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ANTONIO SERGIO PSEUDO-CULT Isto so rapaziadas. Vensey, Verdaieiro método de estudar, This above all: to thine ownself be true, And it must follow, as the night the da Thou canst not then be false to any ma “Suastsovaine, fala de Pals Volk und Knecht und Uberwinder, Sle gestebn za jeder Ze, Hochstes Glick der Erdenkinder ‘Sei nur die Persinlichkeit. Gorrie, Hestostl. Diwan. CABAM de me chamar a atengao para uma noticia do Ler que eu nfo tinha visto, Fa que diz deste modo? «A obra que © Dr. Anténio José Sa- raiva val publicar € edigfo do Autor ¢ nfo da S. E, N,, do Porto, Intitula-se Caprichismo Potinico do Sr, Antinio Sérgio, © posta & venda este més». Ao que parece, este titulo s6 por si divulga ja uma ideia: a de que eu tenho © gosto de armar polémicas; e como estou convencido de que nao é tal assim, sinto- e no direito de invocar um exemplo em que o meu horror a polémica ficou UM CASO. TIPICO da RA NACIONAL bem provado: precisamente no caso do nosso Professor Saraiva. *Nio esqueceu decerto 0 Professor Sa- raiva que em trés longas palestras lhe su- vliquel com amizad= que av publicasse @ sua critica sobre os meus Lasazos sen primeiro estudar muito bem o assunto, —para nos evitar o desgosto de uma dis- cussio pueril, a que se deixou arrastar por uma confabulacao de intriguista Sim: por uma confabulagio de intri guistas, que o quis manejar a seu gosto. tarei eu enganado? E possivel que sim: mas tenho razdes, que vou dar. Antes do artigo do nosso Professor Sa- raiva, haviam-me chegado estas informa- GOes sucessiva 1.4, a de que num grupo aguerrido de cidadaos portugueses despontara a opi- nizo da conveniéncia e justica de uma ofensiva de aniquilamento contra o meu ser social (claro, néo se tratava de des- truir a minha individualidade fisica); 24, a de que se previa um ataque pela seguinte técnica: (@) algumas persona- gens de médio prestigio mental—alguns Donzéis mais fogosos—proclamariam nas folhas onde fosse possivel fazé-lo que a minha obra escrita se tornara ja obsoleta, porque eu havia parado a meio caminho da rota, a0 passo que a mocidade queria seguir avante; (4) buscar-se-ia uma per- sonagem de primeiro plano mental—um grande Cavaleiro do Espirito—que assu- misse papel de ser Super-Sérgio(assinz # que disiam), 0 qual, por uma critica ful- gurante ao meu negregado «idealismo», me deixasse reduzido a uma mumia imatil; ge, a de que a campanha escrita se insinuaria em dois orgios: a Searaea Vértice,—sem conivencia, alias, das di- recedes respectivas; 4, a de que para representar o papel de Super-Sérgio luso, encarregado da be- nemerencia de esfrangalhar 0 Sérgio, se pensara num estudioso de questées filo- soficas que eu sempre considerara como entendedor dos problemas, © que se achava entdo a estudar no estrangeiro; 5, a de que este nfo sémente nfo aceitara a incumbencia, senfio que acon- selhara os cidadfos aguerridos a abrir mfo da ideia de aniquilar o Sérgio; 6#, a de que aparecera por derradeiro um bom eseritor e fildlogo que se dei- xara sugestionar pelo ambiente bélico que Ihe criaram em torno os cidadaos anti-sérgicos, assumindo as fungdes de Stiper-Sérgio luso, de novo Hércules be- néfico, que viria matar esta Hidra; e que o Hércules-Stiper-Sérgio era o Professor Saraiva. A principio, nfo prestei nenhum cré- dito a esta boataria tirgida, embora fosse certo que poucos anos antes j4 me hou- vessem assaltado com uma coalizfo idén- tica, quando uma ardega rapaziada coim- bra e tripeira me anavalhou nas colunas de certos jornais de provincia, entre 03 quais uma revista que se chamou Sof Nascente,— supondo eles ter achado um Siiper-Sérgio idéneo num intelectual multifério e de psiquismo mérbido, que pretendeu dar comigo num Vasa-Barris fragoroso, em particular e em publico (foi ele, por conseguinte, o fundador da dinastia dos Super-Sérgios lusos, onde deveria suceder-Ihe 0 nosso Professor