é. em ge ra l. prepara d a p elo ebegâc
ou sota no próp rio sitio d o trab alh o, pa r a o que disp õem do s r ecurs os in dis -
pensáveis. Nas t ardes em q ue se se rve leite, va i o paq ue te lev á-Ia em cânta ro,
logo que che ga do bardo.
Qualquer que seja a r efeição e o local em que se r ea lize, nun ca se obser va
a seriedade e com postura q ue se vê à mesa d o m onte, no s a lmoços e ceia s d o
outono e inverno.

Com id as m elh or ad as em d i as d e n om ead a (1)

Pelas matanças do fumeiro As matan ças do s porcos go r dos para o preparo


do fum eiro, prop orcionam a o pessoal da lavoura
melhoria de alimenta ção. Nas m anhãs d es sa fa in a, todos que a d esempenham ,

- 119 -
ATRAVt. S DO S CAMPO S

b eb em o seu co pi to de a g uardente. a pretexto de aquecerem o estômago e m at a-


r em o bicho.
D epois, a o a l mo ço, conclu ida a ch a cin a . regalam-se à vontade com b oas
talha das d e cho u riço e morcela frita, acompanhadas d e azeitonas e vinho.
A sup erio ri da de d os puxativos estimula-os a ench erem e emóorcszem o s copos
co m freq uê nci a , p o n do- se t odos meio t a ch ados e al guns a cair.
E m ge ral , a pinga d á -lhes para se p esarem na r omana que s er viu p ara os
po rcos, ha ve n do ant es p a l a vr iado de apor lias, sob r e o peso d e cada um.
.. . . . ....... ... . . . .......... .. . ... ... . . . . . . ..... . . . . . ......... . . .. . . .. . . .... .
D es d e a primeira m atança até à última" carreiros e ganhões cos t u m a m ser
contemplados co m mais dois almoços m elhorados: o primeiro, d ev era s a pr ecia-
d íssím o, co ns ta da tradicional cach ola ; (1) o se gundo, d e migas com torresmo s.
C o midas go rd as, de a va ri a r o estômago a muita ge n t e boa, mas ne ía eles, que
o s tê m à prova de bomba para resistirem im pun emente a to da a esp éci e de
f a r to tes.

Du rante o ca r nava l Na quinte- f eire de «co m pad r es», na de «co m a d r es» , no


domingo «m agr o» , e n os três últi mos dias de entrudo, o
almoço compõe-se de sopas e carne de porco e nsaca d a . Á ceia, além da olh a do
costume, há morcela, chouriço e fari nheira em abund ânci a t a l, q ue sem pr e sobeja.
Nas lavouras onde mais s e obser vam a s tradições antigas, a ceia d o domingo
gordo, o u O jantar de terça-fei ra de en tru d o. q ua ndo n ã o é um a e outro, al ém
do cozido co m cho uriço e morcela em fa rt u r a, consta mais de u m prato de meio
- ga lo capado, ou galinha com a rroz - e so br em esa de arroz doce, o u fi lhozes
com mel. O vin ho é acessório cer t o e em q uantidade que não co ns ente tristezas.
À n t es do banq uete t erminar , já os efeitos do á lcoo l se pa t enteiam à g r a n d e,
em crescente a n im a çã o. A ni maçã o de car naval, q ue faz esquece r reser va s e
a f oi ta a a trevimentos.
P o r co n tá gio e sugestão, a s cria das a pr ox i m a m- se da mesa e de chofre,
enqu a n t o u m a s enfarinham e ma s carram a lg u ns d os co mensais, o utras p uxa m
os a ss en t os dos descuidados, q ue ass im vão a te rra a n tes de s e p r ec a t a rem .
E s trugem então a s ga r galhadas fra ncas e es t repitosas por en tre um r eboliço
doid o. quase sat u rnal.
O s home ns. sarapin t a do s de n egro e branco, pro cu rem a d esf o rra, a ga rran -
do-s e às mulhe res par a as mascarr a r em ta m b é m . Elas escapa m -se-lhes como
p od em. e se a lg u m a é filada , g rita às outras que lhe acudam. que lhe valham ...
À s Que não recebem socorro, arri scam-se a um estimulante esfregão de barbas.
co m o se u apertão d e costelas, ou pelo menos a p a r t ilh a r em da mascarra e
farin h a qu e l ançaram sobre os homens. S em embargo, prosseg ue a r et ouça e
ca da que l ataca e defen d e-se como pode, em lutas d e cor po a co rpo. po r en tr e
um tirotei o de laranja s. ovos. ta los, et c. D e t udo se lança mão, em ba talha

(1) Gabado da Irun... a .....a. de Slo reo co m ma il.. 'ordur.. a te mperOl, pndo miDudo a pia:t...ta e o pt.latio.

- 120 -
...

• Aspectos de povoação
ATRAv t S D O S C A M POS

de senfreada. d elirante e b rutal. Só termina pOI intimação dos fomos ou p or os


co m ba te n tes a bandonarem o campo, estenuados de forças, in undad os de suor.
D o ar d or d o. refrega re sultam rasgões d e vestid os . am olgade le s de brincos e
tamb ém , à.s vezes, slJ los, a rra n h a d u r a s, etc. Mas co mo f oi po r estúrdia, rele-
vam-s e os p r ejuizos e a s co n t usões. O s rap a z es nunca enco r do a m .
P or p a r te das ra par igas, s e a s h á «q u e vã o à s erra », a s outras, mais com-
pla centes, a m a n sam - nas 1080. p ed indo-lhes q ue n ã o descon fiem, qu e vai d e
odevert ímemo, de gozo . . . e que n o « en t r u do passa t u do . .. » E. p a ssa .
N um m o m ento os a muos es va em - s e como f umo . fi can d o to do s em boa paz.

No dia da agarração N este di a, em que se fe rra o ga do vá cuum e cava la r,


- m el ho ra -se se nstve lm en te o a l mo ço o u o jan ta r da
cri a d a gem, dand o-se- lhe ca r ne ensacada, ou en sopado ( tl e v in h o. Da p in ga
res ulta m as a leg rias e expan sões q ue é fá cil pr eve r . V ai i ss o, po r m i u d os, n o
a r tig o f erras.

Pela Páscoa N o do mi ngo d a R essurr ei çã o - t a m bém ch a m ado da «Festa de


Flores » - era o u t ro r a u so ge ral, d ar em-se b ol os a t odos os cria-
d os, e fo la r co mple to a os d e m ai or cate goria , como abegão , sote , g ua rda, m aio ra l
das mulas. etc. E st e co s t u m e t e m acabado em mu itas ca sa s, m a s persis te n outra s.
O n t em e ho j e, a dá di va dos «bolos da festa » é sem p re d e i nic ia ti va da lavra-
d ora , e é ela própria que os distribui n o sábado d e Al e luia à. n oi t e o u n o
d om in go de m a n hã.
O fo la r co mpleto, p a r a os criado s d e pensã o, consta d e doi s o u trê s b ol os
gra n des d e man teiga , e d e outros tan t os biscoitos, tamb ém avultados. Um d os
b ol os, o r na m en ta do co m firínhe s, leva ao ce n tro trê s a q u a t ro o vos cozi dos, ma s
inteiros, sendo por i sso aquel e q ue mais particularmente repre senta o folar.
Para os ga n hõe s e r eata.n t e criad agem , cada f olar limita - se a um bolo de
mante iga, d e: um q u ilo aproximadam ente e de u m biscoito ta lud o, ou sàme o t e
do bolo.
O abegão e outr os criados que , p or circunstância s especiais, se querem
d istingu ir, rec ebem of er ta m aior. À ca da um d esses, a ama avia-lhe o pano,
onde, al ém do f olar co m u m , in t r od u z outros b ol os diferentes. Se os filhos do
cri a d o são afi lh a d o s d os la vrado res ou de sua família, recebem também fo lar
pró p rio, di stinto do dos pais : os dos rapazes, representam u m lagarto o u um
b orrego j os das rap arigas, u m a pintainha o u uma pomba. Em uns e o utros,
figu ra s em pr e um o vo cozido.

Em d ia de Ascenção Em a lgumas lavo uras, aliás poucas, o leite das cabras,


do o rdenho da man hã deste dia é dado, co m o almo ço,
aos g anh õ es, ou em vazilhas, pa ra q ue o l evem às fa mílias.
(I ) Gulu do mllll!) um.lh."te ao t o"ll. cldo _cu".lro com b . t. l. ... Difu. 1m oIu... n unca . u car n. di cU1ld r o. mu
. im d. cllibo. cabu 00. O'I'.lb• • corlad. cm t n o.d.. p.daçu. 4\1 ' " eh'llu m pra.... .

- 121 -
ATRAVl!'.s D O S CAMPOS

Na freg uesia d e Santa E u lália e o utras, o l eit e de um dos ordenhos do dia


da A s cen ção, senão o dos dois, di s tribui-s e à pobresa dos arredores que, à hora
pró pria, corre aos montes para receber essa esmola . Se gundo a crença popular,
o lav rador que, em dia de Ascenção, der, de boamente e com fé, o l ei te 80S
pobres e aos criados, está livre de ter sarna n a cabrada.

P elo s . Sa n t o s .
No utros tempos, er a de u so, na véspera do di a de T od os os
S antos, melhorar-se a ce ia do s cria dos, dando-lhe fe ijão ama-
relo. queijo de ovelh as, uvas e {r u ta s secas. como castanhas. passas, nozes, etc.
No dia seguinte, ca da criado recebia u m b olo grande. dos ch a m a d os ede man-
te iga». Eram os «San tos». A cabou de t odo este uso.

P elo acabamento da sementeira À ceia do dia em q ue se a ca b a a semen-


t eira tem porá (outonal), distingue-se das
ordinárias pOI ter chouriço. m orcel a, v in ho e castanhas. tudo à f ranca e a sobe-
jar. O vin ho produz uma algazarra dos demónios e bastantes bebedeiras .

P o r ocasi ã o d e casamentos e bati sado s Naq uelas lavo u ras onde. até certo
ponto, os serviça is são quase con-
siderados como pessoas de família, eles partilham também das festas dos amos,
por efeito de bodas ou batisados.
N esses dias, todos almoçam e jantam ensopado, carne de porco, galinha
com arroz, bolos, vinho, frutas, etc., tudo em extraordinária abundância .
Se a festa é por celebração de casamento, ta mbém se u sa dar folg a ao pessoal,
para m ais realçar o f est ej o.
À noite permite-se bailarico de criadas com cria dos, ao som do pandeiro e
de ca ntigas de roda .
.. .. .
N as casas de la v ra do res que estão de luto carregado , pela morte de parente
próximo, n ã o há falares nem melhorias de comida em dias festiv os. O luto não
se coaduma co m esses r ega b o fes.

Jejuns E ram antigamente celebrados nas ganh arias e restante pessoal, senão
to dos, que a I greja p receitua, pelo m en o s os da s festas de m a i or de vo-
ção , co rno o da véspera do dia d e T od os os Santos, o do Natal e o de q u inta-
- fe ira. de Endo enças. Presentemente, em poucas ou nenhumas lavouras Se
sat isfaz a fo rmalida de dos jejun s. Digo forma lidade, porque não era outra
coisa. Esses j ejuns. mais pareciam pretexto para f artas comesainas, do que actos
de devoção e pen itência. Tant o a ss im era, q ue n enhum criado havia que, pro-
pondo-se- lh e escolher en tre a alimentaçã o ordiná ria e a u sual em dias de jejum ,
não optasse s empre pela última.
Jejuan do, o sacrif ício limitava- s e à abs tençã o do almoç o, quan do se absti-

- 122 -
A TRAV É S DOS C A M P OS

nh am, por que muitos n em isso. comendo às escon d ida s pão e quei jo, d e q u e se
muniam surrate iramente na ceia anterior. Mas mesmo que nada alm o ça ssem,
po uco se incomodava m . Às onze h oras da manhã o u antes, em vez d a ha bi tu al
merenda do pão e queij o, apare cia-lhe s um fa r to [a n te r de feij ã o br a nco o u
amarelo, muito bem co n di m enta do . frutas e qu eijo gr a n d e de ovel has. Queijo
bravo, como em frase picaresca lhe chamam os criados, qu eren do a ss im diz er
Qu e esse qu eijo é de superioridade e apreço tal, que po uca s vezes o apanham ...
D epois do jantar havia, à noite. a cei a, qu e se diferençava das ordinária s pOI
con sta r de arr oz com bacalhau, queij o d e ovelh as, passa s. n ozes, vinho. etc.
Enfim, uma p enitência muito su por tá vel !. .. Passou à história, e sup onh o que
sem prejuizo para a salvação das almas.

DIAS FERIADOS

Al ém d os habituais d omin gos de folga , imedi a tos ao fim das q uinze nas ou
sema n as de t r aba lh o (t) - a ga n h aria e os ou t ros cria d os q ue se em p r ega m n as
chama das ocu pa ções braçais, guar dam, a ri gor, os se guint es di as santificados :
Àno B o m, R eis, A s cençã o, Corpo de D eu s, S . J oã o, T od os os Santos, Nossa
Sen h or a d a C on ceiçã o e N a tal. O m ei o dia da ta rde d e Quin ta- fei ra Santa e
o da m anh ã d e Sex ta-f eira da P aix ã o, n ã o são tão geral mente gua rdados,
havendo l a vouras onde s e trabalha nesses do is m eios dias para se fo lgar em
segunda- feira de Pás coa o u na i med iata, a dos Praz eres de N ossa S en h o r a,
també m ch a m a d a segu nda-feira de Pa scoela, ou de «passa r águ as». (2)
P a ra os dias d e No ssa S enh ora d as Candeias, d e S. Pedro. d o C oraçã o d e
J esus e Santa Mari a de A gosto n ã o há r egras in va riá veis, gu ardando -se ou
não, con fo rme a urgên cia dos s ervi ços o u a vo ntade dos la vradores e dos
criados. N os dia s de S. José e d e N os sa S enhora da E n ca rnaç ã o n ã o se usa
folga r .
Na freg uesia d e Santa Eulália sempre se dá feriado na segu n d a- f eira de
P áscoa. N a s de Barba cena e Vila Fernand o gua r da -se. pe la m esm a f orma, a
seg unda- feira de P r az eres.
P el os t rês dias d o C arnaval só se folga n o D omingo G ord o e n a tarde de
terça -feira . M a s na quart a-feira de Cinza, vai de d es ca nso ta m b ém, pe lo m enos
em muitas partes. Este feriado, to r na -se forçoso, em conse qu ên cia d o pessoal
n ão com parecer ao traba lho, por fica r arr ombado das foli as carna va les cas.
Em conclusão de feriados, h á ain da, o s d ois d ias d o fim e p ri ncípio d o a n o
ag'rícol .a , por ocasião d o S . M ateus a 21 e 22 d e setembro e ou t ro s por motivo

(I) Por oeullo d u u merr.teiu.l . I a o le mpo dai elral. ~ ..-.. tn b.lbar por p" sodo l de <l~ ;'u e a ... o.i o te eoulder.o.do
de foi;. O domiaáo il:l tU1D edl h lo . N u u . t . ...... hocu do . ao tI&L.11I.- .. l ' ..mao.... du u a laa do· .. tod o. o. do m/oá o"
SI podm 0.& umla' h' Wl1 di. uatlliudo elO <l a l IC lolj•• tra bllb._u ao doodoá o . au ri or .0 di ••• o.to. ou 0.0 Imedi l1 o.
(s) Po r . o.dálmlo.u .. Ol f r , o.., t. dil . b ·u l i rl Ldru , PUIU II 'áo u . como Ilt u cn- I tiYo eoo.l ra • ' U III .

- 123 -
ATRAv tS DO S CAMPO S

de festividades loca is, cu re guarda, cl aro está, que s e r estringe à zona on d e s e


celebram os festejos.
* * *
O s criados cujas ocupações reclamam a ssistência p er mane n te , nunca, em
r eg ra, gozam. de dias feria d os. Quando pod em e preci sam, escapam- se po r
algumas ho ras a os afazer es.
Nas n oites dos sá ba do s ou dos domin go s, a gr a n de m aioria d esse s s er vi-
çais vão se m p re a casa a mudare m d e roupa. e ver a f a mília . Se prec isam estar
a usentes da o b r igação po r um ou m ais dias, pedem licença a o am o e sa em,
fazendo-se sub stituir por pessoa idónea, a quem p agam d o seu bolso . Ou O amo
os ma nda su bstituir por sua conta, desco ntan do-l h es os dias perdidos.
v

R E FE R I no capítulo an terior todo o pessoal de uma lavoura, e a s suas


atribu i çõ es correspondentes. No presente. tratarei dos hábitos
do mésti cos e o utros. desse mesmo pessoal. q u e sejam d ig nos de
m enção.

Naturalidade e domicílio Pondo de parte os rat in hos (ceifeiros vindos das


Beiras) e poucos mais i ndivíd uos. de encargos igual-
ment e transitórios - os serviçais das lavou ras al entejan a s nascem e r esi d em Da s
povoações próxim a s das zonas onde trabalham . A s p equena s vilas e a s g randes
a ldeias são aquelas que fo rnecem maior co ntin gente. D e alg umas se pode anrmar
q u e, pelo menos, q uatro q ui ntas partes da s u a pop ulação m a sculina. válida,
emprega m-se to do o an o a ser vir na s herdades. Andam l á pelo campo a garrados
à «ob r iga çã o», mas o domi cilio est a be lec em - n o nas povoações. Cada chefe de
fa m í lia t em ai o seu lar, onde vive habitualmente a mulh er e os fil h os. Ele em
pessoa, só o utiliza quando fo lga e q u a n do está d oente o u desa comod a do. Mu itos
resid em em moradia s u a , ad quirida po r heran ça , co m p ra o u cone tr u çâo. Ou tros,
h a bitam ca sa arrendede a os s em estres o u por a no, com vencim en to n o 6 m de
i un ho ou de dezembr o.
U ma das principais aspiraçõ es do criad o d e la voura é adquirir d e propriedade
u m a ca sita na aldeia, que o poupe a mu dan ças e a exig ências e caprichos dos
s en bor íc s. T er un s buraquinhos on de se possa a lojar, é o se u maio r empenho .
O s q ue con se gu em en fi m r ealisar esse pro pósi to. q ua se sempre à custa d e priva-
ções e sacrifícios. senão com o a ux flio e protecçã o dos amos, como tam b ém acontece
- t omam à casa tal ap ego, q ue só a vendem por necessidade extrema. imperio-
síssima. Hó exemplos de indi vídu os velhos e i n válidos m endigarem, tendo ainda
casa sua . Se os increpam por esse fa ct o, r esp ond em : - «E n t ã o h ei -de arrancar-

- 125 -
ATRA V l!. S D OS C A MP OS

-lhe uma pedra para co m er ? . . » Outros, de sc ulp am -se a fi r mando q ue não


encontram comprador, qu e o p rédio es tá a r r ui n ado, etc.

HABITAÇÕES

Suas ou arr end ad a s, a s m ulhe r es d is pensam à s moradias inexcedí veis


cuida do s d e conserva çã o, ar ran jo e limpeza. São o ninho d e família, ninho
em o r osfssi mo, a q ue consegeam arr eigada afeição, em s acrifí cios d e t empo, tra-
ba lho e d inheiro.
C om os a ssei os d e caiados n a casa e nas frontarias, a m aior ia d as locatária s,
to cam a r ai a do ex a gero. Caiações parciais vão a efeito de vez em qua n do. sob
q ualquer prete xto. Caiações ge ra is, d e haixo a cima, em que os tra becos s e
desalojam e amo n toa m d eso r n a damen te para depois se co loca rem em t erm os, à
custa de u m trabalh o enorme - é da prax e realizarem -se por o casião de b od a s.
d e batizad os, e nas épo ca s d o estilo : pe la P á scoa. d e verão, n a s vésperas da
festa grande d a t erra e pelo n atal. Q ue m não cai ar a valer. em quelqu er d es tas
ocasiões, incorre na censura p úbli ca" embo ra seja po br e. Que, em geral. nunca há
ensejo par a se melha nte censura. Faltará d inheiro para p ão" m as nun ca para m eia
arrobíe he de cal, pelo men os. Que o digam os caleiros de Borba. que todas as
seman a s vendem car r ada s de cal branca nas vila s e aldeia s do concelho d e E.l va s.
Com 05 lavados e var rições h á a mesma ou m aior a záfa m a . L a va-s e e
varre- se a toda a h ora, de portas a dentro. e varre-se a rua nos sábados à ta r d e
pelo menos. C ad a m oradora obedece aos usos. varrendo e limpand o a p arte da
rua que defronta com a casa que a habita-isto é varre a sua testada. O centro
da rua considera- s e marco para os encargos da varrição correspondente aos
habitantes dos pré dios Ironteiríccs. Desta maneira, a iniciativa dos particulares
supre" com va n tag em , a falta de varredores.
Com efeito, a s ruas põ blf ces das povoaçõ es rurais, onde ainda não cheg ou
o vasc ulho m u n icipal, atestam tanto ou m aior limpeza q ue as ruas da cidade.
• • •
Muito branca s e alegres - a s paredes ex te r ior es e in t erior es das m oradias
dos campónios des ta pa rt e d o Al en tejo" revelam, como as outras d a s cla sses
abastadas, um cunho d e garrid ice tal, qu e d iflcílmente se encontrará se m elh ante
em q u alquer outra r egião.
Cada habitaçã o compõe- se ge r a l men te d e d ois a quatro ou cinco com parti-
mentos ao rez-do-chão: casa dianteira ou de entrada, u m ou dois sotãos (quart os),
ou um quarto e uma pequena cavalari ça. Tudo de alvenaria, com tij ol os n os tetos
e n os piSOS.

Casa dianteira C ostuma s er a mais esp açosa e a de maior importância . Tendo


em si a l areira, serve d e cozinha e igualmente d e a comoda ção
a vistoso m obiliário: cadeiras al tas, d e pinho, ti n tas de roxo, com assentos de

- 126-
ATRAVt. S D OS CAMPO S

b unho; algumas baixas, sem pintura; um ou doi s tr ipeços de cortiça. e mesas


d iversas, p elo gosto d o das cadeiras. As mesas m el h or es e mais altas ficam. bem
visíveis da p orta da rua, en cost a da s à parede e enfei ta das por coberta s de rama-
gem com tigela s. jarra s, terrina s, copos, cend te iros, etc . Até relógio e out ras
coisas bonitas, qu e põem embasbacadas as r espectiva s p ossuid oras.
Sobre as pared es os te n ta m - s e v ar iada s e sorrid entes a rma ções d e m a d eira .
tin t a s a verm elho e Iís rôes az uis, co mo esta n hei ra s, p rate leiras e sanefas, ex p o n d o
os ob jectos do estilo , a co meça r n os r elu z ent es t achos de Br a me, esfrega d o s a
capricho (1 ) e a ter m ina r n a humild e candeia d e feno ou d e lat a, s uspens a d o
de pendurad or .
A parede f ro nteira à ru a d es t a ca-s e, d e en tre t oda s, po r exibir as ma io re s
e mais lindas ceraereires, (d be m co mo o u tras d ecor a ções típ ica s e o r igine is.
Em cima, na guir 18n d8 o u cimalha de a lv enaria , p roposi ta damente co nst r u íd a
para tais exibiçôes. cse Hentam-s e os tachos d e arame, a r m a dos uns sobr e o s ou t ros,
dos maior es aos mais p eq uen os, e a fileira de pratos de estanho, q ue mais
parecem d e p ra t a , pelo brilho e a puro d a lim p eza .
A b a ix o d a 8uirlan da, n um dos intervalo s q ue medeiam entre os po rta do s,
vê -se o es pelho g u arne cido d e co r dõe s e b o rlas de es tambr e, e a p a r, n o m esmo
cam po e n outros, as p ra te leira s e estanheiras com os enar ad e m entos preenchidos
p or fi las de pratos de estanho e d e lo iça d e vá r ias cores e padrões.
S obre a s p o r t a s interiores nota- se d ecoraçã o e n é l oga. As sa n efa s aí coloca-
das, a s u s pe n de re m mirabolantes cortinado s de ramagem at é ao piso, su stentam ,
em cima ga rri dos cast iç ais, jarras, ga rrafas, b and ejas, etc.
Se os m oradores n ão possu em u tensílios e ad ornos d e esta n h o e arame, o
que é raro, a s armaçõ es preenchem-s e co m loiças b arata s de Coimbra e
semelhantes.
De qualquer maneira. se muita capacidade há, muitas prateleiras se arma m
e preenchem com a rtigos de melhor ou pior qualidade.
A en tre m ea r em , a di cio n a m - se, de espaço a espaço, pequenas armações, de
colorido igual à s mai ores, e apropriadas aos objectos que expõem. Resumem-se
em uma o u duas caixas co m almofarises, outras tantas copeiras e um dependu-
radar de ca n d ei a s. Os almofarises entronizados na s ca ixa s, a lu zirem como ouro,
mere cem particular reparo pela originalidade da disposição. Às copeiras também
s e des tacam por lhes realçar o prato e o copo de v idro p a r a a á gua, numa limpidez
cristalina, e bem assim a corr espon d en t e t oalha, p en d i da do ga n ch o - toalha
branca como neve, de rendas enormes nas p ontas, engo m a das a capricho. Figura
ali n ão para uso habitual, mas para que s e veja a habilidade da dona da casa
o u das filhas.. nesse g énero d e lavores.
P or último, completando o quadro, dis seminam-se, pelos campos q u e s obe-
jam, jarras, canecas, o gomil e outras b ogi gangas, sustidas em preguinhos.
(sI o, uc bo. de u.m• • d. cohu, o. puto. d. CI"flLo e ou tr o. ohj.cto. u melblfl tu. de mil", d o "c",,'Pulo..-
m... t. . . lul ado. com .ull I e'''' e,t.nh,';r • • fiO' di .. d. u o. li mpo, por e e..ll0 d. ui.do"
(21 Cba=lm-u unUltliru I t od q;u. bq;u n u lblcll .. de " cbo. d. cob re ti. ar-.m. o u d. puto. d. . .tubo. loiÇA,
com q;u. " deco re m .. paredn d. um a c .

- 127 -
ATRAv t S DO S C A MP OS

Desd e a altura da s ca dei ra s at é qu as e ao t et o, po u co ou nada fic a po r


compor. Quem não t em meios para adquirir arma çõ es v is t osas, s u pre esses
engre dam en to s por tabuinha s simples, ca ia d as d e branco, e s obre elas expõe a
p re t al h a d a . O es sencial é mostrar bastantes l oiças e v idros, qua n t a s mais
m el h or, que a s cantareiras t ornam-se a pedra de toq u e. porque se aq u ilata o
arranjo e bom go sto da dona . P or tanto, cada qual f a z o qu e pode, para n ã o se r
humilhada p el a s visin h a s, no q u e respeita a ece cc a» e coisas tai s.
Ter a habitação d esguarnecida de loiça s, traduz pelintrice e d esmazelo
ve rgon hoso, a que nenhuma mulher se suj eita de boa v ontade. An tes passar f om e.
. ....... .......... .. ........ .... ... ..... ...... . .......... ..... ......... . .....
As o u t ras paredes da casa dianteira recebem men os enfe it os d e cacaria e
semelhantes atavios, p el o motivo de ficarem a ocultas d os t re n.se un t ea q u e
p ass a m p ela rua . Sem embargo, ainda se gu a r n ecem suficientement e, h a ven do
recurs os.
À loiça vidr ada, de barro grosseiro, co mo e lgut deres, pale.ngenas e cântaro s
para águ a , ig u a lme n te se m ostra em quantida de, m as em lugar r etirado , so b re
as »ilbeires <t} e p oial, que h á para o va silham e tosco.
En costada a um dos â ngulos da ca sa, ocultos da rua, ergue-s e a cha mi né.
À tradici onal e confort ável lareira, o nde se prepara a com i d a e onde se passam
os se rões de invern o, a o calor be néf ico d e um lumi n h o aprazíve l, tão de licioso
na qu el e temp o frí gi díssimo qu e, em al gumas n oi t es, a p eq uen a d is t ân cia do
brae íd o, estendem-s e camas provisórias para repous o d os ra pazinhos. senão
mesmo d os p a is ou de qualquer outro fa m ilia r . E o sono assado a o b orra lh o,
so b r e uma ca de ira ba ixa , qua l s er á a criatu r a que o n ã o te nha do r m ido ?l. . .
Àm pla e a tra en te. a lareira a lentej ana é de inverno o t eatro de to d as as
ce nas domésticas. desde o idílio d a s moças a q u em os pais cons en t em ne moro
à vista, até à s desavenças es trepi tosas d os es posos r a buj ento s. Pales t ra · se ,
co stura- se. com e- s e, namora- se, btsbílhcre ía-se, r i-se. r alh a-s e, cho r a-se. e
sonha-se. S onha- se , sobret udo. O m en os qu e se f az à chaminé é aqu ilo pa r a
que se con s t r ui u - para misteres de cozinha.
Mas a cozi nha d o pobre despa cha- se n um Bai te. num sopro. A a çordita
pela manhã e. q u a n d o muito, uma pa r ca o lh a pelo dia fora. Q u a n t a s lareiras
há em que se pa ss am d ois e tr ês dia s sem s e lhe p ô r jantar ao l ume 1. . .
.
. .... . ..... . . .. . .... . . .. . . . .......... . . . . ...... . . . ... . ...... .. ........ . . ....
S o bre a face exterio r d o pan o d a ch am iné, sa lienta-se a cimalha de alvena -
ria , com as pan elas vazias, as «ti jelas d e f 08 0», e a almotoli a d e lata para o
a z ei t e. N o in te rior, por ci ma do lar. a pilhe ire. o u pequ eno armário com o gral
e o sal eiro de co r t i ça , e a ma ior altura a trempe e as travessas qu e a pa n ham o
vã o, pa ra se colocarem as varas de ca rne a defum ar - o fume iro. se po r acaso
o h á. Em baixo. na la r eira p r ôpriame nte d ita . a tenaz p a r a m ech er o lu me, e aos
ca n t os o can u do d e a ss opra r, a fe rra d e ap a n h a r a cin z a , o espeto e a vassoura.

(1) lumlrlOI u m porlU• • hU IOI nu .lunu lu.

- 128 -
AT RAv t S DOS C AM P OS

Desde o rez-dc -chãc a té m et r o e meio ou d ois m etro s de a.ltu r a , o i nter ior


da chami né ate sta asseio igu a l ao que se 'nota no restan t e d a casa . P ara o lume
a não eneg r ec er. as mulh eres cai a m -na aos sá bados, branquea nd o os chamados
baix inhos. Ap ós a caia çã o, la vam-lhe e esf rega m-l he o l ar, o n de p rim eiramente
espalha m a decoada o u cenrede, pa ra elim i na r as n ódoa s que por v en t u r a haja.
Em algumas l ar eira s antigas v ê- se uma to sca b on eca de ti jo lo o u d e can ta r ia ,
d est ina d a , ao q ue pa r ece, a pre s ervar a alv en a ria dos estragos do fogo. Nas m o-
dernas, em v ez da bo neca, colo ca m - s e t ij olo s s obre po s tos, ou u m a fa s e d e gran ito.
... .. . .. ........ ............ . . . ... . . ... . . . . . ..... . . . ........... ..... ... ......
C o m esta n arrati va . faz -se i d eia ap roxima da d a o rnamenta ção d a casa
alentejana d e g ente pobre, d as povoações rura is.
O colorido dos mó ve is , a limp eza d a s lo i ça s, o b ri l h o dos m etai s, a alv u ra
das p a redes e a ordem impecável que em t udo se pate nteia, são mo tivos de
s u r pres a p ara o es tranho, q ue se lhes d epa r em desprevenido. A qu el e con j unto
to do . qu e mais se a s sem elha a baz ar de f ei r a d o que a residência de labr eg os
humild es, denota Inq u es t io n êve lmente, decidido gos to pe lo b elo. Gosto exrei-
gadíssimo. indist r utíve l e exage rado , a ponto d e se lhe sacrificarem b a st ant e
as necesid ades d e a limen tação. N ã o é caso pa ra lou v ar. mas merecem regfs te r- se.

Q uarto de cama O Botão e u quarto d e cama, é o m ais bem prep arado d os


compar ti ment os interiores, posto que, em geral, lhe escas -
seiam ba stant e as co ndições higiénicas de ar e de l uz. Na s modernas con s tru-
ções iá s e pr in ci pia a a t en d er 8 esses requisitos de salu b ridade. Men os d ecert o
do q ue o sulici ente, ma s mais do que outrora.
G uarn ecido po r quadr os d e olecarsfias baratas, co m ima gens de san tos, o
sotão e.lc fe uma excele n te ca m a, com O seu esteirão ou prancha de cortiça aos
pés d a cabecei ra , du as arca s ordinárias paro arreca da çã o d e roupas, duas ou
três cadeir as, e um a mesa alta, com objectos se melhantes aos contidos Das
ou tr a s da casa de f ora . E stes são os móveis co muns em quarto de trabalhad or
ou de ganhâo. O que p erten ce a criados anuai s d e p en s ã o, ou a qualquer outr o
campó n io obscuro, mas co m m eios par a m anter a família em rela tivo co nfor to,
a rra n jo e n ba s ta n ça , r eune mai s co isas aprop riadas, como por exemplo o lavató-
ri o com pleto, um «Se nhor» cr ucificado , sobre a mesa ou em orató rio d e m ad eira,
s enão a b erto n a s a lvenar ia s. E m r eg ra , o cSe nhor» é um. to sco cru cifixo, b àrba-
r amente escu lni d o e s a r api n ta do . Que pelo preço q ue se ad q u iriu não s e po d e
exigir m elh o r - s eis tostões a u m q uar tinho, se t ant o. Mas como é a fé qu e nos
s a l va , s egundo se diz, as possuid ora s de tais esc ult uras ado r a m - n a s e apr eciam-
- n a s com in g énua s impli cidade, cr en tes de que p o ssuem a verd adeira im ag em
do R ed en t or. C h eg am a afirm a r a s éri o, que tê m um P ai do C eu muito boni to ,
com o nã o s e vê melhor nas igrejas .

C omo compartimento rese rvado às in v est ig a çõ es d os miro nes i n d i sc r eto s, e


à f a lt a de melhor, o quarto de do rmir a comoda também algu mas das pro visões

- 129 -
A T RA v t S D O S C AMPOS

de m aior vaior - ' a sac a do ce real, a da f ari n h a. a tarefa com A car-ne d e po rco
e o t a bulei r o do pão cozido. Clar o está que es t es re cursos em casa de criado de
servir, só exis tem n a s daquele s cu ja s s old a d as lh.es pe r m ite m r eu n ir , po r jun t o.
s emelhante s co mest íve is . O s o u t r os mai s po bres, q ue constitu em a gran de
m ai ori a. não a massam pão e n em s o nh am em faze r f u meiro. À s s u as f a mí li a s
co m em a crédito das v endas. E já se julgam com so rt e s e o crédito lh es n ã o fal ta .
.... . . . . . . . .... .... . . .. . ...... . ...... . . ... ......... ..... ..... ......... . ... .. .
V o ltando a o m o bi li ári o. p o rm en orizarei o aspecto e lux o d a cama conjuga l,
a m a is n o t á vel coisa que se observa no satão referi do.
A t é h á poucos ano s, o leit o des sas cama s, a q ue vulg ar me n t e chamam ent re,
era se mpre muito alto, d e madeira d e melhor o u pio r q ualidade. sendo v ulgare s
os de p i n h o. tin tos a v ermel ho escu ro . a cola e ver n iz. com o u sem o rnatos de
pint u r a e d e chapas de metal amarel o n a cabeceira . Lei t os gigantescos, de cabe-
cei ra a vantajada, com t orneados de bilros ou macetas n os colu nas, e os pés a t é
à al tura d os enchim en tos, mas s em arm a çã o sobrecelente. Estes leitos, já de si
eno r mes, avolu ma dos, como são, pelas des comu n a is enxergas e colchões, forma m
ca mas tão d esmesu radam ente e levadas, que p a ra se u t il iza r e m , sem maior
es for ço, carec e-se d o a uxílio d e uma cadei ra a l t a , por onde se possa t r ep ar.
O u en tã o u ma escadi n ha ! Algu n s chega-lhes a ca beceira 80 te to da casa, e a
o u tro s é necesaéei o r ed uzir- lhes os pés para lá ca ber em .
P r es entemen t e poucos o u n en huns se cons tro em por semelhante modelo.
D e d ia a dia ge ne raliza m -se os de f erro, m ais cómodos, elega n tes e ec o nómicos.
«C e r r es da mo da », como lhes cham a m as aldeãs.
D e madeira o u de f erro q ue sejam, os prepar os r es pect i vos constam d o
s eg uinte : d u as m ei a s enxergas. ou um enxergão ; um o u dois colc hões de risc ado,
rep letos de l ã ; dois Iencoi s , cober to r o u co ber tor es ; e por último, cobe rta de
ram agem, de co r al e ér e, toda g u a r ne cida de f olhos, a caire m sobre o co rt inado
do roda -pé, corrido em volta. D e en tre a s r oupas brancas. d esta ca m-s e : as du as
almofadas, cheias de lã. enfronhada s em f8cinhas de r en d a s e fo lhas.. m ui to
catitas, claras de neve; o travesseiro, t ambém de lã, envolto em fronha aIv ís-
síma , com g ua r nições de rendas e laços de fitas n a s p on t a s ; e, de r es t o, a a mpla
dobrez do lençol de cima. term inando por rendas engomadas, a produzirem um
vis tão sob re o co lorido da colcha.
Em gente pobre, chega a pa recer fa ntástico tudo isto. P oi s não há a qui
fan t asia. Há. sim, expressão de verd a de, q ue os incrédulos podem verifica r ,
q uer endo. E note-se que, a r esp ei t o de en xo va is de cama , existe mais d e um em
cada casal. O que ficou mencio nado, cos t uma ser o do noivado e dos dias sole-
ne s, como fes tas , batisados, etc. P ara o us o co rren te, exceptua ndo o enxeegêc e
colchões, que sempre são os mesmos, h á mais u ma o u du a s mudas de ro u pas,
menos es pal h a fa t osa s, ma s igualment e co nfor t á veis e a ssea da s.
A p ropósito : assim co m o existem donas de casa q ue dormem habit ualme nte
no cat re , co m o u se m os filhos pequenos - o utr as há , q ue passam muitas noites
consecutivas se m se u tiliza re m do leito. O bsecedee p ela m o n o m a nia do luxo

- 130 -
ATRAvtS DOS CAMPOS

ca seiro. vêem a cama t ã o tafula que, de boamente, 5acri6cam as suas comodida-


d es p essoais à co nservação e d uração desses atavios. P or ta n t o. dormem com os
filhos em qua lquer camastralh o estendido no chão da casa dianteira. A cama
b oa, d e colch ã o e len çois, 56 serve quando o marido vem a casa, ou por motivo
d e do ença d e qualquer da fa mília .

Outros co mparti m ento s O cu pam-s e segundo a s ua capacidade e as precisões.


Sendo dois, um serve para dormitório da rapaziada,
e outro, o pior, geralmente u m a pequena cavalariça, acomoda a lenho. ( l) e os
u t ensílios re les, como os «cacos» da cal, o coxo dos despejos, etc.
S en d o três, aquartelam isso tudo também, convenientemente separado e em
melhor disposição. Compartimentos devolutos, nunca há .

* * *
N a s moradias mais humildes, restringidas à casa de entrada e quarto, os
t rabecos acumulam-se um pouco, mas nem por 15 090 se olvida o asseio e o
arranjo.

Quintal Não existe em todas as habi ta ções, mas as que o têm, são muito mais
apreciadas e valorizadas. O quintal anexo, constitue d esafogo e aces-
sório de primeira ordem, que se ap rovei te para culturas de primavera, ou para
arrecadação de lenhas e cerrado de animais. Em alguns, há o competente poço,
que, em regra, não passa de depósito de água ordinária, só aplicada a caiados
e lavados.
A m aio r parte dos quintais costumam ser povoados de oliveiras. figueiras
e uma a té duas parreiras.
A propósito : anti gamente, as parreiras de latada, também eram vulgares
nas r uas das vilas e ald eias, sobre os portados principais das ca s a s de habitação,
em feitio de a lpendre, firme em colunas d e ferro ou de alv enaria. Produziam
mag nífico efei to. proporcion ave m óptimas sombras e da vam uvas esplêndidas.
Ainda r esta m algumas, fo r mo síesimas, sem causarem estorvo nem prefuiao,
Foi erro g rande, arran carem-se muitas outras. que havia em análogas condições.

«O s v iv o s» C om ou sem quintal. g ra n de n úmero de moradores humildes dos


povoados rurais, criam em casa os seus vivozinhos - meia dúzia
de galinhas, u m ou dois b écoros de vez em quando, e, por acaso, a sua ovelha
• ou bo rreguíro e um berrinho, o que, de resto, se observa em m enor escala.
Os lanígeros e a sini n oe, como taronjo s e estúpidos que são, carecem de gu a r -
daria e pastos, q ue a gente pobre lhe não pode dar, por falta de lcgradcueos

(t ) N a aldtl a da Tnru,tlm • 1m Vii i Futl,t1do. , llab. dOI rup.ctl..", baLh. "uu. dlp ult'~'1 l U ' nu p6J.Uca• •
C, d.. 1 fllll -Aa ao I.tio o v. -.m frlat' d, u ... oa d, ruid, a alo d. pou u . ella frO. t u m COU V.ml c'lUl"'o. 401 di !d.la
(1...

IlIllho hoan •• d, proLld ada d. qa l ll " 11 11. O .lmplórlo 4UI lo.. fi.." • • 1m OUU" lun do COIloUUlO. 111 0 lu la li um e..... eo
.0 u Lo d. pOlle. . dlu .

131 -
AT R A v t S DOS C AMPOS

comuns. (I) Não a ssim as gali n h a s e p orcos, de i n s t in tos maravilhosos para


tratarem de si. em liberdade a bso l u t a , sem au x íli o d e n in gu ém.
Como quer qu e se ja, bicos e a1im ais recolhem-se à noite n o q u in ta l o u em
co m p a r ti m en t o, fechado com toda s 89 cautelas e pro vid ên cia s de a sseio e limp eza .
D e manhã cedo, bá coros e galin has, são a rra çoados à m eia tripa, e em seg uid a
soltos e en xotados para a rua , a Gm d e irem ca ça r o qu e o papo e o bandulho
lhes ex ig ir. até à n oitinha. hora em q u e re gressam para t ornarem 8 co m er p or
conta d os donos. P elo d ia adiante, que girem, que f arejem e coma m p or on d e
en co n t r em , se puderem . Os porcos principalmente, marcha m logo, em ca rr eira
veloz, a apa n h a r os caidos das rua s, e d e a í passam a fo ssa r e r evolver p elas
estrumeiras e a z in h ag as próximas. s e reconhecem a impossibilidade de invadir
os I err eg ie i s e vin h as co n fin a n te s. onde dece r to encontrariam melhores a tr a ctivo s.
Q u e. de v ez em q ua n d o, sa tisfazem esse i n t ent o, es ce le.nd o, co m en do. re fo ci-
land o e d estruindo, mas arr is ca ndo-s e t amb ém às conting ências de p edra das
certeiras, de lhes fractu rarem a s p ernas o u as cos telas, e às f ug id as esfalfant es,
que os p õem estonteados.
C om o se lh es r epare D OS estragos. o p ropr ie tá r io l esado r epreende a do n a
do a n imal d elinq u ente, a q u a l d es cul pa-s e co m o pode e sa be. pedind o se lhe
rel eve o de sc uido. R el eva - se -lh e, em ge ral. se não h á an t eceden t es a grav a ntes,
de fr esca d ata. M a s se o a b uso se r epete. e, como co nsequê ncia, se co r rige po r
coi ma s o u in d emni zaçõ es, d a pa r te da aco im ada f ervem a s d escom p os tura s ao
qu ei xoso e à en t idade q u e a co i mo u . A d ona do suino clama que n ã o de ix a
viver os p obres. «q ue aq uilo do s estragos f oi nada; que os slimais n ã o t êm sen -
tido de alma cri s tã; q ue ent r a m p or onde p odem; q u e a cu lpa foí d o d on o da
fazend a. qu e a n ã o guar d a n em veda b em; qu e o g u loz o do zelador é um r efi-
nad o ladrã o a viver d e co r po d ire ito à custa d o povo», etc.
E a s si m, desco m po ndo e ouvindo, consegu em eng orda r o po r co e cr ia r os
galin has à s u a custa e à a l heia . Cumpre, p orém, reconhecer qu e, até certo
p ont o, o. ge n te pobre d as a ld eia s, precisa viver de sses exp ed ie n t es pa r a sa t i sfa -
çã o de encargos impe riosos, que talvez n ã o p u d es sem so l ve r por o utra fo rm a
menos in correct a . O po rquinho c cr ia d o à porta», é o mea l h eiro d ond e tira m
pa r a d esp esa s grandes e inevitáveis. D a d o. em pequen o, po r q u alq uer lavrador
a quem o pedem. o u comprado à d esmama po r u ma bagatela, vendem - no em
go r do. a os ch a cin ei ros p ara, com o s eu produ to, pagarem a r enda da casa e a s
contribui ções. Que rem édio, portanto, senão tole r a r -se a u sançe a os n ecessi-
tado s. e, consequentemen te, os pequeno s d escuid os r esul tan tes de se melhante
co stume . . . (z)
(1 ) E.. cepI O '010. B.rbl nDI , ODdl b' rod o• • ee.. l.d• • 4'" o poyO dl . fnl1. com , . dOl d. lod.. .. upfcl...
(lll Pu. ni' l r o• • buo• • iDCODu .DI.alu d.. ~ u ..ti o • pn n.ad.. d. por co. dClu ro d.. poyo.çllu, .. . 0 ....mo
u:mpo ai o dUlnlu U ' I ·" ,. b. d. u n h ••0. r upu l! yo...on dou . - alci p. lI d . d.. d. ), no llcLn c d. MOl'lfo. l• • "a·
d . II ..a d . ... . :lu .. p.... IlI iao•. E n .. hUlholçl o COD. i. te D• • :d . li DcI. d. lUa r.b.abo. CO lllpO. IO n:t1u, l..m, al' d, potro.
do po'o. 4u . pu d •• aOl Jo,ndoon. p6b llc o• • • U.D..IciPI;" .ob • , .. ud•• dlncç1" d" . J ud ro • n a .jlld• .
E . d....br o d. c.d...00, • c1 muI p6. . .. PUÇI o urj o d• • .1u,;ro. 4'" , ..dj od h l do • qa.m o elCHIIl P. Db. po r
01.11.0 . . .. cauI elo. mUDlcl p.. 1I0 1l0l do••olao• • • m.dlla u u a. 1. 0.10. di • • pio qa. lIcl.. um • n c.bcr o . rr.lIl l h Il.U. por
cad. porco d. mil d. 'aud l rl • . N ••Clo. lldl d• • uI ' 1110 ut. m..ud o .m A rroDcbn por 20 n i•• meio 4oJl o li . pio d. trito

- 132 -
A TR AvtS DOS CA MPOS

VIDA DOMÉSTICA

E,' simples . Os ho mens só acidentalmente estã o em casa. M a l lhes vai, se


a í s e d em ora m . D oen ça n o caso, o u «b oa vida» força da. À z a r certo, d e q u a lq uer
me n eara .
Às m ul heres gozam mais o conchego do la r . Para o seu arranjo e cons er va-
ção traba lha m habitu a lmente, posto q ue m uitas d a s disponíveis e isentas d e
en cargos da crianças saem também aos servi ços do campo, em determin a da s
ép ocas, com o d iss e n o utro lugar.
M a s isso não significa a b and on o a bsolu to do la r, e nem s equer dimin uição
d e ze lo pelo cum p rim ento das obrigações respectivas. Àos trabalhos de ca m p o
só vão as que podem i r , as qu e não faze m falta em casa, por terem mãe, 6.lhas
o u i rmãs que as s ubstituam . Aqu elas q u e têm afazeres domésticos a reclama rem
a ssist ência permanen te. essas ficam tod as. D e p orta s adentro o u for a, t raba lham
par a si e para os se us, a cu idarem dos fi lh os, dos caiados. da lavagem da roup a .
da cos t u ra , da en go me cão , d a cond ução da á g ua, d.as idos à lenha (1 ) e de tudo,
enfim. q ue exija a s ua i n terven çã o.
C om o os caiados, a lavagem da r o u pa e a aquisição d e á g ua boa , entram
no número dos s ervi ços que d es empen ham d e m elhor agra do.
Ir à ribeira e ao poço são, em geral, lidas fa t igantes, m a s execu tam -se de
boamen te , e ta nto mel hor q ua nt o m e ia á rd uas se tornam. Assim p a rece, pelo
m enos.
Na ald ei a de Santa E u l á li a, a s m ulhere s vão lavar a o ri o Cai a, distante
seis q uilómetros, e n e m por isso se po upam a esses i ncómodos, deve ras p enosos
n a q ua d re es t ival.
D es de o começo da p rimave ra até a o llm do outono. vão para lá de ma dru-
gada , a p é em r a n ch o s numerosos, cada uma com o s eu ca n a s tro d e roupa à
cabe ça , muito [estas e ga lhofeiras. T a lv ez para não se lembra rem das fadigas
do r egresso, sobretudo no p i no do verã o. à h or a do calor, sobre u m sol arden-
tfseimo , qu e l hes afo g u eia o ros to e a s inunda de suor.
N ã o obs tante, nenhuma se esq uiva às íornadas da ribeira, antes se com-

po ~ e. b.u. o .Judro t ........1. O. U l rllm.. prouDilDI" d. IlIllP'u do . p ocll , õ.. e curul.do•• 011.1. o ••.10 pUlloita .
D UI. mUl lira. cad. cI•• I. d. l III. tlLlD o dlnlto d. tr u r Ila • ./... dou o.. tr h porc o•• p. ' .lldo o ' ''!p ul .do•• aU-
al... t . .. do o. porc o• • 111 . ua c .lu u . 1'0' di • • d. m.... hl I . 0 '01 110.10 . Ao. u ... h or ... o .<luc/ro ch• •• o reb.nh o l .
po r l.. d... li••• b....do -e n cad . ub"1 co rrer 1 .. ont..d,. .... dlr .ctlo 1 ~..Ida.. d . do .1 0"0. 1 u I. do . 1... oco ou d.
u la. t fnur....... tC..i a I ..tt.d.. do••uin o. Il...II•. P.nu u"'. 1, ,1 10 d. I......or .. l"' lIl d ' ll t. . . ..fo.....des, qu. , 'al
co rrnl..... ~tl,lno •• ••• cru ..... p.la. :ru• • , .uop.l.ndo o que I I II... d.p.... .. d u b. rr.n c• • • do • .10110', q UI i D...d.m •
' r " n bl r. h tromb.d.., <:e'o' 11.1 . ,.ofl cld. dc I Como ti.. II .tlum .0 m.ulrll o .m q l" Ih lIu..nt. . . . .:0 ... 1.1. 1.. ,
D. pob. lio O. dono. q ue .. illcumb ..... de o. condu..ir • • d ... . t ... Im que Umbi ch lllu • m. lh.da r u ll. cti....
proprl.d .d. m urúdlll l, d. m. ...llic .. cOl'di,õ u d••Iojo• • !tu.d. 110 r oelo Illlibllco.
h ) J.. lena. ' 0' m aIO•• 1m " b.. 1 c.b't., .ó do • • m ula".. . O. UIIUIJ do. t ub IlL.do r .. ... uh o pobr M uI L,n.
I filL o. d • • b,sõu • o u l . u crl.do' .nuai. d. p. ad o. !lu-IL 1 lum l i, ..... . n'''' t .mIlOU CO lI..ci llm f.r in cómodo.
E m .... 1. uca b.m·,.. dluct'''''IlI' do. I• ..,.do~", l.
c.rr. d cOmO prolll n. qll. ' Illu II.'
.01e1. d.. do. marido•• filh o,.
00 por d.d i.., "OIIl.. I.r1., O. . .... d.l ro. co.tum.... . o r lir dI 1e.. h •• l.m ll h. 1.... lld o·1L•• 1.. .... bllrr.., qO.lldo ..lo •
c.... ol. no !I•.

- 133 -
ATRAvt S DOS CAMPOS

prazem em ir lavar a r oupa sua e alheia, (tl mais a miudo e melhor do que
usam 89 das terras vizinhas, em bons lavadouros próximos.
E,' que o Caia atrai-as a si, pela limpidez apreciável das suas águas e pelas
sombras flesca.!l dos el oendros e salgueiros. retiros deliciosos para liberdades de
lavadeiras. M oças e velhas. passam aí, oculta s, a calma do meio dia , acarredas
em desal inho neglig ente, ii frescalhona, senão em camlsa, como usam a s muito
pobres, enquanto a s saias lhes enxugam Das lezírias e DOS juncos. Mas este
repouso à sombra e à ligeira. não compensa o custo da ca m in h a d a, r ep etida
duas e tr ês veaes p or sema na, O que impele o mulherio a essas jornadas violentas
são as águas da ribeira, á g u a s esplêndidas. que concorrem imenso p ara a fama
das aldeanas como ó p ti m a s lavadeiras. E elas. coitadas timbram e m conservar
a fama que justamente conquistaram .
A que por indolência prefere lavar os «tra p in ho s» nos p êgudtos dos ribeiros.
é classificada d e chelendrona preguiçosa - porca d e chiqueiro a ch a f u r dar em
lamaçais. Lá diz o conhecido remat e de cantigas p opulares:

Àilé, aldeia d e Santa O laia,


A moça arranjadeira
V a i la var a r oupa a Caia.
.... ........ . . . . . . . . . . . . . . . . . ... ... . . . . . . .. . .. . ............. . ........ . ...... .
Com a a quisição de água pa ra consumo caseiro, nota-se fen ó m eno s em e-
lhante. Quanto mais custosa. mais capricham em a ter com fartura.
Na freguesia aludida, onde as nascentes escasseiam com o em pouca s partes,
havendo apenas uns poços reles e desviados, que repres entam um atra so e in cúria
vergonho sa - as mulheres só terminam as fainas diárias das idas 80 po ço
quando, após um trabalho insano, conseguem encher de água potável o avul-
tado vasilhame de que dispõem. Pois trensportem-ne a pé, de cântaro à cabeça,
e de sítios di stantes dois e tr ês quilómetros I Advertindo que, no verão, com o
não tenha havid o invernia rigorosa, t êm de aguardar que a á g u a nasça e esperar
pela vez, durante horas, para enche re m um cân t a r o com o auxílio da co r d a e
cbocelbo, arvorado em balde ou ca l dei ro . (.) Nem a alcan çam por o utro meio,
inda que s eja altas h oras da n oite.
Nos anos de estiagens prol ongadas, avolumam-se esp a n to sa me nt e to das
essas dmculdades, e, sem embargo, a á gua abunda em ca sa da m esma f orma.
ainda que à custa de vigílias e ca ns eir a s das r especti va s moradoras. Outras,
menos a feitas, sucumbiriam . Mas as aldeanas resistem e co n f o r m a m - s e.
(I ) M m' d.. . .11 POhr.... 1110 d. roall.' (I ... addr .. d. u .....b"l.d.., ..ecIhal' a .... ...n h. &a...I,p.'. ,.
dial..ho. lo oau , . a6.uo d l. faalo . I u . h'm • d, ho mlca . uljhu h lo••• ua una. m f.mllh . qa •• po r 1110. III..
p. ..... pu. lh .. cald u.m d. uop• .
Eau. 1Di ... bmb • m. b p.fla ~ .., , ...a l' . rllIl.o I'<lb. li roire . · .. ucillro u m.ou. a .. IId.. .. ri hdn. por . 0~!Yo d.
qouqa.r imp,dim.a~o.
h ) Ola ld . l. d. S.Ilf. fat, ll. , q\l ' . a l o ~ua ch.onlb o uio b. b• • III' 100" d ceder lm . 56 1110 h. L.
qa alo qan. Ap d. " \1,
.n nlla', d• •l c&aclI'••t ' a. c ulaL. do m.l. po br.. • d i d. m.l)"ol' "ollt.d••• todo.
qe e lId t .m .

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ATRA V t. S D OS C AMP OS

... Habituadas à s labu tas d o campo, d ese m p enham r esignadas m ais essa da
f ont e, s em d ú vid a meno s custos a d o q ue o u tras q u e exe cu ta m o. cada pa sso, na
senda espinhosa da sua humilde exis tência. Às vezes, por se lhes tu rva r o
espirito com a vi sã o d as d es igua lda d es sociais, mal diz em o seu tris t e fad ãrfo,
invectivando a s protegidas d a fortu n a , q ue n em sequ er sonha m com s emel ha n t es
sofrimentos.
Mas tais d esa ba f os n ão p a ssam de en fa dos ligeiros. que se es v a em d e
pro nt o. P orqu e. afina l, 8S jor n ada s a o p o ço, a par das fadigas e tempo que
dem andam. prop or cio n a m atractivos i rresistíveis. S ã o ensejo magnífico para as
mul herz inhas darem CUISO à m u rmuração. narran do e ou vindo o que de bom e
m au se diz e fant asi a pelos a rred ores.
Lá mesm o a enche rem, o u n as esperas. a gu a rdan d o a vez. tagarelam à larga
e à g r and e. F a lam d e t u d o e principalment e em intrigu inhas d e n a m o r o s.
P ara variar, abo rdam ta mbém ao bom e mau governo desta ou d aqu el a.
n ôo esqu ece n d o co me n tá rios sobre a bizarria ou sovinice d as graves. termo d e
co n sid era ção ir ón ica porque designa m . às vezes. a s conte rrâneas de tom .

* * *
G eralm ente, a m u lh er go verna em abs olu to na ca sa . O ma rido , Ba nha ; a
mulher, a d ministra . Ele. entrega - lhe a massa ; ela, apli ca-a como entende. a
ponto d e ser ela qu em co mp ra o tabaco para ele. Da m esma fo r m a , arrend a a
casa p ara onde pretende m udar- s e ; d esped e- s e da qu e habita: paga a s r en da s e
as con tribuições ; co mpra a farinh a par a o ama ss ilh o da s eman a, podend o e
precisando; avia-se na l ojas e v end as, e o m a ri do d á por t u do par a se n ão
eavecer com baTafundas. Farto de li d a s n o q u e é d e o utrem, não te m pacho rra
para t ra t a r das suas. Se por a ca so se mete n iss o. é sô men te pe r a ser ec o d a
mulher. P a r a lhe com p r azer , qu and o o con sulta. se co n s ulta. C omo homem
de brios, não lhe quer ir à mão. Ela q ue po n ha e dis ponha . Se boa ca ma fiz er,
nela se d eitará.
Se ambos pensam em comprar casa para morar, ta m bém o n eg ó ci o s e
p l a n eia e decide sob o influxo da espo sa. C a sa em ru a q u e n ã o l he a gra de, por
b oa e barata que seja, n ã o s e compra. Se. pelo contrá r io, fo r ca r a . m as a r u a
a grade. com pra-se log o, d ê por o n de d er . Qua ndo m ui to, por d escargo d e co n s-
ciência. ele diz lá para os seus botõ es: - «Mulhe r es. s ã o o di abo .. . t ortas como
um ge rrocho l .• . Vejam para o n de lhe h avia de d ar ... Ma s se uma p es soa t em
de ir com elas . .. com as fil has . • . D eix á - l o . .. vá pr'aí . • • Se fo r asn eira.
t amem ela a p aga . • • M ais d isso •.• P ara q u em é a casa ? .. P ara a mulher ..
es t á b em d e v er . •. Quem es tá n o ninh o é a f êmea ... O m a ch o gira .
Ma s q u ando v em ó ninho, q u er cer-ansc . . . E, o ce -ensc só é bom. às boas »
......... .................... ............................ .... ......... .......
N ã o o bs tante, há marid os que ralham freq uen temente co m a s mul heres.
com o u s em ra zão. Entre estes, tam bém um o u o ut ro. oferece e dá o seu soco

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ATRAVeS DO S C A M P OS

bem puxado, de longe em longe, não tanto por lhe chegar a mostarda às v enta s,
mas para m os tr a r que é teao, q ue em ele es tando, a casa ch ei r a. a h omem .
F arran cas de o cas iã o, q u e em nada abalam o predomíni o da consorte. Â s boas
ou à s m ás, a chorar ou a rir, ela é a rainha do lar . de soberania discu tida
mom entâneam ente, mas nunca destronada.
Para t a nto. basta-lhe trazer o marido bem v es t id o e calçado. rem endadin ho
a ca pricho, e ao mesmo t empo não lhe falta r com o tabaco. boa comida e boa
ca ma, nos dias e noites q u e vem a casa. Se nos domingos lhe ralhar p a r a q u e
se barbeie. lave e vista em trajo d omingueiro. taoto melhor.
Ora, a t odos es ses deveres e atenções. e a o utros a n á logo s, atendem, so lícitas,
as mulheres d os campónios, sacri.6.cando -Ihes de boamente a sua alim en taçã o.
descanço e v estuário. Comprazem..se em traz er os m aridos c com o uns brincos »,
em ccchego d e comp ost ura e ass eio, q ue nã o dê motivo a censuras, antes a s
eleve no conceito p ú b li co.
P o ss u íd a s da mesma lou v á vel orientação, e s em p re no p ropósito d e a grad a -
rem, muita s. nos domin gos em q ue s e não f olg a . v ão a p é, com os filho s, à s
lavouras on d e trabalham os maridos, a d istâncias de ;; e 4 quilómetros, p a ra aí
ja n ta re m com eles, do que lhes levam d e prop ósito de suas casas, em cesto
ta m bé m provido d e loiça, t oalha e ta lheres, tudo muito Limpo e asse ad o.
O jantar consta da olho.zi ta na panela, p ão de trigo, vinho e frut a . N essa
ocasião, nem eles n em elas comem à custa. do lavrador; m as cada homem
recebe d o e be àãc os marrocat es e q ueijo que lhe pertencem .
À. v ista da mulher com os filhitos p el a m ã o e o ces to d a p a p aro ca à cabeça.
a l em b r a r a saborosa lhe , a boa pinga, e outros mimos que ela lh e tr az expon-
ô

tâneamente - qual será o marido. esla.llad o d e trabalhar, que nesse m om ento


não fa ça beicinho de ternura a gradecida à p revidente cara-metade? . • Essas e
outras ea.rícias, elevam a mulher ao fastígio do poder d oméstico, q ue exer ce
radi ant e, sem contudo s e esquecer do que d eve ao m a r i d o. Isto enquant o a
velhi ce s e n ão aprox ima. Depois, co m o a mbos tenham fil h os m oços, crescidos,
de safin a bas tant e a harm oni a conj uga l, se b em que a preponderância feminina
con ti n u a a subsistir. A s ua s uprem a cia afirm a-s e a toda a hora. E s en ã o veja-se
o seguinte, qu e é sign ificativo : S e a m ulh er t em pai, m ã e ou i rm ã os inválidos
o u precisados d e ampar o, o se u l ar a lberga-o s tam bém, e o marido não estra n h a,
ant es estima. Mas se é ele q ue t em as cendentes o u irmãos a carecerem d e
asilo e a mparo, a companheira t ai s artima nhas urde e emprega, que, em geral,
não o s a ceita em ca s a, o u s e a ceita é em termos ta is, que os ne cess it a d os fo g em
d e semelhante hos pitalidade, pref erindo m endigar. O do no da casa. revolta -se
con tr a a deshumanidade da esp osa, mas ela acaba p o r conv en cê-lo de que não
h á tal : q ue s ão os sogros ou cu n h a d o s q u e a odeiam e qu e s e lhe n ã o utilizam
as s opas e a moradi a, é p a ra a pô rem mal com ele e a desacreditarem a o s olhos
do mundo. E o marido. à força de ouvir essa s ecdr õmínes. a credita -as ou fi nge
acreditá-las. S e lhe fica m remors os e d es ej a passar por bom fil ho, con cili a as
coisas, protege ndo os seus com alg uns cobres . D e portas adent ro não os p od e

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Vida pastoril, - O rebsnba de ovelhes - A boiede
U1F.NS/L10S DOMtS11COS

1 - Pote de cobre; :J - CboclI/bo; 3 - C.feteir. : 4 - Bi/b.


de cobre; 5 - Pr.to de I.i.nrll I 6 - .. Gato_ de l U To :
7 • PequUlo ,.rr./io e m cerimicII : 8 - EriAiJeir. de
b.rro; 9 - TarTO ; 10 - TiAej ,.
AT RAv t S DOS C AMPOS

ajudar. S eria uma guerra viva . Em ca se só entra à fr a n ca a f a m í lia d e la .


A de le, pa ssa à roda . Quando m u ito , eot ra d e fugi da e p or cerimónia. por
m otivo de d o ença, casamento, e m or te .
Mais ainda : se o casal n ã o tem fi lhos, acar ei a- se co m o tal, um pequenito
da família da mu lher. preferindo- se o da s irmã s n o dos irmãos. D os da do
marido. n unca.
* * *
A mã e cuida d os filhos, na turalm en t e. À m a m enta-os e cria-os n o berço. 8 0
colo e D a cadeirinha d e b raços, de co rt iça . Se n ã o têm l ei te em abu ndância.
r eco rr e às vizinhas condoidss, com r ecursos d e lactação. til À c ria ocita a nd a
assim às m a mas pelo am or de D eus. co m o se cos tum a d izer.
P re ventivos de e pendíques e be rloq ues co n t.ra os ef ei tos da l ua e m a lefícios
de br uxedos. d e mau o lhado. n ão fa lta m a nenhu m. Sign o sa imão, fi gas, mão -
zinh a s de t oupeira , ben tinhos, m ed a lhmha s, e tc., tud o isso a companha a
cr ianç a , no cinto dos cue ir os e 80 pescoç o. Pa r a a ta l ha r a s «f eb re s d a s lu a s »,
n ã o bastam a s bugigangas. Recorrem às re zas e b ênçã os da s be n zel h o n a s afa-
madas. E. a quil o é como q uem d iz: mal tira-te d e s i , .. C om q uat r o bocej os e
me io. du a s ca r anto n h as e umas tret a s de rezas manh os as, a lua safa-se d o co r -
pinho d o ino cente, e d ei xa- o fresc o co m o uma alfac e ... Quanto pod e a cren di ce
estú pi da J•• •
D o ano em diante, os pequ err ucho s arra s ta m - se p el o chão a a n d a r em «de
g atas». até firmar em -s e d e p é. N esse e nt r eta nto e d epois. as m ães es carrancham-
-nos de ilhargas à ci n t u r a , e assim sa em com eles caos m a n da dos», a m ercarem
d o q u e preci sam.
A os primei ro s filho s que vêm, os p rog en i to r es, p ro digaliz a m -l hes t oda a
ca s t a d e ca r in h os co m pa t íve is co m os meios.
Aumentand o-lhes a prol e, as ca r íci a s dimi nuem sensivel m ente, e tanto
mais qu a n to maior s e t orna. Pais p obres. que t en ham 4 ou :; filh os, dizem, se m
r ebu cc, q ue Deus l h es faria g ra nde esmola s e lh es levasse um o u d ois. P or i sso
q u a lque r cria nça dessas qu e a d o eça , po uco o u n a d a se tra ta . Se m orrer, en te r -
ra-se. Vai p a r a o eeu e liv ra -se d e pen ar n es te mund o e n o o u t ro . Para fezes e
m erg ulh os na vida, bas ta m -lhes d ois o u tr ês. O s r es tantes, qu e m orram a nj i-
nho s, p ar a, n o o u tro m undo, pedir em a D eus pelos p a i s e pelos pad r inhos.
Pelos pad r i n hos primeiro, seg u n do a cre nça p o pular.
Sendo a prole diminu ta, os pais esqu ece m a s b eleza s d o C eu, e, se m he si tar,
preferem a cons erva çã o d os fi lho s na terra, embo ra en t r eg u em ao acas o a s ua
s a n d e, educação e d esenvolvimento .
U m o u d ois que s ej am, a n d a m em criancita s num a p u r o de vestu ári o e
as seio, q ue chega a ser p asmo so em g en te d e t ã o po u cos recurso s. Que n ã o se
p rolo nga pOI' muito t empo. di g a -s e tamb ém . D os tr ês a os dez a nos, o u an te s
ai nda. as m ães d ã o-lh es a lta pa ra tra quinarem e garotarem à vo nta d e, r oto s,

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ATRAvtS DOS CAMPOS

sem i-nus e sujos. sem q ue isso as p reocupe. P elo menos procedem assim com os
rapazes- capitães de pé descalço, com liberdade de vadiarem pelas ruas e arre-
dores da terra, sem suprema de ninguém. Ás raparigas dispensam maiores
cuidados de arranjo. a par de o utra sujeitação.
Rapazes ou raparigas, as mãis apenas os castigam quando lhes causam
prejuízos, como por exemplo, q uebrarem -lhes louça, perderem-lhes dinheiro. ou
corta rem -se com rebald arias de furtos. Por qualquer dessas faltas. vai tudo
raso: - pagam o s delitos de f ragante e os atrasados. O eaorrague cai-lhes em
cima , n uma fúria selvage m , q ue con trasta com a tolerância qu e 8S mães lhe.
dis p ensa m , o u vindo - lhes e consentindo-lhes i mpunemente. e a toda hora,
pa lavrões ind ecent es e i ns ultantes, de que a t é muitas se riem. S e estra nhos lh es
exprobam semelhante inconveniência, respondem:
- «Ora são inocentes, coitadinhos . Não sabem o qu e dizem . . . Zucsr-lbes,
para quê? Q u a n to mais se lhes auce, pior Entes falarem mal, que furtarem.
A gente era o mesmo . . . Filho és, pai serás »-
Mas não obstante conside rarem-nos inocentes, cob rem - n os de impropérios
à me nor contrariedade, tratando -os por filhos de curta, etc.
- «S e outrem lho há-de chamar, menos de verdade, chamo-lho eu, qu e bem
sei que não o scu.»
Assim se pretendem desculpar quando alguém de respeito as admo esta por
esse tratam ento inj urio so. N i sso 6.cam sem o mínimo receio de perderem a
rep utação. O tratamento de curta e /i lho de curt a, é tão vulgar e admissível
entre o povo rústico d o A lto A lentejo, q ue se profe re a toda a ho ra, sem inten-
ção in jurios a. Àté se ouve em voz a lt a, como gracejo de intimidade I T ris t e
gracejo ...
.
. . . . .. . . . . .. . ... . . . . . . . . . ... . . . . ... . . . . . . . . . .. . . . ... . ..... . . . . . . . ... . . . .. . .
D os seis aos dez anos, a maioria dos rapazes va i ao m ato, ao fe ixe de lenha,
para consumo da casa. Das r.apar igus, poucas vão : as mães p ref erem tere m-nas
d e portas adentro, a [azerem liga, meia ou renda.
D os rapazes, só vão à escola coisa de metade, se tanto, e sõmente qu ando
querem ir. Às mães pouco lhes importa isso, e os pais menos. P o r acaso um ou
o ut ro, de melhor critério, se empenha em que os 6.lhos aprendam a ler. Com as
rapee ige s observam -se factos semelhantes, notando-se, que, as de algumas
freguesias rurais , pop ulosas, inda q ue quisessem aí frequentar a escola, não
podiam, pela simples razão de a não haver. (t )
Os de um e out ro sexo, logo que aos dez ou onze anos principiam a ganhar
no ca mpo, passa também a disfrutar maiores carinhos dos pais. D essa idade
em di a n t e, por muitos qu e se ja m numa casa, a todos, os p ais ambicionam vida
e de t odos cuid am co m in teresse. A a miza de cresce em escala proporcional e
sim u ltânea com o d ese n vo lvimento d os 6.lhos . P ri n ci pa l m en t e da mãe, q ue os
consideran d o casa d oiros, fa z sacrifícios loucos p ar a os ca l ça r e ves tir de po n to

h ) Em 5a rbar~ft •• IIor e:. .. mplo. onda .6 11., ucol. p ioU o .u:o mucu.lIno.

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ATRAvt S DOS C AMPO S

em bra n co , a uxilíand o- os co m o ut ras a j u das maiores, que são da praxe di spen-


sarem-se. E coisa n otável. Nessa altura a mulher, cu jo desvelo p el o marid o v em
afrouxando d es de que a prol e se desenvolv eu - red uz m ais sensivelmente esses
afectos para os prodigalizar a os filhos. que, ao tempo, são o único en levo d a sua
alma. D o mari do vai -se esquecendo, a té qua se o d esprezar, se o infeli z ch eg a a
velho, não ga n h a n do para si. Quantas os t r ata m de bagat ela. com m odos br usco s
de a b orr ecim en t o, como coisa s a fa da qu e j á deu o qu e podi a dar. O d esg raça d o
lamenta-se, procura rea gir, mas p or fi m re si gn a-se.
Todavia, em quanto a in valid ez o não o subme te à d ep endência a b solu ta ,
m os t ra . de vez em quando, uns arrancos d e energia e protesto cont ra a baixeza
humilhante em qu e a mulh er o colo ca .
Poucas vez es surt e efeito o se u pro testo. E m r egra, fi ca vencido e enxova -
lhado, como lhe a con te ce sem pre q ue cens u ra o l uxo d os filhos. S e esse assunto
vem à baila, em trapuxas d e d esavença s matr im o n iai s. a q ue f o i ca ri nhosa
co m pa n h eira doutros te m p os. p õe-se co mo u m a pa nter a. e ui va pa r a o marido
da seg u in t e maneira:
- Q u e tal está o iundiçss t . . . Não vê que os ra p a z es precisam an dar com-
pos tos, para lhes não fazer em cha cota os da s u a ca m ada 1... E.m m oço foi t rinta
vezes pior q u e os filh os. e em ve l h o l eva a m al q u e eles tra jem bem ... P ois sã o
s eus filhos. .. Coitadinhos.. . es m art u çam -s e com trabalhar e não têm metad e
do que você tinha quando i m post u ra va nos balh os e p elas ruas, f eito p av ã o . ..
À gora, g an h a m at ut a P. me ia , e q u er chalantear e comer à g ra n de ... P ois coma
do q u e eu co m o, e vi sta co mo eu vi sto. q ue não me envergonho d e a n dar com
farrap os ... E ando como d ev o and ar. q ue já n ão estou a parecer b em a alm a
do diabo nenhum . . . Faça com o eu f a ço, e n ão seja emplícente . . . em pa18goso,
a e ntrever com tudo . . · Enté com lu x os e namoros das fi lhas I . .. D eixe-as
l u x a r . . . luxam com O que ga n h a m . a trabalhar co mo uma s m oira s. .. S e namoram,
namoram mo ços de vergonha n a cara ... N ã o são como o u tr os, qu e. se n ã o
fizeram das s u as, foi por que lhes não deram at íl h o . . . Uns rai os m e par t is se m
na hora em q ue m e casei I. .. »
E stes d espropósitos encolerizam o marido, que" por des forço, a meaça a
m ulhe r de lhe ir aos queixos, se continua a ladrar. E a crescenta:
- «Voc ê. sua a u'rra, cu ida que vo u de en co n t ro ó arranj o d os fi lho s ?l . . .
Nunca f. . . Que luxem. m as numa ordem .. . s em abrasarem o qu e o n egro
arAenceía . . . O q ue Banham. chega- lhes ... Pois que fadis tem à sua custa. n eja
à minha, p a r a andar um ma ltrapilho . . . Irra I qu e inda ga n h o p ró, meus trapos,
para voc ê e prá s .61hasl. .. Prá s filhas. ouviu?1 Q ue empl íco com ele s L ..
M entira ... Que namor em com todos os diab os 1. .. mas com juizo . . • E que
mexquem O que lhes é da d o . . . nã o q uero que sejam menos qu e «as ma is• . ..
M a s por se olhar por el as. q ue não falte prós meus arremendos .. . S en ã o um
dia fa ço-e a você n um fe ixe. siora lín gua d e cabra . E hoj e se me faz encazínar,
q uebro -lhe um ta ngsnho nas cos tas . . . Arre, que é t orta. mas eu endireito-al. .. »
E ntão a ameaçada. ve ndo o caso bicudo, muda de t ática e d esata num

139
AT RAV ES DO S CA M PO S

b erreir o de choros e lamentações. que põem o m a r ido perplexo. Para o m otim


n ã o s e avolu ma r, o es poso em q ues tão. d ecid e-s e a sa i r d e ca sa p or algumas
h ora s, s eg ur o de q ue, com a s ua ausência , se r es ta b el ec erá o so cego, Já na rua ,
diz lá para 05 se u s bo tões :
- «Que a leve o dia bo I S e lhe vou ó laval. às ganas q ue lhe t enho.
a rri sco- me a posá -la p o r b oa . .. Nada, q ue p on h a t u do n o corpo dos Elk os,
q ue eu passare i co mo D eu s q uise r . . . O que um h o m em pass a pelos filhos 1. .•
T omara eu as fil h a s ca sadas . .. Em isso acontecendo, rento-me na m ãe, mais
m a l ag r a decida qu e uma serpente I. ....
No entanto, o casiões há, em que o pobre do marido. p erdendo a paciência,
n ão sai p ara a rua, c. cu m p rin d o as amea ças, ser ve -se d o t a l ta nganno q ue . q ual
vara mág ica. chega a produzir mila gr es es t upendos ...

• • •
Batisados Pou co o f erecem de notá vel. Em tempos que não vã o lo nge. er a
v u lga ríssi m o os criados de l a voure, e especialme nte os «d e p ensã o ».
co n vida re m para padrinhos d os s eus fi lhos. os l av rad ores da s p r oxim id a des. e
de pref erência os filhos dos respectivo s a mos. embora fosse m cr i a nças. E s t a cir-
cu n s tância. lo nge de s erv ir d e obstá cu lo. pa r ece q ue até in flu ia pa ra os co n v ite s
se r ealizar em e r epetizem com m ai or fo i teza. Os p equ enos. d e ca lças e sa ias
curtas. figura vam a miado co mo p a d r i nhos. e aind a h oje os guinda m a essa s
a ltura s d e ve z em quando. A os pais e irmãos a contece-lhes outro tanto, pelo
m enos a qu eles q u e vivem em maior co n t ac to com a população p obre das aldeia s.
Há muitos exemplos, d e p essoas g ra d as. servirem de padrinhos duas e tr ês
vezes n o m esmo dia e na mesma localidade.
Também se conhecem indiv ídu os, que por muito s filhos que t enham, con-
vidam se m p re padrinhos de u m a s6 família-a do amo o r d inàr ia m en te.
E. a propó sito. q u a n do os convidam , justificam-se di zendo :
- «Já ago r a . t enha paci ên cia: não bato a o u t r a porta; não me a bai x o a
m ai s nin gu ém I. . . »
N ã o obsta n te, es tes u sos vã o diminuindo s en si ve lmen te, sendo m ai s vul gar,
o s p a is d a cr ia nça. co n vida re m pesso as da s u a cla s se para padrinh os. Parentes
pró xim os. so b r et ud o m o ços solteiro s, um d e ca da sexo, q u e s e n ã o na m orem .
Nam orand o-se, o b a tis o n ã o fic a v a lioso à face d e Deus, a firma a s uperstição
p o pu lar 1. .. Também, seg u n d o a mesma cre nça , n inguém t em ente a Deus, s e pode
n eg ar a s er p adrin h o de batisado - «a a j ud a r fazer alma s cris t ã s» - Qu em a
isso s e r ecusar, p erd e a salva ção da a l m a . P ortento, d e melhor o u pior v on t ade.
n in guém o usa r ecusar-se. Ind a q ue n ã o re ceiem a s p enas ete r n a s, temem a cen -
sura dos cren t es.
* * *
Os batisados costumam efectuar-se nas tard es do s d omingos o u dias santi-
ficados . P ela P á scoa, Nata l e o utras festas solenes, realizam-se dezenas d eles
em cada f reguesia rural d a s m a i s pop ulos as.

- HO-
ATR Av tS DO S CAMPOS

N essas tardes, o prior na o larga o batistério e o sacristão a n da num sarilho


a acol íte r o pároco e a rep ica r os s inos. Àmb os t r a balham ex traor d inà r i a me n t e
e amb o s re cebem as propi nas d o estilo. h) ofer ecid a s pelos padrinhos. O s acri s-
t ão r eg u la a exe cução e d uração d o s re peniques pela importância da s esp6rtula s.
S e foi mesquinha, o t o qu e é cu r to e v a i d e em preita d a ; se, p elo co n re ér io , o
s atisfizeram, es quece- s e a badala r '" ' .

À. hora e pre a ada, é d a p eça o pai d a cria nça ir a ca sa d o s padrinhos. p a r a


da í estes o acompanharem à sua , a fim d e s egu irem para a 'igr eja, S e o s co mpa -
dres não são indivídu os d a m esma casa, t em de pagea r ca da um por s u a vez.
Todos reunidos e a postos para o h atisa do ir para a i grej a , trata-s e de
es colher o nom e para o n eófit o. Sendo r a pa z, a escol h a é a tribui çã o do pad ri -
nho , a ssim co m o compete à m ad rin ha , se a cria nça for me n i na . M a s amb os,
embora usem pôr O s eu n ome ao futur o afil h ad o, cost u ma m não f azer uso da
prerrogativa sem primeir o co n sultarem os p ais do néné. E stes, ou pe d em paro.
o Elbc se fi car chama nd o co mo um dos p adr in h o s. o u d ize m o s eg uinte:
- «E m o n ome se n do à v o n t a d e d os pa drinhos, também é à nossa>
Todavia, lá para co n s ig o, desejam q ue a cr ia nça receba o n ome de u m dos
dois compadres. se nã o o d e u m d eles progen itores . E em últim a an ális e, outro
qu e seja vulgar, ou p elo menos d e fá cil p r o n ú ncia . N ome esqu isito pouco
us ado, é- lhes b as tan te desa geed ãve l. Qu an d o por ventura um a cria nça o r ecebe.
o s pais fi cam d eapeita dfssimos. E com en t a m a ssim:
- «Parece m esmo n o m e de m a nga ção .. . é fa zer p ou co dos pobres ...
Nem um a p essoa sa be como o há-de n omea r I. . . »
E fec tivament e. os t a i s nom es a r r ev ea a d os, nun ca os pronunci a m como
realment e s ão. E stro piam-n o s por tal maneir-a, q ue p r o vo cam a h il a rieda d e.
M a r cham, enfim, para a i greja, a p ê, a pa ss o solene e vaga r oso, com a
s erieda de própria d o ac t o. Na fr ent e, os dois pad rin hos e entre ele s a par teir a,
d e ch a ile preto ou manti lha pela cabeça , com a criança a o colo . (2) Va i ta f u lo o
pi mpolh o: tou ca, vestido, cu eir os e capa d e cores a leg res e r endas v i stosas.
Um catita .
L o g o atrás. s egue o pai e às vezes o a vô o u a vós, e o p agem d e m adrin h a (J)
- s e u marido, pai ou ir mão. Nin gu ém ma is, não falando n o rapazio q u e se
vai a greg ando .
Todo s o s dos cortejo v es t em os m elhores t r a jo s q ue p ossuem, de h armonia
com a sua p osição, estado e id a de.
H á poucos anos ainda, era da pra x e o s h ome ns apresent are m- s e n es t es

(I ) o pri o r nubl. pclo III COU. 480 re lc do pldrio.h.o I 2ÁO uI. 011 lIIacI.ri.Aha. ou CUI III ea .. unc fax. O .. edal.o.
160. 200 relc d. c.d. UIII. ~c pcPOu . bu l.da. COala"CIII dar lIIal•.
( d Nom .. h.'u"I... 1 101. p u • • Ip.jc . o pc dtlo l.o ocapa o lo ' ar d. dluil. I • m cdrio.". o d. " c a ud c I OOaIrU.
a"_1I o Io.'u u o. M.. por Co. llIaar {or m• • 1 ... 1110 ceda a lll. t om a I",ar 0100110 l qu cl. 11111 ocapou o.a 101• . t 10.10 III.Co.oc O
COallUIlI m il. a ••do .
(3) COIOlO I. .. bid o. o..m t odo. 01 b. t1..doa l. ulII m.drio l. • . Muit o. .. u .IJulII COIII 0101. 10 . 01<1.0.10 0. 1.0100 .11 • • lOca nd o
1;Im COIII • pu nd. dc N o... S . n h on . N U I' ca" . , c1u o 11111 lIi o 10., pa'lm.

- 141 -
ATRAV e s DO S CAMPO S

actos e outros i gualmen te so len es, com ch e p eu s redond os enormes e de capas


compridas, de sorrubeca ou pano azul, conforme os meios e a id a d e. Os lavra -
dores também trajavam de capa, mas à es pa n h o l a . para se distinguirem dos
cr ia d o s. Hoj e, todos vã o c em corpo» e de chapeus m a i s reduzidos.
D e q u al q ue r classe e idade qu e seja, a madrinha chama sempre a atenção
do público, que nunca perde o ensejo de a observar aten tamente, pelo men os
para lhe reparar nos enfeites. Madrinha solteira, ca m pón i a , apresenta-se séria.
d e ol h os baixos e mãos cr uza d as. T r a j a vestido claro, de sofrível r oda, com
cinto de fitas l argas e compridas, fo rm a n d o laço de p o n t a s enormes, ca idas
s obre a t r a sei r a : co r dão e brincos de ouro, veu pre to e g ri n a l d a . Um p ouco
se n sa bo ron a , valh a a verdade.
Ch egados à igre ja, f a z em oração, dis cutem de novo o nome da criança, bati-
s e m, t r o cam parab éns, legalizam o a ssento, h) sa t is fa z em as propinas Cd e sa em .
O p áro co a companha ou n ão, segundo a norma que ad o ptou o u a co n sideração
que disp ensa aos figurantes. Mal sa em , 're pi ca m o s sin os, e o rapa zio q u e ge r o-
te a v a no adro e à porta. d a igreja, a code em chusma a acompanhar o batisado,
co m o cheiro nas a mênd oas. Pulando de contentes e a chilrearem alegres, lá
cam inham com O s équito, uns atrá s, o u tros a par e adiante, e todos em folia
des enfreada.
Da igreja a ca sa, (.) o cortejo r egres sa co m o vag ar e co m pos t u r a an álo go ao
da ida , sendo igualmente alvo d a cu r iosid a de do gentio.
Chegam e entram . Os padrinhos dão o s parabéns à co m a d r e, dizend o-lhe:
- «A í tem o seu filho batisado : D eu s lhe dê saude e fortun a para o cr iar.e
E os progenitores respondem:
- «Muito ob r ig a d o . . . N o ss o S enhor a vivente os padrinhos pa r a f aze r em
muita alma cristã.»
A o que estes, algumas vezes, redarguem e
- «Q u e n ão s ej a o último , que vocemec ês tenham.»
- «A i, credo I Com este e os que para aí estão, já temos bastante . . .
Não era d emai s ir um para o C eu I .. .»
A ct o co n t í nuo, enquanto a m ã e p ergun ta à par teir a se o pequ en o cho ro u
q uando r ecebeu a águ a. batis mal - p ron ú ncio d e feli cid ad e - cada padrinho,
a b ri n do a sua bolsa d e a m ên d o a s, ( 4 ) ap re s enta-a a t odos da cas a, para cada
q ua l ti ra r à vontade. T odos ti ram . N ã o o bstan te, so beja m muitas. S ão a s do
ra pa z io, q u e na rua a s a guariam ansios os e impa cientes . Pronto o s satis fazem.

(11 L~ado-o, o piroco n ..... crl u l ... pn ..ll u


01 p. llri llh o•• ClUI o ...Ia lm • • • b.allo u cu...r . Cllfllpn Ilotn. 40 . Il' m
'~pr. II ob,u". . .ta p dt i ~ • • poJa h' piroco. llU'. oor . l. u r.. o u d..cul llo• • • 6 la u . m o. urm O' II. rt. luo pero'ilul.l.
di .. . II m.IU' d ~pol. d. cfU1u.UIll o. rt.p. cti yo••eto • •
121 A o o'ro co ....uluio • part.ir• . lu propl " ... do. pr/IIl.lro•• i ' fin r.m ."ou d n . A d. puuln "lo t~1ll ra b.l. h • .
C. II. p&drl" ho II' o IIU' Ib.••pr&. . de: 200 ui. per. c!1II • • u" '00 Ou 1$000 ui • .
<.) tm C.mpo M.l or f ~oJtum . o. mondor... por 01111. P.... o b.ti...do . II~ u,r...o. 1. 11(ucm alll'11do. . .obn o.
p.d.rl"ho•• cu o o. lI"tlum c011.ldue::r. O" lej.m PUM" d••U•• mlz.d~.
H l 80u.. d~ d.m..ee, d. ~OriÕII ~ borI... C011U llllo .. m. do i. ou td. 'iI.. 1I0. d. . ...ado... 4U' 'iI... bqu u O" ' OU for l-lll
d.l.u por ["c...bl llcl. do. p.llri11ho• . T ••bl. uoat.ce: l....n.-a. . .Iu Jlf6prio• • • ad , ltr.j• • pa n ofa ncU'. m .m"a.
d o.. ao piroco • • 0 ..«btio 10'0 lI.pob do b.tI••do. E.u uto , U raro e: qu.n ~:IlC IIl.ly o d.. Eu .....I.. do UIDPO. a tu .

142
ATR Av t S DOS C A MP OS

Os padrinhos, ou algu ém q u e os r epresente, a ssomam à porta ou à janela, e.


de bolsa em p unha, zás, l á vã o a s am êndoas a os p u n h a dos, a tirada s com força
em diferente s dire cçõ es. Imediatam ente es tr u gem os gr ito s da ge.ro t ag em , cla-
mando u n í sso n a: - e Prá qui / .. . Prá q ui 1 . ..• E a s a mê n d o a s l á caem em
diferentes pontos, ocasion a n do reem bulh ô es, socos, a trop el am entos, choros e
gargal ha d as. Um rebuli ço bravio, n ota da s mais alegr es d os costumes
alent ejanos.
A cabadas a s a mêndoas. 0 5 padrinh os re colh em, ma s o r apazio continua a
b errar, até que se ca nsa e di sper sa. S e as a m êndo a s fo r am po ucas, dá sur eiada
a os padr inhos ...
Àpós o refe ri do, term ína a f esta co m chá ou ca f é e se us com pete n tes bo los
e doces, oferecido pelos pais da criança. O pai, a partei ra e t o d os de a com p a-
nham en to. se n tam -se à m esa . A mãe fi ca de fo r a. co m a c ria n ça ao co lo.
Uma pessoa de fa müia se r ve os comensais .
Fin d o o chá o u o copo de á gua, (q ue também se usa).. os padrinhos beija m o
afilhado, dã o as bae t as ( I ) à co mad r e.. despedem-se e saem . O pai d a cri a nça
acom pan ha os co m pa d res a ca sa . e a í d e n o vo l hes agradece o «favo r e a es mo la
q ue recebe u ».
E s tes são os cost umes seguidos n a s ald ei as e vil as, p or part e d a s p es soas
q ue a í habitam. M a s a ge n te q ue r eside n os m ontes o u em o u tro qualqu er lug ar,
fo ra d as povoaçõ es , usa a lg u mas p rá ticas difere n t es, i mpo s t a s pela di stânda
q ue os sepa ra d a sede da fr egu esia. À ssim, por ocasiã o de bati sados e bodas,
vão d a casa à igr ej a e vice- ve rsa, em ch uuiões e ce rroe e tapad os», pu xad os a
mu a r es, arreados a ca p ri cho. À said e da i grej a d eitam. a mêndo a s a os ra p a z es
q ue se j u ntam. r es er van do alg umas para espalhar em à chegada, a q uaisquer
g a rotos que l ã lhe apa reçam. N o r egresso, em ve z do chá o u do ca fé, é mais
com um haver b anquete.
Qua se o m esmo se pra t ica nas chamadas freg uesias de ca mpo, cuja s ed e está
i sol a d a e er ma n o meio de q ua lq ue r h erdad e. Aí. os cor tejos aludidos , r eali-
zam-se t am b ém em carros m elhores o u piores e a té em cavalga d uras e be st a s de
a par elho - sis tema po uco vi st o n o concelho de E lva s, m a s m uito vu lg ar n o d e
A r r o n ch es. N as f reg u es ias d es te te rmo, se melh a n te s jornad as co nstituem , em
regra .. cava lgadas cur i osí ss ima s. a qu e n ã o fa ltam os episó dios co rres pon de n t es.
A trás d e ana f a d a s ég uas, i rrepr eensi velme nte arreadas.. ca min h a n do a tra -
vado o u a g a lop e com um o u d oi s ca va leiro s, seg uem , ap r es sad os, v ários muar es
e jum ento s.. de vist osos ap a re l ho s. co nd uzindo i gu a lm ente d i ver sas entidades.
C arr os, vai um. se tan to . p ara os p ersona g ens d e maior re presen taçã o.

* * *
D os batisa d os r esul tam p ad ri n hados e co m pad r ios num er osos. q ue vão
m uito al ém d o q ue se pode s upor . A s cria nças ba rísuda s, os pais e os avós, fica m

- 143 -
AT R A v t S D OS C A MP OS

s en d o, respectivam ent e, a filhada s e co mpa dres, não s ó d os verdadeiros padri-


nhos, mas ai n d a d o mar ido ou mulh er deles e bem assim d os p ai s, a vó s e
sogros, e a té d o p rior e d a pa r te ira . P or o utro la d o. o s d ois padrinhos e s eus
a scen den tes e cons ortes, contraem ta mbém r eciproco co m pad rio, qu e abran g e
igu alm ent e o pá roco e a parteira .
D esta m an eira, h á pessoa s q u e s ão co m pad r es d e t o d a a ge n te da l o ca lidade.
N ão é caso pa r a envaide cimentos, m as h á q uem gost e.

Boda s Ànt es q ue s e efe ct u em , precedem-nas os se guintes preliminares: Com-


b in a do o casam en to en t re os n a m orados, a n oi va p r evi n e a m ãe
para es ta par tici pa r ao p ai de qu e será ped id a em d eterminado di a . N esse
dia, o n oivo aco m p a n h a d o de s eu pai ou d e qu em o r epresente, lá apare ce a
p edir a m ã o da pequena, r ealizan d o ele p ró p r io o pedido o u a q u ele q ue o
acom panh a . O a ct o efe ctu a -se com a serieda de pr ôpnie, m as se m fra s ead os
especia is, co mo co n s ta usar-se em alg u ns po ntos do país.
D i z-s e q ue , antigamente, os rapa z es s im plórios que tencionav am casar,
aprendiam deter m ina da s fra s es d e efei to . pa r a emprega re m na ocasião de p edi-
r em a n oi v a . Entre o u tras" cita-se a segui n te : - «Ào q ue ven ho. venho, ao que
digo, dilto ; ven h o ped ir a s u a fi lha p ara casa r com ig o ... •
.... . . . . . .... ......... . . .. . .. . . . . .. . .. . .......... . ... . . . ..... . . . . . . . . .. . . . . . .
F eito o p edid o. O p ai da noiva respon d e s egu n do a s impress õe s q ue sen te
sob r e o caso. S e lhe a grada, diz q ue s e fo r da v on t a d e da filha, d a dele ta m b ém
é. Se lhe d es a grada, responde em t ermos ambígu o s, ou com franquez a rude.
manifestada p ela seguinte forma :
- «D a minha v ontad e não é, m as se ela quis er n ã o a es i r ovo... que siga a
s u a. s in a.. . D epois não s e queixe C om ig o, n ão co nt em para nada... D eus os
aj ude e a mi m n ã o me des am pa re .
A m ã e de n u nci a -se mais. Em r eg r a, aprova s em pre. M a s, po r excepção,
também se vê o co n trár io. is to é, n ã o q u ere r , ou fi ngir não qu er er. S e r ealmen te
n ão qu er, atira cata nad as fo rtes, e faz ch in frim .
S eja como for. mu l he r e m arid o, chamam a filh a e, p or fo rma lid a d e,
perg unta m-l h e se quer ou não casar. Ela diz que sim, está claro. e o ca só r io
fica r es olvido .
No ca so d e aprova ção e con tentame n to unânime, a entr evis ta d os n oi vos e
dos pais prolonga-s e p ela n oit e fo r a , em p alest r a anim adí ss ima, tratando-s e
lo go do s pr eg ões (p ro cl am as) . dos convites d os padrinhos e d a forma por que
se h á-d e celebrar o casa me nto : se «à cala d a» , à cepuch s, o u se co m gr a n deza ,
isto é, com a assi stência d e convid a d os e r ealização de banquete.
Como pert en ce ao noivo fa ze r as des pesas d o br õdic, é el e ou o pai qu e
prim eiro f a la m n esse a ssunto. A n ão s er p o r motivo de reparação tardia, ou
por luto rigoros o. os s eus brios e os usos locais, levam -no a d eclarar q ue «fa z
boda », e qu e ha verá banqu ete e q u e fa rá con v it es a os amig os e parentes.
P or co nseg u in t e, diz a o s futuros so gros q u e podem convidar tamb ém a íe m ílie

- 144-
ATRA vtS DOS CA MPO S

que quiserem, que ele fará outro t anto, não ol h a n d o a gastos. O pai ac ode em
ref orço, acrescentand o :
- «Q uem olha a g 8St OS , nã o se mete em fu n ções.. . Um dia, não são dias...
Onde não chegar o rapa z, chego eu . .. ou os am igos. se fo r preciso .. . N ã o será,
g r a ça s a Deus.»
E. para corrobar, conclui a sse verando que ele . hom em d e barba s de vergo-
nha na cara , n ão a com panharia se u filho a pedir filh a s d e o ut rem . s e o n ão
sentisse com poss es p ara mud ar d e es ta do e co m q ue se governar alg u m t em po.
Tão bizarras declara ções são escut ad as, com infi n i to p r azer. p el a ge nte da
noiva, que, lá pa ra co n sigo, nunca levariam a b em o utras em contrári o.
Mas, para s al va re m as a p a r ências, r esp ond em que de to da a m an eira fi ca m
contentes; qu e n ã o qu erem incó m odos, qu e far ã o p oucos convites, pa r a se n ã o
tornarem pesados, etc .
A restriçã o n os co n vi tes é a b er tamente co m bat ida pelo n oivo e se u pai,
no propósito de d em o n s trar em cabalme n te que não são so m íticos, e que se
sentem na bolsa, embo ra a r ealid ad e es teja m u ito lo nge d o q ue aparentam.
mas é da peça a la rdea r a bund â n cia, e p o r isso a rrotam .
Á vi sta de tão insis t ente arra zoad o, os pais da n oiva a ca ba m p or d eclarar
qu e enfim semp re co n vida rão a s u a p arent el a, vi sta a boa vo n ta d e d e qu em
faz as d espesa s. Nessa s in t enções já ele s estava m desde o princí pio, ma s parecia
mal dizerem-n o. À s esco vi n h as d os esc r ú p u los sã o preci sas, p or tamb ém Serem
do estilo.
Àrrumada a qu estã o. vem à b aralha o u tr a d e maior transcend ên cia. T em d e
se combinar sob r e qu em h ã o d e se r os padrinhos: se cr iat u ras da egu aIs dos
noivos, ou se gen te gr a v e. N ão h á-de o n oi vo co n vi dar p adrinhos le p ôes e a
noiva madrinha fina. Ou o invers o: a n oiva ir à i grej a acom pan hada p or
mulher campónia, gross eira, e o noivo entre l1gu rões d e g ra vata ou lavrador es
ricos. T em de dizer o 10m com o som .
Nisto não há diver gências, asse n t an do- se lo go qu e os dois padrinhos e a
madrinha serão t od os da mes m a clessete, Discu t em-s e p orém os pró s e os
contras que haverá em con vi dar d os d e colarinho alto o u d os de ge n t e lam-
beruçe, De re sto. optam p elos qu e julgam co n vi r - l h es melh o r. S e escolh er em
pessoas humildes. [us rificam-se alegand o n ão serem interes seiros n em im p osto-
res: qu e vão bem acompanh ado s co m p ob res como e les, g en t e qu e n ã o é de
cerimónias, que tenha de se andar co m ex équies d e co r teei as.
No caso de optarem por padrinhos de condição social superior à s u a ,
a nnam noutro diapasão, sem que por i sso lhes fa ltem argumentos com q ue s e
jus t inquem. Favores recebidos, qu eda para a s pe ssoas, d e pendênci a s, ofe r eci-
m entos antigos mais ou men os Iantaai osos, etc.
D e qualquer maneira é-lhes f orçoso justi.6carem-se perante os a uditó r io s
das soa lhe ir a s e outros pontos de ta gareli ce.
N ão s endo o casamento da vontade da família da noiva, o noivo e q uem o
a com panha saem logo que formulam o p edido e o u v em a re sposta. As delibe...

- 145 -
AT R A v t S DOS C A M P O S

raçõ es r es tant es res er vam-n a s pa ra d epois, con:.6a n do q u e o temp o aplane a s


p rinci pais d ifi culdade s. S e p assado s dia s os emb ara ços co ntin u a m, cor tam-nos
d e vez, esquecendo contempori z açõ es, e os d ois - n oi v o e no iva - r eso lv em t udo
como m el h o r podem , a tra vés d e todos os obstáculos .
C on h ecida a o p os içã o o u a m á vo n ta d e d e q u al q ue r d as f am íli as d os nuben-
t es à r eali z ação do co nsór cio , um a r ed e de intr i guinha 5 e m exer icos envol ve a s
dua s resp ectivas p a r en tel as. Entre o m u lherio ch ega a ha ver brigas de d es co m -
posturas vex a t órias, no m eio d a rua. qu e à s vezes t erminam p or cen as d e
pugila to.
O s p o br es noivos vêem-se em calças pardas para mant erem aparente n eu-
tralidade. t clar o, qu e e m semelhante co lisã o, inclinam-se para a q u el es que lhes
protegem as aspira ções. M a s t a m bé m d esejam acalmar a s iras e ressentim entos
d os d o ca m po o posto. Em r eg ra. n ã o co nsegue m re ali zar esse intent o concilia-
d or. p ois à m edida que o enlace s e a proxi m a . m a is se a ci rra a des a vença en t r e
as d u a s f amílias.
Chega d o o di a da boda. f a z crise a intrigalha da. O u as pazes se r e al izam
po r int er m édi o d e p essoas amigas e a p6s um co r tejo de cho ros e exp ro b açõe s
recíp rocas. o u os a grav os s e a volumam e o 6di o cresce. como r esultan t e de
m útuas d esconsideraçõe s, imaginária s ou reais.

• • •
L ogo q ue pr-incipiem a correr os pregões, a n oiva deixa d e ir a os t ra ba lhos
do campo, ao p oço , e à ribeira. Também lhe é vedado ir à missa ou a qualque r
diversão. Àt é casa r 56 sai por absol uta necessidad e: a dar parte do casam e nto.
ao exame de do utrina a casa do prior e à confissão na igreja, na v és pera d o
consórcio.
N oi vo e n oiva convidam os padrinhos ante s d e correrem os proclamas.
Demora mai o r. p odia ser t omada pelos convidados com o falta d e consi d er açã o
às s u as pessoa s. Os padrin h os a ceitam g er a lm en t e. mas se p or v entura se
r ec usa m, o caso to r na -se intrincado para os nub ent es, por re cearem q ue a
p es soa ou pessoas a q uem ai nd a te n h a m d e recorrer, igualmen t e se neguem,
co m o fund a m en t o de não servirem para « prato s de seg u n da ccese».
M a s como lhes é fo rçoso sair de semelha n te si tuação, deci dem -se 8 convida r
ou tro padrinho, qu e, e m reg ra, a cei ta. Sucede p oré m o bser var o s eguinte :
- . Pois sim, contem comigo .. . A ceit o po rq ue não te n h o cachaça de opin ioso...
Se f osse co mo a l.~ uns, n ã o se rvia pa ra a s faltas . .. Mas eu cá , n ã o so u de d is -
far ces. . . Basta de ma is aq uelas . .. P or um a lho, nã o se ~d es m a n cha u m a
a lh ada ... »
O n oivo fi ca um pouco estú pido com ta is obse rva ções; n o entanto, como já
co ntava com elas, balbucia vá.r ias d esculpas e tudo se concilia.
S e o ca so se passa com a noiva, h á. ain d a maiores a m u o s d e vaidade por
parte da nova madrinha. Não obstante, tais satisfações lhe dão e ta nto a lison-
geiam, q ue se resolve a aceitar, esq ue cen d o os es cr ú p u lo s.

- 146-
ATRAvtS DOS CAMPOS

Cada padrinho dá ao afilhado a importância de uma libra aproximada-


mente. se não um chibato ou um saco de trigo. A madrinha oferece à afilhada
o vestido para o casamento, pelo menos, e às vezes, outros adornos mais.
Em troca. o noivo aos padrinhos e a noiva à madrinha, costumam oferecer
o lrete do estilo. que antigamente consistia num cesto ou bandeja com biscoitos,
bolo podre e pão de Iõ, de preparo caseiro, e que hoje se restringe a uma grande
caixa de doce. comprada nas confeitarias.
Os dois noivos ou seus pais dão parte do casamento aos parentes e pessoas
de amizade. A noiva amplia a participação às lavradoras que lhe dispensam
favores.
Ele, recebe a dádiva de quinhentos ou mil réis de cada pessoa a quem dá
parte; ela, brindam-na, com prendas de utilidade. para uso doméstico: pratos.
vidros. roupas. m ôveis, etc. Que de alguns. aliás poucos. nem ele nem ela apa-
nham vintém ou coisa que o valha. Ouvem-lhes a participação e o convite.
a gradecem-lhes e aceitam-no. felicitam-nos por mudarem de estado. mas a res-
peito de afrouxarem. não tomam nada. Comem-lhes o isco. comparecendo na
função e abarrotando-se à grande. mas não caem no anzol. largando a esp6rtula.
Outros. procedem em sentido oposto: primam pela generosidade. dando
mais do que podem. sobretudo se tencionam figurar no acompanhamento e
assistir ao banquete. Conheci um pacôvío, que o seu maior prazer era con vida-
rem-no para bodas e brindar com bizarria os respectivos nubentes.
Nada o envaidecia tanto. como figurar num acompanhamento de noivado.
com o seu trajo de gala. Tão notória se lhe tornou a monomania e tão frequen-
temente se lhe repetiam os convites. que a soldada mal lhe chagava para gastar
com os casamentos dos outros.
Por fim, bem a seu peaar, viu-se forçado a ir pela prenda. sem largar cinco
reis. Desde então começou a ser esquecido. e pouco tardou que não visse casar
todos. sem nenhum lhe participar. Morreu pouco depois; talvez de desBosto
pelo esquecimento a que o votaram.

" " "


Como disse. o noivo faz o gastos da boda e leva o que pode para o sus-
tento do casal nOS pr-imeiros tempos. Isto na melhor das previsões. porque os
há que. Hqutdadas as despesas. não lhes sobeja para comer durante uma
semana. Em todo caso. dois ou t rês dias antes do consórcio. interropem o tra-
balho em que se ocupam e passam «à boa vida» até ao fim da semana imediata
ao dia de núpcias.
Boa vida. é modo de díeee. Averiguando-se bem. reconhece -se que o
modesto noivo. à medida que se lhe aproximam as delícias do hicc.ínec, vê-se
assoberbado por uma série de incumbências. que as circunstâncias lhe impõem.
Para ele é certo o rifão de que se não apanham trutas a barbas enxutas.
Vale-lhe 8 força de vontade e a satisfação de se ver noivo.
Em primeiro lugar. antes de pedir a pequena ou pouco depois. precisa de

- 147
ATRA v t S D OS C A M P OS

e eeende r cas a - a quisiç ã o ba stante difí cil, pela falta de habitações que se n o ta
nos povoados rurais, apesar d e em t odos s e terem construido muito s prédios
nos úl timos vinte ano s. M as a p opulação aum enta em mai or esca l a que a s
m oradia s. E tanto que, devido a es sa falt a. vai s endo vul g ar residirem em
co mu.m duas fam íli a s no mesm o p r éd io - p ai e m ãe, com 6 lh a e ge n ro .
Calcule-se, p or co ns eg u i n t e, as cogit a ções e fez es q u e te m d e s ofr er o p obre
rapaz para alcançar, de r enda, o prédiozÜo que pretende habitar. S e p o r Ie líci-
d ade se lhe depara um , toma -o 10&0 à sua co n ta , q uase sem dis cutir o p reço d a
r enda. S e o não o bté m . ap esa r d e t odos os es forç os e ent revista s in úteis com os
s en h or ios, r esign a- se a ir vi ver em comum com o s sog ro s. co r tan do cerce o pri-
meiro entra ve d os preliminares e n tinup ciais.
. .. . . ... . . . . . . . . .. . . . . ... . ... . . . ....... . . . .. . .. . ... . . . . ... . ..... . ....... . ...
O it o d i as a ntes da boda, o n oivo t em de passa r pelo incó modo d e i r p essoal-
mente a vi s ar os padrinhos. o páro co e os convidados, d o dia e ho ra em q ue
t enciona cas a r . Aos convidados, é da pra x e, r epetir-l h es q ue co n ta com eles,
q u e lhe não faltem a a co m pa n há-lo, q u e le va muito em gosto que t o m em part e
no a j u n t amen to . etc .
Depois, já de t odo eut re g e a os p r epar a tivo s d a ce ri mó n ia e d o banqu ete,
procura d epech é-I os co m esfo rço s d e trabalh o pes s oal, q ue lhe permita m eco no-
mias d e d inheiro. Ele próprio, o u coa djuvado p or a lgu ém, condu z d o mat o a
l enha para ca sa , em carro e parelha em pre stad o s i esp ecu la s obre a m a ne ir a
m ais económica de obter a f a r i n h a para o p ão e b olos da boda i d es pacha os
papéis i (1) e por último vai às h erdades para tra z er o chi bato o u chi ba t o s que
co m pro u ou l h e ofereceram para o bró dio. Na v éspera à noite aind a te m de
servir d e magare fe , a b a ten d o e esfo la n d o as r es es que sacrifi ca à v ora cid a d e d o s
convidad os e do s eheaadteos.
No dia do ca samen n t o, desde que v em da confi ss ão, logo de manh ã cedo ,
at é à hora d e dar a m ão, o s af a z eres mul tip Iicem-se-l h e, m as a t o dos a t end e
pela vontad e que o an i m a . . .

* * *
D o g ov er n o e arranjo da boda. que é como quem diz, d o prepar o d os b olos,
d o despacho na cosinha e d o serviço do alm oço e d o jantar, enca r reg a - se a m ã e
ou irmãs do noivo. a quem ele ou o pai entregam O cabed al p ara os g a s tos
correspondentes- Que não haja falt as . . . Que apare ça tudo que é d ado . . . - São
as instruçõ es q ue pai e filho dão à s mulheres e que el a s cu m p r em à ri s ca .
N este p ropósito. a s encarregadas falam à cosinheira de f a m a . insinuam-lhe o
q ue pretendem, coadjuvam-na no q ue podem, e a o m esmo t empo v ão o u m an-
d am, à s casas abastadas, pedir emprestado os utensílios de que precisam, como
.
( 1) C....tidll.... OlltrOl dOcllm.... IO. I di.p b.i. p.u • ul cbu çlo do U " lllel !.fO . S Iu 6' 111"' dbp..... d. prod..-
m.... ch.. m. m_... . l.L.. ,..p. l. cu n do•• l. Cizc ll.. ltl ncl • •• dh: . u: - Fulano .. fu la Ilio .. . pre, o. m; c...m por
PU" ;' u rn J o• .

- 148 -
A TRA Vr.S D O S C AMPO S

vasilhame de casinha . louça s, vi dros, to al has, talher es. etc . E t u do se lhe


empresta de boam ent e, com o f acto trivial q ue está n o s h á bitos d o campo.

• * •
A ssim como o noivo faz as d es pesa s da boda e do banquete nu pcial, a
n oi va cum p r e-lhe adquirir to do o mohiliáxio e roupas de cama, conforme n o t ei
nas pá ginas 94 e 95, ao t ratar da aplica ção dos salários das mulheres.
P or co nseg uinte. a r a p ari g a pedida em casam ento, se ao tempo ainda n ã o
possui a mobília e enxoval pr eci so s, trata de 08 adqui rir desde logo, contando
sempre com as ofer tos q ue espera r eceb er. O pai e a mãe auxiliam-na com dona-
t iv os impo rta n t es.

N a semana que precede a ce lebr ação do consórcio, enquanto o noivo se


ocupa nos afazeres que j á mencionei, a noiva e s ua família incumbem -se de
assear e mobilar â habitação do futuro casal.
A s vizinhas e as am igas coadj uvam -n as desinteressadamente, salvo a ideia
de assistirem à função, ou pe lo menos a perspec tiva de um presente de b olos,
ou de u m prato de ensopado no dia de boda.
Mas haja ou não esse estímulo. t od a s se empenham em assear e ornamen-
tar a casa com O lu x o e garridice i m po st o pelos usanças tradicionais. ti s an ça s
arreígadíssimas, a q ue n en hu m a noiva se exime, antes muitas procuram ir
além do vulgar. H umilhada se julga aquela de que se não d i z que «leva
um cesâc .e
O s prepa ros te rminam pelo arra njo do sotão e d a cama do noivado, coisas
que ficam prontas ao a noitecer da v éspera da boda, para imediatamente se
exporem à admiração e parecer do mulherio previamente convidado. A visita à
casa e à cama da noiva constitui uma diversão atraente, a que concorrem todas
que a podem aproveitar. As apreciações e reparos q ue aí se ouvem, proporcio -
nam cenas curiosas, que t a l v ez tenha ocasião de reproduzir no utro lugar
desta obra.
• • •
P or volta das dez horas do grande dia, o no ivo e seu pai tratam de reu-
ni r os parentes e amigos com que contam para o a lmoço . D o s da noiva concor-
rem ou não, confo'r m e a ccrdeelidade ou frieza de relações entre as duas famí -
lias. Ela e a m a d rin h a não compa recem; os padrinhos só vão sendo de classe
análoga à do afi lhado.
N esta altu ra do almoço, o infatigável noivo entra no período agudo das
massa das estopantes. Por ser da peça e não incorrer nas cens uras, lá vai feito
bolegcrim , de casa em casa e de taberna em ta ber n a , a chamar os parentes e os
amigos onde nem sempre 09 encontra, t endo de esquadrinhar por toda a parte,
'P a ra l h es descobr ir O paradeiro.
D epois mesmo de os encontrar e de l h es dizer o que pretende, ainda por
veze s sofre dece pções, que chegam a esgotar-lhe a paciência ,

- 149 -
ATRAv t S D O S CAMPOS

À poder de r ogurives, todos prometem i r, mas pOUCOS seguem logo. Al guns,


mais ce.rreços, têm d e ser a visa dos se gunda e terceira ve z , fazendo es p er a r e
arreliar os pontuais. Qua se t êm de os l evar a os em p urrões.
A fina l, e a p ós inúmeras di li gência s, a lamilia r eune e o almoço efectua-se.
Const a de s opas de verd e o u sangue cosido, com fressuras misturadas, ensopado.
queijo, frutas, b olos. vinh o e licor. C h á ou ca fé, 56 a pa r ece s e entre os comen-
sais figuram pessoas fina s. Mas, em compensação, b ebe-se vi n h o e licor à fr anca.
A lguns dos bebedouros ficam avinagrados, por tal modo loquazes e fastidios os,
qu e 09 restantes esquivam-se a aturá-los. V ã o, portanto, embirrar com o no i vo
que, pela sua p osição excepcio nal, a t é isso tem de sofrer f

* * *
H oras antes d o co nsór cio, a noiva en trega-se ao s preparos da toile tte,
a u x ilia d a pelas amigas que a r odeiam. O p en t ea d o e a colocação do v éu e da
g ri n a lda , ex ig em con heci men t os especiais de bom gosto, qu e, no conceito do
vulgo f eminino, s ô p ossuem a s e m estra s» de f a m a . É por conseguinte, u m a
dessa s h abilid osas a incom bida de tais a d orno s, m edian t e convite p révio o u
of erecim ento expontân eo. A o ver em - n a passar, to da a ssedada, à ho ra opo r tu n a .
as vizinhas a sso m am à po r ta e ex cla m a m :
- c Aí vai Fulan a A quilo vai pô r o véu à n oiva . .. Sempre te m u mas
m ão s mui t o d eli cadas E b om sen ti do .. . Onde põe os olhos, esserve tudo . . . ~
Às maldi z ent es, r edarg uem :
- Há q u em lhe ga nhe . . . Se sa be, n ão faz maravilha . .. T eve boas m es-
tras . .. Entes de apre nder com as eg r a v es era uma citoIa ch a m a r em - n a .
N oiva q u e compu sesse• .ficav a sem doairo... A gora, à s a ba s das erfcas», já fanfa »
.... ....... ..... ... ... ... ... ... .. .. ... ... ....... .... ..... .......... .........
o n o ivo prepa r a-s e em m en os temp o, trocando o fa to q ue d e manhã le vou
à confiss ã o, p o r out ro n ovo e mais custoso. S em emba rgo, veste-se à p ressa,
p orque, de poi s d e «co m p osto» acompanhado d o pai, t em de ir às r esidências
dos d ois padrin h os, pa ra, po r seu t ur n o, estes se lhe reu nirem e co m eles r egres-
sare m a casa, o nde, a o t em p o, já os esperam os convidados pont u a is. Para os
n eglig entes, a ind a qu alqu er tem de se r vir d e criado, corren do a avisá- los de
que está tud o pronto, q ue estão à sua espera, q ue são h ora s, q u e se nã o
demorem, etc.
Afina l, lá o s a carretam tod os, a p oder d e paciência e de estafas.
. . . . . . ... . . . " .
Da parte da noiva a bservam - se pra x es s emelha n t es. O pai e os irm ã os,
logo que a vêem preparada , dirigem-se ao domicílio da m a d rinha, para esta. o
marido e filho s, os acompanharem a casa, e de aí segu ire m à i grej a . Se q ua n do
chegam a casa. ainda faltam convidados, e lgaem s e incumhe d e os ir chamar.
até q ue compareçam, dep oi s d e m uit as a r re li as.

Noivo e noiva, ante s d e sairem p ara casar, aj oelham-se diante do pai e da.

- 150 -
A T RAv t S D O S C AM POS

m a e, e. como vidos, p ede m-l h es e r eceb em a benção d e ca da um. O s pais, se n si-


bilizados t a m bé m, ficam lacrime jand o i gualm ent e. S e o ca sam en to n ã o é à von -
tade da família, a s lágrimas cor re m d e fio, especialm ente dos olhos da m ãe e d as
irmãs d o nub ente, que, em semelha n te h i pó t es e, faz em -pape linhos de t o do o
g én er o. para alardearem de sgosto e quiailarem o ou tro consorte e s u a f a mília .

• • •
N a ida para a igreja, o n oivo f orma um cortejo e a n oi va o utro , i n do cada
qual p or sua v ez . A n t es, t om am- s e a s n ecessária s prevençõe s para o s do is a com-
p anhamen t os s e n ã o en contrarem n o traje ct o. É d a praxe a noiva chega r
pr ime iro.
Ambos os co rtejos seguem a p é. gr a ves e ceri mo n i osos, cônscios d e que se
t ornam alvo do po vi n h o, q u e aflu i às esqu i n as e largos da s r ua s pa r a l h es
obse rvar os traj os e a s p ectos.
A n oiva to m a à f rente d o se u séq uito, ao la do dir eito da mad rinh a. V es t e
p ouco mais O u menos com o as noi vas d e toda a p a rte : h ) ve st ido claro. de fi ta s
largas à cintura , co m O la ço e p o n tas ca idas j véu branco e g ri nald a d e fl ores de
laran j eira. N as or elh as, a o p eit o e na s m ã os, os te nta re specti va m ent e b ri n cos,
cordão. broche e a n ei s de o uro. O p io r para ela é q u e parte das jcías, na mai o-
ria dos casos. pe r tence m às p are n tas e a m igas q ue a ve stiram , e que Iha8
colocaram para l h e se rem a grad á veis.
Oura da e m excesso o u suficie n te men t e, a no iva cam in ha de mãos cr uzada s
cabisbaixa , descobri nd o-s e-lh e n o enta nto vestígios d e cho ro r ecen t e. M a is
parece seg uir p a r a u m en te rro, do q ue pa t a a mai or solenidade da s ua vi da .
M a s para sa t isfaz er a costumeiras a snáticas, tem de fing ir tri st eza, e n esse pro-
pósito lá vai aparentando aqu ilo que n ã o se nte.
A mad ri nha veste segundo a s ua p osiçã o. S endo mul h er hum ilde d o camp o
apr ese n ta- se de véu pret o antigo ( 2) e vest ido de lã.
O no ivo m arch a tamb ém n a fr ente d o s eu co rtejo e en t re os do is p adri -
n h os. Traja jaque t a , co lete e ca lças d e p an o p r et o o u d e casimira escu ra , cinta
d e roermo encarnad o, sa pato b ra nco e ch a pé u redon do. À semelhança da n oi va .
m ostra-se ta citurno e preocu pa do.
O s padrin hos, de trajos fest ivos, 80 uso lo cal, ap arentam satisfação evi d ente,
s em con tudo p erderem a n o ta da seriedad e a q ue o se u pa pel os obr ig a .
C o m o n os ba ti sados, antigamente nas bodas. os h omens d o campo, pobr es

(tI Ao co.. t rlrio do II". 'eul ee IC o hn ru. " or to d• • " .rl. do ". b . em . I,um.. " u ·o.a....II. . . . 10111.. do di,.
tril O d. POrl . J, 'rc. como A" ouch °
OOU.'. 011 - 11 cutloliSllmo co.to", . 01.. " 01.... Ir..", c...r d. t oc. ou m. .. UU•• "r.l'
° ...
.. "utido d . "'1' ... . cor • • :u cta "'e.. t. ee ... u mo .. ~ oi.j 'o u . jo com a oe ,,10 II. f, uj. .. oo u .. ocu f6 u. A. m.drl ab..
°
• "n.na .. ulld.. d. 1'0. 1 lol'lll" Nu. m o• •1.,..... " U ' m -.1. 1..." rÓ"rio _ Fu I hur No,.,.Jo do S..pu lcr o.
Ct) O ....... co ... q u. I I . .. I.h d rJ.. Io.. d. co.. dlcio hu i1d. n.' hod b.dn do•• 110 , . tI.lmu l.u . f1 d , o••
• m"rell.do. pllu I...T. dor ~o' o. coa ..n d. pro,, 6. ito " Ui e... prh tf... o•. S. o. .. lo co u " u r i. ... d.l.. d.·
l nú 0' p.dido. II". l u!tll leJll.•• t. 11.. . hum . ° 11oc .lu;• •nn Jo • mUnIluuc 6u . 00 .. n -n -h c ld u. d. codu
11'"m ....0 ",odemo lI'o' " o..e • • • nl eiuado -o I "11'1 ' 0' • 0.0. pn ju dl d ol•• N UII coli .lo, como cOll.h" cdor Jll. u lu• • de-
rll doo CO.le m... f .. lm ru." . d. ...e. "UI o. eJll. prh ll...o. l . t omu r ... . &11..01.. .......1' .. .

- 151 -
ATRAVt. S D OS C A M P OS

e remediados, iam à i gr eja de capa larga e co mpa ída, com ch apeu d e borla, de
abas rev iradas. H oje, v ã o c em co r p o», e também com o s fatos melh ores que
possuem.
.. .. ..
Tod os reunid os n a ig r eja. efectua- s e o cas a m en t o. Em seg u id a , os n oivos
dirig em -se ao s respectivos s ogro s e, a joelh a n do -se- lhes, p edem e re cebem-lhes a
b ênçã o. D ep ois, o u ve m os parabéns d o s a ssistent es, q ue s e r esumem n o seg ui n te :
- «D eus lhes d ê vida e sa ude p or muitos a n os e bons. Nosso Senhor os cub r a
de b o a sorte . . . » , e tc .
Entretanto os p a d rin hos dã o a go r geta ao sac ris tão, (I ) e imediatamente,
a com pan h a d os d o pároc o e d os n oivos, v ã o à s ac ristia para l egalizarem o s t er -
m os. s e ant es se nã o p r o ced eu a esse a cto. N esta a ltura, o p ár o co é co n vi d a do
a reunir- s e a o acompanhamento e a ssistir a o b an quete. Ele a grad ece. aceita n do
o u nã o. Em ge ral . n ão ac eita.
C oncluidas todas as fo rm a lidades. o s d ois s équitos reu nem-se e f u n dem - se
num só. d is po n do - se a sair.

Enquant o o m atrimónio se efect ua D O interior d o t em plo, o pequen o adro


da igrej a p a roq u ia l enche- s e de curi osos de ambo s os s exos. á vi dos d e p r ese n -
ciarem a saída d a boda. E' um es p ec t ác ulo des titu ido de n ovidad e, mas se m p r e
apr eciado e co n co rri d o. à f alta d e melh or.
- c D q ue tard am a sa ir . . . lt Dizem vári as mulheres impacientes. com os
filhos a rirs colo.
- «E st a r ã o co m o as sent o » - observam diversas.
- «Q u a l história » - rep licam o ut ras. E con cl u em : - «Io d a não te r dem. »
- «Lá saem já I ... L á saem I ...• - E x cla m am rad iantes a s m ai s a tentas.
Ef ecti va m ent e, à p ort a pri ncipa l assoma o cortejo. caminh ando par a o a dro.
Principia m os comen tá rios do mulh eri o:
- «Q ue lin d a vai I . . . F a z uma n oi va m uito boníce,e
- cR u,m . . . N em po r isso ... L eva olhos de chora r ...»
- «P u de ra , não b.e via de cho ra r ... são coisas q ue choca m u m a pess oa . ..
Ioda m 'ele m bro . . .»
- «E q ue ch o r e P o r isso não se faz feia . Tom a r a m mu itas .. . :10
- «E. o vestido I R eporem para o ve stido . .. C o m o lhe diz bem . . . E stá
à m oda . .. »
- «À i . nina, 8 cape la I .. . Co is a ass eada I . . . B oni ta p re nda . .. »
- «Credo I não é para tan t o . .. T em- s e visto melhor . . . »
- «E o n o ivo I .. . Olh em o noivo I . . . O q ue v ai d e sério J • • ••
- «M as bem ves tido ... »

(t ) D . 160 rei . JlU' cim •• d. ud. Jlad rl n bo • d. m.lUlnb•. O. ' lDolam'Dlo, .0 p'roco do p.'o. p. lo 0.01..0 ...&ri.m
d. lre,oul. pu. [n'olll•• No otro. tcmp N. CJI:l .I'om .. 10uUd.dn. o pboco n u bl. do a oi..o um lreleO d...i.Abo • um'
, . li a b ••

152
ATRA VJ': S DOS C A MP OS

• - «Bota fina . . ,»
- cColarinho de lustre . . . /t
- «Botões de o u r o, grandes .. . elam a rea de prata . .. cordão de ouro DO
relógio ... um dinheirão t • ••
- «Q uem sabe se tudo será dele ... Qu em o alheio veste na praça o
despe . . .
E a s si m , com os elogios de umas e 05 desdéns de outras prossegu em os
comentários das palradoras. Entretanto, a boda passa entre as alas da multidão
e o s olhares prescrutadores dos mirones, que fi xa m atentamente os n oivos e toda
Li comparsa ria. para lhes não esca pa r o mais ligeiro pormenor.
Na frente vai a noiva, a madrinha e s eu pa g ecc. L ogo atrás, o n oivo, entre
o s dois padrinhos. e p OI últi mo , o s paren t es e os convidad os.
A o s a i r em , os sinos tangem o s rep iques do estílo - m ais ou m enos espaça-
d o s, s egundo a sorg eta que o sacristã o r ec eb eu - e, ao soarem 0 5 badalos. o
rapazio que traquinava pelo terreiro a os sa lto s e cabriolas. larga as brincad e i-
r as e corre em massa a formar o cou ce d o acompanhamento, numa indis ciplina
d e incorrigível balbúrdia. Muitos garotos t r esm a lham - s e da chusma, seguindo
uns a os lados do cor t ejo, e ou tro s, t oman d o-lhe a f r en t e. como s e foss em a sua
guarda avançada. Pelo ca m i n h o va i en grossand o a turba de rapaz es e raparigas,
qu e se acotovelam, esmurr am, espezinham e beliscam, em alegria doida, na
perspectiva de muitas am êndoas, co nfe i t a s e rebuçados. Uma boda dá -lhes mais
ee gab ofe de g u lo di ces , que cinco ou sei s b atisad os . . .
Os noi vos e seus pais, bem co mo O pessoal restante, caminham vaga ro sa-
me nte â altura da g ra vi d a d e. O s prim eiros m o st ram-s e comovido s e cabisbaix os ;
e nqu a n to que os p adrinhos e comparsas revelam satisfação, cumprimentando
sorrid entes p a r a a direita e para a es q u e r d a . Como quem diz: - «C á vamos ... »
Á man eira que a vançam, das janelas e por tas , la nça m - l hes flo res, g rão s d e
trigo e folhas d e oltve ire, g a la n t eri a que os obsequ ia do s a grade cem levand o a
mã o a o ch apeu.
Cheg am enfim a casa, onde s e realiza o banquete. q u e tanto pode s er a
de st inada à r es id ência dos cônjuges, coma a do pai do n oiv o. Optam pela d e
m a io r cap a ci d a d e.
À p orta a guarda a boda um r ancho d e moça s, em trajos e p enteados
garr idos, q ue es p a rg em fl o r es s obre a comitiva. A vizinhan ça regoIgita nos
limiar es d os p ortados, e a rua coalha-se de gente, q u e acode de diferentes
dir ecçõ es, a o impulso d a curiosid ade . R.epetem~se enfim o s comentários do largo
d a igreja, com tanta o u maior p a smaceira. O rapazio fura por o n d e p od e,
ga lg a n d o obstá culos pa ra tomar p osiçõe s favorá veis ao apanho das am êndoas.
q ue dentro em pouco lhe a t irarã o. Com as mulheres tassalhonas, (1) que s e lh es
metem de p ermei o, n o s m esm o s in tuitos, provocam pequen os desa guisados,

(Jl MuIh"u d. Iintu at llll Iltt"t1o.. . h.h it u.d., .. u.du Jld... na u. duu lfU , t ... dtUUDho d. nlluhio. l.h" do
q",
.lto tO... ~"'p). .", tO"U. Ol • ialfomeu ndo·n o nd. ni o U th..... m. A , n d u , . d. "'Illhu tom,d ld • • n u u d, • ' u i• • nu.
tOlO bo nutU.d•• aru "io.

- 153 -
ATR A V I! S DO S C A M P O S

clamando que só vadia s e gulosas se atrevem a cercei á-los. Elas co n te s ta m


ír a cc n de s, a legan d o igualdade de direi to s.
..... . ... . . . ... . . . . . .... . .. . . . .. . . . .. . . . . . . . ... . . . ..... . .. . . ... . . . . . . .. . . . ...
N o i va e madrinh a, entes de r ecolher em, e ra co s tu me v oltarem-se para o
p ovo e f aze re m m esura de a grade cimento. Hoje, já s e n ã o u sam esses
s al amal equ es.
Ao e n t r a r em t od os na modes ta moradia a que s e de stinam, ou v e m -s e os
p a r a bé n s do es til o, d ados pela s p es soas que n ã o f oram à igr eja. À n oiva dirige -se
à sogra e. ajoe lha ndo-se, pede-lhe e r eceb e-lhe a bênção . Em seguida, é muito
abraçada e beijada pel as amiga s s olteiras.
Entretanto, os padrinhos mu nem-se das bolsa s cheias de am êndoas, co n -
f ei ta s e rebu çados, e, ab rind o -as, ap resen ta m - n a s ao s circunstantes, para q u e
tirem à fran ca . Nin gu ém r eg eite : un s tiram duas ou três, «por bem pareceu,
o u t ros, a os p u n hados, s em v islumbres d e cerimónia . Não obstante, s obeja m a s
precisas para co nten t a r a tu r ba que es ta cion a na rua.
Imediatamente, os padrinho s e r e presen t a nte da m ad ri r h a , de s envensi-
lh am - se d os gr up os qu e en chem a casi ta e a s somam à p ort a, para regalar o
p o v o leu q ue, an ciosamen te, o s a gue rda . Um S U SSUT O d e sa tis faç ão cel ebra-lhes o
aparecimento . Eles co rr espon dem, mos t ra n do- lh es as bo lsas e es palh a ndo -lhes
o co nteúdo , p or entre s orrisos d e agrado. E' uma sementeira r ija, a ss em e-
lhando-se a ch uva de s a rai v a d a g r ossa cai n d o fo r t e so br e as p edras d a calça da
e a s ca beças do po vi n ho. (1)
Àind a as p r im ei r as a m ên d o as n ão caem não chão, j á O Aen tio brada:
- «P' rá qui f.•. P'rá qui I. . .• E. a o passo qu e a g r ita r i a p ro ss eg ue e a umen ta
em tonS ensurdecedores, os g arotos correm como doidos para os sítios vis a dos .
N a sofreguidão d e obter em a p a n h o av u lt a do, e queren d o a cudir a toda a pa rte
ond e chega m as g ulo seim as, cruzam-se em s en t idos o po stos, num bo rbor i nho
d elirante. C h o ca m-s e, atr o p el a m-s e, a mo ntoa m -se, es pez in h am - se, r ouba m -se
esb o f et eia m-s e e co ntundem-se, ri ndo u ns, chor a n do e pra guejand o outros, a o
som d e berro s e g ud íssimos. P a godeira d e estal o, in comparàvelmente s up er io r à
qu e se passa nos ba t is a d o s. M ai s q u ilos d e amên do a s e o quin tu plc d e gen t e.
- «P'rá q u i!. .. P'rá q u i l. . .lt co n ti n u a m a cla m a r alto ce n ten as de voze s,
à ma neira qu e os projécte is de a çú ca r ca em com o b alas s obre os pon tos a lveja-
d os. A s mulh er es abrind o os aventais, e os r a p a aíto s, d e cha peu n a m ã o,
acer ca m -se d o s padrinhos e impl oram-lh es dádivas. S e po r a caso os o uvem e
atendem, a onda do rapa zi o a u da z p reci pi t a -se sobre os co n t em p l a dos e es b u -
lh a - os quanto pod e. Quem ma is unha s t em mai s apanha, em bora à cus t a d e
praga s. Quantas m ai s lamb arices se es pe lham, m a io r é a al g azarra e os grit o s
d e : - «P'rá qui I. . . P'rá qui I.. .» A final , a s b olsas es ve s íe m -se e o gaudíc
a fro uxa. até cessar por complet o.
À ntiga.mente, s e não se av ent a vam am êndoas ou confeitos em abastança,
' l) N io " , . Iad • • 1;11101 .... 0••• ee .... d ••1. " ... p. dri Jlho., "m . 'O u por O" U' , , o buitolum . . . mla do.. A r.pu l.d.
por mud.. de d e ee ui •• ," c. boo .ue 0 '0 .

- 154
ATRAvt S DO S C AMPO S

h avia, pel a certa, s u rria d a a os pad..rinhos, p o r pa rte da ga r ot e g em , Largavam a


co rre r, v o ciferando: -«Padrinhos de capa rota, que não t êm outra L . Capa r ota I...
ca pa r otai ... » E , entre meand o, repetiam a mtude, em a larido r etu m ba n t e, a
ú ltim a palavr a de Cambrone I. . . Hoje, há menos realismo nessas assuadas
zo m het eir as.
N os i n t roitos d a s amêndoas, o noivo vai a casa da sogra, para lhe pedir e
r eceber a bênçã o, e p r incipa lmente, para a convidar a acompanhá-Lo, afi m d e
aais tir 8 0 br ôdic .
S e o n o v o ge n ro n ã o cumprir es ta formalidade, a recente sogra j ulga-se
d es considera da e d e aí tira pretexto para não co mparecer às comesaina s.
P a ss ad o o período de bulício ocasionado pe lo rapazio, vai para a me sa o
jantar : sopa de macarrão, o lha acompanhada d e carne cheia, arroz com galinha.
enso pado, frtcese é, {impr ópr iamente ch a m ad o cabidela), cox o f rito, (I ) salada,
fr utas, bolos, arroz doce e vi nho . Isto, n as bodas de esbarr unto, em que se
alardeia ab u n dâ ncia. No ut ras, m enos espavento sas, O menú reduz-se co nsid e-
r à v e lm en te, se m contudo faltar o ensopado, tido e havido como p rato de
resistência indispensável.
Como os com ensais co stumam ser muitos e as e.comode cõ es p oucas,
serve m - se primeiro os n oivos, os padrinhos e as pessoas mais gradas. À este
primeiro serviço ch a m a - s e a primeira mesa . Ã segunda, concorrem o s convidados
e parentes de menos cer i m ó n ia . e à t er ceir a e última, as m ulheres an teriormente
ocupadas com o s erviço e o s rapazes adolescentes.
À mesa , a noiva oc upa o lug a r d e h onra, à direita da madrinha, tendo, na
frente o noivo entre os padrinhos.
É da p raxe, a noiva comer p ouco ou nada. Se alguma coisa d ebi ca é para
satisfazer às instânc ias da madrinha. P or sua vontad e abst êm-se de t udo, m os-
tra ndo fasti o e acanhame nto. O noivo come mais, m as s em evidenciar apetite.
A ambos. os convidados instigam a com er bem, dizendo-lhes vário s dichotes d e
ocasião. E les ou vem e sorriem, mas n ão s e co n ven cem . Para man terem a linha,
sacrificam o es tô m a go.
Ao meio do jantar desponta a anima çã o. Á m edida que o vinho mingu a
nas garrafas e nos co pos, os cérebr os esquentam-se e as fa lácia s g ener a li z a m - s e,
pelo menos entre os maio res bebedores. C om a s primeiras presa s de ensopado
começam as seudes, q ue no utros tempos «deita v a m - s e» em versos e décima s,
u m a s de improviso, o utras tradicioneis ou «armadasN expressamente dias antes
e de propósito.
O costume persiste. mas não com a vo ga e inte resse que despertava o u tr o ra .
Em todo o caso, aos comensais em evidência e s ob retudo aos n oi v o s, sempre se
fazem brind es. S e s aem em verso, recitado enfAti camente por voz clara e vibrante,
os circ uns tan te s aplaudem, exclam ando : - «P r a q ue viva J ••• Pra que v iv a I . . .
Viva o bem f eito ' . .. Vi va 1. . .»

- 1;,,, -
ATRA V r. S D O S C A MP OS

Entretanto s e come, mandam-se presentes d e ensopado e d e outras viand a s,


às pessoas amiga s q u e n ã o co n co rre m 8 0 f estim.
A abundância d a com ida ch ega a todos, incluindo os p ob rezin ho s a q ue m
se distribu em o s s o b ej os.
.. ......... .... .... .. .. ........ ..... .......... .... ..... ..... .......... .. .. ...
Ante s e d epois d o j antar, a noiva e a madrinha alojam-se n o q ua r to d a
cama, s en t a d as em f ren te da p orta e aí permane cem o m ais d o tempo, p ela
noit e a d ia n t e, a t é o baile termíne e.
a ~ o tã o faz a s vezes d e sala e g uar d a-ro u pa, à falta de m elhor al ojo.
. .. . ..... .............. ... ...... .... ... .. ... .... .. ........... ... ..... . .......
Ás n o ve o u dez hor as da n oite. depois de s e l evantar a mesa e d a casa s e
desobs t r u ir, p rincipia o baile - o balho o u barulho, com o também lhe ch a ma m .
C oncorrentes, t odo o pessoa l que ass isti u ao ja nta r e os r a pa z es e h omens q u e
a pa reçam . faç a m o u n ã o parte d o s con vid ad o s. A por ta es can care-s e d e par em
par , p a r a que en tre e v ej a q uem q u eira . co mo execu t a nte o u espectador. S ó s e
fec ha. quando se re conhece n ã o ce ber m ais f amilha., o u que a assoiç a d.e bal bú r~
d ia é excess iv a . per turbando a ord em e a r egularid ade do adevertimen to.
P or tant o, a f u nção r ev es t e-se d e todo s os car ecter ístico s e in cid en t es p róp rios
dos baila ri cos p opulares, o u pa re me lho r diz er dos ch am a dos «ba lhos d e can-
deia ». h ) cujos por m en ores r eferirei em p ará grafo p róp rio, ins ert o n outro lugar.
N os b ail es d a s bo d a s, h á sem p r e toque d e g u i tar r a e d.e arm ónio. O s toca-
do re s s ão alvo d e de fe rên cias esp eciais, como o f er e ci m en t os d e vinh os, licores,
aguard en t e. b olos e cha r utos.
O s n oi vos, bailam e dans am p ou co ou muito, conforme o gosto que sent em
pelo salsífré.
Pares n o t erreiro. (I) nun ca f altam, ch ega n d o a hav ê-l o s em excesso, co m o
em d emasia são os espectadores, o q ue produz uma t emperatura a sfixi a n te,
s u portada sem queixumes. À cima d a s comodid ad es p esso a is p r eva lec e a paix ão
p ela dan s a e a s delícias i n erentes ao na moro. Q u em n ão namora , g o z a t amb ém,
es p rei t a ndo o s g est o s e p al a vr ead o d os pombinhos qu e a rrulh am . Fervem o s
come n tár ios trocista s s obre a m anteiga que s e d errete.
En qua nto o s n o v os se en tretêm no bail e co m o f u ro r próp ri o da m o cidade,
r eunem -se n ou tr o co mpar tim ent o certo s tip os m a st a ços, amador es d.e desgar-
rada, e aí passa m o serão. culti vand o o se u ca n to favorito. t ã o o rig in a l como
de s en xabid o. Na d a m en o s harm onioso d o q ue esses v ers o s d e pé q uebrad o,
impro vi s o s d es co n ex o s e coxos g a rga n tead o s e m tom p le n g en t e e a r rastadís-
s imo, por entre ais e sus piros de chor a m ing as piegas a d edilharem na copa d o
cha peu. É u m a cantilena fas t idios a e narcót ica. em q ue doi s o u três m a d u ros
ca n t a m em co mpet ência e a lt eroada m ente, ora al udindo ao acto nupcia l q ue s e
fe steja, ora ao mérito e d emérito d a s s u es pró prias p ess o a s, o u da s d o s pres en-

h) 510 .. .. 1m conl...c1do., pOl que n ndo '.nlm.M. d. dol. por p• .,o.. poh ru , a nu CO' llIma n r lIumlb.d ... luz d.
canil.i...
(s) O pllo ond. II hll l••

- 156 -
ATRAvt S D O S CAMPOS

ees, em term os louvaminheiros, ou a des ced ei re r , celebrando qualidades ou


descobrindo m e lenqueíres. (1) Tu do à boa paz, entende- se. Para variar, também
a bordam n o u tr os assunt os: no profano e n o divino. No divino r egalam-s e p or
faze r citações bíblicas, recheadas de anacronismos. N o fi m de cada cantiga, os
o uvintes aplaud em com p almas e vivas. Ap ós os viva s, t odo s molham a g uel e,
co m a sua p in gole de a g uard ente o u de licor, para entreter a anima ção e in spi-
raIOS cantadores.
E s t e singular certam e t oma e m com eço um caráct er ín t imo, cir cu n scr ito ao s
a pa ix o n a d os no gén ero, e bem assim ao n oi vo e aos padrinh os, que de propó-
sito se cha mem pa ra o u v i r em e ap r eciarem.
D epois aumen tam os curiosos, mediante prévio co ns en t i m en to. I sto em
algu m as bodas. Noutra s, a desaaTrada nã o se co n ta de p ortas ad en tro, em ccn-
conência com o baile. mas sim mui to de pois, por l embra n ça. in teresse ir a d e
estranhos, a h oras mo rta s e em plena rUB. V eremos i sso mais adia n te. hl
..... ... ... .... .. ........ ..... .... ...... .... ... .. .... .. ............. ... .. ...
Sobre a um a da m ad rugada, quando o baila rico está n o a uge d o en tu siasmo,
os velhos n ot am o a dia n ta do da h o ra por entre bocejos d e so no lê nci a e fr a se s
s ugestiva s, para a fun çã o concl ui r. A gent e moça indigna-s e e protesta co nt ra
a ideia, julgando - a extemporânea. O pa i do n oivo, o uvi ndo os comen tár ios,
discorda da r apaziada e, em to m faceta, a ss evera se rem ho ra s d e d escanso e q u e
todos precisam deitar-se. Os n oivos não se pronunciam, o u secundam o pedi d o
dos bailadores. Em qu e pensem d e o u tr a f orma mal par ece dizerem-no. En tr e-
tanto o pe qu ene m e co n ti nu a a insi stir e ro ga r p elo prolongamento da den sa, o
que de res to co n seg uem , em bo r a p o r pouco t empo. À cer t a a l t u ra , o p ai d o
n o ivo, teimando na ideia, d á o «lo u va d o » U ) em voz vibr ante, e o baile con-
cl ui-se abruptament e, com visível p esar da ju ventude.
M sI te rmina. a aluvião de hom ens e de ra pazes que enchia a casa, sa i em
tropel para a r ua. O s co n vi da do s de a m b os os sex os. dispõ em-se a sair tamb ém,
despedindo -se dos noivos. A lguns diri gem -lh es remo ques de g r ac ejo, q u e des-
pertam risadinha s.
. .. . . . .... . . . ... . . .. .... . .. . .. . . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . .. . . .. . ............. ... ...
Minut os dep ois, os desposados enco n t r a m - se completamente sós, liv res
enfim de formalidades estupantes.
A o recolherem a o l ei t o nupcial, a lu z q ue ilumina o quart o conserva-se
ace sa inde6nidamente, até se extinguir. P or r espeito a uma a n tig a superstição,
nenhum dos cônjuges se a t r ev e a apa gá-Ia. O que isso fiz ess e, lavrava a sen-
tença de ser o primeiro a morrer.

h l Fu c(I' d. et...l <l:IIu. P .ndllloo. " ot6rlo • • ClC.


(2) A J .., u n J . ,,1 0 • •6 m. " t. n "t.d. por mod..o d. 1.0.1.., o.. ..lruio.n t lofm .tIl Clo.IClol1" 0 011" e e..U:o. pret.xto
d. pu,,"=po. O '<lYC-" prhulpalllle"l' "o••u Õ.. d. l .. ..u ...o. .. I.nir• .I.. t.lou "0 t,IIIPO d o riuo " 0"0 • de c"h"Io• .
U ... ,.. , .UIO com Ju,nuti. e 10o. pi.. '" • d l",u i o d. pr/ mdr. Ordt lD. P .u eI" . tIl ,lIo" •• IIt' duo .
(a I Todo. o. b.i1 11 pOPlll u . d. porl U .d.atro. hrm loUll p.l. I ntlfna~10 d o doao d. cu . o", de el uelll <o upr u ' at • •
CIO' ao lD OlD t<o OPol'h,.. o. uc1 oa . 11• • - . L oo do ar). Crlllo_. - E.q'<ll l• • d lu e , - . A u ho o· ••• {" ~ io I
1I0a h. 1Il·" a. r o•• - t .. ntll!ll ~' Iee o, I, 1111I ' lIdo a •• ""' ''0 ' T odo. .. . ut&1ll 'CIII • IIIlbl.... dl . n ell' nd. . •

- 157 -
A TR A vtS DOS C AM PO S

Muitas outras crenças ex istem a re- speit o de b odas. E is al gum a s : Chuva em


dia de ca sa m en t o, co nsid era-se a u gúrio d e felicidade para os noivos. N o acto
d o m atr im óni o, as l u zes das ve las q ue ma i s brilham n o a ltar in dicam q u e O
n u bent e fronte iriço à s mesmas velas vi v e m a i s que o o u t ro, colo cado e m f rente
da s me nos bril hante s. Se n o di a d a boda, falece na freg uesia qua lquer mulher,
a noiva morre prime iro que o marido. assim como se morr e h om em , toca a o
noivo ir a dia nte.
* • *
S e o serão do no ivado d e corres em os d es can tes da desgsrrs da, ou se mesmo
havendo-os. o utro s cantador es s e l embram de os da r depois à ho ra da s osse ga,
a inda os r ecé m-ca sados t êm de sofr er est a última im p ertin ência . N em m es m o
na ca ma os deixam em paz. Em tai s ci rc unstâncias, q u a nd o tud o pa r ece en tre-
g u e a Morfeu, o g r u po do s ga rga n tea d ores chegam à por ta dos n oi vos, bate m-
-l h es de ma nsi nho e co meçam a g uin ch a r-lhe as s uas cantigas predilect a s n a
t o nadilha do esti lo. S ã o os d escen tes co m q u e f eli ci tam os desposados , desejan-
do-l hes t oda a sort e d e ve ntura s. O po bre noivo, d a n d o ao d iabo os desce ntes,
salta da ca ma a rreIiadí ssimo, e, em roupas m en ores. a ssoma ao postigo, apa -
r en t a satisfação, a gradece, e ainda p or cima g ra t ifi ca os im portu nos, da ndo-l hes
t a m bém bolos e vi n ho, se t em pa ch orra para t anto. O s gra t ificados aceitam e
agradecem pOI: s ua vez, a cresce ntan do- l h e que não era ne cessá r io t an t o in cómodo ;
q ue se acaute le com o ar d a noite .. . que se vá d eitar ... q u e dur m a bem . .. que
d escans e, e tc.
A vítima, obe dece auto mà ticame nt e, versada a o peso das ironias. O s de fora
endereçam - lhe o ut ra ca ntata, cele brando a bizar ria o u mesquinhez d a esp6rtula..
e em contínuo retiram, para ire m m assar pela mes ma f orma os padrinho s, que
Ig ue lrcente os g ratificam de me lhor o u pior vonta d e.
. . . . . . . . . . ... . . . . . . . .. . ..... .. . . .. . . . .. ... .. . . .. . . . .. . . . . . . .. . ... .. . ... . ... . .
N o di a imediato reune de novo a ge nte d a b oda, pa ra tom ar pa rte no
alm oço, derr a deir o núme ro da festa . Á mesa o u ve m -se saudes semelhantes às
d o di a a n terior e várias aned ota s de pica r dia (aJ com vi sta a os n ubentes. P a ssa m
p o r estú rdia e por efeito da pinga que se b eberri ca a m iud o.

* * *
Nas b od a s da gen te que reside no campo, seguem-s e cos tumes semelhantes
a o s q ue deixo ref erid os ( própri os da s vila s e a ldeias). co m a diferença de que a
mar ch a para a ig reja e o regresso efec tua-se em carros vistosos e cavalgadu ras
de sel a , m u ito bem arreada s. P el o caminho vão em correria s alegres d e q ue,
por v eze s, r esultam formi dá veis trambulhões.
An te s do séqu ito chega r a o m on t e, após o casam ento, algun s jovens ca va-

1) C I..l.ç.. d. ilU iau.çou ••Uclo .... Picard r• •iàaL6.c. ... . llcl• • ee ... o I lltdo tl uadulI c loal . ç a .... d'fum lfta d..
blpÓf.....

- 158 -
A TRAVe S D OS CA M P O S

l eir os co ue m de lá a toda a brida, e s a em ao en contro do cor te jo , para o fe rece -


r em o ramo a o s n oivos : um cesto or n a m e n t ado de flores, com b olos e licor es,
de que os noivos e convidados se servem um p ouco, por mera formalidad e.
C u m p r id a a praxe. os d o r a m o, encorpor e.m -se n o acom p an h a men to qu e,
pronto, ch ega 80 se u d estino .
A cos tu m ei r a d as am ênd oas a p a r ece igual m ente. N o a d r o da ermida. d e pois
d o co n s ó r cio, e n o local d o ba nqu ete. à ch eg ad a da igr eja, o ferecem-s e e es p a -
lham-se a quem apa r ece. S ó falta o alari d o ruido s o. que se nota nos povoa d os.

* * *
R. es t a falar da s b odas à cap ucha, r ealizadas de n oite. em que a m bos os
noivos. ou p el o men os um, são pess oas v elhas, s olteironas o u v iúvas .
Nestas circunstâncias, trata- s e o casa m en to em seg re do , p ara o p úblico n ã o
saber o dia e a h ora em que s e ce le b ra . B al d a d o em penh o, p orque d e rest o o
sigílio transpira s emp r e, d evid o à besbilhoti ce a ld eã . E. en tão, os a lq ueb r a dos
nubentes, n ã o se esc apam ao r i dícu lo qu e o s a gu arda. qu e é co m o a pe na ex pia-
tória da a sneir a qu e praticam, s e é a s n eira casar d ep ois d os 50 a no s.
Quando sae m d a i greja o u j á em casa e n a cama, os seu s o uvido s , p or
avariados q ue este ja m , s entem-se atorm entad os p or m onu mental choca lha d a ,
com qu e a lguns patuscas, munido s de m an g a s e chocalho, lhes a z oinam os
ouvid os, num badalar atro ador. D ep oi s. precorrem a s s im as ruas vi zi n h as,
fazendo ou vi r a m ú sica à po rta d os padrinho s. E,' u m a a lvo r a d a có m i ca , que
d esp erta t odos. Muitos n ã o p recís a m a cordar, p orque prevenidos d o ch i n frim,
a guardam-n o impacientes, para se rirem à cu s ta alh eio . Os noi vos é q u e v ã o à
serra com semel h a ntes ama bilidades. Tem-n os havido qu e se en fu recem a va le r ,
reclamand o a intervenção das au t oridad es. H á e n os, em C am p o Mai or, um
ca so d estes deg enerou em tra g édia, d e q ue foi v íti ma um po p u la r, varad o por uma
bala do s ag entes da ordem púb li ca. S e bem me reco rdo, a v ítim a era um d o s da
a s suada, qu e, se também n ão est o u em erro, ti n h a 8 a gravan t e d e s er diri gida
80 r egedor da paróq uia.
* * *
C om o n os bar ísados, uma b od a d á orige m a numero sa p a d t inha gem e b asto
co m padrio . Os n o ivos e seu s as cendentes fi cam se n do , r es pectivam ente, a fil h ados
e compa d re s, não só d o s p a d rinhos e da m adrinha, com o tamb ém d o s co n ser t es
e p roge n i to r es d es tes e at é do pároco. P or o utro lado. os p ai s e a vós d os despo-
s ad o s, co n tr a em co m p a d rio re cí proco, o que igualm ente s e usa entre o s p adrinhos,
seus ascendentes e co na or'tes. Com ra zã o s e diz que o Alentejo é a terra d os
compadres.

En t e r r o
A o d ar-se um fale cimento de adulto, os ch oro s e gr it o s a n gustiosos
da famíli a alarmam toda a vizinhança, que im edia ta m en t e aco de a
certificar-se do ocorrido e a asso ciar-se ao pranto .
À casa enche-se d e mulher es em alvorot o, a in q uir ir em o que s e p as sou e

- 159 -
ATRAV É S DOS CAM PO S

o que se va i passar. P or entre as consolações que p rod ig e l ise m a o s p ar en t es do


d efun d o, e as frases com q ue celeb r a m os d o t es do extinto, apetece -lhes d a r em
fé de t u do. r em ir ar em o falecido, comentarem- lhe o a s p ect o. e mete rem enfim O
nari z em toda a pa r te , oferecendo -se p a ra o q ue p r eci s o seja. U m a s p ropõem -se
a lavar O morto e outras a vestire m -no e avia r em-lhe o enterro, tudo g r atuita -
m ente se se trata de pessoa po bre, ou pOI módica g r ati6caçã o, q u ando a f a m íli a
pos sui haver es.
Lo go que passam as primeiras impressões, a cendem-se alguns candi ei.ros
co m az eite, que se colocam em volta do cadáver e aí p ermane cem ace ssos, a té
se t er a certeza d e q ue o co r po f oi dado à terra . Àpa gam-se sõm en te quand o
regressa m d o cem i t ério as pessoas do acomp anhamen to.
P or efeito dou t ra a ntiga s u p er at iç ã o, em acto co ntín uo a o falecimento
d eita-se à rua a á g ua d o s cântaros que haja em casa nessa oca siã o e q ue.
segundo a crença, ficou empestada. endem oninhada pelo esp ectro da m orte.
D es d e q u e se d á o óbito até o cadáver sair para a s epu ltu r a . não f a lta ge n te
a acompanhar os enluta dos, sobre tudo à noite, no velo tóri o. que é da p r ax e
ser concorridissimo e d u r a r a té peta manhã.
O s velatórios n ã o d e cor r em com a sizudês e respeito que im p õe a pres en ça
dos mortos. Enq uanto os e l an cea d o s pelo desgosto g em em ais p esaros os ou
cabeceia m sonolentos, r endi d o s pelo ca nsa ço do desg osto e vi gílias an teriores, a
maio r ia d os assis tentes fo rma m grupos e cochi cham sobre assuntos alh ei o s a
coisas fú nebres, de molde a desopilarem os espíri tos acabrunha dos pelo cen á ri o
que os rodeia.
À o a m anh ecer. a assistê ncia d i mi nui. para engrossa r depois à hora do
en terro . A essa h ora, reun em d e n ov o as p essoas q ue toma ram parte n o v el a -
t6r io e o utras que n ã o puderam concor rer. À f a mí li a do 6nndo d esperta então
d o to rpor a que se entrego u, pa r a de n o vo cho ra r O morto e lhe en alt ecer
a s qualidade s.
* * *
Na casa d e entrada arma- se a câm ara a rdente. U m pequeno a lta r um c ru -
ci:.6xo e dois modestos castiçais. por en t r e o s candieiros alimentados com az eite.
O cadáver, v estido ou amor t elhado, (1 ) de m ãos cruzadas ao peito. atada s
por la ço de fit a r oxa , é deposto sobre a h umilde eçe, revestida de lenç o is e l a d eada
p or quat ro t ocheiros. Em b ai x o. n o chão. uma caneca com ág u a bento. e alecrim,
co m que 05 vi si t ant es aspergem o defendo, ajo elh a ndo e orando.

O en t erre r ealis a - s e a p é. ( 2) qua lque r que seja a ca tegoria do finad o . Quatro


h l E... '.u l, .....i .....tldo cO'" o.....Ih or .. lu jO' qUI ooH ul. S . e d o ", oe. IOltt lu I. .. , rle.ld. c. u b.ç• • u ma d.
lorn •• mio. V.i d. lIal.mlt o " c. pd. , como •• conu",. diur. A morn lh. d. linbo ou .I" lI..eo cru. qu e . n lj'~"rll' "
0.1'. III'" . . 11. ..0.. lIobr.., ut' d. lod o b. n ld•.
(2 ) Só pu . ou pobrru i", u .. du u llllua d.. do tntnnd.. , r. lui ll m. rltt. -lI"lo ....o r d . O.uh. Qatm dil põ. d....cuuu ,
po r ir.cu qUI ..j a... , co"'.id -.. d.llri",fdo, Jlio p"led o "M uro • .lu n u., Por pouco q'Ol lIo.." . m , l" IJ. ...· n obri, a.! .
..n dun, • tI .. d• •0 d• .I u ..... IItIl:ut"'U "''''01.. por . 1.... do fa1tcid o. Qua tr o tto.to• • oit.et. ui•• p.lo m .
d iuribaldu por dou lIobru.

- 160 -
o tra jo d om ing ueiro
ATRAVt.S DO S CAHPOS

ou seis homen s pa gos pela família do morto, ou por seu ofere cimento próprio,
gratuito e es pontâ n eo, conduzem o cadá v er 8 0 cem i t ério no tumba dos pobres.
ou em ataud e al ugado, para ser vir sõmente até à sep ult u r a.
Aco mpa nha m o Féretro, o pároco e s acristão, as m ulh er es da vizinhança e
a s viuvas e ó rfã os p o b res , se p or v ent ura esperam receber es mol a s.
Desde que o pároco sai d a igreja at é o cadáver recolh er ao campo santo. os
sinos dão o s dobres d o es tilo. como d eram os sinais de óbito ao toq u e d e trin-
dades imediato ao falecimento.
Se o enterro é de pessoa de alguns ha veres. a co mpan h am- no, mediante
paga, as irmandades da f reg 'ueaie, d e cru z alçad a, com os irmãos revesti dos de
opa, de vela em punho. f ormando a las. Uma espéci e de procissão, nada ed ífi -
cante pelo desarranjo e remenda gem das opa s.
Em esquife ou caixão. o cadáver vai de sc oberto, pa ra sa t isfaze r a curiosid ade
do público ávido d e sen sa çõ es. e p or r esolução un ânim e da f a m ilia, que julga
honrar-se patenteand o o vestuári o e o a ssei o co m q u e o m orto s egu e à cova.
O antigo prior da fre gue si a d e Santa Eulália. D omingo s Ant óni o do Carmo,
após muitas r el utância s p or parte do s paro q u i a n os. co n segui u que os d efuntos
se transp o r ta ss em velad os por um pan o de cente. Não o bs ta n te . o p o vo nunca
viu be m essa in ovaçã o. e tanto qu e. logo que o mesmo pároco deix ou a aludida
fregu es ia. o vel h o u so ressurgiu e mantém-se. com peefuizo da higiene e do
respeito devi d o a 0 5 mortos.

* * *
Nos funerais de gente abastada, como nr opr iet ár io s e l avradores. o fér etro
é conduzido à m ã o por cria d os de estima d o fale cido . P r ecede m-n o dois o u
três eclesiásticos e 8 S irmandades. acompanhando n a ret a guarda os criado s da
casa. as ganharias dos lavradores vi zinhos, e a ma i o r p a rt e d a população da
paróquia, bem como vári a s p ess oa s das fregue sias li mítro fes. Muitas mul h eres
. ch o ra m ou lacrimeja m. umas p or h ábito de ca r pideiras ofi ciosas. outras por
sentimento re al e sincero. D e vez em quando, o cortejo esta ci ona. p ara os padres
cantarem os responso s qu e a fa rníl.ie en co mendou .
Concluido o fun eral. d is t ri b u em - se esm olas de 80 a 100 rei s pelos pobres
que compareceram. Nun ca m enos de ce m ou m a ts.

• • •
Pelo fale cime n t o d e crianças. a q u e v ulga r men te se chama m anjin h os.
o b s er vam - s e costum es semelh a n te s a os d os a dul t os de classes an álo ga s. h avendo.
é claro. menos demonstra ções de pesar. A lgu n s. p ouco o u n enhu m desgos to
ocasionam. dada a indif eren ça d e cer tos pais pej a m o r te de 6Ihos pequenos.
Os velatórios decorrem alh ei os a tristezas. C o n s ti t u em r eun iõ es pra zentei ras,
e nfmedfssimas, com atra ctivos de a n edota s. ri sada s. contos, adivinhações. et c.
Até se joga o padre cure / . . . Às mulh eres m enos ex pansivas. aproveitam o
tempo fazendo meia e r enda.

- 161 -
ATRA v tS DOS CAMPO S

Os cadáveres d os anjinhos são trans portados ao cem itério p or rapazitos da


vizinhança, a q u em se dão am êndoas ou gargeta. Como os dos adultos, o corpo
vai à vista. mas gu a r n eci d o de flores e fitas.

* * *
Trajos Tinham outrora a feição local, carac terística, inconfundível e dura-
doura. H oje vê-se o contrário, pelo menos na g en t e nova. Homens e
mulheres vestem ao capricho de pretendidas modas, qu e passam d epressa, que
ningu ém sabe de onde precedem, usento também simultâneamente o q u e a SUB
fantasia lhe sugere, ou o que gostaram de ver a outros em qualquer parte.
Em suma, o vestuário do povo rural na actualidade, baralha-se e varia
tanto, que impossível se torne descrevê-lo em todos os seus detalhes. Predomina
a macaquice - a tendência para parodiarem os traj os da s pessoas abastadas d o
campo e os dos operários das povoações.

* * *
No fato de tra zer dos homens. há menos m odernismos. embora já não
tenham a uniformidade e persistência de outras eras. Sem embargo. é aí que s e
conservam alguns trajos típicos dos muitos que dantes havia . Àssim. continuam
a usar a jaqueta (I) e colete de surrebeca e a cinta encarnada ou preta. Os feitios
e as fazendas divergem um pouco, mas a forma essencial conserva-se.
Desapareceu o calção de tripe e a polaina de aaragcça, sem dúvida um trajo
lindíssimo. acentuadamente campesino. de realce inimitável. Em troca vieram
as calças de alçapão. Cal que se usaram por muitos anos. de cetim a zul de um
único padrão. para todas as estações. Hoje quase todas são de portinhola. de
cotins de padrões diferentes, ou de surrebeca, no inverno.
A calça a ntiga, exceptuando no tempo do calor. era acompanhada de polaina
curta sobre os sapatos. Mas a polaina também passou à história, por capricho
da moda e p or n ão se adaptar à s botas cerradas de canos compridos. que se usam
agora, principalmente no t empo da lavoura. Os sapatos continuam a subsistir,
mas servem mais de verão. época em q u e também se usam as e lparge tas, o u tr a
macaquice que está a generalizar-se.
Rá coisa d e vinte anos, nenhum trabalhador do campo usava meias de pé
no. dias de semana. e po u cos por o ca siã o de folga. Na actualidade. já mui tos
as trazem conjuntamente com as b otas ou sapatos. Mas ainda os h á de pé fresco,
calçando em canelas. sem se quererem habituar às meias.
O chapeu de borla redondo e preto. de abas en o r m es. reviradas. com :6ta
( 1) A j.qa.U o u ..h ti •• n:uptu-.a do ... oeuia.. d. . . .I.tl.eI. a .uo. d. ... u lco r aQ a1to • • 6 . aITa DO. di .. d. fri o
I.u"o ou da ei.V.Ta . Á. i. oru da t ra hali. o • d. d n uD.H. -n1lIII ..... -a. UIO qQ.lqu u parta. .. Tlata. N o. d om l• • o., .u ru..
d• •Idd. a f.ftl. c... . trua...- •• aO Olllhro O ....1. do talllp o. No..o. a Ii.oa pufu'J:Il a.ad.r cm muoJla. da ea.ml .
( 2) C.leu da .Ie.pio• • tado atth por eorula d. p.la d. cio t g ra a ili. u.•• o. eolei.du . O. ho l.o. fi e d.l.do.
iu elia.do. pau" tr • .,Ir •• praadl.1II .111 h.ixo, .. h..a do .tupio. por hotõ.. d. lIIo. d• • d. eebe e,

162
ATR Avt S D OS C AM P O S

negra e cordão d e seda ve rde, está sensivelmente re duzido, e já n ã o po ss ui a


b orla que o caracte rizava. S ó se vê p or a ca so n o d e algum ca s m u r r o con serva-
d or. dos q ue se n ão atrevem a l a rga r a cal ça d e alça pão.
N o fundo d a copa do ch a p éu co l ocam o le nço de a ss oa r d e co res , que roais
serve para limpar o SUO I do q ue p a ra asseio do nariz.
D e inverno. principalm ente entre rapazes, há q uem prefira o g orro ao
chapéu, sobretudo nos domingos. em passeio pela terra.
A camisa, que era invariàvelmente branca . p erdeu a uniformidade e os
a cessór ios que a disting uiam. Compunha-se de colarinho alto com botões de
prata; peitilho sobrepo sto. rendilhado. de malha aberta. a que ch a m ava m segredo;
mangas. de ombros bordados, com preguinhes e serrilh ss, e punhos presos a
bo tões de prata. A s m odernas, d e co r es diferentes, d esde a branca at é à verme-
lh a, já n ã o têm segredos, nem preguinhas, n em serri lh as. Moldam-s e nos f ei ti os
comuns de toda a parte.
A ntes, poucos indivíduo s vestiam camisola, mas os qu e a ve stiam usavam -na
branca, por cima do colete, e apenas em algumas freguesias. H oje, e em toda a
região, u sam-na in ter ior e exteriorm ente, de fazendas e cores va riadas.
Ta nto n o traba lho como aos domingos, é vulg ar a b lusa - a que ch a m a m
matsnheir a-que antigam ente era d e ris cado aos qua d radinhos, e q ue 80 pre-
sente ve r te de tecidos e padr ões, ao capricho e gos t o de que m a p õe .
. .. . .. .. . .. ... . .. . . . . . . . ..... . , .
P a ra re sgu a rdo, durante a estação inve enosa , conse rvam ina lteráveis, os
safões, o pelica e o tap a -cu. (l I Este u sa - s e m en os e só às horas de trabalho.
D as roupas de abrigo d e outros tempos, r esta apenas o ca pot e ou casacão
a guedairo, de b urel, es curo, com mangas e um só cebecêo . Todavia, usam-se
também, e em m aior escala, talvez, outros capotes d e diferentes cores, feiti os e

o...
(1) la.. co I..... de d",u pel .. u ",.. ldu • prepand.. d. lo rma a adapt a u m· . e .obu • c;.. I1,1 n e c.hu d. qllaJ-
(lIlU ...jeito. Sqllf.= ' 0 cor po por melo d. conelu. fin lu 011 bOlõ" pu.u lo cinl1,1 r• • lo. pu.. .., do I.d o d. dc.. tr o.
u... co...pli....-.. d. p.l.. d. cu.. clr o. d. lã c",r u. bre.. u o'" put a . d. br1>. d.. d. ourel u I O1,1. lr o. de pel.. c.. r dd... d. u bu.
ch-II..l o o.. hll.,.,ro.
O. lI. fa.. 1a."I:.. do• • u pcci.l c.. lc o. d. cor preta. (l"c d o o. m . i.....do• • f.bri ca m-" Cm d Unc.. t .. II..."" d o dl.trilo
da t ..ora por p'''ou ot... ..lu", d ln dá .nia . Apu. c.m 1 u lld•••", ' u .. de (lu. lltidlde . .... dH. u .. tu l'. ir .. d o Alut.jo.
co...o por Ilttlllplo ... do S . MI'O;1.I , . '" SOO;1"1. l. .pcr<lccm em d i....... cOlI.d iç llu d. fa brico. u :.cuçiio. Oud. o. de. ",lIho r"
":p.I .., co... forro d. tI .c.do . , ua.rn.lç<:; .. de p."o, bord.d" • u t . mbu . com o. " u' corda .. d. u d• • hOlõ" d. m.tat l a cr. lo.
ai' .a. l1Ia.h IIIOa..to.c, d. pel .m. ordl.. lr lo. d., pro ..Jdo. dc forr o. e d. omito• . T odo , ..ta m por " .. . .. tm ,6 o.....m O.
trah.lh.doru do campo, IllU Il mbt m I....rador.. . p",opri . t h lo • • • tc . • com o u :cal t .. t lbo 1m di .. d. lrio.
O ra.. d. p.l. curdd•• ra p.d• • co.t1,1m.m . n obr. d. , . n . d Oli ro. h . bilido.o. , "O;1t nu bou ",tntl m cOm
..nu tr.ba.lbo. pu••1 <l po r ...co m...d•• m.d i.... u O for elm ••tO d.. ptl.. <l I p" , 01,1 , r .dli c.çlo con upo.. dente . A p..",
d. f.ltOl por corlo.c• • de .. d..d .. uu.. "1,1." u :c1.. . lu m t. h lid .. do trab.lho. ma l lo• • p.num com 1" 11,, • fei ti o . upc-
",I or .oe de li . Na fr.nt• • ot nlto. da p.d...u ' I:ecoç i o. ' m co uro ' p,,,o lo hre pouo' Ol co. ta u do •• capricho. com o "lrel• ••
<conçõ... to.u. b!lld.l•• d.IU , I dutacartm- •• cobra O fu..do " u lII. lho d o p.no. Nu IlItr.mld.d... d.br a.a. d. mUIII' p.l.
Ol/. d. outra md. 8. 1<1...1•• PO.. lo d. co rra ll d. ci o.
E."(l" I"IO .0 p.llca " 0111. " p' el a de ee teee, d. pai . de c. b"" 00 de. cio. CO ID o pdo col1un.do. I.n.lrodo z..c ptl .
c.b.ç•• " tl..elo o corpo. dud. o p..coço . 14 .. ci M O" . <lI:C lp tO O. buço. (loe fic 'm , II .." .. . . du cobnto. AI ' on. p.llco.
mouram Ire .. u Ot.. ltO. hloel. ao . " .. . .. U" ta .. oe " la.. d. p.l. c ut ti d., co.. lou "lI t.l. ri . Em , .ral , pro c.dem d. f.bric o
<lu.ito. PI"" o "o. ID1,1.h.....olh u .. COI j 01,a= h lbllite d... M" o. fdtlOl miu bo i'lItu . pa el ...tu, 1" lum b'III . " l O' C1,1ri oao •
...t'lId ld o•••l......do• .
Do tap ••co pouco h' • dl.ur. U m. pal e (lu.l quCt. COmO 1,1m 1'lI ço P'(l U...... pro..lda dc d1,1" co...",i.. . 4"''' COI coloc. li'
ca.d• • pt Cl'd. a.do lo elolDl" , p,u "... .. udo du .. Ad.,u .

- 163 -
ATRAvtS DOS CAMPOS

t ecid os . Dos de burel ou dos o utros. cada cempomo, bem e n ro u pa do, poss ui
d ois : um bom, p a ra os domingos, na aldeia ; o utro inferior. para ca m po .
N este p ar ti cu l a r , os antigos a in d a se mostravam mais previdentes e lu xuo-
s os . Homem qu e s e presasse . de s de o a b egão a t é ao gunh ãc r8SO , tinha pelo meDOS
o cap ote a g ue d ei r o para us o corrente, a bo a manta de lã de guarnições d e baeta
colorida, com que janotava n os domingos de inverno, e a capa de b riche o u d e
pano azu l. comprida e de fal:ta roda , com alamares na g o la , que 56 servia p ara
ac to s solenes. Pelo dinheiro em q ue impor tava e pela aplicação que tinha. era
o bj ecto de singular apreço, que todos procuravam adquirir, embora à custa de
s acrifícios. Sem capa. ning uém Se a tr evia a casa r. O que a não alcan çasse em
solteiro, passava p or va ldev incs desastrado ou pelfn tre sem vintém . Também ,
a dquirida em f olha uma vez, du r ava a vida do possuidor, e havia -as que se tr a n s -
mitiam de pais a Elhoe, a poder de cu i d a d os de co n s er va çã o . (I ) M as isto j á se
considerava deprimen te. O tom e o s co s tu me s exigia m uma n ova para cada
moço chegad o a homem. A es tr eia da capa, era, por a ssim di z er, a con sa gra çã o
da mai oridade, e. a par, o testemunho de qu e o d ono so u ber a ga.nhar e r eunir
u m r a zo áv el pe cúlio.
Pois, apesar da importância q ue s e lh e liga v a , jaz hoje n o es q u eci m en to.
O u fosse porque t inha de ac abar um dia. co m o todas as co isas, o u po r q u e a
ép oca actua], impondo outras despesas de vestuário, não p ermite a aquisição d e
velharia s ca r as, é certo qu e a o p r es en te s ó us am ca pa. os velhos que a a dq uirir a m
há muito, e qu e teimam em conservá-la com o recordação dos seus bons tem po s.
P or ca u s a s semel ha n tes aca bo u a mant a de lã, de feit io gen u iumente
alentej a n o.
............... .
Enqu ant o solteiro, o ho m em d o ca mp o tem o fa to do t r a ba lho, o d o s d omin-
gos, e o fi no p ara confissão , bodas, hatisado s e d ia s d e fes ta .
D o de trazer é o que disse a tr ás. R.em en d a-s e, Jav a- s e e se r ve a t é à últim a .
O d o s do mingos só dife re do habitu a], p or m en o s usado . Diferen cia-se ap e-
nas pelo a sseio e arran jo. m áxim é n o chap éu, ca m isa e ci n to , com l enço n ovo d e
assoar, à vista. (2) D e r est o, t udo is s o vem a a cabar p o r s ubst it u i r o fa to d e trabalho.
logo que o u t r o m elhor o colo q ue for a do u s o dom ing u ei r o. o u o de se mana esteja
in capaz.
C om O trajo d e gala há que distin gu ir. O d e h á 2$ ou 30 a nos era lindíssim o.
Chapeu preto. r edond o. d e borla; ca misa engo m a da, d e co l ar in ho, com b otõ es d e
o uro; p eitilho d e renda s e p u n hos com bo tões d e ou ro; ja q ue ta de pano preto e
alam ares de prata ; co lete d e corte aberto . de pa no li so o u co m ram o s de v elud í -
lho ; cinta encarnad a de me ei no, cai n do-l he a s fTa nja s sob re o lad o esq u er do;
l enço de seda à m os t r a, entr e a cinta e o co lete ; ca lç ão d e tripe ou d e malha

(I) S ó .. i",udlla.,..m com 0' U IU'OI d. tu,"" Q uu.d o .. re con heci. UIU'eJ:II ""Ili l' pic . el... dUCIl. lI. dl. u J:II-IU ' •
f. d am fuo. p. r. UP':U ' pall a . tlo,.
(2) LaIl.,"O d• • Ijodl o. d. COrU ,.1 a pad.ri o ..i,lolO. 00 • • eutlado . li.o. elo. da . coeo •• DUI" •• 1' " aio bo rd.do.
pel.. . .... 0•• &.. dOI pO" llido.... d..ao.b d o· Jbu boo .eu, 1' .... 0• ••, l",lclili dele I d. l, a . til! ir.... IJIl.OrO .

- 16~ -
A T RA v t S D OS C AMPOS

azul, com gr a n de abotoadura de pesetas e 6vela s de prat a. segui n do -se-lhe a


li ga encarnada e cordõ es verdes ou a zuis, sobre polaina comp rid a d e b riche,
abotoada por m oedinhas de p r ata Das extremid a des, ( lJ d eixando a m eia bra n ca
a aparecer. N os p és. sapa to branco, d e ca b edal fi no.
Alguns, su bstitu íam a polai na po r boti ns o u borseguíns d e cou r o, muito
flamantes. d e onde pendia m cor neias em m olho, a ca í rem sob re a abertura que
mostrava a m ei a alvíssima. E st a vari a n te avolumava o cu sto do trajo, mas
mais lhe r eal ça va a elegân cia, embora denunciasse p rocedê nci a es p a n h ol a.
Não assim 8 polaina. de fabr ico português e a lentej an o.
Que se sai ba, nu n ca h ouve trajo campestre tão garboso como o do calção.
No ent anto saia caríssimo e f oi talvez d evido à ca r est ia que d eixou d e usar-se,
a p onto de só hoje o vestire m os que há m ui tos a nos o com pr a ra m .
Co m o n ota i nte ressa n te co nsigno a q ui os preços dos a rtigos que constituiam
esse vestuário fes tivo, dos cria dos d e la voura do co ncelho de Elvas:

Chapeu. 1$ 500
Camisa borda da 1$800
Oito botõe s de ouro 20$000
Colete . 1$200
Jaqueta . $$ 200
Alam ar es de p rata pa ra a j aq ueta. 6$000
Calções . 4$800
Fivelas de p ru re 4$000
Abotoadura de 72 moeda s d e peseta. s endo 48 p ara as pernas d os cal-
çõ es e 24 para dependurar ao lado dos bolsos, 1 2 em cada um 17$280
Polainas 1$SOO
Abotoadura de 36 pequenas m oedas de prata para as polainas. 4$320
C in ta de merin o . 1$Soo
Um par de sa pa tos . 3$ 600
S oma - Reis. 72$ 700
Adi cionan do·lhe o cu s to aproximado da capa e alarna res . 16$000
Importava t u do em R e is . 88$700

Verba i mp o r t a ntíss im a pa'ra um pobr e t ra balhado r do ca m p o. M a l s e co n -


cebe como a podia m jun tar. Qu e de pri va çõ es e econo m i as n ã o precisavam
fa z er I Mas era desp es a d e um a vez n o vid a, n o m elhor t empo da m ocidade.
• Aquil o tudo durava mais qu e o primitivo don o.
O traj o festivo ele a gora é mu it o men os elegante e d e efé m er a duraçã o.
Cha peu d e aba s direitas, preto ; camisa vulg ar engoma d a . d e co la ri n ho e peitilho
com botões ele O U l:O, e p u nhos co m b otõ es de prata ; jaqu eta , co l ete e ca lça d e
pano pre to ou d e casimira de q u alq ue r co r; cinta enca r n a da o u a zu l, de meri no ;
h ) No..... 0 . h, XlJo,o" •• bot•• d.r. d• • olal• • co..... Ir..·.. do. ch • •• d.. lto'õu d. ' OCI , d. . .n.1 ordiu' " o ' ai.
d. ,,(I.Idu d. ' Uta .

- 165 -
A T R A v t S DOS CAMPOS

l enço d e seda , en tre a cin ta e o cole te; r elóg io o r di n á rio p r eso a coerente de
prata h l e sa patos o u bo ta s de ca bedal fi no.
Quando a s calças s u bstit uí r a m os calçõ es, todas qu e faziam parte do t raj o
de gala , oste ntavam abotoa du r as d e pesetas, pen d en t es d os b ols os. Durou pouco
essa moda .
Nas j a q u et a s ainda apare cem os a lamares d e prata, posto q u e já também se
vêem s em eles e sim com bet ões, semelhan t es à s que usam os lavrado r es .
O campónio te fulo d e h oje em d ia, possui d o is fatos finos, que, em boa
ve rd a de, não duram a terça p ar te do q u e durava um an t igo . É, po r ém , i sso q u e
lhes ag rada , p a r a v es ti rem de no vo com r el ativa f req uê n cia , embo r a r ecorram.
co mo re correm, a a rt efa tas inferiores m as vistosos, d e il u sória apar ên cia.
O essencia l é bota r figura e dar na s vis tas. Neste p onto estão in t eiramen te d e
acor do co m as ideias da época .

" " "


N as mulheres observa-se ma ior variedade de ves t u a rro do q ue no s homens.
Tod as t êm b a stantes l enços, blusas, ( 2) av entais, saias, ves ti dos e chadles d e
algo d ão o u lã, d e cores alegres, uns p ara u so habitu al, outros para os d o m ingos
e o utros - os m elhores - para os dia s d e f esta. De bl usas, a v entais e l en ço,
poss uem pro vi sã o av anta jad a para va ri a rem a miu d o.
T o dos ess es a tavios. b em co mo os ve s tidos e saias. di v ergem tan to.. que s eri a
f a stidioso des crev ê- los m in uci osamente. B a sta dizer q ue a s ua n o ta típica e
ina lterável é o g a rridis mo d a s cores vi va s. e um pro nun ciado 80 S to artís ti co n a
maneira de a s co mbin a r . N os traj o s do min gueiro e fe s tiv o, o colo r i do alegre e
v a r ia do destaca-s e se m p r e num a b ela e pitoresca dispo s ição.
O v estuário vulgar d e t odos os di a s, com preende len ço de arso d ã o na cabeço ..
atado em cima. «à m oira» j merenbeire de chita ou d e ca s teleta, l enço ao peito,
a tado atrás da cint u ra e sa i a e a vental de chi ta . O d omin gueir o pouco dife re:
cabeça a d esco berto. mos tran do o pe n te ado. o u o cu lta po r le nço de ca che- nez,
t a mbém «à moira » ; roupfnha e s aia d e b rocado d e alsod ão; meio chaile de lã..
f ranjado. atando à cintu r a, e ave ntal d e ch ita o u d e e rmu r .
N os d ias de gala : Lenço de seda n a cabeça, ata do ao pescoço, e blusa e saia de
brocado de al godão, a que chamam piqué, com enfeites de ren d a s e fitas de se da .
Pa ra os d i versos trajos poss uem os co rres po ndentes chaíles, dos pad rões
conhecidos em todo o p aís. O s destinados aos dias d e fest a , são d e lã, de cor
clara, co m vi stosa bar ra de seda .
N ã o h á a inda m uitos a nos. O chaile era i n var iàvel m ente p osto pela cab eça .
dobrad o pelas pontas, a oc u ltar o len ço e u m p ouco do r o s t o.
E.s t e costu me está red u zido aos actos co rrentes da vida o rdinária a l de ã.
M ulh eres n o va s e velhas, já tr ajam de chaile e l e n ço ao pescoço q u ando vão à

hl o u l6&io ....d• • ,..,ohi.1o .. ..... bollil. d. ulemhu, obr • • ofe u • .1. a orad• .
ct:} },.. blv.u. ta .h•• do du f.o. adn por oouo. tio. .., II i . co•• r o..plAb. ." .. lldtu.

- 166 -
ATRAvt S DO S CAMPOS

eídade, e a s rapa rigas usam - nos a ssim ta mbém nos dias d e f esta e à m assa dos
domin gos.
À s to u radas, a u a ia is e bailes vão muitas em cabelo, co m flores D O penteado.
O cal çado condiz com O r estan te . Cada mulhe r poss ui botas, sapatos e
me ias, aprop riadas às diferentes classes de vestidos.
Rap ariga s solteiras, poucas ou nenhumas andam descalças ou em canelas, e
a q u e tal pratica é s õmente em casa, recolhid a, ou nas caminhadas pelo campo.
O uro, nunca falta no mulherio novo , pelo menos n as orel h a s. Arrecadas
ou a rgolas nos dia s de sem an a e domingos , e brincos p o r oca siã o de festas,
connssão e bodas. À s de mais recursos tamb ém possuem cordã o para o pescoço.
A q u e logra comprá-l o com a competente medalh a , cr uz o u N ossa Senhora da
C on ceiçã o, r ealiza uma das s uas m aiores aspira ções. M u i ta s. s ó o obtêm em
casadas, como dádiva briosa do ma rido. na f eira do S. Mateus imediata a o casa -
m ento, ou em outra, por efeito de bo a s oldada ga n h a nesse ano .
A n eis de o uro é raro possuírem-nos, ma s usam-nos de p r a ta , um ou m ais.
..... . . . ..... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ... . . . . . . . . . . .. . . .... . . . . . .. . . ... . .... . .... .
H omens e mulh eres, possuem diferentes trajos e ves t em com apuro, enquanto
solteiros e n os primeiros anos de ca sa dos. Depois, à medid a que avan çam na
idade. abandonam a co m pos t u r a do vest u á rio. Dispondo.. como dispõem, d e
po ucos recursos, têm de aplicá - lo s principa lmente. aos enca r gos da família,
r edu zin d o o seu fato próprio à extrema modéstia, maxím é a s m ulheres, que,
ne ssa a ltu ra , passam a and ar r otas e d esalinhadas.
O h omem conserva um pouco m ais o a rra n jo e concheg o d a sua pessoa .
ma s por fim , a falta d e meios, os filh os e a diminui ção d os cuidados da co n sor t e,
arra stam-no também a íd ênnco d esleixo, emb o.ra m ai s t ardio.
Em geral. elas e eles, acabam a vid a co ber tos de andrajo s. s em um visl um -
bre sequ er do cue for am na m ocidad e. Se. p or ventura, desses t empos lhes rest a
alguma coi sa boa, são os filh os q u e a utilizam. E.l es, os pais. d esp ojand o-se de
tu d o que tenh a va l or, já s e r ep u ta m f eli ze s se lhes dão d e co m e r e lhes as seiam
os farrapos. Quantos viv em, t ã o desdi tos os, qu e n em i sso l og r am d os s eu s 1. . •

• •
Alcun has São atributo inerent e à g ra n d e m a io r ia d os h omens d o campo e a
muitas mulhere s. Imp osta s p elo púb li co, co mo al u são a d efei to fís ico
ou m oral do su jei to, s enão p or q ua lquer out r a cir cuns tância. ou h erdadas do s
as cende ntes - os q u e a s r eceb em t ornam-se m u i to m ais co n h ecidos e t rata dos
p el os an exins (1 ) do qu e pel o n om e, ge ralme nte v u lga ríssi mo e assá s confundí-
vel. Em qu e lhes de sa grade. tê m d e se conformar com a s u bs t i t u ição. desd e q u e
fo i san ci on a da pela vontade p opular.
D os h omens, s6 escapam à cr ism a, 0 5 raro s d e n ome próprio a r r evea a do ,

{t I p,to <l Ue e ulI'ill I Itlllp t.'IUllI' U PUI ch uo. r ou " . IU pUJOI!lIIttllt o i rlCll ~ ld u o. hi 401t UCtplou o, dt t lrict tr
.hoa 10' O ou u", oh , ctl o,.

167
ATRAvtS DO S CAMP O S

ou for a do comum . Mesmo de entre aque les que h er dar a m a alcunha do s p ro-
gerrirores, ab un da m os que apanham outras novas.
Uma ou d uas q u e sejam, 1'0'[ qu a l q ue r m o ti vo. é fr equente, com o te m po, o
pú blico p ron u nciá - las p or a breviatura, qu e p or fi m p r evalec e, esq uece ndo o
cogno me q ue a orig ino u. Exemplo: Cascabulho, po r Casca j R ebo lim, por
Rebola , etc.
Nada ma is f antá s ti co do que os anexins aldeão s. É u ma n om encl a tura
gr otesca , des d e os termo s indefiníveis, banais, ut é a os a cen tu adament e p ornc-
grá6cos. Para ha ver de tudo. não faltam os engraçados e os li songeiros, se be m
que este últim o gé n er o não prima pela quantidade.

" " "


Tratamentos Entre p essoas da mesma idade o u aproxima da , r ein a o de tu,
assim como tratam por manas 05 imediatamen t e mais id osos,
e por tios o s velhos.
Pessoa desconhecida, com q uem tenham de falar, cham am -lhe tíoeínbo,
camarada ou colega.
N as ganharias, os íntimos tratam -se por colegas, pa rceiros, pa rentes e com-
padres , posto que em m uitos o parentesco e o compadrio são pura fantasia .
O você usa-se pouco, e, em geral. quando se emprega, trad uz mau humor
ou azedume. Se sai voic ê, p ior. Vo icê, é como o o utro que diz : «patife . . .
malandro, etc.»
A os a mos é raro t rat a r em-n os por ar. f ulan o o u o senhor. Prefere m o voce-
me cê, e, n a alter n ativa, «meu amo cá, m eu a mo lá.. ; o u «sr. co mpadre e sr. pa-
drinho», quando há compadrio ou p e dtinhe ge m . O s que timbram em campar
po r corteses, d ão senhoria a os lavradores de n o t ór ia i nfluência e importância.
O s ca mar a da s avessos a co rtealas, t roçam os q ue as u sa m , chamando-lhes
mesureiros e fin gidos. Talvez tenham razão. Á lav r ad o r a chamam-lhe se n hora
o u m inha e me.
O lav rador com filhos, distinguem -no por amo velho, e aos filhos por amos
nOVOs. E D. esposa a contece-lhe o mesmo, tendo fi lha s. Ela, em começo . custa-lhe
a conforme r -se com O epíteto. de a m a velha , mas por fim habitua-se.
Antigamente, a gen te do campo q uando aludia, em conversa, a o pároco
respectivo, tratavam-no p or sr. prior ou por padrinho prior. Àgora, é simpl es-
mente o padre. na hipótese mais amável, advirta-se. A o menor despeito ou sem
o mínimo re ssentimento, muitos, por m ero gracejo, a n t ep õ em - l he qualquer
adjectivo picaresco, nada edificante.

DIVERSÕES

Como alentejanos da gem a, aferrados ao lar. os ca m p ó n i os da re giã o elv ense


são pouco propensos a I olg uedos distantes e dispendiosos. Gostam de se di verti r,
mas em família, s em o l uz i m en t o das romarias e círios es pa ventosoe, que se

168
o car r o de mola.!, tapado, pronto para a roma ria do S . M ateuS"
ATRAvtS DOS CAMPOS

observam no norte e centro do país. As festinhas e touradas nas aldeias, cons-


tituem 85 suas d is t ra cçõ es favoritas, restringindo -as em todo o caso às d a s loca-
lidades onde res i d em . Ás de fora das terras vizinhas. pouco ou nada concorrem,
se exce ptwa rra os a rom aria anual do Senhor J es u s da Piedade, em Elvas.
C om o passatempo habitual. por ocasião de folga . preferem os bailes e a
taberna. Na taberna beberricam pouco e falam muito. Falácias apenas, de que
raríssimas vezes nascem desordens.

* * *
Baile s hl O s ge nuiname nte popu la res, conhecidos por balhos de candeia e d e
porta a be rta . consistem em diversos bailados 80 som do cante dos
rapazes e rapa rigas, (si co m a co m pa n h a m en t o do indispe nsável pandeiro (:5) e das
castanholas. em ce rtos casos. P a r a variar, to.mbém dansam polcas. rnaz u r ca s,
valsas e co ntradansas, a toque de g uitarra ou de armô.niu m , como apareça toca -
dor que se ofereça, ou se preste a tecer mediante pedido e oferta de b eberetes,
senão a sec o, Unicame nte por amor à arte. C o n vid a d o de propósito, com ou sem
a n t eci pa çã o , não é costume em advertimentos vulgares de gente pobre, q ue s e
remede ia e até prefe re, a cantoria ao toque. Convite prévio a tocado r, só s e us a
e m funções de bo d a, e não em todas.
Figurando no balb.o pessoal sabedor , ent ra-se por tudo que se conhece de
an tigo e de m odern o, d esde o s fan d a n g o s e a pombinb.a branca ai D om Solidam ,
até à con rr e d a nsa , marcada ... à f ra ncesa, em term os e str opiado s.
M a s o que to ma o mais d o t e m po são as «saias» , co m as voltas corres po n-
den tes, ao s om de ca n tigas e do pa n deiro, acompa n h a das p or es t alo s s onoros
dos bailado res, com os ded o s p olega r e m á xi m o d e a mba s as m ã o s.
As «sa ias» nad a t êm de g racioso ne m difícil. m as a gradam d e preferência
p o r ser o gé nero que m elhor s e quadr a às ca nto ria s de p r ed il e cçã o p o pul ar. É a í
que os cantistas a fam ad os ex ib em a s suas fac u ldades vo cais e po éti ca s. q u e embas -
ba cam os ouvintes apreci a dores . A o mesmo tempo, a simplicida de d o baila do
per mi t e o a cess o d o s m en o s ent en d id o s, dan d o lu gar a que todos se d i vir tam.
s aib am ou n ã o.
* * *
O s ba iles efectuam-se à noite, nas casas dos locatários que se p resta m a
obseq uiar a m o ci d ad e. e de d ia, de improviso, nas ruas e largos das aldeias, às
(t) r.. 1I.tuai•• pl.bda, al'lU.h.a, ~o.o i' di ... ao tutu" d., boclu. o. I.alluico. du alde:l u e do ~.mpo d.,i·
, ..m· •• por ""u/loo" "/hU e /."Jr-6 u . O ltuollo o ..aI ula.do e.t4to.ddo. p.lo .....0' .0 co.nlLo d. EI .
(2) E.lu.6 U Il.UIII .,u.do a bailar. Elu ct.Il.U. d.""ro • fou do te:nmo, e .... 0 lII.i•• olt.,. tarem d. 'ou,
••u • • e....... do. ull.uacloru.
(II O paado h o l u: I. .bur to. p0Q'ono lambor ,.Ia ....ILatlc. do, ,on•• da lIIathla prima - ,de d. o..-Ib. a o. d.
~.bn , qa . u upui .u pu pa u lII • n o 1II0do. DHne, ee .. ludo , •• [orm., q u. I. etaodr.da • •io ~i1rodriu. A I..... ti. 00
uoa fouaclo. d. bUla nl"lll..IL a, ~O. fu.,.lllf ÕU de pu' o h. bo' a.aulo• • 'uil... N io p....1lIIl da l....trame:afO rodlzeea t . ·
rf ..flllo , d. rem ou 'hlltoid.d. ; pro~ho:d .. do '0'" u"l.nillloa, q". ncnl..... COUhlO af.un m. Todo.I •• alod. Loje o ."uda....
".am aa eapul,.., COlllo o ..1I. n..... u.,a..afOO L' <lO UIO• . O p.nd.ho ., poe . ..1... dJur, o phno du mOfa. campõnlu'
Oa "'OCOI . i o oa POU " . ID , n.m .. loc. m, A pen . . . . tllclrdl"a dl.p OS.m d. pafld.lula /Ii tlp'Dhol. , que . 6 Une .,clo
C aen a. a !.

169
ATRAv t S DOS C A M PO S

tardes dos domin gos e outros feriados. principalmente no Carnaval. T ambém


se presenceiam d e noite. ao e r livre. nas vésperas de S. Àntón io, S. J oã o e
S . Pedro, nos loca is de {ogue iras e mastr os.
Os bailes caseiros sã o os mais frequentes e animad os, indo a ef eito por
deliberação espontânea de quem os dá, ou por rogos e instâncias da g en t e m oça,
não incluindo os d a s bodas, que se realizam sem necessidade de suge stões nem
empenhos. A praxe i m põe- nos, como nota de regozijo imprescindível.
À s noites d e Car n aval e dos dias festivos, o livramento ou o r egr ess o d o
serviço militar d e filh o ou irmão, a mudança de ca sa, Cd o restabelecimento d e
doença g ra ve de p arent e próximo e a visita de pessoa am ig a , de l onge, s ã o fa c-
tos que servem d e pretexto para fun çõ es de dansa. As causas v er d a dei ra s TeSU-
mem-se numa - o namoro. E t anto q ue muitas se efectuam fo r a d as ocasiões
ci ta das. sem outra razão que as justifique.
A propósito: quem há vin t e anos s e a tre ves s e a dar um h aile na Quaresma..
era fulminado pela s cen s u ras severas d o público, m ai s estrond osas que os aná-
temas da i greja. Estranhava-se imenso esta s u posta irrev erên cia e nin gu ém
qu eria passar por hereje para d i ve r t i r ou tre m . O escr úpul o e o fanati smo ia m
tão long e que. n as ef u nçõe sp de te rça- f err e, de entrudo, mal soa va a me ia- noite,
o dono da casa a cabava o b a i le s em co n te mpo r iz a çõ es de n enhuma o rdem.
E. se. p or a caso.. algum o protelava, a pedido, e ra certo a parecer o r egedor e os
cabos d e polí cia, d e espadalhões em p unh o. a intimarem-no para lhe pôr fim ..
so b pen a d e ser preso I. . .
Hoj e, há muita m ai s t olerância e bem menos escrúpulos, ce ssa n d o d e t odo
a abusiva intervençã o do regedor. Por muito que p es e à s velhotas b eatas, já
nã o é m o tivo d e es cân da lo ba ilar-se na Quaresma .
. . . .... . .. ... . . . . ....... . . . . . . . .. . . . . . ... , , , , .
Quem «ar ma. um balho em ca sa , al ém de con tar co m os moças de s ua
fam íli a e as das vizi n has. t em d e ir co n vid a r as restant es q ue se ja m precisas.
Depois. à h ora apresada , vai d e novo ter co m t od a s p ara a s co n d u zi r à f un ção
n a compan h i a d a s m ã es . irmãs ou t ias. É, da peça ca da r apa r i ga fa z er - s e a co m -
panh ar por m ulher parente, casada o u v iuva . C om os r a pa z es nã o há cerimó -
ni as. O s u sos e cos t um es dão in gresso li vre a to dos , sem pe d irem l'icen ça , nem
s erem con vidad os. Até s e lh es co ns en te f u mar em às esc â n ce ras , de cha pe u n a
cab eça, como se estivessem na rua .
Ant es d o ade vert i men t o co meça r, a po rta a b re -se de par em par. franque a n -
d o-se en t rada a to do o bicho homem e garoto, tan to àq u eles que se propõem a
can t ar e ba ila r, como aos q ue só vã o a nam orar. e a inda a os p ou cos q ue não
«a te nta m» para n a m or os n em bail ari cos. V ã o na onda . arrastados pelos com pa-
nh eiros o u a guilhoa d os pe la cu riosida de.
Dos pri m eiros e s egu nd os nu nca fa lta m, o u po r l em ir é dos d er r i cos ou por

h l N . lIue d.ium d. I.. Lh•• , lI" . ..do • d u pl h m dOI m6Y.i• . M uit.. .. n u , lI ut. . drtul1.t'nd ... o 10.11. oL.d.CI . 0
P ' OP õ l il O d. l U; " • n .. l O 00 .. 0 i nQ'u l llno.

- 170 -
ATRAVr,S DOS CAMPOS

lh es dar o ch eir o. O s passeios e volt as a q ue s e ent rega m pelas rua s. palrando


e ca n t ando" põem-n os ao facto de q uantos bs lhos ha ja n a te rra . E m t odos
en t r a m, mas demora m-s e ap enas nos que lhes «fa z conta» , onde po de m gozar e
o n de querem «da r f é» de s u speitas br éjeir e s . Àos d emais co nc o rr em de fu gid a,
para o s verem de re lan ce.
* * *
A s m oça s pi mponas dã o começo à fu nção, indo de moto próprio para o
ter r eir o, a bai la r em u m as com a s outras. F armada a roda, dis cutem qual há-de
canta r.
- cC a n ta tu, comadre» - diz uma .
-«Não, tu é que principias .. . Já sabes a moda nova . .. (I ) Eu ín de a n ão
encarrilbo . . . »
- «M a s canta a ve lha, que tamém é bo nita . . .•
-«N a d a , a nova é q ue h á-de ser . . . Anda, não te faça s fi na . . , .
- «O ra, deixa -te de d isfa rses . . . T u ta mêm a acertas ... Se não te sstreves
sozi nha, eu do u - te o ponto ... ( :I)
Com es tes preâmb ulos, ou s emelhantes, res olve-se a dincu ldade, ca ntando
uma das duas, ou amba s, a m od a n ova o u a velha . E/ o prel údio das ca n tor ias
e o cham ariz ou reclame aos moços, se por acaso fa lta m . Faltando, não tardam
a aparecer. Em pouco temp o, a casa enche-se d e homens e de criançolas.
Enquanto uns vão separar as m o ças qu e bailam juntas, duplicando os pares,
o ut ros puxam as qu e re stam sen ta das para bailarem também.
AC1ueles chegam-se às que andam n a roda e dizem-lhe: - «D êe m l á licen-
ça • . . lO E sem m ais aqueles, como coisa qu e n ã o a d mi t e dis putas, cada q u al.
aga rra-se à sua, q ue se lhe entrega im p a ssi vel m en te .
O s que se dirigem às sentadas, falam- lhes assim: - c A n da da í . . . » L, para
co r roborarem, acenam-lhe com a mão e com a cab eça. Elas levantam-se logo,
sem se fa zerem rogadas.
C o m o possam e pretendam, todos os s olteiros tratam d e s e en cas alar,
filando - se às q u e namoram ou pretendem nam orar, e na falta, à s mais bonitas
ou melh ores bailadoras. As feias e pesa das, s ó em ú ltima anális e.
R a pa riga que «po n h a p é n o t erreiro», lá permanece indefinidam ente, a não
s er q ue saia por causa de for ça maior ou p or d esfeita ao cp a r», o q ue s6 se
explica p or desforço de a gravos recebidos anteriormente ou na o ca si ã o . Fora
dessas circunstância s, cumpre-lhe manter-se fi rme no posto.
O s rapazes obedecem a outras normas. A todo o tempo estão sujeit os a
esco rraçarem -nos, pelo menos durante algumas volta s. S e dos es pectadores
algu m pretende ba ila r co m qualquer da s q ue volteiam no terreiro , deit a o olho

(l) A to..l . 00 .<o.lu ao y. n . co• •eo""aall• .Ill • leu. du u atlJ u • re lu. O tls to .1.. n .tI,.. lI.ulu. i D. t-
'"'Tal aUlY h do. "'01. À m61l u Tari. d. ' .... lIO•• t .... po•• •• b... qo ••••pu ee rn oa. r" " ' bO' .1. m.I • • coll• . E.
• <t.da "'0 _ ...... lI.lo ."0'. ~ • • 0<1. DOTO. l..pl,..( l o do 'eIlO. dI!. <t.atador d. '01 10.
' d O priaclplo d . u adlo. t • • to •• m6a ca como •• I.u• •

171
A TRAVt.S DOS C AMPO S

à que pref ere, e, acercando-se-lhe, diz pa ra o q ue a acompa nh a: - «Dá lá


li cença . - O que traduzido, significa : - «Arreda daí . .. ago ra 6co eu . . . lO'
C om o é uso co u en t ís s im o, com q ue todos se conformam, pOI estar nos
h á bi t os. o intimado sa i imedi atamente, entrega ndo a rapariga. sem o mínim o
protesto. El a a ce ita a troca em silêncio, ainda q u e lhe desagrade. S e lh e d esa-
grada, aceita p or acatar os costume s e fugir a murmurações. Re cusar-se. tr aduz
grosseria notória , que nu n ca se comete sem mot ivos de malque renças ou a r r u fos .
M a s, se à moçoil.e repugna O novo par, pode desq uitar-se dele p or dois m o d o s
correctos. Primeiro: pedir licença 80 fulano para sair a pretexto de incómodo ou
cansaço, m as somente depois de b ailar co m ele algumas voltas. Antes~ n ã o lh e
fica airoso. Seg un do: recorrendo ao estra tagem a d e faze r sinais a r a paz afeiçoa do,
d is ponível, pa ra q ue por meio da tal l icença a vá lib er t ar d o ti po com que embirra .
O solicitado, compreendendo-a. faz· lhe a vonta de e livra-a do importu no.
O esco rraçado do terreir o, tem o direito de volta r , i nd o «p uxar» q u a lq uer
rapariga q u e esteja se ntada , o u fazendo a terceiro, co mo antes lhe fizeram a ele.
S e. porém , de s eja ba ila r de novo com a q u el a de que o priva ram, tem de ag u a r-
d ar a lg u ns m in u t os, para , p o r sua vez, paga r -se na mes m a moeda, arre da n do o
t ipo que o fez sa ir; o q ual pode também fazer o utro t a n to, r egul a nd o-se pelas
me s m as praxes.
Com esta sencerim6 nia d os homens, imposta à pa ssivid ad e d a s mulh eres,
a s pobrezin has ne m sem pre ba ilam co m q ue m l h es a grada . O q ue lhes val e são
o s es t ratagemas m en cion ados.
Co m. os pa res em n amo ro . é d o estilo r espeírar-se -l h e o idfl ío, n ão os pe r-
turb ando co m p edid os de licenças inoportuna s. A t anto só se atrev e q uem t em
razões para se julgar preferido e que r er arr o t ar d e co nqu ista dor n a presença do
rival. M a s arrisca -se a perde r o tempo e a faz er m á :6gura. M oça de juizo, q ue
s e veja requ estad a por d oi s p re te n dent es, só d á atilb.o a um, se n ã o se esq uiva
a os dois, embora para co ns igo escolha aq uele d e q ue m ais goste.

* * *
O balho anima -se a p ouco e pouco, a té atingir o a uge de conco r rência e d o
e n t u sia smo . Ã pa r sobe ta mb ém a tem perat u ra . Ã aglomer ação d e gente, o f u mo
d os ciga rros e o pó dos t ij olos d o p iso, prod u.zem u m a. atmosfera esto nteadora
e s ufocante. A casa t ransfo r m a -se em estufa. e os assiste ntes i n u n d a m - s e d e
suor, q u e lhes escorre em :60 p el os rostos r ubros como p im entô es.
N o rer rei co, os pares sobejam, acotovela m -se e p fsa m -se, bailan do e dan-
sand o a custe , po r falta de espaço. Em red or , n a la r ei r a e a té n o sótão da ce rn a ,
mulh er es e xapar fgas, senta das u m a s na s ou tras e n ã o p ouca s de pé e em cima
de cadeiras, a gl o m e ra m - s e, e mp urram -se c a p ert am- s e, para disfr u tarem m elhor.
As casa das, com os :6lhitos 80 colo, a mam arem o u a d o r 'mi r, s uste nta m
pales t ra s j ocosas so bre os na moros q ue p resenceiam. Quantos aprecia m me li-
ciosa m en t e, metendo - os a ridí culo f Às previstes, co m b ossa para a m á líng ua,

- 112
ATR Avt S DOS C AMP OS

reparam mais n os p a leios e ges tos d os pares em d erriço, do q ue n o ba ile pr õ -


priamente di to.
O mesmo acontece à s que t êm filhas solteiras, n a roda ou por foro. À.s fi lha s
e aos r especti vos namorados. nã o os largam d e o lho para se certificarem se eles
l hes faze m a corte ou se as desp rezam por outras. Fi cam fur iosas, se lhes bis-
pam d eslealdades.
En:6.m, a o mulheri o q ue circunda a casa. n ã o lhe fa ltam assuntos p ara s e
dis t r a ir e discretear. E a todos ate n dem nas mais insignificantes erín úctas.
Á po r ta d a r ua. o bservando e comentando, estacionam rapaz es e homens,
em quantidad e t ã o excessiva, q ue os da reta gua rda fica m de fora . aguardando
ens ej o de entra re m, a custo d e a p er tos, pisa d ela s. empurrões e insolências.
À conter os d a frente. fig ura o dono da casa, ou o u t r o por ele. investido n o
mando, d e cacete n a m ã o, para manter a ordem. N ã o obstante, é impossível
e vita r o s ussu r r o d e de n tro e de fora. o q ue abafa um po uco o s o m das cantigas
e o dos instrum entos.
À s ca ntigas e seus remates. escutam -se co m singular apreço, m õrmente
qua ndo são variadas e p roferidas po r boas vozes.
O reportó rio que a tradição co nserva é enor m íssim o, e avo luma-se a toda
a hora co m impro visos esplêndidos. que nunca mais es q u ecem ; que se transmi-
t em de boca em boca, enriquecendo o cancion eir o. II I
. . . .. . . . . . . , . . . . . . .. . . . . .. . . .. . . . . . .... . ... . . . . . . . .... . ... . . . . .. . . . . . . . . . . ...
Após os p ri meiros cantos das rapari ga s, entram em cena os cantadores d o
sex o forte. alternando com os do fraco. D e entre elas e eles não po u cos brilham
patenteando os seus eecu rs os vocais. em quadras aprendid as na tradição ou
«armadas» de mome nto, ali mesmo na ocasião. pelo próprio q ue as ca n t a ou por
outr o que lhe fica j unto, COm «s entido» para versar.
Se os cantistas de dois sexos en t r a m em desafio de co m p etê n cia m ais r ealçam
em afinação d e toada e variedade de cantigas. O s Qu e nunca esgota m o r ep or-
tório chamam-lhe pego se m fundo . Estabelecido o cer tame, cada q u a l canta
a lternadamente. dando réplicas e t r éplice.s repassadas de ir on ia. amor, de speito
ou outro sentimento, que pretendam man.ifestar. Mal t ermina um. O com p eti d or
r es pon d e logo. e assim prosseguem até cansarem o u fa lhar o es t r o a o m enos
inspir a d o.
Out r os, porém, o s substituem depressa. o que faz cr esc er a animação e a
par a bal b ú rd ia da pa rola e d os dichotes co m qu e se entr etém a chusma de
mir on es aficionados, que pejam o portado da TUB. H á oc a siõ es em que o s chas-
cos e os f n[at ôr i os excedem ao s limites da tolerânci a. O dono da ca sa intervém
e excle rne : - «H a ja ru mor . . . I... O que dito p or ele . n a qu elas alturas, qu er dizer:

h) o " a h or À6t6nlo T om h Pi' I...a'. ", ah o . ru d i : o • a m do. pr hu: ip.b foldo ri' llI do aOll o pdl, ueo !!...... d.
ltad lçi o oul. d. to dll I I p ro .ln eill. dn 11 e.atl, qu . p.eiea um.nl' coord.aolO. co... l1.p.rior cdt~r;o n ..... ial UU-
"'a ta oLu "Canto. PopII••r e ll l · olCt ..g ur.e o u aei oa"i ro me l. ....to q o. fC t.m co li,ldo. m POrtl.,.1. Du...
dn ....11 U ll tl. . . . . .... u.d • • p.lo mI IlO• ••i o d. procldh lcl . lr. a'I. , . a •• O qu . hon ra Lut.n t• • po u l. pop l1lar do "I. a teio .
Duta n ll 'II O If.L. lho IIli p",Lllcad o , I .' 'I'o luo... l EI.... - T ipo' r. li. Pro'ru~ o . 19\12 J. <Q1 p'a la u . C01Dpru ad. a do
:Sftl caluiall. dnld • • • at. d ...ffi ".d ll. O 2. 0 'I'o la m. Uli n a do illlp u"o a. IIIIIClll' tlpo,n fi. _

- 173 -
A TR AvtS DOS C AMP O S

- «S ilêncio .. . me nos bul ha . . . q uem manda aq ui sou eu .. . tom em cuidado l. . . »


Se nã o lhe obedece m e continu am a grs zinsT alto, f ormali za - s e m ais e gr i-
t a - lhes : - «O u o ba r ulh o sssoceg8 o u z u ne m tod os p'rá rua .. . Silêncio I. o ' j á
d iss e • .. D eix em o uvir, com tod o s o s d iabos! ... I s to n ã o é r epública • . . :I-
A s m u lheres ta g arel as faze m co ro , exclama n do com fingid a in di gn a çã o :
- «Baía, u m a gen te se m lacha... N em seq uer e deixam adev ertir li fam ilha . . .»
- cAi n ina que assuisse! . .. Cuid am q u e es tão n uma praça . .. Nem guar-
dam d ecor o às pessoas de verg on h a n a ca ra . . . »
-«Botem-nos fo r a . .. Que vão f azer pouco d as mães e das irm ãs .. .
Ora o s vê dios 1.•. »
O s q ue b a ilam , também se p ronu ncia m baixin ho contra os palra dores.
segredando:
- «Há tal q ue só vem às funções p a t a estar d e es cárneo ou arm ar mo tim »
- «Tivessem eles aqui qu em lh e desse corda. outro seria o seu p orte ..
- «P u dera I C om o n ã o têm pres a cá d en tro, n ã o que rem sa ber dos m ais.
F azem gala n a arrain a. . ...
- «Po r v ia d el es daqui a pou co dão o l ou v ado . .. V er ã o . . ...
- «Os pio r es s ã o esses f e n dangos que a i n da cheiram a cue i ros . .. N ã o têm
assu prema n enhuma .. ...
- «Ora adeus . .. S ão t o dos de to das as libreas . . . Àté casa d os. V a lía m a is
qu e s e fo ssem deita r com as mulheres ... El es é que ato içam o s fedelh os...
......... . . . .... . . . . . ... . .. . .. . .. . . . .............. . .... . .... . ... . ...........
Entretan to s e passa m s emelha ntes com en tários, o s repreendido s e cens u ra-
dos, t emendo a expulsão com que os ameaçaram, en tr a m na ord em por algum
tem po. para d epois voltarem as choca r r ic es tarimbeiras. Não sabem estar em
soss ego num b aile d e p ort a a b er ta . Dos ralhos que o u vem p elas incorrecções ,
ri em-se e mofa m à s u rdina. S e os ex p ulsam. a v o l u m a m a alga z arr a cá fora, n a
r ua. À s vezes i n tervê m os cacetes.
....... . ...... . . . ... . . . . .... . ..... . ............................... .. ........
C om incidentes per turbedores o u em r elativo sossego e ccrdu re , o q u e tam -
bém se co n seg u e po r excepção, e a m ui t o custo. o b aile prolonga-se p ela noit e
f o r a , até o dono da casa d iz er em voz alta : - eLouvedo seja C ri st o I...»
Esta frase religiosa em acto tão p rofano , equivale a um - Bast a 1- deci d ido
e irrev og á v el. É intim ação f ormal p a r a o b aile concluir e s e pôr ao fresco a
gente es tr a nha à família d e casa . Efectivam ent e a fun ção t erm ina logo, e a
s eg u i r to dos saem: os homens, em t ropel, a o s grito s d e: - cHaja saúde» - o u
- «Boas n oit es ». - A s m u lhe res, chilrean do . a os a b r aços e bei jocas de u mas
p ara co m o utr as, ap ó s os a g r a d eci m en t os aos d on o s da casa .
Estes, sente m -se fatiga dos pelo a dian ta d o da hor a e pelas folias em q u e os
m eteram. D ep ois , q uan do a só s, r eparam na poei ra da casa , n a desor de m d os
trabec os e n o gas to d o azeit e com a s l u z es da s can deias. dã o ao d em ó n i o o
adevertiment o. N ão lhes b as t a a turar em filhos e fi lhas de tantas m ã es, se não
v er em a almo t olia v a zia , as cadeir as qu eb r adas. a s lo uças partida s e as parede s

- 174 -
A T RA v t S D OS CAM PO S

sujas. À do n a es b ravej a por tudo iss o, mas de pressa amansa, lem brando-se q u e
a ss im te m d e se r, para a s filhas 80z arem. Não se apanham t r u t as a barbas
enxutas.
* * *
Se na s «fu nçõ es» d e porta s a de n t ro, a ordem é pou ca, n o s bailarico s em
p l en e r u a. ainda é m enos, po rque n ã o r esultam d e o r g a niz ação p re m ed it a d a ,
n em se s u b o r d ina m a a u torid ade a lg u ma . Surg em d e repe nte, imp rovis a d os
pel as m oça s d a vi zinh a n ça. a p retexto d e passa te mpo momentâneo. S e os ra pa z es
aflue m e se p ortam em te r mos co rrectos. o e n t reten ime nto pe r s is te por a lgumas
h o ras ; senã o a fl u em. ou se, m esm o a flc.i n d o, o ca sio nam balb úrd i a e travess u r as,
m one à mín gua d e i n fl u ê n cia , o u acaba de estoi ro para s e evita r em ban zés.
Outra s vez es es cangal ha- s e o ba i lari co por efeito d e r eto iç as ca r n a valesca s.

* * *
Festas e t ou radas R ealizam-s e em d iferentes domingos e m a is dia s feriado s
do verão. E.m ca da vila e ald eia, há todos os ano s u..ma
f esta r i ja, promovi d a pe los lav ra do r es , em h onra d e N ossa Se nh ora, so b a
in v ocaçã o de S enhora do Rosári o, d o Pass o, d a Conceiçã o, etc. Àp esar d e
sere m a s p rin ci pais, nada ofe re cem de n o t á vel, q u e se n ã o pa reça com o qu e se
vê e m mui tos po ntos d o pa í s, salvo as to u r a das, de q ue adian t e falarei.
O r es tante, r esume-se em m ais o u m en o s fi lar m ónicas. fogu etó rio. pr ocissões ,
arra ia is, baza r es, etc.
Na maioria das lo calidad es, a lé m da fe sta aludid a, p a ra que co n tr ib ue m
to dos o s habitantes, ca d a classe ou g r u po de classes, promove o u t r a menos rui-
d o sa.. 80 s a n t o q u e arvora em patrono. O pe ssoal das lavouras co ncorr e muitís-
simo p ara estes festejo s, que.. pela maior parte, s ã o de s u a a b soluta iniciativa.
H á povo ações em que se efect u a m a n u a lm en t e qua tro e cinco f estinha s, cada
qu al promo vida por determinada or d em de se r v iça i s.. 8gre mi a d os em mordomias.
Na a ldeia d e Santa Eulália. p or exe m plo.. os abeg õ es, b oieiro s. vaqu eiros e
gen h ô es, festeja m S. Jo ã o Batista; os pa stores e ca bre iros. S . P edro. e o s por-
q ueiras. Santo Àntão. E stranha ao p es so al agríco la. mas em co n d içõ es s eme-
lhantes, real iza-se t am b ém a de Santo Ant ónio a ca rgo dos almo creves arrieiros
e dos carvo eir os. T odas q uatro. e o ut r a s aná logas. nas fre gu esias viz inha s.
são pequena s fe stas de p obres, de assistência circunscrita à g ente da localidade
e a meia dúzi a d e ra pa zes dos arr ed ores . Constam a p en a s de música por filar-
mónica barateira, missa cantada, sermão. pro cissão, e por último, touros, de
tarde - a diversão principal, quas e imprescindível. Não tourada em form a .. o u
coisa que se ass emelhe, m a s á vara larga, dentro da povoação. g ratis, com # a d o
alentejano. deseecboledo, de trabalho e d e criação. em que se dá liberdade d e
lide a toda a gente. Quem q u er f az de toureiro.. já ch a m a n d o es reses com o
• lenço, jaqueta ou chap éu, já picando-as à vara de a guilhão, o u s imulando p r e-

- 175-
AT RAV :e S DO S CA MP O S

tendidos pass es de capote. Outros ou os mesm o s, arvora m-s e em forcados,


fazen d o p eg a s q u a n do e como melhor lhes apr és . Tudo sem ordem e a o capri cho
dos execu t an t es. N ã o obstante. é espectácul o que o p ov o a preci a co mo n en h um.
torn ando-s e o princi pal, se n ã o o único chamariz da f esto.
C ôn sci o s d es t a verdade, o s f esteirce empreg a m esf o rço s incrívei s para q u e
os la v-radores lhes emp r est em b ois ou o q u er qu e s eja d e bovinos, pa r a o p o vo
s e diverti r e botar fama d o caso.
Do s l a vradores ouve m os fe steiros muita n egativ a , mas a tant os r ecorrem
por di v ersas vias, e t a is súplicas em p r eg a m . que se mpr e a lcançam , d e um co n -
de sc endente, o fa vor ambicionado. A gradecem-no reconhe cid íss im os, e d esde
1080 o apregoam ao s quatro ventos, para que t od os saiba m qu e haverá to uros,
que a familha s e sdel1er tirá «s em t er b oca para fa la r ».
Se os não h o uvesse, o juiz e os mordomas fi cariam derro ta dos n o conceito
dos conterrân eos. Entre o público aldeão, festivid ad e s em t o ur os, é co mo olha
sem toucinho e f ogueira s em ro smaninh o.

N a madr uga d a do d ia da fes ta , o u na v éspera, de tarde, os Iesceiros e o u t ro s


amad ores, em r u id o sa a zá fa m a , t rat am d e p r epa r a r a p ra ça pa ra a co rrida n o
m elh or l a r g o da povoação , e be m as si m o correspondente cu rral d e ence rro - o
touril - nu m a das r uas q ue co m u n iq ue com a impro vis ada er-ene. Prep aros
si mp les q ue o pessoa l d es pach a ràpi da men t e, vedando as desemboca d u ra s d a s
ruas p o r meio de carros, pranc has e paus ligado s p o r cor d as. A comunicaçã o do
t o u r il pa r a a p raça efectua -se por u ma p o r ta provisória, q ue se ad apta ao ema-
d eira m ento. P ar a se não in te rromp er a circulação n o larg o , fi ca po r t apar um
pequ en o espaço da en trada de maior t râ nsito , q ue só Se fe cha d ep ois, à hora d a
co rrida .
O s car eo s da vedação, e outros que se arru mam aos prédios. servem d e
a com o d a çõ es para os espectadores, quer em cima, s ob re os l eit os, defe ndidos
pelas enfu ei rad u r a s e t endais, q uer em baixo , ent r e a s r odas, onde os assistentes
espreita m, agachados, pelas enraiaduras . Para a m úsi ca r es erva m- s e do is carros
d os en co stad os às casa rias. que ofereçam melho res co n d i ções d e seg urança e
o bs er vação . Car r o s não fa ltam, devido à cond escen dência dos donos que os
em p restam e ao zelo e pachorra d os popu la res, qu e os cond uze m à mão com a
m el h or boa vontade.
T ermin a d os os prepara tivos do circo, o s feste íro s asseie m- e e e encadernam -
- se de pon to em branco, p ar a se apresen tarem janota s nos ac to s s ubseq uent es.
N este me io t e mp o chega a filarmónica . v in da de Elv a s o u de u m a des vilas
pr óximas, o que eq uiva le a di z er que pri ncipia a fes ta.
- «A música I .. . Cheg ou a música I . .. A í vem a música I . .. » - exclam am,
de t od os os lados. os a lv içareiros tagarelas, numa en t ona çã o de visí vel con -
t ent a mento .

- 176 -
ATRA vtS DOS C A MPOS

O s fil a r mó n icos a p eiam-se à en tra da da t erra, entram em form a , e, em


contínuo, r om p em t o cando pela rua f ora. Tudo se alvorata, principa lm ente a
garotag em, q ue a code em co rrerias a o u vir a s gu'ifas, aco m pa n h a n do- as in ces-
sant em en t e, numa alegria doida . Com um eno r me co r t ej o d e r a pazi o, os
m ú si cos p ros seguem em direcçã o à cas a do juiz, qu e p or s ua vez lhe saí 8 0
encontro. co lo ca n do-se- lhes na frent e até vê-los à p o r ta. A í prolonga-se a to cata,
e fi n da q ue seja , o Iesrei ro co nv ida-os a en tra r, pa r a lh es oferecer vinh o . licores
e b olos. ELe s entram, se rvem -se e saem , rom pen d o d e no vo com outra marcha.
T ocando s em pre , diri gem - se às casas d os res tantes festeiros, para depois irem à
casa do r egedo r e à do d ono dos tour os. E/ da praxe tocarem à porta de todas
estas p erso n a li da des e em casa de todo s entrarem para se se rvirem dos bebere..
tes e a cessértos do estilo. B a sta s libações de es t im ulantes néctares e uma pan-
çada d e bolos, que s up re o al moço. N ã o obstante, m erecem bem as pi nguinhas
e os biscoito s, porqu e a es ta fa de a sso pro, a q ue obriga tão esfalfan tes cump ri -
me n t os, é de arrombar os pu lmões a os paci ent es m ú sicos 1. . •
A propó sito: at é ao an o de 1871 ou 187 2 a m ú sica que an imav a a s festi n h as
da s aldeias lim i tav a-s e a u m velho t a mbo r e a um d esconjunturad o pífOTO,
am bos tocados por veteranos o u gente parecida . M a s n aq ue le ano as fil a r m ó-
ni ca s fizera m u ma tal concorrê ncia ao p ilaro e a o ta mbor, q ue os suplantara m
d e to do, pa ra n unca mais se o uvirem .

* * *
Às dez h o r a s d a manhã, na residência do j uiz o u enti da d e equivalente,
r eun em - s e de no vo os co nfrades e de a í s eg u em para a igreja paroquial. com o
res pect i vo g u ião ou bandeira, a co m pa n h ad os da músic a e d o rapazio . Se o santo
figura n outra igreja. vão lá primei ro com a band eir a . para. o transpo r ta rem pro-
ce ssionalm ente à sed e da paróquia o n de se f az a festa.
Enquant o as cerimónias r eligiosas se r eali z a m na igreja, cá fora, DO adro ,
põem -se em l eilã o as fogaças ( 1) oferecidas, bem como a carne e cereais prove-
nientes dos peditó rios do entrudo e do ve rão. F ogecas, carne e cereais, vendem -
-se por preços variáveis - baratos. se a concorrência é frouxa; subidos. se há
anim ação entre pretendentes bas éfies, que não querem ser suplantados. O s Ees-
tei ro s pimpões f azem render o leilão. cobrindo, por s ua conta, os lanços dos
estranh os. As~im botam figura e defendem os in te resses do santo.
. . ... . . . . . . . .. . . . . . .. . . . . .. . . . . . . . .. . . . . . . . ... . . . . . . ... . . . . . . . . . . . . . .... . ....
A m issa e o se rmão deco rrem com visível despacho. sem incidente n o tá vel.
Àntes d o me io dia j á a procissão está n a r u a, faze n do o trajecto do cos t u m e.
O s mordemos lá vã o com toda a g ravidade, m uito anchos da s ua vi d a , osten-
t an do as re s p ect iva s insígnias: - o ju iz, a va r a; out ros g ra duados. o pe ndão e
os cordõ es. o ando r, etc. O que hasteia o pendão, seg ura -o com todo o aprum o.
en volvendo e a mãos num vistoso lenço de seda.

177
A T RA v t S D OS C AM P OS

A imagem d o santo festejado e outras que o acompanham, sa lienta m - se


no s andores pel os m i rah ula n t es a d o r nos com que se enfei tam. S. J o ã o Batis ta,
que v es tia p el es d e ca m elo j S . P edr o, h u m ilde p es cador ; S an to An tã o, um
asceta, e o utros de tradi cional h u m ildade. fig u r a m-nos carregad os d e fitas b er-
ra ntes e cord ões d e ouro, pen d entes d o p escoço o u enlei ad o s sob re o r es plen d or
d e prata I. . . E s t as ta fular ias, são ob r a das m u lh er es dos f es t eiros, q ue se arvo-
ram em aias d a s im a g ens, i ndo co m polas à igrej a na vésp era da fes ta . Im pem
de s nris feção po r lavar em e en feitarem os sa n t inhos.
Atrá s d o pálio. e a eo nrre star co m o r eduzid o n úm ero d os q ue ad ia n te
enve rg am op e s, i n d ecen t es pela maior part e. a com pa nh a o S an tíssim o, a q uase
tota li da de d a pop u la çã o m ascu lin a. N ão obsta nte este t es temun h o d e fé, a missa
e o serm ão efect u a m - s e com escas s a as sistênci a e s ing ula r frie za, com o se fos s em
acto s de s ecun dári a importância.
O g ra nde a t r a cti vo, que to do s a guardam com an si edad e. é a to irada .
O s es tra n hos à província, que por acaso a pres enceiam, n ã o lhe encontra m
graça nenhuma, m a s os natura is d o s it io, p elam-s e por semelha nte brincad eira.
P ortanto, m al a pro cissão r ecolhe, o s f esteiro s apr essa m -s e a r econdu zir a
ba nd eira e a imagem, para i m ed ia ta m en te tratarem d e t oiros. Desenvencilha-
dos das o pa s, eí-Ios a corre r em para fora da t erra. em man gas d e camisa,
segu i dos de pcvoleo, para auxiliarem a entrada d o ga do .
C omo se n ã o tresmalh em. o que é r aro, os b ichos entram d epres sa na s
r uas d a p o v o açã o. t o ca d o s pe los b oieiros e curiosos. atrás da s madrinhas - os
cabres to s - ( cho ca s), qu e, a gitando as m anga s, arrastam-n os ao torf l.
- «Os to iros 1... A í vêm os to iros I.. . Fujam 1. •• Fujam 1.. •• A ssi m bradam,
co m p r a zenteiro alarm e. os entusia stas, d esm entindo co m o riso os conselhos
d e fuga. Ningu ém foge e tu d o assom a às portas e janelas para verem a s r ezes e
lhe comentarem o aspecto. T a n t o podem s er b ois de tra bal h o , matreirõ es, co mo
novilhos de 3 a 4 anos, vacas. n ov il h a s, bezerros e bez er r a s, ou d e t u do isso um
pouco. desde o eoiec reprod utor. até aos bezerritos. S ejam co mo fôr, som a m
vinte o u mais. que se correm desembalados, p el a m aio r p arte. Para sa l var as
aparên cias e dar satisfação à autoridade, embo lam-se dois ou três ma nse r rões ,
ou um excepcional mente b r a v o e possa nte. que, pela sua reconhecida b ravura e
alen tada corpulência. não ofereça p r obabilid ades d e se r agarr ado. H á lavrado -
r es q ue dão uma casca med o nh a se lhe pega m os bois. J u lg a m-se d eprimidos
nos seus b rios d e criado res. Um prejuizu abs u rdo e i nsensato , que já existi u
em maior es ca la .
.... . . . .......... . . . ... . . . .... . ... . .. . . . .......... . ...... . . . . . .. .. . ..........
R ecol h id o o gado, espera -se q ue a m ú si ca descanse para se começar a
corrida. E n treta n t o. na p raça . vão aflu indo os espectadores. que, a po uco e po uco .
ocupam os l ugares. tanto os dos ca rros, como os d as janelas. sacadas e varan da s
dos prédios em volta.
O s mora dores do sítio, não obsta n te ficarem encurra lados. de bom grado
aceitam o ence rro. pela satisfação de disfcuta rem o pagode d entro d e suas casas,

- 178 -
ATR AvtS DOS CAMPOS

em co mpanhia al egre dos am igos e d os estranhos q u e lhas inv adem , con fia n d o
na benevolência. O s foi tos e estúrdias, não se incomodam em obstr uir a s portas
que dão para a praça. Pelo contrário, a b r em - n a s de par em par , enquanto dura
a fnn çã o, para, d os limiares respectivos, a gose rem a seu modo, fazendo fr en t e
aos cornúpetos que lá chegam, s enão facultando-lhes a entrada para os a dm i-
rarem como hóspede s.
Deixando-lhes a porta livr e, p ro vo ca m peripéci aa e investidas s encer imo-
niosas, com. qu e esperam r ir i m enso, j á pelo facto em si, já pelo susto q u e se
a poder á dos timoratos.
S eguindo orientação o pos té, os medros os t ra n ca m os seus portados, co m
pranchas a o centro. que lh es sirvam d e parapeito e lhes permitam ver se m
perigo de marra das. As j a n ela s, sacadas e varandas, enchem-se à cunha com o
pequenam e e o mand amismo de consideração. Não há uma só que não reg oe-
gite de moças muito enfeitadas, em traj os multicolores, como açafa tes de rosas-
Quem poss ui janelas ou coisa que o valha, p õ e-se at ónito para a t end er o
mulherio flamante q u e, antecip adamente, pede um l u ga 'rz dn ho de onde veja m
com segurança. Tanto i mportun am os moradore s do largo, que estes d ecidem-se
a dar o sim a todas, caibam o u não. M a s elas lá se arran jam como podem, sem
se importare m co m bagatelas.
Nos carros e n os prédios, t u d o se p reenche e apinha, mais ou menos como-
damente. Abundam as posições caricatas, desde a s dos ca utelosas em exa gero,
que se sentam nos telhados, gatinhando pa ra lá ch egarem , at é às mulher es
menos exi gentes, que s e assolapam en tr e os rodados, espreitando pelas fisgas e
abertas. Acomod am-se assim centenas e centenas d e p essoas, sem co ntar os
aficionados q ue fica m na arena: uns dispos tos a lidarem e correrem, outros
resolvidos a ch ega r em - se para os edifícios e aí formarem barreira. colocendc -se
na defensiva, a p é firme e de pau f or rad o, para afrontarem com as arremetidas
dos comu dos. P el o menos a la r deiam semelhantes intenções, com fum aças d e
val entes. embora depois f ujam a esca pe, logo que O perigo s e avi zinhe.
. . .... . ... . . . . . . ... . . . .. . . ... . . ... .. . . . . ..... . ... . .. . .. . . ..... . . ... ... .. .. .. .
* * *
E m enos de uma hora t odos es t ã o a postos : a m ú sica, nos carros, de pé,
t ocando ou nã o, s eg u n d o a s exig ênci a s do público ou o ca p ri ch o do mestre ;
o lavrador, à p orta d o touril, de va r a o u pampil h o em punh o, para dirigir a
corrida ; os {esteiros, ao la do, muito ufan os, mos t r a n do os mol hos d e fitas com
que brindarã o os a garrad ores. À aut oridade iocal- o regedor - t ambém está à
vista, em qualqu er p arte, de benga la o u cac ete . rodead o de cabos de políci a ,
manuseando espadalh ões ferrugentos, qu e lhe se r ve m de arm a e d istintivo.
Dentro do touril estacio n a m muit os curios os, qu e, ap recia n d o as r ezes,
comentam-nas ao sabor d a s impressões q ue s ente m pelo lav rado r .
Entre os apreciadores 6 guram genh ôes, e outros cri a do s de lavoura de onde

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ATRAvtS D O S CAMPOS

são os b ois. Como tais conhecem- n os a f u n do, e po r isso co mp r az em-se em lhes


ci tar os n omes e as q u alid ade s.
- «Aqu ele - o A lfaiat e - é testo como um raio ... Quem lhe a guen tar os
impados, há-de ter estamago», di z Um.
-«P oí s eat e o E sbandalh a - o nome diz . . . Em a vançando pa r a a lami-
t-r

lha, é d e uma pessoa dar às tr an ca s, s e lhe n ã o q u er cheirar o bafo. , - ac re s-


centa o utro.
-«Já o Morgado não é assim ... Bota -se à ge nte como u m leão . . .
Meta m -se co m ele . . . expe rimente m - no.., obse rva te rc eiro.
- c E o Gene ral J• • • A qu ilo f u ma- lhe a ve nta . .. À.. solta tem picos . . .
E,' preciso levá- lo com astúcia ... O que se descuidar está-lhe e m CIm a . • . »
- «G ran de gado . oh pa r en t e l. .. lt
- cE' verdad e, r a p az . •. Isto é q u e vai se r to u rada J. o • •

- eN em eles foss em de n osso amo... O gad o lá d e casa sempre fez flor ... » •
... . ... ... ... ......... . ... . . ........ ....... ........ . . .. . . . . ... ........... ....
Nadp. f a lta ndo de essen cial, fe cha-se o espaço q ue fico u paro. o trân sito,
co m p let a n d o- se o en trin cheiram en to. Q uem s e a tre v er a transpor as ba rr eir as,
arri sca-s e a partir as co stel as, o. esb orrach ar o nari z ou a fica r descompo sto.
A s especta do r as retardatárias, q u e s e d estina m às janelas, a r r os t a m com esses
p rec a l ços, galgando os ca rros co m O a u xílio dos pa ren tes e um certo equilíbrio,
que lhes permite vencerem o obstáculo e segu irem a ma r ch a , a tra vessando o la rgo.
E m que saltem incól umes, não se es ca pam às chu fa s e z um bais! d a m ultidão.
q ue as n ã o poupa , vendo-as caminha r m uito Ii r ôs e rem ech i d a s, d e olhos baixos
e o rosto a f o gu ea do, como que a f u rta re m - se aos ap up o s dos tro cista s. S e l h es
gritam q ue f ujam , q u e vaí sair o boi , as infe lizes p er d em a li n ha e desatam a
correr, co mo corças, o q ue au menta a a ssuada, es rr ug 'indo as galhofas e os
a sso bi os .
En t retanto, O povinho, impacie nte, r eclam a o co meço da corrida, bradando:
- «Venha gado' . .. V enh a gado ' ....
. .. . . . . . . . .... . . . . . . . . . . . . . . ...... . . . . . ... . .... . . . . ... . .. . .... . ... . . .. . . .... .
Começa a lide. R ui d osos aplausos celebra m a saida da rez, que, mal
assoma , põe em debandada os grupos que se entretinham na praça. Tudo foge:
u n s procuram empoleirar-se onde possam, outros distanciam-se apenas no pro-
pósito de tourearem, e alg uns vão engrossa r as colunas d os tl eug mâricos encos-
tados às paredes.
O bicho q ue sai primeir o COStuma ser fraco, d e pouco respeito. Sai a título
de ensa io, por assim diz er, pa ra des afogar a. p r aça. e u nir fileiras. D á umas
voltas, m a rra ou co rre, conforme os In rin tos, ou não marra n em corre, e daí a
nada, reg ressa ao touril.
A nlarmónica tem de tocar de vez em quando. senão o povo indigna-se e
berra:
- «Música 1... Música 1... Haja música 1... Não é só ganhar o dinhei ro 1... »
Ao primeiro chavelh udo s ucede-se cer re, de boa pinta e m el h o r se n tido, e

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ATRA v t s D OS C AM PO S

deste em diante alternam-se os q ue p rome tem co m os d uvidosos, salvo q u a n do


se efectua uma p ega boa, em que. após o r ecolhimento do a garrado. é ce rto
sair bicho de maior tezura, como o haja. Va1 desafrontar o companheiro que se
deixou ve n cer.
A lid e e a s pega s consentem-s e a toda a ge nte, co m o já disse, ma s os
b ez erros de ano 56 costu m a m ser t oureado s p elos r ap a zinhos. O s homens
coadju vam- n os e animam-n o s, quand o muito.
B oi, vaca o u n o vilho, d em ora-se na arena enq ua n to d á so r te in vestindo e
marran do. O q ue r evel a mansid ã o, r ecolhe d epressa. H á- os tã o pacíficos q ue
n em despe rt am co m o s aarg u n cho s da s a guilhad a s . Outros, azedam-se com esse
estímulo e lá se fin gem bravit os à for ça d e ferroadas. Qu e r em édi o . ..
... . ... . . . . . . . . . . . . . . . . .... . ....... . . .. . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . .. . . . . . ... . . ..
R ez q ue ma rre e n ã o seja te m id a , o q ue é freq uente em vacas e n o vil h os
at é 2 anos, os aficionados procuram-na e pro vc cam-n a. E.la co rresponde , cor-
ren d o pa ra os lid ad ores, que são à s dú zi a s a chame re m - na e a esq ui varem -s e-
-lhe com a s jaq ue tas, len ços e chc peus, a o m esmo t empo q ue ou tros, p ela
r etaguarda, a espi caçam co m a s vara s. Fervem a s ag u ilhoadas, e ta n to abusa m
dela s que chega a int ervir o la vrador, reclamando m orig era çâo.
E.m co rreri a s e in vest id a s, o a n i m a l p ercorre e esqu adrinha po r toda a pra ça
n ã o al ca nça n do os art istas, que, a pod er d e muitos, def endem-se reci procamente,
em qu it es m a is ou men os habilidosos, q u e lhes permit e sa fa r em -se es co rreito s e
sã os, deixando o bicho l ograd o e raivoso. Em berros espumantes, manifesta a
s ua ira contra o martírio q ue o aflig e . . . Sem embargo, numa o u o u tr a vez, o
caso mudo de fi gura, ist o é, o cornúpeto a l ca n ça os pseudo-toureiros e atira-os ao
chão , o q u e provoca uma g ri ta ria en t u siás tic a, co m o a colhida o u colhidas n ão
sejam de gr a vi da de. Trambulhões simples o u arranhaduras lig eiras, co nside-
ram-s e bagatelas insignificantes.. de que até m ofam os pad ec en tes I
Após alguns minutos de larga pagodeira e farta s perip écia s, o animalito
cansa e já não corre às chamadas. Só trata d e se esca p a r , ca m i n h a n do para a
porta do touril , q ue en contra fechada. ou t en t a n do fu gir de salto pelas trin-
cheiras, sobretudo por onde en t rou quando o t ro ux er a m d o ca m p o . Salta o u nã o,
conforme a ligeireza de que disp õe e as dificuldades q ue en co ntra .
Nos seus assaltos aos carros dá o r igem a r eboliço bravio en t r e os curiosos
a i apinhados, qu e, cheios de susto, r ed emoinham, rebolam e ca em , a o passo que
os de bai xo, prevendo a s co nsequ ências, fura m e es gui ncham por onde podem
pe re não serem es m a ga do s na rat oeira. Uma confusã o ult ra-c õmice, de q u e
nem todo s saem iles os. Os es p ect a dor es vi zinhos, sentindo-se seguros, riem-se
a valer d os que se vêem em ca lça s pardas. Os mais entusia sta s, como a rez n ão
con sig a fugir, gritam com i n sis t ência : - «Á unha I... Á unha I. . . V á d e
agarrar I... •
Os brados de: - «Á unha I» - que, igualm ente, se o u vem em mui ta s outras
ocasiões, são vozes ao vento as mais das vezes, a que os a garrad ores n ã o ligam
importância .

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AT RAvt s DO S C AM P O S

Como ví tim a s es ca r a m ent a da s, s ó a garram qu ando q u erem , e em ci r cu ns..


t âncias fa vo r áveis . Ent ão, a vançam g arbosamente para o b icho, b a t em- lh e as
palmas e agarra m - no de ca r a s, s em o mín im o de sm a n cho, o u d es as t r a da m ente.
à cus t a d e t es t eira d as e sa fa n ões, q u e con cl u em por b oleus de arr omb a, com a
s ua cha v elhada à m is t ura , mas se m gr a ve s con seq u ência s, a l ém d e ra sgõ es n o
f a to e lig eiras belis ca dura s. B oa fib r a , não há d úvi da .
R ea lizada a p ega , a s pa lmas earrug em e a m úsica celeb ra a acção, toca ndo
expo ntâ n eamente ou po r exig ên cia d o público, que n un ca se fart a de ouvir os
b om bos, os p r atos, os co r ne t in s e os da:r. inetes . R.ecl a m a m mús ica a to do o ins-
t a n t e, e quant o mai s pa n cada r i a t iver ta n to me lh or, q ue sem b ulha de instr u -
m entos não agra da .
.... .......... ........ ..... . ........ . . . . . . . . . . ... . . ... . ............. . ..... . . .
Quand o a lgué m se propõe a aga rre r , é d ever do la vr a d o r conse r var a 'tez
n a praça até os intentos se r ealiz a rem ou h a v er most ras de desistê ncia.
S e, p orém, o s aficionados de sist em d ç s p r opósitos o u se, te n tando-os, os não
levam a efe ito, o a ni m a l re colhe imedi atamente. O lavrador q u e n ã o s eg ue estas
pra x es, p rovoca cel eu m a de p r otestos, q ue te rminam co m a r eaparição d a r ez
re col hi da , ou com a saí da de o utro chevelhudo .
P ara a ca b a r com mot ins. r ixas e d esag uia edos de s em elh an t e gén ero, nada
m ais efi caz que a saida de um boi b reve. U m boi de respeito é m elhor a g ente
d a ordem p úb lica do que o re gedor e to dos os ca bos de policia . M a l ap ar ece em
cena , abafa as r ecl ama çõ es e põ e em debandada o s m a g c tes d e dí scol o s.
. . ..... . . . . . . ...... . .. .... . ...... . .. . . .... . ... . . . ... . ...... . . . . . .... . . . . . . ..
Ha j a o q ue ho uve r e su ceda o qu e suceder, a s p eg as provocam a p la usos
xuidoaíssimos, q u e resso am a o lo ng e, apreg oa n d o o entus ias mo delir an t e q ue
v a i na p ra ça. E pa r a isso nada como a s v aca s, n ovilhos e b ez er ro s, q u e, em
g eral. dão sor te . se m ca u s a r em desastr es de Im p or t â n cle .
A lide d o boi e d o to uro r eprodutor, de n otória braveza e corpulência, ef ec-
tu a - s e com m enos pessoal e m aio res ca u te las, p e lo m uito r es peito que o bicho
i n funde. O a n i ma l d ess e teit io, vê -se quas e isolado no m eio d a arena, à f alta de
h om en s qu e o q u eiram tour ear. Ap ena s de la r go o citam três o u q uatr o do s q u e
s e fi am n o s p és, nos múscu los e n as unha s. O s o u tr os, t ratam de se pôr em
Iu gar segu ro, sem se impo rtarem co m a a lg az a rra e a sso b io s dos s im ples espec-
t adores, que os i n s t ig am à f sena, choco t ea n d o·os pelo receio.
A o s destemidos, que p ermanecem no posto, o público convida - o s a p egar.
M a s es tes tam b ém n ão correm a fog uetes . P o r hon ra da fi r ma Lim it a m - s e a
ent r et er d e larg o o matreírão , fu gindo - lhes a esca p e m a l o vêem avançar.
O po v o, porém, não s e farta de os influtr, já gr itando- l hes: - «A u nha I. . . » -
já oferec endo-lh es dinheir o. Cinco to stões, d ez , qu inze e muito me is, mostram
e oferecem. com es trondo , dif erentes espectado r es. o u seja. p elo empenho de
verem a sarra r com valentia o u par a enquísíla rem o l a v r a d or , se não tam bém po r
mera b as õfie, press upondo q u e lhes não ac eitam a s esp ôr tu las. E aind a outros
oferecem n o intuito de g oza r em, não com a p eg a, ma s co m O esto iro q ue d ará o

182
A T R A v t s D O S CAMPO S

pa r vo que se af oi te à avent u r a . E' um gos t in h o se l vag em, mas gost os n ã o se


discutem . . .
Há trin ta ano s, q uando ab u n d a va m os ag a rradores d e fa m a , (1) ne n h um
r esistia à s te ntaçõ es e pro m es sas d e d inheiro . C h eg a va m a a ga rrar por pimpo -
ni ce es pon tâ n ea e p o r em ulaçâo, tirand o-se a ve z uns 80S o utro s . Hoj e, n ota- s e
o con trári o. O s p oucos que a ga rram , só , d e l on g e em lon ge. se ari ram a b ois
valentes, temíveis. M a s, en fi m , se ca lha. à v oz d e q uin ae to st õe s, ou a o efei t o
de cantatas Hsongeadores, su rge um pimpão liberal, que, sem se i mpor tar co m
a r espeitabili d ad e d o m a t uto, co rre- lh e para a fren te, e ca i - l he na cabeça .
Fica-se com ele ou vai a t erra , es tá claro. Se fi ca e l h e ap ara as p rime iras pano
cede s, agu entando- s e n o balanço, d ezenas de cu-r ioso s cc'rxem a coadju vá - lo. afim
d e m elh or se hav er e a pega ir àv a n te. Como vá e seja r eal. t rov ejam os aplau -
sos. A m ús ica t o ca e o pú blico a clama o a garrad or . C om que ufa nia ele ouve os
aplau sos! Visivelmen te impressio n ad o, r ecebe a s d á d i va s prom et id a s. as fitas
dos Ies teir os, os a braços dos colegas. e po r a caso u m a so rgeta inesperada de
qu alq uer entusiasta . Aceita o qu e lhe qu erem dar, m a s nu nca pede, como faze m
os fo r cados nas verdadeira s tou radas. (2 )
Se a pega fa lho , o agarrador paga o atr eviment o. N a melho r das previsões,
apanho u m trambolhão, q ue o d eixa a to rdoado. M a s passa -lhe depressa.
F..' questão de água fri a. de u m copo de vinho e d e u m cig a r r o. Isso de tombos,
desmai os e arranh adura s, são insignifiCâncias, comparativamente com azares de
fract uras, barrigas furadas e outras co isa s tétricas, que mandam o p obre diabo
pa ra o cemité rio , ou o inutilizam po'r um par de meses.
E: o r esultado ló gico da selvageria, que outra classificação n ã o t êm, as pegas
em tais condições.
R ea lm en t e. q ua lqu er brutamontes, po r musculoso que seja , d efrontar-se
pei to a peito com u m boisão tra içoeiro e desembolado, d e chave lh os enormes e
ponteagudos, no vigor da vida e das fa culd a d es, sob r e terren o ás pe ro d e calçada
o u macadame, se m t er por soco rro quem saiba de t ourei o, cons tit u i audácia de
va lentia br u t eliss im e , que só se co m pree n d e em indivíduos de i gnorância cra ssa.
Q u e a inda os h a ja, ad mite-s e ; qu e os incitem a esse arrojo estúpido, custa a cr er.
P od em con t inuar por muito t empo as corridos à vara larga - e co nt inuarão
de cer to , da da a predil ecçã o do público - m as as pegas aos b ois e t OUTOS desem -
bala d os, h ã o-de a cab a r u m d ia - cedo ta lvez - à fa lta d e néscios b o çai s que se
metam em semel h a n tes f ofas . Bem bas ta q u e se at re va m com va quinh a s e n o vil h os.

• * *
Abstraind o as se l va gerias do s p eg a s em ani m a is d es embolad os, d e avanta-
jada corpulência, a s t o urnd as de n t ro das p ov oaçõe s, em praça s de im pro viso,
<I) H u l. - u d. h'cxu :llu \ to •.,.... e .pddii.. elll. VI1. BoilD. 8arh.tu.• , SUI.f. E v.lili... AU1:Illl.ar. cooforundo.
1011 .... lOunel.. do .1110 • u u do. ...
h ) NOlllro' I. DlP O', o. bo i. d.. u cort.b... ld. b. ... u . , ..1-= 1 pn , • • afe lt.do. colll. ; u d iod ru d. fit.. I! IU'lelo ul..
(.oilu), .. . lut•• p.u o• •,.rr.dou. . . tl n um com o pdmlo d .. ' f Cio . ~ "' O Dl " conliJ:P.h.ro mot el.. d. pu t. , o qOl! ...
fad. COIP.tlu .. o . cto d. ..h • f U , calDO la u Mh o l .uoton d. pt, ••

- 183 -
AT RA V !'. S D O S C AMPOS

oferecem, com o j á n otei , episódios en graçadís simos. q ue suprem, em parte,


a ausência abso lu ta d e t odas a s regra s da taurom a quia . A g ora, é uma
tez q u e salta a trin cheira e s e evade, pondo em alarme os espectad ores
do sítio p or o n d e s e esgueirou e o s trans euntes e morad ores das ruas que
percorre. L080 é o u t ra , qu e entra num d os prédios qu e d ã o para a praça,
caus and o lá dentro um m otim d o s dem ónio s. princi palm ente n o se xo fra co .
O s h omens r iem a b om rir, ma s as mulheres, coit a das, n ã o g a n ha m pa ra O
susto. As mai s impressionáveis e assustadiços v êem-s e em có licas. d everas
compr o m et id as.
P o r o casião da s p egas s ucede apare cerem as co nsartes d os ag a rr a do res , 8
dissu adirem-nos d e s emelhantes pros á pi as. E. en t ão, é cur ioso v er a s mulher-
sdnlaas, em co r po o u d e ch a ile t ra ça do. saltarem os carros. e co rr ere m . muito
ab esp inhad a s. ao m ei o da praça, a r alha rem co m os m aridos e a pretend erem
retirá-l os da ar ena. Eles refilam-lhe. r ecusando-s e. e e las en fu re cem -se. p rague -
jan do -os. E.ntr e eles e elas trocam-s e ges tos d e a m ea ça s có micas. q ue t erminam
por so co s e pela retirada da s intrometidas. O p ovinho d á-lhe s s u rria d a , a p u -
pando- a s p el o insu ces s o.
Outros i n cid entes divertid os s e presenceiam, como cai r um palanqu e, empi-
n arem-s e o s ca rro s. resvalar um patusco que toureia. etc. To dos estes p r eca l ços,
o correm, em g era l. sem co n se q uên ci a s funestas. O p úbli co cele b r a - os ruido sa-
mente. numa alegria d oida e comunicativa. que. de re sto. partilham ta m bé m os
que apanham os sustos. as contusões e os boleus. Folia completa. sem entrav es
de nenhuma ordem.
A tourada acaba a o lusco-fus·co . Se a grad ou. os entusiastas dão vivas 8 0 S
fe steiros, ao l avrador, a os bois e a o .. . santo I
O gado sai imediatamente para a pestoríe, livre enfim do fla g el o a que o
sujeitaram.
. . . . . . . ...... . . . - - . . . . . ... . . . . . . . . . . . . . .. . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .... . ..
Depois da tourada. o u antes. conforme o t em po de qu e di sp õ em. os f es teiro s
e os mordomas realizam um banquete ou um copo de água em casa do juiz. a
pretexto «de correr o ramo», e d eliberarem sobre quem h ão-de ser o s promoto-
res da f es t a no ano imediato.
O ramo consiste num cesto com bolos. sobre toalhas de renda s, g u a r -
necid o de flo r es, tendo ao centro um pão de 16. de o n d e s e ergue um
vi stos o ramalhete. Colocado no meio da mesa. aí figura durante o bródio,
at é que no fim o j u iz o re tira e o passa d e mão em m ã o. c.or r en do a
rod a. p a r a que o «agar r e» quem o pretenda e lhe chegue a v ez. C om efeito,
o que está nessas intenções. e o ensejo se lhe proporciona, levanta-se, ergue
o cesto nos braços. e grita enf àti camente: - «V iv a S. Fulano »!. .. O qu e
si gnifica dizer: - «Honremos o n osso santol ... Sou eu O {esteire nevoe I.. .
O s mordo mos correspondem com outros vivas de eneueí éetícc a ss en ti m en to.
confirmando -lhe a autoridade de qu e se investiu. E passam a nomear os
auxiliares do novo juiz. com o: t es oureiro. esc ri v ão , etc ., se a fe sta n ã o

- t81! -
ATR AVt. S DOS CAMPOS

se incumbe a u ma única entidade, co mo ta m bém s ucede em dete rminadas


circunstâncias. ( 1)
Liquidado o assunto. o cesto com o ramo é e nt regue a um r a p a z, que o
colo ca à cabeça p ara o conduzir n o préstito que vai formal -se. Entretanto,
chega a música , para celebrar o caso e ir tocando.
O juiz velho entrega ao no vo a bandeira, e este, receb endo -a , sai à r u a a
mostrá -la ao p úblico, ao so m de viva s es t r e pi to s o s . Em seguida, o co rtejo
form a-se e marcha adiante da mú sica, com O ramo à frent e, para casa do DOVO
fest eiro, o nde se repetem os vi v ôr i os e 8 S libações de vinho s e licores .
À no ite ce lebra -se o aco ntecimento co m rijo bailari co. E ' o balh o da ban-
deira, assás co n co r ci d o pe la me lhor mocidad e.

* * *
Jogos Perderam o cunho más culo e re creativo qu e os caracterizava nou tros
tempos. Há trinta a n os , se tanto, os homens di straiam-se nas horas de
ó cio a jogar à malha e à barra, a sa l ta r em a g ra n d es distâncias e alturas, a
levantarem pesos enormes, a pulsa re m uns com o u t r os, medindo as sue s forças
musculares. e. enfim, em vários exe rcícios semelhantes, que s e podiam c1assi6.car
de j ogos atlét icos.
Na freguesia dos Prazeres, do vizi nho concel ho de M o n f orte, efectu ava-se
e efectua-se uma pequena romaria na segunda-feira de Pascoela. onde outrora
os popula res da s circunvizi nhanças passavam a ta r d e nesses exercícios, div er-
tindo-se a si e aos curiosos. Quem p ulasse e jogasse à barra n os P razeres, co m
fe rro de a rad o ou coisa m a is t a lu da, era sujei to ex perime ntado, que não temia
d efrontar-s e com outros pimpões d e fa ma. T a m bém - cumpre acresce ntar-
rar o era o an o q u e l á n ã o havia bcrd oede rij a, entre os ca m p eõ es d e força e
li geir ez a .
N a actuali da de, ta nto no concelho de E lva s como nos limítrofes. já se não
pula n em se joga à ba rra. C omo eram ent reten imentos salutares, pusera m -se d e
pat te , prefe rind o-se-Ihe 8 cha pa (2) e o ch ínqu ílh o, em que os patos são depena -
dos sem dó nem consciência d os espertalhões q ue os ex plo r am. O mesmo aco n -
tece co m os jogos d e ca r ta s e cartões m uito em voga, tendo estes a ag ravante d e
decorre re m sob a atmosfera insalubre da taberna, onde muitos homens do ca m po
consomem os dias e noites dos domin gos, perde ndo o salário da sema n a o u a
soldada d o m ês, nos jogos da ron da , ped ida, trinta e um, m on te. e t c. I sto n ã o

It} E. ai."..... localid.du• • n ri 6.. 1. d••Dtr .... d. hu. d.l... , ... I..,ar à po u . d. l.rel. o. a o laurior do u mplo
lo....do·. o (.udro 1>.0"0 d.....Ioe do tI . o. o.. d .. do pboco.
s 1 1 ~ .... rc •• o " ", o o ' n u ir" oa ' u II Ir O' ... Ibo, ee.. do .. . ", • • u .. l r • • a CJlOIU .... •.. PU_ti o prio r • •
40 •••11.1 Dudd... N.u. Ohllllo CUO• • l u u 11.10 II f•• no .ftO ' lIIedlato• • por luo dlt· .. 4d' • h. lIdeiu fico..
• rn.ad • • AalInud. lnd.&..ld I • • u i b.... r d... ou). 4u • • 40 ..1 ,.rr .
(2) Jo.o. d. n ee o. d.. cJ. coh ••• 4ae •• a1ir ' 0 o cblo•••ab.ll do-u ou pu d . lldD· coll fo .
• f. c• d. "'OId. 40. fica "o h .d. $I" cim • . Cu .. ou ""U ' , co mo •• db , calio••• nb.nd o t i crvu, Oa .. c " 'lIodo
o 4'" ., coa ... acion• • o.. o q... U I! • • " ' 0.

185 -
ATRAvtS DO S CAMPO S

f a lan do nos menos nocivos e m a is corr í q ue iro e, como a bisca lambida à s p a rti-
d a s, q ue só custam a s co rresp on d en t es cor ridas d e ca fé rel es e o utras murraças..
q ue in g er em o s jo gadores e os mirones .
Em co n cl u são. O ví cio pelos jogos d e a z a r , que antes era q u ase d es conhecido
entre g a n h õ es e trabalh ad ores d o cam p o, vai g ene r a liza ndo - se e m edra n d o
co n s ide rã ve lm en te, p r od u zin d o. é cl aro. os se us fun estos resulta d o s. C omo se r ia
pref erív el q u e os esq uece ss em d e tod o. ressurgin d o os d a m al ha e de barra 1. ..
... . . ... . ... . .. . ... . . . .... . .... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . .. . . . . . . . . . . . . .
As mulheres joga m jog os d e prenda s a os s erões e nos ve latódos d o s a n ji-
nhos, b e m co mo o u tros d e r etoiça brincalho na, às h oras de desca nso nos t raba -
lh o s cam pest res . N ada m ai s e já n ã o sa be m po uco. para se d iv ert ire m e s e
l ograr em re ci pro cam en te.
R.estam os jogos in fanti s. a cen t uada m en t e popular es. co m qu e se deliciam
os ga ro tos. U sa m-s e mut rlss imo , variando de n o m es e d e g éne r o , de terra p ara
t erra e de épo ca p ara ép o ca . P ara o efe ito em qu estão, a pa rte do a no q u e
d ecorre d es d e o outono at é m ea d o s d a primav era, di vi d e- s e em vári a s te m llo ra ~
d a s, cada qua l d esti na da a u m jogo . em bo ra s e joguem out r o s por rod o o a no.
O s princi pai s são : o d o pião. bola ou boleia, bOAalhinh a, funda. saca-pel ouros,
cabra-cega. escon de- escon de. va rre-varre, v essourin b e, pata, r isquinhe, t ruqu e-
m anduq ue, salta- la -una, sa lta- la-m osca, d os m oir os. etc .
O s d os pião e o utro s, são bastante conhecidos ; portanto, d esn ecessário é
porm en ori zá-l os.
A risquin he e o truque-manduque, r epresentam-se por figuras geomét r ica s,
q ue s e ris cam no s olo, corta das por t r aço s que as divid em em divers os cam pos.
O s jogadores - d ois ou mais. e cada um por s ua vez, alternando - p erco rrem a
fi gura, «a p é coxin h o» . e m p u rra n d o com o pé uma pequena malh a o u m o ed a d e
vi ntém , qu e nun ca deve transpor d et er m i n a d os limites, n em es t acio na r nas
di vi s ó r ia s. O j og ad or perde, s e lhe falha o eq uilí b ri o e interro m pe a m a r cha at é
a o fim do percurso, ou s e o a n dam en t o da malha não satisfaz às r egras esta -
tui d a s. G a n h a . porém. se cumpre todos o s requisitos .
Quem ga n h a . escarrancha-s e às ce lsbrítes em cada um dos parceiros, q u e,
r especti va m en t e. e na d evi da altura , são ob r ig a d o s a servirem d e b estas, carre-
g a n do com o vencedor em ca rreir a ma ior o u me nor , pe lo tempo e di st ânci a que
se es tip u la .
S e. pelo co n tra r io, o jogador perdeu, i nvertem-se as posiçõe s, sendo ele que
lh e t o ca s er v ir de burro, ague ntando o pes o dos ou tros. a um por um . em corri-
d a s i~uais.
Á sa lt a- Js- u na e eeíte-le- m oscs , brincad eiras semelha ntes. um r a pa z p õ e- se
de ca b eça para baixo, dobrando a esp inha, qu ase em p o siçã o de q uad rúpede e
os com p a nheiros , d es vi a nd o-se-l h e a distân cia , correm de l á para ele. s a lta n -
d o-lh e por cima . S e saltam com a gili d a d e. bem es tá; se não sa ltam em t erm o s,
vão. por escala, s ubs titu ir o que estava de bruços, d ep ois d e paga re m a inépcia
com uma cava lhada a ca da figu rante, pela fo rm a usad a n a risquính e e n o tru-

- 18r. -
,
ATRAVr-S DOS CAMP O S

que -manduque. Q u er dizer, a questão resume- se em servirem de cavalgadura s


os que perdem e d e cavaleiros os que ga n h a m . Todos representam ambos os
pa pe is. aproveitando·o s para s e faz erem pixraça s. so b r et u do os mais ladinos e
possantes. que se compra zem em enga n a r os broncos e os fra cos. Como cava-
leiros. segure ec-se e ca stigam-nos. obrigando a best a a Ir aq ue je r e est en d er-s e.
C omo cavalgadu ras, fingem d e po ldros manhosos, ress s bí s dos, es cou cea n d o e
esb ra vei e u d c a t é cuspirem o pacóvio q ue se lhe encelabritou nos lombos. t dos
livros.
. .. . . .. . .. .. .. . . . . .... . . . ... . . . . . ....... . . . . . ... . ..'" .
o jogo d os m oiros ofer ece outras parti cul arid ade s. O s rapazes fo r me m
linha, dand o-se as m ã os. e de poi s. o que fica n a ponta direita, diz, muito bai -
xinho. a o prim eiro q u e tem a o la d o : - cAí vêm os m oiro s 1.. .» - O qua l trans-
mit e a pa rticipação ao imediato, no mesmo tom . e, assim, a frase corre d e boca
em b oca, a té a o ú ltimo da esq u erda , q ue s e v ol ta pa ra o q ue o info rmo u e.
também em segr edo. p ergunta- lhe: - «P a r a q uê? » - O interroga do, em vez d e
r espond er, tr ansmi te a p erg un ta ao qu e s e l he segue, q ue. p or s eu t u rno , a pass a
adiant e. num sossego d e se ried a de cóm i ca , até chegar 80 pa rticipa nte. q ue r es-
p ond e: - c P a ra n os mata re m». - E s eg u e o dito , da direita p a r a a esq uer da. em
a ná loga confidência, chega ndo ao último ouvinte, que obser va : - cCom qu ê?
E st a no va i nterro gação percorre os t râmit es d a pri m ei ra. em vozin h a s, qua se
impe r ceptí veis, até ao da ponta dir eita, que in form a: - cCom uma es pa da de
co r tiça ». - O q ue o uviu , tran smite a notí cia ao vizinho imediato, e deste v a i de
de a em deu , ou sej a. de rapaz em r apaz, até r ecebê-la o da ponta esquerda . q u e
exclama eat rep itosame n te : - . M o r ra m os moir os I ...» - C omo s e os mov esse
u m a pil h a eléct rica. os r a p a z es caem de chofre e d e costas, à excep ção dos dois
da s p on t a s. q ue fi cam d e pé.
O s p rost rados e est en d idos permanecem d e olhos cer ra dos, in ertes. como s e
os fulm inasse u m a a poplex ia. O s d e p é, d irigen t es da brin cadeira. obs er va m - n os
ve rifica n do se r ealmen t e persiste m mudos e q ueda s. Em act o co nt ín uo , passam
a erguer um por um. pes a n d o- lhe p ela cabeça e braços, ma s sem q ue os erg u i-
dos verg uem os j oelho s ou faça m tr egeitos. D e contrário, perdem o jog o e t êm
de pagá-lo por meio de cu les, gritos o u cavalin hos. h l
E.mbora n enhu m perca, há. em r eg ra simplórios, a qu em o s vel h a cos atri -
buem fe ltas e os convencem de que pe rde ram. P o r t a n to. gemem, paga n d o à sua
es colha, com u ma da s penas a l ud idas - a menos rigoro sa, entende-se.
N o d ecurso d os jogos e de pois , a ga r o t a gem g raz ina doi dam ente. come-
tendo d ez enas de tra vessuras, co m o seu cortejo de assob ios, ga l h ofa s. pragas e
imprecações, que ex plode m ao impulso da v erdura d os a nos e do ard o r d o san-
gu e q ue lhes pula nas veias.
Por muitas diabrura s q ue façam re ci procam en t e, tod os se releva m após a s

(1 ) A. caIu ~ .. O CIo. J' l in ......i o II• •" pUeu - ),01.0' co= o. eo.t.llo••ob,., O ch i o. ou 111""0' p.l.. co" ".
O. "';10. coan • • 01. "III' .oum.. ..u o..oIo'" .....= oI.uolo.... ' 0' o".ldo. 01. dtJ=•• po r pue. do . eOlllp."h.iro• . O. u ......
lilláo• .uau;: U.tll .lu uulad• • nd.. ,uceir o. ,dI. l ona. u flrldI. a' d..m elo 010. oano' io'o• .