Saraiva). Repito: nfo acreditel, de principio, que se pusesse em obra esse plano, se ¢ que tal plano existia; porém, verificou-se o seguinte: comecou a efectivar-se o vati cinio estranho, precisamente:ao modo como as informagdes mo diziam. Mero acaso? Talvez; mas as informag6es con- firmavam-se. Assim, surgiram na Seara ois agressivos pagens, ali se maniles- tando aquela mesma tese que me haviam prevenido de que ficara assente, e que também enuncion © nosso Professor Sa- raiva. A identidade dos venabulos e dos processos de tiro inculcavam a existéncia de uma expressfo colectiva, de uma sub- missio dos intelectos a uma mesma orientagio de igrejinha. Extremamente inverosimil, piramidal, incrivel? Isso me pareceu de comero. Mas qué? Le vrai pout quelquefois wétre pas vraisemblable: Porque ocorren mesmo assim, Na apa- réncia, a0 menos. Vejamos o que disse 0 nosso Professor Saraiva, no seu artigo da Vértice: ‘Mas deve-se motar por outro lado que os lei- tores de Sérgio assimilaram nos seus livros aguilo que satisfazia as suas proprias nece dades e correspondia as condigdes actuais da vida portuguesa, Ali procuraram armas de combate, € munidos delas prosseguiram, deixando intacto © que lhes nfo parece adequado a uma marcha ‘em frenter. I, por seu turno, difundindo a preceito a mesma palavra de ordem (a de haver m mim um atrasado, e um embaraco, portanto, para o tal marchismo-em-frente) um dos pagens da Svara papagueava assim: «Sérgio, tendo contribufdo com uma obra de capital importéncia para a cultura do nosso tempo, para o desbravamento de caminhos, acabou por imobilizar se numa atitude ensaistico-polémica> {céestd o polemico, 0 caprichismo sergiano!) «que, por mais {ccunda que tenha sido, se apresenta neste momento, aos olhos da geragao que entrou hos trinta anos, como esgotada das suas virtvali- dades pedagdgicas». (Alias, a geracio dos 30 anos & para mim jé velha; escrevo para a dos 20, mais parecida comigo). Como se esta observando, o Cavaleiro- 2Professor e 0 Donzel da Svara ecoavam a seu modoa mesma voz canénica,amesma formula gregaria, que vinha a parar no seguinte: que eu, por nfo ser recita~ dor de um catecismo em moda (de ne- nhum dos catecismos que esto agora em moda) senfo que possuidor de uma actividade propria,— problematica e vi- vaz, criadora e critica, auténticamente em marcha, —sou afinal quem se imobiliza numa atitude ensaistica (como se nfo fosse por defini¢do a atitude ensaistica precisamente o ademane de quem ca- minha e busca, ode quem fogea inércia!), com uma obra esgotada de virtualidades pedagégicas, e j4 imprestavel, portanto, para os marchadores-em-frente, Mas mar- chadores em que campo?—Decerto nfo no do intelecto, no da investigagio, no da ciéncia, onde s6 se marcha ensaiando, E para marchar noutros campos, os dog- mas de ontologia so absolutamente inti- teis. Um embaraco, até. Importa acentuar 0 disparatado da ideia: nao para demonstrar o disparatado em si, mas para apontar a inverosimi- Ihanga da sua ocorréncia espontdnea a0 espirito de dois homens de tal vigor mental, Num autor de cardcter essencial- mente ensaistico (como se conclama que eu sou) é tudo adequado para uma marcha em frente, porque tudo nele ¢ ensaistico, pesquisador, problematico (0 que nfo é ensaistico é por isso mesmo dogmatico, por isso mesmo imobilizador, por isso mesmo inerte, sob 0 ponto de vista da inteligencia, de educagao mental, da cul- tura). Somente no ensaista ha dinamismo avango. Em resumidos termos: o Donzel da Seara e 0 Cavaleiro-Fildlogo coinci- diam no enuneiado de uma ideia absurda, cujo absurdo s6 nfo veem os que nfo sia sagazes: e eles slo perspicazes, excepcio- nalmente argutos, Se se pode dar 0 caso de que beaux esprils se encontrem por abicar cada um, por seus caminhos pro- prios, 2 moradia luminosa de uma ideia justa, é impossivel acreditar que Geaux esprits coincidam (sem sugestdo colectiva) na enunciaedo unissona de um despau- tério estridulo. Dada a inteligencia dos matadores da Hidra (porque eu, a Hidra, mantenho-me na crenga de que eles sao sagazes, admiravelmente sagazes), a con- cordancia no disparate sd se compreende ¢ explana pelo recurso as concluses da Psicologia das Turbas, Como se sabe, quem participa de um ambiente mental de turba deixa logo de pensar ao seu proprio nivel, e precipita-se num plano consideravelmente mais baixo. A babo- seira comum dos dois intelectuais insig- nes explica-se unicamente por uma su- gestio colectiva. A senha era uma bur- rice, Viu-se bem que o era. Mas obede- ceu-se a senha. Cuidar que se podem esgotar com o tempo as virtualidades pedagogicas de uma dada obra significa nfo fazer a mais pequenina ideia do que sejam as virtua- lidades pedagégicas de um livro,—con- fundindo o pedagégico com:as opinides expendidas, e a forma da inteligencia com a matéria de um escrito. As teses que se defendem em determinado livro (a ma- téria dele) podem bem deixar de ganhar adesdes—tornar-se obsoletas— por ha- ‘ver 0 progresso da experiéncia e da eien= cia levado a conelusto de que nfo expli- cavam os factos, ou de que nao bastavam para tal; porém, a virtude pedagogica de uma obra escrita nfo deve confundir-se com as respectivas teses, e deriva da exemplaridade que caracteriza a obra como modelo de um exercicio de inteli gencia efectivo; em suma: como man: festagdo de uma mentalidade verdadei- ramente critica, verdadeiramente proble- matica, verdadeiramente cientifica. Se amanha se demonstrar que sio efectiva- mente erréneas tais ou tais opinides de um cientista ilustre, nao diminue por isso © valor pedagégico do método de inves- tigagto de que deu exemplo,—se o mé- todo, de facto, foi inteligente e critico, Ler um autor pedagégico € como fazer gimndstica, A virtude pedagégica nao se desfaz com 0 tempo (como se nfo desfaz com o tempo a superioridade artistica); se existiu, existe, e ha-de existir no fu- turo. A senha, pois, era evidentemente absurda. Mas reatemos 0 fio desta instrutiva historia. Certo dia, sucedeu confirmar-me 0 pré- prio Professor Saraiva a noticia de que ele ia publicar na Vértice-um artigo de critica sobre os meus Ensaios. Logo (como € natural) relacionei o caso com as infor- magdes que tivera.e com o ambiente de sugestdes que se Ihe criara em torno,— incitando-o a representar o papel de outro Hercules, matador de,outra Hidra. Como eu (nova Hidra) era de facto amigo do Professor Saraiva e me desgostava uma intitil discussfio com ele (sabia-o incom- petente para a dilucidacao filosofica e enjoava-me 0 ridiculo das preocupagoes mavérticas que lhe tinham infundido os cidadaos anti-sérgicos, segundo a infor- mac&o que eu tivera) imediatamente Ihe pedi que sustivesse o impeto e que nfo desse a piblico o que, sobre mim escre- vera sem primeiro se esforgar por per- ceber bem a doutrina, Como atras fico dito,—propus, supliquei, reforcei, insisti. Sugeri, desde logo, que discutissemos primeiro verbalmente 0 assunto, para eliminar os argumentos rotundamente jos e que resultassem somente da sua incompreensto dos textos. Tudo isto para vantagem do Professor Saraiva e para me nfo ver obrigado a corrigi-lo em puiblico sobre coisas que fossem elemen- tares e gbvias (como veio a acontecer); tudo isto com 0 objective de evitar a polé- mica, Tanto empenho tinha eu em fugir a polémica que duas vezes o convidei a continuac&o da palestra, para tornar a explicar-me, para dissipar toda divida, Em suma, trés tardes consagrei a essa tarefa insipida, esclarecendo e explicando, Sempre (repito) para evitar a polémica, Nao 0 deve esquecer 0 nosso Professor Saraiva: to thine ownself be tru Ora, deu-se um caso estranhissimo, que se me afigurou confirmar o que me disseram antes : 0 Professor empedrou-se numa contumdcia rigida, obturando a alma e os ouvidos como se fosse eu a Sereia, sem nunca querer entender-me, Tudo me inculeava que ndo queria en- tender, —que resistia a desviar-se de uma decisiio arraigada, obsessionante e inflexivel, Pareceu-me vido de polé- mica, como um Dom Sebastiao de caca- das, Nao topei explicacdo, a nfo ser a de que se sentia na obrigagao moral de rea- lizar uma facanha que sobre si tomara, € que o seu cl lhe exigia, Vi naquilo— como dizé-lo?