- 187 -
AT RAv t S DOS C AMPOS

p ri m eir as i m pr essões. D ep ois, co m o t emp o, a m emória a viva es sa s pequeni na s


garotices. d esper ta nd o sa uda d es indel éveis, q u e os anos e a velhi ce nã o conee-
s uem apa gar.
* * *
Pelo Entr udo D esde o dia d e S . S ehas ti ã o ( 20 de janeiro) até à m eia noite de
t erça- fe i ra go r da, b ri nca -se e joga-se o Car naval, como nas
demais po voações do cam po de outras pro vínc ia s, mas co m men o s ent u s iasmo
do q u e antiga men t e.
P os t o q u e em pequen ej es ce la, a inda p ers iste o costu me de s e a ti ra r co m
la ranjas , ta los e ossos, a rremessados co m força e pon taria cert eira . Ond e se sus-
te ntam esses tiroteios, é do s u jeito fug ír a es ca p e e pas sar de largo, para evita r
AaJeirões ou fe ri me n t os. Que, se p or aza r os r eceber, t erá q u e rir da gr a cinha,
para não faz er m á 6g ur a .
À par da s /aTall i adl1!l. s u bsistem igualmen t e o ut ra s brincad eira s an tiqu ada s,
como m a s carrar as pess oa s, atirar-lh es o vo s goros, pô r bra sa s co m pimen tõ es
- pimentoodes - às p ortas das h ab itaçõ es, p a r a fa zu t oss ir e s ufoca r o s
moradores , etc.
O s m a scarados vão s en do raríssimo s, e. em b oa verdade, não va lem um
ca r a co l. O pov o chama-lhes ensaiados, dando o no me de caraças às m áscara s
que lhes ve la m o ro sto.
A ex ibição dos ensaiados, r egala imenso os rapazelhos. Ao verem-n os n a
rua, de caraças sarapintadas. nã o os largam um instante. emprestando-lhes a
nota a legre. de que muito p recisam .
. . .. . . . . . . . . . . - .
N a qua'r re e quin ra - ferr a de co m pa d re s, e nos d ias aná logos da s em a n a
imediata - a das comadres - o r apazio de a lgumas aldeias p r e p ara - s e com
quanto s ch o ca l hos alcança, e em b a n d os , percorre a s r u a s e a rra b a ld es, a
dar as ch o ca lha das t r a d i cio n a is. Sobretudo na véspera e dia das co m e dre s.
em qu e a s correria s d os ga ro tos. COm mangas e outros chocalhos volumo-
s o s, p ro d u z em um b a r ulh o a tr oador at é altas h oras da noite. P or on d e
os r a pa zes passam , a s mulheres sae m à rua e atiram-lhes águ a p ara cima ,
o que. lon ge de lhes arrefecer o ardor, ma is os incita a badalarem fren êtica-
m ente. S ó r eti ram quando lhes aprá s , ou se lhes apare ce h omem d e respeito,
disp osto a z u rzi - los.
....... . ........ . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ... . . . . . . . . . . . . . . . ... . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Na q u a r ta e q ui n ta -feir a d e co m pa d res, ao passo qu e os m o ço s empunham
b a n de ir as vis to s as de l enços de seda , ad ornados d e fita s e flores. co m o nota
fe stiv a da s ol enidade des s es dia s (fan t asia d e b ri nca deira , es tá claro) - a s m oças
mostram-lhes o u t r as, d e esteírõ es, ossos, ort iga s e p ince is velhos dep endurad os
- o u bonecos d e palha a r o erem o ssos - a dem ostrarem que a Semana é de
f o m e e não d e festas.
Na v éspe re e dia das comadres, mudam -se as cenas. As mulheres, al ém de

- 188 -
ATRAVes DOS CAMPOS

pôrem lumin ária s à n oite na s jane las, e a í t o ca r em os almofa rizes, como teste -
munho de regozijo, a parec em de dia com bandeiras d e lu xo, a a lardearem
prazer e Ia r t cre . O s ho mens protestam, p a s s eando com o u t ra s d e sign ifi cação
contrária -as tais grot escas de fa rra p a ri a. esteirões e os sos, q u e simbolizam
a miséria .
Adu zind o carra d a s de a rgumentos em abono das s uas respecti vas i deias,
rapaze s e r a pa riga s, va le m -se da a pa rente rivalida de, pa ra , em chalaça, trocarem
dich otes e descompost u r as. A o m es m o tempo, diligenciam rouba r -se as bandei-
r a s, o que p roduz r et o iç a s, ba l búrdias e lu ta s de corpo a corpo, b em como
a ssaltos às janelas e va rand as, ordin àriamente infrut íferos. por serem pressen-
tidos e malogrados a t em p o.
O s que po rventura conseg uem tirar uma bandeira, celebram a p a r ti da
zo mbando dos espoliados, que ficam arreliadíssimos. As m ulheres, principal-
mente, não se co nformam com o furto, e, como possam, empreg am tod os o s
ardis p a ra tirarem a d es fo rra .

* * *
Na noi te de se r r ação d a ve l ha Nesta noite, (m eado da Quaresma), os r a pa-
zes estúrdias sa em à r ua para, em a le gre
reinacão, ser rare m a velha mais rabugenta da ald eia . C o m um co r t i ço e um a
s erra, vão ao local onde ela reside, e aí, em fr en t e d a por ta , procedem à
paródia.
U m que t enha piada , finge ser a s u p o s ta paciente, e, imitando-lhe a vo z,
so lta ais doloridos, enquanto que outro corre a serra sobre o cort iço , produ-
zindo o Som correspondente.
Á med ida que se avol uma o ruido d a serra çã o, a ima ginária ve lha r ep ete e
au m en ta o b erreiro, clamando qu e a vã o serra r e lhe acabam com a vida.
P or entre o s queixumes e pr ag as que g u incha, lembra- se d e fa z er o t es ta-
men to , e fá-lo em termos cómicos, rimando a s f r a s es e salpi cand o-a s de f ac écia s.
As t or tur a s que a amarguram não a inibem de discretia r jocosamente sob r e o
seu triste fim . e n o mesmo estilo disp or d os haveres. P ouco m ais o u men os
expres sa- s e assim :
- cÁ minh a comadre Maria, d eixo uma ti g el a vazí a. Ao s r . Pr ior a m inha
nele para um tambor. À Ana à Perdiz, a muquite d o meu nariz. Ào Seba stião
o m eu sebento casacão» . E.tc.
C om semelhantes chccar rfces, e o u t ra s alusiva s e os a le íj õe s físico s e a v elhos
peca dilho s da su a p essoa, consideràvelmente exagerados - a testadora co n tem-
pla t od a a vizinhança e os conterrâneo s em evidência. qu e t a m bé m ap anh am
rem oqu e na d es criçã o dos lega d os.
O rapa zi o, acode a ver e ouvir; a s vizinhas assomam à porta. e a brin ca-
deite com en ta-se. Em regra , desperta mais hilariedade do que reprova ção.
À cer t a a ltu r a , {raqueju o s ussu r r o da s erra s ob re o co rtiço ; a voz da

- 189
ATRAv t s DO S C A M P OS

paciente est íngue-se, e,os q ue s e ar voram em padres, cant am os r esp onso s -


u m a cantilena de Iaeechas, endossadas à pobre vítima. A q ual re col hida em
ca sa, re signa-se ao vexame, fazendo ouvidos d e me rcador, para não dar benefí-
cio mai or, ou, seguindo o r i en ta çã o oposta, sai à rua e pespega descomposturas
de ra char nos es t ú r di a s q u e a a f r on t a m . Insulta como quer e q u a n d o quer, sem
q ue os insultados s e melindr em . B em ao contrário, riem-se e regalam-se em lhe
ouvir 8S dio.tribes, até que se en fadam e retir am , d eixando-a em paz. Como lhes
r este pachorra , aind a v ão contender com outra velh ota iras cí vel.
VI

T A N T O n o conce lho d e El va s, como em muitos out ros do Alent ej o,


e a t é em E spanha, a s ce ifas d os ce r ía is n a s herdad es, são ger al-
m ente ex ec uta d a s por mil hares d e h omens e ra paz es que d e p r op ó-
s i to, v êm das Beira s e qu e o público conhece pelo nome de ratinhos
ou ratos. E' um a alcunha p ou co l ís o n geire, mas o s alcunhad os não a rep el em
nem se am ofinam p or isso. R atinh os f oram se us av ós e p ais , ratos se co nsi de -
ram el es , e o u t ro tanto s uc ed erá a se u s filh os e n eto s. O h á bito de vir em ceifa r
à s terr a alente jan as, é t ã o an ti go e i nal te rá ve l, está tã o arr eigad o e p ersi stente,
que d ev erá s u bsis tir p or l arg os a nos, co mo va n tajoso qu e é para lavr a do res e
serv içais. Ai das cclhet te s d o Alen t ej o, se lhes faltasse m os ceifeiros b eirões !.. .
E s sa s ce n tenas e ce ntenas de b r a ço s , cu ja t otalidade comporia uma gr a n d e
legiã o, divid em-s e em mui t os a grupame nt os o u cam ar ad as d e 50 a ce n to e tantos
indivídu o s, d e ant em ã o r e crutados pelo r esp ectivo me n e g etro .
Cada a grupam ento t em o seu mana g ef r c em chefe , q ue delega parte d os
poderes n os encarreg ad os d os cor t es. em q ue a mesm a camara dd s e d esdobra
ao ch egar a o Alentejo e se d i vidir pa r a as diferentes ceifa s qu e aju s t am. Esse
en carregado t o m a o n ome de m an aAeiro d o corte, e co mo ta l gover na sob r e a
gente que lhe distribu em .
Castanheira de P era, Á gu ed a, Anadia, O li v eira d o Bairro, Arganil, G o es ,
Lcuaâ, Figueiró dos Vinho s, P edro gã o Grand e, C ertã, Proença-a-No va e o urras,
são as zonas q ue fo r nece m ma i or co n ti ngente de ratinhos.
E. - nota cu r iosa - entre esses h o m ens, n ã o se en contra m a p en a s os q ue
se entregam a o s la b ores d o ca mpo n a s su a s naturalid a d es, m a s ta mbém
muitos de profiss õ es e h á bito s d iv ersos - sapa t eir os, a lfaiate s, b a rbeiros, et c.
E' que para todos eles. a s ceifas do Alent e jo p roporcionam -l he s m elhores lucros
do que os ofícios que exercem n o s se u s rústicos lugarejos.

- 191 -
AT R A V t S DOS CA M P O S

Manageiro E,' um f ul a n o q ue ad quir e es s a importân cia po r a t er he r d a do d os


se us ant ecess ores. ou por a empolgar a o u tro de men o s mérit o e
astúcia, ou , enfi m , po r excepci onai s apt idões, que lhe ga n h a r a m a sim p a t ia dos
amos e a co nfia nça d os companheiros. De qualquer m an ei r a, a n t es de poss u ir o
penacho, f ez largo tirocinio com o s im ples ceifeiro, t ornando-s e tipo d e n omeada
entre os s eus co n t errâ n eo s. Pequeno propri etário. o u m o de sto industri al, dispõe
de mei os s uficien t es para preponderar s ob r e os que a lic ia e dirig e. N ã o que r
i sto d izer qu e o s domine em absoluto. mas r espeitam-no e obedecem-lhe até
cer t o p onto.
O me na ge irc vem ao Alentej o no começo da primavera, para conhecer o
estado das aearea, e ao mesmo tempo apalavrar as ceifa s dos l avradores, s eu s
antigos fr egu eses, e p or ventura as d e o u tr o s que poss a contratar. T od o s ou
qua se tod os, imcubem-se d o trabalho d e duas e m ai s «casas», ha vend o-os q u e
chegam a a çambarcar seis a oi to . Para obter fr egu esia n OV8 se m p erde r a anrt ga,
o m ana g eir c q ue di spõe de mu it a ge n te, m ete empenhos sem conto. trata n do
de se in si nu ar p or to dos o s m ei o s imaAi n ã vei s. C om os amos a n tigos t a m b ém
se desfa z em sala m a l eque s, p a r a não lhe incorrer n o desag r ado. S e alg um o d es -
pede. pro cura evi t ar o cheq ue co m t orrentes d e lamúria s e cho ra dei ras, q ue,
p or v ez es, a n u la m o d espedim ento. Neste ac to, po de o l a vra d or in cri pã- Io
de qu ant a s lh e l eb re m; po de, n o acto d a r eprimen d a, i n veti vá-Io co m paixão e
injustiça, reme mor a n do q ue ixas a n tig as e r ecentes, q ue ele tud o isso o uve
humild ement e, se m m ostra s de indigna ção, e até concordando com o censor, a
quem p ro tes ta arrep endimen to, j u r an d o s ervi-lo melhor d o qu e nun ca . N ã o
querendo perder a fre gu esia, sujeit a -se a descomposturas, d e et u e para co n s ig o
se ri, co m o rapo sa matreira, qu e lh e n ão importam v exam es , desd e qu e a u fir a
provento s. À o interesse sacr ific a os brios, precisamente a o eont r áxi o do cri a do
Alentejan o. E a ssim co nsegue mant er a clientela e a umen tá - la pro gressiva-
mente, s enão enco n tr a d e permei o o u tro co m p eti d or mai s sa bido .
C onclui da a exc u rsão pel o s ca mpos do Ale ntej o. o m e n a gei ro r egr ess a à
terra s u.fi.cienteme n te enfronhado do que vi u e o u vi u. C om s emelhantes d a d os,
l ogo qu e chega , con t in u o. a alis ta r os homens de q ue p recisa. D a s imp ressões
q u e sen t e, só diz o q ue lh e convém . C a d a alistado paga -lhe d uzentos e quaren ta
reis d e m a trí cul a, q u e s at isfaz meses depois, quando te r min am as ceifas. E n t re-
t anto e desde logo, tê m d i r ei t o a que o engajador l h es abone quaisque r pequenas
q u a n úas de q ue p r ecis em.
O ali s ta m en to não cons titui cOnt rato indissolúv el, como se podia depreen -
der. An t es d e pa rt i re m para as ceifas. e ai nda depois, à chegada, e lgun s dos
alistado s q ueb ram o com p romisso po r sim ples f rivolidades. C o m o enco nt re m
quem os d esa fi e, f àcilm ente deser ta m pa ra o ut ras ca m ar adas, q ue lhes ofe reç am
maior vanta g em. Quanto a ab o n os r ece bid os, re em b olsam-no s o u n ã o s egu n do
a consciência . A m aioria ferra ce l ot e .
. .. . ..... .. -.. ........ . .. . ...... ... . .. . . .. . .. . .. . . ... . . . . . . . . . . . . . . .... .. . ...
o m au age iro da camarada n ã o ceifa em determinado corte. mas s u peri n-

- 192 -
A TRAvt S D OS CAMPO S

tende em t odos, aume ntando-lhe ou reduzindo-lhe a s «foices », co nfo r m e


exigem 8 S circunstâncias, h oj e reclamad as pelo i n t er ess e de comunidade q u e
re presen ta , amanhã pela co n ven i ên cia do lavrador a que de s eja agradar, e no
ou tro di a pelo a d ia n t a m en to ou a tra zo d o trab alho. d e umas pa r a com o ut ra s
CcaS8S». P or iss o, anda n u m a dobedouee, dem orando-s e ape nas onde reconhece
se r m ais n ecessário. Al gun s t razem tan tos cortes e tão distantes que em nenhum.
ceifam. A ca va lo ou a p é, passam a époc a em co n sta n te fis ca liz a ção, d e h erdade
pa r a h erd ade. Nas caminhadas , faz em es ca la pelos m ont es e p o v oados.
Nos mon tes pa r a tro carem i mpres sões com o s lavradores ; n as vil a s e a lde ias.
pa ra haverem a corresp ondência no correio, e, d e passa gem, empin a r em o se u
cop áz io. Em g er a l bebem-no d e borla, o fer ecido pelo am ig o ta berneiro, onde a
camarada fa z g a s to , d esde que chega a té q ue mar cha. Salvo excepções, o m a na -
gei r o t em «boca li vre» na t aberna. B ebe p ela pren d a e d o «bom», como engodo
para trazer fr eguesia qu e dê consumo à zurrapa. Val ores ent end idos a t rOCO de
cigarradas.
....... . . . . .. . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . - .
O s lu cros d o mane ge ír o co nsi st em nu ma qu ota par te da soma t otal obtida
na s ceifas d e que s e in cu m b iu , s endo, para o efeito do ra t ei o, considerad o com o
simples ceifei ro. E aufere m ais os ta i s doze vinténs, q u e lhe pag a ca d a ratinho,
e as lu vas o u p ro pi n a s que, p or us o antigo, r ecebe do s lavradores.
A s luvas r epres entam o m el hor d os seus lucros. Cada lavrador de g r a n d e
m o vimen to, d á-lh es d ezoito a vinte mil r ei s ; o s medianos, dez a q uinze, e os
pequenos, tr ês a s eis. P ortanto o que serve muitos lavradores. arr ecada no fim
da refrega 120 a 150$000 re is. Para um trabalho de t r ês me s es, q uan do m uito,
é bem bom. Val e a pena vir da B eira .
. . . . ... . . . . . . . . .. . . . ... . . . . . .... . ... . . . .. . . . . . . . . . .. . . . . . . . . .... . . . . . ... . . ..
O s mana gefros dos co rtes i gualmente entram. n o rateio das v er b as g a n h a s
pela camarada, tendo mais a go r geta do lavrador, q ue os ci la por um te r ço d a
que obteve o manageí ro chefe. O facto d e ser virem o u n ã o a co n te nto dos
patrões, influi imenso na importância d a espórtul a .

• • •
A vi age m O s r at in h os saem das terra s beirãs para a s ceifas al entejanas aí
pelos m eados de maio ou dep oi s, se v em tardia a matura ção das
searas. Acompanha - os o respe ctivo m a n ag eirc p rf ncipa ], se o m esmo não se
lhes antecipo u , para os esperar n o sítio a que se destinam, e entretant o rec o-
nhecer circunsta ncíadamente a influência ou fal ta d e b r aços, o a s pect o definitivo
das sea ras, o s â nimo s dos lavradores, as intenções e «f o rç a s» de outros m a n a-
teiros seus colegas, etc.
A viagem é f ei ta a p é, excepto os q ue jo r na de iam em burros. À o en t r a r em
n a s localidades qu e enco ntram n o t rajecto forma m colunas, e assim de muchila

- 193
ATRAv t s DO S C AMPOS

e pau às costas. atra ve ssam as p ovoações, entoando cantigas b eirã s. Un s cantam.


outros t oca m em pilar as de que vêm munidos, e todos faz em ruido com a s
brochas do s sapatos sob as pedras das ca l ça da s. Orquestra origin a l. pouco har -
m oniosa, mas ba.st an t e notória. Entretanto, chegam a um dado l oca l, s eu con h e-
cido, e a í, à sombra, estacionam para comer e descansar. Fo r ma- se pois o b ivaq u e,
em que são con sum idas as últimas broas de milho. regada. por golo. de vinho
detestável, que desde a Beira vem vascolejando nuns peq u enos e s u jos ca baços
g u ar n ecid os de l atã o. Se a pinga dos cabaços já se es conipichou, be bem outra
semelhante ou pior nas tabernas d o sítio.
Acolhidos com a grado pelas populações l ocais, onde qu er que chegam tro-
cam cumprimentos amistosos e trocistas. Afoitamente s e pode dizer qu e nun ca
se levantam rivalidades entre beirões e alentejanos. A vinda dos primeiros é
estimada pelos se gundos.
Caminhando o m elhor d e um a semana, chegam al6.m ao termo da via g em ,
onde des cansa m a vale r dois a t rês dias. tratando então do ajuste definitivo .
E d igo defintt ívc, po rque os preliminares, como já notei, fo ram muito antes
t ra tados por alto, entre o lavrador e o ma n ag eiro.

* * *
Carácteres Na sua perman ên cia no A lent ejo. os ratinh os mostram-se agradá·
veis, cor te zes e humild es para t oda a ge nte da r egi ã o, e s ob r etu do
para os lavradores e qu em os r epr ese n t e. Mas à hum il dad e que se lhes t rad uz
nas palavras e gestos. a ssociam visível desconfiança, qu e se acen t ua pri n cipa l-
mente quando t ra tam d os seus inte r esses.
Parecem s im pló ri os mas não o são. A i ngen u i da d e boça l que a par entam, é
a máscara com que procuram ocultar a perspicá cia . P er spi cácia e m alícia bem
notória. embora a que'ire m disfanar com as doçuras d o p alavri ad o. N isto são
mais espertos qu e muitos criados alent ejan os.
Num ina bal á ve l propó sito d e sever a economia, p raticam a ctos d e extre ma
sovinice. Antes, nas taber nas, e ssccíeve m -se a os três e qua tro pa r a . em com u m,
beberem um q uartilho. H oj e, estão m enos forretas. No entanto, afir ma-se, que
um cig arro lh es dá fu ma das para dois ou três. Asserção exage rada, certa mente,
mas sintomát ica tamb ém. Quand o, no regr es so à B eira. vão embarca r às esta -
ções do ca minh o de ferro. acontece r ega tearem o p reço d a pa ss a gem: -
«O h senhor. fa ça isso m ais bara tin h o .. . » - dizem eles ao empr egado da bllhe -
te ira. d epois de l h e p erguntar em e ouv i re m o preço d o bilhete. E o empr egado,
impacientando-se. explica-lhes b r uscame n te a impossibilida de da redu ção.
Se pretendem s egu i r em gr u po. com o está sendo cor re nte. reclamam bilhete
de garupa. qu e lhes d espacham sem reparo. tão conhecida é a expressã o.
. ... . . . . . . .. .. .......... . . ..... . .. . . . .. . .. . . ..... . ..... .. . . . . . . . ... . . .... ....
Timbram em manifestar sentimentos religiosos muito mais e rreigados que
os dos trabalhadores alentejanos. Rezam com frequência e não faltam à missa

- 19~-
ATRAVt.S D O S C AMPOS

nos dias de folg8. A o partirem das su as terras, cada qual promet e 40 r eis às
alm inb as (I ) s e re gr es sarem com sa n de .
Á ch egad a, cu m pr em a promessa, e ainda m a n d am celebra r massas em
acção de graças.

E m a ss eio e compostura , de ixam m uito a d es eiar os 5 1'S. r etínhos. Creio que


o desleixo e a po r ca r ia que se lhes n ota não é tan to devido aos h á bitos. como à
circunstân cia de se verem em t erras est r anhas. onde não podem chegaI' os cui-
da dos das mães e d a s esposas. Que, ver dad e. ve r dade. para se apresentarem
m enos suj os bas ta va la va r em-s e um po ucochin ho em cada semana. nos poços e
ribeiras dos sítios ond e trabalham . Mas não estão para massadas. s eu »0
ent en de r, basta- lh es lavare m-se n a madru ga da dos di a s de C or po de D eu s e
do de S . J oã o, como praticam to dos os a nos, antes de irem gozar o descanso
festivo n a s po voações p r óxim as.
............... ....... . ...... . .. . . .. ... .. .. .. . . . . . . . . . . . ... .. . .. . ......... ...
P elo d ecu r so da te mpo rada, e sobre t u do n os dia s d e C orpo de D eu s e d o
d e S. J o ã o, únicos em que folgam, tod os es crevem às fa mílias, como ta mbém
delas r ecebem correspondência am iudada s vezes.
A s «cartas ratin h as» são o q u e s e pode con cebe r d e mai s minucioso e mas-
sudo. Os que as s ubscrevem , alé m de escr everem ou ditarem banalida des sem
conto, nunca se esquecem de pormen oriz ar como estã o d e sa ude todos d a ce m e-
red» , com o decorr e o tem po . com o encontr ar am as searas, q ua nto ganham, com
quem t raba lha m , qua ndo r egress am, como os t r at am de alim entação, etc., etc.
Depois. passam a pe dir in fo rm aç õe s do que por lá vai: do aspecto dos vinhe-
dos , dos milhos e das batatas; se o compadre fulano, que ficou doente, já está
melhor ou mo r reu; se o sicran o do Casal de Baixo perdeu 8 demanda com o
si crano do C a sal de Cim a ; s e t alou qua l parente, que foi para o Brasil, já de
lá escreveu e o qu e di z ; se n os a rra iais, de fes t as r ecentes, houve bcrdoad a, etc.
E finalizam com u ma ennada d e re comendações para os parentes, vizinhos e
a migos. P ara ela, esposa ou mãe a que m s e dirigem , «as saudades são tantas,
que só à vista t erão fi m .. . » O end ere ço n o sobrescr ito condiz com o co nteudo
da carta . Vai rep let o d e indicações su p érfluas, qu e, o rdfn ê rie m enre, produ zem
efei to negativo, d esnorteando os emprega dos dos correios.
O s que n ão sab em escrever, i nc umbe m a co rresp ondência a os companhe iros
habilita dos, (a) o u d irig em-s e a est r anhos, pedindo-lhes esse serviço: - ePagamos
o t rabalho da sua pe ssoa, como fo r d e r azão, me u se nhor». - Uns, nega m..se - lhes
pata se esquivarem a incómod os, ou tros, prestam-se-lh es de m elhor ou pior
von tade. O s que anuem, já sabem qu e precisam reves tir-se de pa cho rra. Em geral,

h ) P&!uU.m aJci:lo" 1(0. II , " COIl.UU l. cr o:tl1i:l. d.. du umioi:lo' d. Beln . rtpru.Il.I...do II '\'lm u do Po..rlll.t 6rlo.
(:a) Em Q ... i:lo. ' ClItlU.J. bit. , <filo' ulh. u cu"Ir. A p.ruDt';'lD dOi .11.U.hu o, " =o lto m.n o r qo. .. o.
lllu,uiul.o,.

- 195 -
AT R A VES D O S C AMPOS

os obsequiados p r etend em dit a r a s suas missivas. não se confor man do com


laconism os e insistindo por r ep etições inúteis.
P essoa conscienciosa que lhes esc reva, nun ca aceit a r emun era çã o, é claro.
Mas el es sempre p erg'u nta m q u anto d eve m . E , co mo se l h es r es p onda nega -
tivamente, a g rad ecem reconhecidíssimos. C h egam a convidar o improvisado
secretário p a t a os acomp anhar à taber na a bebe rem um d ecilitr o. T êm recebido
destes convites p esso a s fi nas. que, r ecusando-os. sor rie m d o caso, ou enfa dam -se
dever a s se l h es i nsistem no ofe reci m ento. Enfim, o indi víduc que u ma vez
escreve a correspo ndê ncia d e u m ratin ho, n ão l h e ficam sauda des de o obse -
quiar de n ovo.
* * *
A preciad os como ceifei ros, os h omens da Beira revelam resistência e apti-
d õ es incompa r á vei s. Ma i s adi ant e se verá q uanto é ár d uo o seu labor. P o d em os
considerá- los escravos do t raba lho, que exe rcem com assombroso d es em ba ra ço,
sob os rigores do sol esti va l e à me rcê d e pr ivações de toda a ordem. T u d o para
gan harem ho n r a d ame n t e m eios de s ubsistência para si e para os s eus. M oti vos
tão lo uváveis, d ã o-lhe s d ireit o à noss a admi ração e simpatia . N es t e ponto,
ning uém lhes regate ia os mais r a sga d os enc6 m ios .

Ajustes S egu e-s e o sistema de empreita das q ue, ou se bas eia n o presumíve l
núm ero d e homens n ecessários pa ra o fim em v ista, ou pelos moias
de s emen t e q ue l ev ou a se a ra. C om a a da pta ção d a em p reita d a - a homens -
se , p or exem p lo, o la vrador co nt rata a ceifa p or vint e h o m ens, ao preço de
22 $ 000 r eis (média u s u a l), já sabe q ue vinte i n divíd uos h ) lh e ceifarão tudo,
nu m período mais ou m enos d emora do, pela quantia el e 440$000 reis e co mida .
Q uan d o o contra to se regu la po r m o i a s de semeadu ra, o l a v ra do r que aj usta
po r vi nte m o ia s, a 18$000 r eis cada moia de semente ( m éd ia ap roximad a),
i m por ta - lhe a ceifa em 360$000 reis e comida. N ã o se fixa o núme ro de reti-
nhos, mas s ubentende-se que, em co m eço, excederá q uanto possível ao de maios
ajust a dos, pa ra , no m eado d a época, ficar a par e depois se re d uzir tan t o q ua n t o
possa co m p ensa r a cama ra d a do r ef or ço q ue fornece u em princípio.
O a j u s te e a moia s. é qua se ex cl u sivo d as l a vouras em q ue p r epond eram as
cultur a s d o centeio, cevada e av eia - ee s seg un das». ( d N a s que predomi na m o
trigo, prevale ce a empreitad a - ca ho m en s» .
O uso a m oios, sa i m ais ca ro , Mas con vém, p el a n ature za das seg undas,
principalmente cen teio e a veia, q u e req u er em ceifa t em p orã, p a ra não desbagoa-
r em no s rastclb os, como a contece, se a f oi ce lhe chega t a r de. L ogo o la vrador
faz os seus cálculos e, po r conveniência própria, p roc ur a pagar em r elaçã o a

(1) 0 1'0 ln.dl.ldlJo' ...1:0 1:10111.. .. . . por qOI lU' ~.Hu coo tfuad.. por qo,Iq:Q If do. doi ••l'l. m... Ii'of& 'lima cOluld.-
:rhel Plf~ ... u • • m d. u pu u adoinc l Dtu .
(~) Por ocull0 d.. nU... II..• .. du omlDac po c , t' llllJ .. .. ..ar.. d. ce Dt elO, Clnd. , a.. la . t um lu mo da ou_lio.
C!:II' alo I I .mprd a DO un.ata do aao.

- 196 -
AT R AvtS DOS CA MPO S

determinado núm ero d e moios, a que co rrespon da a gente p r ec isa p a ra despa-


char em 30 a so dias.
Ao manageí r o ta mbém l h e serve o sistem a, se pode d istra ir da s ce ifas de
t rigo - a ho m ens - to dos os braço s aí desnecessá r ios em começo. e com el es
ir reforçar e coa d juva r os dos cortes do centeio. O s quais, por sua vez, como já
disse. retribuirão d epois a aju da, indo auxiliar 05 dos de trigo n a m es m a
proporção.
Isto se usava a té há po ucos anos. Hoje, porém, vão estando abandonados
os contratos a motos. por não oferecere m a r eci pro ci d a d e de vantagens que
tin h am ant es. Mu i to mai s gene ra lizada a cult ura do trigo, e assás restringida
a do centeio. nem a ceifa deste cereal carece de tanto homem , nem a do trigo
lh o s pode emprestar, reta r da ndo-se. À cr es ce ai nda a circuns tância de as ceifas
dos trigos começare m m ais ce do qu e outrora . p elo facto d e a ctual me n t e p red o-
mi nar a cultura d o s t rigos m oles t empo r ô es, q ue amadurecem po uco d ep oi s do
centeio e exigem ceifas imedia ta s, sob pena de prej uízos co nsid eráveis, o qu e é
menos sensível n a s ceifas tardias d as o utras va riedades.
À empreitada ea homens» entreté m 60 a &J dias aproximadamente. O es ta do
da s sea ras, 8 aua espécie, o tempo e a 8gilida de do s que as ceifam, são factor es
ess en ci ai s que, por assás va riáveis e s ujeitos 8 co n tingências, de s tro em os m elho-
res cé lcul os.
P a r a o ajuste das ceifas - a homens - p a rte-se do p rin cí pi o q ue um ceifeiro
despache o resultante d e cinco q ue rteiros de semente (7$ a lqueires). Ora como
a s searas t a nto po de m ser d e u ma só espécie co mo d e dua s, três e quatro, e
como as se mentes dive rsas. va ria m t a mbém quanto à s urperffcie da 'terr a que
preenchem em sementeira, cIaro está que a pres u nção é arbitrária ou conven-
cion a l, sem bases sérias q ue a j ustifiq uem . A ss ev era- s e n ã o obstante, que um
r atinh o despacha, em tod a a época, q uantidade m uito superior à que se lhe
atri bui pe lo cá lculo acima a ludido. S ó de s p a cha r á menos, em boas searas de
centeio o u d e t rigo ó timo, excepcio na lmente desenvol vido.
E.m todo o caso, homens d e m a ior cotação nunca saem p or meDOS de 400 a
SOO reis d iários. E d igo de ma io r co tação. po rque nem todos recebem co m
i gu al d a d e. P elo co nrré .rio, cada s ujeito ga nha conforme os se us s upostos o u
ve rda deiros merecim e ntos, apreciados e julgados pela co l ectivi da d e em que se
encorpcro u , com o demostra rei m ais adiante.
A maior ia d os r a pa zes, apesar do seu po u co va limento co mo t rabal h a -
dores s ão tido s com o hom ens pa ra os con trato s das empreitad as. A ssim,
a ceifa justa po r v er ba correspon d ente a 20 ho mens o u 20 m oi os, é executada
p OI 14, 15 ou 16 a d ultos. e o s r esta n t es q ue falt a m para o com p u t o d o s 20 .
s u p r em-n o s criança s, q ue nunca excedem em n úm ero a o dos h om ens q ue
re p res enta m .
O lavrador desgo sta-se q uan do o p ercen tag em dos rapazes se t o r n a r epará -
vel. M as como é us an ça a n t ig a . tem de co n for m a r - s e, a n ão ser q u e o abuso
seja extraordinàriamente gr a v os o. Sendo, qu eixa-se ao mana g ef r o p r i n cip e l,

- 197 -
ATRAVt.S DOS C AMP O S

que se vê forçado a atendê-lo, diminuindo-lhe a ga rot a gem e aumentando-lhe


os h om en s. P a ga a diferen ça, outro lavrado r m en os onerado até então. O mana-
geirc lá arran ja en drómina s e contradansas de pessoal. con s egu in do que os
rapazitos escap em co mo homens, p ara o beneficiarem a ele e ao s mais ceifeiros
adultos. U m a exploração vil. que os pais das crianças consentem, por irem
feitos no jogo ...
• • •
E,' demorado o aj uste de fin i tivo. Ent re ra t inh os e lavradores chicaneia -se
e r epíaa-se o assunto com d em or a s fastidiosas. intercaladas por i n cid en te s
irritantes, q ue põe m em r is co o êxito das nego ciações. Antigame nte, eram o.
m a nagefros q ue con t ra tavam com os lavrado res, sendo as suas resoluções aceites
r eligiosamen t e por todos da cam arada. Hoje, esse negócio é discutido e j ulgado
por m ais entida des. A lém do mane gefro em chefe, inter vêm, pelo menos. três
o u q u at ro rat inhos, d os con sider a d os e preponderantes - espécie de comissão
executiva, q ue deix a na penumbra a a u t or id a de do mana geixo, d u r a n t e o ajuste.
E n t ã o o «ca b eça», quase que é um chefe de caninha verde. À chefia passa, n essas
hora s. para os comissionados da m alt a, h) que são os que verdadeiram en te dis-
cutem e resolvem o ca so com o lavrado r. Este e aqueles ou trata m apenas de
se entender quanto ao número de h omens ou d e m oias que servem de base para
a empreitada, deixando a questã o de preço para o q ue for corrente na freguesia.
04 pago em talou qual lavoure. viz inha -ou, s im ultâ n eam en t e tamb ém , disc utem
e assentam no preço. «P r eço f eito». segundo a expressão consag ra da.
D u ra n t e os arrazoados do aj uste, fe rvilham os argumentos entre as partes
cont r a ta n t es. C a da q u al puxa a brasa à s ua s a r dinha, e nisso consomem horas
e horas, senão d ois e três dias. interrompendo-se e repetindo-se as conferência s.
t a comédia da praxe, com actores para todos os p a p eis. O s comparsas são
representados por gr u p os de ceifeiros qu e. a distância re speit osa, reparam aten-
tamente nos gest os e discussão dos personagens principais. O manageiro, ora se
indina p ara os cam aradas. ora para o lavrador. Na preocupação de não perder
«a casa», n em de se ver abandonado dos seus - ame aças q u e lhe retumham 80S
ouvidos, ar.rip'iando-Ih e os cabelos - chora e ri. humilha-se e reja-se, com a res
de vítima, consoantes 80 caso. Nos intervalos, trata de varrer respons abilidades
e d a r explicações, i nd o. em segredo, conferenciar respectivamente, e por sua vez,
com o amo e com o s da m alta. Nessas con f er ên cias íntimas emprega toda 8
lógica e man h a d e q u e dispõe . T o r n a - se um diplom a ta.
....... . .... . . . .. . . . . ... . ... . . .. . ...... . ... . . . .. . .. ... . . . ... . . . . . . . . . . . . . . . .
P o r fim . o contrato fecha -se e tudo se acord a à boa p a z. O mana getr o
ex u lta e respira . L OetU 8 Z e praze nteiro, protest a q ue a f a m ília há..d e cumprir o

- 198 -
ATRAVeS D O S CA M P O S

que trato u, ne m que a el e lhe custe os olhos da cara. Qu e não custará , por que
sua gente é a escolha lá dos sítios. S ã o «fo ices» val entes, de levar t u do r eec,
da s de não h a ver pão que 85 su stenha, das que ategam fi rmes a té ao cabo, sem
acua rem u ma h o ra. Gente de pri meira. que nem ele a rranjava outra . p a r a
crédito e lama das suas barbas honra das .. .
O s factos subsequentes n em sem pre correspondem às anrmativas do h om em.
. . . . . . . . .. . . . . . . .. . . . . . .. . . . . . . . . . . . . ... . . . . .... . . . . ... . . . . . . . . .. .... . . . ... . .
Nos a nos de boas colheitas, em que escasseiam os braços, algumas camara -
das - a ü á s poucas - quebra m o aj uste, indo oferecer-se a outras c ca sa s.... que
p resu mem lhes proporciona rão m elho r es vantagens. Nesses mesmos anos. chega
a have r des avenças entre re tinhos e lavradores. tendo que intervir, co m o media-
a eiro, a autoridade ad ministrativa. t um recurso extremo e p ortanto, excepcional.
C o m os ajustes das pequenas ceifas não costuma haver demoras. O s q ue as
tom am e os que as oferecem. r eso lv em o negócio sem preâmbulos de i m p ortân-
cia. nem referênci as a preços. T à ci ta m en t e, conformam-se com os estipulados e
aceites n as lavouras maiores.

* * *
o pessoal da camarada reparte-se em t antos cortes quantas as sea ra s q ue
a j u s t a ra m . O mana geiro di stribui a fam íl ia a se u ca pricho. e cada co ntin ge nte
desses segu e logo para a ceifa q ue o chefe l h e d ist ribuiu. ca p itan eand o-o o
respectivo ca beceira (meaa geirc d o corte), também nom eado pelo o utro. de
acordo com o l a vra dor. O cabeceira. t o rn a-s e desde então, o imediato r epr es en-
ta nte do ma.n agej.ro geral, gov er nando os ra tinh os que lhe entregaram. No tra-
balho. toma l ugar n a ponta d ireita , e d aí enc a m in h a e comanda. O la d o esq u er d o
da po nta oposta. preenche-o ou t ro ceifeiro de confia nça , a' quem pertence s ecun-
dar os esforços e p lanos do d a dir eita, tornando-se seu substit uto e auxilia r .
G a n h a como qu alquer. àpa r te um olha mento d e cinco ou dez tostões. que o
la vr a d or lh e queira dar.
• • •
Alimentação C ostu m a ser à cus t a dos lavradores. r eg ulada por q uantidade s
certas (comedias), ou a «ra s t ol h o feito... isto é. por m eio de
comida semelhante à dos ganhões. «B oc a livre». a c en ch er a bar riga », comO
também se di z.
O primeiro sistema - o das com edori a s - vai esta ndo ba n i do. e a pen a s se
usava na s em p reitada s ca moias». A ca da moia ajunta do. co rr es pondiam os
marrocates de sete alqueires de farinha d e centeio, 5 arráteis de toucinho,
S qcertílhcs d e a zeite, z4 queijos. 1 badana e os leg u m es, az eitonas e vinagr e
que consumisse m. O s sobejos e f orr u q ue ven ciam p or co nto, p eso e medida.
levavam-nos consigo pa ra a Beira. o u, q uerendo. era m- lhes abonados em
dinheiro pelos lavradores, m ed ian t e preço conve ncionado.

199 -
ATRAvt S D O S CA MP O S

Áparte O pão, de tudo f orra vam muit o. Das badanas, apena s co m iam duas:
u m a, p elo S . Joã o, outra, no dia de Corpo de D e u s. Com o a z ei te e t ou cinho,
tam bém era m parcimon iosos, po u pa n do quanto podiam . Um ja n t a r d e le gu mes
para vinte h om ens ch egava a ser adubado co m um quilo de toucinh o, ou um
de cili tro de a z eite J O queij o, fo rrav a m - no t odo. para m im osearem a s f a mí lias.
Para s uprirem semelhantes pri vaçõ es - ali ás vo luntárias - co m i a m grand e
quan tid a de d e legumes, muito pão e muit íssimas a z eit onas. N o co n s u m o do
pão, ala rg avam - se tant o, que excediam a q uan t idade q ue ganh a vam . M as, por
obediên cia aos usos, o la vr a d or não lhes de scontava o ex cess o. S e n ão conta s-
se m co m isso, eco no m izá - Lo- ia m tamb ém.
A co m ida a «ra s t olho feito» assemelha - se à d os ge nh ôes, durante o verão,
com a dif erença que, em regr a, a s o lh as n ã o consta m de ca r n e ensacada , nem
vari am de legumes. Predomina a olha de fa vas, altern ada com a de g rão d e bico.
O a l m oço, à s 7 h oras da manhã, r esume-se em sop as frias com cebolas e
az eite refogad o .
Ào meio d ia, co mem o jan t ar - olha a d u ba da co m to ucin ho ou aze ite, con-
f or me o dia d a semana. D e azeite, na s sex ta s e sábados ; d e toucinh o, no s
r es ta ntes dia s.
Á t a r de. meia h ora antes do sol p osto, meren dam o tradicional gaspacb o,
refei çã o fr ug a lfssi m a, ma s bastante apreciad a em todo o Alentejo e g ran de par te
da Espanha. O gaspacn o d os ratinhos disti n gue-se pela ex ce ss iva quantidade
d e vinagre com q ue o prep ar am . C omo os d ei xem, n ão h á vina gr e q u e os sacie .
Tanto a os a lm oços como aos jantares e às merendas. servem-se co n d utos
d e a z eitonas o u qu eijo.
Essas sã o a s práti ca s m ai s s eg u idas, po sto q u e tamb ém h aj a variantes.
Na s ceifas de ce rtas lav o u r a s. é cos tum e me lhorar em o jantar d os domingos e
dias d e fo lg a, ad icio n a ndo-l hes m orcel a ou carne d e b adana. E p ara a merend a
da s se xt a s e sábados, s ubstit ui- se o gas pacho p or sopas d e leite.

* * *
Auxiliares alentejanos E m to do s os cortes ou camaradas parci ais d e ratinhos,
fi gura u m gr up o de serviçai s a le n te janos, q u e se em-
prega exclusi va m ente na s lidas co mple m entare s e a uxilia res d a ceifa. ga n h a n do,
co me n do e tra balhando p or conta d o lav rad or. Tam bém co m em no ra stolh o,
à par t e dos ratinh os, co m ida igu al ou d iferente, p repa r ada e conduzida em sep a-
rado. Igualmente tra balham os mesmos dias e q uase as m esmas horas q ue os
ceifeiros, ven cen do, p or isso, soldada diversa da d os 8an hões, co m o re f eri n o
Pessoal de uma lavoura.
Compõem o grupo, d ois a quatro campcnros r o terdêo, ( 1 ) - homem ou
rapaz q ue, n uma besta , munida de ce n gu lb a s o u puxa ndo a carrinho de va rais,

- 200-
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"
"
A TRAv t S DOS CAM PO S

acarre ta a comida e a ág ua ; os enrilheiradores, que acareiam os molh os ceifados


e atad os, t ra n s po rt a n d o-os à mão para os m o nt ões ou rilheiros que erg uem pelo
ra sto lh o, e p or ú lt imo, d irigindo tod os. o en ca rrega do de ol har pelo desempenho
da ceifa e s e r viços atinentes. P ode- s e co nside ra r o repre sentante do l a vr a dor .
G eralm en te, é o g u a r da d e herda d es q uem a cu mul a e as sume essa s f u nções fiscais.
Nas ceifas, independentemente d os chefes d os ratin b os, t orna-se necessária
a vig il â ncia assídua. enérgica e inteligente de u m hom em estranho aos interes-
s es da cama rada, qu e, po r nã o participar dos se us lucr os. zele p elo a mo, melhor
q u e os ma nag eir os. Podem estes recom endar cautela e perf eiçã o; pode m m esmo
r epreender abuso s e falta s, mas as suas r eco m end a çõ es nã o pas sam d e f ogo d e
vis ta , de armar a o efeito , sem resultad o pro veit oso pala o dono da se a ra.
Lá nos restolhos, para O trabal h o ir co m perfeição, só se r espeitam a s fer-
r oa d as d o encarregado alent ejano. E ste, s im , qu e p õe t od os «a d irei t o».. aliand o
a prudência à energia . O q u e s e co mpe n etra da sua miss ã o, cui d a do seg uin te :
'indice r, a o mena g eiro d o corte. a sa ida que deve dar ao trabalho, d e manei ra
que o «pão» f or te e mu ito g r a do s eja to mbado d e manhã cedo, «a cu d in d o - l h e»
p ela marzia (orvalh ada) e n ã o d u r a nte a ca lma . horas e m q u e desbagoa o u des-
cabeça ; instar co m os ratinhos pa ra q ue te n ha m ca u tel a n o aprov eitamento da s
espigas, o briga n do-os a r e cuarem p ara co lhue m as qu e lhes escap a r a m à foi ce ;
aten der à atada. exig indc-e b oa e firm e; d i r ig ir a enIilheira çã o e coi bir. enfim.
t odos os a b usos 0 0 n egli gências .
. ..... . . . . . . .. . ......... . . . . . . . . . - .
O tard ão r ecebe o rde n s do enca rrega d o e d o m anag ei ro do corte. mas deste
som en te para s er vi ços que se co rr elacio n em co m a co n d u ção da ág u a e d a comid a .
Quando o va gar lh o permi t e. co a d j uv a os com panh eiros da en rilheiIação.

• • •
Nas c ei fa s Ceifeir o s e en erlh e íra do res, co meçam a m ourejar a o r omper do d ia
ou a n tes. h avendo l uar. A quele s, a rrimam -se à labuta quase em
rou pa s m enores, sobre po n do um avental d e p el es q u e termina em safões . Os me-
no s destemidos, vestem calça s de sa r e g oçe, m uito rem enda da s. N a cabeça. um
ch a peuzinho safado. e a o p es coço lenço à li gei ra, como p r es er vat iva contra os
raios d o s ol. Para s e de fe nd erem dos gol pes da fo i ce. ad op tam ca n u dos de ca n a
aos d ed os i n d icado r, m éd io e a nela r d a mão es q ue r da . T am bém se acautelam do
roço das ge lvele s, en vo lve n do o bra ço esq u erdo em man ga de peles. a que ch a -
mam braçadeira. Lembra a m anga d e a lpace , q ue usam o s amanuens es.
. . . . . . . . . . . . . . ... . . ... . . ... . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . .. . .. . . . . . . . .
A ca m a r a da estende-se em linha e procede à ceifa. com a gen t e a d u lta.
O s r ap azeb fica m a trá s, entretidos na atada. Mu itos. são crianças, q u e mal
podem com os molhos q ue preparam. No en tanto. m ostra m- se dilí s.entes e l estes,
talvez por tem er em a censura e o castigo. Ou tros. ainda mais pequeninos
,tO ' "
- 201 -
AT RAvtS DOS CAMPOS

oc u pam -se a g uard a r a copa, ( 1) n o sítio on d e o pesso al pernoi ta . e, simultânea-


mente, ceifam ou finge m ceifar, nas p roxim i dade s d o a cam p ament o. A í s õzi nhos
des vi ados dos superiore s 100 ou 200 metros, nã o s e rala m co m a i ncu mbência.
C omo os deixam à vonta d e, do rmem a s ua so neca.
. ....... .. . . . . .. . . . ........ . .. . . . ... . . . . . . . .. . . . ... . ..... . ..... . ... . ....... . .
A o n ascer d o sol. a cabeceira in t errompe a ceifa, d escobre-se e excla m a em
voz a lta: - «Ben dito e louvado se ja o S ant íss imo S a cr a mento I. . o»
Imedia ta m ente os ou tros ratinh os t ira m o cha pe u, p oisam as foices n o
ombro, juntam as mãos, e cada qual r eza . em voz ba ixa, um P adre Nos so e
uma Salvé R.ainha . Os da atada r ezam tam bém , mas n ã o interrompem o tra -
balho para n ã o s e a t r az a re m .
R eza da s as o ra çõ es, vol ta m à lida com m aio r az áf a ma , a té qu e às sete ou
oito h oras h á s egunda i n t err u pção, por ca usa do al mo ço. Em almoça ndo, a
faina contin ua co m o m es m o despach o, m es aí pelas onze ho ras, a fadiga e o
eal oe a lqu ebra- os de tal maneira, q ue o d esem ba r a ço é meno r. Alguns fraque-
jam ta nto, que u sa m de ma n h a para tom a r em fôlego: - a pretexto de qualquer
coisa i n ter rompem o t rabalho, erguem a cab eça e saem-se com d it os chistosos,
que provo cam o riso dos co mpan h ei ros e lhes proporcionem parola. Assim
o uvem-se-lhes dicho tes, qu e. annam n os s eguintes t on,,:
- sO h rapazes I q ue dize m bacê" àquela cachopa gor d u ch a e branquinha,
qu e é criada lá no mo nte I? . . Cara m ba, qu e se ela me q u isesse, leva va- a p'rá
te rra , a inda que fosse às calabritas I. .. »
Um d os adoutorados, observa:
- eBse- te lá criatura. . . F a zend a da q ue la n om serbe p' ra h omes como n ós ...
Às mulheres do Len teii o são finas de m ais p'rá g en t e. .. Mira- a s bem, e ve rás
qu e n ã o l h es aparecem a s canelas. T êm m edo q ue s e lhes constipem co m o a rl...»
Um terceiro, confirm a :
- eE' tal e qual .. C a pa zes eram elas de irem descalças e de saia curta,
pegar na rabiça do arado ou no cabo de u ma enxada , de sol a sol, lá nos lamei-
ros, am anhando os milhos e as coibes, com o fazem as nossas companheiras. . .•
Ouvid o este arrazoado, cada ra tinho sai com uma nova comparação entre
b eiroas e alentejan as, te rminando todos por conierirem a super ioridade às
p rimeiras.
À respeito d e fo rmosura e plástica , d ivergem 8S opiniões: u ns, são a i nda
pelas beiroas, outros, p elas t re.nst aganas, e a maior pa rte por umas e outras,
s en ti n do -se perplexos a respeito de preferê n cias.
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . . .... . ... . . . . . . . . .. . . . . . . . . . .. .. . . . . . . . . . ..
C er ca d o m eio dia, ap arece o t s rdão, m ontado na besta em q ue tr ans porta
a comida. O qua drú pede vem ajo ujado de u tensílios, d on de s e d estacam as

- 202 -
A TIL\ V t. S DOS CAMPO S

asadas d e cobre, d e um brilho extraordinário, conten do O j an ta r do s ratinhos.


Luzem ta nto. porque, se gundo o costume, foram esfr ega d a s pe lo co zinheiro. ao
arredá-la s do lume.
A o avi st a r-se o janta r , s u spe n dem -se a s ap reci a çõ es so b re o sex o frágil, e
entra-se em assuntos rel a tiv os à paparoc a .
- cO r a a t é que enlim. . . aí t em os o re io d o mantieiro.. . Queira Deus que
ele traga a comidinha bem amanh ad a . Ist o cá p or d entro está vasio com o um
tam bor ... O homem q u e nasce com a si n a de vir ao L enteiio comer fa vas e
g8~pacbos, no meio destes descampados, em que um a pessoa se de r r ete em suor,
mais lhe valia morrer à nascença . .. M á s orte a minha, q u e não meteu nos
cascos do sr. meu pai mandar-me a aprende r a letrado ou a cl érigo l. . . Isso é
que são bidas /. .. »
- cO h compadre, tu achas jus tiça direita ceifa r mos n ôs tri go e com ermos
cen teio ? . .
- cà ch o, si m. O bocado n ão é para quem o faz , é para q uem o come.
N ã o sabes tu, pateta, q u e o pão d e t rigo engasga os lam baruços como n ós .
Eu, se o comes s e, a travessava-se-me na gu ela e d epois . . . o u m o'rria engasgado.
ou t eria de chamar o mestre ba rbeiro pa ra m e tirar a s côd eas co m um
a licate !. .•
Neste co m en os , o me n egeir c anu n cia o jan tar, e, s eg uidamente, i nterrom-
pe-se a ceifa pa r a s e cu idar do estôm ago . ..
.... ....... .......... .. ..... ...... .... ............ .... ....... ... .......... ..
J anta-se à s om b ra da mais fro n d osa a zinheira, o u a ca mpo d escoberto, se
falta esse conforto. Os en r il h ei ra dores, guar da e tard i o, for m am r an ch o à
parte, próximo d os ratinhos.
O manageirc agarra na asada e vasa a o lh a n os algu í d a r es, distribui ndo-a
por todos em partes iguais. Entretant o, a camarada divide-se em gr upos, e cada
u m r odeia o alguidar q ue lhe perte nce. D e j oelh o em t erra, ou ass enta d os
no r a stol b c , cada ratinho a comod a-s e com o pode. e, em acto consecutivo.
todos pa ss am a m tger as so pas para d entro d os ba n anhõ es que receberam
a olha .
O mauagetro profere a frase habitual: - cCom Jesus.. - e, i m ediatame n te.
homens e rapazes. tiram as colheres do s ch ap eus e p ri nci piam a com er.
Ao princípio o jantar corre silencioso, m as do me io em d iante anima-se.
m ercê das fr a ses picaresca s dos que se r eputa m g raciosos. O s do pessoal alente..
jano ta m bém entram no cavaco, encamin h a n d o-o para ass u ntos a lu s i vos a os
costumes da B eira. Então os ratinhos de screvem, a s eu m odo, a s ce nas
populares da vid a beirã, recheando-a s de peta s, destinadas a iludir os d o
gr u p o transtagan o, Estes, porém. nã o se deixam misti6car. Mal se ouve m ,
sorriem e mofam. como quem não engole patranha s. Os beirõ es, p or s eu
turno, troçam t a m bém as costumeiras alent ejanas que lhes parecem ridículas.
Estabelece-se um tiroteio de piadas e epigramas, com que todos se distraem.

- 203 -
AT RAv t s D OS CA MPO S

Nas suas divaga ções, é corrente os n ossos patrícios pergun tarem o se guinte
aos da B eira:
- «É verdade vo cês entregaram as suas mulher es aos a ba d es , q u an do vê m
para o Alentej o?»
Os ratinhos. que dema siado com p r een dem a conhecida chalaça, sar-
r iem m a liciosa m en te. Em reg ra, u m dos interrogados toma a palavra e
r espo nde :
- cÊ. verdade e mais que verdade. Eles são uns santinhos, e p or i sso, nós,
q u a n d o saimos da terra. entregamos -lhes a s mu lheres, para que as benza m e a s
livrem de em a us olhados» . . . »
- c E. é a p eso que os abades tomam conta delas - acrescenta out ro beirão
ladino. - Quando vamos de cá , l evam o-las à b alança . . . se pesam o m esm O o u
menos, bem correu o negócio . .. »
- «E se pesam mais?»-pergunta imediatamente um alentejano.
-«S e pesam mais-responde o r a tin h o - a ela s, partem-se-lhes os canas-
tros, e a eles, os senhores abades, dá-se-lhes uma coça, valente, até deitarem
p elo esp inhaço a gor d u r a dos lombos . . . »
E sta informação é acolhída com gargalh adas e comentári os adequados,
pou co respeitos os para os reverendíssimos a ba d es .
O s rapazinhos, conquanto não compreendam b em o m otivo das gal ho fa s,
v ã o n a corrente e riem como os homens. Questão de COD tá gio ...

Depois do jantar dorm em a sest a - repo uso de uma hora ou hora e meia,
q u e lhes parece um s egundo . . . Acordados pelo mana gefro, espergu.i çam-ae e
volta m a ceifa r . À es sa h ora, o traba lh o é cu etosfs sim o, mas d es emp enham-no
h erõicamen te. P or m ais q u e lh es d oa, esq uecem ao! sofrimentos e en t rega m - s e à
empreitad a, pa ra a vencerem com van tagem . A mira nos g a n h os, in cute-lhes o
a l en t o q u e lhes faltari a se m esse incentivo. M as o estímulo do din h eiro, avi gora-
-lhe a co ra gem.
Regueiras de s uor f étido en c.harca m-Ihes os cor pos a fogueados e s emi-nús,
d espertando-lhes sedes abra sad oras, q u e l hes es ca ld a m o sa ng u e e lhes queimam
a língua . É ver a ansiedade com que os pobres a ceitam a b arri ca de á gua ,
que lhes oferece o tardão. C om que a vid ez tom am a vasilha e a emborcam,
esva si endo- s às go lada s, passando-a de m ão em mã o, e t é a esgotarem 1. • .
A á gua é o s eu salvatério. A sofreguidão com que a ingerem, bem o
patenteia.
Mitigad a a sed e. eí-Ioa a manobrar de novo. pr oss egui n d o resolutos, co mo
os luta dores antigos nos campos das batalha s. P oucos os igualam ; nin g uém os
ex ced e. H o m en s de ferro, com tê mpera de aço não há s eara opu lenta qu e os
det enha. N a alu cin a çã o da refrega, quando as ideias se lhes concentram n o
t raba lho, só lhes o u ve o pass o n os bembor rsis e o eetaleiar d os caules da s es pi-
ga. de rrubada. p elo. polpes da. foice •. E q u e d estre za d e go lpe. !. . . A quü o é

- 204 -
ATR A Ve S D O S CA MPO S

caminh a r para d ia n t e, e to mbar gave le s para t rás. Pa ra t rás, 8 9 g avelea, pa ra


diante , a cam ara d a, q ue a van ça , que av an ça s empre, deixando um l a stro de p a -
veias, como camp o j u ncado d e flores. à p a ssagem vito r iosa d e um exé rcito
triunfante.
O s r a pa z es, coita dit os, vê em -se n uma Ione, a r eunirem à pr essa a multidã o
de pave ias es ren d ídas so br e o r a stolh o. M al apan h a m e enfeixa m um as, j á
o utras os a guardam, e após estas, outras e out ras, que lhes n ã o co ns en t em
d em ora s. Nu m a ssop ro , tor cere o neAs lb o, enfeixam e atam, correndo a d iante.
pa ra se não a tra sar em . ..
... . . .. . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . ... . . .. . ...... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . .. . . . . . . ..
À faina contin ua pela tarde fora . sob a a cçã o asfixiante do sol, à tempera-
t ura d e 40 gZ8US, calor ho r roro ao, agravado pela violência do serviço. Mas não
Im po rta . O s ceifeiros ag ue nta m -se n o posto e p rosseguem a va n te, sem olh arem
a consequ ência". Algun s, paga m caro a ousa dia, adq uirin do moléstias graves,
qu e os arrastam à «San ta Casa», on d e nem tod os se cu r am .
C om efe ito, d e verã o, é importante a percen ta gem d e d o ente s ratinh os nos
h os pi ta is a lentej a nos. Ninguém mai s dig no de d ó, que essa s desgraçadas ceie-
t u r as. E stã o a li padecend o o tr a balho insano a q ue vol un tà ri am en te se entrega-
'Iam, pa r a melho rarem o passadio dos filhos e d a s mu l heres. D o s filhos e das
m ulheres, ausentes m uito longe . .. E, a fin a l, a qua ntos se lhes m a logra m os
p rojectos, e quantos não mo rre m no enxergão da M isericó rd ia , aos emp urrões
do cínico enfe rmei ro, sem o ca ri nho da fa mília, r od ead os d e estranhos, outros
padecentes humildes, de qu em só ouvem queix umes 1. ..

• • •
Qua s e ao pô r d o sol tem lu gar a merend a. V ã o gaspacha r, co mo diz a
gente d o campo. N esse ac to, re petem-s e as cavaqueire a e l êem -s e as ca rtas t ra-
zidas do correio. Q u e a lvoroço e cu r iosi dade a dessas ocasiões, em que r ecebem
n otí cias da pa rent ela 1. . . Às bo as n ova s, celebram-se com sorrisos ... as mâs,
an uveiam os se mbla n tes, m ar ejam os olhos .. .
. . . . . . . . . . . . . . ...... . . . . . . ..... . ...... . . . . . . . ... .. .. . . . . . . . . . .. . . ... . . . . . . ...
Concluída a merend a, os rap azes vão dar ág ua ao s b u rros - an i m al ejos d e
raças Inf eriores, que sô i mpa m d e faz to s duran t e as asseias. D ep ois de um
longo período de fomes e t rabal h os peno sfs si mos, suportados pacientemente
nos frios lameiros das ter ra s betrãs, os m odestos j ericos vêm ao e lent ejo goza r
dois meses de vida folgada, come n do à fr an ca n os abundantes ra st ol h os das
searas, ali, ao alcance dos do nos.
E ao passo que estes, o s ratinh os, rrebe lhem como uns neg ros, a quel es, os
burros, encarando-os fil os õficamen te, z u rra m e esco u ceia m à gra nde, q ue m sabe
se por troça aos seus legítimos senhor es. É. possível que a s asin inas cr iat uras se

- 205-
ATRAvtS DOS CAMPOS

riam. lá para consigo da vida trabalhosa dos donos, que ao tempo contras ta
com a deles, toda de Iol guedos e abastança. ( 1)

o lavrador frequenta as ceifas dos ratinhos, e raras são as ocasroes em que


n ão encontra mot ivos de queixa. Mas, se censurar as faltas, logo os increpados
se defendem, aduzindo argumentos e reflexões. E dos araumentoa passam à
lisonja. gaba n d o a seara ao a m o, no propósito manhoso de lhe dissiparem os
despeitos. Eis as suas argúcias:
- «Não se pode apanhar todo, senhor nosso amo. Sempre tem de .Gcar
alguma esníguinhe . O s adinh o a p r o veita tudo. e o senhor não perde nada. »
Se a seara é inferior, das que não permitem elo gios rasgados acrescentam:
- cE fique o sr. lebredor sabendo, qu e há-de colher mais do qu e muitos
cuidam . . . Assim ela fosse nosse.e
C omo prémio d e consolação. o m aneg eiro confirma, acrescentando :
- «E s tá {raqtriro, m as gra do õ pesa como chumbo J••• »
Se, ao contrário. a se ara é ex celen t e, ou mesmo regular, os lo u vor es
retumbam em todas as bocas, sempre com intensões Ii songeíras. Ouçamo-los:
- «V ej a se acolbe celeiros gra n d es, s en h or labrador. A falar a verdade,
isto n ã o pa r ece trigo j parece um canabialJ Até a gente traz os pulsos abertos!
.Este é d o ta l feroz, que J a z acuar os valen t es I.
- «B em podia o s enhor pager- nos mais um homem. que não O pa gava de
gr a ça . .. Caramba q u e nunca vi m os coisa melhor: os rilheiros não despegam
uns dos outros, as espiga s d e palmo e meio, e os bagos como pinhões I Uma
seara assim , é um lou var a Deus I »
- «E sta seja a m ais somenos » - observa enfãticamente o msnag etro.
E, voltando atrá s. ceifa al gumas es pig a s que escaparam, e exclama:
- «H a ja ca u tela, oh r apa zes. Tenham cuidado com a s espigas . .. para se
criarem, levaram t empo e dinheiro. Dinheiro como t er ra ... que se eu o apa-
nhasse nas unhas, com p rava o melhor casal lá da noss a freguesi a I... Nada de
estregemeotos, que n ã o é esse o n os so brio. S e o rastolho for bem feito (e pisca
o olho ao la vrador) o patrão paga a pinga no dia de S. João . . . »
A perspectiva da pi ng a anima t odo s. Um rato a trev ido, volta-se para o
lavrador e pergunta-lhe:
- «N esse dia o jantar s erá de Arães e cbolriço grosso, não é berdede,
s en h or nosso amo? .. »
O lavrador sorri, e responde q ue efectivamente o janta r será de g rã os de
bico e bo a morcela. Quanto ao cboir íço, 6.nge·se mouco.
O mana geiro adverte:
- cN esse caso, o patrão fará favor inteiro. A badana para a olh« do dia
(I) Multo. dutu hlltto. d o . dqal ri do. 1:10 AI''''lelo, .... l:lo yo., Dor n"'Dn do. u I/alio••0. I ...ndoru • "Il.d.ito.,
lU' d ,pu . . d. Ur tall'l.ura .. nU...

- 206 -
ATRAvt S DOS CAMPO S

santo. mandará o s r. labrador es colh ê-l a das m aiore s e das mais gor d a s qu e
houver no rebanh o. Faça-n os is s o. e ve rá como a rapa ziada n ca contente ... lt
O lavrador d efere esta s egu n d a p r et en çâ o, recome ndando mais cautela na
ceifa e menos ban deira s ( 1) n o resto lho.
Para corresponder 8 0 ar raz ado do amo, o m ana geiro i ulga -s e no dever de
dirigir n ov a ex ortação à camarada, o qu e faz, mais pala armar a o efe ito, do que
pata se r aten di do .
E ntreta n to, o sol começa a es conder-s e acolá, para as banda s do poente,
dond e ch egam ligeiras virações que, co mo o oásis no de s erto. r efrigera m SU A ve -
men te aqueles corpos i ns olados.
Ao sopro das brisas, a seara marulha em on dul a çõ es, e os ceifeiros, ben e-
ficia d os por aragens tão amenas, celeb ra m o confor to entoand o t r o vas beirã s. ..
Que bem lhes sabe, a quel e deli cioso e {resqufssimo vento travessia, tal ao p ôr do
sol das tardes de verã o, em pl en a campina alentejana J. ..
...... . . . . .. . .. . . . . . .. . .. . ....... . .. . . ... . . . . . . . . . . . . . . . . .. . ... . . . . . . . . . ....
É. n oite cerrada qua n do os ratinh os larga m as foi ces p ara ire m d escansar.
É a desapega, co mo ele. deaigae m a so lte do trab alho.
À o larga re m a foice, rezam a s oraçõ es da tarde (um P a dre N o sso e u m a
A vé M ar ia ), e em contín uo este nde m a copa n o rastolho, preparan do, por es te
me io , as camas em qu e tencio n am do r mir. A lguns m et em alhos n os bolsos, pa ra
q ue o cheiro os preserve d os insectos.
D orm em n o r a stolho, n a hipótese d e o tempo ir quente e se co, como é p ró -
prio da estação cal m os a . Ás vez es, porém, não acontece a ss im : t rovoadas m ed o-
nhas, a companhada s de ch u vas torrencia i s, rug em ameaçadoras, pressagia n do
d esa stres iminentes, qu e apavoram o pessoal.
N esse s m omentos críticos, os humildes ceifeiros fo gem a es cap e para o
monte mais próximo, se porventura têm a sorte de estarem p erto de um m onte
ou m esmo de uma ch o ça . Não se lhes p ro porcio n a n do esse precioso refú gi o,
envolvem-se nas mantas, e de sta maneira, transid os de susto, p r ocu ram livrar-se
das chuva s, a r rim a n do -se aos penedos e às árvores - abri gos insuficien te s,
de on de s em pr e saem m ais ou menos molhados.
E. nes sas h oras tremendas, em que fu zil a o relâmp a go e ribomba o tro vão,
el es procuram amparo na misericórdia divina, qu e imploram com f ervor, já
cantand o o Bendito e louvado, j á re zan do a Ma Anílica e o utr as orações.
V olvida a bone n ça, a cora gem anima d e novo aq uela p obre g en te, que -
diga-se de passagem - sofre meno s com a s fadigas d a ceifa, do q u e com as
inclemências da estação. Estas sim, que os morti.6.cam a valer: ontem, era o
cal or asfixiante dum s ol tr opical; h oje, os aguaceiros violentíssimos de uma tro-
voada de respeito. E na m adrugada de a m an hã, ao darem princípio ao seu

(1) Cha mam"1 h,uld,.. h ..pi , .. q UI " capIm ao , olpI da ' olca I q\la . POlrIIDtO. fica m I",pulou. lO <: on l d o nll ol bo .
(2) No Allalljo. t L am..· ,. In u ..lo lO ...to do ponul I aorou". <:011I.0 ae dul' DI. POli' '''' 0. o do DUCIOU . I pdO.
o d o 1111. O tn.e..lo, pr.doml. .. a .. 1Ifd.. dI ..tio.

- 207-


ATRAvtS DOS CAMPOS

l abor quotidiano, embrenhar-se-ão pelos rastolhos assãs úmidos. pondo-se


numa l ás t im a tal, que dá dó vê -los repassados até por címa dos joelhos, com as
cerou las coladas às pernas, a escorrer- lhes a ág ua pelos sapatos I
Pois, apesar de saberem que permanecerão neste mísero estado enquanto
darar a orvalhada, não desistem do seu i n tento : - com mais ou menos custo,
continuarão a ceifar a ceara - sempre na ideia lixa de se aproximarem do dia
memorável em q ue 8S suas foices [uz en.tea irão a o s a res, co m o testemunho de
regozijo, pelo vencimento da empreitada .. _

* * *
A fin al. concluíram -se as ceifas - as eesêíes, como vulgarme nte se diz.
O s mauag eiros dos diferentes cortes . recebera m dos lavradores as importâncias
das empreitadas respectivas, na presença do manag eiro chefe da cam ar a da.
U m e outros ig ua lmente embolsam as costumadas gorgetas que, em regra.
r e pu ta m exígua recompe nsa aos seus importantes serviços. Isto é o q u e eles
dizem. em frases lamuriantes e senti mentais. Os amos pensam exactamente o
contrá rio: - persuadem -se que for a m d ema si a d o ge nerosos, po r en te n d erem
que podia m t er sido mais b em servidos.
D e resto, todos se conformam, e melhor ainda os gratificados, se o lavrador
lhes adoça a boca com u m prese ntíto de qu eijos, o u com a ve nda barata de um
bur ra nco reles.
. .. . . . . . . . . . ... . .. . . . . . . ... . . .. . . ....... . . . . . . .. . . . .. . . . . .... . . . .... . . . . . ....
N o dia aprasado pelo manageiro em chefe, a ca m ar ada re une -se de novo
nas cercanias d a povoação mais a gei to e é aí q ue s e fa z em as co ntas gera is
Eis o processo:
Estende-se uma manto no chão, e, imediatament e, os mana ge'ir os dos co rtes
vão aí depondo as q uant ias gan h a s pelas suas respecti vas m altas, reunindo
assim a soma vencida por t odo o pessoal.
Seg uidamente, os interessados que sabem escrever, co nsriru em- se em
comissão 6scal para verificar a importância amo ntoada, e rever a exactidão das
operações aritméticas que hajam de fazer-se, por efeito de rateios e desco ntos
- operações incumb idas a um r a pa z, fo rte em núme ros, mas que se n ã o aceita m
como boas e certas. sem primeiro se rem conferi das pelos o utros da comissão.
Estes mesmo, s6 se convencem d a exactidão dos seus algarismos, submetendo-os
à prova dos n o v e m eia d ú z ia de vezes, sem nunca lhes sair errada . E. ain da
a ssim , p a ra que n ã o fiq uem somb ras de dúvida. os m a is d es co n fi ados e i ncréd u-
lo s. propõem a prova real, como de ma.io r co nfi a nça e menos falíve l. Mas, em
re gra, esse a l vi tre não é aceite. S eg u n do o parecer d a m ai oria, a prova dos n ove
não fa l h a . g raças a o «b o m sentido » dos que a e nze mina m, e às «co ntas de
cabeça », simultâ neament e fei t a s pelos me lhores ca lculistas, e q ue joga m certo
co m as dos n úmeros à p ena.
Com semelhante s mínu d ên cia s e ca u telas, a i m portâ ncia t o tal reunida em

-- 208 -


A TRA Vt.S DO S CA MPOS

m ontão, é re par tida em tantas par cel a s q ua ntos os i n d ivid uos da camarada.
D epois, procede-se à j oeiraçã o, qu e consiste e m tirar d e cada montículo, desti-
nados a cada rapaz. a m etad e. dois t er ços, três quartos ou m a is, da import ância
do quinhão. S e além d os r apa z es, h á homens de notór ia inferiorida d e como
t rabalh adores, os quinhõ es destes tam bém são dizi m ados.
Com es tas d ed u çõ es. fo r m a~ s e um a verba especial, p ara s e repar tir em
separado e co m isualdade. por t odos os adultos q u e «sa íra m por inteiro».
Os joeiramentos fazem-se, ou d evem fa zer-s e. se gundo a inaptidão d os ioei-
redes, de poi s de ouvid os os p ais o u o utros parentes que os tutel am .
A s contendas azed as acompa nham, em cer tos casos, as classificações sobre
o mérito dos a dcl escentes, pois a o passo que os se us superiores os equiparam
a os homens bons. os m a ne g ei rcs e os que não têm cachopos n a camarada , são
de parecer inteiramento d i ver s o : em sua opinião, os rap azi nhos ficam bem pagos
com a q uinta parte d o q ue toca a cada homem. E p ara alguns, qualq uer
ninh aria de m eia m oeda ou menos 1. . •
E m tão desencontradas apreciaçõ es, o exa gero d e tod os é evidente, embora
nas dos primeiros haja mais razão do q ue n as dos últimos.
A nn a l. depois de r episados pel a cen té si m a ve z os argumentos capciosos de
a m bas a s narres, a cont en da re sol ve-se, ficando ve ncido o que p ugn a pe l o
joeirado que nestas, questiúnculas é o m ais fra co, e que po rtanto ter á de se agu en-
ta r com a imposição dos fort es. E,,' assi m em todas as coisas. O direito da fcrea,
preva lece sob r e a f or ça do direito.
. .
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . . ... .
O s ra tin hos que por doença ou o utra ca usa justificada pe r deram dia s,
m eios dia s ou que ríeis, é-lhes descontado esse tempo, das verb as q u e lhess coube-
ra m em rateio.
E das de d u ções realizadas po r esse motivo reune-se uma n ova soma, qu e é
re parti da com igualdade p or todos os ceifei r os a d ultos, incluindo os p ró p r ios
qu e sofreram o desconto .
P a ra evitar la ps os e dúvidas, as perdas r eferida s fo ram o po r tu n a m en t e
a not a da s pelo mena ge iro do cor te num caderno especial, qu e a pa re ce n o ac t o
da s contas com a d esigna çã o pitor esca de r ol dss p er d izes .
R esol vi da s as ioeireções e d escon t os de dias perdidos, cada ratinho to ma
posse do dividendo que l h e co mpete, pa gan do imediatamente os doze vintens a o
menageir o principal. S e a o mesmo d evem a lgum biquin h o, igualmente lh o
satisfazem então, ou seja por vontade própria, ou por a d vertê n cia do credor.
que. como esceeamenradc em ce lo tes, é avesso a moratórias.
Ao term inarem a s contas, celeb r a -se o fausto acont ecimento com liba ções
de uma pinga ra zo á vel, previamente comprada na taberna r ecom en d a da pelo
mena geiro. N ão t a r da mui t o qu e se conheçam os efeitos d o vinho. M eia hora
d ep ois, tudo aquilo a n da numa alegria doida , m a nif estada por mil m a neiras,
qual delas mais sintom ática: canta m, gritam, tocam, baila m, chora ra, etc.
Uma s.lgaaarra enorme, que ens u r dece q uem a ou ve . E t u do i sso é l ógico.

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AT R A V t S DO S C AM P O S

O s vapores alcoólicos, e a ideia de es tarem d e ma rcha p ara a te rra n a t a l, com


as no ta s no bolso. produzem sensações demasia do f o r t es para a s gozarem à
calada .
• • *
No dia imediato 80 d as contas, efectua-se a partida p ara a Beira. a p é e
em b ur r os. por uns, e no caminho de f erro por outros. Estes. querendo eco no-
mizar. ca mi n h a m a lgumas lé guas a pé. já embarcando na estação imediata à
mais próxima do ponto d e p a r tida, já apeando-se 8 co ns iderável distância do
termo da viagem.
L á nas suas localidades. todos são esperado s a n siosam en te pelas mães. pelas
esposas e pelos Elbos. T od os lhes celebram o r egr esso indo esperá-los 80 cami-
n ho. n uma iminência vi zinha da es t rada. de o nde os possam lobrigar ao largo.
E ao a v ista r em - n os n o cume d o outeiro mais d istante, os gr it os de júbilo ecoam
p or aqueles se rras fora . d e m ist u ra com a s gir ând olas de fo guetes. d e que, em est a-
los sucessivos. anu ncia m aos casais vizinhos. a chegada feliz dos laboriosos
emigr an tes.
VII

F ORç o so é conf es sá -lo. Na a lfaiad a agr ícol a do Alto Alen t ejo, sobre-
tud o nos ca mpos de pequeno t ra n t eio, p ersistem todo s os inst ru mentos
da lavo u ra a n t iga, q ue se con s erva m e u sam por efeito d e t radições
arreigadas, u ns, pelas condições ge ológicas de algumas zonas, outros,
e muitos por circunstâncias de ordem e conó m i ca, ne m se m pre ju stifica das, mas
fàcilmente co mp r ee nsíveis.
C om o q uer que seja. e não disc utindo os prós e con tra s de sem elhante
a pego, é indubitável. q ue, sem se b anirem em absoluto os velhos instrumentos
agrá rios, u m a ev ol u ção l enta, mas criteriosa, vai introduzindo e generalizan do
muitas alfa ias modernas, das melhores qu e a s indústrias mecânicas fornecem à
a gricultura .
O fe rro Ie nceoladc do a rado r oma no, que lavra o so lo, na ocasião d a s
'S emen teir as, a lt erna com as relhas das ch arruas que preparam o alqueive; o
ronceiro O gem ebu n do carro ma nchego, de origem r em otíssí m a, arrasta n do-se
pelas estradas ao impulso de pachorrentos bois, desvia-se da sua d ir ect r iz para
dar passagem à potente e resfolegante viadora a vapor; os toscos arn ei r os de
pele de porco, com que os nossos a vós [oeiravam os cer ea is, cederam o l ug a r a
ótimos crivos de metal ; os car ros de muares, mais completos e m el h or aca bados
que os de há trinta anos, sustentando bojudas e gig antesca s r edes de palha a
gran el, cruzam-se com outros, com o triplo d o mesmo género, em fardos. que a
prensa mecânica comprimiu em alguns segundos, poupando espaço e tem po; a
gadanha simples. braçal. começa a ser batida p ela gadanb.eíxa puxada por q u a-
drúpedes; as ceifeiras tentam suplantar e avantajar-se às foices manuais, e
embora o não consigam por enquanto, é possível que n um fu turo quiçá breve,
novos eperfeícoe mentos lhes conquistem o t ri unfo ; o arcaico e ferru gento cal-
de iro, preso a corda de [ unça, para a tiragem da ág ua n os poços, vai sendo

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A T R A V t. 5 0:0 5 C A MP O 5

substituído p or bo mbas cómoda s. pe rfei tíssim a s; os ancinhos, f orquilh a s e Ioc-


cados, d e a ca bamento rús tico, baralham-s e com similares s uper iores de aço e
ferro ; e por último. co mo con t rast e frisant e e si n tom át ico, os es talos d os açoit es
estimuland o a s cob r as de égu as n a s s uas v olta s donairosa s p el os calcado u r os de
trigo, e os ecos d os m angueis, baten do nrmes n as camada s do centeio , s ão abafados
pelos sil vos e r oncos das locomóveis e d ebulhadoras qu e, a d ois passos de distân-
cia, lab or a m em i gual mister, num afã assombr os o. in a cr editável h á cem anos.
Sem d úvida q ue tud o isto é pouco, comparativamen te com os espa n toso s
progressos e aplica ções em voga nos país es adiantados. Mas qu em viu a lavoura
do concelho de E lv as h á m eio sé culo e h oje r epara n os aperfeiçoamentos intra ...
duzid os de sde então n a sua alfaiaria, te m d e con ven cer -se que re lativamente
muito se tem ava nça do , e que por conseq u ên cia os l a vradores são menos roti-
neiros do qu e pr ete n de m os seus d etratores. D eix em o-n o s, po ré m . d e diva gaçõ es
e va mos a o objecto p r incip al do capítulo - a descrição sumári a dos i nst r u m en to s
da l a voura e a cess órios. S eguirei a or dem a lfa b éti ca, que se me afi gu r a a m elh or
para o efeito d e com pilação e com pulsa ção.

* *
Aguilhadas V a ra s de castan h o com qu e s e g uiam as j u nta s de bo is, ten do na
J ponta um pequen i no agu il hão, com que s e estimulam os a n im ais,
e"n.o ca bo um a pá d e fe rro- a arrilhada. - para lim par O a rad o das r a íze s e da
ter r a q ue se l he a cu mulam entre a s aiveCBS e o mexilh o.
A s aguilha das ven d em-se aos feix es de 205 va ras n a s es tâncias de P ortalegr.e
e nas f eir as do outono.

Agu ii hão V. aguilh.aas,

Agulhas Peça s de madeira que seg u r am o eix o do carro manchego .

Aivecas Àpêndices de m ad eira, d o arado. em forma d e or elha, p rega das obli-


q uam en te n a s fa ces la tera is do dente, próximo do fe r ro. Dua s em cada
a rado, s er vem para al argar o r ego e d es via r em a terra do s u lco ab erto. Gast am-s e
e partem-se muito n o cent ro , s end o n ecessário 'Ienová-las com frequência n o
p róp rio lo cal d a lavrada. O abegão é a entidade q ue p roce de a es ses r eparo s,
com o auxílio do fe rramental, qu e o a com pan h a .

Alcofas Emprega m-se de todo s os tama nhos pa r a div er sos fins, e mõr m en te
para n ela s s e d ar a r ação d e palha e farinha aos bois nas la v-ouras de
singelo, à h ora da m er enda, a o m ei o di a. C ompram- se nas fe iras, fa ze n d o parte
dos utens ílios de palma, q ue se conh ecem pel a desig n ação com u m d e Algarve,
em v irtude da sua proced ência al garvi a. Nas fe ir as, quem precisa comprar
al cofas, golpelhas, es t eieõ es , etc ... díz: - cVou comprar s]gsTve». E depois
comenta: - «O s]gsrve est ã por te.l ou tal preço ... », etc .

212 -
A T R A v t: 5 D O5 C AMP O 5

Alqueirão À medida do alqu ei r e. Posto q u e es teja proi bida para medições de


com pra e v en da, emprega-se de preferên cia a o decalitro, para uso
par ticular, pOI t er con fig u ração mai s có mod a para o medidor.

Alteza V as ilha g rande, d e m ad eira, onde se a massa o pão, p r incipa l m en te o


d e centeio - marrocate - e a s perr u m a s. P ara estas, há uma alteza
exclusiva.

Alviâo Ferramenta de ferro e cabo de pau, com que se a rran ca a cepa do ma to.

Ancinhos Utensílio s de m ade ira u n s e outros de ferro fo rjado ou fundido, de


diversas di mensões, em feitio de pente. com maior ou m enor número
d e dentes. E.mpregam-se n as d ebulhas dos cereais, principalmente n as eiras em
que se trabalha pelos processos an tigos, já pa ra arrastar a palha do solo. já na
limpeza do grão, extrai ndo-lhe os cachos e vá.rios corpos estranhos.

Apeiro P eça de couro, q ue serve nas cs n ga a para a poio e sustento d a ponta d o


arado ou da vara do carro. É, feito de uma tira larg a e com prida d e
co u r o de boi, u medecida p r êvi am en t e, cu j as ext remidades li gam uma à outra
por costura de peq uen as corre ias. D epoi s, é su rrado e amaciad o td com muita
pancada e ro ças, seg ui dos de u nturas com bo rras d e azeite, pa ssando log o a uso
para a dqu irir as quedas pró prias, q ue n ã o mais pe rde em s e am oldand o a o serviço.

Arado O inst ru me nto mais s imbólico e car acterístico d a la vo ura alentejana.


E! construido com mad eira d e azi n ha, sobro, freixo ou m osqu eiro, p r e-
parado a m a cha do e a enxó, reunindo também vários ac essóri os de fer ro, adia nte
m encionad os. S al vo p equ enas modificaçõ es. conserva a fe ição antiquíssima que
lhe davam os roma nos. Mas n ão é o arado p rim i ti vo, como ger a l m en t e se diz. ( 2)
M o vi do por u m a ju n ta d e bois o u pa relha de m u a r es, de cavalar es o u de
asin inos, (I ) l avr a a terra, p r ep ar and o-a para as culturas cere alífer a s e le gumi-
nosas. O ara d o alenteja no, vulgaríssim o. comp õe-se principalm ente de qu a tr o
peças essenciais: rebenejo (re bi ee), dente, garganta e ponta. As p r i meiras duas,
de pois de u.r:.idas po r um a viela de ferro e dois ter ugos de pau, fo r m am a pri-

Is ) O• • p.lro," • Og Uo., d. con........ d. couro Cn>, undo a o ••do bo..lll o. CO III O h, od, u , t ind eir,/lI, ete. , d o ' lCI.eI.do,

.. Og , o••do, p.lo• •••iaü" d. I."oun, a ' ho r


"U••• co. . . .p.lr~tm I o• ••• 0 5n . a rT • •••
~u, por Jmpt dJIII. ato de ciau.... 00 qo alqou OUU' drcu••ll.d• • O ...&10

( 2) O u .do prilll1ti ..o u, WD. . . . . .r. ee .... o.m ..... ciao a o n U'm o. Sc " ' . o • • a ciao d. ,.11.., o cebo d. Il'a. :repu....-
te... o t • • 'o.
Q..-do o iao. ... do.01l o c...al o • o boi • • dop toa 1 ,.11.. a.. ce bo oa rcl>ir. pu . 4u, u.. ' o mal. "di o diri. I- I•
• o tlliaoo • for( . doa .a1mal. pu. i.u o..üa.ato , " ' 4oJ••• M .. b tm., qaaaAo. t ........ d.. m.dm d. p..dz., .. com.-
( o• • l u " O M d. ferro, • tuh"" o do I do r .pnlti(ooo e1a.ol .
T .6610 8 n" , O 110"0 .ort . ... b . o~ at u co.t...u , "'.o r. . . rruir ~" a Ol. , • o uuu d c10Ulot. a utu u,
Cal , . .d oao reprodaaIr. coattltut.. um . i. te u ....1. co1tc (lo d. Nou.~ A. rfcol.. ",u. o u, A:nt6aJo Pú paLli u a. ao ;o . a . 1
O E:l .u.. • "ro"tllo i . !..,oli(io À&r(col. do coo eeu.o d. E I ultahro d. lS9t.
(I) O........10•• j'Ullt o t ol 116 m'llito . ....' d o••l.III. t mpu". t m aI " i r'" i . an do. Com ; a....to. 116 1..... t.IIl
IlIa......uho• • 0• •"u .obtu . A ..&iori. lt.lllL4m I com mo u ...

- 213 -
ATRAvtS DO S CAMPOS

m eiee par t e, a que g eral mente també m se chama arado, (1 ) embora o não se ja no
rigoroso se ntido da palavra . A garg anta e a ponta, liga das pelo processo a cim a
dito. compõem a segunda pa rte, qu e tem o Dome de timão ou t emão. C om o já
di sse, o rsbeneio e o de nte emp alm am -se com dois taTugos e a correspondente
viela. Adiante d o em palm e, próxim o do couce ou r ec tân gulo qu e lh e dá a confi-
guração, o d en te apresenta uma pequ en a co nca vida de , que receb e a espigs d a
garga nta, tendo posterio rm ent e mais doi s orifícios em direcção oposta: o pri-
meiro, perp endicular, por onde Se introduz o sustentáculo do timão - uma barra
d e ferro chamada teirá, alçada a meio metro ; o seg u ndo, transversal. em que se
aloia O mexil1Jo- espécie de ganch o de fe rro que. por sua vez, ampara as aive-
cas, pregadas em baixo. p róximos do lerro de lavrar.
O ierro, de feitio lanceolado, encaixa no dente à fo rça de pancadas sobre o
bico e nos poleAares ou azelh as com que emoldura ao arado.
O rebeneio tem em cima. na parte inferior, a cavidade d en o m in a d a mão-
zeira, para O gan hã o se a p oia r quando lavra.
Já d isse que o timão constitui a s eg unda parte essencial do arado completo,
compondo -se, r epi t o, da AarBanta e da ponta. A BarBanta, de configuração
a rqueada, com uma a b ertu r a perpendicular no dorso para en ca i x e e eci eí tecãc
da teirá, recebe na ex t r e mi da d e dianteira a ponta ou peça 6.n a l. Esta, sobre-
posta à BarBanta, co m o a cabo de di zer , limi ta-se a um pau direito, com qu a tro
buracos no extremo, p a ra , em qu a l qu er deles, entrar a chavel ha que p re n d e o
arado a o tamoeiro e à ce nge ,
O t imão, enteicha (enga ta ) n as r esta n t es pe ça s, enca ixando a espiBa na
concavidade do ara do, ju n to a o couce, ao m esm o tempo qu e a teiró se lhe intru-
duz pel a fenda qu e o a tra v es sa. A q ual teir á é apertada depois com um a cunha
de chanfr o, voltada pare a esquerda, qu e se chama pescás. E sta cunha de sl oca-se
fàcilm ente, el evando-se ou b aixando - se conforme s e quer temperar o arade,
para fi ca r aberto o u serrado. O acto de montar o arado chama- se en t eich ar, be m
como s e denomina enteichadura o seu compl et o co n j u nto. d esde qu e o a compa-
nhem os pertences i n d ispen sáveis, a aAuilhads, can Aa, apeiro, brochas e
corneires.
O arado chama-se can eleiro, q u a n d o o rsben eio fica rel ativame nt e alto e o
dente com p ouca i nclina ção. Apresentando a spe ct o cont rár io, de n omin a - s e
escauçedo,
O tim ão é abafadiço. se te m pouco desenvolvim ento a s u a cur vatura, consi-
d erando-se arcado na hip ótes e inversa.

( I) o tumo de - na do _ d i a da . i'aiJiuc l o .-el,u. a pli ca -.. 1amh ' al ao cODjan t o do ,," .n. j o e de ate• • l'lDm U l'l·
ti do m. l. I'utdto. eOlllo d.ao mia. cl o d. 6.lli . a .I... .I pec... u l.rld.... Ânlm . por oca.llo .lu COrle. a o. ".,0'. • ao pre-
Pil'O .I.. . . d.ir.. - o. p.daco. d. I.alt. co m c". t i f am o. d.o t • • pa u .Dui d ... d.. r .... tI.pu .. Ih .. eh ...... Ir.tio, •
co.o hl• .. coatidaam ,eulmt.l:l l"
N. apltelaclo da h. po u l ad . da . . . Juoeu. 00 cUteemi a.d.. ..I.. aõ... f &e((" el'l'. oUu.--.. : _ . 01"""'. 01'l alUlo
d. lt a t&alo' lr.ti N ..• • - . 0 • • t. l o. d. S icra no a.d 1&1 pUl• •• .• - . H oj. a o. al'.Jo, • • a -.. n u 00 'C• •:I. c..o.. . .
D. ol'ld. II coacIui ((oe o tetlD O e. ((a ulio "mL' . t . ",pl'",a pu. d..i, . u ... j oa l" e homo. (('" n ahalham •• I. ..oo,a.

- 214 -
A T RAv t S D O S C A M POS

Armas As peças com qu e se ar ma a gadanha vulgar. - Coleira de ferro, arti-


c u lad a , p rovi d a de jargunc"bos mui agudo s, com que s e armam o s cã es
r af ei ros dos r eba nhos para lutarem vantaiosamente com os lobos. A col ei r a de
jargunch os nos cã es de gado.. torna-os mais corajosos, não t emendo os ataqu es
das feras, a n t es a cometendo-os com valentia e denodo. O instinto r evela-lhes o
valor e a i m p o r tân cia de sem el h a n te defesa, qu e el es mostram compreender,
sacu di n do u fan os a sua t emível armadura.

Arneiro Nome por qu e vulgarmente se m en cionam to do o gén ero d e cr ivos e


[oeina dor es, p ata lim pe za d e cereais e legum es. À n tiga m en t e, os e rnei-
t OS em prega d os eram. m a n u ais, d e fa brico tosco . com BtOS de m a d ei r a e fundo
de p eles. D epois, pas sara m a u sa r-se os de la ta. d e i dên tica co nfigura ção.. e mais
t ar de vi eram os de arame. un s de m a nivela e ci'li n drc , rotari vos : o u tros, em
forma d e sirend e . E': esc usa do a cen tu a r a s u perio rida de de t odos estes sobr e
os antigos.
O m ais perfeito dos jc elredcres m odern os u sados no concel ho d e E lva s, é
o cri vo Ma r got, q ue só tem o inconven ien t e de da r po uco r endi m en to, en care-
cendo p ortan t o a joei ração.

Arreios V. A presto", de cavalgadura.

Arrilhada P á de ferro no cabo d as a guilha da s, com que se g u ia m as j un tas d a


la v oura .

Asadas P a n ela s m uíto grand es, de lata, de ferro ou de cobre, que de t odos estes
m a t eri a is a s há em a ba s ta n ça nas lavouras g ra n d es e pequenas. As me-
lho res e mais caras - as de cobre - além d e servirem para o preparo e co n du çã o
de comida, co nstituem t ambém objecto de ornamentação das cozinha s e cases d e
entra da dos montes, o que já n ot ei n ou tr o l u ga r. En q u ant o q u e as de u so ordi-
nário se masca rram e es fr egam todos os d ias, as de reserva ostentam-se r esp la n-
decen tes nas p r a teleira s e guir l8. nd8.s, m ist urada s com o restante cobre e a rame.
N os começos do verão os ca ldetr eí.eos aparecem nos mont es para estanharem
o i n t er io r das a sad a s que precisam d esse p rep aro, e para venderem outras novas,
o que por vez es co nseg uem, g ra ças à predilecção da lavrado ra por semelhante s
utensílios. A s a sadas d e lat a a p lica m- se principalm en t e p a r a aqu ecer á g u a e
coag u lar o leite.

Azeiteiras C ha vel h os g r a n des d e bovinos. m u n i dos d e r o l h as, ond e se trans -


po rta azei te e vinag re p a ra a vi a s de ganhões e ganedeiro s. Em todas
as lavouras h á abundan te so r time nto de sta s va sil h a s.

Azorrague C orreia co m pri da , presa a um cab o com argola e chocalhinh o.


Serve para enx otar galin h as, cães, etc., e tam b ém pa r a s er exp er í..
m ent a do p elos ga r otos, co mo co rrectivo de trave ssuras.

- 215-
A T R A v t S DOS CAMPOS

Balamedes T o da a casta d e utensílios de lavoura e outros d e u so doméstico.


de fe ítia tosco , incluindo bagagens rel es, q ue hajam d e transpor-
tar-se ou remo ve r-se. E: te rmo d e calão, m as m uito u sa do.

Ba lde Forq uilha g ra n d e, d e m ade ira , co m que se baldeia a palha das eiras
para as almenare s e ca rros a rm ados com redes.

Baleios P equ ena s vasso u r as d e palha, d e gi esta ou de o u tros arb u stos, co m


q ue n a s eiras se varre, ao d e leve. o grão desemvalhatado e r eunid o
em pelas ou em mon tões, para se li mpar definitivam ente com aux ílio d a s pás.

Banca Mesa co mprid a e est re ita , onde com e a gan h a ria . - Barreleira par a o
fab r ico do q ue ijo .

Barquino P ele de chibo em fo r ma de odre, para va silha de á gua fresca. no


v er ã o, que os ta nadeiras p r epara m co m apuro pa ra seu u so e de
estranhos, a q u em os v endem ou oferecem .

Barranhões Al ~uidaresd e la ta, ele cobre ou de be rre, para as necessidades da


cozinha e para receberem a comida .

Barreleira B an ca d e m adeira de uns zl1l.,zo de com primen t o por 0=,50 d e la rgo,


p ara o f ab rico de queijo. E m ca da lavo u ra costu m a h aver duas :
u m a pua o queijo d as ovelhas, e outra par a o das cabras. Também a s há d e
pedra , m as a exper iência d emo n st r a serem preferíveis as d e m a de ira.

Barricas Da s pequenas, d e capacidade para qui nze a vi nte lit r os, usam-se
como va silha s de água par a os ~anhõesl no cam po. D a s gre.ndes, d e
d uz entos litros ou m ais. vê-se um a. pe lo m enos, n o pá tio de ca da mon te, colo..
cad a em carro a p r o pr ia d o, o nd e s e transporta a água para o ga st o di á ri o.

Barris V a silh am e de lata para a zei te, que modernamen te se têm introduzid o
em s u b st ituiçã o d os od re s. - P equ ena s vasilhas d e barro para águ a.

Belga V. Jangada.

Bocins Argolas de ferro no i n ter io r das m ass as dos carros, em volta dos b ura-
c ós por onde se alojam a s pontas do eixo .

Boquilhas A cessór io d e f erro, sob r eposto nas massas das roda s par a a s r es-
gu a r d ar, b em como as p ontas do eix o e o u t r os pertences.

Borlandejas Artolas q u e s e empregam entre 8S torneies e os bocins das r odas


d ôs carros de mua res.

- 216
ARTE POPULAR ALENTEJANA
J. O Pendão de le~teiro: :I. Corma ; 3 - Colh er: 4 - Botio: 5 - P ri.io 'Para fuer meia ao o mbr o : 6 - Aniteiro.
i - C.nudo$ da ceifa ; 8 . G'. I'.to; 9 - F.ca du matanças; 70 - Cha...õu ; 11 - Po/" .rinho com medida parti
• pó/vora ; 13 - C OPO tie chilre
xr nxvzs D O S CAMPOS

Bor landões A r gol ões colocados nos eixos dos carro, e n tre os lim ões e a s
massas.

Bota.fogo Gancho de ferro. com qu e se bota lum e n as qu eim a das e r o ças.

Bra z ão A r gola pregada na cs n ga d os b ois pa ra substi tuir o s peiro de couro.


E s ta s ubstituiçã o conside r a - se desvantajos a , e por iss o es t á s en d o
pou co u sad a .

Brocha s C o rre ia s tecidas, d e co ur o cru, q ue se p re ndem aos cangalbos para


seg arac em os b ois à ce n ga .

Burro s Tripe ças rús tica s d e azi nha e sobro, q ue os ga n hõ es preparam pata
seus a ssen t o s.

Ca banej o s C es tos de ver ga para a cond u ção d e pão. hortaliças, etc .

Cac h eira C a ja do. de vo lt a m uito pron u nciada, com a. cor resp ondente cach aporra.

Cac heiro O m esmo que o p recedente, mas s em volta .

C a ix ote s D e pinho. d e d iferentes dimens ões, pa ra arrecada ção d e [e rinba s,


le gumes, sal. etc . An t es, a s farinhas e leg um es depositava m -se em
sacas grand es, de pal ma dó A lga rve, não se u sa n do os caixotes.

Ca ldeiros D e fe rro ou de f olha, pa ra a t irag em da á g u a n os p oços, com o au x íl io


de corda . C ada lavou r a ga sta por ano m uitos caldeiros, metendo em
con ta os q ue se perdem e os f u:z:tado s .
O s ga n a dei ros a pro v eit a m - n os como caçarol a s e m armi tas, pa ra p reparo e
t ra n s p or t e dos a lmoços e ceia s, à f a lta de tarrcs.

Cancelas D e feitio portátil, co m pos t a s com pegôes de azinha e varas terís ias (l>,
destina m -se à co n stru çã o d os a priscos d a s ovelhas e dos ba r dos de
todos os Ie nígero s.
C ada cancela r egula por 3 l1l.,7,fiX1 1ll ,OO, co n sta n do de dois pegfies liga dos por
quatro vare jas e d uas tra v essa s em dia go n a l. Um b ard o d e sofrível capacidade
ca rece de 24 cancel a s. As d os redis de ovel has r ecém-p a rida s n o out o no e
inver no, cost umam ser tecid as com giesta, para melhor abriga rem o ga do.

C a ngas A dop t am - s e d oi s tipos: um, exclus ivo p ara bestas e cavalgadu ras;
o u t ro, para bovinos. A carrg a d e m u a res, d e m a deir a d e a zi n h a, com-
p õe - se de t rês peças, q ue f o rmam t rês cu rva t u ras, das q uais se cham a m sua d ou -
( t) Ch lftalll.-u lu lt l., ao. p. u. d. c"I&Q bo urnd o. d. l ho a ba ixo, Ilm d" .. n ul.., )lua .. ')lUnrtftl 1'0 t a bdco
d. caQulu.

- 217
ATRA v t S DOS CAMP O S

TO S a s d uas extrema s, q u e recebem os canAalb.os e que a ssen t a m no s burnis,


assi m como se d enomina meio a do centro, onde se coloca o apeiro para engat e
d o cbavelhão. Ligam a canga aos burnis, colo cad os sobre o pescoço das bestas,
d uas t iredeires, ou berrígueires qu e vão atar na ca beça dos cangalh os.
A cange. dos bois, de procedência e.n âloge à das mulas, limita -se a uma.
trav essa direita, qua tro canga lbos de madeira, e três castelos ou peq uenos paus
erguidos ao cen tro, p a r a , en tres eles, ficar o apeiro. Algumas. em vez dos ceste-
los. têm dois chanfros, e outras um argol ão de ferro, dep endurado - o bree õo,
que s u p r e o apeiro. Os cangalb.os, a pr esen t a m em bai xo duas mossas para, em
qu alquer dela s, aboto a r a broche. À s brocbas e as carneiras são os únicos
object os que prendem os bois à ce.nga .

Ca nga l has Engrad amento de m adeira e correntes de f erro, p ara nas bes ta s
com albarda se tran sportar em cântaro s, pequ enas b arricas ou
a sa d a s . Usam-se principalmente na co n d ução de águ a , l ei te e co mida , em vasi-
l has que se ad aptem a o engradad o.

Ca ngalhos P eças das ce.nge s.

Ca ngão Pequen a ce n ge, a p ro pr i a d a a um 56 a n i m al, q u e p u xe ca rr inho o u


a ra do de va r ai s.

Can iços Esteiras d e ca na s ou eng ra dam en t os de ripa para enxuga do qu eij o,


ou depósitos de pão de centeio e de p errumas.

Cântaros Usam- se de b arro, de lata e de cobr e. O s d e co br e, como vasilhas


p ara ág ua , existia m antiga m ente em t oda s as «casas» g ra n d es, e
aind a h oje pe rs istem em alguma s, r eco m endando-se p ela soli dez e d u r ação.

CARROS

Os carros em pregados n as la vouras, co ns ta m de q u a tro t ipos : carro a le n te -


jan o, de uso co m u m , par a mu ares ; ca rre ta; car ro mauch eg o, pa ra bois, e
ca rri n ho d e var ais, para uma be sta.
Todos se com põem de q u at ro p eça s principais : - leit o, eixo e dua s r oda s,
peças que se constituem com ou tras s ubsidi á rias, adiante r ef eridas, um a s de
madeira de diferentes q u a lid a d es, predominando o azinho e o sobro ; o u t r a s d e
ferr o, como é vulgar em t odo o país.

Carro alent ejan o , d e uso c o m u...!!! E' o m elhor e m a is completo. apesa r de


ser exclusivamente puxado por muares.
Gira so br e duas rodas grandes, diâm etro de l m ,50 a 1 m .55, t en do cada um a
1 2, 1 4 ou 16 raios, a m assa e as co rr es pon d en t es pinas, be m co m o um a r ex pesso,
co m o pezo de 60 'kiles, aproximadamente.

- 218 -
ATRAV t. S DO S CAMPOS

Às r odas prendem ao eixo por do is pregos curvos - as torneies - qu e o


atravessam nas pontas, im pedindo a deslo cação, e ainda por duas argolas.
denominadas borlandeias.
S obre o eixo (1 ) nrma o leito, composto com a peritica, limões, trevesses,
tsboado e t eleires. M ede na base, i sto é, da t aleira da frente à d a reta guarda,
uns 2m,55X l m,15.
A perítica s usten ta t odo o emba rrota do , p r olonga n do -se dois metros para a
fr en t e, como vara de en gat e, e quinze cent ímetros p ara t r á s, a formar o rsbich.o,
simples or nato, s em n enhuma aplicação.
À s travessas, passan d o at ra vés d a peritice e do s limões, fo r m am o viga-
mento q ue s u ste nta o t abo a d o. D os d oi s lim ões - bar rot es de quatr o faces,
paralel os à per itice, tend o de permeio as táb uas - ergue m-se os fu eiros do
engrad a d o. pa r a resgu a r d o d os volum es a tran sportar.
C a da en grade mento consta d e oito a dez f uei r os ( li ) direitos, de 6S a 70 cen -
tímetros de al tura. h a r m õnicam en te dista n cia dos e i n tro d uzidos n os fu ro s do
t endal e n os d a face superior do lim ão.
Os t endais restringem-se a d ois p a u s roliços d e castanho. colocados hori-
zontalmente n a s pontas dos fue'iros, e por entre os orifícios de que são providos
para esse efeito. afim de lhes dar em coesão e solidez. E em m u itos carr os. as
ex tr emida des dos ·t en dais. na t r as eira. são encim adas e ligadas por u ma travessa
d e meia volta - a ponte - que s e lhes s ob r epõ e e at arrac ha pa r a r eforço e o rnato.
O leito monta, como d isse, sobre o eixo, segurando-o dois espigões de f erro
- os mete-bo is - que s e tiram e põem a pancadas d e mar t el o. a rman d ó-se e
desarmando -se com extrema facilidade.
O carro de muares. s endo. como é, o m ais adoptado par a o transporte de
gén er os e materiais diversíssimos, cujo a lojo dem anda carreg o de configuraçã o
e preparo variado - modifica-se -Ihe o engradado do leito, consoante à n at u r eza
e volume da carrada . (3) P a ra len ha s e outros arti gos enca ixotados ou ensacados,
basta a en fu eira d u ra ordinária e as cord as chamadas «d e carregar». P ar a a p alha
a granel, empregam -se fueiros e travessas especiais, muitíssimo a ltos, de onde
pen d em red es eno rmes d e linho o u d e f u u ce , que, de sde a altura de tr ês metros,
apanham todo o cor po d o carro, t er min an d o na dianteira e reta gu arda por
duas gran des e bojuda s bol sa s, a quas e roi e.rem pelo chão.
Nos a carret os d as sear as em r am a e nos dos fenos. refor ça-se a enf u eixa-
dura usual com quat r o fuei ros a ltos e ponreag udos, q ue se introduzem n os
gat os da fa ce exterior do s lim ões.
Para a r em oção de terras, estrumes e t od os os objectos s usceptí veis de

(II Ad !l' JloaCOI ..ao'. 01 . lxol do . c..rrOI d i "ulrIl . fl m lo dol d.....d..ir.. d. ....inha . l ohro...ol qul lro ou ir. iJto ,
M.. de h' U .OI JlIU . cl. "Li-Ie introd ulado o I bum .. di chtO' do fur o, JlO,to qu .. cm mult.. I,," our.. aiad.. lub.ill l o
UIO ..a d , o.
(I) O. i tlllU:OI Clll lu...... lU d . m .. adre . I XCIJl10 01 (( tII .. tro d•• l"' lumid..d.. q tll • • 'm , . re 1. lio di f.uo ...nu" ch ..dol
..o te ad .. l• • Im ltutldOI a .. t .. llu",
fi ' Volum.n di ur coa form. o ar t i.o qtll.. comJlh • un..d• • AI di Itahl . c n u .il cm um... r. aol I l o Itmpu m ulto
alt.. d i clll6' au fio plr ld ..I ,

- 219 -
ATRAv t S DO S CAMPO S

caírem pelos flancos do s f u ei r os, usam-se os tsdpsds, que transformam o l ei to


numa verdadeira caixa, de capacidade aproximada a um metro cúbico. Dois elos
taipa is encos ta m às enfue íraduras, ved a n d o - a s em todo o comprimento e altura;
os outros dois - a s compor tas - resguardam a frente e a traseira.
P or vezes os taipais são substituídos por t ecidos d e esparte, que s e denomi-
n a m espartões, e q ue se t ornam vantajosos p a r a a condução d e melancia,
melão, etc.
Enfim, é tã o variada a aplicação do ce rro de muares, que ainda é ele o
veíc u lo predominante na co n d u çã o de gente do campo. D escoberto ou «tapado...,
p ela fo r m a ad iante mencionada, puxado por bestas de todas as condições, desde
as de somenos valor até à s mais cu stosas e b em arreadas. vemo...lo com frequên-
cia nas via s públicas, em marchas pach orr en tas ou vel oz es, acumulando-se à s
d ez enas nas feiras e arraiais da província.
O carro «ta pado» é provido de uma armaçã o revestida de toldo de lona. em
branco o u oleado a cores. como abrigo â. preservar os viajant es do s r ig ores do
so l e das ch u v as. E ssa armação co ns is te em q ua tro aros d e ferro ou de verga
de casta nho, so br e os tendais, tendo p or cima o ca niço e o pano do toldo.
Quand o a armação é p ortátil, que se tira e p õe cada ve z que serve ou tem
de se rv ir. d enomina-se «bar r a ca», e com o tal s ó a adop tam actualmente os
campónios de p oucos r ecursos. J á não sucedi a a ssim h á bons cin co enta anos
atrás, temp os em qu e tão exíg u a com odida d e só era usada por alg uns lavradores
d e meios. E di g o alg uns por q u e a maioria. s egu n d o a tradi ção. não entravam
nessas fo fas. Caminhavam em ca valgadura s de albarda e em carros manchegos,
d escob er to s, puxados a b ois.
A arma çã o ou tap iço perm anent e, torn a os carros mais confortáv ei s e v is-
tos os que a outra à li geira. p or s er a companhada de cer tos a cessó ri os e comodi-
dades rela t ivas. q ue mu ito os melho ra.m. O que a ssim é preparad o chama-se
cburrião. V eja-se ad iant e, n a alt u ra co rrespon dente a esse n om e.

Carreta C arro de for mas menos a p u radas que o precede nte. com as r odas de
d ez a doz e r ai os ca da u m a, for ma ndo o diâmet ro de 1 m.30. O leito
mede 1 m. 88 X 1 m ,8, exclui n d o os p ro l ongamentos da perítica e d o rabícbo.
Guarn ecem-n o seis a oito f uei r os t oscos, de cada l a do, muito comp ridos para
as carradas altas e curtos para as b ai xas. E., em qu alquer d os casos. desprovid os
d e t endais. A peritice r eg ula por u n s 2 fl"50. a lé m da teleire, prolongamento
indispensáv el p a r a um a junta d e b oi s. N o restante. a carreta a ss emelha-se ao
carro comum. p ode n do ser puxada indistintamente por bestas ou b ovinos, se
bem qu e se presta mais para b ois. Em regra, só se emprega nos acarretas das
searas. nos d os f en o s e n os da s lenha s.

Carro Manchego E' o mais antigo de todo s os veí culos usad os na lavoura.
D e construçã o p esa dí ssim a e bastante sólida, suporta cargas
imensas. resistindo e aguentando-se nos solavancos dos caminhos escabrosos.

- 220 -
A T R A V J!. S DOS C AMPOS

tao vulgares n os n ossos campos, e isto devido à estr utu ra an tiqua d a do seu
roda do. E n qu a n t o que nos ou t r os v eículos, a s ro das gira m sob re o e IXO . no
velho carr o manch ete sucede exacta me nte o cont rário : - o eixo é que gira
sob re dois vãos especiais, pendentes dos lim ões, cada q ual formado p or d u a s
p eças de madeira - a 88u/ha e o r eco cão - e é dess e g ir o q ue resulta o m o vi-
m en to das r oda s e po rtanto o do ca rro. ( 1) M o vim en t o custoso e d em orado. qu e
produz um a chiadeira doI en t e e ag uda , quando caminha va garos o. verga n do ao
peso d o ca r regtrio. A r ot ação do eix o r ece ndo n a clxumeceire produz esses gem id os
sin g u l a r es -a can tareJa ca racterís t ica e in con fun d ível. qu e s e o u ve d e m uito l o nge,
sobretudo à n oite e de madrugada. em so n s p enetrantes, d e s ugestiva m elancolia.
O l eit o do carro manchego d e l "",80X 1 rD ,18 é ig u al mente to sc o, te n d o a vara
o u perit ica 2 11I,50, con ta do s, é claro, d esde a teleire, a té à pon ta . À s espigas que
prendem a o eixo em vez de sere m d e f erro, co m o os mata-bois d os o utros ca r ros,
re su m em - se n umas peças d e pau, a q ue já aludi - a a8ulhIJ e o reco cã o - peças
q ue passando perpendicular m ente a tra v és d os lim ões e da ch umsceire, p rolon-
g a m -se e r ecurvam para baixo, de mod o a deixa rem , entre a m b a s, vão su 6ci en te
para o giro do eix o, co m o já di sse. O s Icei ros, p rí vedcs d e te ndais são com-
p rid o s ou curtos, conform e a n a tureza das ca r ra das.
O car r o em q ues tã o, além d a s parti cularida de s sin g u lares que fi cam refe ri-
da s. d est a ca-se t amh ém pela consti tu ição d as s uas dua s rodas, basta nte diferen-
t es d a s dos outros carros. N a s d os m an ch egos nã o h á m assas, n em raios, n em
pine s, ma s sõmente cãibas e miulos. E os aros de f erro, em vez de In te iriços, d e
uma só bar ra , co n sta m d e dive rsa s lban t ras p resadas à s caibas, co m p r egos de
g rande s dimen sões .
C a d a r oda, de 1 11I ,12 de di âm etr o, compõe-se de duas cgib es , q ue lhe fo rm am
a circunfer ência, e do miulo ou prancha q u e se lhe a travessa a o cen tro , e que
no m ei o. num buraco q u e dra n gula r, r ecebe e a ta r r a ch a a ponta do eixo.
E m res um o, o mesmo carro, n ã o obstante o s eu f eitio pesado, há -de a in da
persis tir por muitos anos, posto q ue j á n ã o ten h a o u so que t ev e o u trora .
S e m e mbs t go , n o a tras o e d esleixo de viação ( 2) que infelizm en te se observa
por essas h erdades fora, conv ém u sá-l o em determinad as circunstâ ncias, n a s
zonas d e maus caminhos.

Carrinho d e varais À p art e a r ed uçã o das f ormas e a s u b st it ui çã o da per itice


por va r ais, d e q ue toma o n ome, é em tud o ig ual ao
carro co m u m , p róp rio pa ra p a r elha .
(1 ) o t ipo mal • • oti,o dOi u no. do. r OIll. OO' . o DIllu tr um. t.iD h . rod .. ch.i•• e .pru eo,h'" ut. pud u.I. r1d. de
.11' 0. d. 'e r Dot. d•• 1111' .lo, J uu , oJ.Io' , mlla lJ.. c. J. um. de um. , ".rl.." ceDlr.J, d e lor... t/u.J"J• • C,.III Up" .J., , obn :
01 e;.ol J Il PIU . o. C!DaI. Ir.m ' Du o,uldOl de pino. (too riUOJl. ) n doDdo. , II' Tlllitll:. à o· lb.. , b u IODn o , ano. E u. modo d.
ee....u'G( l o Iam· .. 0:00 ",.....10 .ti hoie.m P or lo,a1. t. . iod • •0Dn " 11 dilO q Ui O. iJld" c.oll d. IIh. Fo nn ou COJl.uo rm
o. n a' cano• .
J.,.,
R.•• I......" . Co up J 'orl1 . ..r J'HIJ I. J u d orrJ o ppc metltJ de, M . chi tl u I'H ulII. nil• • • P" . 15.
Cd Apun d• • an. doru .lu , u :adu ...tI. . . .1.1• .1.. do Al c.nt. io u ta UIII nt. lb.dOl por ""'''IIU O' ' ' utndu, a1' IIIllU
d. o,ullld. dc. PÓDUU 11I11110 dl.cad....i , bnrlldo · .. • ti q... .,1 0 p....m d. mno. puulo • • DO d. ......idli u d. o a Oll ou tr o
'0.80. 01' _ O. ' .IIIPO' . fuI. do• .lu , n .. du po..o.( 15u, POli' " u tud • • pouo.m • ' " '" POIlC" uti o Du m d. plor '",1 II r. do
d. ' 00" ..... ' 1 0.

- 221 -
ATRAv t S D OS C A M P OS

Destinado a u ma s6 besta.. o carrinho alodído usa-s e mui to n o s erv iço d e


xecova gens dos montes e nos transpor tes de hortaliças, á gua, etc.• ha vendo
lavouras que emp r egam dois e três. À m edida que se vai abandonando o sistema
de cargas em ce n gallxas e albardas sob r e o lombo de burros e muares. aumenta
o emprego dos carrinhos, com vantagem para Os donos e alívi o par a. as bes tas.

Ceifeiras A pesar de traduzirem um adiantamento no progresso da agri cultura,


o emprego quase experimental que delas tem fe ito alguns lavrad ores
da regiã o el vense, fo i.. ao que parece, tão pouco satisfatório qu e os mais deles
n ã o têm p rosseguido com a inovação. abandonando-a como d es vantajosa por
enqua n to, sen do 8 principal razão es ses maquinismos funcionarem mal nas
lavradas d e rego largo e su lco aberto. sistema usado na s seara s de sementeira
outonal e entã o Indispens áv el nos te r ren os ú mid os e alagadiços. No en ta n to.
d evemos crer que com o t empo, e ap ós alguns a perfeiçoamentos qu e se lhes
venham a in troduzir, as ceifeiras hão-de implantar-se a valer entre n ós, nas
zonas que m elhor se prestem à sua adopção. Nestas condiçõe s, ningu ém deixará
de a s empregar, como de há muito s e empreg am a s d eb ulha d or as. Pois uma s e
outras foram a o mesmo tempo ofe recidas e apresentadas à. experiência d o lavra-
dor, n ão s ó pelos ag entes das casas construtoras, mas também pelos poderes do
estado, no louvável intuito d e desenvolver o progresso d a a gricultura. (t) Mas-
coisa notável- as debulhadoras pegaram e multiplicaram-se , ao passo que as
.ceif eir a s quase se pode dizer que ainda não sairam do campo de ensaio s, de
resultados práticos algo duvid osos . E é pena que isso aconteça.. d ada a. falta de
braços que sempre se faz s entir p or ocasiã o das ceifas. não obstante o avulta-
dfssimo re for ço de ceifeiros que a s Beiras feenecem ao Alentejo .

Charruas Introduziram-s e h á u ns 25 anos.. mas já ante s h aviam sido experr-


menta da s p O'I vários lavra dores. Todavia, s 6 começa r a m a usar-se
efica zmente aí por 1880. difundindo-se mais n os ú ltim os dez an os . A s qu e se
em pregam. são a s de tipo p equeno. para la vouras su per6.cia is, conhecidas por
cbarruecas ou a r a do s d e e ívece m óvel, para uma jun ta ou pa r elh a. d os n." 1 e 2
e sua s varian te s. E stas p equenas charruas, são d e reconhec ída van ta gem n o
preparo dos al queives. cu ja la vrada 6.ca incomparàvelmente superior à d o
arado romano.

Chavelha P eça d e f er ro qu e p r end e a p on ta do arado a o ap eiro da ce n gn.

Chavelhão À chavelha em tamanho m aior, a p r opria da a o engate do ca rro de


m u a res. Distingue- se pela cabeça ou prolongamen t o supes Ior, de
un s d.ez centímetros a cima do orifício da va ra on d e engata .

o
(tl mh.J.lhlo .I.. ohr .. pdhlJcu l.cllll ol1 h' lUlO• • u Inu doru do dh lrilo d. Po r hJdu dll u u ltu rd4 l1ia...' r!_
c oi... u mo ceHdr. . . d. hIlIL. dor ", p.la fona •• con éli,lI.. ClII. ..dJ.ou u fu lu l, qll. ado Iraur d.. d.bo IL. dor...

- 222 -
ATRAV!. S D OS CAMPO S

C havões Timb r es d e madeira de buxo, para m arca r bolos. caprichosa e linda-


m ente esculpidos a canivete p elos ge n adeiros e outros h om en s do
campo. Fabricam-nos por entretenimento e vo ca çã o, na s horas vagas, a ssi m
como m uit os outros objectos de madeira e chavelho . p ara oferecerem 80S amos
e a pessoas de amizade.

Chocalhos Veja-se o arti go Ga nadeiros. na página 102.

Ch u rrião C arro de cómodo pessoal. puxado a parelha de m u a re s presas à


cange e arreatas. (1) Este car r o salienta-se pela arm ação ga r ri d a qu e
os ten t a - barraca permanente e luxuosa, em forma de canudo - com ou s em
assento s no leito -mais u sado pelos I ãvradores e s ua s famílias, do qu e por
g en t e .d e outra s classe s.
A s u a introdução n o concelho de El vas data de há 50 a 60 anos, época em
q u e se d esenvol veu o gos to pelas parelhas d e muares, e, consequentemente, po r
est e g éne ro d e veiculas, único compatível com o a tr as o da viação e dos costumes
do temp o.
O churrião compõ e-s e de todos os pertences essenciais do ca rro com u m .
a crescendo-lhe a armação do t ej ad il h o (aros. ca n iço. etc .), com re vestimento de
linh a g em olea da a cores m i r abolant es na parte exterior, e, interiormente, forra d o
e de corado com estofos, borlas. gua r n ições e cortinados de juta e outros a rte-
factos, de maior ou m enor custo, segundo o gost o o u os meios do p os sui dor. (2)
Q ualq uer destes tra n sp or tes, pintalgados de verde, a zul, en carn a do ou
amar elo.. com traços, inicia is do dono e data do a cabamento, a cor es berrantes..
espalha fatosas, se n ã o d en otam ele gância , també m se lhe não podem chamar
feios. Têm pelo menos o cunho ret intamente alentejano. que os torna incon-
fund íveis. E algu ns impo rtam em subido custo, pelo valor dos tecidos que os
guarnecem interiormente. O s churriões privados de bancos - e não os têm
muitos, incluindo mesmo os l ux uosos - a falta de asse ntos. é suprida por
almofada s presas às enf u ei r a du r a s e por um esteirão e colchão de lã. so bre o
tabu ado do leito, a que se adiciona vistosa cob erta d e rama gem. D es ta maneira,
quem se transporta em churriâo sem bancos, em ve z de ir assentado. vai encos-
tado às a lmofada s d e pernas estendidas s obre o colchão, quase deitado. N ã o é
das posições mais incó modas, sobretudo se o l eito a ssenta em molas d e a ço.
com o já é fr equente. Se, porém, fa lta essa vantagem, mal vai ao passageiro .
Às tá buas e as «m olas de azinha» ( a ) p õem-lhe os ossos a rabiar. Q u e, se fo r

ta ) A. pa n U. .. Clu. u .halh . m .0 ch lll'l'llo. do p an u .. efcl lo e.. . . la...d.. com ..I. tuo&. &. P% U IO" D tn o. mumo.
dUlu.m.,. .. 'v1.. a .. &. .. c.abruua.. ou c&.6cud ... co m l n a j.. . bodõe. a. tuido • • m cor c.nlIU'ÚQ o uU" UlIlIt O
..I..... q ue eacobre m a m. lor pU II d. cabaça d o. '1I Imail.
"1'
( 2) A cOllfcc clio do . chllltl õ.. co.tum a e:uc" lad. por u rpilll abo. de urn&. or d ill l.rio l. ou por c"rio.o• • fam .do&.•
• rt.lto.o, com "ueJ. pua pllO /orle ... S. o cano ' ar mad o .. pre parado 100 moa I' , .. fiU... moe u do !a YCado r .upcdlltc.,dem
., a obn e co.dju..a m o ar ri" ••
(a) Fr.... plc u"n pOICl O' ' 1 . tnd us • • u.fll d a d. m oi ... to m• ., do-.. por ..moi .. de uillh o _ o. lim a". • o .Ixo etu•
• .m h l. ei le'llD. u"lu~I ... Ião a m n ,ra d. uf" id. m . d.ln.

- 223 -
ATRAvtS D OS CA M P O S

em ass en tos, decerto não vai melhor. Sofre igualmente as sacudidas dos topes e
estonteantes cabeçadas. No melhor dos casos irá sempre fazendo mesuras, ao
impulso dos solavancos.
Quando o chunião começouaap a recer DO Alentejo, somente o usavam 05
lavradores de fortuna . D epois generalizou-se imenso até 1878 ou 1879, época em
que principiou a decair. Na actualidade mais se lhe acentua a decadência, posto
que Das feiras e romarias a ind a apareçam m uitos carros de semelhante tipo,
mas decerto em menor nú mero do que se via há vinte anos.
Pela redução progressiva q u e se lhes nota , tudo leva a crer que está pró-
ximo o se u fim . O s carros de molas denomi nad os cher-ê -be ncs, se ndo. corno
são, m uito mais cómodos que os churr í ões, emp u rra m estes pa r a f ora da estra-
das moder n as, a niq uilando-os em absoluto, ou red uzindo-os a um a circula çã o
humilha nte. que não irá além dos caminhos escabrosos, abertos ao acaso.

* * *
Coadores Panos de estopa, por onde se coa o leite quando chega do bardo e
se vasa dos cântaros para as asadas. - P ed a ço de casteleta ou de
burel, para coar a solução do cardo macerado que se mistura no leite, anm de o
coag ular.

Cobra Corda de cabelo, provida de colares do mesmo género, com que são
encobradas as éguas para , nas eiras, debulharem os cereais reunidos
em calcadouros.

Co r d as Àrtigo d e que precisa haver abundante p r ov isão em todas as lavouras.


Usam-se de j u nça, de esparto, de linho e de ca belo. As mais usadas
são as de junça, pela sua extrema barateza e valor, que n ã o despertam ideias de
furto aos serviçais que a s empregam , como acontece com outras melhores e
mais caras. Sobre o custo e dimensões das cordas, veja-se o artigo Cordoeiros,
na página 96.

Carn eira s Correias tiradas de couro cru, com que se prendem os bois à ca ng e,

Cornas Vasilhas de chavelho, COm rolhas de cortiça, em que se transportam


merendas de carne, a zeiton a s, etc.

Cou ros O s das reses bovinas que morrem , reservam-se para se retalharem em
correame destinado a ape iragem das m uares e dos bois. S e a existên-
cia é superior ao gastos do consumo, os couros de sobejo vendem-se 80S peleiros
amb ula n tes, que os p rocu ram de vez em quando.
S e u m la vrad or ca rece de couros para s peirs8ens, em virt ud e d e lhe não
m orrer ga do, demora qu a n to po d e a compra desse a rtigo. Uma s up er sti çã o vul-
gar diz-lhe que em com pr a n d o cour os, te rá morrinha nas r eses.

- 22r. -
ATRAvtS D OS C AMPOS

Debulhadoras R ep r esen ta m a a lfaia agrí cola m od er n a m a is p erfeita e vanta-


[osa, posto que o se u custo seja relativamente caro e inacessí-
vel à bolsa do pequeno e d o m edia n o la vra d or .
As debulhadoras mecânicas estão de há m u i t o introduzidas n o concelho de
Elvas e nos limítrofes. Quem primeiro as empregou n es ta região, foi o fal eci do
J oaqui m Lú cio de C out o, lav rador abastado. inteligente e empreendedor . que no
ano de 1879, tendo u ma seara i mp or ta n tíssima e reconhecendo a i m p oss i bi li-
dade de a debulhar a tempo com a s suas éguas, a lugou, para maior despacho, a
S ebast iã o Alvarez, de Borba, u m a debulhadora R..snsomes. de que fez uso.
P ela primeira vez silvou então u ma locomóvel de mãqutna agrícola nas u b ér ri-
mas campinas elvenses. cabendo essa honra à herdade da Gramicha. a poucos
quilómetros de Elvas. O s silvos levaram longe a fama da nova máquina, mara-
vilhando os campónios que ouviam a descrição do engenho e mais ainda os que
o viam funcionar.
a próprio sr. Couto tão satisfeito ficou com o resultado que. poucos anos
depois adquiria uma debulhadora Garrett. de que usou até. trespassar a lavoura.
Mas ao tempo de o sr. Couto adquirir a Garrett, iá os srs. Reynolds. de Estre-
moz, haviam utilizado outra máquina Das eiras da sua lavou-ra do Reguengo de
Baebeeena . Todavia, ninguém mais dos sítios abraçava o novo sistema de debu-
lha , que, apesar de perfeito, era cs eo e mal compreendido pelos trabalhadores
rurais.
De 1881 a 1889 nenhum lavrador de E lvas adoptou as debulhadoras, já pelos
motivos expostos, já por que a agricultura alentejana debatia -se, então, a n g u s-
tiosa 80S efeitos de uma crise medonha que a arruinava. N ã o obstante. o tempo
e as 'ideias da época venceram todos esses obstáculos. como adiante se verá.
Nas circunstâncias que se davam. não é para admirar que fosse preciso o
decurso de oito a dez aDOS par a se desvanecerem as dúvidas e desconfianças
que sempre acompanham todas as inovações. Historiemos:
No ano de 1890, encontrando-se po r acaso, num comboio de viagem para
Lisboa, os ses . R a miro MarçaI, agrónomo do distrito de Portalegre. Francisco
da Silva Lobão R e sq uilb e, la vr a d o r em Santa Eulália, ambos encetaram pales-
tra sobre questões agrícolas, vindo à tela a especialidade máquinas.
D isse o primei ro a o segu ndo q ue. se os lav radores quisessem empregar cei-
feiras e debulhado ras mecânicas, julgava possível obterem- nas do govervo, a l u -
gadas, bastando para isso r eq u erê-la s com empenho à direcção de a gri cultura.
mediant e o co mp ro misso de l hes da r em tra b alho av ultado . A u m a e outra coisa
se pro ntificou imedia ta m ente o s r . R a sq ui lh a , acordando l ogo co m o ilustre
agr ónomo ire m os d oi s no di a seguinte à pr es ença do SI. Elvino de B r i t o,
dir ector geral de a g-ricultu ra. pa ra lhe ex porem a p rete nçã o e p edir..lhe defe-
rim ento.
Assim o fiz eram efectivam en t e. obte n do do Sr. Elvi n o as melhores
promessas.
Em abril do m esm o ano, visitando a ci da de de Por talegre, o mini stro das

- 225 -
ATRAV:tS DOS CAMPOS

ob ras públicas. sr. F r ederic o A r ouca, o S I . R am iro, num disc urso qu e pron un-
cio u no banquete dado em honra daqu el e estadista, lem br o u , entre o u tros alvi-
tres de protecção aos lavradores. a conveniência do Estado lhes alugar máq uina s
agríco las. de que eles se p udessem ut ili zar com pro vei to, sem grande sa cri fício
pe cuniário.
Como representante do governo, promete u o sr. Àrouca dispensar essa
con cessã o, que já de há muito existia na sua mente, a par de out ras
medidas que tencionava pôr em prática para atenuar a crise agr ícola que naque le
tempo flagelava o país e especialmente o Alenteio.
Com efeito, ao aproximarem-se as colheitas chegaram as prometidas máqui -
nas. N 8 estação de Santa Eulália desemba rcaram uma locomóvel e u m a de bu-
lhadora .Clayton» e uma ceifeira eOsbcrn ee . Na de P or tal egr e ou na do C rat o.
:6cou uma compressora .
A debulhadora serviu por bastante tempo nas eiras dos SISo Francisco da
Silva Lobão Rasquilha e J os é Joaqu im da Silva. O primeiro aplicou-a à debu-
lha d o centeio na herdade de A lmeida. freguesia de Santa E ulália. e à do trigo
na do Revelhos, concelho de A rronches, e Reguengo , freguesia de Barbacena.
O segundo emprego u -a em centeio, n a herdade do B a l clio do C o n d e. junto a
Santa Eulália, e também em trigo na eira d a s Longas, freguesia da Ventosa.
Nesse primeiro ano o a l ugu er da c C layton» fo i de 10 o o sobre o ve lcr dos
cereais debulhados, e mais os seg uintes o n us p a ra o l a v r a do r :
Prévia reparação dos ca minhos p or onde o uvessem de transitar as máqui -
nas, s ua con d u çã o para o local d a ei r a ; re conduçã o p a re. o depósito ou p onto
q ue particularmente se convenciona sse, e finalmente, f or ne cimen t o d e água e
combustível, bem co mo vasilhas pa ra águ a .
Todas as d es p esa s feitas com o pessoal em prega do n a d ebulha fi ca vam a
cargo exclusivo do governo, sem a menor re m u ne r ação p o r pa.rte do agricul to r .
R eco n h eceu-s e a carestia de se melhante aluguer. a inda onerado po r co n di-
ções gravosas, e por i sso. e em res ultado de propostas a p resenta da s às estações
competentes pelos agricultores srs. L obã o Rasquilha e M igu el de S á N ogu eira.
determinou -se superiormente q ue os d ez por cento fossem r edu zi do s a sete pa ra
o trigo. seis p a r a o cen teio e ce va da. e cinco p a ra a a v eia . s ubsisti nd o n es t es
novos co ntratos todas as dema is condições at rás d escrita s.
Este red ução foi re cebido com u n ânim e a pla u so e log o s e lhe r e con h eceu a u ti-
lidade. O número de propostas para a s debulhas d as colheitas de 1893 passo u a ser
mui t o superior às dos anos anterio res em q ue se pagava a p rimitiva p er cen t e gem -
Mas. ou porque a qua nttdade d os cer eais a d ebulhar foss e gr ande, o u por-
q ue as máq uinas gastavam muitos dias n o t ra nsporte d e un s pa ra o u t ro s sítios,
é eer tc que a d eb ulha d or a n ã o pôde satisfazer em t em p o oportu no a to das as
propostas apresentadas e aceites. E co m o a época das co lhei tas ia decorrida. sem
que a s m á quina s saissem das eir as em que t rabalhava m n os co n celhos do Crato
e P ortal egre. os proponentes de El vas e os de Arro nches. d esistiram. das suas
proposta s, à excepção d os SIS. Lob ão Ros quilha e Jos é da Silva, esperaram.

- 226 -
A TRA v tS DOS C A M P O S

mas que só foram servidos quase no fim do verão, demora que muito os contra-
r iou, como é fácil de presumir.
D e resto, a debulhadora do go ver n o ainda depois debulhou parte da sea r a
do D r. Gorião, na V árzea Redonda. concelho do Alandroal, distrito d e E vcra.
Contudo era m anif esta a insuficiência de uma ú n i ca d ebulhadora na sexta
região agron ómica (distrito d e P ortalegr e). r egião e eeé s exte n sa , on de h á zonas
cerealíferas de import ância sup erior.
Impunha-se por conseg u in te a ne cessida de de os poder es p úbli cos adq uiri-
tem outra má quina análoga , esta belece n do -se dois d ep ósit os oficiais. um 8 0
norte e outro a o sul d o distrito . O f un cionamen to de u ma só de bulhado ra t or-
nava-se desvantajos a pa r a os a gricultor es e p a ra O pró p r io E st a do . A s máquinas
quase que ga stavam tanto tem po em caminhada s com o nas de b ulh a s pr õ pei a -
mente ditas.
O inconveniente era poi s manifesto e u r gi a re mediá -lo. M a s como a so l u-
ção demorasse, r es ol vera m ir solicitá-la verba lmen te os srs. August o d e A ndrad e,
grande propriet ário do concel ho de E l va s e L ob ã o R a squilh a, la vra d or no
mesmo, os quais se apresentar am d e l a cto e pa r a esse fim ao sr . Elvino de Brito,
que logo prome teu satisfazer- lh es o em pen ho, com a máxi ma boa vo ntade.
E.fectivamente, p ouco t em po depois, a Direcção Gera l de A gri cultura,
remetia para Elva s u m a segunda d eb ulha do r a ...·C lay ton xo, afi m d e ainda servir
nas colheitas de 1894.
Mas n ão foi isso p ossível, porque qu ando a nov a m áquina chegou, j á as
debulhes haviam a caba do . Em t od o o caso, as pro vidências para os anos futuros
pareciam asseguradas. E es ta vam com certeza. Nesse entretanto, o u passa d os
meses, foi definitivam ent e r esolvida a instalação de dois d epósi to s d e m áqu inas
agríco las no distrito de Portalegre, providências que s e t omaram logo . m ontan-
do-se um depó sito ao n ot t e do distri to. com sed e no m onte d a Cru ci eira, concelho
do Crato e outro, zona do sul, na aldeia d e Santa Eulália, con cel h o d e Elvas.
Entre os a gentes do gove r n o e os senhorios d os prédios que se ad apt aram a
depósitos, a cordou-se nê o pagar ao E stado renda alg u m a, m as em compensação
terem a preferênci a os d onos do s armazéns no al ug u er e u so das m âquinss.

Ao passo <ru e o governo e os seus delegados nas regi õe s agronómicas do


sul, concorriam para o em p r eg o das debulhadoras de cer ea is, as casas constru-
toras estrangeiras. por intermédio dos respe ctivos depositários e a gentes. come-
çavam também a procurar os lavradores para venderem essas e outras máquinas
agrícolas. Semelhante propaganda, con j uga da com o enorme des envolvimento
que a agricultura tomou de 1894 para cá, fruto das le is protectoras dos cerea is.
p romulgadas nesse meio tempo. d eram em resultado a aquisição d e muitas d ebu-
lhadoras por parte dos la . . . radores, Em dois ou três anos com p r a r am -se tanta s
que 05 poder es do Estado acabaram com os dep ósitos oficiais . instalados em 1890.
Re conheceu -se que exam então já desnecessários, por não passarem d e elemen..
tos de vulgarização. Deve:riam sim conservar-se, s e a par das m áqu in a s h ouvesse

- 227 -
A T RA v t S D O S C AMPOS

pessoal co mpetente, expressamente incumbido d e instruir os cam pónios q u e


pret end es sem aprender a trabalhar com elas. Que esses d ep ósitos fossem centros
d e escolas m 6 veis, di rigidas por práticos ass ás familiarizados co m a s engrena-
g en s e funcio nam ento dos maquinismos. Mas os depósit os não tin ham sem e-
lhante carácter e po rta n t o não se torno u sensível a sua ex t in çã o .
. . . . ... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . .... . . .. . ..... . . ... .. .. . ...
N o concelho de E lvas há hoje 17 deb ulhadoras d os si. temas . C layton. e
«R us to o» (1) q u e traba lha m n a s eiras dos respectivos proprietári o s e a lg uma s
s ervem tam b ém na s do s la vradores vizi n hos q ue 8S toma m d e a lu gu er, por não
qu er er em ou n ã o pod er em possui r m á quin a s ue . O p reço do a luguer cost u ma
ser d e {J Oi o do valor d o cerea l debulh a do, ac re scen do o custo do com bu stí vel,
ág u a e salá rios d o p ess oal empregado, com ex clu sã o do maqu inista, fogu ei ro,
a li m entadores e oito homen s auxiliares para chegarem os molhos. E.m r egre ,
estes oito h om en s pertencem à ganha ria da casa, mas o dono da máquina a bon a
a o la v rador o custo de s tes sa lários. P or Sua parte o lavrador costuma dar comida
a o maquinis ta, fos uei ro e a Umentadores q u e, como já fiz ver. ven cem por conta
do p roprietário da máquina .
E.m anos abundantes. as debulhadoras não che gam para as n ecessidades do
concelho, com o aconteceu no verão de 190~, em que a s eiras te rminaram no
mês de setembro.
.... .. . . . . ...... . ...... .. . . . . . . . ... . .. . ........... . . . . . ... . .. . . ' - .
Q uando as debulhado ras viera m , o pessoa l campónio vociferava contra a
ino vaçã o que, diziam , vi nha baratear-lhe os sa lários e simplificar extraordinà-
riam en te as colheitas. C o m o ren dimento espa n toso que as m á qu i n a s prod uzia m
(a cres centavam eles), os trabalhos das eira s durariam do is terços m enos do que
pelo sistem a antigo, e por co ns egui nte que faz er d epoi s, desd e o meado de
Julho até ao S. M a teu s ? Em q ue se haviam de emprega r nesse tempo cente-
n a s d e pobres, n ã o have n do sea ras a d ebulhar, s er viço ú ni co, que entretinha.
antes t od a a ge nte até a o fim de agosto ? A s interroga çõ es p areciam ter f u nda-
m ento sé rio, digno de r eílexâc, e não po uco s lav rado r es se p r eoc uparam com o
ca so , te men do cri s es d e falta d e t raba lho, a pa r de vinganças t rai çoeiras d os
qu e o st ensiv a men te clamavam con tra a introd ução d a s máqu ina s, am eaç ando
o s la vradores que as u s as sem .
C omo porém o h omem põe e D eus di sp õe, os factos subsequ en tes vie ra m
diss ipar to dos esses r eceios, d esvanecend o também, se n ão n o todo, pelo m enos
em grande parte, as an tipa tias qu e 8a n hões e t r aba lhado r es alardeavam contra
as máquinas. É q u e com a vinda d es ses modernos e pod erosos enge n hos coinci-
diu a protecção à cultara cerealífera, q ue deu em resultad o o e la.rgemento enor -
míssimo dessa mesma cultura e por consequência a precisã o de braços e a subida
impor tante n os salários e sold adas.

( t ) A d.J:I1;.Ilr.adora .RaIlOtl. alc atl u a o prlm. lro prlm lo tiO COtlCU rlO d. m'qalftu, qUI ee realizou uca aUDl tftfl ftl
eld.da d. t.ou. Mio timo. lIu tealio dI luu r.c1 am • • ca .. eOIl.trutora d• • u 110m•• m.. u:rl. IDjUld~1 ocuh., o na
triaftfo aI CIIII1&1 do Al afttf jo.

- 228 -
ATRAvt s DO S CAMPO S

Nunca os ga.nh ões e jornaleiros ganharam tanto no verão como ganham


depois que as debulhadoras se difundiram. Ainda b em que a ssi m sucede. conci-
lian do-se 09 i n ter esses que pareciam antagónicos. (J)

* * *
Dente Parte do arado onde s e introd uz o feuo que lavra a terra.

Eixos Para ca rros de muares. usam-se de m adeira e de ferro, predominando


os de madeira nas gra n d es lavouras. O s d e ferr o, exigem cui d a do s de
conservação, que a maioria dos carreiros não q ue re m ou n ão sabem dispensar.
O s ca rros manchegcs e as carretas mon tam em eixos de madeira.

Enfardadeiras Máquinas co mp r essor a s de p al has e fen os q ue h á vi nte e tantos


e n os se introduziram n es ta r egião, e q ue ultimamente se tem
gener alizad o bastan te .
M ovidas pO I parelhas de mu ares, ou a va por , qu e por um e outro processo
funciona m em n úm ero avultado por todo o concelho d e Elvas. sã o de no tó r ia
vantagem pa ra a a gricultura cer ea líf era .
Com tais m áqu inas aproveitam -se as palhas em a bsoluto, reduz-s e-Ihe o
volume por efeito da prensagem, e assim enfardada e com primida em fardos de
fácil carr egame n to, deixa-se em ótimas condições de erme e ena ãem, conservação
e tra nspor te. Precisamente o inverso do qu e s u cede com a palha a gr a n el, que
se desp erdiça imenso. tanto nas almenaras e palheiros, como nos transp ortes
em redes.
Em g era l. a s enfardadeiras pertencem aos negociantes qu e com p ram a palha
aos lavra d ores. e tra balham, é cla ro . po r conta dos m esmos nego cia ntes.
H á. porém. lavradores gra n d es que prensam as palhas com m á quinas suas. e
out ros que a s a l uga m.

Enfueiradura O con j u n to dos fueir os e tendais d e u m car ro.

Enteichadura O todo de um arado, com seu s respectivos a cessórios: «ferro».


canga, chavelha, a guilhada e corr ea me.

Enxadas Ferramentas de ferro, larga s e espalmadas, d e cabo comprido de


m adeira. com que se ca vam a s terras para batatas, melanciais,
vinhedos, etc. Adoptam-se de dois feitio s: rasas ou rsseires, e pontessudas ou de
bicos. Às primeiras, servem com vantagem nos terrenos arenosos, de fabrico
fácil. Às segun da s. usam-se nas terras argilosas e em outras que ofereçam
re sist ência.

h ) o ,ui. etg, nu , dbu , gbt. d. bQtb.dgtU, t.1 como o " Q tu.dlm.at o d, d.balb. cu dH.u c tu e nn l. , p.uotl
40' OCOP'lII . ere., lie. tUlnt do PUt o ulI! lulo qg . tl'.tt d .. eotL.hu,

- 229 -
ATRAV e S DOS CAMP OS

Enxadõ e s Instrumento s semelhantes às enxadas, diferenciando-se pOI serem


mais g ross os e compridos, mas menos largos. Com os enxadões
procede-se à s des mo it a s do piorno, giesta e outros ar bustos, e aos arranqu es ele
cepa. São utensíli os q u e se confundem com os alviões, s e bem que os alvi ões
cost u m a m ser mais f ortes, estreitos e compridos.

Enxó Fenamenta de carpintaria, que. com outras, o abegã o trás na lavoura


põrpriamente dita, pata consertar os arados e renovar-lhes as sfveces.

Es c a das Encontra m-se de várias dimensões e altura em todas as sedes de


lavo ura, servin do prin ci pa l m en te para os homens treparem e proce-
d er em ao asseteamento de almenaras, malhadas e pocilg ões .

Escopro Instrum ento de carpíntaria que também a companha o a be gã o para o


conserto dos arad os. Serve para alargar O b u ra co das AarAantas por
onde entra a teit ó, e o dos arad os em q u e se aloja o mex ílho ,

Espartões T ecidos de espar to em fo r m a de esteira" q ue, em d et ermina dos


acarretes, gu a rn ecem e revestem a s enf ue irad u r a s dos carr os.
Os espartões vinham antigamen te de Espanha, mas n a ac t ualidad e pre para m-
-se em Elvas e em ou tros centros agrícolas do país.

Esta ca s Varas de a zinho com Io rca, q u e amparam as can celas dos bardos. -
Paus curtos e g rossos. qu e s e cravam no selo, junto aos manAedourais l

para s e prenderem os bois. • Prender à estaca». como se diz vulgarmente.

Es teios Paus compridos com esgal has. que se aplicam nas construções do s
b ardo. d e cabras, malhadas, choça s, etc.

Este iras F azem-s e de bun.ho, colhido de verão nas ribeiras. Serv em para a s
camas do s cr ia dos «d e portas adentro». e para co loca r sobre os ce rrcs,
quando transp ortam sacos co m cereai s. N os montes costuma haver prov is ão de
esteiras. feitas por q ualquer en eendídc, n as ocasiõ es d e pouco s afazeres, ou às
horas vagas, por amor à arte ou mediante gorgere.

Este irões U sam-se de tecido de palma, comprados na s fei r a s a os algar vios.


para aplicações semelhantes à das esteira s.

Ferrados R ecep tá cul os de barro tosco o u de lata, com duas asas e a compe-
tente bica, p ara onde se ordenham as cabras e as ovelhas. Os des-
t inados às ovelhas, são mais pequenos. Nu m bardo de ca b ra s e num a p risco de
ovelhas. empregam-se t rês ferrado s pelo menos, que aí pe rm a necem em toda a
época : dois ou m ais, pa ra os orde nhas, e u m, o pio r, para os cães do reban ho
comerem as perrum s s, de m is tu r a com águ a e leite.

- 230 -
ATRAV r. S DO S C A M P OS

Ferros de arado Cada lavoura, b em p rovi da, cost u m a t er «ferrosp n o t ripl o


d o número de a rados q u e «dei ta» p el a s eme n teir a outonal,
ou sejam três ferraA ens com plet as: uma para estar em s ervi ço, ou tr a de r es er va ,
pronta a s u bstit uir aqu ela, e a t erceira na l oja do fe r reiro a conse r t ar .

ferros de marcar gado Todos os lavradores têm «ferros» pa r a m a rcar a fog o


os se us ~ados, s en d o mai or es os que s e ap lica m a os
gados b ovino, ca va l a r e mu ar, e pequenos os q ue se emp regam n o ga do rrr íudo,
como ovelha s, cab ras e p orcos. E stes f erros rep resentam iniciais ou m anog r a-
ma s dos n om es d os possui dores ou dos s eu s ascende ntes, mas também há lavra-
dores q ue os usa m em forma d e cru z e s, es t rel as, tra ços, etc. Em ce rtas «casas».
o ferro d os s ados m iudos é d e co nfig u ra ção di versa do reservado para os g ad os
vácu u m, ca valar e m u ar .
A catalogação co m f l et a e co nscen ci osa dos fe rros d o s gado s em P o rt ugal,
devia estar f eita d e h á muito, co n sti tuind o objec to excl u sivo de uma obra q u e
faz fa lta.
Temo s es pe rança q ue n ão tar d a rá a s ua pu bli caçã o. A o q ue pa rece. di ss o
trata m h omens competentes, q ue já anunciaram e que t êm solicitado os i ndis-
pensáveis infor m es. D es se a n u n ciad o livro é pri ncipa l au tor o sr. Vitória P er ei ra.
oficial d o exér cito. que em 1887 publicou um trabalho útil so b re o mesmo ass unto,
mas defi cien te. a avalia r pe las la cunas qu e se lhe n otam na pa rte que respeita
ao concelho de El vas. É. de justiça acrescent ar q ue dess a d efici ên cia s6 fora m
culpados a lg uns criado res el venses, q ue se ndo con vidados a dar os precisos escla -
recim entos, esque ceram-se de os fo r ne cer . Ainda a ssim, n o catálogo d o sr. P er eir a .
publicado em 1887, m encionam-se 275 f er ros po rtugueses ( 1), sendo 237 conheci-
dos e 38 classificados d es con h ecid os.
En tr e os 237, fig uram 1S d e lavr ad or es d o conc elho de E l va s, e nos 38 inse-
r em- se 4, tam bém deste t erm o. Dezanove, porta nto, número m ui to inferior à
realidad e, m esmo Dessa ép oca. H o j e então ascendem ao dobro o u tripl o. Oxa l á
todos ven ha m es tam pa do s n o livro qu e se as uarda .

Foices S ó s e encontram em limitad o n úm ero en tr e a a lfaia ri a agríco la de um


lavrador. Em g eral. p er tencem a os próprios ceifei r os, sen do t odas d o
feiti o comu m e anti quíssimo q ue já u sa vam os g au leses. O s lavradores s om en te
possuem foic es para a ceifa do alcácer ou verd e q ue dão às b estas e aos bois na
pr im a vera .

fo rcados U sam-se de pau e de ferro, para chegar molhos aos carro s, e


também n os serviços das eiras e outros. O s forcad os de pau e err-
cozem ..selt ao foSo. quando ainda es tão ve rdes, entalando-se e comprim indo-se
entre os degraus de uma escada «d e mão », onde se conservam alguns dia s, a ta dos

- 231 -
ATRAvts DOS CAMP OS

pel a s po ntas, para adq uiri rem a volta e queda. apropriada. D epois são aperfei-
çoa do s pelo ca rpinteiro.

Fo r qu il ha s Empregam-se d e madeira, e são providas de quatro a oito dentes
de za mb u je iro. S er vem principalmente nos trabalhos das eiras,
para o que se preparam e consertam n a s v és p era s das coLheitas.
P a r a as r em oçõ es d e estru mes e palhíçcs, adop tam-se forquilhas de ferro,
de diferentes m od el o s e procedên cias.

Fueiros Pa us que compõem o engradame nto e vedação dos carros. entre os


lim ões e os ten dais .

Gadanhas E s p éci e de fo ices m u ito largas e compridas. q ue servem para cortar


os fenos. M a n t êm em absol uto o tipo prim iti vo de q ue há memória.
Em regra, estes instrumentos agrícolas não pertencem ao lavrador . mas sim
aos gndan h ei r oa, que os m an ej am. O la vrador poss u i por acaso u m a ou du as
gadanhas para o corte d e fenos a jornal. sistema que s6 adopta em pequena
escala e por excepção.

Gadanheiras C om eça r a m a empregar-se no s últimos anos. de vários sistemas,


nas lavouras grand es, o nde se experime ntam as prmcrpa rs Ino-
vações. D ã o resultado nos terrenos planos e lim po s de ped ras.

Gamelas V a silh a 5 de madeira , pa ra os bois co m erem p alha com farinha,


fa relos, etc.

Garganta P eça de madeira que, sobreposta na ponta, constitui a parte do


a ra do chamada timio. V eja-s e Arado.

Oolpelhas V a silhas de palma para condução de palhas e de muitos outros


artigos que se transportam em bestas com aparelho de ca rga.
Á s golpelhas maiores chamam-se-lhes ceirões, D a s peq uen as faz- se larga pro-
vis ã o. po r serem aplicáveis a m uita coisa e estragarem-se depressa.

Grade Em agric ul tura. dá-se este n o m e ao inst r ume nto q ue desto rroa a terra
dos a lqueives, puxado a uma j unta ou parelha, dirigida pelo corres-
po nde nte g uia.
No co ncel ho d e Elvas ainda persiste a grade a ntiga, de madeira t o sca, com
lâmina s de fe rro. vu lga rm ente con hecidas por facas o u d en tes. C o n sta de dois
r oj ões d e e.ainho, re curva dos, com dent adura e duas tra vessas, tendo ta mb ém
duas argolas co m d est ino a prenderem a s arras tas d e enga t e.
E ste instrumento rudimen t ar e bara tíssi mo, dá bons result a dos, sob retu do
na s terra s d el ga d a s, d e f á cil desag regemen to. N es ta s terras, ch ega m a em pre-

- 232 -
ATRA v t s DO S CAMPO S

gar-se g rades q u e nem dentes possu em . Àp enas os rojões de madeira e nada


mais. N ã o o bsta n t e, tamb ém se us am o utra s, que co ntra s tam em absoluto p el o
seu cunh o m oderoo - gr a des arti culada s d e fe rro. d os vários modelos que ven-
dem as casa s construtoras. (1)

Gral Vaso d e mad eira aberto em len ho ma cisso, r efo rça d o ext er i or m en t e com
cinta s de ferro, onde se m eceram os p im en tões par a t empero da carne de
porco a ens a ca r. e be m a ssim o cardo para a coag ulação do leite co m qu e s e
fab rica o q ueijo.

Gravata Varapau munido d e ge.nc bo na ponta, que os pastores u sam a t r á s dos


rebanho s, para com o gan cho p r esarem por uma pe r na a. r ex lan ígera
qu e se p r oponha m a garrar. É a maneira mais f á cil d e apanha rem sem cus to
q ual q uer cabeça ov i n a .

Jangada Ara d o com varais para uma b esta. Ordinàriame n te se rve só para
embelgsr, isto é, para abrir regos d e pequeníssimo s ulco, com que se
re talha em belgas a te rra qu e se vai s emear e lavra r de seme n t eir a . A s belgas
destinam-se a nort ear o s emeado r n a di stribuiçã o d a s emen te.

Joeiradores Veja-se Cr ivos.

Jugo C a n ga q u e s e colo ca junto d os cornos do s bois, obrigando-os a


trabalhar de cabe ça assás erguida. Usa-se u n ica m en te nas lavouras
d os barros.

Lençois P r eparam-s e d e este pe, pa r a os carros, por o casiã o d os a carretos das


searas para as eiras, afim d e se a p r ovei tarem os gIãos de trigo e d e
cen teio q u e desbago am das espigas.

Lhantrados Barras de ferr o, com qu e se preparam os a IOS para as r odas dos


carros. Quando se i nu tilizam n ess a aplicação. a proveitam-se para
cha pas d e r eforço n os limões e ou t ras serventías.

Limões Ba rrotes fa eee do s, que constituem as extre midades latera is do s leitos


dos carros.

Maceirões Vasilhas d e madeira, es trei ta s e compridas. para bebedouro d os


ga dos junto aos po ços sem ch afa riz, o u em outro sí tio, para on de se
transporte ág ua, com aná logo destino. Servem principalmente de verão e em

(1) A aud. que . irul .. boje .. 11.. li" I.n..d... . .. que o. rooulI.. eh. m.....lll. eUIU d' Atal. ' • d. qUI! f.l. o u.t au ·
lhl. Plllllo ( XV I I I, SO), i , ..,uo.do R.YD ler. C. ue.l e.o. , .I. lun Dei o ' .ulu • • _ N o t.. J. . d eol u do Ir. A . P in., puhlie.-
i .. no lora . l O E ln n•• .

- 233 -
ATRAvt S D OS C A M PO S

tempo de es tia gens ex te a crdín ürias, n as zonas escassas de nas centes. T a mb ém


se utilizam para com edouro! d os cevões nos chiqueiros.

Machados F erramentas imprescindí veis para limpar o arvoredo. «faz er» a


lenha e «tirar» a m a deira. Também se lhes cham am malhos.

Madeiras Todas qu e se ap u r am n os «cort es» de azinha e de sob ro e a s ou t ras


de f r eixo, mosqueir o, cho upo, etc., que s e criam e cortam nas mar -
ge ns dos ribeir os e nas h ortas, em co n d ições d e s er vi rem para a rados , carros e
cerras apli caçõ es si m il a r es , são cuidad o sam ente ap artad a s e assi na ladas p elo
carpinteiro, como já tive ensejo d e dizer e permonizar n a pág ina 43, n o ca pít ulo
Montados.
Às mad eiras para alfaia s agrí col a s r epresentam uma d esp e sa a v u ltada pa r a
o lavrador q ue t em de e s co m prar. co m o s uc ede a alguns. E o pior e q ue m u itas
vez es nem as en co n t r am à venda com fa ci lida d e, t anto é a procura e a escassez.
A s p eça s p ara o fa b r i co d e gargantas e ea r e dca» são as que m a i s escasseia m ,
p or serem precisamen te as q u e maior con sum o t êm .

Mangas Cho calhos de eno r m es dimensõ es. q u e n o inverno se põem nos bois e
vacas. embora já se u s assem muito m ai s, sobre tudo DOS b o is.
N a s va ca s ainda persis t e o cost u me n a época p r ó p ri a , m as so me nte para as
vadias e gul osas. u s eira s em se esca pa re m d a vacada para in vadirem «folhaslt
ou p astag ens g uarda da s.

Manganilho V arejã o m u ni do d e co rr ei a . de onde pe n de uma va r a cu r ta e


g rossa , com q ue os porqu ei ro s ba tem e saco d em a bolota da s azi-
nheira s e sob reiros, p a ra os p orcos co merem na oc a sião.

Manguais P aus co m q ue se p rocede à malha o u d ebulh a b raçal d o ce nte io.


co mo o utror a s e u sa ve em toda a parte e h oj e po uco se vê.
O m angual co ns ta de du a s peça s - mangueira e peritico - p r esas p or
correias d enominadas m eês, e peles argolas ou articula ções em q ue t erminam os
re vestimentos de COuro q ue lhes envol vem a s ex trem id a d es. Ào 'reves tim en t o da
ponta da mangueira, ch a m a - se camisa; o da ponta do perítíco, designa-se p or
csreirulo.
A mangueira, vara comprida d e ca stanho, repres enta a hast e q ue o m alh a-
d or em p u n h a DO a cto da malh a. O pericico, lenho curto e n odoso. de za m b u jei ro,
de uns 90 centímetros, terminand o em cscheporrs, ser ve para vibrar as
pancadas nas espiga s do centeio, revolteando nos ares, ao impulso vi g oroso dos
braços que o manobram.

Martelo Entre os apetrechos que acompanham O e be gâo nos s erviços d os


alqueives e sementeiras, figura sempre um martelo, como traste
imprescindível para o amanho das enteichaduras.

- 234 -
ATRAVes DO S CAMPOS

Massas O centro das r oda s dos carros.



Mata-b o is P eq u enas vergas de ferro. que atravessam os limões e o eixo dos
carros.

Me io Peça central da cange de muares.

Mexilho Gancho com duas hastes, que se introduz no arado para amparar as
«orelhas» das aÍvecas.

Mi u lo Prancha central das rodas dos carros me nchegos.

Pa d io la Utensílio para remoção de pedias e outros objectos.

P ás Às de madeira, servem para a limpeza do grão nas eiras e para as voltas


dos cereais nos celeiros, eepedejaudo-ose e removendo-os assim de um
para outro ponto. D es ta s pás. as melhores são as de nogueira, q ue os lavradores
mandam preparar pelo carpinteiro da ca sa, ou as compram nas feiras de maio
e junho. Uma pá bem feita. é sing ularmente apreciada por todos os homens do
campo.
Fora das fai nas das eiras e da baldeação de cereais, empregam-se as pás de
ferro inglesas. E. a inda se adoptam outras de madeira , compridas e estreitas, ou
de ferro, largas e cu rtas, para meter e tirar o pão do forno .
Peg õ e s Ps us onde encaixam as varelas que compõem o engradado das can-
celas dos bardos e ap r iscoe.
Perítica Vigota que sustenta o leito dos carros de lavoura, prolongando-se
para a ften te, como vara de engate. As períticas costumam ser de cas-
tanho, mõrmente nos carros de muares. Para as carretas e manchegos, também
se emprega o choupo, pinho, etc .
Pescaz C unha chanfrad a, que r eper ta a te iró no orifício da ~argantB.
Veja-se A rado.

Pespinheiro F en o com d uas hastes, qu e substitui as aivecas. Só se usa em


algu mas la vou r a s dos barros.
Pinas P eças que form am a circunferência das rodas dos carros.

Pipa Barrica gr an d e que se usa em ca no, para abasteci mento de água nos
m ontes.

Ponta A parte poste r ior do tim ão.

Quartão M edida anti ga, de ba rro: correspondente à quarta parte do alm ude.

- 235 -
ATRAvtS DOS C AMPOS

Rabadas M a deixa s de cabelo da cauda d os bois, co m que se ornamentam as


corneiras ou tiradeiras das j u ntas do ab egão e outras entidades
«de pe nsão•.

Rai o s Os paus que en caixam nas pines e mass a s dos ca nos.

Ra s til ho Espécie de grade dentada , para com uma parelha se rastilhar e sulcar
de lev e as t erra s se meadas. m u ito abatidas po r chu vas copiosas,
seguidas de calores inte nsos.

Rasou ra M edida an tig e de madeira. corresp on de n te a meio al queire.

Recocões AcessóIÍos do ca rro rn a n ch ego (d o is em ca da car ro), q ue a tra vessam


o centro dos lim ões e vão circ u nscrev er a rot ação do eixo.

R edes U sa m-se dois t ipos de redes : 8S ch amadas de alErme. com que se pre-
param de pronto redis ligeiros para gado lanígero, e as outras maiores,
de iunça ou de linho, pa r a a co nd ução de palha a granel, em canos. Esta,
merecem particular menção, pela quantidade de pa lha que compor tam e pelo
fantástico efeito que produzem qua n do n o s ca r ros se erguem a lterosa s e reple -
tas, movidas por boas parelhas.
Compõem, como disse noutro lugar, ca r radas g iga n tes cas, ter mina ndo para
a fre nte e r etag ua r d a em bolsas colossais. de m alhas t ensas, a tocare m no chão .
P a r a b em da p ar elh a, o peso da ca rra da não está em r el a ção com o volum e.
Sem custo gran de . os ani mais puxam aq ue la monstruosidad e, q ue avança impê -
v ida m ente. p ejand o e suja ndo os cami nhos. No verã o, as est radas e r uas a pr e-
s enta m va stos vestígio s de sses acarre tas n ecessários, mas i ncómodos para os
t r a ns eu ntes e m orador es d os sítios po r onde passam. N os dias de vento o m al
ag rava -se. Ao sop ro d a ve n ta n ia e dos mo vi m en tos d o veí culo. a p a lh a menos
comprimida escapa-se da r ed e, e depois de remo in ha r p elo esp aço em to rvelinhos
caprichosos, i n tr od u z-se e ca i por tod a a parte, co m o hóspede im p ortu n o e seu-
cerimonioso. Fruto do tempo, que os hábitos t oler a m.

Respigador Apa relho com dentes de arame, recurvados, para aproveitamento


d as espigas nos rasto lhos. Int rod uziu -se há anos, m a s não se tem
g ener alizado o se u u s o.

Rodo Ferr o recurva do , em be bido em varera o, para espalhar o b ras ido do fo rno
de coze r de pão. U t ensílio de madeira com que n a s eiras se arrojam e
j untam os cerea is desempalh assd os, arr edios d os ce Ice d curos.

~oçad o u ras Ferram entas com q ue s e r o ça o mato e se cbapots a chamiça e


len h a miuda. •

• - 236 -
ATRA v t s DOS CA M P O S

Sabicões Barras de fer ro , qu e re forçam a pa rt e inferio r do eixo d os ca rros.

Saco s U m a la vo u r a q u a lq u er dispõ e d e saca rias su fi cien tes para os acarr etes


e r emoçõe s dos ce rea is e l egu m es. P or m uita s q ue haja . é a x i o m á ti co
dize r -se q ue nunca cheg a m , tant o s e r epart em e tan ta s s ão as ap lica çõ es. C a da
saca ria co nsta de d ez sacos, marca d os a tinta e ó leo, co m a s iniciais do d ono,
n ú m er o da sa ca ria , n o m e da «casa» a q u e p er t en ce, e a era , tu do em ca r act er es
geeudos, vi síve is de longe. E s ta profusão de s inais e d istintivos te m por fim
pôr o objecto em condições d e se r r e con h e cid o. quando por ve nt ura se veja
depois de ext raviado. Mas a d espei to d e se melha n tes ca ute las, é corre ntíssímo
extravia re m -se sacos, un s r ealment e perdidos, o utros sonegados, principalmente
n o te mpo da s eiras , em q ue a bar af u nda dos acarretas ocasiona m u itas faltas .
Cada saco co m po r ta 8 a 1 1 d eca li t ros d e se mentes, o máximo. salvo os de
li nhage m , de fab ri co a va por, qu e se compram já preparad os e que são maiores,
m as de pi o r q ualida de q ue os d e fiação c ase ira, procedentes das povoações
beirã s.
E s t es últ i mos , u sa m - se d e p re fe rê nc ia , embora custem mais. P ela m aior
parte t a lham-se e prepar am-se n a s Ca sa s do s la vr a d ores. co m es topa , comprada
em peça a os paneieos a m bu la ntes. A es to pa preferid a e paga co mo m elh o r, é a
de Àrouca e a d e Oli veira de Azemeis. E. h á lavrado r es qu e ai nd a se fornece m
dos antigos sacos d e leteiro, q ue vêm da B eiro B aixo já pron t os, co nstit uindo
também ma n ufact u ra d a s pequ en a s ind ú s tri a s domésti cas. Em qualid ade, são
superiores a t odos os o utro s, m a s peca m por estrei t os, m otivo p orqu e vão
estando ba nidos.
A reparação e arre cadaçã o d os sacos, está a cargo d a l a vra do ra . E/ a ela
que os cria dos se di rige m , para lhe p edir em ou en tregarem sacos, e dela ou vem
r eparos e rep ri me ndas. p elas falta s e es t r agos. O s criados o uve m e defendem- se
co mo p odem , mas nã o se r ala m. Sacos e corda s, extraviam-se e d eterioram- s e
i men so , p or mais ca utela s q u e haj a e por mui t o que os do nos g ri te m e b arafu stem .

Sachos P osto q u e fig u re m n o fe r ramenta l de uma lavo ura , é sempre e m


peque n a quan t idade. O se u m ai or emprego é na s m ondas e sach as,
ma s aí, por cos t u me a n ti q uí ssi mo, são as pró pri as mo n dad eira s q ue os f orn ecem.

Saleiro P equ en o co r t iço. a r rimad o a o ca nto da «c h a m i n é», conten do o s al d a


cozi n h a.

Sementeiro Saco co m o cereal da seme n t e, qu e o semea dor t raz ao om br o e a


tira colo, no act o d e s em ear.

Serras Das manuais, de carpintaria, cos tuma haver alg um a s, de diferen tes
tamanhos, para serra r eiveces e outras coisa s. D os mecâ nica s a va p o r,
já funcionam duas no concelho de Elva s.

- 237 -
ATRAvtS DOS CAMPOS

Serrotes Instrumentos de que nem todas as lavo uras precisam. As que os


necessitem, têm-nos dos grandes, para se r rar madeiros transversal-
mente, e dos pequenos para enxertar aambujetros, et c.

Sinchos Formas de la t a p ara fab rico de queijos. D o s pequenos, para querjt-


nhos, costuma haver cento e ta ntos a d u zentos o u mais; dos gr a n d es,
para queijos de o velhas. dez ou doze aproximadamente. Como i n t er m ediários
en tre os pequenos e g randes. figura u m a certa porção dos medianos. para as
ch a m a d a s merendeiras.

Suadouros As ex tremid a d es da cangB d e muares.

Tabu lei ros Empregam-se compridos e estreitos para o serviço da amassaria


do pão de centeio e das per rum as. Os do pão de trigo, têm
men o s capacidade.

Tac hos Artigo de que é costume haver a bu n d ante e variada p rovisão, d esde os
de cobre e arame, de dive rsas dimensões, q ue pela maior parte só
s ervem para ornato das p rateleiras e guirlandas, até aos de la ta e de ferro,
em prega do s nos serviços da cozinha, a massaria e queijeira.

Taipais Tabuados en cost ad os às enfu eiraduras. p ara conterem as carradas de


estrume e outras semelhantes.

Tal eigos Saquinhos para merendas e objectos miudos.

Tal eiras As travessas dia n t ei r a e t raseira do leito de um car ro, ambas so bre-
postas no respectivo tabuado.

Tam oeiro Vide Apeiro.

Tarefa Pequeno pote de barro pa ra vas ilh a de azeitonas ou de carne, az eite,


queijos, etc .

T a r aras P equ enas m áquin a s, p rovida s d e ventoin has. com qu e se limpa m a


b raço cereais e l egu m es. Po u co se u sam n a r egiã o elvense.

T elize s O conj u n to d os ap etrech o s agrícolas e de outras coisas de u so p essoal
que, re un idos. se transportam em carr os ou em bestas. por ocasião de
mu da n ça de «arados», de r eb an h os de g ado, ou de pessoal t r aba lhado r . E ' um
plebeísmo antigo, hoje s omente emp regado po r cr ia d o s ve lhos, de lavoura.
E,' sinó n i mo de bafâmedes. outro vocáb ulo rústico com igua l signi6cação. ma s
mais em voga.
ATRAv t S D OS CAMPO S

Ta rugos Pauzinhos pre parados a enxó para cavilharem e ligarem o rebeneio


ao arado e a garg ant a à ponta.

Temão ou timão (1) A parte do arado com plet o, constituída pela garganta e ponta.

Tendais O s p aus q ue completam a s enfueirad ura s do s carros. Vide Carros.


Terfsias Varas de cas tan h o, com q u e se prep a ram as cancel as, pa r a b ardos e
a pr iscos .
T ir a de ir as Vide Carn eira s.

Tornejas G an ch os de ferro que at ra ve ssam as pon ta s do eixo dos carros,


im pedi ndo a d esloca çã o da s r oda s.

Trav e s s a s Barrot es d e azinho, que s e emprega m n os leit os d os carr os .

Trilhos A pa re lho r ústico e a n t iquís si m o. para d ebulha de cer ea is com o a ux í-


lio de u ma parelha de muares ou d e cavalares. sob a d irecção d o
correspo nde n te co n d utor. Consiste numo. armação de madeira, em que fun-
cionam três cilindros de ferr o ou de madeira, cra ve ja d os de facas laminadas.
pa ra tr iturarem e esmagarem a p a l h a , durante o movim ento de rotação em que
gi ram. C omo acessó rios, reunem a lança para engate, e a cadeira ou assento do
con du t or , so br eposta em ci ma . (d
Sentado n a cadeira, de arrestas em punho, voltadas sobre a ce n ga, o g u i a
do t rilho serve-se de um chicote para estimular a s bestas e dirigir o trabalho.
T orne and o e quarteando o calcadouro, segundo as ci rcu n st ânci a s reclamam , os
animais puxam como pedem, e a engenhoca lá se vai movendo con fo r me o
pass o d os q u a d zúp ed es , caminhando soluçante por entre a palha que fra gmenta.
Nas eiras d e grande movimento, só se empregam os trilhos como a u x ila r es
das «co br as», de éguas. Mesmo nestas condições, tudo fa z s upo r qu e em breve s e
abandonem, se continuarem a generalizar-se as debulhadoras a vapor. No futuro,
o trilho ser virá s ômente aos pequenos s ee .reir cs.

Tripeças A ssentos rústi cos com tr ês pés, muito usado n os m ont es.

Vasculhas V as sou ras g r a n d es, de gie sta e o u t ros arbustos, para varrer os bar-
dos das cabras, as eiras, a s cava la r -iças e os terreiros do s montes.
Preparam -nos os cria do s «d e p orta s a de n tIO», nas h oras d e poucos afazeres, ou
com pr a m-52 aos m altes es, quando apar ecem a ofe re cê -l os.
(1) Vllt'U.tft1t . di~ - It tlm i o.
b) St do W I!.Id .. . o... . u pic h dt rr lMo q llt tmp rt' • • .I.. d• • , o r. o. ltllak ttlpclo. 'Pau balU' o cu ..1. t qlla
h'lIlId o dllu P lt ll. . d. Slbll•• ua cOllhtcldo taUt u htbuu. no ItmpO dt I..,u. ud a . Ido ...di.au,att u ••do por
habo com pont u dt til"",. POIII.. h oJa . u h. tl luld .. por IIml.. .. dt m atai . 'unldo u lf8nda na faca i,,'u lor t . obu o. tizo• •
qllt .Ira l .tdid. " lIt a """ul.na .Taa,"a .
( Rtb t to da 511... Met/16r Iu .06rt a pOllu/."o e a . ,ricu /, uu <lt P olt.. ,d- N ot.. ai rle ol .. d o .r. A . PI. ... I.....t...
h. &!lO• • lIO i ornal O E/_eut.)

- 239 -
AT RA v t s DOS CA M P O S

Ve rrumas N o f erramental q ue o ebegâo traz na lavoura figura uma ou d u as


verruma s, par a a brir os buracos das eiveces,

Via do r a s
C aminh eira s a va po r. p rí n cipalme nte de stinadas a r eb o carem '18 8 00S,
debulhad oras e o ut ros má qui nas g ra n d es, q ue t enha m de se r em over
e transportar p el os caminhos ordinári os.
Foi o sr. Alfred o À nd rad e. g ran de e ilustradíssimo proprietário d o con-
celho de Elvas. quem. n o ano de 1901 ou 1902, i n tr o d u z i u a primeira viado re
n esta r egiã o. Adqui riu -a para a ut ilizar n a s u a la vo ur a d e F onte Al va , {r eg ue-
S1 8 d e S ant a E ul á li a, o n de efectivam ente es tá funcionando .

APRESTOS DE CAVALGADURAS
Pela cone xã o que t êm com 8S alfai a s a grí cola s, cu m p re m en ci on á-l os no
m esmo capítulo. em b or a à pa r te e por o u t ro m étodo, i sto é, aba n d on and o a
ordem alfabéti ca s eg ui d a até aqui. P o r t a n t o, a catal o g a çã o d os a r reios e atav ios
d a s bestas e cavalgad uras fig u rará em pa rá grafos, co r r es pon dentes à classe e
emprego dos s olí pede s q ue usam esses preparo s. E 'i s a mençã o d o s principais:

Para muares e m serv iço d e carro e a rado Cabr estos co m aírgo l a s de cor"
r eias e du a s a rgola s n o s lados
d a foci nheira, pa ra intro dução e sego ran ça das sen ilh a s e aranha s, lig adas às
a r r ea t a s . D a s sf rgo la s pendem es qu i las ou chocalh ínhos, se estã o em u so n o
sítio es ses ad ornos buliços os. ( t)
C om louça ou «à calada », ad o p tam-se cab restos de três tip os, p elo menos.
P ri m eir o: en cerneiredos, em atan ad o e panos de Liga (algodão, lin h o, e tc.), co m
entre o l hos do mesmo preparo. enteix ugedos, (2 ) t ud o com g uarnições e e po n-
to a dos de esta mb re e pa no de cores viva s, umas em relev o, outras em abertos
Segundo : encsrneiredos, em lin h o, à li geira, tamb ém com entre olho s en t eix u-
gad os. T er ceiro: s omente de ca b ed a l, d e talhe s emelhantes 80S outro s.
O s ca b r es to s, mu nidos das corresp ondent es ser ri l h a s e e r r eata s de li nho e
co r re n te s d e arame, compõem os p er tences indi spensáveis para a simpl es con-
du çã o d e uma p arelha . D ep oi s, pa ra o t raba lho d a parelha em carro e a r a d o,
edicioue m-s e- Ihe os burnis, mantas, canga, tapetes o u t apiços e berr ig ueir ss.
O s burnis, co ns t a m de d ois chu maça s ~ ra n d es, d e palha d e ce nte io, r evesti-
dos de co u r o azei ta do e de carneiras . A v olta qu e t om am, d á -lh es a config u r a-
ção elítica . S ervem, colo cando - se so b re o cach a ço d o s anim ai s, u m em ca de, afim

(I) o 0 d. 114.. 11.. 0\1 ch ou lb.l...bo. 0 0. ub uuo. 01. . . muuu. ...io ~ _. u l ..... m perm an .nu. Mumo BO' .Itlo.
o..de o co.lt e . ,1' arul,ado••eo.. t eee b.nir -.. t. ...porlrl.m. n u dlU'."' u o .erio. fi Qu alldo o. 01.0 " 0 ' d,. b..1,. lllio d.
loto ellln.;ado. por mor l. d. PUUl U mu lto pr6JlUuo.
Em .I'amal ao bui toir ai . .q u ll cboeillo., po r tuito. d. pend or. do. d o. bu rtlil. GuI.o. oa o Qoar
4" " •• i a d. III",,, d..t. ' i Dn o . pnunum um pu ao. c.rreiro., 40. o. compra m . coo . n ta m ol. .... ca,ta . 'Jlact . mQ1 U como
Eu . m o. .....d. iro• •
(2) Cabelo. d. u lJlo,o, compl:ldo., '1lJ", . e• ..,do • ~brl"a bulo .lu .J<u.m.idad.. do • • nlrl alba• • fociAb..in , l U.

- 240 -
A RTE P OPULAR A LENTE JANA
1 - A/, ibelr.; ~ - Meuu feitas la mio. J - Lu.vlt l eit. à mio J 4 ~ AJlorgt: n-melldo. de pe le; 5 - Ma nAA com
medronhos. para a cei/a; 6 - Lenco de ch ita , pITa os om bro s ; 7 - M angui tos para os trabalhos : d.a monda .
e ceifa, te alellamu ; 8 -Bolsa 6ordlJdlJ .8 mis.slluj lt pant o Te16, io
AT R A Vt.S D OS C A M P OS

de neles fir mar a cange , P or d etrás. pa r a r efor ço e resguardo, j un ta-se a ca da


u m a correspondente manta ou fa rdo de lin hagem. Burnis e man tas, p õem-s e
nas bestas de cima para baixo. e atam-se, em baixo. pelas pontas, envo lvendo -
-lh es a maior pa rte do pescoço .
L ogo 8 seguir, põe-se a ca ngu e seus perte nces, de onde se destaca m os dois
ta petes ou teoiços, depend urados dos csnAa lhos. São atavi os vistosos e úteis.
que ficam bem nas m uares e as de fendem um pouco das ch uvas e do sol.
Em ge ral, constam de panos de lona, pintada a cores, com a data e as inicia is
d os d on os, ou de p el es d e d ia, b o n it a s e completas.
P a r a ligar a ca n ge aos burn ís e ambas a s coisas à parelha, empregam-se a s
berrigueire» - duas f oItes ligaduras. encordoadas. de lã ou d e linho, senão du as
corre ia s larga s e extensas. com ou sem rabadas de boi n a ponta s. Quaisquer
que se a doptem, ca da bllrrigueira ou correia , sai da cabe ça do ce ng e lhc de
dentro, passa por baixo do sovaco e barriga da m uar, e, a çambarcando-lhe os
costados e as es pá d ua s, vai atar em cima, em n ó co r re d i o. n o cangelhc oposto.
deixando la ço de ponta caida . C om todos estes preparos. a parelha lica apt a a
engatar e t raba l h ar .

* * *
C omo foi ob ser va d o na página 217, em nota cor r es pon den te ao parág rafo
churrião, os ca bres tos da s muares qu e puxam carros de cómodo pessoal. deno-
minam-se csbrestada s ou csbeçedas. T êm formas aná logas às do primeiro d os
m odelos r eferidos, mas de maior a pa ra to e cu sto . condizendo com o garridismo
dos tap etes e berrigueires que os a companham. e qu e em tudo eê c su perio re s
aos de u so ordin á rio.
C om r evestimentos de l ã, uma s e d e se da, ou tras - a s cebrestod es realça m
p elo s r el evos e fr anjados de rutil antes cor es, aplica ções d e t eix ugo, cuida dosa-
mente tratadas, borlôes, pene eh.os, vidrilhos, etc. A ca beça dos a n i ma is qua se
que n ã o se vê. oculta pelos franjad os. N o pesco ço, destamca m-s e espave ntosas
co leiras d e guises , no mesmo gos to. Guiseira s e cabrestadas faze m u m efeitar rã o,
q ue parece ser com p ree n d i do pelas própria s muares. E l a s pelo m eno s assim o
dem onstram, sa cu din d o O cachaço a mi ud o, como que m anifestando prazer com
o tinir d os aljorges. ( I)

Na s éguas e cavalos . mo nta da s. dos lavradores Ce b r e s t od a de freio e


r édeas j a Ibar dã o e col -
dres com manta en r ola d a. à fr ent e; silha d e fi vela por baixo do capeado d o
albar dã o ; loros e estrib os; peitoral e rab icheira. ( 2)
Para a prisã o à man gedcure, cab r estão vul gar.

( 1) r.." 110'" di I lj or, u f 1ll...lI o corrl ot. 1\0 umpo. pu , d u i'ou 01 ,,,, 40' ,und•••
(si o Ilbudl o d. coldru COlll m..nu lor ol. d• • ( n nl c , •. .. 1 ulodo 1m dll"' O, .. d m COOlO o p.ltoral. À u i. c' ll ..
•"buh "ir t ",do l..o.

- 241 -
AT RAv t S DO S C AMPOS

Nas éguas dos guardas, vaqueiros e eguariços C a b r e sta da de fr ei o e


r éd ea s ; o u de se r rilb e e
e rrea t a, co m enxota -moscas d e peq ue n i nas co rrei as pe ndentes d a t este ira ;
al bardâc r a seiro, sem ca pa; p eles d e cão ou d e o u t ro ani mal, s ob r e o e lbar dãc,
cobrindo -o to do ; silha po r cima, a descob erto ; l oros e es t ribos, e p or últ imo
Ia bicheira ou a ta fais d e va qu eta, P ara a p risão na m e n gedou r a, cabrestão
ordinár io. P a ra estacionamento o. prado, p etas d e fe r ro co m o u sem ca deado.
As peias, q ua n do se n ã o ap lic a m, costuma m fi gu rar a o pesco ço d a s re spectivas
cavalgad u ras.

Em muares de a parelho Cabres to d e couro co m freio e rédeas; e lb e rdã o


ra seir o o u de co ld res; sil h a interior ; lo r o s e estri-
b os ; ataf ais o u r a bicheira . E,' apar elho p r óprio d os m.a ch o s e m ulas em qu e
t r a n s itam os co m pr a do res d e le nhas. peles, e co r t iça s, bem como os d os ca pa -
dores. pene tre s, etc. P ara a mang edo ure, cab restã o s i mpl es ; n o estancio nam ento
a p ra do. peia s de lã.

Nas burras dos ganadeiros Cabres to de couro, com fiv elas de me ta l a marelo
e ornatos di versos, p en de n tes do. t estei ra o u
lig ado s da t es t ei r a à f o cinheira j h ) arreata de correia s im ples ou t ecida: a lbarda
e pel es d e cão, i n t eíriças, po r cima, com silha de correi a e arg ola n as pontas,
ata n d o em n ó co rred io. Na traseira. atafais de couro, com Evele s gr a n de s,
am arelas. Em aparelhos de asininos não se vêem melhores n em mai s bem
cuidados, es p ecia lm en t e os das burras dos maiorais dos p orcos. As destes e as
de outros gunad airos, é fr equente trazerem coleira ao pescoço, com um a p equena
esq u ilo. o u chocalhinho .

Na s b e stas d e carg a, dos m o nte s Àparelho sem elh a n te ao d as burra d os


ge .na d ei'ros, mas de pior qualidade e com
menor estimação. C abresto e atafais de linha gem ordinaríssima ; ar rea ta de
corda, de esparto ou de iu nça; a lbarda e s il h a inferiores, e por cima da albarda
d uas peles d e badana. mais ou menos rotas . Para o carreAuio p eõp r iamente
dito, uma golpelha, ceirão ou cange.lhas, conforme a natureza d os artigos a
transp o rtar. U tensílios para carga e preparo s do aparelho, é vul gar exibirem-se
num estado de desleixo m anifesto. por estarem a ca rgo dos paquetes, conduto-
res e tratadores dos animais que usam ess es pe r tences. O r a os paquetes são
rapeaes de 12 a 14 anos, m ais inclinados a diabruras que a ca u tel as e
a r're.njo s.

o
(1) o.
cahun o c o, tu ~ .. Uf co.. fecclon..do pe lo pr 6pr io , a. ad.iro, .... !l0U.1 ...... ,. om.10. d.. hlll1U. , (I'" t..nl O
01 uncl ub..m ... arll.~ b t .... h ' oal, Ihaltam-u .. corul .. pe.. d. n tn . na fona .. d. '''''o ta- m" c. . . ..Indl. .. I.plinç~ .. d.
cote.i... "Ia d l..,oa . I, fua U . d.. IUle ir .. 1 focl n b.eiu. c","l ndo... e fOfllll ndo Clpelho I ou trO'. eoa etl.lIl d. cnlunte
( ~ ei .. lu..) d e ",u .. l 00 de d. a tu d. poreo, d o el'no .. Imio. de 11m" uuele em ~. I ..I, t.lc.

- 242 -
ATRAvtS D O S CAMPOS

No s mach o s e bu rros d o s a lm ocreves a r ri ei ros C abresto e arresta vulgar,


de linh agem, a com pa nha d o
de boçal de esparto, para evi tar que a besta coma na seara e p ous io s m a rgi na is
das estradas. Aparelho para carga de sacos: suadouro de linhagem, e por cima
dois chumaças com palha de centeio, chamados lombinhos. Sobr e os lombi-
nhos, a servir dei albarda , enxerga rese ire, e por último 8 silha e o mandil -
pano de estopa, debruado de ourelas ou de caseeleeas. com guarnição de cadi-
lhos encarnados, pendentes. N a traseira , e te le is singel os.

* * *
Os arreios e mais pe rtences e qui referidos. como apre stos das celvage duras
e bestas, moldam-se um pouco n os seus congéneres da Estremadura espanhola
e Andaluzia. Questão de semel ha nça vaga e nada mais, porque o fabrico desses
utensílios é genuinamente nacional. caracteris ticamente alentejano. Todos eles
ou quase todos. são prod uto dos ccrreeirce e albarde iro! de Evore, Estremoz,
Elvas, P o rta l egr e, etc., etc. O s correeiros e albardeiros expõem à venda os
respectivos artefatos nas lojas d as s uas oficinas, mas pouco vendem aí.
Vendem e muito. nas feiras de V ila Vi ço sa, Fronteira. Sousel, Borba, e o utras,
onde a rm am grandes e vistosas barracas, d e um va st o so rtimento. Nestas fe iras
poucos lavradores e homens do campo d eixam d e adquirir arreios e preparos
para os se us gados. M uitos fazem até provisão de reserva , para o gasto de
seis m es es a u m a no. Ou tro s, adoptam o sistema de contra ta r em a lba rde iros e
cor reeiroa pa ra irem servi-los 80S montes , me diante salário.

VIII

N agricultura alentejana a s searas oc upam luga r culmina nte, a


A
r egi ã o elvense, é, das q ue mais se distingue e a vant a j a, neste i mp o r-
t antíssimo ramo a grícol a . À q u i. como em Ioda a p r ov inci a , a s sea -
ras co n st a m de trigo. centeio. cevada e avei a. D e cultura ex t en si va
nas herdades. em folhas de 2 a 10 ou 12 moios d e sem ea d u ra , e quase intensiva
nas ta padas, {erregfa is e courelas dos arredores das povoações. A cu lt u r a do
trigo vai num crescendo m anifest o. em b or a i n feri o r 80 que se obser va noutras
zonas, onde pouco se semeava ainda há doze anos. Em Àrronches e no Crato,
por exemplo, havi a t erras e terras incultas, ou cultivad a s de lon ge em lon ge e
mal, q ue de 1892 para cá, estão a ser arroteadas com i n cr em en t o fe b ril . aplican-
d o-se a cereai s. O n de em tempos que não vão longe, s ó vicejava m estev a s, car-
rascos e sarag a ços, hoje de senvolvem -se e criam-se exte n sa s sea r as, q u e aumen -
t a m de ano para ano nos terrenos que se conquistam à charne ca . (1) Ora o
recente al argam en to da cultura cerealífera no termo d e E lvas, n ão pode equi-

II) 50b... o .lar' . llu olO .I.. cult\l.tU cnu lHo u . iI o cr a . ... er.... o Ir. " o.ulmo d. Andrad., n. "i,b. t.5 do &Ia
o ot.hllf u llllo 11..... 0 POHu,d Eum 6l11 ico ,

. O. d llll· " doe f.c t ol ."oo.ndoll q la DO d.c'o lo b odo .. d eu . 0 . m. nho .I.. urn l n uJ...1 d • ••",.oh'im ..alo. II'lld o
. 1.10 OUU U lllld. . ... "uflcl . c ul ti. , .. 1 • n dullld. coau q1;1l . a l. III Call' . . ... "or l.la cult• • A. " co"'.. la oUr . ct... qu. u nl u m
d. III1"ml..o•• nu coDd a do. I i. co o.finD.d•• IHIlo Cl a . moi. dh",ulII.nr.. I. 11'10 100Iea n do ...ui,au. Do . dl colo. , • <to.
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,1'. Ao, o u o J oli Canh• • II Ddo mW uro .I.. ob r .. p ú bllc.., r ..o..It...... . dJfU'D ~.I."
o rd .o.. fo r...... com . ~ .d •• • C:1I.co. tu. l'l . pn ..lad. do AI . at. jo , oad. po r c4lC1llo. . .tlllor .. . . coou~
.aJo. nO/o d. tm .. lacolt... . pu." . ...u pn U III" . " ud.. "id.o. S0010 o. p rom m o. d • ••DII'. o q... U P!'UIlllU _ . 0.0••
...puUcl. n ld..d o. d. Joo • no lII.iI h.cl u .

Vi·... ""aDiO. pal .. aot .. tu a ac ri l1 u . q u. 1\.O ol tllOo d ec i aJ o. .. 11ft. . b.coh.. elo AI.au j o li cu ..... u elodd..
• $(1 °/0 • • 0 p.n. qo ••Dt.r IOnJI.D u ca lcu l... • •••uh lr"lII • J 7 0 /0. M .. 1110. , c1uo, r.r....·•••
l oel• • pn..lDc.l• .
N o dlllrlto d. Poru.le'r•• _pt.rllcl. do. ch • •• doe luu nOI Io.cull ol . ...... I..lm.Dt. inful or. so% • 1.1... lI' . 1'
lo. O ocrl-lnalaJo.' Dto d. ir•• culti.., •• I. lia ' últlmO I du IlI OI . t. mh' m •• II OI • • m m. lol'" c1ulo d o qu• • d. 7° 10 ui.
cu.bdl .0 , .nl d. toda • Plo..hlcl a .

- 245 -
A T RA v t S D OS C AMPOS

parar-se a o d o das te rras q ue aín da on tem esta v a m bravia s. N ã o pode equ ipa-
rar-se pela simples r azã o de qu e 8S herdades elvens es, lim pa s de matag ais desd e
tempos r em o to s, s ã o po r i sso me smo a p li ca d a s a s earas d esde então. não
havendo, portant o, margem pa ra expan sões, como a s qu e s e efectu a m nas zonas
que es ta va m o culta s. T odavia a impossibilidade d e conqut ste r t erra s pare al ar-
g ar a s s ementeira s, rem edeia-se, 8 t é certo ponto. com a melhoria de processo s
cu lt u r a i s e co m a a l te r ação dos a folhamento s. que antes eram quinquenai s ou
q u a dr ien a is, ao pass o q ue h oje são trieoais, a lg uns i bi enais, muit os, e q u e dele-
na is poucos. Àcresce a círcunstânda q u e toda s ess a s folh as. no a no em que se
alqueivem, r ec eb em estr u mes e adu bos que e at i ãem ente não r ecebiam ou r ece-
biam m enos, e a ssim. e p or esse b en efí ci o, são em pa rte s em ea d as d ois anos
consecu tiv os. eb ragen do campo s co ns ide r áve is , out r o r a r edu zid íssím o s - cam-
pos qu e englo bam du a s e mais t orn a s, e q u e na seg u nda seme ntei ra - ch a m a da
de r a s tolhice ou de relvas - avo lum am b a stante a á r ea d a sea ra.
P or outr as p alavra s : a cu l t u ra ce rea lífe ra n o concel ho de E l vas aumen ta, é
certo, mas aum en t a cer cean do as past agens d o s i nver n adou ros e coutada s. (I)
Alargam-s e a s sea ra s, ma s d iminu em- s e os p ous io s. o q ue o b ri ga a r edu zir a
criação do gado v á cuum, limit ando tamb ém o r egim e m an adi o das b oia das.
Não dig o q u e isto s eja u m mal , qu e n ão é, d ecerto, m a s é um facto n otáv el q u e
m erece eonsíanar-se.
Nas h erd ades de sbravadas nos últim os t empos , o caso m u d a d e figur a .
Aí, as terra s que n outros t em p os só serviam pa r a mí ser os r o ed ouro s d o s ga d o s,
a g ora. depoi s d e limpas, s e n e m todas, ou p ouca s m esmo, se prestam para d emo-
rad o e proveitos o sustento d e bo vino s, dão pelo m enos a lg u ma er va. q ue to dos
os rebanho s apro veitam com vantagem .
• • •
Para bem d o país, a av ali a r p el o desenvolvimen to q ue se es tá operando
na lavoura d o Alentej o, é d e presumir que num fu t u ro pró xim o, a mesma
l avoura produza trig o bas tan t e pa r a o consum o da Da ção. (2) A ce rteza de preço s
convidati v os, q u e a ta b ela o6cia l g a ra n te a o la vrador, ('§) o a p r oveita me n to

lt) Por In'fr".dor""o, , UlIUld.-u ai p...h ,n' d. poulfo • • u.r.hd.. drad • • brllali n lem bro ou oUlubro. pu . d. OU IU-
bro 'Dl df.n l' II IU'U'Dl '0 , . do ..' eo.u m • e....lu . A. bol.d.. eO. lo.....m ellru r pr im el.ro ;I' U tlraum • Dor , IIl0 i. p .ra
' PrO..d tUIlIll o- m. lho ru pUlO•• ou o. m. l••pUf tOH'.
Por eoal.du. no e..o 'Dl qa u llo. eOIl. ldu am -u • • nn.. d. u.tolhlee. 'o.rd.d•• l •• '10 " ee...... 'Dl ••t.mbro 0 0.
oatah ro , p.r. n lu••ram .0. re b. nbo. d • ••do ,,'roum , e...lar • UPr1no. q o...do tI ..lum boa P. It'. ' Dl, d. flTu. iro ou
m arco . 111. dl_l• •
(2) Tod• • "e .. t ll qa . &fOm p. .. l.. de pe r lo o pro"r... o e ' ••p...do d. cultura cu n 1fln ...o AI .M.jo. u I' co"'..... dd • •
d. qa ', • eo.. tlllun-. . ..dm, de.. u ·o 'Dl po aeo , O par . pr od a z b ' fri, O p. ra O n o co....a IllO. R .eeno. ",lo l.h.... . Q a.m do -
.. Id.r. Iii. AI n .... hu.. rafi ..lI.. do n , A UII I... o de A.dr.d • • lll.l lr ll1 •• p" I.. . as do Por,,,,.1 &0..6,.. /eo,
. Co m I I pr o••d.. . pddõu d. re.t1ilo Ir .M I....... , d. aala PUI. d. E. lre....d un , pu• • produ cio d. cer .. ls•• em
da ... pr od llcl ... 011.1. I I IUT. ' f.cu l1.. f ol.d•• • b.bo .lu .ltl1udu ÜDp rod .. tb.. do ut.o. l.sI...... .. lo I . por cerr o. u.....
ulop l. d. , co.oal b t. u p. rar u ra . o.mllll0 d. pro d.. clo ...d o••I• • qo.l...I'lI.tI p.to meao, .0 ao..o deGcif d. cne.l• .•
(a) O. pnu. co .....ld. d ..o. qUi • t .I., I. 06 d.1 ,.n al' .0 lurado r , d cro- ••• • m , r...de parti , ), podnoafllh... .
COU I...I. la ler fub cl . d. R eal A lloel' cio C . a tnl d. A;ri cv.ltou P orlu IIl"'PUI prOll.t . e fUClII..he l n . dtfll ' do.
I. ' tllmo. Illun.... d. Inou. a . cl oa.I. Foi . 1. qa • • m 1888 1..... 100. O brado d u .... atl prolut o co a lu O . b'lulo a o (lO'
.atl o .0Eri• • .,rlcultu ra P'lri ••• utnbo ehar "O"U'''' I'. pel . concon' a el• • fTo.. to•• d o. u lio. uln .....ho•• Foi. R ..I

- '246 -
ATR Avt S DOS CAMPOS

cuidadoso dos estrumes. tão d es cu ra do an tigame nte, e o re curso m ilagroso dos


a du bos q uímicos, ao alca nce de t odos, sã o i n centivos q ue impelem o la vr a d or
moderno a semear o máximo q ue po de. Com a s r en d a s e contrib uições s ubidas
que está pagando , o la vrador sabe por experi ên ci a que só a p ura receit a remune-
rad or a a gri cu ltand o be m e m u ito, lavra ndo e semean do a t em p o, se m se esqui-
va r a despesas , como de fac to se n ã o esq uiva. Já não tem o acanhamento roti-
neiro de outrora, subo r dinado à orien tação de s geicultwra po uc o e gastar pouco.
A gor a. a rroteia te rras, d ilata os afol hame n tos. estruma e aduba quanto pode,
la vra melhor, monda com escrúpulo e em grande escal a, e amanha 8 temp o.
não sacri6.cando a perfeição e a o po r tu n idade dos serviços a economias negativas.
Tu do isto conjugado, prod uz O espan t oso a cr és cim o de cult ura e produção que
se está da n d o. S em eia- s e e ~o lh.e-se O trip lo do s cereais que se semeavam e
colhiam há 20 anos. N i n gu é m ignora este p rogresso, mas não será o ci oso
r egistá- lo.

* * *
A seara de cada lavoura , de um a o u mais herdades, semeia-se na folha ou
íolb es, preparadas de alqueive. no s f erxegt a is dos montes ( d e nas terras de re s -
tolhice, q ue, por terem sido estr umadas n o an o anterior, ou que pela sua nota -
ria fertilidade, se iulg am aptas p ar a seg unda seara. Estas terras de rastolhice,
een cc r porade s» às de alqueive, p a r a efeito d e nova sementeira, são queimad as
em agosto, precedendo a desmoita dos r ebent os de piorno, se os há . A queima do
rastolho fertili za o solo l.l e fadlita a lavoura. Cada folha. ta nto pode r eceber
um a única espécie de semen te como d u a s o u três. D ep en d e isso da natur ez a do
terreno, da força das circunstâncias, o u d o critério do lavrador.
C om o já foi dito. as sea r as de trig o predominam por toda a r eg iã o, se
exceptua rmos a zon a g raní tica d e Santa E ulália, em qu e se avantajam e s do

A..oal..,Io. qo ••u. .. u lelllpo . .. ~a.lI uo • • eoll..,OCOO O. 1Il'llIof 'nl. coqu..o••,lIcol.. d. 183& • d. 1389. qo. 6 u ulll ru·
, " r, 1r e In ' al ar • a,rico!t.. u poUo l!o.... Foi t' IlI "~ m 1I0r lold .ti ... doe ..o. prlllC ip ..l. d lrl" ll. t.. 'l'" .. {.. od oo o ....do lO
lonr.al a;rlcola - A t"OCIJ - "'III call1ptio dcood .do. qoc , . Ih u da m" u a batdhou .m pfol d.. fC ln ., lndlu~"u d. l u oo n
lIulon.l. co jo. IlIl cf " ' " u t• ••m uodo e'llulnh.d o' pelo. Olllllllloll ll tU 1lI0a,.lro. . ..... obl lt a. do. pel os ,o. .. o ..nl" .
f oi "1Il' , o ur. u nt • •• 111 40 a . fi.Il&.i uloll foa . ...dade •• Jo. tI, • • O. fr o tos II se U lio ..end o • neol h'lldo. COIll Indl.·
cOlh. 1 ...n u ..... pu. o pro,n u o • rf q" u. d. o.ci o.
C.. llIpn po b . oio "q ... u l' a l!f.dd i o " n con hecl lllell lo lIO' t od os os lUT ad or.. due m A R u i A u oel.çio C llu r . 1 d.
A,rleoh o n Po ..tojo. ... e n i o m. a o. ' 0' cu.lh elro. q... . t ~1lI u llfr u n l.do. De . ncn • •t U j ' e1,a... do..mltm o . ono II.mo.
como o dr. Culo. Pi.o.to Coal ho. VI,co lld. de COfOche. D. 10. i d. S .ld • .o.h•• Corul e d. Fl c. lho. LlOnudo Torre•• uc.
Nut. 11"'0. co.... . ndo . . .eOll loe . ;dcol... . i o bulfalll.lu a c. Lld.. UI " nfuillch.• • cooeio:l. ncllu. qll a Illo
•• curalll .llII.holll' o o.,i d. da. III" qo . U.dUJUIIll om pnilo da jwtl c• .
h)o. ta ont...oa. CO"'O U ou dizer nu UClH ..... u d. a n l .. dallllot o.
• 1:1) .\ teori • • • 11" ..l hlu lm•• d. 'l o • • 'lo. lm. d.. f ..to lhJeu (onIU"" o 1010. ~ .uile 1I0r t odoe oe I.n.dor u . 11)"
po.te 1m IIr"lu alm UllIlln d' ..... oh.do ..tlef.t6rio. A ela... do . rU folh oe .::o", pl5. o",. c......d. ti o tillOI. lI" l .. llI.i.
d.. .,.. 1, i .nuud. pilo• ..cnIOll . 'IU" q... o ....do • IlIluon a . tur • . P or lu o h .l lIO ' 1lI pulh. la.,.,u .. r u tolb lcu um
u qod. ...
O. q 1111 pudu",. '.0 d. PU I CU Cl:1II • lU" li.::. llI.b ba••fiel ad. com o. dudto. do. ,,"olho'. 'l O' o . ..do lh e
.111 0" • • 0.01 d o q" . Gcerl. cOIll o. el'::.U'" f..lduo. de folio' 1I . ....' . lto•.
O u . Aflt 61l.!0 Plru. o•• '0101 No t .. • ".Ieo lu. o" ..n . q.. . o co.t"'llI' d .. qUc/"'l d.. 110 A I.o teio .cb.-u . a ru o.
! oll. h . o 11111 IIfOU ...0. ofl'lm IIfllllltl... . !. . cr U U Il. Ie ' a Dia GlU t. ..1i' J . ElcAthe ll. ch.ado Lua Ju , E'f' pro, rulO d.
ladd.u rl.. pn toul r .., lo. f.lla lll...t • • • 0Ln ••l!.l colt.... d os Fo lI. h I ced • • no. ...tu d• • , allleM . Ir ... Ufll'lc aa:l • qodlll"'"
II 1Il" lIu' • depol. IlIlt to falll .. cfluIU com o u{ruml. q... tl lll em a boa d' a cl.'.

- 247 -
ATRAvt s DOS CAM PO S

centeio. Ãparte esta excepção. a cultura do t r igo prepond era n a m aioria das
herdades, s obret udo n a s t erra cam pas. delgadas e n os berros,
Em escala imedia tament e i n fe rio r, te m os a da cev ada e 1080 depois a do
cent ei o. À a veia fica e m último l ugar, tanto pel a t erra que a produ z como p ela
q u a n tidad e que se semeia. Para ela des tinam-se as terra s piores de alqu ei ve. o u
8S de ra st olhice, j á depauperad a s por r ecen t es produçõe s d o outras sement es. ft J
R.estam~n o s 05 legumes : fa vas. g rão de bico. chích a ros e fe ijão fr ade. cul-
turas re lativa me nt e i nsig nific a n te s co mpa ra das co m a s d os cerea is. Em regra. os
leg umes são produzidos n a s t erras d e a lq u eive, a pre t ex to d e se b eneficiarem
essas m esmas te rras pe re, a s se me nteir as ce r ea líferas do o uto n o seguinte. ( 2)
R eprese n t am po r a ss i m diz er um a cu ltur a secu ndá r ia . s ubsidiári a d a dos cereai s.
E st a si m . que a ting e a ltíssi ma i m po r tân cia. D e t rigos. ce nteio. ce vada e a veia .
colhem -se anualm ente. cen tenas e mil h ar es de m oi a s. q ue pela m a i or par t e vã o
a b as t ece r os g ra n des cen t ro s consumidores.
Desde o verã o até pelo i n ve r n o f ora, as es taçõ es f erroviárias de Elvas e
Santa Eulália estão abarrot adas de tri go e o u t ro s gé ne ros. que todos os dia s
saem em d ezenas de vag on s p ar a L isboa. Port o, Coimbra, et c. Porçõe s enormes
q ue n a sua q u ase tota lidade provê m das lavouras exten si va s q u e se explo r a m
n as herdade s circun vizinh a s. C onsequentemente. 05 múlt ipl os ser viços q ue
de m and am as s earas. oc upam to do o ano num erosas pa r el h a s d e m uares e de
junt a s de bois. assim com o o pessoal refe r ido n um do s anterio res capítulos .
O que são to das essas fainas r ura is, q ue em pregam t anta s p essoas e ga dos. va i
ver-se em seguida .

Serviços cultu rai s C onsta m d os seguintes: lavouras pr opriam en t e dita s. g ra -


dage m . desmoite, adu bação. sementeira. m onda. ce i fa . acar -
retas e d eb ulha. P a r a os tr igos e ce va da prati cam-se es cr upu l os am ente todos
estes s erv iços e em certos ca sos o u t ro mais co mo arr otead a s. ab rição de sa njas
ou valas de esgoto, resril.hag en s, etc. P ara o cen teio disp ensa-se um o u o u tro
«ferro. d e l avo ura e a monda r igo rosa . À aveia presci nd e ta mbém de be nefíc io s
que não pode co mpe nsar. C o m o modesta e h um ilde que é, satisfaz-se co m u m a.
o u duas l avr a da s, s em mais ceri m ónias de prepa ros.

LAVOURAS
Animais e instrum entos qu e se empregam As lav our a s executa m -se co m
cha rr ua lig ei ra. de aiveca m óvel
o u com o ar a do romano. C om charru a n o s «fe rros» do a lqueive. ('I) S o mente

h l COIIIO •• TI ••h nn'III." • • ~ u ltu r.. Tul..... do ai " p ' ~ lu d. ..me" lu. t u.o . .. t1qoJul lllo, (ul u T..n t • • , ... ,io
d'lII o.. ltnd.. ci... d fic..... t. p.IOI .p6.. oal ol.
h) O l.n. do'l' ..b. d. h ' . 'lho p.l.. 1l ~6.. d . 'Qul...d ., 'lu• • c.. !tau do.
.. tl nu pu: • • produ ~ o d. cu ....lI
I.,..
..,u tl lII • T. . r. " al d. L.... fitl u

(3) A cÀanu• • lIIpU' . · .. q a da.l n . . .. u "O pdmd.ro .f.,.'I'o , O" I• ...,.d. d• • lqud... Cb.m._u .Iqllei•• • 0 CO" -
J....tll d .. t.uu.. pnp.n t6d pnecd •• • U mu lt.u• • co... . . "a pllc. .. o.. tro I.. ' ....

- 248 -
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ATRAvtS DO S CAMPO S

com o a ra do. por ocaS1BO da s ementeira. C h a rr u a s o u arado s. cada qual é


p uxa d o por u m a junta de bois ou por uma pa relha de muares. Às junta s diri-
gem -ma s os gan hõe s. o boieiro e o ebeaãc, com o e ux fl io d a a guilhada. Das pa re -
lhas cuidam os a lmo creves, g u ia n d o- a s com as arr ea tas e um pequeno chicote
- a bengaleta - no cabo da anilhada.
E m geral. a s juntas de b ois fig uram e m n úm ero s uper io r ao d a s p ar el h as
de muares, se b em que esta s já f oram m enos, e é d e SU P0l: q u e ainda aumen-
tem. (I ) Em t odo o caso, e po r enquanto. s e uma l a v o u r a d eita 20 arados, 14 ou
1,5 s ã o mov i d os a bois, e os r estantes a muares. E ste é o co s t ume co r ren te.
embora h a ja q ue só la v r e com muares, e outros, mais excepcionalmente, co m
b ois a penas.
T ambém se encontra quem a griculte com bois e m uar es em número a p rox i-
madam en te igu a l, o u igual, mas i sto também se não vê m uito.

Si ngelos e r e v e z a s Chamam-s e lavouras d e singelo aq uel a s e m q u e se lav ra


com os mesmos bois ao s dias inteiros. d esde a ea ga rra »
da manh ã, a té à solta, ao sol po sto, excepto n os inter valos da merenda e das
a gu a d a s.
D en ominam- se lavouras de r evez o 8 S que emp rega m un s determinados
bois, de m anhã d esd e a madru gada até às o nz e o u o nz e e meia, e o u tr os de
ta rde, d o meio dia em diante até a o pôr d o sol. O s que lavram d e manhã,
escolhi dos en t re os melhores, são revezados {su bsti tuidos] p elos da tard e - em
regra bois fr ac os e ve lh os, emparceira dos com n ovilhos da ama nsia . (2 ) H á tam-
b ém O si st em a m uto d e, na m esma la vou r a, figurarem j un tas de r ev ezo e ju n-
ta s de singelo, prá tica exce pcio n al , só j us ti6.ca da por circunstância s imperiosa s.
D e fo rma que um a lavoura que ede ita» exclusivamente arad os de r ev ez o,
precisa o d obro do s b ois que preci sari a se ap enas «dei tasse» si ng elo. P ortanto.
em pata em bois o dobro do capital. Mas este onu s é de certo m odo a t enu a d o
pelo cu st o da a limen tação do ga do , menos gr avo sa n o d e revezo qu e n o d e
sing elo . P ara o susten to des tes últimos, puxa- se mais pela bolsa . po r s er em
tratados à m ã o, a o m ei o-dia jungidos à ce n ge , e d e n oite p re sos à s ma n ged ooras,
ao pass o q ue os de r ev ezo a i nda q ue p o r acaso se alimen tem presos, co m em
rações diminutas p or t ra ba l harem m en os t emp o e pascig ar em a prad o. Isto na
pio r da s hipóteses, pois di spend em ain da menos, q uando só pass a m com o qu e
ap an ham a d ente em p le n o r eg im e man a di o.
Quanto a d es pa ch o, é manifesta a s up erio rida de d o sis t ema d e re ve z o, cu jos
bois, em igu aldad e d e ci rcunst â n cias, la vram m ais, r el ativamente, p o r t er em
melhor passo q u e os de singelo.
N outros te mpos s6 se usava si ng elo na s la voura s das herdad es d e te rras
h > Nu la. OIlI'I ' lmpor Call.lU .6 p or u :elp(io ma ll o Url .1 eopu' lm o atro. IlI.lml l., cama " l ea l . cl. l lo., I,,,•••
j OtAIAIO'. A... I CU a lll.d l II ..f . m 11.1'11' .m •• t ral d. eh. ... "., b am lldl. O. lIarelro. dI p ou co. UcaUO' ttmb' l'> cb" l m I
ur..lr _a. d. j oml ll.lol . MI l lbn ..a i q Ul nd o Cbl ' ll'> a n u . luum p di penór!• .
(.) O. 1I.0..l1bo. qUI u do a rl ce ber . 11.. 111.0 :no t.ub&l bo d o audo. CId . 11m I'o lt...ml t r.b.lb.., COtA um bo i ...Ibo I
pa nl o. q "l l b.. u :... .1 1 am paro I ...u drl...h • •

- 24!) -
AT RA V ! S DOS CAMPO S

impróprias pa r a in ve rn a do u ros e cou t a da s. O u so do revez o v oga va em toda a


par te em que se p odia s us ten t a r o re gime manadio da s b oiada s, qu e era b as -
t ante económi co. atento o insign ificante preço que, então, custavam a s p a sta gens.
Hoj e, pela ca res ti a d os p as tos e r eduçã o d os p ou sios, vã o-se limitand o o s re ve-
za s e ge ne ra liza n do os sing el os . M esm o nas «casas" on d e o r evez o prevalece.
in terr ompe-se n o tod o ou em parte d a se men t ei r a ou tona ], p ara se substituir
t emporàriamente pe lo singe lo, a fi m d e s e dei tarem mai s jun t a s, tanta s quanta s
seja p oss ível. N es sa ép oc a e e rni ma- ee » à lav oura t oda a força disp on í vel.
Há q u e a pro veitar O t emp o e a b oa «ma r é... fa ctores ess eo cia is par a o b om
êx ito da s eaT O•
. . . . . . . . . . . . . . . . . .. ' , , ' , , . , .. , , ' , ' , ' .
Às muares, lavram tod o o d ia . co mo se fo ss em bois d e si nge lo. Mas a sua
lavoura n ã o se lh e cha m a d e si nge lo n em de r ev ezo . É a lavo u r o d a s p arelh a s,
e n ad a m ais.

D is tr ib ui ç ã o das j u ntas (Quem 89 distribuiJ -Como fico u obse rva d o no


Pessoal de uma lavoura. o eb eg â o esco lhe p ara si a
m elhor j u n ta d e bois, o u as d u a s melhores junta s. con form e o caso de Q. la voura
ser de sing elo ou de r evez o. Im edi a tamente esco lhem os b oi ei r os: p ri mei ro O
m aioral e d epois o ajuda e. após estes, o s e ta, escolhen do a se u capric ho ou
su jeita n do -se à indica ção dos boi eiros. s egundo o costum e es tatuido na e case e
o u n a fre gues ia . (I )
À esco lh a das juntas dos govern os costumam fixar-s e n o pri nci pio d a época
e um a ve z es colhid a s. persistem com p os ta s co m os m esmos b ois por tem po
ilimitad o . Às junta s d os âe n bôes sã o organ iz a da s 8 ca pric ho d o boieiro do r es-
pe ctivo r evezo . ( 2) Ele é q ue ind i ca 8 0 S àao bõ es os b ois que hão - de agarra r , d is -
tribuid o- o s e emparceirando- o s segu n do o s eu crit ér io , ma s tendo em v is ta 8
índole d a s t es es e as apti d õ es d o s h o m ens. Pa ra os velh os e ra p a z es p ri nci p ia n -
t es. b ois paca to s. Para o s a d u lt os n o v igo r da vida. quais qu er, de s de os matrei-
t OS e manho s os . a té aos azedos e ariscas. P ara es tes, gan hões co m u nha s e tacto.
qu e os adomem e en ten da m ,
A d istribuiçã o d o r evez o de ma n hã ca be ao aj uda . p or s er o boi eiro q ue d e
madru gada apresenta o s b o is n o s arado s e ta m bé m po r ele l a vr ar duran t e es s e
mei o-dia. À do da tard e. co m p et e ao ma io ra l, po r r a zões a n é lo ges.

(I ) À. j .u u u do .buio. bodro• ••ot • . d.lfu u • •• • " or n re'" u Ihorn p.udud••• E ... • u .l. u mh ...
te dletl .... u.... por tr . ...re ullllilõ.. .... bo.. . u-rdu e <:0..... 11'. . l u ... 1'0 '" nb.d.. d. bo i " d. .. t.. d•• po.. I...
(2) E. capt o pu. o hõn . "./r.i. o• • d. 1'I"l'tll' p.na I• • q 11 tI ... b.... O d lu h o. d. 1I1'0l1r.U j".. t.. pu • .;•
.... . • o)...... t. d.p olo ,h ul'ollurem 0' loO'C ",o• • • 1'0"' 0 I'o... " {i o d o 1' 0 \lU' 0' .obrec. r.........
P or .ptl'l'i.o,. d..l.lO....• •• o. .... bõ.. qa. u .... "ou p.bo. d.. Ja .. e.. do . b o • do. bo.ho• • 1. .. 10 d llb l
"do. do "'0"" ".n o, ar.du. como" tard.... . 011• • dOi . n do. "U. O ",o.. 1• . Jt p io d.. . p.l.c/. o oU • {lOcu bld• •
d.lu... l...do••• t>bõ... \lo d......". n1> am todo. o. d i tr o co d. IIcol blr• • l u nc '0"'0 • • o.. t u . .... . 1&,,=.. 1I0.. 1I• • 11
"01' 11..1• • doil j . t>b1J; I'.d. dJa . ..... dlrd to d olb. '" fuM u. -rlf ol . ndo · 1. " . 101 lu' " ' ' <;to. o. bO.... A·
o cu" •• • IllU' ou A' " ',"0/• . f . tI tohl_ o .11l'!lI ' • O 111.11 oldo. S .... Inoun u. b. lh•• fil ho ou filho. do IU'Tldor.
<:01110 LDII. .....tlt . ... . ..o l,.rlo.lmo .. . IlI:o pond. d. . ....... Id UIU I.mb' m tlm ."./re/ro. com u. o• • Ulcar,o. ...do' o.
10 . do .h..-o • • 0' do. boltlro ••

- 250 -

=
ATRAVt.S DOS C AMPOS

No caso da l avou r a decorrer com j untas de singelo. pertence a o maioral


dos bois d istribuir e emparceirar todas as juntas dos ganhões .

* • *
Horas d e «a g a r r a» (Dias amenos e d ias de chuva) - Desde que s e começa o
alqu eiv e em dezemb ro ou janeiro. «a g a rra - s e» e principia-se
a lavrar ao nascer do solou antes um pouco. D o princípio de março em diante
en rega -se com o so l n a sci d o, e tanto mai s alto quanto ma io res vão sendo os
dias.
Pela s em en t ei r a outonal, como O gado possa e o tempo convide, começa-s e 80
r a i ar da aurora, o u , pelo meno s, a o acle re r do d ia. Se. porém, a s ementeira está
de resto , se «vai de cabeça abaixo», como se co st u m a di zer, a garra-se cedo. mas
não se começa 1080. À gan haria entretém -se a fumar u ma cigarrad a, a guard ando
d ia claro pu ra ir lav rar.
N a h ipótese co ntrá r ia, isto é, quando o serviço es t á atra sado e a época vai
decorrida. o ebegêc a g ar r a e começa muito cedo. sobretudo havendo luar e bom
tempo. Ordioã riaec ente, a fa mília conforma-se com a e.nricipacâo, atent as a s
ca usas que a motivam. P or acaso, algum q ue chia não é p o r ma l; é por fa lar,
para dizer anedotas. Se falam, dirigem-se ao abeã âo nos seguintes termos ou
outros parecidos :
- «O lh e que a clarid ade é da lua . . . I n d a a m anh em não ro mpe . .. » - -
diz um .
-« N em daqui a u m a hora»-obse rva o utro. E vários acrescentam :
- «N ada, o mel ho r é u ma pessoa «agarrar» à meia noite I . .. »
- cT á visto... Á meia noi te é que d eve s er . para a assorda esmoer
bem .. . »
R em o q u es facetas, à boa pa z, com uma p ontinha d e ironia. de que o abegão
se Ú e os próprios q ue os proferem .
M a s se a g a n haria anda escabreada e a forçam a «pega r » de noite, mal
p ri n cip ia m a l a v ra r desa tam aos gritos. simulando o reg 'ougo das r ap osa s.
P ret end em significar, que se as rap osas r egougam é por que a noite subsiste.
O abegão fi nge n ã o ouvir. m a s toma a gritaria co mo u m a t a qu e ie r es p eit oso,
de q ue se vingará oportunamente. E m lhe calhando, pagam-lhas pela certa.
pon d o ao fr esco os bad ios que lhe não têm suprema .. . q ue lhe não guard am
decoro . . .
N a s madrugadas escu ras. por ef eito d e nublados e falta de l uar, a aproxi -
mação d o crepús culo m a t inal n ã o se lob riga, é claro e, nestas circu nstância s, O
abegão aga rra e co meça o t rab alh o. dizendo:
- «Ho je algué m fica enganado . .. N ós.. ou O amo .. .»
A i s to r es pondem-lhe os gan hões :
- «Os enga nados, sem os n ós .. . voceme cê vai pelo seguro . . . »
Querem dizer q ue Da i ncerteza das hor a s, o ebegão nã o se des cuid a e p r .irr-

- 251 -
ATRAV r. S D O S CAM PO S

cipie mai s cedo do q u e prin cip ie rfa es tan d o a atmo sfera limpa d e nuvens - ceu
es,asesd o, com o se diz em l ingu a g em r úst ica. (I}
O chefe da lavo u ra ou ve as observa ções do pessoal e n ã o r espon de. Em lhe
p ar ecen d o, acen d e o ctgar r o, p ega n a agu ilha d a , s egura o raba n ej o, endireit a
a j u nta e gr ita:
- «Vá fo ra I . .. »
E o s ge nh ôes ve ndo -o e ou vi n do -o, re solvem-se a i mi tá-lo . seguindo-lhe os
movimen tos, d e m elhor o u pi or vontade.
D esta maneira, à h ora co nven cio n a d a . com r igor osa o u elás tica po n t u ali-
d ade. a lavoura principia sem p reo cu paçõ es pelo as pec t o d o dia. O d ia. está
sabido, tanto pode apres entar- s e de uma am en idade d elicio sa como b r usco ou
tempes tuos o. Em que chova m esmo, en rege - se como se n ã o cho v esse. cE I- r ei
n ão m anda chover , . . manda caminhar .. . » Portanto ca min h a - se , q ue pOI baga-
t elas nã o se d etém a fai na . O mais que o pe ssoal faz é defen d er -se d a m olha-
d ela, en ro u p and o-se o m elhor que p ode. Cada qu al v este o pelica , o t a pa- cu , os
saf õ es, a jaq u eta e o ca pote a guedet r o, env erga n do tud o i sso, p ara a ssim ense:
marrados, s u po r tare m e defen derem- se d o temp oral.
D e m a n hã. o u p elo d ia adi an te, a chuva só interrompe a lavoura q u a n do ca i
a cân taros, a lagan do o so l o, in ~nd ando os r eg os. Ent ã o, sim . O eb egão reconhe-
cen d o a ímp ossibilidade d e co ntin ua r , d á o sin a l d e pa r age m , ( 2) o s s ubor d i nados
imi t a m-n o, e, a segu ir , t odos a band onam o pos to , d eixand o as junta s a garradas
a os a rados. B o ís e m u a res, q ue d a m -se ca b is ba ix os e impass íve is, s upo r ta ndo se m
u m queix u me as bát egas de á gua q ue lh es esco rrem s o b r e o p elo . N ã o tug em nem
m ugem , mas n o se u o l ha r de inequív oca melanc olia, l êem-se expressões d e m á-
g ua pelo t om lutos o do m ei o que os cer ca ... E a ch u v a fu sti ga- os impi ed osamente,
ao p asso q ue os ho me n s fogem a es cape para os abrig os d as p edra s e das árvo res ,
onde se ass olapam e a ge ite m at é passa r a to r menta ... M al escempe, ebegão,
ganhões e ca rreir a s, voltam a a g arrar-se ao ta nso, l;s) e a la b u ta p rosseg ue como
a ntes da ch uvada , a não ser q ue a terra atasq ue e n ã o ag u ente. Atascando, é fo rçoso
deit ar fo ra - leva n ta r para o utra f olb a ou tor n a. m en os fab rica da, o u mai s en cha-
t íe, q u e perm ita l avrar-s e em t erm os. Não a h a vendo em tais co n dições, so l-
ta-se e in terrom p e- se a fa in a p or alg un s dias, pala a t erra orear, de m o do que
enxu gue em co ndições de se lh e m eterem d e n ovo os a r a dos . T em d e s e i r com
o tempo. E m al va i ao la vrad or q ue a rrostar com os en t r a ve s d o tempo.

Nas m erendas ao m eio dia L a v ra n d o- s e de s ingel o, solta -se às o nz e o u o nz e


e m eia da manh ã , merendando os homens, os
boi s e as mu ares n o pró prio lo cal d a lavour a, d u r a nte h ora e m eia a d u as horas.

h ) E.IU o:o ",. t' rlo. ",hu UoU "IU' d. ho ..... eu m l qo ll.l", .h.d a h Á P01;O CO. a.. o. . .. II h oj.. jÁ . i o ..u lul..o. ou
tal.. u .. limo a .....c o uç . ... p. lo =ottt' o d. a tIl.lod. du h6.. JÁ D'UI" ul6. lo di .1tl!M.lra . . . hu ... h qu .... t..
.... d. m. O ... 16.10 la dluçQ" q UI d.11 t o..am, im p.dltll q UI O . bl.io . Pfonll. O. . . ub l.do. pua 1&.. tirar . 1'1lD'
mla \1lo. d. d..c o.
(2 ) P ....."do . ... co.tando a " ull&..d••0 nb. ... jo com a po" l. l"cU".d. pua d llla.
~~) Ao arado 00 ao trabalho.

-- 252 -
AT R AvtS D O S CAMPOS

Os gan h ões merendam o costumado pão e queijo, como ficou consignado na


página 11S. n o artigo Alimentação.
O s bois com em palha de rriâo, em alcofa s ou ga m elas. misturan do -se-lhe
farinha, farelos, et c. ( 1) Também se u sa a aveia em rama, em vez da palha de
trigo com mistura . A ração d os b o i s, se não cons t a de aveia em rama, é dis tri -
buíd a pelo ebegâo, em 4 8 S postu res, d e um punhado cheio por cada vez e boi.
Antes da post u ra, os gan h õ es 8 viam de palha as a lcof a s ou gamelas, e cada um
por si a p r es en t a a co rr es p on d en t e va s il h a 8 0 ebegã o, para re ceber a ração
respectiva. O abegão a vi a e despa cha de pron to, a la rg an do as m ãos para o s
bois grand es ou magr o s, e enco lhe n d c -e e p ara os p equenos. Para o s da sua
j unta abre- as q u a n t o pode. e. se lhe parece. d ei ta-l he d ose d obrada . D á-l h e
força dupla. para ficar em q uent es e d e pé ligeiro.
Se a m erenda do gado co ns ta d e a v eia em r a m a, distribui- se a av ei a aos
molh os e em g olp e lh a s, um a p ara ca d a g r u po d e du a s j u n tas . P or um o u outro
sistem a , ca da ga n hão passa a u a çoa r os bois a se u cargo, da n do-l h es a aveia
em peq uerrinns gav et as. D á-lha co m ge it o e pachorra. m etendo-lha n a bo ca
para a co m ere m sem d esperdíci os de vulto. E en t re t a n to , o ga n h ã o, vai- se
ali m e nt a n d o a si próprio com fal ca s de pão e q ue ijo.
N o d iz er do pessoa l ca m pó n io, a a vei a e m ram a é a me lhor coisa q ue o
gado com e. N ã o h á bo is que a m a squ em . desdenhosos. P el o contrário to d os a
a ceitam com a vi dez. • À av eia é muito g u losa », dizem os ge nbões. ..
.... . . . .. . . . . . . . . . . . . . . .. .. . . . . . ..... ... . .. . . . . . . . . . ...... . .. . . .. . . .. . . .. .. ..
O s ca rreiros sobr e a nscaüzação do m aio ral. t rata m das parelha s. p ondo-
-lhe bo r n ais co m palha e cevada.
À solta do ga d o p ara ir merend ar. e m ais t arde, a n tes da meren da concluir
bois e mu ares bebem á gua em maceirões e ca l dei ros ( 2) D O sítio o n d e comem , o u
vão bebê-la aos poços e ribeiros da s pro ximidades. Prefer e-s e qu e b ebam j un to
da comida , para se n ã o p erder te m po em cam inha da s.
Carreira s e gen h ões, Ii pem e reno va m a palha tanta s vez es q u a nta s se
t orna preciso. Não obs tante, os h om ens, co n cluem 8 refei çã o m u ito ant es d o
ga d o. Enq'uan to os bois e a s m ua res n ã o a cabam de m erendar, anima-se e
avoluma-se a p alestra dos da m a lt a, por entre as fuma das de cigarros que a
m aioria sa bo r eia . Is to sem preju ia o do t rata mento das ju n t a s, q u e a todos com-
pete rep arar. E': p elo menos o seu dever. S e há quem o esq u eça, o e b eg ã o
corrige-l h e o descui do co m fras es de cens u ra.
.
........ . ..... . .. . . . . .. . .. . . .. . . . . . . ........... . . . . . . - .
Nas la vouras d e rev ez o pa ra -se de m erenda qu ase à mesma hora que n a s
fi) A ra(lo . arl .. eee q",.... t id ..d. .. qu ..lld ..d• . por , ... li .. d. o rdeZllo .eon6 = iu • 0 ", 1, qo ri .. p,o lixo .,,,.cUie..,.
U...-u ' ..rl nh .. d. ce.. te lo . de eMeb .., u. d. cend.. . d• •• "' .. .I.. f' hrle.. d. "'0"'.11I. .I 1 " i o•• lc. N o. 4 i1hno .
doi. aao•• a ......u>: .... e..,..tJ.. .I.. IniaL.. . .lu . . ...... cOa con . .. paea Ciu. c..", hIZllo .. eoa. o Zllo"m h • ••co. d. " ", . .. t..
ol...la o.... 'onucldo. poe ca ... d. Lllbo.. . D un qo l n ta a P""U do eee eeere , o...... d.. ZIIo . . . . o bl . oo cu d. coco e ootr.. d.
liab.. c•• todo mlatoud.. n .. lO'OI'OecIO u'u'!d... CO lll pÕ. U• • • 1IZ11o tlu .cio horin. d. prl..... lclnbn. ocd••. ' 01. o pon t o d••I. t.
1C01l6",leo e notrld• • •
(2) NUI. c..... . ' Ilo• • pehl..... .. ta coadozida pa.. o local d. ",u. Dda . 0..... barrica , ....1•• 1II0nnd. a.. cano.
tieado poe paulh. d:a 11I0..,,,.

- ·253 -
ATRA v t S DOS C A M P OS

de singelo, pa ra o pessoal e as parelhas comerem, e se revezarem os bois.


Mas não se pára s em q u e chegue o rev ez o da tarde. que vem sub stituír o da
manhã. Em a quele chega ndo. solta-s e e agarra-se em menos de de z minutos,
s alvo se s u rg em enredos e embaraços co m os novilhos de amansia. Se os novi-
lhos en r eda m , di fic ul t a n do a a garra e a prisão, a dem ora é b em maior.
A garrado o revez o , a família mer enda e, ao cabo de q u a ren ta min uto s.
vo Lta a la vrar, mas com outros bois - os de r evezo da tarde, é claro.
O s d o da manhã, marcham n eata altura para a p a stagem, t ocados pelo boieiro
ajud a. Os ca rre iros e as parelhas co n tin u a m comen d o e em terminand o. enre-
gum com 8 S juntas d e singelo.

Aguad~ Chamam- s e agu adas a os inte r va lo s em que a lavoura s u spen d e p ara


o ga do d es cansar e o pessoal b eb er. ( 1 ) Quem quer come também a sua
• fa lca d e p ão o u mesmo um marrocate. O abegão dá o sinal d a agu ada, p arando
e grit an do :
- «Água I. . . »
À. voz de: - Á gua I.. . - tudo pára. E ' costume p arar em terr eno plano, d e
lad eira acima. De ladeira abaixo, os boís fi cam em posição forçada, que os impede
de des cansarem convenientemente.
Em regra, há quatro aguadas: duas de manhã e duas de tarde, q u er se
la vr e de revezo ou de singelo. Ma s no s dias pe quenos, e, sobret udo n as l avou-
r as d e singelo, como os bo is estejam bons (vigorosos), acontece suprimir-se a
última agu ada da manhã e a última da tarde. Esta, principalmente.
À primeira, d e manhã, a ma i o r das quatro, dura 30 a 40 minutos e dá-s e
das 8 horas em diante. A segunda, n o ca so de haver, tem lugar cerca das 10
e meia demorand o 8 a 10 minutos. Aí. pelas três horas, decorre a primeira da
tarde, q u e entret ém 15 a 20 minutos. E meia hora antes do sol posto,
realiza-se a última - a mais pequena - que dura coisa de seis minutos. cE': s6
uma mijada". como se usa di zer para lhe justificar a pequenez.
Sendo ne cessário adiantar serviço. o u havendo demoras p or incidentes
ocorridos. o e begâ o esquece-se de dar a segunda aBuada da manhã ou a
segunda da t arde, à semelhança do que pratica na maior parte dos dias de
dezembro e janeiro. Os ganhões co m en t a m a partida, observando: - cH oje a
rap osa abalou com ela .. . »
N as ép ocas de escass ez de pastos, os bois comem «à mã o » um penso ligeiro,
durante a primeira aguada da manh ã ou n a primeira da tarde, senão em ambas,
para de certo modo s e indemnizarem da mesquinhez da pastagem.

(1) N .. h 'rov."a eh POIIC OI arl dol. I ttlll pIra cOolll lD O d. t Ulhl ri. I coa d\Ulidl l i COIt... 1= hani u. pf lo ' I a hi o.
4aa por II Cal. llro . da • • uaddro do d i• • E.m 'cl'ld o pr n llo. o t anhio m. tc I j u..." PI" d uu:"o d. Inrad• • ptra - I af •
lu• • ••• afi= d. I.. . 10"'U ou ' 0 poco lD.l. pr ó xim o. No rc trc uo colou I hanl u pr Ó,. bzl. d. pIIC01• • • oh• • 1• .,11'.
A . lnout ll ...Ion • •n tt.l'm aau . dei ro plU1ll an cn tl (..lho ou " pu ) , q". !.r'DI PO'" I ta ll' cm Llll a =v. ...i d. d. nDt,IL..
eo= harric.. ou cl.nlll'OI. N .. ....., .., ... o aalad.lr o OCIIP.- II f m te n1(01 CODUO ' d. pOllel moat' . como corlar 10b.. ,
.D,.,dio. tuldu d. ffn .mtDtu. eee,

- 254 -
ATRAvt S DO S CAMPO S

Em muitos dias, t a m b ém , s e a proveita m o s aludid os i n t er v a lo s, para se


mu darem os ferros dos arados.
Durante a s a~uad8s. é da praxe não de fecar n ingu ém da ganharia, incl uiodo
car r ei'ro s, Quando m u ito, só O a b egão t o m a es sa liberdade. sem ouvir r eparos-
Outro que transgri da, abaixando -s e, a p anh a s u rria da e sujeita-se a pa gaI vinho
à m alta.
Ma s a n ã o se r p or m oti v o s imperi os os, inadiávei s, o preceito o bs er va - se à
ri sca e da melh or v ontade. Todos s a be m q ue lhes convém cumpri-lo a rigor ,
p or qu e lhes 6ca ens ej o para d epois, isolad am ente, nas horas de trabalho. bota-
rem fora e fo lgare m de n o vo un s in s ta n tes , a pretexto de ..d ar de corpo».
Calcule-se. se h a ve r á o u n ã o caprich o n a observância da praxe.

T a m bém po r oc asião d e aguad as nã o se a d m it em beiss à s mulheres que se


a vi stam de passagem. Como vai de d es can so, e n t en dem que se dev e disfrutar em
sossego. E as m u l he rzin h as trans euntes, v end o a s juntas parada s. ex u lta m d o
ca so e aceleram o pa ss o, para se es capare m a os a p u pos. A s mulh eres r eca tada s,
compr eende-s e. A s fo lion as e voluntárias, q ue n ã o t êm pa pas na l íngua, p refe -
ririam o u vi r e r es p o nd er pachàvada s. (1 )

* * *
A solta E ' in ve.r iêvelm ente, ao 501 posto, seja e m que ép o ca for, tanto p elo
si s t em a de revez o como pel o d e síngelo . E no acto de soltar, o ebeaâo
tira o chap eu e diz : - «L o u v a d o seja N o sso Senhor J esus C ri sto J•• • Antiga-
mente dizia -s e que os b ois deviam ver o p ôr do sol j á fora d a ca n ge ,

A a garra d e manhã cedo, as aguadas, a merenda, a solto. e a própria faina


a rn t ôria, s u b ordinam-se a muitas outras praxes e regra s, que vão mencionadas
nos parágrafos seguintes, e em out ro s, co m p r een d id os em anteriores capítul os.

* * *
Alq ue ives. Lavrada s d e a Iqu eive e lavra d a s d e seme n tei ra Em ger e.l, a
fo lha ou fo-
lhas de pousio que se pretendem ag ricultar para s em en tei r a de cereais, s ão
lavradas a charrua ou arado, com a necessária e possível antecedência, tantas
vezes quantas o costume preceitua, a terra precisa e a semente exige. C a d a
lavrada ou «ferro», tem nome próprio, s egundo a ordem cr o n oló g ica e propósito
que a motiva.
D ã o-s e e íe rros» de alq ueive e «f err os» de s em en t ei r a . O s de alque iv e, repr e-
sentam a cu l tur a preparatória, e tanto podem s er dois como três, ou um apenas,

- 255 -
ATRAVES DOS CAMPOS

se causas extraord inárias imp edirem outros. C o m o q uer qu e s eja , a lquei ve - se


nos m eses d e janeiro a i u n h c , adi antando-se ou retardando -se o s erviço con -
fo rme o de correr do tempo e a falta ou abundância de ervas. N ão es cass ea nd o
o s past os. pode-se lavrar cedo sem rec ei o de cercear os pousios. Faltando a s
pa stagens, t em de s e ag ua r d a r a aproxim ação d e p rimavera, p a r a s e la vrar s em
preocupação d e que as ervas fa l tem para os rebanhos .
Ao primeiro «f er ro » ou lavrada, cha ma-se-lh e relva , h ) ainda q u e mu ita
g en t e l he dá o n om e de e lq ueive. M a s. este t er m o, co mo creio qu e j á disse,
e m p r eg a - s e g er a l m en t e n um sen ti d o mais g enérico. Em 'lig ar, a palavra alqueive.
signifi ca o conjunto d as la vr a d a s p r eparatórias, o q ue se procede no inverno e
n a pnmave re .
O s eg u n d o «f er ro» , s u bse q ue n te a o da relv o, con he ce- s e p or at al h o, e s e
por vent ura ainda o u tr o s e lhe s egue, du ran t e a quadr o primaveril, o que nã o
é v u lga r. denomina-se terceiro. P or tant o, a relva e o atalho. são os s er vi ço s de
arado ou d e charrua qu e exig e o amanh o d e um alqu ei v e b em a ca bado. A s u a
boa o u má ex ecuçã o, influi podero samente n o preparo da s lav rad a s seg u in tes
- as da sementeira - e mu itas v ezes a t é n o b om êxito d a sear a. C onv ém s em
dúvida lavrar s em p r e com p erfeição, m a s n o «f erro » de relves e n o da se me n -
t eira. mai s qu e n o s intermed iári os . O prim eiro é a bas e e o últ i mo o f ech o d e
toda a la buto e r et õria.
,. ,. ,.
N a maioria d os casos, o alqueive, dep oi s de pronto n a p rimav era , fica em
branco. a t é à próxim a se me ntei ra o u to n a l, principal, senão úni co o bjectivo do
se u pr epar o. S e, p o ré m . o te rreno se pres t a à cultura d o s l egum e, a pro ve ita - s e
lo g o, se m es .ndo -se- Ih e g rão d e b ico e cb.íche ro s. M a s quer fique e m b ranco , o u
s e lh e semeiem l egum es, a te r r a e .lqueiva d e lavra-s e d e no vo mais tarde. d es d e
as «ág uas n ovas » d e se t em bro ou out ubro até n o ve mbr o. pa ra se lh e semea r a
sea r a por ex celênci a: - t rigo. ce nteio, cevada o u aveia . N e s te segun do p erí o d o
d e lavoura , a te rra cultiva -se co m do is «fe r ros» m a is, o u um ape nas. Recebe n do
d oi s, o p ri meiro cha m a -se- Ihe rev olta. O seguinte, ou para mel hor d izer, o
d efini tiv o , q uer seja o segundo da época ou o ú n ico. p or se ter prescindido d o
d a revolta , chama -se-Ihe apenas o d a se me nte ira. Este últi mo «fer r o» s erve
p ara cob r ir a s e me nte. D e forma , q ue a s t erra s pare searas de trigo e ceva da ,
n e s h erdades. p re pa ra m -se em reg ra com d u a s la vradas de alqueive e duas d e
s ementeira . Em regra , repito. Excepctone.l meute, po dem receber mais o u m enos,
por efeito s d e ca u sas m últi plas e a ci den ra ía, q u e s e torna p rolixo esc rever.
P ara o cen te io, as la vra d a s red uzem-se em ge ral a duas ou três, posto q u e
n a s eece a s óti mas p a r a es t e ce rea l, també m se u se la v r á - la s tantas vezes, e com
t a n t o ap u ro, co mo se procede para co m os t rigos. P ara a a v eia. são mais q ue

(ti N. u $llo " .kol. d. <tu e 1. 1. nu . b.., o u. mo r. ' • • Iam duu .I ' njfiu ~õ u. P.IQulu , pu. dul, au .. t ......
({Vo a .. ",.. li m. m d• • " Io lilln• • fim d la Tuum a ..m.... m .m " 'uld• . S e' lul d., o p.lmúro .!tno. do . lq rld .e. IIj••1II
qu. u rra e i ,lo. , fo• . Nua•• u . mpre, _ t OlDO .10611.111I0 d e pudo. ou U T" em po,"lo.

- 256 -
...,o
..e
~"
A TRAvtS DOS CAMPOS

s uficientes os dois «fenos .. do alqueive e um d e sementeira. Q u e até se semeia


d e u m ú nico «ferro.., la v r a ndo-s e «à face», de po usio. para cobrir a sementeira.
E' preparo reles.. mas n em por isso deixa d e ser vulgar.
..... . ... . .. . .... . ....... . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ... . . . . . . ....
o que fica exalado sobre «ferros» ou lavradas, refere-se às searas de
s em en t eira outonal, q ue são as q ue p redominam por tod a a parte, n uma exten-
s ã o e 'im por t ân cia in co mpar àv e1m e n t e s up erior às o utras d e primavera. Às de
p rimave ra - s earas d e trigo r i bei r o, de .t rãos e d e chtc haros -lavr am-se de
relva e d e at alho, d e d ez embro a março, para apó s o llto.1l:JO r eceb erem a semente,
e, l og o em seg u ida , a lavo ura fina l q ue 8S vai cobrir. T r ês «ferros» ao todo ,
qu a nd o m u it o. interca lados e beneficiados com uma o u d uas gradagens de gyades
d e ro jão ou d e out ras melhores. Muitas terras preparadas e semeadas de trigo
'ribeir o na p rimavera. são sim ultâneamente consideradas alqueives para searas
d e sementeir as ontona l e como tais se semeiam de novo no o utone , com trigo.
cen teio, ceva da o u a veia, beneficiando-se antes com a lavrada de revolta e a
defirriti va da semen teira .

Tornas, ca ntos, b o quilh õ e s e lobas Toda e qualquer folha , s u b -divide-se


em tornas - porções de terreno limi-
t a d a s po r regatos, estradas, auifes, va les, vertentes, etc. C ham a m- s e- lhes tornas,
p or cada qua l constituir um campo distinto, que se lavra cm separado. de
h a r m on ia com a s ua co nfiguração geo métrica. P o r outras palavras : as píscolas
d o s arados tornam d e uma a outra ponta, l a vrando em voltas ou caminhadas,
de v ai-véns sucessivos, crescendo o u r ecolhendo a lavoura, segundo as eceide e
do terreno», e se m u ltra passa r em os lim it es convencionados.
Às tornas p restam-se a ser la vra d a s com u m importante número de juntas,
e o rdinàriamente assim aco ntece, sobretudo nos terrenos planos e desembaraça-
do s de pedras, como são os barros de Elvas e os de C a m po Maior. Em planícies
e encostas como estas, é vulga r ver em movimento uma u chaTÍa de 20, 30 e mais
arados, todos pertencentes ao mesmo lavrador.
.... . ... . .. . . . . .. . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .... . . . . . . " .
Em muitas folhas, principalmente nas zonas aciden tadas e pedregosas, a
cada torna, estão adestri1as pedaços de terreno conhecidos por centos uns e p or
bcquílbôes, outros.
P or ca ntos, d esign a m-s e os poelongementos da torna, estreitos e muito pro-
nunciados, que dificultam a «direitura» da lavoura, executada com bastantes
juntas. P a r a remediar o inconveniente, esses prolongamentos lavram -se àpa'r te
com uma o u d uas j u n t a s, sendo «cortados» (demarcados) pelo rego do arado
que manobra o ebegâo, ou pelo de outro d irigente, a q uem calhou «endireitar»
a terra em la bríco.
O s boquilhôes r ed u z em-s e a campos mínimos, separados da to rna por meio
de vales, regatos, etc. Lavram -se também à parte com uma ou duas juntas.

- 257 -
ATRAvt S D O S CAMPO S

C h a m am -s e lobas, ao s espaços que escapam à piscola na s ua passagem.


j un to dos penedos e das árvores. A s juntas e as parelhas n ã o podem aí la vr a r ,
em virtude cl~ desvio q u e forçosamente têm d e des crever para n ão esbarrarem
n esses o bs tácul os . «Passam-lhe à roda », s eg u n d o a frase do estilo.
À se me lh an ça elos cantos e dos boquilb ões, a s l obas la vr a m- se co m u m ou
d o is a rad os de ga n hõ es ou ceeretrcs sabedores, que as «co r tam» tra n sversa l-
me n te, em s en t ido o p osto à lavoura da torna. Para o ca so, p r efer em-s e parelhas
d e m uare s, por s e dirigirem e v oltarem melhor q ue os bois. d espa chando mais.

• • •
Armação das tornas D iz-se «a rmar» ou «aga r r a r» a terra, d os primeiros
r egos q ue se abr em num a torn a. D e co me ço, «a r m a-se»
co m po ucos a rados e, se n do p reciso, «e n di re i ta-se» a a rmação, cortando os ca n -
t os e a s cu rvas qu e fa zem estorvo a o prosseg uiment o re gular da l av oura. Depois
o gover n o vai g u ia n do a lavoura, p ara da r ingress o à s junt a s d a s u a piscola e
ai n da p ara cortar terra à s outras piscolas.
D esta man eira a lavoura cresce, «e n ch e» e avança, segu n d o a dir ecçã o qu e
lhe i mpri m e o abegão. Em regra, a vança n a p onta gu iada o u d ia n teira, e mo r r e
ou re cua na outra ap osta-na po n t a mor ta. M as em cer t as o casiões vã o g u ia -
da s as dua s p on tas e então, a lavrada cres ce em a m bas.

• • •
Pisco las D enominam-se píscolas, os turnos de juntas ou d e parelha s em qu e
se dividem, o conjunto d e a r a d os que l a vr a m n u m a determinada
folha ou torna.
A s lavoura s peq ue n as costumam «deitar u ma piscola de 6 a 10 arad os de
bois e outra de dua s a três p arelhas d e muares, o m áx imo.
Nas lavouras gran des fig u r a m dua s a tr ês piscoles d e bois, de 8 a 10 juntas
ca da, e bem assim a das muares, com tod as a s pa r el has disponíveis, como não
excedam a 8 ou 10 . Indo além dest a quantidade, chegam a com por dua s piscola s.
A o r d em da s juntas e das parelhas na com p o si çã o das píscoles, ob ed ece a
prax e esraeu íde s e aca t adas.
C ada p íscole, for mada em col u n a , tem à fr ente a j un t a do governo r es-
pecti vo, e n a re ceaguarde a do imediato subalterno, o u a de qu em o represente.
O s d ois fica m n os extremos: o primeiro, na ponta dianteira o u guiad a ; o
segu n do, n a d a tra seira ou morta. E en tr e os a ra d os ex tremos das du as pontas,
manuse a dos p el os dirigen t es, en6. le ir am. os do s diri gidos - os d os ga n hõ es ra sos
- t end o lugares cert os ou n ão, confo r m e o uso l ocal, q u e n es te a ssu nte diverge
de zona para z on a. A s sim di sp os tos, são tantos os a rad os quant os os re gos qu e
se abrem no dec u rso d e ca da volta.
Quando as junt a s de boi s formam. d u as ou três píscoles, va i lavrando
na avança da a d o comando excl u sivo do abegão, para es t e d irigir daí toda a
f aina e. sim u ltânea m en te . ir co rta n do a s p egas necess ária a o andam ento das

- 258 -
r
ATRAvt S DOS C A M POS

o utras pisco/as. As quais lavram pa ra l ela m en t e, a certa distância nas te r ras


co rt ada s pelo abegão. P or seu t u ro o, o gove r n o da piscole m ais próxima d a d o
abegão, r ecor ta te rre no à outra que lhe fica da parte de baixo. E assim s u cessi-
vam ente. fi cando em ú ltimo lugar a piscola ou piscoles das parelhas. E sta s
o be dece m t a m bé m a preceitos análogos. sendo respectivamente go ve r n ad a s e
diri gidas p elo m ai oral das mu la s e ajuda.
.. . ...... . ..... . . . . .. . . - - .
Como já di ss e, semp re q ue se t orna n ece ss ário, sa em das p Ísc olas a s j u n tas
ou parelhas pr ecisas para lavrar em àpar te os cantos. ou boquilh ões e as loba s.

• • •
De ág u a s for a e de águas tom ad a s A lavo ura do arado antigo ,6ca d e e âg uas
fora» ou de «águas to madas», s egu n do a
di recção que toma em re lação à eceida» do t err eno. D e «águas fo ra», q ue r dize r
regos 8 favor d a corr en te para que as águas das chuvas escoem à vontad e para
os regatos e va les p róx imos. D e «ág uas tomadas » si gnifi ca lavoura ao inverso
da outra, que susten ha o u dem or e a s águas.
Em cer tos sí tios, para evitar diferen t es arm a çõ es, lavra m-se de «águas
tomadas », terren os haixos q ue r ecla m am lavou ra de «águ a s fora s». M as n es te
caso re m edeia-s e O inconveniente por meio d e margen s - r egos fundos e largos.
abertos em se n tid o op ost o à la vrad a d a t orna.

• • •
Lavoura miu da, larga e enfiada A m'iude, consis t e em d eixar a terra com os
r egos bas tante unido s e de pequen o cu me.
t a melhor lavoura, sobre tudo n o primeiro «fer r o» do a lqu ei ve . U s ada n o da
sementeira, carece de margens ( 1) ab ertas na s covas ou baix ios pouco ou nada
escoante s.
A lav oura larga ou aberta - r egos d e gu mes es paços os e distan ciados -
use- se d e preferência n o at alho e na revolta. Lá diz o ditado: Atalho, em que
seja com um ram alho . . . Revolta. at é com uma erreigote . . . h ) À lavou ra larga
e profu n da n o atalho, tem a van ta g em de pô r a te rra em m elhores condições d e
ser calada com os raios d o sol, n o verão, qu e muito e m uito a bene6ciam.
Nas sem en te iras de terrenos are nosos, já p repa ra dos com um bom alqueive
também se ad opta a la voura ab erta . Adia nta o se r viço e n ã o prejud ica, a ntes
con vém, excepto n a s encosta s í ngremes, com te rrenos de fác il d ese grega mento.
P or lavou ra enfiada, cl assifica- s e a d e transiçã o ou m eio te r mo entre as
d uas já aludidas, ou se ja a que n ã o fica mui to fec hada, n em muito a berta.
De qualq ue r mo do, e em todas a s épo ca s, os regos de vem fica r f undos, s e a
camada arável o pe rmite. M a s nas terras d e pouco chão , com m en os de cinco

(1) Ratei ln "o•• fundo • • cono o 16 di....


( :r~ P l ol6q u.lo "Mi,o, I. . ltlIJficu q u .. I... oun d. u~o lt . '" ••noIU ' ·. .."'c. j o... m u m o te ndo m..1 f.l ll.. P or I.n, lo, ..
tulo ra1DDm .. I.litlll.l. qut o .f~rro ' do aI .160 • DO,. . j,ad . q". u i' CO/l:l um ral,ulllo.

259 -
ATRAvt S DO S CAMPO S

cen tí me t ros de espess ura , n ã o s e p ode ob t er essa vanta g em. Àí, as l a vrada s tê m
de ser s u perficial íss imas, de f u nd u ra i nferio r à q u e s e pode obter co m O velho
arado r om a no, único q ue 8S pode lavr ar. Sem em bar go. chega m a p r od u z ír
r egul arm ente D O a nos d e bo a s co l h ei ta s.

• • •
Preceitos diverso s Às j untas d evem ca m inh a r p erto umas das o utras, em
co l u na ce rrad a, pa r a na piscola n ã o ha v er i n terv a los espa -
çosos, o que parece ma l e atrasa o d espach o. S empre q u e o ebe g êc n o ta essa irre-
g u larid ade, cen sura-a grita n do : - «O h I ra p a z es : chegue m-se un s para os out ro s.
I sto para s erem ju ntas , deve m i r j u ntas ... »
Mas nas terra s de p enedios vastos, nunca as píscoles a n dam completas,
nem 8 S j unta s u nida s. Os ped r egul h os e a r r if es que a s em bara ça m e pejam ,
obriga a o des vio e di s p ers ã o . C a d a u m f u ra p or o n de po d e, com t ant o q ue
revolva t erra.
. ..... .... ...... . ................. .... . .. . .... ..................... ... .... ..
S ej a como for, d es d e q u e na la v o ura figur em muitos c r e dos. h á. q u ase se m -
pre juntas p aradas, fo r a d a s p íscoles, po r mai s q ue se a r relie o ebe àã o e p ri n ci-
palment e o lavrador. Mas t em d e se r assim p or ca usa d os reparos n a s entei-
chaduras e p a ra s a tisf ação de n ecessidades urgentes p or par t e d o pessoal.
Ànti gam ente, n as lav oura s d e me n os d e d ez a r a dos, en qu anto um ganhão bota va
fora co m a junta para s e agach ar , n ã o s aia o u t ro po r a ná logo motivo. O que
tal pretendesse ti nha de esperar p elo r egress o do compan heiro . .. Hoje n ã o se
olha p a r a s emelhante s nin h aria s. P ersiste, po rém , o co st u m e d e n ing ué m sair
para be ber o u f u m a r. Q ue m apeteça á gua o u pretenda faze r o cigarro, t em de
a guardar pelas a g uad as. S ó pode d eix ar o arad o, s e por acaso lhe aparece um
ch egadiço. que o q ueira s ubsti t u ir. E às v ezes apa recem: ge nte que procura tra-
balho, co nvalesce ntes em passeio, o u t ran s eunt es q u e saem d o ca m inho para
con v ers ar em co m o s parceiros da ga n h a r ia. A d v en tí cio s de ocasião, que n ã o
de sdenham d a r m eia d úzia d e re g os com O arado do a migo pred tleto. Cheg a a
s er d a co rtesi a u ma a juda ainha de se mel hante n atureza. O ajudado 'reco m -
pens a- a , puxando d a petaca e faze ndo um cigarro para o amigo e outro para si.
Ciga rros s r a udos , sem vislumbres de sovinice. que os d ois a cendem e chupam
como g u losei m a d elici os a . E. d e t och a acesa , a mbos caminham a trás da j u nta,
em ca vaq ueira í ntime, regal ad o. com baforadas de fu m o q u e a tira m ao ven to . . .
..... . ................. . ........ . ........... . .......... . . . ..... . ... . . . ......
N a la vo ur a co m o u r ad o antigo o ganhã o ca m i n ha e ~uia d e den t ro d a
terra re cém-la v ra d a. seguran do o ee ban ejo com a mão que lh e fica de fora e a
a guilhad a co m a o ut ra . Na d e cha r r ueca s eg u e-se sistema o posto: o homem
a garra e g o verna a re b íce, caminhando da parte d e fora .

As j u ntas e parelhas estacam n as pon tas de la v r a d a, pare voltar em e lav ra-


rem em marcha inversa à q ue vinham tra zendo. C ada junta p ára à vo z d o: -

- 260 -
ATRAvtS DOS CAMPOS

. Oh J. .. aí. .. » do respectivo ganhão. qu e a seguir a livi a e p uxa o arado para


si. segurando a mãozeira COm certa pressão. Ao mesmo tempo, toca no boi, que
va i ao rego e eempaea-oe com a aguilhada. Pelo estímulo, pelo hábito e pela
r esistência que encontra no rebanefo, o boi do rego principia a voltar e o com-
panheiro a recuar. Enquanto um boi volto e o outro recua, o homem co a d j u v a
a manobra, inclinando e arrastando o BTa do, até que a volta se ef ect u a.
Consecutivamente, o s a n h ã o põe tudo em tiro. mudando de mãos o rabanejc e
a ag uilhada. E antes o u logo depois, limpa o Brado de terra e raizes q ue se lhe
acumularam entre as eiveces,
À vo lta das parelhas r ea li za-s e quase pela mesma forma . mas com maior
rapidez, devido à ligeireza do gado e ao recurso das arreatas.
Voltados os a r a d o s, cada homem seg ue abrindo o seu rego, encostando-o
aos outros já feitos. Vão lavrando miudo ou la r g o, f undo ou superficial,
segundo o estado do. terra e as ordens do abegão. Este ou q uem o representa,
manda levrer, conforme a sasão da terra. a época, o tempo que vai, e o m o ti v o
da lavrada .
Se uma junta se afasta do rumo devido, o rego em vez de fazer aresta com
com o que Lhe fica paralelo, como é de preceito, d eixa pelo contrá.rio um certo
esp aço inculto. de permeio. a que se chama camalhão. A ssim, quando acontece
esse precalço, o 8anhão faz vir a junta ao rego, p a ra o defeito não prosseguir,
e, imediatamente, brada ao companheiro de atrás: - .Lavra bem . . . _ - Ou : -
«M et e para dentro. .... O companheiro, ouvindo-o, r ep a r a no emal Ievrado », e,
desde logo, encaminha a sua j unta em sentido d e abrir o camal hão pelo centro,
com q ue o defeito d esa pareça .
.............................. . . ....... . ..... . ... . .......... . .. ....... . .....
I ndo o arado bastante f undo diz-se aberto. E se ul t r a pa s sa r os limites do
preciso, caminhan do «de estaca», com tracção di6cultosa, considera-se destem-
perado. Se pelo contrário vai à superfície. riscan d o ou arra nhando. julga-se
cerrado. Em qualquer das hipóteses. t rabalha mal e carece de tempero, mudan-
do-se de furo a chavelha do timão.
Se o arado peca por aberto, o 8anhão diz alto para o imediato da frent e:
- «D eita lá um furo atrás .•. _ E indo cerrado: - «B ot a lá um furo adiante . . . _
O camarada, volta-se e satisfaz-lhe o pedido co n f or m e a recomendação.
Se algum da ganharia conserva o arado cerrado para ter menos trabalho,
sem se importar com o péssimo serviço que fa z - o ebegâc, como repare, ou
obriga o madraço a lavrar em termos, ou vai ele em pessoa corri~ir o abuso.
Quando o chefe da lavoura «p õ e furos » adiante no arado de outrem é, na
mente de que o tipo abale, vêxado e sacudido pe lo ataque que lh e inflin-
giram.
Ás vezes o deste mpero de u m a enteichadura é tão exa gerado, que se não
emenda com a mudança de chevelhe , mas somente por meio de peque ninas
cunhas q ue s e encrav a m junto d a t eiró. principa l r egu lador. Então. p ara s e cor-

- 26 1 -
A TRA vtS DOS C AMPOS

rigir O defeit o, a junta sai da púco]a e m et e pa ra de ntro da lavo u ra . O ga n hão


deixa-a aí parada, r eun e as ferramentas , e va i t er com o ab egão, participan do -
-lh e o i n co n venien t e. O a begã o, o uve-o, ent rega-lhe o posto, e segue a end irei-
t a r o a r a do de harmonia com a s segu intes r egra s . P a ra a brir, afim de o timão
a Ica n sar ponte e o fer ro aga rra r bem, introduz uma cunha no bura co da gar-
gant a e a tei ró, no lado da traseira, o u em baixo n o dente, n a fa ce q ue arrasta
sobre a terra e na r etaguarda do o rifício por o n d e se me te a teÍró.
P a r a cerrar, põe ap en a s u ma cun h a adi an te da t eirá, DO bur a co do a r a do,
fac e i nferior.
C om a i n trod u ção e 'rep er to da s cu n has pOI meio d o esco p ro e d o medeio,
o abegão d ep r essa regu la a en teichad u ra . M a s s õ se co n vence d ep oi s d e a ex pe-
riment a r. C omo a p rova o se tiste ça , d á a missão por acaba da e regressa à p ís-:
cola a assu mir o seu posto. O gachão que o s ubstit uia, volta ao lu gar que lhe
pert ence.