—um quixotismo de dog- matico, que o elevava a estatura de um inquisidor manfaco, Para ele, langar & fogueira 0 meu relapso seria dar um concurso a salvacio da Patria. Esta espécie estrambética de cavalaria andante inspirava-me ao mesmo tempo simpatia e mégoa,—mdgoa a que se li- gaya uma impressio de espanto, e que nfo podia deixar de ser de si irdnica. ¢Pois concebe-se que um homem que é essencialmente ensaista (como eu) possa acaso deixar de se sentir ironico perante um Quixote «cientificor de raiz dogma- tica?... Seja 14 como for, vi o inevi- tavel de me resignar ao meu fado, — 0 de perder 0 meu tempo em explicagdes inu- teis, o de ser alvo das faganhas deste testo Alcides. Retirei-me tristuroso, a resmunear ed comigo: «Ora o Fildlogo N&o querem ver que se comprometeu a estrangular a Hidra ?» Ele tinha de esma- gar-me, sem admitir delongas. Sem dei- xar udo nem mudo. Assim eu o entendi... Finalmente, os prelos estrebucharam, e o artigo da Vértice apareceu. Valha-me Deus! Ai de mim! Que the havia eu de fazer? Que remédio me res- tava, sendo responder aquilo, — retrucar com paciéncia ao seu caprichismo anti- -sérgico? A este respeito, todavia, cumpre-me acentuar duas coisas, A primefa, é que sou Hidra pacatis- sima ¢ com horror as brigas,e que ainda depois da arremetida herculeana eu n&o tive 0 intuito de polemicar com 0 Hér- cules, —que nfo tive consciencia de_po- lemicar com o Hércules, Em meu juizo hidrologico, limitei-me a explicar com ar- gumentos simples os pontos que ele nao tinha compreendido em mim,—e que eram tudo, ou quase. A segunda, é que me pareceu impossivel nao aludir, sor- rindo, aquela ansia de belicosidade em que me pareceu firmadot e de ai o simile explicativo em que figurava 0 arsénico. Ao que me disseram, anojou-se ele do sorriso, ¢ a intervencio do rosalgar é que foi aqui mais téxica, Agora, forcado a considerar clinica- mente 0 lance, percebo que esse sorriso fosse*acaso um erro, Ignorava eu 0 tem= peramento do Professor Saraiva, e fui julgar por mim proprio. Sorrindo, ma- goei-lhe talvez a sensibilidade aguda, quando pretendia unicamente fazé-lo sor- rir tambem. Peco perdao deste engano. Mas o lapso explica-se. Vendo-o t4o cobi- soso de batalhar com monstros (com su- postas Hidras) julguei-o homem fragueiro de epiderme rija, de alegria espon- tanea e apreciador de facécias, como eu proprio sou, Pelo que a mim diz respeito, esta Hidra de Lerna nao é tao-s6 paca tissima, como ja acentuei: é extravertida, risonha, de claro humor, folgaza. E de- pois, tenho sido toda a vida atassalhado a fundo; de todas as facedes sofri golpes, que recebi sempre a sorrir (ou, melhor: sem preocupagfo quanto a mim, mas inquieto, uma vez, quanto a individuali- dade atacante); e trago a pele encor- reada por uma multidao de mosquitos, todos aferroadores e zunintes. Assim sendo, pois, supus naturalmente que um Super-Sergio autentico s6 achasse gra~ cinha ao que gracinia era, e que Ihe parecesse procedimento estomacal e sa- lubre que eu langasse uma pitada de vivo sal de Setubal numa insossa caldei- rada de magicacoes filosdficas. Mas nao, Ao que estou agora enten- dendo, eu deveria ter fingido que nao vislumbrava 0 intuito, e dar ao publico A apararéncia de uma conviceao intré- mula de que a critica publicada pelo Professor Saraiva era uma pomba abs- tractiva e puramente ideolégica, emplu- mada de intuitos de objectividade cien- tifica, — doutoral, teorética, emoliente é angélica..E deveria, ainda, esquecer-me de que sou um tavanés que ainda mexe (e por isso mesmo legivel) e nfo um s6- cio efectivo da Academia das Ciencias. Miserere-meé! Valei-me! Ser de fingir, ou de