Muda n ça d e fe r r os Sempre que se põem in ca p a zes de servir, por romb os ou


mui tos gastos, os fe rros dos arados são substit uidos por
outros consertados de 8~ UÇOS~ smenhos o u remontes, h l s en ã o novos, o que é
r aro. E é raro, porque os ferros foriados du r am anos e e nos, à custa de con-
ser tos freq uentes.
Um a ferragem faz boa lavoura dura nte q uatro a seis dia s, se a terra está
b ra nda o u f8~ u lh eira . E s t and o rezíe o u encr u a da, chega-s e a en ferra r duas
vezes po r dia, ou uma pelo me nos, como sucede n os períodos d e estiagem, em
t errenos endure cidos. Os f erros gas ta m -se, se gundo o estado e a quantidade d o
solo q ue rom p em. À s t erra s aren osa s arrombam e inu tilizam muito m a is q ue
as o u tras.
O lavrad or que capricha em trazer os se us arados bem en l erre d os, poss ui
três fer ragens: u ma a lavrar, outra d e p rev enção, pronta a s ub stit u ir a que está
f u ncionando, e a te rceira na la i a do f err eire, para de l á regressa r conse rtada
q ua ndo entrar a receber amanho q ualque r da s o u tras d u as.
. . . . .. . . . . . . ... . . . . .... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . ............. . . . . . . . . .

E n éeera-s e a toda a h or a que seja preciso, ainda que se suspe nda a lavo ure
por insta ntes. M a s co mo n ão haja urgência maior, aproveitam-se as pa rage ns
d a s a g uadas~ o u as d a m eren da, senão a solta à norte, o u a a garra de manhã.
N a ocasião cporrun a, o ~ov erno diz em voz a lta: - «Vá de enfe rrar .. . »
E todos d a gan h enia, obedece ndo, tra tam d e s ubstituir o fe r ro gas to da sua
en t ei ch e dura por o utr o ama n h a d o. A seg wir, tran s po rta m os i nca pazes para um

(1) A,uu. como (h ll mUl t . .. p.rub•• Umh..... 111 m up no .implld..lmo 1100 bh o do ferro . Aman ho, fru dQ ~ o , mpalm,
de l;Im t U (O da (u ro. o u "'bO'. ~u blti l uJ nd o · llu a P.tll dOlulou d. por ou tra 1100... . b.tlda a ul d..da 1100 rU I.lIofa. R, mont fl•
•fp !fi e. ( Ob . U t O u tUeal. m.lor Que lIo.nhum.

- 262 -
ATRAvt S DOS C A MP O S

do s car r os das mulas, Ou para sítio indicado p elo govern o. Entretanto, co m en -


tam a perfei ção ou imperfeição artística do mestre ferreiro.
. . . . ... . .. . . . .. . . . .. . . . . . . . . . . . . . . ... . . . . . ...... . . . ... . . . . .. . . .... . . .. . . . . . .
Mu da nça d e relhas A su bsti tu içã o da s q ue se gasta m ou p a r t em na s char-
rue ca s p or outras n ova s. es tá a cargo exclusivo do abegão
que 8S vai renovando i soladamente, à medid a que se det erioram. E p ara este
ef eito , pro cede como q ua n d o t em p er a e co nser ta os a r a d os e as charr uas .
Quero di zer, enquanto p ô e a Telha com a chave e mais fe rramen tas, su bstit u i-se
na piscola p elo ganh ã o da charrua a qu e tem de a ten d er.
A s Telbas d as cheeruece s, um a v ee gast as o u q u ebra d a s, n ã o mais se rvem
na Lavoura . P or s er em d e ferr o fundid o n ão vale a p en a consertá - las. D ep ois
de arrom badas. j u n ta m -se em g ra n des po r ções, pa ra se vendere m co mo s ucata .
.. .. .
Madeira partida Qu and o se queb ra o tima o, o arado, o u as efveces, de q u a l-
q uer en te ic h a d u r a , o genbão r es p ect ivo met e lo go para d en tr o
da lav oura com o a rado e a junta , para nd o à distâ n cia d e poucos passos.
A í d eixa a j u n ta e vai b uscar as f erramenta s e a ma deira a emp r egar. (I ) D epoi s,
ten do tu do r eunido, chega -se a o ab egã o o u ve-c d e m elh or o u p i or catad u ra.
entrega - l he a junta e dis põ e- se a ir tratar do am anh o. <d M a s prim eiro orienta
o subord inado n a dire cção q ue deve se guir a lavoura. S e julga n ecessário,
tamb ém inqu ir e do f acto para que é ch a m a do. E se do que a pura encontra
m otivo para ierroeds n u Sa n hão. a n:i rna -I he sem r ebuço pa ra q ue sirva d e
em en da . Em r egre n ã o se rve, m as é como se ser visse. n a m en te do «go ver no »,
está cla ro .
O repr eendi do, ou ag ue nta em seco se m dar ca vaco, o u r etroca da mesma
m oeda , com d esculpa s d e cabo de esquadra. C om o seja to r to e az edo, r es pi n ga e
mosca. voltando a s cos tas e ab aland o. Tamb é m acontece ser o eb egê c q u e
manda em bo r a o sanhão, na h ipó t es e d e r eincidência m anifest a m en t e abu siva .
Fa rt o de o ver es t raga r sem tom n em so m, põe- n o a a nd a r, in dica n d o- lh e a

(1) A I ftl'U llllfIt. . .1lCOftU . - " I1UIII 01.010 li d o • • POUCOI p."OI. 0 11 01 1 o .blti o . 1 coloco" Ou IIIl ftdo u co lou.r.
A ml dl ln. COIIIO I udol • tI", õ". 'U' ftO 1II0nl• • n. ceb..n. d o cup;M. no. II o mo n tl fie l mu lto pr 6x11110. E ..uftd o dl l tU I-
e1.do. 1m que a io u ll IIIUItO, 1., pro..l.lo d. l. .. o. c ur O' 01... 1IIu1.. 'lo••colllp.nh"lII • """OllrA . Onde qllu qu e II lei l . pcuo
o.. 1011". ai um 011;1' b u. d · t . lo, cou.. o ' .fthlo 'lU. I lIu l u il. p u • • ,u.. I ftfeiC1.,I!u:r• . Vai d. " onud c , dl mora q .. ..ftt o
podl • ucoIb•• qu e Ib ••, r. a ., como o de i<'U .... Qu.....t o • I /cccl' coat ulII.. IIlIIpl'l 1..... 11' r uen • • j .. MO 01.. I n ollu,
(d Do . "' ....100. i "'0010 de d izer. P orqu•• • bft. l. o .1..'10 IImlt" " 1 I , " bulrui r .. $1'(" p.rdd.. 'Por o .. tn. li a"" ou
repU l al' $1110 '&.f,lauuo. O 0 011'0 o ch . fl d. 1"' 0"1'1• •'1.. .. pl o u d • • 0 I ftC ..1x1 • 1II0 ftU ' . m 0101 ti miju 110" .1'.. 01 0• • o u
..lu _Ylr... C • op o,; (lo d....i,llu. N l o ob . u nte tom d e 1I.b.lbu co m. ' .11:6 . o "COpI'O • I Yln nlll • • A ..u rum l p. r.. . brir
o. bUrl co" por o lldl ... . 11 o, ' 1'1' 0' 01. , ..I..cc• • : o cnop ro ... 11Oll6, p u • • cer l. r o. en cl i".. d . In lllc1..du:r• •
. . ... . .... . .. . . . . . . . . .. . . . . . . . . . .. . . . ... . . . . . . .. - . . .. . . . . . . ...... . . . . . . . . ...
Muilo, ' l ftbl5u ' U i. ... 01. ee .. ,nlu 01 lIu ' .ndo, pu.. o 4 0 • • jU~,II.do ... " PIO' . p. d.... Ucenç . lO .b., 10 . qu e lh.
coftccdl 00 u cu", .. , onda o n1l ullido. Neee.... de..l.. COD ' lfttlr 111I lal. pri ftclpl lmutc . 0' In'l<pa ll nt.. ou 1II1dl:.Ç O. ·
POllCO pr' tlc o, o.... 1I",·lço dllll ol'lm molto • ful· lo I d. ordJfthio ficI 11I. 1 Jeito. R.." ludo : o .lIuu lho du ra p ou co. I . COIIIO
c OlUc4 alaci• • I' 11m d. ir .fill.l o .be,lo ou o ' oU Jlroca4u . " ' ull do u p.ro. q o. ftlo • •ri. pu ci o Jlrlllldro b C.... bOIll'
O . ......1.00101 ar.d o, por ..n lçú . 'l o. lli o " iam , on , nol . ,6 muilo exc.pcio ft.lllll ftll te 01 COllu ftti r • • 1, _
. a llh io j.holo. 40. $1.1. lN. u collhecid l u lldf llcl. u lh l a P' II • • dlllh l..•...

- 263 -
ATR AVt.S DOS CAMPOS

estra da. E vai-lhe dizendo q ue p rocu r e outra vida . C om a q u ela «não faz filho -
ses», à m íngua de sentid o, o u à fa lta d e opinião ...
C om O auxílio da enxó, do escc p ro, da verr u m a e do martelo, o abeg êo
efectua o conserto, substituindo a peça o u peças inutilizadas por outras novas
ou reparadas. Imed iatamente m ira e r em ira a enre ich a d ur a , engata , faz expe-
riências lavrando u m pouco, e efi na l, certificado de q ue t udo 6.cou bem, recolhe
as feuamentas n a a lcofa e encam in ha a j unta para a eboce> da torna, onde a
deixa proota a enccrpo re r-se na piscol a. Em contínuo va i ocupar O se u pos to
na lavou ra para q ue o ge n h âo siga a la vra r com o a r a do q u e lhe conse rtou.
Antes de se separarem, ebegão e gsn hão com entam o a ma n ho e as co nd ições
da madeira empregada. O ca rpi nteiro t ambé m é objec to d e referê ncias. boas ou
más, segundo o co nceito q ue lh es m erece. E.m r eg r a. apo dam-no de trapalhão o u
empreiteiro.
. ... . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . ..... . . . . . . . ... .
As peças e acessórios de madeira que compõem os arados e charruas,
ga s ta m - s e e par tem-se com o uso e O embate de co ntingê ncias mais ou menos
inevitáveis. C a u sas f req uentes. a esca brosidade dos te rrenos. os descuidos do
pessoal , e. por vezes, a i mpa ci ên ci a do gado, q ua ndo n a primavera es tá go rdo e
a mosca o apoq ue nta.
O arado (dente). a lém de se quebrar por gasto, desde nta-se e parte-se com
os impulsos que sofre. sob ret udo q uando o fe rro anda largo na pa rte traseira
dos polegares.
O timão, ou. melhor exp licando, a garga n ta , q u ebr a-se nos topes das moitas
e das pedras, quase sempre pelo bu r a co d a e t e ir ô», se o tope fo r direit o. S en d o
de to rcilh.ão, o pau estala e fragme nta -se n a l iga çã o com a pont a, quando não
sucede partir-se a própria ponta também . j un t o da vi ela que ampara e em palma
com a garganta.
A ponta quebra -se pela causa já a ludida, ou em resultado de um d os bois
lh e cair em cima, empurrado pelo compa nheir o, ao passarem por u m estreito
acanhado e di6.cultoso.
Quanto ao rebenefo, é o que está menos sujeito a azares. sendo também o
que menos se gasta. Só se parte ao impulso de pancada fo rte ou tope brusco, se
a mãozeira se escapa ao sanhão. o u se este é forçado a abandoná-la na passa -
gem por algum en ta lã o d e d.ifícil a ces so.
Restam as sívecss, que se detioram e in ut ilizam em q uantidade muito
maior que tudo mais. D a q u i que dali, o abegêo é cha mado a pôr e iveces,
no que se não repara muito por serem apêndices de p o u co valor. que se gastam
e partem com facilidade .
... . . . . .. . ..... . . . . . . . . . ... . . . . . . ...... . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . . .. . . . . . . . . . ..
A cautela ou negligência do pessoal i n flu i bastante na conservação e d ura-
ção d a m ad ei ra. e s pecialm en t e dos arados e d os timões. Por isso algu ns
l avrador es u sam paga r mais 10 reis p o r dia a cada homem que não faça l en ha
da s ua respectiva enteíchad uea . E.stimu lam-no ass im a maiores cuidados, e
ATRA vtS D O S CA MPOS

obtém- nos em parte, com as eq u iva lentes van ta gen s, mas nã o t a ntas como rea l -
mente se podia conseg uir. H á ga n hões q ue em não l h es a gra da n d o o arado o u
o timão. pa rtem -no de propósito, com .fingido descuido. no primeiro ensejo que
se lhes depare. Mais : nos di as em que se pautem m uitos a r a dos.. mofam do
caso, e sorr identes dizem u n s para os outros : - .Grande esnoce fizemos boie i. . .
Baia um a eSSSTna Ch.8 / •. . Te mem, se não fosse o gasto, sobravam os car-
pinteiros . .. »
.... ........... ..... ....... .. .... .. ............................... ... ..... ..
E ' uma despesa impor tante esta da madeira cons umida na lavoura. E nas
terras de a reia, sobe co n si der ê vel me nt e, po r limarem como n enh u m a s, a p esar
de se lhes aplicarem a rados, timões e aivecas dos mais grossos que se alcançam.
Nos terrenos de moitais de ptorno e de ca r rasco, também se q ueb ra made ira
em percentagem g ra n d e, máxime se O ra i za m e é basto e pouco vi sível. como
quando as moitas estão cortadas de Iresco, que não mostram rebentões. Aí, co mo
falte a ce u re la , o a r a d o prende de vez em quando nas raizes q ue encontra , sendo
facílimo partir-se com a força que o gado faz para O libe rtar. O ge.nh ão cum-
pridcr, evita o embaraço, levantando o a r a d o ligeir a m ente ao passar pe la m oita,
mas de modo que o rego não fiq ue interrompido. O preg u içoso, em vez d e
alivia r no momento preciso, inclina O cebaceio pa ra o lado de menor resistên ci a,
de maneira que o ferro e o den te resvalem , saindo incólumes. E': artimanh a
có moda, posto que inaceitável. Com a inclinação da e nteíehadure, interrompe-se
o rego e faz -se camalbão, coisa fe ia e imprópria. Mas quer se leva n t e o u incline
o arado, este nem sempre se move a tempo de evitar que se pren da e parta, ou
qu e pelo menos fique preso, es ta ce ndo a junta . E também se observa o contrá -
rio: não para r a j unta e a cepa estoirar e ar rance r-se , prosseguindo a l a vour a
sem prejuizo, graças ao potente esforço dos animais e à resistência da entei-
taichadeíra.
O estoiro e arranque da cepa por semelhante fo rmo, considera-se um feito
notório, que o ganb.âo celebra jubiloso, exclamando : - ((Eh bois va le n tes I. .. 111
N "a h ipótese de o arado prender sem quebrar madeira nem levan ta r r aiaes,
o ganhão, acudindo a tempo, socega a jun ta e ameiga-a assim: - «Oh I aí . ..
oh 1. . . Atrás boi. .. atrás.. . » - E bate-lhe as palmas, atirando-lhe para a fr ente
com uma pedrita o u torrão. Se estas artima nhas falham , intervém o ganhão da
junta imediata q ue, voltando -se, acena 80 S bois desobedientes, obrigando -os a
recuar. Em os bois recuando, o arado solta-se com pequeno esforço. M as se por
excepção, persiste encravado, com o ferro espetado até a os polegares - o ganhão
respectivo pede o auxí lio dos camaradas, q ue em tal a l tura acodem, mas chas-
queando-o pelo i ns ucesso . O ins ucesso e a troça põem- no corrido. porque a
interve nção dos companheiros constitui vexame e iné pcia . previs ta e punida
com a perda da boia (I ) o be nefício da gan har ia, na pri me ira ceia de carne.

(1) A lJ:aal cUII.o fiu lujc ilo n, C1l1 q,unto tnta di .oltu o an do, d.lxa uir a 1'lIllhlda ou I a ba nd o n a , . m ..n dI
I ...."1"01111" lO pllto. d. , o",to PUlO I" ." p' "'I tun , como' dI II'n 1l1. Q "'I umllh.ntu c u tl.o' - di •••.. CID abono d.
u ldad. _ 4.11 11. Il."'Dca do a plicad o• • E m . er al Eal.-.. nll". PU"1IIO di tt'o çU" O. d.1I IlqIlI 1l.1U .

- 265 -
AT RAvts DOS C AMPOS

N ã o obstante, o ch a sq u ea do resig na-se para q u e a enteichadura se desobst rua


d e vez, como realmente se des obstr ui a poder de esforços.
... . . . .. . ... ..... . . .. . ....... .. ... , ' .
P elo que fica d ito, e por o u tras raz ões, q ue seria ocioso relatar, co n vé m
entrega rem-se as j u ntas a ganhões j eitosos. co m t acto e habilidade. Nas t erras
de penedia! e arrífe s, mais s e impõe a es colha d o pessoal, pelos obstáculos que
se deparam o cada passo : - arrtlões e p ed r eg u lh os a pejarem o terreno, f orm ando
labi rintos estontea ntes. espaços re duzidos, qu e, p or muito f errei s, co n vé m lavrar,
embora à cus ta de pachorr a , de jeito e de tempo.
Ao entra r uma junta p or qua lquer desses ga rg a n t ões apertado s, o ge nh ão
sabedo r, fala aos bois, am ei ga - os 8geitiva-lhe o arado, de m odo que lavre e saia
i ncólume do escolho. P a r a is to os m el h ores bois e os m elhores ge nhô es, en con-
tra m -se na fregues ia de Santa Eu lá lia, habitu ad os uns e o u t ros a lavr arem em
t erras embaraçadas. Tornas extens as, r etalha da s em cu rra ló rio s e n esgas sin uo-
sas, onde só cabe u m a o u duas j unta s. N esta s circun stâncias as píscolas
desmante lam-se e esbandalham-s e para cada a r a do lavrar p or o n de possa.
E onde o ferro não consi ga penetrar, o ga n h ã o rem ed eia a fa lt a p o r ocasião das
voltas, revolvendo o solo com a pá da a guilhada . (,)
S em p re que se la vr a po r en t re brenh as penha scos as, interes sa ver como os
bois de uma junta se col oca m nas d ifícei s e i n có m od as p osiçõ es qu e o ca so
exige, ora t repando. ora d es cendo, ga lg a n do ambos num sítio p a r a n outro
i m ed i a t o avançar um só b oi , a6.m de os dois. p or s u a vez, t ra n s por em a sai da
-saida tão estreita e es ca b rosa , que a miudo os a nimais resvalam e caem ,
ferindo os cu rvil hões. O san hã o va i sempre animando os bois t ocando-lhe d e
l eve com a ag uilh a da , e afa gando-os de m ansinho co m as frase s habitu ai s :
- .V a m os lá. Brazid o 1. .• Oh re go ... Cerejo 1. .. Eh boí 1. • . À. r oda.. . Ai... à
roda.. . oh 1. . . o h L .. lI> E. os bois obedecem, vã o ao r ego, e se p or a ca so s e afas -
tam e negam, um oh 1. .. o h l. . . mais alto e intimativo, com maior pressão d e
r abaneio, fá-los vir às eíveces e caminharem em t ermos. O s a n h ã o jeitoso
consegue este resultado s em esforço gr a n de j mas o á spero ou desastrado m a lo-
gea m - se -Ibe as tenta tiv a s. N a maioria d os casos só con segue quebrar mad eira
- faze r esga r nBcha, co mo eles dizem .

Golpes no s boi s Corta-se u m ou outro boi n as unhas d as patas traseiras por


serem atin gidos pelo fe rro d o a rado, quando a junta foge
sem governo ou a lavrar, se o arado es capa ao ga n h ã o, sac ud ido por tope vio-
lento. Em geral, só acontece esse precalço quando a ju n ta lavra com enteicha-
duee, de tim õo curto. O t im ão comprido desvia os bois do ferro. e portanto
preserva-os d e se re m golpeados.
E m muitos casos, o go lpe nas u nha s fa z coxear o boi, pos to q ue sem g ravi-

(l) A arrlUud4

:2 66 -
xr s xvzs D OS CA MPO S

dade, N o enta n t o. pode produzir con sequê n cias piores. co m o inutilizar II r ez


por muito tem po o u para sempre.

Oeiras P or 8eira, considera-se a p orçã o de t erra que lavra p OI dia o arad o d e


uma junta de b ois ou o d e u ma parelha de muar es. Esta é a definição
comum da palavra, mas n o cam po vari a um pou co de silt nifica ção. aplfcand o- se,
principalmen te, para a q u ilat ar o t ra ba lh o de lavoura q ue d emanda ou deman-
dou determina do terr eno. Exemplo : se um a torna se la vr ou num di a com vinte
arad os, d iz -se que ess a torne l ev ou vin te g e ira s, e n ã o se d iz q ue as representa
ou mede.
C omo se sa be , a s ei ra er a uma m edida ag rá ria antig a . eq ui vale n t e a meio
hect ar e. pouco mais o u m enos.

A LAVOURA NO OUTONO
N ã o há época de maior int en si dade de la voura do q ue a desses lindos d ias
do ou t o n o, q u e decorrem desde o S. Miguel at é p rin cí pios de d ez em bro. É a época
das seme nte iras dos cere a is e, simult ân ea m en t e, das la vr ad as defini tivas qu e as
a n t ecede m . É enfim, o p rep a'ro da s se a r as n os al queiv es e queima dos d a s h erda-
de s e fe r reg ia is. Gran d e Hd a, n ã o h á dú vida . Lid a a fa nosa que e m pr eg a todo o
gentio d e jei to e t od o o ga do q ue sirva . Q u em t em f or ças n a cha velha a provei-
ta- as a vale r , p ondo em t iro o m á xi m o n úm ero de a ra dos. M as nã o basta ser
m uita a uciierie, P ara o trab alho lu zir, cerceia m -se a s h ora s d e d escan so, r edu -
z em -se a s folgas (I ) e aviva -se o pa s so do ga do. Tudo se co n j uga p a ra se fa bri-
car em a s te rras a tempo, ao im pulso d e esforços t en acíssimos q ue tomam a
atençã o de toda a gente int eressada, d esde o la vra dor de grava ta a té 80 ch a r epe
de aa ragoça, de sd e o e begã o de « mãos g ran des» até a o ga n hão «de man ta às
costa s» . S ó se cu ida de lavrar, de l avrar muito e semear muito. A seara é tudo.
P or el a deixa - se t udo.
N este propósi to o lavrador alh eia-se dos o u t ros r amos da sua p rofissão ,
pa ra a te n de r p rin cip a lmen t e a o and am ento das piscoles. C om o possa , n ã o l arg a
os arados, a o bser var- lhe o despach o, a v ê-los «d es p ej a r » t erra e e nterra r
sem ente - a een ch er era» ca n t os e torna s, prosse guind o impávidos para um dia
acabarem. Quando ch egará ess e d ia? - interroga p a r a con sigo o lavrador.
E como n ão saiba responder d e Improvis o, faz cálc u lo s, estabelece confrontos e
tira conclusões. C onclusõe s vári as, q ue p or fa l ív eis e opos t a s que sejam, n ão O
desviam d o fi m almejado - conclui r as la vradas e as seme n teir a s a te m p o ével
e n ão «à noite», por assim dizer, já quand o a s ch uva s do Natal lh e t êm alagado
os terre nos. A ideia de a cabar cedo. se m faltar à t erra com os s er viços que l h.e
sã o dados, domina-lhe o cérebro. E. emp en ha -se n este des idera tum co m sing ulax
afinco. Se o consegue, im pa de satisfação. C o m o sej a va id oso, cr esce- lhe o rego-

(t } O . di.. ful .do•.

- 261 -
A T RA v t S D O S C AMPOS

z ij o s e r epara r n o q u e v ar p or ca s a d os vizinh o s e n otar que eles a ind a es tã o


at r asad os.
Na. hipótese con trári a . isto é. qu a n do o l avrador ch ege. a convencer-se q u e
será o 6 1timo ou um dos últim os a concluir a r efrega, rala-se e amo fina-se. p or
fl eumático q u e seja. M as apar entemente. para q u e o não disfrutem, m os tra ca r a
a leg re e j us rifice, o atra s o com to d a a lógica d e que d ispõ e. Nem t o dos podem •
acabar cedo e a o m esmo t em po, é certo ; m a s lodos pret endem n ã o s er do s ú lti-
mos, p or int eress e p ró p rio e pa ra lustr e de brios. Nin gu ém q uer 6 car com a
«c h av e» , q ue assim s e d iz n o la vrador que na fre guesia foi último a terminar.
É Iis orrgei r o ser-se o prim eiro e desagradá ve l o últ i mo, se m dú vi da. M as, m el ho r
o u pior, tudo s e expli ca e justifica, com encó mios o u censuras para o s v i sados.
seg u n do o co ncei to e m que es tão pa r a os críticos q u e os a preciam, co l eg a s e n ão
não co legas. O s cria dos f a z em co r o co m o s patr ões. N a pres en ça, está cla ro .
Ne au sência vu r ia m de to m , co nfor me sopra m os vento s .

S e co mo fi ca dito e é i negá ve l, o la vrad or, n o o u to no, em po uco m ais s e


oc u pa d o q u e n o amanh o e se me nteira d as t erras, os criados e t od o s qu e v i vem
d o ca m po dedi ca m t a mb ém os s eus pe n sam ento s e comen tá r ios a essa labuta
int ens a . É a o rdem d o d ia e da n oite, que en tret ém todo o cida dão, in cl u indo
os p r ó prios ig no ra n tes d e la v oura . Estes, abs or v ido s pelo m ei o. julgam-se n o
d ever de ta mbé m di s cretiarem s obre a ma t éria, proferindo a s ua s entença , fun-
d ad a nas t eoria s de entend ed ores ou pseudo-entendedores, q ue citam a ca d a
m omen to. como orácu los ven er á veis e infalíveis ..•
As sim . qua se se n ã o fala n outra co isa , com um a prodig alidad e de de talhe s
q ue p r ee nchem o s serões e a s h oras de ó cio, na s l ojas. n as b oticas, na s t abern as,
n as cazin h as d os ga nhões e na s praças públicas. Na s povoaçõ es e n o ca m po,
'ín q o ere -se d o n ú m ero de arados q u e «deita m» os d iferentes la v ra d ores e o q u e
semei a m; ap re cia m -se os se rviço s d e cada «casa», tanto na execu ção co mo no
adia nt a m en t o e atraso que d enota m; co men t a m -se os salá r ios e a s cau s as da
a lt a o u baixa; citam-se os nome s e as q ualidade s do s ganhões q ue serve m este
e a qu el e ; dis cu tem-s e os e hegôes , sot as , b oieiros e seme a dores; vati ci na- se s ob r e
o futur o d as sea ras e o calibre d o e n o ; h á, enfim , carradas d e considera ções e
prog n ó s ti co s so b re o t emp o, n ã o esquecendo r eferências vastas a respeito do bom
o u ma u ga do d a s la v ouras e m f o co.
S e a audiência. é en t re cr iados, n u nca fica p o r d is cutir onde se agar ra m a is
cedo e on de se so lt a m a is tard e ; q u a ia os ebegõ es qu e d ão merendas e a gu adas
gra ndes , e q uais os q ue as d ã o peq u e ne s. C om maior calor . co m entam e 'Parlam
sob r e o tra to da família n o s m on t es das ciccu n vizinh a n ças, co n cluindo por
d es com por em o u elogia r em o s amo s. O cozin h eiro e O a m a ssador apanham.
p or tabela.
I sto é a súmula d a s pales tras a que o a ss u nto obriga. fora d o verdadeiro
ce mpo de a cçã o.
Nas herdad es. no p ró prio t ea tro da lida, onde o mo v imento d e a r a dos se

- 268 -
ATRAvtS DOS C AMPOS

patenteia n ítido e r eal. com o um formi gueir o tenás e 'in ce nsé vel. nin guém O
presence ie de perto ou afastad o. que o nã o ob se r ve atent ament e. É um quadr o
d e gra nd e r ele vo, qu e nunca s e ol ha co m 'indiferença. Á lu z d o sol outonal e
em p lanuras d esembaraçad as, ag're da v er o d es6lar d a s j u n t a s a pass o ce rtei ro,
de cabeço. ergui da, a puxarem o e re d o e a vo lta re m ter-ra , s e m p r e o b ed i en t es
aos ga nh ôes q ue os g ove r nam e gwia m.

* * *
Fantasiemos que n os t r a ns porta m os 8 um m ont e. se d e de l av oura, aí 8 0
r om p er da manhã de um belo dia de outubro, pr e ci samente à ho r a d a ga n h ar ia
sair do monte, d epois do alm oço, em atitude d e ca m 'in har para o s arad os .
Supunhamo s q ue chegamos lá e que, a s eg u ir, aco m p a n h a m os o pess o al e as
pare lhas na s ua marcha p ara a lavoura e aí p erman ecemos d epois em obs er v a -
ção durante o dia . Imaginem os isso e vejamos o qu e s e passa.
Ganharia e s eus dirigente s estão almo çad os com a t r a d icional açorda. antes
ao amanhecer. (s )
L ogo que s a em d o almoço, um ga nhão qu a lq uer toca o bú zio n o terreiro do
mont e. fazend o eco a r s ons e gu díss ímos e intensos. s i n a l de pr eparativo de
marcha, p ró p r i o da época e d a h ora. (2 ) E,. o segundo s in a l, que o p rim ei r o
reboou for te e ch e io. qu ando os g a n hões se ergueram das tarimbas para irem
almoçar. Antes e depois do almoço o búzio da g a n h a ri a vibra s onor o e retum-
bante por diferentes vezes , correspondendo a outros qu e se o u v e m da s herd ades
p róx im as. E,' um despertar à vida. queb rando o silêncio da m anhã, a i nda
envol ta em t r evas.
entrement es, as p arelhas s aem e e ngata m . e o s home ns procu ra m muni r-se
da co pa e d o s a pe iro s. (a i Un s mi nutos m ai s. entr ecor tados por dito s e pa r o las
com a cigar r a da da praxe, e tudo s e v ê em a cçã o de sai r . D á o e x emp l o, o a b e-
gão e o m e'ior al da s m ula s, pondo - s e em mo rcha para o lo cal do t r a b alho .
S e a lavoura fica per to. t odos caminham a p é; s e, p el o contrá rio. cl.íst a u m
pouco, segue m n os ca rros. A pé o u d e carro - a p é qu a s e se mpr e - a m alt a
ca minh a sem preo cup aç õ es v isíveis, ant es salien tand o- s e pe la lo q u a cid ad e fa ceta
com que abordam vário s assunto s, à me dida qu e vai cami n h and o. A princípio
os idosos t omam a vanguarda e vão nanando a s suas p ro eze.s d e ca lg um dia ».
que é como quem di z - as s uas façanh a s d a mo ci dade - al gu m a s fan tasistas.
muito exa geradas. Eis uma a mostra :
- ..I sso é que era m tempos I ... Havi am h omen s e faziam-se acçõe sl . ..
A mocidade de a gora sa be lá o que é trabalhar I ... Un s fandan g os. .. não pres -
tam para n ada e gan h a m d oi s d obro s d o qu e a ge n t e ganha va q u a n do e ra como

(I) Sobr.. o al moco" ponae n.oru ~on.l .. t1TOI. "di '" o . n l, o - A II", ...., . c'o - ... p" h.. ln.
o
(2) t040. dOi búriol d. mldno• • d •• • 0 101 1I01to olt., . .. IU • d.poít d. u la . , o.. c olt um. el a .. .. a la lIrl.. -
1I,.lmou... I. frl'aul. d. S. 1:".1611• ••rr ed ou .. M.. o..• ai' •
lI ~II " IIO '''1II110 d. . .lIl.... uíra. "" PU" d.. di. de SaMo• .
(a) A cOP" ~o",I. de jaq au • • et.1I0U . ,,' iiu. 1I.Ueo • h p.-~ .. . o • • lIe16o. UllU .... t . lIl o ~ orru ... . ~ O ... q u.. puad.m
•• j ll a . . . 10 n.do.

26!l
ATRAv t S D O S CAMP O S

eles . .. e que traba lha va d ez ve zes m ai s. H omens com o o s d a n o ssa cam ad a já


não t orna a h a ver ... E e ntã o o s b ois? I E ram com o muralhas.. . H oje sã o
chibos. .. que n ão pod em com os atimbaldes »
- «6 D o min g os, alembras-t e d aquele boi BandarT8, q u e eu am a ns ei ó"
t rês a nos. em casa d o avô do nosso a mo, a lém no S ei x o ?.. . E r a um s lima !
m a i s alto que a t orre da ig r eja 1... »
-«Inda d iz es se m ·a/embral . . . F oi da m inha junta nu m a sem en te ira que
lá fiz.. . Por s i nal que t i ve de lh e tirar a s m anhas.. . C om ele e co m o cam a r a da
- o Esbandalha - esnoqueí m ais r aiz es d e azinheira d o que ca belos ten ho na
cabeça . .. »
-«E tu não t' ócordes d o Soldad o, um b oi joeiro, r et in to. q u e lá n a s B a r-
rocas a ve n tou co m t od a a malta 80 a r ? A mim n ã o s ei co mo n ã o m e e eeeben-
ta u I... Ferrei u m es to iro t ã o vale nte que m e caiu a espinhele, por si nal qu e
a n d ei em cu r a tivo com o tio P aulo, q ue f oi q uem m e p ôs b om . . . »
- . Não m e fa les n o Soldad o.. . À el e e ao Medronho - u m bo i como u m
eli ínnte, q ue p o d ia co m uma alm iara - pus-l h e uma catrada de l enh a para 8
vi la, t ã o g ra n d e q u e a fun diu as ped ras el a s ca lça da s. Tam ém o fe r rad or, para
q ue m era a le nha , m eteu-m e n a s unha s d oze vinténs, doi s p ães e uma morcela
r o s qu eiea, q ue pa r eci a um pai o ... Bem o s g a n hei . . . Que eu nã o car rega ria
tanta l enh a , s e n ão so u b ess e a coragem do s bois e não contasse com a molha.
dura do mestr e »
- «Tá. v isto Um a p ess oa, quando os amos m and am carreg ar pres entes
para que lquere, l ogo v ê- s e a criatura oiroxo. S e a/roxa. b om é o presente . . . se
n ão arreia. ou arreia p ouco . . . q ue se amole ... Leva -se-lhe pouco e ruim .. .
Que s a iba m onde caem as co is as . . .»
- «Iss o d e sorte com molhedures, já lá vai . .. D a n tes. s im . que s e arrece-
biam b o as e muntas. A g ora, o s amos não querem saber de fre.nqueaas . . .
Mandam menos pres entes . . . estão sovin a s q u e nem g e l eg o s.»
- «E d o s p ou co s q u e a g ent e v a i levar. os alma s d o dia bo q ue os a panham
es corregam uma re cularia . . .»
- «Q u a n t o mais ri cos, m enos s e descosem ... E os n oss os amo s. v ão-Ihe,
na piuAad a . . . ca d a ve z m ais sumitigos, No s no ssos temp o s corr ia pouco
d i n hei ro ma s h avia mais olham en t os .. . C ois a s de que eu m' alembro! . . .»
E co m r ecordações e co m en tá r ios desta o r de m, os pobres h omens co n tin u am
anda n do e cavaq uean do s obre o s s eus b o n s te m p os, anrmando factos es t upen dos.
qu e se n ã o vêe m h o j e, no se u en t end er.
E n t ret a n to . os r a pa zes qu e vi n h a m atrás, apro ximam-se d o s p arla d ores
mastaços e passam-l he a d iante. co m o m ais lest oa q u e são . S em lhe s l igarem
importânci a, o s n ovos seg ue m o s eu caminho. tr ocando co n íi dê n cí a s s o br e
d er ei ços e coisas co ncomit a ntes . A v entu r a s da m ocida d e, qu e lh es sucede r am ou
p recen cia r am nas ú lti mas n oites. o u nessa m esmo, há p o u cas h o r a s a in d a.
q ua n d o a rru a r a m pe la aldei a.
A nnal. todos ch egam a o s arados, ma l começam a enxerg a r -se os primeiros

- 270 -
ATRAV e s DO S C A MP OS

exre bo ís da a u r o ra . Se não há luar, a s ent eichaduras distinguem-se va gamente


à be ira da torna , erg uida s como n caram de v éspera, ou em terra. derrubada s
pelo ven to. O s bois também j á lá es tão ou vêm chegan do. E stão próximos o u
che gad os co m ce r teza , p orque lh es soa m os choca l h os.
. . . . .. . . . . . . . . .... . . . . . . .. . . . . . . . . . .... . ... . .... . . ........ . . ..... . ...... . .. .
H omens e 8a do , tudo está a pos tes, a gu ard an do age r ru. O s bois, deita dos
8
un s, o u tro s em pé. A s par elhas, uma s enga t adas a o s carros, para irem espa lha r
8 seme nte ; o utras, com a s canga s a p enas. O pessoal , de cigarro a ces o, v ê-s e
d ispe rso o u re unido em volta d e a prazível fogu ei ro , pre vi amente p rep a rada p a.ra
li VI 9.1 do fri o. O passa t empo é agra dáve l, mas dura pouco. N ã o ta rda q ue o
ebegão n ão diga a b r u tam ente : - ti. V de agur re r . .. lt
é

À es ta intimação co rrespondem o s g a n hõ es dir igindo -se às en teichaduras e


e ca d a q u a l apeirsndo (1) a q ue lh e per t ence. se à chega d a não ti nha m apairado.
Em s eg uido. ca d a ganhão trata d e aga rrar os bo is d a s ua j u n ta. para os pôr
em tiro co mo d e facto põe, sem esfo rço gr a n d e. N o a cto de s e agarra r , o boieiro
dá dife re ntes in dicações e ordens s o b r e o pa radeiro dos bois e a composição d as
junta s. O s àen h õ es r ed e r g em , troca m à p e rte s, fo r mula m pergun tas. até qu e
prendem o ga d o à ca n g a e ao ara do. b ) P or s ua vea, sim ultân eame nte. o s
carreiros engata m as parelhas às ente ich a d u ra s. Entretan t o. um o u d ois vai p ri-
m eiro com as mu are s e ca rros, di stribuir os sacos de s em ente p ela terra q ue se
calcu la sem ear dur a n te o d ia. Àco m panha-o o s em eador.
D istr ibu içã o de sem en te e aga rra d e gad o. ocasion am a n i ma çã o de parol a .
M as co m o sejam ho ras d e enc eg nr, o ab eg âo a tal ha as f alácias. i ni cia nd o a
faina. (lI) Arrimado à j un t a, com u m a das m ã os no rabanei o e a o u t ra na ag u i-
lha da, o ch efe d a lav oura p õ e a a nda r os bois. e g r i ta : - eV ã f or aL . . » C omo
que m di z : - cBas ta de paleio ... v am o s a i s to . .. » E v ã o t odos. d e m elh or o u
pior catad u re , em bo r a fa çam caramunh B co nt ra a pressa d o abeg ã o. ( 4)
........ ... ........... ......... ... .... ............. ........... .... ... .......
À lav oura principia e o dia amanh ece. B and os d e elv éloe s, ch iand o f a méli-
cas, caem s o bre a lavoura d e fre sc o. sa lti ta n do e d ebica nd o n o s ve rmes que o
ar ado dese n te rrou . O s bois e as m u ares qu a s e a s pisam. m as a s a vezi n h as mal
se desviam para v oltarem prestes à s u a tar efa utilíssima . Nada as d etém. ne m
a geada in tensa . ne m O passo d o s anima is. Uma o u o u tra pa ga as custa s. v iti-

(II A,einr .1"",i6u. p"r ",a U rl" a • u ",...l bo. o a pch o. ai com ein . . .. br ocbn. 1. 10 ". Iodo o coun a>. com <:lu,
o. boi• •• pre u ' a> j. i l. a> .. u"' • .
A ...I. lcb . lI, do. bol . ir o• • •,.ind. p.lo ... " hl 0 4'" Ibu nn. d. ap.inbo.
<,) Em d"u.lJ>.d•• ~o"'... . p. b io dOi boi. 1 UII.. . . ob .d.c. .. PfaX' d. cad. boi ..!t cnou d. 10" 11' 'a> u d. di ••
pu. 010 u ... ' fr .lTo.- p.u. II b .bho • .• a> • IlTnr do I. do dlnlto • do u<:l"udo. A nlm o q". hoJ ' foca 1 dln lu. l mallb.i
pu.. p.u • 'l4and• • o d ,,,..d. pu• • direit• . Como IlIdlucl0 oh. d. ud. urd • • • C.II". fica . oco.t ad••0
tI . .o. cOm" ' 0111" do. n lho. 'O'oltad ... pu. o I.do opo.to ao qoa bcou lu d•••uulor. O lado ladlndo pa i.. po"'t..
.lo. clUl..alboa " O <tu. ptlm.lro II , r ..acb. cOm o boi conuPoDd.al• .
(J) COID'C" II cllulId. qUi 110 b ot .. d. com.(u. S.a do udo. alo 'lIu", . . u , ulda .. . ,.rn . mu , ....do limpo.
r..lutul1o. pu , l' 1I o nuco.
(4 ) A 1111 IlIp,ilo u i.-u o cOl:lllud o do ptrlin fo - Ho rn de . , . rr . _ li. p" lo. 2$t.

- 271 -
ATRAvtS DOS CAMPOS

m ede pela brutal idade d os homens, m as a gr a n d e maioria persiste desb i chando,


s em se i m port or com ingratidões.
N est e meio tempo o sol in t erro m p e mageatoso, lá ao largo, em t erra s d e
Espa nha , e à s u a aparição o quadro ilumina- se co m rid en t e fu l gor, insu fla ndo
vida ao cenári o q ue se d esenrola. Os p á ssaros s u rgem de t oda a b a nd a . em
pequ en os vo os, d enunciad os por meigos cantar es j 8 S juntas apressam o and a -
mento avolumando o som dos ch ocolhos e esqudlêes, e os m oç os da Ievcuee,
i nv ade-os uma sa t isfa ção ineq uívoca. que revelam ca nta n do modinhas am orosas,
da s que lhes evoc a m recor daçõ es... E os bo is, os pró p r ios bois qu e sulcam a
te rra, ouvindo es se bulício s u ge stiv o, e q uiçá de scobrindo os s eus semelhantes
nas p astagens próxim as, sol t a m languidos b erros, q ue são a n ota gr a ve d este
concerto matu t in o. A mesma terra, lavrada de h á po u co , aparent a a ssocia r-s e
aos esplendores da n atureza. A o verm o-la sat u rada de humildade. a e va pora r
em abudân cia, com o ela evapora s empre nesta h ora , t alvez algu ém diga, q ue os
vapores da terra, confundindo-s e com o baf o que ex a la m os bois, f orm am como
qu e nu vens d e incenso, q u e s e ergu em n o espaço, em homen a gem a o Criador.
.... . . .... . . . .. . .
A m anh ã pro ssegu e am ena , per m it in.do q ue a lav ou ra si ga s em inci de n t e
estranho. O sol prin cipia a aque cer e os ge nh ôes tratam d e despir as ja quet as
para, em man g a s de ca m isa , lavrarem à vontade. Muito s ar rega çam -se, ex ib i n do
braços atl éticos d e 'inv u lge r musculatura.
Enquanto el es vão lavrand o com ou se m jaque ta. na estrada próxima, n o
cum e d o o u teiro, a p ar ecem a lg u m a s mulh eres vindas da vizinh a aldeia, de
caminh o p ara a r i b ei r a , co m cest os de r oupa à cab eça.
- «Lá vê m elas f •• •», diz o gan hã o que primeiro a s biscou. E a cr escen ta :
- ..Vá. rapa z es, errimem- Ibs a val er. . . q u e se não g a b em qu e passa r a m sem a
a panhar... » E. os in sti gad os, solteiros pela m ai or pa r te, n ot and o a aproxim ação
d a s mu lherzinhas, sa u dam - na s com a vaia da praxe, em voz ea ria d oida e ges t o s
tru ane scos. Uns rincham com o cavalos, o u t ros es pínoteiam e z u rram co mo
burros, div ersos assobiam e muitos so ltam após trofes rud es , qu e seriam ofensi-
v a s s e as n ã o tom a ss em por ch a laça. M a s tomam.
D e entre as ating idas pelos apupos, h á m atrona s sis u d as e ra parigas cir-
cunspecta s que nada r espondem es cudando- s e no aforismo de qu e a m u l h er
honrada n ã o t em ouv i dos • . M a s as outra s, as q u e g os tam de ..falar mal» e ou vir
p ior, voltam o tro co n a m esma espéci e d e m o eda. Simulando indigna çã o,
param -se. defrontam -se com os provo cad ores e, e m vo z es ganiçad a, acoimam-n os
de q uantos apodo s lh es lembram: - . Oh ! ca m ba da el e ch ib os re laxad os I .
F ilhos de púcara vão rinchar à s z o rras da s m ães 1. .. N ós não semos éguas .
L á o viço que t êm Fora brutos I . .. Súcia d e piol h osos .. . Alimais! .. . P onha m
cab r es tos ... C om a m palha» I . . . E,' isto o C(u e os da malta qu erem ouvir.
Ainda as m u l h er es guincham t oda a cas ta d e i m p rop ér ios, já lhes rede.rg uerc
ass im: - «F o ra g ulo sas I . . . Q uantas chávenas d e café boeram h oje? I ...

- 272 -
"
~

ii
.,"e
.
ATRAvt S DO S CAMP OS

Bru xa s l . . . Bsdies l . .. Tabacosasl . . . Voluntáriasl . .. Feiasl .. ... E homen s


e m ulhe res prosseguem nes te COlO de e m ebíl ídud es, a t é que elas s e cal a m ,
a fas tand o-se. Eles continuam gritando -lhes, en q u a n t o as não p erd em d e vis ta .
D ep ois, riem- se da brincadeira . Elas tam b ém a vão come n t an do com pr a zer,
posto a pa r en t a ssem ir à serra. Há por a caso uma ou o u t ra que en cordoa.
M a s a maioria, gosta. No íntim o, e nco n tra m imensa g ra ça àqu e les d ich otes
frescos, em que dizem e ouvem o qu e lhes vem à b ola . Demais, sa b em que
tirarão a desforra a se u tempo. qu ando tr a b a l h a r em n os mondas e noutros
serviços. (1l
. . . . . . . . . .. . ... . . . . . . . . . . ... . .. . .. . . . . ... . . .. . . . . . . . . . . . . .. .. . . . . . ... . . . . ...
o dia cresce e a Ia voura prosse gue. Mais de um ganh ão tem olhado para o
sol, a ob se r var- l h e a a l t ura , como que a interrogá -lo se já se r ã o h oras d e para -
gem: - «D e ve m ser . . . não pode tardar ... » - m onologam para consi go.
E f ectivamente, daí a p o uco , o e begãc f az parar a junta, levant a O arad o, (2)
empurra-o, larga a aguilhada, deixa os bois em paz e g ri ta : - «Ág u a l. .. »
As demais ju n tas, vendo para r a d o a b egâ o, instinti vam ente aceleram o
passo e estacam, unindo 6leira s. Os que a s g u i a m , p rocedem como o ab egão,
deixando os arados e chegando-se à barrica d a água para beberem e fol gar.
Vai de agu ada e d e descanso pa ra hom ens, bois e m u a r es. Os homens comem a
CUnhS, (a) as parelhas aquietam-s e, r eparando as forças, e os b ois fazem outro
tan to, ruminando tra n q u ila m en t e. C onhece-se-lhes pelo olhar que l h es agrad a
a etui etu de.
Vol tando a os ho mens, o t em p o voa-lhe s nos 30 minutos que o intervalo
dura. Aquilo, p a r a eles, é u m a delícia. D e p é ou sentados, em p equ enos g copos,
ou em um só, vemo -los ge.lhofeiros, 8 com erem, a b ri n ca rem e a parlarem.
Abordam assuntos diversos, vindo sempre à b ar al ha o fa b rico d o mauo cat e e a
carestia do tabaco. D o tabaco, fala -se e prag u eia-se, C( u a n do va i d e ciganada,
aí pelo fim da aguada. Não obstante, qua se t odos gus t am , en t r egando-se ao
vício. O ebegêc, é o primeiro a p ux a r da pe t a ca , seg u in do- se- l h e os ge.a b.ôes e
ou tros. O s ga n h õ es fazem o ciga rr o a preceit o, deva garin h o, co m os mata d or es
do est ilo. na. manha de protelarem a fol ga. N o picar da cigarrilha d e d ez r ei s,
no ma chucar do tabaco, no enrolar da mortalha e no fu silar dos petiscos, para
a cenderem a ís ca e por 6.m a tocha. qu e de antem ã o sabo re iam, buscam p r e t ex to
para demoras maliciosas. 'I'odavie , de pouco lhes vale o est ra ta gema , qu e por
sebid o não pega . O abegêo, em lhe parecendo, b ota fum o. camin h a pa ra a pis-
cola e reata o serviço, sem se im portar qu e os cigarr os dos o u tros estejam o u
nã o acesos.

h l SObf' •• "" lu d.. lIIulbu u ' 0' 1.0111' '''. Id. · .. o . tti*o - MuI/ate, - n . p'tin. 93. O. hOla. D' .6 di o t.. ;., u
lIIoJben. 4\O'Ddo ...d. 1II .. Infu. NOOlf O: ' Cl ud . qllCf "fri~O' 'io ID. illll..l,,'• •
h l Pau o. boi. dIlCI.D. ualll.
{,l F."'" d. 1110 COIII . obcjo. d. u. 1. OP d. lII. rl ad • • COlDO ., ulli o. loucill bo. Ilc.

- 273 -
A T RA v t S DOS C AMPOS

Um minuto d ep o is, t oda a ge nte está a pos to s, a pa r age m ter m i na. e a


lavoura m o vimenta-s e co mo antes da a g uad a .
.. .. .. ...... . . ... . .. .. .. . . .. .. ... .. , , .
D a s d ez h ora s em dia n te aparece m d os lados da aldeia gr up os d e ga rotos,
d e cordas a tira colo ou en r oladas à ci ntu r a . C aminham d esca l ços e ro tos. às
carreírin has, como que e t r e id os para o s a rados . Os p obrez i to s v êm à lenh a, às
raizes d a s cepa s. pa ra as t ranspo rtarem à cabeça. P equ enot es m a s pres ta d íos.
T ã o n ovitos e j á and am ao «feixe», p ara alimen ta r em a lareira d o casebre on de
h a bitam com os pais . P ob re zitos . ..
Em bo a ve r dade , a l enh a não é o ú nico motivo q ue os a trai à lavo ura.
Pa r a os m ais deles, o que os impele a estas ca minhadas, é a f o m e q u e sentem e
q ue de certo s e darã o ali entre a ga nh a r i o, o n de lh es da rão à m er en da q u a ntos
mar rocates q ueixa m comer. E o pão de ce n te io sa b e t ão bem aos pob res q ue não
al can ça m outro I Quem lhes d er a a e les t erem-n o sempre em abundância I. . .
O bando dos .re paeelhos espalha -se por ent re as píscoles. Ca da garoto
p rocu r a , l ép ido, u m ganhão pare nte o u a fe iço ado, d e q uem espera obter BTr e Í -
gotas. E.' pre t ens ão j usta, fa cili m a de obte r , q ue t o dos co nseguem . Qualq u er dos
da g a n haria, ve n do a ce r car-se-lh e o rapa zinh o p refe r ido, ch am a -o e día-Ih e e-r-
«A nda cá C h ico . . . dá a qtri um rego, enq u a n to faço o ciga rro ... S egu r a- t e com
ele, q ue é lev ezinho ... Logo dou -te um a ra d o par ti do , q u e escondi a lé m n a s
pedras ... E arranco - te cepos .. . V er á s ... »
A voz de «dar», o Chico lu z-lh e o olho e a ce it a a proposta . Mui t o ancho ,
seg u ra o r a ban ej o, toco. n a j unt a , e lá se met e a lavrar, t od o ufa n o po r faz er de
h omem . N ã o a certa o passo. cambal e ia , mane ja mal a a guilhad a , m as l á se
a gu enta, pr o v ocando obser vações e r eparo s q ue m a is o em ba raça m.
Enquanto vai de lav ou ra, o rapa z vence a s difi culda d es, sac rilica n do a
es tética e os p r ecei tos da regr a . M a s à s volta s, v ê- se gr ego, po r nã o poder v ira r
o a r a do e a j u n ta. Sem em ba rg o , ins ist e na s tentativa s. pa r a m ost rar j eito e
vontad e. O ganhão q ue r auxili á -lo, ma s el e opõe- s e, observand o-lhe r-r- e E spere. ..
d eix e ver s e posso s õzinh o . .. » E insis t e, f azend o fo rça . N um a rra nco de ener-
gi a puxa t anto , que a s m ã o zit ns escapa m - s e- lhe do raban eio e z ás d esequili-
bra-s e e v ai co m o s cos tado s ao chã o . Toda a ga n h a ria ri, ch acotean do o r ap az,
que d esiste do intento, ac ei t ando a i n t er v enção d o gu nh ão.
. . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Num vai -vé m co ns ra nfe, os a ra ao s p ross eg uem no se u tra balho cu lt u r a l,
l avrando baixa s e enco stas. O dia convida, o s bois po d em e o e begão «p uxa».
N ão falt am ele m en tos pa ra o se r v iço luzir, e mais luziria s e nã o h ou v ess e os
enredos d e costume - as in evitá v eis p a rage ns d e j u n ta s, po r efeito de ma de ira
p e et tda, um a s ; pa r a satis fa ção d e impre t eríveis necessid a d es pessoai s, o u t r as, e
o en t r eté m d e arad os po r fo ra d as piscoles, a cortar a s lobas e a enchei: ca ntos.
A desp eito d e tudo, d es pacha-s e a valer. A maré n ã o po d e s er melh or, a
te rra a ss opra e o gado mexe -se. M as as h o r a s pa ss a m, e aí às d ez e m eia, o
a begãc pár a d e ag u a da . E.' a segund a da manhã, e du ra só o s ufi cien t e pa ra

- 274 -
ATRAvt s DOS CAMPO S

se beber e cigarrea r de fugida . Em decorrendo uns d ez minutos, o a begã o di z:


-«Vamos a ela . . . o reveze está a chegar . . . » E a seguir, voltam 80 tango
se m mai s preâmbulos. De resto, ai nda não t êm dado mei a dúzia d e v oltas, e
j á os bois mug em pOI sentirem aproxime r -se os que vêm s u b stit ui- los.
U m minuto mais , e eis que chega o r evezo d a t arde. Chega s em g r a n de ruíd o,
ouvindo - se os ch o ca l h i n h o s d os novilhos e al guns po u co s esquíl õ es d as juntas
-pimpanas. (1)

Ab egão e g anh ê es, m al O re vez o se espalha por e n ice as »iscol es, como
que a entregar-s e à cange e ao trabal ho, p aram e so lta m os animais que t r a-
zem, passando a a ga rrar os recém-cheg ado s.
Os a lmo cr eves tamb ém s oltam a s par elhas, n ão para re ve zar em, m a s p ara
irem m erendar. S ó o m ai oral dos bois se co n s er va n a esp ecta tiva, de cacheiro
às cos ta s. de p é, atrá s d o gad o, ob ser va n d o- o cu ida d oso, p a ra q ue nã o f u j a à
prisão. Nesta a tit u d e g esticula . i mpe rri g a -se e d á i ndica ções s ob re os b ois e
n ovil h os q ue s e hã o-d e p r en d er .
- . O h I mano Z é I então q ual a garro h oj e? . . l'1 - p er g u n t a - lh e um g n.n hão
d esastrado, qu e bota a baixo os bois que lhe con fia m .
- «Hoje responde o boie i ro - já que d este ca bo do Foloza e d o Pintas -
-e-

silgo, entrego - te o Traidor, que não seus p 'rl1'i assim. Se o botares a terra,
como ós outros, prégunts v i d a n ova .. . Noss'emo, p a ga-me para olhar pelo seu
rem édio ... » E, v olta-se pa ra d iferentes q ue ag u a r d a vam instruções e di z-lhes:
c- e'I'o, Camoezas, aga r r as o Maranha que, que é jeito so p ara o novilho ...
E tu. Assorda, deixe s hoje o Vinagre, que anda estio, e b ota a fa te ix a ó Capi-
t ão, que está de boa vida há uma semana . . . »
O s da lavoura aceitam as indicações do boieiro, e este, prossegu indo, ex cl ama
sentencioso:
-«I oda estão quatro novilhos para amansar. Vamos lá ver a que m
tocam .. . » E chega -se ao ab eg â o, ou o ebeg ão a ele. co n fer en cia n d o ambos,
baixinho, sobre o assunto a nunci ado . Pronto s e entendem o s doi s. e, a seguir.
ou n esse entretanto. oferecem-se ganh ões para a mansar o s bichos. Se n ão h á
ofereci mentos voluntários, o bo ieiro a lvit ra. até o encargo s er a ce ite p o r tantos
.ganhões q u antos os precisos para as amansiss . . .
D istribuido s os novilhos, O maioral fa z-lhes a apolo gia no s seguintes
t ermos:
- cD Torradinha, com que fice o Mu eeela, há-de satr letra asse ada.
"E,' *ra nde e tem m uita pe le . . . Aquele amarelo. carapito, que vai pr'ó C ant iste.
é le ve como u m pássaro anda sempre encabritado.. . N ão tem muit o co rpo ,
m as rij o co m o canel a s O barriga na, borqui lho, que escolheu o Filhoz es, é

(I ) T co"... pU. o euo o , 1.t. rIlO. d. 1'1'Quc. d. ee.. n o . .. i o o d• • 10 , . 10. pOCQ'u. o 0.0 do rlTUO i .... oel.lm.M•
•10.t_ioo. Do U .1....10. Q'1t. t bim .. ut.l .dopu...do moho. 'OCOMn o l"fO• • uGel f" rdnlacl .. a o uti ' o - N..
• "rAi...,,' .rlo .I/.- a. 11....1 2$ 1 • ll OO UO COm • • plt•• f. - Sio,cI" .. . nu". _ n' ' !In 249.

- 275 -
ATRAvtS D O S C AMPOS

curto m as sobra - lhe madeira. .. G rosso e atochado... S e sa ir zo rra , eeeíma-se -l he


g raxa de aguilhão e verão como ele esperta.• . O irmão, o Dama sco, tsmém
ti n ha d oaire de badana e depoi s fo i o q ue se vi u ... fino como u m coral I . . .
A go ra o barateiro é este r isso, retinto, bem a rm a d o de corna E st e é que é o 0.0

rei da baralha .. . Vem da r aça do Poeta, aquele boi maior da junta do abegão...
S e sair bom, h ei-d e ajuntá -lo co m o meu... Verão vocês a ju nta faia q ue d eles
se faz . .. Olha lá, oh Cupido. t u que o aga rras, p õe- lh e Brilhante, para calhar
com Diamante. nome do m eu . . . (I ) E a gora, r a p a z es, ten ham sent ido e astúcia
com todos. . . h a j a cuidado, se q ue rem sair-se bem da acção... B onda q ue D O ano
pass a do 6cassem dois ren didos. . . M a L empregados I . . . S em pre f utu r ei q ue
encascassem . . . mas q ual his tó r ia I . . . »
O S exortado s r esp ond em:
- «Isto é uma sorte . . . O s n ovil h o s são co mo as be la n cias: só se l h es
co n hece o vido nho, d ep oi s de se e bei eem.e
Cer t o ganhão b rioso, que estava de parte, di rige-se ao bo ieiro, obser -
vando-lhe:
- «O r a. m an o Z é, se vccemecê q uisesse, aj untava o m eu n o vilho, co m o d o
Guelas. .. E m parceiram bem dão um a junta real. . . ver á . . . »
- «Não m etem mal. n ã o P ois ajunt a- os. •. To m a tacto co m eles. .. »
Ainda o m ai oral não t i nha co n cl u íd o, já o u t ro ga n hão l he fa l a va a ssim :
- «Se m e deixasse m, ta m ém eu I e ai a uma ajuntada : o m eu com o do
MaD te'iga s I .•• »
- «Nada, nada . . . deixe mo - nos d e mais a ju n ta da s . . . » E a m eia voz,
m on olega em tom de ce ns ura :
- «Não têm astú cia pa ra u m e já quere m dois.. . Nunca v ê em lobos peque-
nos. .. Baía u n s impostores 1. . . »
O pret en d en t e embucha e n ã o insiste, r enunci and o a educador de juntas.
.. . . . . .. . . .. . . . . .. . . . . . . . . . .. . . . . . . . .. . . . ... . . . . . . . . . . . . .. . .. . . . . . .. .
Demora a agarra dos bois e dos novilhos, porque a dos ú Ltimos de m anda
trabalho e arteirices, que s ó s urtem efeito à custa de manha e de paciência.
M a s co m geito e pa ch orra tud o se consegue, embora haja trambu l hões e corre-
ria s, inte rcaladas per incidentes e peripécias q ue não vêm para o caso, po r
t er em ca bida n outro lu gar. ( 2 1
Às juntas, uma vez a garradas, co n se r va m - se de pé, ag uard ando submissas,
pelo l a b ut a r da tarde, qu e pouco demora rá . S ó revelam indisciplina as dos
n o vil h os da amansia, não qu ebrados de fo rces , nem domados pelo ensino.
N ovos e indóceis, refiLam e barafustam contra a prisão, posto que não
consigam libertar- se , o q ue os exaspera, explodindo-lhes a rai va em pulos de
co rça c berros espumantes . Pulam, berram e correm, arrastando a en tei ch a d u ra

( 1) o" olllro cãama U lI ao 110.lIb o qllc tr. . d• • m . IU/.. .. (o porqu u ja propri edad e d.le. mU por pu ta.. cer " j ll.. t..
1:0m qu. Ian• • O . ' I a b õn t a lll" ' lll dlum . - .0..... "u boi •• • ... ,,,10. j ll.. t • • II me.. (1 0.,1100. etc•• t. \110 'tu 1.
b) No u pl lll.l0 - G.Jo, - • II. par te l".,pdl."I•• 0 , .do . 'n .......

- 216 -
ATRAv t S DOS C AMPOS

e O camarada - o boi madrinha - que lhes m o dera os ímpetos e n a t c raliae as


forças. P or fim a pressão do arado. aqu iera- os como os adultos e mansos, mas
sem pre desconfiad os e cabisbaixos.
Entretanto, nas proximidades das enteíchaduras, permanecem as reses que
sobeiam e os bois que sairam da ca nge , Estes vão-se deitando sobre o a lq u eiv e,
em descanso irresistiv el.
Nesta altura os h omens p assam a merendar, a pequena distância dos ara -
dos, em volta de quaisquer pedras ou arrifes. O s ga ro tos da lenha já lá estão
em po leira d os. com o feixe em preparo, aguardando 8 falca d o pão, que se não
fará esperar e repet ir, até mais não querer em. Próximo. vê-se a barrica da ág ua,
o saco dos meeroce tes e o ts.le igo dos queijos. S ão os comestíveis que constituem
a merenda para o pessoal, a esta hora d o meio dia. h )
... ... .. .. ... ... ... ... ... . .. ... .... .... .. . ... .. .. .. .. .. .... .. .. . .. .. .. . ... ..
Toda a gente come n o espa ço de 40 m inutos. decorridos desapercebidamente.
como é de prever. Aí pelo final, o abegâo chama os rapazitos da lenha e dá -lhes
marrocate pela úl ti ma ve z, observando-lhes:
- cA ga r a, em aca bando d e comer, toca d e arranjarem os fe ixes.. . E, d ep ois,
zunam caminho da aldeia. . . Nada de csreibe, que s e fa z tarde Se se demo -
ram, a raposa branca sai-lh es ó caminho.. . N ã o se acautelem »
Os garo tos sorriem e r espon d em :
- «À s en te n ão tem medo das rap osas. . .»
Enquan to s e come, e depois mesmo, na cena final da cigarrada, bísbílbc-
teia -se em todos o s tons e géne ros, esfuziando as g ra çola s tari mbeiras, ganhoa is.
acolhidas com aplauso de muitos, reprovação de poucos e indiferentismo de
alguns. Os tagarelas falam pelos coto vel os, com o se costuma d iz er, e os f uma-
dores ch upam cigarros como vagens, ou p ontas enegrecidas - cerocbee de
cigarros anteriores. O s q ue fala m . falam sem con ta n e m medida, e os que
fumam, fumam de espa ço, devagarinho, para economizarem ta baco e entreterem
tempo, se os deixarem. Q u e não deixam, está claro. Em sendo h oras de enregar,
o ebe gão ata o saco d os marro cates. recolhe o teleigo d os qu eijos e dispõe-se a
lavrar. O s ganhões, em que lhes custe. se guem o exemplo do ma n dante, e daí
a segundos, todos estã o D. postos, de rabaneic na mão e j u n ta s em tiro, a lavra -
rem com o revezo d a t arde.
Neste meio tempo o boieiro ajuda toca os bo is s oltos, asso bia- lh es d e m od o
significativo e fá -los seguir para a pastada d o invernad ouro, d eixando o maio-
r al a subs titui- lo na lavoura. S ó os ca rr eiras e o emb elg ad or continuam em

t d S obu • •ar . .. a. o... ,.f.l ~io do nu lo di., nj. m- u o. po r••n or .. lJUu to . D O upho.lo _ A U••"'er io - n u
" " llIu llJ • 11. e t Ullbi m o p.r' ,nfo - N., rnneoJu . 0 mdo dl o - II. P'ai"o ::52.
Q awo .. lu o u u fond oll.UIl pr6dlllo d... oldeiu. .. mu llaar .. do . (,[ a e 10fTom . 11"111 Ir .0' a n do•• d e n ua. a
pOllol. ... caL_ca. com o ollao . ofim d. J. n t u . m co m o. m ul do•• lillao•• O . laomell' co••m ...Im • l U.. eOlt., III" uelblm
do .b_Aio 01 murocuu a o (,[u. llo etUI lla.. "UUDU . Eola cOltum. i;.. . lmellu u o bun o IlO' do min,ol (,[ne fOI I." ra.
r. ...110 .. 1Il...1b.an. nio II prenda m com dlot illeiu. Vlo ollda o. mu ido. a u eI. m ati • 10ll,lIuda d II etoil 6 mu rot.
V.l •••.. .. ,,"*1.... 135 a 1116 - Co" um... ,lu C.... p ón io' - u li,o - VIJe dOa> b tlc••

- 21'1
AT RAvt S D O S C A M P OS

d esca n s o, agu ardan do q u e merendem as parelhas e a b es ta da belga . D ep o is lá


v ã o ta mb ém l a vrar, co mo fi z eram d e m anhã.
. . . . . . . . . . . . . . . .. . ....... . . ... . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . ... . . . . . . . . . . . . .
D e tard e, a lavoura segue o seu curso o rd in á r io, posto que mais vagar osa-
m ente q ue de manhã. As muares lavram com o mesmo despa cho, é cer t o, mas
não os b ois que, em regra. t êm meno s poder qu e os outros da manhã. O s bo is.
como v el hos, sã o dem orados DO p asso, e os n ovilhos, por inexperi entes e ae isc os,
nada adiantam n a s primeira s volta s. Ào princípio só pulam e berram, dand o
á gua pela barba aos hom ens, qu e os aman sam . E pela tard e fora, tamb ém fa zem
p ouco de jei to, s alv o se já t êm d ias de trabalho e de ensi no . Mas nem as sim
despacham como o gado sa bi d o e possante. Bois m adraços e novilhos de am an -
sia, põem à prova o jeito e as unhas d os ga c h ões. D es tes, encontram- se al guns
com pachorra e ha b il id a de b astant e ; m as o u t ros, n ã o r eun em ess es requisit os,
sendo pelo con t rá r io , ixaciveis e im pacientes. D es ta falt a d e aptid ões, r esulta a
frequ ência com que certos b ru tam ontes invetivam os p obres a n i mais, procurand o
amedr ontá-los co m exclama çõ es 'iracundas, de palavrões es túpid os e obscen os .
O s s eg u i n te s. muito usados. dã o uma i deia pálida de tais m eiguice : - R a ios te
partam, eorro d e um cã o 1. .. Oh boi d e aqu ele filh o de curta .. . » S e no momento
o amo apa r ece de impro viso, o cria do procura emendar, a crescentando ; <11: •• • q u e
o vend eu . . . » O am o, s e o u ve, faz que não ouve, ou o bser va : - «E ssa venda j á
vei o tard e . .. • Quando n ã o re sponde p or es t a outra f orma: - «Vê lá d e qu em
sã o ... » E. afasta-se, p or saber qu e a grosseria proferida pelo criado provém de
h á b i to s velhos, d estituídos de intenção ofensiva. Estava servid o o lavrad or se
ligasse Importân cia a essas b a gatelas. Ele não vai aos arad os para se abespinhar
com o calão do s q ue o s er vem . Vai para ver l avrar m u i to e a pre ceito. A p é ou
a cavalo, caminha a o l a do d o ebegâ c, trocando impressões, transmitin do ordens.
D e vez em quando, desvia-se e es ta ci on a em qualquer p onto cu lm ina n te , a
obse rvar o p asso da s j untas, o jeito dos ãa n b ões e o tempero dos ar ados.
Quer en d o certificar-se de t u d o, dá també m uma s a ss um a da s pelas juntas e
pa r elha s entretidas a cortar l obas e e ncher cantos. Entretidas, é o t er m o a p ro-
priado. Aq uilo de corta r lobas po r entre pedregulhos, co ns tit u i se rviço de enredo.
m uito de m ol d e para se faze r cera. Assim . o lavrador não l h e falta que fiscaliza r
nos arados em acção, onde passa o melho r do d ia. com pref eito manifesto.
B em s e diz qu e oca ca lvaga du ra em que o lavrador monta, qua nd o assiste à
Ia vo u r a, ta nt o o u mais que u m a ou du a s j u n ta e.e

Lavra-se com o possível des pa ch o e s em eia - s e na proporção que a la v rad a.


cresce. O semeador, d e sementeiro ao ombro, vê-se a d istâ n ci a , semeando a
lanço, pelas be lgas que o n or teiam. A d ia n t e, o e mbelgador ma nob ra a. ja n gada .
traçando as b elga s q ue norte ia m o se me ado r. T odos e nfim laboram na cultura
e sementeira da sea r a.
A tard e declina. e o abegêo, o bse r va n do o sol, p ár.a d e ag u ada . E ' a p n-

- 278
ATR AVt.S DOS CA M P O S

meir a da tarde e a terce ira do d ia. D ecorre como a prim eira d a man hã.
demorando vinte a vin t e e ci nco m inu t os.
Durante a para g em, os n o vilho s m os tram-s e fatig a dos, a arfare m com
violência, es cor ren d o-lh es o suor sob r e a p ela g em espessa e fu lfa. N os fracos, o
cansaço é enorme e angustioso. Dá p ena vê -los a escencere r em a boc a . de líng ua
fora , espuma ntes. Alguns d eitam- se re n d idos e ex t enue doa. Outr os, r ecebe m
carícias dos h o m ens que os am a nsam , ca r íci a s n em sem pre aceites, ante s r epeli-
das com assopras e marradas. q ue suscitam r isotas. U m a pândega.

A a gu a da conclui e 89 plscoles voltam a manobrar animadas pelas cantigas


dos ganhões, sempre d es p r eo cu pa d o s e infatigáveis. P o r entre as cantorias dos
ra pa zes e a faina que se desenvolve, surgem os incidentes habituais, como
partir-se madei ra, sairem juntas, repararem-se enteichaduras, etc. São entraves
que n u n ca falham; cenas infalíveis, próp rias do cenário.
À i às <tua tro ho ras ou q u at ro e ·meia. tem lu ga r a ú ltima aguada, que
decorre de fug ida, n u n s es cassos d ez m in utos. O pessoal, q uase não arre da
do reban ej o por saber que a par a g em é curta. Vê-se que O dia está por
pou co e q ue o desca nso tem d e s e r bre ve. O sol va i baixo, prestes a esconder-se,
de m odo que as jun tas e os home ns já projectam sombras gigantescas, que vão
crescendo, à medida que a tarde avança .
D ep ois da aguada, a lavou ra m o ve- s e como anteriormente, mas a animação
Ire qu eje , posto se ouçam as vaias dos sanhões às mulheres que por a ca s o se
a vist am em regresso da ribeira ou de ou tra procedê ncia. M a s são assuadas
froux a s e fuga z es. quase cons tra ngidos. sem a espontaneidade e entusiasmo que
cara cteriz a m as de manhã. A hora do sol posto, mais predispõe ao sossego e à
concentra çã o do espíri to , d o q ue a bulidos de troças e re toiças. Tem de se entrar
em pa ca t ice o r de ira , e entr a-s e evidentemente.
D u a s v oltas mais e o sol es con de -s e po r com pleto, dei xando apen as a luz
purpu rin e do cr ep ú scul o. A s a lvéloas e o ut ros passarinhos vão rarean do. pres -
tes a de sa pare cer em ; os ga nhões emud ecem e aquele m ei o, em que m o ur e ja m
dezena s de h o mens e d e q u a d rú pedes, en tra n um p eríodo de mutismo, que seria
absoluto se o n ã o q ueb rasse a loiça (d dos bois e das muares.
D e súbito, o abegão pá ra a s ua junto, entra na la vr a d a, crava o a gu il h a da
no solo e b r a da fo rte : - cF erra' . . . _ C o rre s pon d e a dizer : - «Vá de solt ar.. .
acab ou- se por hoje. . . »
Ào bra do do a b eg ão, a s junta s t od a s, compree nden do - lhe o a lca n ce, a cele-
ram a m archa e, num m oment o. unem file ira s. faz endo a lto . O s g a n hões l arga m
desde 10&0 os ra ban ei os e 8 S ag uil h a das, co mo q uem s e ali vi a de fa r dos imp or-
tun os. A segu i r , ca da j u n ta é desecorn eir ed s pelo h om em qu e a trás, m a s
nenhum l ar ga os b oi s s e m q ue o ab egfio d ê o exe m plo. O s apr essados espe ram
pelos re tardat ári os, e o abegão a gu arda por todos . A so lto. tem d e se r ge ral e

279
ATRAv t s D O S C AMP OS

uniforme. T o dos procu ram desacorneirar co m pr es t eza, e t o dos co ncluem po r


tomar a a titude d e solta , ca da qu al a garrad o ao boi que primeiro tem de largar.
a ab egão fa z o ut ro ta nto, e os s u bo rd inados passa m a 6. tá-l o atentamente.
p a r a obede cerem de pron t o a o sinal q u e d ele agua r dam. N es t a ocasião o silên -
cio é notó rio e im pressio n a nt e. O s b ovinos e as mu ares, p arad os e qui et os como
estát uas, não agi ta m os chocal hos trem esqul l e s r 05 h omens, m al s e me x em,
sem pr ofe ri r u m a pa lavra. P erturbaI a cena, se r ia es p aç a r - lh e o desfe cho.
À Him, o chefe da l avo ura r elanceia o ol ha r , certi fica-se qu e n ada falta, e
imedia tam ente, des cob rin do -se, diz r es peitoso : - «Lo uva do s ej a N osso S enhor
Jesus Cristo I. . .»
À cto co ntín uo, abegão e ga n hões. como se a elec t rici da de os m ov esse,
desabrocha m o b oi q u e ti n ha m seg u ro p el o ch a v elh o, l argam-n o e d esa bro cham
e l eva n t am a ca n g u a o da p ar te o posta, sol ta n do -o t amb ém. T od os fica m soltos
n u m a b r i r e fec ha r d e ol hos. espalh ando-se por en tre as entei chad uras e a rr e-
d or es, a intentarem comer n os a rrifes e vales . D e o r di ná r io , p rocu ra m em vão,
mas em q ue enco ntrasse m, n ã o os d ei xari a m Ía mbuj ar , O b o ieiro depress a lhes
assobia em tom de mar cha. e, sen do necess á ri o, o ca jado r ef orça a o rd em ,
pondo -os a ca m i n ho d a pa stage m , n o se u p a sso va gar oso e cade ncia do.
A s p a relhas sae m ao mes mo t empo d os a rad os, indo a lgu mas en ga te r DOS
carros qu e tr ou x era m de m anh ã. E nga ta das ou não, seg uem para o m on te de
canga n o cachaço, com os alm ocreve s no d orso ou n a taleira d os ca rros.
. .. . . . . . . . . . .. . . . . . . .. . . . . . . . ... ...... . . . ... . . . . . ... . . . . . . . . . . .. . . . . . .. . . . . .
Efectua d a a solta, a ca ba o s il êncio e ressurge a a ni mação. Entre o p essoal da
ga n h a d a cr u za m -se os ditos, as ordens e os re p aros, em voz alta, o ba n fa n d o o
tinir d os es qul l h êes. Um co nt ra st e fris a nt e co m o sossego da h ora e a s olidão d o
meio. En t r eta n t o, o s ga nhões encos t a m os cange s aos a rad os e cada um enrola
à p ress a o seu ap eiro. O abegãc, enrola nd o o que lhe p erten ce, m o stra -o e diz :
- «Q u e m o q uer Pe Aq ue le a qu em p or escala, i ncu m be o encargo d e s peíre ir o, (I )
res po n de : - eE u ... h oj e toca-me. . . »
P o r forma a ná lo ga à d o a be gâc, procede o ma i oral do s bois, entregando o
apeir o a ou t ro ga n h ã o, q u e lh e com pet e levá-lo. E pronto, n a d a m ai s entret ém
a ga n h a ria, a não s er mu nirem-se d os ca po tes e da s ja q u et a s q ue larg aram de
m anhã . De pressa tomam isso tu d o, e a segui r marcham para o monte, a p é o u
n os ca r ros, co n f o r me a l o n gitude, a s instru ções d o a m o o u a vontade d o m a io-
ral da s pa r elhas (.l
Ao i n icia r -se a m ar cha, o u à sol ta , u m dos da malta assopr a o búzio,
tira ndo sons ag udos, q u e s e ouvem a o la rgo, na s Ie vour e s vi z i n h a s. De l á cor-
r espo ndem igu almente e, d este modo, os so ns do s búzios. cr u z a n d o-se n o espaço.
anunciam a sol t a d o trab alho e sig n ific am a saudação de despedida de umas

fi) S ohn .pd,f1 j,u. .. ej • • • •'uad. aOI' d. pU la. s50.


(2) O. h"hõu .6 yio .111 u no• • d. I...o.u'. p.... o lII on ll I .. Ice-nll' , qUl ndo • dllll Dela I. ,nnd,. E a ind. n u ll'
d ,-clllulladu. " al U.nuio qu. o .1110 ...;111 o ordl"'. o u qUI o lII. loral d .. lIIu lu con.tn1l. .. o Il u. dor a i o d. 'nJ llu çÕII
alll e u bddo. D."'do· ... CU III PUIIl - I I. ui. 1111 401 'lll.lldo Cor .

- 280 -

ATRAvtS DOS CAMPOS

para outras ganharias. Exactamente o mesmo que 6zeram de madrugada à hora


do almoço, e como farão dentro em pouco, à entrada e à ssida da ceia.
São cumprimentos e sinais exclusivos da ép oca, que se observam a rigor,
havendo buzina e quem a saiba tocar.
.. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
A luz do crep úsculo - co ar do d ies - vai-se ex ti ng o i ndo , e a noite avizi-
nha-se, bonançosa e linda, como é Frequente na quadra ou tonal. Brilham no
infinito algumas estrelas, que os genbões contemplam e apreciam na sua cami-
nhada pa ra o monte, em regresso da lavoura. O brilho d as estrelas e a limpidez
da atmosfera. sugere-lhes raciocínios singulares, que dão origem a comentários
e tiradas filos óficas, algo estapafúrdias. De argumento em argumento, conduem
que nada percebem pontue nada lhe ensinaram e p ouco « t ira m do «sentido».
De re sto - acres centam - aqui lo das estrelas, do céu, da lua e do s ol, são «coi sa s
de Iun de me nto », obra de Deus, que nem os homens de letras sabem explicar.
Um ou outro nega esta pretendida ignorância dos h omens de letras. mas a
maioria a6rma q u e aim, que a gente de saber. tanto lê que t realê, nada pescando
do que vai lá por r íba. O que dizem a esse respeito s ã o contos da carochinha,
para embarrilarem os Iambaruços que não têm letras nem tretas. E nisto con-
cordam quase todos. Os que discordam. têm d e meter a lfng ue, na caixa, para
nã o os acoimare m de pa [VOS e impostores. Passam, pois, todos, a outros assun-
tas mais consoantes com os seus parcos conhecimentos. E assim prosseguem
na marcha, inteiramente alheados dos problemas complexos em que antes se
envolveram.
Das proximidades ci r cu n v iz in h a s, soam os balidos das ovelhas que recolhem
ao bardo; a chocalhada das vacas e bois, a pastarem no invernadouro; o gru-
nhir dos porcos, a entrarem para as cunaladas e o coaxar das rãs nos charcos
e ribeiros. De espaço a espaço. das azinheiras nu dosas e seculares. as aves
nocturnas piam os seus queixume~ ag ou rent cs, e. lá no alto, no monte, de onde
as luzes se di stinguem, frouxas e amortecidas, os cães fazem ouvir os seus lati-
dos de alarme. COmo bons vigias que pressentem a aproximação de alguém.
De facto. minutos depois, a ganharia e os carros pisam o terreiro do mo n te,
e nime ndo-o com sussurros e vozeiras. Os rafeiros emudecem então, agitam a
ca u da e correm cabisbaixos a afagar os recém-chegados, como que a pedirem-lhe
perdão de os não terem conhecido.
Dai a um quarto de hor-a, se tanto, o abegêc g ri t a ; - «Ã. ceia J. .... A esta
ch a m a da , ninguém deixa de acudir. Ganhõ es, carreiras e outros, que porventura
trabalham sob o comando do abegão, ou de seus delegados, todos comparecem
a cear, como estejam presentes. ( 1 ) Ceiam sem fastio, é claro, e a seguir saem.
Os ganhões vão para a cazinha. a parolar e pernoitar, h) e os carreiros para a
(1) y. j P" 'D' 29 do artl,o - A rlJ. DO. aODl... - • o pu.t" ,o - C.. J. - . . . p~' 1.16 • 117 .
(t) A cul 01(>. t ii Dei .oh.. do 01010.. 0 • do i Mlo. ton.-.. o pO.IO d. uc.Di lo d. cri.d.,ua " i . d u .
I . co f'lI • •t. ,u do coa p.. tutr.. dJ IMI p.,ad.lr t6.rdl coa Gco.. co, uUII. d o II" p" i ..
11 .. 19 o p...,,,.. fo - C., l. lo. J .. " '&olu - e 1:0..0 undOflo por,uflorbu• .1011 ou tra for• • • e. art:'o pr 6vrio. 4 0 ' .
, irei ••1. a.dJa.D.1C

- 281 -
AT RAv t s DOS CA M P O S

cavalariça das mulas. ( 1) O a begão e o sota s ó recolhem 80 seu al o; o ( 2) d epois


de levantarem a mesa. de entregarem a ceia aos malteses e de ouvirem as
instruções do am o, pa ra o trabalho d o dia s eguin te, se o amo reside n o m onte.
N este entretanto, soa d e n ovo a buzina, assoprada por qua .lqu er qu e sa iba.
Dos ge nh ôes - cum p r e ac r esce n ta r - os moços s olteiros nem se m p r e r ecolhem
à cazin h a, a pós a ceia. Os m a is dele s põem-se na píreze, a caminho da ald ei a ,
calc u r r iand c a p é e d e p a u n a m ã o, p or veredas e atalho s. com o fim d e p a ss e -
r em o melhor da noite p ela te ua : - p rimeiro, a arru ar em e ca n tare m d e sú cia
com os «pa rcei ro s» a m igos; d epois, a falarem co m os n amoros pel o p os tigo das
habitaçõ es. Vão go za r, di zem eles. E, g ozam r ealmente, se Lhe acr ed i tarmos o
q ue a nrmam.

SERViÇOS PRELIMINARES E COMPLEMENTARES DA LAVOURA


Gradagen s E.fectua m-s e so bre a s la vr a da s q ue precedem a s sementeiras d e
t ri gos de prima.vera e d e grãos d e bico, e a inda depois, na defini-
tiva q u e t a pa li s emen t e. P ar a a s searas outonais, a s gra dage ns u sam-s e n as
t erras mu ito en te rroadas, a ntes d a seme ntei r a, sob re o fer r o «de r evol ta », ou
seja o penúltimo. O ú lti mo «feno», logo s u bseq ue nte à se m en t ei ra . n un ca se
gr a da . Fica se m pre de s u lcos ab er tos, pu re, es coa r em mel h oe as ág uas das ch u va s.
A mai oria d os lavrad or es persi s te em u sar a g'rade antiga , rús tica , de ma -
deira, provid a d e «fa cas». Que tamb ém j á se em pregam a s grades mode rnas
ar ticuladas. Úl tim a m ent e va i-se adoptando a do sis te ma Osborne, q u e d ó. bons
resultados. Nas «te r ras sol tas», bem ense r vi çadas de al qu ei ve, uma g rad agem
co m a O sborne, ap licada pela s «ág uas n ovas», d e pois da t erra a brolha r, dispe nsa
a lavrada d e re volto,

Limp eza da s terras

Desmoitas Àn t es o u d e pois de s e prepararem os a lq u ei ves, a s t eeres resp ecti-


va s, com exc epçã o das qu e se d estinam a grãos d e b ico ou chícharos,
são desmoítadas, a en x a d ã o ou alv íão, do mato que a s suja e «embara ça ». (J )
Igual benefício s e di spensa às r a stolhices a queimar, para s egu n d a s eara e aos
pousios que s e tencionam semear «à face», e que s6 se lavram uma ve z, por
ocasião da sementeira.
D o manto em questão, predomina o piorrio, ne maioria das zo nas ; noutra s.

h ) 01 Cll"ulro l do r mcm n a CI...luiça d .. mu i.. pln tntl um .. p anl h ... Ani ta d ll rl colhar lm d . fin lth llllllltc, . 10
aTiu·.. di nç llu pln o , • .10, ' " d a o m . io ra l n Clh u o rdlln l do amo, co mo U II fuld a .. o mo .. t e. VcJaZlll -" .fa , ol l - C.....
lar"., - • • .,6, 111. 11 - A _iJ. 00. montc' - n a p" ln . t9 - M' io"l J ..... ,,1•• e u rr ei , o, - nu 1'"I"u 1" • 71.
(,) A u d nh . cllll.. ..d. d o ah e'io, , u ,c1o ll... dutl • do l a ti . V. j a· u a I'" la. 20 .
(:5) AI urr u pr 6.,r1.. p Ua Ido• • cDrch aro l . n . ,na d.. mai oria .lo. CU OI, dm ..p.a .. . l,um.. mail.. d i plo, .. o 00
ca n plltalrOI . S lo Ut.. mottt l qOI 'enl me ntl li um por car l." 1m ohedl'ael. I uma anli' l cofl u md n. S e,un d o • f-n dl,l o,
o. P"'I II chlc haro. u ml. do. eZlll fun du moita da d o pio rno . me l. m co... m alo f fI.cllid I.dI.. prod .. a1a do pouco. mil. to Olll"
. upenti çi o infund ad a, quI. 01 f. ctol e • u peri . .. ei . du ment. m .

282
ATRA YE.S DOS CAMPOS

poucas, o sargaço; e a in da em out ras, o pior no, a giest a e di ve r so s, n uma m is-


celânea avassaladora d e pastos e ch apa rros.
H á d es m oi ta s u pe rfi cial e desmoita r a di cal. A primeira , posto q ue destr ua
pela raiz os a r b ustos peq uenos, co m o giesta, sargaço e ros ma ninho. co rta de
le ve o u tr os m a io res - pi orn o, carrasco, carapeteiro, etc., derruban do - lhes as
hastes e d esca b eçando-Lh es a cepa , qu an do m uito. h ) O raizame m a i or. a r reigado
e 'Profundo. con tin ua intacto na terra, apto a r eno va r, como de facto renova em
poucas semanas, a p r es en tand o reb entões viceja.n tes , D e modo que a moita
osten ta a m es ma alt u r a e vigo r q uando. passados anos, volta a ser cortada,
para preparo d e out ra seara .
A desmoita r adi cal, chamada s rrenque, con si st e em extrair a cepa total-
mente, a não rebentar mais, ou só tarde e sem viço.
Antigamente, pouco se desmoitava por este processo decisivo, ótimo, evi-
de n temente, mas caríssimo. Ho je , em virtude do desenvolvimento das cult uras
cerealífer as, a desmoita pela raiz está sendo bastante usada, môrmente pelos
agric ultores q ue lavram terras suas. Faz-se sobret udo nas herdades de arvo-
rede. Nestas, a extinção dos moitais e carrasca is tem a dupla vantagem de
be neficia r as á rvores e searas.
N a s her da des escassas de arvoredo, que não p roduzem l enha para o co n-
sumo da casa, e onde pelo contrário abunda o píorrio, julga-se inconveniente o
arranque total e radical deste arbusto, que. sendo desenvolvido, supre a falta de
len h a . Além disso, tanto nas herdades de montado, como nas cam pas, despidas
de a rvoredo, o p ior no, p rovido de rama, também ser ve para revestimento de
alm enara s, m alha da s, choças e chiqueiros . P a r a este fim é superior a tudo mais
semelhante. a ponto de se ir cortar longe, para se aplicar onde o não há.
Cons equent em e n t e, pelo que respeita ao ptorno, é de crer que subsista o
u so da desmoíta s uperficial, em p a r te do moital, pejo menos, embora se arran-
que o q ue fo r tido p o r d esnecessário e n o civ o.
C o m O car r asco e ca rapetei ro, procede-se po r sistema semelhante. C o r ta m-s e
a enxadão, em desmo ita s uper.6cia l, o u de a rra n q u e total, s e não se olha a
des pesa s.
A giesta d es t r oi-se pela r aiz, se m g rande cus to, da da a h agilidade do seu
raizam e. Pos t o q ue renove d epressa , r edu z-se e extermina -se qua nd o as lavra-
da s s e r e p etem de d ois em dois an os ou d e t r ês em t r ês.
Em muito m aior quantidade, vegeta o sa rgaço, q ue em ce r tos sítios abra nge
folh a s inteiras. Arran ca-se a enxad ã o e à m ã o, quan do a te rra está úmida.
Àpres entando~ 5 e r ast eiro e p o uco cresci do, d estr o i- se com a l a vo u ra da che r -
ruece, se a t erra é d es embaraçada e «de chão•. P ois, a pesar d e n ã o oferecer
r esis tê n cia d e arran qu e, difi ci lmente se ext i ngue. C o m a. f a cilidade qu e se des-
troi a ssim r e n o va, em i nt ens idade igual ou a prox imada. P a ra se reduzir o sar-
gaço e n ão crescer, há qu e a rra n cá-lo anual m en te, persistindo na s pelas anu a is,

rt ) Vai ll. mlÍ a ull1ca , <:omo lt.mt.' m ta di:. .

- 283 -
ATRAvtS DOS CAMPOS

duran t e muitos a n os sucessivos, até r ar ee r basta n te. D o ccntré ríc, vegetan do à


vo ntade nos três ou que tro anos que a s folhas ficam d e po usio, co bre o terreno
to do. atinge considerável altura e impede o crescime nto das ervas.
A desmoita de um sargaçal espesso e va s t o to rna-s e mui t o dispe n diosa,
por barato que esteja o pessoal. À terra o qu e prod uz é. em ger a l. inferior, não
pagando a Iimpesa, s e o adubo ou esterco nã o b en efi ci ara m a sea ra.
Da esteva, quase não vale a pena falar, tão pouca existe na região elvense,
onde se pode classificar de p lanta exótica por assim dize r . A pen a s uns pés por
aqui e acolá . e isso mes mo numa única zona bastante li mitada. M a s vi n ga em
talou q ual quant idade no vizinho concelho de A rro nches e redondezas, posto
q ue muitíssimo menos do que em tempos passados, não m uito remotos. qua n do
compunha manchas extensas de respeitável altura e densidade. E aí, no termo
de Arronches, a xa'ra ( t ) desmoita-se hoje «por baixo», de arranque radica l,
estando quase abandonado o uso da r oça.
Da r oça e arranque n a esreva e carrasco, escuso de pormenorizar mais.
porque teria de repetir o qu e já disse no capítulo Montados, as páginas 35 e 36.
T emos por último as sarças de sil vas, nos terrenos de penedios, arrifes e
regatos, e ainda o rosmaninho, em terraS delgadas e arenosas. À s silvas cost u-
mam-se cortar à roçadoura, para. depois se l h es arra nca rem a s raizes. O rosma-
ninho, sendo vasto e crescido, desteoi-se a enxadão. Mas, geralmente, está r alo.
N estas condições sai fora com o arado. dispensando d esmoita .

• • •
E mb or a se desmoite desde o :6m da sementeira o utonal até «cabo de maio».
é sabido que o período intenso da desmoí ta, decorre na época do ve rão. e,
sobretudo, depois de se recolherem as palhas, avançando pelo «5 . Miguel. fo r a .
Em regra faz -se a desmoita com a ganharia. Mas se o se rviço é m uito e o
tempo aperta, mete-se pessoal estranho, ajustando-se por empreitadas «a
homens». Quer dizer, se a limpesa de uma folha for avaliad a em 100 di as d e
trabalho a um homem, contrata-se a empreirede por 100 homens, o u sejam
100 jornais, à razão de 120 a 160 reis cada j ó.r na] e as competentes comedorias.
O trabalho da desmoit e é dos mais violentos do campo, principal m ente
nos dias grandes, calmos os, em que o trabalhador maneja o enxadão, escorr en do
em suor, acurvado e cob er to de poeira, desde manhã ced o até pela noite fo r a,
descansando apenas à sesta e às h or a s de comida. N ão obstante, paga-se poe
salário baixo -120 a 160 r ei s e comida , é claro. N ã o há dinheiro mais bem
ga nho .

E n quanto a ga nha ria ou ca ma r ada vai d esm oi tand o, um ou do is h omens,


de forcados em p un h o, seg uem at rás. junta ndo o mato cortado , para s ecar e
a rder em peq ue nos mo ntões, qu e se d enominam csmin heiree ou moiteiras. Nas

- 284 -
A TRA v t S D O S C AMPOS


desmoitas de rastolbices e pousios para q uei m a dos, co m destino a searas d e relvas
- cà fs eu ' - o mato cor tado, n ã o s e ju-n ta, a ntes se espal ha , d e mistura com o
rastolho e pa sto, para m elh or se car e a rder . N esta hipótese, os ter re n os g u e r-
dam-se do ga do, pa ra q ue o pa sto fa cilite a quei ma.

Queimadas M oitas cortad as n o ve rã o, a ssim como r oças e rasto l h i ces, só se


quei m am d ep ois do dia 15 de a gosto. (tl E stá a ssi m p rece it uad o,
como precaução con tra incêndi os em searas nos raseo lhos e na s ei ras. De 15 de
agosto em diante. a s searss estão r ecolhidas ou presume-se que estejam . E então
vêem-se fogos p OI to da a pa r te . S ã o a s q ue i madas do t em po -fogos que d e
noite projectam clarões eno rm es, ilum i n a n d o fa ntãstica me nte os ca m pos cí e-
cunvizinhos.

E strumes e a d ubos

Entre os preparos cu ltura is, nen h u m se panten t eie mais va n t aj cso e e:6. caz
do que o da estrum açã o e adu ba çã o d a s ter ra s . À s u a utilid ade r e vela-s e a
cada pa sso ; é t ã o conhec íde, q u e n ão carece d e d emo ns trações.
Há mei o sé cu lo, est r u m a va- se um terço d os terr en os qu e s e est r u m a m na
actualidade, donde se infere qu e tamb ém n este pon t o a agri cultura t em adian-
tado e progredido.
Nos tempos a n tigos e n as p o pu lações ca m pó n ias, era corrente di z er-se que
os estumes escaldavam a s terras, e Aafa va m de er va a s seara s. Fosse por i sso ou
por desleixo, a s estrumeiras a cu mula vam -se e estr aga va m-se n os a rr a bald es
dos povoados, e até em al g u n s m on tes , d u r ant e anos, como coisa i nú til o u de
insignificante valo r. Nas povoa çõ es ning uém vendia es tercos, à falt a d e com-
pradores. E. qu em tinha on de os a p li ca r, descuida va disso o u apli cava -os sem
critério nem ccnfianca, a pa r t e exce pções h onr os a s.
Precon cei t o se mel hante ha via ta mbém a respeito d os estrumes d e ovel has
no pino d o verão. Embora os a ntigos l h es r econhecess em a s ua ben éfica e6.cáci a
nas outra s es tações do a n o. n ega vam- lha re do n dame n te n o pe ríodo estiva L
De ju lo.., a fi ns d e a gost o, ent ran do p or sete mbro. o ga do Ia nfg er o nun ca
reccl bra aos ba rdos , d ormind o à solta o n de calhava n a s vo ltas, ma lbarata n do
ester cos e urinas.
A gora já se pr atica d e mo do dive r s o. Os reba nhos Ie na r es, n o est io, reco-
lh em a os bardos na s po ucas h o ra s que repou sam de n oite. Claro est á que a
pr odução de estr u me n est a s h o ra s. é po uco t a m bém . Mas po r peq ue na q ue seja,
repetind o- se em 70 a 80 dias s eguidos, repr es ent a uma qu a n ti da d e co nsiderável,
que se n ão d eve desprezar. E, já não se despreza , p a ra h on ra e proveito do
lavrador.
N a s aldeia s, d espe r t o u igualme nte o inte r ess e e ze lo pelo aproveita me n to
Cd MI" dI II 4Il l l111 U I .IIl .. nuolLl cu . IU1U .IIl _II 01 11'IU.IIlOI confinlal " com pU ll tc n. cm p ulao . c blm 1..lm
"' , h dn Ilrf oUI 1:dII",UI no IInlno I 4'l1 c!m lro OUII aULD l lr . , .uu/ulI> ·'c II p n U i f.n l I o ...... ond o.

- 285-
AT RA v tS D O S C AM POS

do esterco. À m ai oria d os m oradores faz a sua estrum eira, boa ou r el es, g r a n d e


o u p eq uena, p ara a em pr ega r po r conta própria. o u para a vend er a quem q u er
que seja.
Nas h erdades observa-se zelo semelhante, muito maior qu e o d e o u t r os
temp os, se b em que ainda se d eparem d esperdícios. A contrastar. h á muit os
l a vrad ores q ue, al ém de apr oveitarem rig orosam ente os estrumes de s u a l a voura.
co mp ram na s povoa ções p ró xim a s t odo o qu e p odem al cançar, a soo, 600 e 700
r ei s a ca r rada de muar es. Nun ca chega p ara a s en comenda s .

• •
O s es t rume s p ro vê m das montureiras fe it a s co m d ejectos d es perdíci os e
d et r itos d e tocla a ordem , e d os exc re me ntos e urinas dos r ebanh os em bard os,
ap r iscos, ro dadas e m s.lhadios.

Estrumeiras Prep aro ba s t an te rud ime n t ar. U ma s volta s d e vez em q u a n do,


r evo lvend o o estrume d e cim a pa r a ba ix o. e ei s tudo. Alguns
lavrado res tap am a s estrum eira s co m terra , p reserva ndo - a s ass im dos raio s d o
sol e da chuva. Mas a m aioria não se importa com i sso.
Descobertas o u tapad as, em chega n do o temp o própri o, o estrum e r emo ve -
-se para a t erra a es te rc e r, o n de se de stribui aos mo n t õ es mai s ou men os di s-
tanciad os. Em s eg ui da é es palh a do à f orquilha, nem s e m p r e co m ac er to e
ig u a ldade, antes um p ouco à t oa, à mín gua de critério de quem o di stribui.
Para evit a r es se co n t r a . há q u e m pre6ra espalhar à m ão, a lanço. com mulhe-
re s, diri gidas por hom em ex periente. E': melh or p r o cesse , posto qu e mais caro e
mor oso . Na hip ót ese d e se u sar. co n vé m qu e os montí culos fiqu em maiores.
Às mulheres enchem neles os coxos, cesto s ou g a m elas qu e tr azem consigo, e.
depois, com O provimento à ilharga, seguem a espalhá-lo pela terra, co m o se
anda ssem a s emear.

Esterco de gado manadio De entre os melhores, de stacam-se, pela quanti -


dade e apreço, os das ovelhas. carneiros e borregos,
DOS bar d os e a prts cos, e um pou co n os a cartas, à sombra das árvores, de verão.
Em quantid ade muito inferior, co n t a m -se os das cabras, no bardo e malhadios
circunvizinhos; os d os p orcos, na s m alhadas e redondez as, e, p or últim o, os d as
Tes es b o v ínas, na s eca m e s» on d e essocegem à n oite. e junto dos manged oraís
onde co m em , presos.
Os estrumes d e ég u as d e manad a, quas e q u e não m erecem mensão. A s éguas
mud am tanto de pastaria, qu e os s eus d eject os fi cam dispersos po r t oda a parte,
sem proveito visivel.
Nisto d e gados, como produtores d e es tr u m es. cabe a primazia às ovelhas e
carneiros, cujos estercos são aproveitad os co m o n enhuns, pela circunstância de
os Ia n fg er os pernoitarem e es tacio n a r em em bardos m óveis so b r e o t erreno a
cultiva r . Compostos de cancelas ou de r ed es de alfirme, os bardos ence rram os

- 286 -
A T R A vtS D O S CAM P O S

r ebanhes, durante a noite e de manhã, at é saírem a pastar. Para aproveita-


mento e ampli ação da estrumada, as ca nc elas ou as redes mudam-se de sít io
uma vez por di a no o u ton o, inverno e verão, e duas n a prim avera . h ) Duas
vezes d iàriamente n a prima ver a, p orque neste tempo, o ge d o, durante o encerro,
esterce em exc esso para a capacidade d e um ba r do, já po r se lh e r etardar 8
solta até às 9 ou 1 0 h ora s d a m anhã. já por ter um passa di o a bundante d e
eIY'89 fr es cas e tenra s. (d O velhas, ca rneiros e bo rregos, co mem à f arta na
quadra p rim a veril, es tercando e urinan d o m u it íssim o mais q u e Das o utr as
épocas.
Seja em q ue tempo for, a m udança das cancelas efectua-se metõdicamen te
«corren do-s e» o terre no à s fia das o u eit o s, para q u e não fiq uem intervalos por
estrumar. Estercam-se por este meio as tor nas extremas da folha e lqueivada,
ou a alquei ve r, as baixas e vales para melanciais e meloa ís, e outras que s e
ten cionem semear dois a n o s consecutivos, sem estorvar n t raita dos r eban hos.
ne m retalh a r os afolh a mentos. E' axiomático que um a terra passada a bardos
àá bem d uas searas consecutivas.
.... .... ............. .. . . .. . .... ...... ..... .. ..... .. . .............. ..... .....
Um r ebanh o de 400 ovelhas, acomoda-se. para dormida e encerro, num
baldo d e Z4 cancelas de 3,75 de comprimento cada, e seis cancelas por banda,
ou seis num r ecinto de 500 met ros quadrado s, aproximadamente . P a r a u m
rebaJ\ho d e ca rneiros em número igua l. o bardo tem d e co m po r -se co m 28 ca nce -
las. Os carneiro s são m oi ores que as ovelhas, comem m a is, e por tanto, m a i or
tem de SeI o r ecin to de encerro. N o s dos borregos, em q u an tid a d e igu al. atri-
buída às ovelhas e ca r ne i ros, a s uperfície do r edil costum a ser m enor, bastan d o
20 cancelas. Quatro cen to s bo rregos estrumarão t a nta terra como 250 a 300
ovelhas. Isto enqua nto novos, até a o ano. D ep oi s, em malares, do a n o aos dois
anos, podem equipara r-s e às mães, par a o emprego de cancelas.
Mas pondo de parte s exos e i dades, tomemos para cálculos , sob re estr u ma -
ções, o animal típico, a o velha, t ez pred om inan te nos nossos rebanhos Ianares.
Assim, tendo em v is ta qu e 400 ovelh as est r u m am coisa d e 500 metro s
quadrados por b ardo, e s endo certo que u m moia de trigo em se mead u r a oc u p a
8 terra de nove h ectares, a pr o ximad a m en t e é claro q ue essa t erra fic a estru-
mada com 180 bardos n o período 'd e 180 d ias. S e a estrumaçã o en t rar p el a
primavera, está s abi d o qu e se ob té m em m en o s t em po, v isto q ue u m di a d e
en tão proporciona dois b ardos.
:Estas ba ses. embora ver d ad eiras, pode m f al ha r. O valor d as es tr u madas, a
s u perfí cie que abrangem e o te mpo q ue de m a nda m, dep en d em de cau sas di ver-

d tof.. 'pou do rio b li qu..m ..d Opl .. o .ll l".m.. d. mudu u b n dOI d ... OYl l b ... d. do i. tm do ll d i... o , .. do pu ·
. ......, .... tio ' OIlCU .. or o ee eeeee , o, II ICU O, Y.I.lIl m t llO' ' . POrt ....IO. n,ul'-U 11l,,,lif lclltl .. UtTv.m.d .. d .. um ...6 .. oh. ·
(sI O ,.do J....~.,o, ... pd m ., I do bndo d.p ol. d.. fiOU b or .. da m ...Iü. do .6 por ur comida UIl .bu.. di .
dI. 110 UIll PO. o(V.I. dqorn u O . . w lu prin dpallllrlll,. p.. ra lIio CO"lU . . I n u u mrdr cid.. P • .!. ", .ul. ou on.lh..d .
t CU"(' " r..l 'to.... plJlcl.Il'a clo do. I. .. ta...o. , d. "'.lIbi •• " 4 0.,1(0 hli ' n da ou ", ud• . pudbp l5. ai , . . . . .. do.uça
da '''fI",lIA•.

_ J
'18-
ATRAv t S DO S C A MP OS

S8S,even t uais e i m periosas, que s u rge m fre quentemente, entra vando p ropósitos,
gore cdc previsõ es. E.m prime iro lugar h á que ate nd er 80 pass adio dos animais.
S endo medíocre ou defi cien te, 05 es tr u m es escasseia m e a t er ra fi ca m a l estru -
ma da , tendo q ue se redu zir a s ca nc ela s, o u r eta r da r - l hes a mudança , passa n do a
ser de dois em d ois d i a s. em lugar d e to d os os di a s, ou u ma so mente, se o
costum e da ép o ca f or de dua s vezes por d ia . C om pa ss a d i o abundante d á - s e o
in ver s o : o u o s bardos se a la rg a m . e di cic nand o-s e-Ihes ca ncelas, o u mudam- se
com m e.is fr eq uênci a. O tem po t amb ém influi para o ca s o. S e va i am eno o u
quent e, d eix a-s e o r edil espa çoso, p ara os animais fica re m à la rg a e à fres ca.
S e, p elo co n t rár io , o frio aperta e o t em poral fu stiga, e ncu r ta - se o cercado,
tirando-lhe cancelas. A frialdade e a chuva , impele os a n i m a is a co n ch ega r em -
- se, de forma qu e, se o re cinto fo r a m plo, fica em parte de vo lu to e p or estr u m a r,
co nseq ue.n tem en te .
C o m o os bardos, e para a n á logo aproveitamento d e es trumes, os epriscos
o nde s e ordenham os slev ões, a ssentam-se sobre os terrenos a lavrar, s e isso se
co ac'ilte com a situação da s pastag ens que a s ovelhas correm . N ão s e conci-
liando, ficam onde calha m elho r à s voltas do gado. O s a pri sc os a pena s se
m udam du as e três vezes por s emana, a ten d en d o a o p o u co t e m po q ue as ove-
lha s p erm anecem nel es. E ' portan to p ouca a terra q u e estrum a m. Mas era , sem
dúv ida, menos aqui hó 30 anos, qu ando 09 a p 'ris cos nã o s e m udavam, o u muda -
vam p ouco . p ermanecendo n o m esmo sítio em t cde, a época do o r de n ho.
...... . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ...... . . . .. . . . .. . . . . . . . .. . . .
Tendo em conta os d etalhes co ns ig n a d os, e con sider and o qu e t odo o lav ra-
dor de importância dispõe, pelo m enos, de um rebanho l anar, h avendo muitos
com dois, t rê s e quatro, r eu nindo 1 .000 a 2.000 ovelha s, f à cilm ente s e concebe a
alta importância dos estru m es o vin os e a quantidade de t erra q u e f ertüizam
anualmente. Não obstan t e, t oda essa t erra abrange aí um terço d a fol ha ou
folhas em preparo.
Os estercos dos outros ga dos, b en eficiam quando muit o u ma qu art a ou
quint a p arte d os d ois t erços qu e as o v elhas n ão estr u m a m . Tor n a-s e pois i nt ui-
tivo q u e a m ai or por çã o d e alqu eive não s e beneficia, o u be nefi ci a -se com a d u -
bos qu.imicos, cu jo cu st o n em sempre é co m pen sado . Enfim, estr um ~ ... m a i s
barata e r emu n eradora que a da s o v elh a s e carneiros, n ão a h á. po r ce rto.
É d e uma econom ia e vant a gem q ue se impõe aos o l hos d os men os en te ndi dos.
Basta fri sar q u e não o ca siona despesas d e tr an s porte n em de espalhação.
Os próprios a nima i s q ue produz em os estr um es, s ã o eles precisamen te q ue os
vã o d epo r na t erra a qu e se destina m , e n a proporção que se pretende . É certo
qu e o ga do em ba rdado sofr e um t a nto n o en cerro, com o rigor das es tações,
sobretudo d e inverno. Mas ess e dano, re prese n t a p ouco o u nad a . cc m pe r e riv a -
mente com os lucros que o lavra d or au fere na m elho r ia da seara . A se a r a
estrumada por ovelhas, p rodu z o trip lo do q u e produ ziri a sem estrumaçã o ou
a dub o. Mais : o solo estruma do fi ca apto para seg u nd a s eara bc e , prod uzindo,
de futu ro, melhor es e mais abund ant es paatag ens. Quanto valem, p ortanto, em

- 288 -
ATRAvt s D O S C A M POS

r eis, os est rum es dos la n íger os, po r cab eça e a n o ? - p ergu ntará nat ura lmen te o
leitor cur ioso. Resposta : o valor real, indisc u tível, é difícil sabê-lo com acerto .
O q ue se lhe atribui varia d e região para re gião. Ao passo que em algum as
zon as r epu tam os das ovelhas a 400 reis, os dos carneiras 8 500 e os dos bor re-
gos a 200 reis por ca be ça e anuidade, mais vintém menos vintém. n ou tra s
cotam-se po r preços maiores ou m enores. confo rme o apreço que se l h es lig a e
a precisão q u e há .
Os cri ado r es de ga do ovino q ue co m pr a m pasta gen s nos olivais e esplan a -
da s de Elvas. p ara aí pastarem os seus rebanhos, cos tu m a m vender-lhes os
est ercos a os donos do s o liveis a 120 e 140 reis por no ite e gr upo de 100 cabeças
adu ltas. Tratando-s e de borregos, o preço baixa po r vi a de re gra, mas pouco.
• • •
A terra estuca da pelas ca bras limita-se ao r e ci n t o do bardo e red ondezas
- a s camas e m a lhadi os - n u m raio d e se a 60 metros. E,' u m a área pequena,
pelo m otivo de q ue o bardo per ma ne ce n um dado sí tio, desde que pri ncipia a
servir no outono até ma r ço, pelo menos, se rvindo sômente nas h oras dos orde-
nha s e da a.6. lhação. E m a lg u m as herd ad es, lo go que en tra a p rimavera, s u b s-
titui- se o bardo pe rmanente das cabr as, po r o utro ligeiro em lu ga r próximo,
que se muda todas as seman as o u d e lS em 15 d ias. D es ta m aneira, est r u m a - s e
ma is t er r a co m visível vantagem.
Das limp esas d os bardos e dos chiqueiros dos chtbcs, obtêm -se algun s
estr u m es que se amontoam nas proxi midades para se transportarem e aplicarem
oportuna m en te.
• • •
D os porcos t a m bém se ap roveitam os estrumes q u e produzem nas malha-
da s e r odadas em q ue dormem e param. Cada herdade s usceptív el de sustentar
suínos, dis põe g er a l m en t e de du a s a três m a lh ad a s, cada q ual em folha diversa,
afim de o gado ocupar a q ue fica no terreno d o alqu eive, ou a alque ivar em breve
tempo. À comida dos bâcoros na m a lhada. a s u a saída e entrada diária , d u r a n t e
meses, e o estacionamento, por horas, de manhã e à noite, na rodada em volt a ,
prod u z uma boa es tr umada q ue se utiliza na seara em p r ep a r o, sem p r e qu e é
possível. E quando s e não pode utüizar imediatamente, po r a malh ad a fic a r fora
do a lqueive, aproveita-se no ano seguinte ou no o utr o subsequen te. D a s limpe-
se s dos poci lg ões, pocilgas, cunaIada s, rebolins e ccmedoc ro s. que co m p õem 8S
malhadas dos p orcos, form am -se estr u m ei ra s que a seu temp o se t ra nspor t am
para a t er r a . Nã o é coisa de grande 'import ân cie, mas nem por isso se abandona.

• • •
Da s boiadas e vac:adas po ucos es tr um es s e r eunem, devido ao regim e m e na-
dia em que vi vem , pri ncipa lmente as vacas, que passam o ano à solta e a prado.

- 2B9 -
ATRAv tS D O S C A M POS

Dos bois, aproveitam-se os es tercos que deixam nos me ngedour a'is onde com em,
por horas, em todos os dias de parte do outono e do inverno. Mas perd em -s e os
do restante temp o d essa é poca , quando os bois comem no invernadouro, e os
que p ro d uzem d e primavera e verã o, a pastarem pelas coutadas e rastolhices.
Quem percorre os pousio s e os rastolhos, lá encontra a cada passo as bo stas
das res es vá cuas, para ali abandonadas a esmo, em maior ou menor decompo-
siçã o. a t é à s secas e mirradas, aptas para com bustível. Já n ão sucede assim às
qu e fi cam nas «ch ega das» à palha de centeio, comida das próprias alme neres,
em certas horas do dia e d a n oi te, n os m eses de novembro a fe vereiro. (t)
Os deject os das reses, m i s turados com os desperdíci os d a s p alha s, rem ove m-se
para fo r a das a lmene r a s, co m pon d o es t r u me ir as g r a n des, de va lor apre ci á vel.
E stas estrum eira s e a s o u t r a s similares, que s e r eunem n os m a nge dou r e is, em
que os b ois co m em, presos, r epr es enta m os ú n icos es t r u mes d e b ovino s qu e se
apro veitam.

Adubos químicos Empregam-se o s s up erfosfa to s de cal a 12 % s olúv eis e m


á gu a , n a r a zão de .50 quilos p or a lq u eire de trigo em s emea-
dura, o u s eja m 300 a 350 q ui los por hectare. p ou co mais ou meno s, s egundo a
co mposi ção das t erra s e as preocupaçõ es ec o n ó mi ca s do lavrador.
A espalhação do adubo efectua-se a lanço . po r h omens e mulheres. ou co m
distribuid or mecânico puxado a muar es . Este último sis t em a , indubi t àvelm ente
mais perfeito, é ap enas u sado Das g ra n d es lavouras e nas terra s limpas onde se
pode aplicar com van ta gem.
Por q u al q u er forma. a es palhação vai a efei t o antes da s em en t eira , e pro-
cura-se fazê-la em dia s de pouco ou nenhum vento, que permitam distribuição
met ódica e equitativa.
Os adubo s aplicam-se com reconhecídíssima vantagem em terras delgadas
e arenosas de alqueive. Nas q u ei ma das de rastolhice -r -rel ve s para segunda
seara - nunca dão resultado. e outro tanto ac ontece Das de trigo ribeiro, de
primavera. Pelo menos é o que a experiência demonstra.
A introdução dos superfosfatos n a cultura cerealífera do concelho de Elvas,
data. aí de 1884 em diante, empregando -os sômente os lavradores m ai s empreen-
dedores, e estes mesmo em campos reduzidíssimos . A principio, e por a lg un s
anos, não se passou de experiências ligeiras de melhores ou piores resultados.
Mas afinal, de há uns dez anos para cá, a s adubações generalizaram-se, mercê de
uma t en á s e activíssima propaganda, de r esultados bastant e lisonjeiro s. H oje
empregam-se adubos q u ím icos em q u a nridades espantosas - centenas de vagens,
que anualmente se descarregam em setembro e outubro nas estações de Elvas
e Santa Eulália. Então há uma f ebre de adubos que nem por s onhos se con ce-
b eria há coisa de meio século . . .
.... .. . . ........ . . .... . ............... ... .. . ........ ... .......... . . ..........

, -- 290 -
AT RA V E S DOS C AM POS

S em en t ei r as outon ai s

São a s de ma ior importância, nas gr a n d es e pequenas lavouras. Qualqu er


dos cereais semeados no outono, a tin ge quantidade igualou maior q ue to do o
trigo ribeir o e legumes semeados d e primaver a.

o que s e s emeia C om o neou registado n o começo do ca p itulo , s emeia m-se


t ri gos, cen t eio. ceva da, aveia e favas. O s trigos em m uito
maior porção e. a seguir, a cevada, o centeio, a aveia e as favas.

Trigos S em eiam-se n as t erras do alq uei ve. n as rastolhices de cevada e em


outras d e tr i go que, por serem d e superioridad e excepcional, ainda se
julgam aptas par a s eg u n d a seara. N as chamadas terras cenríetras, de melhor
aspecto, (te r re nos aren osos e a zot ados) já hoje se cultiva m tri gos . coisa que a ntes
se não fazia. D ã o r egularmen t e, cri and o m uita palha se o tem po lhe decorre
propicio. M a s exigem mo n das cuíde dcsas, di spendiosissimas como n en h um a s.
O s trigos m oles estão m ais em voga q ue os rij os, acent uando-se de ano
para ano a s ua pref er ência e a s corr esponden t es va ntagens n a procuxa, r end i-
mento e produçã o. D entro em p ouc o, se n ã o j â, os t rigos r ij os culetva r-s e- ão
ape nas n os banas absolu tamente impróprios para os mo le s. D e uns e c u t rcs
semeiam -se as variedad es s eguintes. Moles : - d e Cor uche, ga lego~ barbela.
r ibeiro. h) branco~ {s) Noé. d e R.ieti~ focen s e e precoce. R ijos: lobeir o, cendisl, -s

analil e de Santa Marta. Nenhum se s em eia tanto como o de Coruche, por ser
o que melhor está pro vando, em condições de r esistê ncia e produção. O No é, o
de R ieti e o locen se, for am introduzido s h á poucos anos. como v ariedades
prolíficas d e primeira ordem, mas o resulrad o, p osto con fir m e esta fam a. demons-
tra igualm en te que ess es t rigos têm O peco d e d esbagoarem à ceifa, muito m ais
que outro qualquer. O p recoce. é de introdução re centísaima, e como t a l a i nda
se não pode apreciar devid am ente.
Os trigos moles da região elvense, são do s mais apreciados n os mercados do
p aís, sobr etu do os d a s z onas servidas pela est a çã o do caminho de ferro de Santa
E ulália. Já se têm despachado trigo. de outra. esta ções adiante, para recuarem
a Santa Ecl âlía, e da qui s erem reexp edidos a Lisboa e Porto, como oriundos e
-procedentes das aludidas e afamadas zo nas. Uma esperteza .. .

Centeio D ê-se õti mam en te n os a lq ueives da s t erra s a r en os a s e nas rastolhices


estrumadas no a n o de alqueiv e. Na freguesia de Santa Eulália
seme ia-se grande quantidade deste g én er o, e mais s e s emea va antes quand o nas
areias daquela zona se não culti va va trigo mole, como h oj e se cultiva. O centeio
de Santa Eulália é do s mais a preciados do Alent ejo. Às searas de cen teio es tão
sujeitas às conting ências das outra s e mais à cresta das espig as por ef eit o d as
geada s. A s geada s de março ch ega m a estragar fol h as inteiras.
(I ) o VDtiro . . . .;IIo-U ,cnim' Gt. II ' prim.".,.. c , 6 u: u pcl o1l1lo1mt Gt c DO 11l"'",0.
hJ o ttl, o DU 1lCO, p ~ to Q\1 . u illo mo le. DO m nu do f p. ,o como rijo. u.im II t ' ..ado cluriJiudo , . nim'G1I.

291
ATRAvtS DOS CAMPOS

Cevada Re cla m a te rra boa, bastante est ru mada. Sem estr u m es produz mal,
n ão compensando. S em eia-se quase exclusivam en te n a s vá rzeas e ma-
l h a di os dos alqueives e nos {ereagtais que constituem 09 bafos dos montes.
D iz- se que a s ua cultura não escalda a terra. antes a deixa em ótimas condições
para a segunda seara, de semente diversa, é cla ro , sea r a que pode ser tão b oa
ou melhor q ue a p rimeira .

Aveia C omo vale p o u co, fica nas terras piores do alqueive e nas r a sto lh í ces de
so lo ordinário ou m uito depa uperado. Estas circunstância e o po uco
esmero com q ue se cu lti va, concor rem p ara q ue a s u a produção seja fra ca ,
g eral me nte. S emeia m-se Brandes aveia is, mas não se colhe n a p ropo rção q ue
se semei a . N o con cel h o de E l va s, en ten da -s e. N os v iz i nh os. de B orb a e d e Vila
Vi çosa, é im portant e a cu ltura e p ro dução de st e cerea l. D a a v ei a d iz-se que
até abr il es tá a d orm ir,

favas C ulti vam-s e n09 ferragiais d os mo n tes e do s arr ed ores das povoações.
de s de o princípio de o ut ubro até princípio d e novembro, o mais tardar,
e se m p re em terra com estrume, a p r et ex t o d e 6car u m bom alqueive para
cereais, se não pega r de favas, co mo, co m f undados r ecei o s. se admite. O d ita d o
an tigo, de que pelos Eavais vereis o mais. não t e m fo ros de Evangelho neste
ca n t o do A l ent ejo.
Os subú rbios de E lvas são os sítios do con celho onde a cultura d a s fav as
vinga melhor e onde te m u m a certa i mportância, inferio r . no enta n t o, à cultu ra
dos cereais. N a s herdades, os favais nem s equer prod uze m o suficiente
para o consumo das lov ou r as respectivas, tã o pequen os costumam ser e tão
pouco dão. Sejam como for, semeiam-se «à casa» e a o rego, o u a granel, a lanço,
à semelhança do que se pratica com os cereais. Eete último sistema é inovação
r ecente no sítio. O outro. antigo. «à casa» e ao rego, ainda é preferido pela
m a ioda dos la vr a d or es . Um arado vai abrindo o rego; atrás segue o semeador
res pectivo, de cesto à ilharga ou saco ao ombro, donde tira, por cada vez, 4 a
6 favas q ue deita juntas, no fundo do l'ego para nascerem «à casa», ou «à
moita» , de ixando de moita a moita o espaço que julga su6.ciente. Àtrás deste
s emeador vem segundo arado, cobrindo a semente e. l ogo depois, u m terceiro,
sulcando novo rego de encosto, imediatamente semeado por s egundo semeador,
que semeia e caminha como o primeiro. Segue-se o utro arado, o q uarto, a tap a r
a semente. pela fo rm a do segundo. E, assim sucessivamente, d e modo que os
a rados constam de d ois para cada semeador.

.. • •
Selecção das s e m e nte s Os la vradores metic ulosos só lan çam à t erra se mentes
fi n as e ap uradas, li vres de ter ru gem, que, de entre as
de sua colh eita ou p or compra, escolhem e joeiram po r meio de cri vos e arn eír os ...

292
ATRAvtS DO S CAMPO S

ap erfeiçoa dos . como o Marot e o u t ros. E s ta selecção im põ e-se: a parta. as semen -


tes estranha s e nocivas, com o o j oio, o cisirão e a n eg ri te, e, conju ntamente.
sepa r a o cer eal m iudo e mi rrado. d o cheio e são, próprio para a sementeira.

Sulfatagens C om o precaução contra o m a l da lerruAem, que ataca os trigos e


a veia, u sa-se, d esde 1874 ou 1875, s u lfatar as respectivas s ementes
com um a solução de s ulfato de cobre a Z o u 3 % , p r epa r ad a e aplicad a dias ou
horas a ntes de s e efe ctuar a s emen teira.
S ulfa ta-s e por 8sp ersão o u p or imersão. D a primeira for m a r eun e- s e um
pequeno m onte de semente sobre o piso de qu a lqu er casa, e aí s al pica - s e com
uma va sso u r a embebida na água d o sulfa t o, d and o-s e-lh e volta para a semente
u m edecer m elhor. E r ep etem-se a s m olha s e as vo ltas, enquanto aparece m
bagos enxutos. Em seg uida ensaca-se o g r ã o sulfatado e prepara-se outr a
quantidade, sendo precisa.
Por i m er são, processo melhor e mais radi cal, a semente sulfata-se dentro
de uma a lcofa que se imerge num tino ou al guidar de á *ua su lfa ta d a. Àssim
que a alcofa se cobre de água, retira-se do banho e escorre-se, vasa ndo-se-Ihe
a semente para o chão ou vasilha. D epois enche-se de n ovo a alcofa e procede-
"se como ant eriormente, tantas vezes quantas for preciso.
Esta p recaução de sulfatar o tri go e a aveia, como pe rs ervativo da f err u -
*em a q ue estão propen sos. dá ótimos resultados. Não obstante, q uando no
outono s e se meia trigo s ulfatado em terra enxuta, esse trigo arrisca-se a n a scer
mal, se as chu va s vierem m uito depois da sementeira . Conhecem-se exemplos
qu e justincam este reparo. T ambém não é prudente s u lfa tar o grão muitos dias
antes de o lan çar à terra.

Quando se semeia. T empo seco e t empo chuvo so D a primeira à segu n d e


quinzena de outubro,
depois de u m em p u r r ã o valente à la vrad a d e revolta. entra-se com a sementeÍta,
tomando à conta a s t erras friss e as rastolhices . (I ) D a s ementeira das rastolhi-
ces e baíxas d e «m en os corpo », passa - s e a con clu sã o d a revolte, e, nnda a
revolts, reata-se a sementeira, de que já se não larga m ã o até se acabar de vez,
como o tempo consinta . E stas s ão as p raxes. Entretanto, h á que distinguir.
Àssim, começa-se em princípio d e ou t u bro, se as terras tê m reb entado por
efeito das «água s n ovas», próprias d o . S. Mateus• .e do <II S. Miguel• . Se adreAB
a não chover neste período, aguarda-se que ch ova , mas n ão s e es per a índefin i-
damente. Aí po r 20 de o ut ub ro, ch ov a ou n ão, dê p or on d e der, vai a semente
à terra, que o futuro não se adivinha e o t empo voa . Àn tes s emea r a t empo e
em seco, a arranharem os arados. do que t ard e e a más h oras, a a tascarem-se os
boís nas te rras empap adas pelas ch uvas de à ezem bro . Lá diz o ri fão: Não tenhas
dó de se mea r pio em pó . . . Talvez q ue o rifão se não d eva a ca tar em absoluto.
(I ' Aa ti;.=u u ••, ' h' coi.. d. 60 .ao• • "=I"lIlr. com e'.... , , = pu '1;11. " L.do. POI u e di . d. No... S."Lon.
prot.c ~lo •• 1,,'O'oc... pau. o hom 'xlto d. ' n n .

- 293 -
ATRAvtS DOS CAMPOS

E " poré m sabido, que para se semear ta rde. em atoleiros, sob o influxo de uma
temp eratura frigidíssí ma. m a is vale adiantar em o utubro, quer seja semeando em
pó, quer em lamas de chuva das passageiras, que enx uguem de pronto . As tais
lamas quentes. que a ninguém assustam, que aream depr essa, mercê de ameni-
dade da temperatura e da relativa g randeza dos dias. C h o ver ou não chover.
eis a grande inc6gnita . Se o futuro se adivinhasse?1 Se de antemão se soubesse
qual a melhor maré de s ementeiras? I M as n ã o s e sabe. ninguém desvenda esse
raisr êeio . Ainda há bandarras la b r egos que a r r o ta m profecias tolas, fund a-
me n t a das no aspecto d a lua e várias baboseiras, de crédito aqui há cem anos.
Ma s hoje, en t r e cam pó nios mes mo, os bo rdas d água e saragoçe nos est ã o
m uito desaeredímdos. P o r conseg ui nte. na incertez a d o que há-de v ir, O la vr a -
do r amolda-se às circu nstâncias. Norteia -se pela experiência - a mestra d a
vida. de q ue o bom agricultor não prescinde. n em deve prescindir .

o que se sem ei a primeiro. O qu e se se mei a úl tim o


Começa-se pelas aveias,
ceva d a e favas. Depois.
passa-se aos trigos e ao centeio . Estas são as normas correntes. que nem sem-
pre se observam à risca. A vantagem de semear de seguida, e por completo,
u ma folha afastada do centro da lavoura. impõe a sementeira ráp ida e quase
simultânea de todos os géneros que se lhe destinam . Para alguns, a época pode
não ser a melhor. mas tem de se aproveitar como é. D o contrário, h á que vol-
ta.r lá o utra vez. o que de ma nda caminhadas q ue enredam e atIazam . h ) Mais :
uma estiagem prolongad a. ou um a invernia per sist en t e obriga, em certos casos,
a deixar-se determinada ter ra e ir-se para o ut ra, alterando-se o programa que
se t raçara de an temã o. Em agricultura tem d e se ir com o tempo. e a i daquele
q u e n ão reconh ece esta gr a n de verda d e.

Semeadores A s lavouras d e 8 a 1$ ara dos empregam um, q u e sem eia e em b alga .


Às de m ai or m ovi m ent o ocupa m um semead o r e um embelgudo r,
s enão dois em cada serviço.

Como se s e m e ia . A formiga, o s pássaros A passo cadenciado e de semen-


e o vento comp rometem o s s e m e a d o r e s teiro a o ombro. caminha ndo pelas
belgas (d qu e o g uiam, o semeador
espal ha a sement e a l anço, despedi n do -a com fo rça. para se r epartir m elhor.
À m ã o esva sia-s e-Ihe, el e enche-a de n o v o no sementeiro e de no vo es pal ha ,

(tJ Co"'o pl'tulto d. I conOIllI. nua!, • po nr o ....o.u Cla• • In.o.u•• d• •ndo., de 1l-1li .hio pu. oano dl.r'nll.
4a &..o.to. IIlUlO' melho r.
( 21 Ch..",.",- .. bel.... .. f.I ... d. t U l'tllO, d. 6 • 7 ",.no. d. lar' o.n •• '" 40••• npu-u: • ror D' . 5 10 Illdi. p•....,,"'. ,.
1" 1'1 . "'!tar '0. "1'10' 00. l . con.. d. TVItO. o Clal .p..ar d. t o.do II' ''' um pu u con..'o. • • t rn Clo lllt. licut'" " P'COI por
.."'.ar. ( 01ll0 l onu qa 'nc! . d. duco.ido. 00. pu.... . A lIlU'u cl o d.. bc1, .. • up c...nt.d.:po r ralo ' I o.pcrli d .U.ri mo., .bnto.
11.1. }'t1,.d. 00. araeUo.Lo d. om .. bu t a ,o.I.d . pel o .mL.t;. dor. loU'. u.c • .. bel, .. n. dlucclo d . d. l l u oun. qa. 'U1a
.u" . n ttn . u o • u ", . n f••
O. DOIl."1Il•• dOUI . d. Dnco. co.,. .lc.llo u , pt. r..... bc1,u I. u .., Cla. IL.. cOIlo,lllo u ", m'llejar .. ",onud • •

- 294 -
A T R A vtS DOS CAM POS

cain do a sem ente n a t er-ra como se foss e chu va de gr a n i zo. ( I) E assim vai
anda ndo e se mean do, pelas belgas f ora, «ca rregan d o» ou «l eva n tan do» a m ão,
seg undo o caso e a s circunstâ nci a s. ( t )
O sementeiro d espej a - se ; o semeador i n t errom p e a tarefa. p õe O cha p eu n o
chão para sinal, e a segu ir sai d a belga, a en che r n o v a ta le iga da ali p r ó xim o,
a um d os sacos. V olta depressa, d e sementeiro cheio às costas, e imediata m ent e,
reata 8 fai n a, co m ou sem chap eu, para que os ara d os lhe n ã o cheg u em 8 0S cal-
ca n har es, a a dver ti-lo de q ue lhes es tão em cima. co m a seme nte ap u ra da , e que
mais precisam n a terra . p ara da re m saida à la voura . M an o b ra , p ois, com per-
sis tência, p elo s egur o, a sa l vo de a pe r tões que o entalem. P r ef er e d escançar
men os, f ugindo a «fumadas» e cavaqueires ociosas, d o que and ar de lufa-lufa ,
a tress ue r, e ainda por cima escarnead o pelos da ganharia. (a) S em emb ar go,
durante o u t ubro e parte de novembro, quando os dias vão ca l mos, o semeador
precisa inte rromp er a lida p a ra s e não adi an ta r em ex cess o. T em de sem ear às
peq ue nas p orções, q u ase «à boca dos a rados», de m a n eir a que a semente se
enterre logo, ant es q ue os pássaros a dizimem e a formiga a leve. A formiga,
so b retudo, é o pe sa de lo do se m ea do r. Nos dia s serenos ela sai dos for m ig u ei r os
e, e m l egiõ es de milhares, trata de acarretar e juntar os grãos que encontra pe la
te rra . Tal actividade d es en vol v e qu e, s e os arados tardarem em r evo lv er a ter-ra,
a sementeira foi-se em g ra nde parte, e a que vi nga sai às m a lhas, defeituosíssima.
Nuns s í ti os, exibir-se-há em m ontões d e cra veiros ; noutros, p é a qu i, pé acolá,
po r ent re clar eiras d es er tas, sem um bago sequer. À fo rmiga abalou com el es,
aca rreta ndo se mp r e, tenaz mente, dando r a zã o à fábu la qu e lhe grans eou cele-
bridade .
No s di as ventosos. ta m bém a se m enteira t em d e ser feita com ta ct o , de
m an eira q ue o grão fiq ue bem di vi di d o. À for miga, os pássaros e o vento. são
i n im igos d e t emer, com que h á a co ntar, de que o semeador se precata, coma
p er ceb a do ofício e não lhe e m pa tem as v asa s . O sem ea d or, por experiente q u e
se julgue, n unca p ode ga r a n tir q ue a se a ra virá a f uro em co n diçõ es d e lhe
bo ta r f am a. O mais p intado b o rra-se às vezes, q ua n do menos o i magina . . •

Sementeiras vastas e sementeiras ra las C onsidera- se s eme n teira va sta, a


q u e l ev ou mais s emente d o q ue a
precis a, ou estritamen te n ecess ári a. D enomi n a-se rala, a que se efect uo u co m
m enos grão. do q ue o índispensáve l. Ma s só d epois da nas cen ça é qu e s e
con hece a valer q u a l a que levo u de mais ou d e menos.

(1 1 N o. di .. di un tl oti, ." o II mu do!' cualw p.nlc1•• UIl II coa • 1't' O d. Qad. o ,calo copn, du,lIllo ,..11. doI.
''''01 do nJo op ono, S. o ...... 10 b.tI d i uru o", d. co"", Ullj. r ij o o", buado, aud•• p.lo UDtrO d. b.16" "muDdo
eom f,oddadl p ara a dl rdt. I pua a u l;[lIl rd a,
(2) D.lta"do m.l. o'" mlIlO. . .mlM I, "."'Ddo a II n a . pld...
t ,riae"io a u h . 1;[<11 a tina, u i' co mo for, lUlU d. "'11'.110 ' nouall 110 lom lCO do Oo t OIlO. do q",. a o Gm , utbD
II" ..
cooo.o prtclu 10.... tt·d.ptr u da prim....n d o 40' dlPQII , do mudo d. muco l to dfl.ll.tI.
,1I'
( 3) O. , , "hllu moll j.m do " mu d or 401 II dllxa af c... pilo. a n do •• Tro(lm-aO fmplldoumlatt.

- 295-
A TR Avt S DO S C A M P OS

Os si stem a s d e se m ear vas to ou ralo - se sist emas se pode m chama r -


t êm os s eus entusiastas e detra ct ores. q u e. r esp ectiva m en t e, a p r egoam as s upo s-
ta s vanta gens do que lhes me rece afeição e as i nco n ve niê ncias do que lhes
desag ra da . Mas a pr u dê ncia a consel h a a que nem t ã o va st o como cab elo em cão
nem tão ralo q ue o g rão nascido a pa r e ça mal. distanciado p o r intervalo s g r an -
des. supérfluos. co nvida nd o a espojeiro s de cotovias. Espaço s d e ter r a malbara-
tada. qu e nã o remunera u m ceíril da cu l t ura q ue r ecebeu .
À s terras boas. «d e co rpo », tida s co mo erveir s s, podem com ma is seme nte
do q ue a s r uins. d e pouco chão. À s pri mei ras, só pecam p or vas tas. q uando o
exa gero é no tór io . Às seg undas. as «delgadas» e «fr acas», tê m de se r poupa das.
N a s lavr ad a s em rastolhices, de ita- s e u m eba g u in h o a mais», do que preci-
s aria m se es ti v es s em d e a lqu eive . S emea da s de relvas. «co m em » s emente, no
dizer d os sem eado res.
Em q u a lq u er das hip ó teses. a sementeira rala de outono. é menos n o ci va no
co meço da ép o ca , do q ue depois. À s eara te mporá e r ala. p ode emenda r m uito
se afilhar exc epcio n a lm ente bem, o q ue s em dúvida atenua a deficiência de
se m enteira . N a s searas de primavera. o sistema ralo é menos prej u dicial do fim
de março em diante, do q u e a n t erior m ente.

Sem entei ra s temporã s e se me n te i r as serôd ias Em regra, todas as sea ras


o utonais req uer em s emen-
teira t em p or ã , maxime as av eias, a cev a d a e as fav as, q u e d ev em estar nascidas
n o m ea d o de nov embro.
O s trig o s e o cent ei o t o leram a lgu m a demora. mas nascem e medram
m elh o r, sem ea n d o - s e n o a pojo da temp orada, dez dias antes d os ..Santo s», a 1$
dias d ep ois . e Tem poriio, ou pa lba ou ~riio», reza um ditad o antigo. Àc onselha
porém a exp eriê n ci a q u e, em certos casos, s e não siga o ditado muito à letra.
Às searas de tri go m uito tempor ão, em terras estrumadas, a rr is ca m - s e a d esen-
volver-se p r em a t u r a m ent e e a a camarem, Arad an d o mal. Que o d esas tre d a
acamação, co mo se nã o rea liz e em g r and es p arcelas da s eara , é menor d o q u e
a p a r en t a , a darmo s cré d i to a u m o u t r o r ifã o, q u e d iz : «Q uan d o a s eara caí,
le vanta-se o dono ... » B onita e a n i m a d or a imagem, s em dúvida, m as deveras
otimista. O e pã o» q ue tomba , não erg ue o d ono. por certo.
O cent eio remoerã o, n ã o t omba co m o o trigo. mas pode suceder-lhe pior,
p or se adiantar m ais q u e n enhum outrO cereal. S em ea d o cedo. es p iga no s fins
de fevereiro a princípi o de março, o que o põe em perigo eminente d e ser cres-
tado p el as g ea da s e v en t a n i as d o no rdeste, t a n to de te m er n ess es m eses.
... . ..... .... . .. . .. . ...... . . . .. ... .. .. . .. . .. . .. . .............. . ... .... .. . . .. .
R ecei a m- s e com razão os dano s ap on tado s, mas se as circunstâncias co lo -
cam o l avrador na colisão d e ter d e semear m uito ce d o ou mu ito t a r d e, visto
que a tempo rada p ropícia é curta para o g re n ge ío a efectua r, o la vra d o r opta
pela s ementeira t empo rã, co mo a de menos co n t i n g ên cia s e a de melhor palpi t e.

296
ATRAvt S DOS C A M P OS

A s er ôdia s6 prova bem nos a nos temperados, que s e não assinalam por secas
prolonga das o u {nveeede.s r igor-oalsaimas.
........ ... .. ... .. ... .... .. ... ... .. .. .. .......... ...... . .. .. . . . .... ... .... ...
Nas semen t ei ra s o u t o n a is, tem de se ter em vista q ue, à medida que o tempo
avança, aumentam 8 8 probabilidades d e chuvas excessivas e fr ios intensos,
tan to p iores para as searas q ua n to mais adiantada for a épo ca . D á-se O inverso
do que se ob serva com a s s em en t eira s de primavera, qu e, com o nasçam bem,
dep ois n ã o h á ch uva s qu e as prejudiquem. É q ue na p r imavera v ai-se para o
bom tem po e dias g ra n d es. a o passo que no o u tono, m ar cha-s e para a q ua d r a
inver nose, de dias cu rtíssi mos, com tem peratu r a ba i xa . P ortanto a primeira
me tad e d o o uto no, em que d ecor ra excepci onalmente chuvosa e fria , ~rande t em
de ser a ano r m a li d a d e, para causa r es rra gos sensí veis e Ir eem ediêveis. E sse
perigo é m uito m ais de tem er depois d e 15 d e n o vembro em d ia n te, quando o
i nve r no s e a pr oxima e que Deus sab e o q ue d ará de si. Se o inver no se d em ora
em vi r, be m está . M as s e ele se antecipa, ca r ra n cu do e tenebros o, transtornando
a lavo u ra em plena laboração, ai da sea r a e d o la vra dor 1. ..
Resum in d o : s em enteir a serôdia só se faz à m íngua de forças. ou por que o
tempo n ã o a bo n ou em começo. e Q u em tem fo rça na chevalha e não se descuida
para ta r de.
. . . ....... . . ........ .... ... ... ..... .... .. .. . ..... .. .... .... ..... ..... .... ...
C onsi d eram-s e sementeiras muito temp orãs as qu e se re alizam até 20 de
outubro. D e 20 d e outu br o a 30 de n ovembro são m edianamente temporãs e
prom etedoras como nenhumas, por ca l ha re m na em elh o r m ar é», s e o tempo
nã o fa lta r . As subsequentes, de 20 a 30 d e dezembro, já podem pe ca r por se rô-
dias, e mais tardias se reputam a s q ue se r ealiz am depo is, a té e à S enhora da
C onceiçã o e, N es ta altura, as sementeiras estão a cabada s. ou v ão «de cabeça
ebe'ixoe, a matarem-se de vez por 1 2 ou 15 d e d ez em bro. Que nos barros po u -
ca s se arrebentam antes do Datal. Há mesm o la v r a do r es nesta zon a que pros-
s egue m semean do d ep oi s do N e.ta], se a te u a d á. E sses n ã o s e cingem a épo cas
ttxa s, n em circun scr evem os limites das fol ha s. O te m po é q u e os deit a fora'

Semente por hectare Sob um po n to de vi sta g era l, é d ifícil avaliar a q ua n tia


de semente i n d is pensáve l pa ra a s em enteira de um
hectar e o u d e ou tro ca mpo maior. É muito hipotética es sa avalia ção, pontue
tem d e r egular-s e p or circunstâncias várias, ta is como a ocasião em q u e se
sem eia , a n a ture za d a t er r e , etc.
A bstra ind o d e u sos excep ci on ais, r esultan tes de caprichos q u e n ã o s e devem
tomar em conta, ca d a hec ta re, n a m aioria d os casos, 6.ca sufici entemente semead o
com d ez decali tros d e t r igo mole, ou u ns doze de rij o, por este s er mais
vol umoso.
A mesma s u perfície. semeada com ou trO cereal em vez d e trigo, deve rece...
ber o seguin te : sen do centeio, s eis a sete d eca li tros ; cev ad a , d oz e a treze; aveia ,
dez oito a vi nte.

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ATRA V É S DOS C A MP OS

Qu an to leva cada folha S e para um h ectare é variável a porção de d eterm i-


nada semente que precisa, essa variedade mais s e
a centua n um a folha qualquer, sempre constituída por muitos hectares, e, por
conseg uin te, de á rea gr a n d e. No entanto, é cor r en t e as folhas das her dades
estarem t ereede» num certo n úmer o de moios de semeadura. Não obstante,
le vam em ge r a l m ais ou m enos d o que a lotação qu e s e l hes atribui, chegan d o
a e cus e r d if erenças de 2.5 e 30% . O que se explica. p ejas seguin t es ca us as.
P rimeira: pouca ou nenhuma uniformidade no s istema d e s em ear. E.nquanto
q u e un s só espalham basto, d e q ue sã o a p ol ogis t as, outros d escambam para
o ral o.
Segunda: n as épocas em que va i a efeito a sem ent eÍI:a. U ma fo lha s emea d a n o
p ri n cipio da t emporada com cinco moioa, precisa r ia d e cin co e m eio ou se is, se
fosse se m ea d a 40 d ias d ep ois. h '
T e:rceira: n o esta do d a terra q u e se esti v-er s eca ou exces s ivame n t e úmida,
r equer m ais semente qu e estando em boa sasão .
Em s u m a, a m esma folha, 8. m es ma época , estad o análogo d a t erra e o
mesmo sem ead or, em d oi s ou tr ês a n os d tf erenres, ac usa m difer ente q u antidad e
d e sem eadura em p reg ada, em bo r a o g énero s eja do mes mo . S ó muito p or a cas o
r ecebe p orçã o ig u a l à d o s ou tros a nos.
A s em en teira d o s cerea is, como ainda hoje se p r a tica e praticará por la rgo
te mpo, é um trabalho imperfei tíssim o. que está l ong e d e satisfazer .

Cã lcu los d e geira É. u so entr e os la vradores calcularem a semen te q u e se


ent er ra di àríamente, pelo número de Aeiras empregadas em
cada dia, q u e para o caso é o m es m o que d izer, pelo número de arad os q ue t r a -
z em em mov-imento.
Todavia, p a r a semelhantes cál cu lo s sair em apr oximados. h á qu e indagar d e
uma infiniclade de factores : a natureza das g eira s - se de bois ou d e muares : a
épo ca - dias grandes ou pequ en os; a sas ã o das ter ra s - s ecas o u ú m id as,
cr u a s e resies, ou fabricadas e f ofas, «arm a n do» ou nã o ; a com posiçã o d o solo -
forte ou de lgado, limpo ou enredoso r e por último. à s fo r ça s e andamento d o
ga d o - se vi goroso ou fraco. se de pass o li geiro ou pachorrento.
Partindo porém da h ipótese que os dias são dos de mediana gr a n d eza da
época , qu e a terra d á bem e é desembaraçada, que o gado está sofrível, mar"
chando a pa ss o certeiro, sem enredos de maio r . aproximar-se- é d a verdade
q uem com p u ta r a semente enterrada por dia e arad o a b ois. n o seguinte, mais
pico. me nos pico:
T r igo. 40 litros; centeio. 2.5; cevada• .50: aveia. 7.5. Faltando qualquer d os
requis itos mencionados, claro está qu e o resultado não corresponderá à previsão
e tan t o m aior será o engano quan to mais falharem a s base s que s e tomaram.
À s ge iras represe ntadas por arados d e muares dão quase o duplo do des-

(a) No OuI OIlO. to mp r..lId N .. prhaaur. d'·.. II 10 , .0 . Q uallt o m ..l. tud 0 te .

- 298 -
A T RA v t s D O S C A M POS

paebo q u e as dos bois, enterrando por consequência maior porção de semente


- m ai s u m terço talvez. Isto q ua n d o bois e muares estão em a n á log as con di çõ es
de trabalho. Uma parelha de muares, magra, ca n sa da e velha, é natural qu e
lavre menos qu e uma junta de bois .2o r d os e novos.
N os barros, custosos d e lavrar, é bastante vagaroso o passo das juntas de
bois e o das parelhas de muares. Sucede. por isso, qu e o d espa cho d as últimas
pouco ou nada s e avantaja ao da s prim eiras.

S em enteiras de primav era

Têm importância secundária. co mp a rad a s co m a s do o utono. qu er na s u per -


fí cie d e t erreno que oc u p a m . quer n a var ie dad e e imp ort â n ci a dos géneros q ue
a s r epresentam. D e cereais, a penas t rigo ri be iro. De legu m es, g r ãos de bico e
chícharos. H á ainda a notar o fei jão frade e o m ilho que s e cultivam ta m b ém ..
mas em porções mínimas e em poucas zonas.
A s chamadas sementeiras de primav er a - que se efectuam a lanço como a s
outonais. s em lhes faltar a embe lgecão d o alqueive - conv ém, ge ra lmen te, n ã o
se realiz arem n o ced o, antes de março. p or ca u sa das chuvas torr enciais e per sis-
tentes a que muito se a r r isca m entã o. Mas quem precisa de sem ea r p orções d e v u lto
e t em pouca ucharia d e a r a dos. «a vent ur a - s e» à s orte. Se o t empo con vida , la vra
e semeia d esde que m arço s e a proxima atê por abril fo ra, se n ã o en tra por
maio a d ia nte. contand o com as problem áticas chuvas de junho, que fa lh am em
muitos ano s malogeando tota lm ente as eve ntualíssimas sem enteiras de mai o, e
a t é as ao fim d e abril. Ag". pelo S. João, tira azeite e vinho e n ão d á pão,
diziam os anti gos. Há exag ero no dito. As chuvas podem tirar a zeite e vin h o,
mas dã o com certeza muito t rigo tremês e l egu m es.

Trigo ribeiro S emeia-se desde fev ereiro a t é fim de a bril e pr in cípio d e m aio,
segundo o estado do t empo, a qu alidad e das terr a s e a força do
lavrador (1) Quando vai de chuva. suspende-se a sementeira, que só se reata em
seg u r a n d o o tempo - que o sol brilhe no espaço, sem intermit ência s, pondo a
terra enxuta, de modo a lavrar-se «às escancaras» para ficar «co m o um cinzeiro».
N os campos de Elvas e arredores, a cultura extensiva do t rig o ribeiro data
de 1870 a 1873. generalizando-se depois e progressivamente, até há coisa d e 10
ou 1 2 anos, em q u e estacionou, senã o decaiu. Desde que os a d u bos qu ímicos s e
vulgarizaram, demonstra-se que a sua aplicação é proveitosíssima nos trigos
outonais. e de escasso ou nenhum resultad o DO trigo ribeiro de primavera.
Por isso. a predilecção que porventura h ouvesse para este, passou à qu el es.
Sem embargo, ainda se semeia muito trigo ribeiro, maiores porções nos anos e
em que as chuvas obstam à conclusão das s em en tei ra s do outono. Nesses an os
angustiosos. apela-se em última instância para o trigo ribeiro, recurso 6na1 d e
(t) Com.o prunutl ..o ~ oIl.u" .. /urv,.m • • u Uo r lhtlro ..mudo 1.1,1 mudo. de marco i pr~ ...J .m 'lI. t••uJid.Jo p.l.
lo rm. 40 ' •• pude:. COlll. o. oouo, U" J• • P , . 1IIu te lr. do tr l.o dh.lco . &rUio••l.c uat d. do. SQ. d. marco
• • d l.BIc. pr ucJ.Il.d.... d. ' 01l.t".III , Etll.nd.·.. 4 ca a i1un l' 11.10 con . o p.ri,o d. (I.Il.I.nv ju .

- 299 -
ATRAv t S D OS C AM P OS

que se tira ou não partido. segundo a primavera decorre. Calhando com boa
m a r é de sementeira e chovendo em abril. maio e junho não se lhe perde o fe itio.
À s terras ap r op ri a das dão colheitas de ar romba. Mas s e a primavera «dá à
cont ra », que n ão chove ou chuvisce, apen a s, h á sea rinha que n em sequer nasce.
Foi o qu e acontece u em 18% e em 1907.

Grão de bico Lançam-se à t erra em março e abril. Os a n tig os s en te n cia vam


que: grãos em março, nem nascidos n em no saco. Como q u ere n do
d i zer q ue convém s emear em-s e d e 20 de março em dian t e, para n ascerem no
come ço d e abril. Na ac tualidad e observa-se esse preceito. como o te m po vá
enxuto. Chovendo, a s ement eira adia- s e para melhor o ca siã o. Grã os em te rra
enlameada vingam mal o u pe rdem-s e. Sã o legum es m elíndrosos, como po ucos.
Suced e verem-se g r a vança is lind íss imos, e em poucos dias, po r efeito de chuvas
excessivas ou por ventanias d o suão, principiarem a amarel ecer e a cabarem
po r se estragar. E nreivom-se, se gund o a expressão usual.
Outras vezes m ostram-se enfezados, por motivo de estiagem, e, senã o
quando, cai-lhes uma bátega d e água rija, qu e os rejuven esce em dois di a s,
pondo-o s sã os e óti mos. V erittca-s e O prol ôqwio, de qu e : uma boa grav ançad a
está. n o couce de uma trovoa da. Trov oada com ch u vas, mas sem ex a ge r os, com -
preend e-se . Se for a compa nha da de p edr iscc, d esacredi ta-s e o rif ã o.

Chícharos L egume ordinário, q u e pouco se cultiva . e h o j e m enos que outro r a.


Hoje ne m seque r se col h e para o co n s u mo d a r egião. S em eiam -se
em fe vere iro e março, n a s piores te rra s que se destinam a legumes. Tam b ém,
poucos cu ida dos se lh e dispensam, e por isso tudo, d ã o colheita escassa .
À s v ez es nem se col h em. L argam-se a os porcos, lo go que secam as vag es.

feijão frade F azem-s e pequena s sem en tei r as de sequeir o n a s várz eas de t erra s
f resca s, contíguas aos melanciais e m eloais. A o mes m o te m po
que se aman h a a terra para a melancia e melão, prepara-se a do feijoal, que é
semead o depois, a í pe lo S an t o A n t óni o.

S e m e ad as r ec em -n a sc i das

A bo a o u m á n ascen ça d as s ea ras conco r r e im en so para o se u resultado


n n a l. À q ue n a sce s àd ía, a guenta-se com muito s a zares e. em ge r a l. triunfa.
À que vem ra quítica, por melhor q u e o tempo lhe decorra d e futur o, jA m a is se
robu stece.t d o s livros: q uem torto nasce, tarde o u nunca s e en d ireita .
Como o temp o vá amorado e a lavrada esteja e n a corrtae, a se ara temp orã
d o outono, o u a serôdia de p rimavera , principia a a po ntar aos se is ou oito dias
de sem ea d a e daí a dois ou t rês está fo ra t oda, nas cida por co mpleto . S eara q ue
assim co m eça . t raz em ge ra l boa n a s cença. q ue mais r ealça se povoa a terra a
p receito, a creditando o s emea d o r. E então é um regalo a d mir a r -lh e o a specto :

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ATR Avts DOS CAMP O S

1fngua d e pa lmo, cõr a ãdí a, ris onha, a a t es ta r uma pu jança de r e si st ênci a que
enche de gozo o l a vra d or. Vista 8 0 pôr do s ol, d uplica de encanto.
A sea r a serôdia de dezembro e as tempo rãs de primavera, de fevereiro e
março, d emoram a n ascer, e mais, se as u midades esca sseiam e as g eadas aper-
tam. Nestas con d ições, chegam a dem orar 20 dias e a s de dezembro ZS ou 30.
·......... ....... .............. ....... .. .. . ........., .................. .. ....
V enh a com o vier e seja de que temp o fo r , a s ea ra recêm -nascida denun cia
1080 se 6co u va sta ou r ala. be m o u mal repartida . Ligeiros senões, desculpam -se
se m relutância. Aquilo não va i a compasso, n em o o l ho d o homem é mira
infalív el. Mas se os defeitos de s em en t ei r a se de stacam e av olumam, averi-
guam-se-Ihe a s causas. ajuízam-se, e, por fim, a culpa va i a q u em a tem, se o
crítico sabe iulgar.
·.... . . ...... . ...... . .. .... ....... . ...... . . ............. ... . .. . . ... .... ... . .
Toda a seara que nasce encsrreteireds, mostrando-se às faix a s ou ce rretei-
ras, umas com muita semente, outras com p ouca ou nenhuma, desa grada
imenso. quando se observa de caras para o sol. que o defeito se patent eia com
rigorosa nitidez.
Igua l ou pior aspecto a cusam as que se a ssi n a la m por malhas d e nascença
vasta, aos montões, intercaladas por flancos com poucos ou n en hun s p és. D es ta s
s earas diz -se que ficaram abandoadas.
N a s t rigueir as em nascença . também os pássaros causam estragos grandes,
d e péssimo efeito. C oto vi a s, t rigueirões e calhandras - calhandras p ri ncipal-
mente - desgre lam e arra n cam milhares de pés de tri go, deixa ndo a terra
esburacada, a paten te ar a des truíçêc. h )
Enfim, s emeadas recém-nascidas com O peco d e encerreteíredes, abandoadas
ou comidas dos p ássaros, principiam com azar, O qu e já n ão é d e bom e.ugúrio.
E m en da m com o te mpo, a sseveram os sabichõ es, a qu em o prece lço nã o afe cta .
H istória s, replicam os i nter essados, convictos do contrário. E. estes é que ajuí-
z am bem. O s males em q uestão, embora s e atenuem de futuro, à sombra d o
d es en vol v im en to que a s ea r a tom a, nunca s e rem edeiam em absoluto. Sabe-se
que o «p ã o», à medida que afilha e cresce, vai tapando a terra e, assim, oculta
as maselas de s em en t eira e os estragos de nas cença. Mas qu em atravessa uma
folh a em sem elh a ntes condições, e a passeia, reparando, re conhece a cada passo
esses ach a qu es de origem, que de longe se nã o vêem.

R as t l l h agen s

A s sea ras em terrenos entorroados e enchutios, costumam s er passadas ao


restilb o, do primeiro ao segu ndo mês de nascidas, antes de aAuçsrem, co m o
prática vantajosa para o seu desenvolvimento. À rastilhsgem, esha r r u n da o s
h l M. lof u u tt"" nu t..d. . . . o. " ...u.ho. o. a i o n c.... n ... co.o U ~' Ia . t ' o.afd u b.l . 4'o••ri d..d.. d. pún,oa
11'0' .1•• • " d "~U' . d o d••co. ul ooU" .r:..dllà Du c d. "o h· di ..o d <lJ' U11f o ooto.o
• {a u.~o. obn u o .. Ii. boa 'II.U.rio . r.. doi . 00 trh di .. COIlJlt COri ..O. 'P"" •• o. "bu, o lia _II.d o "otel 0 d. j.1to•
..1 0 ...od.·lol oh d61 1.. . 0' ... nu do. d . elu d••

- 301
AT RA v t S DOS C A MP OS

torrões, rompe a crosta da t er r a , e, a par, destro i m u i t a erva, p os to deteriore


alg u n s p és de trigo, o qu e de resto não tem importância . Se a sea r a p eca po r
basta, ma is lhe a pr o veita o rastilho. prin ci p a lm en t e se lhe ch ov e a seguir.
N es te caso, re ceb e um se r vicão, melhora n d c «às bra çadas », como se levass e
u m a sac ha.
À s rastilhasens, n ão CO D vêm. n em se u sam, Da s t erras a lagadiças.

D r en ag en s - V al as - S anj as e sa n g rade l r as

Drenagens P ouco se us am por en quanto. As s em ea d a s em terras baixas, pan -


t a nosas, não sofr er i a m t anto co m o sofrem, s e. em v ez de escoa das
p or v alas, f osse m drenadas a ri gor. Mas comp r eende-se qu e o n ão sejam.
A s dren agens, p or dispen dios as q ue fi ca m, só co m p en sam t a rde, a po der de
sea r a s s ucessi vas e n ão em uma ap enas. A s sim, o lavrad or r endeiro re trai- se,
à míngua d e ca p itais e de est a bili d a d e. R eceia-s e ave ntura r-s e a aman hos
caríssi m os, qu e tanto p odem a proveitar-lhe a el e, com o ao v izinho invej oso e
açamba rcado r, q ue s e em pen h e em emp almar -Ihe a h erdade. H á- os d esse
f eiti o .. .

Val as Antes ou dep ois da sem en te i ra , pro cura-se escoar os t errenos baixios,
por meio d e valas, de diversas dim ensões, a que o vulgo cham a sa nje s
ou san Arsdeiras. Nem sem p r e se conse gue d esaguar suficientemente a seara
co m este preparo, mas nunca deixa de lhe s er p roveitoso e, por vez es, s a t isfa z em
absol uto. A qu estão é a s sa.njas serem em número e em con di çõ es correspon-
dentes à extensão da terra e ao curso e voLume d as á guas .
Desde que t enh am os indispensáveis requisitos, as valas são o s a lv a té ri o de
muitas s earas, que, por certo, morreriam afogadas de inverno, sem esse deriva-
tivo. O pior é qu e t êm de se ren ovar ou r eparar nos fu turos anos, maxime nos
t err en os aren osos, onde s e deterioram e inutilizam, como em nenh uns outros.
A í, uma enxurrada qualquer, en tu lha - as e arra za-as. o u p el o contrário,
escancara -as e afunda- as. tran sformando-as em abismo s. N ão s e dá i sso com
as drena gens, que escoam e esgot a m sem danos nem esto r vo s . ( 1)

o tempo

Qual é o bom tempo para as s ea r a s ? Qual o m a u ? Eis dua s pergun tas a


q u e d ificilm ente se r esponde. O futur o não se a d ivin h a e só o futuro s e ence.r-
Tesa de dem onst ra r depoi s q ual fo i o bom e q ual o mau .
P or bo m tempo. s ob o ponto de vis t a a g rícola, consídera-se : o q u e re clamam
as circ unstâncias d e momento, o que facilita os amanhos culturais, o q u e

h ) À . . . .1.., nDj.. e " "'ultlelru , eO'hIlDlUll . u f. Ita. d• • mptd u.d., POt Lom' ll' do D outo. d.. B.lu A leI., COD.L..~
d do. P OT
Vd . · .. ... ptjial. &8.
.,.=
". l. de/rol . <:lu, d.. prop6.ho .0 AI'Dujo . E.lL uu!m· .. por d lIlI ' U tubalLo., du il. lI O'OllllbTO ai.
f..... u eIro .

- 302 -
A T RAV t S DOS C AM POS

ben e6.cia e a ux i lia a s cu lt ur a s, o que remedeia ou atenua anteriores desmandos


a tm osf éricos, danosos, e, em última análise. o que parecendo mau na oea eí ã c e
depois se re conhe ce que foi bom, por t a lou qual mo tivo. Quanto ao mau,
encont ra -se, é cl aro, na ra z ã o inversa d e tudo i sso.
Se porém fanta siarmos um ano ch eio . d e ótim a produção cerealífera" a
experiên cia l eva - n os a s u p o r , que ne st e ano o t em p o d ecorre o u decorreu com
as fe ições seg u i n t es, apr ôxímadamente: ch uvas abundan t es. desd e o começo do
outono a vin te e tantos de outubro e dias enxutos ou po uco úmidos. po r
n ovembr o fora, at é p rin cípi os de d ezembro. D ep ois, chuva s su ficie n tes antes d o
N atal e. 8 seguir. algumas semanas d e estiag em e g eadas, que podem prolongar-
-se, sem pr ej u íz o, at é fev ereiro. Do meado a fim de f ev ereiro. ág ua s copiosa s
a abastecer em 8 S t erras. Na primeira qu i n zena d e março, t em p o amoru do.
benigno. mais enchutio qu e úmido ; na se gunda, dias enx utos e dia s ch uvosos,
predo minan do 08 primeiro s. Em a bril. água.! mil, coa d as por um cen dil, como
rez a a di tado. ou mais grossiah e e, dispe ns ando coad ouro. T em os agora m a i o,
de dias qu entes e variáveis : ora s ol que desl u mbre, ora nu bla dos e ch uvas.
Em p rincípio d e junho, algu m as chu vas e depois temp o enx uto e fres co. r ela ti -
vame n te, a té meados d e j ulho. Daí em diant e, ca lor inten so por julh o e a gos to
fo ra. sem ch u vas , para o an o f echar com ch av e d e o u r o. ( 1)
P ode haver anos bons, e há- os se m dúvida, que no todo o u em parte s e
desvie m destas n ormas. Mas o s q ue d ecorrem a ssim, são sempre ó ti m os - an os
te mpera dos, abundantes q u e ederam> a fav or, desde o começo até ao fim.
P ena é virem tão poucos desse calibre. Quase se contam como os jubileus.
O s anos, em g era l, ressentem-se de i n ver n i as ou estiagens, s enão ambas o.s
coisas, um a após outra. causando transtornos gr a ves, e, em certas ocasiõ es,
perdas desola doras. «M a n da quem pode» - diz o povo, e o lavrador aguenta.

(t) No• • d" lo . nf.r."tn .. . , ri cultuu .IIClultnlll.-U lIo e~u d. ,..Ior Plr' . , .jolnulD CO III .pros.lmlelo do. (u to r..
IllI1&or01&, lco. qOI COllcorrlm p,u um ho m .ao c" ..ll f..o. C OIl.IAII. u l . qu l o. m ai . (rI,,"U" t...d lll lldo o. q... u fnl i ' ,
ao duouo d. n.u.ti.... l. f·lc. •
.(,vao a O'O .... pud.d.ir". p./o S. M i, 1 . , p" aui....
/<1". d • P orta , .I, lIu lldo 11' trb dd 0t lU 110 N .t.l.
-o
N .tal, "' rv.'l • Phco• ••• c Ill.f.lb ......ll.t. p. u o. I. .. ado rn. q u.. . " . P"" 'o u d. a 11I. .,n o ' p,l o Nu. I,
c:"ou. UIII d. II u t " UII . . .. ; pd . P'aco• • (.~ M I , ,pll' u frellGllIItar • ' 01'"
E. j. od ro . ..olle ' 0 o.. td•• • ,c ° .I. e. 1..,i•• pl .-" • rir: IfI • .,11. 1.., lIu"• • c&o.u.
A a6<l0. de I.a t i.o. a'o tIu o . .. 0 i .. td. o.
Ap. . . . /... dro 6o. " .,r/o. n.... 60111 1I.1I..i•••
1~tiro••/.100 00 tiNIrO.
°
' ,..rd ro " ..cat• • ' u , JI.llo nO "Ol'e".
°
S. ao _cI.lJ.Jcl. .. ch or• • , .11 ia•• • ao lo.,; .. rI.m, c..t. O ''''c.ao ,..tI .ir.
Mueo. "ar ~. , lo . J 1.• • di, Iloolto : li t.ni. , c..a.. J. cio.
R.ao, d .or ado. , o. 1II.I&O..J ol.
AIl.it. " a .. 11111. co.J.. por u ... ulldll.
"" d o pudo . ...a t.,o. lu O .00 /0 '1110'0.
A',... Ju uo.o.du, ..ri• ... .. i,•• r1h.h. d...
VIII' 6o. " ' '' ' " e.d. , ..,,, no co"c, J • ...... tr opo. d• •
A,,,.. no S. /01. , ti..... • i,, &o. u .it•• p'o.
)... 6hl•• parto d u ta .d 'do 1I0da ri. h. t u cn to . am la moo. Ido•• q " l lIdo n a i. un u • cultu ra d o. lTfmuu. Ho l.
d' a.. l al . o, como I' ob" " al lIootrO lu' " .

- 303 -
ATR Av t S DO S CAMPO S

por não ter o u tro rem édio. Por de sabafo faz lamúria, q ue a lás rim a é Ií vre e o
falar de safogo. O que seria dos chour inces, s e não lhe permitissem a lam úria .. .

Anos de estiagens e a n o s d e inver nia D iscr et eia - s e muito sobre quais são
- o s p ícres para a s searas. C o s t u mam
s er os de invernia, a firmam o piniõ es a u t orizad a s. Todavia, os anos que se assi-
nal am por estiag ens medo nhas, num período assás largo, que vá, por ex em plo.
de d ezembro a 6.os de maio, como já se t em vi sto, esses são tan to o u m ais
nocivos que os mveenosos. (s I Fora desta hipótese excepc'io n al ís ai m a , a s s ecas
cons íderam-se prefe ríve is às i nver nas. Sabe tod a a gente do campo, q u e decor-
rem an os que, aí e m m arço , se julg am 8 S sea ras quase p er di d a s por falta de
ág u a, e afina l, u m b el o dia - qua n do meno s se espera - vem a ch u va ap etecida
e tudo s e salva.
N ã o se ca lc u la o regozijo das popu la çõ es rurais ao verem enfim a s am bicio-
n adas chuvas, caindo a potes, a remediarem em absoluto uma seca gra n d e, que
8. t odos preocupava. Ricos e pobres. amos e criados. v elh os e DaVa S, tod os se
alvor atam de alegria e todo s se assomam à rua p ara ver chover for te e firme e
s e regalarem com o suss urre da águ a d os beirais, caindo a jorros so b re a s r- edres
das calçadas.
Lntão o s co mentários cruzam-se de boca em boca. esfuziando ra di a n t es p ela
beleza d o espectáculo:
- «O dia de h oje, não há dinh eiro que o pague .. . Isto é ou ro q ue es tá a
cair . . . Moias e moios que se estão a. fazer l . . . Venha á gua, que D eus dará
I
pão J. . . Olhem como ela cai J. . . Até faz fumo J. . • Já dizia m q u e nã o vin ha ...
A í a tem .. . e a abastecer . .. C h ega às raizes, n ã o há dúvida ... Ve m mes m o
entre março e abril . . . N o ss o S en h or . quan do dá, é sempre em fartur a . . . »
E n treta n to, os assis tentes m en os ent usiastas e m ais p erscrutadores, deixam
de f a lar pa ra sondarem os astros e o ve n t o, com receio de qu e a rega s eja p a ssa-
geir a, de i n su ficien t e d u ração. Saem pois fora, m olham-se por gost o, levan t am
a viseira, investigam do que vai lá p or cima , reparam se bate do travessia, do
pego o u do suão e, p or úl tim o, rec olhem às moradias, de juizo formado sob r e o
qu e está para vir. C omo bispass em sin a is de ág ua , apreg oa-nos co m j úb ilo,
convencidíssimos . Se n otaram o contrário. dizem-no tamb ém e em tom profét ico.
M a l lh es va i, po ré m s e fe r em a nota d o p essimismo. Os optimista s qu e os
ou ve m, sorriem e cb asq u ea m , du vidando. S e não s e i n d ig na m , a co imando as
a gouren t os de m a l a gradecid os , de aboinhas n egras, d esmancha prazer es, q ue
nunca es tão se u sf ei eos :
- «É por iss o que Deus castiga à s vezes» - acresc entam .
E assim se es t abelece larga contro vérsia, com referências vastas a fac tos
su cedidos e. a p a r , um tir oteio de palpites e presságios, que pare ce interminá vel.
.. ...... ... .... ... ... ..... ... .. .. .... ... .... ... .... ... .. .. ..... ... ... .......
(1) Sobu .. utl••• n. proton."d u . q u. utr. jam .:omlll ' U Ill, n u fi . lI ru. " ';.... a par 'tulo U ma u ta em Alorll . du
N otu " Imp ru, lJu la. ut.. mal• • dl. n t e,

- 304-
..
.!::
..'"
....
e
Q.
A TRA v t S D OS C AMP O S

Prosse guindo: dia- s e co m f un d ame n t o que u m a seca r em ede ia -s e em du as


horas d e chuva cert ei ra , a o passo que um a inver na l eva m es es a emen da r ,
quando em en d a . À s mais delas d ã o de r evés dei xa nd o estrago s insan á v eis que
não h á so l que os cu r e.
Em t o do o ca so, s eca ou inver n ia q ue se acen t u e. fa z co m q ue a s po pula -
ções a grícolas se a larmem d e susto, n a persp e ct iv a de falta el e t ra balho e enca-
r eci mento d e gé ner o s . O lav r a d o r n ã o pens a n ou tra coisa. S onha co m o t em p o,
fa la nele a toda g ent e, sonda os a stro s ci n co entn ve zes p or d i a, es pr ei ta o pôr
do 50], ( i) nã o larga de o lh o os ca ta ventos. manda à fava os sinais q ue já nã o
vogam, consulta o se u baró me tro e os alh ei os, com gana de os pa rtir a tod os.
dá 8 0 di abo q ua ntos sara go çano s e bordas de ág ua ex ista m e, por último, apela
para D eus, em r ecu rso supremo, como crente q ue é . • .

Prece s N ão vai lo ng e o tem po em que era cos t u m e celebra rem-se preces pú bli -
cas n a s igrejas, e procissões d e penitência pelas ruas, logo q ue um a
seca o u inv ernia s e to rnava ass ustado ra . P or estiagens, principalm ente.
A ind a em abril de 18%, os povos ate rrados com a h orror osa seca q ue vi nh a
decorre ndo d esd e o N a tal, ac udia m, p ress urosos e contritos, a esses acto s reli -
giosos, a nun ciad o s por dob res de sinos, e celebr a dos com fervor n as cidades,
vilas e aldeias. N a s preces, à bo q uinha da n oite, a s m ultidõ es enchiam os tem-
plos cantando la da i n h a s e benditos, e nas p ro cissões de p en itência , aos do min gos
de tard e, a conconência era também eno rmíssi ma , camin h an d o nu ma ordem de
ser iedad e e compunção s irrgu la r, nunca vista em procissões d e o u tr a orde m .
- «S en h or D eu s, misericó rdial. . .• - b ra d a va o cle ro , de vez em qu ando.
no decurso do t raj ecto . E. o po vo em m a ssa, se cu n da va. tccploraado o auxílio d a
Vi rgem , para que Deus lh e conced esse ág ua por mis ericórdia. Q u antos p ed iam
«miseri cór dia», de lá grim as n os ol h os, como se tivessem p r ati cado um crime
hediond o. a m o ê-los de re mo rsos.
I sto pa ssou-s e em 1896, r ep ito. D e então 'Para cá, no con cel h o d e E I\Tas e
limítrofes, nu n ca mais houve p reces pú b licas n em pr o cissões d e penitên cia,
apesar de t er h avid o invernos e estia gen s.
N os últi mo s 55 anos, as secas ca lamitosas de n efasta memória foram ape-
nas as de 1874, 187$, 1896 e 1907. C om o i n vernias memoráveis, p rej ud ícialts e í-
ma s, registam -se as d e 1&56, 1872, 1876, 1879, 1881, 188.5 ou 1886. 189.5 e 1904.
S obretud o as de 18.56, 1876 e 1881 q ue d eram b ra do e não esq u ecem .
.... . . ... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . - -.' .

Gea das Consi der am -s e úteis para as seara s em d ezemb ro, ja ne iro e parte de
fever ei ro. época em que são in tensíssima s, a po n to de, em mui ta s noi-
tes, a águ a encarame lar e fica r ge la da de uns par a o ut ro s dias. a conten to d a
lt l O op&r <lo ,01. 'Q.cobe rl O'. por 'D.t "11.1.1'1 0. ' n.. .. . UUlt... Ii ' in. 1 d. c.bll. ' . Po o do -u limpo. o u por '"U'
O GU" undu. tu o. , an o tu , d ' ia d lc!o d. t eta po utl o.

- aos -
AT RA v t S DOS CAMPO S

ga.rotad a, que se div erte a par tir o ca r a me lo dos po ços e charco s. A s terra s
tam b ém ape rtam e endurecem p elo mesm o m otivo, dand o Iev ouea difícil. O a rado
entra-lhe a cu s t o e leva nta «t ijolos », q ue- só d enegam em o s o l aquecen d o .
Na s m anhãs de g eadas g r a n d es, a s se mea d a s e os pous ios ofere cem u m
qu adro ac rebilfss tmo, de alvura s evera. m a s g r andio sa e i n co nf u n dível. C am po s
vastos, t r a n s f o r m a d o s em l enço is e lv ís si mos, inco me ns u ráveis, com os «pães» e
ervas hir tas. regeladas pelo f r io da no ite. Tud o está branco. de orelha murc ha,
n um torpor hiber na l que met eria dó se fosse d ura do uro. Q ue não é. sabe-se.
O sol cr iador e ca rinh oso, incu mb e- s e d e d errete r os ge los, r estit u in do aos
campos 8 s ua feição verdejante e so rrid ente . . .
Em fi ns de f ev er eir o e por março fora, a ind a caem ge adas fo rtes, que muito
se rece ia m pelos p r ej u izo s q ue fazem DOS ce nteios e em cul turas d e o utra ordem.

Nevões Passam-se deze n as d e anos sem que s e veja u m de importância na


zo na elvens e e redo ndezas. Q u and o p or acaso neva , muito o u pouco,
esse facto celebra-se como aco n tecime nto se nse cíoaal, q ue todos correm a d is-
fr u ta r . O s la v r a d ores, então, esfreg am as mãos d e contentes. L e m b r am- se q ue
an o de nevão, a no de pão. É adá gio antigo qu e falh a p o u co.

Pedrisco Ca í , freq uentemente, com as trovoadas de p ri mavera . E, às v ezes,


cai em ta l quanti dade e grossura q ue fusti ga e arrasa searas inteiras,
como sucedeu em m aio de 1906.

M on d as (1)

Se os estr umes fer ti li za m o so l o e o seu emprego é de transcendente utili-


dade para a s culturas cerealífe r a s, a s mo n da s co nsideram -se imprescindíveis na
m aioria das searas, como ú n ic o m ei o de as eapu r ge r das ervas noci vas qu e as
gafa m e empolgam.
S ear a por mo ndar em te rra ervei r a, o u s e earragu co m p le t a me n te, o u fi ca,
pe l o menos, em p éssimas co n d i ções de ceífe, e o pouco gt"ão qu e vem a produa ír
s a i mistu rado co m sementes estranhas, que sujam e desvalorizam •
. .. ...................... ........ ... .. ....... ... ... ....... ...... .. .... ......
C o m o a g r a n d e maioria dos labores a grícolas. este de se mondarem as s earas
vem d e t emp o s afastados, quiçá r em o tíssim o s. Uma l ei d e el-re í D . Sebastião
de 1 2 d e fevereiro de 1564, ent r e o utras previd ências, ordenava o s eg ui n t e :

cQue os lav ra dores e o••eare.Iro. ou os ea.e.i r os que .emeaslicm t ri So. cent eio e cevada. o. mo ndauem
n05 mue. de março. ab ril e maio. Il mpa ndo· ol de tod a a erva e mato, e que o mesmo pra d cau em com o.
milhol ao nd . a q ualidade da . terr ... o reque re..e. E . ta beleecl) qae, le o dono ou re ndeiro ti veste ta n tas tu,.,
.emead... que el e e soa famUia as não pudeu cm li mp ar , bu.une pcssoas de fora para o aiodare.m
..... . . .. . .
. . . . . . . . . . . . . .... .
. . . . . . . . . . . . . . . ..
(I ) DucuJI, c:h' III.",·lh.. , m Ctmpo M.Jol I ,n. do'' '' Crtl o que o tl f1IlO pu....... d..... qo,l. 1I0.... 1II0..dU'Ill·'1
n . rdo. 1m qU 'lOdd.d. mult o JlIp.riOI • d. OUln. pl , .. . tI .

- 306 -
ATRAvtS DOS CAMPOS

Se,ue.m-.e • • penas dOI ill.lraC'tore • • que Dio e u .ta braDd ... ubcl'ldo a mu lta de 4.000 reais, u.ás puad• •
lO qoe I.nlue um Illoio de .eau:.clon e a de 2 .000 t e e h ao 4u e la na.." m e DO • . O •• .e.relto. ii! c•• eiro.
cinJam . pagar .U! 1.000 rui. (30$ 000 re h d e hoje)... (Lei de u de fe.erei ro de 1564. Co/eerio de leis e,tra-
. ai . a t,"1 por Duarte N un es de Leio. p arte 4.-, tlt, J6. 0) . fi )

É pois a n ti ga a prá tica das monda s, n ão h á dúvid a. Mas também dev emos
crer que es te uso foss e b a st an t e r estrito outrora e se m o e p wr o que hoje s e lhe
dispensa. A próptia lei citada au toriza a pensa r m os assim.
Desd e q u e se legisl a par a to rn ar obrigatória q ualq u er medi da d e alca n ce e
se comina m p enas severas para os q ue a não cump rem , t emos de admitir qu e
tais medi das estão po uco em u so e tão po uco que, para se ge neralizarem , há q ue
recorrer aos meios coercivos. Que os nossos an t ep a ssa d os não morriam de amo-
res p elas mondas e q ue delas faziam conceitos falsos. demonstram-no à ex ube-
rância certa s m á x im a s de alforge a i n da hoje conhecidas. Exemplo: - Trigo
m ondado. é t rigo com prado. N eg rita, pão que ar rebita. Joio, faz m oia. etc.
O qu e explicado por miudos q ue r dizer: - «Não mondeis, que isso equivale a
com pra r d es a s ea r a . N ã o a limpeis do cisirão, d a n egTÍta e do joi o. que essas
semen tes faz em moia e melhoram o p ã o .. . lO' E aco nselhava m -se absurdos tais,
que só se explicam por igno r ância ou mesq u i nhez J. Qu em se a t r ev eria p re-
o '

sen tem en t e a dar semelhantes conselhos? .. Bem ao inverso, hoj e em dia. a


vantagem das mondas é geralmente reconhe cida e quase todos os a gricu ltor es
mondam o máximo que podem, sem se atemor izarem com a s conseqcecres des -
pesas. C o m o a seara valha e precise, recebe pela certa ess e a lto b eneficio, desd e
que chegue o pessoal e o te m po . O pe ssoal- di ga-se também - escasseia bas-
ta n te em abril e maio dos anos que animam e incitam a desvelos excepcionais
- mon da s morosas, em searas fortes e extensas, para que n ã o há ranchos que
cheg ue m, n em te mpo que sobeje. F altan d o o tempo e o pessoa l. acode..se de
pr efer ên cia às f olh as e to rnas q ue mais precisam, e assim se vai indo, enquanto
as sea ras o permitem, sem estragos de m aior. D ep oi s, em elas espigando, opu-
len tas e r ecos ta da s. como um bosque cerrado. s em se lhe ver palmo de terra, a
mo nda tem de cessa r por inoportuna e perigosa. O s benefícios que daria não
compen sa m os prejuizos q u e ocasiona em tais condições. P a r a a erva se arran-
ca r nessa altura. tem de se estragar e p isar mu i to «pão ...

Mondadeira s Constam de centenas de mulheres e raparigas compondo ranchos


d e 1 2 a 30 pessoas, cada qual governado pela respe ctiva mana-
geire e p or um homem - o gu a r da de herdade, ordinAriamen te. (:1) O s costumes
do ran ch o. as at rib uições do homem e da m en ageiea , bem como ou tros detalh es
corr elat ivos, encontram-se descritos no parágrafo - Mu lheres, na página 90 .
L á se con signa a parolice do mulherio, de mistura com várias notas expansi vas ,
des de as baias estrepitosas ao s t r a n se u n tes q u e se avistam, at é a os inciden t es

fi) Notai ' lr/co'" , do n. A . P u " . I• • ulas a o iOI',ul O !:h, nu.


(I) N u 6nro. d. !.I".. c a .. ol'oxl_Ih d.. d. C .mpo M.lol'. I••bim ••110. npuu . . . .pu.... a .. moad ... d•
• Üh!.U 1'0 . as ••1htru. l. alé a o.... ,..~o. . .. ..c.... i.1II ol1lro' Ir .b.lho• • tricolu .

- 307 -
ATRAV ,t S DO S C A M P OS

cómicos que surgem a toda a hora. A fu ga de um lagarto ou d e uma lebre, o


voo de uma perdiz, o achado de um o u r i ço, a corrida de um ratinho e outras
futilidade s sem elhantes, dão pr et ex t o a pa godes de gargalhad as, s u stos fingidos
e correrias de fuga, que del eitam a s d o ran cho e amofinam o en car r ega d o.
Mas é d a pece. N os trabalhos d o cam po, está s ab ido que as mulheres hão d e
rir, falar e cantar à g ran d e, para dar em rumor de si e para se aliviarem um
nadinha. À s m ondas. então, predispõem-nas a v a le r para g]audios e partidas,
entremeada s por cantorias diversas, das que es tã o na moda . C omo as d eixem,
esque cem 8 enfadarrilh s, q ue por ve n t u r a a s derr eia, e, d e v ez em quando,
armam em reale j os, papa gaio s e rouxinois-em al gazarra reina d i a q u e faria
rir um san t o.
Depois à m er enda e às sestas, h á as patuscadas da rebola , d o salta la uns,
e v árias cabriolas e pi rueta s, e m q ue são im éri ta s as d es carada s e de s temidas.
Retou ça brava, agu il hoad a pelo cenário q u e bril ha em vo lta. En t r e os tri gais
banhado s de luz e p uja ntes de se i va , com o perf ume esto nteante d as flo res,
vend o o s p áss aro s e m idíltos i n disc re tos, po r um a tard e q ue n te , a s m on da deiras
moça s n ã o pode m a l h ea r -se do meio exci tante q ue a s cerca. Sugesti ona das
pelo q ue v êem e o u vem, entr eg am-se à na t u reza em g alas e d ã o 8 0 diab o pai-
x ões, q ue se n ã o ca s am com a verdura d os se us anos, n em co m o a m b ien te q u e
re spi ram . À s ve lh a s, coita das. n ã o se estarrecem com o s nam oros d os pás saro s ,
nem s e e m b ri ag a m com o cheiro da s flo res. M a s t amb ém lh e chegam cócega s
de diz er em coisas, e dize m - nas como sa bem, sem pa pas n a língu a , n em aLgo d ã o
n os o uv idos.
Na s cami nhadas de i d a e regresso, ca da mo n dadeira anna no diap a s ã o q u e
lhe e g r ad a , esq uecendo amarga r as, q ue p or a caso p o ssa te r . As «di verti d as»,
a grada v ê- Ia s e o uv i-las em ma rc ha , d e s ac ho 8 0 o m b ro , com flores s i l v es t r es
n o s ch a pe us, u mas ca n t e n dc as «modas» pr ed ile cta s, d e i n fl ex õ es m elenc ójica s,
caract erist icam ent e a lentej a nas, o ut ras, acom pa n h a n do o coro co m o pa nde i r o
e 85 cas ta nhol as . À a ndare m e a ca ntare m , v en cem as jor n a d as da m anhã e
d a n oite, num a desp reocu pação inf antil e doudef e n te, q u e m ete i n v eja a meio
mund o.

Como se monda e quando A «fol ha" a m ondar «co r r e- se» às pa r celas de


faix a s. que se denominam eitos e q u e s eguem em
dírecçã o «tal h a d a» ao ca p r icho da m ana g ei r a o u do mandant e. Em um eito s e
despachand o, p a s sa-se a out r o e o utros, co m a mane g e i'ra à dir e i ta do :ran ch o e
o encarregado na retag u a rda , o u onde julga melhor, para ns cali z a r e diri gir.
De ch a p éu de homem na ca b eça , em trajes de colorid o s alegr es, a matiza r em
o fund o verde d a s se a r as, d e saias à vontade ou li g adas às pernas, (I) as mulhere s.

h) Ao e..QlnUlIl P' U u m. 'U II . . . b crudd .., .. ftIo nd.ddru .. uIII.I . ..... prh·l.. m.n 'o. 1I,.ndo .. . a l.. h p' m u ,
•• iOnD' do. u /rOo . I,.,. O . ulcon.tu lIl5ua.ou em r ond h õ u de 1I0 1lCO .. oJufau lII o . pl.o ' rOlll . . .al.., 11 q u. o unea conu-
,ltirl . 1II um eu . pr,ull çi o. Aulm IIlUIllO, qll . Ofo. I'ft de IrI,o II. oio tOIDD.ft1 • • old. m po r du clli do. fon!tb.h • pel.
"P" 'lIf' e pu j.n( . d•••,.I.(io

- 308
ATRAvtS DOS CAMP OS

põem -se em linha e de cabeça baixa, algo curvadas, m on d am à m ão ou com


sac h o, o t r igo ou o que r que s eja. À mão simplesmente. na s Iolbn» sujas por
erva s grossas de arranq ue fácil. Ào sacho, sempre que s e q ue ira destr u ir ervas
rasteiras e outras muito radiculadas. Também se adopta o sistema roix to ,
em que or a t r aba lha a sacho, or a a mão, som ente. V a i co mo s e p od e e ca lha,
pelo que a ex periê ncia e as ci rc unstâ ncias aconselham.
D e o rdinário , a erva fica no sítio em que se corta ou arranca. Sendo gr ossa
ou comprida, depõe -se no fundo dos regos, para não estorvar o des envolvi-
mento da seara.
Quando se mondam os centeios da «sarna» de soages q u e os inçam, por
t erem escapado à la vo u r a da sementeira, essas ervas e outras igualmente gros-
sas. que se arrancam então. juntam-se em e lcofas, e, a seguir, despejam-se nas
estradas, penedos e e r rifes próximos, onde murcham e apodrecem. Não se dei-
x am na semeada, porq ue vinga riam de novo se lá continuassem. É facto averi-
guado, desde que o tempo vá úmido e as soa ges sejam m ultas.
. .... . .... . .... . . . . . . . . .. . ........ .. . . . ..... . . . . .. . . . . . . . .. . . .. . .. . .. . .

M onda-se em diferentes épocas, conforme a espécie e o adiantamento da


seara. As de centeio vão a efeito em primeiro [ugu r, desde dezembro a té fe ve -
reiro. Em geral, não passam de mondas Iigeiras, limitadas a o arranque de
.!oaSes, sara magos, tremoços bravos e cisírõo.
À.s searas de cevada , d ã-se-Ihes «um a passag eme, como às de centeio, aí por
feve reiro a ma rço. D a s de aveia, quase nada se quer saber. Quando muito.
tiram-se-Ihe por alto algumas ervas maiores. O seu fraco rendimento não con-
vida 8 despesas de por aí além.
Te m os agora os trigos, de primacial importância em qualidade e quantidade,
que, por isso mesmo, recebem mo ndas escrupulosas e caras. Àlguns precisam
monda r-se d uas vez es, ta l é a q uantidade de e rvas que os sujam, tanto ren o vam
elas e tantas nascem e medram, até a se ara se pôr em borracha, a querer espi-
ga r. A primeira m o n da - que tem por objectivo principal destruir as ervas
t emporãs - realiza-se quando o trigo principia a tapar a terra. À segunda e
definitiva, tem lugar de março em diante e é feita com maior atenção, para
extinçar quanto possível toda a vegetação prejudicial.

Ervas que se destro em Torna-se difícil enumerar todas, mormente as que


se confundem e baralham n a multidão do anon i-
mato. ( I ) D a s classi6 cadas na flo ra popular da região, l em b ra m-n os as seg uintes:
tremoços bra'vos, saram agos, r ín cbões, aoages, língua de vaca, melvss, or t igões,
pampilr os, alabaças, joio, cisírõo, n es rita, cardos (numerosas varie dades), mar-
gaça, rabo de gato. palanqu.e, t oiceitss, espargos, côngitas , trevo, papoila, unh a-
-8ata, almeirões, ervas, Eadagosas, bredos, mentrestos, meimendro, figu.eiras
(I) GTuwI. ,&lU 11111 cnll . illd....i o ti ... d • .,Uiu( 10 upc dfiu . Co.lIccc._u ... 1. cl ...lfi.. (1 0 CO ll UUll lc n .....
d. {mu.

309
ATRA v tS D OS CAMPO S

doidas. erva agulha, galarit os. diabelh s, azedas, set as, espa dan a, olho de mocho
e muitas mais de som en o s importância . D e entre as referidas, vale a pena co n -
sig n a r certas particularidades das que de preferência se mondam. Vejamos i sso:

Malvas Erva grossa, vulge-ríasime. Contudo, apenas se encontra nos terrenos


estrumados, como «b afos» de monte. m alh ad ios de ga d o, roc isde»
de p orcos, etc.
Onde apare cem. n ão es capam à monda. E co n vém e erencerem-se em no vas,
ain da pequenas. Do contrário, cres cem e enraízam imenso, custando a colhe-
rem-se.

Tremoços bravos Criam-se principalmente na s s em ea da s em terras mu ito


«feit as», nas q u ei m a d as d e r a st olhice s. Imp õ e-se a sua
extin ção p ara fa cili t a r a ceifa .

O r t ig õ e s
Como a s malvas, d ão -se u n i camen te nas t erra s d e qu e s e d iz serem
u m ebo l c de esterco ». O s o rtig ê es co s t u m a m cr ia r -se n o s ee rn eir os»
muito vastos. Formam cardumes de pés m i u din hos, que picam CO InO ve spas em
s e lh es tocando. eTê m pico s..., 'não h á dú vida. As m ondadeiras que o digam.
Muitas d elas. pa ra os co lhere m , em b r u lh a m a s mãos em tr apos o u n o a v en ta l.

Cisirão É a er ví lhaca, em diferente s va r i ed a d es . O d e mai or cres cença


t r ep a e e n l eia - s e pelo trig o, centeio o u ce va d a. Se n ã o se destro i em
p equeno, assenhor eia-se da sea r a e estraga-a.

Cardos Criam-se muitíssimos. d e gé neros diversos : ca r do mans o, a provei-


h)
t a do e a preciado enquanto te n ro, para m istura nas olh as de legum es ;
cardo sento, qu e os antig os preconiz av am para tis a n a s ; cardo berreiro, d e q ue
a s bestas gos tam bas tante ; cardo leiteiro, cuja flo r se a p a n h a e v ende por b o m
preço, para co á gulo d o l ei te, m as r ar is aimo em sea r as, p o r s e cria r d e p r efe rê n -
cia em terrenos arrifosos ; cardo d e alcac h ofras, ~igantesco, d e folhas l a rg uíssi -
mas, próprio das t erras boas e úm ida s, à margem da s aa rrjas e r i b eiros.
E, finalmente, muitos outros, sem cle eeífi cec ão própria , que infestam o s terren o s
de toda a ordem. A' ex cepção dos q ue fic a m peq uen i nos, quase inofensi v os p ara
as searas, e que p or i sso s e de ixam vingar, to do s mais s e corta m a s ach o ,
in cl u in d o o s mansos e os burreiros, q u e sobej a m da p ro cura para gen te e b es ta s.

Joio Cresce ba st a n t e. e, de começo. a s pe ss oas i n ex p erien tes di stinguem-no


mal do trigo, centeio e ce va d a. Prejudica p ouco, mas arranca- s e com in te-
res se por causa da semente, qu e n ã o sai do arneiro e, por co n seg u i n t e, desva-
loriza o ceree l.

• (t) Tcn ,uri11•• ,. r1.•••• ·I.... tia c•• po M . ior.

- 310 -
ATR.A v t S DOS C A M P OS

Negrita Está DO caso do joio. Tem de se destruir pata evitar a semente, aind a
assi m, menos de te m er que a do j oi o . A negrita j c eíra-se com facili-
da de. po r ser miudinha e negra como g rã os de p ólvora grossa .

Margaça D e to das a s ervas daninhas é a q u e apar ece em maior quantidade e a


ma is dif ícil d e se matar em nova, te n d o ainda o centra de renova r
fàcilm ente. d esde q u e a terr a lhe se ja eca roãv ele e o tempo decorra chuvoso.
Tanta margaça, vi ng a em alguns a n os, q ue chega a ab afar a s ea ra, de mod o
que o u tem de ser mondada à custa d e muito dinheiro. ou a seara perde-se
quase toda, dando ceifa p éssima . Às flo r es da margaçs confundem-s e com os
malmequer es b r a n co s, mas mais p equenos.

Pampilros Malmequ er a m a r elo, mais avan ta jado q u e a marga ça . Mas cri a m - s e


e m mui to me n or cruan tidad e.

Soages Ervas qu e a parecem em ab un dâ ncia. logo às ág uas novas e q u e se


caracteriz am por folhas larg as. p eluda s. q ue se a lastram p el a t erra.
até espig arem em m arço. dando flo res r oxas, conhecidas por ch ups- m eis.
Nos anos em qu e chove b em nos m eses d e s et embro e out ubro. as s cag es
cobrem int eiramente os a lque iv es dos terrenos a r en osos. E. posto a s lavr a das d e
sementei ra inutilizem m uitíssim as, vin gam a inda em p ercentagem s uficiente
para se con sidera r em uma p r ag a. S ã o de teme r, e como ta is se co rta m a s acho,
com r elativa faêiüelade. E nqu anto pequenas, u sa-s e retirá ..l as p ara fo r a d as
semeadas. aG m d e n ã o pegarem d e n ov o, como já di ss e noutr o lugar.

Saramagos Pela ép oca em que m ais n ascem. pe la «r oda» que tô mam e pela
quantidade em que a p ar ecem, têm cer ta a nalo gia co m as s oag ee,
posto sej a m menos danos os e m consequência de espigare m ced o e secarem logo.
Mas ant es d e espigarem, a lastr a m-se m u i to, o qu e imp õe a sua d estrui ção.
Mondam-se fà cil m en te, em ' v ir t u de d e v eg et a r em e cres cer em no ou tono e n o
invern o, q ua ndo as searas estão cu rtas.

Papoila E.rva d e p rim ave ra muito con hecida , q u e se cria em g r ande qu a nti-
dade Das te rra s efei tas.- to do s os an os . N estas. dá que faz er e nunca
se extingue de todo, p or ma is «catada.- que seja .

Rabo de gato Enq u a n to no vo , ap aren ta s emelha nças co m a s ea r a, p osto l he


sobejem ca r act erísticos para se distinguir de longe . S ó se cria
nas terras baixas e ú mi das. Cresce i men so. tanto ou mais q u e o t rigo. A espiga
é parecidíssima co m a d a alpista .

Lingua de vaca Nas folhas e na Ilor, pare ce-se com a s soages, embora al a str e
menos e demore bastante a desenvolver-se e a florir. Dá-se
nas terras cele âre es e na s várzeas de chão. espiga n do em abr il e maio. Corta-se

-- 311 -
ATRAvt S DO S C A M P OS

a sa cho e n ã o se a rran ca em abso l uto po r t er r aí zes prof u n d issima s, que só uma


s u rri ba pode dest r u ir. E m esmo a ssim, a ex ti nção é t empo r ér ia.

Pal an qu e À ssemelha-se ao r abo de 8ato~ a t é espiga r. D epo is mu d a de a s p ecto,


parece ndo- se co m a avei a , p or botar espiga d e ban deira. N a s see ees
po uco aparece . dando -se de p refer ên ci a nos a r r if es. M as esse po uco n ã o escap a
à m onda. para se evitar o mau efei to que prod uz.

A labaças Dão-se n as terras «fria s». baixa s e «d e corpo• . Cortam -se a sacho.
superficialmente. por terem raizame va sto e profu ndo.

T re vo Cria-se nas terras m ui to boas e úmidas. Em geral most ra -se viçoso e


va s to , de modo q ue se não s e atranca, galg8 a seara, passa-lhe adiante
e d est ec i-a . Um a v e z colhido, exala a ro m a a gr a d a bilíssi mo .

Rin ch õ es Erva grossa, raleirona, que t o m a g r a n d e desenvolv imento aí: por


março e abril. Vai fora, pelo mau efeito q ue pro duz.

Espa rgos Pela su a enormíssima qu antidade, ser iam temíveis nas searas dos
barros, se os espergueiros os não dizimassem em pequenos, para os
irem ven d er a Elvas e Badajoz, o n d e realm ente os vendem por bom preço.
A ssim, quando ch ega a monda. na primavera, já muitíssimos estão colh idos;
errem-s e, porém, tantos, q ue ainda escapam bastantes à monda e aos esps r ..
aueiros.
N os camp os d o co ncelho d e Elvas criam- s e « esp o n tâ nea m en t e», e muito
dua s qualidad es d e es pa rgos. Assim. nos e rrifes e po:r en tre os montes de pene -
d os d os terreno s arenosos, d ã o-se os espargos «brancos », qu e mais propriamente
se d eviam cha ma r verd es. V êm cedo . l ogo em novembro o u a n t es, em seguida
à s «ág uas nova s». Mais tarde, nas terras fo r tes. na scem os outros. os epcetos»,
dando-se de preferência na s semeadas. Sã o estes os que inçam a s campinas dos
barro s e o s que abastecem os m ercados das po voações. «B r a n cos e p retos» apre-
ciam-se muito n o p r i ncípio da ép o ca . O s eb ran cose n ão se mondare, por veg e-
tarem no s e ertfes, onde n ã o faz em dano à se ara .

Côngitas V egetam à s ceb oleiras o u moita s. e les t ea n d o - se de inverno para


crescerem e espigarem a os cac hos n a primavera . A monda só as
d estr ói superficialmente. em virtude d o seu raizame vasto e res istente. Para se
perderem de todo e nã o renova rem por alguns anos, seria nec essá.rio s u r ri b a r
a terra.

Alm eirõ es Crescem DO fim da primavera. deitando r a i z es comprida s, q ue n ão


cedem à mão nem ao sacho . Querendo·se acabar com eles, por
algum te m po, há q ue de st~i-los a enxadão, qu a n d o a te rra se prepa ra do
a lq uei ve, o u no fi m do verão, n a s vésp eras da se me nte ira.

- 312 -
ATRAv t S D O S CAMPO S

Unha-gata Caract eriza -s e po r ser es pinhosa, vir ta r de e criar-se n a s terras bai-


xas p ró pr ias pa ra trigo. Era alg uns sítios é m ai s que a seara. M a s
ainda q ue seja pouca, tem de se mond ar , para não transtor nar a ceifa.

Bredos ou e r vas fad a gosa s Conhecem-se pela cor ve rde-cinzen to e roxeada


das fo lhas . Em espigando e que s e lhes toque,
la rgam um visco verdoso d e ch ei ro e aspecto desagradáve l. N as cem d o meado
de abril em diante, por en t re os tri gos rib eiros e o s legumes das me lhores ter r a s .
M uitos tr igo s tremes es e grãos de bico s afam-se de bredos, sendo necessário
destrui- los 8 sacho, enquanto novo s, para a seara t riunfar ele s emelhan te p este.

A pers p ec tiva da s se ar as

N o longo períod o que vai de o u t u b ro , n ovembro e dezembro at é à colheita


em maio, junho e julho, as searas varia m d e perspect iva e passam por diferen-
tes fas es, atravé s de perigos e vicissitudes, de que triunfam ou não, mais por
capricho insondável da N a t u r ez a , d o qu e pe la acção do homem . O s cu i d a d o s
do a gri cultor, por m a i o r es q ue sejam, reduzem - se u pouco, se forças s ob r en a t u -
rais não regul arem a marcha do t em po . consoante as n eces s ida d es das cultu ras.
E m regra , o tempo é um dos principais f actores do bom ou mau resultado.
Sabe isso t oda a ge n t e, q ue não v ive de fan tasia s.

As pec t o s e impr essõ e s

D ep ois da na s cença, as s ea r a s m ostram o q ue já d isse no artigo Semeadas


rec ém- nascidas. A specto lind íssimo. a s b oa s; det estável, as ruin s. Das im p r es-
sões q u e deixam ao obs ervador, avalia - se pel o s co m en tários que ele lh es fa z ·
Às bo as, g a ba-as. di zendo : - «T r a z ca ra d e jeito . . . ca lh o u co m a maré . .. dá
es per a n ça s ... Vem g os to s a de terra s a di a ... N ão fa lhou um bago . . . E que
bem n a s cid o s 1. . . repartido s a precei to Com cada língua, que é uma beleza ...
Verão -na p a m p ula r , se não tiv er a lgum tope ».
D a s más, obser va : - «M ala cara t r az I . .. Parece que tem febre ... E a lín -
g ua ? . . que 6ninha, que en ganida . . . Amarela como a ça f r ã o ... Se não s e
en direita, dá catanada . . . S e isto der abono, s erá de uma cria tura se ben zer . . . »
P eca n d o por ralas, diz-se : - aFaltaram-Ihe com a sem ente . . . o u levou-lha
o ven t o .. . P o d ia com o dobro . . . C omo a chuva lhe casque a f og a- s e em erva .. .
E sca pará , se o inverno não apertar .. . qu e afilh e à v ontade . . . que bote boa
es piga Mas começa ma l, com tanta t err a às cotovias . .. com mau sem-
ble nte .
P a r a a s vastas também não faltam r eparos : - «E.s tá clteg e dí nh.e .. , D eita-
r a m - lh o ós pun h a d o s, s em dó .. . É com o cabelo em cão . .. N ã o traz frio .
P or a go r a n ã o parece m a L . . D e po is é q ue são elas . .. Em espigando se verá .
espigu in ha s f racas , das ta is, q ue tr ês n ão fazem uma .. . E. n fi m , a erva, e m q ue

- 313 -
A T RA v t S D OS C AMPO S

queira vir, n a c t em pOI onele . . . Ma s se f or ano dela , s em pre h á-de Iure r . . •


É 61ha da terra I. .. •
... . . .. . ..... . ... . ... . ... . . . . . . . . ... . . . ... . .. . . . ......... . . .. . . ..... . . . . ...
À s searas o uto na is, como 8 S pu x e um t em po amen o e ú mid o. d esen vo l-
vem -se muito em começo e at é em demasi a , às ve z es. Os t rigo s e a s cevadas
ar ri sca m-se a aca mar e em pa n ca rem , a inda em erva , a podrecend o, I t ) e o centeio
a es piga r cedo d e m ai s, correndo O pe ri go eminente de se r cr es ta do p elas geadas
d e março e a b ril. S e porém d e co meço p r edo m i n a o t em po f rio e seco. as searas
acanh am-se, s umin do-se. p OI a ssim dizer. Algumas, o bse rv a das d e long e, só a
terra s e l he s de sco bre, mais par ecendo alquei ves em bra n co do q ue se mea das
co m doi s m eses d e nascidas. «Não t êm vis ta », n o diz er d o povo. Mas a es t e co n -
ce i to , apar en temen t e d esanim ador, s egue-se em r egra a adv er t ência d o - «Dei -
x em q ue elas d es pertarã o .. . » E a seg uir e p a r a r efo rço, cita-s e o prc l óq uio
o ti m is ta q ue diz: E m janeiro sob e o u outeir o: se o vires luzir. põe-te a rir;
se verde jar, d esata a chorar. Há exage r o n o r ifão . É t oda via ce rto q u e se chove
e m fe vereiro. de p oi s de u m a s eca d em o rad a, a s sea ras a d q uirem to d o o vi gor de
que p r eci sa m, n ada sofrendo com o a t r aso a n terior. M elh o r é a tra s arem- se em
janeiro, numa apar ente l etarg ia, conseq uê nci a d e tem p o enxuto e frio, do q u e
inundare m- se d e água a jorros e p erma n ecer em al ga da s por se ma n a s . C om
á gua em d ema si a, a s s ea ras 6t imas e boas, pod em por ventura aguentar-se se m
g ra ndes d an os, mas a s sofrív eis, medíocres e o r diná rias, amarelecem e definham ..
es t ra ga n do- s e imenso . É q ue a n ódoa de janeiro, n ão tira o ano inteiro. D ep ois
d e janeiro, a s n ódoas resu l ta n tes d e umi dad es ex ces sivas são m eno s da n osas,
m as tamb ém cu s ta m a ap agar.

De fevereiro a meados de março Nesta q u a d ra , m al vai à seara o uton a l q ue


não t a p e a te rra , a lastrando-se verd e e
viçosa. O s t rigos já entã o dev em estar sderreiedos, a cevad a slerreied« o u a
desi~ualar e o centeio a encanar, s en ã o em borracha ou es pigado , em r is co d e
se p erder co m as geadas, p erigo q u e s u bs iste por muito te m po, a té a gra da
realizar- se. (d À aveia . por via d e r egra, conti n u a aca n ha d ita, «aga r ra d a à t erra »,

CIl H' do i. r u :uu o. p.n . . . .iI.r qUi • ' U fA 10 lllbc • • c..... 10' 0 DO ud o. elD nu do de ee.... Ul t.. d. ~ lIun.,..
r; P" 'O .=bo. taoh.elD o. 1111. perl.o. c io coo ...o ica tn , dio r ....h . do 6 tf mo••I' um ....., u . U m do. uc..n o. coa . l. t • ••
metu ' Ido II . " . 1'1 pu. lh.e cOlD U e lD o folhldo IlD u: cc" o • re c...r"", · ... . N ute prop,hlt o, o I• .".doc . ... ah"'. · •• • la u o.
d.. , lr·lh • •.,0 n b.abo d i , . d o lDludo (c . bu . o u bo rn, o, ) ou mI l. d úzl . d I r .... bo ..ID" m l ' u • . l. po r l ' d l l....ndn o•
• I'llml ll • r o, u . 1lO I q..l10, laq U. DtO Ih. pl nc. q u. a io nU."1II d. ..n • • . O outro ..".io i du polltu I .nn II. ' olu, .01'1. .. •
do·1h1 . 6 .. po at.. d o ,.fooloo. co.." o cu ldl d o pn d . o, o q UI • t01"D. dl.p udlo.o I d. mo n d o. M.. tal..r 1"0 u j. llre·
fnl...1 do q Ui m un t a i . fo lh ... . O ,.do u.."pu upulDh• • alo 1'0;. Ipca.. o . pi o_ 10rlC, m. l. n ri lc l do • tombar.
PIlo coa t .hlo. COmi oadl Ih . 'PU'CI• •Im po .. par o fraeo . D.m - c. lt l, . .. e e fo rl'. A d • • di r q UI o 'Ido • • •rr.·., d. pu·
fu l erl. II. pnu d i ...n mca o. d..,a..ol ..ld• •
Com o qun qo l u jl . por m.lo d . folu. 00 • d'Dta di t u .., pode co a u.ui.·., o qUi te p.ulad• • a io .. . bull ndo e
h"lndo • •o rll di d . o de poi• • • pll. o dUPODII . S. porim • .,u. fica. uc o .d. o.. n ... a. no d cm ui • • a io 110.. ch our I
tempo d i rnlo ..ar erdac.. em t.rtIlo•• o .uulrldo .atio i dUlluo,o, mult o pl ot do qUI .,rh •• Dl o ho u"' '''1 u i
Il mb ra a , •.
(I) A. lIu l'ld... ' nd.., . co lllplnh.d .. d. U OtO no tdU' I. au Dolt ll d. l....nir o. 11I"'0 ••brll cru U m cOm u I la f'lI·
.ill. d. o. uoteio. IIpl,.do. I ' m .cbor.. , q"l chl'. m • pu der . u . foU.... hUllt ll .

- 314 -
ATRAvts DOS CAMPOS

para dormir até abril. Mas a que está excepcionalmente boa, desperta também
e «n ã o se agacha» à cevada. .
Se neste período se acentua uma estiagem rigorosa, as favas sofrem mui-
tíssimo, os trigos ressentem-se, o centeio aguça e toma cor cinzenta, a cevada
seca-se-lhe a folha e a aveia põe-se roxa. Como. porém. lhes chova a tempo,
tudo se remedeia. Mas se lhes não chove de pronto, apanham peco considerá-
vel, sobretudo o centeio, a cevada e as favas . Os trigos ainda se aguentam por
uns dias mais sem prejuízo de maior.

Por ma rço fora Do meado d e março em diante, as se ar as acentuam o que


podem ser e o que deverão dar. Como o temp o lhes decorra.
a favor. as boas pulam de dia para dia a afilharem e cr escerem. Quanto mai s
medram, melhores parecem e mais animam . Quem as vê a ssim, viçosas e s ã s,
ex cla m a encantado : - «B en z a -te Deus I Não se lhe vê palmo d e terra ...
De verde que está, negreja. ... E toda parelha ... sem m orredouros n em ma ze-
la s I. . . Que nebrezía / .. . Põe marco, se for à va nte ... »
À s medíocres «fazem - se» menos, ou por out r a , demoram a desenv olver-se.
Mas se o tempo a s ajuda, lá se vão «com pon d o» d evagar, emendando-se de
ligeiros a chaques. Mas deste feitio, os otimistas campónios dizem: -
Escapa ... Há pior... Afilhou pouco mas vai engrossando.. . Outras d e fama
darão menos.. . E' questão d e grada » Os pessimistas afinam em tom op os to ,
com en ta n d o : - «H u m ! Não mostra ca ra de jeito... E' um a s ea ri ta . .. À gora
em erva, índa apare ce Mas depois, em se cando, fica por metade. .. Onde não
vi res força, não tires sangue. . .•
... .... . .. .... ..... .. . .... ... . .... ... .. . . ... .... . . . . . . .. ... . .............. . . .
Às s ea r as ruins de nascença não costumam melhorar com o de corre r d os
dias e meses, antes, em regra, vão progressivamente ace ntua ndo a su a inferio-
ridade de origem, desvanecendo ilusões que porventura possa ha ver. Quem a s
observa atentamente, define-as com este frasead o: «I h, que mis éria I.. . Um dó
de alma 1. . . O paizinho só .. . enganído e amargurado J•• • Amarel o, como
cidra 1.. . Filhos, vi ste-os Não vale um ciga rr o Em lhe vindo uns sois, a
erv a a bafa- a . . . Nem mere ce monda . .. Que espeto I .
. ........... . .... . .... . .. . . . . . . . . . . ... . . . . . .. .... . . . . . . .... . . . .. . . . . ... . . . . .

Entre março e abril EJ a época em que os favaís estão em flor, já sachados.


Pouco tardará que não mostrem vagens. e, a par, o
companheiro do estilo, o negr egado piolho. Em que tenham pouco, t êm-no
quase sempre e em quantidade nociva .
Neste meio tempo mal aparecem os grã os de bi co temporões. Os s erôdi os
ainda estão no saco ou enterrados na terra.
As searas de rrigos e outros cereais continuam cr es ce n do, so b o influxo do
tempo e as condições do solo e do amanho. Ume s, estão já montadas, de sde
março; outras, recebem agora esse benefício o u r ecebê...l o..ão dep ois, quando

- 31 5 -
ATRAvt S DO S C AMPOS

lhes chegue a ve z e a oportunidade. Quanto mais depressa o re ceberem . m ais o


agradecerão.

o ramo nas searas Entre março e abril costuma cair o ch a m a d o d om in g o de


Ram os. Vem pois a propósito registar o costume d e se
«pôr o r am o » n as se aras, durante o referido domingo. C om efeito, lavradores,
sea r ei ro s e criados de pensão, alcan çam ramos de alecr im. benzido na igreja
pa r oq ui a l, por oc asião d a missa do dia , e com eles compõem e ornamentam
cruzes, em h a stes de cana, que mandam ou vão colocar logo em qual qu er árv ore.
muro ou pen ed o que d efronte com a seara. As sim. a see re fi ca entregue à pro-
t ecç ã o de D eus, que a far á m edrar e produzir. E', pelo menos, esse o objectivo
d os cre ntes e d o uso em q u es t ão. ..
O a ct o de «pôr o ramo » d á pretex t o a p assei o s e visitas às s eara s, tanto
do s do n os co m o d os f a milia res e a m ig os. prin cipalm ente s e o tem p o convida
com um s ol p rima veril e cria do r. Se chove, esfria o entusia smo. mas as cr u z es
s em p re s e põ em . E co m m a i o r f é: Ramos mollmdos, ramos melh orados. ..

Em abril D o co m eço de abr il em di a n te, os trigos d o outono estã o «em borra-


cb .a», a q ue re r em es p igar, o u já espi gados. Pela cor e I clhedc, a cusa m
à légua a variedade q ue re pres entara, ac ent u a n d o se pertencem a o grupo d os rijos
o u ao dos m oles. :Os r ij os d eitam es pig a s d e p'ragena , (de cor preta em a lg uns )
mai ores que as d o s mo les. N est es a s espigas s ã o meno s aparanto sas e as de certas
castas nem n r a ga n a p o ssu em. M a s fund em melhor que o s ri jo s, e, em verdes, são
t ã o lind o s ou mais.
R ij o s e mo les. como estej a m bo n s, o stentam em a br il u m a p u jança de
v ege tação sobe r ba e lux u r ia n t e. Filh os va s tos. de h a st es com p rid as. co m folhas
larga s pe ndentes, ex ubera ntes d e se i va , a tocar em-s e de leve, a o so p ro d o vent o.
num m u r mú r io constante, q ue r ecorda o marulhar da s o n d a s em h oras de
bo n ança .
. . .... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . .. . . . . ...... .. . .. . .. . . .......
N a ú ltima qu adra de abril os centeios e as ce vada s com pletam o d es envol-
vimento e p assa m a v ias d e gra da . O s centeios destacam-se por a ltu r a s'in gu lar,
muito s u pe rior à d o s outros ce re a is. À s sua s espi ga s. est r ei tas e co mp r ida s,
chega-lhes em:6 m a maré d e ebnirem em pendã o. Entram p or co ns eg u in te n a
chora, pe río do crítico da f rase fe cund a n t e. s uj eita a g ran des prejuí zo s, por
excessos de f r io o u d e chu v a . •
Ap ó s a chore, os bagos dese nvolve m -se e a grada efectua-se. A s r ola s apa-
-recem a a n u n ciá -l a , in vad ind o as ce n tieiras, onde passam a encher o papo e onde
estacionam de preferência a t é emigrarem em a gosto. E por lá se entretêm e
nid íficam, a esvoaçarem aos bandos e em caseis, de penedo em penedo, de
azinh eira em azinheira, baixando e levantando para comerem e a n u lh a r em .. .
N a quadra em que as rolas chegam, as se aras acusam contrastes fris antíssi-

- 316-
ATRAVeS DOS CAMPOS

m os. Há-as de h a stes comprida s e de hastes cu rtas, fortes e fracas, limpas e


s u jas, sàdias e doe ntes. Há de tudo : õ tim as, sofríveis, más e péssimas. (I)
As ótimas deslumbram toda a ge nte que 8 S olba 8 preceit o. O s lavradores..
então, en altecem-nas com exp r essões típica , assás Iisonge'iras e - «Q ue searão 1. ..
Parece um x a r e l fe chado... um bosqu e l . .. U m a pessoa den tro n ã o te m por
onde fu rar... M a l empregado , se ac ama . . . Q uase q ue ta pa um homem a ca valo...
Belal ... Vejam - lhe as espigas. . . às vinte em cada pé 1. .. E. farfa lh udas.. . de
palmo e meio .. • E J de Se lhe tiraI o chape u I Se acabar com bem. descose-se com
vinte sementes o u mais. .. trinta, t alvez Sabe-se lá quantas l. .. Muitas, pelo
segure...
Às searas ruins também são julgadas pelos profissionais e curiosos que as
encaram . Eis as sentenças da praxe: - .Vê-se que não emendou Cad a v ez,
pior . . . A erva abafa -a toda .. . O que não morreu, mirrou-se Tem os pés
enfezados. .. [evere ntos, de espige inb as amarguradas... Metade falhas .
E a respeito de pal ha , está ó consoante com o grão . . . nem palha. nem grão .
Em elas n ã o presta nd o, funde m menos do que se cuida I.. . »

Uma seca e m a b r i l Quando o mês de abril se assinala por estiagem ri gor osa,
que se vem a6.rmando de sde fevereiro, essa estia gem
escangalha os trigos, cevadas e aveias. Não é um desastre brusco e irremediável.
Mas é um contratempo temível, de processo lento, que, protelando-se por sema-
nas. agrava a s it u a çã o dia a dia. até estragar «fol h a s» inteiras, antes viçosas e
Iind...
T r igos ou o que seja de cer ea is , a cusam falta de chuvas, tomando cor cin-
zenta, pela crescença do dia, a exibirem folha murcha, de «o r el h a ce íde e, mal
enca ra dos. «Põem-se patetas», e dá dó vê-los. Sem embargo, ainda esperam e
ainda se aguentam. Tan to, que de manhãzinha cedo, com as orvalhadas da
ms rezie, r ea dq u i r em o primitivo vigor e [escura, para o perderem de novo. à s
primei ras résteas de sol erguido e às rajadas e coute ntes do vento suão, que em
geral assopra, nesses períodos estiolantes e calamitosos.
A despeito de tais asares, s e a certa altura as chuvas vêm em abundân-
da. regando a fartar, os danos são fracos ou n u los. remediando-se em absoluto.
Mas se a estiagem pr-eaiste na sua marcha destruidora, as searas pioram às
braçadas e agonizam sedentas, morrendo às nódoas. Enquanto que nuns sítios
o prejuizo é total e irremediável, noutros manifesta-se menos, por serem terras
de resistência , que a inda conservam algum sangue.
..... .. . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . .. . . . .. . . . . . . . . . . . ... . .. . . . . . . . . . .. . ... . . . . . . ...
Ent retanto, os dias võo passando. O sol que ima, lembrando agosto, o vento
continua a s çouta r e a seca completa a sua obra ru inosa. tisnando searas boas e más,
sem distinção de vales n em outeiros. Apenas resistem as baixas de algum v er-

h J N •• dI....d••• Ill.' 1.0111. II' _ p u . p.r ' lIupc lio , "u'" """ ••lton po.. ~" . eo• • a o, . .. .. ",I.." r. ....' ....
nupÜ••• I. ''''1' ..
nh. uu.. 1.0&1. ola d..... , .... 6 ="'0 u dll.d d INi=o .

- 317 -
A TR A v t S D O S C AMPO S

gel muito fres ca I. Mas isto é n a da comparad o co m a q ua n ti dad e e imp o rt â n cia


das se a ra s q ue se ato r d oam e torram. E stas, embora em maio lhes ch o va , não
h á chuva s q u e a s sal v e. Só o ce n t ei o escapa, s e esca p a , em r azã o do s eu ant er io r
d es en vol viment o. T u do m ais q ue n ão seja centeio, ag o niza e m orre f atalmente,
à m íng u a de umida de s, n u ma des olação tr em enda e pa vorosa f. "
.. ... .... ........... ... ... ... .. . ..... ... ... ... .. ... ... . .... ..... ... ..... .. ..
E m maio P el o decurso de maio, d esva nece m -se a s dú vidas q u e por a ca s o r es-
t em sob re o próximo r esultad o d a s sear a s. À s bo as. só calamidades
mui t o d esa strosa s a s p oderã o a balar. As ruins, exceptua n do a s dos tremeses,
fra ca melho r ia l og r a rã o.
No come ço d o m ês, os tri gos outonais, u ns estã o alta neiros, es p essos e ve r-
dís si m os, co m es pig a s fo r mosas ; o utr o s curtos , r a l eir ões e am ar el o s, de espigas
f r a ca s, rev eland o criaç ão d oe ntia q ue des coroçoa e a t erra o dono. Há tri gu eiro s
d e a rromb a, s ob er bíssimas ; há outras boas, d e m enos es p anto e a lgu mas o u m uita s
d a s chamadas esceped ou res, sofrív eis, que ainda consolam.iTam b ém não fa ltam a s
d e feiçõe s o posta , as ma lenAas, o r d in e rfssim as, t ã o s omenos e «ma l a m p ar ad a s»,
q ue dar ã o a semen t e o u co isa parecida .
E m t odas elas, p o r boas o u más q u e estej a m, é vulgar pe r d erem-se es p igas
co m a doença do marrão e out ras. Mas esses p rejuízos s ã o, em reg r a, pequenos,
sem im po r tância se nsí vel.

O s tri gos ri be iros prosseg u em criando-se, verdej a ndo co mo l im os se as


chuva s os b en efici a m . P or atrasa dos q ue estejam, medram a palm os, contan t o
q ue a pa n he m a s ua rega d e v e.t em quand o . S e por ém lh es f altam as ág u as e o
sol 08 cas tiga, de nnh a m- se e p erdem- s e, abrasad os p elo ca lor.
. . .. . . . . ... . . ... . . . . . , . , ' . . . . . . . . . . .. . , .. .
, , .
E n q uant o q ue os trigos perma n ecem verdes n es tes pr im eiros d i a s d e m a io,
os cent e ios, as ce va d a s e as f avas aloura m e sec a m , co m pletando a ma t ura ção.
D a s favas , bem s e di z: «M ai o 85 dá , m aio as lev a . • . » A a vei a con tin u a verde,
mas em breve «dará a cara », aloi rando t am bém .
O centeio di s tingu e- se p ela a l t ura e pe rda to ta l d o fo lhedo. A s es pigas do
bom , co ndizem com a altu ra da palha . E xt ensas e peladas de pre ge n a , dobr a m -se
a o peso dos bagos que l h es assomam nos cas ulos, cr iad os en6m , a qu er erem
«esgu ichar», n u t r ido s e belos. Que nem todas a s espigas denotam beleza impe-
cável. E n tr e as gra ndes e cheias, há as de genera das, onde se gera e vinga o
cornilhão (cravagem). as roidas pelo esca ra vel ho h) e a s s alt eadas o u meias
falidas, d e cas ulos cheios e casulos ve eícs. D e resto, as espigas ss l teedss, as
cria d or a s d e crava ge m e as r oid a s de esca ravelho costum am restr ingir - se a

(I) O u uu ..lbo Oll u uu.yeU.io do un uio, Um .. dimlnlõ" de um f. lj i o fr. d• • III rnlltldo de pel o. cluo.
A plun o;jli.... d o II ..pi", enU'lm em ," d, .
N.qu.II e em q li. po.... . eet-.. ao to do o .. 1m Pl rl e , •

- 318 -
ATRAvtS DOS C A MPOS

peque nin os se nões, q ue a nin guém as sus ta m. P elo co n t rário, a gradam ge ral-
mente, po r ser em prenúnci o d e colheitas fa r t a s. (1 ) Isto no centeio f orte e r ecos-
tado, n aqu ele que se classi fice um centeiâo brutal. de perspectiva soberba. - «Bo m
a va le r l . . . N ã o há m elhor . . . »- dizem os q ue o e .d m ieam. E acre s cen tam:-
cC omo está grado .. . a n ã o caber n os ca sulos 1. . . Mal em pregad o se apan h a r
r uim aceia ... Se l h e n ã o aco de m em saraço (ve rd u r engo) fica m etade na
te rra . .. » C om efeito. se fo r ceifado s eco e em dias de calor. d esbag oa r m uitís- â

simo, coalhando os chapeus dos ceifeiro s e os sulcos dos regos.


Mas é bem melhor m ostra r- s e ac urvado e cheio, em perigo de «espirrar»
por ocasião do acarrete e da ceifa. do que tombar e empancar à grada ou d o
que exibir-se di reito e le ve, com po ucos bagos e mi údos, embora com muita
palha. P od e f undir m uito em carr a d a s, mas dará pouco em moias.
R est a o de aparência oposta - o r uim e curto, tido e havido como um
penescc, de pouca palha e menos g rão. Centeio assim criado, ou mal se des-
cobre por entre os bamb ucrais de me egaça que o e e tog ame, ou encontra-se
livre de er va em areões ordinários, por onde os lagartos rastejam a descoberto,
sem estorvos de vegetação. T u d o q ue se cria e seca ne st as condições de penúria,
chama-se-lhe centeio en~a marrado, porque nunca lhes cai a prsgana e jà.mais
desbagoa. Há-de desbagas r bem, s e os ba g os ficam mirradinhos, aderidos a o
casulo, de q ue só desprendem depois à debu lha nos cilindros da deb ulhadora,
ou à porrada do m a ng ua]. E. aí mesmo, quanto e quanto vai na palha, encerrado
no casulo I.. .
C om o o centeio, a cevada em maio, mostra -se em plena matu ração, mas
conservando a p ragan a. Em «descaindo» para secar de vez, toma cor aloirada,
que depois aclara ou escurece, conforme de corre o tempo. Entretanto os pardais
entram com ela e papam a que podem . Como os deixem, «d ep e n a m» espigas
i nteiras e m uitas, sobretudo nos arredores dos montes e no das p ovoações. h :}
Por via de regra, cevadeira de fama, bem en ca beçada e de muita palha va i
abaixo com o peso do grão e da pa lh a . À ruim e curta , de espigas chochas ou
falidas, não tomba por certo. A o utra, a boa, como tombe depois de grada e a
chuva a não apodreça, dá sempre muito grão. posto de muitíss imo mais se, por
milagre, se aguentar de pé até a fo ice a tombar. Ceifada assim, erg uida sem maze-
las de nenhuma esp écie, p rod uz fund as fabulosas. M as se não se ceifa logo que
seca 4:fa z- se velb a », ecorv ílhe até rastejar, parte-se como o vidro, e, por fim,
quando a foice a derriba, descabeça em g r a n d e quantidade, a ponto de o solo
ficar coalhado de espigas. Ming ua a produção na eira, mas valoriza-se o a gos-
redo uro. Não vai a o e lque idão, mas l u z nas bacoradas. Do ma l, o menos.
As cevadas inferiores, ou se mostram ralas. re qufricas e desiguais, descobrin-
do -se mal, por entre as setas e papo ilas que as inçam e sujam, ou livres de erva,

o
(1\ u cundlo 'o f. " co r Ri/ hio .io pnft úndo . d e co ll.. il.. . bunda n lu . po rqu e U .DOI.m q ue ... .1 , . p n. u .....io j a . I. ·
mU I,. 111 0.1.. lUll (fu' LA melLorll UDthir... O uce r...c lhi o. pri n cip a lmen te . Por luo .. d ia: . Aa o dll u CU . ".. If"O .toOJ. p' "
(21 C.u..... lDai,,;.. ul u'ol 1:1.0' anador.. d o. 1U 0n lU c d.. PO'l'o . çõu , por . flu iulD .1 de p u ful a da , 1m u l u lt.do d ..
l:lldlfi u nlD 1101 t. Th. dol pr 6xhllo, .

319
ATRAv t S D OS CA MPOS

patenteiam igualmente a s ua insigni6 cân cia. branqu eando n o t odo o u em parte,


a. revelarem Brada ru im, r esultante da pobreza d o 9010 o u de irregulaIidades
atmo sf éricas. Em ~nos de estia gem, de ixam d e esp i gar. muit a s. Ficam em bor-
reche, cu r t in h as, d a nd o p ouca palha e pou co g rão.
O q ue sucede com a cevada. a ssemelha- se ao qu e s e pa s sa co m a aveia em
a n álog as co n d içõ es . Notam-s e aveia is de truz, avantaj ado s de palha e de ban-
d ei ra, a prometer funda s d e por aí a lé m . Para contras tar, dep ar am- se t ambém
o u t ros que. s e m al começaram, pior a ca ba m. Chegam a fi caI: tã o reles e aca n h a -
dos, qu e m al se podem ce ifa r . E stes, e m gera l. s ã o d os que se se me ia m à face.
em terra s po brfs si m a s, j á ca nsa da s p or ant eriores produções, o u e m t errenos
folaadio s, ma s tão i ng r atos e av essos, q u e n em aveia produzem.
Entre os a ve ia is bon s, p oucos se e n c orrt'ram que não esteja m to ca do s da ler-
r uéem , Alguns basta n te sofr em desse peco e de o utro aind a - a oliorrie, N o
en tanto, a d o ença sllorria a taca de pref erência a s a v eia s o rdi ná r ias. Àv eia ruim
alforrisdo , d ecer to q ue n ã o va le na da .

Por v inte e t ant os d e maio, os avei ai s « to m a m co r» e em p oucos dia s secam ,


r eclam and o foi ce. D o co n t r á rio a s espigas a brem, es ce n caram-s e, e os b a g os ab a-
lam com O v ento, o u caem por si m esmo. N ão desc abe çam como as d a ceva d a ,
m a s desbe g oam mais q ue as d o cen teio . A t é as fo r mig as a s esva ziam, esca l a n -
d o-lhes a s h a stes e levando-lhes o g r ão. Desaparec e t oda, por co ns egu i n te, s e
n ã o se to m ba depressa. E tom ba d a m es m o, ainda a fo rm iga a a ca rrete, se esti-
v er mal en r ilhei rad a .

Em junho L og o n os p ri m eiros d ias, g ra d a m , a loi r a m e seca m os mais d os t ri-


gos, à exce pção d os ri b eir os tr emeses, q ue pro ssegu em ver dtssi m cs,
com a s espi gas em ag r ás, c em leí te.e O s o u t ros, os q ue fo ra m se m ea d os n o
o u to no. esses, m oles o u rij os q ue sejam . a m ad u rece m d o co meço d e junho em
diante, a o influ xo d o m eio e d a s co n dições em q ue se cria ra m : dev a g a r, n os
baix ios úmido s e d e chão; d epressa, n as t erras qu e epux em e, soa l h eira s e en x u -
tias. O s tri g os sãos e for tes, que se cria ra m à von ta d e, tomam um co lo r ido fu lv o,
lindíssimo, q u e só s e extingu e 8 p oder d e di a s e de s ol. E que de espi g a s ó ti-
mas neles realçam! Que d e ris onhas e speranças el as aug erem L .. O trig o é o
r ei d os cer ea is, cu lt iva -se na m elh or t erra e dispen sam-se-l h e cu i d a dos p arti-
cu le rfssimo s, porque dand o, remun era bi zarr amente. C onsidera-s e o u ro d e lei
e do melhor q u il a te . Cal cul e- se, pois, como s erão g a ba d as essa s trigueires ex t en -
sa s, so b er b íssi m a s, q u e se e ncon t r a m n o s a nos abundan t es e q u e, aIfim ceie da s,
avolumam d e in teresse e ce ntuplica m d e va l o r . G abam- se po r mil expressões
parecendo pouco tu d o q u e se di g a em se u l ouvor: - «Q ue n obrezia de sea ral. ..
É. um canavial fe cha do .. . u m a m u r alha cu s tos a d e r om per l Quando a foice
a botar abaixo há-de abr ir os pulsos a m ais de q u at r o .. . T êm pa r a. p era s os
retinhas ... Dis t o h á po uc o . . . Parelh o, r ecostad o e g ro sso I . . . E a s es pigas ? l ...

- 320 -
ATRA v t S DOS CA MPOS

Cada um a faz d uas .. . bem criadas e cheias . . . de bagos como pinhões . . . Sim
sen h or, f uma-lhe a ve nta . .. V er ã o à ceif a o que é botar molhos e r i lh eir os . . .
Rilheiros e carrada s ... D eve da r u m esbar rnnto 1. . . :10 E p or aqui fora, to da a
gente as a dmi ra , nu m a ca tadup a de elogios. r etum ba n t es e expressivos.
Os de co ndiçõ es opostas, ta m bém n ã o es ca pam a os comentários dos apre-
ciado re s. Trigos que em ve r des nu n ca presta ra m, a go ra , em maduros e secos.
pior efeito produzem . E a p e r d estes, amargurados e rel es, há porventura, outros,
as sá s desen vol vi dos. q ue já mostraram fantasia. m a s que 8 perderam de resto,
por l he eda r o tempo à contra». D i-lo bem alto a cor anormal que tom am.
Em vez de aloita re m, como os sãos e grados, branqueiam mais ou menos,
acu san do grada péssi ma . E. como bra nqueara m, hão-de por força fundir pouco.
P ou co, em gr ã o. E.m p alha. escapam.

P or bons o u maus q ue sejam. os t rigos do out ono estão secos de todo aí


por 10 a 20 d e junho e. a segui r, a foice entra com eles . P r imeiro. nos moles,
ma is propensos a desbagoarem , depois. nos r ijos, que não desbag oa m, mas que
des ca beçam em estan do ressequidos. N est e período. d e 10 a 20 d e junho, prin-
cip ia e efect ua-se a grada do s trigos r ib eiros, que vai a cabo. bem ou mal,
segu n d o o t empo. Mal lhes irá por certo, se «a per tar em » 0 8 calores do cS an to
A n tón io».
... . . . . .. . . . . . .. . ....... ........ . . . . . . . . . . .. . .. . . . ... . . . . . . . . . ........ ... .. .
P elo «S. João », os centeios, as cevadas e as av eias, estão em terra, to dos, já
ceifados. D os trigos temp orões, m uitos perm anecem de pé e ootros r eceber am
foice. Nesta s condições, vê -se a maior porção, aí por vinte e tantos de junho,
temp o em que as ceifas «vão de cabeça abaixo». à p a 'rt e as de certa s lavouras
grandes, onde se costuma acaba r tar de . Entretanto, os trigos ribeiros principi am
a cdar a cara», para secarem de todo, d en tro de poucos dias, já em j ulho. A lguns
vão a terra, primeiro que outros dos do ou ton o.
... . . . . . . . . . . . . ........ . . . .... . . . .. . . . . . . . . . ... . ..... . . . ..... . . . . . . .. . .. . . .
Em ju lho Pelo «5. T iag olt, n ã o h á searas verdejant es, por serôdias q u e sejam.
A s q ue po r acas o ainda estão d e p é, most ram-se secas e ac urvad as,
à falta d e vigo r que a s ampar e e d efenda. A t é pare ce qu e minguara m e falira m,
tão velhas se põem e tanto se lh es emar anh a m a s pa l has e as espigas. Para des-
crédito do lav r ad or, estã o ass im com o abandona das, a ser virem de saad io à
formiga e a tod a a casta de bicharia .

COLHEITAS

Nesta peregri n a çã o a tr a vés do s campos, eis- nos chega dos às co lhei ta s, às


almejadas col heita s d as s earas, q ue o la vrado r a guarda com im paciê ncia, pa ra re co-
lher o fruto do se u longo e insa n o t r a balh o. M aior azáfa ma agrícola . não h á por

- 321 --
ATRAvts DOS CAMPOS

certo nos campos do Alentejo e muito principalmente nos de Elvas e cercanias,


onde a cultura dos cereais ass ume importância capítaIíssima. D esd e vinte e tan -
tos d e maio, até por agosto {ore, as colheitas ocupam centenas e centenas de
braços, a ponto de as ceifas. nas herdades, serem efectuadas por homens das
Beiras e do Douco - os ratinhos - pois os campónios da xeg iâo mal chegam
para as gadanhas, acarretos e debulhas, onde tê m q ue f azer de sobejo n os pri-
meiros dois meses da época. Meses de labuta afanosa e intensíssima, pela magni-
tude do assunto, pelo receio de faltar o tempo propício e pelo temor de incêndios.
que de súbito podem irromper. destruindo esperanças, inutilizando sacrifícios.
abalando fortunas .
O recolhimento rápido das searas, para saírem a salvo de eventualidades e
avarias. co ns t it ui a principal preocupação da maior parte dos lavradores.
Desenvol ve-se, portanto, toda a activid ade, e, conjuntamente, a s atenções
fix am-se nos rasto lhos e nas eiras, cujo labor é acompanhado de perto com
singular ca rin h o por todos que vivem no m eio rural.
Nas aldeias e nos ca m pos, as colheitas são 8 ordem do dia e da noite.
dando margem a palestras animadas, em que 8S horas p assam a fu gir. Lnque-
re-se e s abe- se dos «h o m en s» de ceifa qu e deu cada lavrador j q u a n do os mesmos
começaram r se faze m ou não b om rastolho e quando pensam em a cabar.
Passando para os acarretas e d e bulhas, citam -se os adiantad os e os atrasados,
onde se ca r r ega mu i tõ ou pouco, caminhos que d ão estes e aqueles e quem sabe
ou não carregar. S obre «funda s», cada qual sentenceia a seu talante, e, a propó-
sito, acrescenta-se q u e fulano colheu 60 moias de trigo. em tal parte; que bel-
trano 40 de centeio e sicrano 20 de cevada, dando o trigo a 10 sementes, o
centeio a 15 e a cevada a 20.
Neste relato de fun das, se entre os circ unstan tes lig uram lavradores, estes
dizem do que lhes vai por casa. Algu ns carregam a nota para aquem ou além
da realidade. N ã o é por maL . . está-lhes no feitio. O s ch orincss, por exemplo .
só falam das searas que lhe f undem pouco. Das boas, esquecem-se. Os bssó!i.as,
jactam-se de colherem esbs rruntos, em tais e tais «folh a s» afamadas. Das ru ins...
nem pio 1. . . Há ainda outros de critério diverso, também interessante. S ã o os
concbss, que se encolhem como cágados. por de sco nfie rem dos parceiros.
Lembram -se do a f o ri sm o, que a alma d o neAócio é o segr ed o. E. no aforismo se
en trincheiram, inquisilando a valer com o. indescrição dos abelhudos curiosos.
Esquecem-se no entanto de que têm criados; de que os cri a d os papagueiam
t udo que se passa nas casas dos ames, e que, fi nalmente, os criados são bisbi-
lhoteiros incorrigíveis, apr egoa ndo e exager a n d o por toda a parte o que os amos
semeiam e colhem . ..
Resumindo : das colheitas trata-se com afinco extraordinário. sem se olhar
a gastos. e das colheitas fala-se à grand e, como assunto moment oso, de e lrís-
síma transcend ência.
.. ...... . . ..... . . . ... . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
A faina da s colheitas compreende três serviços distintos: ceifa s, ece rretos e

- 322-
AT RAVl. S DOS CA MPO S

debulhas. Em começo, só se trata das ceifas. Po uco dep ois. entra-se com 08
aearreros e a s debulhas, prosseguindo t udo simultâneamente, mas cada s erviço
com p ess oal pr ôprfo e praxes diferentes. E, a par, durante o primeiro m ês da
época, cuida-se também da ga danha d os fenos, cem gente estranha aos ou tro s
serviços. Enfim, trabalhos múltiplos e variados. com Aentio de diferentes id a des
e procedências, a a nim a r em e p o voarem 0 5 campos, des de o luzir da manh ã até
alta s h ora s d a noi t e.

C e ifa s

A s ceifas exec utam-se, ge ral me n te. com a f oice braça l. mane jada p or h ome ns,
ra pazes e m ulh eres. e. po uc o ou n ada. por m eio d e ceifeiras mecânicas. ( t)
D e o rdi nári o. com eça-s e de 18 a 24 d e m a io e acaba -se de 10 8 18 de julho. o u
p ou co mais t arde. D ois meses, aproxi ma damente.
Primeiro, ceifa m - se as ce vad a s, os ce nteios e a s a v eia s, q ue, para o efei t o,
se eng lo ba m e conhecem pela d en ominaçã o genérica de segundas o u sementes
brancas. h} T o m b am- se em primeiro lugar porque s eca m m u i to a n te s d os trigos
e po rq ue «es per a m m en os», não s e a guentando de p é s em prej uízo s ensível.
O cen t eio e a aveia de s be go am em g r a n d e escala e a ceva da d escaheça a va ler.
Derribada s as seAundas, passa- se aos trigo s . Começa-se, e m r egra, p el os
mol es e conclui -se n os rijo s. A s p r axes a ssim o estatuem. Ma s, à s v ezes, oc o r -
r em circunstân ci a s impe riosas e ex cepcionais que obrigam a aband onar as
praxe s. P or exem p lo , adiar- se para o fim da faina restos de s earas ordinárias
d e cen tei o e ce va da , p ara se a cudir d e preferência a o u tra s 6timas de tri go,
dign as de a pro vei t am en t o opo rtuno .

Ceifas por «r a t i n h o s) T odas o u q uas e toda s d as s eara s em h erda de s são


desem p en h a d a s p or esta gent e. O s cha mados ratinho5
- escusado seria repeti-l o - são h om ens e ra pa z es da s Beiras e do Douro, q u e
expressamen te v êm ceifar ao Alentejo, regr es sand o às s u a s p ro vín ci a s logo que
despa chem a refrega .
.... . .. . ...... .. .. . .... . ..... . . . ..... . ........... . ..... .... .... . .. . . .. . .... . .
Cada lavoura ocu pe d e entr e 15 a 50 ratin hos, gover ne.dos por um deles - o
mene geiro do corte q u e, p o r sua vez, re ceb e or d ens do chef e e patrício, O mana-
geirc principal. (JI O que sã o, o que fa zem, o q ue val em e o q u e ga n h a m esses

h ) Vt j.· .. o . rri. o Cel{e ;ru, 'l ' p ltin. U~ .


(21 A ra d o d.. nu.. d e Clnl.lo. cu· &d• • ""ti. IIU<D • d ... lfic' Ci o ••nirlu d. "'un".,. por OClli lo 0311 CtU...
dutd fillu-.' n. clIc" ulln cl . de. II IIIUmU .. aru. unOl d.... lo r ..c"ndlrlo. comp. ud.. com II d o. trl , o• . N i o Ul a
OIal. p or ll-Oto . O q". p od a '0' mal. i ch.maU<D·n-lb.u . ..men, u ÓraDe.,. qU''ldo. 1111 ho. uM.d •• • i .. mil. uc or.. qa •
.. do. u l.o••
(J ) MIlI ....lIo pri'lcip.l I d • •e.....nd u toei•• upntld. 1m ...I rlo. co r lU o u . ..IIl•.u d ..... p arclab, um. tm ..d.
l..,olllu. M' 'l •••lr O do ee ere, • o qu. ,our.. . o...l u me 'l U aO pI ..o.1 qo. t u b. lb • • oh ••u. e onlllll tc dl:reccl o. Vl j.... o
Cllllllllo R..d.. ltol.

- 323 -
A TRAv t s D O S CAMP O S

milhares de trabalhadores, bem como os usos e re gras a que se s u bo r din am na


organização e disciplina das e ce m a xa das» e «co r t es», em q ue s e ag eem ia m e
encorp aram. j á o pormenorizei à larga n o capítulo Ratinhos. t pois, d esneces-
sário entrar em d etalh es referid os. T odavia, como preito de justiça que se não
deve re gatear. direi uma vez mais. o que de re sto sa be muita g en t e. O s ceifeiros
beirões, vindo. como vêm. ceifar ao Alentejo, são obreiros pres timosíssimos da
a gricultura alentejana. Obreiros quase imprescindíveis, p ela escass ez d e braços
indígenas. que todos Os anos s e n ota n o primeiro período das col heitas e pela s
aptid ões qu e revelam em t ã o á r d u o serviço.
................ . . . .. . . . .. . . . . . ..... . ........ . . . .. .. . .... . . . . . . . . . . . . . .. . ...
O s ratinhos ceifam as g ra n des e as pequenas s earas d as h erd ad es e ceifam-
- n a s com de sem b ara ço i n co mp arável. Causa admiraç ã o 8 destreza e ga lha r d ia
com q u e el es manob ram a f cice, ora sob a acção importuna da s merezies
da no i te, ora. ao ca lor eston t eante do sol, num p eríod o d e 40 a 60 d ias, em
que s õ folgam n u m ou dois . (1) Nos dem ais, mourejam «8 p é :firme..~ desde
o raiar da a u r o r a até noite cerrada - durant e 16 hora s. em qu e só descan sam
nos intervalos das três comida s I Interval os curtos e fu gidias. ao ca p rich o
do ma n a âeiro, q u e n ão desperdiça um minuto. ( 21 O seu gosto é ver a família n o
corte. a da r-lhe saida e a va nço: - os hom ens. a derr ibarem «pã o» ; os rapazes.
a atarem.
A enrilh eíra çã o dos m olhos compete a homens estranhos à e ca m a rade e-
C ompete a um ou dois ga nhõ es eneilheimdcree. Do a carreto d a comida e d a
água. cu i da um r ap a z - o tard iio ou mantieiro. O tsrdão e os enrilheira dores
formam o g r u p o d e auxiliares alentejanos. a quem o lavrador paga e a li m en t a
àparte.
... . .. . ... .... . . . . . .. . . ... . . . . .. . . . . . . . . . .. . . . ...... . . ...... . . . . .. . .. . . . . . ..
Ceifas por mulheres À o posso q ue os ratinhos despac h a m e aju stam p or
em p rei t a da s as ceifa s d as g randes e m edianas lavouras
- as searas d e relativa i nsig ni 6 cân cia . p ertencen te s a se areiros e ainda algumas
parcelas da s grandes. e m herdad es vizinhas das po voações. cost u m a m ser ceifa-
das a j or n a l. p or mulh eres da s aldeias pr óximas, median te a f orne d e 160 a
180 reis «s eco u , por meio dia e mulher. Às aprendizas nada g a n h a m n a die
da estreia. No segundo e no terceiro. ganham 80 a 100 reis j no quarto 120 e daí
para o futuro o mesm o que a s sabedoras.
A ceifa p or mulh eres era assás restríto em t empos que já Já vão . De h á
10 anos para cá tem..se generalizado muito e prossegue alargando-se. de an o a

(1 ) Ol a de Corpo da D.u•• d. S . 10 ' 0. Q " I .. do o ar, d. C orpo d i O l ll' ui 1.. 1.. d. co meça re m u n U... fol. l .
Ibm n u no dll d. S. 101 0.
( I) Ino a DI ."oe bo 4UI • II.por.d. "Ild• . NO I :ru11l.6, d i pOUC OI • .f U I"UU , o mllll .'UO puoc.. p.... m o h o mUIOI
..o... o du p.c,,"o. A . ... puh.da I - Ih e m.i. df... li c n lOI =u I .. ([ua ll lo .1•• 01 co ...pallh.irOl . . .Illnl' • • nUu, ee ....m
I. CU tl. al hel., por cOnla d o I.nador. E 110. Ul OI n lamJtO'IlI • • ee ...ld a ...1. mui lO pau CI.. . ... a 1'110 pO'lu l 1m c...·

- 324-
A T RA V t. S DOS CA MPO S

ano, a contento dos ag riculto r es e d as ald eanas que a executam . Estas, sem
descurarem os a fa zere s d om ésti cos, de sti nam o meio dia da manhã p ara ganhar
com a foi ce o s eu sustento e o d os fi lhos.
A s m ulh er es ceifeiras de ou t r or a , p ost o ceifassem bem, pelo que se refere a
apuros e caut elas, eram poucas, ce ifa va m com morosidade e não apetecia
em pregá-I a s. Às d e h oje, con t am-se 80 S centos, ceifa m a preceito e despa cham
sofrivelme n te. D i z- s e que faz em m enos que os ho m e ns das Beiras . M a s essa
relativa i nferiorid a d e, compens am -na na p erfeiçã o do s er vi ço. O trabalho delas
é ma is escru pulo so e p erfeito que o deles, o q ue de sobej o se explica . Elas, tra-
bal ham a jor n a l. a s eu sal vo ; ele s. d e em p r ei ta da e ag uil hoa dos p elo m e nag eiro-
todo açodado em con clu ir. p ara r egre ssar à t exrínb e , co m as no tas n a algibeira e o.
que ijos n a sacol a . h l O co n t rá rio d as a ldean ae, que quanto mais se apuram.
mais salários vencem .
. ... .... . ... - .. - -- .
A hora da sAsrrs, para as mulheres, é a mesma dos eratos», ou s ej a ao
raiar da aurora. Soltam. p orém, à s onze do dia, tendo por única interrupção a
hora do alm oço. Almoço ligeiro, à custa delas, que se resume a pão. queijo,
azeitonas e frutas . P or acaso almoça carne de enchido, uma ou outra de algu -
mas posses. Quanto a serviço, apenas o da ceifa. A atad a dos molhos e a
endlheiração incum be a um ou dois homens agregados ao ranch o. ( d

" " "


A n tes d e s oar a um a n o ca m p e n âr io da igreja, a s ma na gei ras das ceifas
p er corre m a aldeia, b atend o d e p orta em porta , a a cordarem e chamarem o
m ulherio do s seus r espe ctivos ran chos.
- V á arriba, p ergu içose s I. .. V á, qu e são ho ras.. .
As de spertad as resp on de m , erg u em -se e saem p or entre bocejos e s usp ir os
caminha n do para o ponto d e r eu n ião, q u e é, or dinàría m ente, a ca sa da mana-
geire. Seja on d e f or. r eunem-ee em d et erminado s ít io. e. à medida que vão
ch egando , d ã o- se os b ons dias, com o «S a l ve-as D eus» da praxe, correspo n d i d o
com um «De us te salv e» u n ís so no. Ou, em v ez d isto . outras sa u d açõ es fa m ilia -
res , a mistos a s e e ntoadas.
A os cum prim en t os seg ue m -se a s fa l ácias e galho fas, n u m a a lgaza rr a dos
demóni os, qu e a corda e a r reli a a vi zinhan ça:
- «Credol . . . fa çam m en os ba r u l ho . . . menos motim Bais, umas badissl.. _
N em aTreparam em quem está n a s s uas casa s a dormir! AS.foceAue m. al mas
do diabo J. .. • À ssim fa la a m e na g ei ra , r eclamand o silê n cio . Mas as r epree nd i-

(1) QUlii o. qu. l h. d" o I"Tudor. co...o l....bu"' ;. p,u .. f....III• .


(s) O. 1l. 0lll.l "" .u... e Cllr ilhelu... pilo di . fora , u qu. u to h' ...olh o. p u. uar e "ullh.lru. S. l obl j l u ...po t. "' -
i i... fi O.\Ip.... ",ouIro . tu b.Thu••

325
ATRAvts DOS CÀ~I POS

da s fi ngem n ã o ouvir e co n ti n u a m a grasnar. S6 a fr o u x a m q uando entra m


a conta s com a lam beia do café - costumeira moderna de que a d ona da casa
se i n cumbe, n a m i ra em algu n s lu cr os. ou para. bebe r de g raça, p elo menos.
V em pois, o café e cada fr eguesa toma a s ua chávena, a troco de dez reis.
As mais a mador as t om am d uas e não entram com terce ira por q ue receiam as
más línguas.
D e re st o, todas se pela m pelo caf êaínhc , que reputa m u m a delícia.. .
E melhor por certo lhes se beria, se o temperassem à vontade com açúcar em
fartura .. .
· .
Partem, en6m, para o rasrolho . Saem a í pela s duas horas da madrugada,
entre ruidoso alarido de cantorias e toques de pandeiro, que d espertam toda a
gente. A canta'! saem da aldeia e a cantar caminham pelas azinhagas e cerre-
teiras, 8 espairecerem ama rguras, a a vi va r em r ecordações... Se não f oss e m a
ca ntar, ouviriam de vez em quando os chios es pa ça d os e assustadiços das coto-
vias madrugadoras, ou o piar a gourento dos mocho s e corujas ...
·. . ....... . ....... . ..... . .... . . ... . . . . . . . . . . . . . .

* * *
A o nascer d o sol já a s do rancho têm ceifado o bastante para se lhes ava-
lia r o d esembara ço. A retaguarda do corte vê -se juncada de 8.veJas. a atesta-
rem q ue as foices a ge r rara m cedo, a n te s de os pássaros saudarem festivam ente
os prim eiros a rreb ois da man h ã .
De pois do so l ne scído, a azáfa ma pross egue com a ten acidade pri mi tiva.
N o va s e velhas, solteir as e casad as, na m edida da s suas {o r ça s, to das fazem o
qu e pode m , de mangas arrega ça d a s e saias em calçonates. N ã o tr a balham com
desembara ço a nál ogo a o d os ret inhos, mas mexem-se re soluta s, s enho r as d o
seu p a p eL .. E à porfia ava nça m , derruban d o «pão» e esten den d o p ave ia s.
Lá alivi am a m i údo, p ara di zerem coisas o u pe r a emb orcarem u ns 8010s de
água f r esca qu e a agu a d eira lhes ofer ece. fi ) m as pront o v oltam à Iíde , dando o
s eu a seu don o. C omo o lavrad o r apareça, d ã o-lhe as b oa s v in da s, ga b a m - lh e a
sea ra, enc a r ec em o trabalho, e, a prop ósito, como olb.amento, d e que s e julgam
mere cedora s, p edem - lhe um a l moço d e so pas de lei te . c em fa rt u r a». O l avrador
a n u i ou nã o, segu n do o feitio q u e tem e a s impressões q u e recebe. Se anui.
retum bam-lhe os elogios e a pan h a vivário . . .
· .
Aí p el a s dez h ora s, já as la b oriosa s ce ifadocas {re qu ej a m sensivelmente.
A viol ência do s er viço e o calor d o sol põe-na s tontas e pa tetas, a suarem em

- 326 -
ATRAVt.S DOS C AMPOS

bica , de rosto esbraseado. C on tu d o. agu e nta m -se até à s onze, hora a que lar..
ga tn o trabalho, por vencerem o meio dia. Dez minutos m ais e ei -Ias a caminho
de casa d escalças, de ch ape u na cabeça e foice ao ombro . pisando a areia das carre-
terras, quente como brasas d e lu m e. C a min ham em bando. algo atordoadas e a
passo ligeiro. Lá fala uma o u o u tra, mas o trajecto é triste e 8S fa las são poucas.
P ouca s e em voz d e d esânimo. abafadas pela ínferneira das cigarras, que a essa
h ora cantam furiosamen te, do cimo das moitas e arvoredos. t uma «canta rela e
azoinante e p ersistente, q ue pred isp õe à p r eg ui ça e 80 sono.
............ . .. . ........ . . . . . .. . . . . .. . . . . . . . ........ .... ... . ... . . . . . . .... .. ..
Afinal, ao cabo de pou co t em po, sob um sol de rachar, q u e lhes escalda o
sangue e as ala ga de suor, as caminhantes v êem-se próxima s da. povoação e dos
seu s branqueados casebres. Esta perspective sorri-lhe, encoraja -as e transfor-
ma -as por assim dizer. D e macambúzio.s e estafada s que pareciam, t ornam-se
viva zes e parladeiras. Com efeito, mal entram DO povoado, de satam a ca n t a r
alto, m uito alto e em co ro, ao som do pandeiro e das castanholas . D e ve z em
quando param par momentos, a cantarem e bailarem. E daí a nada, s eg u em p ela
r ua fora, a cantarem e a toca r, de s perta n d o a curiosidade. Entretanto, à s portas
e ja n el a s entreabertas do cas a rio rasteiro. assomam várias caras feminis, de
t rajos à Erescalbone, ávida s de verem e ouvir as po bres que vêm da ceifa-
Muitas são- lhe afectas e be m O m oatt e m, excla ma n do: - e Coitadinhas! esmee -
reneeedes de trabalhar e inda com ga na para se edever tírem I O que é a
m ocidad e ?l. • • D i virt a m- se, ra parigas 1. .. C an tar é do s anjos Quem canta
seus males espanta I. . . » O u tr a s não lhes rende m lo uvores. antes l h es chamam
nomes feios:
- eBai8 u mas essolut es t ... V alunt aícssl .. . A darem motim pelo meio das
rua s, sem á .tsu pr ems d e n ingu ém I. .. Be díss, a alvoroçarem quem está n a s ua
casa I. " E ain da a ge nte as vem a ver J. • . » Assi m se exp ress am as maldizentes,
com cheiro d e ajui zadas. S ã o em ge ra l ca r ca ssa s ra buientas e moças recolhidas e
dengo sas, com pretensõ es a graves. T odas el a s ret occe.rie cem vezes ma is que a s
al vej adas, s e se ap anh a ssem à solta e à lar g a, onde n ão d es sem nas v is tas I...

* * *
A atada O pr ep aro d os m olhos d e «pão» es t en dido sob o ras tolbo, ch a ma-se
ata d a. E ste serv iço s eg ue a trá s d o co rte e dele se incum be m o s r a p a-
zes da ca mar a da , q u a ndo a ceifa é fe i ta por ratinhos. Desempenhad a por
m ulher es, a atada per t ence a h omens ou r apazes, que as a co mpa n ham de
propósito.
Em qu al qu er dos casos, ca da a t ad o r reune e so b raça u m i ndeter minado
núm ero de p a vei as e com elas faz o m olho q ue aperta e a ta, d e joel ho em eerea.
em n ó simples. p o r meio de um n egalbo. p rêviame nte preparado . O negalh o

- 327 -
ATRAVe S DO S CAMPO S

Jaz-se de gavelas do próprio «p ã o », ou de outra coisa a j eit o - junca, hastes de


piorno verde, correias de trovisco e até cordeia ou teniçes. S eja co m que for, os
m ol h os atados continuam sob o rastolho·aguardando que os enrilheiradores os
retirem , para faz erem os rilheiros,
À atada carece de fiscalização rigorosa. Do contrário fica «u m a porcaria».
Quando os atadores são rapazes dos restinhos, essa fiscalização impõe-se em
absoluto. sendo geralmente incumbida 80 guarda de herdades, aliro de que os
ga rot o s aldrabem o menos possível. Novatos e inexperientes, mal podem traba-
lhar a contento do am o, que reclama p er fei çã o. e ao agrado dos ceí feíros, seus
s u p er io r e s e parentes. qu e lhes exi gem de spacho. O guarda talha com o s gaiatos,
queixa -se ao manegei ro, o manag eiro repreende-os também , mas os rapazelhos
doem-se pouco. E.mbora crianças, possuem manha suficiente para saberem que
as sanfonadas do manag eir o , ordenando apuro, são fogos d e vistas para ama -
ciar o guarda . Resultado: a atada quase nunca satisfaz, porque as paveias nem
todas se aproveitam, porque os negalhos não prestam. e os m olhos desatam-se.
C o n s eC{ u ên ci a : o guarda enfada-se com os garotos e acaba por se enfurecer com
os verdad eiros culpados - os ratinhos, pais ou tios dos cachopos . Se fala no
caso ao amo, vai -lhe dizen do que os e ratos » trazem a atar uns fundiças chei-
rando a cueiros, sem jeito para nada. E. O amo observa: - «A h I ele é isso ?I .. .
pois pa ra o ano falaremos ... Nem um só desses fedelhos ranhosos ... Às mã es
que os desmamem lá na Beira ... Nada, que eu pago-lhes com o homens . . . e
por homens trato .. . »
Mas no ano seguinte, quando se ajustam as ceifas, o lavrador já se não
lembra do desma.zelo dos rapazes , ou se se lembra, finge que se esqueceu . Sem-
pre assim. foi e sem p re será a ss im .

Ril hei ros Na região elvense e lim ítrofes, o vocábulo rilheiro aplic a-se aos
montes de molhos que, após a ceifa, povoam os ra stolhos, e tam -
b ém às grandes medes que, depois, se levantam nas eiras, com o recolhimento e
acumulação desses mesmos molhos. No concelho de Àviz só se designam por
rilheiros aquele s q u e se erguem nos rastolhos. Os outros, o s das eiras, cha-
mam -lhes fraseais ou medas, como chamam moreias a os primeiros, em diversas
localidad es.
Finalmente, 05 Dom es de rilheiro o u irescel, nun ca d evem t om or - s e por s inó-
nímos de almenara . Em a gr icultura a l en t eja n a , o vo cábulo - almenara - apli -
ca-se exclusivamente a um gr a n d e m onte de palha ou de fen o, erguido e acon-
d i cionado a preceito.