nao fingir: eis para mim a ques- tao. No meio da mascarada desta nossa vida social, eu sou sempre acoimado pelo meu compatriota excelso: porque, se finjo que nao enxergo onde se oculta ‘0 enredo, o compatriota censura-me por- que sou «ingénuo» ; se do finjo que nao atino onde se alaparda a trama, o compa- triota repreende-me por ser eu «polémi- co». Aide mim! Que fazer? Fingir?...Nao fingir?... Sorrir?... Nao sorrir?... Ora! Quer num caso, quer no outro, a conde- nagio é fatal. Se no sorrir na aventura, terei de sorrir depois dela, Repito: eu tenho horror as polémicas. Simplesmente, parece-me as vezes que é do meu dever pedagégico (ou patristico, ou civico) o levantar diquezinhos a cer- tos autores de influéncia, quando dao gato por lebre ao pobre do leitor portu- gues. Deve 0 filésofo (a haver razao no que eu penso) sér ainda’ mais rigoroso, mais dilucidador, mais claro, que 0 pr6- prio cultor das ciéncias: nao cair nunca no nebuloso, no mero metaforismo ret6- rico, Creio que os cientistas deveriam ser sempre filésofos, por uma reflexto efectiva sobre a ciéncia propria; e que cumpre ao fildsofo que nao é cientista uma mentalidade forjada no rigor cien- tilico. Sempre combati por esta concep- gao de cultura, e espero que por ela continuarei lutando, ainda que por isso me veja forgado a polémica (ou, antes, ao que prefiro chamar controvérsia, que € 0 que realmente eu faco: dilucidacto das ideias, e nfo lutas pessoais): pois (creio eu) nao pode haver uma formula mais transviadora e mais falsa que a do «caprichismo polémico do Sr. Anténio Sérgio». O que existe (isso sim) € o de- samor do Sérgio as dogmatizagdes fala- zes. O meu lema ¢ este: nfo obscurecer ‘0s espiritos, nfo hipnotizar os leitores. Mais, ainda: nfo cumpliciar pelo silencio. O ideal do filésofo amador, entre nés, é que o deixem a vontade enevoar os cé- rebros, palavrear a toa, sem haver quem © advirta, Mas advirto-o eu: e nao por «capricho», mas para que exista em Por- tugal uma cultura critica, onde a filoso- fia seja (como queria o James) um es- forgo excepcional para um pensamento claro. E agora, esse gtacioso problema do Super-Sérgio luso. Descansai. Hiio de aparecer Suiper-Sér- gios. Muitos deles; as centenas. Porém, ha talvez certos dbices. Para vs, —certos Obices, E € que os que forem de facto muito superiores. ao que eu sou nfio hio de ter a mesquinha preocupacdo sectaria de exceder e de esmagar a quem quer que seja, e portanto a de exceder e de esmagar o Sérgio: porque essa propria mania de se alcandorar vencendo seria um indice inegavel de inferioridade mental. Os verdadeiros Super-Sérgios 86 se ho ocupar das ideias, e discutirdo das ideias sem querer derrubar o seu préxime, Serio comigo magninimos: e Por essa mesma generosidade hao de eles revelar que sfo grandes. Creio que todas as inteligencias verdadeiramente altivolas tem sede de estimare de apreciar 0s outros, de os elevar e os louvar. Nao: os verdadeiros Siiper-Sérgios nto me hao de vibrar facadinhas. Far-me-Ao critica objectiva, sem a preocupacto de opugnar- -me} acentuardo o bom que em mim haja, com certa caridade eindulgencia, Ealguns requintardo esse seu fidalgo ademane até © ponto de exagerarem uma certa gratidao aos Ensaios. E porque? Por haverem adoptado as concepedes que proponho ? No, nada disso: mas porque lhes pare- ceram um exemplo de pensar probo e efectivo —nao-magistral, problematico, —sem mecéinicas recitagdes e sem pres- tigiagdes de retorica; de adogmatico ajui- zar; de honradez. A obra de um homem que nao simulou nem mentiu, De um clere que nao trai, e que sempre pensou que é do seu préprio campo (o da es- querda) que sobretudo a simulacto deve ser banida. Os Stiperes ? Os grandes? Ora reparai como eles fazem. Numa carta do Antero ao seu amigo Oliveira Martins, escrita dos Agores por 1873, ha este trecho ma- gnifico, que é uma bela ligto para nés todos

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