Enrilheiração e enrilheirad~ Dos molhos estendidos e atados por o ca s iã o


d a ceifa, compõem-se i medi a t a m en t e peque-
nos t il b eiros, compassados, d entro da própria re stclhice, onde continuam a per-
mane cer até ao acarreto p ara a eira.
O serviço de enrilheirsção compete a homens qu e não se ocupam da
ATR A vtS DOS C A H POS

ceífa, mas qu e a a companham, enrilheirendo. P or isso, d enominam-se en rilh ei-


re d ores. (l)

A os enr ilheired ore s cu m pre l azer b oa enrilheir eçêo, d e harmon ia com O


estado do «pã o» e do temp o qu e pred omin a. S e o cer ea l es tá s arecc (ve rdurengo)
os m olhos deixa m -s e empinados, de p é, d u rante aI.~uns dia s, p a r a s ecar em a
va ler e n ã o abolorecerem . D a mesm a fo rma se procede q uand o o « pã o» está
m olhado o u úmido. Nesta hipót ese, dá -se-lhes volta to d os os d ias, a brindo e
al argand o a ca beça do s m olh os p a ra ou r earem a s espigas e n ão gr el ar o grão.
D epois, em os mo lhos s ecan do e enx ug a n do . estendem-s e e en rilheir a m - se com
a s espig a s p a r a um só l ad o e os talos para o o ut ro. O «pão» enx u to e s eco,
en rilheira-s e l ogo d efinitiva me nte em rilh eiro s gran des e apru mados" q ue se
n ã o re passem com a s chu vas e q u e se p restem a carr eâuio fá cil.
Por cautel osos q u e s eja m os en rilbeired ores, é r aro a nga riarem os m ol hos
t odos. Em ge ral es capam-lhes muitos, e mai s n os r e stolhos a ltos, de bambo rra is
espessos. Ne stes. s empre escapam m olho s encober t os, que n ão vão à eira e q ue
se per d eria m em absoluto se os não a proveita sse m os p orcos, q u ando ent ram
a o a g ost adou xo, O s p orcos a p ro veit e m - nos, se m d úvida, ma s é a proveitamento
de sluai do, cheira n do a d esp erdí cio .
. . .. . .. .. . . . ...... .. .. . . ... ...... . ... .. .. . .. . .. . . ...... . . ... . ......... . . .. . .
Das searas que, en fim , tom b ad as, m os tram muitos ri lhei r os no ra stolho,
diz-s e: -« V ê-s e q ue é b oa .. . O s r i lb eir os, n ã o despegam uns d os outros . . .
P a r ece u m a n o vilhad a 1. .. . M uitos e gr a n des E em q u e tivessem saído, de i-
xavam a fam a ... O lhe m -l hes para os ossos Mi rem es se s ca n u dos re z i cs, que
h aviam d e d ar t oss e à~ foices f. . . »

Aca r r et os

D ia s d ep ois d e começarem as ceifas, dá -se princípio 80S acarret as - à r e m o "


ção da seara p a ra a eira, afim d e s e deb ulhar e recolhe r .
Os acarretas fazem -se p or m e io de car ros puxa dos a bois o u a m uar es,
s enã o p or uns e o utros, sim u l tânea me nte e em sepa rado. Ou se a car re ta a p o uco
e pouco, p a ra o desp acho da deb ulh a diária, a proveita n do -se d e preferênci a as
m adrugada s e manhãs, (2) ou vai de fio a pavio, dura nte semanas" até fi n alizar
de vez.
O cere al acarretado, que n ã o tem cabida para d.eb ulha imedia ta, reun e-se e
a comoda -se n a s ext remas d a eira" compo ndo rilheiros gígan tescos d e várias
confi gur ações. E ste s ril h eíros erg ue m -se dos la d os no rte e sul, dei xando liber to s
o do poent e e o d o nasce n te p ara a eí ra 6.car bem la v a d a da tra vessia, a d ar

(1) En~lI" eluJo~u. V i i i -II p" . !6.


(t) Por num lU 1u ra. ml h p ~op(e1 .. plU .urUIOI. Ã m u u i l ou OM'llh.dl , q g.1 1101"" Lor.. (Olla ml LITIf. Iml-
e11 • pIII.. I DIII..dIU o ' rio. o qUi proporclo n.. C.fU'uJO UclI , u m o ItlCOIl"ltlIUIU dll IIpl, .. d..b l'Ol u m oa d., cI -
Lat lrllll.. COIII.O ."cl d. 4u l lIod. L' ulor.
ATRA V t.S DO S CAMPO S

direito o vent o oeste - o mais pred o m in a n te e o melhor pa ra a l imp esa do grão


por meio de forq uilha e pá.
Nas ei ras on de s e proj ecta d ebulhar a vapor, os rilh eiros erg ue m -se onde
calha m elhor para o nive lamento da debulhadora. e erguem- se a ltos e largos,
para evitar mu danças de m á quinas, sempre demorada s e enredosas .

Pessoal dos acarretos P erten ce à gan h a ria e a o gr u po dos ca rreiros. Dos


car ros de bois incumbem-s e: um , o a b eg ã o ou o sota ;
o ut ro, o bo ieiro q ue lh e tece, e os re s tan te s, a ga n hõ es d e co nfia nça . a rvorados
em carreteiros, sob o m ando do a begão. O s ca r ros d e muar es são guiado s e
ca rreg a dos p elos ca u ei ros , co mp reen d e- s e. às o r d en s do m a iora l , q ue tam b ém
trata e co n d uz a s u a r es pectiva p a rel ha e cano.
No s a ca rre tas d e traj ect os curtes, e nt re os ra sto l h os e a eira , cada co n d utor
d e carr o, de bois ou d e mu ar es, faz-se a co m pa n h ar d o correspondente m olhe iro.
h omem ou rapa z qu e au xili a o ca rrego e descarrego das ca r ra das. U sa- s e i s to
para s e d espaeb e r d epressa e d arem- se m uito s csm ínhos em ca da d ia. Se as d is -
t ânci as a pe rc orre r vão al ém d e 2 q o ilõ me t ros, o u meno s mesmo, dispens am -se
os molb.eiro s, porque se p a ssa o m a i s do te m po no vai-vem das caminhadas.
N estas condiçõe s, t raba lha m ca rro s em n úm ero par, a bm d e os con d u to res
darem molh.os uns aos o utr os e assi m se r emediare m.

Preceitos e usos N a refr ega d os ac areeros, os bois t ra ba lh a m d e revezo, ao s


m eios dias. O s do revezo da manh ã estã o n os ce r r os m uit o
ante s d o amanhecer, e carreteiam até ao meio dia. descansando 40 a $O m inu tos,
das 7 às 8 h oras, ag arrados aos cerros, enquanto o pesso al alm o ça. Em r egra
dão dois caminho s antes do almoço dos homens e out ros t antos ou mais no
resto da manhã. Os do revezo da tarde agarram ao meio-dia, mas só vã o para
o rasto lho em os ga n h ões jantando.
Desde q u e começam de tarde, até que s o lt a m ao sol posto, dão uns três
caminhos. Que de t arde e de manhã, pode variar bastante o número de cami-
nhadas. Isso depende, principalmente, das distâncias que medeiam entre a eira
e o rastolho, e as distâncias podem ser de dezenas de passos ou de um a três
quilómetros.
Às parel has de muares acarretam por todo o d ia, do raiar da aurora ao
pôr do sol. Entretanto, o gado desc ansa e come na cavalariça. à hora do alm oço.
das 7 à s 8, e bem assim ao meio-dia, pelo espaço de hora e meia a duas horas.
D e manhã e de tarde, dão mais caminhadas que os bois. se as jornadas não
forem m uito maiores. O seu passo ligeiro presta-se a men os demoras e de
facto reduzem-nas bastante, com manifesta vantagem. Por es ta circunstância,
a maioria dos lavradores decidiu-se a. lazer os acarretos com muares sõ m e nte.
Noutros tempos, via-se o contrário: os bois acarretav am muito e as muares
pouco . E' que antigamente, as parelhas reduziam-se a um t e rço das de hoje.

- :330 -
A T RAV E S DO S CA MPOS

No rastolho e em marcha Ainda a manhã não r ompe e j á os car ros estão n o


r aatol.ho, vindos do m onte o u da eira, on de o
pessoa l pernoitou. Vê-se mal, mas a labuta co m eça para se apro vei t a r a mar-e-
zia (orvalho) da madrugada - a m elhor em e r ée, em qu e a palha es tá m a cia e
o «p ã o» não desbague. Tudo es tá pois a pos to s: os b ois. obedecendo às chama-
deiras (varas do s carreteiros) ; as muares, cam inhando de arrea re, p ela m ã o dos
almocreves .
Carr et eiros e ce.reeir os, g u ia m a j eito de ch egarem os carros r és-vês dos
( I)

rilheiros, p a r a a í carrega rem à vo n t a de. Cada veículo arrim a a um rilheiro e


cada ca rregad o r di spõe-se «à obrigação», auxiliado p or s eu molheira. O gad o
estaciona e estaca, n ã o a rr edan do p é s em qu e a isso o o b rig ue m . S ó s e m ex e e
baraf ust a , espantando-s e po r q u a l quer coisa .
.......... . .... . . . ..... ..... . ...... ..... . . . . . . .. . ...... . .. .... .... . . . .. . . ....
T r ep an d o para o carro, o ca rrega d or este n de no leito o lenço l destinado a
rec ol h er o g rão qu e sal ta da s espigas. D ep o is, d o cimo do carro, acena a o
molh eira para que p r inci pie a servi- lo . O m olh eira pronto obedece. D e forcado
em pun h o, espeta um d os m ol h os e alcança-o 1080 ao carregador, que, por sua
vez, o a garra e «aq u ar te la» , to man do o u tro e ou tros, até a co ndi cio n ar todos.
E então, o molheira condu z o ca r ro pa ra s egun d o rilheiro, de ond e am b os conti-
nu am a ca rr eg a r , pa ssando a terceiro e q u e etc, s e a ssi m lhes fo r p reciso.
Durante o csrregu ío, d esatam-s e-lhes alguns m olhos. o que arr eli a os dois
homens por t er em d e atá -lo s d e no v o e enr eda rem-se co m isso. E strugem p o r-
tanto as p r ag as ao s atadores da scei« e a quem o l h a v a por eles.

Sobre a ca rrad a em preparo. o ca rregador t o ma as posi ções q ue enten d e


para melhor se desembaraçar. Ora mano bra de pé, o r a de joelhos e de br uços.
D e qualquer forma, sujeita- se a de sastre s ério e sobretudo no :6m, DO mo m en to
crítico em que se empoleira no topo da carrada, para a cerrar e atar. Então,
arrisca-se a um boleu formid ável ou a espetar-se DOS fueiros e fur ar a pele.
Como neste instante o curo desate a rodar sem gov er n o, é q u a s e certo a
carrada tombar, o carro partir-se e o carregador estender- se. pelo m en os . Senão
ficar pior, com os ossos avariados e de tripa s ao sol. à beira da sepultura.
F elizm en t e são raros os desastres fatais, p orque os acarreta s fa zem - s e. em g era l,
com muares e bois mansos, experimentad os e escolhidos entre os de maior con-
fiança. No entanto. toda a cautela é pouca. Erguer carradas e limpar árvores,
constituem serviços perigosos. algo temidos. a que muitos gan h õ es se escusam por
a mo r às costelas. Outros, querem -nos des empenhar à força. faltando-lhes as
a p ti d ões. Não se conhecem. ..
...... .. ... . .. . . .. . . .. . .... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ..... . .... . . . .. . .... .
À. medida que os rilheiros desa parecem, a s ca rra das vão subin do e alar-
h ) Por oc..il o do • •ca rre t o• • o. 'Illllaõe•• coruh u o,u d. canOf d. bo i• • to ...m • cl... ifiu~lo de ce rn tc /ro,. Por
urrclto" cOIl. idlnm.,. .ôm.....l. o. dOI CUTO' d. III""". II mbfll'l coftlacddot por .lmotlC'fu.

- :~ 3 1 -
AT RA v t S DOS CA M P O S

sando até às pontas d os fu eiros-travsdouTo - onde atingem 8 largura máxima.


Daí para ci ma com eçam a recolher e a ssim vão subindo até fe char em em
pirâmide, de t rês a quatro metros de altura.
à ca rra da d e bois é sustida por duas cor da s de linho ou de cabelo. À pri-
meira - 8 tra va de i r a - tra va OS molh o s con t r a o s fue íros, na altura do
tra vadouro. A s eg u n d a, denominada d e inquirir. ou de carregar. sobraça a
ca rra da pelo cent ro , apertand o-a e suge irando-a de alto a baixo e de lado a
lad o, pala evi ta r d esar a nj o e desmancho .
Às ca rrad as de muares di spensam a travadeira, por s e erguerem em cerre s
de enfueiradura s mai s cu rtas que os do s b ois. Para ficarem s eg u r a s, b asta a
corda de carregar.
... . . . .... . ... . . . . . . ................ . ..... . ... .. ...... . . . . ...... . ... .. ... . . ..
o feitio i rr ep r een s ív el de uma carrada
gr a n d e exige conhecimentos e des-
treza qu e nem todos possuem. P or isso, notam-se carradas pequenas e tortas,
entre grandes e corretas, de execução artística e alçado imponente.
Lá no meio do rastolbo. na o ca s ião d e s e rematarem umas e curre s. é da
praxe faae rem-se-Ihes os co m en t á ri o s. O pessoal puxa, pois, das pe ta ce s, e,
enquanto cÍsarrreia, os sabichões de fama. com honras de s lquitetes, (1 ) miram
e remiram o car regu io. E. sem e mbag es nem modéstia. abarrotando mestria.
pronunciam o seu parecer. É muitas vezes suspeitíssimo, mas isso não os aca-
nha. Ouçam o-los:
- E sta~ vai à Camões, oh parente I. . .
O «pa r en t e» . responde:
- Esr ã boa, está... Mas cá a do cura não s e lhe agacha. " S e a tua é poeta,
a minha fa z mímoírs.. . C á o rapaz tem o l h o e unhas... Salomão não fa r ia
melhor ...
Um terceiro. bas t ant e r et ôrico, observ a :
-Àmbas estã o laias, n ã o h á dúvid a ... E ali a do Me lvartscc, tam ém se
lh e n ã o põe pitafe... A d el e e as d e vocês, nã o en vergo n h a m , está bem de ver...
Mas a min ha. d esban ca a t odas . . . V ej am on d e ela tr epaI ... L arga a mais não
po de r. .. E direita... D ir ei t a co mo um f uso I. . , Quem é cbestre, ca n t a
ass i m 1...
Já el es lh e metem fol hage m .. . - d iz a mei a v oz outro, menos farronca .
E pross egu e: - S e eu fosse sB vBz ola d a va-lh e p~las ventas co m a minha...
E fazia-o s com e r abó bo ra .. . Mas d eix á-los p~ra'i slsraosr... Obras, quitam
p alavra s 1...
O obeg ão e te lhe, observan do : - Cada um fa z o q u e pode O que se quer
é m olho s pa ra ci ma... m uitos mo lhos.. . E nrme sa nas corda s Qu e elas, estão

11) I:.t. (l1"1Il 0 d • .J:lUitde • • duheUfio d. "(Iui luo. .... ' u ..... • .. o .uqu. .. II ...... h o . 11'...., 6...10• • 11'0 ... 0 .1 . 6.1... 0 d.
h .!llIldo .o. U IUlClo1". • ....e.. ho.o. ete,

- 332 -
ATRAvt S DO S CAM P OS

a pr eceito, quase todas... Só ficou marrana além a d o Pencuelhoe.. . Al to será


qu e se não es trsmpalhe p1r'ó caminho ... O alma do diabo não se mete
em brio I. . .
.. .. . . . . . . . ... . . . .. . . . . .. . . . . . . . . .. . . . ... . . .... . . . . ... ... . . ... . . . . . ..... . . .
~

Os come ntários terminam e os carros p õem-se em marcha. Antes de m ar-


char em, os bois e a s mu a r es esforçam-se u m pouco para arrancarem os rodados
dos regos d a ra stolb íce . Arrancam -nos, a6nal, de uma «a va n ça d a » maior e, a
segu ir, ca minh am aos sola vancos, enquanto vão na l avrada. Dezenas de passos
apenas, porque a po uca distância entram no trilhado aberto pelo trânsito e logo
adiant e na carreteira. C essa , portanto, 8 a spereza do piso e os cat ros passam a
rod ar melhor. O s almocreves g uiam-nos sen tado s na raleira ou a p é e de arrea-
t as n a mão. O s carreteiros dirig em-nos a pé, adiante dos bois, acenando a est es
com a co mp eten te cbama d eira. O s molheiras de todos, seg u em «à pata», ou
acomoda m - se como podem, nas traseiras das carrada s. De rest o, tudo jo r n a de ia
em m a r ch a vagarosa, tendente a acautelar da s escabrosidades dos ca m inho s e
da im por tâ n cía das cargas.
Arrastando-se sob o peso enorme que tran sportam, os carros rc enchegos
ran gem aos sons estridentes e doloridos q u e os d enuncia à l égua. H á um nã o sei
qu ê d e emocio nante nos rangid os amargurados desses anacr6nicos veí culos, que
se acentu a m ais n itidamente à s horas s il en ciosa s da madru gada e do an oitecer.
A qua lq u er hora que s eja, posto imp ressione ouvi-lo s.. a grada vê -los em ma rcha
ronceir a , puxados por co r pu l en to s bovinos, q u ase indiferentes à missão que
desem pen h a m , meio esc ondidos pelo v olume gigantesco que arra st a m . As car re-
tas e os carros d e muares se guem em sossego, o u vi u do-se- Ih es apena s os e lice-
ges das besta s. ft)
Junt a s e parelhas , toda s cond uzem carradas colo ss a is, pirâmides impon entes..
de a cabam en t o arrojad o, que ora d eslizam pela carr eteiru, ser ena s e aprumadas..
ora se in cl inam e balouçam , ao impulso dos socalcos. E a ssim. transitam at é à
eira , semp re vistas com i nteresse, sempre olhadas com a t en çã o . Nela s cam inha
alfim a messe sasonada da grande cu lt u ra cer.ealífera, prestes a pagar a s can-
seiras de mui tos dia s, o t rab alho de mui t os meses J. . .
.......... . . .. . . . .. . . .. . . . . . . . .. . .. . . . . . . ... . . . . . ... . . . . . . . . . . . . . . ... . ...... .
Percorrido o trajecto, entra na eira a carraria e desde lego abo rda aos
rilheiros, pa ra aí d es carr egar. Ca rr ete iros e mo lheiros conf un dem -se e equipa-
ram-se nesses m om ent os, p ara, entre to dos , d es pa ch arem . E nqua nto u n s sobem
aos carros e d e lá atiram co m m o lh os, o utros aparam - nos e colocam-nos no
rilheiro em prepa r o, que assi m cre sce e alarga, a té s e erguer e ce rrar. Minutos
depois, os carros est ã o vasios e va rridos, o pessoa l sa lta - lhes para cima e a
curaria volta a o rastolho, .zu n ind o pela estrada fora, 80S tores e s olavancos.

/1) A,l jor, .. p.o.a .o.tn do. L"ro.l. d... ID lu rn , ",,,h o •• u . o 0.. f pou do• • , unto• .

- 333 -
ATRAv t S D OS CAMPO S

Os almocr eves vão nas horas de estalar, gu iando de p é, sobre o leito. co m o


eqcrilfbristas ga r bos os qu e sabem d o ofici o . . .

* *
fundas por carrada Para se n ortearem em cálculos e prevrsoes, u sam os
la vrad ores in fo rm ar -se do n ú m er o de car ra das de «pão»
em r a ma q u e lhes pr oduz em a s sea r as, e sobret u do aa xfo lh a s» e etorn as", mais
em evidência. Sabida a conta d a s ce r re des, e conhecidas as co n dições em q u e
as m esma s se erg ue ra m e «de ram», o l avrad or co n ject u ra l ogo do bom o u m au
êxito da colheita. En gan a - se a lg u m as vezes, m a s n em por i sso aband ona o
h ábit o de i nq uirir e d e ava li a r . E por q u e o h ábito es t á arreigado. po rme noei-
ear -Ihe-ei a s bases. Àssim , a f unda o u q u a ntida d e de g rão co n tido na pa lha de
uma ca r ra da , d ep ende d o volum e da mesm a , da n atureza d o cereal , do co m p ri-
m ento da palha e d a g rada das espigas, qu e ta nto p odem estar chei a s, como
f al has o u sacud idas. N o entant o, um a ca na da m ediana. em ca rr o d e muares,
cu jo «pão» esteja g ra do, sem muita p a lh a po r ai al ém .. a t ribu i- s e- Lhe. ger a lm en te,
o seg uin t e : em trigo, 25 d ecalitros ; cen t eio. 28 ; cevada. 40 ; av eia, 70. As q u e
f u ndem i st o. já dã o bem. Que po d em dar mais ou menos. compreende-se.
Os cá lcul os falh am com fr equ ência. p or melhor que se fundamente m .

Precau ç ões contra incêndios

S ab e-se que as searas. dep oi s de se cas, tanto no rastolho, em p é e t omba-


das, como na eira. em rilheiros e ce.lcedou ros, co rr em o risco de serem destruidas
po r um incêndio. re sultante de descuido involuntário ou propósito de malvadez.
Por conseguinte, os lavradores previdentes acautelam -se desse perigo. r ecorrendo
a o se guro, e ceirandc as eiras e fa zen do guardá-las de noite pelo g u a r d a de
herdades ou por guarda próprio. ainda vigiado p or aquel e e até p elo lavrador.
Um ou mais cães a u xi lia m a g u a r da r i a .

Seguros O da s seara s, contra o f ogo posto o u casual. mrroduaíw-se no co n ce-


lho de Elvas há coisa de 27 an os. A companhia Lealdade. do Porto,
por vi a do sec agente Samuel Ferreira Batista. foi a primeira que os iniciou,
segurando em 7 de junho d e 188.3 o t rigo, cevada e aveia do sr. David Rodei-
g cee, de Varche. A se guir ef ectu o u o u t ros se guros, e. p or sinal. t eve de pagar
logo parte de um ao s r . João Miguel Caldeira. então lavrador da herdade das
Esqe ila s, concelho de Monforte.
Pa ssado pouco tempo, a Companhia L ealdade f undi a - se na Tagus. e esta,
mantendo an ti gas normas, não qui s co n tin u a r o seguro d e se a r a s introduzido
por a quela. Entretanto, propôs-se a isso a Companhia Con fian ça Portuense,
p o r intermédio do seu representante em Elva s sr. Joaquim Dias Barroso.

- 334 -
A T RAv t s DOS C A M PO S

que realizou i m edia ta m e n te verrcs segur os, sendo o primeiro a 2.5 de junho
de 1883, da fo lha da herdade das Cal dÚras, do fa lecido lavrado r João Carlos
da C osta.
N ão obs tante a p ropaga nd a d o sr. Barros o, os seguros a grícolas efectuados
em 1883, fo r a m poucos e o mesmo a conte ceu no s d o is anos subsequentes. S ó aí
por 1890 e tanto s, s e g en era liza ra m e a creditaram. E/ q u e a s experiências es t a-
vam fe i t a s e as van ta g ens r ec onhecidas. F a ct ores desta nova e m elhor
ori enta ção, encontram o-los: primeiro. n a seriedad e absoluta da Confiança
Portuense, que t e m p ag o p ontualmente os sinist ros p or ela ga r a n ti dos ; segundo,
na pro paga n d a e concorrência de n o va s co m pa nhias (Internacional, Fomento
Agrícola e outra s) que es palharam e gec tes e circu lare s por t oda 8 parte ;
terceira, n a melhoria d e va ntagens para os seg ur a dos, cujas indemnizações,
de 7fJ o o que eram em p ri ncí pio , passaram a s er to ta is, sem aumento d e prémio.
A indemniz ação integral e a pro pagan da activíssima dos agentes, foi o qu e
mais i nil uiu para a g ene r a li zação d os se guros. Qu an to ao prémio estip ula do ,
foi e é de 800 r eis po r ca da 100$000 reis de va lo r segurado. P ar a a s searas
atravessadas po r vi a férrea ou debulh a d a s 8 vapor, acresce o adicional d e 200
rei s por cada l CO$OOO r eis, a p retexto de ser maior o perigo de incêndio.

E ir as

olocal on de se d ebulha e limpa a sea ra o u s earas d e todo e q ua lq u er


género, chama-se eirs, A superfície oc u pa d a por uma eira varia de á r ea ,
dimens ões e preparo, con for m e pormenorizei em outro lugar. Ct) Eiras circunda-
das por terrenos d e rastolhice ou pastorrais, costumam ser defendidas por um
sceíro largo e bem fei to , qu e evite ou dificulte invasões de incêndios. ( 2)
Para facilitar acarretas, é frequente haver mais de uma ei r a em cada
lavoura grande, funcionando t od a s simultâne a mente ou ca da qual po r sua vez.
Em regra, a eira fica a uns centos de met ros d o monte para on de s e rec olhe o
grão, ou donde vai a comida destinada ao pessoa l. 13)

o sombracho Junto a cada eira n ota-se gera l m en te um es p a ço so s ombracho ,


erguido d e propós ito n o começo d e cada verão, para com odid ad e
da ganharia e dos ch ega díç o a q u e a parecem . E,' um ch oça simples, de giesta ou

J> V.iI· 1I Ila plaill. 21_


b) a .<:d,o cOllSine cm 0-.lIl. faiae eI. t uu.. o limpo Ullt OnellelO toda o ~u , 110 fu'uro d. a • 1:1 tIl.uo•• P n pue· u
por . 110 de Inoou• • t ud. , co . , Ou r ..p.ado· .. O turcao !lo .Ilaed., ele tIloelo • fie u llU, • • <:oaclJcõu de lo.tuuptar qllll ·
(VoU fo, o 4C. pa u . TIl' elol Inadoru ,
(. 1 No. ro cio. eoatl,co l h po, oe( Õ.. do AI ' ll lajo, Iroi ai dUI ele l<tfTldio co""ull. pua 01 ..ueiro. d ... <t orn , pOIl.
datu fouU d.eI.... E IIl f I.... c ov.u .. turu itllPou ...t ... I cODlid " l ...1 a q.. ..lltid .d. de <:u..h IitllPOI .. o. no ecd".1
roeiOl, No for( . eI.. <:o U..ltu, elo prl adplo d <t jv.lIlroo ati . 0 . n elo d. falho, lo elol . Iu ..110 . b. n Ole do l eI. ril h .l rOI •
po'lOldOl de trabalh.dor...
Ill.lu"l. 'lU ."tio • .,., " P.( O'O I l o do'llro. p6blico•• u l. lh . d ol . m prqv.I IlI.. . . elru, cad. 4a.1 co... O 11'11 l O"'·
h,..!lo, • elll 40 ..e 10.1 1"1111" h llll!l pi"',,, p . u u c.u m .. fClltIli, .. 'l o r d lzi lllelll O ' lia. Ae fumi,.. IlUllc . ..
ead.'lIe. I • •1.101010, 01 . ..1.. 0. - la' or d.m .. cr u c. ... m ernllhoulIllall.

- 335 -
ATRAVr.S DOS CAMPOS

d e piorno, em forma de a lpe ndrada, q ue se to r na singularmente apr azível Das


h oras de calor. Nele se i nstala o pote d a ág ua , a ha n ca d a comida e os 'rrip eços
e mochos q ue servem de assentos. R epresent a, enfim , u m local de descanso, de
s ombra ven tilada e fr esca, onde o pessoa l come, b ebe, fuma e pa le stra. nas
h or a s vagas d o dia, 80 a brigo d o sol r utilante que d a rdeja em volta, tis nan do
restolhos e p a stos. O fresco que se goza no interior d o sombracho à hora do
meio d ia , contrasta em absoluto co m o calo r a s fixi an t e q ue se faz sentir Io ra,
na vastidão ime nsa dos ca mpos resseq uí do s.

Uso s N as lide s d a s eiras, a q uantidade d e p essoal o cupado, a s horas de trebe-


lho, os salários e o u rros usos subo rdt nero-se ao processo de debu lha que
está em exec ução. E. como h á vários s istem as de deb ulha. a ca d a qua l a ndam
ad est ri t os certas praxes e costumes que r ef eri r ei oportunamente, ao tra tar de
ca da especia lidad e.
Em to do caso, n a alimen ta çã o do pessoal observa -se t alo u qual u niformi-
da de . q ue r seja no preparo e qualidade das comidas, quer pelo q u e resp eita às
h ora s e lo ca l onde se come. h l Geralmente. come-se no sombra cho d a ei ra e
por acaso n o m onte. s e o m onte fica a po uc os passos. Em regra. al m oça-s e das
7 às 8 horas e janta-se ao m eio-dia . A cei a t em lugar ao esc u recer , nas de bu-
lhas por máquinas, e m a is ta rde nas d e calcadouros e m on t ões. à a ntiga. Nas
m a lha s d e cen te io suprime -se a ceia e. em troca, se rve -se a merenda. aí ao sol
posto. o u antes.
Qualq u er q ue seja O sistema d e debul ha e t rabalhos acessórios, o pessoal
p er n oita n o meio d a eira o u em volta, a o relent o e à fresca. onde lh e calha
m elh or. Se o frio apert a. os pernoitan tes esten dem-se ao abrigo da palha amo n-
toada e n ela chega m a envolver-se, à míng ua d e co pa.


Feição das e i r as Na força das colheitas, quando os s erviços se multiplica m e
a voluma m. a eira torna-se o ponto conve rge n te d e to do O
mov im en to da lavoura . A gra n deza, disposiç ão e variedade do s ri lheÍYos e das
almenara s ; a azáfam a das d ebulhas po r es te ou p or a quel e processo, senão dois
s imultâ neamen te e em separa do; os montões d e cer eais lim pos e a medição dos
mesmos ; as pilhas d e sacos cheios. a g ua r dand o s aid a; o ba r u l ho e o m ovimento
dos car ro s, uns a des carregar em mol hos, ou t ros a ca r r egarem o grão para o
cel ei ro; o d es vio e a re m oção d a p al ha por vários sistem a s, d esde O d a baldeação
para as almenaras e redes com b al d es e panais. até ao en fa r da m en to n a com-
press ora m ecâ ni ca ; e o ut ras pequenas coisas que com pletam a quele m ovimento
ATRAvtS DOS C AMPOS

a fa noso, cel eb r a do e apreciado pelos que es t ã o e pelos que chegam, Ct l tudo isso
en 6m , reu nid o, compõe um cenário interessante, d os mais típicos e notórios da
lavoura alentejana.
A eira nas co lhei tas é sem dúvida a grande oficina rura l. de abençoada
lab ora ção. O la vr a dor assiste-lhe com assiduidade e carinho, coopera nos traba-
los de Iímpese, dá orde ns a todo o mome nto e do q ue vê e ajuíza , fixa imp res-
sões várias, algumas tão emociona ntes que jàmais olvida . Impressões l'is o ngei-
Ias e ô timaa nos anos abun da n t es ; tr istes e amargas nos de escassez manifesta.
É assim a vida do lavra dor e ele o sabe muito bem pelo que a experiência
lhe ensina.
D eb u lh as

Podem pri n ctpi e r entre maio e junho, quando porventura se precisa reco-
lher géneros pa ra rações de gado e fabr ico de m er rocet es. (s} Semelhante apertos,
obrigam a deb ulhas p r em a t u r a s, restr ingidas, em todo o caso, a pequenos calca-
douros de cev ad a e a qu aisq uer m achocas m de centeio. São colheitas antecipadas,
e como tais, por vezes, sofrem co nt ratem pos, de chuvas copiosos q ue prejudicam
e empatam o despacho ambicionado. Por isso só se fazem excepcionalmente,
por necessidade abso luta .
.. . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ... . . . . . . . .. . . . . - .
Como não s urja m o t iv o imperioso que apresse ou reta rde a fai na, as debu -
lhas começam a valer e sem interru pção de maior, na pri meira s em a n a d e j unho
tendo a primazia as favas e a seguir a cevada e o centeio. O t rigo ent r a e m cen a
no m ês de julho e a aveia reserva -se para o fim da época, já em agosto, no pro-
pósito de, ent retanto, comerem dela, nos r i lhei ros, as éguas da debulha, as
muar es dos aca rretas. a bes ta da ág ua e alguma rez fraca. Os t-ilh ei r os de ave ia,
assim dizima d os j unto da e ira, mi nguam a olhos vistos, mas o ~ado engorda a
va por, p or comer à f a r ta e à f ran ca . Esta fran queza não se com pa ra COm a
prodigalid a de e d esperdício de ou t ros tempos, mas aioda t raduz la rgueza exces-
si va, sob retudo nas lavo u ras grandes e antigas, em que se não faz caso de
miudesa s.
.. . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . - . . . - . - . . . . . . . . . .
Sistemas de debulha U sa m - s e q ua tro: pr imeiro, a p a t a s de éguas man a d ia s

em cobra; seg u ndo, por m ei o de trilh os ; terc eiro. a
msngual, por m al ha bra ça l, com ho me ns vigorosos; q u a rto, à m âqo io e d ebul ha -
h J ~ .Ir.. c1uh= c.. rio.u d. dri.. proc.d."d... . u 1;I.. t • • d.. c n n C.!r....il' i...h... '.:II.d.iro. d. nh h.u ..
• 'ucUlI.....-... a= ..oln. e.. (Uon•• ee.. 'raL. ...,U..e... ,UlIa Lo ....ld .. po r 1.,..= .LaI.do dond. ul ...... ra, f ' lido.
" .lIdl,o•• al e
Todo, 411. ch.. ~ .1 0 co.ulda,..do. c:b.,aJlto, • todoa pard lL..I = .1:.. 'OP" d. 'llIharl• • 4luraDdo. E1'lI Irou . 1'lI1;Ift...
d. lu hocorpoum·,. a o tr . b.lh o , or . 1"'01 t em po. I b m de ai aa lul. rc lB. ou para f."uclII Ju••• dmlaf io la Diuo •• 'D"o -
,,!l.m. O"tro., ulh,h~ • f.n alllalli. d. ulll parall l. ou Iml,a ... m.nt.. da Ih. du.= .. u.DI • • jud...
(, I Piu de ""Ido.
'"' P. q'Ut.1I0. I..tra. d. u Du lo q'"t. ai m.lh..=« Ii mp«m t.:o;upcloll.1m.... I•••bm da .a larfllu a panlliuJ em It~uld.

- 337 -
ATRAv t S DOS C AMP OS

dora, movid a a vapo r. O primeiro sis t ema, aplica-se i n d isti ntame nte a t odos os
cereais e l egumes ; o seg un do, uso u - se muit o n o tri go, mas j á p asso u à história
pelo m enos n as ei ra s de gran de m ovim ento; o te rc eiro, excl u si vo para o centeio.
tamb ém vai es tando a b a ndonado, e finalmente. o quarto. o da d ebulha a vapor,
a p revalece r so b re os o ut r os. po rq ue sa tisfaz à maravilha para t odo o género de
cereurs.
..
Calcado uros D á-s e este n o m e às uni d ad es de cer eal em ra ma q ue se d epõem
no las tro d a ei ra pa ra i mediata d ebulha p or ég u a s ou a trilho.
N o acto de se este nde re m , aprese n ta m a co nfigu r açã o de m ont õ es v olumos os, Qu e
de pois baixa m e alargam. à mane i ra que a palha assenta co m a debulh a.
O s ce lca douros preparam -se a toda a h ora qu e seja preciso, mas es ten -
d em -se co m m ais frequ ência de m anhã cedo. E, o u se f a z em d e m olh os r ec ém-
- vind os d o ra et o l h c , n os sitios em qu e se tenciona d ebulh a r. ou se co mpõem
com O « pã o » q ue se re se rv a nos ril h eiros e q ue a braço se con du z o u a rre mes sa.
p ar a o lastro. De q ualque r m an eira, a q uil o q ue s e vai d ebul h ar é previam ente
des at a d o à fo ice para não embaraça r a deb u lha.
Quand o p or acaso se t rata de cen te io, os m olh os, em bora de sa ta do s, col o-
cam-s e, empina dos e unidos, CaDtornand o-se uns 8 0S o u tr os, em ve z de se
e st end erem a es mo e a ba ldão, co mo s e usa n o t rigo. na ceva d a, na a ve ia e n as
l egumes.
Com O centei o principia-s e p or se co locar um m olho direito n o centro do
lastro, e, em volta, vã o-se-lhe encostando outros, em posiçã o semelhante, até o
ca lca do u r o se arred ondar na circunferência que se q u er.
O calcadouro gran d e, de vinte a trinta carradas, convém s er debulhad o por
duas cobras de égu as, a trabalharem nele simultâneamente, mas em separado e
desencontrada s uma da o u tr a . Para os p equenos, de seis e vint e carradas, basta
apenas uma cobra, mai or o u menor, conforme a quantidade da palha.

Debulha por éguas As ég u a s introduzem-se no ca l ca do u r o [ungfde a em cobra


e s obre ele giram aceleradas, em voltas sucessivas, durante
hora s e h ora s, até que à força de co r rer em e pisar conseguem efa z er» a palha,
desprender as es pig a s e d ebulhar o g rão. Mas a n t es d e prosseguirm os em maio-
re s d eta lh es, retro cedamos um pou co para consign ar os preliminar es que ante-
cedem a in tradução da s éguas e bem a ssi m os costumes em voga neste gén ero
de debulha.
P ara o trabalho em qu estão, as ég ua s são previamente jungidas e m linha,
depois d e se prepararem co m f errad u ra s n os ca scos e ca lças d e couro na s quar-
telas. Sendo muitas, r epartem-se em g urp oa d e 6 a B ou 10 ég uas, e cada g r u po
desse s toma o nome de cobra.
À cobra, g ra n de o u pequena, apresta- se com uma corda de linho o u de
cabelo, e tantos colares de análoga procedência" quantas sejam a s ég u a s a

- :J38 -
AT RAv t S DOS CA M P O S

eacobr e r. Á corda (cobr alb.a) prend em os colares. a tando-se cada um a o pes coço
de sua égua, de m odo a fica r em todas presas e encob r a d a s ; - presas em co n di -
ções de se poderem soltar fà cil men te. A seg u i r, sen ã o antes, é enca b res ta da a
égua de uma das extremidades - égua mansa, sabedora e esc olhida a preceito
para trabalhar à mão d o egua rí ço. Na extremidade oposta à «da m ã o», .figura a
..da po n t a», re crutada entre a s m elhores e mais ligeiras.
Dentro d o ca lcado u ro o u à be ira d ele, n os m omentos d e i n tervalo destinado s
às volta s d o ca lcado uro por meio de f orcados e forquilh as, as égua s m u da m - s e e
alternam-se n os lugar es q ue v in h a m o cu pa n do . Assim é n ecess á rio para hav er
equidade n a ex ecução d o t raba l ho. po is que a deb ul h a fa ti ga- a s mui to em d eter-
m inados luga r es e po uco ou nada n o ut ros. Ào passo q ue a égu a «da mão» m al
se mex e. por a n da r vaga ro samente n um giro r ed u zidissim o, a ede p onta» , esta-
fa -se n a m archa, po r co ntornar a galope a circunferência do calcado uro.
A s intermediárias, tr a bal h a m e fa ti gam-s e me nos q ue a cda p o nta» e tanto
menos qu anto mais se a cerc am da o utra, q ue fi ca à mão do eguexiço .
C onse quentement e, de v ez em q uando, m ud a m-se as dos lugares for ça dos e
viol en tos p a'ra os o u t ros m enos cus tosos e as d es te s p a ra aq ue les. I sto n a hi p ó-
tese d e to da s es tare m em iguais con dições de re si stência. ou a p r ox imadas, pelo
men os. Não es tando, B S possantes e t re n a d as oc u pa m alternadame nte a ponta,
o cen tro e imediações e a s fraca s e velhas s u bs tit uem-se n os l ug ares de m enos
custo - en a m ã o » e i m ediações. A s poldras primeiriçss o u d e amansia (d e d ois
e três anos d e idade), nunca trabalham cn a ponta », nem cna mão». Geralmente.
ncam numo lugar de exercício m oderado, onde se fatigu em p ou co.
.. .......... .. ...... .. .... .......... ..... ... ...... . .... ....... . .......... ....... .. ... .......
A debulha por égu as era a preferível antes de se v nlgerix axem as debulha-
doras a vapor. Só a não usavam os pequenos lavradores e os s eareiros que, nã o
possuindo ég ua s, nem as obtendo de empréstimo ou a luga das, debulhavam, à
falta de melhor, com umas bestitas quaisquer, s enão reeorr endo ao s trilhos,
como ainda hoje pratieam ah~uns. Afora estes, todos pr eferiam as égua s, por-
que elas são, com efeito, os a nimais de maior pr ésti m o para a debulha de
ceeee ís. Hoje mesmo, muitos lavradores eontinuam a utilizá-la s nesse trabalho,
que realmente despacham com ga r bo i n ex ced ível.
A auxiliar e completar a debulha, ou seja a cuidar dos ealcadouros, esten-
dendo-os, voltando-os e limpando- os, bem come a rem over e almen arar 8 palha.
fiiura nas eiras o pessoal preciso, sob a direeção do abegão ou de quem o repre-
sente. Este pessoal compreende h omens e rapazes d e diversas idades e aptidões (1)
incluindo velhos e rapazolas, quas e inadmissíveis nas debulhas a vapor e ina-
ceitáveis em absoluto nas malhas braçais. A d ebulha p or ég uas e trilhos, é d e
molde a empregar gente d e tod a a or d em , desde que seja dirigida por enca rre-
gado zel oso e sabedor.
. .... ... .. .... . . .... . ... .. ... . ...... ... ... .......... ................ . . . . ... ..
h) G' II.h!u . 11.11.1. , um ponilo, • • dlu, d. mlatuu com "P U " d. U mpoud••• JOIIl.'. v.j.·.. P."o. lJ.. 11 m_
~.oo '" II". oU • 64.

- 339-
A T RAv t S DOS CAMPO S

Quando se «agar ra e so lta) - Intervalos À ganharia cagarra» antes das éguas


e «so lta» m uito depois. D e manhã,
«agarra» aí 80 nasce r do sol. t ratando 1080 d a baldea çã o da s p a lh a s, do pr é..
pa ro das al men aeas, lim p esa s po r co ncl u -i r da véspera, mediçõ es, etc. E si m ul-
tâneamente, enq uanto un s s e o cupam nas lidas m encionad a s, o u tr os es te n de m
ca lcadouros ou ar -n eixam tri go. Em p ou ca s palav r as. a «família» aga rr a e solta
co nfor me o adian t a men to d os servi ço s e s egundo o vento dá. S oprando d o tra ves-
si a e h ave ndo ca lca do u ro, d eb ulhados. a proveita-se a mar é, li mpando -se a valer
e de von tad e log o ao a ma nh ece r, durante o dia todo e pela noite for a .
P ara m aior d es pach o, chega-se a refor çar o pe ss oal com gen t e d e outras
ocupações. S e, p elo co ntrário, o v en t o é fra co o u nu lo, o trabalh o com eça t arde
e a ca ba cedo, arra sta ndo - s e vaga r oso e desluaido, co m o d esânim o ca r acte rístic o
da ca l m a ria q ue r eina. - «Hoje não d á cubi ça », d izem os traba l hado res.

D esd e que s e p rincip ia. de man h ã até à n oi t e. o pessoal d escansa d u as


vezes: das sete às oi to, para almo ça r e do meio-dia à uma para ja n t a r. A ceia,
comem- n a d epo i s da solta .
.................... . ................ . .... . . ... . .. .. .. .. ........... . ... . . ....
• • •
A debu I ha À s ég u a s entram para o calcadouro d a s s eis à s sete da man hã ,
b otam fora ao m ei o-dia pa r a beberem e com er, (1) vo lta m a debu-
lhar de ta rde e so lt a m - s e definiti vam ente aí às ci n co h oras. N o exercíci o de
debul ha. são co n d uzi da s por um h omem prático - o egwar iço, ordinària m ente
- qu e as go verna e manobra co m um flexível e formid ável açoite. O qual açoite
zun e de vez em qu ando, o r o. em estalos estridente s e inof ensi vos, o ra asse n -
tand o de firme nos quadris da s executantes. E la s compreendem o estímulo,
doi-l hes, alv oroçam-se e anima m-s e. D e princípio resvalam e a f oci n h a m a ca da
passo por falta d e ap oio n o p iso e p or que a palha 8S afund e at é à barriga.
Mas a pouco e p ouco vão-se eq u ilib ran d o e em breve a certam, quarteando e
torneando o calcad ouro sem o m inim o a t r it o. em cir cu nvo l u çõ es donairosas, de
um rodopio es t on t eant e.
Com es se r evoltear f ebril. em q u e o açoite estalefa, pronto se esmaga a
palha à s uperfíci e e pronto ela se tritura e esmaga. m ostrando-se «feita».
À seguir, os ga n h ões dão-lhe volta cautelosa com os forcados, de man eira que
a triturada. d ep o is de r emexida e sacudida (d vai p ara baixo e a de baixo.
inteira, vem p a r a cima . I sto, tratando-se de tri go ou de le gumes. Se se trata de
centeio, cevada ou a ve ia. a palha à su perfície em vez de voltada é extraida ao de
leve com a s f orquilha s e com a s forquilhas se p õe f or a . À que por fim resta,
q uando a debulha t ermina, representa uma fracção insignificante que s ai ao vento.
b.bu o nda b. j. "0. mail prllll:lmo I com 1m e e d lbllr o da . n l., por ..p.co d. ,na . b ou • bor•• mlla
(1) V 'o
Cd Sacode· .. p.u q... o , rIo d.b ulb. do ui. 10 0 I••n o • 11'0 II: .mbralb. 1'01 p. lb • .

- 340 -
ATRAvt S DO S CAMPOS

Enquanto os homens dão volta à palh a. a cobra continua debul hando, mas
num campo restrito, que o pessoal faculta, se pode. Havendo impossibilidade de
ambos os serviços p ros seg uire m a pa r, as éguas suspendem e aproveita-se-lhes
8 paragem, mudando-as de lugares. Ou vão entretanto debulhar n outro calca-
douro di sponível. Depois tornam ao sítio que deixaram e à tarefa que inter-
romperam. E aí, de novo em cena, não esm orecem. Pelo contrário, continuam
a correr g a r bo s a s e áAeis, a ar regac e rem os braço s e a mostrar em as ferraduras
poídss, brilhando a o s ol como se fossem de prata. De lon ge em longe a veloci-
dade bota-as for a em desmandos de confusão, que remedeiam num instante, por
instinto próprio ou por que a isso os obdga o a çoite do eguariçc.
Nesses desmandos arrastam palhas e es pigas, que os homens recolhem à
proced ência para evitar desperdícios de efeito desagradável.
.......... . . . ......... . . . . .... . . . .. . ... ... . .. . . . . . ... . . . . . ........ . ...... ...
A debulha pros segue, entrecortada pelas voltas de qu e a palha ca r ece, até
ficar em condições de limpesa ao vento . Fica, a 6.nal, com a palha gro ssa ou
miuda, ao estil o da localidade o u ao capricho do lavrador. (1 ) À s ég ua s retiram
então p a r a outro calcadouro o u desencobrem de vez, s endo horas de solta .
Saem enfim da refrega e s a em ba stante enxovalhadas, de cabelo sujo e empas-
tado por m otivo d o pó e d o s u or . Ma s não revelam cansaço, t ão alegres se
mostram e tan to rincham para as crias. (,) Mais tarde, ou lo go a seg u i r, n o acto
de as desprenderem da cobra, vemo-Ias de n ovo radiantes e dnchonas, a darem
de mamar às crias e a af~arem-n as com ternura . De vez em qc andc esquecem
os poldritcs e tratam de si : - sacodem-se das moscas que as perseguem e d as
sujidades que as a feiam . À s mo sca s, o s uo r, o pó e as p rag anas incomodam-nas
bastante. POI isso, uma vez em liberdade, toda s alçam o rabo e todas se espojem
na terea . Daí a nada, éguas e cria s, tudo desata a correr e espin otear, em reto uçe
brava, a caminho d a água e do rf lhei ro, para refresco.rem o sangu e e r estaura-
r em as forças. (3 ) Trabalharam oito a dez hora s, com ligeiras interru pçõ es.

(iJ Co..fonlll i o 'Irul, ...1m dl mora • d.hlll ll• . O qu. fIl 1U I'", ....110. " .... d • •• " ' \ll r • u ...d• • O. rTi.OIm01,.
• • rt llul• • O. t rl'o. r ij o. op ô. ... n.Luflld. Il uln ••ob ,.tudo II loh. iro. i . ao l llO d po do. d\lrhlo• • f.t • • dI qll. (......
tIo &trlli . do .. COllltn. IlU IIpl,u • tIo &1 lltOl• • • p.U••. Pu *'11"
~ 01 lri lllo. o d.bolll.,.... cOII..... l ~ll t.JII ~ ll t • •
purh... de "'lli10 m.b 1.... '0 do qu. 'u. O. OO IJ'O' ruul •• Cllr' metu rarr'" ao. c.ludollrO'• • fi.. d. :.-od ue•
•dl.... t~ 01.. l,t . .. • lh . f.rilllau'" o ..,..1'0 .
h ) E,,,qu," to .. """ d.bun••• , " ui.. <fU' 11111 lI.rlnlum Ulio . a u n . d.. r ... q••1qu., rllu.1 011 rnCldo , ' 6.1<lmo.
C., fUlh• • o.hu. Nio h''''lIdo cerudo. '" ,oldrhOl Gn... em Ilhnd.d., 110' arredar.. d. cira • do Jilhdl'o d..... i • •• lId.
ro••• • No Iilh r lr o p.u... ,Clllro, d.poll d. . . (. r lu ..... Prtler..... 10....' ... lo 1." olun... •.. 'II U, . . 111111 . lato pn-
ItI,h. " ..., ..1111111""0 d. d.hulh•• pOT rOIl" 'Wllle o pu.o.l U P'"t1 ·0' • fI · lo ir do nlndoluo. M .. I~ im .... em ..olt. r •
...It •• du ,"" d. .. n n , . 11«0;:. ..10 .. 1110 ••f.d'lII d. r uotol• • ;" q.llo ' .f.d. _lllu m....i to p.n 1U1U n . rhorll.d d u 011 tUu
.lu .Iu . dePOi. e,.fil~ir... ~m II. rob r., f.ulOdo li'lOn. O CIO' , O 1... t1...10 d. 11.11.,10 1•• •
11' POl1 0 u i. dl((cll n1rular lo h 'UII ' for .... i •• i rlc. q" . 1 " par,io d. u n,,1 «\I' '1111 ' . .. . d.hul h . ~= ud. du. 1110
n d dU Pl o, 4,i to atrHlI.1r·n·lh. II ,,'oiatl I
Tri,o. moi.. 3 5. 40 d.ralitro.
Trláo, r ij o.. sJ . 20 •
C'" f.l o . • . 40 . 45
C d. . 4j • 10
A I. • • • 60" 70
la to do mero. dlrolo., .... qu ' lIi o pode h....., . h. 01Ilt. cOIl6 .a, •• Pu. II du p. r llo . 111 qllll tlo. CO IICOfll1ll 11111110'
fatto l u 1111' 011' 11111 de çoudl ,5u ..u lb.l• . Nll...n o. ' P1idilu • d"'lIIbn.,o do p,.,o.l. ui. ,lo do " ' nno .... d. bulll . , CO Ill
PO \lU 0\0.111.,,11. p. III• • d. ..pi.... h.m ou 111.1 " U d UI di .... ".õ.. do calcad ollro; lr mp. utll" do dI • ••t c.

- 341 -
ATRAvtS DOS CAMPOS

Limpes a ao vento Na maioria dos casos"


calcadouro debulhado passa a O
imediata limpesa. Só permanece por limpar. à falta de
vento ou quando se impõe o despacho de o utros atrasa dos. Também acontece
limparem-se dois 80 mesmo tempo, mas em se parado e com o pessoal diverso. é
claro. Um ou quantos sejam, antes de se pa ssar em à fo rquil ha, sã o p r êvi amente
ancinhados e varridos da circunferência para o interior, afim de ocuparem menos
campo. Perdem então a forma circular q ue tinham e adquirem a CJ:uadranâular,
melhor ou pior delineada.
Quando um calcadouro ocupa área grande, o abegão traça-o prê viamente,
de norte a sul. dividindo-o em duas metades. para a do lado do poente ser
limpa em primeiro lugar.
. . . . . .. . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Em regra, as horas da tarde são as preferidas para os serviços de limpesa.
P r efer e- s e a t arde porque a essas horas há geralmente calcadouros debulhados
e porq ue das reês em diante costuma soprar «boa travessia» (vento oeste), cir-
cu nstância valiosa de si ng u la r apreço. O vento trnvessio, batendo r ijo e certeiro,
como de ordinário bate nas tardes e noites de verão, despacha mais e melhor
q ue outro. principalmente que o do suão, o pior de todos, pela sua not6:da e
a bo rrecí vel inconstância. C o m efeito. o suão ou leste, tanto se faz sentir em
ra ja d a s e .redemoinhos violentos. que baralham e transtornam os serviços, como
se cala de todo, durante ho ras e dias. T em po desluaído. horas de calmaria asfi-
xiante, em q ue as limpesas chegam a i n terromper-se pela impossibilidade abso-
lu ta de prosseguirem . E mpa tes de eiras, para desespero do lavrador e arrelia do
a begão . A os gan hões" agrada-lhes .. .

De len ços ao pescoço, a livrarem - s e da s pcagen as, homens e r apa z es. após
os preliminares de scritos" entram n o lastro" coloce m-s e em linha e dispõ em-se
a limpar. A limpar deveras, por meio de fo r q uil has e com a a cção d o vento,
factor i m pres ci ndí vel.
O abegão ocupa a ext r em a d e o n d e cor r e o vento; os ganhões b cam entre
ele e o pelheireiro - um ga n hão q ua lqu er, colocado na ou tr a extrema. de o nde
de svia a palha q u e o vent o arrasta. Desvia-a d e vez, a ficar fo ra.
Abegão e ga n hões, em posição d e atir a do res, en ch em as forquilhas, a tir em-
-na s a o ar e desped em-lhe o con teú do , s eguindo de norte a sul e vice-veree.
E o vento lá abala com a palha, a u a stand o-a pelos ares, em t orvelinhos capri-
chosos e poeirentos, no passo que o g rã o cai no solo, de mistura com os troços
de palha e o u tr a s impuridades. Por seu turno. o encarregado a ven t eja com
maior desembaraço e preceito. A sua forquilha, d e dentadur a mais cerrada que
a dos outros. enche-se no gr ão j á «a ven t ej a d olt pelos 8an hões. Faz as pelas, (I)
que assim se diz em frase ologi a de eiras.
(lJ V.I .(uc.udo o ,tio II..,. de p.lh • • "II .iad. m ui10 .ajo <toa tr OfO• • u<tho, dll upl'lI. boal<to. 01 .. I,a u . 10r_
r ,}". eee, t eafi lll. o 'ri o li 'l'.IlI.j.lio p.lo. , ••h,}u • Cila. d• • 0"0 1 .0 O aD.,lo quando o . nAU" . di_lh. . . .oll .
pred.. pu. u u a jt:i lo d. . . u feader p.la ei ra . 11I f.b ... pu.I.I Cilll p.l.,.
d. ao -.lll'. O. aacido, p• • t.l a.-a..
oI.pol ., utaado· ... 01.. Im paddad.. Cila. <toDtilll.. t t.l u& ue. o 1IIo th o 00 : '1ue lhe <th.llla. "du.

- 342-
ATUAvtS DOS C AMPOS

Em su ma, o grão eaventejadce vai tomba ndo para o la d o do vento e a palh a


segue ao inverso , em rumo oposto. S e por ve n tura ai nda cai d en t r o do calca-
do uro, de n ovo a atir arão ao a r, para sair d e v ez, ou p a r a cair próxim o do
palbeir eir o e este a desvia r. À ssim às avança das. de norte pa ra sul e de sul para
n orte, desempallia-se ( 1) um calcadouro em d u as horas o u men os, desde que o
ven to ajude. P orq u e sem vento d e feição e certeiro, n a da de jeito se faz.
E m mu dan do de repente. que bata de ca ra~ ou às avessas, com redemoinhos
impertinentes, o trabalho t rans torna -se, a eira suja-se e os Limpado res enfa -
dam-s e. En fa dam-s e, p or não p oderem s upor tar as palhas e a moin ha, que lhe
fla gel a m o rosto e lhe ma r t irizam os ol hos.
.. ........................ .... .................. .. .. . .
Desem palhagad o o ca lcadouro. varre -se-lhe para dentro os bagos arredios e
o m a i s q ue se encon tra. Tudo va rr id o em volta. amontoa- se s u &cíen t e m en t e
pe ra, em mo n tão ou à pela, se limpar a preceito com o auxílio das pás. À palha
saiu à fo rquilha. como &cou di to. R es ta separar os cachos. (21 os b onicos da s
ég uas. etc.
O a b eg ã o ou outro homem entendido. senão dois. de pá em punho. entram
a contas co m a tarefa. a pedejandc o grão e a m urraça que o envolve. Em fren te
dos homens d a s pás trabalh am os d os a ocinhos e baleies, trê s ou que tro pelo
m en os. Q u ant os s ejam. à medida q ue os bagos caem no chão. largando nuvens
de pó. vão - nos balea ndo e a ncinhando a capricho. extraindo -lhe as i m p u rida-
de s. T a n to trabalham os das pás e os dos anci nhos e baleias q ue em menos de
uma ho r a o mo n tão está passa do e limpo . - «P r on to I» - di z o a be gã o. cr av ando
a pá no m ontã o. E os cama ra d as imitam -no. l argando as ferr am en ta s. Depois,
vai d e cigar rada e de pe leio, s obre a f un d a do gé nero e da qualidad e que aparen ta.
... . ......... ............. . .. .. . . . . . . . ..... . . . ... . . . . .. . . . .. . ... ., .
o trigo limpo e amontoad o vai depois ao crivo ou arne iro para se .ioeire r
da s sementes. torr ões e pedrinha s. que porventura lhe restem . E q uase o m esm o
se faz a o cen teio com muita areia. o que é i n evi t á v el n a s eiras tér r eas. não
calçadas . P a ra esse caso. emp r ega m - se crivos d e ciranda. q ue sepa r a m ràpida-
m ente o centeio da areia que o suja. N a cevada e n a a v e ia. p rescinde- s e d e
s r neiros. Co nforme &cam da limpesa à pá. assim se mede e ensaca . Dos le gu -
mes. arne íea-se a p en a s o g r ão de bico.

Mal h a s A malha é uma d ebulha b ra çal que s e a plica a o centeio. D esem pe-
nh am -na hom ens r obus t os e s abedo r es com O auxili o de msm gueis.
Est eve muito em vo ga noutros tempos. ainda ho je se v ê nas lavouras pequena s.

c1u. db.-•• Jcum p.I1••


( I) N u ,.r .
a i o dU lllllp.lbu.
Is) Cu"". chcm am . u ao. tn.tlll.ato. d.. IIpl ~ ... 11.0 fado 0'" 1m P"-'1I . u u,.,•• iii • • iI.. l h • . COftlla ádo. f
duo. c". mu. u . p co •• itar.... qUi U ' )lI'01'ci l. rc.l a l •• 4.boU••ado · .... par u'"'' . 1.... .. 11 d•• • ir... . llll C. ...po Md ol'
du.... -Ib. ' (ln, ...
O. u chu d. c.d. .. , I d e d. ue.. ! ..l o- n ; a.tlado • par u. "D ili 1II0D ll0 .(.. udo. qu . . . d.hulh• • Hill". ao fi ... d.
#pon. ht o ao c.... d.
I I u lu.lr pa rei o .... ull.d. qg , ... lh • • p C II I.
A TRAv t S DO S CAMPOS

mas virá a aca bar depre ssa, t ão pouco s e vai usando. Àlém de raz oes eco n óm i-
cas, m ais ou men os d is cu tí veis , determina esse abandono, não 56 a r a pidez e
perfeição dos modernos sistemas de debulha, como a falta de braços e a expan-
são da cultura cerealífera. Às colheitas de h oje, p ela importância que têm atin-
gido, i mpõem O abandono d e processos morosos, qu e, a manterem-se, dariam
em r esul tado n ão se co n cl u ír em os serviços na quadra estival, ú ni ca apropriada.
O pe ríod o propício p ura as malha s, limita-se ao mês de julho e à primeira
qui nzena de agosto - a épo ca dos dia s quen tes, de orvalhadas li geiras. Dos mea-
dos de a gosto em diante. a s mareias (I ) costumam ser Brandes e isso não convém
pa l a o ser vi ço em questão . Poc co n seg u in te prefere-se d ebulhar o cen te i o à
máquina e até com ég ua s. Mas em primeiro lugar opta-se pela debulhadora,
q ue no centeio despacha mui tíssimo, con tra s ta n do a valer co m o ron ceirismo
dos mangua;$.
No entanto, a s malh as f o ra m tão usadas outrora e obedeciam a praxes
tão originais. que ser ia indesculpável o m i t i- la s. Eis, pois, esses p ormenores,
r eco l h i do s, é claro, na região elvense, ou para melhor na zona d e Santa Eulália,
onde a cultura d o centei o é de importân cia primacial•
. . . . .. . . . . .. . . . . . . .......... .. . .. . .... . .. . ... . . . . .. ... . . . . .. . .. . . . . .... .. . ..
D e o rd in á rio, o ser viço da malh a executa-s e num a eíra d e oca siã o, melhor
ou p ior preparada em qual qu er vale inculto. «bem lavado da rraveasie» .
O p essoal co m põe- s e de uma eca m a r ede» de: oito homen s e excepcionalmente
de 10 o u 1 2. O essencia l é co mp utare m númerO par. Se for ímpar, o que só
acontec e p o r C8 S 0 d e f orça mai or, os me lhadores tra balham irregularmente. de
m á von t a de - malham à cadela, f o ra das regra s que a ex pe ri ênci a ac o nsel h a .
Também es tá averigu ado que oito homens d es pac h a m relativamen te mais e
m elhor que 10 o u 1 2. Nas eira s d e searas muito g ra n des, cos tum a m fun cionar
du as o u rne i a eca m a ea d a s» de oito homens cada uma, trabal h ando em separado
ou m esm o j untos, se o to ta l d os h omens n ã o ex cede a 16. E t a n to podem per-
te n cer à ca t egoria d e «c riados a n u e ise, co m o à de g anhõ es assoldadas o u à de
jo r n a leiros a dia s. D e q u a lq ue r classe de q u e procedam, t odos tomam a classifi-
caçã o tran sitória d e m e l b e âores e t odos sa bem d o ofício, àparte os novatos-
a pre n dizes - um a d ois por «ca m a r a da» .
Cada g r u po o u ec e mar a da.. é dir igid o po r um mandant e - o abegão ou o
so ru, e, no impedimento d e ambos, por o ut ro criado anu al. de con fi a n ça e
desembaraço. Se, contra o costume, o p essoa l consta de jor n a l eír os a pen a s, o
q u e de ent r e el es «f az cabeça .., intitula-s e manageiro e ga n h a 40 rei s diários a

(l I Por m. re i,. 11..1' 0, "' -,,' .. ",mi:l.d.. d.. o...· .II••d nub l.do, qu • •" . n u ... fu qo. nf l "' l o tl ou ........blil d•
• ,o.!o. !.tI " ... ere'" . .. ucl = " .. 00 .. ubU q u. poe uu, °
co= p. nlt.. m. embora '011" ''''0'0 u olt.. depoI. diu ipã · I...
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• • do , 11 "pl, u , • p.l b... pó.·.. cot ne"," . 'Iu. ,.orl"(r I'.... . S 6 POrt , O di m.lh. prou llo." em II ' 01 II ''Iu tee odo
" or .IÃ"...... bort' <

- 344 -
T ransportando palha enfardada - For m and o o fra scaI
ATRAvt S DO S CAM PO S

mais que os companheiros. Que isto de um assalariado de ocasião go v er n a r


malhas. nunca foi vulgar nem vantajoso.

Enquanto que Das eiras de debulhas por égua s se moureja desde o alvorecer
até ao pôr do dia e mais tarde, nesta s exclusivas de malha. agarra-se de dia
claro. solta-se cedo. com sol às vezes, e nas h oras úteis dão-se intervalos de
descanso demorado, aliás indispensáveis à violên cia d o trabalho.
À malh a do centeio é p or assim diz er uma empreitada diária, de despacho
e rendimen t o sa b id o . Pronta a tarda da praxe, está o jornal gan h o. embora
so be je o dia. E sobeja quase s em pre. Esta circunstância apreciam-na tanto os
ser viçais, q u e pOI ela preferem a malha a o u t ra o cu pa çã o rural de muito men or
vi olência.
* * *
Vai de erguer, a o aclarar do dia . Quem quer, come a cunha ft) e q u em p ode.
fu ma um pouco. Os previdentes consertam os manAuais. cosem o s sa pa t os e
fazem vassouras. Ligeiros entretenimentos, de aprovei tar o tempo, até serem
hora s de trabalho.
À.s s eis da manhã principia-se. De o rdin á rio pri ncipi a - s e p or s e a im en a rar a
paiha malhada d e véspera e de véspera r emovida pa r a o sítio em q u e vai ficar.
C om fo rca do s e baldes, os malhad ores a volum am as a lme n a ra s em preparo.
ergu endo-as assim, d ia a dia, met õdicnm ente. D ep ois, à medida que as vão
el evando, pe nteia m - n a s co m os ancinhos g ra n d es e ba tem-na com as a Suilhadas.
Dão-l hes enfim a forma e solid ez necess ária para esc o a r em as ág u as das chuva s
e resistirem a os im pulsos dos vendavais. Também se usa não se almenarar.
Em ve z di sso, enfarda-se o u enfeixa-se. S e se enfarda, não são os malhadores
qu e enfardam. Mas s e s e enf eixa. a el es i nc u m b e esse encargo . a essa h ora
matinal. m ed ian t e g ra t ifica ção ou se m ela . D e qual quer maneira. a almenararem
ou enfeixa rem, d emo ra m pou co t empo. (2)
.. .... .. ....... ..... ......... .... ..... ..... .... .. ..... ... ........ ...... .... ..
A í à s 7 ho ras o u a ntes. confo rme ee ca r a d o d ia», o man dant e susp ende a
arruma çã o da pal ha e t r a t a d e estender a cama da, (J) - o ce nte io qu e se p ro põe

(II U.. p .da~o d. pio e q...lj o Oa ...hoa....


12) Palh a d . u alllo q a • • • ' Dfll.s l . duti Da-1Il • •achimlalOl di 'D1<U'ÕU • a lb u-d .. pHa ...10. d a cua ou p ua
,. .ad a ' 0 p6blico. No el'lt.a to . ma h .. 'fi'" o. m a lh adOfla • ouuo, Ienl~ll. 'l'If.l1<ulI al'um• •m u p u l d o. pa u a. I a ..
"'Cluldadn u u lt.. , m. d llllll . rODr u . i o ob u q \llo u d o la"'rado r, lo II~ .uud. obl. ram p.rml lll o do amo pan ... 1 ho ru
,.., u ptll I'It U ' 'D Dllla o a o utra c~na dha d. p.U•• e m fdx ... aGm d • • 1 lum ",. .. der po r . <la cObta • d•• 1 l u fu iu m .hlun.
10'lõ". O a"'o Dlo I ..pobu re pOJ' 1110 • o r rla do nm ld.la a .ua ..Id • .
\tI} "" ca ..ad a lIan o ito home• • , a bu D" u ma ir.. d. 17 • 1.\ ..111'0. d i eomp l i ....l'lto l'OJ' 9.' d e l ar,un, ou u i a m
160 ••rro l q Uld rad o• •IIJ' bd mad. m' DU . A que I I uI.ade pua ..... h a1D ' D', rI'a la-.. pOJ' di ....a l õu c:on u pood n. t u a o
abUO d Oi . al hadou•• Da PJ'opoJ'Ci o q UI I' J'l. u pua. d o. oito . tllldo ••mpu elll ..lUa q a. oilo hom l D' dUll lch . ao' .ala,
nlllhamllDl" q D. l O, 12 ou 16. l.m lodo r uo • • p.u qa.lq a cr iaip6t1 I1 , a m.lor aa m.aoJ' 1"II.r Ud . d i u ..ada, d.p.ad .
a cri lid o -d. Cla. .. a pupara. O 'Dc&.nl, ado bri ollO. ri.r• • IItlad• • fn DU. Ia" tn..o• ••<lucio d. qo. t in r' II .
• ,,!to, KIII •.UII' U . O d. ol:ll.iOll "'a Dd u ~ u liaa • la ...a • animl·U" lDo11l0 roato. d uldldo • 111'11' .uill......o ..
' J'W' u lorc. , a lo .. llu Imllortaad . rom o la. coa.... II.ilall d. a ll ha ddxu ma,iro UD I.III Da p.liaa . O p.rtel~o .o l n
u m.4.. " qo'lIa., • pUI.1<to d. a i '.C'1Idir hlm. o qOI . ... u m, J" ..:lral• .

- 345 -
ATRAvtS DOS CAMPOS

malhar até à hora do meio dia. Nesse propósito começa por fazer a cubela -
um. cordão de palha deposto sobre o last ro d a eira, na extrema do nascente.
direcção de sul a norte, indicando a extensão a ocupar. D eli m i ta d a a cubela, o
abegâo manda vir molhos dos rilheiros que ladeiam a eira e os ganhões vão-lhos
trazendo. O e begâo e um auxilia'! desatam-nos, desdobram-nos e estendem-nos
Estendem-nos «às fiadas», com 8S espigas para o lado do nascente em condições
de se não emaranharem . POI último. o lastro enche-se e a camada vê-se esten-
dida a capricho, assemelhando -se a uma esteira descomunal. que ali s e desen-
rolasse. Então os malhadores miram -na e remiram-na, exagerando- lhe as
dimensões. Para t erem que falar, «bramam » que as fiadas são muitas e os
cav alos (v darão que fazer . - «Abóbora com esta assorda/ . .. Esta, desbanca à
de ontem . . . E às dos mais dias. . . Neste caminhar estrempolho-ee todo em
metade do tempo . . . Não bonda a jorna ser pouca, senão tirarem-nos a p eleI...»
O mandante não responde. A chiada dos ganhõea é da peça e da peça é ele
n a o responder ou responder com «anedotas», ao consoante das que ouviu.
S em fazer caso do que lhe dizem, ele e outros passam a travar a camada, nas
s uas quatro faces. Travam-na . encostando-lhe um cordão de molhos intactos,
ain d a por desata r. E' precaução da praxe, tendente a amparar a palha n a
ocasião de ser malhada . Feito isto, os malhadores retiram para o sombracho,
o nde os a g ua r d a o almoço. Entretanto, o centeio estendido vai aquecendo 80
sol, para me l ho r espirrar, q uando os marig u ais o z urzirem .
.. . .. . .. ..... . .. .. ... .. .. . ..... . .. ... "...
" . .
À lmoça m um as sopas ab u n d a n tes, tendo p or con d uto a zei ton a s ou q ueijo.
Àpós o almoço e a s f u m adas s ubseq u en tes, ca da home m pega no seu
rna'ngua] e to dos se dirigem pa r a O s ítio d a ca m a d a. E ntram ne la, t omam
pos ições Cd e com eçam. -a malhar o primeir o cavalo, na dire cçã o d e poente a
n a scente. C omeçam por uns prelúdios de ens aio, a experimentarem os «pa us» e
a mostrarem as "ap tidões. D a í a nada a s ex pe r iê ncias a cabam, o co m passo
acerta-se e a t ar eia d es envolve-s e, à voz e g esto d o m a n d a n te . E n qu anto os.
ma.n guais d os de uma d a s fre n tes s e erg u em e r evolteiam, os dos da out ra
frent e caem de chofr e na p al ha e n as es pig as, z u r zi n d o -as d ev eras, com a certo
e prontidão, A refrega é rija e as pa n ca d a s retumbam, num vai-vem caden cioso.
que f az saltar o gr ão e t r essudar os h omens. O sol afogueia-lhes a p el e e a1aga-
-lhes o cor p o, mas eles, p or enquanto, desd enham do calor e d o sol com o encas-
cados no «ofício» e avezados a ressolenes. Ora m alham a p é firme , enê rg ica-

CtJ Por ~"1l1o• • Iu"enle ndem-u .. peruIce em q'H! erbi tri da me n te Ie dh 'lde e um ed •• a6 m de te ir mlU...ndo por
p.rru . 101 p•• el .. e n i o de ub o a ra bo. um IMumltlnd u . P or t a nt o. ud a 11m uu lo . cOJlua d a 1'or,io d. p.II,. e di elPl,
, ... qu e fie. de pUllllio entre o. Il1llb.dor u I qUI d u .io m..ll'a Jldo (u n te . (u n te. p ela fo rm a qUI " .ed leiall tl.
À clmad.. para o ho h Ollllnl ~ O .tU III" - " ~ o mp or de du u ..lolI. talhad ol , "onfldll . a caprl eb o do cn~a n e'ad o .
(2) O CllpaJld o a n:rrl ma da uma d.. qn e be. aO lul . 01 lIIalb ..do r .. dl .tdl m_u em doil , ru pu .II t16mero l'", al, eoloeUI'
' u .m hln te u m do ecsee , a.mbo. 1m l iaba . I di permlio. a upari-Io• • be a o el n ul o que 'l'io m alb u. a CfU' .t. dll U II O.
u llla .I.. pu ecl .. o u U ..JOII e m li'" a fai n l III dj"ld •• N OIllI .I.. po nt.. di Cf oalquer du Ii nh u , 111111.. O ule n u,cdol
Dou tra • .lu opo. t .. '" do maa daa tl . m lnobram oa d a pka - o bomem ou b.om nu q"'l malb am de . 0.1.10 co"" for ça II jeho,
pl e. não a p.lb.a . 01... [nlre 01 .l u pOM .. I 01 d a pie.. trab albam 01 princl piant...

3M; -
ATRAvtS D O S CAMPOS

mente, ora a va n ça m a passo, da ndo exem plo os das pontas. (t} Ao cabo de alguns
m i n u tos chegam à extrema do nascente, abatem os m e nguais, tomam fôlego e
estacam, por segundos. São momentos de alívio, em que se enxugam de suor, a
respirarem ofegantes. E,' que esta primeira zurza de mangue l é das mais força-
das e custosas. E,' aquela que assenta n a palha a descoroa r - a ba tê -la em cheio
e com força. quando ela resiste muito, por estar unida e inteira.
D a descoroação passe-se a nova tareia, indo a efeito do nascente ao poente.
E a seguir, chegam-Lhe terceira, em rumo oposto ao da segunda. Três sovas
tezes no cavalo atingido, rematando a última por um estímulo do ebegão, que
brada alto : - . Farte I . . . cForte I.. repetem aos companheiros, obedecendo à voz
do chefe. E os mangue is de todos, vibram e revolteiam-se nos ares, descarre-
ãandc pancadas de arromba sobre o colmo do centeio.
Pronto um cavalo, tratam de outro e outro, até mais não haver. À malha
d o último traduz um arranco de energia forçada, que seria insustentável se a
refrega prosseguisse. De rosto rub ro, sangue a escaldar e suor a escouer-lhes pela
camisa à vela , os malhadores não dissimulam o extenuamento que 05 oprime.
M al acabam saem da camada , atiram ao largo com os me nguai s e caminham
a cambalear para o sombracho. No sombracho entram meios tontos e aí entra-
dos, ei-Ios a contas com a água do pote, bebendo-a sôfregos, parA refrescar
a va ler os pu lmões ressequi dos. C om que ansiedade eles emborcam o latão da
ág ua e o disputam de m ã o a m ã o n um a avidez glutona, de sede abrasadora!. ..
À água empanturra-os e o cansaço r end e-os. U ns a ss en t am- s e o nde podem,
a fumar devagarinho e de viseira car regada; o utros estatelam -se n o m eio d o
chão. sem f or ça s n em pacho rra. E à so m bra e à fresc a . a proveita m este p rimeiro
intervalo de des canso, indispensá v el e r ep a rad or. E ' a { er r e, co mo se diz lá nas
eiras. Vint e minutos d e corridos. a lerra termina e o l a bo r r ea t a- s e.
Saindo do s om br ecb o arra s t a dos pelo d ev er. os m a lh a dore s des trin ça m a
palha malhada e de sviam-na p ara fo re co m os fo rca dos e a ncin hos. D ep oi s
dividem-na e a m o ntoam - na em borregos, p ara a r em overem a b raços. D e ca da
borrego tomam co n ta doi s hom ens, q ue n a ba se l h es i n t rod uzem d ois me ngu a 'is,
de lado a l ado. a s ervirem de padiola . E com os me.ngu e is os l evan tam e rem o-
vem para o sítio da s a lm en a r a s. Os borregos representam m on t ões b ojudos, de
peso escasso. em relação ao volume. Por isso m es mo, tran spor tam-nos sem custo.
quase a correr, dando ensejo a episód ios engra ça dos, se en t re os da camarada
há tipos estúrdi a s, amadores de partida s. (d

11) o. 4u . Ili• • U U I pu', •• p ~.cI. d 1. l,ulII 111.' c"",p."",• • ' CII..m i :-p.. i~lIcl . ou clum.-
...1• • • 111 poda e e.. i... u 01 0 •• P .... cuod. cI. mal1t.nl .111. f.l.o. bol.cI. O" f.1'O d. u mp•• h.clla t • • lill" • m.h.. .. ..
. .110...... &'lIt.l..o. P.r I o••". pn ti com f.It •• M' .cr. .... 1I1I ee....o..odo. 1'.1•• com p' IlL.uo•.
(.l A. mal. f.. td.cI. , • "'oillll' 'lu.I u· IIl. JLAdor co rp.. I.lI lo. cI. co.I.. lo CO.. oo~o•• IIl"oclQl·"" 'Ocop. lU n .. u.
cI. _ '-rr.,•• d •• "uL• • oc .. lt• . " um . u . o d..f.clo.o. [1I "U• • tO. . . .0..lo l.do••• p". . . . . bl.. udm.....L.. P....
C_....eoRllO olol. llOonl••• In.....orl. " • • p.lh. 4 11• •o~.h" o l.t.,lo. O . IlIn.do. CO'• •• I' .. lo 111.0110 I.mp.bo• •
CUI'tJ'u. 10• • ".rulO .I..do. cojo pu U .... ... m lo••. M.. ",".ot... l.p'Ddo. "III. p.o rullu covo • • Por &. lu·
u- • fudo • O .lothl o d od .. ..·lb D. 1.111. 1'" ...1... COIII, o. f.DIO•••••or• • -lb.. do lo d. palh. . . . .I h.m.m
'KoMido •• 11' .. .t-I.. fil.· tb.. h pu pronuUlcl• • •r,h · lo•• t o. h' · lo•• !..otlo • nni.d. inomp. D""'O'" . . .
I""'' 'QJ • • 0. 1lO1•••••• d. ho. ou _, c. ndute. O. loi oo ..I. , un "''''111
por iuo •• 00••

- 3~7 -
ATRAvt S DOS CAMPOS

À ca r :ret a dos os borregos, reun e-se a palha que a inda resta malhar - po rção
d i minuta, que, por ter ficado debaixo da outra, não f oi batida s uficientemen te.
t por tan t o ba tida de novo e com fo rça, nu ma tare ia ret u m bante - a remelhe
- que se despacha depressa. À cto contín uo . salta f or a o col mo r emalhado e a
seguir estende-se uma nova camada, semelhante em tudo à q ue se acabou de
despa char. Esta de ago ra. destina-se à tarefa da tard e, fica n do em condições aí
80 meio-dia. No entanto. só se malha ao levantar da sesta. d as duas horas em
diante. Neste meio t empo. o sol aq ue ce-a d e firme, para dep ois se faz er m elhor
com o esvaids q ue se põ e.
........... ..
Ao meio - dia os homens jantam no sore br e ch o a clássica olha, com o u sem
badana. ( 1) E, no sombracho dormem a sesta - hora e meia ou du a s horas.
Nos sábados nu nca há sesta . T ant a pressa têm de a b al a r para a a ldeia , a
gozar a fo lg a domrnguei re, que a antecipam de véspe ra , adia ntando o traba l h o
e aprontando -o mu ito cedo .
.. .................. .. , , . , .
Erguem-se da sesta por entre b ocejos e suspiros. E lá vão a mal har, co m o
q u em vai pa r a a fo rca. (2) A ma lha d a tarde é idên tica em tud o à o utra da
m anhã, com 8 correspondente ferra ou intervalo de de scanso. D ep oi s da ler r«
e dos serviços subsequentes, já relatados. baleia-se a espigada (J) e a m oínb e q ue
.6cou sobre o gr â o . Essa m u rra ça toda, b ota-se fo ra imediatamente co m os
ancinh os e vasculhas, passando-se logo à última Hmpesa, a qual compreende
o produto da camada da manhã e o do da tarde. ou seja a funda total do dia.
a cen t eio malhad o e s uj íssim o, coalha o las tro por completo. mas as pás dos
malhadores. desenvolvendo uma poeirada medonha. vão-no atirando ao ar e
eoneentrando-o no solo. a ponto de em poucos min utos o juntarem no meio da
eira (4) par a o lim parem de sde l ogo ao so pr o do vento. Basta pa ra isso uma
ligeira vira çã o.
Com efe ito. neste pro pó sito d e limpesa ger a l, o abegão, ou alg uém por ele,
pa ssa à p á o centeio em m on t ã o. enquan te qu e pela frent e outros o baleia m e

\ 1) B.<I.n • • 10llll elnho eo.. I•••nnu Aol di ... . d. eUA.'. ao ";.11I IC......d.... ur(n, qll u ln • quinl.... L..t llmu TcIllP.-
..do. d. u .II", ..... IU l ... . "I..do• . V tj.·.. A IJIllf'nr. ç' o. pljh•• 111.
•:) Ao . r'u u d. 'UI' , o 1II.lh.dor llll. ~ liu - • dorllli r, "lo acudi ndo . eb.lII.d. do .1. " .11II, .nilu·.. . lOira .
pir ra ç. dllll t'Jlt err ~. E h o <;lll. i.uo f :
001. ou u h • • nb Õ.. Ul úr dl Ol• • rro r.m·u t'm fI.d r .., po ..do • c. m i.. de fon • • li A'ir d••0b u p.U.. . . cl" l••11II
p.' eo(o•• lII.n,iu d• •u ol • . E. ••utU. " t llll o• • p.d uu .. ,.put.m, ou tro p. III' CO••n orado .m ' . eri. tio , d.p ~ w-nto dllll
mOfl O • l .. dh tte...d .u l _ulde irI Dh . d. "o. bee , • • _ UIII bunnhio t u nd. , do. d. eom ld• • d ado d. ' ,u. , "Ad.lmu..... dllllu
L. lelo. d. p. l h • • "o. urura d. hl"opu. P "p•.ra d• • eo.... Iodo ••••cerula> do Jluodo.dclllnlo, 4 0•••Ih t lo • brillud.lr.,
cOAtlAO. "non.ndo. E. .Alio , o. pru "Adido. dlrl ' o,• • prori.... m· ..- Ib p.r. . ..-ee .m elat lo. com o. b..ltio. ullb. bldo,
n . "11., '0 mum llll Um.po 411;. Ih• u" n ... . 'rlo. n um.do. d.. r ..po n. o•• au "oll.,d. ufo.don. A dal lll' .eord••0 tf.1I0
d. bn lh . t d. m ol.b..d..1., u frt " 01 olbo•• U ' Ut · .. d. u m ..h o. e, .Jad••" t u dt .. " .oC!', I' ro" PT 'IIlUÇU UD_
tu O. qo. o rod .I...... Ch. ... . -Ih.. iod.I", " 11 ' . UIa> I.eb. (" U'OIlI..>. f.l.o. , Ue. O. Ie,..d ••do• • rl - llld . .... i•• , . .
.. ilD pO r lf ta m cOm luo. Por fim, t. m.bi ... ri o 4od xo ,o, pn• •d u. ' • • p. .. d. . . . . o d.ix.u....... p, ,,.
(1 ) F""lIltalU de upla.., eOm POlleO 00 Du,bn...., io.
(4J J an t• • ·no .m 11m "'ODtiO 40.ado o, 1Il11.b..dofU tio oltll ou duo S.Ado dou 00 d en u cl. f llll rtD.m. u doi. IIlIIIIDt ÕC"

- 31i8 -
ATRAvts DOS CAMPOS

ancinham d as im puridades, à m a n eira que vai ca indo. A o cabo de meia hora


ou me nos, a p á d esco br e o objecto que servia d e sin a l , ( 1) prova clara de q ue o
mon tão está pa ssado e o centeio em condições d e sair. De sair sem demora. que
o la st ro tem de fic a r varrido e vacantio, p a ra se encher d e no vo, na manhã
imedia ta. M ed e..se po is 10&0, m edida arra pazada, que chegue à «con ta da t ab ela »
e a t é a d a r cresce nça s .
..... ...... .. .. .. ..... ...- - ' .

M ai s trapaça menos trapaça, a medição t er m in a e o resultado vê - se. (sI


Se rea lme nte excede ao ambicionado querteíro por homem, os malhadores
a rrot a m ef ranqueaas ». Se pelo contrário fa lt a . explicam o fracasso po r motivos
es tra n h os. imperiosos. O centeio estava sa cudido, tinha m u rta palha, etc.
Entret a n t o, a par dos comentários sobre a funda do dia. o ebegâo a n o t a a
qua n ti da d e que aca bara m de medir. Os moias são assentes à navalha. que os
regista n o cabo da pá, abrindo u ma moss a g ra n d e para cada u m . A s fracções
alqueires. Que excede à u ni da de moias. o u s eja m os chamados piques, também
o man dant e regis ta pe lo mesmo sistem a. mas em pau diverso p rovis õrie ment e,
até co mp or em um moia. Em se a tingi n do os 60 alqueires. o moia dos piques é
registado em mossa geau de, no cabo d a pá , onde os outras Êgu rem .
C o n fo r m e concluem, empilham os sacos cheios. onde não façam estorvo, ou
vã o despejá-los no montão que juntam no extremo da ei ra. Mas se calha a
seita de saida imediata, não empilham n em despejam. Em vez disso, os carros
arrimam e os homens atiram os sacos para os carros que se m dem ora carregam.
rod an do logo ao se u desti no. D e q ualquer for ma. a eira desobstrui-se, a faina
term ina e o di a ganha -se. À merenda a gu arda os malhador es no sc cabre chc, e
eles apressa m-s e a i r comê-la. (3 )
M erend am à vontade e em sossego. 80 pôr do solou antes , com o apetite
vulgar de q uem tra balha n o campo. D epois fumam e caturram até que a noite
avança e o so n o chega.
R endi d os pelo sono. de itam -se por onde encont ram abrigo, se o fr es co é
demas ia d o. Fazendo ca l o r estiram-se à vontade onde co rra o ar. Isto pelo que
respeita aos ho mens madu ros e m a s ta ços. O s novos. mal engrolem a m erenda.
raspam- se à formiga, a caminho da a lde ia . ..

(I) O ele•• I, COllum..... a lIO •• p.IO ... ILo, q..c u colou •• fr e"l' do Lo.c. d. p', '''' hu. do mo.. tio. qu ...do p.ia _
cipl. . I p...". lo .
b l An t.. d. nu dl çlo. o' mou...dorn .II....", .I ' 010.. O unulo e40 C tiu um. C I .faftd... 4'" dad o No u .. td o
do. ploo,lin . t o, ....r1ba • .10 i d.dh _ dulo c• .I.. 1$ .1 lr.. (q un t el ro) UXld .. . ud. 11I..11".101'. A prop6.ho
uJ:,. '401 orn. "J:, uN.çlo. A 11. ntl.. ç• .II uda l\o lllC oll u 1$ .1" e 111''' .II u .. eele po r .II., , u• • con" cDei o ,,!ti·
trül •• hut l"l' fa liu !. Oho Lom epl u l"' d.. cmb ,.d "od. m q"utllu • Ir .14m do q UI n ei" , .. m .dorco ' rand• •
f. II U' IrI U lIlO. Lom....... "Inlei" d. condleliu oiah.. , u.ba lhando o . ' d . o pod.m. , coM . ce · lh.. 6 .. aum ... 110
10;[0" do ut.tu ldo. ' lb' lIdo • • " mofo 10 00 m....... P .....m"u .. hip6t I.. Rol podn",uluIIU • q ... lidad. do
'n1l1lo S.ado rui. O" d. ..pl, u odld " onu lOoeI. {ondir "UD. .fIlando. ptlo "oMdrlo. , ...... por d""" ..r • .I,
foaolu d..."IJT1l.Q' o. 40' p• •• h • • f q I m•. 01 . 1.. ueo•• q ..... ,u. .. .. zIU• • o Uah.lh" o. fru col .. <imi-
4... dUieo!l ••·.o, cl..,...do a IfOpadi·Jo 8ut eh .. ..luGI.
tJ' M.u ad. d. ,u, ,,,"o 0 0 d.. " uat.. cadd d. a.. ile . "I .. ..u•. Nu " ,u" • "h.du co ..... .. pu d. Itlt• • '11:'
noS d..... ".dlo " h.II'U.
ATRAvt s DOS CAMPO S

Debulhas à mãquina. - Sua adopção. -Usam -se nas eiras de quem possui
mãquinas e nas de outros lavradores que as alugam. - Contratos de
alu guer. - Caminhadas de umas para outras eiras

N o capít ulo Alfaias A .grícolas. páginas 22.5 a 229 desta obra, p ormenorizei
a in troduçã o e vulgarização d as de bulhadoras na região elvense. Como lá digo,
a p ri m eir a de bulh a a va por efectua d a nos campos de Elvas e vizinhança s, f ez- se
n o ano de 1879, na herd a d e d a Gromic ha.. por iniciati va do lavrador Joaquim
Lúcio d o Couto . Mas isto fo i um ensaio passageiro. A s d ebulhadoras s6 fun..
cion a r am efi ca z m ente a í po r 1890, qu a n do o gover n o as adquiriu e as facultou
d e alu gu er ao s lav ra dores. fa cto que ta m bém registei por miudos n o já citado
ca pítulo . M esmo d ep ois d e 1890 a inovação d e d ebulh as à m á quina. em bo ra
a g rada ss e co mo nov id ade, circunscr eveu-se ap enas a algumas zo n as. S ó p egou
a valer d o a no de 1896 em dian t e. D esd e e ntão, em ca da n ova col heita, v êem-se
aum en tar os m a quinismos de deb u l ha. N o últim o verã o (1911) f u ncion a r a m na
:regiã o elvense vi nt e e ci nco d ebu lha do r a s, co n str u id a s nas ca sas C l a yt on, Rus-
t on, Marshall e G a rre tt, p redo m i na ndo as Ru stou de tip o mediano e a s Clay-
to n , gra nde s. 1 1) M uita s delas, tanto g ra ndes co m o p equ enas, debulham so m ent e
a s se a r a s do s resp ec ti vos d onos. Outra s, antes ou depois dos dono s a s utili-
za r em nas s u a s ei ras, vã o d eb u lhar f o ra, na s d o s lavradores dos arredores. q ue
n ão pod em o u nã o querem ter m á quinas. (:J Estes alugam-nas àq u el es , mediante
a p ercent agem d e 5 a 6 0 ' 0 s obre o rendim ento da debulha e co m a cl áu sula de,
o que a luga , fo r nec er co m bustível e á gua. Quanto a p essoal, o dono da m áquina
paga ao maquin ista, ao fo gu eira, aos d ois alim entadores e a oi to o u dez homens
auxiliares. P or sua v ez , O d ono da seara p aga a os restantes trabalhad ores pre-
ci sos e dá comida a todos, s em exceptuar o maquinista e o fa gueiro. W Também
lhe cumpre fa cuItar uma parelha d e muares ou junta de bois para «d a r saida»
à palha, W acarretar á gu a e combustível. O acarreto d os cereais em g rã o para o
celeiro corre igualmen t e p or con t a do lavrado r. (J)

Às m áquinas de aluguer t ra n spo r ta m -se pa r a a s eiras à custa de quem as


aluga. O primeiro lavrad or q ue as utiliza não a s devolve à procedência . E m
as nã o precisando, outro a s le vanta e retira, p ara por sua ve z as empregar em
aná l ogas condições. Assim, só o últi m o a apro veitá-las é sobrecarregado com O
en ca r go da recondução a o de p ósito, Se porventura anui a isso.

(1 ' ll lti a u . IIlio dopu r-.. u b, C I.y loa p.q...a U . II'" • up... ilacl . d a.tr. ..u m 6rim...
(~J) Oh,u opl alõ u q at....... au di o I.n.d..r tlr dl ba l b.dou .• 1m . lu. '_I H ' IIUU" If r.j . I Ql d ..cu..u.-
t l ..d . d. po• • uIr a p.uu. o da d.hulb • • "' O o rru •. pufedado .lut'· lo todo. o. aIlO'. Outro., d... j .... pOIIllI · lo m..
alo pod por f. h . d. u phcJ. Po r iua rui a .1 .., '-10.
( J) O. to t.lld. d•• •• I.6.rio•• comld. OUlpado ao.... .ln d. d.h..lb. . . . .por. dlr•• ·b ' 1• • dl.a ll.
(..) P. ... dar •• ld pilh a a p.I1>. aio , I...edi.t. ..... u l al.rd.d. por ..o... pullor por. 5 . a do. a io L' ......o{lo
• 1I'0U.a10 ICollomic.- d..p .
(5 1 "!=-bo.... IIU. d.hol1>.d. a li...p. ,., , . ....u..Utl d••1.... p. u o ul.lro. ar oatl u t ....h......Ir a .... 00. .... I. por-
-cliu. dluu•..IluaU pu. o u mla1>o d. fano .

- 350 -
ATRAV-tS DOS CAMPOS

N as caminhadas de umas para o u t r as ei r a s. as debulhadoras e Iocom óveis


vão em separado e cada q u a l atrelada a pa re lh a s de muares" diri gidas p elos car-
reira s e aco m pa n h a das de pessoal suficient e pata remover os embaraços e entra-
ves oc asio n a do s p ela s esca brosidade s d os camin h os e por quaisqu er precelços
que su rjam. Embaraços e a cident es vulgares, qu e s e conta com eles e que s e
previnem a t empo . O s maus ca mi n ho s escan galh am os maquinismos e estafam
o ga do que os arrasta . Arrastar, é o t er m o. A s p arelh as con d u z em pelas cerre-
teiras escalavra das esses maquinismos pesad'íssi mcs, em marchas vagarosas,
interrompidas, de vez em q ua n d o. por a varias e embar a ços. ou de propósito até,
para de scanso mom entâneo . N a s pu xada s ..de pei t os acim ae , o gado tem de redo-
bra r d e esfo rço. t í ca ndc a cus to . P or b oa s q ue as mu ar es seja m. se m pr e ofegam
e sua m n ess es ar ranques. d e l a deira a r r iba, em q ue espicha m o rabo e d esacer-
tam o passo. N ega riam sem d úvida, se a s n ã o animassem os ca rreiras. Dos car-
reira s, um. o d a parelha d o tro n co, va i esca rra nchado na lan ça . em posiçã o
a rri sca da; ( I) os o ut ros seg ue m a d ia nte, cada qu a l m o n t a d o n u m a d as muares,
da sua res pectiva p ar elha. N os síti os d e ma u camin ho. põe-se a pé o d a p a re -
lha da fr ente, g u ia ndo a je ito de a livrar da s pedras, a evita r os topes. De pé ou a
caval o. 0 5 h o m en s fa lam às b est a s. aoimam-n a s e. po r ú l ú mo, cheg am -l h e co m
as arre a tas , É r ecu rso ex trem o, de resultado d eci siv o. G eralmente, às primeiras
erreata da s, as b es ta s a rrancam. v encendo a s u bi da . E s enão arrancam, é porque
a cen ge se pa r te , o b riga n do a dem oras.
Com o a n d a m ento d e i n t er va los enredosos , ou sem embaraços de maior. a
caravana atravessa ca mp os e a l d eia s, dand o rumor de si pelo sussurro dos
rodados a voz ear d os ca rreiras. - «Olhem as mánicasl ... ai vêm as mánicasl. .. »
- diz a garo t a d a d as terras. btspando o trem de debulha . E. à cha m a da d o
rapazi o. a codem os mirones ociosos e a s mulh eres «p re vis t a s» . Todos q u ere m
..dar fé» d as mânicas. de quem a s a companha. a qu em p ertecem e para onde vão.
As máquinas chegam em bre v e ao p ovoado. d et êm-se um po u co ou co n ti n u a m
Iodando. Entretanto. a g en t e do p ov o aco mpa n h a -as co m os olha r es. admira-
-lh es as en grena gens e aprecia-as a s eu modo. (2)
O utro ra viam-nas mal. E diz iam: - « Um raio as partisse ... que v êm ro u-
bar o trabalho ó pobre ... Abrasadas fossem todas . . . Em havendo fo gos, elas
que os vão a paga r ... Veremos s e os apa g am s em lá irem os pobres .. . » Àgora
já não lhes ro gam pragas nem as lembram para os fo gos. À gora encaram-nas
bem e re conhe cem-lhes a utilidade. At é lh es ex a geram as vantagens e o des-
pacho. se en t re os circunstantes h á q u em a s perceba o u passe por p erce-

(I) T h u.i.u.da q,n aID a'otlo .I. 1911 o maio ral do mu i.. M allu tl 1oaq"lm C Ulac"'o. '1:Ilalld o flU" po.lci o a pa n-
a... ao ~aco q'oe n au'portu a a dlb1:l1ludo rl . rol I n l mu ..do .II II IICI po r 0.11I t o po q'ualq'uu . undo 10' 0 colhido pII.
111('I1... q.... o UIDIo'ou • m . tou Im.d l. toID'M O.
(11 Qu u,do .. dlbulhldoru II itlt rod "lhlm n O u, 'io .lfe lO lI. o. trahalho ru r uul. &n uID d U COfOcoadOI • dIlCOII-
lutllJhn l. Pcu llldlram- u q'UI II ""'quloll .I. d.hulh ....1111.111I urcn r- Ih.. . O lrab oU.o ' . CONlcqu. aumellt" m.la'uu-u.a
• ..ti do . Soud, u podm O IlInuo l O Itlb"ho IU"UaIO Q • o ••lb!o lub ru . O qu. i' Ih. laujo d. IUalUIr DO pod,..., o
- Dt•• /W.." . - o »,,11111 228 • :.251. r. »o,quo O ..Il ri o .'Oblo c O , ...1.011.0 OUllln' IOu. O m' "ollllde do . 'l.. h úII U mP 6111 0.
1I:• •• I_ou· " • • • lmpU!_ • .lldlrlcio. q UI I prou h l I luudoru • nhdo • •

-- 351 - •
ATRAvts DOS C A M P O S

bê-las. Pessoa que tr abalhe nas máq uinas em ocupação de destaque, ( I ) quando
fala no assunto, r eveste-se de uns ares de entendido que o guinda 8
sabichão .
.
. . ..... ... ..... . . . . ... .. . . . . .. ... .... .. .... ... . .. . . ...... .. ..... .. . .. . .. . .... . ... .. ......... ..
A jornada efectua-se e os máquinas entram enfim na eira, onde as arri-
mam aos rilheiros que têm de debulhar. ( 2 ) À s parelhas desengatam-se e sol-
tam-se. Soltam-se depressa, por entre os comentários do pessoal sobre os in ci-
dentes da viagem e o «poder» dos elíraeis. Gaba-se a força e a arne Is das mulas
de coragem e «derrotam-se» as «trapacei ras» e as te niones, que destoam
da pa rce irada. Fala -se de todas. mais ou menos, nos poucos minutos que
demora a solta do gado até ao seu a lojo e arraçoamento na quadra ou
no r í lh eiro. D epo is, os homens tratam de si também . indo comer a refeição
própria da hora e da ocasião. Homens e animais comem e descansam em
sossego, livres de uma jornada ronceiro, q ue estafa as parelhas e enqu'isile O
pessoal. P ar a evi tar estes inconve nientes se ria preferível que os motores das
máq uinas em questão, fossem viadoras potentes e não locomóveis simples.
À circunstância das caminheiras se transportarem por si mesmo, comhoiando
as debulhado ras e sirandões, é de gra ndíssima vantagem para o lavrador.
O lavrador efectua assim fàcilmente a mudança dos maquinismos, gasta ndo
m en os tempo do <toe gasta com a tracção animal, e sem o perigo de arromba r
as m ue res . Mas as viado ras custam um di nheirão, que as tor na inacessíveis
à m ai oria dos agricultores. Por isso, só fu ncio nam duas em todo o concelho
de E lvas.

Deb ulhado ras g ra n de s e debulhadora s p eq ue nas Por gran des, classifi-


cam-se as de l m ,37 de
la r gu ra, acie nadas por locomóveis de 10 a 12 cavalos. Por peq u en a s ou m edia-
nas, co nsideram-se as de 1 81 , 07, movidas por Ioco m õveis de 6 ou 7 cavalos. (3)
E sta s i ntroduziram-se há menos tempo e, no entanto, estão a p r eval ecer sobre
a s grandes. E porquê ? P orque as debulhadoras peq ue nas cu sta m consideràvel-
me n te m en o s, t rans porta m - se melhor, resiste m m a is e dão r en di m ento apro xi-
m a d o d o das maiores. À s grandes d espacham m ais, eviden temente. Mas essa
dife r ença n ã o co mpe nsa as desvantagens do custo e os emba raços d a s m udanças,
S obret ud o, q uan do se conta com remoções frequ ent es, por caminhos escabrosos
e long os. E. é isso que acontece na maioria dos casos. P or conseg uinte, a debu-
l ha d ora peq uena to rna -se preferível. Já é, ou será d ep r es sa, a máq uina típica
da r eg iã o elv ense.

rI ) M'l<Iviftu. fo,uciro• • alimlftl.doru ••b• • üu .


( 2) A lll u d. IftCUUcm • d cbolb •• do tfcr o polu amcll. tI ..Iilllu d. . . fth·cl ..du p.lo m.qoÚlI. la c fo,vu ro. com nlliUo
do. t.n blllb.dor ...
(3) A locom6ee1 d. U I. uulo. d mdDlIr r(l01l.do. A d. ui•• i la.oficlcau Jlua u dlbaLbu doi rrl'oll.

- 352 -
ATRAvt s DOS C AMPOS

o aparelho d e d ebu lha - Perte nces e a cessórios - Bomba


para incêndi o s - Peça s s o b recele ntes

D a configuração e aspecto de u m aparelho de de bulha de cereais, veja..se


o que fo i dito no parágrafo Debolb eâorss, a páginas 22$ a 229. O lallulheiro,
m ais conhecido por sire nd êo, deixa de funcion ar nas debulh as em que se não
trit ura a palha , o q ue só sucede na do centeio .
Às t rês máquin as componentes do aparelho, já referidas. h á que adicion ar
os pertences indispen sáveis e outros acessórios secundários. Eis a lista dos
pri meiros:
U m j ogo de correias de volante para os tambores.
Três lança s para engate d as parelhas q u e p uxam 8S máquinas, 80
tronco.
D ois oleados ou encerados impermeáveis , p a ra co ber t u ra d a debulhadora
e locomó vel no armaz ém e em via gens .
C a lços patente s e tra vões.
U m jogo de chaves.
O utro dito d e ferramentas m iudas, incluindo as «d e fo So».
Duas escadas para subir à lo comóvel e à d ebulhad ora.
T ud o isto a co mpanha o aparelho d e debulha com pr a do em q ua lq uer casa
forn ecedora. São pertences imp rescindíveis, incluídos no cu sto t otal das máqu i-
nas. R esta enumerar os a cessór ios, q ue se adquirem e pagam em se pa r ado. São
os seguintes :
Um macaco da força de 10 toneladas. ( 1)
Um torno de ferro portátil, a propriado a cr avar -s e no solo. pa ra funcionar
nas eiras. em pequ en os con ser to s de ocasião. (I)
Seis cor r entes de ferro para tiro das parelhas, que se enga ta m de refor ço a
auxiliare m a parelha d o tronco nas mudança s e caminhadas.
U m carrinho de mã o para s e removerem os sacos que se vão enchendo à s
bicas da deb ulhadora.
D ois tinos para depósito d e á gu a, d e ca pa cid a d e n ã o inferi or a 400 litros
cada um. ( 3)
U m barril ou o ut ra vasilha para depósito da água q ue a spira a bomba da
locomóvel.
U m balde ou caldeiro co m q ue se at ire ág ua para a pagar o cinz eiro da for-
nalh a.
Um o. g rade-rcj ão de m a d eira, co m tir a n tes de co rd a para arrasto e desvio
de palh a. ,.)

(1) ta .UIlIU to llcr. llII d. eOelvn d. d.lt....lb.doru. Ioda; ·.. O no.ueo a o e a ll O do .pu.lho. Noo uOI ...io.
1: 1 Sic • • b'olo t Am. a tl n'Cl ll h h • • qalll"o do t om o. M n eo a ,. i m bAIe&a tl • p oe luo .... ..- •• mg lt o.
(I) QOUIl .. lo qOIr 00 .. l o p odo O.., d aOI, ... m.dll.· .. (Oel QI, ..UQ O I t ooun ,...flhu : bu ril o ndOl. polUo e te .
1. 1 Anuto c n lll o~ 'o q ...... fl. l...... om o . oxU lo d. ama PArtIh. d. mau n .

- 353 -
ATRAvt S DO S CAMPOS

U m caixote de madeira. em condições de aparar c receber O grão Limpo,


saido da máquina. (iJ
Quatro fo rq u il h a s de fer ro.
Quatro alcofas.
Duas alm otoliao para os óleos de lubrificação.
Uma arca de madeira para arr eca da ção de ferramentas miudss.
A par destas COiS85 e como medida de prevenção de lav rador endinhei rado
ou caueoloso, vê-se em algumas eiras (poucas por sinal), uma bomba de tirar
ág u a com a corresponden te manguei ra e agu lhetas para acudi r a incêndios. E
precaução de valor, mas não tan to como se pode i m agi n a r. Fogos em eiras a len-
tej ana s , mau é que apareçam. Em aparecendo, alastram-se e desenvolvem-se
com tal intensidade e rapide z, que se torna dificílimo apa gá-l os a tempo, com
bombas ou sem ela s.
... ... ... ....... . ... . ..... .. ... .. . ... .. . . .. ..... .... ..... ...... .. .... ... .. ... . .
Para re med ia r de pronto as pequenas a vari as das m â qu inas no trabalho
das d ebulhas. há junto d as m esma s, ou no armazém resp ectivo, uma provisão
de peça s miudas, sobressalentes, a que se recorre de vez em quando pa r a substi-
tuir o utra s idênti cas que se inutilisaram : - anilhas e rebites, p entes, faca s.
ligadores. etc. E conj untamente. como artigos indispensáveis de coosumo grande,
costuma haver um a ab u n da n t e res erva de a r tig os vários para limpesa da l oco-
m ó vel: - d esperdícios d e a lgo d ã o. atilhos, empanque hidráulico, etc.

C o m b u s tlve l - E.mprega-se d e preferência a lenba de azinho e a cepa de


nicrnc, (:) coisas que o lavrador possui quase s em p r e. E quando
as não possua. compra-as aos colegas vizinhos por preços módicos. O carvão de
pedra Cardi ff, u sa-se também à falta de lenha. Mas emprega-se pouco porque
sai muit o caro. (,,) O combustível de qualquer espécie representa despesa impor-
tante que s e avoluma o u reduz conform e a capacidade e o zelo do foguei ra.
Àquele q ue sa b e e q uer, economiza muitíssim o. O que não sa be ou não faz
ca so. gasta em excess o.

Ág u a - Na maioria das ei ras, a ág ua pa r a alimentação da locomóvel é outro


encargo considerável, embora in ferior ao do combustível. Havendo-a
pr óximo - dezena s de metros apenas - empregam-se dua s mulheres a acarre-
tarem-na em cân ta ros. Ficando longe - e muitas vezes fica a 800 m etros e mais

(I I !: m mui tu .Ir... uum-u ..ro. cm ...ea .I. nbo!• . O. U COl, .Loto,do' 1>. 1. !'ou 11 birll d. d .Lu1l•• don . 10'0
4u ' u cnrL.m, ...io 111'1.10 nlindo•• 11m 4U C ..., m edido o 11 11 cO.n l. odo. t ... . I• • Impl ,.. DU' m.au u ' ul ar. O nlxou. dil -
, ' IU• • • u,p.ndo d o. uro'. Á lIIa.adn <fUI II .... 1 ' D.rL.odo . .... f -le-U•• nfinl\~O li 'rão por 111.10 do denll uo..... .110.10•••
10'0 UM • rijo r JI.n drafTo do. IIC O' •• 111. la mo. d. II COD.lo. cu • fu ndo o und im.o to cx.rto d. d.bolh•.
(s) La.. ha d••obro. por durorth"lf. ai o co.... , .... O ..U ..... pnao I. um 1I.rl;0 d. {ndndlo. p,l... mult.. E.olh.. 411'
prod ll' .
(,) Diz·.. ll.u . o lojo do un io d. pc dn dt tulo r. I ' Ufa "," uilo 111'1.1 o = a u ri al d. loc om6",1 do Gllt li ou lto
d. 1. 1'11. • •

- 354 -
A TRAV E S DOS CAMP OS

-8 sua co n d u ção para a eira fa z-se numa pipa. em carro de muares o u de b oi s.


Este acarre to ent r etém , o r d inàr ia m en t e, uma parelha desde manhã a té à noite,
como pequenos in ter valos.

Ól eo s e vazelina - Impõe-se uma abastada prO VI SS O destes artigos, a bso -


l utamente i n dis p en sá veis para a lubrificação das máquin as.
Além de os h a v er em p orçã o s ufici en te j u n t o da d ebulha, existe eeeêrve em
dep ósito. (ti Emprega-se a va z elina am a r ela e diverso s ó leos das marca s Shafting
(óleo fino), Crank Cas e ( õleo g ros so ) e outros. Ã d espesa. gasto da vaae liua e
óleo s corre se mpre por conta d o do no da d ebulhadora .

Pessoal que empregam as mãq u inas. - Atribuições e deveres


das diversas entidades

Um apare lho pa ra de bul ha de cereais, com d ebulhadora gra nde de 1 . m3? d e


largura a cci o n ad a p o r lo com óvel de 1 0 a 12 cavalos, ocupa o s eg ui nte pessoal ;
Um maqui n ist a: t ra ta das máq u inas e superen.tende n a d eb u lha. U m
fogu eiro : cui da da lo co móv el e auxilia o m aqu in is t a. D oi s a li men t a dores : reve-
zando-s e u m a o outro de vez em q uando, alim entam a d ebulhad ora, me rende-
-lhe o «pão» em ram a às bra çadas. Um tra balhad or, munid o de fo ice, a cort a r
os negalhos dos molhos e a a rrim a r estes a o aliment a dor. Outro, d e f orcado em
pun h o, a chega r os molh os ao da foice. Quatro a seis, a desaloj ar em com fo r -
cados os mol hos do ril h eir o o u m on tão e a chegá-los a o alcance d os dois ante-
cedentes, q u e fica m próximos do a limen tado r . Um. a r etirar a m oioha, com
ancinho ; dois, a d esviarem a pa lha e a fazere m os borregos; o u tro s do is ao
arrojã o o u gr a d e da pal h a . a a m pa ra r em- no, auxiliando a parelha d e muar es
no arra sto .d os borregos p ara o local da s al m ena ras . Dois ma i s, à boca da
máquin a: u m. a re ti ra r os sa cos q ue se vã o enchendo e a pô r os vasio s, ou a
medir do caixote p ara os sa cos e ou t ro a r e m o v er os sacos cheios n o carrin ho
de m ão, o u a a uxilia r o ce rreg u io para os ca rros de m uares. T otal, 17 a 20
hom ens, incluind o o abegão, chef e da gan h aria q u e, à s v ez es, é um dos qu e
mede e en saca . E a i nda há a acrescen tar os d ois carr eira s da s parelhas d a
palha e d a ãgua .
As debulhad ora s m ai s peq uen as oc u pam quas e ta n t o pess oal como a s gra n -
des, excepto n o ,g r up o d os h omens qu e d esata e chegam os m olhos. Estes cos-
tum am ser me nos e lguns. r,)
D os 17 a 20 h om ens acima m encionados, h á q u e particulariz ar os s egu in t es:

Ct) QUl nd. po r Iruo u '1"ot.m .. r u d. 61.0., n Ua u , , .. ..,riu P"" miudu Po.n..úlu plrl rtp. n _
<lill l nl d..l h d . , ceuem .. pnd u o hli lll-nll "elI I. de pd. ti o do. 'l'idn ho. pro pri . t m o. de outr.. ...' q"l n ...
h J POQ~ O p.llo.l .m d,b ulh .. , ....po r u.d,,* q u umpre em '~oD o ...l. D' • • tI.....

- 355 -
ATRAVt.S DOS CAMPOS

Maquinista É. a alma da debulha. T udo q ue se re la ciona com a instalação e


fu ncionamento do s maqu inismos est á sob a sua direcção e r esp on-
sa bilid a d e. M on t a g en s, alinhamentos. nive lações, laboração, repectos, lubrifica -
ções, reparos triv iais, límpesas, etc., tu do is s o lhe pe rte nce executa r e dirig ir co m
auxílio do tog cei ro, d e mod o q ue as máquin a s fun cionem bem, efinedas em
term os, de b u l h a ndo na perfeição. se m p arage ns de a za r, ( 1) a den u nciarem de s-
leixo o u ignorân cia .
É ig ualm ente o m aquinista que regula as horas do trabalho e do descanso.
sendo ele q ue dá o sinal de apito pa ra a agarra e a solta, bem como o das cigar-
radas e os de «p aragens» repentinas, por mo tivos de prece lços.
R es u m i n d o : maquinista brioso, que saiba d o ofício, não lhe falta que ve r e
co rrigir. E. vê d e facto. intervindo de vez em quando com notó ri o resultado.
A sua oportuna intervenção influi poderosamente no r en di m e n t o do aparelho,
n a perfe ição do serviço e n a laboração e conservação d as máquinas. S eja ele
indolente e ign ora n t e e o des pacho s erá pouco, o grão sairá partido e s ujo e a
d eb ulha d ora te rá avartas e p reca lços a to da a hora , co mo engen hoca v elha , se m
présti mo nen h um.

Fogueiro Álem de coa d ju va r o maq uinista em tudo q u e possa, s em prejuizo


dos seus afazeres próprio, incumbe-lhe levantar-se ao romper da
m a n h ã para acender a fo rnalha e a água aquecer em t ermos de a l ocomóvel
t rabalhar ao nascer do solou antes. C u ida pois da locomóvel, e ltmentando-e,
regulando -lhe a pressã o, l ubri6cando-a e limpando-a. Nas horas d e paragem..
re tira-l h e a cinza e os resíduo s c ccmbcsttvets que pejam a fornal ha e o cin-
í

zeiro. Á tarde , d e poi s da s olta, ab re -lhe as vál v u la s e limpa a tubagem e O mais


que é preciso. P elo di a adia nte, te n to em p lena l a b oração co mo n o s i n t er va l os,
la nç a água em a b u ndâ n cia D O cinzei ro e p rox imidades, para evitar a sa ída de
faul has e b rasas. N es te par t icul a r, o fogu eira te m de ser m uito cauteloso.
Qual qu er d es cu i d o ou i m p revi d ê n ci a pode originar um incêndio de resultados
d es a st r os os.

Sal ários do maqu inista e do fo g ueir o Quand o se implantaram as debulha a


Outras notas s o b re a mbos vapor, os maquinistas ganhavam 2$000
reis diários e o fo guei ro 600 a 800 r eis
tendo a m b os co m ida po r conta d o lav ra d o r . (s) Hoje ganh am menos : o m equi -
n i ste 1$200 a 1$500 r ei s e o fog ueiro salário semelhante ao d os ga nhões ou
pouco m a i s . O s d ois co n t in uam a co mer à custa d o la vr a d or e àpa rte d a
ganharia . T a m b é m há l av oura s onde o maquinista das debu lhas é u m criad o
anua l «d a p ensã o » (a b egã o ou gua rda), que no pe ríodo d as eiras deixa a sua
ocupa çã o habit ual (.) e vai dirig ir as máqui nas.. ganhando por isso u m a soldada
( I) S.hu d. (:oruJ... fractura d. "'U -.1'0.,1.. , ero. leou oiutl(:olo. " c.
(d COlald.......11:1.&11.,. l do. " D"ÕU , tlDd•• 1a.1. (:. m . do 1I0rco ....ud •• tod o. o. li.. .. »ão .I.. u l,o l ia 1'U' do
.I.. <:IIlI.io.
(I) A ew oCIlII. ( l o f Ill c'OlIIbld , tlIaPOl'lri'.'Dt' , OgU. u i,d• .I.. COMi'DU .

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ATRAvtS DOS CAMPOS

superior. Ainda é uso po uco visto, mas será por certo o mais corrente" num
futuro próximo.
Nos primeiros dois anos de debulhas a vapo r, os maquinistas e fogueiros
respectivos, eram, em geral, homens estranhos à região. vindos dos grandes cen-
tros, onde adquiriram habilitações nas escolas oficiais e nas casas fornecedoras
de máquinas agrícolas. Mas quase todos revelavam pouca prática e n en h u m a
vontade de se aperfeiçoarem. Vieram porém dois homens novos, de excepcionais
conhecimentos, de reconhecida competência e extraordinàriamente devotados à
difusão e ensino da mecânica agrícola . ( I) E, com tal empenho e proficiência se
dedicaram a esse ensino prático" entre os nature is da região, que o resultado
corres pond eu, indo além do que se esperava. Os naturais da região. ao cabo de
uns três anos de convívio e prática com tão bons mestres, já fazia concorrência
aos estranhos e pouco depois não só tomavam conta de todos os aparelhos de
debulha das redondezas, como ainda se incumbiam de outros a funcionarem em
eiras essés distantes por esse Alentejo fora. Vila Boim, Barbacena e Santa
Eulália, três povoações rurai, importantes do concelho de Elvas, dão um con-
tingente de pessoal de primeira ordem para tratar dos aparelhos de bebulha e
para trabalharem com eles.

o a begão - Nas debulhas a vapor, o abegão não dá as horas da aAa.rra, nem


as da solta. Isso. COmo já notei, está compreendido nas at ri buições
do maquinista. Em compensação. o ch efe d a ga nharia tom a n ot a da q ua nti-
dade de género que se debulha d ià'r iamen te, he bt ltre edc-se a d ar a co nta a o
amo, no fim do. quinzena e toda a vez que o a m o lhe pergunte.
C omo nos outros serviços, o ab egjio manda nos ganhões, traba lhando entre
eles e onde vê m ais precisa a SUB assistência. T ã o depressa está no topo do
rilheir o, de ferramenta nas unhas, a atiçar os brios dos que chegam os molhos
e os desatam, como vem a baixo, a reparar na saida da moinha, da palha e do
grão. Às bicas da debulhadora. ora mede e ensaco , ora incumbe isso a outro
homem capaz - o so te, quase sempre. Ele ou o so ta , à maneira que os sacos se
enchem e saem. vai registando as saidas no contador de madeira , pendente da
debulhadora.
Também o ahesão fiscaliza O trabalho da debulhadora, observando se parte
muito ou pouco grão, se sai limpo ou sujo e se vai na palha em percentagem de
importância. NC!ste propósito, não dá ordens ao maquirriste, mas comunica-lhe
o que vê e o que sente. Se o serviço lhe não agrada . por considerá-lo imperfeito
e porco, reclama remédio de pronto para que não haja que dizer e o amo se
não queixe. O maquinista atende-o, se pode e sabe. Se não pode o u não sabe,
desculpa-se de qualquer maneira. Por sua vez, em calhando, o maq uinista trata
igualmente de ouvir o abegâo, quanto ao desenvolvimento a dar às máquinas e

h l t.tu b••••bilu .ro•• ~.adJu.. 'ou ... o, .... hor.. }.al6alo r.lI.. d. lu"u, cc.ault.. adwu.o rq,.. r. a"fnla.
".1' ..datallludor d..... d . . . .1. I.POI'lu.. lnou.. io ccoauU.o d. II .... • 5 ..... 11. Vltoriao !lu.... , • • • n !,u
laldlt••tful•• i. Potla]"" • •'d.. lcco d, c ro ••d....Ior......110 uILh.uii..... t..l•• AI ••I. j...

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ATRAVt.S DOS CAMPOS

ao apuro da debulha. Se lhe hão-de meter muito ou pouco «pão», se o trigO


deve sair selecionado por classes, como convém que fique a p alha, etc. E.n fim,
os dois entendem-se e combinam-se menos mal. Mas se por acaso divergem, o
a begão participa o facto a o lav rador para que el e providencie. Res umindo :
a fiscalização do abegão só é eficaz, se ele tem com petêncía e se o amo lhe d ê
a autoridade p recisa. D o contrário, o maquinista faz o que entende e quer,
sem se importar com O abegãc. ( 1)

Alim entad o res Como tais se designam os homens que se ocupam exclusiva-
mente em a.limentar a debulhadora. São dois sempre, para se
r evezarem de vez em quando. Vestidos de blusa, com os braços defendidos por
b raçadeiras de COUTO e os olhos resguardados por óculos escuros de rede,
enquanto u m, lá em cima, de cócoras ou de joelhos, braceja constantemente à
boca da d ebulhadora, alimentando-a à fa rta com os molhos que os ga n h õ es lhe
chegam, (a) - O outro, sentado em baixo no chão, ao abrigo de qualquer sombra,
descansa e fuma tranquilamente, a refazer as perdas de energia que esgotou
pouco antes. Tem de ser assim, que a labuta de alimentar, órdua e extenuante,
é excessiva pala um Só homem por todo o dia. D oi s, alternando, custa-lhes a
dar conta, em condições de a debulhadora produzir em abastança e não esces-
semente, à mí ng ua de mantimento. Alimentar à míngua ou devagar, atrasa o
serviço, encarece-o e des ac redita o alimentador. Este, se quiser cumprir, tem de
m a n ob r a r com desembaraço, sem fraquejs r, Meio minuto que i nterrompa ou
a fr ou x e, logo a debulhadora o acusa no seu sussurro oco, de movimentos em
vasto. E,' pois u m trabalho focçado e fatigante, que só despacham a contento
ho m en s moços «de poder».
O s alimentadores apesar de só t ra b a lh a r em metade do tempo útil, visto que
se revez am um ao outro, ganham u m salá r io de mais 60 a 80 reis que os do s
ou tros sanhões. M erecem-n o bem.
Quan t o a comida , numas ei ra s la ncham em comu m com a ganharia; no u-
t ras, s epara m - nos dos gunhêes, para co merem com os das máquina s.

Despacho da debulhadora P a r a o rendime nto avultado ou reduzido de uma


de b ulh ado ra. con correm fa ct ores diversos q ue. por
vari á v eis e fa lív ei s. de sa creditam os m elhor es cá lc u los. À de bu l h ad ora despa cha
mu i t o se tra balha sem embaraç os, na devi da a fin a çã o; se n ã o tem parag en s
ex tra ordin árias de asares e m ud anças; se a ali m en t a m co m fa r tura e a pr eceito
e se o «pão» está gredo e com p ouca palha. Se por ém, f u nciona m a l, se pára
com freq uência, se a a li m en t a m pou co, s e o grão falt a n a s eapig ns, ou se a palha

h) C Ol!lO U .untlld 110lÜI'0 la .hl'. o .b.,lo•• m .I'<lm.. 1' ''0''' '' , u<ll!l"I lal1~llu d. chefe d. 'talnd. com AI
d. m.qo"'I"I. H,uI C.. O, I . 1. qa . r.do mUld • • d. qll. llldo dA ee... r•• 0 I dol'.
(a ) Ch.;.m ~lhl o. =olho. 40 rilhdl'o• • 0 I.do n,uldo. 0<1 .1. .. nn.d.. qu. . . ducaru;am lU oc.,lio da d. bal1l.• .
A c!lI,ad.. do. molh a. , U cl1 I " rOIH. qO'llda .. . I.el<ll do, C"1'OI ou do .ho dD dllu irD. t demD"d•• Cal lDU. Cloaadl»
"e"" d. bu. dI» rU hriro.

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ATRAv t s DOS CAMP OS

ê muita, o r endimento t orna-se mesquinho e a debulhad ora não d á vant 8 ~ens .


E men os ainda dá , s e em vez de u m desses co ntras, se co njugam dois o u m a is,
COmo sucede à s vezes.
Assim, a d m itida tanta hipótese, se porventura se acerta num cálculo desse s,
é questã o de acaso.
N o entanto e como simples a proximação, aí vai uma nota do que em m édia
pode despach ar d ià ria me n te uma deb ulhadora gr a n d e, da s de 1,rA37, bem gover-
n ada e melhor alime n ta da , sem asares de maior, em Sea ra s de boa funda, q u e
não tenh am mu ita palha:

Trig os m oles 20 a 2$ moios


» rijos. 16 a 20 »
Cen t eio 25 a 30 »
Ce vada 30 a 3S »
A v eia . 4oa4-5 »

Às d ebulhadoras p eq ue nas ti.ram um bocado menos, m as a dif erença não é


muito gran d e.
As q u a nti d a des m ínimas a cima fixadas . j á traduz em um b om rendime nto,
com o m édia diá r ia para tod a a é poca . As máximas" en tão, devem os co n sid erá- l as
é rimes, excepcionais mesmo.

Nos trigos, a d ebulhadora dá resultados diametralmente o postos de dia


pa ra dia e d e seara para seara . Em tr ig os de muitíssima palha, mal g r a dos, o
rendimen t o em g rão ch eg a a ser tão es casso" que niio vai al ém de dez moias
por dio .
..... ... ....... ...... .... . ..... .. . .. .. ... .. . . .. ...... .......... ... . ,.

Horas de agarra. -A debulhadora, em acção. - O a l m oço, - Entre o almoço


e a <ciga r ra da. da manhã . - Continuação da faina. - O jantar. - Refrega
da tarde. - Segunda <c ig a rra da • . - Mudanças de máquinas. - Avarias. -
Impressões diversas. - Ao cair da tarde. - A solta. - Quanto se t iro u. -
A ceia ou merenda. - Depois da ceia

À excepção do fogueir o" q ue logo ao luzir da manhã a cende a fornalha da


lo co mó vel e ap ita a ergue r. todo o pessoal « a ~arra » a o nascer do sol em ponto.
A nt es. o maqui nista faz silvar a m áquina e ao ouvirem-na os da eira , todos
a codem à cobrig ação». en t re tanto a locomóvel principia Q. a cci o nar a d eb ulha-
dora. T o dos a postos e prepara dos, (,) a faina começa , desenvolve -se e intensi-
fica -se. N u m instan te " homens e máqui nas tudo manobra na perfeição. se o

l a) Pnpuado. cora I•• ~o. ao pucOfO • o. ol a o. d. f••dld o. por .sc. 10' 1•••.10., d. u d• • a pr u ftT u da . pu da
• •ln. du pa lL d o p6. Alã..l. ' . d. oco;la~io mlll.o....j. lIa a un. 11.,.10., prucUul•• d. to i. pr.u.. , õ Outro• •
,01111I, alo .. .1,,\1 II pod. m dbp.nur . l'lio • • u . ru o o• • Ii ••• udor.. c o. 4 nola.. d a ..oboLac da polh• .

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ATRA v t S D O S CAMPO S

realejo (1) não desafin a, po r qualquer asar ou descuido. A faina da s prim eiras
horas da manhã, com o pessoal refeito pelo d escanso ela n oite, dá em regIa um
rend imento pro por cíon al men t e maior a o das outras h oras do dia. como n ão h aja
o sen ão de a m anhã estar muito úmid a e o «pão» fazer-se mal. ( 2) Estando 8
manhã bo a, 8 9 m áquinas na a fina çã o e o pessoal cuidadoso, o aparelho fu n-
ci on a lindamen te, num a laboraçã o cer teira e m etódica, sem tre p idaçõ es nem
p reca lços.
N o alto da d ebulhadora, firme no se u pos to, o alimentad or de staca-se
im en so pelo dese mbaraço que r evela e pela Io i tez a q u e mostra. N er voso e de ci-
d ido, ali m en ta i ncessa n tem en t e e a preceito. desdobrand o os m olhos que lhe
vêm à m ão e at i rando-os às braçadas para os batedores em giro, que d esde logo
os apresam, eng olem e esfrangalham, n u m a v el ocidade ve r tigin os a. N ess e per-
s iste n te redop io, tod o o grão sa lta das espigas e s egue os s eu s trâmi te s de Iim-
pe sa . D os prim eiros crivo s va i aos alca truzes e dos alcatruzes corre aos a'rnei-
ros, indo d epois a um crivo r otativo, o nde se acaba de limpar e de onde sa i
lo go, a fl ui n d o às bicas da m áquina e d ela s cor r en do d e tt r m e p ara os sacos ou
ca ixo te. Por sua. vez a palha «fa z- se. também e lá vai saindo à s lufada s no
couce d a debulhadora. À palha conforme sai passa a o crivo do Eagulheiro, onde
o m esmo 8 s epara da m oinha e d e al guns r estos d e grão. O fa gul h eiro agita-a
de contínuo at é a de spejar no chão. sem bago s nem m oinha . Do chão a des -
viam logo dois homens. co m o t am bém é desvi a da a m oinha r espectiva. Ambas
as coísas não mais se juntam e antes se a fa st am po r m ei o de um r oj ão, que uma
parelha a r rasta. a uxil ia da por dois ga nhõ es.
Parelha e h om ens não cessa m de remover a p alha e a m oinha, a rrasta n-
do - as em «bo r reg os» volumosos q ue deixam a dist ância e em sepa ra do.. on de
n ã o faça m estorvo à d ebulha . rI) Assimj todos os q ue po voa m a eí ee m exem-se
e t rabalham n os seus respec tivos lu gares, d es de o g ru po d os ga n hões q ue d o
rilh eiro s ervem os molhos ao alime n ta do r, a té aos qu e ench em os sacos e os
ca r re ga m pa ra os carros.
...... , , .. , , . , , ,

Às s ete da manhã ou à s sete e m ei a , a máq uina s i] va e o pessoa l suspen de.


i a ch am ad a a o a lmoço, q u e fa z p ar ar t udo. Os h om ens la rgam os serviç os,
tiram os óculos, lava m-s e n as vasilhas d e água e lá vã o a a lmoça r ( 4) e de scan-

( I) E~ 1i "'IU" ~ G'o r. d• • por .nu f.uI • • o. hOlllc", do c.mllO .Ã .m.~ u. lc;o • ' 001 • • • •pld. d. DI'o;lul"illIlo,
'Ill ... o.lm... 'o. E U ClIo 'Oll.m do tI.... o llU' .11'101. lia fo. , 1. o . I,..IIi•• do. Ch.III...... plic'-Io . 0 conflu llo d. q ",aI. _
qu.. colu ••ol u lllo'" que n umO" 'III, COIIIO utlllllllo. tr po.'.do. CIII ( 11:' 01, ' Ic.
(al !Ift 1. 1. ( o..dl,õ" d. muh.. "lIIfd.d•• ou c!lo.". U l'Il d. . . m1ruo.pCl" • debulh ... A. ='010111" p' U III • • , ...11.• •
ri. . .I lu b. lIu . 1Q0u.I.o ......Iço•.
(:5) T.nto • p.lh••01lDO • mol.. h. Ii• • m . 111 011.10. 01. . . UaI.aal d. mUlo' d. d. bulh.do•• , . "a ..d.ado oPOfluaid.a.
d. pU lll al.m Da d• ••omoa'(io • Illre... I, .....lm. n..... lno 1'1' 111.10.1. do . ' U OI. Oul.U ..un• • p.IÕ • • IDol.. L.• • io
pu,u .d. . . .llllu .u .d.. loão q'oe lU. do .perllho d. d.bu1h., h" l l\do p." 1"0 . l q",hu I.o, p. Óprio•• pII.o.1 c:u1o,j'O'O.
t o ....illl . ' " ' IlI. jO' o qUI " Il.lo 0.1' . u llo por falta d. IC. PO. 011 .OIft ., .... O... '" d. pU'OII. O {\1nclon. . . . lo I/IIIOitl.llIO
do .p.relho 01, d . bu lh. , do l1'Im d. prtll""=. di o .. ti.. 'llc,pdolll l IIlillll(io, . om I.Um d. UIII .p. onh 'III'Jl'o d.
1I.lh .. moito m. lo . do 40. pu,," ..do-.. ou .1. Ul u .ado · " uiu.lotDI... , •• 11.0 ln . al' 01 ir u .
( 4) V eJ . ~.. A llmclIt.( oJo, • pj , ln.. n7.

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ATRAvtS DOS CA MPOS

sar no sombracho. até às oito ou oito e meia. Neste meio t em po fala -se do muito
ou pouco que a máquina está a tirar e do bom ou m a u se r viço que el a faz : -
se parte ou não o t rig o; se sai sujo ou l'impo, etc. E a propósito h á co nfrontos
entre tais e tais debulhadoras e estes ou aqueles maq u inistas. Q uant o às debu -
lhadoras, uns são pelas claytas (Clayton), outros pelas Tussas (R usto n ) e alg uns
pelas marsas (Marshall), Dos maquinistas falam con for me a lab uta çã o e a queda
que têm pela criatura em fo co . Do Bragança qua se nunca se esq ue cem por se r
o m ai s antigo e o de maior fama .
...... "

D eco rri d a a hora do almoço, um novo silvo chama a família ao trabalho.


A família vai e o trabalho reata-se de pronto. na intensidade q ue tinha a n t e-
riormente. E com afã prossegue até às dez e meia. em que a locomóvel, silva
outra vez, anunciando a cigarrada da manhã - um pequeno intervalo de des -
canso entre o almoço e o jantar. Ào soar o silvo, todos param. Quem quer,
fuma no sombracho ou fora. Q uem não fuma, descansa apenas. Dez minutos
depois, o uve-se d e novo o apito, acabando a cigarrada e chamando à retrege .
E lá se volta a debulhar com igual empenho e com maior calor. Calor do sol,
entenda-se , calor que flagela os homens, esce lda n do -Ih es o sangue, abrasando-
-lhes as faces. Mas eles aguentam-se a pé firme. n o cumprime nto do dever.
Estão avezados ao sol e o sol não os vence.
... ... .. . .. .... .. .. . ... .. ... .... ....... . .. . .. ... ... . ' ..
Cheg a a hora do meio-dia e a locomóvel apita, chamando ao jantar.
A s eguir ces s a o labor das máquinas, d os homens e do gado. O gado vai para
O rilheiro da aveia ou para a cavalariça do monte. a comer a ração. Os homens,
abandonam o aparelho da debulha. sac od em -s e do pó e da moinha, lavam-se
nos tinos da água e, em contínuo, vão para o s ombracho a fazerem hora ao
jantar. Nesta altura o sol dardeja raios de f ogo. que ferem a vista e abrasam a
terra . No sombracho há uma sombra preciosa, que todos aproveitam.
. .... . ..... ... .

Dentro d o scmb r achc, enquanto os genhões se sentam nas tripeças ou


burros que ladeiam a banca - o ebegâo vai despejando a olha da a sa d a de cobre
para os el guicla.res de barro que tem à mão. Tantos el gwidares, quantos os pre-
cisos para figurarem na banca, ao alcance do pessoal. O abegão enche-os, colo-
ca-os na me sa e toma o seu lugar à cabeceira da banca. Desde 1080. todos os da
ganharia rc igurn pão de centeio para o caldo da olha, a té mais não caber.
O abegão suspende e diz: - «Com Jesus I... » - t como se dissesse : - « Vamos
a isto ..• » - Os comensais assim o compreendem, abordando às sopas e ao
cozido, dep ois de amolecerem as sopas no caldo que as embebe. Comem devagar
e em sossego, muito de espaço, o. aproveitar-lhes a comida. S e entram bem nas
sopas e nos legu m es, melhor se atiram à boia e à morcela , senão à badana que

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A T R A V e S DO S CAMPOS

por acaso apan ham. (t ) C omem à fr anca e à vo n tade. se m vi slumbres de fastio,


como quem n ã o sof re d o es tômag o nem d e a cha qu es s emelha n tes. Qu em tra-
balha b em, é d e r a z ã o co m er mui to. E, eles tra b alh am a valer , co mo p o uco s.
N ão h á m elhores t rabal h ad o res em todo o Al en tej o.
· - .. .
Àparte d a gan ha ria , O m a q uin is ta e o Io g uei r o ja n t am de u m a m a rmita a
sua olh a d e legumes, algo m elhor que a do s ge n hôes. M et e m ais ca r n e e a com-
panha -a o pão de erf a o.
· ,. . . ... ........... . ..... . ...... . .
D ep oi s do jantar do rmem a s esta . .Ianre e e sesta entretêm h ora e me ia a
d ua s h ora s. Maquinista ze loso só d em ora o indispens á vel pata se comer à fr an ca
e d ormir-s e u m pouco. E.m l h e pa re cen d o. levan ta- se e faz ouvir o apito .
É a chamada à. tarefa da tar de, o. que os d o. ga n h ada respo n dem erguen do -se e
espreg ui çando-s e. Mas lá vão to dos par a os seus lug a r es em red or d o npà re l h c,
o u em volte da debu l hadora. N ã o vão muito alegres, rnss vão dispostos a cumprir.
·.. . ...... .. ......... . . . .. . . .. .. . . .. .. .. .. ... ....... .... . , .

• • •
A d ebulha a vapor nas prim eira s h oras da ta r de , vai a efe ito co mo a das
ú l timas d a manhã, is to é, s ob a a cçã o s u focante d e um calo r int ens íssimo.
O calor fa cilita o preparo d a pal ha e a d ebulha d o g rão. M a s a ba te a ene rgia
d os h omens, qu e apesar d e g ra nde n ã o é d e tod o ins ensí. vel à asp ereza do clima
n es sas horas tó rr ida s d e te m pe r a t ur a afr ican a.
, . .. .. . . . . , , .
Ao mei o ela t arde dá-se a segunda cigarra.da, igualou se m elha n te à ou t ra
da manhã. A propósito de cigarradas, ca be aqui um pa rê n tesis. T ant o a da
manhã como a da tarde, só t em lugar n os dias em qu e n ão há enredos d e para-
gens forçadas por motivo d e avarias ou por mudança de máquinas de um
r.ilh ei eo para outro. Nos dias em que há enredos desses. as cigarrada s supri-
mem-se ambas ou uma pelo menos. Nem são precisas. S e se trata de avaria ,
desde que o aparelho suspende até que o reparo se efectua e as m á quin as vol-
tam a funcionar, o pessoal descansa, fuma à vontade e di z o que en ten d e. a
p ropósito ou despropósito do caso . (2 ) Com as mudanças de rilheiro para rilheiro
aco ntece quase o mesmo. Posto se faç am a braços, a p ouco e pouco, aos empur-
r õ es e fo rça de toda a g ente da eira, no final, essa g en t e disfruta a compensação
do seu t rabalho excepcional. Enquanto o maquinista nivela e afina o aparelho
n a sua nova instalação. os da g an h aria, pelo men os, fumam e folgam o seu

h } Va i~·'a AIi".. r>.. ~io • • p' .i,.u 117 a u 8.


fi} O puaou dU ta,... . IlllD. 4r>aado a. d QU' O UlIUO d....·.., 1. d"lIo" PIIUt O. 'II lD q u ar lO d. Lou, J'ot "" allllt'.
011 ual lI.du lllLo .... i • . Prolo",a.. do·.. O l o.. u r lo, O 1I".oal ocall'- U n oa lto Qu al quu lu bal h o d. t ln. E .. O reparo
d.aloU . lnd. lIuil•• 4. a l...1'I. Icual. d. lift ....1 lu ba lbu fou .

362 ~
ATRAvt S DOS C A M PO S

pedaço. maior ou m en o r conforme a demo ra do conserto. Interrupções ex tra or-


dín ãrías, semp re atrasam a debulha, ocasiona ndo descansos maiores q ue os das
ciAarrad ss . Mas te m de ser assim . As mudanças impõem-se nas eiras de grandes
debulh as. com muitos rilh eiros. (1) Às avarias também se contam com elas.
E verdade, verdad e. a pe sar de prevista s, toda a. vez que a parecem, arr eliam
bastante o maquinis ta e o lavrador. Sobretudo q uan do ac u sam r omb o grosso,
ou se r ep etem a rn iud o, o q ue é v u lgar nos aparelhos ve lhos o u es cangalhados.
C o m cha vecos dess es, há dias de tanta macaca que a toda a hora surgem p ara-
gens de asar: - ago ra é p orque se quebr ou um pente dos corta-palhas; 1080,
amol ga-se outro; mais tard e. salta a correia do volante; caldeia-se um bronze;
a locom ó vel n ã o toma ág u a; o s arneiros es can g nl he m -se, etc.• etc.
. ....... . . .. .. .................. ..... . . .. . ..... ...... ..... .. ............ . .. .. ......... . .... ... .
D o meio da tarde em diante. o apa relho de debulha continua a laborar
q uanto pode. m elhor ou pio r. segundo as circunstâncias. S e as circunstância s
fav orecem numa co n j ug ação de fa ctores propícios , t orna-se at ra en te observar o
traba lho ace le r a do das m ãq ui n a s e a saída do cereal. Ao cair da. tard e j ã o
"gentiol'> trabalha de melhor gana. livre d o calor ab afadi ço qu e o t ortura e q u e-
branta na m aior crescence d o dia. Â. t ardinh a o ca lo r é b em m enor, e. em reg ra ,
muito atenuado pelo vento Oeste - a a p ra zí vel t r evessie, q ue reanima e enri ja .
O ambiente melhora. os corpos r efres cam e a ei ra anima-se ao infl u xo dessa
aragem a gradebi lísaíma, certeira e pers istente. A ssim, " refrega d a d ebulha e
d os acarret as, prossegue mais i n t ensa e vi vás, sobretud o a dos acarretos para os
celeiros. qu e se efectua de preferência a esta h ora. Carros a chegarem e carros
a saírem. engatados a boas parelhas. rodando li g eiros e r uidoso s em caminha-
das r epet id as e ep ressadus. P or o ut ro lado nota-se igualmente a chegada de
vá rios curiosos. ganadeiros de r eb an h os a pastarem ali perto, o u cria turas estra-
n has à casa. Cheg adi ço s dive rsos. q u e vêm dar o se u passeio a ve r a s máq u ina s,
a obse rvar as d ebulh a s, a saber d as f un das. a p edirem pa lha. ou som ente a fa la-
rem com este ou aq uele d a s ua camada , s enão co m to d os. incluin do o lavr a d o r.
Qu e falem ou nã o, os d a eira mal a s ou vem e entendem. En treg u es ao t raba-
lho, sob a vigilâ n cia d os man d antes, 80 trabalho se aplica m co m afã. tanto
m a is an i mados q uanto m ais refresca a tarde e ma is se aproxima a s olta . E a
locomóvel lá continua a accionar a deb u lhado ra. que prossegue laborando metó-
di ca. a debulhar O grão e a ef az er» a palha. num sussurro co n ti nu ado e in con-
fundível.
... .. . ....... . . " .
À o so l posto. a [o com ôvel si lva d e espaço e pe la ú lt ima vez, a nu ncia ndo a
( 1) P u. nhu mud'IlC" fUq'a,nt ( OIlYiIll 1.... 11111' rllhelrOl ' fl lld u , Itr~ o" '111 ""POI d• .1111. pu . lel' lIIe.. t .

.0.
nh,Ido •• 6 ( ....10 d. pel ....lo ",p'co , g lid p,u n illu.I.,. d.halhadou • ,r I.bour 1II111t0 mai. umpo. um mad aDC', do
I.bo r• •olDdo . . .nlml • 11m .6 rllh..l ro · M.. flfo. , "lllt.jotO plU o dup,ch.o dI d.hulh,. t,m o ill(Ona l'D1 ' d•
...olllmu o rl. co d• •ud. du má l(o,i DU DO c..o d. iDdlldl o . lom. 0;( 0 ' .. p,u,", , .. UlIIl dot doia d lh..fro• • (0 1110 a io ..j ..
••••• d. d••r oo t o, co.aaJu••• 10 ' 0 .0 riU.,ilo 'roottirho• .1.1. ..",.10 o Ipaulho d. d.lullh.. uIlr. doia fo.o. IO d o u • • • • 11'
o uiaj.lrio por nllo. dll 'rionodo-o h ut••t. 00 tA"'tl lh<' lIdo. o , • •hlOlllto.
A de bo,lh,dor•• pelo meno....rri.n~.... arder t onl••at• • ( o. meoo, prob, hlUd.du de ...I...c I o do 0;( . . . . . udun.
u(ou.d.... um .6 ri lh., lro.

- 363-
ATRAvtS D OS C:\MPO S

solto. Ao som d o a pi to, en q u a n to as m équines vão afrouxando lentamente até


pararem, os ga n hõ es e os alimentadores largam o trabalho. tiram os óculos,
sacod em-se d a s p alha s e lavam- se nos tinos. Ào mesmo tempo d es en gatam as
mu ar es da pal ha e d a ág ua , para irem comer e descansar. À trabalharem em
vol t a d o a parelho. continuam p or m inutos os dirigentes da debulha e seus aju-
da s : - o maquinista e o fc guerro, a t ra t a r em das máquine.s j o ebegão e o sota
a u lt ima re m a mediç ã o, o en sa q ue e o ca.rregtrio, se porventura adreg8 haver
cerr eguic para os ca rros. Haja Ou n ão. tudo se despacha de pronto. concluindo
a l ida pela anotação do s moi os ou sacos que a debulhadora tirou em todo o dia
e p elo as sento d os m oios said os pa ra o celeiro. D os primeiros, toma n ota o abe-
gjio e o m a quinista; dos segu ndos, só os regista o ebe àêo. De ordinário. à
an otação do q u e se t iro u, assiste m o lavrador (sempre que está na eir a), a lgun s
trabal had ores e os chegad iços cu rio sos, q u e prIvam com os «ca b eç a s» . Então
repe tem - se os comen tári os da praxe s obre a funda d a see re e o tr ab a l h o do
d ia . Pisa- se e re pisa-se o q u e já foi dito, mas não importa. As apreci ações
s obre a s eara e a debulha são tem a o br ig a tó rio d o cava co à solta e à s r efeições.
.
. . . . . ....... . ...... . . . . ....... . .. . . . . . . . . . . . .. . .
Afinal, o a begão co n cl u i os a fa zeres da eira e aos da s má quin a s aco n te ce
o u t ro t a nto. C o ns equentemente, um e o u t ros vo l ta m as cos t a s à eira e vã o até
ao sombrsch o, a tratar da m er enda. ( I) M erenda para eles e pa r a os da ga n h a -
'tia, q ue o s ag uar da m impacientes.
Instantes dep oi s, ge nh ões e «go ver no s» m erend am o gaspa ch c do estil o,
batatas d e a zei te e vina gre, ou s opas de l eite. É con forme o dia da semana e os
u sos da ca sa . Seja o qu e fo r. com em quan t o querem e dizem q u a n t o sentem.
E m co me n do sae m p ara f ora d o sombracho a gozarem à vontade o fre sco da
n oite, em s erã o d e di chotes e brincadeiras. Brincadeiras de jog os e de f or ça s,
entremea dos d e pa rti da s a os pacóvios. «Armam-nas» os estúrdias, m uito dados
a j ud iarias. Com i sso r iem e r erou çe m, at é q u e se enfadam e sossegam . Depois.
de itam-s e ao r el en to , por aqui e a col á, pela eira for a. à LU2 d a lua ou das
estrelas. E t od os d orm em tra nq u ilos, a sono s olt o, restaurando energias d e que
ta n to ca r ece m . Tu do r epo u sa en fim na eira , à exc epção do guarda. que anda
num va i-ve m constante, seg u ido do s eu apreciável companh ei ro - o cão fiel e
«se n tido», que n ad a l h e es cap a, la dr an do f ur ioso à m enor d es confiança .. .
.... . ... . ... . . .. . .. . . . . . . . . . , . , . . . . . . . ... . . ... . . ........ . . . . . .. . . . . . .. . . . . . ,
Os montões nas eiras - a enxuga ao sol Tanto na s debulh as por égu a s
como nas que se efectuam à
máquina ~ até Da s das malhas, os cereais debulhados são, por via de r egra ,
medidos e ensaca do s de ve z n o s ítio em q u e se limparam, seguindo depois em
carros para os celeiros o u ca m in ho d e ferro . Mas em muitas ocasiõe s, pro cede-se

fl) A nfe h i o d o 101 PUlO. U,OIO Ih. ch u :lI. = cei. COII>O m crrc n d •• t cOQfom. u ll•• .

- 364
ATRAvtS DOS CAHPOS

de outra forma. O g rã o medido e ensacado. em vez de sair para o seu d e6nitivo


destino, é apenas removido para um loca l próximo, d en tr o da eira, onde se des-
peja dos sacos e onde se vai a cu mulan d o em montão ou montões" q u e dia a dta,
aumen tam de vo lu me . C ad a mon tão desses. chega a r ep r es en tar de zenas de
mo ios, assim ex postos à soalheira durante dias e dias.
P or dois motivos se ex plica este us o : o u por q ue o vaga r dos carros é pouco
para aca rretos distantes, q u e se podem adiar, preferindo -se outros m ais impe-
riosos. como os da seara em r a m a, o u p o r que estando o g r ã o úmid o. p recisa de
sol e de ar até se pô r enxuto e res sequido. N em em condições opostas se deve ence-
leira r , sob pena de f ermentações d es astro sas, qu e mal se r em ed ei am . T r ig o s#
centeio, cevada e aveia, tudo precisa enxugar bem , antes de se recolhe r. E. as
cevadas mais que os out ros g én eros P or enxutas que p a r eça m , é d e boa pru-
dência pô-Ias ao sol por muitos dias, a apanharem 8S r ess ole Das de julho ou
de ag osto , co m o prese rvativo eficaz contra a ponilha e o gor8ulho.

Med içõ es Fazem-se co m o decalitro quadrado e ainda à s v ezes co m o antigo


alqueire. desde que s e não trate d e vendas ou pagamentos. Nos
cereais, qu er que se empregue a medida d ecimal, quer se adopte o velho alqueire
o uso corrente no termo de E l v a s é m edir -se «d e raso ». s em ex ceptuar a a v eia ,
que noutras regiões vai de cog ulo. Nos legumes, us am -se o s dois sistema s, p re -
valec end o o de cogu lo e no alq ueire e o de raso no decalit ro.

• * *
Há muitos modos de med ir. Quem sabe a valer , mede como quer e entende.
Quem não sabe ou sabe pou co, mede s em uniformidad e nem consciência, des-
cambando, g er a l m en t e, p ara medição av anta jada, prejudicial a. q u em v ende.
O s medidores de profiss ão, sabem ta n to «da art e» que tornam a medida es cassa
ou farta. s egundo as intenções com que medem. Aquilo neles é elástico feito na
per feição, com toda a li m p es a ap a rente-, E.' ques tão d e mais ou menos en drómi-
n as na m aneira de r asa rem com o pau e nas pancadas à medida, no acto de a
encherem e v o l tarem .
... . ... . . . . .. .. . .
Nas eiras, quando apenas se tr ata de g éneros a rem o ve r para o s cele ir o s da
casa , a med içã o respectiva faz - se s em preocupaçõ es de rig orosa legalidade.
C on f o r m e o propósito a q u e se vis o. assim vai. Mede -se por qualquer das
seguinfes fo rma s: medida «fr a n ca» , a nunca dar quebra, antes crescen ça r m edida
«de bigote», ( I) assás a v a n t a ja d o. para dar muita crescen ce : medida Brrapazada#
metendo p ouco , para faz er núm ero de me didas e avultar a «funda » do dia o u a

(I) Medida .d, 6" 01' ", ua.bl' 1m lacLar b. m .. med ida . u m o pa~ .. U'I'UU' dI todo. aDfU p.lo con.trbto. d. i:ua-
°
do·I L. Plo pod t. d. mCDt. \13 Pf <t acn.o co, .. lo DI"'" d .. u u .mld.du. Ena co' .. le, , cLamado biJOIC,

- 365 -
ATIl.AVeS DOS CAMPOS

grandeza d o m ontão. (1) Medida direita. «d e pau e ferro », o preceito d e n ão daI


equebrase nem ecres cen ça s•• é rar íssim o faze r -se. Resumindo : a medição dos
cereais presta-se a trapaças de toda a ordem. que mais se avolumam com um
medidor habilidoso. falh o d e escrúpulos. Por isso vai-se abandonando o sistema
de vend as ca medid a » e adoptando-se o d e: '- 8 peso », q u e é. sem dúvida, mais
racion al e menos a da p t á vel a tram oias.
. . . ... . .... ... . . ..... . ..... ..... . . . .. . .... .. .......... . .. . .... .. ... .. . ... ....
(Não foi encontrado o original qu e se referia tl esta pa rte do capitulo.
Vid e nota no fim do vol um e).

. . . . . . ... . .. onde os empilham ou despejam. S e se trata de carr eg wío imediato


para os carros, os carreiros ajudam , e. a propósito. vão falando sobre a eat a d a»
dos s acos e do peso que lhes notam. E O medidor continua a medir e a contar
alt o, desde O número 1 a 29 (sendo alqueirã o a medida) ou de 1 a 39, na hipó-
t ese de medir com o d ecalitro. No prim eiro caso, ao ver q u e vai em 30, em vez
d e d iz er : - cT r i n ta l. .. :. - d iz alto: - cTslbas. uma . . . :' (ou a s q u e s ão ).
N o segundo (t ratand o-se do d ecalitro), a bstém- se de g rita r : - eQ uaTen ta I. .. »
pa ra dizer forte: - eT alhas# tantas 1..• » P or outras palavras, em lugar de con -
tar as medidas a té p erfazer u m ma io d e 60 alqueires ou 80 dece.litros, (2) conta
so me nte a t é meio moia e a ess a q ua nt id a d e chama talhll. Era assim an tes,
invariàvelm ent e. Na ac t ualid a de, n em s em pre se conta assim. H oj e em d ia.
v a i- s e aban d o nand o a unidade talbos e ad optando-se a de sacos. O medidor, em
v ez de contar a té 30 alqueires ou 40 decal irros, restrin ge o conto ao número de
m edidas que d espeja em cada saco. E em todos bota quan tidade fixa, igual : -
6 alqueires ou 8 decalf rros, nos med ições para sacaria do lavrador com destino
ao celeiro; 10 dece Htrcs, nos sacos f or n ecid os pelos negociantes, quando se
medem cereais 8 conduzir para O caminho de ferro. (I) Estes últimos não vão
cheios mas pesam bastante. sobretudo 0 5 q u e levam trigo. Sacos com trigo a dez
decalitros cada um. fazem mau ca b elo aos ganhões e carreiras que lhes passam
p elas costas. Nessas oc asi õ es diz em eles com razão: - «S e quem o merca lhe
passasse pelos lom bos, nã o mandava enchê- lo s tan to ... »

(I) t o ca.o du IIldi{ a.. A•• m.lhu d. uA tdo, .m qu . o. lIl.lh.doru ptl lUl.dlla dCltl.o u tru 4110' _tlru..m tIlollo"
4110. Umpu. . . . . . ..,.cI...um ..o h ol al" uda. ou d.caUtto. d. Claulo.
(2) P or t.I1",• •• Iu.d.· •• o waid ••• de 30 ..I"ud r .. ou mtlo mofo. O aad,o .I" ud u do U nlI O d. Eh·... alada , til
'0'0' ... u .. dOI mu. p.que lOo. do 1' co nllpo lld• • l J .J9 . Um mol o equl .... l. a &03 litro•• MI.. pu. arudo Ddu aO.no •
po r Ilduo cO.. ... Dclo 'Atra a Iuou n • o comitelo• • • "a'ou'" "'II' o molo d. [ I.... u ja . qoJpar.do • ao d. ulltro•.
Por i.IJO qo.Uldo II mil. co m o d.ull no , COl:Ot.·.. wa. ,.11'1 d. 40 CItl. 40 d n.lJ uo• . Em I I.jIltll.. tini . M lIluod. t al...,
uuUld.... da "ID UOI com dutUo o . 01 u taitOI do I.uldor r u pf' d 'O'o . Dled._.11 .h.d. com o n U. o al4utln _ o tudldo" ..1
.11I8, ft i o. ,omo 11.. , L. m..m 01 ' . IDLi5,..
N ......dlci5.. po r .f. ho de ...."d. ou . m P. ' . IIU l:Ot o d. nod... fuo• • pea.a 6 •• lD.d. co'" o d.ulhro " o.d, . do.
M .. lno fu · .. por oludlla d . l 1.,.. Ud. d•. 0 1 .... did or.. .1.. oca.lio (..b"15I1. ou l:r ar. lc.l. d. I....ou n ). .. o. d.l:n ....
.....obur li. ' 0. ..o",.d., lDedlr i.... IImpu pelo .Iqu. lr • . D o de cali uo. Al o 'ou . m. AI . ,.m 4u. lD. dull. m. ll.o r . all il
<1.pr.... com o .1"".Ir. - 1II" ld. 1II.lo r • d..... l.I d"plcho. ,\p" o ' tudl Clo . /fu. h'·d. le d. up.n c."do .
<J l O .... co. do. I...,.dor.. co.tum.m ..r p .qu.oo. . ..tr. lto., d. c.p ..c1d..d. p..u 8 d. c..lluo' ou pou co illul • • O . do.
1I" Oel."u. a o. d••Iu'un, . io multo rlub 1""0', compOIlI.do dou d.c. li uo• .

- 366 -
ATRAVt.S DOS CAMP OS

o ap ura mento final - No levante A í pelos meados de agosto. as debulhas


da eira - «Ca c h o s e v arreduras» estão de r esto, p ron tas ou quase. M al se
ap rontam, trata- se do «levante d a eira »,
que é como quem diz, do aproveitame nto d o grão, (I) q u e es capou à deb ulha ou
à lim pesa. Escapa sempre, mais ou menos, conforme os cui dados do p essoa l, o
process o e a execução da deb ulha, a preparação da eira. etc. À ssim. nest e propó-
sito d e aproveitamento rad ical, a moinha dos tr igos de bulhados à m á quina,
passa-se 80 vento e desse t rabalho resulta a pu ra r - se quase todo o g rão escapado
à Hmpesa primitiva. O s cachos (fr a g men t os de espigas) (2' que saem 80 a ncin ho
quando se limpam os montões das debulhas por égu a s. são afinal debulhados
juntos n o fim da épo ca, dando origem a um derradeiro calcado uro. À n tigamente
o trig o apurado deste calcadouro era, em g er a l, a p lica d o ao fabrico do pão
cas eiro da lavoura. D a debulha do centeio por ég u a s ou a m a ngue ís, ret ira -se e
junte- s e uma co n si deráve l porção de espigada (a) « P OI: fa zer» ou «mal feita» que
é por ú lti mo r episada o u ba tida d e novo, dando ainda um rendim ento d e apreço.
Enfim, do s as sen t os dos rilh ehos e das varreduras finai s da eir a, também se
re colhe tanto o u mais g rão, qu e da espigada e dos cachos. À l'impesa simultânea
do s «ca chos e varr eduras», constitui o derrad eiro serviço d as eiras dos trigos e
do cente io. E.' e m ger a l se r viço d e u m d ia, qu e s e faz a ri g or e es cr úpul.o, para
se a proveit ar q ua n to p os sí vel, o q u e t anto cu sta a criar. E ' neste apr oveitam ento
cuidadoso q ue s e fund a a conhecida locu ção popular alentejana: Fulano, ganhou
tant o, loro «cachos e var re d uras».

Palhas Conform e s ae m 4I:fei ta s» das m áquin as, d os calcadouro! o u das camadas,


a ssim se d es viam da eira para onde não ca u sem estor vo e onde s e
pos sam am on toar pro vis oriamente, em co ndi çõ es de se alm enararem ou prensa-
rem à vo n tade. Se o de svi o é curto, de al g u ns m etros a p enas, faz-se à forquilhe.
Se pelo contrário tem de ficaI a distância, há que juntar a palha em montões e
re m ov ê-I a po r meio de r ojão e cordas, puxados p or bois o u muar es . Este uso é
próprio das d ebulhes a vapor, em que se impõe o afasta mento das palhas para
sítio m ais afa stad o d o que o us ado nas debulhas por ég u a s. A palha do cen teio
mal had o, ta mbém sa i d a eira , acumulada em borregos, (~) que os p ró prio s
malhad ores remo vem , como j á pormenorizei no utro l u ga r .

À g ra ne l, co nform e sa em das d ebulha s, ou em fardos, as palhas são recolhi-

II ) Tri,o ou U Dt.lo. Da cnad • • da .... 1. 1'1 10 ,. <lu cr .. 1.. ... h .nto. O q u. U~ a p a • debulh• • l Hmp .... b.m. o
apTouham d.po l. o. ; ado • • um puj,.Jzo pua o l a.., adoT.
A prop6d lo d. aproulum.nlo, ee .. dm n Olar <I a . .. d.ball..do r u 100... didllld.. por m . q:u h~lat .. b' b.b . c.UUIO'OI,
,ld x""1 u c. pu m.no. ui,o n. m olllh . do qua &.li ",Ih .. ou ma l 'oumed...
(II) No flnao d e C.mpo M ala .... cb.m , u n, ., 10 ' f re'çl.lll.101 d.. upl, .. conJu cld.. por u cAo, no collcclho d. l i.....
(3) E,fII,.J., nll .Ir.. d. ma lb .. ' T11 ce lllo. 'lIolul• • c.cA... " .. . Ir u do. ui,o• •
( ~ ) Po r borres ", d." oml .... m· .,' 01 moa.l i>u , ,,ndu d. p.lh. II'" . a Jçnum " II . ir .. par. II umou um 10110 • 10:1 ; 0
00 po r Illd o de ....ln"J•.

- 367 -
ATRAvtS DOS CAMPOS

d a s em almenaras (ti e palheiros. para assim se conservarem até saírem para o


con su m o da la voura ou exi gências do me rcado. À almenaração a granel ou em
fardos, é fei t~ pelos ganhões, a p ouco e pouco, durant e 8 temp orada das deb u-
lh as ou no re mete das mesmas, indo então de fio a pavio, sem levantes de
maio r . C o m o quer que seja, o fei tio e cobertura [esseteem ento} das a lm en a r as,
é confiado 80 r isco e d i r ecçã o de um homem entendido que 8S faça e asseteie
em condições d e se destacarem pela S UB execução de apr umo, altura e r evesti-
mento. R evesti m en to expesso de piorno ou colmo. colocado a pre ceito, sem lhe
falta r o cordão tecido a pouca alt ura da base e o cerredou r o em cima, no fecho.
T ê m de fi caI ass im a cauteladas. para se defenderem u m pouco d a s investidas
dos pa rdais que as a cometem e deteriorem no inverno. Os pardai s tanto inves-
tem e esg ravatam n o tapum e das almenaras que l á co nseg u em introdu zir-se
en tr e o co lmo e a palha, pala a í cometem e nidincarem . E hibernam l á ao s
bandos, da n do en se jo a que os apa n h em ao candeio , à rede e a tir o.

A n ti ga m en te n iugu ém prensava palha. Esta, co nfo r m e sa ia d o s calcedcuros,


mais ou menos «feita» assim 8 g r e ne] se t ra n s po rt av a e a r re ca da va . O trans-
p o rte a d istâncias era e é n es te ca s o e fectuado p or me io de carros a r m a dos de
grandes redes de j u rrça o u d e linho. À s quais, d esd e o cimo da enlueir8dut"8
do carro onde «a botoa m», até em baixo. a o f u n d o da eb o ls ae, a quas e ro jar pelo
chão, uma vez ca lcadas e cheias, compunham e co mp õem carra das ~ig 8ntesca s.
de um b o jo tal, que chega m a peja r 3 5 v ia s públi cas por ond e tran si t am. Carra -
d a s apa rentemente enorm es, de gra n de volume. mas de p ouco p eso, r ela tiva -
mente. Este sistema de condu çã o, qu e ainda subsi ste ( pa r a as palhas e gr a n el,
en te nde -se), é m oroso, incomodativo e caro. O mod erno sist ema de fa r do s,
prensado , reduz bastante o volume da palha, dando marg em a carrada s de mais
fácil ce r reg uio, co m muito maior p eso e quantidade de palh a.
S e não houves se en f a r da m en tos n e m p r en sa g en s, seria ec onômicamente
im possível tran sportar as palhas em ca m inho de ferro, na escala e vantage ns
com que h oje s e tran sportam. À grane l, não d av a a co n ta e por i sso pouco ou
nen huma se expor tava dant es .
....... .............. . . . .... . . .... . . . .. . . .... . ...... . ... . ..... . . . . .... . . . . ...
Àí por 1875 é q u e n a r egiã o elvense principiou a u se r -se o en fa r da m en to
das palhas, q ue se destin ava m à venda e s aida pelo caminho d e f erro. Enf a rde-
menta deficle nttsst mo por me io de saca s que se enchia m de p a l h a e depois se
ligavam com cintas de f erro, aperta n do-a s u m a prensa de m a deira muito r udi-
m entar. E s te process o acab ou d e todo , a o fim de pou cos ano s, substituindo-o
co m vantagens outros sistema s d e fard os comprimidos por b oas co m p r ess ora s
m ovida s a gado algu mas e a v apor outras - a grande maioria delas, sem
d úvida. À e nfardadeira a vapor é, de facto, a mais perfeita, m ais potente e de

- 368 -
-.".•
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ATRAV t. S DOS CAMPO S

me ícr rendimento - 3&J a SOO fardos diários, com o peso de 30 a 34 quilos cada
um . ( I) Qualquer qu e seja o sistema de prensagem, a palha ent-ra a granel para
a ca ixa da enfardadeira e em resultado da p r es são que s ofre, sai de lá mecâni-
camente em fardo s comprimidos. duros como pedras e amparados por três ara-
mes que os segurem de lado a lado em todo o comprimento. Na palha do centeio,
há quem empregue d ois Brames em vez de três. Mas isso é uma economia nega-
ti va qu e prejudic a a perfeição da enfardagem.
É sab ido que as pa l ha s t i nham noutros temp o, um valor diminuto, apesar
de s e col h er em m enos e bem menos do que se coLhem hoje. Como o seu con-
su mo s e restringia quase ex cl usi va m en t e às necessidades locais, os sobejos
eram em ger a l a vultad os, cr es cen do de ano para ano, sobretudo nas z on a s em
que pezdomina m bas ta nte as cul tura s cerealíferas. Tantas palhas s obej a vam
antigamente po r es sa s herdad es f or a , à fal ta de expor teção, que as de menos
valor ou m ais antig as er e vul gar zeduzirem.. se a estrumes.. depois de removidas
pa ra bai xios ú midos.. onde ia m curtindo.. a pouco e pouco. A algumas, como
as de cen teio.. dei tava-se-lhe fog o nas próprias almena ras ou eram prêviamente
espalhedae n os alque i ves e aí s e q u ei m a va m no nm do verão. E as de boa q ua -
lidad e q ue f azia pe na. tran sforma r em estr ume ou cin zas, comp u n ham avulta-
dissi mos d epósi tos, que p erm a neciam inta ctos a n os e anos.
Na actualidade e po r via de regra.. o valor das palhas é bastante superior
ao dos te mp os a ntigos, apes a r d e hoje em dia haver colh eita s em muito maior
quantida d e. O preço. poré m, varia imensíssimo de ano para ano, descendo b as-
tan te nas boa s colheitas e su bindo muito n os anos es ca ssos, de est iag en s gran..
d es, n o i nv erno e primavera. H oj e, como ontem.. a palha é um artigo qu e o
lavrador se mp re franqu eia com si ngular g en er osida d e. Cara ou b ara ta q ue esteja,
o lav rador de bo amen te a dá.. à s muit as pessoa s pobres qu e lha pedem pelo a n o
adi ante e sob ret u do na oc asião da colheita . Almocreves.. pe quenos carv oeiros..
ven d edo re s a m b ula ntes.. don os de estalagens. burriqueiros, ci ganos, gunade ír os,
toda o. g en t e pob r e, en Êm, que di sp õe d e umas b esti ta s q uaisquer. to d os
pedem e obtêm palha d os la vra d o res dos sítios.. com padre.. a migo o u padrinho.
E m ger al, a d ádiva va ria sàmente na q u an ti da d e. C om a palha sucede o q u e
Se passa com a chamiça n os em e tos ». Em a haven d o, é do estil o dar-s e aos
pob res que a p edem . S ã o us os velhos, quase pa triarcais, d os poucos que
ain da r es ta m.

* • *
A a lme na raçã o e a rrecad ação d as pal has, é.. r -e pi to, O derradeiro serviço das
colh eitas cerealífer a s. A i fica, pois, r efer id o nos seu s d etalhes d e vulto. como j á
11) 1110 a o ,uo di lo do o . " afll ho ter lu m dIrll: ldo I bml ,," Ido oor oluo.1 ..bed or . C o m , .ate rllad n c. 00 1'110-
rull . o dfl " ac ho l butallU m lllor .
O 'Pl flu l lIlduollI.d...1 • oma ell(ard . dl ira • " . 'Por COII.'la do u , ulll.u ;
Um I IlClnl,. do l ulll .Umelllado r a u i,ccir o. mlllu· • p. lha 11.1 ptUJU I um co nl -araml l doi . brc u dor u a lJ,ar o,
Itlmel a u m acu ru ldo r doa fud o• • TOlal, u i. hom l ll' ou d.1lcO pelo mlIl.OI.

- 369-
ATRAvt S DO S CA M PO S

antes deixei pormenorizado. to dos os outros que se dispen sam a o preparo , cul-
tura. e recolhimento das sea ras, principal r'iqu eae d o Alentejo. Grão e pa lha,
demandam serviços demorados, dispendiosos e constantes. Desde o prim ei ro
«ferro» do alqueive at é ao levante das eiras - um período de 18 mese s - quan-
tos cuidados, quantos en t ra ves, que ntoa desenganos I. .. E t ud o iss o o lavr a dor
suporta, sem desalento d e maior, posto s e queixe a toda 8 h ora dos contratem"
po s que sofre a cada passo. Mas queixa-se por se qu eix ar , po r de sabafo, por
ouvir dizer que a lágrima é livre. Habituado aos r ev ez es d a vida, o lavrad or
experimenta-os e aceite-os como ossos d o ofício - sofri m entos ing énitos d a s ua
rude profissão. cujos asares e b afei os ele bem s abe q ue r esultam principalmente
de causas superiores à vontade humana. S e num a n o a vesso e mau, colhe
pouco ou nada. outro lhe virá propício e abundante suprir as faltas daquele.
E com isso se conforma. Com efeito. a vi da do la vrador gasta - se num ci clo d e
esperanças Iíscngeiras, alimentadas pOI u m a fé arreigada que nun ca O abandona .
....... ....................... ...... .
Searas . a quarto> - Sea ra s de obrigação -Searas de favor O capit ulo
Sea ros ai nda
não está concluído. Falta de cer t o pouco p ar a a s ua co nclusão; m as esse po uc o
t em importância . E por que 8 tem, n ã o fic ará n o olvido. Àssim, após a referên -
cia e descrição das gr a n des s earas pertencen tes aos la vra dores, há q ue a l ud i r às
pequenas c pequeníssimas dos criados da la voura, dos seare ir os e ai nda por acaso
de uma ou outra cria tura estranha qu e a al cança por favor ou recomp ensa.
. . .. . . .. . .... .. . . .
. . . . .. . . . . ... . . ..... .
. . . . . . . . . . . . .. . ... .. . . . . .. . . .. . . . . . . .
NOTA DOS EDITORES
Tendo falecido em E lvas a 18 de maio de 1922 o saudoso
autor deste trabalho, o seu primeiro editor viu-se o bri -
gado a feo har o volume sem tão Interessa nte est udo estar
concluf do, porque a morte, que o roubou aos carinhos
da familla e dos amigos, privou-o de completa r a s ua
obra, tão prec ios a para o estudo da vida da la vou r a do Alt o
Al en t ej o. P as sados tan tos anos sob re a época em q u e ela
foi escrita, por certo q ue t a m bém a lguns dos se us info r -
mes careceriam de se r actualizados, aflm de corresp o nde-
rem a06 dias de ago ra . Ente n der a m , porem, os pr om oto-
r es des t a nova edição não toca rem no que o fa leci do Autor
deixo u esc rito, co nse rva ndo intacto o texto da pr im e ir a
edição, que ape nas se modlfl c ou qua nto à ortografla.
1 N D I c E

I
AS HE R DADES - O que sã o n 8 herdade. _ No m e. por qu e ee conhecem, etc. 1 a 2

T op ografla - Li n da . e a f olhamento. - Area c l ota ção - Dím ene õee _ P 0 88ul-


dare. - Arrendamento • . 2 • 10

II
OS M ONTES _ São ai ca i u d e re atdêncta n a. b er-dede e, e, co mu ta t tvnm ente,
sed e. d e la voura - Herdades eem monte e m ontei q ue n ã o ee a plica m a
ce nt ros d e lavoura - Monte. g ra n de. c m onte. p equenos . 11 R 12
S itu a ção e as pecto - A p a taagem - Almeuarae e medu - Hc apltaltdad c que
. e franqu ei a nOf! m ont e. - Coe etr uç õee. . 12 a 13

Casa de hab lt e ç ã o - Ca86 d e entrada - Dtepenee - Cozi n ha - Amanar la . 13 R l i)

Acom odaç ões a g r ico la s e pecu árias - Celeiros - Q u eijeira - Forno - Ca83 d e
IA - Cav al ari ça. - Pal heir o - Cocheira - Atafone - Cas in ha dOI g a a h ôc a
- Casin ha d o a b egAo _ Caban a s - Ga li ohc Lro - CB8a d o. pintos _ C hi -
queiro . l ã a 21
Ar r e do r es _ Eira - P o ço s e chafarizes _ Malhadas d oi porcos - Bardo d a s
ca b r a s _ Quint a, h ort a ou qutncho ao . 21 a 21
A vid a no s m ontes - Como se pe eee o t emp o - De madrug a d a , à b ora do
almoço - A salda para o trab alho _ O lavrador e a lavradora - Avio. e
ou t ros afa zere. - Oa a 88ei08 d e porta. ad entro - 'I'ra n eeu n tce e vlaltantee
_ Ao . 01 p ost o e à n oltlnha _ A .onega . 21 a 2!l

III
OS M O NT AD O S - Arvoredo s de azinho e ao bro - Co n fuaâ o e n tre matos e
montado. - Azinhe iraa, s obreiros e c bupar -rce . 3 1 a 32

C r iação - Azlnhelraa e sobreiros, prov é m de a n tigos carre ece te 32 8 33


Tratamento _ Lavou ra - Límpeea das Ser ra i _ Arrote am ent o _ Deamott a c-

Roça - 08 «co rte.. - Desbaetea . 33 a3U


Produto s - Bo lota - Cortiça - Le n has - Carvão - Ra m a - Encabeça m e n tos
ou lot ação. 38 a 1i!1

Fru iç ão d a bo lota _ A e m a lt a » - Slar c maa d e fru ição - Eng ord a d e «vara ..


d e po rco. _ Apro v eit amento com eg a d o d e v tda» _ Ap a n h a d a bolota. 49 a 52
Conting ên c ias prejudiciais _ 801etel1'08 - pombos - O bur g o . 52 a 53
L on ge vid a de - Azinheiral e s ob r eir os v ive m mui tt aalm oe an os _ A az inheira
so bret u do é d e uma longevid ade Incalcul áv el

IV
PESSO AL DE UMA LAVOURA - Cr ia d o d e a no, de tempo rad a e a dt ae c-

Sua d enomina ção, s egundo o p eríodo p orq u e s e con t r a ta m _ Ag ru pa -


mentoa . 55 a ~6

C r ia da ge m per man ente - Entid ades q ue a constituem. 56 a f)7


P es s o a l t ransitório _ Quem o com põ e &J

S o ld a da s _ vencem-se d e du as claeeee - De qu e consta m _ É poca d os ajustes


_ Prec eit08 e praxes que 01 r egulam _ Pelos introit os d e S. Mateu s - No
d ia d e co n tai [)J a 6'1
S al á r ios - Preços méd ios por dia e h omem, e m r el a çã o à s diferen tes é p ocas do
a n o - UI onça I qu e p re cedem 08 ajute a - Ins ta b ili d a d e d os jornal ei r os . :)7 a fi'!
A um e nt o das soldadas e sa lár io s _ c eu eee qu e m otivam a au b ida . H'Í a (j;)

P a r t ic u la r id a des de cada ocupação - Gua r da d e herd ades - Abegão-Sota -


Botctroe - Gan hõee - Mai oral d e m ul as _ Carr ei ro . - Car pinteiros - Cozi-
nheiro -A ma ssador - Pa qu ete - Cr ia do d e c a v a los - Roupeiros _ Leiteiro
- Peru nzeiro _ Jio r te lAo - Semeador _ E mbelgador - Co r t a -ra ma s - m e-
Iancl etro - Ga d a n b eír oe - En rllhetradorc _ _ 'l'a r d ão _ ei onie trc e _ Guard a
da e ir a - Ceifelr os - Toe q u ta dc r e e - Cordoelroa-c- Va lad el ro s - Lançar ot e. (j5 a 69
Mu lh e r es _ Empr-egam-ee : nos Ap a n h as d a azeitona e da bolota ; na ee p alh ação
d oa estr umes e a d ub os : na s mond as, each a e e c ol he itas de leg u m es e um
pouco n AS cetfae - S al ér lo c hora s d e trabalh o _ Quem a8 govern a - A.
eba la as - Co m o p a ssam oe eer õee - A «p ag a» a OI d omingos fiO a !'IS
G a n ad e ir os - Dlettn çâ o e n t re ganad eír-oe e metc rnte - Catcgorlas _ Proced ên-
ela - Aju stes - S old a das - Pegul haie - Tend ências e b ábttoa - Traj08_
Malh adas - Chocalho s - Guardadores de ga do vàcu u m: boieiros; vaq ucí -
rOI; a çougueiro; no vllheiro - Guar dad ore s de gado cavalar: eguar- lço:
poldreiro -c- P or q u etr oa : mai oral ; en t reg ue d e p orcaa ; fa rroupelro ; v a re lro
-Soldada d e u m porquei r o, com pegulhal ~Pa _to r e 8: m aioral : e ntreguee ;
a lavoctroe - Guard adores d e g ado capelno : c a b r eiro ; chtbateir-o - Alfe l-
reiros. n5 a j l2
Alim ent a ç ã o - P raxes qu e a reg ul am - Avio. ou co r ned or ta e - Refelçôe e c;

Com tdae habítuata desde o S . Mllte uI a tê molo : almo ço: merenda; ce io.
_ O t rato n o verã o, d esde o 1.0 de junho at é 20 d e s etembro : a l moço: [an-
ta l' ; merenda ; ceia - Comldae m el h ora da s em dias d e «nomea d a»: pela,
m atan ça s do fum eiro ; durant e o Carnaval : no dia da eag a r r a ç ão»: p ela
Pâ ecoa ; em q uinta-feira de As cen çAo ; p el os Santos; p elo acaba me nto da
eemeutets-a : por bodas e betteedoa : [eju ue. U2 a 123
Dia s fer iad os _ Oe q ue se g ua r da m a ri g or - 08 q u e s e g u a r dam ou nã o, coa-
formc ae cír-cunetâncta a - Os que nunca s e g u a r da m . 123 a 124
(".....I •• n.
v
COSTUMES DOS CAMPÓNIOS - N a t u ra li d a d e e domIcilio - A ' excepção
dos er a t tu b c ee, e grande m aI o rI a doa servIçais na s cem e residem nas p o -
voaç õee do. a rredores . Diligência pa r a adquu-lrem, de propri edade, cnea
na a l deia t 2.) a 120

Hab it aç õ e s - Culdadoe de c o nser va ção c u saeío - Casa dianteira _ Qua r to d e


cama - O utro s comparttmento e - Qu lntal - Os evt voes . 126 a 132
Vid a do m éstica - Deta lhes que a definem - P rcdom in lo da mulhe r sob r e o
m arido - Como c uidam da. crte n ça a - Negação à es co l a _ A a m izad e do.
pate, eô ee avigora quando os f ilhos começam a g a n h a r no campo - Dcea-
v ençae conjugais - Batíaadce - Bodas - E n te r ro. - Traj os _ AJcuoh.. -
T rat a mento. . 1:].3 8 168
Dive r s õe s _ Pouca pr-opc ueão para folgucdo s - De romarias uot àveía, a do
Senhor da Pieda de, em Elva s - BaUeR _ FC8 ta~ e t ouradas - J ogai - P elo
En t r u d o - Na nolte d e eerr-eção d a ve lba . HUI a lHO

VI
OS RAT IN H O S - Deetg nam-se por raunnos os hcme na que em maio ea e m
dae Beiras para ceifarem aa eearae do Alen tej o - SUa divido e m cama -
r adas - O managcl ro -A. v iagem - Car ácreres Aju 8te8 - AlhnentaçAo -
c-

AuxUfarce a le ntejenoe - Nae ceifa . _ As contas - O reg'reaeo 1!11 Il :H O

VII
ALFAIAS AGR íCOLAS Per-elat ên ct a d oe Iuat rumcntoe autlgoe de Javoura
c-

- I ntr odu çã o d e a ifaiu . 211 n 222


Deecrtç âo alfabética d a a Jfalaria agrícola a ntiga e moderna, u aade na r eg tão . 212 n 2'.0
Ap r es t o s de c a va lg a d u r a s - P a r a m u a r es e m eervtço e d e carro c arado - Na 8
ég u a s e cavalos emo n tado... d o s l av r a d ores - Na 8 égua s do s guardas ,
vaqueiro. e egu arlços - Em m uares d e apa r elho - Na s burras dos g ana-
detroe _ Nal besta. de carg a , d o s m ontes _ No. macho. e burros dOK
ulmocrevee a r rlelro.

VIII
SEARAS _ O lugar que ocupam na agricul tura a Je ntejan a - O eeu de seuvol -
v lmento - Scrvtcoe cultu rais 2/.5 a 2'.8
La vo u r a s - Animais e i n s trumentoa qu e ee em pregam _ Singelos e revez ai
- D letrlb ulçAo d a s [u u t e e _ Ho ra. de «ago.rra», dia. amenoe e d ias de ch u-
v a s - N08 merendas d o m elo-dla- Ag u ad aa _ A solta - Alq u eive- Lavra -
d a s d e alqu eive e lavradas d e eementeíra - 'ror u ee, can tos, boq u Uh õea e
loba. - Armação da. to r na s _ Piscolas - De ág ua s fora e de àguas tom a -
dae _ Prcceí toa d lveraoe - mu d ança. d e fe r roe - mudança. de relha.-
Madeira par tida - GoJpes 0 0 8 bots - Geí rue • 1"8 ü 2t11
A lavoura no outon o - Su a Intenetdede - Pessoal que se empr ega - S eu luat-
m ento - amanho - Setârt oe, altos ou baixos - Prognôerícoe - borae de
agarra c s olto - Recordeç õee e coment ârt oe -As balas - Hora s da aguada
e de s canso - Revezo c s olta d os un ím a ta . 261 a 281
Serviços preliminares e complem entares da lavoura - Gradegens - Ltmpeea
das terra s : Deemotte e: quctmad e s - Estrumes e aduboa: ean-umctrae:
ee tc r cc a de gado manadlo : adubos quimlcoe - Sementeira ouroeate : o que
ee s e m eia ; trigos : centeio : cevada: aveia; favas - Selecção das aementea
_ Sulfategena Quando se semeia - Tempo seco e tempo Chuv080 - O
c-

que s e s e m eia primeiro. O que ee s e m eia 6ltimo-Semeadorcs-Como s e


eem ela - A formiga. o. pâ saerce e o vento, comprometendo os semeado-
res - Sementeiras va at a a e aemeutetr-ae rafa s - Sementeiras terupcr ãs e
eementetra a serôd ia s - Se m e n te p or bectar -Quanto leva cad a folha_
CAlculas por getra - S e rue n t e tr a s de primavera: trfgo ribeiro; grão de
bico; chi charos; feijão fr nde-Semeoda a recém-na actdua: b oa ou má nas-
ce nça : seu resultado ftnaí : vasta o u rala: 8e U8 d efeitos e averlgua çõc s -
Raettthegena : cost u mes : práttca - Dr enagen s _ Valas _ O tempo : qual o
bom tempo e qual o mau - Anos de estiagen s e 0008 de invernia _ Pr-ecoe
- Geadas - Nev ões - P cdr-íscca _ Mondas: rucndadeírn a: com o 8e monda
e quando - E r v a 8 que se de stroem: malvaa: tremoço s bravos; orttg õea:
ctelr âo: card o s; Joio : negrlta : marge ça : p ampilros; 800gCD8; ea r -a m a g o a :
papoila; rabo de gato; Hng ue de vaca ; palanque; alabaçoa: trevo; rin-
cb ôee: eepargoe ; c ôngtta e: etmeír õea: unha-gata; brados ou ervas fadago-
sa8 _A perspectiva das gea r as: f a se a: c u td a dc e c-A spectoe c Impressõea:
depois da na scença ; eepectoa : tempo; de s cnvolvimento; re auftado a - De
fevereiro a meedoe d e março _ Por março fora - Entre março c abrll-
O ramo no s eearae - Em nbrll - E m maio - Em Junho - Em julho . 261 a 321
Colheitas _ Ceifas por er a t tn b oe» c mulheres - A atada - RUheiros _ Enri-
Ihetração e enr-ílbetredcree - Acarretos: pessoet dos acarretas; preceitos
e usos no rastolho e em marcha; fundas por car-radea - Precauções con-
tra Incêndios; seguros _ Eiras : sombracho; usos; feição das elras- Debu-
lhae : si stemas de debulbaa: cetcedouroe ; d ebulha por éguas : quando se
«ag a r r -a e s ol ta» : intervalos: a debulha: lImpe so a o vento; palhas: debu-
lhas i\ méqutna : sua adopçêo-c- Uearn-ae n a s ctrae de quem po s sui máqut-
nee e nas d e outros lavradores que a a alugam - Contratos d e aluguer :
Caminhadas de umas para outrae eiras _ Debulhadoras grandes e debu,
Ibadorea pequenas - O aparelho de debulha - Pertences c a ce se ôrlos c-

Bomba para Incêndtoe Peças sobrecel entc l1-Combu stivel-Agua _ Óleoa


c-

e vazcllna _ Pe18oo1 que empregam 8 8 m áqulnaa _ Atribuições e deveres


da. diversas entidades - Maquinista _ Foguetro c-Balàrtoe do maquinista
e do foguelro - Outra s notes sobre amboe O abegâo - Altmentadoree
c-

- Despacho da debulhadora _ Itorae de agarra - A debulhadora em


acção - O almoço - Entre o almoço e a «cig arrad a» da manhã -Continua-
ç ê o da faina _ O jantar - Refrega da tarde - Segunda «ci g a r r a d o» - Ao
cair do tarde _ A solte - Quanto se tirou _ A cela ou merenda - Depo! e
da cela - 08 montões na s etra a - A enxuga ao 801- Medições - O apura-
mento flnai- No levante da eira _ «Cac h o s c var-rcduraes - Palhas _Sea_
rae a «quarto» - Searas de obrigação - Searas de favor . , :11 I a 370
APtNDICE

A Caminho da C ego nha


(Novela Regionalista)


E S TJ:: Iralj(J"'o i 1./11I dw l ,r i Nl r /r <4 do ..Iu/ar ,
'Juc com de tl',dOIl o ~e/l ttl/XJr 110 t'UIflJXI d'l/it-.;,io
l i ter tirifl . j " t'I "i ,ulo-" /led" edi,;••» de O . 1T R . I-
I -E 8 fifI ....· ( · , I.1/P O .....·, /II"efendclII (#' "III'
~/U,orU }JI'u r" r " e~ t(1 jei';lill (/" yrrlm/e rl,'ril'lr
n '''JIIln'''!Jt1ll 'I"e '"l' tI dCl"it/fl.


E R A. a i pelos íntrottoe do S . Mateus . A. c h u vas o u t o nai s ainda n ão tinham apareci do
e a eatlagem d o v er ão, q ue for a com prida e aspérrimo . a meaçava prolongar-se
indefinidam ente. p ara fl agelo d a. mulher es da a ld e ia, q u e ee via m em palpos de
aranha p ara ob ter e m âgu a suficiente às n e cess idad e s d o consum o.
Da quatro poços contig uos à p ov o a ção. de h ã muito que es tava m a b s olutam ente secos.
No fundo d e t odos, com o q ue a ates tar 88 dia bruras d o rapa zio, a m o n t o a v am-s e pedra . d e
d ife r en t e. t amanhos, m istura d as com váeloe f ragme n tos de o r Jge o e dt v cni8.lmaa. Mtt'. a
r espei t o de amostra. d e égua . q ue era o qu e n a t uralm ente nele. d evi a h a v er, n em seq u er
uma g o ta I
E n con tr -ava-se 111 m . mas em p equ en íeaímae q uantidades. nas fo ntee d eevfad a e m ei a
l égua e mais. o q ue de man dava um tra b a lhão insano para a quela gente in f eliz , que fo r ço-
ea men t e tinha d e vencer a p é e ss a s díat âu ct a a grandes e In c ôm od a e, m á x i m e q uando
pe r cor r idas trêe c qua t r o vezes p or dia e n o trc, co mo a contecia ordin à riamente.
Ma8 q ue r e m é d io . sen ão ab ra ça r a cr uz com h ero ica r-eatgna çâo l As pobres c r iatu ras
aee tm o compreend iam ta mbém, e p o rtanto r eet g uavem-ee com melhor ou p io r vo nta de.
C oe t u madaa d esd e a i nfân cia a u m a vida d e a trit08 c amarguras, arr'oatevam pacien te-
me nte CO Dl m a is ceee s a cr t ftcto, q u e de r esto era apenas u ma sombr-a de o u tros cem v e ze s
maiores , q u e ec lh e. d e p a r a v a m a ca da p a ss o, n a acuda d oloro s a da sua humild e ex íat ên-
da. Tod a v ia , l á d e l on g e em l on g e, o d eefalect m entc anuviava-lhes o ee ptrít c , e e n t ã o
mald izi a m o seu tri ste [aâà rto, iu v e ti v a nd o o . p rot egidos da fo rtu n a, que não sabiam o
.quc e ra sofrer 1. . .
Mas 088es d eeabafo e ola p aa ea v a m d e f r a q u eza s m om e u t ân ea e, qu e s e esv aiam como
fumo. P or q u e, a fi nal , as jornad as ao p o ço, a par de muitas canseiras c fad ig u e, concor-
ri am, Ig ualmen te, p a r a u n s certos a t ra c tiv o s que compe nsavam menos m al a q uel a s m ar;
cbaa violen ta s. Era m u m ens eje eept êudtdo pe rn as caminhant es u arrar em u m a s à s outra.
o qu e ocorria no p aróquia , desd e a coecovífh tce rastei ra e bana l , até à s im o r a Ud a d es de
s ens ação es cu t a d a . com av idez pclae gu loeas do eecâu d a.lo. E o e n s e jo a p eo vett a v a -se
se mpre, não ee p erd endo u m m inuto .
Ne s t a s ctrcuu s tâ n cta e, a p o pul a çã o fem inina and av a num v a i-vem co n eta n te a cam l-
nhc d a «Ceg o n ha» - uma n a s ce n t e bem r cl ee, ma. a m elh or das im edia çõ es, p r inci pal-
mente qu anto li qu alidade d a a gu a . que a aeever a v e m ser ôt tnta . Até se d izi a qu e o San tos,
m estre de Ietr ue, que vIera de Ca mpo Maior s o f r en d o atro z m ente da bexig a. d epois q u e
b ebera d a Cegonha, nunca m a ta Importunara o Dr. Ytcerto c o m a m ueead a gratuito da
In trod u ç ão da algália.
Com t ais p red icados. c eabt do o r igor d a estiagem, é fác il dc ava l ta r e apreço da
f am os a águo. ee p êc!e de man é divino. c ub içado com sofr eguidão p or um en x a me de cria -
'turne. Mas o depósito d e ep ej a r a -ee h a v ia u m pa r d e m eSCI, e p or con segu i n t e q u em
q utsee ee e n c her , ti n h a d e esperar que lh e coube aee a vez , por qu e aqu ilo la por eua ordem
e a lt ura. O pior poré m . ó q ue a n a s cent e conti nuava a a f oícua r a ol ho s vtatoe, e jã. quas e
qu e n ã o cor ria . As u míd a deztn haa q ue a i n d a l a cri m ej av a m a s fend as das r o c h a s. Ia m-s e
ac u m u la n do n o fund o d o poço e ai se c cnaer v a veur q uinze o u v i n te mtn utc e, o tempo
preciso p ara ee e ncher o cova cho. Depois ca ia lá o chocal ho e .. . pronto ... e f ica v a todo
esgotado.
Mas qu e o r ig i nali dade é e ae a d e s ervir o chocal h o para s e t irar a á g u a do po ço?
dtr ú provAvelmente o l eitor. Não s e a d m ire , excc lcntfeetmc senhor: s ã o cost u mes d os
povos. L â diz o ditado : cada terra com seu us o; cad a r oca com seu fU 8 0 . E o fu so, que n o
cas o pres ente e o chocalho. após a sua natural a p l ícaçâ o, isto é , d epoi s de s ervir p o r
muitos ano s para compoatura d as reses b ovinas, p aeaa p ela am p u t ação do ba da lo e. eaetm
de s p rov id o d o tosco a pên d ice, serv e d e b alde ou caldeiro. Q uem n ã o t em chocalho u âo
bebe - dizem por e p ig r a ma o s earranhoe à a ldeia . Mas s ó não bebe q ue m n ã o q u er
A p es a r da agua ser pouca e díepeudio aa, a té n a cas in ha do m ais p o b r e s e d a d a mel hor
v ontade a todos qu e a vão p edir. Assim se con f ir m a a boa e gen er-oet..ima hospitalid ade
alent ejana. que n êo encontra rival em tod a a terra portuguesa.
Reata n do porém a narração. fica evidenciado qu e o s itio da Cegonh a era naqu ela
é p oca calamitosa um constante acampamento do mulh erio indígen a , q ue a li se entretinh a
horas e horas com uma paciência extrecr-dinârf a. Verd ad e s ej a que elas procuravam
distrair-se po r mU maneira s, t odas t en den t es a esquecer a a r relia d a es p era e a a r idez d o
l o cal. De dia sentavam-se à acmbra d e um u vet u s ta c copa da a zinh eh·a , o n de co s t u ravam
ou fazlaw meia, quando n ão ee p entea v am uma s á s outrue, porque p ara tud o h avia oca-
81Ao. E a o mesmo t empo q ue m an ej avam a agu lha o u m o v ia m o p ente, t a garelav am com
fren esi so b r e c e a..untos Ioca íe, eepecla l mente ee se dis cu tiam os nam o r os d e p aren tes,
ou 88 qualtd adee d a s qu a tro eeuh o rue d a a l d c ta _ da. g raves, co m o lhe c ha m a va m p or
considera ção a lgo irânica 88 . ua s r úettcas com p a ro q u lanae, E ee por úl ti mo Morfeu a.
acometi a, ela e r endt am-ec-Ihe de b o a m ent e, por q ue en fi m , uma eeeraztnba na queles
altural é m esm o d e a pe tecer . E e n tão 0 8 rapartgue, q ue se pelam por uma ecue ca I Dava
gosto vê-Ias para ali eet e ud id ae ii. free ealhon a, s obre a e mu s g o l a s I agee d o g r a n ito, a p e-
Dai com uma ea íeztnha cu r ta s ob r -e a ca m isa, com 0 8 8ei 0 8 ii. v el a e 0 8 ca b elo s deeg'reuba -
doa, Dum aba n do no natural , v oluptuoso, excit ante I

E n tr etan to e nche- se a p oça.


O f a cto fora es p reita do d e antemão p or multa s Intereeead a e, e a go ra q ue ee r ealiza ,
pro du z o co s t u mado a lvoroço , especia l me n te n aqu ela a qu em p erten ce a vez. Pud era , se
a p obre p ode euftm encher o 8CU b ojudo cântaro d e bar ro I
Um e õ, b em e n ten did o . Mais n ã o p od e e er. S e a ãg ua sob ejar, p erten c e à e s pera ime-
diata. J~ a d trettnra, ou, melh or diz end o, o coeturn e , qu e ee o b ser va eecr u p u toeerneu ee,
embora n ão conare d o b olo r ento car ta pãclo das p oerurae munfctp ut e. S u pomos q ue é p or
Iaeo m esmo que o co s t u me ee c u m p re à rteca.
Mas seja o u n 60, p ou co Impor-ta tseo . O qu e é cer to é qu e a d on a d a v ez, maI o cova-
c bc encheu , arrim a log o à fonte, a jeita a bilha, d esenrola Q co r da d o c hocal ho e Zã8 .. .
cetr-apuz . .. l ã v ai o dito p ara o f u n do d o p oço , de ond e l og o s e ergue a transb ordar ,
eegut chend c-Ihe a é g ua pela s d ez en a s d e b u r a qu in hos de qu e catá c r ivado, m erc ê d a
a cção d o t empo e d a co n t in u idad e d o servi ço.
Efectu ad o o ench ime n to do c â n ta ro, a boa d a mulherz inha coloca -o à cabeça c dia -
p onde-s e a par-tíe , g rita p ara a e o u t ras :
-c-Haj a sau d e i bem t ê l ogo, fil ha s, q ue eu c á me sumo I . . .
A8 co m pa n b etr-a e a carra das l\ sombra da arv ore, con t eeta m -Ibe com um bocad ín b o
d e Invej a:
- Al a , que ee f az t ard e' Ol ha n ão t e en gan es n o caminho r Dá l ã eoídadca I.. .
E p arte . P art e triunfante co m R sua ca r g a . deixando encostados a o red or d o poço um
car d u m e d e c ân ta r os e choca l ha i d e div ers o. tamanhos , q ue ainda a li p erm anecerã o h 0l"88
e h ora a, t eet emuuh eudo a p enúria da naecentc e a conat âucl a d o mulherio.
E 08 guuedetroa qu e p ercorriam a rostolhlce v iz in ha, tralteando uni a al feirada d0 8
novnnoe, o u t ro s a bacorada d os er vtço a, a o ve re m a q uela ce na des oladora nunca d eixa-
vam de murmurar p esaros os: -Que d e eeper ae h ã h oj e n a Ce go n h a ! . . .

Um a h ora d a madrugada. Noite s erene . Lu ar esplêndido.


Aí à Cruz d a veteea, ca m in h a vam para o p o ço, a Vitó ria à PIngalha e a Lu ísa à Ratu-
cba, d u a s m ocetoua a de truz, ca p azes de em beiçar em o mais aíeudc eclcelà eríco.
Ao l o n g o da vereda ee cab r o ea e Iu gr-e m e por o n d e el as s eg u ia m , t udo e r a triste e
medonho. A' d ireita, os ped regu lhos colosaate da g ruta d a Laplnha : à esquerda ee rulna s
d o s vel hos casarões da Ladeira: n a fr ente a d es mantelada cr uz de ped ra que d ava o Dome
no l ítio, e na r eta gua r d a o hu m il d e cem itério da a l deia, com dois cipr estes ún íco a e a via
fé rrea , co m os seus e eg u ío e poetes relegrâftcoe, avej õce etu ts troe qu e na s u a imobilidade
consta n te, infund ia m t étrico p a v or 008 Pen átícoe eu perat tcíoeoe.
O zu mbido Im pe r ti n ent e d08 a ra mes, queb ra ndo o etlê ucío eepu lcrat daquela hora
mí etertoea, e ra m ai s o u t ra nota esqutetta que Im primia s ingular asp ecto à q u el e ponto
ermo e 8011 tãr io .
As rap ari g a s é m edid a q ue venc iam a co s ta, aeet m aceleravam o pa s so f alando
a lto. muito a lto. Da Inten çã o ma olfes t a de afugen tarem o m edo q ue a mba s een tt a m Invo-
lu n t àe íam ent e, a deapetrc do a eu ca rácte r re solu t o, p ouco d ado a pí egut c ee.
- Ai co ma d r e I Sin to Uln trem or n u peenas l. . . Sem p r e cuidei q ue f08 s e m aí e t arde . . •
Se eoubeeec que era tio cedo, n ão v inha à font e a esta h ora . Até se m e er r içara m o s ca b e-
l os, quando ouv i eoar a uma I .. .
- O lha cá, Luísa, ía m ea e u n ão vou com a cer a toda j unta , e mete n ão s ou cagarola . ..
Uma p eeeca sair d e caee, 8881m tor a de borae, e para eiti08 t ão sotur noeí. .. On de q ucr
e et â um deea veegcnbado que p od e fazer p ouco d a gen t e ... E entã o s e D0 8 aparece a lgu m
medo? .. , o u a lg u m a alma d o ou t ro mundo .. . Q u e a m im, afigura -se-me que tud o 1880 são
e nzona8 d a s criatura. velhae, q uc ee q uerem adevertl r com a ( omi lta mo ça I Pote s e eu
a inda n ão vi n cn hu m m ed o, e j ã t en h o umu ca tre (a de a n os. T u já v is t e, comad re -
p ergunt a a Vitó ria com t utereeee .
- Eu n ão -c-res p ond e a ou tra . E acreeceu ta : - Mae d izem q ue oe ai. e bruxa•. .. e
Io ble-bom eae •.. e m oura e enca n tada s ...
- Lã m oura e eu cantad a e, a modo qu c é verdade h evê.Iae. Se ee n Ao houve••e, de m il
sor-te chamar iam Ot tet ro da " [oiro , a lem àq uele q ue t e e et à vendo em Vil a Cov a.
- Poi s 1180 6 velho - co nfir ma a Lu tae.
E a Vitór ia proesegue :
- O que me a m lm d á qu e p e nsar e dizerem q u e na n oi t e d e S. João. à meia- noit e, a
mo ura quebra o enca n te e apa r ece c á em b a ix o n a ri b eira . ali ao p eg o da Azen ha. Se ser á
v erda d e '( I . ..
E n tre tan to alcan çaram o topo da coUna, e l og o d epore en traram n a calej a d e Safa r á
- a zi n haga e streita e t ortu osa , l a dead a de muro s a n ttq ut aal mo e, r e v estido s de e speesoe
s u vadce . que a li 80 d eeenvol vl e m à v o n tade, p ara m elhor vedação d as v in has co n ft-
nen tes.
A Lu tea , que eentt a a u m en t a rem-lhe OA rece ío e, à me d ida q ue a v a nçava, mu rmu rou
Jm p acien te:
- Amaldiçoada ecj a a caleja cata, q u e t ã o eSCUBa I. . . Muito p a aea q u em é pob r eT . . .
ê

Nes te com enoe, o r-egou g o agu do e p r olon g ado d e uma repoe a , eco ou l u gu bremente
por aquele eecempad o tora , f erind o o . tímpano. da pobre moça que n u n ca a goirava b em
do cantar da. repoeee.
A Vitó r ia, que lhe conhec ia o fr a co , exclamou jovial :
_ O l h a a g ran de zo r ra , como e Ja ca nta forte 1... E está p er tlcllJ n ho de nÓ8 . .. Soa d ali
logo ... Hav ia d e ela a s so m ar aqui , que eu g os t ava d e lhe v er o raba eoíha 1
- POi8 eu não I Ne m a q uer o v er , nem ou vir. Só eu l ei o que et n to n o en te r íor , quand o
o uço d e n oite aq uela s ladronas v elh a cas . Lembr em-m e 0 8 Iob te- b o m e ne .. .
E ce to u-ee r ep entinam ente. Reparara cm duas l u zlnh os qu e brilh avam s o b r-e o ver de
esc u ro do s 811v od 0 8. e q ue a fl nal n ã o p aeeu vem de d oi e Itudleeí m oe p íetlem poe. Mas el a,
q u e ao t em po e ô p ensav a em Io bta-homeue e Iauta emee, i m agin ou l og o bruxari a.
- Q ue s e r á aq u il o, Vitória ?
- Ora ' o que há-d e s er ton t a? Nem s equera vês q ue s ão doi. arem-cu s . T a mem t ens
m ed o d el ee ?
- Nilo . d oe arem-cu s a âo m e er-receto . ;Uoe afigurava-s e-me out ra coisa .. _ Se Isto
tudo é tão m ed onho 1
- E m edonho. é. Mas qu e lhe b a vem oe d e faze r . O mel hor e dee te r r'a rmoe pensa-
me ctoe trist e. I • . .
Co m esta s e o u tr a s p rà t tca e, e e du a e m o ç as l ev a vam d e venc ida o s olltàrlo cam inho
da a zi n haga, cu ja d es embo ca dura já avis t ava m per to, d escobr indo- s e en tão o o p u le nt o
c ba pa r r a l d o Bal d lo cio Co n de, que era como qu e o ve eti b u lo d o cetio la do v ergel onde
ficava o p oço d a Ceg on ha , p onto t ermtnue da eu a jornada.
Em cer ta aJtura e mbae s e r-ecolberem ao atl ên c íc , ae gulnd o s empre a p an o li g eiro,
próprio de gen te n ova , qu e n ã o cen ea fà cümente. Ma8 d e e úbtto, a Pl n g a l ha eetaco u , e
dine a ailrlo :
- Tato . . . t emos ob ra I. . .
Algo de extracrdtu âr-ío sucedia. Ela n ão proced ert a aeatm por futilidad e de pirilam-
p os, o u outras eemelbaatee. Havia n o vidade de r eep etto, com certeza. Em todo o cee o n ão
ee atrapalhou . O qu e fez foi tocar no br-a ço da Luíea e dtzer-Ibe b alxinho:
- NAo vê. um vulto, além ao fundo da caleja. meemo ao cant o. aeeím como coíea de
.de criatura que eet à aeeolapada ?
- Vejo sim - respo ndeu a co m pan hei ra , vis ivelmente aae uetnda. E o b servan do
melhor, acrescento u a t r emer : _ Ai nina qu e e u m homem 1. .. Al gum maroto ca p az d e
implicar com a gente I. . .
Efectiva m e n t e, junto ao muro d o l an ço d a S a fara, d es cobri a-se o cor po d e u m h om e m
a gachado. P erm anece u ae eí m coisa d e dois minutos. Depoi s ergueu -se com um v a r a-pa u
na m ã o, e em segu ida olhou l o g o p ara t odas a s dlrecç ôee, como a ce r et ft ca r -ee d e que
ningu ém m ai s o v er ia . Parece que r econheceu 1880 m esmo, porque Im ediatam ente d e u
alguns pa eaoa p ara o cen t ro da azin haga, o n d e parou. Ali aeeobt ou d e u m m odo e s p ecial ,
en ccetaad o- ee 80 pau, de r osto voltado p ara a. rapartgae , q ue fi xava com a t en ção.
As du a s sen ti ram u m cala fr io pelo cor po t od o . A Ratucb a t eve de a mpa rar o c ântaro com
a m ã o, par a nã o a tir-ar co m ele a te r r a: tremi a co mo var a s verde s . E b atend o cast a n holas
d iz p a r a a o utra :
_ Ai , Vitória, que t r abalh os t ão g r-an des l , . . E q ue t an g anho com q u e ele ae apezu-
nha, o a mal diçoado I
- F a la b aix o, m ul he r , q u e a embrectiaâa não p ára aq ui . Ve rá . tu q u e o m armanj o
não vem . a zinh o .. . Toma scn tido além p a r a a quina do Va le d e Andorinb a, que h ás- d e
b iapar a ca beça de outro m oinante q ue se asso ma e eacon de lo g o , co m o q uem ea t â co m
eecov íuba e . . . O lha, l ã aparece u ele a go ra t odo ... E qu e br êg etro q ue c o patife .. . A nda r
em fra l da de cam iaa I E ve m p ara c á •. . t r a z uma cois a na m ã o . . . III to e m ol hada do e d ote
p or fo rça I...
A Lu tea [ut ga-ee per d ida . Nem ao m eno s o u ve o s co men tâ rto e da Plogal ha . A chorar ..
r ecor re à p rotecção celest e:
- Va l.ha-noe a Se n hora d o R o sár io I
A Vitória t ambém não ee t â a foi ta . O uvindo a eúp lf ca da compan heira , a crescenta
comov ida :
- S lm , val ba- noe NOI sa S enh ora. E o Sen hor d a P iedade n o s acu da I . . .
En tretanto , o h o m em q u e viera d a esqu ina d o muro, d tr-ígfu. ae para o o u t ro d o pau,
qu e permanecia q uieto no m eio d a es trada. Chegou-se a ele , p ou s ou n o ' 010 o ob jecto q ue
eegu r ava , e, a cto contin uo, co meça ram a mbos a fa l (:lr b a ix o . Eviden tem e n te eram com pu -
nbetro e. E um c out ro fitavam com peraiet êucta e e du a e ra p a r tgaa, qu e p or aeu t urno
já ti n h am p arado t am b é m , à r -eepelt oea distância de uns 300 p aeeoe.
P anado um instante, 0 8 d ois d eevlaram-s e um pou co, e col oca r am-se d e modo a
es torvarem a m arch a Ús moças, ee p or acaso el as evan ça ee em .
A8 p o bres ficara m geladas. A P lngol h a , p orem, cha mou a 8i une r estos d e força
m oral d e q ue aind a d tepu u ba, e d taee r eeoluta m ente : - S e ja o q ue Deus quiser 1 Para
di ante é q u e é o cam in ho . . . t o ca a a ndar . . .
- Não, Vitória, não - obtemperou a Lutaa com v o z au m ida . _ E' melh or voltarmo s
para tra z e d ceatarm oe a fugir.
- Es pa r va r Pois não vês qu e e e f uglrmos, etee, q uerendo , p ítb a m -n o s l o g o I
A tã o s ensata obse rva ção, a Ra t ucha n ão a tlna com respoe ta d e jeit o. Por fi m
titubei a :
_ AI c omadre d a m inha a lma 1 Isto é O fim d a n o ss a. v ida 1 Aqu ele s m arlolõ es eâo
cap a zes de n o s m atar . P e lo me nos d ão- nos u m a unt u r a valent e, qu e no e d eixam a p ã o e
laranj a . E se fo r 8Ó i8 80 ? 1. .. UiT . . . que d or de b arrig a que eu t enhoI . . .
A Vitória está tã o ebeoeta , que nem d á p elas lame nta çõ es d a a m iga . Seu te-ee Ig ual -
mente perplexa, atónita , s em ee a t rev e r a ca m in har p ara diant e, confor me t in ha dito.
E' n es sa oca etâo qu e o s dote so ltam eatrep ttoea e g a rgal h a das. E se m m ai s a qu elas, o s
preeum ídoe mo fnantes adta n ta m -ee p ara a a r a p ariga s, z u r ra n d o e eep tn ot ea n d o como u na
doido•. O d a ca m isa d e fora g r ita de l argo:
-Arrenquenl dai, suas b adanaa m edroea e l, . . Qu e t al f oi o sf rote ? 1
E o d o pau obe erv a -Ibe em chacota :
- Deíxa-ae, parente t Det xa-ae l qu e eet ãc en t u p td e e I. . . To me m a r pa vonas T Tomem
ven t o, ee não q uerem m orrer de austoT A apostar que a Lutea bota cheiro I.. . '
E a Ptngalba e a Ratucha reconhecendo aa vozes d os d ois, exclamam admtradlestmae r
- O Ventoaas l. . . .
- O Car-ra p ícbana r••.
- Quem tal havia de dizer-I - conclui a primeira, deveras aaeombruda.
- E e verdade I - corrobora a segunda, elnda estupefacta.
Eram efe c ti v a m e n t e eles. Eram o Chico Ve ntosas e o Tomé Carrnpich ana, doi. r apa-
g õee alentados c eet úrdíoe : o prtmeíro, namoro encartado da Vit ória ; o s egundo, d eertço
fiel da L ulu .
Aquilo tudo fora pirraça l embr a d a por ambos , duas horas antes, q ua n do t e j untaram
na praça da aldeia para regr-eeearem a o trabalho . Ate eeee t empo hav iam p auad o a n oit e
de namoro com ela. m e. mo, que Ib ee d isseram e s tarem tratada s p aro entrem d e m adru-
gad a à tonte na m ente de s e demorar em p ouco c o m a e spe ra d e ve z. Ieto r e v olv eu-lhe s o
miolo. Vie ra m -lhes c ôcegae d e segunda entrevi sta, lá fora ao Iu ar-, no caminho d o p oço.
S ão as m elhores, dteaeram ele a p ara con sigo, evo ca n do cena s eemet b e u t e e, euced íd a e
fr equentement e.
P or co u s eg u tute, a o salrem da p ovo ação. acor daram lo g o no plano d a empr-esa.
iriam eep er á-Iae um b ocado mai l adi a nte, ai p ds bauda a das v i n has . Dep oía , qu ando a e
lobrig a s s em, m eter-lhes-i a m m edo por qu a l q u e r m aneira, que aa eeeuetaeae b aatant e . . .
- E ' um a p ança d a d e rir q ue u m home m apanh a ' co nclu Lra m eles m u lto [o vla íe, muito
eepirttuoeoe.
_ Es um velhaco r um m arot o ' . . . _ d ine a P lngalha para o IC U Chtco, moetrendo-ee
fur io. a . T e res a p ouca ve rgonha de n Os s a ir- ao caminho, como fazem os l adrõ es r•••
E ee e u m orres s e d e l u s t O?'
- E ntão agora pões-te ar teca ? .. . - cbeerva-Ibc ele. lA laia de galanteio.
- Tíe-t ô cão r qu e eu nã o sou besta. Começa com a la r vidadea c ver-ás quem esta ê

a m iga. O ra o atrevldor . .. Sem p re h ã cada farso lelrol . . .


O Chico co meça a a r repe nder-se da chalaça. Aquela d es comp os tura, eaaím à queim a
r o upa, d oia-l he como p ica da s d e alfine t cs.
Ne ceeeá rta me n t e , tin ha d e mud a r d e t êttca. Precisava deita r água n a fer vura. Senão
e n t or nava-s e o cal do, e IS80 u êo lh e convl u h a .
- B ata um gé nio con d en a do 1 _ r ed a r gu iu ele, p rocu ran do ameiga r a voz. E depois,
c om ruc doe hu m ildes : - Ca ram ba, m u l her. qu e d e tu d o d eeco u f 'í a e l S e quer-es, peço-t e
pcrd ão l . . . O l h a sabes o q ue t e d ig o? d á-me o câ n taro , que e u t o l evo a té al4m adiant e.
E e ntrementes, ouves u maa coisas q u e e u t e q u ero co n tar. Si m, detxu-t e de am uos . ..
a quUo foi bri nca d eira . . . Cá p or m lm estão a . p a zes f eita s . Tom a lá u m fJgo ... é dos ver-
dí ata ... E o ferece -l he o ea bc r oeo fruto .
A P i ngalha ou v ia e m s ec o. Ne m pio. De r esto l á p a r a c o m o s SP.U8 botõ es m o nolc g a va :
- Qu e di abo . a s trapuciiae t ê m de acabar. Se eu morro-me por ele l, . . Está dito . ..
a ceito a I p a z es . Ma s n ão lh e m o stro o fo cinh o l og o à s primei r a s ' . . .
Nest a s Intenç ões tir o u o câ nta ro d a cabeça, e ut rego u -Ibo , e d in e-lhe brusca m e nte :
- A vo nta de que me d à e q u eb rar-to o a cara 1 Mas larg a p ara c á o figo . . . E r ece b eu-
do-o, agradece com um a palmada t ez a sobr-e a I mAOI d o Ventosas. - E' fi p a g a - disse ela
rindo. E s eguira m a mbos p ara d iant e, a08 eo p aptnhoa um no o u t ro . Ea tav am congraçados.
O u ça mos a Lutea. Eeta, s aind o d o t orp or e m q ue ficara. m ediu com c ircu n specção O
alcanc e da ptrra ça e n ã o gos tou. P are ceu-lhe forte demais.
Por ccneequ êucí a v olt ou-se p ara o Ca r ra plcha na e e xprobou -o :
- Se c u ida s qu e es t o u b c m con t igo. e ngana s -te. Agora vejo qu e não re ne lach a
nenhuma I Apar-eces-me aqu i a horas m ortas, e usetrn d e ca misa de fo r -a com os e n saia-
d08 r . .. Q ue m t e d e u eS8a 8 con fla u çaav l
Ele lord, e reepoude :
-A8 confi anças tomei-as eu . .. E a r espeito d a cami sa de fora . . _ são cotsaa .. .
Foi preci so a s sim .. .
- E para quê ? Para que foi 1880?
- Para te trazer contente, que é I Ó no que cuido r Para t e molhar a boca, prenda de
minha alma 1. •• - E voltando atrás, o To m e corre como um gamo ao lítio o n d e pousara
o volume que trouxera o a m ão, e dele tira um f orm oso cach o d e u vas, que ee a pr-eeee a
oferecer à Lulaa . - Toma lã tonta . . . Come-as à minha eaud c l Fui caçá-las a li ao bacelo.
Por isso â que d eept o colete e PU8 a fralda II vela . Quis a ss i m meter m edo ó pae}udga8
do vluh eiro.. . Como ele fugula a escape, se v lue l ã. d entro este fantalmal Se ihe não
deee e p ara me atir ar al g u ma chu m b ad a, q ue tud o podia ler. Por is10 m e r a sp e i l og o .. .
A q u ilo foi num f ía íte . . . O Ven tosos fico u de fo ra à es p reit a, a v er e m q ue p ar a v a m 08
modas l ...
Mas a Rat ucba não aceitara a s uval . I a . o mente o uvindo O qu e o namorad o l h e dizia .
Por ú ltimo, quando ele pareceu te rmina r, ela observou-lhe:
- E é com eeee carão d cef a vad o que m e co n t a s acções d ee aae I Porvent ura, p edi-te
e u alguma vez para que furta..el u v a l par a mim ou p ara q ua lquera? E' on de p ode ch e-
gar a des{achatez 1 E o l ha r e u p a r a u m m en ino de sta laia. q u e f urta u v al d e o utrem e sai
à. m o ça s de noit e T E eu q u e lh e dei ereto I E cu q ue lhc m eti no bi co q u e v i n ha p'r 'ó'q u l e
mail o Yít ôr-ía l , .. O que fal ta. é que agora a pareça algu ma m a Un g u a , q ue n OI a pa n he
aqui de 8tiba to, a ver-nos d e pa leio 8ozinhoa n o melo da cal e ja I... Não era p recla o mais
p'ra ficar deeonrade n a s boca s d o mun do ' . . .
E ao Iembr ar-ae de qu e n aquele m omento grave, cor r ia perigo a lua honra tmp otuta
até então. a honesta r aparig a r o m p eu Du m choro copio so, que atra palha basta n t e o atre-
vido Carra p lchana. Quase qu e ee co moveu.
- O ra n ão hã uma co isa a ee tm I - e x cl am a ele. melo d eeorienta d o . - F iz-lhe a p artida
cuida nd o q ue a fa zi a r ir , e vai d el ata-m e o chora r I E a chora r p orq u ê ? Por n ada, a b e m
d ize r. P e ta e n tão tirar um a p eee oa u m eagal ho de uvaa Du ma v in ha d estas , q ue é u m a
lalma de t erra , é co is a que fa ça m al a a lgué m?I. .. (/n d lg n a n do -sc) E os ae ngou ai e dos
v tnheíroe p or q ue as n ã o d ã o. q ua n do u m homem lhos p ed e para s e fa zer novo, o u p ara
m eter um deaejo?1 bise iS80 d ã o eles . q ue é festa . Se f0 88e p'r e alg u ma raflona q ue lhes
moerra sae os d cntee, o u p 'ra a lgum b a eofãc que Ih ea a c euaeee co m a pataca, er a logo I
Malj cá p'r ó p ob r e. que não a fro uxa t aba co, n em aveza ch eta o u co isa q ue O val ha , Isso
c r u aee. Inda ontem, quando à boq u inha da n oite a qui pasa ámoe de v ir mos da o b rigaçã o .
e q ue el es estava m eepe rneqaâos alé m na a pe dra l a b ot arem fumo e a vender-em tampa-
nas, n ó. Ib ee pedimos à boa p a z um cac ho p 'ra cad a um. P o is 01 fUho 8 d e curta, f ora 88
m ãe s, p u ecra m -ae a r ir d a ge n te, com ares d e eecârneo. E o pr-cgut çoec d o Pau Ve atld o
respon deu à boca cheio : - Eetâ o v erd ee l . .. NÓI encbem o- no e de brio e n ã o lhe v olt àmoe
t r oco . Que e u a inda diste d c v agarinho: agora [ant ae tu . chibato earn oec I m ae d eixa catar
q ue ai nda te h ei-de pu c b nr p ela gadelha I ... E fo m o s p'r a di ante. Mas a eatm que o . vimos
p el a s coatas. e u d is s e escama d o p 'ró Chi co: _ P ola não a h avemos d e preg a r à q uele s bel-
d rog ueir o e s ovinae ? E ele r ee poudcu : - cE' e ó amanhem b E foi o que f iz emos. p 'ra que
n ão fa a m pouco d os r a p azes ... Q ue d iga m a g ora que estão ver deaf
E o Tom e Julga n d o-s e jUltlflcado . r emata a d efeaa enve r ga n do o colete e a v êetta ao
mes mo t emp o q ue acre scen ta com d oçura :
- j ã tu vês, L u taa, qu e ee fur t ei n ã o foi por m al ; fo i p or u m d es p i q ue I . . .
- Mas e u n ã o gos to de dee pí qu ce - o bserva ela, com r eet oe de ch o r o.
Ele fin g e q ue n ão a ouve, e contin ua b r andJ nho :
- Não chor es , filh a . . . a n da, acei ta 0 8 uvas I. . .
- j ã te d teee, To m ê, q ue e u n ã o como uva l f u r -tadae, Ten ho cscrúp a lo 1
- Q ua l eec rúpa lo n em eecr úpa loe 1 Eu cuido que não é pecado uma p es s oa furta r
uma recuíarta para comer ... E m ata d laec, n ão fos te tu q ue furt astef ...
E o Carra p lcha na, pereíatínd o n a lua ideia. qual o u t r o demó n io. ten ta ndo uma
segunda Eva, chega o p omo proibido m esm o aos I àbtoe d a peq uena . di zendo-lhe multo
dengo eo :
- Ao men os este esga lhln ho r... Vê, aceita r. .. - aupUca e le. d er-retendo-se como
m antei g a e m f in 8 d e ju l ho.
E COnt O «á g ua mole. em ped ra d ura tanto bate até q ue fura ». a Lu tea , dando razão a o
prol óquio, d eix a p er -ce b er um ri s inh o bonançoso, indicio ae guro d e t âctta con de s cen dê n cia.
- É8 o diab o n a t en ta r -me I - a r r u l ha ela co m m ei guice . _ E u a n ã o querer p ecar e
t u . .. z u m b a . . . atelmando aempre f Nã o ru e a ten tes , h om em . .. n ão m e atente• .. . (R ef lec-
tindo) S ó se d eres um p ataco à . alma s. Se me prom ete. iss o, a cei to.
_ P o is darei o p ataco. eet â dito.
- Palavra de h onra ?
- Pa l av ra de honra, eetA bem de crer. Para prova ai vai o cepo. (e.tende-Ihe a mdo)
Aperta , p apoila t. . .
- O ra, d eix e m o . nos d e to lices. P'ra q ue d ia cho t e h ei-de a per tar a mão? T Basta a
pal a v r a.
- An da I á, a perta semp re. E a maneira de o n eg ó ci o ficar v aU oeo T
Ela e ntão r -ende-s e de t o d o . JA não tem fo rças para r eet s üe m al• . Aqu tlo de ele pro-
m eter o pataco à. a l mas, com aperto de mão A mistura, e n terneceu -a tanto que l he esque-
cem t o d o s os e s cr ú p u lo e, que por acaso ainda lhe restou em.
Deram pois a s mâoe, esta sabido. E é claro q ue ficaram com cree e nlaçadas por muito
t e m p o, n um êx tase eloq u ente, delettoeo. Estavam bêbedos de amor.
- Se te parece, Lulsa, é melhor irmo. ali p 'ra o pé da parede e conver'earemoe u m a
mlgalhi oha. s e nt ad o s. Se vier alguém , eu escondo-me d etrás dos cerapatet roa, e t u f ioge l
que e s tá s a a tar 0 8 Hgue.
- E i880 não parecer á mal ?
- Mal porquê ? Ninguém 008 vê I . ..
- Ma. podem-n oa ver.
- Qua l história' . . . Se v ier g en tio. cu esco ndo-me.
- Bem, vã. lã . Mas hã-de ser p or pouco tempo .. .
Ela arrimou o c ântar-o j u nto da s s ilvas, e sentou- s e DO chão, m uito ligeira.
Ele j ã lá estava, a g u a r d an d o -a Impac ie nte.
E ao eeutt-Ia ali , a seu la d o , o mbro com ombro. face com face, pegou-Jhe na mão e
a perto u-lha com f uror.
- Ée mate bon lta q ue a r ainh a r- diz- lhe ele n u m ata q u e de e ntuelaamc.
Ela embeiça e fi nge p rotes ta r:
- Credo, To mé' POi8 e u posso compa ra r-me com ra tubu e ? t Oe teus 0l h 0 8 enga-
nam-te . . . Ma8 ver dade que fosse, o lucaro era te u , Não hei-de eu ser t ua ?
- Iss o eãc fa ....a. contada s _ confirma ele m uito ufano.
Mas, im ed iatament e a ssa ltado p o r um pensam en to ec mbrto, qu e r a r a s ....ezee olvidava,
perde o t o m face ta e o bserva macambúzio :
- O p ior ê a volta das eoeree. . . Se ti ro n ú m ero ba ixo, amola m -m e' E u m a vez n a
tro pa, a deus casa mente po r estes auoe mail chegados I
E o Carra p icha n a, p reven do a r ea li za çã o das s ua s hi póteses rocttne e, pana ao estado
colérico e explode:
- Ra los pa r ta m 08 lad r6es que nos m andam a s e r so ldados T. . .
A Lutea escu tava-o com s ingular atenç ão . Desde q ue ele fa lara em sorteio, ela fica ra
a t remer.
Não o queria soldado por COi80 nenhuma . P a r ec ía-Ibe que em ele aeeentando p raça ee
esquecer ia logo dela, para ir arr uar lã pela c idade, d e n am oro com as criadl nhas fi n órl8fl
- uns estafermo s a maretcnto a, uma . Iemb íeg o iee e s g rou v ia d a s q ue 8Ó t ê m Impo sturice
n o cor po t.. . E eaae aba n dono p o d ia ser com p leto . . . a ponto d e casa r com uma d a s t aí e l. . .
M8fI s e CaD et eeee semel hante tra içã o _ Deu s lhe perdoaa ee - mae h a vi am de lho pagar.
IrIa t er com 08 dois e cbamae.tbee-ta, a ele, t r a t a n t e, fals o, r el axa d o ; a ela, gata podre,
cara f eia , pelada T•• • E e m d es a b afa n d o tudo. trataria de ee deitar na tin ha, para o com
bolo a red uzir a f r a n g a l h 0 8, por n à o qu erer viver m ais.
Tais eram ae inte nções da Ratueha, se por ventu ra s e r eal iza ss em o. s eua funea tos
preeec uttmentoe.
- Não me fales em coteae tri8t es - d tz -Ibe e la, eueph-a ndo, após a pra g a d el e. E ao
m esmo t em p o, não podendo disfana r o q ue een t! e, 08 s eu s be loa o l hos negros verteram
duas I âgrt m ae dlama n t tna a, que l h e r ola r a m p el as face s r c eada e e Icu çãe, co mo in d icio
e v id ent e d o s e u a margo desgosto.
O To m é com preendeu a qu elas lãgrimae. Jã 88 conhecia de outras oca. Iõ es.
_ Ten e razão. Luísa. Perdoa a m i nha le mbrança . . . Que ta mêtn n Ao é p ' ra choros. p or
ora. E m ai s d teec , q uem eabc ee e u s ereí s ol d a d o . Ten ho fé que nã o ... Mas se o for, nu nca
me esquecer ei d e t i.
- J u ra s? - p erguntou ela 8n 8i0 89.
- Juro. s im. Juro-to, como h omem d e palavra q ue n ã o volta a tr âe ,
E l ev ou-lhe a mão ao. I àbt o e, beí jeudo.a r e p elid as veze s.
A Rat ucha r ecebeu os ôecu loe d o a mante como cboque e ct êctrtcoe, qu e a fa zi a m
voltar a o êxta s e de v entura s cm que se e u e b r-í a r a e ntes, qu a n d o ele a gaba ra.
As expansõe s eutuet âetíca s Ir ropera m-lh e d a alma, v e em entes, etccera e, a r r e.
batadae.
_ Ah Tomé I h um moço como um cravo T P 'ra mim v ales m ais d o qu e o r ei I. .. mail
do q u e t odo. 01 h o m en e I Quero-te mult o . . . m u l to ... E l an ç ou-lh e u m o l har eloq ue utfe-
etrco, r epaeee d o de ternu ra, rep leto de l an gu id ez .
Ele ficou deslumbrado. N u nca a v ira tão formo8 a . Qui s cor res ponder -l he. m a. não
p ôde. S ent íe- ee emba t ucado . Por fi m gagu e jou;
- Tu eettmae-mc a va ler , m as c u Ind a t e qu ero m ail. E a um a borre gulnha I. ..
E p ee eou o seu bra ço pote n te e mu ecu.lce o s obre 08 l argo s o mbroa d ela . f orça nd o- a s ue-
ve mente a u ni r o seu rcet o m ei g o e p eq u enino, 8 0 d el e cor rec to e varo n tl .
Aa a u lua a do Ca r r a plcha na roçavam li g eiramente eo b re 8a face s da L ulu, que ee
co n traia u ervoee ao e s tím u lo d as co rnicbõe e.
-e-Largn-m e , Tom é' . . . Larga-m e . . . q u e 18tO não e at â a ca l ha r . .. - diz-lhe cla t ltu-
b ea n do , sem f o r ças para reetatl r .
- P 'ra qu e te b el -d e l arg ar, fl.lb a, se a s eí m g o zamos t anto t . . .
E s em a atend er, ele e et r-eít o u -a ainda mail, b eí jo ca u do-n co m d etido.
E os d oi s e n t r egura m -ee d oid am en t e àq ueles r equint es d e volú p ia que 0 8 m ateriali-
zar a m d e t od o . . .
Por fim. r eg r e..a ra m à vida nor mal . Que re méd io ' etc t i nha d e a eguir para a f o n t e :
ele para 8 h erd a d e . E ntão é. q ue ec l em bra r a m d a Vitór ia e do veuto eae.
- E eles a eeperurem p el a ge nte 1- diz a Ratuch a , com a s ua In g enuidad e de
ca m ponesa .
-c- Co n v erea , JOlué: f Logo eles e s pera m po r n ó •.. . HA que estão ema nchadoe -observa
o Ca r raplchana c om m a lí cia . E a cres c enta : - Ma s va mo. andando q ue s e faz t ard e ; ele.
a parecerão. s e qut eesem . . .
E pueerem-ee em marcha, ae m tro care m um a frase a té à eat dn da caleja. Ali o l hara m
p ara t odo s 01 la d o •• m a . a resp eit o de Ve n tosa. e d e P lngal h a , níc íee, O n d e eetar üc a qu e-
les m arotos ? perg un t a 8 Luís a com m oe t ras d e surpre s a.
O To mé r e s pon d c :
_ Ora o n d e h ã o-d e ee ter l . . . Ea tAo p'r'a t a goza re m. de reáe de a lgu m a m olt a . ..
Mas a Rat ucha q uer ia cer t tffc a r-ee. Cham o u cm v oz alta .
- Vitóri a I .. . O h Vitór ia ' . ..
- Já lá v ou, mulh er . . . jA IA vou . . . - responde a Plng alha , de um ar-r-If e d e pedras,
en co ber to p or uns s ob r eí r o a.
E confirmando a promessa, a Vitóri a a m a n ha o l enç o , a g a r ra a b il ha e põe-na à
cabeça. dtepoud o-e e a p artir . O Ch lco p orem s egur-a-a p elo b r a ço e d iz-l h e rind o :
- E n tAo ebatae, se m d ízcrc a adeus? ' Pai. cu n ã o t e l arg o. sem m e d es p edir de u .
E z âe, pree p egu-Ihe n o s I âbt oe d ot e b eí j o e prolong a d os e Iuxur-l o ece , q ue for am o cpilogo
fo rça d o d e um dram a d e e rotismo .
.Ma. a Vitória , sem pre resoluta e azo uga d a, ft x a-o com modo s br êgelr-oe e d iz -l he:
- Aind a não es tá 8 fa r to . g ulo.o?' . . .
E eem esperar respo sta, d a-lh e um eac ão violento, fu ~ i n d o-Ih e d08 bra ços. e p ar tindo
a correr p ara a estrad a . a o mes mo te m p o que exclamava alto :
- A í v ou L u ís a . . . a i vou . ..
Encar-araru-ee . Encar -a r a m -se e enver g o nh aram- s e. A Ratuc ha co m e n ta :
- Boa a fiz em os. Vitó ria ' E eta r moe p ' r'aq uí enredad a. de p aro la com oa r apazes ,
aeaím s õzlnh a • . .. dUB8 m oças l oIteira sl . . .
- Pote por eermoe eoltetra s é que la. o n ão parece m al, to nta - obs erv a a Plngalha
aparentando indiferença. E conclui: - Eu c á n ão me apoq uento .. . S crá o que ti ver de
eer . . . (R ef le ctI n d o) Sab em o que lbee digo . . . n ós, e e fêmea s, march emo. já p'r à fonte e
vocês, 01 macho I, girem p'ró trabalho.
- Faial com cabe ça. mulher - ob serva a Lulsa. - Quanto mais depreeea no. apar·
tarmos, m elhor. Se no. deecutdamc a, ainda no. topam [untos.
- Pole p 'ra que nos não topem é z u n i r m os s em demora.
- Ainda ê cedo - observa o Chico.
Ma s, a n t es que elas lhe demonetraseem a fa l8idad e da afirmativ a, ouvem-se vozee d e
gen t e e latidos d e c ãee que, vtndoe d o l ado da aldeia, pareciam s o ar d e perto .
_ A i q u e sem os bispados I - excl a ma a R atucha, um p ou co de s ori ent ad a.
A Vitóri a a d ver te tm p eeaível :
_ N ada d e arrecef08 qu e nos n ã o pescam •. . O eencía t é darm os às canelae , .•
E vocês, r apa zes , t om em a vereda d o me n te c e u mam - ee-uo e d as vtetae ,
O s r apa zes ob edecera m, e a . r a parig a s c egueírura m -ee pel a e s t ra d a fora , n u m p aeao
ligeiro e miu dinho, q u e d epreeea a. l ev a ri a ao t lm d a for n a da.
Ent re tanto 88 vozes estra n has p a eeara m a o uvlr- ee m ai s d isti n tamen te, e 08 c ãea,
e egauí çau do-ee com f ús-ía, eoltavam aque les l atid os agu do. e diss ona n tes que cara cterf-
za m 01 p o d cng o s na pista do coelho.

• • •
Chegaram ftn a l m e u te.
Sobre a facha de calçada Ir r egularíssima q ue circunda o poço famigerado, depuse-
ram 88 bilhas c o s chocalhos , depois de s ol t a r e m um su spiro p rofundo , que ta nto signifi-
cava s a ud a d es Hdíbtnoee a d a s p eripéci a s r -ecentes , como explodo de queima por não
a pen barem a vez , q ue e ra , pelo vis to, de m ulherio mníe a g uçoeo, co m o In d ica v a a p r e-
sença de alguns câ ntaros v a eloe, p a r a a U embo rcados a esmo, Deus sa b e deede quando.
-AI nina I quem ha vla d e adlvinha r ? I. .. Não bon âa esfal far-te a gente a pa880 de
cavalo, t ão lo nge, senão chegarmos c á e fazermOs cr uzes T• •• 'I'rê •• .• quatro . .. cinco .. .
seis . .. Ici. espera s! .. . A nda, comadre Pinga lba, aguenta IA esta mecha t. .. NAo abalemos
daqui. menos das oito h or a s !
- E é chuchar, co madre Luisa . . . Nem t udo são rosa .... S im . não sei se me entendes...
_ Quem eerão a. d a s esperas?- pergunta a Ratucha, não p rcetu ndo atenção Ú piada
da amiga.
A Pingnlha ree pcnde-Ibc :
- ES8u que for em devem estar eet b-a çadee , além debaixo do a zi n h ei ra . Vamos até
lã. O mais certo é termos de 88 arre medar.
-Se temos ! E u nem pOIiSO com 8 S pernas ! E o corpo .. _ e tudc l, ..
E a e duas di rIgiram-se para a arvore , onde encontraram efecrtvemeute as mu lh er es
o que se r e fer ia m .
- Salve Deus a vocemecêe, t c d a e f
- Deus as salve, rapariga. T
- Cara m b a, que 1180 é q u e é m ad ru g a r .
- Mal8 madr ugou vocemec ê, tia Leoc ádta - cc n t ea tou a Pingal h a .
- E nga nai-te f Uha: eu v im on te , Cheguei a q u i à meia p'r'as o nze. Mas vocês não
vie ram sós 1. .. Soa p'r·ai bul ha ... gente ... c ães .. _
- Viemos 8ôdnhaa• • 101 senhora . Ieee q u e ouve IAo caçadores. Desde l a de b aixo ,
q u e lh es ouvimo s ee fa las .
- Pois são caçadores, s ã o . Lã aparecem el es. Se me c ão engano, um é o pad re cap e-
lão . . . e o outro ... d ei x a v er ee o de s cu bro . . . oh! ... é o lenh ar Lou ren ço d o. Cor tiço s.
Conh eço-o p 'Ic modo d e andar . Parece que a nda p elado .. . Oh , que dois cadeletr-o s I . . . _
conc l u i m ord a zm ente a tal ti a Leo cã dl a . E como ela d e ss e o p onto , t o da s fiz eram coro,
cr uza n do-se os co me màrtoe p icares co . sob re o m oral dos r ecé m -vindos .
- Têm m anha co mo s et e r apo s a s.
- Velh acaria, é qu e ef ee t êm .
- O q ue querem é fa lar m al , Estão s empre com ptca rd ía T
- Pois p'ra mim v êm d e ca rrin h o - obse rva a Gada n ha, matrona p i mponaça com
ares de doutora. E continu a : - Se ele s b aterem a q u i, e co meçar e m co m l ara ch a s, h ã o-de
o u v t-Iae I E eu que m e r eg a lo toda p or d ar um a r recu ão t e s o u eet ce barrae coe arra bacelros l
- Pois b at em cê, mana in ês-nota a L u tea , d esg os t osa , dep oi s d e olhar para a eet r ada ,
E n 40 te e ng a n a v a. Os caç adores, qu e eram o s mesmos que o Leccá d te pre eum íre ,
8alram d a ve r ed a e cortaram em direcção Ús mulheres, ao p a88 0 que o s c âee l adra vam
fren éticos, p or pressen tirem aU p erto penou d es conhecidas.
- Joio T.. • G lbola T. . . PIno la T. . . - gritou alto o p adre Si mõ es. qu e n âo q u eria m al.
qutetar-se com as d o poço p or ca use d a c a nzoad a.
Mas 88 ced et a e Ignor a n d o 88 Inten çõ es d o a mo, explodi am d ezen as de be-b éue, cada
vez m aia em ca çad or ee, m al . e nca rniçados .
-A q u i, Plnola ! ... -ber rava furt oe o o ca p elã o , com voz d e g eneral e m chefe '
Mas. qu al P lno la! A8 p odenga e con ti nuavam a l adrar fue íoea e, sem se Importarem
c o m o d ono .
- Es tlt v o cê um bo m pato-mo l eque _ di z ao cap elão o b ojud o 81'. Lo u renço , n a sua
v ozi nha p au end a e íu eonee . Depot e, pa ra [u ettftc ar o apodo. a crescenta: - Quer ver como
ele s se calam ? . . Aqui , D i a m a n te! •.. Calud a j Ar . .. _ or de no u o eeubor- d 08 Cortiços.
In terrom pen do a8 palavra. com a demora pa ch orrenta d e um cont a gota . m e cânico .
E o Diam a nte cal ou.ae Im ed iatam en te. e v olt ou l og o a t r ás, arr a s ta n do ii. o bed iê ncia toda s
u P íno íae c G lbolo8. Foi triun fo p ara o 81'. Louren ço e u m d eeaetrc p ara o pad re Sl mõe •.
- O r a vê, eeu padr eca 1 Ve ja, o q ue e u m hom em entender d a poda . No latim me
gan ha vo cê, rua s a mandar cães c a fazer p o ntar ia s 1880 . . . bolho t . ..
O ca pelão encava co u co m a troça , a pon to de jog ar a aeg u l o te btsce :
- v ocê , "eu a ea íca-t óbarae, ê e s p er to, lã Iaeo 6. Ma 8 n ão lhe v aleu u (Inura quando
ma tou o c oel ho emp l olhado 1. .. E f err ou.Ibc um a ga rgal hada eat âulca , qu e d eixou apo-
pt êttco o zo r -ro do senhor Louren ço.
- Você men te I m en te como um judeu l .. . Ol he n ão seja mai s verdade ir v o cê ii mela
o olte ao . gam boz l no8. 00 p àtí c da J oana do LaranjaL ..
-c êl au l s enhor Louren ço, rn au l . . . [ ee o n ão e para o Ó• . . . Quem t em t elhados d e
v id ro n ão atira aos d o v tztnb o . (Adoc ic a n do 08 m ane lra5) E o a m igo , vamos , qu e 08 tem
feito b OD8. Que m e diz d a quel a es per-a às lebre s, acol á n 08 Lc bat o e ? Ah, seu maganAo t
De eea vez n Ao t ol v ocê o cm p l olado 1•..
- Ora. h â que temp o. que Iaeo p aeaou l , . .
- Q ue f08se h ã mult o t empo, o u h ã p ou co, n ão imp orta. A p artida d eu-se, c O amigo
não n ega, h elo ? I
- Homem, cale-se para a i, nAo ou çam a. d a foote . Ol h e qu e es t a m o s ao p é d elas . . .
Agora é que v a mos co n hecer a8 t r ês p erd tg ot ne que vinh am encaeaíadae . ..
- Bone d íae, minhas fl ores, cu m p rime n ta muito co rt ês o menboso do padre S ímõe e,
dtr-ígfnd o-ec às ca rupone ea e,
- Viv am lã , eeub cs-es m o ça. - eaud a r o ncctrame n t e o velho Leurenço.
- Bo n s di a. t enham v c cem ec êa tatuem - r espondem algum a •.
- Não se i com o ee a t reve m a estar aqui d e n otte .Ldl z o cap elão a p retexto d e p arol a .
- E s em co m pan tia d o h om ens- a crescenta o d0 8 Cor tiços com int en ção a vel haca d a.
- Nem prec íee m oe d eles . . . - a dver te a Gad a n h a , m ostrand o m au fo cinho.
- Lá 1880 p r ecisam _ couteeta-Ihe o padre . _ Se uã c p r ecteaeae m, v in ham s ó , e não
aco m pan b a dae.
- Poi s n ó. v tmoa sozi n h as - r e pli ca a Leoc ád la.
_ A 's veeee, m ana.
_ Se m p r e .
- Se m p re é modo d e dizer. Pelo m eD OS a lgu ma •.
-Como a ..im ?
_ Com o eu lhe dlgo, comadre.
_ E m ais e u - a crescen t a o s enhor Louren ço s orrindo a seu modo.
- Nã o entend o - cout eete a Leo c ádt e .
_ P ai. ã f 6cI1 de e n t e nd er
c; r ed argu o o capelão. E pro.segu e: -Quero eu dizer, qu e
en t r e v cce m e cê e h ã q u em venha de noite a o po ço, a co m p a n h ad a de homem ou hcmeae,
Ytram estes que a t erra hâ.d e com er.
- E eet ee - a d uz o Louren ço arr egal a n d o u m dos olhos com o ded o indicador.
Depor e ecreecenta : - E nã o era um a 8Ó... eram dua • . . . ou quatro, para m elhor. dual
f êmeas e do i8 machos . .. dois calais de perdtzea t. . .
A Ratucha e a P lngalha est remeceram d e 8U8tO.
- Ma . que a reae eneotradae 8Ao C88as ? - p erg unta a Lecc ád ía, um pouco int rIgada.
E a Gadanha acreecenta : '
- Vã , d igam q u em s ão, Nada de nabos em SSC0 8 t
- Sim , que n ão fa çam um a s o fe ito e outra, carregu em com a fama - comentam
várlae a u jeitas a teca dae d e puritan ismo.
O s en ho r dos Cortiços r eapoude :
Quem hão-d e eer ? São e8888 que nos tra zia m a dianteira. Vocês d irão quem eram . ..
_A Vlt 6rLal . . . a Luis a ... -cxclama ao m esmo tempo a maioria d o a u d itór io.
Espanto geral.
E ra para Isso. Depois d as duas terem afirmado qu e v i n ha m 8óa, e ago ra descobrir-se
o contrário, quem nã o h avia d e estran h ar? Pobres moçaal . . . S oi s d ig n a s de làstim a, n ão e ô
p ela falta que cometest es, maa também por verd es a vossa r-eputaçã o abocanhada por
dois Hnguaretroe vlperi nos que de t u d o fa zem troça.
Confundidas pelo choque, el as n em sab ia m o q ue a lega r, t ão atarantadee estavam.
Por ú ltimo a Plnga lha c obrou o ânimo e r espo nde se rena:
- P ois v ie mos n a cam pa n ha d e h omens , u âc h á d úvid a . Mas e ss es homens não n 0 8
fazem verg o nha: um er a o m eu Ir-m ão e o outro o irmão da Lutea . Se a inda agora dteee-
mOI que víohamos SÓ8. foi por e les n 0 8 deixarem l a l onge, o n d e aparta 8 ca rr e te lra de
Fo ntalva. Não é ver d a d e isto, senhor p ad re ca p e lão '?
- Que eles se a p a r t a r a m de vocem ecêa, ltn d tu b a s , é v erd ade e m aia que verdade.
Ag or a se ele. eram os ee ue tr-mêos , 1810 n ão sei, p orqu e o . não co u b ec í.
- Todos somos trm ãoe - gague ja em tom de ruo fa o s enhor Lo u r enço, q ue er a um
al ho p ar a Indirecta • .
In tervém então a G a d a n h a :
- Nã o lhe deit e p imenta, seu pardal pansudo t As raparigas vieram co m o s Irm ãos
de verdad e, co m aq ueles q ue são fil h o s das eu ae m ãee e do ••eue pate, entendeuJ Você
com o .6 pensa na p o u ca vergonha , cuida que 0 8 m ais eã c o m e. mo.
- Qu e t al esta a centopeia t - ex clama de cara à ba n da o senhor do s Cortiço•.
_ AlUe8 ce n t o p eia qu e cadela relaxada, o u v iu ?
- Nã o vale zangar, c o m a d r e - ob ser v a o aetucloec capel ão, d ettendo água na fervura.
- Eu nã o me zango. M. as n ão con s lnto que na minh a cara ee fa ça p ou co de quem é
po b re. Bem vê, q ue nem todo o mat o é our égãoa,
A Leo c ád ta que estava a em b ir rar com a queetâ o, e que procura en eej c para di zer
díchotee, ata lha o d espique fa lando ass im:
- Dei xem-se d e trap ucbae, que não é p ' ra tanto. Va m o s a ea bcr : p ara onde vão 0 8
men Inos ca ça ?
á

- Eu , s enhora D. Leocd:dJa, sigo à toa p or eeee e herd ades fora, a se tro. E a q u i o


a migo d os Co rtiço s, co m o lh e doem os espar-võee, fi ca eu na f o n t e do Lobo , a armar 008
p àeear o e. E a g or a a s ua m ania.
- E ja fez o bebedouro, senhor Lourenço?
- Então havia d e estar por faze r, tonta t Aq u ilo arranja-se de vésp er a.
E o a g ách l: ?
-c Ta mb êm.
- Q ue m puxa o cordel ?
- Or a eeee l pu x o eu . . . ou tU, .e q u teere a vir co m ig o.
- Ag r a decida, mas não aceito .
- P or q u ê ?
- Porq ue não cai b o no socho.
Or a s e ca bia s ... anda vem . .. Es tá t ão gelto:lnho 1. . .
- Nada, n ão senhor . . . f ic o-lh e o b rigad a . Q ue e n t r em bem o s p a es ar-ínhoe é o que eu
de s ej o. Se mpr e m e d ará um, não é ver dade ?
- Um ou dois, como tu qut eere e. Um plnta ee tt g c , n ã o ?
- Um ptnt ae al lgo, pote , d o s vet boa, d a qu eles que t êm b ar re te.
- Se r ée eer v td a, d eeceuea. - E v oltando-se p ara o l ado d a Ga d a n h a , o ar. Louren ço
fl t a-a com u m 801'1'180 agaiat a d o e d iz-lhe : - Tu, minha vel hot a , tam b ém h ás-d e provar
na fe s ta. Se a caçada for boa, d ou-te um verdelhão.
- Dê-o a que m quiser, que a mim não me faz falta .
- Devera e ?
- Jã lhe d íeee,
- Então não fa zem o. a e p a zee?
- Com você ee n hcr- d íabo, nem b em nem mal.
- Mae com ig o b em. nã o , comndrlnha ? - pergunta muito manteigueiro o padre
Stm õee, roçando-se pel a Interrogada.
El a empurra-o e co ntesta-lhe :
- Co m voce mecê é a mesm a co tea . Vocem ecê e el e são da m esma j olga.
- Apre com a eerpent e l. .. Vamo-nos e m b or a, senh or Louren ço, que estam o s a per-
der pólvora . A m anhA. eet é a luzir e n óe a q u i, feitos martetetroe, a paeearm os por tcfoe.
- Por rolos e al arv e. - rumoreja a G ad a n ha, com une gesto. de n ojo .
O eenh or do. Co r tiçoe r oeua p or en t re d entee:
_ Va m o -no e embora . v a mo e, que is to é ca ça brava. Elas amansarã o!.. . E marcharam
im ediatamente, s oltando umas a p ôat ro fe e curta s c s ecas, qu e de certo n ão a p re nd er am
nos com pên d io s d e civ ili d a d e.
A contestação vi brou em estilo au âlogo, a in da que a Leoc âd ía rtu-ee m uito, p or s er
e eec o seu feiti o . Ate lh es grit ou:
_ Cautel a com a gaita !
Ele e n em a o menos a o uvir a m . O s eohor Lourenço. que n ã o e ra d e calibr e a sofrer
m o ssa com v it u pér io s d o b elo s exo, esqueceu logo o incidente. Ag ora ia t odo a b sor -to no
a per feiço a men to d o bebedou ro, q u e ai n d a t encion av a m odifi car. para a red e ca ir melhor.
O p adre S tm õee, p elo contrario, fi cara t üo enxofrad o com a d eecompo u enda que a pa -
nhou por r e b ela, q ue 88 s ua s ideias concent rara m -ee tod a s num p ro jecto d e d es forra . em
que , v in ga n do-s e da s m o ço ü ae, havia tam b ém de en ta lar o pateqae d o eeu b or Lou renço.
Por q ue . cm s eu en ten der, este, co m as eu ae zombarias rotes, é qu e tinh a pro v ocado a
h ostilidade d o peque na me- E eemcthaute fia sco pu nha-o fu lo co m o velh o d oe Ccr -t tç oe, a
pon to d e mo n olog ar col érico :
_ Q ue moerrengo aquele I Só eabc d izer c boca r r -í ces! .. .
Enq uan to às mulher zinh as, é forços o ccn fe eear qu e cada um a te z a sua a p reciação
p icante sobre a cond uta d oe d o is . A p r opósito v eio à baila o coeo d a Ratucha e d a Pi n ga-
lha, que fo i di s c u t tdo por m lu d oe. Afina l, ate nde nd o à preced ência da e cuea ç ão e ouvtd ea
a e explicações da s in cr c p ud e e, r ceolv eu-e e r eabtltt à-Iae de t odo. Seg u ndo a optn íãc ger a l,
a Vit ória e a Lu tea ti nh a m critério bastan te pa r -a r egeitarem a companhIa d e o utr o s r apa-
zes q u e n âc fo eaem eeua Irm ã o s.
. . .. . . . . . . . . . . . . . . ... . ... . ....... . . .......... . . . . . . . . . . . ... . . . ..... . . .. . ....
Me ia h o r a d e pote, t udo era sU ên ci o o a s ccrce n tae d a Ceg onh a . Da 8 m ulh erea d o p o ço,
uma s ti nh a m r egreu ad o à a ldeia. com oe câ n ta ros ch eio a; outra s, a gu ard ando a vez,
d or mi t a v a m junto d OR p en ed os pr ôx tmo s, vencida R d e t odo p elo s o no d a m a drugad a.
A Lute e er a t alve z a única qu e continu a v a d e v ígtl ía. Aa co moções viol e n t a a porque pes-
s ar a a n t es , a racaram -Ihe a Imagina ção fantasiosa e a paixonada . Assim, o s eu c érebro
eecend ectd o , l onge d e ee en t r egar a o r epou s o r eparador, agitava-s e r evolto num t u r b il hão
d e pene am ento e, q u e lhe co n tra ia m o s músculos num a Iu et st ên cta a ngu s t io u, verdad ei-
r am ent e fe b r il.
. . .. .... ........ ..... .. ... . ... -- .
• •
A o cair d a tarde d e um domingo de d ez embro. o pequeno adro da igreja paroquial
regorgltava d e cu rtoeoe d e emboa oe ee xoe, que a tod o o cU8t O qu eriam v er a boda do
C h lco v entosa e d a Vit ória lt Pingalha, que àquela hora se reali zava . ali, no interior do
templ o, perante um rebanho d e ccnvldedoe.
- o que tarda a eatr l L d tzta m vár ias aldeãs Impaclentea com 08 fIlhoa a
tiracolo.
_ Po ls agora n à o h ã b ên ç êoe _ observa a Maria Rita , que campa por entendida em
coteee de liturgia.
_ É que estão com o eeeento _ rcda rgu e eentenoícsa 8 mulher do sacristão.
_ La s a em , jã . . . La saem 1. .• Com efeito, à porta p rincipal da igreja eeaomaram 08
noivos, os p a d rin h 08 e 08 convtdadoe, ea ín d c todos pa ra o adro em direcção à casa da boda .

J
Principiam o s comentaria s:
_ Que bon ita valI
_ H u m I n em por leso . Leva o lbo s d e chorar.
- Poi s não havia de c horar? São coisas q ue cheg a m fundo . Eu qu e o diga 1
_ E que chore. Por liso n ão e m ai s fe ia. To ma ram m ult as . . .
_ E o vestido . .. ol he m q ue é d a moda.
_ Fo i fe ito à d a s Eu e éb ta s.
~ .\ 1, n Ina, a ca pela I ... Coisa asseada t ...
- Veio d a cidade. Do Manu el do Cavalo . Dez t ost õ es .. .
_ Coitadi n ha t Noaea Sen hora a a jude.
R o noival ol hem o n oi v o I O q ue vai d e s ério 1 Tem o l heira s r. ..
_ Ma s bem vest ido J•• •
- Bota fi na I
_ Co la r in ho d e lustre I
_ Bo t ões d e o uro . . . a la muree d e pra ta ... um di n h eir ã o I. . •
- M0 8 não l ev a abotoadu ra .. .
- Se jA s e n ã o u s a r... Ne m r e p aram que as calças e ão d e portin hola. Pois cu , fo i
p a r a o que olhe i l og o . . .
_ Um m oço bem estreado, sim sen hora . . . Aqu ilo deve ser ri jo e dur àeto. Ta tnê tn
a pan ha um peixel. ..
Neste m eio tem po o corte jo a travee eava as a la s da m u ltidão, p o r entre oa ol hos
perecrutadoree d08 basbaques , q ue n ão queriam desperdi çar o mais inftmo pormenor.
Segundo o u s o lo cal, o. n otvoe e o aco mpanhamento Iam g raves e cerimon iosos,
cumprime n tando para a direita e pa ra a esqu erda, ao m es uro t emp o que agradeciam 88
í'Ioree e os gr-ãos de trigo q ue l h es atiravam d as ja n ela s e da. portas. em obediênc ia às
coetumeí r-ae. No m eio da com itiva, d eeta cav a -ee, solene e mage ato eo, o velho p ároco d a
freguesta - o pad rlnho-p rior _octogenArlo de virtudes exemplarteetm aa, que b á meio
s écul o servia a paróq uia com eve ng éltca dedicação. O. 8in08 tangeram 08 re p íq uea d o
eerüo, e d esde logo as criança. q u e enxameavam o terreiro a08 sa lto. e cabrfolae, v ieram
u nir-se aos con vtdadoe, formando o couce do pr éertto, numa deeordeur e ind18clp llna
b ulheuta, própria do. poucos a nos.
Algun8 mais ladinos, t re smalhavam d a chu sma, e acercavam-se do venerando sacer-
dote, dizendo-lhe cm t o m h umilde :
- A eu a b ê nção, sen hor p a d r inho I
E o pa d r e Alb uquerque, leva n do a m ito ao ba rret e, d escobria a s ua formo sa cabeleira
branca e correspondia r is o n h o:
_ Deus vos abe nçoe, me us fil hos. _ E attr ave-Ibee com ea amêndo a. que lhe haviam
oferecido n a ig reja , expa udí n dc-ee nu m a a legria santa e si mples, e ó própria de q uem
I! bom.
Chegaram p or fim cala d o a u o ívoe. A' p orta da r u a agua rdu m -noe u m ba n do de
à

meças das m ai s H am aet ee da t erra qu e, [u bllo ee a e fo lga eãa , cepar gem sobre o séq u ito
pê talae de và r te a Hoeee. A viz inhança t r esbord a pele s pcr -tedoe d a s h a bita çõ es e a ru a
coal he-ee d e gen t e d e t od a a ca s ta que a code a v er a boda. Repetem -se, en fim , 88 cena s
do adro da Igrej a, co m t anta o u m ete cu r io s idade.
A noi va e a m adrinh a v o l t a m -se p ara o p o v o e faze m a meeu ra d o cost u me, para n ã o
fal t arem às pra x es . E e m s eg u id a , metem-se em casa, t endo en tào lug ar a cen a d o s para .
bé n e. Q ue ventu r a e q u e prazer pa ra a Vitó r ia e para o Ch ico J Realizaram fin alme n t e o.
eeu e s onho. dourad os I E n t re ta n to. o s p adrtub o » deeeu ve u cí t ham -se d a turba qu e e nche a
catita, e reg reeea m à rua, e m p u n h a nd o a bol sa d a s a mê u doa a, r ebu çad os e co nf eita s , qu e
atiram ã s m ãos cheias, sobre a onda d o p o v oleu.
- P'r'a qulT . . . P'r'aqull . .. _ bra d am d e tod os 0 8 l a d o s, em t ons va rte d teatm o s.
E 0 8 garot o s, caind o d e chofre s obre a s guloeeima a q ue Ibee esp al h a m, es m u r r a m -se e
espezinham - se r eci p roca men t e, r i ndo un a e chorando o ut ro s, t ud o num ber r ei ro a gudís-
s imo e de. com passad o, que se ou v e a m el o l egu n.
- P'r'aquí I. . . P 'r'oqut l -con ti n uam a gritar d e t oda s a s ban das. num ent u s la em o
freme n te, c aract er fer ícc . ..

j
Entretanto, algu ém aabo re la o ee pectà c u lo por uma form a b em dt v eraa. E~8e a lguém
é o capelão e o eeu Inaep er ável L oure n ço , a mbos a eetet tn do ao p a g ode d o ceaó r !o , d o
peItoril de um a janela.
O pr-ímetro, de g orro e cache-nez, n am orava d es caradamente a J oana d o Lar a njal.
l) s egundo, n Ao ve ndo o coirão d 08 eeua efectoe, ol h a v a luxurio so para 08 mulheres b o ut -
tee, e. com 1880 s e r esignava .
Mu, à c hegada d o pr ésttto, aco r dara m de pa amacetr-a qu e o s e rotlz ava e fica ra m
m ara vilhad os com a fo r mos u r-a d a n ctv e . E c o n t e m pla n do-a por Inetantee, vteram-Ihe
r ec ord a ç ões fec etae d as cenas o cor-rtdee h á meeea n a s proximidad es d a Cegon h a.
O p adre, rememorando 0 8 facto s, n ota :
- Ou h oj e, ou a m anhA c m qu e n ó. a btsp àmce d e s ope ira com ele T
- Ho je. goza ela ma íe I. . . _ r e p Uca o eeub or d 08 Ccr -tiçoe, com o s e u risinho b rej eir o.
- [880, q ue m s abe - objecta o ca pelão.
_ Não t e m qu e saber . Hoj e. é e m c h eio ! . .. Tomara v ocê est a r -l he n a p el e - di z o
Lo u renço com ares d e tro ça, ol h a n do d e esguel ha p ara o padre S tmôe s .
- Vade retro, s e u a t revido I O ra o abe ta râa , com que s e h avia d e ea ír-L . .
E os doi e, e ncar e u d c-ac com cini sm o. d esataram a rir d eebreg ad os, com o paeear õee
d e p ap o d e r ola que ae e n ten d em p erfeit amente. Bons ttpce t

Dua s p ala vra s sob re a R a t ucha:


Desve n t u r a da ' Des d e a q uela m e m or ável manh ã, t ão fértil e m acon tectmen toe, nunca
mole p ôde sor r tr . Des d e e n tão, p arece que um a n jo m au ee com p razia em a t orturar
atrozm en t e, r ou bando-lhe o s cari n hos ex tre mos o s d equ elea q ue id olatra v a.
A mãe morrera-lhe n o bceptt al . O To m é, ia fo ra ten tar pra ça e m Ia n cetroe, p or ter
t ido o infortúnio d e tirar o núm ero ba ixo.
B em o p r e ..a gtava el a, a in feli z, qu ando se debulh ava em I ágr-ímae p or tal8 supo aí-
ç õc e. Mae i880 a in da e r a o m eno e.
Ap ôs o s euceaeos da Ce gon h a . a 0 8 sofrim c n tos in at08 d o ecu t e m p e ra mento n erv o s o,
juntaram-s e o u t r-os m orata e Fteicoa que p or s cu turno agra v aram aq ueles, pon do-a num
a bati men t o t al qu e cau sa va d ó vil-l a e o uv i-la.
Pe ím ctro , s entiu des falecim ent os , n àueeae c ca l ef'rto e. Depo íe, o u tr o s sintom a s m ai s
a l a r m a n tes c pronunciad o s vieram acu sa r-l he um eetedo criti co . . . v ex at ório.
E s tava grá vid a ! . .. O c ú m u l o d a. d ee v euturee l . . . Ao t empo jA era ó r fã d e t odo .
S ozinha , no mundo !. .. O pai , mal a con hecer a, a m ãe ftuara-ee, o a ma n te.. . e ra aoldad o ...
Pensou e u tcid a r -ee. Ma 8 r cnunciou à Idei a , por covarde e a vUt a n t e . Viveri a . Ser ia m à e e
eepoe a . O To mé jurara-lh e fidelida d e. Bacre veu-Ibe, r elatando-lh e tudo, t udol E l e n ã o
r espond eu . Não r eceb eria a car ta , 8Up Ô8 ela. E ec reveu -Ib e o utra vez. Nada . Ter ce ir a ca r t a .
O mesm o muti smo. Indagou . Velo-Ihe o d es eng ano. El e. o traid or, q u e v il m e n t e a sedu-
zira, olvidara-a p or um a m eretriz d e b ord el . com quem vivia amancebad o' ln fami aaímo
procedim ento T
E a deedttoea Ratuch a, veudo-e e d es onrada e es ca r n ec ida p or a qu el e qu e ama va
de sd e a Infância, r olou d esmaiad a pelo c hão, e atorceudo-ee em co n t o ceõe e horriveis que
lhe dlsflguravam o reato.
Quando v o l tou a st, pareceu-lhe um s oubo. Ma8 fulmin ou-a l ogo a realidade, a ts-lete
realidade . C h o r o u entào muito .. . Depois a e Iágr-tmae exaurfram-ae, e apenas lhe Itc ou 8
ee curfdão da alma negra co mo uma n oite tempeetuoee .
Pobre Lutea T
~.:<c('u"ão f!r.í.lica dn ~l·o!-"'T:l.\ur=\ Limita la.
T r:m :l> !-3 ,1:\ Oli\l'ira (i\ E..tr\··b)~ ·1 a li)
Tclt fone ti l l:!lj Li..\.o:'\ - - -

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